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A presente pesquisa faz um estudo analítico do campo de atuação do produtor cultural na cidade de Porto Alegre, avaliando qualitativamente o atual contexto profissional no qual a figura do produtor está inserida. Para isso recorre-se a uma pesquisa bibliográfica que traz como base o surgimento desse novo agente do campo através da institucionalização da cultura em nosso país e da criação de políticas de fomento via concessão de incentivos fiscais e construção de fundos direcionados a atender as atividades culturais no Brasil. É feita também uma análise do atual mercado cultural, abordando desde o segmento de compra e venda de obras de arte como também o emprego de mão de obra advinda das atividades culturais, bem como as especificidades de nossa região. Por último, faz-se um estudo do percurso do produtor cultural na cena artística de Porto Alegre desde a década de 1980, através de entrevistas com diversos produtores atuantes no mercado cultural local. Essas entrevistas foram utilizadas para dar embasamento a pesquisa mostrando a formação de uma nova profissão no mercado e as carências que ainda deverão ser supridas para que o mercado venha a se solidificar, atingindo gradativamente sua autonomia.
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1
UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO GRANDE DO SUL
INSTITUTO DE ARTES
DEPARTAMENTO DE ARTES VISUAIS
FERNANDA CASTILHOS DE OLIVEIRA
A PROFISSIONALIZAO E O PAPEL DO PRODUTOR CULTURAL NO CENRIO
DA ARTE CONTEMPORNEA EM PORTO ALEGRE NOS ANOS 2000
Porto Alegre
2013
2
FERNANDA CASTILHOS DE OLIVEIRA
A PROFISSIONALIZAO E O PAPEL DO PRODUTOR CULTURAL NO CENRIO
DA ARTE CONTEMPORNEA EM PORTO ALEGRE NOS ANOS 2000
Trabalho de concluso submetido ao curso de Graduao em Artes Visuais, do Instituto de Artes da UFRGS, como quesito parcial para a obteno do ttulo de Bacharel em Artes Visuais. Orientador: Prof. Dra. Ana Maria Albani de Carvalho
Porto Alegre
2013
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FERNANDA CASTILHOS DE OLIVEIRA
A PROFISSIONALIZAO E O PAPEL DO PRODUTOR CULTURAL NO CENRIO
DA ARTE CONTEMPORNEA EM PORTO ALEGRE NOS ANOS 2000
Trabalho de concluso submetido ao curso de Graduao em Artes Visuais, do Instituto de Artes da UFRGS, como quesito parcial para a obteno do ttulo de Bacharel em Artes Visuais.
_____________________________________________
Prof. Dra. Ana Maria Albani de Carvalho - Orientador
_____________________________________________
Prof. Dr. Paulo Cesar Ribeiro Gomes
_____________________________________________
Prof. Dr. Paulo Antnio de Menezes Pereira da Silveira
4
AGRADECIMENTOS
Em primeiro lugar, agradeo aos meus pais, Alzenira e Fernando, por sempre terem
acreditado no meu potencial e terem apoiado minhas escolhas incondicionalmente.
Agradeo a eles principalmente pela construo do meu carter e da minha educao, e por
me ensinarem que dentre os maiores bens de um homem e de seu povo est sua cultura, e
que preserva-la e estimula-la antes de um dever, um direito inalienvel.
Agradeo carinhosamente s minhas amigas, Luise Malmaceda, Flvia Fogliato e Cristiana
Gotsis, por me acompanharem nesse despertar para para uma maturidade crtica e
psicolgica, e simplesmente por terem feito parte de alguns dos momentos mais
importantes que vivi, dentro e fora do percurso acadmico.
Muito obrigada a essa Universidade, que me conferiu autonomia no discernimento,
argumentao e defesa dos meus ideais.
Por ltimo, mas no menos importante, obrigada a minha orientadora Ana Albani de
Carvalho por todo o apoio, confiana e por ter sido uma incentivadora dessa minha vontade
de arte, me incentivando a continuar esse percurso, que com certeza ser longo e
gratificante.
5
No basta consumir Cultura: necessrio produzi-la. No basta gozar arte: necessrio ser artista! No basta produzir ideias: necessrio transforma-las em atos sociais, concretos e continuados. (Augusto Boal)
6
RESUMO
A presente pesquisa faz um estudo analtico do campo de atuao do produtor cultural na
cidade de Porto Alegre, avaliando qualitativamente o atual contexto profissional no qual a
figura do produtor est inserida. Para isso recorre-se a uma pesquisa bibliogrfica que traz
como base o surgimento desse novo agente do campo atravs da institucionalizao da
cultura em nosso pas e da criao de polticas de fomento via concesso de incentivos
fiscais e construo de fundos direcionados a atender as atividades culturais no Brasil. feita
tambm uma anlise do atual mercado cultural, abordando desde o segmento de compra e
venda de obras de arte como tambm o emprego de mo de obra advinda das atividades
culturais, bem como as especificidades de nossa regio. Por ltimo, faz-se um estudo do
percurso do produtor cultural na cena artstica de Porto Alegre desde a dcada de 1980,
atravs de entrevistas com diversos produtores atuantes no mercado cultural local. Essas
entrevistas foram utilizadas para dar embasamento a pesquisa mostrando a formao de
uma nova profisso no mercado e as carncias que ainda devero ser supridas para que o
mercado venha a se solidificar, atingindo gradativamente sua autonomia.
Palavras-chave: Produtor cultural, artes visuais, produo cultural, polticas culturais,
sistema das artes, projeto cultural;
7
ABSTRACT
This research is an analytical study of the cultural producer playing field in the city of Porto
Alegre, qualitatively evaluating the current professional context in which the role of the
producers is located. This research uses a literature review that brings the emergence of this
new field agent through the institutionalization of culture in our country and the
establishment of public policies promoted via tax incentives and public funds directed to
attend Brazilian cultural activities. It also made an analysis of the current cultural market,
addressing the segment from the purchase and sale of artworks, the employment of labor
arising from cultural activities and the specificities of our region as well. Finally, it is a study
of the route of the cultural producer in the art scene in Porto Alegre since the 1980s,
through interviews with several cultural producers working in the market. These interviews
were used to give foundation to this research showing the formation of a new profession
and the needs that have still to be fulfilled so that the market can solidify, gradually reaching
its autonomy.
Keywords: cultural producer, fine arts, cultural production, cultural policies, art system,
cultural project;
8
LISTA DE FIGURAS
Figura 01: Tabela de valores mximos de renncia do ICMS ..................................................44
Figura 02: Tabela de valores mximos a serem solicitados via LIC .........................................45
Figura 03: FUMPROARTE: Projetos aprovados por rea 1994 2008 (total 626) ...................50
Figura 04: Indicador de valores mdios reais de financiamento por projeto aprovado 1994 - 2008 (corrigido p/IGP-M).........................................................................................................52
Figura 05: Nmero de empresas, pessoal ocupado total e assalariado no Cadastro Central de Empresas no setor cultural Brasil 2003..............................................................................56
Figura 06: Nmero de empresas, pessoal ocupado total e assalariado, salrios e outras remuneraes no total das atividades e nas atividades do setor cultural Brasil 2003/2005......................................................................................................... .....................56
Figura 07: Nmero de empresas, pessoal ocupado total e assalariado, salrios e outras remuneraes no total das atividades e nas atividades do setor cultural, por faixas de pessoal ocupado Brasil 2003/2005.......................................................................................58
Figura 08: Nmero de empresas, mo-de-obra total e assalariada, salrios e outras remuneraes, tamanho mdio das empresas e salrios mdios mensais, no total das atividades e nas atividades do setor cultural Brasil 2005 ..................................................59
Figura 09: Nmero de projetos e valores apresentados, aprovados e captados por ano atravs de Lei Rouanet e FNC 1993/2013.............................................................................60
Figura 10: Relao entre o nmero de projetos apresentados, aprovados e captados por ano atravs de Lei Rouanet e FNC 1993/2013.............................................................................61
Figura 11: Relao do nmero de projetos captados por ano e rea cultural atravs da Lei Rouanet na modalidade mecenato 2003/2013....................................................................62
Figura 12: Relao dos valores captados por ano e rea cultural atravs da Lei Rouanet na modalidade mecenato 2003/2013........................................................................................63
Figura 13: Relao de valores captados por ano, UF atravs da Lei Rouanet na modalidade mecenato 2003/2013 (Detalhamento de valores captados no Rio Grande do Sul por ano, UF e rea cultural 2003/2013)..............................................................................................64
9
LISTA DE ABREVIAES
ACERGS Associao dos Ceramistas do Rio Grande do Sul...................................................49
AI-5 Ato Institucional n5 .....................................................................................................28
ANCINE Agncia Nacional de Cinema ..................................................................................37
BNDE Banco Nacional de Desenvolvimento Econmico.......................................................26
CAS Comisso de Avaliao e Seleo ..................................................................................49
CEMPRE Cadastro Central de Empresas ...............................................................................57
CEPAL Comisso Econmica para a Amrica Latina e Caribe................................................26
CFC Conselho Federal de Cultura .........................................................................................27
CLT Consolidao das Leis do Trabalho ................................................................................57
CNIC Comisso Nacional de Incentivo Cultura...................................................................38
DCDP Departamento de Censura e Diverses Pblicas........................................................28
ECA-USP/SP Escola de Comunicaes e Artes da Universidade de So Paulo......................49
FAC Fundo de Apoio Cultura .............................................................................................45
FBN Fundao Biblioteca Nacional.......................................................................................42
FCP Fundao Cultural Palmares......................................................................................... 42
FCRB Fundao Casa de Rui Barbosa....................................................................................42
FHC Fernando Henrique Cardoso .........................................................................................33
FICART Fundo de Investimento Cultural Artstico ................................................................38
FNC Fundo Nacional de Cultura ...........................................................................................38
FUMPROARTE Fundo Municipal de Apoio a Produo Artstica de Cultural.........................48
FUNARTE Fundao Nacional das Artes ...............................................................................30
GM General Motors .............................................................................................................26
IBGE Instituto Brasileiro de Geografia e Estatstica..............................................................22
IBRAM Instituto Brasileiro de Museus .................................................................................42
ICMS Imposto sobre Circulao de Mercadorias e Servios.................................................43
IPHAN Instituto do Patrimnio Histrico e Artstico Nacional..............................................30
JK Juscelino Kubitchek ..........................................................................................................26
MACRS Museu de Arte Contempornea do Rio Grande do Sul............................................13
MAM Museu de Arte Moderna ............................................................................................25
