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UNIVERSIDADE DE BRASÍLIA FACULDADE DE TECNOLOGIA DEPARTAMENTO DE ENGENHARIA CIVIL E AMBIENTAL ESTUDO COMPARATIVO DAS PERCEPÇÕES DE RISCO DOS PILOTOS DE HELICÓPTERO DA AVIAÇÃO DE SEGURANÇA PÚBLICA COM A REALIDADE DOS ACIDENTES DESSAS AERONAVES LUIZ FERNANDO AZEVEDO DIAS ORIENTADOR: JOSÉ MATSUO SHIMOISHI DISSERTAÇÃO DE MESTRADO EM TRANSPORTES PUBLICAÇÃO: T.DM-011 A/2010 BRASÍLIA/DF: AGOSTO DE 2010

Acidentes Helicóptero

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helicóptero, acidentes

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  • UNIVERSIDADE DE BRASLIA FACULDADE DE TECNOLOGIA DEPARTAMENTO DE ENGENHARIA CIVIL E AMBIENTAL

    ESTUDO COMPARATIVO DAS PERCEPES DE RISCO DOS PILOTOS DE HELICPTERO DA AVIAO DE

    SEGURANA PBLICA COM A REALIDADE DOS ACIDENTES DESSAS AERONAVES

    LUIZ FERNANDO AZEVEDO DIAS

    ORIENTADOR: JOS MATSUO SHIMOISHI

    DISSERTAO DE MESTRADO EM TRANSPORTES

    PUBLICAO: T.DM-011 A/2010

    BRASLIA/DF: AGOSTO DE 2010

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    UNIVERSIDADE DE BRASLIA

    FACULDADE DE TECNOLOGIA

    DEPARTAMENTO DE ENGENHARIA CIVIL E AMBIENTAL

    ESTUDO COMPARATIVO DAS PERCEPES DE RISCO DOS PILOTOS DE HELICPTERO DA AVIAO DE

    SEGURANA PBLICA COM A REALIDADE DOS ACIDENTES DESSAS AERONAVES

    LUIZ FERNANDO AZEVEDO DIAS

    DISSERTAO DE MESTRADO SUBMETIDA AO DEPARTAMENTO DE ENGENHARIA CIVIL E AMBIENTAL DA FACULDADE DE TECNOLOGIA DA UNIVERSIDADE DE BRASLIA, COMO PARTE DOS REQUISITOS NECESSRIOS PARA A OBTENO DO GRAU DE MESTRE.

    APROVADA POR:

    ______________________________________

    JOS MATSUO SHIMOISHI Dr. Eng. (UnB) (orientador)

    _________________________________________

    ADELAIDA PALLAVICINI FONSECA Dr. Sc. (UnB) (examinador interno)

    ___________________________

    ADYR DA SILVA PhD (CEFTRU) (examinador externo)

    BRASLIA/DF:AGOSTO DE 2010

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    FICHA CATALOGRFICA

    DIAS, LUIZ FERNANDO AZEVEDO Estudo Comparativo das Percepes de Risco dos Pilotos de Helicptero da Aviao de Segurana Pblica com a Realidade dos Acidentes dessas Aeronaves / Luiz Fernando Azevedo Dias - Braslia, 2010.

    xiv, 103p., 210x297 mm (ENC/FT/UnB, Mestre, Transportes, 2010).

    Dissertao de Mestrado Departamento de Engenharia Civil e Ambiental Faculdade de Tecnologia Universidade de Braslia, 2010. rea: Transportes Orientador: Prof. Dr. Eng. Jos Matsuo Shimoishi

    1. Acidente Aeronutico 2. Fatores Contribuintes 3. Percepo de Risco 4. Investigao de Acidentes

    I. ENC/FT/UnB II. Ttulo (srie)

    REFERNCIA BIBLIOGRFICA

    DIAS, LUIZ FERNANDO AZEVEDO, Estudo Comparativo das Percepes de Risco dos Pilotos de Helicptero da Aviao de Segurana Pblica com a Realidade dos Acidentes dessas Aeronaves - Dissertao de Mestrado, Publicao T.DM-011 A/2010, Departamento de Engenharia Civil e Ambiental, Universidade de Braslia, Braslia, 103p.

    CESSO DE DIREITOS

    NOME DO AUTOR: Luiz Fernando Azevedo Dias TTULO DA DISSERTAO: Estudo Comparativo das Percepes de Risco dos Pilotos de Helicptero da Aviao de Segurana Pblica com a Realidade dos Acidentes dessas Aeronaves. GRAU/ANO: Mestre / 2010

    concedida Universidade de Braslia permisso para reproduzir cpias desta dissertao de mestrado e para emprestar ou vender cpias somente para propsitos acadmicos e cientficos. O autor reserva outros direitos de publicao e nenhuma parte desta dissertao de mestrado pode ser reproduzida sem a autorizao do autor.

    _______________________________

    Luiz Fernando Azevedo Dias SHIS QL 24, Conjunto 09, Casa 11; CEP: 71.665 095 - Braslia/DF - Brasil

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    Dedicatria

    A minha famlia e a todos que trabalham na rea de Segurana de Vo.

  • v

    Agradecimentos

    A minha famlia, que sempre incentivou e acreditou no meu trabalho e desempenho profissional;

    O meu agradecimento especial ao orientador, Professor Jos Matsuo Shimoishi, pela disposio, ajuda e, principalmente, reflexes acadmicas, sempre precisas e esclarecedoras;

    Aos colegas do curso, pelo estmulo e ajuda;

    O meu reconhecimento ao trabalho dos professores do Curso de Mestrado em Transportes da UnB, pelos ensinamentos transmitidos;

    Agradeo tambm aos colegas da Diviso de Operaes Areas da Polcia Civil do Distrito Federal, pelo incentivo e apoio para concluir este curso.

  • vi

    RESUMO

    ESTUDO COMPARATIVO DAS PERCEPES DE RISCO DOS PILOTOS DE HELICPTERO DA AVIAO DE SEGURANA

    PBLICA COM A REALIDADE DOS ACIDENTES DESSAS AERONAVES

    O presente estudo descreve a pesquisa realizada com a finalidade de procurar contribuies para a melhoria da segurana de voo. As operaes com uso de helicpteros pelos rgos de segurana pblica em geral, abrangem voos em condies diferentes daquelas que acontecem com as aeronaves privadas, estando suas tripulaes sujeitas presso e estresse peculiares de suas misses. A identificao do que preciso ser alterado em determinado procedimento devido o seu risco, fica por conta dos pilotos de cada organizao area, que, s vezes, desconsidera ou menospreza a realidade da situao em que se encontra, potencializando a situao perigosa. Verificou-se, atravs de pesquisa realizada com pilotos de helicptero da rea de Segurana Pblica, a percepo do risco durante a realizao de suas misses. Durante a investigao de acidentes aeronuticos, so identificados todos os elementos envolvidos, chamados de fatores contribuintes. Ao se comparar os resultados das investigaes realizadas pelo Centro de Investigao e Preveno de Acidentes Aeronuticos CENIPA nos ltimos dez anos com as avaliaes de risco desses pilotos de helicptero, verificou-se discrepncias que influenciam diretamente nos ndices de acidentes com essas aeronaves. A motivao deste estudo advm da perspectiva que determinados fatores contribuintes dos acidentes aeronuticos no estarem sendo levados em considerao pelas unidades areas de Segurana Pblica, quando da alocao de recursos materiais e humanos, visando o aumento da segurana de voo nas suas operaes.

    .

  • vii

    ABSTRACT

    COMPARATIVE STUDY OF THE PERCEPTIONS OF RISK OF PILOTS OF HELICOPTER IN PUBLIC SECURITY AVIATION WITH THE REALITY OF

    THESE AIRCRAFT ACCIDENTS

    This study describes the research carried out with the purpose of seeking contributions to the improvement of flight safety. The operations using helicopters of public security organizations in general, cover flights in different conditions from those that occur with private aircrafts, and their crews are subject to the pressure and stress peculiar to their missions. The identification of what must be changed in a given procedure due to its risk, relies on the pilots of each air organization, which, sometimes, overlooks or disregards the reality of the situation in which it is, potentializing the dangerous situation. It was verified, through research carried out with helicopter pilots of the Public Security area, the perception of the risk during the performance of their missions. During the investigation of aeronautical accidents, are identified all the elements involved, called contributing factors. Comparing the results of investigations carried out by the Center of Research and Prevention of Aeronautical Accidents CENIPA in the past ten years with the risk assessments of helicopter pilots, it was verified discrepancies that directly influence the rates of accidents involving such aircrafts. The motivation of this study results from the perspective that certain contributional factors of aeronautical accidents are not being taken into account by air units of Public Security, in the allocation of human and material resources, aiming to increase flight safety in their operations.

  • viii

    SUMRIO Pgina

    LISTA DE FIGURAS x LISTA DE TABELAS xi LISTA DE GRFICOS xii LISTA DE SIGLAS E ABREVIATURAS xiii 1. INTRODUO 1

    1.1 O Problema 2 1.2 Justificativa 3 1.3 Hiptese 5 1.4 Objetivos 6 1.5 Metodologia 6 1.6 Estrutura do Documento 7

    2. CARACTERSTICAS DO SISTEMA DE TRANSPORTE POR HELICPTERO 9 2.1 Definio 9 2.2 Histrico 9 2.3 Funcionamento 11 2.4 Estabilidade 13 2.5 Finalidades 13 2.6 Vantagens e desvantagens 14 2.7 Procedimentos de emergncia 14

    2.7.1 Teoria 14 2.7.2 O procedimento de autorotao 22

    3. OPERAO AREA DE SEGURANA PBLICA E/OU DEFESA CIVIL 27 3.1 Dimensionamento de Aeronaves 28 3.2 Equipamentos de Proteo Individual 30 3.3 Situaes de Risco 30 3.4 Estresse 31 3.5 Treinamento Fsico 33 3.6 Acidentes 34 3.7 Importncia do Helicptero na Aviao de Segurana Pblica 34

    4. DEFINIES 37 4.1 Segurana de Voo 37 4.2 Sistema de Aviao Civil 38 4.3 Regulamentao e Fiscalizao 39 4.4 Acidente Aeronutico 41

  • ix

    4.5 Incidente Aeronutico 42 4.6 Ocorrncia de Solo 43 4.7 Preveno de Acidentes Aeronuticos 43 4.8 Investigao de Acidentes Aeronuticos 43 4.9 Fatores Contribuintes 46

    4.9.1 Fator Humano 47 4.9.2 Fator Material 49 4.9.3 Modelos Conceituais 50

    4.9.3.1 Modelo de Heinrich 51 4.9.3.2 Modelo Shell 52 4.9.3.3 Modelo Reason 53

    5. FUNDAMENTOS TERICOS SOBRE RISCO 56 5.1 O construto Risco 56 5.2 Percepo de Risco 57 5.3 Comportamento de Risco 62

    6. PESQUISA DE CAMPO E ANLISE DE DADOS 68 6.1 Resultados 69 6.2 Anlise dos Dados 72

    6.2.1 Todos os pilotos 72 6.2.2 Pilotos menos experientes 73 6.2.3 Pilotos mais experientes 75

    7. ANLISE DOS ACIDENTES AERONUTICOS OCORRIDOS 78 8. ESTUDO COMPARATIVO 81 9. CONCLUSES E SUGESTES 85

    9.1 Concluses 85 9.2 Sugestes para Melhorias nas Organizaes Areas 86 9.3 Sugestes para Futuras Pesquisas 89

    REFERNCIAS BIBLIOGRFICAS 90 ANEXOS 98

  • x

    LISTA DE FIGURAS

    Pgina Figura 2.1 - Itens fundamentais de um helicptero. 9 Figura 2.2 - Desenho da mquina voadora de Leonardo da Vinci. 10 Figura 2.3 - Movimentos de um helicptero. 11 Figura 2.4 - Comandos do helicptero. 12 Figura 2.5 - Foras criadas em um perfil aerodinmico quando

    atravessa um fludo. 15

    Figura 2.6 - Resultante aerodinmica e suas decomposies. 16 Figura 2.7 - Curva Polar (sustentao x arrasto). 16 Figura 2.8 - Decomposio da fora Fn. 17 Figura 2.9 - Decomposio da fora Fn, quando o ngulo de

    incidncia (i) pequeno. 18

    Figura 2.10 - Decomposio das foras atuantes no perfil aerodinmico, quando a pane de motor acontece no vo pairado.

