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A QUESTÃO DOS MANANCIAIS NO GRANDE ABC Uma Análise da Gestão do Partido dos Trabalhadores em São Bernardo do Campo (1989-1992) Maurício Waldman (*) (*): Maurício Waldman é mestre em Antropologia e doutorando em Geografia pela USP. Atuou como membro da Coordenação da Campanha Viva a Billings Viva, no início dos anos noventa, em defesa dos mananciais da região do ABC na RMGSP. Representou o Comitê de Apoio aos Povos da Floresta no Encontro paralelo da ECO-92. Foi Coordenador de Meio Ambiente no município de São Bernardo do Campo (SP) no período 1991/1992. Autor de Oito Críticas Ecológicas à Conversão da Dívida, in Conversão da Dívida e Meio Ambiente (Cedi/Global, 1991), Ecologia e Lutas Sociais no Brasil (Contexto, 1992), Brava Gente de Timor (em parceria com o Professor Carlos Serrano, Xamã, 1997) e do Guia Ecológico Doméstico (em parceria com Dan Moche Schneider, Contexto, 2000). Resumo: Trabalho final, elaborado em 1994 para o Curso Planejamento Governamental: Crítica de uma Prática Social, ministrado em nível de pós- graduação pela Professora Ana Marangoni, do Departamento de Geografia da FFLCH-USP. Este paper foi posteriormente atualizado, constituindo matriz para apresentação de comunicação a respeito da questão dos mananciais na Grande São Paulo no Encontro Nacional da ANPEGE , Associação Nacional de Pesquisa e Pós-Graduação em Geografia, na FFLCH-USP, entre 23 e 26 de Março de 2002. Foi também requisitado como referência para apresentação no XIIIº Encontro Nacional de Geógrafos, em João Pessoa, Paraíba, entre 21 e 25 de Julho de 2002. É liberada a divulgação deste material, desde que mencionados o autor e a fonte. e-mail : [email protected] “A origem de todo o oportunismo reside precisamente no fato de se partir dos efeitos e não das causas, das partes e não do todo, dos sintomas e não da própria coisa; no fato de se ver, no interesse particular e na sua satisfação, não um meio de educar com vistas na luta final, cujo resultado depende da medida em que a consciência psicológica se aproxima da consciência adjudicada, mas qualquer coisa de precioso em si ou, pelo menos, qualquer coisa que, em si mesma, seria um passo na direção do objetivo; Numa palavra, consiste em confundir o estado de consciência psicológica efetiva do proletariado com a consciência de classe do proletariado”. Georg Lukács, História e Consciência de Classe .

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A QUESTÃO DOS MANANCIAIS NO GRANDE ABCUma Análise da Gestão do Partido dos Trabalhadores em

São Bernardo do Campo (1989-1992)

Maurício Waldman (*)

(*): Maurício Waldman é mestre em Antropologia e doutorando em Geografia pelaUSP. Atuou como membro da Coordenação da Campanha Viva a Billings Viva, noinício dos anos noventa, em defesa dos mananciais da região do ABC na RMGSP.Representou o Comitê de Apoio aos Povos da Floresta no Encontro paralelo daECO-92. Foi Coordenador de Meio Ambiente no município de São Bernardo doCampo (SP) no período 1991/1992. Autor de Oito Críticas Ecológicas à Conversãoda Dívida, in Conversão da Dívida e Meio Ambiente (Cedi/Global, 1991), Ecologia eLutas Sociais no Brasil (Contexto, 1992), Brava Gente de Timor (em parceria com oProfessor Carlos Serrano, Xamã, 1997) e do Guia Ecológico Doméstico (em parceriacom Dan Moche Schneider, Contexto, 2000).

Resumo: Trabalho final, elaborado em 1994 para o Curso PlanejamentoGovernamental: Crítica de uma Prática Social, ministrado em nível de pós-graduação pela Professora Ana Marangoni, do Departamento de Geografia daFFLCH-USP. Este paper foi posteriormente atualizado, constituindo matriz paraapresentação de comunicação a respeito da questão dos mananciais na GrandeSão Paulo no Encontro Nacional da ANPEGE, Associação Nacional de Pesquisa ePós-Graduação em Geografia, na FFLCH-USP, entre 23 e 26 de Março de 2002. Foitambém requisitado como referência para apresentação no XIIIº Encontro Nacionalde Geógrafos, em João Pessoa, Paraíba, entre 21 e 25 de Julho de 2002.

É liberada a divulgação deste material, desde que mencionados o autor e a fonte.

e-mail : [email protected]

“A origem de todo o oportunismo reside precisamente no fato de separtir dos efeitos e não das causas, das partes e não do todo, dos sintomas enão da própria coisa; no fato de se ver, no interesse particular e na suasatisfação, não um meio de educar com vistas na luta final, cujo resultadodepende da medida em que a consciência psicológica se aproxima daconsciência adjudicada, mas qualquer coisa de precioso em si ou, pelomenos, qualquer coisa que, em si mesma, seria um passo na direção doobjetivo; Numa palavra, consiste em confundir o estado de consciênciapsicológica efetiva do proletariado com a consciência de classe doproletariado”.

Georg Lukács, História e Consciência de Classe.

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INTRODUÇÃO

Este ensaio estará voltado para a discussão de uma problemática queenvolve, simultaneamente, diversas variáveis, dentre elas a questão dosmovimentos sociais, da preservação ambiental e o papel do poder público.Também estará preocupado com os limites da política frente à questãoambiental, no caso envolvendo a Administração Democrática e Popular (ouseja, do Partido dos Trabalhadores) de São Bernardo do Campo,compreendendo a gestão do Prefeito Maurício Soares (1988/1992).

Necessariamente, com estes dados explicitamente colocados, esteensaio terá em seu cerne a complexa questão da depredação dos mananciaisda Represa Billings, um vasto reservatório de águas doces cuja degradaçãotem sido motivada por uma ocupação desordenada consorciada àespeculação imobiliária. O pano de fundo deste debate é, portanto, a profundacrise sócio-ambiental que atinge não só o Brasil, mas o conjunto dos paísespobres, subdesenvolvidos, dependentes ou como prefere determinadaterminologia, do TRICONT, e isto, particularmente no referente aoagigantamento das suas áreas urbanas (1). Constituindo um debateextremamente polêmico, ele é, no entanto, de crucial importância para onosso momento histórico, em que a formação sócio-espacial brasileiradebate-se quanto às alternativas colocadas frente à crise que ela mesmavivencia.

Tendo exercido, entre Março de 1991 e Julho de 1992 o cargo deCoordenador do Meio Ambiente de São Bernardo do Campo, minha inserçãoinstitucional trouxe-me diversos subsídios, sem os quais não poderia estaratrevendo-me em desenvolver um tema tão complexo como é o relativo aodos mananciais da Região Metropolitana da Grande São Paulo (RMGSP).Mais ainda ofereceu-me a possibilidade de vivenciar diretamente a dramáticasituação que envolve a manutenção dos ciclos dinâmicos da Represa Billings.Muito mais que acompanhar o noticiário ou as denúncias encaminhadas pelomovimento ambientalista, é fundamental estar presente e atuante emquestões que como a da Billings, abrem um amplo leque de interlocutores ede atores sociais, no mais das vezes, em oposição ou em conflito potencialentre si.

Mas, antes ainda de iniciar a discussão a qual estamos nos propondo,gostaria de sublinhar alguns elementos pertinentes ao nosso tema, que sãofundamentais para desenharmos um cenário geral da narrativa. São eles:

1. Caberia recordar algumas das particularidades que fazem da águaum artigo verdadeiramente indispensável para a vida humana, justificando aprioridade colocada em termos de sua preservação. De pronto, podemosdestacar que a água perfaz nove décimos do volume total do corpo humano ecerca de dois terços de seu peso médio. Sem ela, não seria possível

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compreender a irupção da vida, humana ou não-humana, e tampouco, dasgrandes civilizações do passado, cujas realizações estiveram, mormenteenvolvidas com a gestão dos recursos hídricos, como foi em especial o casodos Estados cuja base material foi o Modo de Produção Asiático ou Tributário.

Apesar da importância inegável da água para a manutenção dos ciclosde vida das sociedades, apenas uma restrita fração da massa liquida doPlaneta é própria para consumo humano. Embora difusamente presente naTerra - a ponto tal que poderíamos tranqüilamente, e com muito mais justiça,rebatizá-la de Planeta Água - cerca de 97,4% das águas do planeta sãoimpróprias para consumo humano direto, correspondendo aos oceanos,mares e lagos salgados. Além disso, 1,8% está virtualmente inacessível,constituindo a água sob a forma do gelo encarcerado nas calotas polares.Deste modo, unicamente 0,8% do suprimento mundial apresentariam aquelespré-requisitos limnológicos indissociáveis da potabilidade: a água como umlíquido puro, insípido, inodoro e incolor.

O acesso às águas doces em grau adequado de pureza, em si mesmodificultado pela exigüidade do recurso, é agravado pelo fato destas estaremirregularmente distribuídas junto ao meio natural. Em algumas regiões, comoos Desertos e áreas semi-áridas, sua escassez é notória, ao passo que emoutras, como as florestas pluviais, ela é abundante como em nenhuma outrapaisagem natural. Em termos da sua disponibilidade, poucos países, dentreeles o Brasil, o Zaire, o Canadá, a Papua Nova Guiné, os Estados Unidos e aFederação Russa, estão agraciados, pelo menos por ora, da posse de umrecurso verdadeiramente estratégico, fator de estabilidade social interna e dabalança de poder na arena internacional. Todas as avaliações sinalizam quedo ponto de vista geopolítico, estará reservado importante papel aos recursoshídricos no futuro.

2. A questão do abastecimento de água foi violentamente agravada pelocrescimento desmesurado das cidades nos últimos decênios. As metrópolesgeralmente não dispõem de recursos hídricos nas suas proximidades. Parasatisfazer as necessidades das indústrias e do consumo doméstico, o meiourbano é levado à implantação de portentosos sistemas artificiais de captaçãoe de distribuição do precioso líquido, muitas vezes em detrimento das regiõessituadas mais adiante. Esta realidade é particularmente verdadeira para asgrandes cidades dos países do Terceiro mundo. Mais do que em quaisqueroutros, nestes países as áreas urbanas acolheram, numa escala semprecedentes, milhões de humanos oriundos das áreas rurais, um êxodo quecom especificidades regionais ou nacionais, é explicado por uma"modernização" da agricultura dispendiosa em recursos e poupadora de mão-de-obra (2).

Sem que na assertiva resida qualquer alarmismo, reserva-nos no futuroum possível esgotamento dos recursos hídricos, uma situação tecnicamente

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definida como stress hídrico, conclusão esta respaldada por diversasavaliações. Por conseguinte, a reivindicação pela preservação dosmananciais de águas doces terminou conquistando o apoio de parcelasconsideráveis da opinião pública. As ações administrativo-governamentais,seguindo uma mesma senda, passaram em muitos casos a pautar a questãode proteger mais rigidamente estas reservas, ampliando a abrangência dalegislação e aprofundando a fiscalização. Dado importante que justifica estacrescente preocupação com a preservação, é que muitos dos resíduos ouefluentes modernos provocam uma poluição praticamente irreversível por nãoserem triados pela tecnologia disponível de purificação (3).

Não sem razão, a disponibilidade e o acesso eqüitativo à água potáveltornou-se uma prioridade indiscutível. Conforme foi consignado no Preâmbulodo Tratado de Água Doce, do Fórum Global do ECO-92, o usufruto da águapotável se constitui num direito fundamental à qualidade de vida.

3. Os mananciais correspondem a uma terminologia adotada paradesignar aquelas áreas destinadas à produção de água (4). O termo, nãomais identifica exclusivamente os depósitos naturais do líquido que repousamsobre rochas impermeáveis, mas sim toda e qualquer obra - natural ou social -incorporada aos sistemas urbanos de abastecimento. Dependentes agora deuma complexa rede artificial para o atendimento das demandas de águapotável, os humanos, em face de uma escassez quantitativa e qualitativa doproduto-água, foram levados a uma valorização de todo e qualquer bancodisponível no espaço geográfico, um claro sinal do aprofundamento do que seconvencionou denominar de humanização da Natureza.

Em conformidade com o já explanado no item anterior, esta valorização,corriqueira nos países centrais já há algumas décadas, foi incorporada napauta institucional das administrações dos países periféricos. Na Índia, noMéxico, na Venezuela, na Argentina, na Nigéria e no Brasil, todos eles paísesdo Tricont, em razão do crescimento de metrópoles como Calcutá, Cidade doMéxico, Caracas, Buenos Aires, Lagos e São Paulo, os níveis de gravidadequanto à disponibilidade dos recursos hídricos foram exaltados pelo próprioacentuamento das taxas de crescimento urbano.

Mas não unicamente. Para além deste processo de urbanizaçãoabsolutamente desenfreado, inédito na história da demografia, adisponibilidade de águas doces foi afetada pela contaminação resultante deum caudal composto por centenas de produtos tóxicos, químicos eradioativos, degradação esta auxiliada por legislações ambientais mais"tolerantes" ou simplesmente pela não aplicação das leis porventuraexistentes. Além da poluição deve-se considerar, no que é mais pertinenteaos limites deste ensaio, a pressão incessante do crescimento ditodesordenado.

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Apesar de sua inegável importância, a área dos mananciais tem sidosistematicamente agredida pelo avanço da urbanização desordenada,informal, clandestina ou perversa. Ela está consubstanciada nas favelas,callampas, bidonvilles e numa rica variedade de designações que em comum,nominam a caricatura da cidade (SANTOS, 1981). Praticamente não háqualquer cidade do Hemisfério Sul, desde que detentora de algumaimportância para as redes urbanas, que esteja isenta da manifestação desteautêntico desdobramento da Torção do Tempo-Espaço.

A interpenetração destes três componentes, ou seja, do enunciado daágua enquanto artigo prioritário, de sua crescente escassez e a eventualcontradição entre as diretrizes visando sua preservação e a pressão exercidasobre este recurso por uma imensa massa de excluídos, e isto, em um quadrode crise sócio ambiental, foi o mais sério desafio colocado para aAdministração Democrática e Popular de São Bernardo do Campo(1988/1992).

Este desafio, motivador de desdobramentos em diferentes níveis,materializava-se em nível municipal de uma forma muito mais acentuada doque em qualquer outro município da região, em vista de uma conjugação defatores de índole diversa, mas que em comum exaltavam a importância destadiscussão para a administração.

Neste sentido, poderíamos elencar, no tocante a São Bernardo doCampo, os seguintes dados de interesse:

1. Situado na Região Metropolitana da Grande São Paulo (RMGSP) oumais exatamente, no Grande ABC, São Bernardo do Campo é de longe omunicípio com maior dinamismo econômico e o mais populoso dos sete quecompõem a sub-região em que está situado (5). Sua pujança econômica,evidente quando recordamos que o município constitui a segundaarrecadação em ICM (Imposto sobre Circulação de Mercadorias) do Estadode São Paulo), deve-se à indústria automobilística, criada durante a décadade cinqüenta no Governo do Presidente Juscelino Kubitscheck de Oliveira.Com a industrialização, começa a decolagem econômica da cidade, quepassa a ser conhecida como Detroit Brasileira. A concentração de um enormecontingente operário em sua área urbana foi a base que propiciou a eclosãode um forte movimento sindical, origem do que passou a ser denominado denovo sindicalismo. Paralelamente a este ascenso do movimento sindical,outros movimentos, como o feminista, o ecológico e o de moradia, tambémganham destaque na vida política da cidade. Enfim, a cidade, do ponto devista político, tornou-se referência nacional como berço do Partido dosTrabalhadores (PT). Este partido despontava no final da década de 70 comouma das três forças alternativas mais importantes no cenário internacional,compondo ao lado do Partido Verde alemão-ocidental e do Sindicato Livre

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Solidariedade, da Polônia, uma tríade de anseios e esperanças por um mundomelhor.

Os municípios do ABCDMR com São Bernardo do Campo em destaque

2. Do ponto de vista ambiental, São Bernardo do Campo ocupa posiçãoestratégica em função de seu território ser em grande parte coberto pela Leide Proteção aos Mananciais (nº 898 de 18/12/1975, nº 1712 de 17/11/1976 eDecreto Lei nº 9.174 de 19/04/1977). Estes mananciais são os situados nosentornos da Represa Billings, construída pelo capital estrangeiro em 1926com a finalidade de gerar energia. As margens e as derivações hidrográficasdo Reservatório, protegidos formalmente pela legislação, guardam a maiorreserva de água doce da RMGSP, em tese suficiente para atender cincomilhões de pessoas. Em razão de sua importância para o futuro de toda aRegião Metropolitana, a legislação dos mananciais prescreve umanormatização especifica para a ocupação humana destas áreas, tendo emvista a garantia da potabilidade e dos ciclos dinâmicos deste gigantescoecossistema artificial. Além da Represa, há que se considerar que o territóriosob jurisdição da Lei forma um importante acervo ambiental por ser cobertoextensamente por vegetação do tipo Mata Atlântica. Formação vegetal do tipopluvial ou chuvosa, a Mata Atlântica é uma paisagem natural que ganhounotoriedade internacional, na esteira das mobilizações em defesa dasRainforest e das Regenwald (6). Outras regiões do município, não incluídasna área sobre a proteção da Lei, também estão cobertas pela Mata Atlântica.

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O interesse ecológico desta Mata é manifesto por abrigar enormebiodiversidade na forma de uma fauna e flora de considerável relevância (7).Transformando estes dados em cifras, cerca de 70% dos 411 km² domunicípio possuem, direta ou indiretamente, características naturais quepredispõem a um rigoroso monitoramento quanto à sua preservação. Porsinal, é importante desde já esclarecer que a Lei de Proteção aos Mananciais,muito mais do que uma lei de preservação da natureza é uma legislação deocupação territorial, surgida em uma época em que as mobilizaçõesambientalistas eram virtualmente nulas (8).