MARGS Museu de Arte do Rio Grande do Sul ......................................................................46
MASP Museu de Arte de So Paulo ......................................................................................24
MEC Ministrio da Educao e Cultura ................................................................................25
10
MEI Micro Empreendedor Individual ...................................................................................57
Mercosul Mercado Comum do Sul .......................................................................................13
MinC Ministrio da Cultura ..................................................................................................34
MP Medida Provisria ..........................................................................................................40
PAC Plano de Ao Cultural ..................................................................................................29
PR-CULTURA Sistema Estadual Unificado de Apoio e Fomento s Atividades Culturais do
Estado do Rio Grande do Sul ...................................................................................................43
PRONAC Programa Nacional de Apoio Cultura..................................................................38
PUCRS Pontfice Universidade Catlica do Rio Grande do Sul..............................................69
UFRGS Universidade Federal do Rio Grande do Sul .............................................................23
ULBRA/RS Universidade Luterana do Brasil Rio Grande do Sul............................................70
UNISINOS Universidade do Vale dos Sinos ...........................................................................69
11
SUMRIO
INTRODUO..........................................................................................................................13
1. ECONOMIA CRIATIVA NO BRASIL CONTEMPORNEO.....................................................18
1.1. Um breve histrico sobre a poltica cultural brasileira...................................................18
A poltica cultural na Era Vargas...................................................................................22
O golpe militar e a cultura miditica............................................................................26
Neoliberalismo como poltica cultural.........................................................................28
Gilberto Gil e o governo Lula........................................................................................34
1.2. Sobre as leis de incentivo a cultura para o campo das Artes Visuais.............................36
1.2.1. Mecanismos Federais...................................................................................................38
A Lei Rouanet e o Mecenato........................................................................................38
Fomento direto: FNC e FUNARTE.................................................................................41
1.2.2. Mecanismos Estaduais.................................................................................................43
A LIC (Lei de Incentivo a Cultura) .................................................................................43
FAC (Fundo de Apoio a Cultura)...................................................................................46
1.2.3. O municpio e o FUMPROARTE....................................................................................48
1.3. Artes Visuais como campo de trabalho rentvel............................................................54
2. O PRODUTOR CULTURAL...................................................................................................67
2.1. O surgimento de um profissional a partir de um novo campo de atuao...................69
CONSIDERAES FINAIS........................................................................................................90
BIBLIOGRAFIA.........................................................................................................................97
APNDICES.......................................................................................................... ..................102
CURRCULOS DAS ENTREVISTADAS......................................................................................103
Ded Ribeiro............................................................................................................ 103
12
Adriana Donato......................................................................................................103
Carolina Biberg.......................................................................................................103
Susana Gastal.........................................................................................................104
Marisa Veeck............................................................................................................34
QUESTIONRIOS BASE PARA ENTREVISTA.............................................................................90
Ded Ribeiro...........................................................................................................107
Adriana Donato......................................................................................................122
Carolina Biberg.......................................................................................................138
Susana Gastal e Marisa Veeck................................................................................145
13
INTRODUO
O interesse por este objeto de pesquisa advm do meu prprio processo de
formao profissional dentro do campo das Artes Visuais. Trabalho como produtora cultural
desde o ano de 2012, tendo iniciado meu percurso atravs de um projeto de exposio
desenvolvido a partir da disciplina de Laboratrio de Museografia, ministrada pela Prof. Ana
Albani de Carvalho neste Instituto. O projeto consistiu uma exposio elaborada com o
acervo do MACRS (Museu de Arte Contempornea do Rio Grande do Sul), onde ficamos
responsveis pela curadoria, expografia, e produo da mesma. Aps o encerramento da
disciplina eu e alguns colegas de turma fundamos o Coletivo Or:Be, um coletivo de produo
cultural que tem como principal objetivo auxiliar jovens artistas a encaminhar projetos e a
alavancar sua carreira no cenrio local, a partir de novas proposies em Artes Visuais que
integrem outras reas da cultura, ativando espaos e buscando novos pblicos. No ano de
2013 meus laos com a produo em artes visuais foram estreitados devido a minha
participao como assistente de produo na 9 Bienal do Mercosul. Tendo a produo
cultural como campo de trabalho e percebendo algumas dificuldades e oportunidades
oferecidas pelo mercado, o interesse pela atuao do produtor e ainda mais pelo seu
processo de formao como profissional, para mim muito latente, motivo pelo qual trago
esse como o tema de minha pesquisa de concluso de curso.
Esta monografia resultado de uma pesquisa que visa discutir os processos de
formao da profisso do produtor cultural inserido no campo da arte contempornea na
cidade de Porto Alegre (RS). Buscamos aqui compreender o papel desse profissional
14
especificamente no campo das artes visuais e como se deu a legitimao desse novo agente
da rea cultural. Assim, direcionamos os estudos para a compreenso do contexto histrico-
social que foi decisivo para seu surgimento, tendo como base a trajetria de diversos
produtores inseridos na cena cultural da cidade de Porto Alegre desde a dcada de 1980.
O primeiro captulo destina-se fundamentao terica do trabalho partindo do
pressuposto de que a partir do ps-guerra a cultura emergiu como uma das principais
ferramentas de marketing empresarial das grandes corporaes. Sob essa perspectiva,
identificamos os diversos processos formativos da profisso do produtor cultural, atravs de
um breve histrico das aes em poltica cultural no Brasil, discutindo o processo de
institucionalizao da cultura no pas, a criao de suas instituies e principalmente o
sistema de financiamento aos produtos culturais, baseado em leis de incentivo atravs das
isenes fiscais.
A implementao desse mesmo sistema abriu uma brecha para que o
empresariado brasileiro (e cabe aqui salientar, tanto em empresas nacionais como
multinacionais que mantm um brao de sua corporao instalado no pas) usasse o
marketing cultural, atrelando a sua marca aos produtos culturais por ela financiados, com o
objetivo de expandir a comunicao com seus clientes e aumentar o seu alcance no
territrio nacional, alm de usufruir da iseno fiscal1 propiciada pelas leis estaduais e
federais de incentivo cultura. Essas aes, que se deram principalmente a partir da dcada
de 1980, acarretaram na instaurao de um mercado cultural que opera a partir de
parmetros de consumo do capitalismo. Coube s classes artsticas a adaptao a esse novo
sistema de fazer arte, exigindo o surgimento desse novo profissional, o produtor,
responsvel por elaborar os projetos, vend-los iniciativa privada (real viabilizadora da
cultura na atualidade) e prestar contas para com o Governo, o rgo regularizador do
campo. Esse profissional, especializado na confeco de projetos e na busca por patrocnio,
apoio, se tornou essencial, uma vez que a maior parte das produes no competitiva o
1 Iseno fiscal - Dispensa legal do pagamento de um tributo, que pode ser extinta mediante lei ordinria.
Quando tratada na esfera cultural, refere-se a iseno de tributos a pessoas fsicas e jurdicas que invistam em projetos culturais previamente aprovados pelo Ministrio da Cultura e/ou Secretarias de Culturas dos Estados Federados e Municpios. Em nvel federal, a lei que prev iseno tributria a Lei Rouanet (LEI 8.313/91) que isenta o pagamento de at 4% de imposto de renda para pessoa jurdica e at 6% para pessoa fsica, desde que essas empresas atendam os requisitos previstos pela Lei.
15
suficiente para sobreviver apenas de sua receita direta e dependem de financiamentos por
parte de investidores (sejam esses, empresas, instituies ou Estado).
Para que esses projetos fossem inscritos e habilitados e aprovados, havia
necessidade de profissionais capacitados e com conhecimento tcnico tanto na rea da
cultura, como nas reas de administrao e marketing, pois no bastando aprovao junto
ao Governo, era necessria a captao atravs do setor privado. Para a maioria dos artistas e
produtores era necessrio inclusive contratao de um profissional que ficasse responsvel
pelo preenchimento de formulrios e planilhas, e que tambm acompanhasse o processo
(bastante burocrtico) junto s instncias reguladoras (Ministrio da Cultura). nesse
contexto que surge o profissional do produtor cultural, que encarregado por planejar,
orar, formatar, vender (quando o caso) e administrar todo o projeto cultural desde sua
concepo do projeto at a prestao de contas para com o governo e as empresas
patrocinadoras (se houver).
Alm de se configurar em um administrador de projetos culturais,
desenvolvendo-os desde sua pr-produo at a prestao de contas, o produtor ainda o
encarregado pela venda iniciativa privada, pela busca de verba para a execuo do mesmo,
e quando falamos em venda salientamos a importncia de aproximar essas duas lgicas
distintas, entre o artista da rea criativa e o empresrio da rea administrativo-financeira, o
produtor cultural atua no apenas como um gerente de projetos, mas tambm como um
negociador, um mediador entre esses dois campos.
Portanto imprescindvel que alm dos domnios da esfera cultural esse
profissional tenha noes administrativas e at mesmo jurdicas, uma vez que as inscries
se do atravs de editais, e que a compreenso dos mesmos um ponto chave para a
confeco de um projeto de sucesso. Conhecer o sistema politico-cultural e as formas de
financiamento de cultura em nosso pas fazem parte do trabalho do produtor, e estuda-las
aqui se faz necessrio para entender como se deu o processo de profissionalizao desse
agente.
Neste captulo discutiremos tambm em termos de mercado, como a cultura
pode ser um campo de trabalho rentvel. Atravs de ndices e informaes cedidas pelo
16
Ministrio da Cultura e Secretarias da Cultura do Estado e municpio, pretende-se aqui
analisar os reais investimentos realizados pelo Governo e pela iniciativa privada. Esse estudo
imprescindvel para que possamos delimitar perfis de produtos culturais bem aceitos no
mercado e indo mais alm, a partir desses dados, pensar no fomento s atividades que
tendem a no ter uma boa aceitao pela indstria cultural.
