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Terapia de Aceitação e Compromisso (ACT): mais uma possibilidade para a clínica comportamental

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Terapia de Aceitação eCompromisso (ACT):

mais uma possibilidade

para a clínica comportamental

Boavista, Rodrigo Rodrigues Costa.

Terapia de Aceitação e Compromisso (ACT): Mais uma

possibilidade para a clínica comportamental / Rodrigo Rodrigues Costa

Boavista. 1a ed. Santo André, SP: ESETec Editores Associados, 2012.

64 p

21cm

1. Terapia de Aceitação e Compromisso.2. Terapia Comportamental.3. Análise Clínica do Comportamento.

Copyright © desta edição:ESETec Editores Associados, Santo André, 2012.

Todos os direitos reservados

Solicitação de exemplares: [email protected] André – SPCEP 09041-070

Tel. (11) 4990 56 83www.esetec.com.br

CDD 155.2CDU 159.9.019.4 ISBN 978 85 7918 036 1

Arte da capa: Regina Costa

Terapia de Aceitação eCompromisso (ACT):

mais uma possibilidade para a clínica comportamental

Rodrigo Rodrigues Costa Boavista

2012ESETec

I’ve lived a life that’s full

I’ve traveled each and every highway

[…] I faced it all and I stood tall

And did it my way

[…] I’ve loved, I’ve laughed and cried

I’ve had my fails, my share of losing

And now as tears subside

I find it all so amusing

To think I did all that

And may I say, not in a shy way

Oh, no, no not me

I did it my way

Sumário

1 INTRODUÇÃO ........................................................................................ 9

2 O MOVIMENTO HISTÓRICO DA TERAPIA COMPORTAMENTAL .. 13

3 TERAPIA DE ACEITAÇÃO E COMPROMISSO ................................... 193.1 Base Filosófica .......................................................................................... 213.2 Raízes Teóricas ......................................................................................... 233.3 Modelo de Psicopatologia .......................................................................... 28

3.3.1 Fusão Cognitiva ............................................................................... 293.3.2 Esquiva experiencial ........................................................................ 303.3.3 Predominância do Passado Conceitual e Autoconhecimento Limitado 313.3.4 Falta de clareza de valores .............................................................. 323.3.5 Impulsividade, Inércia ou Persistência na Esquiva ........................... 323.3.6 Atrelamento ao “eu” conceitual ......................................................... 33

3.4 ACT e mindfulness ..................................................................................... 34

4 APLICAÇÕES ......................................................................................... 37

5 CONSIDERAÇÕES FINAIS ................................................................... 49

REFERÊNCIAS ......................................................................................... 53

APÊNDICE AGLOSSÁRIO EXPLICATIVO DE CONCEITOS DA ACT ........................ 59

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1

INTRODUÇÃO

Com o advento da globalização e a consequente modificação radicalde funcionamento dos meios de comunicação de massa, a populaçãoacompanhou uma intensificação da troca de informações. A teia globalcapta insumos e rapidamente os disponibiliza aos interessados espalhadospelos quatro pontos cardeais em frações de segundo. Tal aceleraçãofavoreceu o compartilhamento de produções acadêmicas e constantesrevisões, esse processo se por um lado vai ao encontro dos pressupostosempiristas de ciência, os quais, por definição, elogiam as replicações eretestes de hipóteses (SKINNER, 2007), por outro é bastante desconfortávelpara aqueles que se beneficiam de dogmas e verdades inquestionáveis.

A Terapia Comportamental, que desde suas primeiras investidas écalcada num paradigma cartesiano, usufruiu – e continua usufruindo –intensamente desse fluxo de trocas. Apesar da juventude doestabelecimento da Análise do Comportamento (AC) no mundo dapsicoterapia, que se dá a partir dos trabalhos de Watson e Rayner datadosda década de 1920 (COSTA, 2002) – e ainda mais recentemente noBrasil, que só ocorreu após a visita de Fred Keller à São Paulo em 1961 –Micheletto et al. (2010) afirmam que é visível a evolução e o franco progressovivido no campo.

Hayes afirma que a Terapia Comportamental já viveu pelo menostrês momentos de reformulação paradigmática. As chamadas ondas, ougerações, da AC são uma forma didática de referir ao “conjunto deformulações, assunções, métodos e metas dominantes, sendo quealgumas dessas são implícitas” (HAYES, 2004, p. 640) 1 características decada período. A primeira onda ficou marcada pelo rigor metodológicocomo forma de rebelião contra as concepções clínicas prevalentes na

1Original em inglês, tradução nossa.

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década de 50. A ausência de suporte empírico das intervenções utilizadasaté então motivou os terapeutas comportamentais a realizarem testes eexperimentos que comprovassem os princípios básicos docomportamento. A obra de Pavlov na área do condicionamento respondentefoi fundamental para esse período histórico (VANDENBERGHE; SOUSA,2006). A segunda geração da Terapia Comportamental nasce a partir daslimitações apresentadas pelos terapeutas de primeira onda no que tangeseus esforços para explicar e intervir sobre os eventos privados(sentimentos, pensamentos, sensações etc.). Vermes, Zamignani e Mayer(2010) apontam que a década de 1970 foi dominada pelo modelo cognitivoracionalista, segundo o qual os processos psicológicos eram mediadospor sistemas subjacentes. Assim como a primeira onda da AC, a segundageração ficou marcada pelos seus êxitos no tratamento dos transtornosde humor. Outra herança do modelo clássico da AC foi o foco naeliminação de respostas problemáticas, disfuncionais ou mal adaptativasenquanto meta clínica (HAYES; STROSAHL; WILSON, 1999).

Inúmeros autores intitulam os anos 80 e seus subsequentes deTerceira Onda ou Terceira Geração da AC (FLETCHER; HAYES, no prelo2;HAYES, 2004; PEREIRA; GUIMARÃES; GUEDES, no prelo3;VANDENBERGHE, 2007; VERMES; ZAMIGNANI; MEYER, 2010).Caracterizado fundamentalmente pela busca de epistemologias alheiasao mecanicismo e ao racionalismo, e pela eclosão das releiturascontextualistas do Behaviorismo Radical, o movimento terceira-ondistacompreende quatro modelos de intervenção clínica em seu núcleo, sãoeles: a Psicoterapia Analítico Funcional, a Terapia ComportamentalIntegrativa de Casais, a Terapia Comportamental Dialética e a Terapia deAceitação e Compromisso (VANDENBERGHE, 2007).

Harris (2008) aponta que, no bojo da terceira onda da análise docomportamento, existe um ímpeto revolucionário que a imiscui nesse

2Relational Frame Theory, Acceptance and Commitment Therapy, and a Functional AnalyticDefinition of Mindfulness, de autoria de FLETCHER, L; HAYES, S. A ser publicado no Journalof Rational Emotive and Cognitive Behavioral Therapy.3PEREIRA, C; GUIMARÃES, T; GUEDES, M. Eventos em Análise do Comportamento:contribuição ao estudo da institucionalização da AC no Brasil. Disponível em <http://www.abpmc.org.br/relatorio.pdf.

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contexto de amplas modificações estruturais dos paradigmas científicos.Uma vez que abandona o modelo racionalista característico dos terapeutascognitivo-comportamentais e supera o sistema compreensivo mecanicistadas respostas disfuncionais do modelo pavloviano clássico, os terapeutasde terceira geração da AC inauguram um período fértil em produçõesteóricas e comprovações empíricas da efetividade de suas intervenções.Ainda assim, Hayes, Strosahl e Wilson (1999) alertam que foramnecessários mais de 20 anos para que a Terapia de Aceitação eCompromisso (ACT) se transformasse em um modelo de intervençãoteoricamente consistente e filosoficamente bem embasado. Tendo emvista que em 1986 já existiam estudos metodologicamente criteriososque comprovavam a eficácia do tratamento de indivíduos depressivoscom a ACT, e que o primeiro livro-texto só foi publicado em 1999, é de seesperar que muito tenha sido produzido nessa área. Tal hipótese éverdadeira caso o olhar do leitor seja fixado no território estadunidense. Adespeito dos incontáveis resultados positivos no tratamento de gruposacometidos pelas mais diversas psicopatologias, salta aos olhos a carênciade trabalhos científicos sobre o tema nos mais respeitados bancos detese e revistas científicas de maior circulação no meio acadêmico nacional.

