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A REPRESENTAÇÃO DA PEDAGOGIA TRADICIONAL E DA ESCOLA NOVA SEGUNDO A PROPAGANDA E A PRODUÇÃO
TEÓRICA DOS PERSONAGENS DO MOVIMENTO RENOVADOR BRASILEIRO - UM ESTUDO DA COLEÇÃO “ESCOLA NOVA
BRASILEIRA” DE JOSÉ SCARAMELLI (1931)
Merilin Baldan – Mestranda em Educação Escolar/FCLAR – UNESP ([email protected])
Alessandra Arce – Departamento de Educação/UFSCar ([email protected])
Agência de Fomento: FAPESP
1. Introdução
“O que está em questão é a amplitude e a qualidade dos conhecimentos transmitidos aos alunos e, de modo geral, o desconhecimento da própria história e, mais especificamente, de nossa história educacional, bem como de nossos pensadores e pedagogos”
(SAVIANI & LOMBARDI, 2000, p.2)
Este trabalho é parte integrante da pesquisa de mestrado “O Ato de Ensinar:
Continuidades e Rupturas da Concepção de Ensino na Pedagogia Tradicional, na
Psicologia Histórico-Cultural e na Pedagogia Histórico-Crítica”, sob orientação da Profª
Dra. Alessandra Arce, junto ao Programa de Pós-Graduação em Educação Escolar da
UNESP/Araraquara e financiada pela FAPESP.
O tema da pesquisa é fruto das discussões, trabalhos e pesquisas realizadas no
âmbito da graduação sobre a história da educação e a história das idéias pedagógicas no
âmbito da Iniciação Científica e Trabalho de Conclusão de Curso. A partir destes trabalhos
foi possível observar a influência do movimento renovador na educação do século XX,
uma vez que provocaram uma ‘revolução copernicana’, cujas reflexões sobre o ensino, e a
defesa do mesmo, são muitas vezes contrapostas entre o “tradicional” e o “inovador”,
denominados, na história da educação, a Escola Tradicional e a Escola Nova e permitem,
por sua vez, duas considerações importantes no âmbito da pesquisa: o (dês)conhecimento
das aproximações e distanciamentos dos seus próprios autores e teóricos em relação à
filosofia da Escola Nova e o (dês)conhecimento das concepções ipis litteris do que veio a
ser denominado, pelo movimento renovador, de Pedagogia Tradicional.
O primeiro passo da pesquisa, portanto, cabe a recuperar de que modo a
representação da Escola Tradicional se faz ipis litteris ou é construída pela propaganda e
2
difusão das idéias contrapostas pela Escola Nova. A pesquisa em andamento tem se
concentrado nesse movimento das idéias pedagógicas de representação e afirmação
conceitual do que vem a ser a Pedagogia Tradicional no âmbito da argumentação da Escola
Nova para, em seguida, dar continuidade na compreensão do ato de ensinar desta
pedagogia e como ela realiza o seu ato de ensinar.
Nessa perspectiva, o presente trabalho tem como objetivo apresentar o processo de
investigação das obras de propaganda e difusão do ideário escolanovista que fazem
referencia a estas pedagogias e a importância que elas assumem para a área de história das
idéias pedagógicas e da história da educação. As questões deparadas nestas obras de
referências permitirão compreender o movimento e as relações teóricas estabelecidas, bem
como apresentam questões interessantes ao campo da história.
A primeira analise destas obras se deu com a Coleção “Escola Nova Brasileira”,
escrita por José Scaramelli1 na década de 1930. A escolha desta obra, é significativa para o
estudo, uma vez versa sobre o período de efervescência das discussões das idéias
pedagógicas renovadoras do período de ascensão da Escola Nova no Brasil, já estabelecida
pelas reformas estaduais de educação que adotavam estas idéias. A coleção, composta por
cinco volumes, foi encontrada no acervo histórico do Museu Educacional da Escola
Normal Álvaro Guião de São Carlos, no qual se desenvolve projeto de restauração,
também, financiado pela FAPESP.
2. Referencial Teórico
O termo “Escola Tradicional” foi/é empregado para denominar as idéias
pedagógicas que antecederam o Movimento Renovador, traz em seu bojo uma
representação da Pedagogia Tradicional cunhada pela crítica como forma de justificar a
necessidade da renovação e marcar a sua contraposição.
Nesse sentido, retomando a pesquisa de iniciação científica, é possível resumir a
representação da “Escola Tradicional” através da crítica auferida pela Escola Nova,
embora nem toda a crítica seja “verdadeira” sobre as idéias pedagógicas ditas
“tradicionais”, apresentamo-la a seguir, a partir da obra de Bloch (1951) que pontuou o que
seria a filosofia da escola nova.
1 O nome do autor desta coleção aparece com duas grafias ao longo da sua publicação, no ano de 1931, sendo grafado nos primeiros três volumes como José Scaramelli e nos dois últimos volumes como José Scaraméli. Para fins de apresentação no trabalho, tomamos como referência a primeira grafia: José Scaramelli.
3
Em suma, o caráter educativo faz o movimento de fora para dentro, cujos valores e
conhecimentos são impostos à criança do alto para baixo e sua função educativa é o
intelectualismo, cujo estímulo é forjado artificialmente pelas sanções ou prêmios. Estas
características, entre outras, motivaram e são contrapostas a todo o momento pelos autores
escolanovistas que muitas vezes, sem perceberem, se colocam no extremo oposto.
Por outro lado, nos manuais de história de educação, é possível observar na
constituição da Pedagogia Tradicional a permanência da concepção de homem
essencialista, fazendo-se necessário o processo de educação. O homem acabado contrapõe-
se à criança, como ser imaturo e incompleto; essa configuração aponta o adulto/professor
como o centro do processo de ensino-aprendizagem.
A Escola Tradicional compreende duas vertentes distintas. A Escola Tradicional
Religiosa, cujas raízes estão na Idade Média, caracterizada, principalmente, dentro das
correntes do tomismo e neotomismo, dos quais orientaram muitos compêndios da filosofia
da educação, baseados na escolástica. E, a Escola Tradicional Leiga, própria do período de
ascensão da burguesia, cuja educação, centrada na “natureza humana”, serviu como
instrumento de consolidação de sua hegemonia. Esta última inspirou a construção dos
sistemas públicos de ensino essencialmente laicos, obrigatórios e gratuitos.
Todavia, se tomarmos como referencia a criação do termo cunhado pela Escola
Nova como forma de denominar as idéias pedagógicas que a antecederam no tempo e no
espaço, retornaremos aos primeiros atos de ensino da humanidade. E, nesse sentido, não se
poderá permanecer com o termo “Escola Tradicional”, uma vez que o longo período que
antecedeu a Escola Nova está marcado, na história da educação, pela constante evolução
das idéias pedagógicas, percorrendo uma série de autores.
Dessa maneira, a análise das coleções de propaganda e difusão das idéias
pedagógicas da Escola Nova também se torna objeto do estudo específico, juntamente com
as obras que fazem referencia a História e a Filosofia do Movimento Renovador, os
Manuais de História e Filosofia da Educação. Estes referenciais teóricos, esboçados no
trabalho se inserem num projeto maior de investigação e análise em andamento.
3. Objetivos
Tais pressupostos retomam a dificuldade de analisar as categorias elencadas na
introdução para estudar as concepções próprias da Pedagogia Tradicional e quais os
autores poderiam ser tomados para representá-la, permitem os seguintes questionamentos:
4
- Em que medida a representação da Escola Nova sobre a “Escola Tradicional” configura a
concepção ipis litteris da concepção de ensino tradicional?