    19

    Figura 2.11 - Fluxo de ar atravessando o rotor na descida em procedimento de autorotao.

    19

    Figura 2.12 - Variao da velocidade tangencial U. 20 Figura 2.13 - Diviso do disco do rotor. 20 Figura 2.14 - Variao da zona autorotativa. 21 Figura 2.15 - Velocidade do vento relativo Vr, segundo a posio do

    rotor. 21

    Figura 2.16 - Diviso do disco do rotor. em autorotao com deslocamento frente.

    22

    Figura 2.17 - Manobra do flaire. 24 Figura 3.1 - Helicptero modelo Esquilo AS350. 28 Figura 4.1 - Modelo Causal de Acidente de Heinrich. 52 Figura 4.2 - Modelo Causal de Acidente Shell. 53 Figura 4.3 - Modelo Causal de Acidente de Reason. 54

  • xi

    LISTA DE TABELAS

    Pgina Tabela 6.1 - Respostas dos pilotos aos quesitos da pesquisa. 71 Tabela 6.2 - Respostas dos pilotos com experincia inferior a 1000

    horas de vo. 74

    Tabela 6.3 - Respostas dos pilotos com experincia superior a 1000 horas de vo.

    76

  • xii

    LISTA DE GRFICOS

    Pgina Grfico 1.1 - Crescimento do nmero de helicpteros nos ltimos

    14 anos no Brasil. 3

    Grfico 1.2 - Total de acidentes com helicpteros no Brasil. 5 Grfico 2.1 - Curva de potncia em vo nivelado. 23 Grfico 2.2 - Diagrama Altura x Velocidade ou Curva do Homem

    Morto. 25

    Grfico 6.1 - Distribuio dos pilotos por faixa etria. 69 Grfico 6.2 - Experincia dos pilotos entrevistados. 70 Grfico 6.3 - Respostas corrigidas dos pilotos em ordem

    decrescente de avaliao. 71

    Grfico 6.4 - Respostas corrigidas em ordem decrescente de avaliao dos pilotos com experincia inferior a 1000 horas de vo.

    74

    Grfico 6.5 - Respostas corrigidas em ordem decrescente de avaliao dos pilotos com experincia superior a 1000 horas de vo.

    77

    Grfico 7.1 - Participao de Operadores Policiais nos Acidentes com Helicpteros.

    78

    Grfico 7.2 - Percentual dos Fatores Contribuintes nos acidentes de helicpteros no perodo de 2000 a 2009.

    79

    Grfico 7.3 - Desempenho dos Fatores Humano e Material ao longo do tempo.

    80

  • xiii

    LISTA DE SIGLAS E ABREVIATURAS

    ABRAPHE Associao Brasileira de Pilotos de Helicptero

    ANAC Agncia Nacional de Aviao Civil

    CBA Cdigo Brasileiro de Aeronutica

    CCF Certificado de Capacidade Fsica

    CCI Cadeia de Comando de Investigao

    CCT Certificado de Conhecimento Terico

    CHT Certificado de Habilitao Tcnica

    CIAA Comisso de Investigao de Acidente Aeronutico

    CENIPA Centro de Investigao e Preveno de Acidentes Aeronuticos

    DAC Departamento de Aviao Civil

    DES Dentro do Efeito Solo

    DIPAA Diviso de Investigao e Preveno de Acidentes Aeronuticos

    EAC Escritrio de Aviao Civil

    EPI Equipamento de Proteo Individual

    FAA Federal Aviation Administration

    FAP Ficha de Avaliao de Piloto

    FAR Federal Aviation Regulations

    FES Fora do Efeito Solo

    FLIR Foward Looking Infra Red ou Sistema de Localizao por Tecnologia Infravermelha

    GPS Global Position System ou Sistema de Posicionamento por Satlite

    IAC Instruo de Aviao Civil

  • xiv

    INSPAC Inspetor de Aviao Civil

    NSMA Norma de Sistema do Ministrio da Aeronutica

    NSCA Norma de Servio do Comando da Aeronutica

    OACI Organizao da Aviao Civil Internacional

    OSO Oficial de Segurana Operacional

    ASO Agente de Segurana Operacional

    PCH Piloto Comercial de Helicptero

    PPA Piloto Privado de Avio

    RAB Registro Aeronutico Brasileiro

    RBHA Regulamentos Brasileiros de Homologao Aeronutica

    RELIAA Relatrio de Investigao de Acidente Aeronutico

    RF Relatrio Final

    RSV Recomendaes de Segurana de Vo

    SAC Sistemas de Aviao Civil

    SegVo Sistema de Segurana de Vo

    SENASP Secretaria Nacional de Segurana Pblica

    SERAC Servio Regional de Aviao Civil

    SERIPA Servio Regional de Investigao e Preveno de Acidentes Aeronuticos

    SIPAER Sistema de Investigao e Preveno de Acidentes Aeronuticos

  • 1

    1. INTRODUO

    Os sistemas de transportes so partes indispensveis da infraestrutura de qualquer regio. O desenvolvimento de uma nao est ligado diretamente ao grau de sofisticao do seu sistema de transporte. Toda sociedade requer mobilidade para o seu funcionamento pessoas se locomovem dos locais de moradia para os locais de trabalho, insumos e bens acabados so levados at seus consumidores, etc. De um ponto de vista amplo, as opes de trabalho, lazer e consumo, alm do acesso sade, educao, cultura e informao de uma sociedade dependem da qualidade dos sistemas de transportes a sua disposio (Setti & Widmer, 1998).

    O transporte areo se desenvolveu em menos de cem anos, perodo considerado curto, se comparado com os demais modos. Uma das caractersticas mais importantes do consumidor do mundo atual o valor atribudo ao tempo, o que torna o transporte areo uma alternativa conveniente e est contribuindo de forma significativa para a disseminao desse meio nos pases desenvolvidos (Neves, 1998).

    Quase 30 anos depois que Santos Dumont realizou seu primeiro voo que surgiu o primeiro helicptero tecnicamente vivel. Devido sua versatilidade operacional, permitindo pousos e decolagens em locais inacessveis ao avio, o helicptero vem se tornando um importante meio de transporte nos grandes centros urbanos mundiais, evitando os congestionamentos crescentes e economizando tempo.

    As operaes com uso de helicpteros pelos rgos de segurana pblica em geral, abrangem voos em condies diferentes daquelas que acontecem com as aeronaves privadas, de txi areo e de servios remunerados em geral.

    Diferentemente do setor privado, as presses e o estresse aos quais esto sujeitas as tripulaes envolvidas nas misses de segurana pblica, servem como catalisadores que potencializam o risco por si s elevado.

    Segundo Moreira (1992), nas ocorrncias policiais complexas, a ao da equipe que compe a aeronave pode fazer a diferena entre uma soluo a

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    contento ou um desfecho trgico e exigida dos pilotos a manuteno de uma elevada condio de serenidade e autocontrole.

    Voar para resgatar vtimas de acidentes diversos para as quais pode no haver outra alternativa e a aeronave pode fazer a diferena entre a vida e a morte, ou ainda voar para coibir aes criminosas que no raro resultam em disparos de arma de fogo contra a aeronave so, sem sombra de dvida, fatores de risco que esto nas mentes de pilotos e tripulantes operacionais, desde antes da partida dos motores.

    A identificao do que preciso ser alterado em determinado procedimento devido o seu risco, fica por conta dos pilotos de cada organizao area, que, s vezes, desconsidera ou menospreza a realidade da situao em que se encontra, potencializando a situao perigosa.

    As investigaes de acidentes aeronuticos tm por objetivo a preveno de novas ocorrncias, poupando vidas e recursos materiais. Para que isso seja possvel, necessria a identificao de todos os elementos envolvidos nos acidentes, chamados de fatores contribuintes, bem como a emisso das Recomendaes de Segurana de Voo RSV que so as principais ferramentas nessa preveno.

    O crescimento do uso do helicptero nos grandes centros urbanos mundiais como alternativa para enfrentar os incansveis congestionamentos, bem como a estabilizao dos ndices dos acidentes com essas aeronaves, habilita este signatrio a executar a presente pesquisa, visando contribuir para a melhoria desses ndices.

    1.1 O Problema

    Determinar que meios empregar para que fatores contribuintes negligenciados dos acidentes aeronuticos sejam levados em considerao pelas unidades areas de Segurana Pblica, quando da alocao de recursos materiais e humanos, visando o aumento da segurana de voo nas suas operaes.

  • 3

    1.2 Justificativa

    A pesquisa se justifica em funo da importncia do transporte areo para o desenvolvimento da economia mundial, sem o qual haveria grandes entraves para a circulao de pessoas e mercadorias, dificultando as relaes comerciais entre as naes (Santos & Arago, 2000).

    O crescimento da frota de helicpteros no Brasil foi de 130 % nos ltimos 14 anos, passando de 547 aeronaves em 1996 para 1255 em 2009, segundo dados da Associao Brasileira de Pilotos de Helicptero (ABRAPHE), visualizados no Grfico 1.1.

    O estado de So Paulo tem a segunda maior frota urbana de helicpteros do mundo e tambm a segunda em nmero de operaes. Ao todo so 754 aeronaves registradas no estado, 464 delas apenas na capital. Atualmente, existem 260 helipontos na capital paulista, dos quais 200 ficam em pontos elevados (em edifcios), sendo sua maior concentrao no entorno do Aeroporto de Congonhas, utilizados para facilitar a locomoo dos usurios, geralmente altos executivos e empresrios. Atualmente dez empresas oferecem o servio de txi areo naquela metrpole.

    Fonte: ABRAPHE

    Grfico 1.1: Crescimento do nmero de helicpteros nos ltimos 14 anos no Brasil.

  • 4

    As dificuldades criadas pela crise econmica mundial aumentaram a procura por uma alternativa ainda pouco conhecida no Brasil: a compra compartilhada de helicpteros. Grupos de at dez pessoas se renem para comprar uma aeronave de forma fracionada, dividindo os custos de aquisio e manuteno entre elas, demonstrando que a tendncia de crescimento do nmero dessas aeronaves.

    Tamanho o trfego de helicpteros na cidade de So Paulo que, alm de possuir corredores obrigatrios para deslocamento dessas aeronaves, ela tornou-se a primeira cidade do mundo a criar um centro exclusivo de controle de voo de helicpteros.

    O desenvolvimento do setor est sendo possvel em grande parte pelo suporte fornecido pela Segurana de Voo, conceito que rene todas as atividades ligadas investigao e preveno de acidentes e incidentes aeronuticos. A Segurana de Voo permitiu conservar os meios materiais e humanos do sistema de transporte areo, aumentando com isso a confiana dos usurios.