Harris (2006, p.3)4 afirma que “atualmente existe um vasto corpo dedados empíricos que embasam a efetividade da ACT”. São notáveis osresultados apresentados pela Terapia de Aceitação e Compromisso nostratamentos do exibicionismo (FUKAHORI, SILVEIRA; COSTA, 2005), dadepressão (DOUGHER; HACKBERT, 2003; KANTER, BARUCH; GAYNOR,2006), da dependência de substâncias psicoativas (TWOHIG;SHOENBERGER; HAYES, 2007; STOOTS, MASUDA; WILSON, 2009), dador crônica (TORCH; FOLLETTE, 2006), das psicoses (BACH, 2004) edos transtornos de ansiedade (ORSILLO et al., 2004). Existem aindaestudos que apontam que a ACT chega a atingir índices de 50% deredução na incidência de re-hospitalização de pacientes esquizofrênicoscom apenas quatro horas de intervenção (BACH; HAYES, 2002).

Tendo em vista que a literatura internacional aponta a ACT comouma ferramenta clínica de muito valor e utilidade, se faz necessário umtrabalho que introduza o referido modelo no repertório terapêutico dos

4Original em inglês, tradução nossa.

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analistas do comportamento brasileiros. Pretendemos, neste livro,apresentar a Terapia de Aceitação e Compromisso no que tange os seusfundamentos filosóficos, pressupostos, e aplicações. Buscaremos, a partirde uma criteriosa revisão da literatura, contextualizar a ACT no cenário daterceira onda da análise do comportamento; elencar conceitosfundamentais que embasam o modelo de intervenção; e identificarpossíveis cenários de aplicação da referida psicoterapia.

Esperamos que esta obra sirva de incentivo aos que difundem aciência do comportamento e auxilie na expansão do leque de tecnologiascomportamentais à disposição dos terapeutas brasileiros. As discussõeslevantadas aqui não ambicionam esgotar o tema muito menos dar caráterde verdade às conclusões extraídas dos dados encontrados. Afinal decontas como ensinam Hayes, Strosahl e Wilson (1999, p.19) 5:

O critério de verdade do contextualismo é o sucesso. Análises sãoverdadeiras apenas em termos do cumprimento de determinadas metas.Desse modo, a verdade é sempre local e pragmática. A sua verdadepode não ser a minha, porque podemos ter objetivos bastante diferentes.

5Original em inglês, tradução nossa.

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2

O MOVIMENTO HISTÓRICO DA TERAPIACOMPORTAMENTAL

A Terapia Comportamental, uma forma bastante específica depsicoterapia, está ancorada cientificamente na Análise do Comportamentoque, por sua vez, possui raízes filosóficas no Behaviorismo Radical propostopor B.F. Skinner (VERMES; ZAMIGNANI; MEYER, 2010). Tal afirmação dámargem à construção da imagem de uma pirâmide epistemológica (Fig.1)onde se pode observar a relação estabelecida entre estes três níveis deanálise. Na base da pirâmide situa-se o campo filosófico conhecido comoBehaviorismo Radical, conjunto de postulados e explicações queambicionam estabelecer um modelo de entendimento do ser humano.No segundo nível, encontra-se a Análise do Comportamento, ciência queutiliza a filosofia skinneriana para confeccionar um sistema deinterpretação dos fenômenos psicológicos. Tomando como base o

Figura 1 – Pirâmide da Hierarquia Epistemológica

Terapia

Comportamental

Análise do

Comportamento

Behaviorismo

Radical

• Campo de Saber Científico:produções reflexivas, interpretativas,

empíricas (experimentais e nãoexperimentais) e aplicadas.

• Campo Filosófico:Conjunto de

postulados. Descriçãode assunções e

padrões.

• Campo Prático: modalidade depsicoterapia. Conjunto de tecnologias eferramentas interventivas.

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comportamento, compreendido como uma interação entre indivíduo eambiente, realiza esforços para entender, sistematizar dados, explicar,descrever, prever, controlar e intervir no comportamento humano. O terceiroe último nível desta pirâmide é constituído pela Terapia Comportamentalque pode ser compreendida como a aplicação direta das contribuiçõesteóricas da Análise do Comportamento. É uma modalidade de práticas etecnologias que busca, utilizando o conhecimento disponível sobre ocomportamento humano, transformar a realidade (ULIAN, 2007).

Ao contrário do que se geralmente veicula na literatura psicológica,a psicoterapia de base comportamental tem passado por diversos períodosde reestruturação (VERMES; ZAMIGNANI; MEYER, 2010). Há muito foiultrapassada a psicologia estímulo-resposta e seus métodos laboratoriais,e nas últimas décadas foi apresentada à comunidade científica e aosclientes uma clínica comportamental bastante reformulada. A terceira onda,ou terceira geração, da Terapia Comportamental reinventou o settingterapêutico e trouxe o indivíduo – tanto aquele que procura ajuda porquesofre quanto aquele que sofre porque tenta, juntamente com o primeiro,superar o sofrimento – para o centro do palco terapêutico.

A chamada Primeira Onda, ou primeira geração, da TerapiaComportamental surgiu em 1913 com a publicação de Watson A psicologiavista por um behaviorista (VERMES; ZAMIGNANI; MEYER, 2010). Tidapor muitos como o marco inicial da Terapia Comportamental, estapublicação ficou conhecida como o “Manifesto Behaviorista”. Obehaviorismo watsoniano, ou clássico, foi marcado pela forte influênciade Pavlov. Outra característica desse momento foi a crença de que umprograma de pesquisa bem estruturado seria capaz de identificar ao menosum estímulo incondicionado ou condicionado que antecedesse toda equalquer resposta. Segundo Vermes, Zamignani e Meyer (2010) esta formade atuar ficou conhecida por “psicologia S-R” ou psicologia do estímulo-resposta e manteve-se como protagonista do movimento behaviorista atéos anos 40, momento no qual Skinner elucidou os mistérios docomportamento operante (VANDENBERGHE, 2007).

Os anos 50 figuraram como o ápice da primeira geração da TerapiaComportamental, o movimento que surgiu como uma tentativa de substituira Psicoterapia Existencial, entendida, pela comunidade científica, comoineficaz e pouco embasada nos princípios empiristas, trouxe em seu bojo

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as formulações de Wolpe sobre o processo de Inibição Recíproca quesão o cerne da técnica, ainda atual, de dessensibilização sistemática.Seu foco era principalmente a eliminação de respostas inadequadas,entretanto o condicionamento de respostas funcionais já aparecia, mesmoque superficialmente, como objetivo terapêutico. Os terapeutas da primeiraonda carregavam, com muito empenho e honra, a bandeira do rigormetodológico e definiram o laboratório como “terra sagrada”. Apesar dosprogressos obtidos na área das teorias do aprendizado a partir daconceituação do comportamento operante, sua transposição para ocampo clínico não foi muito exitosa na época. Os terapeutas foram bastantesuperficiais quanto à sua operacionalização, razão pela qual as técnicasutilizadas nunca surtiam o efeito esperado e pareciam até mesmo inocentes(VANDENBERGHE, 2007). Como exemplo disto têm-se o reforçamentode sorrisos e verbalizações otimistas em pacientes deprimidos (COONS1

apud VANDENBERGHE, 2007) e a instalação de um programa deeconomia de fichas para solucionar problemas relacionais entre casais(STUART2 apud VANDENBERGHE, 2007).

Com o advento dos modelos cognitivos nos anos 70, que chegarama tomar para si a predominância do campo do tratamento da ansiedadehá muito dominado pelo comportamentalismo (VERMES; ZAMIGNANI;MEYER, 2010), surge a Segunda Onda da Terapia Comportamental. Aomanter o ideal empirista de ciência e sustentar, o rigor metodológico dageração anterior, os “modificadores de comportamento” deixaram de ladoo interesse pelo desenvolvimento terapêutico e suas energias se voltarampara os controles experimentais rigorosos e para uma tentativa detransposição dos progressos obtidos no laboratório para o setting clínico.Diante das dificuldades de compreender e explicar, principalmente oscomportamentos encobertos (emoções, fantasias, sonhos etc.), surge oprincípio cognitivo que reza que sentimentos e comportamentosinterpessoais são mediados pela cognição, estabelecendo-se então umnovo paradigma que contrastava com o proposto por Skinner.