- A concepção de ensino conferida a “Escola Tradicional” representa a evolução das idéias
pedagógicas no período de longa duração em que a mesma existiu?
- Como poderia ser configurado o estudo ipis litteris da chamada Pedagogia Tradicional e
quais os teóricos que a representam na História da Educação?
- Em que medida, tais teóricos, se aproximam e se distanciam da compreensão
escolanovista da Escola Tradicional?
- Como poderia se apresentar a filosofia e a concepção do ato de ensinar na Pedagogia
Tradicional, auferida pela análise e estudo a partir dos autores e obras pertinentes as idéias
pedagógicas ditas “Tradicionais”?
Estes questionamentos, e outros que surgirem no decorrer da investigação,
procuram orientar atingir os objetivos específicos propostos para este trabalho:
- Investigar o discurso e a construção do termo “Escola Tradicional” pelo Movimento
Renovador;
- Analisar de que maneira a representação da “Escola Tradicional”, sob influência da
Escola Nova, permite o (dês)conhecimento das idéias pedagógicas que a antecederam;
- Estudar a filosofia ipis litteris da Pedagogia Tradicional a partir dos seus principais
representantes no período de longa duração na História da Educação;
A análise da coleção “Escola Nova Brasileira” nos permite compreender algumas
destas indagações, bem como, permite observar de forma mais detalhada o movimento das
idéias pedagógicas, apresentando outras questões que sugerem investigações outras de
suma importância para o estudo do período de longa duração em que se insere o estudo.
4. Metodologia
A metodologia empregada na pesquisa é de caráter teórico-bibliográfico, e como o
objeto de análise se insere no campo da história das idéias pedagógicas, os princípios
orientadores da metodologia do trabalho e das categorias de análise serão de acordo com
Saviani (2007):
1. O princípio de caráter concreto do conhecimento histórico-educacional a
partir de modelos explicativos das complexas relações e múltiplas
determinações na história;
5
2. A perspectiva de longa duração representada pela captação e distinção dos
movimentos orgânicos dos movimentos estruturais/conjunturais;
3. O terceiro princípio é denominado pelo olhar analítico-sintético das fontes
levantadas por meio da análise e articulação das informações sincrônicas e
diacrônicas que caracterizam o objetivo de investigação;
4. A articulação entre o singular e o universal, isto é, as relações de
reciprocidade, determinação e subordinação entre a esfera local, nacional e
internacional;
5. A atualidade da pesquisa histórica, na investigação histórica da consciência
humana, de forma interessada, isto é, compreendendo o objeto a partir de
suas raízes do passado e projetando-o para o futuro.
A historiografia das idéias pedagógicas evidencia a estreita ligação entre as idéias
pedagógicas e as idéias educacionais. As idéias pedagógicas compreendem o movimento
real da educação que constitui a prática educativa, adentrando nas idéias educacionais, por
meio da análise do fenômeno educativo da produção das idéias no campo da ciência
(objeto de pesquisa) e determinação das múltiplas concepções de homem, sociedade e
educação (filosofia da educação).
Acrescenta-se, ainda, a função da pesquisa em história da educação como uma
prática intencionada, uma forma de intervenção social que acaba por construir sujeitos
humanos é que propomos o trabalho de pesquisa teórico-bibliográfica, acrescentando que a
pesquisa a ser aqui realizada caracteriza-se como um estudo de caráter político, histórico e
filosófico.
As categorias de análise metodológicas adotadas no trabalho como um todo,
perpassam todo o projeto de análise da pesquisa do mestrado. Em outros termos, tanto o
objeto de estudo: “O ato de ensinar” nas três correntes pedagógicas; como a investigação
que insere como parte da pesquisa compreende esse movimento. A coleção produzida por
José Scaramelli adentra o projeto e a sua análise é realizada dentro destas categorias, uma
vez são modelos explicativos/ilustrativos de uma relação complexa das idéias pedagógicas
e das determinações da história e, sendo objetos concretos desse conhecimento histórico-
educacional, representam o caráter concreto de sua utilização na pesquisa. Nesse sentido, o
estudo da obra permite entrar em contato com uma fonte concreta desta propaganda e
difusão do ideário da escola nova e que colaborou para a construção da representação da
escola tradicional. A esta consideração, o estudo permite as seguintes questões de
6
investigação: Em que medida a Coleção “Escola Nova Brasileira” permite compreender as
discussões das ideais pedagogias deste período? Qual a representação emite da Escola
Tradicional? Como suas idéias se aproximam ou se distanciam de seu algoz? O que sugere
as questões apresentadas na obra para pensar a relação de análise do projeto?
A análise de coleções que venham a colaborar nesta investigação, inserindo-se
dentro da pesquisa de mestrado, torna necessária a sua compreensão no período de longa
duração, a fim de observar em que medida a obra representa e se distingue dos movimentos
orgânicos de sua produção. A compreensão desse movimento nos permite indagar uma
série de questões, dentre elas: Quais as aproximações e rupturas a coleção apresenta da
Filosofia da Escola Nova? Como que o movimento de elaboração, difusão e propaganda da
escola nova repercutiram na formação da mentalidade política e educacional do contexto
brasileiro?
Dessa forma, adentra-se ao princípio em que as fontes levantadas, tanto pelo estudo
em relação ao contexto estrutural/conjuntural como o momento de propagação destas
idéias nos sugerem uma série de fontes para analisar e articular as informações sincrônicas
e diacrônicas da investigação. A coleção de José Scaramelli representa uma das fontes em
que será utilizada na investigação para permitir esse olhar analítico-sintético relevante para
a investigação do “Ato de Ensinar” da Pedagogia Tradicional.
A discussão promovida pelos princípios metodológicos garante a investigação
estabelecer a articulação universal e o singular, em suas relações de reciprocidade,
determinação e subordinação entre a esfera local, nacional e internacional, que
contribuíram para fazer uma “representação” construída pela Escola Nova sobre a
Pedagogia Tradicional e, assim, promover uma análise dos princípios ipis litteris do Ato de
Ensinar promovido por esta pedagogia.
A investigação, tomando o objeto do “ato de ensinar” e as suas representações no
interior das correntes pedagógicas, percorrendo as suas raízes do passado e projetando-o
para o futuro, retoma a necessidade de entender a importância do ato de ensinar na
histórica [da consciência] humana. A investigação interessada com a verdade, procura
desvelar em tempos que o ensino vem sendo rebatido, reiteradamente, como sem
importância para a formação do homem, por uma série de fatores, dentre eles, a própria
produção de cultura que seria iminente desde o nascimento.
5. Desenvolvimento
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O presente trabalho irá desenvolver como um estudo de natureza teórico-
bibliográfico acerca da representação da “Escola Tradicional” por meio das obras de
filosofia da Escola Nova e das publicações de divulgação das idéias escolanovistas no
Brasil que apresentam uma versão da concepção tradicional do ensino. Além deste estudo,
investigar-se-á, no período de longa duração que comporta o ato de ensino até a
constituição do movimento renovador, a partir de teóricos e obras da História da Educação
e da História das Idéias Pedagógicas que compreendem a Pedagogia Tradicional.
O estudo, no tocante ao estudo e análise da representação da “Escola Tradicional”
por meio das obras filosóficas da Escola Nova já foi iniciada com a leitura da obra de
Bloch, devendo-se, anda, contemplar outros autores como Luzuriaga, entre outros.