3. O cenário que estamos descrevendo, qual seja, o de um municípiorico, populoso e politicamente importante, com um valioso potencial ecológico,ganhou maior complexidade com a conquista do poder municipal pelo Partidodos Trabalhadores (1988). Enfrentando uma articulação políticarepresentativa dos interesses conservadores na cidade, a candidatura de.Maurício Soares, advogado com duas décadas de serviços prestados aoSindicato dos Metalúrgicos de São Bernardo do Campo e Diadema logrou aconquista do pleito eleitoral, reivindicando uma Gestão Democrática ePopular. A plataforma política vencedora propunha a adoção de medidasreformistas, aglutinando diversos setores sociais para com base num acúmulode forças, trabalhar uma perspectiva futura - e não imediata - de construçãode uma sociedade socialista, entendida, no caso, como de tipo socialistademocrático. A vitória do PT marcou o primeiro momento na história da cidadeno qual o poder municipal escapou do controle das elites locais. Para oPartido, ela foi de extraordinária importância. Afinal, o PT vencia em suaprópria casa. Motivando enorme euforia junto a amplos setores sociais, aposse do novo prefeito (1º de Janeiro de 1988), malgrado as limitaçõesantecipadamente colocadas pela Plataforma Democrática e Popular, nãodeixou de suscitar, junto ao imaginário popular, anseios de transformaçõesprofundas na vida da cidade (9).

4. Durante todo o período de vigência da nova administração(1988/1992), a polêmica questão relativa à ocupação das áreas demananciais por conta dos loteadores clandestinos consorciados a setores domovimento de moradia, foi indiscutivelmente o principal dilema enfrentadopela ADP (Administração Democrática e Popular) de São Bernardo doCampo. Aparte o momentâneo episódio do rompimento do então prefeito como PT (1990/1991), nenhum outro evento ganhou, em termos de permanênciaou de importância política, a magnitude alcançada por esta questão.

O fato de a ADP ter como cerne um Partido que por excelênciarepresentaria os excluídos, por si só motivaria algumas provocantesindagações. Qual seria o projeto ambiental que poderia contemplar anecessidade de defesa do patrimônio ecológico municipal, acervo este deinteresse não só do município como da RMGSP? Como atender demandasrelativas à moradia num município que apresentava um dos índices de

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crescimento demográfico mais altos do país? Na impossibilidade de umprojeto unificador das demandas ambientais e de moradia, como reagiria aAdministração quando confrontada entre "optar" pelo meio ambiente ou pelos"sem teto?”.

Devemos antecipar, e isto não retira qualquer validade doaprofundamento das questões motivadas pelas interrogações que acabamosde registrar, é que a política realmente adotada pela ADP foi de favorecimentodas ocupações em áreas de manancial. Esta opção trouxe as mais durasseqüelas para todos os sujeitos políticos e atores sociais com ela envolvidosou por ela atingidos. Do ponto de vista político ela levou a uma ruptura entre omovimento ambientalista local e a Administração, situação esta agravada emfunção da presença de militantes do Partido no poder tanto oriundos domovimento de moradia quanto do ecológico.

Ademais, havia envolvimento direto do próprio prefeito com a prática deocupação dos mananciais. Evidências neste sentido podiam ser percebidaspelas constantes manifestações da SEPLAN - Secretaria do Planejamento,em favor da revisão da Lei de Proteção aos Mananciais, assim como pelaatuação da Secretaria de obras, principalmente em razão da instalação deequipamentos urbanos nas áreas degradadas, tornando irreversíveis muitasdas ocupações.

Naturalmente, seria possível objetar que a prática de ocupação dosmananciais não era nova e tampouco, um apanágio da ADP. O processo deindução do adensamento demográfico na região dos mananciais é antigo ereportaria, pelo mínimo, ao mandato do Prefeito Aron Galante, do PMDB(1983/1988). É fácil identificar, pela análise do noticiário da imprensa regional,dos estudos encaminhados por órgãos das próprias administrações, assimcomo pelas denúncias do movimento ambientalista, que em São Bernardo doCampo a indústria das ocupações contou tradicionalmente com o beneplácitodo poder municipal (Vide SEMASA, 1991: 8).

Entretanto, é também uma verdade que esta prática está permeadacom os vícios típicos de um clientelismo político que o PT local semprepretendeu denunciar, e, portanto, excluído a priori como uma possível práticadeste Partido quando governo. Nesta ordem de argumentações, é importantefrisar que a atuação da ADP de São Bernardo do Campo frente à questãoambiental não admitiria generalizações frente as demais ADP, ou pelo menos,não num mesmo grau. Analogias com esta índole são simplesmenteimprudentes e deveriam ser descartadas sem maiores considerações, poisobedeceriam mais aos ditames das disputas partidárias que de uma análiseobjetiva da questão (10).

Uma das possíveis contribuições deste ensaio residiria na avaliação dasvacilações de forças políticas contestadoras do status quo, que em função da

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não interiorização da questão ambiental, podem, uma vez alçadas ao poder,postar-se a serviço da reprodução da mesma ordem em tese combatida.Implícita nesta análise, o destaque de um fio ecológico como um potencialdivisor de águas político-ideológico. A partir do momento em que a questãoambiental polariza diretamente com a herança cultural e tecnológica doPadrão Civilizatório Ocidental, ou como desejariam alguns, do ModernoSistema de Produção de Mercadorias, as forças que pretendem atransformação do mundo devem obrigatoriamente estar em sintonia com asreivindicações ambientalistas, pois estas interferem diretamente junto aosdebates relativos aos relacionamentos e formas de relação mantidas peloshomens entre si e com seu meio ambiente imediato.

No concernente ao nosso tema, veremos como o crescimentodesordenado, expressão possível de uma determinada lógica espacial,aparentemente um manifesto sintoma perverso atuando no sentido dedegradar o Reservatório da Represa Billings, pode estar ajustado a umapolítica de malversação dos recursos naturais, dos hídricos em particular. Taisrecursos, não seria exaustivo repetir, são nos dias de hoje, uma frente delutas na defesa do interesse público, que não pode prescindir da água de boaqualidade para garantir a própria reprodução biológica da sociedade humana.

Igualmente advertimos, uma Ecologia Política dos Mananciais, nãoadvoga e sequer prescreveria uma opção pelo meio ambiente que seriacontraposta àquela outra, em tese preocupada com o homem, defendida naocasião pela ADP e setores do movimento de moradia. Sabedores de que aprópria expressão Ecologia é proveniente do grego e significando Estudo daCasa, uma política ambiental que procure credenciar-se como alternativa aordem existente, deve possuir a sabedoria de unir movimentos e forças emcontradição com a ordem existente, em prol de medidas que assegurem obem-estar para a maioria da população. O contrário disto seria uma outra não-política, tão contrária aos interesses populares quanto as que são formuladase executadas pelos poderes públicos quando o assunto em pauta é a questãodo meio ambiente.

De resto, é importante assinalar que o autor deste ensaio foi umatestemunha privilegiada de um processo que opôs uma Administração doPartido ao qual foi filiado ao movimento social do qual ele é originário, asaber, o ecológico. Assim sendo, não foi sem exaustiva reflexão que estetexto ganhou vida. Como ex-Coordenador do Meio Ambiente da PMSBC(Prefeitura Municipal de São Bernardo do Campo), tive a oportunidade deobservar, de compreender, com mais força do que antes, que a questãoambiental é um desafio primordial, no interior do qual estão sendo gestadasas premissas que o tempo tornará indispensáveis para o futuro dos humanos.É igualmente em seu interior que as forças que possuem a pretensão demudar o mundo poderão inspirar-se para torná-lo digno da maioria doshomens e mulheres que habitam este planeta. Ele é indiscutivelmente o berço

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de um Novo Projeto Político, socialmente justo e ecologicamente responsável(WALDMAN, 1992 e 1993).

Sentenciava o filósofo romano Sêneca (in Sobre a Brevidade da Vida),que não haveria nada que a longa passagem dos anos não destruísse ou nãodesordenasse. Asseverava, contudo, que o valor do conhecimento, pelocontrário, quando consagrado pela verdade profunda dos homens, somenteseria aumentado com a lenta passagem do tempo. Por entender que aEcologia é indissociável desta verdade profunda dos humanos é que, apósalguns meses de meditações sobre o assunto, atrevi-me a elaborar esteensaio. Sendo parcialmente um relato pessoal, este ensaio também salienta oquanto a perspectiva social prontifica-se primeiramente enquanto uma opçãoindividual.

Sem a possível presunção de considerá-lo uma palavra final sobre otema ou sobre os acontecimentos que presenciei - mesmo porque apenas otempo pode assegurar o conteúdo de verdade de uma avaliação - antecipoque mesmo a passagem deste curto lapso de tempo foi por si só suficientepara dar transparência a muitas das nuances ao embate que motivou, dentreoutros desdobramentos, minha própria exoneração do Secretariado da ADPde São Bernardo do Campo.

II - A QUESTÃO DA BILLINGS OU DA NÃO-POLÍTICA DA ÁGUA

Compreender o verdadeiro emaranhado político que envolve, opõe eaglutina os movimentos de moradia e o ecológico, lideranças político-partidárias, a opinião pública e as várias instâncias do poder público (onacional, o estadual e o municipal), determina o comentário de alguns dadospreliminares relativos à construção e monitoramento do vasto reservatório daRepresa Billings, ainda hoje é o maior de toda a RMGSP.

Estudar a criação deste reservatório é também tomar conhecimento dasdiretrizes que regem a elaboração das políticas públicas de gestão dosrecursos hídricos. Estas tem sido, e o histórico da Billings é um dos maisevidentes esclarecimentos possíveis a respeito do assunto, uma política demalbaratação destes recursos, que poderão tornar um dia o Brasil um país noqual a água, tão abundante nesta favorecida nação, tornar-se-á escassa, umproduto caro e de difícil obtenção.

A degradação da Billings é reveladora da existência de uma matrizenergética, que articula numa sólida aliança, os poderes públicos e asempresas de produção de hidroeletricidade aos esquemas de endividamentoexterno e grandes empreiteiras; estas, com as administrações em nívelestadual e municipal; e estas, por sua vez, com as expressões político-

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partidárias que agem, com claros vínculos com a especulação imobiliária, emnível local.

Estatísticas do crescimento da capacidade da antiga Light e do crescimento do consumo noperíodo 1901/1925 (Fonte: Boletim Histórico, editado pela Eletropaulo, Junho de 1985).

Esta questão tem suas origens nos idos do inicio do Século, quando acapital paulista, a cidade de São Paulo, crescia vertiginosamente graças àampliação de seu parque industrial. Este fator, unido à modernização docotidiano urbano - impulsionador do consumo de eletricidade - originou uma

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forte demanda de energia que desenhou prognósticos de que oabastecimento de eletricidade deveria, cedo ou tarde, ser ampliado.

Entre os anos de 1913 a 1921, em continuidade a indicadores dos anosprecedentes, o consumo de energia crescia na ordem de 10% ao ano. Nobiênio 1922/23, a taxa de consumo saltou para 15% ao ano. Em 1924/25, aocorrência de forte estiagem motivou uma crise sem precedentes noabastecimento e o precário serviço de fornecimento de eletricidadepraticamente entrou em colapso.

Sem outra saída, o Prefeito Firmiano M. Pinto, através do Ato nº 2.499,de 13 de Fevereiro de 1925, decretou severo racionamento do uso deenergia, medidas logo recrudescidas ainda mais, em Março do mesmo ano. Aprofundidade desta crise, uma autêntica calamidade pública, suscitou aadoção, quase em caráter emergencial, de um projeto encomendado pelogoverno do Estado à empresa canadense (com controle acionário britânico)The São Paulo Tramway, Light and Power, ou simplesmente Light, como erachamada pelo povo. Este projeto, denominado Projeto da Serra, envolvia oaproveitamento dos recursos hídricos do Alto Tietê e a construção da RepresaBillings.

Este Projeto tomava por base a especialíssima configuração geográficana qual está assentado o sítio urbano de São Paulo. Esta cidade, que hojeforma uma gigantesca conurbação com 37 municípios limítrofes (justamente aRMGSP), foi construída, ao contrário da maioria das cidades do mundo, juntoàs cabeceiras de um grande Rio, o Tietê (caudal volumoso no linguajar dosíndios Tupi) e das margens de dois de seus afluentes mais próximos, os RiosPinheiros e Tamanduatei. No mapa, estes três rios formam uma espécie deum "U" invertido aberto no sentido Sudeste, no interior do qual cresceu acidade de São Paulo e também, o Grande ABC.

"Não se poderia supor, até quase a 2ª década deste século, o papel queestaria reservado a Serra do Mar, em São Paulo, sobretudo no pontodenominado Serra de Cubatão. No auge da pior crise de energia elétrica desua história (1924/25), e sem possuir quedas d'água significativas,necessárias à construção de hidrelétricas, a Serra de Cubatão, como eraconhecido este lado da Serra do Mar em São Paulo, surgiu como que ogrande trunfo para a solução do problema, cuidadosamente escondido nasmangas de um mágico" (MACEDO, 1992:15).

A idéia de aproveitar as características da topografia da região,bastante favorável se pensarmos na existência de um desnível, no sentidocontrário à drenagem hidrográfica, de mais de 700 metros entre o planalto e aorla litorânea, incendiava a imaginação da maioria dos paulistas. Afinal, aSerra, que transparecia como um obstáculo indomável no imaginário espacial

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dos cidadãos do Planalto do Piratininga, seria doravante domada peloprogresso e colocada a serviço do desenvolvimento (11).

As características meteorológicas favoreciam a opção pelo Projeto daSerra, a Obra do Século, no dizer dos ufanistas de outrora. Um índicepluviométrico elevado, proporcionado pelos ventos carregados de umidadeprovenientes da Massa de Ar Tropical Atlântica, permitiria abundanteprecipitação nas cumeadas da Serra e bordos adjacentes do Planalto, vitalpara a manutenção dos níveis do Reservatório que movimentaria as turbinasda Usina Hidrelétrica (UHE) Henry Borden (ou Cubatão), situada no sopé daSerra, em plena Baixada Santista.

Ao lado destes pré-requisitos geofísicos, existiam outrasargumentações decisivas para a aprovação do projeto. Dentre elas, afacilidade de transporte dos materiais de construção (através de dois desvios,um na Estrada de Ferro Santos a Jundiaí e outro pela antiga Estrada doVergueiro ou Estrada Velha de Santos) e sumamente, a menor distância a serpercorrida pela transmissão de energia na direção do centro consumidorpaulista.

Este histórico da construção da Represa Billings, envolvendo aconcessão da exploração dos recursos hídricos da Bacia do Alto Tietê para aLight, empresa que já havia desenvolvido diversos outros projetos deaproveitamento hidrelétrico no interior paulista e em outros Estados daFederação, é também o relato de um primado energético que tem norteado aelaboração das políticas de gestão dos recursos hídricos.

A Light viria a transformar-se no maior grupo privado do Brasil, e suainfluência junto às repartições públicas sempre foi muito grande. Isto auxiliana compreensão de muitas das decisões tomadas por sucessivos governosnos âmbitos federal e estadual, contribuindo para que a concessionáriaterminasse por assenhorar-se das águas doces do Alto Tietê.

Mais ainda, a Light induziu a gestação e implementação das políticas degerenciamento das águas doces de um vasto território, abarcando áreasbastante longínquas de seu cenário original de implantação. O poder inercialdo sistema implantado pela Light é de tal monta que mesmo suanacionalização pelo Governa Federal (em 1978) em nada alterou suasdiretrizes primordiais. Rebatizada de Eletricidade de São Paulo S.A. (ouEletropaulo, sua denominação mais corriqueira), a companhia continuou areproduzir uma política baseada em uma matriz energética que acarretaria asmais graves repercussões para o futuro da RMGSP.

Apesar de na autorização governamental para a construção da RepresaBillings constar explicitamente que o uso energético das águas não poderiaprejudicar o abastecimento da população (Decreto Lei nº 16.884 de 27 de

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Março de 1925, assinado pelo Presidente Arthur Bernardes), tanto a Light,quanto sua sucessora, a Eletropaulo, jamais cumpriram os estatutos daconcessão, tornando a companhia uma autêntica "proprietária" de todas aságuas de São Paulo, gerenciando-as a seu gosto e sem qualquer interferência(Vide VITOR, 1991).

Planta geral do aproveitamento hidrelétrico nas imediações de São Paulo, reproduzido deHistória e Energia, nº 2, Outubro de 1986, página 12. No mapa os números correspondem a: 1-Usina de Cubatão, 2- Canal de ligação, 3- Barragem reguladora (summit), 4- Usina de Recalquede Pedreira, 5- Barragem de Guarapiranga, 6- Usina de Recalque de Traição, 7- Estrutura doRetiro, 8- Usina de Parnaíba, 9- Usina de Rasgão, 10- Usina de Porto Góes e 11-Usina deItuparanga.

A diretriz básica para a utilização da massa líquida da Bacia, sempre foià geração de energia, uma causa básica para se compreender a degradaçãodos recursos hídricos na RMGSP. No parecer de um conhecido especialistaem poluição das águas e impactos ambientais, o Professor Samuel MurgelBRANCO, "mesmo quando se fala em políticas de usos múltiplos das águasna RMGSP, é preciso levar em conta que os usos da Bacia do Tietê sempreforam direcionados pelo interesse energético predominando sobre os demais",e acrescenta, "esse privilégio constitui também, a principal causa dadeterioração das águas da Região Metropolitana" (1991:54).

A UHE Henry Borden entrou em funcionamento em 1926, quando oVale do Rio Grande foi afogado e transformado em um dos braços doReservatório, precisamente denominado de Rio Grande (12). Esta drásticaalteração do curso natural das águas pluviais e fluviais foi completada pelaautorização, concedida pelo Presidente Eurico Gaspar Dutra (Decreto Lei nº22.008 de 29 de Outubro de 1946), para a Light reverter à totalidade do curso

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do Rio Tietê, via Rio Pinheiros, para a Represa Billings, transformando esterio em um Canal com seu curso natural invertido.

Em tal esquema, as águas do Tietê, que deveriam correr na direção daCalha do Paraná e escoando através da Bacia do Prata, desembocar noAtlântico entre a Argentina e o Uruguai, ganharam um curso inteiramentenovo. Primeiramente, as águas do Tietê foram barradas pela Usina Edgard deSouza, que passou a controlar sua vazão a jusante. Segundo, as águas desteescoadouro natural, através da Reversão do Rio Pinheiros, foram empurradaspor um sistema de estações elevatórias (Usinas de Traição e Pedreira), até oReservatório da Billings e daí precipitadas, por meio de tubulaçõessuperficiais e subterrâneas, para a UHE Henry Borden em Cubatão, cujoefluente passou a ser vertido no rio de mesmo nome.

Desta forma, formou-se o Sistema Billings . Seu eixo é um vastoreservatório de 127 quilômetros de extensão, 560 quilômetros quadrados,banhando cinco das sete cidades do atual ABCDMR e que armazena umbilhão e duzentos milhões de metros cúbicos de água potabilizável. Aconcentração em um único ponto do espaço de tão considerável quantidadede água determinou utilizações não-premeditadas pelo projeto original. ARepresa tornou-se uma área de lazer, atraindo banhistas e pescadores. Asqualificações estéticas do entorno originaram uma ampla rede de restaurantescom clientela concentrada nos fins-de-semana. Estas atividades gerarammilhares de empregos diretos, sem contar ambulantes, minhoqueiros einclusive pescadores profissionais cuja fonte de renda passou a gravitar emtorno da Represa (13).