1COONS, W. Psychotherapy and verbal conditioning in behavior modification. CanadianPsychologist , [S.l.], vol. 13, p. 3-29, 1972.2STUART, R. Operant-interpersonal treatment for marital discord. Journal of Consulting andClinical Psychology , [S.l.], vol.36, p.675-682, 1969.

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Vandenberghe (2007) comenta ainda que esta situação terminou por gerarmuitas críticas de ordem paradigmática e epistemológica.

Os anos 80 foram destacados, na história do behaviorismo, comoum período de grande avanço na teoria comportamental (VERMES;ZAMIGNANI; MEYER, 2010). A terceira geração da AC surge trazendo oretorno à psicoterapia vivencial superando a mera aplicação de técnicascomo método de tratamento. As epistemologias não-lineares e poucoortodoxas como o construtivismo social e as releituras contextualistas dobehaviorismo radical assumiram posição central na agora chamadaAnálise Clínica do Comportamento, rótulo que, segundo Vandenberghe(2007), compreende fundamentalmente quatro modelos clínicos:Psicoterapia Analítico Funcional (FAP), Terapia de Aceitação eCompromisso (ACT), Terapia Comportamental Dialética (DBT) e TerapiaComportamental Integrativa de Casal (ICBT).

A adoção da filosofia analítico funcional marcou profundamente omodo de fazer clínica dos terapeutas comportamentais dessa geração. Aênfase na vivência genuína e a grande relevância assumida pela relaçãoterapêutica fizeram com que a meta da psicoterapia se expandisse e aconstrução de um repertório amplo e flexível para uma interação saudávelcom o mundo fosse adotada como foco das intervenções (VERMES;ZAMIGNANI; MEYER, 2010). A terceira onda da Terapia Comportamentalreduziu a importância das psicopatologias e aumentou o nível de atençãopara as formas particulares com que cada indivíduo vivencia o cotidiano.Temáticas-tabu, anteriormente desconfortáveis para os terapeutascomportamentais como emoções, motivação, comportamento verbal(pensamentos, sentimentos e demais cognições) e o complexo mundodas relações simbólicas, passaram, a partir da década de 80, a ser centraisnas intervenções clínicas. Essa ampliação do leque de atuação dospsicoterapeutas se deu, também, por conta da expansão do nível decompreensão do comportamento humano. O modelo causal da origemdos comportamentos e os três níveis de seleção comportamentalapontados por Skinner (2007a) passaram a ser mais bem exploradosuma vez que o entrelaçamento da cultura, enquanto contexto verbal/social,com a filogênese e a ontogênese ficou mais claros a partir dascontribuições na área das metacontingências (MOREIRA; MARTONE;TODOROV, 2005) e dos quadros relacionais (HAYES, 2004).

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Essa complexa teia de relações, que gera como produto final asformas pelas quais interagimos com o mundo, é chamada de repertóriocomportamental (JÚNIOR; SOUZA, 2006). Como nunca será possível doisindivíduos possuírem as mesmas experiências filo e ontogenéticas eculturais, nunca existirão repertórios de comportamento idênticos, daíentão, surge a perspectiva skinneriana do caso único que prega o estudoe consequente intervenção particular e individual para cada cliente(SKINNER, 2007a). Uma das inúmeras contribuições de Kohlenberg eTsai (2010) para o avanço das tecnologias comportamentais na clínicadiz respeito a esta perspectiva de estabelecer relacionamentos intensos ecurativos com os clientes. A relação terapêutica, segundo os autorescitados, estabelece-se como um encontro muito distinto entre dois sereshumanos. Afastando-se da assunção de que a relação terapêutica é ummero cenário, assume-se que ela pode ser vista como instrumento demudança comportamental. Uma vez que esta relação é uma interaçãosocial, que apesar de suas particularidades reflete as características dosrelacionamentos estabelecidos pelos clientes no mundo fora do settingclínico, deve-se utilizá-la como anteparo para os processos deaprendizagem comportamental.

Vermes, Zamignani e Meyer (2010) apontam que todocomportamento existe por um bom motivo, o que significa dizer que todocomportamento traz algum benefício para o indivíduo. A terceira onda daTerapia Comportamental instaurou como primeiro passo do terapeuta nocaminho para a mudança a descoberta de quais variáveis ambientaisforam responsáveis por instalar e quais são responsáveis por manter ocomportamento de interesse do cliente. Esse processo vem sendochamado com certa frequência de “análise funcional do comportamento”.A despeito de tal informação, existem autores que discordam de talnomenclatura, e sugerem o termo “análise de contingências” como maisadequado para intitular tal intervenção (ULIAN, 2007).

A terceira geração da Terapia Comportamental foi de encontro àconcepção absolutamente equivocada de que o behaviorismo e aspsicoterapias apoiadas nesse sustentáculo filosófico ignoram ou dãopouco valor aos eventos internos do organismo, por exemplo, sentimentose sonhos – crença essa que tem origem numa compreensão parcial dahistória dos movimentos da Terapia Comportamental (VERMES;

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ZAMIGNANI; MEYER, 2010). Skinner (2007a) desde que iniciou suasanálises comportamentais percebeu que o mundo interno é tão importantequanto o mundo diretamente observável, a única diferença entre eles estásituada na capacidade de acessar os eventos de interesse. Tanto osencobertos ou internos quanto os comportamentos públicos ou observáveissão produzidos pela interação do indivíduo com o ambiente, desse modoa importância deles se equivale e o terapeuta deve dedicar esforçossimilares para compreendê-los (BLACKLEDGE; HAYES, 2001).

Como exposto, as terapia comportamentais vêm sofrendo mudançassignificativas nas últimas décadas. A passagem das três gerações não foiestanque ou eminentemente abrupta. Como todo processo histórico muitasidas e vindas ocorreram e até hoje é possível encontrar terapeutascomportamentais fazendo uso, muitas vezes com êxito, de técnicassurgidas nos tempos de Watson (VERMES; ZAMIGNANI; MEYER, 2010).É nesse contexto de mudança e renovação que nasce da pena de StevenHayes, a Terapia de Aceitação e Compromisso (ACT). Em consonânciacom seus contemporâneos Kohlenberg, Tsai, Jacobson, Christensen eLinehan, Hayes, psicólogo estadunidense ligado a Universidade de Reno(Nevada), está revolucionando a Terapia Comportamental desde os anos80. A seguir será desenvolvida uma exposição dos fundamentos filosóficos,dos pressupostos teóricos, do modelo de psicopatologia e de algumastécnicas clínicas da ACT com o intuito de difundir os conhecimentossobre o tema em território brasileiro, expandir o repertório clínico dosterapeutas comportamentais do país e motivar novos estudos quecomplementem a literatura.

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3

TERAPIA DE ACEITAÇÃO E COMPROMISSO

Nos idos de 1980, Steven Hayes, psicólogo estadunidense, começoua confeccionar, juntamente com seus colaboradores da UniversidadeReno, Nevada, um modelo clínico de intervenção que estava de acordocom os postulados da terceira geração de analistas do comportamento.Entretanto, por acreditar que suas formulações ainda eram poucodesenvolvidas, aguardou quase vinte anos até publicar o primeiro livrosobre tal modelo (HARRIS, 2009). Nascia, então, a Terapia de Aceitaçãoe Compromisso, única psicoterapia desenvolvida conjuntamente com seupróprio programa de pesquisa básica – Teoria dos Quadros Relacionais(RFT) – que tem como campo de investigação a área de cognição elinguagem humana.

