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Otávio Beltramello
Acompanhamento Terapêutico: características de
classes de comportamentos constituintes dessa atuação
do psicólogo no Brasil
Orientadora: Profa. Dra. Nádia Kienen
Mestrado em Análise do Comportamento
Londrina
2018
Otávio Beltramello
Acompanhamento Terapêutico: características de
classes de comportamentos constituintes dessa
atuação do psicólogo no Brasil
Dissertação apresentada ao Programa de
Mestrado em Análise do
Comportamento da Universidade
Estadual de Londrina, como parte dos
requisitos para obtenção do título de
Mestre em Análise do Comportamento.
Orientadora: Profa. Dra. Nádia Kienen
.
Londrina
2018
Otávio Beltramello
Acompanhamento Terapêutico: características de
classes de comportamentos constituintes dessa
atuação do psicólogo no Brasil
Dissertação apresentada ao Programa de
Mestrado em Análise do
Comportamento da Universidade
Estadual de Londrina, como parte dos
requisitos para obtenção do título de
Mestre em Análise do Comportamento.
Orientadora: Profa. Dra. Nádia Kienen
BANCA EXAMINADORA
____________________________________
Orientador: Profa. Dra. Nádia Kienen Universidade Estadual de Londrina - UEL
____________________________________
Profa. Dra. Sílvia Aparecida Fornazari Universidade Estadual de Londrina - UEL
____________________________________
Profa. Dra. Olga Mitsue Kubo Universidade Ferederal de Santa Catarina -
UFSC
Londrina, 19 de Janeiro de 2018.
Beltramello, O. (2018). Acompanhamento Terapêutico: características de classes de
comportamentos constituintes dessa atuação do psicólogo no Brasil. (Dissertação).
Programa de Mestrado em Análise do Comportamento, Universidade Estadual de
Londrina - PR, Brasil.
Resumo
O termo Acompanhamento Terapêutico tem resultado em definições na área da
Psicologia que indicam a necessidade de mais investigação sobre os comportamentos do
psicólogo envolvidos com a prestação desse serviço. A produção científica sobre o
Acompanhamento Terapêutico, embora variada e diversa, pouco tem contribuído para a
formulação de uma definição consensual do que caracteriza esse tipo de serviço. O
objetivo desta pesquisa consiste em caracterizar as classes de comportamentos
constituintes do Acompanhamento Terapêutico como um subcampo de atuação do
psicólogo no Brasil. Para isso a pesquisa foi organizada em dois estudos. O Estudo 1
teve por objetivo caracterizar de forma crítica diferentes contribuições da Psicologia e
da Análise do Comportamento para a definição de Acompanhamento Terapêutico,
problematizando características que têm sido utilizadas em suas definições no Brasil.
Verificou-se que o Acompanhamento Terapêutico tem sido definido por meio do uso de
metáforas e como um serviço necessariamente subordinado ao trabalho do psicólogo
clínico. Já o Estudo 2 teve como objetivo caracterizar as classes de comportamentos
constituintes do Acompanhamento Terapêutico como um subcampo de atuação de
psicólogos, por meio de análise da literatura especializada onde foram identificadas,
partir da perspectiva analítico-comportamental, as classes de comportamentos
constituintes do Acompanhamento Terapêutico. O conceito de comportamento como
um complexo sistema de relações entre classes de estímulos antecedentes, classes de
respostas e classes de estímulos consequentes foi considerado como base para
identificar essas classes de comportamentos. A identificação foi feita a partir de um
procedimento constituído por 4 etapas que permitiu identificar, avaliar e corrigir a
linguagem que tem sido utilizada para se referir às classes de comportamentos. Foram
identificadas 911 classes de comportamentos, que foram (re)nomeadas e organizadas
em uma lista e estão categorizadas de acordo com seus componentes, o que possibilitou
questionar definições em que o acompanhante terapêutico é subordinado a outro
profissional, ou que o aproximam às funções que são realizadas por estagiários, ou
como sendo um profissional responsável exclusivamente por uma modalidade de
atuação. Defende-se que utilizar recursos conceituais e tecnológicos derivados da
Análise do Comportamento e especificamente da Programação de Ensino, parece
sinalizar uma alternativa para definir mais claramente o “perfil” do Acompanhante
Terapêutico. Por fim, a presente pesquisa poderá contribuir com a produção de um
conhecimento que poderá favorecer o desenvolvimento da profissão e do ensino de
Psicologia.
Palavras-chave: Acompanhamento Terapêutico, campos de atuação de Psicólogos,
classes de comportamentos, Programação de Ensino, Psicologia no Brasil
Beltramello, O. (2018). Therapeutic Accompaniment: characteristics of behavior classes
that constitute the performance of the psychologist in Brazil. (Dissertação). Programa de
Mestrado em Análise do Comportamento, Universidade Estadual de Londrina - PR,
Brazil.
Abstract
The term Therapeutic Accompaniment has a result in the area of Psychology that
requires a need for more research on the behaviors of the psychologist involved with a
service delivery. The scientific production on Therapeutic Accompaniment, although
varied and diverse, has contributed little to a formulation of a consensual definition of
what characterizes this type of service. The objective of this research is to characterize
as classes of behaviors constituent of Therapeutic Accompaniment as a subfield of
psychologist performance in Brazil. Therefore, the research was organized in two
studies. Study 1 aimed to critically characterize different contributions of Psychology
and Behavior Analysis to the definition of Therapeutic Accompaniment, problematizing
characteristics that are being tested in Brazil. It was verified that the Therapeutic
Follow-up has been defined through the use of metaphors and as a service necessarily
subordinated to the work of the clinical psychologist. Study 2 has as its objective to
characterize as classes of behaviors constituent of Therapeutic Accompaniment as a
doing not field of action of psychologists, through an analysis of the specialized
literature where from the analytic-behavioral perspective were identified as classes of
constituent behaviors of Therapeutic Accompaniment. The concept of behavior as a
complex system of relations between classes of antecedent stimuli, classes of responses
and classes of consequent stimuli was considered as the basis for identifying these
classes of behavior. The identification was made by a procedure consisting of 4 steps
that allowed to identify, evaluate and correct the language that has been used to refer to
the behavior classes. 911 classes of behaviors were identified that were (re) named and
organized into a list and are categorized according to their components, which made it
possible to question whether the therapeutic companion is subordinate to another
professional, or you are at the top of the functions carried out by trainees, or as being
responsible for a modality of performance. It is argued that it uses conceptual and
technological resources derived from Behavior Analysis and specifically from the
Teaching Program, it seems to signal an alternative to define more clearly the profile of
the Therapeutic Accompanist. Finally, the present research can contribute with the
production of a knowledge that is to favor the development of the profession and the
teaching of Psychology.