Com referência as representações apresentadas pelas obras de divulgação das idéias
pedagógicas da Escola Nova, serão analisadas cinco coletâneas, a saber: Escola Nova
Brasileira – José Scaramelli2; Biblioteca da Educação – Lourenço Filho; Atualidade
Pedagógica – Anísio Teixeira; XXXX – Toledo. Cabe ressaltar que esta parte do
referencial bibliográfico será analisado no Museu Pedagógico da Escola Estadual Álvaro
Guião, tendo em vista a aproximação ao projeto financiado pela FAPESP, em Parceria com
a Escola e a UFSCar, de recuperação do mesmo. A vinculação da pesquisa ao projeto tem
como objetivo específico demonstrar a importância do projeto no âmbito da pesquisa em
História da Educação e na História das Idéias Pedagógicas a partir da corrente da História
das Instituições Escolares.
Os teóricos e obras datadas do período de longa duração da Pedagogia Tradicional,
ainda, serão verificados no decorrer da pesquisa e levantamento anteriores; até o momento
destacam-se os seguintes teóricos: Platão, Kant, Herbart e Durkheim.
Em fase de finalização, apresentamos neste trabalho, algumas idéias sintetizadoras
da coleção “Escola Nova Brasileira” de José Scaramelli, como parte da investigação
pretendida. A análise desta obra tem nos permitido observar a rede interpretativa dos
teóricos do Movimento Renovador por seus defensores, difusores e propagandistas da
Escola Nova e como estas interpretações nos revela a compreensão da filosofia da escola
nova brasileira e a contraposição ao ensino tradicional.
5.1 - A Coleção “Escola Nova Brasileira” de José Scaramelli
2 A análise desta coletânea se encontra em fase final.
8
José Scaramelli é autor da coleção “Escola Nova Brasileira”, produzida na década
de 1930, é composta por cinco volumes intitulados: Esboço de um Systema, Lições Ativas,
Como realizar a transição da Escola Tradicional para a Escola Nova, Didática e Testes. A
finalidade do estudo da propaganda e da produção deste, e de outros, personagens que
participaram do Movimento Renovador do século XX, é de suma importância para a
história da educação e para a história das idéias pedagógicas. A partir do contato com estas
produções é possível observar as aproximações e distanciamentos que cada um destes
personagens estabeleceu com a “filosofia” da escola nova, revelando a luz do estudo da
história das mentalidades, a circulação e a heterogeneidade do que se veiculou chamar de
Escola Nova. Por outro lado, o estudo deste (e de outros personagens), garante a
reconstrução no período de longa duração das idéias pedagógicas da Escola Nova, buscar
as representações atribuídas a Escola Tradicional a partir das criticas do Movimento
Renovador. Este fato, em particular, é o que mobilizou o estudo deste personagem, e de
outros elencados no projeto de pesquisa, ao depararmo-nos com a dificuldade do estudo da
Escola Tradicional, cujo conhecimento, principalmente nos cursos de formação em
pedagogia e demais licenciaturas, versar sobre a Pedagogia Tradicional a partir das
representações/críticas da Escola Nova.
O estudo desta coleção permitiu a compreensão das idéias de propaganda e
aplicação das idéias escolanovistas nas escolas brasileiras a partir da década de 1920
quando o movimento renovador ganhou impulso no Brasil, a partir das reformas estaduais,
convivendo com os métodos tradicionais, introdução de metodologias novas e adaptação
de algumas metodologias, até a década de 1930, quando a disputa ideológica, para além
das idéias educacionais, se acirraram e deram origem ao Manifesto dos Pioneiros da Escola
Nova, que parece, no caso brasileiro, “resumir” a Escola Nova, seus princípios e seus
atores/agentes.
O estudo da coleção, como parte do projeto de pesquisa, apresenta-nos, em cada um
dos livros, uma série de questionamentos e apontamentos de lacunas na compreensão da
composição heterogênea da escola nova, as importantes argüições sobre a aplicação dos
métodos novos e as considerações quanto à didática e as implicações para o ensino de
história da educação e para o “ato de ensinar”. Alguns destes questionamentos e
apontamentos de lacunas para a produção em história e historiografia serão indicados na
sequencia da síntese destes volumes.
5.1.1 – “Esboço de um Systema” (Volume 1)
9
José Scaramelli (1931) inicia o prefácio do primeiro volume de sua coleção
apontando que a função da coleção é apresentar a assimilação da essência da doutrina e
não uma reprodução dos ensaios práticos de Dewey, Decroly, Ferrerier, Lombardo –
Racine, Demolins e etc. Esta indicação é fundamental por dois motivos, primeiro porque
anuncia os principais autores escolanovistas que circularam no período e influenciaram o
pensamento brasileiro nas idéias pedagógicas, em segundo, porque apresentam a
importância da produção de conhecimento sobre estas idéias, metodologias, práticas
educativas e não apenas uma reprodução demonstrando como foi esta apropriação e
aplicação escolanovista no Brasil. Poder-se-ia também pensar, a partir desta idéia, a
verificação das “redes interpretativas” da leitura, da compreensão/assimilação e da
propaganda e aplicação destas idéias, tal como Ginzburg (2006) realizou no denso trabalho
de pesquisa em história com a finalidade de observar a circularidade das idéias e as redes
interpretativas; no caso deste trabalho, seria importante para a construção de uma
mentalidade que se criou sobre o movimento renovador com certa homogeneidade de
idéias e práticas e que foram implantadas de forma eclética no Brasil e muitas vezes de
forma equivocada. Nesse sentido, Scaramelli (1931, p. 18-19) expõe da seguinte maneira
em seu texto:
“Se é cedo para falar de resultados positivos não o é para os frutos literários. A literatura da escola renovada é riquíssima, no estrangeiro. No Brasil copiamos, traduzimos e aproveitamos umas phrases feitas para dourar pílulas que impingimos como... frutos literários da escola nova”.
Cabe ressaltar que Scaramelli (1931, p.18) não era um critico da escola nova, mas
antes, um intelectual que defendia a renovação pedagógica, em cujas considerações via que
“A escola nova será uma risonha realidade quando o magistério, na sua totalidade, se
constituir de professores que se tenham educado nella. Antes desta data, continuaremos,
provavelmente, no terreno experimental”. Estas palavras nos remete uma certa diferença na
coexistência de mentalidades formadas neste período, de defesa as idéias hegemônicas e
contra hegemônicas, bem como aos diferentes posicionamentos dos seus fomentadores.
Terá sido Scaramelli uma voz destoante dos renovadores brasileiros? O que ele
considerava como o terreno experimental na oficialização da renovação? Como ele
pensava a Escola Tradicional e a importância da sua renovação? Terá, junto aos
escolanovistas brasileiros hegemônicos, um reprodutor ou um produtor de conhecimento
destas premissas?
10
A preocupação na reconstrução desta mentalidade e as suas implicações para o
ensino são enormes. A suposição desta consideração se deve tanto ao fato de verificar em
estudos anteriores que cada um dos autores adeptos do Movimento Renovador apresenta,
em suas práticas e teorias, aproximações e distanciamentos dos princípios orientadores da
filosofia da Escola Nova e, também, o próprio processo da escola nova no Brasil, como nos
apresenta Nagle (1976). Para este autor, enquanto o movimento renovador internacional
representou um amplo processo constituído de quatro fases que vai desce a criação, e não
especulação, das escolas novas (1989-1900), passando pela formulação do ideário
educacional na qual diversas correntes teórico-práticas se formou, a partir das quais se
tornou possível apontar as aproximações e distanciamentos do que podemos chamar de
“Filosofia da Escola Nova”, (1900-1907), seguida pela criação e publicação dos métodos
ativos a partir da maturidade pedagógica dos seus autores na formulação, debate e
propaganda (1907-1918) e, por fim, na difusão, consolidação e oficialização destas idéias
pedagógicas escolanovistas de forma global (a partir de 1918). Enquanto que no Brasil,
compõe-se de duas fases, uma preparatória (1979-1920) que envolve a “infiltração”
facilitada destas idéias, uma vez que associadas ao plano político econômico em voga:
liberalismo; nas legislações do período como a Reforma Leôncio de Carvalho, o Parecer de
Rui Barbosa, Escolas Estrangeiras/Protestantes, a Reforma Paulista de Sampaio Dória, a
indicação dos métodos e criação de laboratórios em cujo período há a coexistência de
métodos tradicionais, reformulações e inovações; e, em uma segunda, a difusão e
realização da escola nova a partir da década de 1920, com a maciça difusão dos ideais
político-pedagógicos, as reformas e remodelações da estrutura e da mentalidade a serem
formadas por meio da escola, as reformas dos currículos e aplicação de técnicas.
