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A resolução de problemas como metodologia de ensino: uma análise a partir das contribuições de Vygotsky Elaine Maria Poffo Escola de Educação Básica Domingos Sávio - SC [email protected] No início do século XX, o ensino de matemática baseava-se em técnicas de memorização, no uso de regras e algoritmos e na repetição de exercícios. O professor apresentava o conteúdo e o aluno prestava atenção para memorizar, escrever e repetir por meio de exercícios rotineiros a técnica ou o processo apresentado. Segundo Onuchic (1999, p. 201), “nessa época, o currículo de matemática ainda não estava bem definido, embora houvesse um caminho de trabalho: aritmética, álgebra e geometria.” Com o passar dos anos, surge uma nova orientação que substitui a matemática por meio da repetição, sendo que os alunos deveriam aprender matemática com compreensão. Esta forma de ensino de matemática baseava-se no treino de técnicas e habilidades para a resolução de problemas formais ou para aprender um novo conteúdo. “Essas duas formas de ensino não lograram sucesso quanto à aprendizagem dos alunos. Na verdade, alguns alunos aprendiam, mas a maioria não.” (ONUCHIC; ALLEVATO, 2005, p. 214). Com a preocupação da aprendizagem em relação à matemática, começaram as discussões a respeito da resolução de problemas para se aprender matemática. Na década de 1960, iniciou um movimento de renovação educacional denominado

A resolução de problemas como metodologia de ensino

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Page 1: A resolução de problemas como metodologia de ensino

A resolução de problemas como metodologia de ensino: uma análise a

partir das contribuições de Vygotsky

Elaine Maria Poffo

Escola de Educação Básica Domingos Sávio - SC

[email protected]

No início do século XX, o ensino de matemática baseava-se em técnicas de

memorização, no uso de regras e algoritmos e na repetição de exercícios. O

professor apresentava o conteúdo e o aluno prestava atenção para memorizar,

escrever e repetir por meio de exercícios rotineiros a técnica ou o processo

apresentado. Segundo Onuchic (1999, p. 201), “nessa época, o currículo de

matemática ainda não estava bem definido, embora houvesse um caminho de

trabalho: aritmética, álgebra e geometria.”

Com o passar dos anos, surge uma nova orientação que substitui a matemática

por meio da repetição, sendo que os alunos deveriam aprender matemática

com compreensão. Esta forma de ensino de matemática baseava-se no treino

de técnicas e habilidades para a resolução de problemas formais ou para

aprender um novo conteúdo. “Essas duas formas de ensino não lograram

sucesso quanto à aprendizagem dos alunos. Na verdade, alguns alunos

aprendiam, mas a maioria não.” (ONUCHIC; ALLEVATO, 2005, p. 214).

Com a preocupação da aprendizagem em relação à matemática, começaram

as discussões a respeito da resolução de problemas para se aprender

matemática. Na década de 1960, iniciou um movimento de renovação

educacional denominado Matemática Moderna. Esse movimento deixava de

lado todas as reformas anteriores e procurava aproximar a matemática que era

estudada na escola, com aquela estudada pelos pesquisadores, provocando

várias discussões e amplas mudanças no currículo matemático.

Essa orientação apresentava uma matemática com abstrações excessivas,

utilização exagerada de símbolos e complexidade na abordagem dos conceitos

matemáticos. Porém, esse excesso de formalização também se distanciava de

questões de relevância social e cultural.

O ensino proposto fundamentava-se em grandes estruturas que organizam o

pensamento matemático contemporâneo e enfatizava a teoria dos conjuntos,

as estruturas algébricas, a topologia, etc. Porém toda esta proposta estava

Page 2: A resolução de problemas como metodologia de ensino

longe da realidade dos alunos, principalmente das séries iniciais do Ensino

Fundamental. (BRASIL, 1998, p. 19).