A ACT – lida como a palavra act, ação em inglês – vem sendocriticada pela dificuldade em ser classificada. Harris (2008) aponta quesua melhor localização epistemológica situa-se no grupo das “terapiasexistenciais humanísticas cognitivo-comportamentais”. Fundada no fértilterreno da análise do comportamento em pleno movimento terceiro ondistaa ACT agrega aos princípios comportamentais básicos o mindfulness1 e aaceitação como formas de intervir nos mais diversos grupos de pessoasacometidas por psicopatologias. Segundo Fukahori, Silveira e Costa(2005), a ACT é uma alternativa psicoterápica não aversiva que apresentaboa interação com o tratamento medicamentoso, uma vez que este últimofacilita a aceitação dos sentimentos e pensamentos desagradáveis. Quantoao seu objetivo, Hayes, Strosahl e Wilson (1999) esclarecem que é ajudaro cliente a criar uma vida rica, completa e com sentido enquanto se aceita

1Mindfulness, segundo Vandenberghe e Sousa (2006), é uma forma específica de atenção plena.É a atitude intencional e não valorativa de concentrar-se no momento atual. Harris (2009) vai aléme afirma que mindfulness é prestar atenção com flexibilidade, abertura e curiosidade.

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a dor que essa vida, inevitavelmente, trará. Um dos focos do terapeuta daACT está na definição e esclarecimento de valores que possam dirigir ocliente neste modo único de viver. Utilizando os princípios da aceitação edo contato por inteiro com o momento presente busca-se reduzir o impactodos pensamentos intrusivos e sentimentos aversivos no comportamentodo indivíduo que procura tratamento.

Harris (2009, p. 33)2 aponta que a ACT é o “mais alto dos três andaresde uma fabulosa mansão”. Neste edifício metaforizado pelo autor, o segundoandar seria povoado pela Teoria dos Quadros Relacionais, o primeiropela Análise Aplicada do Comportamento (ABA) e o terreno sobre o qual foierguido este “empreendimento imobiliário” seria composto peloContextualismo Funcional (FC) (Fig. 2). Apesar de a imagem idealizadapelo autor estar visivelmente enviesada, levando-se em consideração agrandiosidade da adjetivação, a sua forma torna clara a robustez estruturalconstruída pelos criadores da ACT. Como já exposto em seções anterioresHayes precisou de quase 20 anos para satisfazer-se com sua obra, estasituação deu margem ao desenvolvimento de pesquisas de base econstruções teóricas que embasaram a prática clínica. Harris (2008)aponta que a Terapia de Aceitação e Compromisso é passível de ser

2Original em inglês, tradução nossa.

Fonte: Adaptado de HEASTON, 2010.

RFT

Figura 2 – Metáfora do Empreendimento Psicoterápico

FC

ACT

ABA

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aplicada apenas à nível técnico com grandes possibilidades de êxitoterapêutico, contudo Hayes, Strosahl e Wilson (1999) vão ao encontro doprimeiro autor quando concordam que a compreensão filosófica e teóricadas raízes da ACT abrem espaço para a inovação e variabilidadeinterventiva.

3.1 Base FilosóficaUm observador que dispenda alguns instantes admirando os andares

mais altos da mansão da ACT (Fig. 2) será capaz de perceber através dadecoração das paredes e da mobília, ou melhor, das práticas interventivase assunções clínicas, que existe um conjunto de formulações, métodos emetas bem determinadas. Hayes, Strosahl e Wilson (1999) afirmam queuma filosofia é a descrição de assunções e padrões de maneira não-avaliativa, consequentemente, filosofar seria então a atitude de assumirpostulados. O terreno sobre o qual foram erguidos os alicerces do referidoempreendimento psicoterápico, ou seja, a base estrutural desse sistemade compreensão é conhecida como Contextualismo Funcional (FC)(HARRIS, 2008, 2009; HAYES, 2004; HAYES; STROSAHL; WILSON, 1999).

O FC é uma variedade do pragmatismo e apenas uma das tradiçõesfilosóficas abarcadas pelo Behaviorismo Radical (SKINNER, 2007a). Suaunidade analítica nuclear é a ação em curso num determinado contexto,e os componentes principais de uma análise contextualista funcional são:a) o foco no evento como um todo; b) a sensibilidade para o papel docontexto na compreensão da natureza e da função do evento em análise;c) a ênfase no critério pragmático de verdade; e por último d) metascientíficas específicas para a aplicação de tal critério. Quando se busca aabertura prática que ACT herda do FC é possível encontrar diversosaspectos, desde a formatação das entrevistas iniciais às técnicas deestabelecimento e esclarecimento de valores. O contextualismo funcional,através do seu ramo clínico, a saber, a ACT, interessa-se pelo papel queexercem os eventos psicológicos, definidos por Hayes (2004, p. 646) 3

como “o conjunto de interações em curso entre organismos como umtodo e contextos definidos histórica e situacionalmente”, em determinados

3Original em inglês, tradução nossa.

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contextos. Dois questionamentos auxiliam nas análises embasadas noFC: 1) Em que circunstâncias/contextos ocorre tal evento? e 2) O que seconsegue a partir desse evento? (HARRIS, 2006).

Dentro da concepção dessa base filosófica não há espaço paranenhum tipo de reducionismo uma vez que a consideração holística docontexto deve abranger todos os tipos de variáveis (biológicas, psicológicase culturais). Em decorrência de tal assunção o sentido de uma análiseque privilegie algum desses aspectos se perde. Outro postulado de raizfilosófica que se faz muito presente nas intervenções dos terapeutas daACT diz respeito ao critério de verdade. O contextualismo funcional adotacomo verdadeiro tudo aquilo que funciona para o cumprimento de umameta específica, postulado este que embasa o conceito workability4,livremente traduzido por nós para a língua portuguesa como utilidade. Écomum que em sessões clínicas os clientes da ACT sejam confrontadoscom perguntas do tipo: “A que propósito serve essa atitude?”, ou ainda,“Essa estratégia comportamental é realmente útil?” e frente às respostasobtidas se assume o compromisso com a mudança e o desenvolvimentode repertórios comportamentais mais ricos e flexíveis (HARRIS, 2006).

Uma análise contextualista funcional deve possuir: 1) precisão (deveser específica para um determinado fenômeno); 2) alcance (devedescrever a extensão de uma gama de fenômenos); e 3) profundidade(deve apresentar coerência entre os três níveis de seleçãocomportamental) (HAYES, 2004). O objetivo de uma análise como adescrita é, simultaneamente, prever e influenciar realidades. Uma vez queo contexto é a única possibilidade de manipulação que se oferece aoterapeuta, vale frisar o valor inestimável de uma acurada análise dasvariáveis ambientais. A ACT herda do FC a especificidade interventiva aopasso que, enquanto configura-se como aplicação clínica de uma filosofiarealista, rejeita terminantemente a ontologia. Sendo assim não éconsiderada a essência dos eventos, a verdade não é julgada por suanatureza e sim por sua utilidade (ou função) num determinado contexto.Por conta de todas essas características citadas a ACT floresce num

4A tradução literal do termo é trabalhabilidade, entretanto a tradução da sentença “it´s true if itworks.” (HAYES; STROSAHL; WILSON, 1999, p. 20) - é verdade se funciona – indica que émais adequado adotar o significante utilidade como correlato em língua portuguesa para o conceito.