O segundo captulo pauta-se sobre o primeiro, focando especificamente no
surgimento da figura do produtor e nos processos formativos e institucionalizados dessa
nova carreira no campo da cultura e das artes visuais. Partindo da definio de
administrador cultural de Teixeira Coelho, define-se aqui a figura do produtor cultural, no
como autor propem o produtor como o artista, produtor do objeto cultural mas sim
como uma importante figura articuladora, mediadora entre o artista, o pblico, o Estado e o
empresariado cultural. Essa mudana de paradigma, referente ao conceito de produtor
cultural imprescindvel para essa pesquisa, uma vez que observamos que o produtor
cultural no mais aquele que produz cultura, mas sim aquele que produz dinheiro e
condies para a execuo das aes e bens culturais. Nessa nova formatao o amadorismo
da produo cultural cede espao ao profissionalismo empresarial exigido pelo mercado.
(DRIA, 2003, p.19)
A partir disso surgem aqui alguns questionamentos: como que se deu o
surgimento e o processo de profissionalizao desse novo agente? Quais as relaes que
podemos estabelecer entre o processo formativo desses agentes e sua consolidao
profissional? Qual a real importncia do produtor no mercado de arte contempornea
regional? Na tentativa de responder a esses questionamentos e de estabelecer um percurso
de profissionalizao desse novo agente, recorremos s tcnicas de pesquisa qualitativas,
atravs de entrevistas e relatos orais sobre o percurso profissional dos mesmos. Recorre-se a
essa abordagem uma vez que o discurso oral capaz de fornecer questes especficas para a
pesquisa, pois devemos considerar que o campo da gesto e produo cultural no Brasil,
ainda est em seu processo de construo e estruturao como campo profissional.
Para isso, foram colocados alguns nomes, que compem o material desse estudo
de caso: Denise Ribeiro, Susana Gastal, Adriana Donato, Marisa Veeck e Carolina Biberg. Os
profissionais foram escolhidos por diferentes motivos, desde que todos tivessem em seu
17
currculo projetos voltados para o campo das artes visuais. O primeiro critrio de escolha foi
o geracional, objetivou-se aqui coletar informaes sobre as experincias de produtores que
tiveram sua formao e atuao profissional em diferentes pocas, desde os anos 80 at
atualmente. Outro fator importante para compor os diferentes vieses do trabalho como
produtor foi escolher agentes que trabalhassem em diferentes instncias, desde a esfera
pblica at a privada, passando por produtores independentes. Para esse estudo, foi criado
um questionrio padro, porm flexvel, que foi alterado ao longo das entrevistas de acordo
com a relevncia das informaes dadas pelo profissional.
A partir dessas entrevistas objetiva-se aqui traar um panorama da
profissionalizao do produtor cultural na cidade de Porto Alegre, mostrando, atravs de
trechos desses relatos, fatos que comprovem as informaes at agora tidas como
proposies e hipteses dessa pesquisa.
18
1. ECONOMIA CRIATIVA NO BRASIL CONTEMPORNEO
Os prximos textos trataro do potencial econmico das atividades em artes
visuais em nosso pas e especificamente nossa regio. importante entretanto, falar sobre
as aes do Governo quanto s polticas pblicas de cultura, apresentando primeiramente
uma breve explanao histrica e trazendo posteriormente quais as atuais opes de
fomento e iniciativas na poltica cultural do pas. A presente pesquisa traz um levantamento
bibliogrfico a partir de autores como Coelho, Brant, Chau e Oliviere que trazem o conceito
de poltica cultural e as problemticas de uma prtica baseada em leis de incentivo atravs
de iseno fiscal. A pesquisa presente se pauta tambm sobre dados fornecidos pelo prprio
Ministrio da Cultura e Secretarias da Cultura do Estado e Municpio de Porto Alegre, onde
podemos observar os reais investimentos em cultura por parte do Estado e da iniciativa
privada. Apresentamos aqui os ndices de projetos aprovados, financiados e executados,
tendo assim uma noo da real representao do Rio Grande do Sul em termos de aes
culturais em nosso pas.
1.1. Um breve histrico sobre a poltica cultural brasileira
Cabe aqui, como ponto de partida, a definio do que se entende por polticas
culturais. De acordo com o especialista em polticas culturais Teixeira Coelho, poltica
cultural pode ser entendida como:
um programa de intervenes realizadas pelo Estado, instituies civis, entidades privadas ou grupos comunitrios com o objetivo de satisfazer as necessidades culturais da populao e promover o desenvolvimento de suas representaes simblicas. (COELHO, 1997, pg 292)
19
Sob esse aspecto, podemos dizer que as polticas culturais se configuram em um
conjunto de aes que objetivam fomentar e promover a produo, distribuio e o acesso
aos bens culturais, bem como a preservao do patrimnio histrico e o ordenamento do
aparelho burocrtico por elas responsvel. (COELHO, 1997, pg 292). Essas iniciativas podem
assumir forma a partir de normas jurdicas, como o caso do Estado, e intervenes diretas,
atravs dos agentes do campo da cultura e da iniciativa privada. Como modo de organizao
e estruturao do campo, a poltica cultural intenciona o estudo dos diversos modos de
promoo das aes culturais e a compreenso de seus significados nas diferentes
realidades em que se inserem. (COELHO, 1997)
O conceito de poltica cultural por muitas vezes acompanhado por uma
ideologia poltica. Se partirmos do pressuposto que os fenmenos culturais constituem uma
parte de um organismo vivo ao qual chamamos de sociedade, a noo de poltica cultural
tida como o conjunto de aes na ordem da cultura que tem como objetivo maior a
transformao social dos indivduos. Utopias a parte, a motivao mais antiga das polticas
culturais a da difuso da cultura, pautada sob o fato de existir um ncleo cultural positivo,
de importncia para uma sociedade, que deve ser compartilhado pelo maior nmero de
pessoas possvel, justamente por ser de interesse geral, esse ncleo deve receber amparo,
ser preservado e propagado atravs de aes planejadas e continuadas. (Ibidem , 1997)
De acordo com o autor, a legitimao dessas polticas culturais formatada a
partir de quatro arqutipos: o primeiro sugere as polticas a partir de uma lgica do bem-
estar social, onde sem elas, a dinmica social seria deficitria, e as aes culturais seriam
encaradas como uma complementao ao ser humano. No segundo arqutipo a poltica
cultural seria um orientador da dinmica social, assumindo a responsabilidade da procura de
uma identidade, seja ela tnica, religiosa, nacional, etc. O terceiro aponta a necessidade de
um enquadramento poltico-ideolgico, indispensvel no processo de (re)construo da
identidade cultural nacional. J o ltimo modelo se baseia na necessidade de uma prtica de
comunicao entre Estado e cidados, propiciando um dilogo entre instituies e pessoas
afim de que essas polticas sejam vistas e aderidas pela populao. Todos esses modelos
podem coexistir de maneira articulada em um mesmo plano de poltica cultural (COELHO,
1997, p.293). H ainda um quinto paradigma de legitimao em polticas culturais, no
20
tratado por Teixeira Coelho , mas que est diretamente ligado ao mercado neoliberal em si,
a viso de cultura como um bem de consumo, pautada sobre a cultura do uso, onde ela
consumida por aqueles que podem pagar por ela.
A partir desses preceitos, algumas consideraes sobre a evoluo das aes em
polticas culturais no podem ser ignoradas: no basta apenas a distribuio da alta cultura,
ou da cultura popular, necessrio garantir que mais cidados possam participar dos
processos culturais como criadores de bens e produtos culturais; o Estado contemporneo
passa a ter, cada vez mais, uma menor participao no campo cultural contemporneo,
abrindo mo de sua atividade como financiador da cultura e transferindo essa
responsabilidade aos poucos iniciativa privada, s indstrias culturais. (COELHO, 1997)
Ainda segundo Teixeira Coelho, tradicionalmente, quando nos referimos ao
objeto das polticas culturais, observamos trs possibilidades: o primeiro modelo de uma
poltica dirigida preservao, fomento e difuso de tradies culturais, ligadas s origens
do pas e identidade da nao, e aqui encontramos acervos histricos e afins e que tendem
a abarcar as manifestaes das classes populares. O segundo modelo pode ser denominado
de criacionista, e trata de polticas que visam o fomento a produo, distribuio, uso ou
consumo de novas obras e novos valores culturais. Esse modelo tende a priorizar as aes
culturais das elites, e poderiam ser denominadas inclusive de polticas de vanguarda. J o
modelo patrimonialista apesar de se configurar uma poltica de preservao, no tende a
ser popular, mas do contrrio, trata da preservao dos valores culturais eruditos,
patrimnios, etc. No obstante, devemos lembrar que uma ao eficiente em poltica
cultural, deve abarcar, ou pelo menos pretender, todos os modelos citados (Ibidem, p.295).
Para a autora Cristiane Olivieri, desenvolver uma poltica cultural investir em
aes de desenvolvimento que fomentem a produo, distribuio e acesso aos bens
culturais, e que considere a diversidade e multiplicidade cultural (OLIVIERI, 2004).
Justamente por isso uma poltica cultural no deve se resumir apenas em programas de
transferncia de renda e leis de incentivo fiscal, o conceito de polticas culturais envolve
muitos outros fatores, como assinala o autor Nestor Canclini no texto que segue:
21
Los estudios recientes tienden a incluir bajo este concepto al conjunto de intervenciones realizadas por el estado, las instituciones civiles y los grupos comunitarios organizados a fin de orientar el desarrollo simblico, satisfacer las necesidades culturales de la poblacin y obtener consenso para un tipo de orden o transformacin social. Pero esta manera de caracterizar el mbito de las polticas culturales necesita ser ampliada teniendo en cuenta el carcter transnacional de los procesos simblicos y materiales en la actualidad. (CANCLINI, 2005, P.74)
No Brasil, a relao entre Estado e Cultura pode ser identificada por diferentes
formas de atuao de rgos governamentais em diferentes contextos polticos, sociais e
econmicos. De acordo com Marilena Chau, existem quatro principais modalidades:
A modalidade liberal, que diferencias as artes liberais e servis, onde as
Belas Artes so tidas como privilgios de uma elite social que tem
acesso a um alto nvel de escolaridade e ao consumo de bens culturais;
Modalidade populista, que aposta na chamada cultura popular,
entendida como produes do povo (artesanato, folclore, entre outros),
priorizando a criao de uma indstria cultural.