O excesso de preocupação com a formalização e o afastamento de questões

práticas fez essa orientação fracassar. O movimento da Matemática Moderna

refluiu “a partir da constatação da inadequação de alguns de seus princípios

básicos, e das distorções e dos exageros ocorridos.” [...] Buscavam elas

ensinar Matemática de modo a preparar os alunos para um mundo de trabalho

que exige conhecimento matemático?” (BRASIL, 1998, p. 20). Todas essas

orientações já mencionadas: o ensino de matemática por meio de repetição, o

ensino de matemática com compreensão e o movimento da Matemática

Moderna, segundo Onuchic e Allevato (2005, p. 215) “não tiveram o sucesso

esperado”.

A resolução de problemas passou a receber dos educadores matemáticos sua

devida importância, destacando-se pelo mundo, no final da década de 1970.

Em 1980 foi editado nos Estados Unidos uma publicação do NCTM – National

Council of Teachers of Mathematics, intitulado “Agenda para a Ação”, que

descreve recomendações para o ensino de matemática sendo a resolução de

problemas apontada como o principal foco do ensino da Matemática.

(ONUCHIC, 1999). Dossey apud Pozo (1998) observam que os professores

receberam vários recursos a fim de colaborar com o seu trabalho didático como

listas de problemas, diferentes tipos de estratégias e orientações para

avaliação da capacidade dos alunos em resolver esses problemas, e dessa

forma, passaram a fazer da resolução de problemas o foco de seu trabalho.

Porém, o resultado esperado não foi satisfatório devido às discordâncias entre

as concepções existentes sobre a resolução de problemas. Para Onuchic

(1999, p. 206)

[...] este fato ocorreu devido às grandes diferenças entre as concepções que

pessoas e grupos tinham sobre o significado da “resolução de problemas como

foco da matemática escolar”. [...] os estudos da década de 80 deram muita

atenção ao processo de resolução de problemas, não se limitando

simplesmente à busca da solução do problema. Mesmo assim, o processo

continuou atrelado à busca da solução do problema.

Como se pode observar, não havia consenso sobre como se entender a

primeira recomendação do documento “Uma Agenda para a Ação1”: a

Page 3: A resolução de problemas como metodologia de ensino

resolução de problemas deve ser o foco da Matemática escolar na década de

1980. Neste sentido, o ensino de matemática por meio da resolução de

problemas é uma concepção relevante dentre os vários tipos de concepções já

existentes, pois o aluno tanto aprende matemática resolvendo problemas,

como aprende matemática para resolvê-los. Essa orientação para o ensino de

matemática considera

1 “Uma Agenda para a Ação” – foi um importante documento publicado no

NCTM = National Council of Teachers of Mathematics. que o ensino-

aprendizagem de um conteúdo matemático ocorra a partir de um problema

gerador, podendo este ser advindo de uma situação contextualizada ou ser um

problema puramente matemático. Além disso, utiliza o que foi considerado

satisfatório nas orientações curriculares anteriores. “[...] busca-se usar tudo o

que havia de bom nas reformas anteriores: repetição, compreensão, a

linguagem matemática da teoria dos conjuntos, técnicas de resolução de

problemas e, às vezes, até a forma de ensino tradicional.” (ONUCHIC, 1999, p.

211).

Onuchic (1999) recorda que, sem dúvida, ensinar matemática por meio da

resolução de problemas é a abordagem mais significativa e fundamentada com

as recomendações dos NCTM - National Council of Teachers of Mathematics e

dos Parâmetros Curriculares Nacionais, pois conceitos e habilidades

matemáticas são aprendidos no contexto da resolução de problemas.