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terreno onde metas, que mais tarde ficam caracterizados como valores,são indispensáveis (HAYES; STROSAHL; WILSON, 1999). A metáfora dacadeira de três pernas é capaz de sintetizar adequadamente o desenhofilosófico do FC:

Imagine que alguma coisa aconteceu a esta cadeira, e então uma desuas pernas saiu do local em que estava originalmente instalada. Vocêdescreveria esta cadeira como “quebrada”, ou “faltosa”, ou“danificada”? Você a chamaria de “cadeira disfuncional”, ou então“cadeira mal adaptativa”? Eu tenho feito essas perguntas a centenasde terapeutas e eles sempre dizem “sim” à pelo menos uma delas. Oproblema é que essa resposta instintiva – “Sim, existe algo errado,faltoso, ou prejudicado nessa cadeira” – esquece de levar emconsideração todo o contexto da situação. Pensemos em pelo menostrês ou quatro contextos em que nós poderíamos dizer que essa cadeirafunciona efetivamente aos nossos propósitos: pregar uma peça emalguém; criar uma exibição de arte com mobílias quebradas; demonstrarproblemas de design numa aula de construção de mobília [...] Emtodos esses contextos essa cadeira funciona muito efetivamente. Esteexemplo ilustra como o contextualismo funcional ganha o seu nome:ele olha como as coisas funcionam em determinados contextos.(HARRIS, 2009, p. 34-35) 5

3.2 Raízes TeóricasA ACT, numa metáfora bastante usual, é apenas a ponta de um

iceberg (HARRIS, 2006). Já foi relatado que na sua base estrutural está afilosofia contextualista funcional, mas é de um campo intermediário quesurgem suas alternativas práticas e a força motriz que impulsiona apesquisa básica na área. A Terapia de Aceitação e Compromisso nasceconjuntamente com o desenvolvimento da Teoria dos Quadros Relacionais(RFT) (HAYES; BARNES-HOLMES; ROCHE, 2001). Na pena de Harris(2006) a RFT é um programa de pesquisa básica em linguagem ecognição humana que inova o campo e supera a aproximação Skinnerianadesses fenômenos.

5Original em inglês, tradução nossa.

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Segundo Hayes, Barnes-Holmes e Roche (2001) o núcleo dalinguagem e da cognição humana reside na habilidade de aprender aderivar eventos sob controle contextual arbitrário. Dito de outra maneira,os autores se referem à capacidade, exclusivamente humana, apresentadaapós 14-16 meses de vida, de relacionar eventos e prescindir de instruçãodireta para estabelecer novos aprendizados (HARRIS, 2009). A sentença“relacionar eventos” se refere ao comportamento de organizar diferentesexperiências (tanto privadas, como sentimentos, sensações, memórias,pensamentos, entre outras cognições, quanto públicas) que compartilhamalgum tipo de função em conjuntos chamados quadros relacionais. Porexemplo, a palavra “FOGO”, o som da palavra “FOGO”, a imagem dechamas e a sensação aversiva causada pelo contato da pele com aschamas podem ser eventos pertencentes a um mesmo quadro relacionalde um determinado indivíduo.

À capacidade de ampliar as redes relacionais através doestabelecimento de novas relações dá-se o nome de derivação relacional.Outra característica constituinte da cognição humana é a capacidade dederivar relações a partir de propriedades não formais dos eventos (HAYES;BARNES-HOLMES; ROCHE, 2001). O exemplo clássico para essapropriedade é o controle arbitrário ao qual estão submetidas as moedasde 5 e 10 centavos. Uma criança que está dando os primeiros passos noaprendizado das relações financeiras deve afastar-se da lógica que apontao tamanho físico dos objetos como indicativo do seu valor. A criança deveentão aprender que a moeda de 10 centavos apesar de menor em tamanhovale mais que a de 5 centavos. O valor aplicado ao evento não diz respeitoà propriedade física do objeto, mas sim ao que foi estabelecido pelacomunidade verbal como mais e menos valioso.

A RFT tem sido uma das áreas mais ativas em pesquisa básica daúltima década e tem apresentado forte suporte empírico para seuspostulados (HAYES; BARNES-HOLMES; ROCHE, 2001). Nessas pesquisasforam descobertas três propriedades fundamentais dos quadros relacionaisque serão detalhadas a seguir:

a) Bidirecionalidade: também denominada de implicação mútua,esta propriedade acena para a possibilidade de que após uma instruçãodireta do tipo A = B, um humano seja capaz de derivar a relação B = A.Suponhamos que um indivíduo, com domínio exclusivo da língua

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portuguesa, está pela primeira vez assistindo a uma aula de finlandês. Aprimeira instrução que o professor lhe dá é que o conjunto de letras, ouseja, a palavra sitruuna é equivalente em finlandês à palavra limão emportuguês. Mesmo sem ter sido ensinada a relação inversa (palavra limãoé equivalente a palavra sitruuna), o indivíduo frente ao questionamento“Qual a palavra em finlandês para limão?” é capaz de responder comconvicção: sitruuna;

Figura 3 – Propriedade de Bidirecionalidade ou Implicação Mútua

b) Implicações Combinatórias: esta propriedade diz respeito àcapacidade de a partir de instruções diretas do tipo A = B e B = C, derivarrelações inéditas entre os diferentes eventos do tipo A = C, C = A, B = A e C= B. Esta derivação ocorre na proporção de x², em que o x equivale aonúmero de relações diretamente aprendidas. Esta propriedade justifica orápido desenvolvimento da cognição humana a partir dos 16 meses devida, uma vez que no princípio da vida são infinitas as instruções recebidasa potenciação quadrática desse número dá o resultado final do númerode relações derivadas que passam a povoar a rede relacional do indivíduo.Continuando o exemplo anterior, o mesmo indivíduo que aprendeuanteriormente que o conjunto de letras sitruuna equivale à palavra limãorecebeu agora, numa aula de francês, a instrução de que a palavra francesacitron equivale à palavra portuguesa limão. Daí, então, o indivíduo é capazde derivar as seguintes relações: limão = citron, limão = sitruuna, citron =sitruuna e sitruuna = citron. Tendo sido ensinado apenas que a palavrasitruuna significa limão em finlandês, e que citron significa limão emfrancês, o indivíduo do exemplo aprendeu, por si só, a palavra francesapara sitruuna, a palavra finlandesa para citron, a palavra portuguesa parasitruuna e a palavra portuguesa para citron;

Sitrunna = Limão

Instrução Direta Derivação

Limão = Sitrunna

Quadro Relacional

Limão = SitrunnaSitrunna = Limão

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Figura 4 – Propriedade de Implicações Combinatórias

c) Transformação da função do estímulo: muitas vezes confundidacom a propriedade de equivalência de estímulo, diz respeito à capacidadede um evento relacional derivado adquirir as propriedades funcionais deum outro evento, mesmo que não existam semelhanças morfológicasentre eles. Se o mesmo indivíduo do exemplo anterior gostasse muito desuco de limão, e durante uma viagem à França alguém lhe oferecesseum suco de citron, a probabilidade de esse indivíduo aceitar a oferta seriaalta. Mesmo nunca tendo vivido experiência diretas com um suco decitron, a partir da equivalência dos estímulos citron e limão, o indivíduoaprende que o suco de citron é tão saboroso quanto o suco de limão. E amesma situação se aplicaria ao suco de sitruuna.

A linguagem cotidiana à qual estamos expostos dá a esta capacidadede enquadramento relacional (derivar relações, incluir essas relaçõesnuma rede e transferir funções entre estímulos) o nome de “pensamento”.Outros vão além e chamam esse comportamento de “mente” ou ainda,cognição (HARRIS, 2006). Hayes, Barnes-Holmes e Roche (2001) chamama atenção para a diversidade das relações que podem ser aprendidas.Nos exemplos acima apenas a relação de equivalência (igualdade) foicitada, entretanto, como aponta Saban (2011) relações de diferenciação(diferente de), comparação (melhor/pior do que), entre outras, sãoigualmente importantes na expansão cognitiva em seres humanos.