O Estado totalitarista, que se coloca como produtor e regulador da
produo cultural da sociedade civil;
A neoliberal, onde a cultura tida como evento, glorificado pelos mass
media, que tende a privatizar as instituies pblicas deixando a gesto
da cultura a cargo de grandes empresrios. (CHAU, 2005)
De certa forma, se acompanharmos o desenvolvimento poltico cultural do Brasil,
podemos observar todos os estgios citados por Chau, onde o Estado passa, aos poucos, de
financiador, produtor e regulador para apoiador e facilitador das atividades culturais. Essa
nova configurao no cenrio cultural acaba por refletir em uma complexa redefinio dos
papis dos diferentes agentes do campo cultural. Os editais (de instituies pblicas e
privadas em diferentes nveis) e as leis de incentivo cultura passam a exigir maiores
necessidades administrativas nos projetos, e logo uma mudana de como os artistas e outros
profissionais do campo cultural encaram o seu trabalho.
A figura do produtor, que at a dcada de 1980 era praticamente inexistente,
comea a ganhar espao, assumindo uma grande importncia no contexto cultural
contemporneo. Este profissional passa de executor de aes culturais a um gerente de
22
projetos, encarregado de administrar o programa cultural desde sua concepo at a
prestao de contas, prevendo dentre essas etapas, a pr-produo, execuo, comunicao
e captao de recursos para que o mesmo possa ser realizado. Isso acarreta
consequentemente em uma elevao no nvel de profissionalizao do produtor, que deve
estar capacitado no somente para compreender o significado dessas aes simblicas de
uma sociedade, mas principalmente estar preparado para atuar no mbito de planejamento,
administrao e marketing, ficando sob sua responsabilidade o gerenciamento dos recursos
e do tempo de elaborao, execuo e avaliao do projeto.
Tendo esses preceitos intrnsecos na estruturao da poltica cultural brasileira e
posteriormente na estruturao do profissional de produo cultural, apesar das aes de
mecenatos ocorridas na poca do Imprio, (como por exemplo, a criao da Biblioteca
Nacional, da Escola Real de Cincias, Artes e Ofcios, a Misso Francesa e a concesso de
bolsas de estudos na Europa para artistas brasileiros), s podemos falar de uma poltica
pensada em termos de cultura e da estruturao e profissionalizao do campo cultural,
com a chegada de Getlio Vargas presidncia da Repblica na dcada de 1930.
Os tpicos a seguir tm por objetivo traar um panorama histrico da relao
Estado-Cultura no Brasil. Os dados apresentados se baseiam em pesquisa bibliogrfica de
autores como Brant, Miceli e Calabre, e tambm em informaes cedidas por rgos como
Ministrio da Cultura, e IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatstica).
A poltica cultural na Era Vargas
O regime varguista (1930 - 1945) concebeu e organizou a cultura com base nas
experincias dos regimes totalitaristas europeus, onde cultura era tida como um suporte
poltico, e controlada por rgos reguladores do Governo. O novo regime trouxe ao Brasil
um compromisso de industrializao e modernizao atravs de um governo nacional
centralizado politica e administrativamente.
Das investidas da Era Vargas, dois fatos marcantes inauguraram a criao de
polticas culturais em nosso pas: a passagem do literato Mrio de Andrade pela direo do
Departamento de Cultura da Prefeitura de So Paulo entre 1935 e 1938, e a criao do
Ministrio da Educao e Sade em 1930, em posse de Gustavo Capanema.
23
Mrio de Andrade foi responsvel, dentre outras medidas, por estabelecer uma
interveno por parte do Estado abrangendo diferentes reas culturais, abarcando
literatura, cinema, teatro, dentre outras formas de manifestao artsticas populares, incluir
ao que chamamos de patrimnio cultural no somente obras materiais, mas tambm aes
imateriais e intangveis, patrocinar misses as regies Norte e Nordeste do pas e englobar
suas aes e folclore ao patrimnio cultural brasileiro. Estes atos foram de grande
importncia para o incio da poltica cultural, por difundir a ideia que o folclore e as aes
simblicas populares das diferentes regies do Brasil, devem ser conservados e estimulados,
e que essas mesmas aes compem a identidade cultural de nossa nao. No obstante
devemos lembrar que Mario de Andrade foi um dos grandes artistas e intelectuais do
movimento modernista brasileiro na dcada de 1920, e que seu entendimento de uma
poltica cultural vem justamente ao com o ideal modernista da poca, enaltecendo a
brasilidade e a cultura a partir da miscigenao racial e cultural presente em nosso pas. De
acordo com Miceli:
O movimento modernista de 1922, com toda a sua complexidade e diferenciao ideolgica, representa um divisor de guas neste processo. Por um lado significa a reatualizao do Brasil em relao aos movimentos culturais e artsticos que ocorrem no exterior; por outro lado implica tambm em buscar nossas razes nacionais valorizando o que haveria de mais autntico no Brasil. (MICELI, 1984, p. 43)
Tendo a construo de uma identidade brasileira como principal objetivo, a
primeira medida adotada pela poltica cultural de Vargas foi a construo de instrumentos
institucionais voltados para o desenvolvimento da cultura nacional (BRANT, 2009, p.53),
valorizando o nacionalismo e a brasilidade. Dentre os rgos criados para pensar a formao
de uma cultura brasileira estavam: a Superintendncia de Educao Musical e Artstica;
Instituto Nacional de Cinema Educativo (1936); Servio de Radiodifuso Educativa (1936);
Servio do Patrimnio Histrico e Artstico Nacional (1937); Servio Nacional de Teatro
(1937); Instituto Nacional do Livro (1937) e o Conselho Nacional de Cultura (1938), dentre
outros.
No Rio Grande do Sul houve a criao da Universidade de Porto Alegre em 1934,
que seria a antecessora da atual Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS) e
24
tambm a criao da Escola de Belas Artes no ano de 19082, que posteriormente seria
anexada a UFRGS como Instituto de Artes. Ao final da dcada de 1930, o movimento
modernista j influenciava uma elite intelectual presente em nosso Estado, tendo sido
introduzido primeiramente na cidade de Porto Alegre atravs das ilustraes da Revista do
Globo, de grande circulao na poca (SIMON, 2003). A Revista, criada no ano de 1929,
manteve durante os seus anos de funcionamento oficinas de ilustraes com grandes nomes
da arte local como Ernest Zeuner, Edgar Koetz e Joo Fahrion, e foi um instrumento essencial
para o reconhecimento dessa elite intelectual rio-grandense. No obstante importante
lembrar que a Revista do Globo foi fundada com o grande amparo de Getlio Vargas na
poca deputado federal, tendo seu posicionamento editorial voltado para a o Rio Grande do
Sul. (NORONHA , 2008). Essa tentativa de estruturao da poltica cultural brasileira tinha
como principal objetivo inserir o governo estrategicamente no processo de
institucionalizao da presena do Estado na vida poltico-cultural do Brasil, apoiado pela
imprensa, em nveis local e nacional. (BRANT, 2009).
No perodo seguinte, entre ao final da dcada de 1940 e no decorrer da dcada
de 1950, podemos observar o aumento de incentivos por parte da iniciativa privada, uma
vez que o Estado enxugava seus gastos e investimentos devido II Guerra Mundial. A autora
Maria Eliezer Galvo nos relata que a ascenso da elite industrial paulistana e o crescimento
da cidade como polo industrial e econmico do pas acarretaram em um grande
desenvolvimento da cena cultural da regio Sudeste. Podemos observar a partir da a criao
de cinemas e de grandes colees de arte como a coleo do Museu de Arte de So Paulo
(MASP - 1947), e da organizao da primeira Bienal Internacional de Arte de So Paulo no
ano de 1951. (GALVO, 1981).
2 Fundado em 22 de abril de 1908, por iniciativa de um grupo de intelectuais e artistas liderados por Olinto de Oliveira, o chamado "Instituto de Bellas Artes" veio como um importante passo no processo civilizatrio do Rio GAande do Sul, propondo a criao de um campo artstico simblico autnomo no sul do pas. O projeto vinha principalmente com a ideia de compensar das deficincias culturais que vinham desde o Imprio. No ano de 1909, a Instituio abre o Conservatrio de Msica dirigido pelo prprio Olinto de Oliveira, e em 1910, funda a Escola de Artes dirigida por Libindo Ferrs. O Instituto de Bellas Artes viria no ano de 1934, juntamente com mais cinco cursos superiores a integrar a Universidade de Porto Alegre (UPA), tendo sido desvinculada da mesma no ano de 1939. Aps um difcil perodo e busca por legitimao, em 1941 os cursos de msica e artes plsticas foram reconhecidos em instncia federal, em 1962 o Instituto foi incorporado Universidade Federal do Rio Grande do Sul.