    Esse conceito desenvolveu-se a partir da dcada de 40, quando os governos dos pases signatrios da Conveno da Aviao Civil Internacional (Chicago, 1944 Aircraft Accident and Incident Investigation) comearam a realizar a investigao e a preveno dos acidentes e incidentes aeronuticos e iniciaram a implementao das atividades de regulamentao, fiscalizao, homologao e controle da aviao civil, sugerida pela Organizao de Aviao Civil Internacional (OACI).

    A partir de ento, os ndices de acidentes aeronuticos no mundo indicaram contnuas redues. A desacelerao da reduo desse ndice, a partir da dcada de 80, pode ser atribuda a diversos fatores, em funo da prpria evoluo do transporte areo. Aps a investigao de cada acidente, muitas falhas foram sendo identificadas e corrigidas atravs da emisso de RSV, o que causou a natural eliminao da reedio de alguns acidentes por situaes j conhecidas. A entrada em operao de novas geraes de aeronaves e de diversos sistemas ligados aviao tambm favoreceu a reduo dos ndices mundiais.

  • 5

    No Grfico 1.2 observa-se os ndices de acidentes aeronuticos com helicpteros no pas durante o perodo de 2000 a 2010; onde se verifica que existe uma tendncia de estabilizao na faixa de 16 acidentes nos ltimos anos (mdia = 16,28 com desvio padro = 2,56).

    Fonte: DIPAA/CENIPA (atualizado em 15/06/2010)

    Grfico 1.2: Total de acidentes com helicpteros no Brasil.

    Essa estabilizao est longe do ndice ideal na aviao, que tender a zero acidente. Para que essa meta seja alcanada, que providncias devem ser tomadas?

    1.3 Hiptese

    Pretende-se examinar se:

    Existem discrepncias entre a percepo do risco sob a tica dos pilotos de helicptero da Aviao de Segurana Pblica e a realidade dos acidentes dessas aeronaves.

  • 6

    1.4 Objetivos

    O objetivo geral do trabalho identificar e quantificar as discrepncias existentes entre as percepes de risco dos pilotos de helicptero que atuam na Aviao de Segurana Pblica do pas com os resultados das anlises dos acidentes aeronuticos dessas aeronaves durante um perodo de 10 anos. O objetivo complementar propor mudanas na priorizao dos recursos material e humano que so aplicados nessas unidades areas, a fim de alcanar a reduo dos ndices de acidentes aeronuticos, poupando recursos e principalmente vidas.

    1.5 Metodologia

    Este trabalho apresenta uma pesquisa qualitativa, realizada com pilotos de helicptero que trabalham na Aviao de Segurana Pblica do Brasil, para acessar a percepo de risco e perigo desta populao. O estudo direcionado no sentido de identificar as discrepncias entre as percepes desses pilotos e a realidade dos acidentes aeronuticos com essas aeronaves, as quais dificultam a melhora dos ndices de segurana.

    Dessa forma, a metodologia adotada a abordagem hipottica dedutiva, partindo-se do objetivo para provar a tese e consta das seguintes etapas:

    Definies: so apresentadas informaes para o entendimento do assunto, como a definio de Helicptero, Operao Area de Segurana Pblica, Segurana de Voo, Sistema de Aviao Civil, Acidente Aeronutico, etc.;

    Referencial Terico: o embasamento terico sustenta-se em estudos feitos sobre Risco, Percepo de Risco e Comportamento de Risco;

    Pesquisa de Campo: so apresentados os resultados de pesquisa realizada com 60 pilotos de helicptero que atuam na Aviao de Segurana Pblica do pas, identificando e quantificando o grau de percepo de risco nas suas atividades;

    Anlise dos acidentes ocorridos no Brasil no perodo de 2000 a 2009: apresenta-se o resultado da anlise dos Relatrios Finais - RF

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    dos acidentes do perodo considerado, sendo identificados os fatores que contriburam para a ocorrncia desses acidentes;

    Estudo Comparativo: apresentado um estudo comparativo dos resultados da pesquisa de campo com as estatsticas dos acidentes aeronuticos, identificando suas discrepncias;

    Concluses e Sugestes: so apresentadas as concluses deste trabalho e sugestes para possveis mudanas de serem introduzidas nas respectivas organizaes, a fim de alcanar a reduo dos ndices de acidentes aeronuticos.

    1.6 Estrutura do Documento

    Este documento composto de nove captulos alm das Referncias Bibliogrficas e dos Anexos.

    Alm deste primeiro captulo, o segundo detalha as caractersticas do sistema de transporte efetuado por helicpteros.

    O terceiro captulo abrange as operaes areas de Segurana Pblica e/ou Defesa Civil efetuadas com o uso do helicptero.

    No quarto captulo so apresentadas definies imprescindveis para o entendimento do assunto.

    O quinto apresenta a reviso bibliogrfica dos assuntos de interesse para o desenvolvimento do trabalho.

    No sexto captulo relatada a pesquisa feita com 60 pilotos de helicptero que atuam na Aviao de Segurana Pblica do pas, quantificando o grau de percepo de risco nas suas atividades.

    No stimo captulo feita a anlise, baseada no panorama estatstico do CENIPA, dos acidentes aeronuticos com helicpteros nos ltimos dez anos.

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    O captulo seguinte mostra o estudo comparativo dos resultados da pesquisa de campo com as estatsticas dos acidentes aeronuticos, identificando suas discrepncias.

    A validao do processo encontra-se no nono captulo, composto pelas concluses e sugestes para possveis mudanas de serem introduzidas nas organizaes areas, bem como sugestes para trabalhos futuros.

    Este volume se completa com uma lista das referncias bibliogrficas, seguidas dos anexos em que constam dados utilizados no estudo.

  • 9

    2. CARACTERSTICAS DO SISTEMA DE TRANSPORTE POR HELICPTERO

    2.1 Definio

    Helicptero (do grego hlix - espiral e ptryks - asa) um tipo de aeronave de asas rotativas mais pesada que o ar, propulsada por um ou mais rotores horizontais (propulsores) que, quando girados pelo motor, criam sustentao e propulso necessrias para o voo. Devido ao fato de as ps do rotor girarem em torno de um mastro, so classificadas como aeronaves de asa rotativa (Figura 2.1), o que os distingue das aeronaves de asa fixa convencional (avio).

    Figura 2.1: Itens fundamentais de um helicptero.

    2.2 Histrico

    A primeira ideia relacionada com os helicpteros est associada a Leonardo Da Vinci. No final do Sculo XV, elaborou alguns desenhos (Figura 2.2) que viriam a ser relacionados com o helicptero, apesar de no terem sado do papel. Somente durante o sculo XIX, que vrios esboos de helicpteros foram desenvolvidos e construdos, levantando voo por ao de um motor com vrias ps.

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    Figura 2.2: Desenho da mquina voadora de Leonardo da Vinci.

    Os helicpteros foram efetivamente desenvolvidos e construdos durante a primeira metade de sculo XX, com alguma produo e alcance limitado. As duas grandes guerras mundiais da primeira metade do sculo levaram governos a investir no desenvolvimento das aeronaves. Em 1942 atingiu a produo em larga escala, com 131 aeronaves construdas. No fim dos anos 50, os helicpteros comeam a especializar-se e a desenvolver-se, atingindo velocidades de 260 km/h, com at 44 lugares a bordo.

    Na dcada de 90, surgiram helicpteros diversificados que suportam o transporte de passageiros (Figura 2.1), operaes militares e de salvamento no mar, etc.. Com as melhorias da tecnologia, o consumo de combustvel baixou, os nveis de rudo foram reduzidos, o mesmo sucedendo com as vibraes. Desta forma, passou tambm a haver um menor desgaste da sua estrutura.

    Em termos militares, existem helicpteros que transportam mais de quarenta toneladas ou cerca de cento e cinquenta homens armados. Os engenheiros aeronuticos preocupam-se em projetar sua fuselagem de forma a diminuir as possibilidades dessas mquinas serem detectadas por radares, bem como emitir um quantidade mnima de calor, para no serem detectadas por equipamentos infravermelhos.

  • 11

    2.3 Funcionamento

    Os helicpteros so mquinas muito versteis, permitindo ao piloto acesso completo ao espao tridimensional, de uma forma impossvel para um avio. A incrvel flexibilidade dos helicpteros possibilita que eles voem por quase todos os lugares.

    Pilotar um helicptero uma operao complexa, requerendo treinamento intenso e habilidade, assim como ateno contnua mquina.

    Conforme visualizado na Figura 2.3, o helicptero pode fazer trs coisas que um avio no consegue:

    voar para trs; girar no ar; pairar no ar sem se mover.

    Figura 2.3: Movimentos de um helicptero.

    O helicptero pode se mover lateralmente em qualquer direo ou girar 360. Essa liberdade extra e a habilidade necessria para domin-la fazem os helicpteros to instigantes, mas tambm complexos. Para controlar um helicptero, a mo direita segura um comando chamado cclico, que controla a direo lateral do helicptero, incluindo ir para frente, para trs, para a esquerda e para a direita. A mo esquerda segura um comando chamado

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    coletivo, que controla o movimento para cima e para baixo do helicptero e a velocidade do motor. Os ps do piloto ficam sobre os pedais que controlam o rotor de cauda, permitindo ao helicptero girar nos dois sentidos de seu eixo vertical (Figura 2.4).

    Figura 2.4: Comandos do helicptero.

    Nas aeronaves convencionais, o perfil (formato da seco transversal) da asa (ou aeroflio) projetado para defletir o ar para baixo com grande eficincia. Essa deflexo causa dois efeitos: uma reao contrria e uma diferena de presso. A reao tem como princpio a terceira lei de Newton, e gera uma fora contrria deflexo, neste caso, para cima. A diferena de presso, por sua vez, baseia-se no princpio de Bernoulli, onde o ar movimenta-se com maior velocidade na parte superior e menor na parte inferior do aeroflio. Isso causa respectivamente baixa e alta presso. Essa diferena de presso aliada com a reao deflexo do ar causa a fora de sustentao no aeroflio. No entanto, quanto maior a sustentao produzida, maior a fora de arrasto gerado pelo aeroflio. O helicptero faz uso do mesmo princpio, excetuando-se o fato de ao invs de mover a aeronave inteira, apenas as asas (ps, no caso de asas rotativas) que se movimentam atravs do ar.

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    2.4 Estabilidade

    A estabilidade inerente s aeronaves de asa fixa. No caso de uma rajada de vento, ou uma perturbao nos comandos de voo causar alguma variao na atitude da aeronave, seu desenho aerodinmico tender a corrigir o movimento, voltando ao equilbrio. Vrios modelos de avio permitem ao piloto soltar os comandos em pleno voo, mantendo-se no curso sem a ajuda de piloto automtico. Em contraste, os helicpteros so muito instveis. Um simples voo pairado constantemente requer correes do piloto. Caso o helicptero seja perturbado em alguma direo, ele tender a continuar aquele movimento at que o piloto o corrija na direo contrria.

    Quase todos os ajustes que se faz em um dos comandos de voo produzem efeitos que requerem compensaes nos outros comandos. Movendo o cclico frente resulta em aumento da velocidade, mas em contrapartida tambm causa uma reduo na sustentao, que por sua vez ir requerer mais efeito do coletivo para compensar essa perda. Aumentar o coletivo reduz a rotao do rotor por causar mais arrasto sobre as ps, requerendo a abertura da manete de potncia do motor para manter a rotao constante. Se o motor est transferindo mais potncia ao rotor, isso causar mais torque e ir requerer mais ao do rotor de cauda, o que resolvido ajustando os pedais.