A importância clínica da Teoria dos Quadros Relacionais para aACT se dá na medida em que fica perceptível a rapidez com que osquadros relacionais se expandem e que as funções dadas à um eventotendem a alterar a função de outro membro de uma mesma classe

Sitrunna = Limão

Sitrunna = Citron

Instrução Direta Derivação

Limão = SitrunnaCitron = Sitrunna

Limão = Citron

Citron = Limão

Sitrunna = LimãoSitrunna = CitronLimão = SitrunnaCitron = SitrunnaLimão = CitronCitron = Limão

Quadro Relacional

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relacional conforme compartilham algum tipo de propriedade. Dessemodo, é plausível especular o perigo do aprendizado e inclusão do eventopsicológico “Eu” numa cadeia de significantes como, por exemplo,“depressão”, “doença” e “suicídio”. A RFT tem sido utilizada peloscomportamentalistas para explicar uma série de eventos clínicos como,por exemplo, a depressão, o preconceito, o auto-conceito, o misticismo,entre outros (HAYES; BARNES-HOLMES; ROCHE, 2001). Na tentativa deesclarecer a aplicabilidade da Teoria dos Quadros Relacionais no contextoclínico, Harris (2006 , p.3) 6 propõe a análise do estabelecimento de umquadro de ansiedade:

Para efeitos ilustrativos, imagine uma criança pequena que ouve queela está passeando num “BARCO”, e logo em seguida ela experienciaum grande enjoo por conta do balanço das ondas (por condicionamentorespondente a palavra “BARCO” se torna um aversivo). Em uma aulana escola, essa mesma criança aprende que um “Ferryboat” é umaespécie de barco. Mais tarde então a criança ouve que irá viajar pelaprimeira vez num “ferryboat”, ela então passa a demonstrar sinais deansiedade apesar de nunca ter experenciando uma viagem deferryboat. Esse efeito se baseia na aquisição de funções respondentesde “barco” e na derivação relacional entre “barco” e “ferryboat”. Emefeito a criança não precisa experimentar as possíveis consequênciasaversivas de viajar num ferryboat em águas agitadas para mostrarsinais de ansiedade.

Outra base teórica na qual se sustenta a ACT denomina-se AnáliseAplicada do Comportamento (ABA). A ABA pode ser compreendida como aextensão interventiva da AC. Enquanto na Análise Experimental doComportamento os interesses do profissional estão dirigidos pelos seuspróprios valores, na análise aplicada do comportamento, segundo Ferster(1979), ele é obrigado a se engajar em qualquer problema que o clientetrouxer. Esta poderosa tecnologia intenciona a previsão e a influênciacomportamental. Baseada na teoria de aprendizagem e nos princípioscomportamentais básicos exporta para a ACT, entre outras práticas, aanálise da tríplice contingência (HARRIS, 2009). Nesse sentido,estabelece-se como ponto de partida para a mudança comportamental achamada análise ABC, na qual A refere-se aos antecedentes – o que inclui

6Original em inglês, tradução nossa.

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eventos privados, estados físicos e fatores ambientais -, o B à resposta emestudo, e o C às consequências da ação.

Por estar no campo prático, ou seja, em contato direto com oseventos de interesse dos analistas do comportamento, a ABA exerce umafunção primordial para o desenvolvimento da Ciência do Comportamento:abastecer os pesquisadores e teóricos das áreas de experimentação efilosofia com os problemas e desafios impostos pela realidade (HAYES;STROSAHL; WILSON, 1999). E é nesse sentido que os terapeutas da ACTtêm trabalhado, há mais de 20 anos. O fomento às pesquisas de base, oincentivo à criatividade nas tecnologias clínicas e a constante difusão doconhecimento são as formas mais eficientes de se manter uma íntimarelação entre filosofia, teoria e prática.

3.3 Modelo de PsicopatologiaSegundo Kessler et al.(19947 apud HAYES; STROSAHL; WILSON,

1999), em qualquer ano, a prevalência de índices de desordens mentaischega a 30% da população. O fato mais marcante da humanidade seria,então, a dificuldade de ser feliz. Diferentemente dos outros animais, abrigo,comida, bebida, calor, estimulação, diversão e saúde física não sãosuficientes para trazer felicidade aos humanos. Sob influência direta dasformulações da RFT um dos pressupostos da ACT reza sobre acapacidade destrutiva da linguagem, e por um infortúnio contingencial, aespécie humana foi agraciada com essa ferramenta. Hayes, Strosahl eWilson (1999) afirmam que “o sofrimento é característica básica da vidahumana” (p.1, tradução nossa), e sendo assim a não aceitação dessacondição é o principal fator a ser combatido durante um processopsicoterápico. O modelo de psicopatologia da ACT pode ser representadopor um hexágono (Fig. 3) no qual cada um dos vértices representa um dosprocessos que, segundo os autores, contribuem para o sofrimento humanoe que, quando interagem entre si, dão origem à inflexibilidade psicológica,ou rigidez comportamental.

7KESSLER, R; McGONAGLE, K; ZHAO,S; NELSON, C; HUGHES, M; ESHLEMAN, S;WITTCHEN, H; KENDLER, K. Life time and 12-month prevalence of DSM-III-R psychiatricdisorders in the United States: Results from the National Comorbity Study. Archives of GeneralPsychiatry, [S.l], vol. 51, p.8-19.

29

Mesmo conhecendo a indicação de Hayes, Strosahl e Wilson (1999)de que os processos nunca ocorrem individualmente e que a riqueza dapsicopatologia está nas relações entre os vértices (representadas pelaslinhas do hexágono), a seguir abordaremos, por razões didáticas,separadamente, cada um dos núcleos patológicos que compõem omodelo de psicopatologia8 da Terapia de Aceitação e Compromisso, eilustraremos a explanação com algumas técnicas utilizadas na reversãode tais processos.

3.3.1 Fusão CognitivaTambém conhecida como contexto de literalidade, é definida como

o processo psicológico no qual o indivíduo tende a dar caráter literal aos

Esquiva deexperiência

Falta de clareza devalores;

predominância dainfluenciabilidade e

da esquiva desituações

Fusão Cognitiva Inércia, impulsividade epersistência na esquiva

Fonte: HAYES, S; PISTORELLO, J; BIGLAN, A. p.81-104, 2008

Figura 5 – Modelo de Psicopatologia da ACT

8 Vale ressaltar que, segundo Saban (2011), a ACT entende psicopatologia como comportamentosque possuem componentes aversivos, o que exclui patologias de origem orgânica.

Predominância do passado conceitual e deum futuro temido; baixo autoconhecimento

Inflexibilidade

psicológica

Atrelamento ao eu-conceitual

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eventos privados. Pensamentos, sentimentos, memórias e sensaçõesfundem-se à identidade do indivíduo que, desse modo, passa a operar apartir da realidade criada pela sua cognição, o que acarreta o afastamentodas respostas comportamentais dos antecedentes disponíveis noambiente na forma como se apresentam. Saban (2011, p.23) ensina que“quando se identificam com seus eventos privados [...] as pessoas os levammuito a sério e, consequentemente, sofrem além do necessário”. Ofuncionamento comum da comunidade verbal ensina aos indivíduos abuscar sentidos para o mundo debaixo da pele e criar coerência entreeles, o problema apontado por Hayes, Strosahl e Wilson (1999) reside naarbitrariedade com que isso é feito. Como resultado desse modo defuncionar, surgem as relações em que sentimentos aparecem comocausas de comportamentos e consequentemente devem ser evitados, oque obriga o indivíduo a lutar contra uma parte significativa de si mesmo.As técnicas de desfusão cognitiva ou desliteralização visam corroer aestreita relação verbal que, por aprendizado relacional, estabelece funçõespara estímulos privados (HAYES et al., 2004). Através dos paradoxos,metáforas, exercícios como os de mindfulness e a Repetição de Titchnero indivíduo aprende a interagir de modo mais saudável com seus eventosinternos. O cliente aprende, então, que cognições são apenascomportamentos que ocorrem no “aqui” e “agora”, e logo em seguidaserão precedidos dos por outros. Em prol de alcançar êxito, os terapeutasda ACT devem ensinar seus clientes a perceberem as armadilhas dalinguagem e prepará-los para abandonar a luta contra seus eventosprivados (HARRIS, 2008).

3.3.2 Esquiva experiencialSaban (2011) defende que a habilidade de evitar eventos privados

aversivos é adquirida filogeneticamente. Acrescido a isto existe a regrasocial estabelecida e mantida pela cultura ocidental da busca incessantepela felicidade plena e supressão dos sinais de tristeza. Por sua capacidadede evitar perigos, a espécie humana sobreviveu às mais difíceis situações,entretanto, quando se dá a tentativa de importar as técnicas de evitaçãodo mundo observável para o universo debaixo da pele o resultado écatastrófico. A atitude de afastar-se de potenciais eventos aversivos (muitas

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vezes apenas em nível cognitivo) prejudica a conquista de reforçadores elimita o campo operacional dos indivíduos. As técnicas de combate àesquiva experiencial são englobadas por Hayes et al. (2004) no núcleoAceitação. Etimologicamente, o termo significa “aceitar o que é oferecido”,a ACT promove tal atitude colocando o cliente em contato com os custosdo controle, fracassado, dos eventos privados. A persuasão verbal e osinsights intelectuais são evitados em favor de intervenções evocativas eexperienciais; nesse sentido o cliente aprende, a partir do contato diretocom as contingências ambientais naturais, que é possível, por maisintensos que possam parecer, experienciar sentimentos, percebersensações corporais, identificar pensamentos e relembrar memórias semperigo. Hayes, Strosahl e Wilson (1999) apontam que comportamentosque geralmente seriam evitados, por conta dos respondentes evocadosconcomitantemente, numa terapia embasada na ACT, são perseguidosno contexto da aceitação da ocorrência de tais respostas.