Por último, e igualmente um desdobramento não previsto no Projeto daSerra, o Reservatório, em razão de seu valioso acervo ambiental, tornou-sefoco das mobilizações ambientalistas do Grande ABC. De modoaparentemente paradoxal, a Represa Billings, um objeto espacialeminentemente artificial, e a despeito de ter sido projetada apenas como umamera reserva de água para gerar hidroeletricidade, terminou definitivamenteincorporada à Natureza.

Na RMGSP, com a crescente valorização dos mananciais de águapotável, a Billings passou a ser inserida na ótica dos interessesmetropolitanos, sugerindo uma revisão dos propósitos até então colocadospara o funcionamento da Represa. Vale lembrar, neste sentido, que aqualidade das águas do Reservatório foi, durante a maior parte de suahistória, muito boa. Mesmo a reversão do Tietê não chegou a alterar ascaracterísticas limnológicas das suas águas. Até a década de 50, o Tietê,embora com sinais evidentes de um processo de contaminação em expansão,ainda estava relativamente limpo. Vários clubes construídos nas suasmargens utilizavam o rio como uma piscina natural, com trampolins voltadosna sua direção.

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Assim sendo, a água do Reservatório, que tanto poderia gerar energiaelétrica como abastecer a população - utilizações ao menos em tese nãoexcludentes - tornou-se alvo de uma disputa na qual os interesses relativos àmatriz energética e ao abastecimento público de água potável entraram emcontradição. Neste conflito, o primado energético que citamos algunsparágrafos atrás, soube impor-se e explorar, a seu proveito, uma ideologia doprogresso e de resto, combinar as próprias mazelas do desmesuradocrescimento urbano da RMGSP às suas expectativas.

As pressões exercidas pela Light/Eletropaulo procuravam justificar aperpetuação do Sistema Billings em nome da irreversibilidade da matrizenergética em operação e paralelamente, a hipótese de uma crise noabastecimento devido à suposta incapacidade de atender as demandas deenergia com uma eventual paralisação do aparato implantado. Esta últimaargumentação se inscreve nos clássicos postulados que tradicionalmente temarticulado as grandes empreiteiras ao setor elétrico, garantindo uma pródigaprofusão de mega-projetos.

Graças a este expediente, o Brasil tem sido pontilhado por barragens epor represas, cuja construção nem sempre encontra efetiva justificativa nosníveis reais de consumo de energia elétrica. É uma constatação bastanteconhecida pelos estudiosos do assunto de que os órgãos responsáveis peloplanejamento hidrelétrico destacam patamares de consumo muito superioresaos que mais tarde a realidade demonstra irrevogavelmente inferiores aoprognosticado (Vide WALDMAN, 1992:76/90).

Outro fator que explica a permanência do Sistema Billings reside nasdinâmicas urbanas registradas na RMGSP, tendo como pivô o processodesenrolado na década de 70 sob a rubrica de Milagre Brasileiro. Nesteperíodo, formou-se o vasto conglomerado de 38 municípios dispostos aoredor da cidade de São Paulo. Esta Região Metropolitana, pelo próprio fato deencabeçar nacionalmente o processo de espacialização da formação socialbrasileira, foi detentora dos índices mais assombrosos de crescimento urbano.

Nada menos de nove milhões de novos moradores foram atraídos paraa RMGSP, e o Grande ABC absorveu fatia significativa deste crescimento.Centro de propulsão de um "milagre" do qual um dos eixos foi a indústriaautomobilística, o crescimento demográfico foi espantoso. O Grande ABCteve sua população multiplicada por quatro em trinta anos. Ela passou depouco mais de 500 mil habitantes em 1960 para 2 milhões e duzentos mil em1990, inchando as cidades da sub-região (14). Apesar de sua reduzidasuperfície (8.051 km², correspondendo a 0,9% da área total do Brasil e a 3,5%da do Estado de São Paulo), a RMGSP passou a concentrar, no período,cerca de 17 milhões de habitantes, ou algo em torno de 11% da populaçãobrasileira.

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Os impactos sócio-ambientais gerados por tamanha concentraçãopopulacional em tão curto lapso de tempo foram tremendos. Em particular,destacamos a poluição hídrica gerada pelos esgotos domésticos e industriais.No início dos anos noventa, assegura estudo a respeito do assunto, grandeparte das águas residuárias geradas na Região Metropolitana, numaporcentagem talvez maior do que 80%, não recebia qualquer tratamento ounão chegava às estações de tratamento existentes (AMARAL E SILVA,1991:62).

A contaminação das águas foi favorecida por uma enormeconcentração industrial, igualmente proporcionada pelo Milagre Brasileiro. NoABCDMR, somente no ramo químico, são cerca de 600 empresas instaladasna região, tendo como atividades mais proeminentes a química industrial,tintas e vernizes, armas e munições, indústria farmacêutica, plásticos,fertilizantes e petroquímica. Estima-se que 10 mil formulações químicas sãoempregadas nestas atividades.

Além de produtos e sub-produtos, há uma geração vultosa de resíduossólidos, líquidos e gasosos, lançados direta ou indiretamente nos esgotospúblicos, terrenos abandonados, atmosfera, pequenos rios e riachos que, nogeral, deságuam na Represa Billings. Apenas uma indústria, a ELCLOR(antiga Eletrocloro), despeja, desde 1948, mercúrio nas águas doReservatório, sem que sejam tomadas providências (Diário do Grande ABCedição de 14.03.1991). Esta alarmante carga letal, prejudicial ao conjunto daComunidade, tem, pois, justificadamente, motivado manifestações e ações devários setores da sociedade civil e da iniciativa privada, medidas incipientes,porém plenamente reveladoras de tomada de consciência quanto â magnitudedo problema (15).

Paradoxalmente, este dramático quadro de impactos e riscosambientais não parece ter sensibilizado os sucessivos governos estaduais,aos quais caberia a responsabilidade pelo devido equacionamento daproblemática. Os enormes riscos à saúde para os milhões de habitantes daRMGSP, por si só seriam suficientes para a adoção de medidas drásticasquanto à despoluição e implementação imediata de políticas visandosaneamento da Região Metropolitana.

No entanto, existe uma ordem de motivações muito concretas que estána raiz desta política, que por parecer mais preocupada em produzir esgotosdo que água potável para a população, constitui-se verdadeiramente numa"não-política" de águas doces. Vejamos, pois o elenco de razões quesinteticamente explicam a situação:

1. A Light é uma empresa do setor elétrico, e enquanto tal, preocupadaexclusivamente com a geração e distribuição de energia. Para manter o "seu"

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sistema em funcionamento, a Light não hesitou em solicitar toda a águadisponível dos arredores da cidade de São Paulo, e posteriormente, de áreasainda mais distantes. O Reservatório da Billings tornou-se o epicentro a partirdo qual evoluiu um redemoinho hídrico, sugando águas doces de uma vastaperiferia. Este esquema implicou na aplicação de bilhões de dólares emvultosos e caros sistemas de abastecimento. Dinheiro obtido viafinanciamento externo, não é demais asseverar que o custo destes projetosfoi (e ainda é) suportado pelo conjunto da população brasileira, em especialpelos mais desfavorecidos. A transformação da Light em uma empresa"pública" - a Eletropaulo - em nada alterou as diretrizes da empresa. Suanacionalização pouco pesou num possível redirecionamento de suasprioridades, em vista do fato notório de que para o lobby que sustenta o setorelétrico - ao qual se associam as empreiteiras e os órgãos governamentais -pouco importa se uma empresa de geração de energia, desde que satisfaçasuas expectativas, seja nacional ou estrangeira. O Sistema Billings, não é ummeio a serviço de fins que poderiam ser alcançados por outras vias. Ele é emsi mesmo, um meio que condiciona os fins a serem obtidos, excluindo,obrigatoriamente, todos os demais. Sua burocracia, prepotente e autoritária,não obedece a nenhum outro desígnio além daqueles que favorecem aestrutura de poder existente, a serviço da qual estão, a priori, a serviço.

2. Neste sentido, não admira o alheamento da empresa quanto aosproblemas relativos ao saneamento e abastecimento de água. "A companhiaLight, então detentora do monopólio energético, não se interessava a questãodo abastecimento, e muito menos, da despoluição do Tietê e da Billings, umavez que esgotos, ao passarem por turbinas, geram eletricidade do mesmojeito (grifos meus). Na medida em que o Sistema Billings foi se tornandoinsuficiente - e como a Light não interessava os aproveitamentos de outrospotenciais a jusante, que contrariavam seu monopólio - começou a cresceruma demanda de esgotos, para acionar novas unidades instaladas emCubatão" (BRANCO, 1991:55). Objetivamente, a Light/Eletropaulo tornaram-se parceiras de uma política de geração de esgotos. Quanto mais esgotosfossem encaminhados para o Tietê, tanto melhor, pois desta forma a Lightpoderia gerar mais energia sem arcar com qualquer custo adicional.

3. A inviabilização dos recursos hídricos sob controle da empresa comofonte de água potável para a população, além de ser uma garantia para seumonopólio energético - por reforçar sua utilização para fins energéticos naausência de qualquer outra utilização possível - fornecia paralelamente umsólido argumento para a implantação de caríssimos sistemas deabastecimento, um filão explorado por construtoras e evidentemente, pelasagências de financiamento externo.

Com base nestes três pressupostos, "os tributos pagos pelo cidadãopaulista para a manutenção de um genial sistema de geração de energia"

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(BRANCO, 1991:57), incluíram pelo menos duas graves repercussões para oconjunto da RMGSP, entre elas:

1. O comprometimento dos projetos de saneamento e de contenção dasenchentes na Grande São Paulo, sumariamente descartados através dopoder de influência da velha Light, já que contrariavam seus interessescomerciais. Entre estes projetos, esteve o desenvolvido pelo engenheiroFrancisco Saturnino Rodrigues de Brito, responsável pelo saneamento demais de cem cidades brasileiras e com razão considerado uma das glórias daengenharia nacional. O plano de Saturnino de Brito previa o barramento devários tributários do Tietê a montante de São Paulo, ou seja, antes da cidadede São Paulo, contribuindo para regularizar as enchentes e também comoreserva hídrica para irrigação e abastecimento. Outro plano, desenvolvido porCatullo Branco previa a construção de barragens a jusante de São Paulo, asquais seriam beneficiadas pelas obras regularizadoras de Saturnino de Brito.Porém, "a Light não interessava nem uma, nem outra coisa. Assim como nãolhe interessou, mais tarde, o desvio dos esgotos da metrópole para o RioJuqueri, desaguando, tratado, no Tietê a jusante e não a montante das suasbarragens energéticas" (BRANCO, 1991:5). Por conseguinte, a RMGSP, quepoderia ter controlado ou minimizado desde o inicio do Século o problema dasenchentes, enfrenta até hoje os prejuízos derivados das inundações. Aomesmo tempo, arca com as seqüelas da destruição dos equilíbrios daRepresa Billings, como a desvalorização das áreas marginais da Represa, ocomprometimento da indústria pesqueira no Vale do Tietê, no Reservatório eno estuário de Santos, perda de oportunidades de lazer, sem contar com omau cheiro que nos dias quentes devassa os domicílios de uma vasta região.

2. Uma vez inviabilizada a captação de água potável do Alto Tietê e daBillings, foi desenvolvido em seu lugar o fantástico Sistema Cantareira, "muitomais caro, e em prejuízo das regiões doadoras" (VITOR, 1991:66). Atravésdele se fazia, agora, a reversão das águas das cabeceiras dos formadores doRio Piracicaba. Transferia-se o problema do abastecimento da RMGSP para aregião de Campinas e partes do Estado de Minas Gerais. No caso deCampinas, o Sistema funcionava em detrimento de uma outra RegiãoMetropolitana, ela mesma às voltas com demandas crescentes de água doce.O torvelinho hídrico do Sistema Billings, agudizou em escala estadual aquestão dos recursos hídricos, pois objetivamente, "o problema danecessidade de reversão tende a criar possíveis situações de conflito entreusuários de água de regiões vizinhas" (AMARAL E SILVA, 1991:61). Obracara, gastando desnecessariamente milhares de Kilowatts de energia paratranspor a Serra da Cantareira, constituía, nas palavras do EngenheiroRodolfo Costa e Silva, "um projeto de antiengenharia e deantidesenvolvimento" (SEMASA, 1990:15). Não obstante, do ponto de vista daconcessionária, era, sobretudo uma obra desejável, "uma vez que traria, para

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O Sistema Cantareira de Abastecimento de Água da RMGSPe sua relação com o SistemaEnergético Tietê-Billings (Reproduzido de BRANCO, 1991:56).

o Sistema Billings, 33 metros cúbicos por segundo de águas provenientes deoutras bacias, as quais, transformadas em esgotos, iriam poluir a RepresaBillings e o estuário santista, mas aumentariam significativamente o seupotencial em Cubatão. Mesmo que em detrimento da região de Piracicabaque, justamente no momento em que elevava o seu potencial poluidor pelainstalação de indústrias de celulose, de álcool, de açúcar, etc, teve reduzidasas vazões diluidoras de seu rio" (BRANCO, 1991:57). O ponto culminantedessa reversão de águas na direção da RMGSP seria atingido pela execuçãodo Projeto Juquiá, envolvendo a exploração dos recursos hídricos do RioRibeira de Iguape, no Sul do Estado de São Paulo. O Vale deste Rio, uma dasúltimas reservas de Mata Atlântica de grande porte do Brasil, é habitado pornumerosa população rural com grandes especificidades culturais, e aconstrução das represas componente do projeto redundaria nos mais gravesimpactos sócio-ambientais. Situado a mais de 700 metros de desnível comrelação a RMGSP, a água dos diversos lagos artificiais projetados teria de serbombeada por enormes instalações, uma verdadeira "cachoeira ao contrário".Obra ainda mais cara que o Sistema Cantareira, com custo estimado em 10bilhões de dólares (na época equivalendo aproximadamente a 10% da dívidaexterna brasileira, a maior do mundo) o Projeto causou várias manifestaçõesde inconformismo, tanto do movimento ecológico quanto do Movimento deAtingidos por Barragens, que juntamente com a CPT - Comissão Pastoral daTerra - organizou a resistência da população local contra o Projeto.

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Trajetória da águas residuárias da RMGSP na direção da UHE de Cubatão

Neste croqui rústico, temos o percurso dos esgotos da RMGSP e suas implicações para aRepresa Billings e Baixada Santista. Esta ilustração é similar às que já foram produzidas ereproduzidas na escala dos milhões de exemplares em folhetos distribuídos pelo movimentoecológico do Grande ABC (Reproduzido de folheto da Campanha Viva a Billings Viva,Março/Outubro de 1992).

Certamente, é de se perguntar, uma vez diagnosticadas as variáveisque respaldaram o Sistema Billings, se todo o rol de sacrifícios impostos amilhões de cidadãos, tiveram alguma contrapartida que os justificassem.Numa única palavra, a resposta seria Não. Sistema construído no inicio doSéculo, a geração de energia elétrica pela UHE de Cubatão já tinha deixadode possuir, nos anos noventa, qualquer importância de monta, respondendopor apenas 3% do consumo energético do Estado. Deste modo, sob qualquerponto de vista, levando-se em consideração os custos sociais, ambientais eeconômicos, tornava-se inadmissível a continuidade do funcionamento doesquema energético da Billings.

Todos os dados amealhados ao longo dos últimos anos são unânimesem confirmar uma requalificação do Sistema Billings, revendo-o emprofundidade, e priorizando a Represa em termos de uma área de produçãode água. A resistência das autoridades competentes em alterar as prioridadesenergéticas que hegemonizaram o Sistema (entre as quais se inclui a própriaSecretaria do Meio Ambiente do Estado de São Paulo), conquistou acoloração de um claro confronto com a sociedade civil, inconformada ante tãodesabusada defesa dos interesses de um setor, o elétrico, cujas prerrogativas

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configuravam-se como uma ameaça real à estabilidade sócio-ambiental daRegião Metropolitana da Grande São Paulo.

Fac-símile de Manifesto do Movimento de Atingidos por Barragens do Vale do Ribeira,posicionando-se contra o Projeto Juquiá (SP).

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III - A QUESTÃO DOS MANANCIAIS OU DA NÃO-POLÍTICA URBANA

O extraordinário crescimento urbano verificado no período do “MilagreBrasileiro", explica como sabemos, o surgimento das Regiões Metropolitanas(RM). Referendadas em 1973 pelo IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia eEstatística), estas conurbações, em número de nove (Belém, Fortaleza,Recife, Salvador, Belo Horizonte, Rio de Janeiro, São Paulo, Curitiba e PortoAlegre) - incharam em decorrência de um movimento migratório que arrastou,a partir da década de 60, milhões de brasileiros para o meio urbano (16).

Com muita razão, este crescimento foi considerado pela ONU como omais rápido do mundo (in SEMASA, 1991:12). Basta assinalar que o Censode 1980 indicava 29% da população habitando as RM, situação esta previstapelos demógrafos para acontecer apenas no ano 2.000, ou seja, vinte anosdepois. Nos nossos dias, mais de 80% dos brasileiros habitam o meio urbano,tornando a criação de políticas urbanas uma necessidade vital para a garantiade padrões minimamente aceitáveis de qualidade de vida.

Para as grandes aglomerações urbanas, em particular para as RM, acomplexidade dos problemas gerados nas três últimas décadas tornou oordenamento urbano um campo privilegiado para a elaboração das políticaspúblicas, e neste sentido, os primeiros projetos metropolitanos constituíramuma tentativa de controlar e monitorar os efeitos indiscutivelmente negativosdecorrentes de uma urbanização desenfreada.

Para a RMGSP, estava colocado o desafio de redirecionar a expansãoda mancha urbana, indicando a ocupação ao longo da várzea quaternária, nadireção Leste-Oeste e não mais Norte-Sul. Esta intenção de ocupaçãometropolitana se justificava por obras mais baratas de infra-estrutura urbana,pelo fato de diminuir a pressão sobre a Serra da Cantareira - uma áreaflorestada e com custo maior de ocupação por possuir alta declividade - e, porfim, por preservar as matas ao Sul e os dois grandes mananciais aí existentes- os Reservatórios da Billings e do Guarapiranga (cf. SEMASA, 1991:16).

