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A responsabilidade subjetiva no regime jurídico dos acidentes de trabalho

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A responsabilidade subjetiva no regime jurídico dos acidentes de trabalho

1. Introdução

Regime geral da responsabilidade (civil?) emergente de acidente de trabalho: responsabilidade objetiva risco de autoridade/ empresarial (?); regime assistencial/alimentar (?) – arts. 6º L 100/97 – 8º L 98/2009 Especialidade: – Prescinde do nexo entre o acidente e o trabalho – Tal nexo deve estabelecer-se entre o acidente e a

relação laboral (ou equiparada)

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1. Introdução

• Danos a ressarcir:

– Danos patrimoniais “indiretos” – a perda ou diminuição da capacidade de ganho enquanto reflexo patrimonial de um dano pessoal (lesão corporal, perturbação funcional ou doença …)

– Danos patrimoniais “reflexos”

• despesas decorrentes de tratamentos – 39º LAT2009

• despesas de funeral – 66º LAT2009

• subsídio para readaptação da habitação – 68º LAT2009

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1. Introdução

Os danos patrimoniais “diretos” (ex.: destruição de roupas, relógio, telemóvel do sinistrado) não são ressarcíveis

As prestações em dinheiro (maxime as que compensam a perda ou diminuição da capacidade de ganho) são tarifadas

Conclusão: Derrogação do P. da reparação integral do dano (art. 562º CC)

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2. A responsabilidade subjetiva

O regime excecional da responsabilidade infortunística laboral: fundado em facto ilícito e culposo (arts. 17º e 18º LAT2009 – 18º e 31º LAT97)

– do empregador,

– seu representante,

– entidade contratada,

– empresa utilizadora de mão de obra

– terceiro

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3. O art. 18º da LAT 2009 Inovações

Inovações do art. 18º LAT2009:

a) Âmbito subjetivo:

i. entidade contratada

ii. empresa utilizadora de mão de obra

iii. solidariedade

b) Âmbito objetivo:

i. todos os danos patrimoniais

ii. danos não patrimoniais claramente inseridos na tutela infortunística laboral (“abrange” x “não prejudica”)

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4. Os sujeitos da obrigação de indemnizar

Alteração de teor interpretativo (?)

Clarifica dúvidas da jurisprudência quanto à questão de saber que entidade poderia ser responsabilizada no caso de trabalho temporário (empresa utilizadora

e/ou empresa de trabalho temporário)

Consagra solução diversa da interpretação fixada pelo ac. STJ de fixação jurisprudência nº 6/2013 (DR 1ª s nº

45 de 05-03-2013) relativamente à LAT 1965 e à LAT 1999

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4. Os sujeitos da obrigação de indemnizar

Conceito de representante

CARLOS ALEGRE: art. 163º CC

MENEZES LEITÃO:

- delegação do poder de direção no seio da empresa (em diretor, chefia, ou coordenador)

- delegação ou transferência do poder de direção para outro empresário (ex: empresas de limpeza ou segurança)

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5. A “atuação culposa”

Modalidades:

i. Facto ilícito e culposo do empregador, seu representante, empresa contratada, ou ETT (art. 18º)

ii. Facto ilícito e culposo de empregador (ou “equiparado”) e/ou 3º (arts. 17º e 18º)

iii. Responsabilidade objetiva do empregador (ou “equiparado”) e facto ilícito e culposo de 3º (arts. 7º e 17º)

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5. A “atuação culposa”

Evolução legislativa:

Base XVII da Lei 2127 de 03-08-1965 (LAT1965)

Epígrafe “casos especiais de reparação”

Normativo refere expressamente o dolo (nº 1) e a negligência, ou “culpa” (nº 2)

art. 54º do DL 360/71, de 21-08 (RLAT1971)

Presunção de culpa em caso de inobservância de “preceitos legais e regulamentares”, ou “diretivas das entidades competentes que se refiram à higiene e segurança do trabalho”

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5. A “atuação culposa”

Art. 18º LAT1997 Epígrafe “casos especiais de reparação”

Normativo sem qualquer referência à imputação subjetiva

Inexistência de presunção de culpa (seja nesta LAT, seja no DL 143/99, de 30-04 - RLAT99)