Key words: Therapeutic Accompaniment, fields of intervention of Psychologists,
characterization of behavior classes, Teaching Programming, Psychology in Brazil
Lista de figuras Estudo 1
Figura 1. Especificação dos componentes constituintes da definição do comportamento
como interação entre o que o organismo faz e o ambiente em que o faz. As setas
representam as intereações entre os componentes do comportamento. (Adaptada de
Botomé, 2001)........................................................................................................................... 36
Figura 2. Componentes que constituem comportamentos e classes de comportamentos
que foram identificadas e derivadas a partir do trecho do texto de Oliveira (2000). ...... 40
Figura 3. Representação do procedimento para a decomposição de classes de
comportamentos........................................................................................................................ 44
Estudo 2
Figura 1. Especificação dos componentes constituintes do(s) comportamentos emitidos
por acompanhantes terapêuticos (adaptado de Botomé, 2001). ......................................... 65
Figura 2. Protocolos para identificação e derivação de comportamentos ou de
componentes de comportamentos que caracterizam a atuação do acompanhante
terapêutico. ................................................................................................................................ 72
Figura 3. Resumo dos procedimentos correspondente às quatro etapas do procedimento
para identificar classes de comportamentos constituintes do acompanhamento
terapêutico, e os instrumentos utilizados em cada uma
delas.................................................................................................................................75
Figura 4. Exemplo de resultado dos procedimentos referentes às Subetapas de 1.1 a
1.5....................................................................................................................................79
Figura 5. Exemplo de resultado dos procedimentos referentes às Etapas de 2.1 a
2.3....................................................................................................................................82
Figura 6. Exemplo de resultado dos procedimentos referentes às Subetapas 3.1 e
3.2....................................................................................................................................84
Figura 7. Amostra da lista de classes de comportamentos nomeadas a partir dos
componentes dos comportamentos básicos constituintes de classes gerais de
comportamentos do Acompanhamento Terapêutico.......................................................86
Figura 8. Exemplo de protocolo encaminhado para avaliação da juíza (Adaptado de
Silva, 2017).....................................................................................................................87
Figura 9. Modalidades de atuação do psicólogo como acompanhante terapêutico e
subclasses de comportamentos que por elas são abrangidas (Adaptado de Botomé et al.,
2013).............................................................................................................................. 90
Figura 10. Exemplos de componentes de três subclasses de comportamento que foram
identificadas e derivadas............................................................................................... 110
Lista de tabelas
Estudo 2
Tabela 1. Quantidade e porcentagem de subclasses de comportamentos avaliadas ou
derivadas que são abrangidas pelas subclasses gerais que compõem as três classes gerais
de comportamentos relacionadas às modalidades de atuação do psicólogo por meio do
Acompanhamento Terapêutico....................................................................................... 95
Tabela 2. Amostra de subclasses de comportamentos constituintes das subclasses gerais
constituintes da classe geral de “produzir alterações em processos comportamentais por
meio da intervenção direta como acompanhante
terapêutico”..................................................................................................................... 99
Tabela 3. Exemplos de subclasses gerais de comportamentos que são abrangidas pelas
subclasses gerais que sao abrangidas pela classe geral de “produzir aprendizagem
relacionada aos fenômenos que constituem os objetos de estudo e de atuação como
acompanhante terapêutico”........................................................................................... 107
Tabela 4. Subclasses de comportamentos que foram identificadas e/ou derivadas que
constituem as subclasses gerais que são abrangidas pela classe geral “produzir
conhecimento sobre fenômenos e processos comportamentais que constituem os objetos
de estudo como acompanhante
terapêutico”................................................................................................................... 108
Sumário
Apresentação ................................................................................................................. 13
Estudo 1 – Acompanhamento Terapêutico e Análise do Comportamento: Avanços
e problemáticas nas definições desta atuação ............................................................ 15
Resumo .................................................................................................................................... 15
Abstract ................................................................................................................................... 16
Surgimento do Acompanhamento Terapêutico e seus precursores no Brasil ......................... 20
A produção científica em Acompanhamento Terapêutico na Psicologia ................................ 23
Contribuições históricas da Análise do Comportamento para o Acompanhamento Terapêutico
................................................................................................................................................. 27
Contribuições da Programação de Ensino para definir o Acompanhamento Terapêutico por
meio de classes de comportamentos ........................................................................................ 35
Considerações finais ................................................................................................................ 46
Referências .............................................................................................................................. 48
Estudo 2 – Caracterização das classes de comportamentos constituintes da atuação
do psicólogo como acompanhante terapêutico ........................................................... 58
Resumo .................................................................................................................................... 58
Abstract ................................................................................................................................... 59
Objetivos da pesquisa .............................................................................................................. 70
Objetivo Geral ..................................................................................................................... 70
Objetivos Específicos .......................................................................................................... 70
Método ................................................................................................................................ 70
Resultados ............................................................................................................................... 93
Discussão............................................................................................................................... 113
Considerações finais .............................................................................................................. 121
Referências ............................................................................................................................ 123
Apêndices .............................................................................................................................. 130
APÊNDICE A ................................................................................................................... 131
Identificações, derivações e alterações em nomeações de componentes de comportamentos
e de classes de comportamentos por meio de exame dos trechos selecionados ................ 131
APÊNDICE B ................................................................................................................... 681
Componentes de comportamentos e de classes de comportamentos que foram identificados
e derivados por meio dos trechos ...................................................................................... 681
APÊNDICE C ................................................................................................................. 1180
Proposições de novas versões, com correção e com terminologia consistente, para os
trechos examinados ......................................................................................................... 1180
APÊNDICE D ................................................................................................................. 1286
Lista de subclasses de comportamentos que foram identificas ou derivadas da fonte de
informação. ...................................................................................................................... 1286
APÊNDICE E .................................................................................................................. 1350
Tabelas das três classes gerais de comportamentos e as subclasses gerais que por elas são
abrangidas, bem como os números (para identificação) das subclasses de comportamentos
avaliadas ou derivadas abrangidas pelas subclasses gerais. ............................................ 1350
APÊNDICE F .................................................................................................................. 1355
Listas que demonstram as abrangências das subclasses identificadas ou derivadas (quanto
mais à direita, menos abrangente e complexa é a subclasse de comportamentos em questão)
......................................................................................................................................... 1355
APÊNDICE G ................................................................................................................. 1423
Dados do sorteio de classes de comportamentos para o juízo de dados e protocolos com
sugestões da juíza. ........................................................................................................... 1423
Apresentação
O Acompanhamento Terapêutico é uma atuação profissional que ocorre em variados
locais, como em escolas, hospitais e nas casas de clientes acompanhados. Trata-se de uma
intervenção indicada em casos de déficits importantes no repertório básico de
comportamentos em que o profissional auxilia seu cliente a realizar suas atividades cotidianas
(Zamignani, Kovac, & Vermes, 2007). Portanto, um dos principais objetivos do
Acompanhante Terapêutico é desenvolver intervenções para maximizar as condições de
autonomia de seus clientes em atividades diárias. Em função dessas características, é
apontado por pesquisadores como uma atuação que apresenta algumas particularidades que
exigem do profissional um repertório clínico sofisticado (Zamignani, Kovac, & Vermes,
2007).
A presente pesquisa parte da proposição de que há necessidade de realização de um
exame mais acurado acerca das variáveis e componentes comportamentais que constituem o
Acompanhamento Terapêutico. Para justificar essa proposição a pesquisa está organizada em
dois estudos. No Estudo 1, intitulado "Acompanhamento Terapêutico e Análise do
Comportamento: Avanços e problemáticas nas definições desta atuação", essa proposição é
explicada e explorada ao longo do texto. Que objetivou caracterizar de forma crítica
diferentes contribuições da Psicologia e da Análise do Comportamento para a definição do
Acompanhamento Terapêutico, por meio de um exame crítico de literatura da área. Já o
Estudo 2, que é denominado "Caracterização das classes de comportamentos constituintes da
atuação do psicólogo como acompanhante terapêutico", visa produzir contribuições para sanar
parte das críticas e problemáticas apontadas no Estudo 1.
O Estudo 2 objetivou caracterizar as classes de comportamentos constituintes do
Acompanhamento terapêutico como um subcampo de atuação profissional do psicólogo a
partir de um exame da literatura analítico-comportamental. Para isso serão realizadas a
identificação e sistematização de classes de comportamentos constituintes dessa atuação, por
meio do uso do referencial teórico de uma subárea da Análise do Comportamento comumente
conhecida como Programação de Ensino. É importante destacar que para analistas do
comportamento os objetivos de uma atuação profissional são sempre relações entre classes de
estímulos antecedentes, classes de respostas e classes de estímulos consequentes (Botomé,
2001; 2013). Ou seja, são sempre classes de comportamentos. Portanto, a nomeação de um
comportamento ou até mesmo a definição de uma atuação profissional, como o
Acompanhamento Terapêutico, somente é possível após análise dos seus componentes (que
são classes de estímulos antecedentes, classes de respostas e classes de estímulos
consequentes ou classes de comportamentos). Nesse sentido, defende-se que para uma clara
delimitação e sistematização do Acompanhamento Terapêutico, se faz necessário identificar,
caracterizar e avaliar quais são as classes de comportamentos constituintes dessa atuação
profissional.
Estudo 1 – Acompanhamento Terapêutico e Análise do Comportamento: Avanços e
problemáticas nas definições desta atuação1
Resumo
Embora o Acompanhamento Terapêutico tenha sua importância reconhecida na Psicologia e
na Análise do Comportamento, não há consenso quanto às classes de comportamentos
constituintes dessa atuação e que têm sido utilizadas para defini-lo. Esta reflexão teórica
objetivou caracterizar de forma crítica contribuições da Psicologia e da Análise do
Comportamento para a definição do Acompanhamento Terapêutico, além de propor que a
Análise do Comportamento e a Programação de Ensino possuem recursos teórico-conceituais
e tecnológicos para contribuir com essa definição. A partir da análise da literatura, verificou-
se que o Acompanhamento Terapêutico tem sido definido por meio do uso de metáforas e
como um serviço necessariamente subordinado ao trabalho do psicólogo clínico, apesar de
contribuições da Modificação de Comportamento, da Terapia Comportamental e da Análise
Aplicada do Comportamento. Defende-se que a Análise do Comportamento e a Programação
de Ensino possuem recursos para contribuir com uma definição mais precisa do
Acompanhamento Terapêutico na Psicologia, por meio da caracterização e sistematização das
classes de comportamentos definidoras dessa atuação a partir de seus diferentes graus de
abrangência.
Palavras-chave: Intervenção Terapêutica, formação do Psicólogo, Programação de Ensino,
Classes de comportamentos.
1 Uma outra versão deste texto encontra-se publicado na revista Perspectivas em Análise do Comportamento,
2017, vol. 08, n. 01, pp. 061-078. Histórico do artigo: Submetido em: 13/09/2016 Primeira decisão editorial: 28/11/2016 Aceito em: 13/03/2017 Editor: Nicodemos B. Borges
Abstract
Despite that Therapeutic Accompaniment has been recognized as an important intervention in
Psychology and Behavior Analysis, there is no consensus regarding what behavior classes are
constituent and could define this intervention. This theoretical-conceptual study aims to
critically characterize contributions of Psychology and Behavior Analysis to define this
intervention, besides proposing that Behavior Analysis and Teaching Programming have
theoretical-conceptual and technological resources to contribute to this definition. Based on
the literature review, it was found that Therapeutic Accompaniment has been defined using
metaphors and as a subordinate service of a clinical psychologist despite the contributions of
Behavior Modification, Behavioral Therapy and Applied Behavior Analysis. It is argued that
Behavior Analysis and Teaching Programming provide resources that contribute to a more
precise definition of Therapeutic Accompaniment Intervention in Psychology. This might be
done by characterizing and systematizing the behavior classes that constitute this intervention
through different degrees of complexity.