    Enquanto nas aeronaves de asa fixa o piloto senta esquerda, nos helicpteros ocorre o inverso. Isso ocorre para que os pilotos de avio possam ajustar os rdios, manetes e outros controles com a mo direita. Nos helicpteros o piloto senta direita para manter a mo mais gil (geralmente a direita) no cclico o tempo inteiro, deixando os rdios e outros comandos para a mo esquerda, que pode ser retirada do coletivo durante o voo.

    2.5 Finalidades

    Atualmente os helicpteros esto presentes em diversas atividades. Nas Foras Armadas, atuam no transporte de pessoal ou carga, busca e salvamento, misses de reconhecimento e ataque, alm de apoio s populaes nas calamidades pblicas. Nas Polcias Civil e Militar, Corpo de Bombeiros de diversos Estados brasileiros, bem como no meio civil, podemos

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    destacar, entre outras, as misses de transporte (txi areo, transporte executivo, transporte de cargas externas, etc.), prospeco petrolfera, atividades agrcolas, apoio imprensa nas grandes cidades, combate ao crime, salvamento, controle de trnsito e remoes aeromdicas colocao e fiscalizao de linhas telefnicas e de alta tenso, construo em regies isoladas, extino de incndios, etc.

    2.6 Vantagens e desvantagens

    Comparando com os avies, os helicpteros so muito mais complexos, mais caros na compra e na sua manuteno, operam com reduzida velocidade, possuem pouca autonomia, pouca capacidade de carga, possuem limitaes de altitude de decolagem e teto operacional, bem como necessitam de potncia adicional para decolagem vertical. A vantagem obtm-se na capacidade de manobra: helicpteros podem pairar, inverter a trajetria e, acima de tudo, podem decolar e pousar com voo vertical. Dependendo do reabastecimento e da quantidade de carga, um helicptero pode viajar para qualquer lugar desde que haja espao no local de aterrissagem. Quando no pode aterissar, ele permite desembarcar e/ou embarcar pessoas e equipamentos por meio de cordas e guinchos especiais.

    2.7 Procedimentos de emergncia

    Vrios so os procedimentos de emergncia utilizados nos helicpteros para o piloto tentar livrar-se de diversos tipos de pane, sendo o mais importante o de autorotao.

    Para o entendimento desse procedimento, faz-se necessrio reavivar alguns conceitos aerodinmicos, descritos a seguir:

    2.7.1 Teoria

    Para estudar o comportamento aerodinmico de um corpo, preciso considerar seu movimento, no em relao terra (movimento absoluto), mas em relao ao ar (movimento relativo).

  • 15

    Quando um perfil aerodinmico passa atravs de um fludo, neste caso o ar, com uma velocidade relativa Vr, cria dois fenmenos, visualizados na Figura 2.5 e descritos abaixo:

    uma rea de presso no intradorso (parte inferior do perfil) e uma rea de depresso gerada no extradorso do perfil (parte superior);

    as foras de depresso so preponderantes em relao s foras de presso, assegurando por volta de 70% da fora de sustentao.

    Figura 2.5: Foras criadas em um perfil aerodinmico quando atravessa um fludo.

    A diferena entre estas duas foras se chama resultante aerodinmica (Fr) que se decompe em outras duas foras (Figura 2.6):

    a fora de sustentao (Fz) que sustenta o perfil e perpendicular ao vento relativo (Vr);

    a fora de arrasto (Fx) que freia o perfil e paralela ao vento relativo (Vr), absorvendo inutilmente energia.

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    Figura 2.6: Resultante aerodinmica e suas decomposies.

    O ngulo de Incidncia (i) o ngulo formado entre a corda mdia de um perfil aerodinmico e o vento relativo (Vr), visualizado na Figura 2.6. Sabendo que as foras de sustentao e arrasto variam em funo das modificaes de ngulo de ataque ou de incidncia (i), desde que mantidos constantes os outros parmetros, pode-se afirmar que o Grfico de sustentao x arrasto define as caractersticas do perfil aerodinmico. A esta curva damos o nome de Polar, porque definida pela extremidade do vetor OM e oriunda de um mesmo plo. (Figura 2.7).

    Figura 2.7: Curva Polar (sustentao x arrasto).

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    Os comandos de passo coletivo e cclico so mecanismos que alteram as foras aerodinmicas do perfil de uma p, variando seu ngulo de incidncia (i).

    Quando se tem o motor enviando potncia para o rotor, mantendo a rotao constante das ps, tem-se garantido tambm a manuteno do vento relativo nas ps. Mas, quando ocorre a pane de motor esta transmisso de potncia cessa em virtude do desacoplamento motor/rotor, atravs da roda livre. O rotor do helicptero continua a girar (fornecendo a sustentao Fn), mesmo no existindo mais a transmisso de potncia do motor, conforme explicado a seguir.

    Ao decompormos Fn em seus vetores formadores (Figura 2.8), segundo a direo do vento relativo (Vr) teremos:

    Fora de Sustentao Fs; Fora de Propulso Fa.

    Neste caso, a Fora de propulso Fa oposta Fora de Arrasto Fx.

    Se o ngulo de incidncia (i) grande, Fn inclinada para frente e a fora Fa muito mais significativa que a fora de arrasto Fx, cuja resultante R, entre Fa e Fx dirigida para frente. Esta a fora autorotativa que impulsiona as ps em autorotao (Figura 2.8).

    Figura 2.8: Decomposio da fora Fn.

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    Ao contrrio, se o ngulo de incidncia (i) pequeno, a inclinao de Fn frente tambm discreta, como tambm o a fora de propulso Fa, em relao fora de arrasto Fx (Figura 2.9).

    No momento em que Fa < Fx, a resultante R dirigida para trs, criando a fora anti-autorotativa, que uma fora que freia as ps. (Figura 2.9).

    Figura 2.9: Decomposio da fora Fn, quando o ngulo de incidncia (i) pequeno.

    A pane de motor, que obrigar o piloto a efetuar uma autorotao ocorre em duas condies bem definidas:

    com velocidade zero, ou seja, em voo estacionrio, dentro do efeito de solo (DES), ou fora do efeito de solo (FES);

    com velocidade horizontal positiva, ou seja, em voo nivelado.

    No primeiro caso, quando a pane de motor acontece no voo pairado, a incidncia das ps depende to somente da direo do vento relativo Vr. Como a descida se faz verticalmente, o vento relativo resulta da velocidade tangencial das ps (U = w R) e da velocidade vertical do ar que passa atravs das ps do rotor (V1), visualizado na Figura 2.10.

  • 19

    Figura 2.10: Decomposio das foras atuantes no perfil aerodinmico, quando a pane de motor acontece no voo pairado.

    A descida em autorotao corresponde ao regime de descida moderado. Na parte central do plano do rotor (formado pelo conjunto de ps) o fluxo de ar atravessa de baixo para cima. Acima do rotor, a velocidade se anula e os filetes de ar so rebatidos para a periferia do disco do rotor, atravessando-o de cima para baixo (a velocidade V1 inversa), visualizado na Figura 2.11.

    Figura 2.11: Fluxo de ar atravessando o rotor na descida em procedimento de autorotao.

    A velocidade tangencial U proporcional ao raio R da seo da p considerada. A velocidade cresce no sentido do punho da p, para sua extremidade. (Figura 2.12).

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    Figura 2.12: Variao da velocidade tangencial U.

    Utilizando todos estes parmetros, pode-se afirmar que nestas condies, o disco do rotor se divide em trs zonas distintas, visualizadas na Figura 2.13:

    Figura 2.13: Diviso do disco do rotor.

    Na autorotao, a partir do voo em translao, agrega-se um novo elemento que a velocidade do helicptero, no modificando em nada os conceitos aqui apresentados. O que se modifica a velocidade do vento relativo Vr, segundo

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    a posio do rotor e o sentido de deslocamento do helicptero (Figuras 2.14 e 2.15).

    Figura 2.14: Variao da zona autorotativa.

    Figura 2.15: Velocidade do vento relativo Vr, segundo a posio do rotor.

    O aumento da incidncia do lado da p que recua (e sua diminuio do lado da p que avana) desloca a zona autorotativa para o lado da p que recua, em consequncia da velocidade de translao v (Figura 2.16).

  • 22

    Figura 2.16: Diviso do disco do rotor. em autorotao com deslocamento frente.

    2.7.2 O procedimento de autorotao

    A falha ao efetuar uma boa entrada em autorotao, aps uma pane de motor, uma das causas primrias dos acidentes de helicpteros. A chave para se fazer uma boa entrada em autorotao manter a velocidade de rotao do rotor alta. Ao se permitir uma queda acentuada desta rotao, o rotor poder estolar (descolamento dos filetes de ar do perfil), quando solicitado a sustentar o peso do helicptero. Porm, muito antes deste ponto chegar, outras panes como falha do (s) gerador (es) ou presso hidrulica abaixo dos mnimos podero acontecer.

    A razo para esta queda de rotao que a energia fornecida pelo motor cessou e o rotor comea a consumi-la, o que se traduz na diminuio de rotao. Se temos um rotor de alta energia, em funo do peso das ps, esta queda se dar mais lentamente do que num rotor de baixa energia.

    A condio de voo no momento da pane de motor tambm influencia na queda de rotao, ou seja, uma pane de motor num regime de subida a toda potncia,

  • 23

    resultar numa queda rpida de rotao. Ao passo que numa situao inversa, ou seja, numa descida em baixa potncia, a perda de rotao seria insignificante.

    O procedimento para se prevenir uma queda acentuada de rotao, descrito e aprovado pela maioria dos fabricantes, diminuir as solicitaes de potncia do rotor, reduzindo-se o passo coletivo. Esta manobra resultar numa diminuio de sustentao, fazendo com que o helicptero inicie uma descida no ar (ar passando pelas ps do rotor), que se constitui no primeiro pr-requisito para uma autorotao.

    Ao perder altitude, o helicptero estar perdendo sua energia potencial, mas ganhando energia cintica no rotor.

    O fluxo constante de ar pelo rotor produz potncia suficiente para as necessidades do helicptero naquela velocidade.

    A menor razo de descida ocorrer na velocidade onde o helicptero voa com a menor potncia aplicada (Vy), da curva de potncia em voo nivelado (Grfico 2.1). prudente manter uma velocidade 10 ns acima da Vy, como margem de segurana no momento do flaire.

    Grfico 2.1: Curva de potncia em voo nivelado.

  • 24

    Ao se manter a mesma atitude da rampa em autorotao, at o contato com o solo, positivamente o choque teria energia superior ao suportado pelo trem de pouso ou esquis do helicptero, e os mesmos no absorveriam esta energia, tampouco o corpo humano. Portanto, uma manobra que diminua a energia cintica ao longo da rampa se torna necessria, ao mesmo tempo em que o contato com o solo efetuado. Isto o flaire. A manobra consiste em cabrar, ou seja, colocar o nariz da aeronave para cima, diminuindo ao mximo a velocidade de translao do helicptero, enquanto ganha rotao no rotor para se aplicar potncia nas ps atravs do passo coletivo, e suavizar o contato com o solo. (Figura 2.17).

    Figura 2.17: Manobra do flaire.

    O sucesso de uma autorotao depende de vrios fatores, mas o timing do piloto ao executar todas estas manobras crucial. Isto se adquire atravs de treinamento continuado at que todas as aes sejam feitas quase que por instinto ou reflexo condicionado.