Estas diretrizes de crescimento para a RMGSP incluíam uma claraconsciência da condição peculiar dos recursos hídricos da RegiãoMetropolitana, possibilitando o surgimento da Lei de Proteção aos Mananciaise das propostas visando o saneamento da Bacia do Alto Tietê. Estas duasmedidas, de considerável alcance e arrojo urbanístico, foram consignadas noPlano Metropolitano de Desenvolvimento Integrado, ou abreviadamente,PMDI. Apesar de ter sido concebido no bojo do Regime Militar, este fato nãodesmerece a qualificação técnica e a racionalidade que o PMDI procurava darao crescimento da metrópole.

A este respeito, comenta o engenheiro Sadalla Domingos, um doscriadores da Lei de Proteção aos Mananciais: "É interessante enfatizar uma

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contradição; embora a gente estivesse num momento autoritário, com aditadura instalada, esse modelo de região metropolitana criou algumas figurasjurídicas, algumas alterações na ordem jurídica clássica, que eramextremamente progressistas. Por exemplo, a Lei de Proteção aos Mananciaisnada mais é do que a tão decantada função social da propriedade, ou seja,existe uma propriedade e aquela propriedade está situada em um lugar tal,que lhe dá qualidades ligadas ao destino de alguma coisa que não é só o seuproprietário que dirige" (in SEMASA, 1991:30).

Estas premissas não foram incorporadas tranqüilamente ao PMDI.Sabe-se, por exemplo, que o engenheiro Rodolfo Costa e Silva, a principalcontribuição teórica ao PMDI, sofreu duras perseguições durante o regime deexceção, daí a máxima que se refere à Lei de Proteção aos Mananciais comocriada "nos porões da Ditadura Militar" (depoimento de Ronaldo Queródia).Antecipamos, de resto, foi justamente por intentar a garantia de um mínimo deracionalidade e de controle a um processo selvagem de urbanização que oPMDI não foi levado adiante e interrompido na administração do entãoGovernador Paulo Egydio Martins.

O esquema apresentado pelo PMDI era tecnicamente adaptado àmetrópole, excluindo a importação de equipamentos e de know-how. Erabarato, cerca de 40% do custo total das outras propostas e singularmenteprático. Propunha um Plano Diretor de Esgotos, a chamada SoluçãoIntegrada, prescrevendo o fim das reversões e o tratamento dos efluentesatrás da Serra da Cantareira, que só depois de purificados seriam lançadosno Tietê.

A Represa Billings, livre do flagelo do bombeamento de esgotos,permitiria então a potabilização de mais de 20 metros cúbicos por segundo deáguas doces para a RMGSP. O Reservatório poderia acentuar sua vocaçãopara o lazer, esportes náuticos, recreação, pesca amadora e profissional,utilizações estas que a população metropolitana espontaneamente adotoudesde a formação do Reservatório.

Concentrando apenas águas limpas, a Represa deixaria de apresentarperigo para a saúde pública, sem contar que o meio ambiente aquático e dasmatas dos arredores seria intensamente revitalizado. No plano, nas palavrasdo engenheiro Rodolfo Costa e Silva, "não era o primado energético quedominava. Era o primado metropolitano, o primado do desenvolvimento, adefesa da Billings" (in SEMASA, 1990:21).

Quanto à Lei de Proteção aos Mananciais, ela é um dos instrumentoslegais criados para induzir o adensamento populacional no sentido Leste-Oeste, protegendo as regiões de matas do Norte e do Sul da RMGSP. É umalegislação bastante complexa, estabelecendo diferentes critérios de restriçõesquanto ao uso do solo. A Lei tem como pressupostos básicos as

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características meteorológicas, pedológicas e fito-botânicas da região dosmananciais e é claro, a maior ou menor proximidade com a Represa Billings.

AS DUAS SOLUÇÕES PROPOSTAS PARA O SISTEMA BILLINGS

Os projetos Greeley-Hansen, Hazen-Sawyer e Hibrace previam o barramento do Tietê emPirapora e Edgar de Souza e dispositivos de bombeamento em Traição e Pedreira para levar osesgotos até a represa Billings, para daí descer a Serra do Mar e gerar energia em Cubatão.

Na Solução Integrada, os esgotos seriam conduzidos por um túnel, de Leopoldina para detrásda serra, onde seriam tratados em Pirapora, numa cota mais baixa.

Visando o equilíbrio hidrodinâmico do Reservatório, a Lei procura contera blindagem do solo. Por esta razão, prevê a preservação da coberturavegetal e uma urbanização que não impermeabilize o solo, compavimentações de ruas com paralelepípedos, permitindo a infiltração daságuas pluviais para recarga dos lençóis subterrâneos.

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Apesar de considerada na atualidade como uma lei ecológica - e otempo provou que há, nesta assertiva, uma considerável dose de verdade - asintenções originais da Lei de Proteção aos Mananciais são de molde aconsiderá-la fundamentalmente como uma lei de ocupação territorial. Muitasdas áreas vedadas à ocupação são simplesmente impróprias para qualquertipo de edificação, por insalubridade, alta declividade e por perfil pedológicodesfavorável do solo.

Em razão da elevada concentração de areia na composição do solo(justificando inclusive a presença de dezenas de portos de areia, empresasmineradoras geralmente ilegais que atuam na região), o desmatamento ouuso irracional do solo abre caminho para drásticos processos erosivos,gerando ravinamento com sulcos que chegam a atingir 20 metros deprofundidade.

Por outro lado, consoante a existência de pré-condições do meio físico,a lei admite praticamente todos os usos normais de solo: residencial,industrial, comercial (menos o atacadista), serviços e institucional, lazer eatividades hortifrutícolas, florestamento, reflorestamento e extração vegetal.Apenas nas áreas de primeira categoria, as restrições são em maior grau,pois se tratam de regiões que pela vizinhança com a Represa e/ou pelainadequação do ambiente físico não poderiam assimilar um forteadensamento populacional.

A Lei de Proteção aos Mananciais tem sob sua jurisdiçãoaproximadamente mais da metade da RMGSP (51%). A abrangência territorialda Lei varia consideravelmente de município a município, em decorrência departicularismos geofísicos e hidrográficos. No Grande ABC, apenas omunicípio de São Caetano do Sul está localizado inteiramente fora da linhados mananciais. Rio Grande da Serra e Ribeirão Pires, por sua vez, estãototalmente dentro da área de preservação. São Bernardo do Campo tem 70%de seu território em área de proteção aos mananciais. Santo André, quase60%, ao passo que Mauá e Diadema, aproximadamente 19%.

Do ponto de vista geográfico, o Grande ABC é detentor de importantesmananciais, que aliados à presença marcante do Reservatório da Billings,confere a estes municípios o importante papel de "guardiões da qualidade daágua produzida e consumida pelos 17 milhões de habitantes da metrópole" (inSEMASA, 1991:17).

A importância destes mananciais se acentua, em termos da realidadelocal, pela precariedade do abastecimento fornecido pelas companhias dedistribuição de água do Estado de São Paulo (SABESP). O Grande ABC écastigado por um severo racionamento, impondo um impopular sistema derodízio. Os quatro metros cúbicos por segundo que são captados da Billingspara atender a demanda em São Bernardo do Campo, Santo André e São

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Caetano do Sul, são indispensáveis para evitar um colapso no abastecimentoregional de água (17).

OS MUNICÍPIOS DO ABCDMR E A LEI DE PROTEÇÃO AOS MANANCIAIS(Reproduzido da edição de 11-07-1992 do Diário do Grande ABC)

Na medida em que a região do Grande ABC espacializa tendências cujaexplicação reporta a um contexto muito mais amplo e é indissociável destenódulo do Tempo-Espaço da Modernidade que é a RMGSP (o que nãointerfere com os postulados de sua relativa autonomia no interior da RegiãoMetropolitana), as propostas do PMDI teriam um efeito necessariamentebenéfico por ordenar e direcionar tendências de crescimento que nãopoderiam ser administradas em nível meramente local.

É de se ressalvar que na RMGSP, a região do Grande ABC é oconglomerado urbano mais importante depois da capital. Nos três municípiosmais influentes, a saber, São Bernardo do Campo, Santo André e SãoCaetano do Sul, sua população é detentora de indicadores de padrão de vidacomparáveis às economias do Primeiro Mundo. Sua renda per capita,aproximadamente o dobro da registrada na Capital, possibilita um elevadopadrão de consumo, típico das chamadas sociedades afluentes.

A posse de alguns bens ajuda a medir a qualidade de vida no ABC. Deacordo com pesquisa realizada pelo Instituto Municipal de Ensino Superior deSão Caetano do Sul (IMES), 98,5% das famílias possuem geladeira, 91,8%TV a cores, 71,7% máquina de lavar, 63,7% automóvel, 51,6% telefone,39,4% videocassete e 18,5% freezer (citado in PENHA, 1992). Também

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coerentemente, o ABC apresenta ainda uma ampla rede de restaurantes,shoppings e lojas de alto padrão, que atendem o elevado perfil de consumodos seus habitantes.

Ao mesmo tempo, o ABC não escapa do binômio crescimento epobreza que marca o conjunto das cidades da RMGSP. A deterioração dascondições de vida da maior parte da população brasileira, apontada já nadécada de 70 em estudos encaminhados por setores que se opunham àvigência do modelo implantado pelo Golpe Militar de 1964 (Vide SÃO PAULO,1975), nunca cessou de se aprofundar.

É de se notar que, apesar da desconcentração industrial verificada naRMGSP, devido ao deslocamento das indústrias para a Região Metropolitanade Campinas, Ribeirão Preto e Vale do Paraíba e mesmo para outros estadosda federação, provocando diminuição das taxas de crescimento demográficona Região Metropolitana, “este continua a ocorrer em ritmo mais acelerado doque o do Brasil, o do Estado de São Paulo e mesmo o do município de SãoPaulo” (SOBRAL, 1991: 23).

Em outras palavras, isto, significa colocar parte significativa da"absorção" de migrantes, que acudiram de forma incessante para osmunicípios do ABC, terminaram por instalar-se precariamente na área destesmunicípios, especialmente nos mananciais de São Bernardo do Campo. Esteincremento demográfico trouxe centenas de milhares de novos moradoresque além de despreparados para enfrentar um mercado de trabalho exigentee uma economia urbana altamente sofisticada, não possuíam condiçõesobjetivas de inserção em face de mudanças do perfil sócio-econômico quelentamente foram se desenhando na região.

Entre estas tendências, está a da terceirização da economia regional,um quadro de mudanças que, aliás, também se afirma na capital (Ver nestesentido, PENHA, 1993). Nestes novos marcos, nota-se urna queda do pesorelativo da indústria, substituído pelo crescimento do comércio e do setor deserviços. Este dado tornou-se óbvio para os profissionais que atuam na áreado planejamento urbano no ABC e assim sendo, passou a ser seguidamentecontemplado nas avaliações pertinentes aos Planos Diretores e em outrosdocumentos técnicos.

Ressalve-se, porém que esta tendência não necessariamenteredundaria em saúde econômica ABC. Declarou a respeito a economistaMaria do Carmo Romeiro, "A recessão econômica atinge principalmente osetor industrial e obriga a drásticas reduções de mão-de-obra por parte dasempresas e até o fechamento de algumas. O resultado, é que, mesmo emexpansão, o setor terciário não consegue absorver todos os trabalhadoresliberados pela indústria" (in PENHA, 1992).

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Berço da indústria automobilística, cidade conhecida em todo o Brasilcomo uma possível porta de entrada na modernidade, São Bernardo doCampo foi, de todas as cidades do ABC, A que mais se ressentiu do intensoincremento populacional. Sabe-se, com base em estudos realizados durantevários anos pelo IBGE, que o crescimento migratório é de longe superior aocrescimento natural da cidade.

De acordo com projeções, na cidade a taxa de crescimento demigrantes seria de 2,23 quando na Grande São Paulo era de 1,19 e noEstado de São Paulo, de 0,80. Dados da própria Prefeitura Municipal de SãoBernardo do Campo indicam que 60% do demográfico do município - quesaltou de 425 mil habitantes em 1980 para aproximadamente 700 mil em 1992- deve-se à chegada de migrantes, contingente este caracterizado pormanifesta falta de preparo profissional (Ver “Migração dificulta planejamentoem São Bernardo, edição de 16 de Maio de 1992 do “Diário do Grande ABC”).

Pelo menos parcialmente, e apesar da alteração do perfil urbano dacidade na direção de um pólo de serviços, a atração desta corrente migratóriase justifica por uma miragem urbana que continua a identificar a cidade,malgrado as profundas transformações dos últimos anos, como um espaço deemprego fácil e de altos salários. Isto, apesar da tendência caminhar emsentido exatamente oposto, qual seja, a de absorver mão-de-obra qualificadae alto nível de especialização.

Naturalmente, e reforçando as demais informações que já incorporamosa este texto, não podemos deixar de destacar tais tendências comodecorrentes da ligação que a cidade mantém com a vasta conurbação que é aRMGSP, particularmente com os municípios congêneres do ABC e a capital,São Paulo. Nuance nem sempre enfatizada pelos especialistas, São Bernardodo Campo inscreve-se num contexto histórico no qual os problemas urbanossão mais e mais metropolitanos, determinados pelo intenso intercambio queas cidades da RMGSP mantém entre si. Por conseguinte, as dinâmicasregistradas no município são um reflexo e simultaneamente, elemento indutordos fluxos espaciais que perpassam pela RMGSP e quiçá, pelo conjunto doterritório nacional.

Estas condições, às quais devemos somar um quadro de recessãoeconômica e de concentração de renda que tem demonstrado extremainsistência em ser perpetuado, criaram uma população empobrecida sem asmínimas possibilidades de acesso à moradia adequada. A crise habitacional,conseqüência lógica deste processo, se instala e é catalisada pelaespeculação imobiliária, que retém terras vazias visando posterior valorização(18).

O fenômeno do crescimento dos bolsões de pobreza (seria por sinal,mais exato argumentar na direção de bolsões de riqueza, ilhados num mar de

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miséria) é a melhor tradução de uma dinâmica urbana que formou, em poucosanos, um Exército Industrial de Reserva "muito maior do que as possíveisnecessidades de exploração” (Ver neste sentido, VIANA, 1982:126). Atiradospara "nichos ecológicos desfavoráveis", estes excluídos formam imensosbolsões de pobreza crítica, "que ao mesmo tempo em que são maissuscetíveis ao processo de degradação em curso, são também, agentesimportantes deste processo" (SOBRAL, 1991: 24).

No caso de São Bernardo do Campo, esta Torção do Tempo-Espaçorespondeu nomeadamente pela atuação da especulação imobiliária, cujoprincipal alvo são os mananciais responsáveis pela manutenção das águas doreservatório. Estas terras, na perspectiva de uma ocupação irregular, poroferecerem alto risco para seus ocupantes e por sofrerem restrições legais(pela Lei de Proteção aos Mananciais) - são sub-valorizadas no mercadoimobiliário e conseqüentemente oferecidas, a preços baixos, para a populaçãocarente (Vide LUSTOZA, 1991).

Embora esta prática tenha amplo registro histórico nos municípiosvizinhos, é em São Bernardo do Campo que a especulação imobiliária ganhoumaior notoriedade. Esta caótica situação foi ilustrada pelo Recenseamento doIBGE de 1991, que indicava 20% da população habitando favelas, boa partedas quais situada além da linha de proteção, contra 8% da média do ABCD(“Diário do Grande ABC”, edição de 23 de Janeiro de 1991).

No Distrito do Riacho Grande, um dos mais atingidos na cidade, 65%das construções existentes no bairro são irregulares, índice que faz analogiacom um outro, que indica 157% de crescimento populacional no bairro, contra27% para o ABCD como um todo (19). Estas ocupações geram um pesadoônus para a economia urbana, pois situadas em áreas impróprias parahabitação, importam em pesados investimentos de infra-estrutura, arcadospelos contribuintes seja diretamente, pela locação orçamentária de recursosobtidos através de impostos, seja indiretamente, pelo pagamento deempréstimos obtidos junto a bancos e agências financiadoras.

Mesmo assim, as ocupações têm sido uma prática constante na históriado Grande ABC. No geral, elas são negociadas com vistas a garantir asambições políticas dos próprios agentes do loteamento clandestino ou daslideranças que despontam nos movimentos de ocupação. A formação de"Associações de Moradores" tem sido a fachada usual para encobrir asatividades da especulação (20).

Para Nilton Hernandes, veterano militante ambientalista do GrandeABC, a invasão de áreas protegidas por loteamentos clandestinos temenriquecido imobiliárias e proporcionado indiscutíveis ganhos políticos: "Nãoimporta o partido no poder: todos ajudam os loteamentos, dando material de

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construção ou simplesmente fechando os olhos. Vereadores, prefeitos ecandidatos, criam verdadeiros currais eleitorais, trocando apoio por votos".

A foto acima mostra uma favela situada em área de risco na região dos mananciais de SãoBernardo do Campo. No canto direito da foto, para evidenciar a escala do ravinamento, estáVera Rotondo, na ocasião assessora ambientalista do Vereador Wagner Lino Alves. Em razãodo perfil pedológico deste solo, no qual predomina o silte, as constantes precipitaçõespluviométricas, através da erosão laminar, originaram a formação de sulcos profundos, naordem de dez a quinze metros nesta foto, que terminam inapelavelmente por engolir, em meioa chuvas torrenciais, os habitantes destas precárias construções (Foto da Iconoteca doGabinete do Vereador Wagner Lino Alves).

Quando eleitos estes mesmos interlocutores da ocupação repetemnovamente o processo e passam a pressionar o poder público para aimplantação de melhorias e equipamentos urbanos (tais como Postos deSaúde, Linhas de ônibus, Água, Luz e Esgoto), tornando irreversíveis asocupações. O resultado é uma violenta degradação do meio ambiente,comprometendo recursos que deveriam ficar disponíveis para as geraçõesfuturas, e entre eles, o vital fornecimento da água.

Em larga medida, esta explosiva situação, gerando uma polêmica que,equivocadamente para alguns, estaria opondo o movimento ecológico e o demoradia (21), foi uma das mais graves conseqüências da não implementaçãodo PMDI na década de 70. Apesar de incluir aspectos altamente positivos,este plano foi interrompido por constranger vários esquemas tradicionais defavoritismo político e econômico. Basta lembrar que este era um plano barato,eficiente, não contemplava os interesses da especulação imobiliária, do

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capital estrangeiro e tampouco os do primado energético durante décadasdefendido ardorosamente pela Light e posteriormente pela Eletropaulo.