Key words: Therapeutic Intervention, Psychologist training, Teaching Programming,
Behavior classes.
17
Uma das explicações para muitas falhas relativas a definir conceitos e resolver
problemas na Psicologia parece estar relacionada ao uso que cientistas e psicólogos fazem de
metáforas e construtos (Skinner, 1977). Os psicólogos estudam relações entre organismo e
ambiente, porém utilizam explicações mentalistas e internalistas para se referir a essas
relações e seus constituintes (Skinner, 1977). Tais explicações, por sua vez, são utilizadas
como objetivo de estudos psicológicos e têm afastado psicólogos da possibilidade de analisar
e produzir resultados a partir de dados sobre as relações entre organismo e ambiente. A
problemática aqui está no fato de que, segundo Skinner, não há nenhuma evidência de um
mundo mental se relacionando com as variáveis das quais os comportamentos são função,
diferentemente das perspectivas cognitivistas ou psicodinâmicas (como a Psicanálise) que
aceitam e estudam esta possibilidade.
Um dos tipos de intervenção realizados por psicólogos que têm atendido pessoas com
transtornos psiquiátricos, deficiência física, dependentes químicos, crianças e adolescentes
com dificuldades no processo de escolarização e idosos no enfrentamento de situações
decorrentes do envelhecimento, é denominado Acompanhamento Terapêutico. Do ponto de
vista da Psicologia, de modo geral, as definições utilizadas para denominar essa atuação
podem ser consideradas exemplos da problemática apontada por Skinner (1977). Nessas
definições são utilizados recursos conceituais explicativos internalistas, com uso frequente de
metáforas, na maioria das vezes, vinculados a propostas psicanalíticas. Segundo Nogueira
(2009), por exemplo, o Acompanhamento Terapêutico deve ser definido como uma atuação
que possibilita ao cliente a construção de novas referências para além da equipe
multidisciplinar, por meio de um setting não determinado (diversos ambientes e contextos),
com o envolvimento de diferentes indivíduos, não necessariamente pertencentes a uma equipe
18
multidisciplinar (o que é denominado “Rede Terapêutica”). Além dessas características,
segundo o autor, é uma atuação ligada à “identificação” e “manejo de laços com o ‘Outro’“
(conceito utilizado por Lacan para se referir aos efeitos da incidência da linguagem sobre
indivíduos) (Nogueira, 2009). Nesse exemplo, “construção de novas referências” pode ser
considerada uma metáfora para designar classes de comportamentos, assim como
“envolvimento” se refere a interações comportamentais entre indivíduos e ambientes.
Os dados de uma ciência deveriam guiar os cientistas para a formulação de definições
operacionais de termos, por meio de observações, de procedimentos de manipulação e de
“passos lógicos” (que se interpõem entre as observações e os procedimentos de manipulação)
(Skinner, 1961). Isso significa que há necessidade científica (na sociedade e na comunidade
científica) em desenvolver definições operacionais dos termos, em detrimento do uso da
linguagem vernacular (semelhante à utilizada no «senso comum») (Skinner, 1961). No
entanto, apesar dos recursos conceituais e tecnológicos produzidos na Análise do
Comportamento e, apesar do Acompanhamento Terapêutico ser uma prática comum entre
analistas do comportamento, essa atuação também parece ainda não estar claramente definido
na própria Análise do Comportamento. Como exemplo, o Acompanhamento Terapêutico tem
sido definido por analistas do comportamento como uma atuação auxiliar e subordinada a um
psicólogo clínico e/ou de uma equipe, com execução de procedimentos indicados por esses
profissionais, sendo também um «importante elo» entre a família, o cliente e demais pessoas
envolvidas (Zamignani, Kovac, & Vermes, 2007). Essa definição tem como requisito a
aceitação de que a “subordinação” do acompanhante terapêutico em uma equipe deve ser uma
de suas características definidoras. Esse requisito é um exemplo de uma característica
(“subordinação” do acompanhante terapêutico) que não define explicitamente o núcleo da
atuação do psicólogo como acompanhante terapêutico, uma vez que indica apenas o tipo de
19
relação a ser estabelecida entre o acompanhante terapêutico e o psicólogo, sem fazer
referência aos comportamentos constituintes dessa atuação.
A segunda característica ainda presente na definição de Acompanhamento Terapêutico
a partir da perspectiva analítico-comportamental e que a afasta do pensamento de Skinner
(1977) está na manutenção do uso de metáforas. Expressões tais como importante “elo”
(Zamignani, Kovac, & Vermes, 2007) ou “ferramenta” para “prevenir” que os pacientes se
tornem “pacientes críticos” (Cruz, Lima & Moraes, 2003) têm sido utilizadas para fazer
referência a relações entre organismo e ambiente e seus constituintes. Além dos problemas
com uso de metáforas, outras definições apresentadas por analistas do comportamento fazem
referência ao Acompanhamento Terapêutico como uma forma de intervenção e/ou
complemento de um tratamento multidisciplinar (Vianna & Sampaio, 2003) ou ainda como
uma técnica de intervenção (Balvedi, 2003). Esses exemplos ilustram a falta de delimitação,
sistematização e consenso em propostas para a definição do Acompanhamento Terapêutico do
ponto de vista analítico-comportamental. Sugerem também a falta de estudos na Análise do
Comportamento que objetivem a identificação e análise dos comportamentos constituintes
dessa atuação, o que possibilitaria a proposição de uma definição mais consistente com a
perspectiva analítico-comportamental.
O Acompanhamento Terapêutico ocorre por meio de intervenções em ambiente
natural do cliente e apresenta algumas particularidades que exigem um repertório clínico
bastante sofisticado e um exame acurado das variáveis que o envolvem (Zamignani, Kovac, &
Vermes, 2007). Essa atuação profissional tem acontecido desde a década de 1980 no Brasil e
tem trazido benefícios a clientes que não desenvolveram ou que apresentam dificuldades ao
emitir comportamentos necessários para desempenharem tarefas da vida cotidiana, e que em
geral, para um bom prognóstico, necessitam de vários atendimentos semanais realizados por
20
diferentes especialistas (e.g. psiquiatra, psicólogo e/ou fonoaudiólogo) paralelamente com o
serviço de Acompanhamento Terapêutico (Zamignani, 1997; Zamignani & Wielenska, 1999).
Portanto, o Acompanhamento Terapêutico tem sido utilizado para atender diversos casos e em
variadas situações, como exemplo, em dificuldades no desempenho escolar, em casos que
envolvem drogadição e em situações psiquiátricas graves.
As variáveis que envolvem o repertório clínico necessário para intervenções por meio
do Acompanhamento Terapêutico podem ser examinadas de diferentes formas, contando com
variados procedimentos e a partir de diferentes teorias e conceitos. Como exemplo, pode-se
caracterizá-las por meio da história do Acompanhamento Terapêutico, da descrição dos
comportamentos relacionados a essa atuação profissional, ou ainda de acordo com o “perfil
profissional” dos acompanhantes terapêuticos de uma determinada localidade, como o Brasil.
Na Psicologia, apesar das diferentes contribuições teóricas, conceituais e práticas para a
definição do Acompanhamento Terapêutico, ainda parece haver a necessidade de um exame
mais acurado das variáveis que compõem ou que participam de eventos comportamentais
envolvidos nessa atuação. No presente artigo objetivou-se caracterizar de forma crítica as
diferentes contribuições da Psicologia e da Análise do Comportamento para a definição de
Acompanhamento Terapêutico, problematizando as características que têm sido utilizadas por
pesquisadores como definidoras desta atuação no Brasil. Além disso, defende-se que a
Análise do Comportamento e a Programação de Ensino possuem recursos para contribuir com
uma definição mais precisa do Acompanhamento Terapêutico na Psicologia, por meio de
tecnologias de identificação e derivação de comportamentos.
Surgimento do Acompanhamento Terapêutico e seus precursores no Brasil
A prática que vem sendo denominada por Acompanhamento Terapêutico no Brasil
teve suas origens no século XX e em derivações de propostas psicanalíticas. Seus
21
pressupostos surgiram a partir da criação e atribuição de novas funções para agentes de saúde
mental, originadas em movimentos político-ideológicos, como o movimento antipsiquiatria,
liderado por Laing e Cooper na Inglaterra, na década de 1960; a psiquiatria democrática,
representada por Basaglia na Itália, nas décadas de 1970 e 1980; e a psicoterapia institucional,
caracterizada por Oury e Guattari na França, na década de 1950 (Nogueira, 2009). Esses
movimentos contestaram o tratamento psiquiátrico realizado no modelo hospitalocêntrico e
possibilitaram o surgimento de novas modalidades de tratamento como as comunidades
terapêuticas, o hospital-dia e, posteriormente, o Acompanhamento Terapêutico (Nogueira,
2009; Simões & Kirschbaum, 2005).