3.3.3 Predominância do Passado Conceitual e AutoconhecimentoLimitado

Segundo Luoma, Hayes e Walser (2007), a ausência de contatodireto com o momento presente faz com que o comportamento do indivíduotenda a seguir programações históricas, o que resulta em baixavariabilidade e exclui novas topografias de respostas. Indivíduos que estãofortemente atrelados ao passado conceitual apresentam poucaconsciência do fluxo contínuo dos seus eventos privados, e desse modo,por condicionamento aversivo, tornam-se propensos a responderindiscriminadamente às situações. Por este motivo, além de outros citadospor Hayes (2004), existe íntima correlação entre a esquiva experiencial,autoconhecimento limitado e alexitimia. Hayes, Pistorello e Biglan (2008)batizaram o conjunto das técnicas de intervenção voltadas para amodificação deste núcleo patológico de Estar Presente. Tais práticaspromovem o contato constante e não-valorativo com os eventospsicológicos e do ambiente na medida em que ocorrem. Segundo estesautores, experienciar as contingências naturais diretamente aumenta aflexibilidade comportamental e reduz a elaboração de auto-regrasdeficientes. Hayes (2004) chama a atenção dos terapeutas para que

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respeitem o timing dos seus clientes e apenas sugiram alternativas, nuncaimponham seus valores e crenças em forma de novas regras.

3.3.4 Falta de clareza de valoresLuoma, Hayes e Walser (2007) afirmam que pessoas criadas em

famílias caóticas nas quais a vida era imprevisível, e geralmente frustrante,podem evitar construir seu futuro embasado em valores numa tentativa deevitar mais perdas e dor. No sistema da ACT, os valores não devem seravaliados per si, entretanto servem como balança para que se avalie ocaminho que se está seguindo. Valores são definidos como característicasescolhidas para a vida, que são representadas por padrões contínuos decomportamento. Os autores concebem valores como um modoconscientemente escolhido de viver uma vida que faça sentido. A ausência,e/ou falta de clareza desses valores torna a tarefa de selecionarcomportamentos adequados impossível. As técnicas da ACT vislumbramfomentar a criação de uma “bússola comportamental”, em que o indivíduoperceba claramente o caminho que deseja conscientemente seguir e apartir de então estabelecer passos/comportamentos que o direcionempara tal. Segundo Hayes et al. (2004), valores são ações escolhidas quenunca podem ser obtidas como objetos, mas apenas ser instanciadasmomento a momento. Os clientes são, então, desafiados a considerar oque eles querem para suas vidas em diferentes domínios, como, porexemplo, carreira, família, relacionamentos interpessoais, espiritualidade,saúde, amizades, crescimento pessoal etc. O objetivo da ACT, enquantoTerapia Comportamental, é colocar o cliente em movimento para que eleseja capaz de viver propositada e vitalmente tomando seus valores comonorte (HAYES; STROSAHL; WILSON, 1999).

3.3.5 Impulsividade, Inércia ou Persistência na EsquivaEste núcleo patológico diz respeito à inabilidade de comportar-se

efetivamente de acordo com os valores eleitos pelo próprio cliente. Metasde curto prazo (por exemplo, sentir-se bem momentaneamente, estar certonuma determinada situação, manter o self conceitual) funcionam comoalívio psicológico, geralmente, quando o indivíduo está diante de situações

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de mudança, como é o caso da experiência de psicoterapia. A partir de talconstatação, Luoma, Hayes e Walser (2007) apontam que uma pessoapode ser consumida, metaforicamente por tais processos e nuncaaventurar-se a novos caminhos (valores) que garantam uma vida maisprofunda, com significado e vitalidade. Os autores afirmam que é comose o indivíduo “sempre afiasse o machado, nunca conseguindo a chancede colocá-lo em uso” (p.17, tradução nossa). A ACT concentra no núcleoAção Comprometida as estratégias de mudança elaboradas para combatera inflexibilidade comportamental, tais como definir metas em áreasespecíficas, adotar condutas, antecipar barreiras psicológicas, fazer emanter compromissos (muitas vezes publicamente) de ação. Hayes et al.(2004) listam a psicoeducação, resolução de problemas, tarefascomportamentais, treinamento de habilidades e técnicas de exposiçãocomo táticas de intervenção úteis para a reversão dos processos dessenúcleo patológico.

3.3.6 Atrelamento ao “eu” conceitualO self conceitual define-se por uma coleção de relações verbais

autorreferentes que geralmente são descritivas e avaliativas. Hayes et al.(2004) dissertam que os indivíduos constroem ao longo das vidas suas“histórias”, nesse relato estão contidos detalhes históricos, relações decausa-efeito e explicações para comportamentos atuais que sustentam acondição do indivíduo. A ACT não busca discutir a validade/veracidadedos fatos descritos, mas analisar a funcionalidade das relaçõesestabelecidas. Hayes, Strosahl e Wilson (1999) apontam que não há nadaa ser feito com o eu-estórico, uma vez que ele se tornou tão restrito eengessado que padrões comportamentais inflexíveis são o resultadoinevitável do mesmo. Estratégias de transformação do sentido de selfcomeçam pelo descolamento do indivíduo da sua estória. Os terapeutasda ACT têm como objetivo ensinar aos seus clientes a experimentar o selfcomo um contexto em que eventos privados ocorrem. Exercícios detomada de perspectiva (perspective taking) tendem a colocar os indivíduosem contato direto, efetivo e indefeso com situações antes evitadas. A grandevantagem apontada por Luoma, Hayes e Walser (2007) do sentidotranscendente de self é a perda de valor aversivo dos conteúdos da

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consciência, o que permite transformações de função de estímulo egarante variabilidade comportamental.

3.4 ACT e mindfulnessEnquanto abordagem de terceira geração da AC, a Terapia de

Aceitação e Compromisso, faz uso das técnicas de mindfulness e deaceitação como meios para atingir o sucesso terapêutico9. Apesar daaplicação explícita do mindfulness nas psicoterapias comportamentaisdatarem dos anos 90, as primeiras ondas da AC já apresentavamintervenções com elementos característicos dos exercícios de atençãoplena (VANDENBERGHE; SOUSA, 2006). Classens (2010) aponta que ainserção das práticas de mindfulness na medicina comportamental deu-se por contribuição do programa de redução do estresse de Kabat-Zinnnos anos 80. No que tange os resultados empíricos da aplicação dostreinos de mindfulness, vale frisar, como expuseram Vandenberghe e Sousa(2006), que este se mostrou eficaz na diminuição de problemaspsicossomáticos, dor crônica, fibromialgia, transtornos de ansiedade,psoríase e outros.

Kabat-Zinn (198210 apud. VANDENBERGHE; SOUSA, 2006) definemindfulness como uma forma específica de atenção plena. É a habilidadede manter a concentração no momento atual de maneira intencional esem julgamentos. A prática do mindfulness envolve estar em contato diretocom as contingências atuais e não vagar pelas memórias e pensamentos.O praticante é convidado a perceber tudo aquilo que lhe ocorre no exatomomento em que se concentra, o indivíduo é então, nas palavras de Kabat-Zinn, ensinado a abandonar o modo automático de funcionar em prol docontato pleno com o que o ambiente lhe oferece.