25
Sobre esse aspecto, imprescindvel ressaltar que essas e outras iniciativas no
campo da cultura na poca tinham como ponto em comum a iniciativa privada como
organizadora e incentivadora da produo e confeco de alguns dos mais importantes
acervos brasileiros de arte. Privados de recursos simblicos e sem vnculos institudos com as
elites da oligarquia brasileira de origem portuguesa, esses empresrios, em sua maioria de
descendncia italiana, providos de recursos econmicos e qualidades comerciais davam
sustentao a construo de uma nova sociedade moderna no Brasil. Em busca de capital
simblico e de sua passagem e legitimao na elite brasileira, industriais como Francisco
Matarazzo Sobrinho (Ciccillo Matarazzo) e Yolanda Penteado (sua esposa) se tornaram o
smbolo da elite paulistana e do mecenato da arte moderna brasileira3. Ciccillo Matarazzo e
Assis Chateaubriand se configuraram nos grandes mecenas da cultura, estando, a famlia
Matarazzo, por trs da criao da Companhia Cinematogrfica Vera Cruz (1951), do Museu
de Arte Moderna (MAM - 1948) e da Bienal de So Paulo (1951), e Chateaubriand
juntamente com Pietro Maria Barti, por trs da criao do Museu de Arte de So Paulo
(MASP - 1947). (GALVO, 1981)
Com a iniciativa privada voltada para sua prpria ascenso social e econmica
atravs da cultura, ao governo restaram poucas, mas fundamentais, investidas como a
criao do Ministrio da Educao e Cultura (MEC), no ano de 1953, e a Campanha de
Defesa do Folclore. Como o governo estava voltado a outras preocupaes ligadas a
modernizao do pas, e principalmente na dcada de 1950, ao desenvolvimento da regio
do cerrado brasileiro, atravs da construo da moderna Braslia, as instituies criadas por
esses grandes empresrios paulistanos foram declaradas de utilidade pblica e passaram a
receber incentivos do governo federal. Todavia esses investimentos eram eventuais, sem
continuidade, o que no poderia ser tido como a constituio de uma poltica de
financiamento e de manuteno de bens e instituies culturais (GALVO, 1981).
3Salientamos aqui que as aes desse empresariado composto basicamente por imigrantes foram
imprescindveis para o desenvolvimento da cidade de So Paulo, uma vez que a capital do pas na poca era o Rio de Janeiro. Devemos lembrar tambm que sem o apoio do governo provavelmente essas aes no teriam seguido em frente.
26
Apesar disso, na dcada de 1950 que vemos no Brasil o surgimento que
grandes aes em economia, poltica e cultura. O Plano de Metas 50 anos em 54, criado
pelo presidente Juscelino Kubitschek, abre contas de capital para atrair investimento
estrangeiro, mas mantem restries quanto importao de bens de consumo. O Plano de
Metas foi elaborado com base em diversos estudos realizados desde a dcada de 1940 por
comisses econmicas, dentre elas a Comisso Mista Brasil Estados Unidos, o Banco
Nacional de Desenvolvimento Econmico (BNDE) e a Comisso Econmica para a Amrica
Latina e Caribe (CEPAL). Essas comisses apontaram a necessidade de eliminar os gargalos
da economia brasileira, que seriam setores crticos em termos de funcionamento
econmico. O Plano de Metas traria a superao desses obstculos estruturais, atravs de
metas e estratgias de investimento para que o crescimento ocorresse em cadeia.
nessa poca que chegam em nosso pas grandes multinacionais, em especial,
da indstria automotiva como GM General Motors, Ford e Volkswagen. Os setores de
transporte, energia, siderurgia e refino de petrleo receberiam a maior parte dos
investimentos do governo. Os estmulos e subsdios seriam concedidos para expanso e
diversificao do setor secundrio, produzindo com uma grande intensidade equipamentos
e insumos. Alm dessas aes, temos no plano de metas a construo da cidade de Braslia,
smbolo de desenvolvimento e arquitetura moderna do pas. Com a transferncia da capital
do Rio de Janeiro para Braslia, JK pretendia desenvolver a regio central do pas e afastar o
centro das decises polticas de uma regio densamente povoada, separando o centro
poltico do centro econmico-cultural (eixo Rio-So Paulo).
4 O Plano de Metas foi consolidado a partir de um conjunto de 31 objetivos a serem alcanados por diversos
setores da economia, onde a 31 meta referia-se a construo de Braslia e a transferncia da capital federal. Observamos que atravs de seu projeto de governo, a ideologia desenvolvimentista pautada pela industrializao tornava-se a palavra de ordem e a promessa de superao da condio de subdesenvolvimento. Para tanto, priorizou-se o desenvolvimento industrial dos produtores do primeiro setor bens de capital e insumos industriais , assegurando o avano da indstria de bens durveis, tendo aqui a indstria automobilista como carro chefe. O Plano de Metas, apesar de apresentar uma certa continuidade nas aes de governo de Getlio Vargas, marcou uma mudana significativa de concepo se comparado com o Governo Getulista, de projeto nacionalista. No caso de JK, havia uma clara aceitao ao capital externo, tendo o capital nacional como um scio menor deste processo. Os setores de transporte, energia, petrolfero e siderurgico receberam a maior parte dos investimentos. Foram concedidos diversos estmulos e subsdios para a expanso do setor secundrio. Para a implementao do Plano ainda foram criados grupos executivos e colegiodos de representantes pblicos e privados voltados para a formulao de polticas aplicveis ao setor industrial. ENtre os anos de 1957 e 1961 o PIB teve um crescimento anual de 8,2%, superando a prpria estimativa do Plano. (VASCONCELOS, et. al, 1999)
27
Esse cenrio, reforado pela retomada econmica dos EUA no ps-guerra e,
principalmente no Brasil pela possibilidade de um planejamento econmico promissor,
difundia um esprito otimista de esperana, um novo modo de vida proporcionado pela
produo e consumo em massa a nvel domstico. Atravs disso vimos a mudana de
comportamento de toda a populao brasileira que via nos centros urbanos mais
possibilidades de trabalho e uma melhoria na qualidade de vida. Esse fato viria a mudar aos
poucos o perfil da populao brasileira, que passava por um perodo de transio entre o
modelo agrrio-exportador e a concretizao da sociedade urbano-industrial, pautada sobre
uma poltica desenvolvimentista e difundida pelos meios de comunicao de massa, tendo a
televiso como seu maior smbolo. (Disponvel em: http://cpdoc.fgv.br.)
Todo esse contexto otimista contagiava tambm o campo cultural, implicando no
surgimento de vrios movimentos no campo artstico. Novas maneiras de fazer e pensar o
cinema, a msica, as artes visuais, o teatro e a literatura. na dcada de 1950 que podemos
observar algumas das principais iniciativas nas artes visuais como o surgimento de dois
grandes movimentos de vanguarda da arte brasileira, o movimento concreto, diretamente
ligado cena artstica de So Paulo e o movimento neoconcreto nascido no Rio de Janeiro.
Os anos 50 foram de grande efervescncia, experimentalismo e liberdade artstica.
principalmente no final da dcada, com o movimento neoconcreto que podemos observar as
diversas apropriaes de manifestaes populares por parte desses grupos de artistas, e
consequentemente uma transformao de smbolos da identidade nacional, prevendo uma
mudana na dinmica cultural brasileira. (Ibidem)
O golpe militar e a cultura miditica
Podemos observar ao longo do perodo da ditadura (1964 1985) que a poltica
cultural demarcada de acordo com os trs momentos distintos do golpe. De 1964 a 1968 a
as aes e medidas polticas promovidas pelo regime militar so dirigidas principalmente s
classes populares. O governo de Castelo Branco (1964 - 1967) cria uma comisso direcionada
especialmente a apresentar sugestes para uma reformulao do plano cultural do pas.
Essa comisso, por sua vez, cria o Conselho Federal de Cultura (CFC) em 1967, ligado ao
MEC. O rgo fica responsabilizado pela criao de um Plano Nacional de Cultura e de
rgos estaduais e municipais. O regime passa a estimular as dinmicas de cultura
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midiatizada, como um estimulante passividade poltica-cultural por parte da populao.
Com isso, podemos acompanhar um grande investimento em aes que contemplem a
infraestrutura das telecomunicaes, a criao de empresas como Embratel e a
implementao de uma indstria cultural. importante ressaltar que esses meios de
comunicao eram controlados rigidamente pelo Governo, de acordo com uma poltica de
segurana nacional. (RUBIM, 2007)
O segundo perodo, datado de 1968 a 1974, que se configurou no mais brutal do
regime, atravs do Ato Institucional n55 (AI-5, vigorando at dezembro de 1978), foi
dominado pela represso e violncia, atravs de censuras sistemticas que barraram
qualquer dinmica cultural que no viesse de acordo com as prticas repressoras do
governo. Aps a promulgao do AI-5 todo e qualquer o veculo de comunicao passou a
ter sua pauta aprovada por agentes autorizados do Departamento de Censura e Diverses
Pblicas DCDP (que existia desde o ano de 1946). Alm da censura o Ato autorizava ao
presidente da repblica a decretar o recesso do Congresso Nacional, cassar mandatos
parlamentares, suspender os direitos polticos de qualquer cidado por at dez anos,
decretar confiscos de bens tidos como ilcitos e suspender habeas-corpus. No mesmo dia da
promulgao do Ato, foi decretado o recesso do Congresso Nacional por tempo
indeterminado, sendo reaberto apenas em 1969 para endossar a escolha do general Emlio
Garrastazu Mdici como presidente da Repblica.