Para muitos educadores matemáticos, a resolução de problemas consiste em

permitir que os alunos utilizem seus conhecimentos e desenvolvam a

capacidade de administrar as informações ao seu redor. Dessa forma, os

alunos adquirem a oportunidade de ampliar seu conhecimento, desenvolver

seu raciocínio lógico, enfrentar novas situações e conhecer as aplicações da

matemática. O mesmo sucede para o professor, pois trabalhar com a resolução

de problemas permite atingir os objetivos de aprendizagem definidos, além de

tornar a aula mais interessante e motivadora. No entanto, ensinar matemática

por meio da resolução de problemas é uma forma de ensino que ainda enfrenta

muitas dificuldades que precisam ser superadas. De acordo com os

Parâmetros Curriculares Nacionais,

A prática mais frequente na Resolução de Problemas, consiste em ensinar um

conceito, um procedimento ou técnica e depois apresentar um problema para

Page 4: A resolução de problemas como metodologia de ensino

avaliar se os alunos são capazes de empregar o que lhes foi ensinado. Para a

maioria dos alunos, resolver um problema significa fazer cálculos com números

do enunciado ou aplicar algo que aprendam nas aulas. Desse modo o que o

professor explora na atividade matemática não é mais a atividade, ela mesma,

mas seus resultados, técnicas e demonstrações. (BRASIL, 1998, p. 40).

Na realidade, o foco central do ensino da matemática não deveria estar em se

encontrar a solução dos problemas propostos. O papel da resolução de

problemas no currículo de matemática seria um caminho de aquisição para

novos conhecimentos, ou seja, compreender deveria ser o principal objetivo do

ensino, para adquirir um novo conhecimento ou um processo no qual pode ser

aplicado tudo aquilo que previamente havia sido construído. (ONUCHIC, 1999).

Page 5: A resolução de problemas como metodologia de ensino

A TEORIA DE VYGOTSKY E A RESOLUÇÃO DE PROBLEMAS

A formação do conceito

Vygotsky, em seus estudos, evidencia o processo de formação de conceitos

que são entendidos como signos, uma vez que são construções sociais de

significados realizadas em um determinado período histórico.

Para Vygotsky (1999, p. 70), “Todas as funções psíquicas superiores tais

como: memória, a abstração, a atenção, o pensamento e a linguagem, são

processos mediados, e os signos constituem o meio básico para dominá-las e

dirigi-las. [...] o signo é a palavra, que tem função de mediar a formação de um

conceito e posteriormente tornar o seu símbolo.”

Estudos realizados por Vygotsky e seus pares revelaram que a formação de

conceitos se desenvolve a partir de várias fases do pensamento. A primeira

fase é a do sincretismo; a criança apresenta os primeiros sinais da formação

dos conceitos, quando faz agrupamentos de alguns objetos distintos de uma

maneira desorganizada e sem fundamentos. Vygotsky (1999, p. 74) afirma que

“esse amontoado constitui-se em uma extensão difusa e não-direcionada do

significado do signo (palavra artificial) a objetos que não possuem uma relação

entre si, porém estão relacionados na percepção da criança.”

A segunda fase é chamada de pensamento por complexos, que inicia na

infância durante o período pré-escolar. Nessa fase o pensamento já possui

certa coerência, porém ainda está longe do pensamento conceitual que ocorre

na idade adulta. Para Vygotsky (1999, p. 76), “os objetos isolados associam-se

na mente da criança não apenas devido às impressões subjetivas da criança,

mas também devido às relações que de fato existem entre esses objetos.”

A terceira fase tem interesse especial, pois se efetiva durante a adolescência e

se chama fase do pseudoconceito, considerada muito importante, porque está

entre a fase dos complexos e a formação do pensamento por conceitos, que

ocorre na idade adulta. Vygotsky (1999, p. 85) enfatiza que “a fase do

pseudoconceito é dual por natureza: um complexo já carrega a semente que

fará germinar um conceito”.

Mas para que a formação do conceito ocorra de fato, o uso da palavra como

meio de comunicação da criança com os adultos é primordial, uma vez que a

palavra produz forma ao pensamento e cria novas modalidades de atenção,

memória e imaginação. Assim, é importante

Page 6: A resolução de problemas como metodologia de ensino

tanto na fase dos complexos influenciando no desenvolvimento dos conceitos

infantis, como também na fase dos pseudoconceitos, durante a adolescência e

conforme Vygotsky (1999, p. 101).

Um conceito se forma [...] mediante uma operação intelectual em que todas as

funções elementares participam de uma combinação específica [...] dirigida

pelo uso da palavra que conserva a sua função diretiva na formação dos

conceitos verdadeiros.