Os serviços originados a partir de contestações ao modelo hospitalocêntrico
possibilitaram o surgimento, nos Estados Unidos e na Europa, na década de 1950, e na
América Latina, na década de 1960, do Acompanhamento Terapêutico (Alvarenga, 2006;
Neto, Pinto, & Oliveira, 2011). O cerne das primeiras funções dessa atuação profissional
originou-se na Terapia Familiar e na Psicoterapia Institucional. Na terapia familiar, as
atribuições do acompanhante terapêutico estavam relacionadas à “diluição da gravidade da
doença” entre membros da família e à proposição de alteração de comportamentos do
paciente (Ayub, 1996). Já a Psicoterapia Institucional influenciou na formulação da função de
“olhar em rede”, um procedimento técnico utilizado por alguns acompanhantes terapêuticos
para a formulação de projetos terapêuticos realizados em articulações entre uma equipe
(Hermann, 2008).
No Brasil, as funções precursoras do Acompanhamento Terapêutico receberam
variadas denominações ao longo da história como: atendente psiquiátrico, auxiliar
psiquiátrico e amigo qualificado. A primeira denominação, atendente psiquiátrico, surgiu na
Clínica Pinel, em Porto Alegre, nas décadas de 1960 e 1970, sob a filosofia de um Hospital
22
Dinâmico onde trabalhos ocorriam por meio de socioterapias, grupos operativos,
ambientoterapias, reuniões comunitárias e outras atividades desenvolvidas por equipes de
trabalhos, constituídas por psicólogos e assistentes sociais (Silva & Silva, 2006). Nesse
contexto do Hospital Dinâmico, surgiu o atendente psiquiátrico, um cargo que não exigia
formação acadêmica para ser exercido e cuja função era acompanhar os pacientes internos em
suas rotinas (Nogueira, 2009).
Na comunidade terapêutica Clínica Villa Pinheiros, fundada no Rio de Janeiro em
1969 por um grupo de psicanalistas a partir do modelo estrutural da Clínica Pinel, surgiu a
função do auxiliar psiquiátrico (Nogueira, 2009). Embora esta função não exigisse formação
superior, a atuação profissional, em geral, era exercida por estudantes de Psicologia ou
Medicina (Nogueira, 2009). A rotina dos auxiliares psiquiátricos envolvia participar do
cotidiano dos pacientes, coordenando junto aos outros profissionais as atividades diárias
desses pacientes e participar de reuniões em que se discutiam, sob referencial da teoria
psicanalítica, os casos atendidos dentro e fora da instituição (Nogueira, 2009).
No final da década de 1970, devido ao incentivo a políticas de internação asilar
adotadas durante a ditadura militar em detrimento de outros tipos de tratamentos, as
comunidades terapêuticas existentes entraram em decadência e fecharam (Londero &
Pacheco, 2006; Nogueira, 2009). Após o fechamento das comunidades terapêuticas no Brasil,
o serviço dos auxiliares psiquiátricos continuou a ser requisitado por terapeutas e familiares
de pacientes, demonstrando assim a importância social do serviço, principalmente para
aqueles que identificavam naquele trabalho uma alternativa à internação (Londero & Pacheco,
2006; Marco & Calais, 2012). Com a demanda social existente na prestação de serviços
relativos à função de auxiliar psiquiátrico, houve o surgimento, no Brasil, de um serviço
particular realizado na residência dos pacientes, baseado em pressupostos psicanalíticos e que
23
envolvia principalmente pacientes psicóticos (Londero & Pacheco, 2006; Zamignani &
Wielenska, 1999). Realizada em domicílio no final da década de 1970, a função de auxiliar
psiquiátrico transformou-se em um componente importante no processo de manutenção de
vínculos sociais, na participação ativa na qualidade de vida e no tratamento de indivíduos
(Pitiá & Santos, 2006).
A denominação Amigo Qualificado surgiu em 1981 no Instituto A Casa, em São
Paulo, e é subsequente à denominação auxiliar psiquiátrico (Simões & Kirschbaum, 2005). A
função do amigo qualificado era estar junto do paciente em momentos em que este não estava
em atividades do hospital-dia, principalmente nos finais de semana; e sua denominação foi
substituída na mesma década de seu surgimento pela denominação Acompanhante
Terapêutico (Nogueira, 2009; Simões & Kirschbaum, 2005). A substituição da denominação
Amigo Qualificado ocorreu, segundo os psicanalistas, pela necessidade de desfazer a
referência a um vínculo equivocado de simetria entre pacientes e profissionais (Nogueira,
2009). A denominação Acompanhante Terapêutico foi escolhida por ser derivada de termos
constituintes da Terapia Familiar e de pressupostos psicanalíticos: “Terapêutico” é um termo
que salienta a importância dada à terapia familiar para a evolução do tratamento dos
pacientes; e “Acompanhante” é um termo que retrata uma ação, a de acompanhar, e portanto,
segundo os psicanalistas, um bom substituto para o termo que antes descrevia um vínculo
equivocado (amigo) (Nogueira, 2009).
A produção científica em Acompanhamento Terapêutico na Psicologia
Desde a década de 1980 o Acompanhamento Terapêutico é tema de uma variada
produção científica sob diferentes proposições teórico-conceituais (Hermann, 2008; Muylaert,
2006; Pitiá, 2002; Santos, 2013; Zamignani, Kovac, & Vermes, 2007) e de aplicação na
24
Psicologia no Brasil (Alvarenga, 2006; Marco & Calais, 2012; Nogueira, 2009; Sereno, 2006;
Silva & Silva, 2006). Um dos fatores para isto está na problemática de que o
Acompanhamento Terapêutico é uma atuação que não possui teoria, procedimentos e normas
éticas sistematizados, embora estas sejam características necessárias para que essa atuação
ocorra.
Dada a variedade de produção científica sobre o Acompanhamento Terapêutico na
Psicologia e a falta de clareza quanto aos comportamentos constituintes e delimitadores dessa
atuação, há dificuldade na elaboração de uma definição consensual para a atuação do
psicólogo como acompanhante terapêutico. Isso parece ter sinalizado para a necessidade de
realização de estudos com o objetivo de caracterizá-lo: (a) historicamente, afirmando que o
Acompanhamento Terapêutico surgiu de derivações de propostas psicanalíticas e movimentos
político-ideológicos, com funções em oposição à internação e que atuou e atua em uma
espécie de setting “ambulante” (Alvarenga, 2006; Araújo, 2005; Neto, Pinto, & Oliveira,
2011; Pitiá & Santos, 2006); (b) como atuação profissional, em casos que envolvem diversas
temáticas, como a inclusão, a drogadição, o alcoolismo, a depressão pós-parto, pacientes com
diagnóstico psiquiátrico e pacientes com transtornos orgânicos (Fujihira, 2006; Fraguas &
Berlinck, 2001; Londero & Pachecho, 2006; Marinho, 2009; Neto & Amarante, 2013;
Palombini, 2006; Sereno, 2006; Silva & Silva, 2006); e (c) a partir de seu “perfil profissional”
no Brasil, que em geral é uma atuação exercida por estudantes, por meio de estágios, onde o
acompanhante terapêutico é percebido como coadjuvante no tratamento, mas com papel ativo,
de grande importância e que atua "diretamente" no ambiente em que o paciente está inserido
(Figueiredo, 2009; Kischbaum & Rosa, 2003; Marco & Calais, 2012; Nogueira, 2009).
Nos anos 2000, o Acompanhamento Terapêutico tem sido descrito na literatura como
uma atuação alternativa à internação, que abarca funções terapêuticas (Alvarenga, 2006;
25
Chaui-Berlinck, 2010; Neto & Amarante, 2013; Neto, Pinto, & Oliveira, 2011; Silva & Silva,
2006; Zamignani, Kovac, & Vermes, 2007); e funções sociais, como a inclusão (Fraguas &
Berlinck, 2001; Fujihira, 2006; Sereno, 2006) e a garantia de direitos (Chauí-Berlinck, 2010;
Muylaert, 2006; Neto & Amarante, 2013; Neto, Pinto, & Oliveira, 2011; Palombini, 2006;
Silva & Silva 2006). Na década de 2010, o primeiro estudo que objetivou realizar uma revisão
sistemática sobre a produção científica a respeito do Acompanhamento Terapêutico, na pós-
graduação brasileira, foi publicado por Santos et al. (2015). Nesse trabalho, o grupo de
autores examinou 43 teses e dissertações concluídas entre os anos de 2000 e 2011 disponíveis
no Banco de Teses e Dissertações da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível
Superior (CAPES). Os resultados obtidos indicaram que: 62,8% das referências analisadas foi
produzida entre 2007 e 2011; 41,9% delas classificadas pela CAPES como pertencentes no
banco de dados à categoria de «Psicologia» e 25,6% à categoria de «Tratamento e prevenção
psicológica»; a abordagem teórica mais utilizada (48,8%) foi a Psicanálise; e 79,1% dos
estudos tratavam de relatos de experiência. Embora essa revisão sistemática realizada por
Santos et al. tenha sido significativa em indicar de forma quantitativa as produções sobre
Acompanhamento Terapêutico na pós-graduação brasileira, o estudo não indicou
especificamente o que tem sido produzido por esses estudos, o que envolveria uma análise
qualitativa e que poderia indicar demandas específicas de estudos e pesquisas nessa área.