5 Baixado em 13 de dezembro de 1968, pelo general-presidente Arthur da Costa e Silva, o Ato Inconstitucional n5 foi a expresso mais rgida da ditadura militar brasileira (1964-1985). Tendo vigorado at 1978, produziu uma srie e aes arbitrrias de impacto duradouro. Dentre as medidas impostas pelo Ato, estavam a possibilidade de dissoluo da Cmara dos Deputados e o Senado Federal, cassao de mandatos parlamentares em qualquer nvel, demisso, aposentadoria e cesso dos direitos polticos de qualquer cidado, alm da suspeno de habeas corpus, decreto de estado de stio e confisco bens. No bastando isso, o Poder Judicirio ficava proibido de apreciar a legalidade das decises baseadas no Ato. O AI-5 definiu o momento mais duro do regime militar, concedendo ao governo e seus agentes o poder de punir arbitrariamente qualquer pessoa que fosse considerada uma ameaa ao regime. Desde ento o movimento estudantil se tornou um smbolo de protesto dos jovens contra a poltica tradicional, evidenciando a urgncia de demanda por novas liberdades, fato expresso no jargo " proibido proibir". No decorrer do ano de 1968 a Igreja comeava a ter uma participao mais expressiva na defesa dos direitos humanos, e lideranas polticas cassadas continuavam a se associar visando o combate ditadura. A Frente Ampla, formada em 1967, que reunia Carlos Lacerda, Juscelino Kubitschek e Joo Goulart foi posta na ilegalidade em 1968. O perodo do AI-5 foi marcado por manifestaes de movimentos sociais e polticos adversos ao Regime. A greve de metalrgicos em Osasco tambm sinalizava o Governo Militar que medidas mais enrgicas deveriam ser tomadas, afim de controlar as manifestaes de descontentamento de qualquer ordem e um possvel golpe comunista. O Ato foi promulgado justamente para dar cobertura poltica conservadora da dcada de 1970 e tortura como poltica de Estado. O AI-5 s foi revogado no ano de 1978, pelo ento presidente Ernesto Geisel, que deu incio abertura poltica no pas. (DOMINGUES et. al, 2007)
29
Contudo, foi tambm nesse perodo, com a gesto do ministro Jarbas Passarinho
(1969-1973), a elaborao do Plano de Ao Cultural (PAC), em vigor nos anos de 1973 e
1974. O Plano se tratava de um programa de financiamento de eventos culturais. Segundo
Sergio Miceli:
O PAC, por sua vez, era no apenas uma abertura de crdito, financeiro e poltico, a algumas reas da produo oficial at ento praticamente desassistidas pelos demais rgos oficiais, mas tambm uma tentativa oficial de degelo em relao aos meios artsticos e intelectuais. (MICELI, 1984, p.55)
O PAC abrangia o setor de patrimnio, atividades artsticas e capacitao
profissional, tendo sido o marco inicial de uma srie de aes na rea cultural. O Plano teve
como objetivo a implementao de um calendrio ativo de eventos culturais financiados
pelo Estado, prevendo 118 aes culturais para dois anos, incluindo diversas apresentaes
teatrais, 46 espetculos na rea circense, 99 apresentaes folclricas, 212 projetos de
preservao do matrimnio histrico, 266 recitais de msica, 30 filmes e 45 projetos de
apoio para as artes visuais, com circulao por diversas regies do pas, ou seja, uma atuao
no campo da promoo e difuso de atividades artstico-culturais. O programa foi iniciado
basicamente com o intercmbio de diversos artistas pelo pas, como por exemplo, o Coral
Palestrina, um grupo de dez msicos do Rio Grande do Sul que foram se apresentar na
cidade de Recife, o Coral Ettore Bosio de Belm do Par que viajou at o Estado de Santa
Catarina, ou Procpio Ferreira, que levou Bahia seu espetculo teatral, o Monlogo das
Gargalhadas. Porm, apesar da tima perspectiva em termos de investimento, que subiu
uma margem de 150% no ano de 1972, passando de 12 para 30 milhes de cruzeiros, a
quantia ainda irrisria, o Plano comea desacreditado por alguns artistas, devido aos seus
gastos iniciais de divulgao: para sua inaugurao o Governo promoveu um evento onde
foram gastos 1,8 milho de cruzeiros dos 2 milhes reservados para o primeiro ms de vida
do Plano. (VEJA, 1973).
Apesar dos esforos do Conselho Federal de Cultura em seu plano de cultura,
onde era proposto inclusive a no participao da Polcia Federal na censura das atividades
artsticas, as polticas de cultura do regime militar que, de acordo com o governo, visavam o
fortalecimento da cultura brasileira, vinham na realidade difundir a cultura de massa,
domesticadora e reprodutora da ideologia oficial do Estado. Tratava-se muito mais de um
sistema de direcionamento e controle do processo cultural, tendo sua atuao como
30
neutralizadora das aes culturais tidas como subversivas, atravs da forte censura e exlio
de artistas que compunham a minoria contestadora ao regime. Paixo menciona que a
poltica cultural militar tinha como finalidade:
no apenas controlar o que deveria ser produzido como cultura oficial, mas adequar essa poltica de desenvolvimento aos novos valores trazidos com as transformaes do mundo capitalista, na tentativa de inserir o Brasil no crculo dos pases de primeiro mundo. (PAIXO, 2008. Disponvel em: . Acesso em: 15 abr. 2013 )
O importante aqui assinalar que as medidas tomadas pelo Estado se
constituram em grandes aes uma vez que continuadas. O terceiro perodo, a partir de
1974, foi caracterizado pela lenta e gradual abertura do regime, onde o Governo passa a
criar inmeras iniciativas na rea da cultura. em 1975, que surge o Plano Nacional de
Cultura, juntamente com a criao de instituies, o Centro Nacional de Referncia Cultural
(1975), o Conselho Nacional de Cinema (1976), o IPHAN (Instituto do Patrimnio Histrico e
Artstico Nacional) e a Fundao Pr-Memria (1979) e a Secretaria da Cultura do MEC
(1981). Outro movimento fundamental na composio da poltica cultural brasileira foi a
criao e desenvolvimento da Fundao Nacional da Arte (FUNARTE - 1975), a partir do
Plano de Ao Cultural. A Funarte comeou como uma agncia de financiamento de projetos
culturais, e gradualmente, foi se consolidando como um organismo de aes inovadoras na
rea da cultura, sendo composta por profissionais qualificados, originrios do prprio campo
cultural. Para Miceli foi importante destacar sobre as aes do Governo Geisel (1974 - 1979).
(...) inserir o domnio da cultura entre as metas da poltica de desenvolvimento social do governo Geisel. Foi a nica vez na histria republicana que o governo formalizou um conjunto de diretrizes para orientar suas atividades na rea da cultura, prevendo ainda modalidades de colaborao entre os rgos federais e de outros ministrios, como por exemplo o Arquivo Nacional do Ministrio da Justia e o Departamento Cultural do Ministrio das Relaes Exteriores, com secretarias estaduais e municipais de cultura, universidades, fundaes culturais e instituies privadas. (MICELI, 1984, p.57)
Apesar dos grandes avanos citados, podemos observar ainda a problemtica
tradio estabelecida entre a cultura e o regime totalitrio ao longo desses anos. A ditadura
foi, juntamente com o empresariado brasileiro, responsvel pelo ingresso da cultura
miditica de massa no Brasil, pautada em padres de mercado, pois era necessrio educar
esse novo mercado de trabalho e consumo, criando novos hbitos. Para isso, foram criados
31
diversos instrumentos que facilitavam o acesso ao mercado consumidor, como por exemplo,
a liberao de crdito e o desenvolvimento das tcnicas de promoo e publicidade.
Neoliberalismo como poltica cultural
Com o fim da ditadura, no incio da dcada de 1980, a criao iminente de um
rgo responsvel por incentivar, responder e legislar as aes culturais se fez indispensvel.
Foi ento que surgiu o Ministrio da Cultura, no ano de 1985, marcando o incio de um
regime democrtico, que gradativamente passou a encarar a cultura como parte intrnseca
ao desenvolvimento humano. Contudo, o perodo ps-ditadura foi marcado por intensa
instabilidade poltica e econmica, o que fez os investimentos em cultura oscilarem, at o
fechamento do Ministrio durante o perodo de governo do presidente Fernando Collor de
Melo (1990 - 1992).
A fase inicial de reconstruo da democracia compreende os governos de Jos
Sarney (1985 89), Fernando Collor de Melo (1990 92) e Itamar Franco (1992 94). O
perodo de implementao do Ministrio da Cultura marcado por um processo catico onde
foram nomeados nove ministros ao longo de nove anos, conferiu a esses governos um
quadro de instabilidade e principalmente descrdito quanto s polticas aplicadas.
Na tentativa de criar novas fontes de recursos para fomentar a produo cultural
foi promulgada, em 1986, a primeira lei de incentivos fiscais para o campo da cultura. A
chamada Lei Sarney, (lei n 7.505) intencionava disponibilizar verbas para o custeio de
atividades culturais, permitindo ao mercado selecionar quais aes culturais seriam
patrocinadas, e ainda ceder a essas instituies privadas benefcios fiscais. A lei tinha o
objetivo de impulsionar e principalmente compensar o campo cultural devido carncia de
recursos por parte da administrao pblica. Como boa parte do oramento estava
comprometida com os custos administrativos e operacionais dos Ministrios e seus rgos, o
aporte a rea da produo artstica diminua cada vez mais. A ineficincia das aes em
cultura por parte do Governo no possibilitou a criao de um fundo direcionado a cultura
que no sofresse com cortes e restries oramentrias. (CALABRE, 2005).
O quadro foi agravado em 1990 quando o Ministrio da Cultura foi extinto, sob o
governo do Presidente Fernando Collor. A situao ficou insustentvel, diversos projetos e
32
programas foram suspensos, inclusive a Lei Sarney, que j vinha apresentando alguns
problemas, sendo acusada de facilitar o desvio de verba pblica e a corrupo. No ano de
1991 o governo federal no efetuou nenhum investimento na rea cultural, o que fez com
que os estados e municpios repassassem parte de suas verbas para o investimento em
cultura. Em dezembro de 1991, foi promulgada a Lei n 8.313, que instituiu o Programa
Nacional de Apoio Cultura. A lei conhecida como Lei Rouanet, que retomava as aes da
Lei Sarney, se tornaria no carro chefe da poltica cultural brasileira contempornea,
consagrando o modelo neoliberal de cultura.
Com a posse de Itamar Franco, no ano de 1992, o Ministrio da Cultura e a
FUNARTE foram recriados. A partir de ento observamos uma mudana na poltica cultural
do pas, que passa de mantenedor da cultura a facilitador. Atravs do incentivo fiscal, o
governo federal pretende na realidade incentivar a participao da iniciativa privada no
fomento das atividades culturais. Se por um lado a nova configurao da poltica cultural
brasileira alivia as produes culturais do rgido controle do Estado, lana as mesmas lgica
cruel do mercado, onde produes no rentveis acabam sem incentivo.