    Em todo o procedimento descrito at o momento, independente da proficincia do piloto, algumas combinaes de altura e velocidade se tornam mortais e resultaro em um acidente.

    A curva que mostra estes pontos a Curva do Homem Morto, ou mais polidamente chamada de diagrama Altura x Velocidade (Grfico 2.2).

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    Grfico 2.2: Diagrama Altura x Velocidade ou Curva do Homem Morto.

    Fora da rea a ser evitada, o piloto dever ser capaz de efetuar uma autorotao com sucesso, assumindo que ele tenha uma rea de pouso disponvel. Mas, dentro da rea do Grfico a ser evitada, mesmo com todos os pr-requisitos descritos anteriormente, srios danos podero ser causados aeronave e seus ocupantes, no caso de uma autorotao.

    Alguns pontos desta curva so bastante definidos:

    1 - Voo pairado dentro do efeito de solo: se a pane ocorrer e o helicptero estiver na altura certa, a energia do rotor e o uso do passo coletivo sero suficientes para amortecer o contato com o solo. Mais alto que o previsto, o rotor ir estolar quando o passo coletivo for usado e o contato com o solo ser bastante severo;

    2 - Voo pairado fora do efeito de solo: este segundo ponto o mais alto da curva que possibilita ao piloto ganhar velocidade a frente at a velocidade ideal de autorotao, efetuar um flaire e ter energia suficiente no rotor para amortecer o seu contato com o solo;

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    3 - Voo nivelado baixa altitude: uma autorotao em voo nivelado ser sempre possvel visto que grande parte da energia cintica j est presente na velocidade, salvo no segmento de alta velocidade a ser evitado na curva Altura x Velocidade. Se durante um voo a baixa altura, uma pane de motor ocorrer, as caractersticas de fapping do rotor (p que recua abaixa e p que avana sobe) produz um momento a cabrar, fazendo com que o nariz do helicptero suba. Se a distncia em relao ao solo no for suficiente, haver o contato do rotor de cauda com o solo e o acidente ser inevitvel.

  • 27

    3. OPERAO AREA DE SEGURANA PBLICA E/OU DEFESA CIVIL

    So atividades realizadas com aeronaves e conduzida por tripulaes pertencentes aos rgos de Segurana Pblica (Polcia Civil e Militar, Corpo de Bombeiros, Defesa Civil e Departamento de Trnsito Detran) da administrao pblica direta federal, estadual, municipal e do Distrito Federal, destinadas a assegurar a preservao da ordem pblica, da incolumidade das pessoas e do patrimnio (Subparte K do Regulamento Brasileiro de Homologao Aeronutica 91 - RBHA 91).

    Executam atividades tpicas de polcia administrativa, judiciria, de bombeiros e de defesa civil, tais como:

    policiamento ostensivo e investigativo;

    aes de inteligncia;

    apoio ao cumprimento de mandado judicial; controle de tumultos;

    distrbios e motins;

    escoltas;

    transporte aeromdico, de enfermos e rgos humanos;

    transporte de dignitrios, presos, valores e cargas;

    resgate; busca, salvamento terrestre e aqutico;

    controle de trfego rodovirio, ferrovirio e urbano;

    preveno e combate a incndios;

    patrulhamento urbano, rural, ambiental, litorneo e de fronteiras;

    outras operaes autorizadas pela ANAC.

    Face s peculiaridades das atividades areas de segurana pblica e/ou de defesa civil, a Subparte K do RBHA 91 estabelece normas e procedimentos aplicveis a tais atividades. permitido, por exemplo, como operao

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    ocasional e sob total responsabilidade do piloto em comando, efetuar pousos e decolagens de helicpteros em locais no homologados ou registrados.

    3.1 Dimensionamento de Aeronaves

    A aeronave deve apresentar espao que comporte um efetivo bsico, composto de uma equipe ttica e seus equipamentos, armamentos ou aparelhagem peculiar determinada misso, com espao suficiente para comportar um eventual resgate de feridos e a segura conduo de presos, alm de ser apropriada s evolues que a equipe pode necessitar para desencadear suas atividades.

    Normalmente os helicpteros utilizados pelos rgos de Segurana Pblica so do modelo Esquilo AS350, visualizado na Figura 3.1. Seu piso de plataforma regular e sem ressaltos, com capacidade operacional de at seis pessoas, bem como a possibilidade de ser instaladas duas portas corredias traseiras, facilitam a movimentao dos tripulantes operacionais, sendo itens decisivos na escolha dessa aeronave. Geralmente so identificadas com pintura semelhante s viaturas dos respectivos rgos e podem receber diversas configuraes operacionais, dependendo do tipo de misso (policial, resgate, defesa civil, patrulhamento ambiental, transporte de rgos e de enfermos, de tropa especializada, de autoridades, etc.) e tambm do perodo do dia em que so empregadas (diurno ou noturno).

    Figura 3.1: Helicptero modelo Esquilo AS350.

  • 29

    Esses modelos de helicptero tm autonomia para at trs horas e trinta minutos de voo ininterruptos voando a uma velocidade mdia de 200 km/h, podendo alcanar at 287 km/h, permitindo que o apoio areo seja feito de forma rpida e segura em ocorrncias distando at aproximadamente 500 km, dependendo da disponibilidade de apoio logstico imediato. Podem operar em altitudes de at 20.000 ps ou 6096 metros, e em temperaturas variando de -45C at de 50C. Possuem peso aproximado de 1500 kg abastecido, podendo transportar at 760 kg, entre tripulao, passageiros e cargas.

    As aeronaves mais modernas so dotadas com um eficiente sistema de navegao por coordenadas cartesianas, utilizando o Global Position System (GPS), onde toda a regio sobrevoada se encontra disponvel em uma tela instalada no painel da aeronave para consulta da tripulao.

    Para misses noturnas, os helicpteros so equipados com faris de busca com mobilidade de 180 e potncia de 1600W, permitindo que uma rea do tamanho de um campo de futebol seja iluminada. Outro equipamento que ajuda nas misses de segurana pblica, o FLIR (Foward Looking Infra Red) que utiliza a tecnologia de viso infravermelha para captao de imagens noturnas geradas pelo calor dos corpos e objetos. Essas imagens so mostradas numa tela de cristal lquido, localizada no painel da aeronave, permitindo, por exemplo, identificar uma pessoa escondida numa regio de mata ou um veculo recm utilizado, atravs do calor emitido pelo motor e pneus.

    Seu sistema de comunicao dotado de pelo menos dois rdios aeronuticos, que fazem a comunicao bilateral entre os rgos de controle de voo e com outras aeronaves. Geralmente as aeronaves so dotadas com mais um rdio para as comunicaes operacionais com suas respectivas unidades areas.

    Hoje, as aeronaves policiais mais adequadas aproximam-se s aeronaves de combate em nvel de sofisticao de equipamentos, devido gradual transferncia de tecnologia dos equipamentos militares de operaes especiais para as aeronaves policiais, ocorrida nos ltimos anos. A cabine de pilotagem das modernas aeronaves policiais tem se transformado em locais altamente

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    sofisticados em termos de comunicao, navegao e tecnologia de informao.

    3.2 Equipamentos de Proteo Individual

    Os Equipamentos de Proteo Individual (EPI) utilizados pelos pilotos de helicptero da Aviao de Segurana Pblica so:

    macaco e luvas de voo, confeccionados em tecido resistente ao fogo;

    capacete de voo, possuindo viseiras para voos diurnos e noturnos;

    colete de proteo balstico com capacidade de suportar disparos de armamentos com calibre 38, 40, 357 Magnum e 9mm;

    botas de cano alto;

    protetores auriculares, devido ao alto nvel de rudo produzido pela aeronave.

    3.3 Situaes de Risco

    Normalmente as aeronaves de Segurana Pblica apresentam os mesmos padres de grafismo de suas viaturas, sendo facilmente identificadas pelos marginais que, em situaes limites, podem efetuar disparos em direo tripulao, como j ocorreu anteriormente.

    Os helicpteros esto inseridos no contexto de Segurana Pblica e so empregados em atividades policiais e de emergncia, gozando de prioridade em relao s outras aeronaves, no os eximindo de respeitar as regras gerais de trfego areo nos locais que sero sobrevoados, independente da gravidade da ocorrncia que esto apoiando.

    Em alguns locais onde o helicptero presta apoio h um elevado fluxo de aeronaves, obrigando os pilotos a manter a ateno redobrada. Alm disso, no apoio na maioria das aes, a atuao da equipe da aeronave direta, obrigando os pilotos a realizarem, por vezes, o voo em condies meteorolgicas adversas, pouca velocidade e em baixas altitudes, fatores que diminuem sensivelmente a probabilidade de sucesso em eventuais manobras

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    evasivas decorrentes de pane do helicptero. Referida situao caracteriza a Curva do Homem Morto ou diagrama altura x velocidade, onde, no caso de uma pane, ser muito difcil o piloto executar com proficincia um pouso seguro em procedimento de auto-rotao.

    A responsabilidade por realizar o voo nessas condies exclusiva do piloto em comando em que pese o dilogo realizado no interior da cabine com os outros tripulantes para avaliao dos riscos da operao.

    Segundo Manwaring (1998), a chance de sucesso na execuo dessa manobra depende de vrios fatores, como tempo de reao do piloto, altitude, velocidade e peso da aeronave. Durante o voo, o helicptero tem uma distncia limitada de sobrevoo quando est em baixa velocidade e o lapso temporal antes de executar o procedimento de auto-rotao, deve ser utilizado para selecionar um local seguro para o pouso e se preparar para execut-lo.

    O voo realizado em baixa altura em condies climticas desfavorveis um importante fator contribuinte para acidentes. A mortalidade decorrente desse tipo de acidentes alta porque normalmente eles ocorrem juntamente com altos impactos e poderiam ser evitados se fosse realizado um plano de voo apropriado. Voar em condies de mau tempo foi a maior causa de acidentes com helicpteros que realizavam servios mdicos nos Estados Unidos (Thies, 2006).

    As misses areas do segmento de Segurana Pblica e/ou de Defesa Civil so caracterizadas pela irregularidade de horrios, sendo necessria a disponibilidade das tripulaes durante as 24 horas do dia. No entanto, esses fatores impem aos tripulantes riscos relacionados fisiologia humana, trazendo problemas de sade fsica, psicolgica e scio-familiares, agravados durante o perodo noturno.

    3.4 Estresse

    Estresse o conjunto de reaes orgnicas e psquicas de adaptao que o organismo emite quando exposto a qualquer estmulo que o excite, irrite, amedronte ou o faa muito feliz (Ballone, 2002). Dessa maneira, um elevado estado de ansiedade, que caracterizado como um sintoma de estresse pode

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    influir na habilidade cognitiva devido reduo do nvel de concentrao na execuo das tarefas (Rosa, 2004, citada por Diniz et al., 2006).

    Segundo Selye citado por Guimares Jnior (2004), a sobrecarga de agentes estressores pode ser considerada um fator importante para ecloso do estresse patolgico no trabalho. O estresse um mal de propores globalizadas e que, particularmente, pode influenciar de forma relevante o desempenho do piloto de helicptero.