Vygotsky destaca que a escola, ao ofertar conteúdos e desenvolver

modalidades de pensamentos específicos, exerce um papel diferente e

insubstituível na apropriação do conhecimento pelo sujeito. É no ambiente

escolar que o estudante passa pela maioria das fases do seu pensamento

conceitual, assim, a escola, com suas atividades educativas sistematizadas,

tem o compromisso de fazer com que o aluno evolua em todas as suas fases,

conduzindo-o de forma plena à formação de conceitos.

A formação dos conceitos e a resolução de problemas

Durante uma série de investigações realizadas sobre o processo de formação

dos conceitos, Vygotsky destaca a importância do papel do problema nesse

processo:

a formação de conceitos é o resultado de uma atividade complexa em que

todas as funções intelectuais básicas tomam parte. No entanto, o processo não

pode ser reduzido à associação, à atenção, à formação de imagens, à

inferência ou às tendências determinantes. Todas são indispensáveis, porém

insuficientes sem o uso do signo, ou a palavra, como meio pelo qual

conduzimos as nossas operações mentais, controlamos o seu curso e as

canalizamos em direção à solução de um problema. (VYGOTSKY,1999, p.

72-73 – grifo nosso)

A solução de um problema não é destacada por Vygotsky como uma categoria

conceitual, mas é utilizada em vários métodos de investigação sobre a

formação de conceitos e parece desempenhar um papel importante no

desenvolvimento do processo de como se estabelece um conceito. Para

Vygotsky (1999, p. 66-67, grifo nosso), “um conceito não é uma formação

isolada, fossilizada e imutável, mas sim uma parte ativa do processo

intelectual, constantemente a serviço da comunicação, do entendimento e da

Page 7: A resolução de problemas como metodologia de ensino

solução de problemas”. Também Breuckmann (1998, p. 85, grifo do autor)

contribui:

um conceito não se forma ao acaso, de maneira aleatória, existe sempre uma

situação provocadora, que garante ao mesmo uma finalidade. Esta situação

configura, portanto, uma crise. Não que precise ser, obrigatoriamente, uma

situação desagradável: pode ser, quiçá, uma situação prazerosa e que,

exatamente por isso, merece ser cuidada para que se perpetue e/ou seja

aperfeiçoada.

Diante do fato de que um conceito não se forma por acaso, haja vista que é

fruto de uma operação mental a serviço da atividade prática, da resolução de

problemas, convém ressaltar que um dos principais objetivos da resolução de

problemas matemáticos é procurar fazer com que o aluno pense na busca de

possíveis caminhos para a sua resolução e, para que isso aconteça, o ideal é

propor situações-problema que o envolva, o desafie e o motive a querer

resolvê-las. Dessa forma, estarão sendo levados a gerar os processos de

pensamento, e assim à formação de novos conceitos matemáticos que, por sua

vez, não se formam simplesmente por meio de regras e treino de algoritmos.

Conforme Vygotsky (1999, p. 104)

o processo da formação de conceitos [...] é um ato real e complexo do

pensamento que não pode ser ensinado por meio de treinamento [...], pois

pressupõe o desenvolvimento de muitas funções intelectuais: atenção,

memória, lógica, abstração, capacidade para comparar e diferenciar.

Entretanto, Vygotsky (1999, p. 73) aponta para um fato muito importante na

educação em geral e no ensino formal, em particular:

a presença de um problema que exige a formação de conceitos não pode, por

si só, ser considerada a causa do processo, embora as tarefas [...] sejam, sem

dúvida, um fator importante para o surgimento do pensamento conceitual. Se o

meio ambiente não apresenta nenhuma destas tarefas ao adolescente, não lhe

faz novas exigências, e não estimula o seu intelecto [...] o seu raciocínio não

conseguirá atingir os estágios mais elevados, ou só os alcançará com grande

atraso.