Ainda, neste primeiro volume, Scaramelli (1931) anuncia a solidez da Escola Nova
Brasileira diante da areia movediça da educação que se manteve por séculos, notadamente,
fazendo referencia a Escola Tradicional. No entanto, a despeito das reformas realizadas
pela Escola Nova por meio das suas reformas, este idealizador, propagandista e defensor
do método escolanovista menciona suas criticas sobre a implantação destas idéias nas
reformas brasileiras em educação, exceto a realizada no Rio de Janeiro sob a tutela da
Professora Armanda Álvaro Alberto.
As criticas realizadas a reforma escolanovista no Brasil se deve ao fato de as
discussões aqui realizadas não atingirem o ângulo de complexidade verdadeira que essa
renovação abrangia para o ensino. Nesse sentido, apresenta o panorama do que corria nos
países internacionais como Estados Unidos, Suíça, Bélgica, França, Alemanha, Itália entre
11
outros países e o Brasil, inexperiente e, antes de passar de uma fase de experiência, se
intitula na sua oficialização aligeirada. Estas considerações são fundamentais para captar a
mentalidade construída no início do século XX e para a tessitura do movimento das idéias
pedagógicas na educação brasileira.
Os temas trabalhados neste volume contemplam temas gerais que esboçam algumas
idéias renovadoras no ensino. O trabalho de análise desta pesquisa que aqui apresentamos
nos permitirá visualizar em que medida estas idéias se avançam no conhecimento
pedagógico e na compreensão da criança, do ensino e do conhecimento. A socialização e a
integração da criança, na qual a imitação – refutada a sua presença no ensino tradicional –
se apresenta na escola nova como sendo de 4 tipos e a integração da criança ao meio,
natural e pragmático. Nesse sentido é possível apontar o uso da imitação tanto no ensino
tradicional quanto no ensino novo, sendo neste ultimo, introduzido o uso da psicologia
infantil como reforço.
Os métodos de pesquisa, como forma de ensino, apresentam ao mesmo tempo a
eliminação de regras e a sistematização, entre a espontaneidade do ensino curricular e a
produção/criação desta “espontaneidade”, as lições ativas e estabelecidas em
procedimentos, que ora marcam suas diferenças – principalmente em comparação os
métodos adotados por Herbart e Decroly – ora estabelecem um seqüenciamento criticado
na pedagogia anterior. Em resumo: situação de vida, pesquisa e globalização; em cada um
deles, uma ordenação do ensino. Em certa medida, essa espontaneidade e a diretividade na
educação “ativa” das crianças, guarda semelhanças com o projeto educativo elaborado por
Maria Montessori, cuja diretividade no ensino infantil era preconizado, embora a leitura
fragmentada e utópica pareça ser fruto único e exclusivo da espontaneidade da criança.
A organização escolar também é esboçada neste volume da coleção como sugestão
de uma organização que ora preconiza o ensino e as discussões em relação aos aspectos
lógicos e psicológicos do conhecimento, a elaboração do programa escolar, as formas de
planejamento do ensino e as lições ativas, além de introduzir o tópico sobre
“questionários”. A análise destas considerações permite com maior acuidade observar a
construção do pensamento das idéias escolanovistas e as suas aproximações e
distanciamentos em relação à pedagogia tradicional que tanto se contrapôs. Com estes
suporte teórico será possível compreender a rede de interpretação dos autores
escolanovistas na (re)produção no caso brasileiro e a representação da Pedagogia
Tradicional.
12
Scaramelli (1931) longe de negar a importância das reproduções escolanovistas,
apresenta, ao final deste volume, a tradução do artigo de John Dewey “Finalidade da
história no curso primário”. Neste artigo traduzido é importante observar a rede
interpretativa do texto de John Dewey e a sua aplicação no ensino “novo” brasileiro,
permitindo compreender uma representação da história “tradicional” por meio de uma
crítica auferida a este ensino e não representando ipis litteris a sua compreensão, da mesma
forma que faz indicação (importante para nós no âmbito maior em que este estudo se
insere) a crítica a Herbart.
Assim, este esboço inicial produzido por Scaramelli (1931), uma série de questões
de pesquisa se acrescenta aos objetivos inicialmente traçados, pois concebe a produção
teórica de propaganda das idéias escolanovistas sem deixar de vista a sua realidade no
plano educacional, seus problemas, suas apropriações, suas diferenças, suas representações
e suas interpretações, muitas vezes ecléticas, que embora tenham sido importantes no
sentido de compreender a rica formação pedagógica do período por um lado, impediu com
que os professores formados neste ínterim, tivessem acesso ao estudo dos seus autores pelo
original, no qual a série de clichês, chavões e pastiches formaram o ideário educacional
brasileiro. Esse quadro representa conseqüências à compreensão do movimento renovador
em termos de concepção de criança/infância, de desenvolvimento e de educação, além das
implicações advindas de sua ligação com o projeto liberal que se fortalecia e consolidava
no plano político.
5.1.2 – “Lições Ativas” (Volume 2)
O segundo volume dedica a propor a lição ativa como núcleo formador do ensino
pautado pelas idéias escolanovistas, adaptada a realidade de cada escola, aluno e interesse.
O prefácio deste volume traz, dessa forma, um apanhado geral do que sejam as lições
ativas e como elas deverão ser “dirigidas” e dando a impressão de certa interpretação
ambígua que cria na critica da diretividade da escola tradicional e a apologia da
espontaneidade do interesse, da realidade e da necessidade das crianças.
A importância das considerações de Scaramelli (1931) também se coaduna aos
objetivos de observar as aproximações e distanciamentos dos autores escolanovistas em
relação a “Filosofia da Escola Nova”, como pode ser vista pelas criticas auferidas a
Decroly; e, por outro lado, a representação e contraposição com a Pedagogia Tradicional,
marcadamente pela produção teórica de Herbart. A crítica a estes autores, um do próprio
13
movimento renovador e o outro representante do que veio a ser denominado de Escola
Tradicional, se refere ao fato da rigidez dos passos/procedimentos estabelecidos no
processo de ensino aprendizagem, o que contraditoriamente, a sistematização das lições
ativas realiza ao estabelecer seus “próprios passos”, a saber: situação total, pensamento
(dedução/indução), globalização e assembléia infantil.
Estes “passos” são pormenorizados no volume citado, no qual é possível observar
as contradições internas da teoria e em relação às próprias representações e contraposições
estabelecidas. Os exemplos, a maior parte da composição deste volume, apresentam os
passos seqüenciais na formalização do ensino e fica a indagação, a crítica aos
procedimentos fixos do ensino, mudando o conteúdo da disciplina, mas cujo procedimento
se mantém, justifica as criticas auferida a estes dois representantes? Em que medida a
crítica se estabelece nos procedimentos ou nas concepções de ensino? Quais são estas
concepções de ensino e em que diferem em que se assemelham? Quais as suas implicações
para o ensino? São questões pertinentes na investigação que se pretende.