    A pilotagem de helicptero aparentemente no se caracteriza por intenso esforo fsico. Ao contrrio, o piloto tende a se tornar cada vez mais sedentrio, em razo de permanecer por longos perodos de tempo sentado e com restrita movimentao dos principais segmentos corporais. Por outro lado, a responsabilidade da funo demanda um grande componente de estresse mental, aliado necessidade de permanentemente estar o piloto vigilante, atento e preciso em seus movimentos de comando da aeronave (Ribas, 2003). Segundo Diniz (2006), padro postural sedentrio ou trabalho sentado na maior parte do tempo, estado de alerta constante em atividade de risco e contatos com situaes de tragdia so comuns no meio de trabalho dos pilotos de segurana pblica. Tais fatores, somados atividade de pilotagem e complexidade de tarefas num ambiente de contnua mutao acentuam as presses dirias de servio.

    Como os agentes estressores, fsicos e mentais, se constituem causa e consequncia um do outro, devido natureza das atividades de voo, no possvel estud-los de forma estanque. A lombalgia, as dores no pescoo e ombros, os efeitos do rudo excessivo e as redues da viso perifrica e da ateno, podem ser citados como agentes estressores e, ao mesmo tempo, efeitos do estresse mais comuns (Guimares, 2004). As dores nas costas tm sido relatadas com frequncia em pesquisas realizadas com pilotos de helicptero que assumem uma postura assimtrica curvada para a esquerda durante o voo. Nessa posio as prprias vibraes produzidas pela aeronave aumentam o risco de problemas na regio lombar (Oliveira, 2005).

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    A vibrao um agente estressor que afeta uma significante quantidade de trabalhadores e, no caso dos pilotos de helicptero, se encontra associada ao rudo elevado oriundo da aeronave.

    Segundo Dupuis citado por Oliveira (2005), estudos epidemiolgicos tm revelado uma incidncia maior de desordens relacionadas aos discos intervertebrais em profissionais submetidos a muitos anos de vibrao. Trabalhadores expostos continuamente a vibraes no corpo e rudos tm desenvolvido distrbios fisiolgicos e psicolgicos (Silva, 1996). A regio da coluna cervical tambm submetida a constantes presses, decorrentes das desaceleraes durante o voo e dos esforos exigidos pela musculatura visando compensar as foras que incidem sobre o organismo na realizao de curvas com a aeronave. Tais comportamentos, potencializados pelo uso constante do capacete de voo, propiciam o desenvolvimento precoce de osteoartrites cervicais, comuns em pilotos de helicptero (Aydog et al., 2004).

    A musculatura da regio do pescoo essencial para suportar e controlar o complexo da coluna cervical. Ela envolve mais de vinte pares de msculos, mais de trinta articulaes isoladas e numerosos rgos proprioceptivos. A fadiga muscular dessa regio pode implicar num risco srio, interferindo na coordenao muscular como um todo (ng, 2005).

    3.5 Treinamento Fsico

    Segundo Moreira (1992), a habilidade para a pilotagem varia de uma pessoa para outra e depende de qualidades fsicas, como coordenao ou velocidade de reao, cujos nveis de desenvolvimento podem ser aprimorados por meio de treinamento, mas que possuem tambm um considervel componente gentico, o que explica as diferenas na qualidade do desempenho de dois indivduos com o mesmo padro de treinamento.

    Entretanto, o limite gentico vai decrescendo significativamente a partir de certa idade. Esse fato deve-se a deteriorao da atividade fsica, provocada pelo envelhecimento que, por sua vez, acelerado pelos hbitos sedentrios.

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    O piloto da rea de Segurana Pblica apresenta grande dificuldade na manuteno de uma prtica regular de exerccios fsicos, uma vez que cumpre horrios alternados de escalas de servio.

    Weinberg et al. (1995), citado por Ribas (2003), relacionaram o nvel de condicionamento fsico como fator crtico para determinar se o desgaste fsico de uma atividade produz resultados positivos ou negativos nas performances mentais, sugerindo que o exerccio pode facilitar os processos cognitivos, afetando diretamente o sistema nervoso central e a durao da atividade pode reduzir esses efeitos facilitatrios, que so abafados pela fadiga muscular.

    Particularmente, a condio aerbica individual pode ser decisiva na eficcia da recuperao orgnica, uma vez que todo o processo de restaurao metablica de natureza aerbica. sensato supor que essa varivel fsica (condio aerbica individual) tenha forte relao com a capacidade de recuperao da fadiga provocada pelo estresse, seja ele de que natureza for (Moreira, 1992).

    3.6 Acidentes

    A atividade de um piloto da rea de Segurana Pblica em muito diverge da rotina de um piloto civil, pois as aes requeridas exigem condutas que, mesmo escoradas em regras e regulamentos aeronuticos, aumentam consideravelmente as chances de acidentes graves.

    Segundo Thies (2006), a realizao de voos baixa altura, nos moldes dos que so realizados pelos pilotos de Segurana Pblica so importantes fatores contribuintes para acidentes e a mortalidade decorrente desses sinistros extremamente alta em razo da alta energia ocasionada pelo impacto da aeronave.

    As aeronaves de segurana pblica representam aproximadamente 8% da frota total de helicpteros da Nao, mas contriburam em 27% na totalidade dos acidentes e 40% das fatalidades no ano de 2005, segundo o CENIPA.

    3.7 Importncia do Helicptero na Aviao de Segurana Pblica

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    Conforme cita o artigo Helicpteros Bell na Polcia, extrado da revista Bell Helicopter Textron inc (1991):

    A introduo do helicptero em foras policiais proporciona uma plataforma area de confiana que se superpe a congestionamentos e acidentes do terreno. Este ponto de observao area se move numa grande gama de velocidade e o faz fcil, tranquila e confortavelmente a qualquer hora do dia ou da noite; desta forma a organizao policial dispe de uma nova dimenso na obteno de informaes, ligao adicional na coordenao e controle de todos os elementos da operao, aumento sensvel na mobilidade de pessoas e cargas vitais, fora e agilidade capazes de desencorajar ou reduzir atividades terroristas, um meio de impedir o crescimento e a distribuio de narcticos e tambm um grande auxlio para o pblico nos casos de desastre ou calamidade.

    O helicptero pode desempenhar com muita propriedade, as funes de batedor em um comboio policial transportando presos de elevado risco, por exemplo. Sendo esse transporte por via terrestre, fluvial, martimo, lacustre ou ferrovirio, ele desempenha esta diligncia com excelente empenho, baixa vulnerabilidade, garantindo a segurana s equipes que se locomovem pelas vias utilizadas na misso.

    A atividade aeropolical pode variar de uma simples observao area a um cerco ou ato de captura, podendo identificar pontos de incndio distantes, congestionamentos e fluidez comprometida do trnsito, localizar reas ocupadas por elementos suspeitos, acompanhar movimentos de massa em marcha ou concentrada em algum local, participar em levantamentos de investigaes, realizando filmagens e fotografias areas para a confeco de mosaicos investigativos e de possveis incurses policiais, dentre outras.

    Por ser uma mquina area verstil, pode elevar-se o suficiente para aumentar seu cone de viso vertical e horizontal, permitindo um maior poder de observao, domnio, acompanhamento, fiscalizao, visualizao, coordenao, etc.

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    O helicptero a servio da segurana, efetivamente, ainda viabiliza o exerccio de operaes com finalidades sinrgicas, atravs de propostas distintas; umas dirigidas populao que comunga com a tranquilidade, recebendo uma mensagem de leve estratgia de defesa e de preservao, animando-a; e outras enviadas ao pblico potencialmente delinquente e apresentadas atravs de uma moderada demonstrao de poder, como sugesto inibidora e modificadora de comportamento, induzindo-o a reflexo.

    Resumindo, o helicptero uma mquina que deve ser utilizada para minimizar esforos, enquanto amplia resultados esperados.

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    4. DEFINIES

    Neste captulo so apresentadas definies e esclarecimentos necessrios para o entendimento do estudo em pauta.

    4.1 Segurana de Voo

    A qualidade do sistema de transporte areo est primariamente ligada ao conceito de segurana, visto que, o simples ato de voar desperta, de forma involuntria, uma reao adversa nos seres humanos em funo do prprio instinto de sobrevivncia.

    A aviao s tornou-se um meio de transporte aceitvel para o usurio aps um longo perodo de desconfiana, superada com a conscientizao das vantagens desse modo sobre os demais e da implementao de novos dispositivos de segurana obtidos atravs dos avanos tecnolgicos que agregaram informaes extradas das investigaes dos acidentes ocorridos no passado.

    medida que a aviao mundial crescia, novas exigncias passaram a ser feitas para a segurana de voo, sendo necessria a sistematizao das atividades de investigao e de preveno de acidentes (Chiavenato, 1999).

    A Segurana Area um conceito subjetivo, conhecido no meio aeronutico como Segurana de Voo ou Segurana Operacional, e definida pela OACI como sendo o estado no qual o risco de ferir pessoas ou causar danos em coisas se limita a, ou est mantido em ou abaixo de, um nvel aceitvel, atravs de um processo contnuo de identificao de perigos e gerenciamento de riscos (Doc. 9859/OACI).

    A Segurana de Voo passou a ser estudada e divulgada para a aviao civil com maior destaque a partir das recomendaes da OACI, contidas no Anexo 13 da Conveno de Aviao Civil Internacional (Chigago, 1944 Aircraft Accident and Incident Investigation).

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    No Brasil a Segurana de Voo teve maior nfase com a criao do Sistema de Investigao e Preveno de Acidentes Aeronuticos - SIPAER em 1971, juntamente com o Centro de Investigao e Preveno de Acidentes Aeronuticos - CENIPA, rgo central do SIPAER.

    Em 1986 o Cdigo Brasileiro de Aeronutica CBA passou a contemplar os dispositivos que regulamentam o SIPAER, competindo a esse sistema planejar, orientar, coordenar, controlar e executar as atividades de investigao e de preveno de acidentes aeronuticos.

    Desde ento o Brasil adequou-se s exigncias internacionais e passou a ter um sistema de segurana de voo equivalente em qualidade e respeitabilidade aos dos pases mais adiantados. A partir da a segurana de voo no Brasil completamente redimensionada e uma nova estrutura sistmica comea a tomar forma e a difundir-se pelo Brasil. Diversas organizaes militares e civis tornam-se Elos SIPAER.

    4.2 Sistema de Aviao Civil

    O transporte areo espalha-se no mundo e constitui uma densa rede de interdependncia entre os Sistemas de Aviao Civil - SAC das naes. A indstria aeronutica impulsiona-se pela demanda produzida por empresas areas, as quais dinamizaram e propiciaram o desenvolvimento de uma infra-estrutura voltada a apoiar toda a aviao internacional.

    Para viabilizar o desenvolvimento desses sistemas, a OACI props, por meio de seus 18 Anexos Conveno de Aviao Civil Internacional, formas que implementam o planejamento e o controle da aviao civil em cada pas, estabelecendo prticas e padres sobre os diversos assuntos referentes ao transporte areo.

    Os SAC so estruturados por componentes funcionais bsicos: aeronaves, empresas areas e outras empresas vinculadas atividade area, rgos responsveis pela fiscalizao e regulamentao, infraestrutura aeroporturia, navegao area, indstria aeronutica, centros de formao e de pesquisa

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    ligados atividade area. Agrupam sistemas especficos, destacando-se no Brasil:

    Sistema Aeroporturio;

    Sistema de Proteo ao Voo;

    Sistema de Registro Aeronutico Brasileiro;

    Sistema de Facilitao;

    Sistema de Segurana e Coordenao do Transporte Areo;

    Sistema de Formao e Adestramento de Pessoal Destinado Navegao Area e Infra-Estrutura Aeronutica;

    Sistema de Indstria Aeronutica;

    Sistema de Servios Auxiliares;

    Sistema de Coordenao da Infraestrutura Aeronutica;

    Sistema de Segurana de Voo SegVoo;

    Sistema de Investigao e Preveno de Acidentes Aeronuticos SIPAER.