Esse fato que ocorre na educação de forma geral apontado por Vygotsky, pode

ser levado a uma reflexão de modo particular sobre o ensino de matemática

por meio da resolução de problemas, uma vez que auxilia na formação dos

Page 8: A resolução de problemas como metodologia de ensino

conceitos. Desse modo, espera-se que o professor de matemática, ao trabalhar

com essa metodologia, elabore problemas adequados, ou seja, que ofereçam

condições para que o aluno, a partir do seu conhecimento já adquirido, seja

capaz de interpretar, elaborar estratégias de resolução, além de efetuar os

cálculos necessários para obter a solução dos problemas, por meio do seu

próprio raciocínio. Desse modo, o professor estará proporcionando condições

para a construção conceitual do aluno, contribuindo para o seu

desenvolvimento. Para Van de Walle (2001) apud Onuchic (1999, p. 221),

compete ao professor gerar esse ambiente, uma vez que ensinar matemática

através da resolução de problemas não significa, simplesmente, apresentar um

problema, sentar-se e esperar que uma mágica aconteça. O professor é

responsável pela criação e manutenção de um ambiente matemático motivador

e estimulante em que a aula deve transcorrer.

Dessa maneira, os caminhos oferecidos pelo professor ao utilizar situações-

problema diferenciadas para o ensino de novos conceitos, criam condições

para o processo de construção da formação do conceito. Para Pozo e Crespo

(2009, p. 83), “o processo de compreensão é gradual; é praticamente

impossível conseguir uma compreensão ótima (similar a que teria um

especialista) na primeira vez em que nos deparamos com um problema.” Para

isso, o professor

deve ter como objetivo a compreensão das relações intrínsecas entre as

tarefas externas e a dinâmica do desenvolvimento, e deve considerar a

formação de conceitos como uma função do crescimento social e cultural

global do adolescente, que afeta não apenas o conteúdo, mas também o

método de seu raciocínio. (VYGOTSKY, 1999, p. 73)

Essas relações intrínsecas devem ser consideradas quando o aluno se coloca

diante de uma situação-problema. Para Vygotsky (1999, p. 100) “a transição do

abstrato para o concreto mostra-se tão árdua para o jovem como a transição

primitiva do concreto para o abstrato”.

Para o professor que trabalha com a resolução de problemas como

metodologia de ensino a partir do sexto ano do ensino fundamental, é

importante que o aluno seja capaz de resolver as quatro operações aritméticas,

para a resolução de problemas que exijam mais raciocínio, com estratégias de

resolução mais elaboradas. Vygotsky (1994, p. 118) considera o conhecimento

Page 9: A resolução de problemas como metodologia de ensino

das quatro operações fundamentais como sendo “um domínio fundamental,

pois proporciona a base para o desenvolvimento subsequente de vários

processos internos altamente complexos no pensamento das crianças.” O

ensino de matemática, por meio de resolução de problemas, também procura

desenvolver no aluno esses processos internos de mudança no seu

pensamento. Provavelmente, além de encontrar a solução do problema,

atingirá com êxito o processo de mudança do seu pensamento

pseudoconceitual para o conceitual, uma vez que o pensamento conceitual se

forma “mediante uma operação intelectual (dirigida pelo uso das palavras) em

que todas as funções mentais elementares participam de uma combinação

específica.” (VYGOTSKY, 1999, p. 101).

Page 10: A resolução de problemas como metodologia de ensino

VIVENCIANDO A MATEMÁTICA NA ESCOLA:

Page 11: A resolução de problemas como metodologia de ensino

aplicando situações-problema geradoras no ensino fundamental

A pesquisa foi desenvolvida na escola pública estadual de Educação Básica

Domingos Sávio do município de Ascurra - Santa Catarina, envolvendo 27

estudantes de uma turma do sexto ano do ensino fundamental, durante o ano

letivo de 2010.

O trabalho didático ocorreu por meio de temas geradores que foram explorados

pelos alunos, originando situações-problema contextualizadas, deflagradoras

de novos conceitos e conteúdos matemáticos. Na definição desses temas,

procurou-se atender a dois critérios: (i) fazer parte da realidade do aluno, de

sua vivência, sendo rico do ponto de vista sócio-cultural, (ii) possibilitar a

exploração do conteúdo matemático.