Alguma jurisprudência concluiu no sentido do “desaparecimento” da imputação subjetiva

RC 26-11-2003, CJ t v, p. 60

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5. A “atuação culposa”

STJ clarificou:

• A imputação subjetiva decorre da utilização do verbo provocar – “acidente provocado pelo

empregador”

• A violação das regras de segurança constitui uma modalidade de atuação negligente, mas exige-se nexo de causalidade entre aquela violação e a ocorrência do acidente (JÚLIO VIEIRA GOMES parece entender que é o responsável quem tem o ónus da demonstração do inverso – “comportamento lícito alternativo”)

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5. A “atuação culposa”

- STJ 12-02-2009 (Pinto Hespanhol), p. 08S3082

- STJ 18-02-2009 (Mário Pereira), p. 08S3437

- 07-07-2009 (Vasques Dinis), proc. 09S0375)

- 25-11-2010 (Pinto Hespanhol), p. 55/07.7TTLMG.P1.S1

- 19-06-2013 (Gonçalves Rocha), p. 1294/04.8TTLRA.C1.S1

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5. A “atuação culposa”

Art. 18º LAT2009

• Epígrafe: “atuação culposa do

empregador” (mas clausulado refere tb.

representante, empresa contratada, empresa utilizadora …)

• Clausulado mantém mera referência a “acidente provocado pelo

empregador …”, sem referência expressa a dolo ou negligência

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5. A “atuação culposa”

RL 19-12-2012 (Jerónimo Freitas), p. 686/10.8TTLRS.L1-4 – nexo de causalidade entre a violação de regras sobre segurança e saúde no trabalho e a ocorrência do acidente

Nota: este aresto reporta-se à Lei 98/2009, reafirmando jurisprudência anterior dominante, relativa à LAT 1997

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6. Danos

• 27º L1942, de 27-06-1936

• Base XVII da LAT1965

• 18º LAT/1997

- Danos patrimoniais decorrentes da diminuição ou supressão da capacidade de ganho

- Agravamento das prestações “normais”

- Natureza sancionatória (?)

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6. Danos

• Base XVII da LAT1965 e Art. 18º LAT97 “abriam a porta” a uma responsabilidade mais “alargada”, mas apenas quanto a danos não patrimoniais, fora do âmbito da tutela infortunística laboral (“o disposto no nº 1 não prejudica a responsabilidade

civil por danos morais”) → o que parecia apontar no sentido da competência dos tribunais comuns para a apreciação de tais pretensões…

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6. Danos

Art. 18º LAT2009

Inovações:

• Admite que o valor global dos danos patrimoniais exceda o montante da retribuição anual do sinistrado (“a totalidade dos prejuízos”)

• Insere a responsabilidade por danos patrimoniais não tarifados e por danos não patrimoniais na tutela infortunística laboral → art. 78º LAT2009: garantias de inalienabilidade, impenhorabilidade e irrenunciabilidade, garantias creditórias

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6. danos

Danos patrimoniais dos familiares decorrentes da supressão da capacidade de ganho do sinistrado

podem exceder o valor da retribuição anual?

• regra geral, as prestações tarifadas estão sujeitas a esse limite (vd. nºs 4 a 6 do art. 18º)

mas …

• há outras possibilidades: ex.: sinistrado tinha outras atividades profissionais remuneradas

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7. Solidariedade da obrigação de indemnizar

Concurso de responsabilidades empregador – representante/entidade contratada pelo

empreg./empresa utilizadora de TT

Art. 18º LAT2009 [497º, 500º/3, 507/1, CC]

Solidariedade imperfeita (ausência de objeto comum)?

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7. Solidariedade da obrigação de indemnizar

Art. 18º LAT2009 não distingue …

Solidariedade abrange:

• prestações tarifadas

• danos patrimoniais “sobrantes”

• danos não patrimoniais

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7. Solidariedade da obrigação de indemnizar

Interpretação extensiva do art. 18º/3LAT2009:

• não só o representante, como empresa contratada e ETT

• abrange tb. violação causal de regras de segurança

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8. O papel da seguradora

• art. 37º LAT1997: Responsabilidade subsidiária pelas prestações “normais”

é necessária a excussão prévia do responsável RL 17-07-2008 (Seara Paixão), p. 5850/2008-4, com voto de vencido]

basta a mera interpelação do responsável “principal” (PEDRO ROMANO MARTINEZ)

• art. 79º/3 LAT2009: Responsabilidade a título principal pelas “prestações normais”, mas com “direito de regresso” sobre o(s) responsável(is)

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8. O papel da seguradora

Responsabilidade da seguradora:

solidariedade “imperfeita” ?