5.1.3 – “Como realizar a transição da escola tradicional para a Escola Nova” (Volume 3)
Nesse âmbito, Scaramelli (1931) dá uma clara visão do processo lento e gradual
dessa transição, com pequenas modificações no ambiente escolar e nas metodologias. A
crítica às construções suntuosas dos prédios escolares é incisiva e importante,
demonstrando os problemas em relação ao investimento educacional, fazendo sugestões de
condições de construção dos prédios escolares e adaptações ao espaço e a mobília das
mesmas. A parte metodológica também se modifica com a introdução de pequenas
inserções da cotidianidade da criança com projetos de centro de interesse da criança, a
experimentação, as excursões, a globalização e as assembléias dos juvenis. Ou seja,
“As investigações práticas, no meio immediato, para a solução de problemas da vida real, não trazem despesas á escola. Com pequenos gastos, com a iniciativa e boa vontade, quer dos alumnos, quer dos professores, organizam-se, pouco a pouco, pequenos museos, salas-ambientes, pequenos laboratórios, etc. etc. e vai-se caminhando em direção do ideal sonhado” (Scaramelli, 1931, p.8-9)
A primeira parte do livro é dedicada a considerações sobre a Escola Tradicional, ao
financiamento e a sua transição em nível metodológico. Em relação ao ensino tradicional é
amputado a pequenas representações que permanecem ainda, dentre elas, a falta de
14
empiria, a disciplina rígida, ao método mnemônico, sintetizada na frase significativa para a
sua representação: “Explicar era a funcção do professor. Memorizar a tarefa que incumbia
ao alumno” (p.16). Mas, será que os autores da Pedagogia Tradicional se reduziam a estes
dois fenômenos? O que os diferentes autores e a construção da “filosofia da pedagogia
tradicional” têm a dizer sobre isso? É possível fazer uma representação a esse modo? Estas
questões são um dos objetivos da pesquisa, afinal, o que consideramos como escola
tradicional? Quais são os seus autores/teóricos/filósofos/educadores? O que eles pensavam
sobre a criança e a sua a educação?
A parte financeira, como iniciado anteriormente, nos leva a tecer considerações
importantes devido às implicações que podem ser desenhadas a partir dela. A crítica sobre
a construção dos grupos escolares e os seus custos e a construção moderna das escolas a
um custo reduzido: pavilhão de salas modestas, centralização do prédio em terreno
murado, cercada por jardim, pomar e horta, no qual as próprias crianças e técnicos
experimentados fariam o trabalho e o mobiliário barato. Estas construções, conviveram,
criando, como a literatura em história da educação e a história das instituições têm
demonstrado, a dualidade pedagógica nos prédios e conhecimentos conforme a
representação de criança/infância a que se refere. Quais as implicações destas
considerações numa sociedade antagônica como a brasileira? Como estruturar e centralizar
a realidade do aluno, o atendimento aos seus interesses, a vinculação com as suas
necessidades, o barateamento das acomodações escolares como forma de redução de custos
e garantir a sua educação, alcançaria o mesmo patamar? O que podemos inferir a esse
respeito?
Em sequencia, Scaramelli (1931) nos delineia a transição metodológica da Escola
Tradicional (cunhada pelo movimento escolanovista) e a Escola Nova, da qual é possível
depreender as formas de apropriação do pensamento renovador e o ecletismo das
propostas, a rede interpretativa que poderá ser feita diante deste quadro poderá ser profícua
para a (re)interpretação das lacunas da escrita da história das idéias pedagógicas
hegemônicas, não hegemônicas e contra hegemônicas.
A essa transição, o autor apresenta o planejamento e a exposição de aulas sobre o
método escolanovista dentro dos “passos” por ele indicados, seguindo o seqüenciamento
nos diferentes eixos do currículo. A título de curiosidade, Scaramelli (1931) expõe sobre
zoologia (criação de pequenos animais) e botânica (crescimento das plantas) nas quais o
seqüenciamento metodológico compreende: situação total, tarefas em equipe, orientação,
observação e experiências, assembléias de alunos, globalização.
15
Nesse ínterim, o autor faz a tradução do artigo “Independência” de Maria
Montessori, no qual é ressaltada a liberdade e a independência como formas de dirigir as
manifestações ativas desde a primeira infância, contrapondo-se, ao mesmo tempo, a
diretividade como forma eficiente de educar a criança e guiá-las na independência, ou seja,
“Quem não compreende que ensinar um menino a comer, a lavar-se, a vestir-se é um
trabalho muito maior, mais difícil e exige maior dose de paciência, do que realizar, por ele,
estas diversões ações?” (Montessori, s/d, apud Scaramelli, 1931, p.78). É curioso observar
o uso pontual desta tradução com o conteúdo deste volume, pois ao compreender a
pedagogia montessoriana como uma relação intrínseca entre a diretividade e a liberdade da
criança, muitas vezes ocultada e contraditória internamente nos textos de Montessori, se
coaduna com a proposta de lições ativas, que levam em consideração o interesse da
criança, as suas necessidades e a sua realidade. Muitas vezes dirigindo os interesses, a
interpretação de suas necessidades frente a sua realidade e as conseqüências desta na
distinção entre a concepção de criança/infância e de educação e as representações advindas
da sociedade capitalista antagônica.
Novamente, faz-se necessário observar a produção dos autores escolanovistas na
apropriação e (re)produção dos autores deste movimento amplo que se consolidou no
início do século XX e quais as suas implicações na rede interpretativa e suas conseqüências
no ensino brasileiro. Para tal, faz-se necessário, pois muito desconhecemos da obra teórica
destes formuladores, defensores e propagandistas da Escola Nova, tornando o fragmento
como parte, muitas vezes equivocada e acrescida ao ecletismo reducionista do pensamento
e das práticas educativas destes intelectuais.
5.1.4 – “Didática” (Volume 4)
O volume da coleção que apresenta a fundamentação teórica sobre a didática e a
sua discussão, sem reduzi-la a parte metodológica e, justamente por isso, o que nos permite
observar as considerações, interpretações e representações na história das idéias
pedagógicas. Já no prefácio, Scaramelli (1931, p.7-8) apresenta a ausência de livros
didáticos, em seu sentido restrito, com a sistematização de seus princípios e, dado o fato,
ele procura apresentar ao leitor brasileiro um guia que supra tal necessidade, o autor argüi
que “Sou dos que pensam que um professorado, sem solida base didática, não poderá
cumprir a missão que lhe incumbe com a proficiência necessária. A maioria dos fracassos
do nosso ensino senão todos têm suas raízes no terreno mal acanhado pela didática”.
16
O livro é composto por cinco partes: Origem do conhecimento, O que é o
conhecimento e, por fim, Como se aprende, Função do Conhecimento e Princípios
orientadores. Essa composição se deve aos pressupostos da discussão da disciplina
didática, sendo realizado por Scaramelli (1931) com a finalidade de demonstrar os avanços
do conhecimento que a Escola Nova desenha.
Sobre a “Origem do Conhecimento” o autor indaga inicialmente até que ponto se
argui em relação a sua gênese ou a sua ideologia, apontando para as considerações
religiosas da origem do conhecimento e a própria origem sensível do individuo no mundo
como produtor do conhecimento. Essa consideração será reveladora ao considerar o
princípio de origem na experiência sensível nos escritos escolanovistas, como exposto já
pelo seu predecessor Rousseau, em cuja obra Emilio ou Da Educação, diz redescobrir a
educação sensitiva e que implicará na teoria de uma série de autores, como Maria
Montessori.