A principal mudana aqui que no mais o Estado o regulador da produo de
atividades culturais no pas, pois o fato de o projeto ser aprovado pelo Ministrio da Cultura,
no significa que o mesmo ser realizado, ou que ter garantia de financiamento. Quem
escolhe o que ou no produzido em cultura o mercado. A iniciativa privada com o
objetivo de difundir a sua marca e projetar uma imagem positiva junto aos consumidores
potenciais, acaba por decidir o que ser de fato financiado em termos de cultura, porque
detm o poder de barganha e os recursos necessrios para a realizao desses projetos. Em
sntese, o governo federal disponibiliza (abdicando dos impostos) parte de sua verba que
ser administrada e aplicada pela iniciativa privada. Todo o capital investido pela empresa
patrocinadora na verdade dinheiro pblico, que gera um retorno em marketing para a
prpria empresa.
Foi a partir dessa lgica que as leis de incentivo foram construdas. J na Lei
Sarney o governo federal se caracterizava como uma espcie de apoiador que possibilitava o
abatimento do Imposto de Renda de at 100% do valor da doao, 80% para o patrocnio e
50% do investimento em organizaes autorizadas pelo governo. Mas foi sob a presidncia
33
de Fernando Henrique Cardoso, que vimos o novo modelo neoliberal de incentivo a cultura
ser aprimorado. Tendo em vista a incapacidade do Governo de propor uma reforma na
poltica cultural e em meio a um cenrio de instabilidade econmica devido a proposio de
um novo plano econmico para o pas, mais uma vez o setor cultural fica em segundo plano.
O Governo FHC acaba por seguir os moldes dos governos americano e ingls, de Ronald
Reagan e Margaret Thatcher respectivamente (WU, 2006). As leis de incentivo se tornaram
uma forma importante de marketing cultural, termo at ento praticamente desconhecido
pelos agentes do campo artstico brasileiro. A Lei Rouanet, apesar de ter sido promulgada no
ano de 1991 foi regulamentada apenas no ano de 1995 e juntamente com ela vigorava na
poca a Lei do Audiovisual, voltada mais especificamente para o cinema e que gozava de
maior porcentagem de incentivo. Devido a isso e presso das demais classes artsticas foi
aprovada a medida provisria que garantiu para algumas atividades (especialmente para o
campo das Artes Visuais), 100% de incentivo fiscal. (OLIVIERI, 2005).
Com isso, podemos observar que a poltica cultural implementada por FHC e seu
Ministro F. Weffort ao invs de democratizar a cultura, valorizar a diversidade e a liberdade
cultural e fomentar do desenvolvimento de produes artsticas no pas, acaba por se tornar
uma ferramenta de marketing cultural, beneficiando a iniciativa privada com a iseno fiscal.
O grande problema desse tipo de poltica adotada pelo Estado se torna o
clientelismo e a grande desigualdade em termos de fomento s produes nacionais. A
partir do momento em que o mercado passa a escolher quais projetos sero custeados e
realizados, d-se preferncia obviamente quelas aes que apresentam uma maior
visibilidade e consequentemente uma maior garantia de retorno do valor investido pelo
patrocinador. Esse fator ainda o responsvel pelo surgimento de diversas instituies
culturais ligadas s prprias empresas patrocinadoras, como por exemplo, o Ita Cultural
(So Paulo -1987), a Fundao Bienal do Mercosul (Porto Alegre - 1994) e o Santander
Cultural (Porto Alegre - 2001), entre outros. A cultura de massa miditica passa a ter os
maiores ndices de patrocnio, e um pequeno grupo de artistas e produtores, cerca de 3%,
em geral do sudeste do pas, conseguem o patrocnio de seus projetos, restando ao Estado
viabilizar e fomentar o restante das aes culturais no eleitas pelo mercado. (BRANT, 2004)
34
Gilberto Gil e o governo Lula
O impacto simblico do presidente Luiz Incio Lula da Silva no governo do Brasil
(2003 - 2010) foi to grande que foi preciso repensar o planejamento em cultura do Estado.
Para isso, o Presidente convida um nome respeitado da cultura nacional, que acaba
fortalecendo e viabilizando o seu projeto governista, nomeando no ano de 2003, para o
Ministrio da Cultura, o cantor e compositor Gilberto Gil. Contando com Gilberto Gil, e
posteriormente com Juca Ferreira (a partir de 2008) frente do Ministrio da Cultura, a
cultura passa a ser diretamente associada ao plano de reforma do projeto de
desenvolvimento brasileiro, que tinha como foco a poltica social e uma projeo e insero
externa do pas no cenrio poltico-econmico internacional.
Quero dizer a vocs que a cultura , por isso, uma das prioridades do nosso
governo. Elemento inigualvel de expresso e afirmao humana, tanto do
indivduo como dos grupos, a cultura nos singulariza como criaturas no universo.
Ao mesmo tempo, a cultura e a produo cultural devem ser tambm
encaradas como fatores de gerao de renda e emprego, de incluso social, de
cidadania, de crescimento individual e coletivo, e de insero soberana no processo
de globalizao. [...] Atravs do Ministrio da Cultura, procuramos criar as
condies necessrias no s para democratizar o acesso cultura, mas tambm
para garantir a mais ampla expresso cultural, tanto individual quanto coletiva. [...]
Tambm incorporamos uma viso ampla e transformadora de cultura, vista agora
no s como expresso simblica, mas como direito do cidado e fator de
desenvolvimento (LULA DA SILVA, 2012b, p. 2 3).
Gil traz outra postura para o Ministrio, definindo primeiramente trs dimenses
de ao do rgo, tendo cultura vista pelas seguintes prerrogativas: como direito e
cidadania, como usina de smbolos, e como economia. (BRANT, 2009). Surge ento o que
Brant chama de do-in antropolgico, a ideia de reposicionar o Estado frente diversidade e
multiplicidade da cultura popular contempornea do Brasil, alavancando assim uma
dimenso de desenvolvimento.
A primeira medida tomada em sua gesto foi a reforma do Ministrio da Cultura
(MinC), no ano de 2003, que apresentou uma nova compreenso sobre o papel da cultura no
desenvolvimento e as bases conceituais das polticas culturais do pas. No ano de 2006 o
Governo traz como ideia norteadora a proposio de que Se o desenvolvimento econmico
expressa o bem-estar material de uma nao, o desenvolvimento cultural que define a sua
35
qualidade (MINC, 2006, p.13). ento a partir dessa afirmao que o oramento do MinC
ampliado, duplicando de 2003 a 2006 (MinC, 2006), aumentando tambm sua rede e sua
capacidade de escuta.
O Ministro buscou descentralizar o Ministrio da Cultura, criando rgos de
representaes locais e regionais, que fossem capazes de atender as demandas dessa
sociedade construda a partir dessa multiplicidade cultural. O Plano Nacional de Cultura, por
exemplo, vem cada vez mais trazendo a discusso assuntos como a legislao dos direitos
autorais e o financiamento s artes. J o projeto Pontos de Cultura, ao prioritria dentre as
demais atividades criadas pelo Programa Cultura Viva (2004), apresentou j no ano de 2006,
mais de 300 representaes do MinC em reas de comunidades carentes consideradas de
risco social, apoiando iniciativas voltadas a jovens de baixa renda entre 17 e 29 anos. (GIL,
2010).
Nota-se aqui que o novo posicionamento adotado pelo MinC durante o
Ministrio de Gilberto Gil e Juca Ferreira se pauta no discurso sobre a mestiagem e o
carter antropofgico da cultura brasileira, porm agora vem aliado a uma abordagem
contempornea baseada na diversidade cultural.
O processo de constituio do Brasil e da sociedade brasileira caracteriza-se por um
conjunto de aspectos singulares em que se inscreve, com destaque, a mestiagem,
ou seja, a intensa mistura de genes, valores e signos, de mltiplas
procedncias. O impacto da mestiagem brasileira foi amplificado, ao longo de
nossa histria, por um modo peculiar de absorver influncias e transform-las em
algo prprio, muitas vezes novo, ou com forte tempero local, modo este que
ganhou o nome de antropofagia cultural. A mestiagem e a antropofagia cultural,
alimentados por constantes fluxos migratrios de pessoas e de ideias, produziram
aqui uma cultura potente e plural, com um grau de diversidade e renovao
comparvel ao de alguns poucos pases do planeta (GIL, 2010e, p.2).
O objetivo de fortalecimento do Ministrio da Cultura foi, atravs de seu
discurso e projetos, bem sucedido, porm na prtica restam algumas dvidas. O uso das Leis
de Incentivo aumentou, passando de uma mdia de R$ 300 milhes para R$ 1,2 bilho no
ano de 2007, enquanto os investimentos pblicos no acompanhavam na mesma proporo,
fazendo com que a Lei Rouanet fosse responsabilizada pela ineficincia da poltica cultural
do pas. (BRANT, 2009)
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Os sucessores de Gilberto Gil e Juca Ferreira no Ministrio da Cultura foram
respectivamente Ana de Hollanda, que teve uma conturbada gesto marcada por escndalos
e dvidas, e posteriormente Marta Suplicy. Dentre as ltimas aes do Ministrio de Marta
est o Vale Cultura, implementado em 2012, que consiste em um sistema de aporte
financeiro, onde os trabalhadores recebem mensalmente um vale de R$ 50,00, que deve ser
utilizado para o consumo de bens culturais. O benefcio foi concedido para 12 milhes de
trabalhadores, tendo sido disponibilizados cerca de R$ 7,2 bilhes j no seu primeiro ano de
criao, ou seja, mais que seis vezes o valor direcionado a Lei Rouanet.
O aprimoramento da poltica cultural brasileira de suma importncia para o
desenvolvimento do pas. As leis de incentivo fiscal e os programas de transferncia de
renda podem auxiliar no fomento e acesso a bens culturais que servem o mercado
neoliberal, mas no abarcam as manifestaes que no obedecem a lgica de consumo
capitalista. Portanto a ao do Estado como financiador e mantenedor de aes culturais de
cunho autoral, alternativas aos grandes circuitos mercadolgicos, imprescindvel. S assim,
com uma poltica cultural que integre tambm os pequenos produtores, veremos o
desenvolvimento da diversidade cultural brasileira, enriquecedora por excelncia, e capaz
sim de uma transformao social atravs de aes simblicas.