Algumas etapas foram estabelecidas, que iniciaram com a preparação do

problema gerador de um conceito ou conteúdo matemático a ser trabalhado.

Em seguida, após uma leitura individual, a turma deveria formar pequenos

grupos, entre três ou quatro alunos, com o objetivo de resolver a situação-

problema inicial proposta. O papel da professora/pesquisadora foi o de

observar, esclarecer dúvidas e incentivar a resolução do problema. Em

seguida, todas as resoluções foram registradas no quadro para a realização de

uma plenária, na qual a professora/pesquisadora procurou analisar todas as

resoluções encontradas, sanar as dúvidas e buscar um consenso junto à

turma, sobre o resultado do problema. A formalização do conceito ou do

conteúdo matemático foi apresentada somente no final de todas essas etapas,

sintetizando de maneira formal os objetivos pretendidos com a situação-

problema, apresentando as devidas definições, pontuando propriedades,

realizando demonstrações, utilizando a terminologia e a notação correta

relativa ao conteúdo matemático abordado.

Os temas geradores desenvolvidos durante o ano letivo de 2010 foram: Tema

1: Ábaco; Tema 2: Festa Per Tutti; Tema 3: Telas de pintores que utilizam

formas geométricas; Tema 4: Formas geométricas espaciais na cidade de

Ascurra; Tema 5: Cesta Básica de referência; Tema 6: Dobraduras, recortes e

pinturas no estudo das frações; Tema 7: Potenciação no torneio de Need for

Speed; Tema 8: Porcentagem; Tema 9: Explorando Gráficos por meio do

jornal.

Page 12: A resolução de problemas como metodologia de ensino

A seguir, apresenta-se a descrição de uma das propostas desenvolvida em

sala de aula por meio do tema 2: Festa Per Tutti, que partiu de uma pesquisa

na rede de computadores sobre o município de Ascurra e a Festa Per Tutti,

realizada pelos alunos, em pequenos grupos. Esse trabalho resultou em um

texto sobre o município de Ascurra e sua tradicional Festa Per Tutti, que serviu

como base para a elaboração e aplicação, em sala de aula, da seguinte

situação-problema:

A figura 1 abaixo mostra parte da XV Festa Per Tutti. Quantos espectadores

você estima que aparecem nessa foto?

Figura 1: Foto Pavilhão Festa Per Tutti

Análise referente à situação-problema proposta:

Foi possível verificar que os alunos apresentaram certa dificuldade para iniciar

a resolução dessa situação-problema, talvez porque estavam habituados a

resolver problemas somente após a apresentação de algum processo, técnica

ou um conteúdo matemático, conforme já mencionado pelas autoras Onuchic e

Allevato (2005). A professora/pesquisadora procurou incentivar os alunos que,

aos poucos, resolveram a atividade proposta, na qual surgiram diferentes

estratégias de resolução:

Figura 2- Resolução (a) do problema 1 – Aluno A

Figura 4- Resolução (d) do problema 1 – Aluno D

Page 13: A resolução de problemas como metodologia de ensino

Figura 3- Resolução (b) do problema 1 – Aluno B

Figura 5- Resolução (c) do problema 1 - Aluno C

De acordo com a resolução apresentada na figura 2, o procedimento que o

aluno conta um a um é elementar, não necessitando de estratégias de

resolução mais elaboradas. Tal procedimento revela que o aluno possui o

conceito de contagem, definido por Vygotsky (1999) como um conceito

cotidiano, no qual a criança aprende de forma inconsciente e involuntária, no

seu cotidiano, no contato com objetos, fenômenos e fatos.

Nos demais procedimentos, conforme a resolução apresentadas nas figuras 3

a 5, foi possível observar que os alunos utilizaram vários tipos de estratégias

de resolução, mostrando domínio de diversos conceitos matemáticos, tais

como: adição, multiplicação, divisão e média aritmética simples. Para Vygotsky

(1999) os conceitos em que a criança aprende na escola, de forma sistemática,

consciente e voluntária, são definidos como conceitos científicos.