Outro estudo bibliográfico realizado nos anos 2000 foi o de Simões e Kirschbaum
(2005), que analisou a produção científica sobre o Acompanhamento Terapêutico no Brasil de
1960 a 2003. Os autores destacaram que nesses estudos, em geral, há uma «preocupação com
o estabelecimento de funções e objetivos que determinavam a especificidade do trabalho de
Acompanhamento Terapêutico (...)» (p. 395), destacando como características principais do
Acompanhamento Terapêutico: o setting ampliado, o diálogo com a família e o trabalho em
26
equipe. Nesse estudo, diferentemente do realizado por Santos et al. (2015), os autores optaram
por um procedimento qualitativo, que obteve resultados que parecem corroborar os estudos de
Kirschbaum e Rosa (2003) e Londero e Pacheco (2006), demonstrando a demanda de
caracterização dos comportamentos constituintes do Acompanhamento Terapêutico.
O Acompanhamento Terapêutico tem sido descrito na literatura como uma atuação:
que não possui teoria, procedimentos e normas éticas próprios (embora essas sejam
características necessárias para sua execução); e não privativo de alguma área do
conhecimento e profissão. Ambas características contribuem para o aumento de dificuldades
na prestação de serviços e na elaboração de uma definição para a atuação de profissionais.
Essas dificuldades, por sua vez, parecem ter indicado a necessidade de elaboração de estudos
que caracterizassem o Acompanhamento Terapêutico. Essas caracterizações foram realizadas
de diferentes maneiras (e.g. historicamente; indicando características desta atuação; ou
traçando um “perfil profissional” dos acompanhantes terapêuticos) e foram importantes por
caracterizar essa atuação em três funções principais: (a) sua função terapêutica; (b) sua função
social; e (c) sua participação na garantia de direitos (do cliente).
Uma problemática existente e possivelmente oriunda da variedade teórica, conceitual e
de aplicações do Acompanhamento Terapêutico está no fato de que os estudos realizados
sobre essa temática, em geral, têm indicado que as características principais do
Acompanhamento Terapêutico são: o setting ampliado, o diálogo com a família e o trabalho
em equipe. Essas três características parecem se referir às funções do Acompanhante
Terapêutico (terapêuticas, sociais e de garantia de direitos) e a situações e contextos nos quais
o Acompanhante Terapêutico deve atuar (como no setting ampliado, no diálogo com a família
e no trabalho em equipe), mas não explicitam claramente o que esse profissional tem que ser
capaz de fazer (seus comportamentos) e que caracterizaria essas funções nesses contextos.
27
Contribuições históricas da Análise do Comportamento para o Acompanhamento
Terapêutico
A Análise do Comportamento pode contribuir para o desenvolvimento do
Acompanhamento Terapêutico por meio de exames de variáveis que compõem ou que
participam de eventos comportamentais e que estão envolvidas nessa atuação. Outras
contribuições podem ser obtidas por meio de referenciais históricos da Análise do
Comprotamento, como a aplicação de procedimentos de avaliação e análise de
comportamentos realizadas por meio da Modificação do Comportamento, da Análise do
Comportamento Aplicada e da Terapia Comportamental. Essas contribuições podem ser
exemplificadas a partir do uso de procedimentos de avaliação e de observação de
comportamentos "diretamente" no ambiente em que ocorrem e de procedimentos de avaliação
e demonstração de relações de determinação entre variáveis comportamentais. O destaque
para a necessidade de que o comportamento-alvo de intervenção tenha relevância social e que
as intervenções à que será submetido sejam oriundas de pesquisas básicas, assim como a
possibilidade de pesquisas aplicadas, que ocorrem em contexto natural também parecem
exemplos de contribuições a serem consideradas.
O Acompanhamento Terapêutico exige procedimentos de observação e de avaliação
de comportamentos realizados diretamente no ambiente em que ocorrem (Zamignani, Kovac,
& Vermes, 2007). Essas atuações profissionais se assemelham com os realizados por
modificadores do comportamento. A Modificação do Comportamento era composta por
procedimentos de observação, avaliação e demonstração de relação de determinação entre
variáveis comportamentais. Esses procedimentos ocorriam em conjunto com a transposição
ou adaptação de conhecimentos produzidos em pesquisa básica para uso em contextos e
28
ambientes não controlados (Barcellos & Haydu, 1998; Londero & Pacheco, 2006; Marco &
Calais, 2012).
A Modificação do Comportamento surgiu diante de um contexto científico em que os
estudos eram realizados baseados principalmente no paradigma respondente. Isso perdurou
das décadas de 1920 a 1940 (Barcellos & Haydu, 1998) e teve seu início atribuído ao
experimento de Watson e Rayner (1920), os quais demonstraram o condicionamento do
“medo”, no experimento com o menino Albert. Um dos fatores contextuais para o surgimento
da Modificação de Comportamento foram as constantes críticas da Psicologia e da Psiquiatria
ao tratamento tradicional em relação ao comportamento tido como “anormal”, a partir de
abordagens psicodinâmicas como a Psicanálise (Caballo, 1996). Diante disso e do crescente
desenvolvimento e influência das ciências biológicas e físicas à Psicologia, teorias da
aprendizagem e seus princípios, como os investigados por Pavlov, Thorndike, Watson, Hull,
Guthrie e Skinner, ganharam um notável destaque em intervenções. Em grande parte, por seu
comprometimento científico evidenciado em suas características: a transposição do modelo de
laboratório para a situação clínica, o rigor da produção de conhecimentos para atender a
comunidade científica e a prestação de serviços com vistas à promoção de melhoras sociais
significativas (Baer, Wolf, & Risley, 1968).
Ao longo das décadas, pesquisas em diferentes temáticas foram realizadas pela
comunidade científica da Análise do Comportamento: como na década de 1930, envolvendo
princípios preditivos e proposições teórico-conceituais e na década de 1940, envolvendo o
paradigma operante e estudos realizados em infra-humanos, o que pareceu ter conduzido o
enfoque principal dos estudos da década posterior, muito marcada pelas contribuições para o
desenvolvimento da Terapia Comportamental (Barcellos & Haydu, 1998). O surgimento da
Terapia Comportamental, segundo Guedes (1993), é proveniente de críticas direcionadas a
29
modificadores do comportamento, em específico aos procedimentos que adotavam
(observação, avaliação e demonstração de relações de determinação entre variáveis
comportamentais) e à transposição ou adaptação de conhecimentos produzidos em pesquisa
básica para uso em contextos e ambientes não controlados. Segundo as críticas, os
procedimentos e a transposição de conhecimentos da pesquisa básica demonstravam que os
modificadores do comportamento eram superficiais em suas atuações profissionais e
violadores da liberdade pessoal de indivíduos (Guedes, 1993). Considerando as críticas
direcionadas aos modificadores do comportamento, parte deles, segundo Guedes (1993),
abandonou “(...) a solução de problemas concretos, a rapidez da terapia, os registros, a
confiabilidade na relação procedimentos/resultados e a esperança de que a oferta do serviço
psicológico, um dia, viesse a ser avaliável pela sociedade” (p. 62). Além disso, deu-se início a
novas práticas, como a utilização da análise funcional como ferramenta de análise, a
utilização de contingências artificiais, o enfoque no autoconhecimento e a adoção de um
setting terapêutico, segundo a autora, não próprio da Análise do Comportamento e que pode
ser incoerente com seus princípios.
Outra área que possui características constituintes semelhantes às que compõem o
Acompanhamento Terapêutico é a Análise do Comportamento Aplicada, que destacou a
necessidade do uso do modelo científico na prestação de serviços, buscando uma integração
entre o rigor científico e a intervenção em problemas de relevância social. Conforme Baer,
Wolf e Risley (1968), a Análise do Comportamento Aplicada caracteriza-se como uma
intervenção em que o comportamento alvo tem sua importância representada por meio de sua
relevância social, para o indivíduo ou para a sociedade. Além disso, segundo os autores, trata-
se de uma intervenção em que tanto as variáveis envolvidas com o comportamento alvo,
quanto a intervenção sobre ele, são claramente controladas, de modo que se possa demonstrar
30
a efetividade dos procedimentos em produzir mudanças sociais significativas. Em seus
primórdios, a Análise do Comportamento Aplicada partiu da premissa de que o
comportamento deveria ser mensurável e observável, o que, como afirma Moskorz, Kubo, De
Luca e Botomé (2012), naquela época se referia à resposta do organismo, afastando-se da
noção atual de definição do comportamento como “(...) um complexo sistema de
contingências (de eventos circunstanciais não necessários, fixos ou com papéis ou funções
obrigatórios) que vão configurando, progressivamente, as características das ações ou
atividades com as quais cada organismo interage com o “mundo” (determinados aspectos
dele) com o qual se defronta” (Botomé, 2001, p.14).