    O Sistema de Segurana de Voo - SegVoo, apesar de o nome evocar a ideia de investigao e preveno de acidentes, na verdade, um sistema muito diferente do SIPAER. O SegVoo est voltado para as homologaes e certificaes necessrias atividade aeronutica no Pas.

    4.3 Regulamentao e Fiscalizao

    Pode-se afirmar que o processo de regulamentao utiliza-se de alguns dos princpios do planejamento, isto , deve-se estabelecer uma ao visando alcanar um determinado padro considerado como adequado para aquela atividade. Segundo Kwasnicka (1995), o planejamento compreende a anlise de informaes relevantes do presente e do passado e a avaliao dos provveis desenvolvimentos futuros, de forma que um curso de ao seja determinado.

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    A fiscalizao utiliza-se de princpios do controle, isto , mede o desempenho atual e o compara aos padres, para determinar se h diferenas e impor a correo, que nessa atividade se obtm aplicando sanes.

    Segundo Chiavenato (1999), o processo de controlar o esforo sistmico de estabelecer padres de desempenho e sistemas de informaes. Comparar o atual desempenho com padres determinados e medir o grau de significncia dos desvios, tomando aes corretivas para assegurar que a empresa possa atingir seu grau de eficincia quanto aos objetivos definidos no planejamento.

    Os padres de segurana foram estabelecidos pela OACI atravs dos seus Anexos. Coube a cada nao, atravs do rgo regulador, estabelecer sua legislao interna e seus procedimentos associados, adequando-se sua realidade sem ferir os preceitos internacionais.

    Pelo Artigo 37 da Conveno de Aviao Civil Internacional, os mais de 180 Estados contratantes se obrigaram a colaborar com a uniformidade dos regulamentos, sempre que isso trouxer vantagens para a atividade em mbito mundial. O cumprimento das padronizaes e recomendaes sugeridas pela OACI permite a elevao dos padres de segurana de voo, gerando, consequentemente, uma preocupao das autoridades aeronuticas no que se refere ao cumprimento dos compromissos firmados pelas naes.

    A fiscalizao exercida pelo rgo regulador tem por objetivo verificar se os operadores esto em condies de atuar de acordo com os manuais e programas apresentados, seguindo os padres estabelecidos pela regulamentao aeronutica.

    No caso do Brasil, a regulamentao composta pelo CBA, Lei n. 7.565, de 19 de dezembro de 1986, e pela legislao complementar formada pelas leis especiais, decretos e normas sobre matria aeronutica.

    Para exercer a funo de rgo regulador e fiscalizador, foi criada em 2005 a Agncia Nacional de Aviao Civil ANAC, substituindo o antigo Departamento de Aviao Civil DAC. A criao da agncia reguladora seguiu uma tendncia mundial. A ANAC mantm com o Ministrio da Defesa uma relao de

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    vinculao, ao passo que o antigo DAC era subordinado ao Comando da Aeronutica.

    A ANAC cumpre o Artigo 197 do CBA, prevendo que a fiscalizao seja exercida pelo pessoal credenciado pela autoridade aeronutica. Constitui encargos de fiscalizar as inspees e vistorias em aeronaves, servios areos, oficinas, entidades aerodesportivas e instalaes aeroporturias, bem como os exames de proficincia de aeronautas e aerovirios.

    Cabe a ANAC, portanto, a orientao, a coordenao, o controle e a fiscalizao da:

    Navegao area; Trfego areo; Infra-estrutura aeronutica; Aeronaves;

    Tripulaes; Servios, direta ou indiretamente relacionados ao voo.

    A legislao complementar mais importante do CBA o conjunto de Regulamentos Brasileiros de Homologao Aeronutica - RBHA. Tais regulamentos usam como referncia os padres fixados pela OACI, sendo que, a exemplo dos pases europeus, a ANAC optou por apresentar no formato bsico utilizado pelos Estados Unidos em seus Federal Aviation Regulations - FAR. Tal opo baseia-se no fato de que, por serem os regulamentos mais difundidos mundialmente, a adoo de sua forma de apresentao facilita as relaes aeronuticas internacionais.

    4.4 Acidente Aeronutico

    Conforme a Norma de Sistema do Ministrio da Aeronutica 3-1 (NSMA 3-1) que conceitua os vocbulos, expresses e siglas utilizadas pelo SIPAER, adaptada do Anexo 13 da Conveno de Aviao Civil Internacional, acidente aeronutico toda ocorrncia relacionada com a operao de uma aeronave, ocorrida entre o perodo em que uma pessoa nela embarca com a inteno de

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    realizar um voo, at o momento em que todas as pessoas tenham dela desembarcado e, durante o qual, pelo menos uma das situaes abaixo ocorra:

    qualquer pessoa sofra leso grave ou morra como resultado de estar na aeronave, em contato direto com qualquer uma das suas partes, incluindo aquelas que dela tenha se desprendido, ou submetido exposio direta do sopro de hlice, rotor ou escapamento de jato, ou s suas consequncias. Exceo feita quando as leses resultem de causas naturais, forem auto ou por terceiros infligidas, ou forem causadas a pessoas que embarcarem clandestinamente e se acomodaram em reas que no as destinadas aos passageiros e tripulantes;

    a aeronave sofra dano ou falha estrutural que afete adversamente a resistncia estrutural, o seu desempenho ou as suas caractersticas de voo; exija a substituio de grandes componentes ou a realizao de grandes reparos no componente afetado. Exceo feita para falhas ou danos limitados ao motor, suas carenagens ou acessrios; ou para danos limitados hlice, pontas de asa, antenas, pneus, freios, carenagens do trem, amassamentos leves e pequenas perfuraes no revestimento da aeronave;

    a aeronave seja considerada desaparecida ou o local em que se encontre seja absolutamente inacessvel.

    As leses decorrentes de um acidente aeronutico que resultem em fatalidades at 30 dias da data da ocorrncia so consideradas leses fatais. Uma aeronave considerada desaparecida quando as buscas forem encerradas e os destroos no forem encontrados. Tambm so analisadas pelo SIPAER, alm do acidente aeronutico, outras ocorrncias de menor gravidade que so o Incidente Aeronutico e a Ocorrncia de Solo.

    4.5 Incidente Aeronutico

    Toda ocorrncia, inclusive de trfego areo, associada operao de uma aeronave, havendo inteno de Voo, que no chegue a se caracterizar como um acidente, mas que afete gravemente a segurana da operao.

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    Um incidente pode ser classificado como grave quando ocorrido sob circunstncias em que um acidente quase ocorreu. A diferena entre o incidente grave e o acidente est apenas nas consequncias.

    4.6 Ocorrncia de Solo

    definido como toda ocorrncia envolvendo aeronave e no havendo inteno de voo, da qual resulte dano ou leso.

    4.7 Preveno de Acidentes Aeronuticos

    Preveno de Acidentes Aeronuticos, de Incidentes Aeronuticos e Ocorrncia de Solo, segundo a Norma de Servio do Comando da Aeronutica NSCA 3-3, o conjunto de atividades destinadas a impedir essas ocorrncias, evitando assim custos adicionais desnecessrios operao, atravs da preservao dos recursos humanos e materiais.

    Ao tratarmos de preveno de acidentes, no nos reportamos somente ao homem ou mesmo a aeronave, mas, de uma maneira global, ao ser humano que opera essa mquina, a aeronave que operada por uma equipe e ao meio no qual se desenvolve essa atividade, seja o meio areo com suas condies atmosfricas, o ambiente da cabine de pilotagem, o meio social e familiar em que vive esse homem e, tambm, o meio em que trabalha esse homem.

    Em Preveno de Acidentes Aeronuticos no se deve desprezar aspectos considerados irrelevantes, tornando-se necessria a disseminao de uma real mentalidade de Segurana de Voo no seio da coletividade, com especial ateno para as reas de motivao, educao e superviso.

    4.8 Investigao de Acidentes Aeronuticos

    A investigao de um acidente aeronutico normalmente se inicia em cenrios que chegam a ser caticos. A desacelerao abrupta pode transformar uma grande aeronave em um monte de metal retorcido. Em caso de incndio, a situao fica ainda mais complicada, dependendo do local onde o acidente ocorreu, sobrar pouco para ser analisado. Alm disso, as estatsticas mostram

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    que comum ocorrer vtimas fatais em acidentes aeronuticos. No meio dessa confuso, indispensvel seguir uma metodologia para que seja possvel obter as informaes necessrias que permitiro atingir o objetivo da preveno.

    Alm das dificuldades normais para se desvendar o mistrio do acidente, existe uma srie de complicadores agregados que servem para criar uma presso sobre os investigadores. Um acidente envolve a perda de vidas humanas, disputas financeiras e interesses da mdia que, para fazer seu trabalho, busca todas as informaes disponveis. Alm disso, logo aps um acidente, comum que muitos passageiros cancelem seus voos, mesmo em outras empresas. Muitos processos judiciais so abertos, nos quais pessoas fsicas e jurdicas so responsabilizadas por fatos relacionados aos acidentes. Os prejuzos causados podem at culminar com a falncia da empresa envolvida.

    Visando facilitar o trabalho dos investigadores, a OACI elaborou o Manual of Aircraft Accident Investigation - DOC 6920, com o objetivo de dar as orientaes bsicas s autoridades responsveis pela investigao, visando unicamente prevenir novas ocorrncias.

    Evidentemente que, a critrio de cada nao, em paralelo, poder correr um processo na Justia Comum buscando responsabilidades. No entanto, as informaes colhidas na investigao SIPAER no devem ser utilizadas pela Justia, conforme recomendao contida no Anexo - 13 da Conveno de Aviao Civil.

    No manual da OACI consta que o primeiro procedimento a ser feito no local do desastre a Ao Inicial, que engloba um conjunto de medidas preliminares, adotadas de acordo com tcnicas especficas e por pessoal habilitado. Tal procedimento visa preservar indcios, a desinterdio da pista e principalmente o levantamento inicial de todas as informaes disponveis no local.

    Logo aps essa etapa, a Autoridade Aeronutica designa uma Comisso de Investigao de Acidente Aeronutico - CIAA. No caso da Aviao Civil Brasileira, isso feito pelos Servios Regionais de Investigao e Preveno de Acidentes Aeronuticos - SERIPA, que so os rgos regionais do CENIPA, ou na prpria Diviso de Investigao e Preveno de Acidentes Aeronuticos

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    DIPAA do CENIPA. Essa Comisso responsvel pela elaborao do Relatrio Preliminar e pelo Relatrio de Investigao de Acidente Aeronutico - RELIAA.

    A OACI recomenda que seja designado um encarregado pela investigao. No Brasil, esse encarregado chamado de Presidente da CIAA, devendo ser um Oficial Superior da Aeronutica (posto igual ou acima ao de Major na hierarquia militar).

    A CIAA dever contar com o nmero de profissionais que seja necessrio para esclarecer todos os fatos relacionados com o acidente, no entanto, existe, de acordo com cada pas, uma equipe mnima. No Brasil, esse grupo composto por um piloto militar, que seja Oficial de Segurana Operacional - OSO, ou piloto civil, que seja Agente de Segurana Operacional - ASO; por um mdico, um psiclogo e um engenheiro aeronutico, todos com curso de Segurana de Voo ministrado pelo CENIPA, nas suas respectivas reas.