Embora a Solução Integrada não defendesse a cessação das atividadesda UHE Cubatão - pelo contrário, pressupunha a convivência das duasutilizações - a diminuição da vazão do Reservatório foi por si só suficientepara incomodar a Eletrocracia da empresa. Verdadeiro triunfo para osdefensores de uma Não-Política Metropolitana, a interrupção do PMDIfavoreceu o setor elétrico, as grandes empreiteiras, o mercado imobiliário e osórgãos dedicados à elaboração de Mega-Projetos, voltados ao monitoramentode mega-problemas criados justamente pelo adiamento anterior dasresoluções para o crescimento metropolitano.

As áreas de mananciais, que continuaram sob proteção legalterminaram informalmente solicitadas para absorver os impactos de não-medidas metropolitanas. Assistiram ao crescimento desordenado que éinerente ao modelo econômico brasileiro, concentrador de renda esocialmente excludente. Abandonadas pelo Governo Estadual, quecoerentemente sucateou a fiscalização dos mananciais e pleiteadas ainda,por diferentes administrações municipais, como áreas para futura expansãourbana (22), a tragédia dos mananciais é, indiscutivelmente, uma das maisdantescas e inacreditáveis agressões já feitas contra o meio ambiente e asociedade civil brasileira.

O movimento ambientalista do Grande ABC, o primeiro segmento dasociedade civil a endossar e a mobilizar-se na defesa de uma lei que pareciaesquecida por todos, assim como de um Plano Diretor de Esgotos, a SoluçãoIntegrada, cuja genialidade residia em sua simplicidade (e talvez por issomesmo sepultada pelo faraônico Projeto SANEGRAN), continuou, apesar doreduzido número de militantes e do continuo boicote exercido pelosrepresentantes do poder público em todos os níveis, a defender as premissasde um crescimento mais disciplinado, o mínimo que se poderia exigir parauma mega-metrópole que, é, ela mesma, “uma expressão de uma relaçãoequivocada entre o homem e o meio ambiente" (Carta do Vale do Rio Juquerie da Serra da Cantareira).

Em nome do interesse público, o movimento ambientalista pressionouconstantemente os Governos Estaduais com o fito de solucionar a calamitosasituação da Represa Billings, Conseguiu em 1933, que a AdministraçãoEstadual (mandato do Governador Franco Montoro) cessasse por dez meseso bombeamento de esgotos. Demonstrando extraordinário poder derecuperação, durante este período, batizado de Operação Saneamento,houve significativa recuperação da qualidade das águas, inclusive nos trechospermanentemente sem oxigênio, as manchas anaeróbicas, que visivelmenteretraíram em diversos pontos do reservatório.

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Mas, esta vitória durou pouco, e logo em seguida, os esgotos voltarama empestear as águas do Reservatório. O movimento ecológico nãoesmoreceu. Graças a sua atuação, foi conquistada junto ao LegislativoEstadual, a Disposição Transitória nº 46, que explicitamente define: "No prazode três anos, a contar da promulgação da Constituição, ficam os poderespúblico Estadual e Municipal obrigados a tomar medidas eficazes para impediro bombeamento de águas servidas, dejetos e outras substâncias poluentes naRepresa Billings". Este prazo, que findou em 05 de outubro de 1992, foi porsua vez outro grande marco nas mobilizações ambientalistas da região: aCampanha Viva a Billings Viva.

Mesmo com escassa repercussão junto ao insensível poder público, omovimento ecológico logrou tornar a questão da Billings e dos mananciais umtema de conhecimento nacional. As imagens de mortandades de peixes, deesgoto in natura atirado no Reservatório e da devastação das suas margens,conquistaram espaço no noticiário da grande imprensa e das cadeias detelevisão. Tornaram-se o símbolo mais acabado da incúria dos grandesinteresses econômicos pela questão ambiental.

Todos estes apontamentos, representativos dos limites da questãoambiental frente à política, ganharam uma coloração especifica durante aAdministração Democrática e Popular de São Bernardo do Campo. Umaconjunção de fatores contraditórios, parte dos quais registrei nos parágrafosanteriores, deixaram uma marca na história política da cidade, determinadospor uma lógica que doravante, estarei preocupado em decriptar.

IV - OS LIMITES DA NÃO-POLÍTICA FRENTE À QUESTÃO AMBIENTAL

O fato de estar me detendo, nesta última parte do ensaio, no micro-cosmo de São Bernardo do Campo, não é fortuito e muito menos, destituídode implicações. Não é demasiado repetir, São Bernardo do Campo possuienorme importância na perspectiva de uma Ecologia Política dos Mananciais,seja pelo fato da ser uma cidade guardiã de extensão significativa de áreas deproteção ambiental, seja por ter sido governada por uma Administraçãomarcada simbolicamente com o signo do popular, do excluído e do bempúblico.

Embora já tenhamos colocado que São Bernardo do Campo nãorepresenta as ADP em termos da política ambiental realmente explicitada, poroutro lado constitui uma antiexperiência altamente representativa dosinevitáveis desvios políticos aos quais as forças originárias do "campopopular" estão sujeitas quando não interiorizam a questão ambiental.Podemos asseverar, a guisa de alerta, que tais desvios no futuro poderãoderivar nas mais trágicas conseqüências, pelo que a análise desta ADP podeencerrar uma profunda validade política.

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Isto posto, podemos então afunilar nosso ensaio sem perder de vistaaqueles parâmetros maiores que regem, soberanamente, a polêmica dosmananciais, quais sejam, o da política de gestão dos recursos hídricos e suainterface com as não-políticas metropolitanas na RMGSP.

Há que se recordar que os pleitos eleitorais de 1988 brindaram oPartido dos Trabalhadores com a conquista de vários municípios deconsiderável importância no cenário político e econômico nacional. Juntas, ascidades doravante governadas pelo Partido representavam uma quarta partedo PIB brasileiro e várias dentre estas urbes, detinham o papel de centrosdinâmicos da formação sócio-espacial brasileira.

Cidades como Porto Alegre, Vitória, São Paulo, Santos, Santo André eSão Bernardo do Campo, entre outras, são reconhecidamente municípios dedestaque na rede urbana nacional e, por conseguinte, pólos de elaboração depolíticas urbanas. O potencial reprodutor de exemplos de cidades como ascitadas era enorme, não se restringindo a escala regional ou estadual, masrepercutindo para o conjunto do país.

É de se sublinhar que as ADP, frente à questão dos loteamentosclandestinos, tiveram uma postura similar, embora as medidas variassem deum município para outro. Em São Paulo, a Prefeita Luiza Erundina, porexemplo, embora com postura vacilante em vários momentos, de um modogeral acionou os mecanismos legais existentes no combate aos loteadores erespaldou estas iniciativas com campanhas de esclarecimento para apopulação carente com enfoque na questão da água e da educaçãoambiental.

Em Santo André, o Prefeito Celso Daniel, além de aplicar medidas decunho idêntico, criou logo no início do mandato, uma Assessoria de MeioAmbiente, sob cuja responsabilidade estava uma "Guarda EcológicaMunicipal", também iniciativa de sua administração. Os efetivos desta Guarda,superiores ao da Polícia Florestal do Governo do Estado de São Paulo - aquem em tese caberia a vigilância na Área de Proteção aos Mananciais -desenvolveram excelente trabalho de fiscalização, suprindo uma lacuna quepremeditadamente fora criada pela própria Administração Estadual.

Já em Diadema, o Prefeito José Augusto, sem a preocupação em criarinstâncias ou órgãos institucionais de Meio Ambiente, resolveu a questãoapelando para medidas mais diretas: colocou sumariamente todos osloteadores na cadeia.

No contexto do Grande ABC, ganhou destaque especial a PM de SantoAndré pelo seu empenho em pensar regionalmente as questões do ABC. Seuprefeito, Celso Daniel (assassinado no início de 2002), desenvolveu grandes

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esforços para a constituição do Consórcio Inter-Municipal das Bacias do AltoTamanduatei e Billings , ou abreviadamente, Consórcio. Criado em 1990 pararepresentar o conjunto dos municípios do ABC, o Consórcio objetivava aexecução de projetos de interesse comum, entre eles vários com nítidointeresse ambiental (resíduos sólidos, captação de água, diretrizes decrescimento urbano, etc).

Face ao exposto, é fácil perceber o caráter estratégico de São Bernardodo Campo. Cidade de importância impar no espaço brasileiro, no da RMGSPe no Grande ABC, o peso político do município seria uma contribuiçãoimportante no sentido de influenciar várias outras administrações na senda deuma postura ambiental correta, fazendo frente comum com as demais ADP.

Independentemente dos fatores políticos mais amplos, internamente,além da questão relacionada aos mananciais, a cidade apresentava aindauma impressionante série de problemas ambientais. Entre eles poderíamoscitar:

. Presença de um alarmante trânsito de cargas perigosas no ComplexoAnchieta-Imigrantes, composto de produtos químicos, tóxicos e radioativosque circulam sem controle pelas estradas;

. Elevados índices de poluição sonora;

. Presença de abundante concentração de material particulado naatmosfera (a região do Bairro da Paulicéia é considerada a mais poluída doEstado depois de Cubatão);

. A questão da arborização das ruas, parques e jardins e da poda deárvores;

. O problema das enchentes, sensivelmente agravado pela agregaçãoindiscriminada de terrenos ao tecido urbano;

. Contaminação de lençóis freáticos, inviabilizando muitas das bicas edos poços utilizados pela população.

Estes problemas, extremamente graves e afetando o cotidiano de todosos habitantes da cidade, somados à questão dos Mananciais, seriam mais doque suficientes para assegurar a adoção imediata de medidas visando contera degradação ambiental do município, inscrevendo-as no rol de uma autênticaReforma Ambiental.

Entretanto, esta não só não ocorreu, como os sujeitos políticosenvolvidos na defesa desta demanda terminaram marginalizados pelaAdministração. A gravidade deste histórico não se estabelece, conforme seria

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a pretensão de algumas avaliações, nos termos de localizar o conflito emtermos da existência formal ou não da Coordenadoria do Meio Ambiente(CMA), uma antiga reivindicação do movimento ambientalista local.

A foto registra instantâneo de palestra ministrada em São Bernardo do Campo em 11-06-1989,em cerimônia alusiva ao Dia Internacional do Meio Ambiente, quando o autor deste ensaioexercia o comando da Sub-Secretaria de Ecologistas do PT Estadual de São Paulo. Do ladoesquerdo, o Vereador Wagner Lino Alves, então presidente da Comissão de Meio Ambiente daCâmara Municipal de São Bernardo do Campo e atualmente exercendo advocacia no GrandeABC. No lado direito, está o geólogo Cláudio Maretti, também representando a Sub-Secretaria.Cláudio Maretti, parceiro de muitas lutas e iniciativas, posteriormente atuou no arquipélagodas Ilhas Bijagós, na República da Guiné-Bissau e em diversas instâncias relacionadas com omeio-ambiente (Foto gentilmente cedida pelo Gabinete do Vereador Wagner Lino Alves).

Colocar o conflito nestes termos é esvaziá-lo de seu sentido políticomais profundo e encarcerá-lo nos marcos de uma discussão burocrática. Maisdo que isto, a contradição entre a Questão Ambiental e a Administraçãoresultaram das resistências colocadas por esta última relativamente àelaboração de uma Política Ambiental para a cidade, razão concreta paratodos os impasses surgidos internamente no poder público municipal.

Faz-se necessário lembrar, em nome de uma explanação mais precisa,da presença de variáveis externas a São Bernardo do Campo de relevanteinfluência para o desenrolar dos acontecimentos na ADP. Entre estas, a deque o Partido dos Trabalhadores jamais definiu em toda a sua complexidade,o perfil da questão ambiental na ótica dos interesses populares.

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A questão ambiental, assim como outras consideradas como “de caráteralternativo” (como a das mulheres, negros e portadores de deficiência),sempre causaram certo embaraço interno e a inserção destas discussões nodiscurso partidário sempre se desenvolveu enfrentando toda sorte deresistências e quando muito, incorporadas pontualmente.

Entre os motivos, podemos arrolar primazia dos temas originários dochamado mundo do trabalho, em razão da influência, especialmente numprimeiro momento da existência do PT, das acepções marxistas ortodoxas.Posteriormente, a hegemonia de um discurso social-democrático, entrelaçadocom uma perspectiva tecnicista, contribuiu também para secundarizar aquestão do meio ambiente como uma possível matriz para a elaboração deuma política pública urbana, transformando-a na realidade num apêndice dapauta tradicional de discussões (Ver neste sentido, WALDMAN, 1992C).

Neste contexto, a atuação das ADP no trato da questão ambiental,terminou por inserir-se numa ordem de argumentações reformista, na qual oessencial passou a ser um crescimento urbano equilibrado, associado apenasindiretamente com considerações de mote ambiental. Neste particular, éexemplar a assimilação pelas ADP de um discurso de índole técnica,respaldado nos conceitos de desenvolvimento sustentável e do manejoracional dos recursos, que sendo ambíguos e contraditórios, prestam-se atoda sorte de manipulações (Vide entre outros, WALDMAN, 1992 e 1992C).

Em síntese, e nesta observação não há nenhum desagravo para comas medidas de interesse ambiental desenvolvidas pelas ADP, a questãoambiental tornou-se alvo de uma política de ajustes e correções e por issomesmo, não subentendendo uma estratégia ambiental comum por parte dasADP, até porque, conforme já explicitamos, o meio ambiente, ao contrário dediversos outros temas, sempre constituiu uma lacuna na cultura política doPartido (23).

Em São Bernardo do Campo, este vácuo viu-se particularmentefavorecido pela hegemonia de um discurso partidário eivado de conotaçõesobreiras, caracterizado por uma terminologia capacitada a abrigar as maisdispares tendências políticas. Isto explica o porque do ingresso de loteadoresclandestinos no Partido e a continuidade da carreira política de vereadoresvinculados a este esquema na agremiação. Simultaneamente, estes atoressociais coexistiam com militantes dos movimentos de moradia e o ecológico,uma situação paradoxal durante muitos anos mantida sob tensão potencial, sóganhando maior visibilidade no momento em que o Partido foi alçado àadministração do município.

Dadas estas contradições, não admira que o desenrolar da campanhaeleitoral, aparte a Plataforma Democrática e Popular defender "um PlanoDiretor baseado no crescimento harmônico e ecologicamente equilibrado do

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município" e apoiar, "a organização dos Conselhos Populares" (24), tenha sepautado em várias situações por promessas de implementação de infra-estrutura urbana para áreas de Manancial loteadas pela especulaçãoimobiliária. Mais tarde, estas seriam origem de incidentes envolvendo aAdministração com a violação da Lei de Proteção aos Mananciais,ocasionando atritos generalizados com o movimento ecológico.

A possibilidade de o Partido alçar-se como um espaço para efetivaresolução desta problemática, já comprometida pela presença decompromissados com a degradação ambiental em seu próprio interior, viu-seconsideravelmente agravada pelos distúrbios que, sumamente,caracterizaram a relação mantida entre a Administração Municipal e o PT,contaminando todos os níveis de relacionamento. Sobremaneira, destacamoso entendimento do então Prefeito Maurício Soares, de que o mandato seria desua exclusiva competência, “não admitindo ingerências do Partido nasdiretrizes traçadas pela Administração” (25).

As tensões resultantes deste posicionamento foram acirradas ao longodo mandato, por diversos conflitos envolvendo a ADP com os movimentossociais organizados na cidade. Para além dos conhecidos problemas com omovimento ambientalista, há que se notar os sérios atritos ocorridos com omovimento feminista - por conta da retomada pela ADP de três imóveiscedidos em 1988 ao Comitê de Mulheres de São Bernardo do Campo peloprefeito Aron Galante - e um virtual rompimento com a Central única dosTrabalhadores (CUT) face às atitudes da ADP quando das greves dofuncionalismo municipal.

Esta somatória de fatores desembocou, nos final de 1990, em umrompimento público do então Prefeito com o seu Partido, tendo por pretexto onão cumprimento, por parte de Maurício Soares, de resolução do Partidoproibindo, durante o segundo turno das Eleições de 1990, o apoio a AntonioFleury Filho, candidato do PMDB ao governo estadual.

Esta ruptura, que na realidade obedecia a uma estratégia de retornoposterior ao Partido e dando, a Maurício Soares, "maior liberdade de ação”,causou forte impacto político e naquele contexto, no qual o Partido ainda seressentia da derrota presidencial frente a Fernando Collor de Mello (1989) edo insucesso das suas campanhas na disputa dos Governos Estaduais(também em 1990), a perda de uma Prefeitura da importância de SãoBernardo do Campo - reforçada simbolicamente pela cidade ser o berço doPT – seria de molde a gerar indiscutível desgaste político (26).

Dividido internamente entre os que propunham a exclusão de MaurícioSoares da vida partidária e os que, de uma forma ou de outra, propunham aassimilação do episódio, o Partido optou pelo acordo e pela negociação,visando a volta do Prefeito aos marcos do PT. Esta atitude contou com visível

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apoio do Presidente Nacional do Partido dos Trabalhadores, Luis Inácio Lulada Silva, e com o respaldo de forte corrente interna de opinião de instânciaspartidárias em nível local, estadual e nacional.

Quanto ao Secretariado, este manteve - com a possível exceção doSecretário de obras, Laurentino Hilário, mais transparente em seu apoio aoPrefeito - um cauteloso silêncio durante a maior parte deste episódio.Retornando com mais força ao Partido, Mauricio Soares passou a exercer omandato com maior liberdade e o Partido, passou a manter uma prudentedistância de seus atos administrativos.

No que respeita às intenções deste ensaio - a Questão dos Mananciais- esta sucessão de fatos trouxe inequívocas repercussões negativas. Muitoembora, no início da ADP - no que é exemplarmente representativo das suascontradições internas - o Departamento Jurídico da PMSBC (na época, tendoo Advogado Pedro Estevam Serrano como titular), tivesse iniciado açõescontra os especuladores de terra, derivando inclusive na expulsão de partedos implicados do PT, em 1991, a situação era outra.

Na evolução do mandato, a correlação interna de forças dentro daAdministração, dava claras mostras de supremacia para os segmentos quedefendiam a ocupação dos Mananciais. Seus interlocutores mais explícitosseriam o Vereador José Ferreira no plano da Bancada Municipal do PT e oSecretário de Obras, Laurentino Hilário. Outro expoente desta tese, oSecretário do Planejamento, Taiti Inemani, embora atuasse com maiordiscrição, respondia, juntamente com o Chefe de Divisão da Secretaria, aArquiteta Denise Maria Ziober, pela formulação de projetos de “manejoracional” e “auto-sustentáveis” de ocupação destas áreas.