Portanto, no final da década de 1960 e no início da década de 1970, as intervenções
contavam com procedimentos que permitiam que variáveis do ambiente fossem manipuladas
para promover a alteração de respostas específicas (em geral, alterando sua taxa de ocorrência
absoluta e/ou relativa), utilizando-se delineamentos de linha de base múltipla ou
procedimentos de reversão (Guedes, 1993; Moskorz, Kubo, De Luca, & Botomé, 2012). A
Análise do Comportamento Aplicada, a Modificação do Comportamento e a Terapia
Comportamental parecem ter sido áreas em que a produção científica forneceu importantes
contribuições para o Acompanhamento Terapêutico, tais como os procedimentos de
observação e intervenção.
As definições de analistas do comportamento para o Acompanhamento Terapêutico
abarcam características que foram inicialmente utilizadas na então denominada Modificação
do Comportamento e na Análise do Comportamento Aplicada, como a utilização de
procedimentos de observação, avaliação e demonstração de relações de determinação entre
variáveis comportamentais, a necessidade de que o comportamento-alvo de intervenção tenha
relevância social e conte com intervenções oriundas de pesquisas básicas e que, na prática,
31
ocorrem em contexto natural. Quando o contexto clínico não é suficiente para a resolução de
uma problemática, o clínico busca no acompanhante terapêutico um auxiliar para a realização
do serviço. Portanto, pode-se hipotetizar que a definição do Acompanhamento Terapêutico na
Análise do Comportamento está relacionada a três fatores históricos principais: (a) o
surgimento de procedimentos de intervenção em contexto natural, por meio da Modificação
do Comportamento; (b) a delimitação da Análise do Comportamento, por meio da Análise do
Comportamento Aplicada e (c) o surgimento da Terapia Comportamental, em intervenções
realizadas em setting clínico tradicional, em gabinete.
As contribuições da Análise do Comportamento para o Acompanhamento Terapêutico
no Brasil parecem ter surgido em um momento em que houve um aumento no número de
profissionais que atuavam em setting clínico em detrimento do número de profissionais que
realizavam atendimentos em ambientes e contextos naturais de seus clientes. Por outro lado,
as demandas de atendimentos extra-consultório, em casos de desenvolvimento atípico, por
exemplo, parecem ter enfatizado a necessidade de "retorno" desses profissionais a
intervenções em ambiente natural. Isso porque os profissionais que atuavam exclusivamente
na clínica identificaram que, para obter maior eficácia em tratamentos, certos procedimentos
teriam que ser aplicados em outros ambientes, como a casa do cliente, e/ou a escola
(Zamignani, Kovac, & Vermes, 2007). Em consonância com isso, pesquisas aplicadas vinham
sendo realizadas objetivando desenvolver tecnologia para trabalho em ambiente natural
(partindo da premissa de que produziriam maior chance de generalização de resultados
obtidos durante a intervenção) (e.g. Asmus et al., 1999; Handleman, 1979; Neef, Iwata, &
Page, 1978). Essas pesquisas contribuíram para o desenvolvimento do Acompanhamento
Terapêutico (Cassas, 2013), que parece suprir algumas limitações de profissionais clínicos em
atender demandas extra-consultório, como exemplos: a disponibilidade de horário necessária
32
para os atendimentos, os deslocamentos necessários (para ir até o local), a obtenção de dados
diretamente observados para realização de análises funcionais e a comunicação mais
frequente com agências de controle, como a escola e a família.
Para os analistas do comportamento há uma diferenciação entre o terapeuta analista do
comportamento e o acompanhante terapêutico, pois os acompanhantes terapêuticos cumprem
a função de auxiliar ou complementar o trabalho de outro terapeuta ou de uma equipe
multiprofissional. Como exemplo, está a afirmação de que "o acompanhamento terapêutico é
melhor definido, como uma forma de intervenção e/ou complemento de um tratamento
multidisciplinar, no qual o AT vai até o ambiente natural do indivíduo, intervir junto ao
paciente diretamente no comportamento problema" (Vianna & Sampaio, 2003, p. 285); ou
ainda a afirmativa de que
O que define o AT [(Acompanhamento Terapêutico)] não é o local de trabalho e sim a
função profissional, dentro de uma equipe de trabalho, de quem exerce a atividade. Apesar de
praticamente não haver AT que não trabalhe no ambiente, também não há AT que não esteja
subordinado a um terapeuta comportamental ou a uma equipe de profissionais responsável
pelo caso (Zamignani, Kovac, & Vermes, 2007, p. 38, colchetes adicionados).
As contingências que determinam essa distinção parecem ligadas a aspectos da
formação profissional pois, em geral, essa atuação é exercida por estudantes ou terapeutas
recém-formados e a questões sociais e econômicas que guiam o Acompanhamento
Terapêutico para “uma espécie de estágio remunerado no qual ele acompanha de perto o
trabalho de um terapeuta experiente que o supervisiona” (Zamignani, Kovac, & Vermes,
2007, p. 34). Essa distinção é importante por indicar que o Acompanhamento Terapêutico, na
perspectiva de analistas do comportamento, parece uma atuação diretamente ligada à
formação do psicólogo. Isso, por sua vez, implica em considerar que é preciso criar
33
condições, durante a formação profissional, para que os comportamentos constituintes dessa
atuação sejam desenvolvidos. Portanto, identificar essas classes de comportamentos se faz
importante por possibilitar a caracterização, delimitação e sistematização dessa atuação
profissional, como condição para que o desenvolvimento desses comportamentos ocorra.
As contribuições da Modificação do Comportamento e da Análise do Comportamento
Aplicada, em grande parte, influenciam as intervenções realizadas diretamente nas
contingências-problema e em diversos contextos diferentes. Portanto, parecem contribuir
principalmente para o trabalho do analista do comportamento que atua diretamente nas
contingências-problema, por meio de técnicas, procedimentos e utilizando-se de instrumentos
para avaliação e verificação de variáveis e comportamentos.
A atuação clínica por vezes impossibilita a saída do terapeuta de sua clínica (por falta
de disponibilidade de tempo ou dificuldades de locomoção, por exemplo). Na clínica podem
surgir demandas em que há exigência de que o trabalho ocorra em diversos contextos e com
um número maior de sessões, e quando isso ocorre, geralmente os terapeutas recorrem ao
Acompanhamento Terapêutico (Zamignani, Kovac, & Vermes, 2007). O acompanhante
terapêutico é uma atuação relacionada ao manejo de contingências de reforçamento em
ambiente natural (Savoia & Sampaio, 2010). Mesmo que o acompanhante terapêutico seja um
psicólogo experiente, como os participantes da pesquisa de Marco (2011), com oito e
dezessete anos de experiência em Acompanhamento Terapêutico, ainda é considerado, por
definição, como um subordinado ao terapeuta. Isso ocorre por essa atuação ter implícita em
sua definição a exclusividade de situações em que é a alternativa financeiramente viável de
tratamento, quando é uma atuação exercida por estudantes e psicólogos recém-formados
(Zamignani, Kovac, & Vermes, 2007). "Suborbinado" é um termo que não nomeia de forma
clara e precisa a atuação do acompanhante terapêutico, pois pode sinalizar uma relação
34
profissional equivocada, em que o acompanhante terapêutico seria um profissional que não
possui condições (e repertório profissional) para definir e decidir quais comportamentos
devem ser alvo de intervenções e/ou quais comportamentos devem ser desenvolvidos pelo
cliente. Portanto, "subordinado" é um termo que pode sinalizar uma suposta falta de
autonomia do acompanhante terapêutico em relação aos demais profissionais que constituem
uma equipe de profissionais com o objetivo de produzir maior eficácia e eficiência ao
executar suas intervenções.
Outra problemática existente na Análise do Comportamento para a definição do
Acompanhamento Terapêutico está no fato de essa intervenção ainda ser definida apenas
parcialmente, sem uma avaliação mais ampla das variáveis que definem essa atuação.
Variáveis tais como o controle que o profissional possui sobre o comportamento do cliente
em ambiente natural (Cassas, 2013), a posição que o Acompanhamento Terapêutico ocupa em
uma equipe (como subordinado) ou a sua função na interação com a família, o cliente e
demais envolvidos no processo (Zamignani, Kovac, & Vermes), o complemento de um
tratamento multidisciplinar (Vianna & Sampaio, 2003) ou ainda uma técnica de intervenção
(Balvedi, 2003) parecem contribuir de modo limitado para esclarecer o que é definidor dessa
atuação. Esses aspectos utilizados como definições indicam parcelas de variáveis constituintes
do Acompanhamento Terapêutico, e sinalizam a necessidade de uma avaliação mais
minuciosa das classes de comportamentos (e de suas abrangências) que caracterizam essa
atuação.