Scaramelli (1931 apresenta em um primeiro momento a teoria clássica da origem
do conhecimento, percorrendo-a, sob dois ângulos. O primeiro deles é a corrente na qual o
conhecimento provém de atos inatos, do qual destaca três filósofos. Platão, com a teoria
das idéias, a partir do mito da caverna. Descarte, pela classificação do conhecimento em
três âmbitos: adventícios (sentidos), factícios (espírito) e inatos (impressos por ação divina
e lembrados pelos sentidos); e, também, por Leibnitz, para o qual, inteligência pura e
inteligência provinda da experiência sensível e cujas disposições são inatas, mas que o
conhecimento intelectivo depende da potencia de sua formação com o contato com a
realidade.
O segundo ângulo compõe dos atos adquiridos, tomando como referencia cinco
correntes. O “ontologismo” é a apresentação visão de deus sobre o conhecimento e para o
qual destaca: Malebranche, Gioberti e Rosmini, podendo ser apresentada como uma gênese
no espírito, uma organização no corpo, um conhecimento emanado de Deus.. O
“tradicionalismo” é caracterizado pela autoridade, tanto no sentido rigoroso do qual
destaca Bonald e Lamennais; quanto mitigado, do qual referencia Bonnetty e Ventura. As
considerações sobre esta escola são elaboradas a partir das referencias de Cardeal Mercier
(apud Scaramelli, 1931, p.27), a partir do qual defini a palavra, antes do pensamento, como
atributo da inteligência. Os autores referendados como representantes do tradicionalismo
são pouco conhecidos, teriam eles que concepção de ensino, de criança, de conhecimento?
O “empirismo” é apresentado como ato oriundo dos sentidos e do qual se
depreende três tendências. O ‘sensualismo’ com Locke (tabula rasa) para o qual somente
17
através da experiência é que se adquirem os materiais do raciocínio; e Condillac (estatua)
para o qual as sensações como único fato do qual derivam as idéias, ou seja, “Toda a vida
psíquica reduz-se a estas duas ordens de fatos: o entendimento e a vontade” (R. Faria Brito,
apud Scaramelli, 1931, p.31). Esta idéia muito se assemelhará a obra teórica de Maria
Montessori. O ‘associacionismo’ são idéias generalizadas por via das expressões da
sensibilidade, da inteligência e da vontade, sendo que seus representantes destacados,
dentre eles Stuart Mill e Bain, e ainda, com o ‘evolucionismo’ de Herbert Spencer.
O associacionismo de Alexandre Bais, do qual Scaramelli (1931) faz menção,
indica a redução da inteligência em três elementos primitivos: o sentimentos ou
consciência (discernimento – associação por contraste), o sentimento da semelhança
(similaridade – abstração, raciocínio e generalização) e a memória/reprodução
(retentividade – fundamento memória e associação por contiguidade). Ainda nesse item
apresenta os tipos de associação formulada: contigüidade, qualidade e construtivas. Estas
idéias serão, posteriormente, trabalhadas por Claparèd, influente intelectual da Escola
Nova (Suíça).
O criticismo é compreendido pela composição entre sensibilidade, inteligência e
razão. Segundo Emile Faguet (apud Scaramelli, 1931, p.38) aponta que conhecemos, ao
mesmo tempo, pela sensibilidade (impressão do fenômeno), pelo entendimento (relação
entre impressão e forma) e pela razão (formulação de idéias gerais, universais,
sistematizadas).
Por fim, Scaramelli (1931), apresenta o “Psicologismo Racional” tomando como
referencia a obra de Aristóteles e de Santo Tomaz. Para Aristóteles, a inteligência seria
uma potencialidade que se exerce a partir de determinantes conceituais que se lhe
apresentam, ou seja, o conhecimento surge do contato/experiência sensível que produzirá
uma idéia. Já para a ideologia tomista são apresentados quatro princípios explicativos:
Inteligência como potencia receptiva, determinação da potencia pelo entendimento
(abstração): imaginação e intelecto vivo; relação entre a potência intelectiva e o
determinante conceitual e, por fim, a inteligência (reflexão).
Em seguida, Scaramelli (1931) passa a explicar a origem do conhecimento a partir
da teoria moderna, notadamente por meio da Escola Nova, a partir de cinco problemas que
julga indispensável: É possível conhecer? Qual é a origem do conhecimento? Qual é a
essência do conhecimento? Que espécie de conhecimento é formada? Quais são os critérios
de verdade?
18
Nesse ínterim, Scaramelli (1931) apresenta ao seu leitor as diferenças entre a
atividade biológica e a atividade psicológica, embora, ambas juntas, se complementam,
dando origem à psicologia funcional/fisiológica e que irá refletir na própria atividade
consciente do indivíduo. A teoria biológica compreende o funcionamento do organizamos:
evolução, função, adaptação, seleção neutral e etc.. A teoria psicológica é uma ciência, ao
mesmo tempo, independente, mas que se fundamental, se complementam, já que as
funções biológicas ocorrem e a adaptação ao meio físico incorrerá a adaptação psicológica
do indivíduo refazendo o processo. Estas explicações, embora tenha sido referendada na
obra de Scaramelli (1931, p.54) por meio da indicação de Abel Rey.
A segunda parte, desse modo, trata sobre “Que é o conhecimento”, Scaramelli
(1931) se baseou na obra, trata somente a partir da teoria do conhecimento de Dewey3,
retomando o papel do cérebro (conhecimentos biológicos, fisiológicos e psicológicos), o
método experimental, o conhecimento e o habito, a verdadeira significação do
conhecimento. Assim estabelece que o cérebro seja o mecanismo pelo qual se dá a
reorganização d atividade mental, que se realiza pelo método experimental que leva ao
conhecimento (fundamenta outras experiências/repertório) ou ao hábito (novidade
pontual).
São novamente sobre estas premissas que será tratado as divergências entre a
concepção de conhecimento pela teoria clássica, na qual apresentará os fatos (particulares
ou gerais) de um lado e as relações do outro, enquanto a teoria moderna lida com o
conhecimento real às relações particulares e gerais será vistas conjuntamente, o que
implica a seguinte consideração no texto:
“Sem os dados particulares tais como são discernidos pela resposta ativa dos órgãos sensíveis, não há materiais para o conhecimento nem para o desenvolvimento intelectual. Sem colocar estes materiais na trama dão significação elaborada na experiência ampla do passado – sem o uso da razão ou do pensamento – os dados particulares são meras excitações ou irritações. O erro das escolas sensualistas e racionalistas consiste em não considerar que a função do estímulo sensível e do pensamento é relativa à experiência organizada para aplicar o velho no novo e, portanto, para manter a continuidade ou consistência da vida” (Dewey, apud Scaramelli, 1931, p.65)
A exposição teórica que se segue, embora apresente este argumento, será clara ao
anunciar que o “conhecimento é justamente algo de que temos consciência senão que
3 “Filosofia da La Educación: Los Valores Educativos”de John Dewey
19
consiste na disposição que utilizamos conscientemente para compreender o que agora
ocorre”(Scaramelli, p.66).
A terceira parte se ocupa de “Como se aprende”, na qual o autor também se
utilizará de outras obras de John Dewey em sua exposição. Inicialmente foca o reflexo
condicionado de Pavlov e a teoria do interesse transferido de Dewey e, na sequencia,
apresenta as relações entre os dois. Esse fundamento da psicologia behaviorista será à base
da matéria e dos métodos, associados, uma vez que ambos compreendem o mesmo
processo, sendo a matéria a classificação dos fatos e princípios da natureza e do homem e
dos métodos representam os métodos de exposição desta matéria a ser aprendida. Para isso,
observa também o uso e a função das matérias de acordo com a visão das idéias
pedagógicas de Dewey.