Ressalte-se que, afora as possíveis divergências quanto à forma deocupar os mananciais, não existiam dúvidas quanto à pertinência em ocupá-los. Assim sendo, as divergências entre a SEPLAN - Secretaria doPlanejamento, a SO - Secretaria de Obras e eventualmente, com a SH -Secretaria da Habitação, não contestavam os Mananciais como área de futuraexpansão urbana. Basicamente, os desacordos reportavam às disputas porespaço político na ADP, e um conflito quanto às competências administrativase em especial no caso da SEPLAN, quanto à metodologia e aos aportestécnicos de ocupação.

Quanto ao movimento ambientalista da cidade, este já havia cessadoseu diálogo com a PMSBC. O motivo principal era a conivência daAdministração quanto à instalação de loteamentos clandestinos nosMananciais. Outros motivos podem ser localizados nos choques ocorridosentre as Ongs locais e a SEPLAN, então responsável, na pessoa da ArquitetaDenise Ziober, pelo CONDEMA (Conselho Municipal de Meio Ambiente), quenão sendo oficializado, reunia-se informalmente.

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Tendo estes arranjos como pano-de-fundo, a progressão dadegradação ambiental avançava de forma a dar claras mostras de umaautêntica calamidade pública. A imprensa emitia sucessivas reportagenssobre o avanço dos loteamentos nas áreas de manancial e uma destas,publicada pelo jornal O Diário do Grande ABC, em 23 de Janeiro de 1991("São Bernardo já perdeu mais da metade de sua área de Manancial")provocou grande polêmica e a proposta de instalação de uma ComissãoParlamentar de Inquérito (CPI) voltada para investigar a criação deloteamentos clandestinos na Área de Proteção aos Mananciais.

Proposta defendida em Fevereiro daquele ano pelo Vereador AdemirSilvestre (ex-PT, na ocasião integrante do PSB), foi debatida e aprovada emMarço pela Câmara Municipal de São Bernardo do Campo (CPISBC) eformalmente instituída em 13 de Maio daquele mesmo ano. Esta CPI, ou CPIdos Mananciais, como passou a ser conhecida, provocou as mais violentasreações por parte dos loteadores clandestinos, que chegaram a organizarpasseatas com centenas de moradores da Área dos Mananciais com oobjetivo de influenciar a opinião pública e protestar contra a CPI.

Neste cenário, o anúncio pelo Prefeito Maurício Soares, de intenção emcriar a Coordenadoria do Meio Ambiente - CMA - um valioso instrumento, aolado do CONDEMA, para a instalação do Sistema de Administração deQualidade Ambiental, previstos no artigo n9 241 da Lei Orgânica doMunicípio, pouco poderia representar enquanto uma nova orientaçãoambiental da ADP. Suscitando uma vaga esperança junto aos setores que,dentro e fora da Administração, preocupavam-se efetivamente com o quadroambiental critico do município, o tempo, todavia, demonstrou que asexpectativas da Administração, pelo contrário, se pautava pelo desejo emcriar um marketing ecológico-institucional, uma cortina de fumaça, destinada aconfundir a opinião pública, crescentemente sensibilizada pelas constantesdenúncias contrárias à Administração (27).

Durante os quase 16 meses de atuação informal da CMA, a ADP nãocumpriu nenhuma das formalidades necessárias para a implementação donovo órgão. O Projeto de formação da CMA, que contou com a colaboraçãodo movimento ecologista local (processo nº 6269), não foi encaminhado pelaSEPLAN, a quem caberia esta responsabilidade político-burocrática etambém, não foi contemplado no Projeto de Reforma Administrativa, que sedesenrolou ao longo do segundo semestre de 1991. A CMA não foi dotada deverba orçamentária, de pessoal técnico, de infra-estrutura para funcionamentoe não foi requisitada para participar de importantes decisões com interfacecom a Questão Ambiental, como no caso do Plano Diretor da cidade.

Esta constrangedora situação motivou constantes solicitações para quea situação da CMA fosse regularizada. Já no terceiro mês de mandato, foi

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elaborado um contundente documento a respeito, distribuído para o conjuntodo Secretariado, a totalidade da Bancada do Partido na CMSBC, para aExecutiva do Diretório Municipal do PT e também para o Presidente Nacionaldo PT, Luís Inácio Lula da Silva. Mesmo que o texto deste documento jáprenunciasse uma rota de colisão com a Administração, nenhuma providênciafoi tomada (28).

Jornal Gazeta Independente, de São Bernardo do Campo, edição de 01-11-1991.

Entre 05 de Março de 1991 e 31 de Julho de 1992, a CMA posicionou-se claramente por uma postura reclamando firme posicionamento da ADPfrente aos loteamentos clandestinos, defendendo uma política habitacionaladequada ao quadro sócio-ambiental da cidade e a implementação demedidas de controle ambiental.

O fato de nunca ter sido ouvida, significa que a própria CMA, por terassumido integralmente o papel que a justificaria, terminou ela mesma vítimada não-política ambiental. Tornou-se uma não-questão, uma não-secretaria equando de seu posicionamento frente a um episódio de devastação de MataAtlântica em um loteamento situado literalmente rio encostamento da ViaAnchieta, trecho pelo qual transitavam diariamente milhares de veículos e,portanto, um incidente de domínio público, provocou irascível reação daAdministração e a exoneração de seu titular (31 de Julho de 1992).

É mister também ressaltar que, no curto lapso de tempo em que a CMA,mesmo informalmente, possuía um interlocutor direto, transcorreram na regiãodo Grande ABC, diversas mobilizações ecologistas de grande envergadura,

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apoiadas incondicional e irrestritamente pela Coordenadoria, como o VICongresso Paulista de Ecologistas e Pacifistas (realizado em São Bernardodo Campo, de 6 a 8 de Setembro de 1991), o Seminário Meio Ambiente, Vidae Trabalho (realizado no Sindicato dos Metalúrgicos de São Bernardo doCampo e Diadema em 23124 de Novembro de 1991) e particularmente, aCampanha Viva a Billings Viva (Março a outubro de 1992).

Diário do Grande ABC, edição de 05-02-1992.

Todos estes eventos, desenvolvidos na atmosfera do Fórum Global doECO-92, nunca representaram, apesar do apoio da CMA, uma tomada de

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posição da Prefeitura, mesmo porque este apoio sobreveio a despeito e nãoconsoante a ADP. Mas, tiveram ao longo do tempo, uma repercussãoextremamente positiva para a região.

Por sua vez, a Administração continuou a encaminhar sua não-política,não hesitando, apesar da CPI dos Mananciais estar em curso, emimplementar obras de infra-estrutura em loteamentos clandestinos, como nocaso do Bairro dos Casa, envolvendo o virtual pré-candidato do Partido àsucessão, o secretário de Obras Laurentino Hilário (Ver edições de 30/09/1991 e dos dias seguintes do "Diário do Grande ABC").

Irregularidade evidente, uma entre muitas outras, não sensibilizou,apesar dos protestos provocados no interior do Partido qualquer alteração danão-política, em cuja defesa acudiu inclusive o Secretário de AssuntosJurídicos, Antônio Sampaio ("Secretário diz que não pode fazer nada contra avenda ilegal de lotes", edição de 08/10/1991 do "Diário do Grande ABC").

Por outro lado, numa demonstração da plasticidade das teses dodesenvolvimento sustentado, a elas recorreu a SEPLAN para suasformulações técnicas. Convencida de que necessitava da ocupação dosMananciais, mas, ao mesmo tempo, preocupada em manifestar-se a respeitodos impactos ambientais em vista do intenso destaque dado pelos veículos decomunicação, a SEPLAN, ao invés de aprofundar a discussão no sentido deanalisar a problemática dentro de uma realidade sócio-econômica, encontrouum meio-termo inusitado: o loteamento ecológico, proposta acolhida comsatisfação pelos loteadores e coerentemente, pelo Vereador José Ferreira(29).

Por último, o Prefeito Mauricio Soares, explicitamente origem deste rolde manifestações, destacou-se como um crítico feroz da Lei de Proteção aosMananciais. Sempre argumentando na linha da "defesa dos interesses dostrabalhadores", o prefeito criticava o "caráter draconiano" da Legislação,impedindo o acesso dos humildes à moradia (Ver entre outras, a edição de20/11/1991 do Diário do Grande ABC).

Neste sentido, os defensores da Legislação, os ecologistas emparticular, seriam "cruéis e desumanos" (Fala proferida nos debates doNúcleo de Regularização na CMSBC também no dia 20/11/1991). De resto,para o Prefeito, a resolução da questão ambiental do município não poderiadar-se de imediato, mesmo porque, a complexidade da própria Lei seriaimpeditiva de sua aplicação (30).

A todos estes ataques desferidos contra os Mananciais, a CMAprocurou responder em Seminários promovidos no interior da Administraçãoou fora dela, junto aos movimentos sociais e através de artigos publicados naimprensa local e na própria mídia institucional (WALDMAN, 1991, 1991B,1991C, 1992B, 1992C, 1992D e 1992E). Foi, entretanto, um esforço inútil. No

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limite de uma não-política ambiental, o meio-ambiente torna-se, conforme já odissemos, ele mesmo uma outra não-questão.

AS DIVERSAS FISIONOMIAS DA CRISE DOS MANANCIAIS EM SBC

A foto mostra a posse do autor deste ensaio enquanto Coordenador do Meio Ambienteem São Bernardo do Campo em 05 de Março de 1991. Podemos identificar na imagem asfisionomias de vários dos expoentes, participantes, interlocutores e agentes diretos e indiretosda crise política envolvendo a questão dos mananciais em São Bernardo do Campo, dentreeles: 1- Maurício Soares, o prefeito, 2- Eu mesmo, Maurício Waldman, 3- Luiz Roberto Alves,Secretário da Educação, 4- Luiz Carlos Berbel, da executiva local do PT, 5- Taiti Inemani,Secretário do Planejamento, 6- Dermi Azevedo, Coordenador de Comunicação Social, 7-Denise Ziober, Chefe da Divisão da Secretaria de Planejamento, 8- Carlos Eduardo de Lima,Sub-Prefeito do Distrito do Riacho Grande, 9- Laurentino Hilário, Secretário de Obras e 10-Fran Bernal, Secretário da Saúde e futuramente candidato a vice-prefeito na sucessão deMaurício Soares na chapa de Djalma Bom (Foto: Coordenadoria de Comunicação Social daPrefeitura Municipal de São Bernardo do Campo, gentilmente cedida por Dermi Azevedo).

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Por outro lado, esta não-política também tem seus limites. Ela pode (eceve ser) enfrentada concretamente, teoricamente, no dia-a-dia do cidadãocomum, dos trabalhadores das fábricas, no campo e nos escritórios, pelosestudantes, por homens e mulheres que percebem estar o poder público nasmãos de quem exatamente atua contra seus mais vitais interesses, como opão, a água e a terra, todos eles componentes de uma relação que o mundomoderno passou a reconhecer definitivamente como ecológica. Esta luta nãoadmite o raciocínio de curto prazo, não aceita a realpolitik, repudia não-soluções e não-políticas.

Pode ser que o custo pessoal que nós arcamos quando nos decidimosa evidenciar fatos graves e atentatórios ao bem-estar do cidadão seja grandee duro, mas, este é, em muitas ocasiões, o mínimo que nós podemos fazer.Indo às raízes dos problemas que nos afligem, podemos tornar claro o quenão queremos e dialeticamente, passar a ver a possibilidade de uma novavida, pura e cristalina, a transcorrer, por intuição e vontade, no campo denossos desejos mais profundos e das nossas expectativas mais esperadas.

V - ALGUMAS OBSERVAÇÕES FINAIS

Com base no que já foi exposto, seria possível fazer algumasconsiderações, reparos e advertências, entre elas:

1. As contradições espaciais urbanas, são um reflexo direto de umaTorção do Tempo-Espaço típica da Modernidade. Resultam da propensão deuma dinâmica temporal linear e progressiva em negar quaisquer equilíbriosdinâmicos, sejam os da Natureza ou, como no caso da Billings, do próprioespaço artificial que é sua emanação direta. No rol destas contradiçõesespaciais é que identificamos os conflitos relativos com a ocupação das áreasde preservação ambiental, cujos agentes em muitos casos são os setoresexcluídos, no tempo e no espaço, dos circuitos da Modernidade. A ocupaçãodos mananciais ê um dos capítulos de um histórico exclusivamente modernoque atraiu para o meio urbano um contingente de homens e mulheres queeste ambiente artificial não está (e sequer estará) capacitado a absorver. Aespacialização informal dos mananciais, configurada no discurso tecnocráticocomo passível de uma política de ajustes e correções, possui, pois limitesobjetivos, tanto em função dos custos crescentes para a economia urbana,quanto para estas mesmas políticas, que não podem, no longo prazo, e pormais bem aplicadas que sejam, solucionar problemáticas cuja origem não étécnica, mas sim política e econômica. "Qualquer que seja a solução, o queparece obvio é que o modelo de preservação da qualidade da água dosmananciais e esse modelo de crescimento das cidades brasileiras são coisasincompatíveis” (SEMASA, 1991: 14). Um dos dois tem que mudar, e que sejao modelo.

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2. Advertiria, no tocante as relações entre o movimento ecológico eaqueles movimentos sociais que estão em contradição com a questãoambiental, do surgimento de uma perigosa linha de interpretação relativa aomeio ambiente. Confrontados com o ascenso da questão ambiental, setoresdestes movimentos (caso explicito de São Bernardo do Campo e dasocupações de parques e áreas verdes em Piracicaba, por exemplo),substituíram seu discurso tradicional, considerando Ecologia como umaquestão burguesa por um outro de qualificação diferente, passandodiretamente pelas tentativas de desqualificar o movimento ecológico comointerlocutor da questão ambiental, categorizado, por exemplo, como"destrutivo" e "demagógico" (in Documento da Comissão Organizadora IIIºEncontro de Moradia de São Bernardo do Campo, Março de 1991).Conscientes da falta de sustentação do discurso tradicional, estesmovimentos passaram a inverter os dados simbólicos da discussão ambiental,fagocitando a argumentação ecológica, articulando um discurso pelo qual, ainvasão das áreas de interesse público passa a ser definida como luta pelavida, e suas associações, passam a incorporar a denominações ambientais(caso das associações "fantasma” de São Bernardo do Campo). Este"ecologismo popular", além de subverter os dados da questão, procuratambém despolitizar o debate sobre a moradia, procurando supera-la inclusivepela manipulação do jargão pelo qual que estipula uma “contradição entre oHomem e a Natureza”.

Há também a necessidade de apontar para a fragilidade de algunsdiscursos políticos que apontam a ocupação informal e a economia submersacomo possíveis fontes de inspiração para um projeto político alternativo àordem existente. É Herbert de SOUZA (1989), quem alerta para a questãoquando lembra, por exemplo, da funcionalidade da economia submersa aomodo dominante de produção, sendo com ele perfeitamente compatível.

É também este sociólogo um dos que destacam o caráter conservadordesta perspectiva, impedindo ou arrefecendo explosões sociais no TerceiroMundo. "No interior das atividades desenvolvidas pela economia submersaprincipalmente através das iniciativas de caráter comunitário, poderão existiros germens de uma proposta de economia e sociedade democráticas. Daípensar que, por este caminho, vamos construir a utopia democrática sem umconfronto real e global com o mundo do capital, vai uma grave ilusão e comgraves conseqüências, que pode nos levar a tomar o caminho do desvio,onde se encontram as utopias que não conseguem seguir o caminho daspedras".

Por fim, há o perigo dessa ordem diferentemente regulada encontrarsua materialização nas socializações marginais e na economia dacontravenção, cujos exemplos mais acabados e brilhantes são a violênciaurbana, o narcotráfico e o contrabando (Ver NASCIMENTO, 1993: 104).Atuando contra o Estado, estas organizações têm constituído, como no caso

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quase paradigmático do Rio de Janeiro, autênticos Governos Paralelos, comsua economia, sua justiça e suas forças armadas. O não enfrentamentopolítico da questão do chamado crescimento desordenado pode, pois frutificarnuma ordem indiferente ao conjunto de relações institucionalizadas que tecemo mundo da democracia.

Folheto de divulgação do Seminário Meio Ambiente, Vida e Trabalho, realizado pelomovimento eccológico e sindicatos da CUT, região do ABC paulista e Baixada Santista, emNovembro de 1991, em São Bernardo do Campo.

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Mais do que nunca, organizar e defender os excluídos é uma questãoque aponta para novos pactos territoriais, estabelecidos numa radicaltransformação social, onde a Natureza, o tecido urbano, as águas, as leis, aprodução e a cultura sejam expressão de um crescimento harmônicocompatibilizando Homem e Natureza.

São Paulo, 24 de Fevereiro de 1994.

Rua Topázio, Aclimação, São Paulo.

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CARTA ABERTA DO MOVIMENTO ECOLÔGICO DO ABC

A demissão do Coordenador de Meio Ambiente, Maurício Waldman, daadministração municipal de São Bernardo do Campo, vem agravar ainda maisa falta de definição de uma política ambiental para a cidade.

Apesar da informalidade do cargo que Waldman ocupava, entende-se quesua demissão nada mais significa do que o descontentamento daadministração municipal com as denúncias formuladas a ela pelo ex-coordenador quanto à conivência com a degradação ambiental no município.

Estas contradições existentes na administração vieram à tona a partir dasdenúncias realizadas no transcorrer das últimas semanas em relação aoepisódio da devastação da mata nativa ocorrido no km 24 da Via Anchietapela associação habitacional Monte Sião, cujo presidente afirmouenvolvimento do prefeito na autorização de terraplanagem da área.

Na oportunidade, em seu depoimento ao delegado responsável peloencaminhamento do inquérito, Maurício Waldman declarou que existeresponsabilidade da administração municipal na devastação da Mata Atlânticano município, o que vem consolidando a invasão e instalação de loteamentosclandestinos em áreas de proteção aos mananciais.

Confirmou ainda que isto ocorre em virtude de duas posturas básicasadotadas pela administração, a saber:

1. A administração tem feito "vistas grossas" às ocupações ocorridas emáreas de mananciais.

2. A administração tem levado benfeitorias às áreas degradadas, tais como:terraplanagem em áreas não ocupadas, asfaltamento, água, equipamentosurbanos (centros de convivência, etc), consolidando as ocupações etornando-as irreversíveis.

É bom lembrar que as contradições existentes na administração quanto àformulação de uma política ambiental para o município não é nova e nemtampouco se dá a partir dos últimos fatos, uma vez que toda a atuação do ex-coordenador para a determinação de diretrizes para o meio ambiente nãorepercutiu nos diversos setores da prefeitura, criando impasses para ambastendências.