35
Contribuições da Programação de Ensino2 para definir o Acompanhamento Terapêutico
por meio de classes de comportamentos
Uma das subáreas da Análise do Comportamento que investiga os processos de ensino
e aprendizagem nos mais variados contextos em que esses processos ocorrem é comumente
denominada por Programação de Ensino. Essa subárea tem como seu objeto de estudo e de
intervenção o processo de programar condições para o desenvolvimento de comportamentos
e, portanto, abrange: (a) descobrir os comportamentos-objetivo (comportamentos que
necessitam ser ensinados/aprendidos); (b) construir, aplicar, avaliar e aperfeiçoar o processo
de ensino; (c) comunicar os trabalhos desenvolvidos; e (e) desenvolver tecnologias para
auxiliar nesses trabalhos (Botomé, 1981; Botomé et al., 2003; Kienen, 2008; Kienen, Kubo, &
Botomé, 2013). Descobrir quais comportamentos são relevantes na vida do aprendiz e, por
isso, necessitam ser ensinados, é pré-requisito (e necessita ser o ponto de partida do trabalho)
para identificar e construir procedimentos de ensino que serão utilizados para desenvolver a
aprendizagem desses comportamentos (Bori, 1974). Como exemplo, antes de construir
procedimentos de ensino/treinamento do Acompanhamente Terapêutico, é necessário definir
o que deverá ser ensinado, ou seja, descobrir quais são os comportamentos necessários para
que o acompanhante terapêutico atue profissionalmente.
As funções e objetivos que especificam a atuação de qualquer profissional, inclusive
do acompanhante terapêutico, se referem a comportamentos constituintes dessa atuação, tais
como comportamentos relacionados à intervenção, observação e comunicação. Para os
analistas do comportamento, um comportamento representa a interação entre aquilo que o
organismo faz e o ambiente no qual realiza esse fazer (Botomé, 2001; 2013). O que o
organismo faz representa a sua ação, e o ambiente no qual realiza esse fazer é constituído por
2 A denominação mais precisa para a área seria “Programação de Condições para o Desenvolvimento de
Comportamentos“, mas para fins didáticos o nome será resumido como “Programação de Ensino”.
36
dois momentos distintos: o ambiente antecedente, composto por aspectos específicos da
situação na qual a ação ocorre e o ambiente subsequente, composto por aspectos específicos
que se seguem a ação do organismo (Botomé, 2001; 2013). Esquematicamente é possível
representar a noção de comportamento conforme a Figura 1. Nessa figura são especificados os
três componentes do comportamento: a situação que antecede uma ação (ambiente que existe
antes do organismo atuar sobre ele), a ação (aquilo que o organismo faz) e a situação que
decorre da ação ou sucede a ela (ambiente que resulta dessa ação) (Botomé, 2001; 2013).
Situação
(Classe de estímulos
antecedentes)
Ação
(Classes de respostas)
Situação subsequente (Classes
de estímulos consequentes)
O que acontece antes ou junto à
ação do organismo
Aquilo que o organismo faz O que acontece depois da açao
de um organismo
Figura 1. Especificação dos componentes constituintes da definição do comportamento como interação entre o
que o organismo faz e o ambiente em que o faz. As setas representam as interações entre os componentes do
comportamento. (Adaptada de Botomé, 2001)
A noção de comportamento como interação entre atividades do organismo e aspectos
do ambiente aumenta a precisão na descrição de comportamentos que são apresentados pelos
organismos e viabiliza nomeá-los de forma a indicar a interação estabelecida. Os
comportamentos são comumente nomeados fazendo referência à interação que está sendo
estabelecida, por meio de um verbo acompanhado de complementos que fazem referência ao
ambiente. O acompanhamento de complementos é necessário, pois a utilização de verbos
isolados apenas resume a interação ao invés de indicar os componentes envolvidos na
interação entre o que o organismo faz e o ambiente em que o faz (Botomé, 2001; 2013).
Como exemplo, uma tentativa de nomear o comportamento “intervir” por meio do uso isolado
37
desse verbo (“intervir”) indica apenas a ação de um organismo e não descreve de forma
precisa o comportamento do qual essa ação é constituinte: intervir sobre o que? Com quem?
Para quê? Como exemplo, o verbo “intervir” pode estar se referindo a um acompanhante
terapêutico que necessita “intervir” em uma situação-problema relacionada ao comportamento
do cliente com o objetivo de amenizá-la ou diluí-la, ou ainda, pode se referir à intervenção
que deve ser realizada junto à família para que ela tenha condições de atuar sobre a situação-
problema que envolve o cliente. Esses exemplos se referem a situações diferentes que
envolvem contextos e ações distintas, caracterizando-se como comportamentos distintos. No
primeiro caso, poder-se-ia pensar num comportamento de “intervir diretamente sobre
contingências que mantêm o comportamento-problema do cliente” e, no segundo caso,
“intervir por meio de ensino sobre o comportamento de familiares para que eles promovam
modificações em contingências que mantêm o comportamento-problema do cliente”.
A nomeação de um comportamento somente é possível após análise, que envolve
explicitar os prováveis antecedentes de uma classe de respostas, as características dessas
classes de respostas e os seus consequentes. Isso significa identificar qual é o comportamento
que está ocorrendo e entender as relações entre seus componentes (Botomé, 2001). O termo
“classe” aqui se refere a vários eventos com propriedades semelhantes (Catania, 1999).
Portanto, podemos nos referir a um conjunto de respostas que são topograficamente parecidas
como “classe de respostas” e comportamentos que têm todos a mesma função sobre o
ambiente como “classe de comportamentos” (Catania, 1999). Portanto, as classes de
comportamentos se referem aos comportamentos que podem variar em relação às
propriedades que os constituem, porém mantêm a mesma função (Catania, 1999).
Aqui, cabe destacar que os objetivos de uma atuação profissional são sempre relações
entre classes de estímulos antecedentes, classes de respostas e classes de estímulos
38
consequentes (Botomé, 2001; 2013). Ou seja, são sempre classes de comportamentos. No
Acompanhamento Terapêutico, como exemplo, as classes de estímulos antecedentes são
aspectos da realidade com os quais o acompanhante terapêutico se deparará; as classes de
respostas designam o que ele deverá ser capaz de fazer em relação a esses aspectos da
realidade e as classes de estímulos consequentes se referem ao que necessitará decorrer desse
fazer, ou seja, são as mudanças em relação à realidade na qual o acompanhante terapêutico
atuou. Portanto, quando são propostos objetivos, são propostos comportamentos que
necessitarão ser desenvolvidos pelo acompanhante terapêutico para que ele intervenha sobre
comportamentos de seus clientes nos contextos em que esses comportamentos ocorrem.
Para uma clara delimitação e sistematização do Acompanhamento Terapêutico, se faz
necessário identificar quais as classes de comportamentos dele constituintes, o que implica em
compreendê-las, também, a partir de diferentes graus de complexidade. Isso porque as classes
de comportamentos constituintes de qualquer atuação profissional variam em complexidade
(Kienen, 2008). Como exemplo, tomemos duas classes de comportamento necessárias para
um caso de Acompanhamento Terapêutico: “orientar os pais” e “criar condições que gerem
sucesso na execução de tarefas escolares” (Pergher & Velasco, 2007). No exemplo, embora
“criar condições que gerem sucesso na execução de tarefas escolares” pareça ser mais
complexo do que “orientar os pais”, para “orientar” é necessário que o profissional seja capaz
de “identificar” e “avaliar” componentes-problemas. “Orientar os pais” pode ser um dos
constituintes de “criar condições que gerem sucesso na execução de tarefas escolares”, mas
requer que sua complexidade seja analisada. Explorar esse aspecto relativo à complexidade
das classes de comportamentos é importante por possibilitar identificar comportamentos que
necessitam ser desenvolvidos como pré-requisito para o desenvolvimento de outros
comportamentos.
39
Pesquisas que objetivam caracterizar classes de comportamentos constituintes de
atuações de diferentes agentes sociais têm sido realizadas por meio de procedimentos de
identificação e derivação de comportamentos, especialmente a partir de literatura a respeito
do fenômeno investigado. O estudo de Kienen (2008), por exemplo, buscou delimitar a
atuação do psicólogo como um profissional capacitador de diferentes agentes sociais (pais,
cônjuges, profissionais da área da saúde, líderes empresariais etc.) para que eles possam
aprender a intervir sobre comportamentos. Santos, Kienen, Viecili, Botomé e Kubo (2009)
examinaram as classes de comportamentos constituintes da formação do psicólogo a partir do
que está proposto nas Diretrizes Curriculares para os Cursos de Graduação em Psicologia.