Ou mera obrigação de garantia ? (“a seguradora satisfaz o pagamento

das prestações que seriam

devidas casou não houvesse

atuação culposa …”) → verdadeiro direito de regresso, ou sub-rogação legal?

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9. A competência dos Tribunais do Trabalho

LAT1997 - Jurisprudência maioritária (≠RC) – compete aos Ts. compet. genérica/cível apreciar:

pretensões indemnizatórias emergentes de acidentes de trabalho na parte em que as mesmas excedam as prestações “tarifadas”

• STJ 30-09-2004 (Vítor Mesquita), p. 03S3775

ações de regresso entre seguradora e tomadora de seguro de AT

• RE 03-07-2008 (Eduardo Tenazinha), p. 1261/08-2

• RC 13-09-2011 (Virgílio Mateus), p. 3415/10.2TBVIS .C1

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9. A competência dos Tribunais do Trabalho

• LAT2009: Os TT são competentes para apreciar todas as pretensões fundadas no art. 18º

Mas …

• TT tb. são competentes para apreciar pretensões fundadas no art. 17º

• Quando os TT fixem prestações, eventuais diminuições decorrentes da aplicação do art. 17º LAT conjugado com art. 26º da RSSORCA devem ser apreciadas pelos TT (arts. 85º, als. c) e o) LOFTJ99; 118º, als. c) e o) LOFTJ2008; e 126º, n.º a, als. c) e O) LOSJ); no âmbito da ação especial prevista nos arts. 151º ss. CPT

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10. Interrogações e perspetivas futuras

• Continua a justificar-se a admissão limitada da reparação do dano global (só em caso de atuação ilícita e culposa)?

• Continua a justificar-se a desconsideração total dos danos patrimoniais “diretos” e dos danos não patrimoniais em casos de responsabilidade “objetiva”?

• “Meio termo”: o reconhecimento do impacto dos danos não patrimoniais enquanto fator determinante da perda de capacidade de ganho

• Porque razão se mantém a “intransferibilidade” da responsabilidade agravada para as seguradoras através do contrato de seguro de AT e com garantia do FAT (≠ seg. obrig. resp. civ. autom. + garantia FGA)?

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Conclusão

Muito obrigado!

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Bibliografia consultada

• Alegre, Carlos, “Acidentes de trabalho e doenças profissionais”, Almedina, 2001

• Leitão, Luís Menezes, “A reparação de danos emergentes de acidentes de trabalho”, in “Temas laborais”, vol. I, Almedina, 2006, pp. 537 ss.

• Mendes, Luís Azevedo, “Apontamentos em torno do artigo 18º da LAT de 2009: Entre a clarificação e a inovação na efetividade da reparação dos acidentes de trabalho”, in Prontuário de Direito do Trabalho nº 88-89, janeiro-agosto 2011, CEJ/Coimbra Editora, pp. 125 ss.

• Gomes, Júlio Vieira, “O acidente in itinere e a sua descaraterização”, Almedina, 2013

• Martinez, Pedro Romano, “Seguro de Acidentes de Trabalho — A responsabilidade subsidiária do segurador em caso de atuação culposa do empregador”, Prontuário de Direito do Trabalho nº 74-75, maio-dezembro 2006, CEJ/Coimbra Editora, pp. 81 ss.

• Pinto, Maria José Costa, “Violação de regras de segurança, higiene e saúde no trabalho: Perspetiva jurisprudencial”, in Prontuário de Direito do Trabalho nº 74-75, maio-dezembro 2006, CEJ/Coimbra Editora, pp. 155 ss.

• Ribeiro, Vítor, “Acidentes de trabalho e doenças profissionais”, Livraria Petrony, Lda, 1994

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