    Iniciam-se ento os trabalhos da CIAA com a Reunio Inicial. Nesse momento, todas as informaes so apresentadas aos membros dessa comisso. Os especialistas recebem as orientaes bsicas para dar continuidade s investigaes de suas reas.

    A fase de pesquisa dos fatores que contriburam para o acidente pode prolongar-se por meses, de acordo com o tamanho e a complexidade da investigao. Nesse perodo, so elaborados laudos tcnicos, exame da documentao pertinente, entrevista com gerentes e outros funcionrios das empresas, anlise de gravadores de voo, simulao, anlise e reviso de autpsias, relatrios de toxicologia, etc.

    Aps todos os testes, anlises e reunies necessrias, a CIAA conclui os trabalhos com uma Reunio Final e encaminha o Relatrio de Investigao de Acidente Aeronutico - RELIAA para ser analisado e revisado pela Cadeia de Comando de Investigao - CCI, a qual dever endoss-lo. Uma vez aprovado pelos vrios nveis da CCI, o RELIAA enviado ao CENIPA, para ser elaborado o Relatrio Final - RF.

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    O RF ostensivo e utilizado para a divulgao das Recomendaes de Segurana de Vo - RSV, que so as principais produes de todo esse processo. Elas permitem aos diversos setores envolvidos com a ocorrncia do acidente, corrigirem suas falhas, evitando que voltem a contribuir para tais acontecimentos.

    Segundo o RBHA 91, a ANAC no poder usar os relatrios e outros documentos relacionados com segurana de voo e investigao de acidentes aeronuticos em processos judiciais, a menos que o assunto dos mesmos identifique uma ao criminosa.

    4.9 Fatores Contribuintes

    A utilizao de processos padronizados nas investigaes de acidentes aeronuticos serve, entre outras coisas, para evitar erros na indicao de aspectos que coloquem em risco a segurana de voo, permitindo, dessa forma, a realizao de anlises de tendncias, feitas atravs dos levantamentos estatsticos. Tais anlises so ferramentas importantes na preveno de acidentes.

    Dessa forma, os rgos responsveis pela segurana de voo podem extrair dessas anlises subsdios para as tomadas de decises relativas s aes a serem tomadas na busca de melhoria da segurana de voo, definindo estratgias e programas que visem eliminao dos problemas apontados.

    Nenhum acidente ocorre por um nico motivo, mas pela somatria de diversos aspectos ligados aos fatores contribuintes. Parte-se do princpio de que a eliminao de qualquer um dos aspectos poderia ter evitado a ocorrncia do desastre, quebrando o desencadeamento de eventos que culminaram com o acidente.

    No Brasil, as investigaes so baseadas na anlise dos fatores contribuintes, que foram estabelecidos no incio da dcada de 80, por oportunidade da elaborao das primeiras NSMA relacionadas com o SIPAER.

    Os fatores contribuintes so definidos, portanto, como sendo as condies que, aliadas a outras, em sequncia ou como consequncia, conduzem aos

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    acidentes. Os fatores contribuintes classificam-se de acordo com a rea de abordagem da segurana de voo (ou segurana operacional), a qual poder ser a de Fatores Humanos ou a de Fatores Materiais.

    4.9.1 Fator Humano

    De acordo com a NSCA 3-6 Investigao de Acidente e Incidente Aeronutico e de Ocorrncia de Solo, a investigao deste fator constitui uma anlise dos aspectos mdico, psicolgico e operacional, considerando as caractersticas fsicas, fisiolgicas, psicolgicas, psquicas, organizacionais e sociais, bem como o desempenho do ser humano nas atividades relacionadas com a aeronave, com o voo e infraestrutura aeronutica, incluindo o controle do espao areo. Ao mesmo tempo, o Fator Humano estuda a inter-relao com variveis ambientais, materiais, temporais e operacionais. Desta configurao, decorre a necessidade de que todos os indcios e evidncias relativos ao Fator Humano sejam efetivamente coordenados com os indcios e evidncias pertinentes s outras reas da investigao.

    Segundo a NSCA 3-1 Conceituao de Vocbulos, Expresses e Siglas de Uso no SIPAER, os Fatores Humanos compreendem os seguintes aspectos:

    Aspecto Mdico: a rea dos Fatores Humanos onde h o envolvimento de conhecimentos mdicos e fisiolgicos que so pesquisados para definir a presena de variveis desta natureza e a forma de sua participao nos eventos;

    Aspecto Psicolgico: a participao de variveis psicolgicas individuais, psicossociais ou organizacionais no desempenho da pessoa envolvida;

    Aspecto Operacional: refere-se ao desempenho do ser humano nas atividades diretamente relacionadas com o voo.

    O Aspecto Operacional encontra-se assim subdividido:

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    Condies meteorolgicas adversas: participao de fenmenos meteorolgicos, interferindo na operao e conduzindo-a s circunstncias anormais;

    Deficiente infraestrutura: participao de servios de infraestrutura aeronutica, incluindo as condies fsicas e operacionais do aerdromo, quando homologado;

    Deficiente instruo: participao do processo de treinamento recebido, por deficincia quantitativa ou qualitativa, no atribuindo ao instruendo a plenitude dos conhecimentos e demais condies tcnicas necessrias para o desempenho da atividade;

    Deficiente manuteno: participao do pessoal de manuteno, por inadequao dos servios realizados, preventivos ou corretivos, e do trato ou da interpretao de relatrios, boletins, ordens tcnicas e similares;

    Deficiente aplicao dos comandos: erro cometido pelo piloto, por uso inadequado dos comandos da aeronave;

    Deficiente controle do trfego areo: participao do pessoal que realiza o controle de trfego areo por inadequao da prestao desse servio;

    Deficiente coordenao de cabine: erro decorrente da inadequada utilizao dos recursos humanos para operao da aeronave, em virtude de um ineficaz gerenciamento das tarefas afetadas a cada tripulante, de falha ou confuso na comunicao ou no relacionamento interpessoal, ou da inobservncia de normas operacionais;

    Deficiente julgamento: erro cometido pelo piloto, decorrente da inadequada avaliao de determinados aspectos, estando qualificado para aquela operao;

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    Deficiente pessoal de apoio: participao de pessoal que realiza os servios de preparao e recebimento de aeronave, reabastecimento, tratoramento, apoio de rampa e outros envolvidos na operao;

    Deficiente planejamento: erro cometido pelo piloto, decorrente de inadequada preparao para o voo ou parte dele;

    Deficiente superviso: participao de pessoas, que no sejam tripulantes, por falta de superviso adequada no planejamento ou na execuo da operao, a nvel administrativo, tcnico ou operacional;

    Esquecimento: erro cometido pelo piloto, decorrente do esquecimento de algo conhecido, da realizao de procedimento ou parte dele;

    Indisciplina de voo: desobedincia intencional pelo piloto das regras de trfego areo, normas operacionais ou regulamentos, sem que haja justificado motivo para tal;

    Influncia do meioambiente: interferncia do ambiente fsico, de cabine ou externo, no desempenho individual;

    Pouca experincia de voo ou na aeronave: erro cometido pelo piloto, decorrente de pouca experincia na atividade area, na aeronave ou especificamente nas circunstncias da operao;

    Outros aspectos operacionais - a manifestao de outros fatores ligados ao desempenho de tripulante, no classificados nos fatores contribuintes conhecidos dentro do Aspecto Operacional.

    4.9.2 Fator Material

    O Fator Material a rea de abordagem da segurana de voo que se refere aeronave, incluindo seus componentes, e equipamentos e sistemas de tecnologia da informao empregados no controle do espao areo, nos seus aspectos de projeto, de fabricao, de manuseio do material e de falhas no relacionadas servio de manuteno, sendo subdividido nos seguintes aspectos:

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    Deficincia de Projeto: participao do projeto da aeronave ou componente, por inadequao do material estabelecido; dos controles, luzes ou instrumentos devido interferncia induzida pela sua forma, tamanho, instalao ou posicionamento; ou do estabelecimento inadequado de parmetros de operao ou de manuteno preventiva;

    Deficincia de fabricao: participao do processo de fabricao, por deficincia de montagem, no material empregado ou no seu manuseio durante esse processo;

    Deficiente manuseio do material: participao do material em questo, devido falha prematura de manuseio, estocagem ou utilizao sob condies inadequadas at a sua entrada em operao, provocando alteraes no seu comportamento previsto em projeto.

    4.9.3 Modelos Conceituais

    A aviao contempornea, ao contrrio do modelo operacional do passado, abarca a necessidade de mudanas tcnicas, econmicas e sociais, sendo que os Fatores Humanos constituem o veculo para tais mudanas (Moreira, 2001).

    A crescente importncia dirigida aos Fatores Humanos na rea de Segurana de Voo conduziu pesquisadores a estudarem modelos conceituais, fundamentados nos princpios ergonmicos, a fim de auxiliarem os investigadores de acidentes e incidentes aeronuticos a analisarem o contexto da ocorrncia e a identificarem os aspectos contribuintes.

    Num acidente aeronutico, existem dois tipos de erros humanos: os ativos e os latentes. Os erros ativos so falhas geralmente associadas operao das aeronaves e so de efeito imediato. Por outro lado, as falhas latentes so informaes, decises ou aes cujas consequncias mantm-se dormentes por um longo tempo. Elas j estavam presentes no sistema bem antes do acidente ocorrer.

    Segundo Moreira (2001), os indivduos, no desempenho normal de suas atividades, cometem erros, como caracterstica da atuao humana e estes,

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    chamados erros ativos, somam-se aos erros latentes pr-existentes, sendo submetidos ao sistema de defesas da organizao. Quando esse sistema defensivo encontra-se funcionando conforme foi planejado, naturalmente evita a possibilidade de acidente. Porm, quando essas defesas no so suficientes para conter a sequncia de erros desencadeada, o acidente torna-se inevitvel.

    Na busca de uma compreenso do processo que resulta num acidente areo surgiram os Modelos Conceituais, que consistem nos diferentes enfoques utilizados para auxiliar os investigadores de acidentes aeronuticos a analisar as informaes e identificar os elementos contribuintes.

    4.9.3.1 Modelo Heinrich

    Tambm chamado de Teoria dos Domins, foi concebido por H. W. Heinrich em 1931. Esse modelo considera que aes aparentemente no relacionadas podem desencadear uma sequncia de eventos que culminam num acidente.

    O Modelo de Heinrich utiliza os domins, atravs da sua queda progressiva, para representar como uma sequncia de eventos pode produzir um acidente.

    O Domin 1 representa as causas implcitas que colocam os demais domins em movimento. A sua atuao corresponde ao nvel gerencial da organizao onde erros latentes so cometidos, criando pr-condies para problemas no interior do sistema.

    O Domin 2 refere-se s causas bsicas e envolve os defeitos no sistema operacional que podem ser originados por erros latentes do domin 1 ao criarem erros latentes adicionais.

    O Domin 3 aquele que representa as causas imediatas ou o que manifesta o que se pode chamar de sintomas, compreendendo os erros ativos cometidos pela linha de frente das operaes.

    O Domin 4, tambm conhecido por contramedidas de segurana, representa o sistema defensivo da organizao, responsvel por reduzir os riscos e prevenir os acidentes. Sua funo detectar os erros, tanto latentes quanto ativos,

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    evitando suas consequncias. Na medida em que o sistema falhar nessa funo de detectar o erro cometido ou for ineficaz para cont-lo, o acidente torna-se inevitvel. Pode-se visualizar a dinmica citada na Figura 4.1.

    Fonte: Si