Quando Waldman assumiu a Coordenadoria do Meio Ambiente (esta informal)recebeu do movimento ecológico local as propostas, até aquele momentodiscutidas exaustivamente com a administração, relativas a diretrizes para aimplantação da política ambiental no município, as quais nunca foram

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atendidas, seja elas em parte ou em sua globalidade, efetivando com isto umaruptura de diálogo entre a administração e o movimento ecológico.

Neste sentido, com a chegada de Waldman, o movimento ecológico entendiaesta como uma sinalização por parte da administração em estabelecer umnovo relacionamento que viabilizasse as propostas até então encaminhadas.

Naquele momento, para o movimento ecológico, o relacionamento a serestabelecido pressupunha a vontade política da administração para aefetivação da política ambiental no município, iniciando-a com a criação defato da Coordenadoria do Meio Ambiente - pois esta funcionava, comoocorreu até o presente momento, informalmente - e do COMDEMA (ConselhoMunicipal de Meio Ambiente), ambos instrumentos fundamentais para ainstalação do Sistema de Qualidade Ambiental do município previstas na LeiOrgânica, ela mesma o resultado de conquistas do movimento junto aolegislativo municipal.

Estabeleceu-se então, entre a Coordenadoria do Meio Ambiente e omovimento ecológico um "armistício", e em conjunto elaborou-se umanteprojeto contemplando a criação do Sistema de Qualidade Ambiental, aCoordenadoria de Meio Ambiente, o COMDEMA e o Fundo Municipal para oMeio Ambiente, anteprojeto este, encaminhado por Waldman ao conjunto daadministração para conseqüente discussão e aprovação.

Concomitantemente ao encaminhamento do anteprojeto na administração, omovimento ecológico fez gestões junto a Câmara Municipal com vistas aaprovação do mesmo.

Obtivemos do legislativo o compromisso de apoio ao anteprojeto e daadministração a resposta de que o mesmo seria enquadrado no projeto dereforma administrativa, que até hoje não nos foi apresentado.

Faz-se necessário lembrar, ainda, que o movimento ecológico não recebeucom bons olhos a proposta da administração de implantar a Coordenadoria doMeio Ambiente, visto que na época nem projeto para a mesma havia. Omovimento ecológico advertiu o Prefeito para estas dificuldades, ou seja, afalta de definição da atuação desta Coordenadoria a partir de uma políticaambiental clara por parte da administração.

A atuação do movimento ecológico tem, até o presente momento,demonstrado que, tentou por inúmeras vezes auxiliar a administração aformular diretrizes básicas para a atuação, conjunta ou não, que viabilizassema contenção da degradação ambiental que vem ocorrendo no município nosúltimos anos.

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No entanto, está claro que de nada adiantou o esforço realizado até aqui pelomovimento junto à administração, pois toda ação da prefeitura foi deescamotear a falta de compreensão da mesma para as questões ambientaisdo município.

Desta forma se coloca a continuidade do escamoteamento desta realidadequando a administração se dispõe a substituir, em final de mandato, a figurado Coordenador de Meio Ambiente, visto que questões fundamentais para ofuncionamento desta Coordenadoria não foram resolvidas e não há tempoobjetivamente, para resolvê-las.

Por último, mais uma vez, a exoneração do Coordenador não atende aosanseios de importantes setores da sociedade civil, a quem o Partido dosTrabalhadores sempre pregou representar, o que sugere a urgente discussãoda problemática nas várias instâncias partidárias.

Portanto, o movimento entende que a relação com o futuro Coordenador seinviabiliza, pois o mesmo será reprodutor da continuidade da política dedegradação ambiental que se instalou nesta administração.

São Bernardo do Campo, 03 de Agosto de 1992.

Assinam: Associação Ecológica dos Pescadores Profissionais, Amadores eAmigos da Represa Billings, Terra Viva – Movimento de ResistênciaEcológica, SATS – Serviço Aéreo Terrestre de Salvamento e ProteçãoEcológica, Associação Comunitária de São Bernardo do Campo, Associaçãode Ex-Alunos do Instituto Metodista, Movimento Brasil Verde.

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NOTAS

(1): O TRICONT corresponde à uma terminologia utilizada pelo movimentoambientalista alemão para referir-se ao Terceiro Mundo, no qual as cidadestem se notabilizado como foco de atração populacional. A intensidade destaurbanização está registrada em diversos documentos. Um deles, elaboradopela UNESCO na década de 80, já acertadamente advertia que por volta doinício do nosso século, quando mais da metade dos presumíveis seis bilhõesde humanos estariam concentrados em áreas urbanas, destes, pelo menosdois bilhões residiriam em metrópoles dos países periféricos e 1 bilhão, nasdos países centrais. Subscrevia ainda que, das 60 cidades com mais de cincomilhões de habitantes, 47 estariam situadas no TRICONT, onde estariamlocalizadas, 12 das 15 maiores cidades do mundo (1983: 35).

(2): Em 1973, já alertava o historiador britânico Arnold TOYNBEE, "oscamponeses que viviam em comunidades aldeãs, no estilo da Idade Neolítica,ainda constituíam a maioria da geração humana então viva", mas, estes,"estavam rapidamente escoando do campo para as favelas que envolviam ascidades" (1979:717).

(3): A análise dos debates concernentes ao importante Congresso de maio de1992 da IWSA - International Water Supply Association (Copenhagem,Dinamarca), possibilitou perceber duas ordens de motivações quanto àpreservação dos mananciais. Uma primeira, de ordem técnica, considera queapesar dos avanços conquistados nos processos corretivos, de tratamento ede purificação da água, estes só podem ter um efeito gradual na eliminaçãodos poluentes e não são necessariamente eficazes. Existe hoje umaquantidade grande de micro-poluentes que cresce a cada ano, gerados noprocesso industrial pelo desenvolvimento de produtos químicos novos, cujosefeitos são largamente desconhecidos. Uma segunda motivação é o própriocusto financeiro da despoluição, um ônus que as frágeis economias doTerceiro Mundo não estão preparadas para sustentar. Deste modo, emtermos de longo prazo, a relação custo-benefício depõe explicitamente emfavor da preservação (Vide SEMASA, 1991:27). É importante sublinhar que aLegislação de Proteção aos Mananciais da RMGSP em nada deixa a devercom relação as que estão em vigor nos países centrais: "A RMGSP, por umconjunto de razões, acabou tendo uma legislação com essa visão preventiva.Pode-se dizer que ela é quase pioneira, a nível mundial, nessa visão, quedepois de quase 20 anos está se reafirmando com algo indispensável nospaíses mais avançados do mundo" (in SEMASA, 1991:27).

(4): A expressão "produção de água" que poderia pecar por um viés"tecnicista", é, entretanto muito feliz por realçar o fato de que a água, nomundo moderno, não mais constitui um recurso livre da Natureza. Pelocontrário, ele só é acessível mediante uma intermediação humana. A água éum dos recursos naturais tornados inacessíveis ao homem pelo que se

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convencionou denominar de “progresso” e “desenvolvimento”. Nestaprogressão, restariam apenas dois outros bens naturais a serem integradosdiretamente na Natureza Socializada: a energia solar e a própria atmosfera. Éplausível imaginar que em função dos efeitos deletérios da poluição e datecnificação da biosfera, não tarda o dia em que mesmo estas duas grandesemanações da Natureza também serão afastadas do convívio direto com oshumanos.

(5): Além de São Bernardo do Campo, o Grande ABC é formado pelosmunicípios de Santo André, São Caetano do Sul, Diadema, Mauá, RibeirãoPires e Rio Grande da Serra. A sigla ABCDMR é também utilizada parareferir-se à sub-região, onde A significa Santo André, B, São Bernardo doCampo, C, São Caetano do Sul, D, Diadema, M, Mauá e R, Ribeirão RioGrande da Serra. Vários estudos comprovam autonomia da sub-região nointerior da RMGSP. Uma pesquisa da Companhia do Metropolitano de SãoPaulo (Metro), confirmava, por exemplo, que nos anos noventa cerca de 72%dos deslocamentos ocorriam internamente na sub-região (ZIOBER etPEREIRA, 1991: 96).

(6): Respectivamente floresta pluvial em inglês e em alemão.

(7): Esta expressão, Mata ou Floresta Atlântica, na definição de Carlos ToledoRIZZINI, "semelhantemente a floresta amazônica, designa um complexovegetacional que, embora dominado pela floresta pluvial montana, englobatipos muito díspares. Enquanto a floresta hileana é de planície, a atlântica éde altitude (1979:75). Outrora vicejando em toda a cadeia montanhosalitorânea, do Nordeste ao Rio Grande do Sul, a Mata Atlântica vem sendoagredida desde os primórdios da colonização do Brasil. Restam atualmenteapenas 5% da cobertura original, ilhados no longo dos bordos das Serras daCantareira, do mar, da Mantiqueira, etc. A Mata Atlântica é consideradapossuidora da mais rica biodiversidade do mundo. Especialistas chegaram aidentificar 450 espécies por hectare, dado que supera o recorde anteriorregistrado na Amazônia Peruana, que incluía 360 espécies por hectare (Jornalda MATA ATLÂNTICA, nº1). Na região de São Bernardo do Campo,habitavam em profusão o veado do mato, a onça pintada, a paca, a capivara,o quati, o sagüi e diversos outros tipos de primatas. Arapongas, garças etiribas esvoaçavam de um canto a outro da floresta. No chão, rastejavamcascavéis, urutus e jaracuçus. Apesar de toda a devastação, nos recantosmais recuados do município ainda é possível localizar vários doscomponentes da fauna original, quando não na beira da própria represa,aparentemente alheios à to da poluição dos arredores (caso das garças; quesobrevivem dos peixes que encontram - vivos ou mortos - nas margens doreservatório). Quanto a ictiofauna, pode-se listar a traíra (Hoplias Malabaricus)e o lambari (Astynax bimaculatus), ambos espécies nativas. A Carpa(Cyprinus carpio) e a Tilápia (T. Melanopleura) são espécies alienígenas. Aprimeira foi introduzida pelo antigo serviço de piscicultura da Light em 1948. A

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segunda, importada do ex-Congo-Belga (atual Zaire), foi introduzida na regiãoem 1953. Certos peixes existem apenas nos braços menos poluídos, pois nãotoleram a contaminação ou competição com a tilápia. É o caso do Bagre(Rhamdia sp), do Cascudo (Plecostomus sp), do Cará (Geophagus sp), doPiau (Leporinus copelandi) e do caborje, todos nativos. Quanto ao perfil dasmatas, abundavam outrora as madeiras de lei, há muito devastadas pelasmadeireiras e lenhadores. A floresta foi, nos Séculos XIX e XX, utilizada comorecurso para uma próspera indústria carvoeira, que funcionava em largaescala no que hoje é a área coberta pelo Reservatório. Por último, destaque-se o Palmito (Euterpe edulis), um clássico ingrediente da dieta regional, cujofarto sortimento sustentou os colonos italianos que a partir dos finais doSéculo XIX povoaram a região (Vide MACEDO, 1992).

(8): A transformação da legislação em defesa dos mananciais, assim como aprópria Represa Billings em objeto de lutas ambientalistas nada mais é do querevelador essência eminentemente histórica da questão ambiental. Lembra oilustre geógrafo Milton SANTOS: "muitas vezes, o que imaginamos naturalnão o é, enquanto que o artificial se torna natural quando se incorpora ànatureza. Nesta, as coisas criadas diante de nossos olhos, e que para cadaum de nós é novo, já aparece às novas gerações como um fato banal. O quevimos ser construído é para as gerações seguintes, o que existe diante delascomo natureza. Descobrir se um objeto é natural ou artificial exige acompreensão de sua gênese, isto é, de sua história" (1988: 75).

(9): Reveladora destes anseios é a observação consignada em documentoelaborado na época pelo então Prefeito Celso DANIEL, da ADP de SantoAndré, que sinaliza para a "altíssima expectativa da militância, quepressionada nos bairros, nos repassava sua natural angústia” (Ver 1990: 2/3).

(10): Nos anos noventa, de acordo com os dados coletados para elaborar esteensaio, de apenas a ADP de Piracicaba (SP), na gestão do Prefeito JoãoMachado (1988/1992), apresentou problemas particularmente graves notocante à gestão do patrimônio ambiental urbano, no caso, envolvendo asáreas verdes da cidade. Em Piracicaba, com a conivência do poder públicoforam ocupados 54 parques e áreas verdes por parte de movimentos demoradia, agravando os índices disponíveis á população, dos menores dentreas cidades brasileiras. Por outro lado, algumas ADP, como Santos (SP) eVitória (ES), constituem exemplos do que de melhor foi concretizado poradministrações municipais na matéria de conservação da natureza. Nesteperíodo, as gestões de Santos (mandato da Prefeita Telma de Souza) e deVitória (mandato do Prefeito Victor Buaiz), ambas transcorrendo no mesmolapso de tempo das ADP de São Bernardo do Campo e de Piracicaba;desenvolveram trabalhos de enorme importância ambiental, logrando oestabelecimento de políticas urbanas com visível qualificação ambiental, eambas com enorme repercussão positiva para a questão dos mananciais.

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(11): A Serra sempre foi vista, pelos habitantes do Planalto de Piratininga,como um elemento natural que impedia contatos mais freqüentes com oexterior. Não era este, um sentimento infundado. A Serra é muito íngreme esuas escarpas e penhascos motivaram diversos comentários no passado. Umdeles é de um comerciante inglês, John Mawe, que esteve no Brasil entre1807 e 1881. A travessia da Serra é assim relatada: "Obtido um guia,montamos e caminhamos cerca de meia milha, quando chegamos ao sopé demagníficas montanhas, que teríamos de atravessar. A estrada é boa e bempavimentada, mas estreita, e devido às subidas íngremes,foi talhada emziguezague, com voltas freqüentes e abruptas em ascensão. As tropas demulas, muito carregadas, que encontrávamos no caminho para Santos,dificultaram-nos a passagem, tornando-a desagradável, muitas vezesperigosa. Em alguns lugares, a estrada atravessa vários pés de rocha, emoutros, sobe perpendicularmente, conduzindo, com freqüência, a uma dasmontanhas cônicas, ladeando precipícios, onde o viajante está sujeito a serlançado numa floresta inacessível, trinta jardas abaixo. Estes lugaresperigosos estão protegidos por parapeitos. Depois de subirmos por hora emeia, dando numerosas voltas, chegávamos a um pouso, em cujasproximidades, num lugar pouco abaixo da estrada, encontramos água.Segundo nos informou o guia, distava apenas meio caminho do cume;ficamos pasmados com a informação, pois as nuvens estavam tão distantes,abaixo de nós, que obstruíam toda a visão" (1978 : 60/61).

(12): Parte dos moradores da orla da Billings tratam a represa por rio, numaalusão talvez inconsciente, ao Rio Grande, que represado, deu-lhe origem(Ver MACEDO, 1992: 32/33).

(13): A pesca profissional é desenvolvida na região da Represa a pelo menos30 anos. Nos anos noventa, ela formava a base da sobrevivência deaproximadamente 500 famílias, que fundaram, em Setembro de 1991 com aassessoria de um advogado ambientalista do ABC, Wladimir Cabral Lustoza,a Associação Ecológica, de Pescadores Profissionais, Amadores e Amigos daRepresa Billings . Apenas no Braço do Riacho Grande do Reservatório, onde amata apresenta melhor preservação e a qualidade da água atinge níveisquase satisfatórios, a pesca garante não só o sustento dos pescadores comode centenas de sacoleiros, como são conhecidos os vendedores de peixe,principalmente da tilápïa. A atividade pesqueira, no entanto, é proibida por lei,pois a portaria 08 do Instituto Brasileiro de Recursos Naturais e Renováveis(IBAMA), a restringe aos amadores. Esta legislação, que é um bom exemplodo caráter verdadeiramente surrealista que fundamenta a elaboração das leisno país, é criticada pela própria comunidade ambientalista. Para oambientalista Nilton Hernandes, "A manutenção da pesca como um meio devida na Billings, faz parte do desenvolvimento sustentado, que propõe umequilíbrio entre a ação do homem e o meio ambiente".

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(14): São Bernardo do Campo, a população salta de 82 mil habitantes em1960 para 650 mil em 1991. Mauá passou de 29 mil para mais de 300 mil eDiadema, que tinha 12 mil habitantes, alcançou no mesmo período cerca de475 mil habitantes (cf. dados SEMASA, 1991: 7).

(15): Além das ações do movimento ecologista, os trabalhadores da regiãotambém passaram a se mobilizar na defesa ambiental não só da chaminépara fora, mas singularmente da chaminé para dentro. "O meio ambiente podeser ruim no exterior, mas é pior dentro da fábrica" (declaração de RemigioTodeschini, diretor do Sindicato dos Químicos de Santo André, in GazetaMercantil). O Sindicato dos Metalúrgicos de São Bernardo do Campo eDiadema, no entendimento de Vicente PAULO DA SILVA, veterana liderançada agremiação, desenvolveu esforços no sentido de despoluir as fábricas emque trabalha a sua categoria, assim como tem buscado inserção nas lutasgerais da população (1991). Assinale-se também que o movimento sindical daregião tradicionalmente manteve um diálogo de bom nível com o movimentoambientalista, apoiando e/ou promovendo seminários conjuntos, como MeioAmbiente, Vida e Trabalho, organizado pela Comissão Nacional de MeioAmbiente da Central Única dos Trabalhadores (CUT), conjuntamente comsindicatos e movimentos ecológico e popular do ABC e Baixada Santista emSão Bernardo do Campo, 23/24 de Novembro de 1991.

(16): Ao longo das últimas décadas do Século XX, várias outrasconcentrações urbanas conquistaram destaque na formação espacialbrasileira. Cidades como Fortaleza, Salvador, Porto Alegre, Belém, BeloHorizonte e Rio de Janeiro, entre outras, terminaram alçadas à condição denúcleos de vastas conurbações, aglutinando cidades vizinhas através deprocessos muito rápidos e igualmente displicentes no cuidado com oplanejamento deste crescimento. No âmbito do Estado de São Paulo, além daRMGSP, cidades como Santos, Campinas e Ribeirão Preto também setornaram referências espaciais enquanto centralidades expressivas,capitaneando processos de adensamento que infelizmente tem demonstradotendência em repetir o drama urbano já instalado na RMGSP.