1.2. Sobre as leis de incentivo a cultura para o campo das Artes Visuais
Atualmente existem no Brasil diferentes plataformas de incentivo cultura,
sendo divididas de acordo com sua gesto: federal, estadual e municipal. Neste subcaptulo
sero apresentadas as principais leis que esto em vigncia, e quais suas especificaes para
o campo das Artes Visuais. imprescindvel ressaltar ainda que, a partir desse molde de
poltica cultural e da criao das leis de incentivo cultura, que observamos o gradual
surgimento da figura do produtor cultural, objeto de pesquisa desta monografia.
As leis que sero aqui abordadas tratam de um sistema de financiamento
cultura pautado principalmente sobre o apoio da iniciativa privada. A burocratizao para
conseguir a aprovao do Governo e financiamento das empresas fez com que fossem
criados diversos formulrios e modelos de apresentao de projetos culturais que
37
gradualmente tornaram mais complexa a tarefa de inscrio dos mesmos para pleito dos
mecanismos de fomento. Devemos atentar para o fato que, j no final da dcada de 1980, a
partir da aprovao da Lei Sarney, era necessrio que o responsvel pelo projeto fosse
inscrito como produtor cultural junto ao Ministrio da Cultura. Para o envio do mesmo, era
necessrio um planejamento que contemplasse todas as suas etapas de confeco, desde
sua pr-produo at a ps-produo e prestao de contas para com o Governo. Os editais
tambm exigiam a apresentao de um cronograma fluxo-oramentrio que especificaria
quais os profissionais envolvidos em cada etapa, o quanto seria destinado para cada um
desses prestadores de servios, e em qual etapa tal servio se faria necessrio. Os projetos
ainda deveriam apresentar objetivos gerais e especficos e uma contrapartida.
Atualmente os mecanismos de incentivo cultura se do em trs
instncias: federal, estadual e municipal. Os mecanismos federais como os conhecemos hoje
surgiram na dcada de 1990 e so compostos atualmente pela Lei Rouanet, Lei do
Audiovisual (especfica para o cinema, motivo pelo qual no trataremos da mesma na
presente pesquisa), e legislaes conexas. Para pleitear os incentivos cedidos pelo governo
federal, os rgos reguladores, Ministrio da Cultura e ANCINE (Agncia Nacional de
Cinema) colocam a disposio dos proponentes formulrios bastante especficos para a
apresentao de projetos culturais, que podem ser apresentados tanto por pessoa fsica
como pessoa jurdica, sendo necessria a apresentao de um currculo do proponente. O
primeiro papel do produtor cultural, nestes casos o de adequar o projeto s formataes
estipulada pelos editais desses rgos.
O Ministrio da Cultura (MinC), atual regularizador dos projetos culturais
propostos na instncia federal, composto por diversas secretarias, cada uma com objetivos
diferentes, so elas: Secretaria de Polticas Culturais, Secretaria de Programas e Projetos
Culturais, Secretaria de Articulao Institucional, Secretaria do Audiovisual, Secretaria da
Identidade e da Diversidade Cultural e Secretaria de Fomento e Incentivo Cultura, alm de
sua Secretaria Executiva. A secretaria responsvel pela regularizao de projetos culturais
incentivados a Secretaria de Fomento e Incentivo Cultura e Secretaria do Audiovisual,
ambas tem como funo a avaliao e aprovao das propostas que pleiteiam incentivo
fiscal. (Disponvel em http:// http://www.cultura.gov.br/)
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1.2.1. Mecanismos Federais
A Lei Rouanet e o Mecenato
Em 1995, tendo sido regulamentada a Lei n 8.313, foi institudo o
Programa Nacional de Apoio Cultura (PRONAC). Esse por sua vez sancionou a concesso do
incentivo fiscal, atravs de imposto de renda, queles que custeassem projetos culturais
previamente aprovados pelo Ministrio da Cultura. Atravs desse incentivo, dado a partir do
patrocnio ou doao de recursos que tornassem possveis a execuo dessas aes, ficou
estabelecida a modalidade do mecenato.
Adjunto ao PRONAC foram criados tambm o Fundo Nacional de Cultura
(FNC) e o Fundo de Investimento Cultural Artstico (FICART). Ao Fundo Nacional de Cultura
ficou a responsabilidade de garantir a realizao dos projetos culturais mercadologicamente
pouco atraentes, ou seja, aqueles que no teriam grande abrangncia ou alto nvel de
popularidade e acabariam assim por no conseguir o apoio da iniciativa privada. J o FICART
foi pensado para financiar projetos com amplo retorno comercial atravs da construo de
fundos de investimento em cultura com iseno do imposto de renda para operaes de
crdito, cmbio e seguro, sendo administrado pela Comisso de Valores Mobilirios.
Entretanto no saiu do papel, j que nunca for de fato operacionalizado. (FICART. Disponvel
em: http://www.receita.fazenda.gov.br , acesso em 21 abr. 2013)
Para a Lei Rouanet, o incentivo fiscal s aprovado aps um processo de
avaliao pela CNIC (Comisso Nacional de Incentivo Cultura), rgo pertencente ao
Ministrio que aprova e regulamenta quais propostas estaro aptas a utilizar o incentivo. Os
projetos culturais que tem o direito ao benefcio fiscal devem ser relativos s reas de:
teatro, dana, circo, pera, mmica e congneres, produo de cinema, vdeo, fotografia e
discografia, literatura, msica, artes visuais e grficas, gravuras, cartazes, filatelia, folclore e
artesanato, patrimnio cultural, rdio e televiso educativa que contemplem a rea cultural
e de carter no comercial e cultura negra e indgena. A partir de janeiro do exerccio de
2012, de acordo com o artigo 31-A, a msica gospel e atividades a ela correlatas tambm
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passam a gozar do direito do benefcio de iseno fiscal, desde que no sejam promovidas
por Igrejas6.
Alm dessas categorias, h outros segmentos em quais os projetos
culturais podero estar circunscritos, so eles:
Incentivo a formao artstica e cultural - atravs de concesso de
bolsas de estudos, pesquisa e trabalho para artistas e tcnicos,
concesso de prmios a artistas e criadores, instalao e
manuteno de recursos de carter cultural destinados a formao
do pessoal do campo cultural;
Fomento a produo cultural e artstica atravs de produo de
discos e filmes, edio de obras relativas s cincias humanas, letras
e artes, exposies, festivais e espetculos artsticos;
Preservao e difuso do patrimnio cultural e histrico mediante
construo, manuteno e ampliao de acervo e equipamentos de
museus, bibliotecas e arquivos de organizaes culturais,
conservao e restaurao de patrimnio e obras de arte e
proteo ao folclore, artesanato e tradies populares;
Estmulo ao conhecimento de bens culturais atravs de
distribuio gratuita e pblica de ingressos para espetculos,
estudos e pesquisa na rea cultural, repasse de recursos para as
fundaes culturais;
Apoio a outras atividades culturais mediante realizao de
misses culturais no pas e exterior, contratao de servios para
elaborao de projetos culturais, e aes previstas e relevantes
para o Ministrio da cultura. (Disponvel em
http://www.planalto.gov.br)
6 importante ressaltar porm que a maior parte das atividades em msica gospel esto diretamente
relacionadas s instituies de Igrejas Evanglicas, e que esse mesmo grupo tem ocupado posies bastante importantes nas bancadas polticas de nosso pas, tendo uma representatividade bastante significativa no Congresso Nacional por exemplo.
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Como j citado a Lei Rouanet possui trs mecanismos especficos de apoio
s atividades culturais: Mecenato, FNC e FICART. Nos pargrafos seguintes, veremos como
funciona cada uma dessas instncias de legitimao de projetos e quais as suas
especificidades quanto a legislao, porcentagem de incentivo:
No caso do mecenato, a legislao prev duas formas de aplicao da
verba a ser destinada ao projeto: patrocnio e doao.
Por patrocnio entende-se a:
(...) transferncia gratuita de recursos, em carter definitivo, pessoa fsica ou jurdica de natureza cultural, proponentes com ou sem fins lucrativos, de numerrio para a realizao de projetos culturais com finalidade promocional e institucional ou publicidade. (Artigo 3, inciso IX, letra a do Decreto n1.494/91. Disponvel em: . Acesso em 04 mai. 2013.)
No patrocnio o investimento est diretamente ligado s aes de
marketing da empresa patrocinadora, o que denominamos de marketing cultural. Neste
caso, aceito que at 20% do valor do projeto seja direcionado divulgao do mesmo, e
at 30% do valor do projeto podem ser deduzidos do imposto da empresa patrocinadora. J
no caso de atividades previstas pela Medida Provisria n 2.229-1, e aqui est includa a
circulao de exposies de artes visuais, passam a ter 100% de incentivo fiscal, porm as
empresas que patrocinarem atividades elencadas a MP citada acima, no podero lanar o
total montante investido no projeto como despesas operacionais (que entrariam como
despesas e custos em sua prestao de contas anual para com a Receita). Cabe ressaltar
tambm que a utilizao do valor incentivado tem o limite de desconto de at 4% do
importe devido em cada ano fiscal, a ttulo de imposto de renda para pessoa jurdica, e 6%
para pessoa fsica. Esse fato acaba muitas vezes por limitar o rol de empresas
potencialmente apoiadoras. Empresas que tem dvidas ou quaisquer pendncias financeiras
para com a Unio, no podem usufruir do benefcio de iseno fiscal. (OLIVIERI, 2004)
J no caso da doao a transferncia de recursos deve ser
obrigatoriamente sem fins lucrativos e sem finalidade promocional direta. Para as atividades
includas na MP 2.229-1 (o caso das atividades em artes visuais) seguem os 100% de
incentivo atravs da iseno fiscal. Na modalidade de doao, gastos com mdia para a
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divulgao no podem ser includos. O que geralmente ocorre que empresas acabam por
escolher a forma de patrocnio uma vez que tem interesse na promoo das aes de
marketing da mesma, j a pessoa fsica tenda e escolher a modalidade de doao permitindo
um maior desconto em seu imposto de renda.
Fomento Direto: FNC e a FUNARTE
O FNC (Fundo Nacional da Cultura), diferentemente da Lei Rouanet, na
qual o incentivo indireto par