A “Função do Conhecimento”, quinta parte do volume, refere-se aos problemas
didáticos das estruturas apresentadas na contraposição entre a teoria clássica e a teoria
moderna e os seus princípios orientadores, baseados no “retalho” de diversos autores do
movimento escolanovista com a finalidade de juntá-los “coerentemente” para a construção
didática da Escola Nova Brasileira. A esse respeito, Scaramelli (1931) traz a observar que
essa será uma tentativa, e caso não dê certo, o trabalho devera ser recomeçado. As
perguntas que cabem nesta parte são se é possível elaborar uma didática a partir dos
recortes dos diversos autores escolanovistas, ignorando as suas aproximações e
distanciamentos em relação a “Filosofia da Escola Nova”, bem como entre eles próprios?
De outro modo, é possível que o professor tenha um domínio teórico dos autores e de suas
propostas diante do ecletismo, fragmentação e retalhos realizados pelos propagandistas
escolanovistas brasileiras? De que forma podemos compreender a formação dessa
mentalidade escolanovista no Brasil?
Nesse ínterim, apresenta as funções do conhecimento como o elemento de
(re)construção das experiências anteriores com as novas, cujo desenvolvimento educativo
envolve a estrutura dos órgãos corporais e atividades funcionais, a partir dos interesses de
cada pessoa, através da interação entre o sujeito e o meio. O desenvolvimento
natural/adequado envolverá estas premissas, destacando o desenvolvimento a partir do uso
(educação utilitária), a importância do meio para direção do crescimento (respeito e
naturalização das condições sociais), educação partindo sentidos humanos (educação
sensorial), bem como a importância da diretividade do adulto na atividade educativa (re-
direção). A interação entre o sujeito e a sua realidade é fundamental no processo de
aprendizagem, pois permite a apreensão daquilo que não se inscreve sob os órgãos
20
funcionais: o hábito, o controle social, a subordinação dos poderes naturais às regras
sociais. A experiência direta com o sujeito e o meio é que irá proporcionar o
enriquecimento cultural da criança e a definição do próprio processo de (re)construção do
conhecimento.
A partir destes pressupostos, Scaramelli (1931) passa a dissertar sobre o programa
escolar como fator de unidade e integridade a própria vida da criança, conciliando a
criança ao mundo adulto/social, como processo educativo. Nesse sentido, Scaramelli
(1931) fará a critica ao mundo da escola como sendo externa a criança, desvinculada a sua
realidade e ao seu interesse, de forma que os estudos deverão ser compostos pelo que de
mais importante se impõe, a experiência, que implica em formação e
atitudes/comportamentos, motivos e interesses que levam as crianças a dedicarem-se. Em
resumo, pode-se denominar que esse processo/programa deverá ser estabelecido pela
função da interpretação natural realizada pela criança, focando seus interesses e com
vínculo a utilidade, dirigindo e guinado a educação como forma de expansão do seu
crescimento.
O reforço destas premissas filosóficas da escola nova, ligadas ao liberalismo,
fortaleceu a formação do novo homem para esse sistema social, pautado no individualismo
e na naturalização das condições sociais, bem como a limitação biológica do
desenvolvimento infantil para pensar o seu desenvolvimento, a educação pragmática e
utilitarista sob o jugo do respeito e naturalização das necessidades à realidade da criança. A
essa contraposição ideológica reiterada pelos seus autores, o elemento de cunho
pedagógico nos leva a questionar de que forma os interesses/concepções de formação de
homem, de sociedade e de educação se estabelecem entre a Pedagogia Tradicional e a
Escola Nova? Em que elas diferem? As críticas escolanovistas se devem a quais fatores?
Quais as implicações que se ocultam sob a denominação “técnica”, “pedagógica” do
movimento renovador?
A quinta parte, “Princípios Orientadores – Decálogo da Escola Nova Brasileira”, é
elaborado um “catecismo” para vulgarização/divulgação e difusão das ideais
escolanovistas no Brasil, uma vez que como a comparação de aulas do ensino tradicional
(aula expositiva e mnemônica) e as lições intuitivas e os centros de interesses de Decroly
(passos embora superior a escola tradicional, ainda apresenta passos formais) são
metodologias que não compreendem a moderna sociedade brasileira, a ser reformulada,
pelas lições da escola nova brasileira, caracterizada pelos “passos” da situação total (parte
da realidade social da qual se depreende uma problematização prática), atividade de classe
21
(busca de socialização para os problemas, com divisão do trabalho em grupo) e
globalização (a socialização e sistematização). É possível observar que a contraposição aos
sistemas de ensino é realizada de forma sintética/reducionista para àquelas correntes em se
impõe a critica, enquanto o que se quer avivar é demonstrado com maior acuidade,
explanação, exemplificação. Dessa maneira, como compreender a (re)presentação e a
construção da mentalidade pedagógica? Quais as implicações desse reducionismo na
interpretação dos sistemas de ensino?Como que o normalista ou a formação de professores
constrói uma representação reducionista e como estes refletiram na (falta) compreensão do
que vem a denominar-se de Escola Tradicional?
O decálogo, elaborado por Scaramelli (1931) é sistematizado da seguinte forma:
1) O interesse – imputar o interesse no aluno seja de forma extrínseca seja de
forma intrínseca. Faz destaque a teoria de Claparèd.
2) O conhecimento – “somente o que se organizou em nossa disposição e nos
capacita a adaptar o meio as nossas necessidades e adaptar as nossas
necessidades e desejos a situação em que vivemos pode chamar-se
realmente conhecimento” Dewey (apud, Scaramelli, 1931)
3) A socialização da criança, o trabalho em comunidade – com algumas
referências a obra de Durkheim, Scaramelli (1931).
4) A globalização – coesão de todas as atividades elaboradas pelas crianças,
em grupos de trabalho e, caso falte à criança o conhecimento de alguns
conceitos, passar-se-á a intervenção da professora.
5) Atos com um fim em vista ou atos com um fim previsto – tomando como
referencia Kilpatrick e Dewey, Scaramelli (1931) aponta que o processo
educativo tem que estar ligado com a própria vida da criança.
6) Verificação objetiva pelos testes – embora aqui ele esboce a idéia da
importância dos testes, indica a produção do ultimo volume da coleção
dedicado a este tópico.
7) Educação Moral – toma como principio moral a participação eficazmente da
vida social.
8) Educação Física – referenda, no decálogo, os teóricos Emerson e Spencer.
9) Educação Econômica: poupança (conservação e preservação dos bens), boa
aplicação (uso conveniente do dinheiro) e equilíbrio orçamentário (gasto em
conformidade com a renda e saldo favorável)
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10) Educação Estética – em todos os trabalhos desenvolvidos essa preocupação
se imporá em transversalidade.
A discussão poderia ser abordada diretamente sobre este decálogo de como ele nos
revela determinadas particularidades do pensamento de Scaramelli (1931), ou da Escola
Nova Brasileira, na proposição de seus princípios. Em que medida eles se aproximam e se
distanciam do que vem a ser denominado como “Filosofia da Escola Nova”? De que forma
podemos observar se há avanços ou retrocessos nessa produção escolanovista a partir de
seu ecletismo teórico? O que cada um dos seus pontos contrapõe a Escola Tradicional?
Uma série de indagações foi e está se estabelecendo no aprofundamento do estudo
iniciado pela coleção de Scaramelli (1931). Estas serão fundamentais para a orientação do
projeto de pesquisa.