(17): "Em 1982, o Governo do Estado construiu a Barragem Anchieta (àaltura da Via Anchieta) criando o Compartimento Pedreira e o CompartimentoRio Grande. A barragem tem o fito de impedir a penetração de águasprovenientes do chamado bombeamento (de esgoto) no setor que a Sabespfaz a captação de água para o abastecimento do ABC" (MACEDO, 1992: 61).O município de Santo André conservou um serviço próprio de abastecimento,o Serviço Municipal de Água e Saneamento de Santo André - SEMASA - queopera a Estação de Tratamento de Água de Guararã, explorando o pequenomanancial do Pedroso. Embora de pequena capacidade, de 4 a 5% doconsumo, ele é imprescindível face à escassez de água (Vide SEMASA,1991: 35).

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(18): Acredita-se que ao longo da década discutida neste ensaio, que cercade 50% do espaço urbano no Brasil foi mantido vazio pela especulaçãoimobiliária (Ver entre outros, MALTA, 1989). Esta é, no parecer da geógrafaArlete Moysés RODRIGUES, "uma das principais causas do não acesso dapopulação à moradia" (1991: 62). Em São Bernardo do Campo, estaporcentagem, no interior do perímetro urbano, é menor do que a médianacional, porém não inferior a 15%, o que teria permitido, ao menos emprincípio, uma vazão para o crescimento populacional para os dez anos quese estenderam até o início do Século XXI (dados repassados a CMA pelaSEPLAN em 1991).

(19): O Sub-Distrito do Riacho Grande apresenta grandes particularismosgeográficos e culturais, abrangendo diversos bairros pouco povoados domunicípio de São Bernardo do Campo, tais como o Bairro Tatetos, Rio Acima,Monos e Córrego Preto, Curucutú e Taquacetuba, a região do Capivary e RioPequeno, Pedra Branca, Jurubatuba, etc. O Distrito tem origem na antiga Vilado Rio Grande, que se formou junto à Estrada Velha do Mar, no trecho ondeela se confunde com a primitiva Estrada do Vergueiro, hoje coberta pelaságuas da Represa Billings. Os primeiros colonizadores da região, deascendência polonesa, alemã e italiana, exploraram a indústria extrativa damadeira, lenha e carvão ao longo do Século XIX. A área passou a ser Distritopela Lei nº 223 de 24 de Dezembro de 1948. É a principal área de interesseambiental de São Bernardo do Campo, devido à presença do Reservatório eda cobertura de Mata Atlântica. O núcleo urbano, situado na beira da RepresaBillings, forma a sede da Sub-Prefeitura do Riacho Grande, possuindo cercade 35.000 habitantes. Este número é muito maior do que permitido pela lei eas casas, chegam até a beira do Reservatório, em mais uma flagranteevidência da falta de planejamento urbano (Fonte: SEMASA, 1991 eDepartamento de Estatística da Secretaria de Planejamento da PMSBC).

(20): Para burlar a Lei de Proteção aos Mananciais, os loteadores se valemde vários expedientes. Em deles, é a montagem de associações demoradores fantasmas, que sob pretexto de organizar movimentos de moradia,estão na realidade preocupadas em comercializar lotes. Essas “entidades"funcionam como verdadeiras quadrilhas, em muitos casos não sedistanciando do banditismo puro e simples, com o uso de ações depistolagem e de corrupção. Grupos ou imobiliárias compram as terras na áreade mananciais por um preço baixo e desrespeitando a legislação, a dividemem lotes menores que os propostos pela lei. Via de regra, não esclarecem aosinteressados que jamais poderão obter escrituras dos terrenos por estaremem áreas cuja ocupação é proibida. Quanto à infra-estrutura urbana, estaquestão é “solucionada” mediante acordos políticos: “Uma vez efetivada nãosó a venda como a ocupação dos lotes, saem os loteadores ou seus testas-de-ferro na defesa dos trabalhadores ai residentes, ajudando-os a formarcomissões ou associações de bairros com a finalidade de reivindicarem juntoao poder público toda sorte de infra-estrutura e serviços" (OLIVEIRA, 1982 :

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134). Vale a pena repetir, esta “conversão do espaço-social em espaçomercadoria” (CASSETI, 1991:115), termina por materializar uma profundadesestruturação ambiental e seus impactos geomorfológicos são complexos edificilmente solucionáveis.

(21): Não há como se confundir a especulação imobiliária disfarçada demovimento social com o movimento de moradia propriamente dito. Não hácontradição entre a reivindicação de moradia e o ambientalismo. Pelocontrário, as teses relativas à Reforma Urbana (Ver DA SILVA, 1991),defendidas pelos sem-teto endossam a questão ambiental de forma muitoclara. Conforme está expresso na "Carta de Princípios do IIº Fórum Nacionalde Reforma Urbana, realizado em São Paulo em outubro de 1989, uma daspremissas básicas seria a função social da propriedade e da cidade entendidacomo uso socialmente justo e ecologicamente equilibrado do espaço urbano.Esta tese foi nos inícios dos anos noventa, retomada e confirmada emdiversos outros encontros como na Conferência Internacional Terra, Ecologiae Direitos Humanos (Vitória, Espírito Santo, 24/28 de Maio de 1992), e noFórum Global da ECO-92 (Tratado sobre a Questão Urbana).

(22): Via de regra, a questão da Autonomia Municipal tem sido trabalhada deforma a intuir mudanças na legislação dos Mananciais, sugerindo, pois que osmunicípios passem a deter o comando do gerenciamento destas áreas (Verentre outros, ZIOBER e PEREIRA 1991). Porém, ressalve-se que se na óticados interesses metropolitanos não podemos sugerir que os municípios sejamsimplesmente atrelados a instâncias mais amplas, por outro lado, é licitoadvertir que autonomia municipal não se confunde com independência domunicípio.

(23): No geral, as ADP - inclusive São Bernardo do Campo - alcançaramdestaque na área da educação, transporte, saúde e política salarial de seufuncionalismo, temas que possuíam, ao contrário da questão ambiental,relativo consenso no Partido. Neste particular, podemos também sublinharque as duas ADP com melhor performance quando ao meio ambiente, asadministrações de Santos (SP) e de Vitória (ES), tinham como titularrespectivamente uma conhecida militante de movimentos sociais (Telma deSouza) e do próprio movimento ambientalista (Victor Buaiz).

(24): Ver Tese da Administração Municipal para o Seminário Interno do PT deSão Bernardo do Campo, realizado em 29/30 de Junho de 1991.

(25): Este entendimento por parte do então Prefeito, não pode serconsiderado uma postura isolada ou de cunho pessoal, pois revela, naverdade, uma concepção política de Administração. Na voz de Mauro LuisIASI, na época membro do Diretório Municipal do PT de São Bernardo doCampo e militante alinhado com as correntes de esquerda do seu Partido,esta conotação é cristalina, quando este reconhece que "nossa grande

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dificuldade hoje em dia, no seio do Partido dos Trabalhadores, consiste nofato de que alguns setores tendem a assumir uma postura que os aproximada concepção tradicional e conservadora a respeito do voto e do poder”(1991).

(26): Nesta ocasião, foram marcantes os notáveis choques que opuseram oPrefeito Maurício Soares ao seu vice, Djalma Bom, caracterizados por notóriatruculência verbal (Ver edições de Novembro e Dezembro de 1990 do "Diáriodo Grande ABC").

(27): Minha posse na função de Coordenador do órgão, ocorrida em 05 deMarço de 1991, dava-se com absoluto desconhecimento de minha parte,quanto ao ambiente político que vigorava na cidade e em particular do quevigorava relativamente à questão dos Mananciais. Não sem razão, omovimento ecologista local, conhecedor de meu compromisso com aconservação da Natureza, não compreendeu a atitude da Administração emoptar pelo meu nome (Ver "Nomeação de Waldman surpreende ecologistas",in Caderno ABCD do Jornal Folha de São Paulo, edição de 03/03/1991). OPrefeito Maurício Soares, apesar da oposição constante que a CMA adotavacontra suas decisões, não ousou exonerar-me da função. Uma vez colocado oimpasse, já no terceiro mês de gestão da CMA, o Prefeito temia,provavelmente um acirramento ainda maior com os ecologistas locais. Estes,por sua vez, e apesar da informalidade de meu mandato, sustentarampoliticamente a CMA, pois esta era a única voz dissonante no interior da ADPquanto à questão ambiental.

(28): O documento fazia críticas pungentes à Administração, dispondo sobreas diversas dificuldades encontradas, dentre estas o já visível boicote doAnte-Projeto da CMA pela SEPLAN. Posicionava-se sobre a questão dosMananciais, sobre as contradições internas da Administração, sobre anecessidade de uma política ambiental, sobre os problemas ecológicos domunicípio, discutia o caráter de uma Administração Democrática e Popular econtestava o papel "pirotécnico" potencial colocado para a CMA com basenas resistências encontradas. O fato do documento não ter gerado maioresrepercussões – exceto a visível da reação nervosa do Prefeito e do Secretáriodo Planejamento - é em si mesmo, demonstrativo dos limites dos arranjospolíticos convencionais frente a questões que, como a ambiental, e apesardestas incorporarem o mais absoluto interesse público, terminam gerenciadascomo um outro tema administrativo qualquer.

(29): O loteamento ecológico, propondo-se como uma visão de esquerda dodesenvolvimento sustentado constituía uma verdadeira caricatura proletáriado condomínio ecológico, tese proposta por muitos dos loteadores das áreasde Manancial. Contudo, o loteamento ecológico incorporava diversosproblemas conceituais, a começar pelo fato de absolutizar a questão dosefluentes. Nesta formulação, uma vez "resolvido" o problema do esgoto, seria

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possível então ocupar racionalmente os mananciais. A este respeito,comentando sobre os limites da técnica ante a questão ambiental, podemosrecorrer a Carlos Walter PORTO GONÇALVES, para o qual, "O que a questãoambiental coloca para a reflexão são os limites que a natureza apresenta numcontexto sócio-histórico determinado, o que pressupõe um determinadoestágio de conhecimento técnico. Em cada situação, vários usos da Naturezasão possíveis, mas não qualquer uso. Cabe à sociedade decidir comconhecimento de causa. O livre acesso à informação se torna uma questãocentral" (grifos meus, 1988: 14).

(30): Nesta ordem de considerações, poderíamos recorrer ao ecologistaCarlos MINC (1987), para o qual, quando alguém demonstra muita dificuldadepara compreender um ecossistema, é porque existem interesses em jogo.

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VITOR, Fernando, 1991, O que há por trás da podridão, in POLIS, ibidem,São Paulo; SP;

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ZIOBER, Denise Maria et PEREIRA, José Abílio Belo, 1991, Os Municípios doABC e a Proteção aos Mananciais, in Ambiente Urbano e Qualidade de Vida,POLIS, São Paulo, SP;

WALDMAN, Maurício et FATHEUER, Thomas, 1991, Ecologia: um Novo eAntigo Projeto Global, in Folha de S. Paulo, Caderno ABCD, edição de27/12/1991;

WALDMAN, Maurício, 1991, Ecologia Política dos Mananciais, in Folha deSão Paulo, Caderno ABCD, edição de 27/10./1991

WALDMAN, Maurício, 1991B, A Contribuição dos Eco-Socialistas in BoletimNacional do PT, edição de Julho de 1991;

WALDMAN, Maurício, 1991C, Uma Política Ambiental para São Bernardo doCampo, in Folha de São Paulo, Caderno ABCD, edição de 7 de Julho;

WALDMAN, Maurício, 1992, Ecologia e Lutas Sociais no Brasil, ColeçãoCaminhos da Geografia, Editora Contexto, São Paulo, SP;

WALDMAN, Maurício, 1992B, Questões sobre Planejamento Ambiental, inFolha de São Paulo, Caderno ABCD, edição de 27/01/1992;

WALDMAN, Maurício, 1992C, Desenvolvimento Sustentável, in CadernoABCD do Jornal Folha de São Paulo, edição de 11/06;

WALDMAN, Maurício, 1992D, A Luta Ambiental é uma Luta Popular, inNotícias do Município, edição de 09 de Fevereiro;

WALDMAN, Maurício, 1992E, O ABC e a ECO-92, in Notícias do Município,edição de 7 de Junho;

WALDMAN, Maurício, 1993, A Eco-92 e a Necessidade de um novo Projeto,in Geografia, Meio Ambiente e Desenvolvimento em Questão, Edição da AGB- Associação dos Geógrafos Brasileiros, Fortaleza, Ceará;

WALDMAN, Maurício, 1993B, O PT e o Ecologismo Popular in Jornal EmTempo, edição de Setembro, nº 270, pp. 13;

DOCUMENTOS

São Paulo, 1975: Crescimento e Pobreza, Estudo realizado para a PontifíciaComissão de Justiça e Paz da Arquidiocese de São Paulo, 4ª edição, EdiçõesLOYOLA, São Paulo, SP;

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I Fórum Nacional Sobre Reforma Urbana, Carta de Princípios, São Paulo,1989;

Carta Do Vale Do Rio Juqueri e da Serra Da Cantareira, Distribuída no VºCongresso de Ecologistas e Pacifistas do Estado de São Paulo, realizado emSão Bernardo do Campo, 1991.

Tratado Sobre a Questão Urbana, Fórum Global do ECO-92, Aterro doFlamengo, Rio de Janeiro, RJ, 1992;

Tratado De Água Doce, Fórum Global do ECO-92, Aterro do Flamengo, Riode Janeiro, RJ, 1992;

O Plano Médio UNESCO de Médio Prazo, publicado na Revista O Correio daUNESCO, nº3, ano 11, Março de 1983;

A Década da Água, 1981/1990, Revista O Correio da UNESCO, nº 4, ano 9,Abril de 1981;

Municípios Ecológicos Nórdicos, Programa Sueco de Eco-Municípios, materialdistribuído no Fórum Global do ECO-92;

História e Energia, publicação do Departamento de Patrimônio Histórico daEletropaulo - Eletricidade de São Paulo, 1986/88;

Boletim Histórico, publicação do Departamento de Patrimônio Histórico daEletropaulo - Eletricidade de São Paulo, 1986/1988;

Semasa, 1990, exemplar da publicação Água Viva, de responsabilidade doSemasa - Serviço Municipal de Água e Saneamento de Santo André, SP, deNovembro de 1990, sob o titulo Falta água Sobra Esgoto;

Semasa, 1991, exemplar da publicação Água Viva, de responsabilidade doSemasa - Serviço Municipal de Água e Saneamento De Santo André, SP,exemplar de Junho, sob o titulo A Ameaça aos Mananciais.

Brazil/Canada, transcrição do seminário Cidade Anos 90: Catástrofe ouOportunidade?, realizado no Rio de Janeiro por iniciativa de federações eorganizações municipais canadenses e brasileiras, Rio de Janeiro, 1991.

Jornal da Mata Atlântica, Boletim Informativo da Rede de Organizações Não-Governamentais da Mata Atlântica;

É Preciso Verde novo para Vermelhor, texto elaborado sob a responsabilidadeda Coordenadoria do Meio Ambiente da PMSBC relativo à questão ambientalna cidade e distribuído para análise e posicionamento para o conjunto do

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Secretariado da ADP de SBC, bancada de vereadores do PT, executiva doDiretório Municipal do PT SBC e para o Presidente nacional do Partido, LuisInácio Lula da Silva. São Bernardo do Campo, 05 de junho de 1991;

Constituição do Estado de São Paulo, editada pela Imprensa oficial do EstadoS.A. - IMESP, São Paulo, SP, 1989;

Água Viva, órgão informativo do Consórcio Intermunicipal das Bacias dos RiosPiracicaba e Capivari, 1991/1993;

Núcleo Ecológico do PT-ABC, diversos materiais, entre proclamações,manifestos e material de divulgação;

Carta Aberta do Movimento Ecológico do ABC, distribuída em 03 de Agostode 1992 em São Bernardo do Campo (Ver em Anexos);

Histórico do Distrito do Riacho Grande, material elaborado pela Secretaria doPlanejamento da PMSBC, Departamento de Estatística, São Bernardo doCampo, 1991;

Fábrica de Escolas, publicação da Associação Comunitária de São Bernardodo Campo, 1991.

Associações buscam Equilíbrio: Moradia e Ecologia, documento distribuído no11º Encontro de Moradia de São Bernardo do Campo, 24 de Março de 1991;

A Campanha de Proteção da Área de Mananciais, publicação em tablóide daPMSP, 1992.

HEMEROTECA

Coordenadoria do Meio Ambiente da Prefeitura Municipal de São Bernardo doCampo, colocada sob guarda do movimento ecológico da cidade;

Gabinete do Vereador Wagner Lino Alves, do Partido dos Trabalhadores deSão Bernardo do Campo;

ICONOGRAFIA

Coordenadoria de Comunicação Social da Prefeitura Municipal de SãoBernardo do Campo, gestão de Dermi Azevedo;

Gabinete do Vereador Wagner Lino Alves, do Partido dos Trabalhadores deSão Bernardo do Campo;

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CURSOS, ENCONTROS E SEMINÁRIOS.

Áreas Verdes - Um Problema uma solução, Curso de Gestão Comunitária deÁreas Verdes, promovido pelo Núcleo de Áreas Verdes do Grupo de ExtensãoUniversitária da ESALQ, Escola Superior de Agronomia Luiz de Queirós, dePiracicaba, com o apoio da Prefeitura da Cidade, Piracicaba, 04/05/1991 a01/06/1991.

Meio Ambiente, Vida e Trabalho, Seminário promovido pela ComissãoNacional de Meio Ambiente da Central única dos Trabalhadores (CNMA-CUT)conjuntamente com os movimentos ecológicos e popular da região do ABC eBaixada Santista. São Bernardo do Campo (SP), 23 a 24 de Novembro de1991. Encontro mais tarde editado sob os auspícios do CEDI - CentroEcumênico de Documentação e Informação.

Iº Ciclo de Debates Ecológicos do Departamento de Geografia da FFLCH daUSP, realizado de 15 a 17/06/1988 no Anfiteatro da Geografia daUniversidade de São Paulo - USP.

ENTREVISTAS, RELATOS E DEPOIMENTOS

Condesmar Fernandes de Oliveira, Presidente do MDV - Movimento emDefesa da Vida da Baixada Santista (SP).

Nilton Hernandes, Presidente da Sociedade de Preservação e Resgate deParanapiacaba, de Santo André (SP);

Ronaldo Queródia, Assessor de Meio Ambiente da PMSA, PrefeituraMunicipal de Santo André (SP), na gestão do prefeito Celso Daniel(1988/1992);

Vera Rotondo, Presidente do Grupo Terra Viva - Movimento de ResistênciaEcológica, de São Bernardo do Campo (SP).

Cândido Malta, depoimento realizado em 17/06/1989 durante o I Ciclo deDebates Ecológicos da Geografia da USP, São Paulo, SP;