Sabendo que o resultado esperado deveria ser próximo a 320 pessoas,

percebe-se que na resolução da figura 5, o aluno C cometeu um erro e chegou

a um resultado distante do esperado. Porém, o erro não foi desprezado, pois se

torna importante valorizar o processo, o modo como o aluno resolveu o

problema. A professora/pesquisadora incentivou o aluno a apresentar a

resolução errônea da situação-problema 1 para toda a turma, que foi discutida

por todos até se chegar a um consenso. Conforme os PCNs, “na aprendizagem

escolar o erro é inevitável e, muitas vezes, pode ser interpretado como um

caminho para buscar o acerto.” (BRASIL, 1998, p. 55).

CONCLUSÃO

A utilização da resolução de problemas como metodologia de ensino exige do

professor muita dedicação, avaliação contínua, além do planejamento para a

escolha ideal de situações-problema geradoras que provoquem a curiosidade e

mantenham a motivação do aluno. No entanto, com o desenrolar das

atividades, essa prática utilizada vai se tornando cada vez mais essencial,

destacando qualquer outra metodologia de trabalho, pois o resultado é muito

satisfatório. [...] “essa opção traz implícita a convicção de que o conhecimento

matemático ganha significado quando os alunos têm situações desafiadoras

para resolver e trabalham para desenvolver estratégias de resolução.”

(BRASIL, 1998, p. 40).

Page 14: A resolução de problemas como metodologia de ensino

A resolução de problemas como metodologia de ensino faz com que os alunos

utilizem seus conhecimentos matemáticos já adquiridos e desenvolvam a

capacidade de administrar as informações ao seu redor. Dessa forma, os

alunos ampliam seu conhecimento, desenvolvem seu raciocínio lógico e

conhecem as aplicações da matemática. O mesmo sucede para o professor,

pois trabalhar com a resolução de problemas torna sua aula mais interessante

e motivadora.

Ensinar matemática por meio da resolução de problemas auxilia na

compreensão do conceito, processo ou técnica matemática, em que o aluno é

instigado a relacionar uma determinada ideia matemática a outros contextos

matemáticos.

Por meio dessa metodologia aplicada com os alunos do sexto ano do ensino

fundamental, constatou-se que os objetivos propostos foram alcançados com

êxito, pois foi possível perceber que os alunos utilizaram seus conhecimentos

matemáticos como recursos para interpretar, analisar e resolver problemas em

diversos contextos. E durante o processo de aplicação no ano letivo de 2010,

percebeu-se, também, que eles desenvolveram e aprimoraram sua capacidade

de investigação e perseverança na busca de resultados para a solução das

situações-problema trabalhadas, além disso, várias formas de estratégias de

resolução foram utilizadas pelos alunos. Diante dessas considerações, vale

ressaltar a importância do aluno compreender a matemática por meio do seu

próprio raciocínio na resolução de problemas, e para isso, o professor precisa

ter clareza da importância de mediar o processo de ensino e aprendizagem,

procurando fazer questionamentos aos alunos de forma especulativa para dar

oportunidade de manifestarem suas ideias e assim, fazer com que evoluam em

todas as suas fases do pensamento até a formação do conceito, que só é

possível, “mediante uma operação intelectual (dirigida pelo uso das palavras)

em que todas as funções mentais elementares participam de uma combinação

específica.” (VYGOTSKY, 1999, p. 101). Desse modo, o professor

deve ter como objetivo a compreensão das relações intrínsecas entre as

tarefas externas e a dinâmica do desenvolvimento, e deve considerar a

formação de conceitos como uma função do crescimento social e cultural

global do adolescente, que afeta não apenas o conteúdo, mas também o

método de seu raciocínio (VYGOTSKY, 1999, p. 73).

Page 15: A resolução de problemas como metodologia de ensino

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