5.1.5 – “Testes” (Volume 5)
O último volume da coleção escrita por Scaramelli (1931) é dedicado ao tema de
testes justificando-o como forma/modelo que permite a verificação da validade das
aptidões e do desenvolvimento que perpassaram ao longo da história e da filosofia da
educação. A discussão levantada por Scaramelli (1931, p.11) nos permite compreendê-lo
como uma “ciência” nova, sendo na “atualidade” (1931) “não passam de uma arte – a arte
mais insipiente de pesquisar aptidões, marcha do aprendizado, nível global de inteligência,
etc. etc.”
Nesse volume, dividido em três partes, é possível encontrar uma série de temas para
a pesquisa em história e filosofia da educação, uma vez que o trabalho pormenorizado de
Scaramelli (1931) faz revelações importantes, inclusive para pensar as supostas críticas que
foram atribuídas ao ensino tradicional. A primeira parte intitulada “Como surgiu à idéia de
medida em Psicologia” o autor apresenta-nos a psicologia experimental e os laboratórios
desta psicologia no desenvolvimento da medição das sensações e critérios de
estabelecimento de sua validade, revelando-nos considerações sobre Tetens, Herbart,
Ernest Weber, Fechner e Wundt. A segunda parte, desse modo, estabelece um “Histórico
dos Testes” de forma cronológica, dando destaca aos testes e a revisão da teoria de Binet-
Simon. Ainda nesta parte, Scaramelli (1931) tem o cuidado de apresentar a conjuntura
nacional, com a aplicação destes testes no Rio de Janeiro, Bahia, Recife e São Paulo por
intelectuais de destaque, como Lourenço Filho.
23
A terceira parte, “Que é que se testa”, apresenta-nos cinco categorias: aptidões
físicas, do desenvolvimento global da inteligência e nível mental, aptidões especiais, de
descrição, de juízo moral e de determinação dos conhecimentos. O que nos importa aqui, a
despeito destas longas e detalhadas descrições, cabe ao item que refere-se aos “Testes
Pedagógicos” nos quais são reportados aos conteúdos escolares definindo os níveis de
desenvolvimento e a idade mental/intelectual das crianças, incorporado nos próprios
manuais, como instrumentos para o professor. A esse respeito, indica ao leitor de seus
volumes, o ensaio de Leonard Ayres (apud Scaramelli, 1931, p.92)
“[...] pedagogo americano, que ao invez de submeter as crianças aos testes específicos, ordena as meterias de estudo a maneira dos testes. Na aritmética, por exemplo, estabeleceu uma série de exercícios, cientificamente ordenados e valorizados, cujo nível de execução proporciona automaticamente a medida desejada”
Aos exemplos significativos que Scaramelli (1931) traz em sua obra, nos
perguntamos, Teria, portanto, somente a Pedagogia Tradicional estimulado testes que se
incorporam como ensino do certo e do errado? De que maneira estes testes, presentes nos
manuais de ensino, eram do conhecimento, e assim interpretados, na educação
escolanovistas e na formação de professores? Quais as implicações desta introdução, desde
a escola primária, para o desenvolvimento das crianças?
6. Conclusões
Embora em andamento, o trabalho e a pesquisa de mestrado, é possível destacar a
importância dessa investigação para a área de História da Educação e da História das Idéias
Pedagógicas, bem como para o Ensino de História da Educação.
Compreender a influência que o movimento renovador, em consonância com as
mudanças políticas, econômicas, sociais e culturais teve na concepção de educação do
século XX e na história da educação que a precedeu. Da mesma forma que poderá retomar
a filosofia e a concepção do ato de ensinar próprio do que veio a ser denominado
Pedagogia Tradicional, retomando a sua compreensão enviesada pela Escola Nova.
Tanto o trabalho de investigação das idéias pedagógicas permite compreender as
aproximações e rupturas, na história da educação, entre os teóricos que constituem
períodos educativos: Pedagogia Tradicional, Pedagogia Nova, Psicologia Histórico-
24
Cultural e Pedagogia Histórico-Crítica; e a filosofia e concepções de homem, de sociedade
e de educação inerentes em cada uma delas.
Através deste estudo, poder-se-á dar continuidade a pesquisa de mestrado,
demonstrando a filosofia própria da Pedagogia Tradicional e, assim, permitir a
investigação da aproximação e ruptura na concepção do ato de ensinar entre ela e a
Psicologia Histórico-Cultural e a Pedagogia Histórico-Crítica. O interesse em tal
investigação se deve ao fato de que muitas vezes elas são tratadas como se partissem dos
mesmos pressupostos, ou pela representação escolanovista crítica ao “ensino tradicional”
que vem, na história contemporânea, criticado a defesa ao ato de ensinar.
E, nesse sentido, retomar o que é próprio ao ensino, demarcando a evolução das
idéias pedagógicas que defendem o ato de ensinar, é o principal objetivo das pesquisas por
nós desenvolvidas. Somente através da educação poder-se-á garantir o desenvolvimento
pleno dos homens, cuja atividade de ensino interfere no desenvolvimento do psiquismo
humano, além de promover os instrumentos sociais (conhecimentos) necessários para a
transformação social em uma ordem em que não haja o dualismo pedagógico nem o
antagonismo social.
A análise da primeira coleção que se insere no movimento escolanovista de
propaganda e difusão das idéias pedagógicas renovadores, contrapondo o ensino
tradicional e os métodos novos, nos permitem compreender através de sua singularidade
um quadro geral destas críticas que leva a curvatura da vara e que muitas vezes se
assemelha ao próprio ensino tradicional.
Os estudos realizados com a coleção “Escola Nova Brasileira”, em fase de
finalização, nos revela a necessidade de realizar avaliar as aproximações e distancias do
conteúdo desta coleção e a sua relação com o movimento renovador, a sua filosofia, o
apontamento dos seus avanços e retrocessos. Além de estas indicações nos abrirem um
caminho de investigação da rede interpretativa que foi realizada pelo movimento
renovador para representar, na contraposição, a pedagogia tradicional; além dos próprios
princípios norteadores no qual se denota o ecletismo reducionista dos seus autores/teóricos.
Além de permitir que trilhemos na busca da representação e na concepção, ipis litteris, da
Pedagogia Tradicional, como objetivo específico deste estudo que adensa o projeto de
pesquisa.
As indicações e as lacunas possibilitadas por esse estudo e pesquisa nos trazem a
importância do estudo da mentalidade pedagógica do início do século XIX. A investigação
destas coleções, presentes no Museu Escolar do Instituto de Educação da Antiga Escola
25
Normal de São Carlos, nos permitiu, e permitirá, a tantas outras bibliotecas escolares e
pesquisadores, como uma possibilidade de encontrar ali, formas para a reconstrução da
mentalidade formada no período estudado, lacunas que precisam ser retomadas para o
ensino da história da educação e das idéias pedagógicas. Esse trabalho, em parte, nos
remete a Jorge Luis Borges, para o qual “Um livro é uma coisa entre as coisas, um volume
perdido entre os volumes que povoam o indiferente Universo, até que encontra o seu
leitor, aquele destinado a seus símbolos.”.
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Psicologia Funcional de Eduard Claparèd – Uma Análise a luz da Psicologia
Histórico-Cultural. 2008. Trabalho de Iniciação Científica. Orientadora: Alessandra Arce.
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MANACORDA, Maria Alighiero. História da Educação: da Antiguidade aos Nossos
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______. Lições Ativas. SP: Livraria Zenith, 1931. Coleção Nova Escola Brasileira.
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