Moskorz (2011) investigou os comportamentos presentes na interação entre psicoterapeuta e
cliente, aprofundando o exame feito por Zamignani (2007). Luiz (2008) sistematizou as
classes de comportamentos constituintes de “projetar a vida profissional”. De Luca (2008)
caracterizou a classe “avaliar a confiabilidade de informações”. Esses são exemplos de
estudos que objetivaram caracterizar e sistematizar classes de comportamentos constituintes
de alguma atuação, a partir da literatura, o que possilitou avaliar a pertinência dessas classes,
realizar proposições com a finalidade de amenizar equívocos presentes na linguagem utilizada
para se referir a elas, bem como em problemáticas decorrentes desses equívocos, além de
caracterizar funções sociais e científicas de profissionais e permitir a capacitação de
indivíduos que necessitam lidar com comportamentos envolvidos nessas funções.
No caso do Acompanhamento Terapêutico, a utilização de procedimentos de
identificação e derivação de comportamentos a partir de literatura sobre esse tipo de atuação,
pode auxiliar na elaboração de uma definição e em sua delimitação. A seguir será apresentado
um exemplo para ilustrar o potencial desse tipo de procedimento, iniciando com a transcrição
40
de um trecho do texto de Oliveira (2000) que apresenta uma definição para o
Acompanhamento Terapêutico:
O AT serve de elo entre o profissional ou a equipe responsável e a família. Dessa forma, o
AT pode reforçar adequadamente os esforços tanto do cliente quanto de sua família, orientar
o cliente em suas tarefas diárias, garantido o exercício das atividades programadas; realizar o
levantamento de dados da relação familiar e de contingências da vida do paciente, através de
observação participante; repassar os dados novos, levantados através da observação ao
profissional ou equipe responsável pelo caso, para a análise das novas contingências
percebidas e assim traçar novos procedimentos e técnicas cabíveis ao caso (Oliveira, 2000, p.
257).
Nesse trecho, é possível identificar referência aos três componentes que constituem
comportamentos: classes de estímulos antecedentes, classes de respostas e classes de
estímulos consequentes (conforme ilustrado na Figura 2).
Trecho Classes de estímulos
antecedentes Classes de respostas
Classes de estímulos
consequentes
Classes de
comportamentos
O AT serve de elo entre o
profissional ou a equipe
responsável e a família.
Dessa forma, o AT pode
reforçar
adequadamente os
esforços tanto do cliente
quanto de sua família,
orientar o cliente em
suas tarefas diárias,
garantido o exercício
das atividades
programadas; realizar
o levantamento de
dados da relação
familiar e de
contingências da vida
do paciente, através de
observação
participante; repassar
os dados novos,
levantados através da
observação ao
profissional ou equipe
responsável pelo caso,
para a análise das novas
contingências
Profissional ou equipe
responsável pelo caso
Cliente
Esforços do cliente
Esforços da família
Atividades
programadas
Tarefas diárias do
cliente
Reforçar adequadamente
os
esforços/comportamentos-
alvo tanto do/emitidos
pelo cliente
Reforçar adequadamente
os
esforços/comportamentos-
alvo quanto/de membros
da sua família do cliente
Orientar o cliente sobre o
exercício das atividades
programas em suas
tarefas diárias
Garantindo o exercício
das/Garantir que o cliente
exercite as atividades
Os comportamentos-
alvo emitidos pelo
cliente foram reforçados
adequadamente
Os comportamentos-
alvo emitidos por
membros da família do
cliente foram reforçados
adequadamente
Aumento na
probabilidade do cliente
emitir os
comportamentos-alvo
Aumento na
probabilidade de
membros da família do
cliente emitirem os
Análise de/Analisar novas
contingências
percebidas/que foram
identificadas
Traçar/Planejar novos
procedimentos e técnicas
cabíveis/adequadas ao
caso
Reforçar adequadamente
os
esforços/comportamentos-
alvo tanto do/emitidos
pelo cliente
Reforçar adequadamente
os
esforços/comportamentos-
alvo quanto/de membros
41
percebidas e assim
traçar novos
procedimentos e
técnicas cabíveis ao caso
(Oliveira, 2000, p. 257).
Necessidade de
reforçar
adequadamente os
comportamentos-alvo
emitidos pelo cliente
Necessidade de
reforçar
adequadamente os
comportamentos-alvo
emitidos por membros
da família do cliente
Necessidade de
orientar o cliente sobre
o exercício das
atividades
programadas em suas
tarefas diárias
Necessidade de
garantir que o cliente
exercite as atividades
programadas
Necessidade de
demonstrar dados
novos que foram
identificados por meio
da observação ao
profissional ou equipe
responsável pelo caso
Necessidade de coletar
dados de interações
comportamentais entre
membros da família do
cliente por meio de
observações
participantes
programadas
Repassar os/Demonstrar
dados novos, levantados
através/que foram
identificados por meio da
observação ao
profissional ou equipe
responsável pelo caso
Realizar o levantamento
de dados da relação
familiar e de
contingências da vida do
paciente, através de
observação participante/
Coletar dados de
interações
comportamentais entre
membros da família do
cliente por meio de
observações participantes
comportamentos-alvo
O cliente foi orientado
em sobre o exercício
das atividades
programas em suas
tarefas diárias
A garantia do exercício
das/ As atividades
programadas para o
cliente foram
excercitadas por ele
Possiblidade de análise
de novas contingências
que foram identificadas
Possibilidade de que
novos procedimentos
sejam planejados
Possibilidade de
planejar novas técnicas
adequadas ao caso
da sua família do cliente
Orientar o cliente sobre o
exercício das atividades
programas em suas
tarefas diárias
Garantindo o exercício
das/Garantir que o cliente
exercite as atividades
programadas
Repassar os/Demonstrar
dados novos, levantados
através/identificados por
meio da observação ao
profissional ou equipe
responsável pelo caso
Realizar o levantamento
de dados da relação
familiar e de
contingências da vida do
paciente, através de
observação participante/
Coletar dados de
interações
comportamentais entre
membros da família do
cliente por meio de
observações participantes
Figura 2. Componentes que constituem comportamentos e classes de comportamentos que foram identificadas
e derivadas a partir do trecho do texto de Oliveira (2000).
Como classes de estímulos antecedentes, pode-se destacar: Cliente, esforços do
cliente, esforços da família, atividades programadas, profissional ou equipe responsável pelo
caso, tarefas diárias do cliente. Como classes de respostas: Reforçar adequadamente os
esforços tanto do cliente quanto de sua família; orientar o cliente em suas tarefas diárias
42
garantindo o exercício das atividades programadas; realizar o levantamento de dados da
relação familiar e de contingências da vida do paciente, através de observação participante; e
repassar os dados novos, levantados através da observação ao profissional ou equipe
responsável pelo caso. Por fim, como referências às classes de estímulos consequentes, é
possível observar: a garantia do exercício das atividades programadas, e duas decorrências do
comportamento do acompanhante terapêutico que são classes de comportamentos que deverão
ser emitidos pelo profissional ou equipe responsável pelo caso: análise de novas
contingências percebidas e traçar novos procedimentos e técnicas cabíveis ao caso. Nesses
dois últimos casos, os estímulos consequentes de classes de respostas do acompanhante
terapêutico poderiam ser mais claramente descritas como: possiblidade de análise de novas
contingências percebidas, possibilidade de que novos procedimentos sejam planejados,
possibilidade de novas técnicas cabíveis ao caso sejam traçadas. Porém, mesmo explicitando
aspectos relativos aos três componentes de comportamentos, as expressões utilizadas para
fazer referência aos comportamentos do acompanhante terapêutico parecem não deixar clara a
sua função. Isso porque são mantidas metáforas (“serve de elo”, “através”, “percebidas”,
“traçar”, entre outras) e uma ênfase às classes de respostas que o acompanhante terapêutico
deve emitir (“reforçar”, “orientar”, “realizar”, “através de observação participante”, “repassar
os dados novos”). Uma maneira de explicitar mais claramente as classes de comportamentos
destacadas nesse trecho seria substituir os termos vagos, metafóricos ou imprecisos por
termos mais claros, concisos, objetivos e precisos3, levando em consideração a função dessas
classes de comportamentos.
3 Objetividade se refere à linguagem utilizada para descrever os componentes que fazem referência a variáveis
observáveis (direta ou indiretamente) (De Luca, 2008, 2013);
A concisão é um critério que define que a linguagem não deve apresentar palavras ou expressões desnecessárias
(De Luca, 2008, 2013);
43
Exemplos das possibilidades de identificação, derivação e substituição de termos
vagos, metafóricos ou imprecisos também estão ilustrados na Figura 2. Nessa figura, as
informações em itálico foram derivadas dos componentes do trecho selecionado da obra
(fonte de informação). Em negrito estão as frases e palavras que se referem a componentes de
comportamentos (classes de estímulos, de respostas e/ou de comportamentos). As partes
tachadas seguidas de uma barra indicam um trecho para o qual foi escrita uma nova
proposição (indicada à direita da barra e em itálico). Já as frases sem nenhum grafo e/ou frase
ou palavra tachada anteriormente não necessitaram de novas proposições.
Como está ilustrado pela Figura 2, além de propor a substituição de alguns termos, é
possível, a partir do trecho destacado, propor a derivação de outros componentes de classes de
comportamentos que podem ser inferidos a partir das informações apresentadas. Como
exemplo, é possível destacar consequências t