9Sucesso terapêutico deve ser compreendido como a habilidade de entrar em contatoconscientemente com o momento presente de modo a não julgar as experiências internas essumir comportamentos pautados em valores que possam guiar o indivíduo para uma vidaintensa e com sentido (HAYES, 2004).10 KABAT-ZINN, J. An outpatient program in behavioral medicine for chronic pain patients basedon practice of mindfulness meditation: Theoretical considerations and preliminary results. GeneralHospital Psychiatry, [S.l.], vol. 4, 1982, p. 33-47.

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Os exercícios de mindfulness utilizados pelos terapeutas da ACTtêm origem em práticas orientais de meditação e yoga. Os clientes sãoconvidados a executar tarefas formais simples como realizar desde umavarredura completa do próprio corpo, identificando pontos de tensão ediferenças de temperatura, até monitorar o fluxo de ar decorrente da suarespiração durante suas atividades diárias. Enquanto a sociedade modernaprega o “sentir-se bem” enfatizando o vocábulo “bem”, o mindfulness buscaenfatizar o “sentir-se” (VANDENBERGHE; SOUSA, 2006).

Em muitos aspectos, a própria definição de mindfulness chega aconfundir-se com a ACT. A valorização do contato direto com ascontingências, a redução do controle verbal, a promoção de um sentidotranscendente de self (eu-observador), o enfraquecimento da esquivaexperiencial, além da redução da reatividade cognitiva diante de mudançasemocionais demonstram a congruência entre ambas. Apesar dodetalhamento epistemológico e do caráter eminentemente científico daabordagem elaborada por Hayes, Strosahl e Wilson (1999), é possívelperceber claramente o encaixe exato entre a Terapia de Aceitação eCompromisso e o mindfulness (CLASSENS, 2010). Numa seara maispragmática, Vandenberghe e Sousa (2006) propõem que os exercíciosde atenção plena, no contexto de uma psicoterapia embasada na ACT,sejam responsáveis por: 1) reduzir a esquiva experiencial, principal fontede sofrimento humano; 2) eliminar o contexto de literalidade no qualemoções e pensamentos controlam o comportamento, uma vez que sãotidos como objetos e reflexos do real; 3) destruir o contexto de avaliaçãoque diz respeito à tendência de categorizar experiências em boas/más,gerando, como consequência direta, a evitação ou aproximação dascontingências que as produziram; 4) diminuírem o contexto de controle,ou seja, a propensão à lutar contra eventos privados e forçar a regulaçãoemocional; 5) corroer o contexto de dar razões, que são tentativas debuscar coerências e explicações para os problemas do cliente (“história”);6) fomentar a elaboração de um nível transcendente de vivência do “eu”,no qual o self é percebido como um contexto no qual ocorrem fenômenos(pensamentos, sentimentos, sensações) passíveis de observação.

Os componentes do mindfulness – observar, descrever e participarplenamente – são também citados por Saban (2011) como objetivos aserem alcançados durante a psicoterapia pautada na ACT. A habilidade

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de observar, segundo Vandenberghe e Sousa (2006), diz respeito a estaratento a eventos, emoções e diversos aspectos do próprio comportamento,a capacidade de descrever é entendida como a possibilidade de elaborarum relato verbal eminentemente descritivo – não avaliativo ou explicativo– do que foi anteriormente observado. E, por último, a capacidade departicipar plenamente refere-se à posição de agir de forma efetiva deacordo com valores, deixando de lado julgamentos, avaliações ecategorizações contraproducentes.

Como visto, a prática do mindfulness em intervenções apoiadas nomodelo da Terapia de Aceitação e Compromisso se justifica a partir tantode questões conceituais quanto de objetivos terapêuticos. Apesar dopreconceito que vêm sofrendo, ACT e Mindfulness têm encontradosustentação empírica nas mais diversas áreas de aplicação (FLETCHER;HAYES, no prelo). Além dos casos citados por Vandenberghe e Sousa(2006) acrescenta-se ao debate o êxito terapêutico alcançado a partir daaplicação de exercícios de mindfulness durante sessões de psicoterapiaem casos de transtorno de ansiedade generalizada, transtorno obsessivo-compulsivo (BAER, 2003) e redução de incidência de re-hospitalizaçãoem pacientes psicóticos (BACH; HAYES, 2002). Tomando como ponto departida o debate acerca da eficácia deste que é um dos elos fundamentaisda ACT serão discutidos em seguida os diferentes contextos em que foramencontrados dados empíricos que dão sustentação ao modelo.

37

4

APLICAÇÕES

Harris (2008) aponta que a ACT é sustentada por um rico corpo dedados empíricos que demonstram sua efetividade e justificam suaaplicação no tratamento de variadas psicopatologias. Fukahori, Silveira eCosta (2005) indicam que a ACT tem sido frequentemente usada emintervenções nas áreas dos transtornos de ansiedade, transtornosalimentares, no tratamento da tricotilomania, no tratamento do abuso desubstâncias e nos casos em que as tentativas de controle do ambientesão fadadas ao fracasso, como por exemplo, situações de luto, dor crônicae no sofrimento causado pelo câncer. Harris (2009) acrescenta asinvestidas da ACT no terreno da depressão, da esquizofrenia, do controlede peso, da autogestão da diabetes, do stress no trabalho e no tratamentodo transtorno de personalidade borderline. As intervenções da ACTcaracterizam-se pelo empoderamento e pela validação das experiênciasdos clientes. Diante disto, o reforçamento das práticas culturaispatologizantes, como, por exemplo, a rotulação diagnóstica, afasta-sedos princípios dessa e das demais abordagens de terceira onda (HAYES,2004).

Hayes, Strosahl e Wilson (1999) afirmam que, apesar dos mais de20 anos de ACT, a literatura na área ainda não amadureceu o suficientepara que o modelo se firmasse no cenário dos tratamentos das doençaslistadas na edição mais atual do Manual Diagnóstico e Estatístico dosTranstornos Mentais (DSM-IV). Contudo já existe uma quantidadeconsiderável de experimentos metodologicamente criteriosos provandosua equivalência, e até mesmo superioridade, no que tange a efetividadedas intervenções baseadas na aceitação e compromisso quandocomparadas aos procedimentos clássicos da terapia cognitivo-comportamental (CBT) (HARRIS, 2008). A seguir serão expostos algunsexemplos encontrados na literatura de diferentes contextos em que a ACT

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foi aplicada de modo efetivo. Vale elucidar que, por tratar-se de um dosobjetivos do presente trabalho, dar-se-á maior ênfase aos resultadosencontrados pelos autores, em detrimento da discussão dos aspectosmetodológicos das pesquisas.

O primeiro contexto de aplicação da ACT a ser discutido é também aúnica pesquisa empírica sobre o tema encontrada na literatura nacional.Os autores do referido texto tiveram como sujeito um indivíduo do sexomasculino de 24 anos que frequentou 16 sessões clínicas em que a ACT foiutilizada como modelo de tratamento psicológico para a queixa deexibicionismo. No tratamento da parafilia através da aceitação de estadosdo organismo e de emoções indesejáveis, Fukahori, Silveira e Costa (2005)obtiveram, entre o primeiro dia de autoregistro e o sexagésimo quarto, umaredução de 100% na taxa de respostas de exposição imprópria dos genitaise masturbação (Graf. 1). Além deste efeito percebido nos comportamentospúblicos, no que tange os eventos privados, a frequência de pensamentosrelacionados ao exibicionismo reduziu consideravelmente, apesar de nãoter sido extinta da amostra comportamental. Os autores relatam ainda queem contatos telefônicos realizados 4 e 12 meses após a última sessão detratamento foi relatado pelo cliente que as modificações comportamentais

Fonte: FUKAHORI; SILVEIRA; COSTA, 2005, p.74.

Gráfico 1 – Autoregistro das frequências do pensamento intrusivo, da exibição e damasturbação com estímulos parafílicos em registros semanais realizados

(aleatoriamente) ao longo do tratamento.

Pensamento Exibição Masturbação

6

5

4

3

2

1

0

1º 10º 19º 28º 37º 46º 55º 64º

Freq

uênc

ia

Ordenação dos dias de registro

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se mantiveram e o repertório comportamental adquirido nas sessões ohaviam direcionado para a conquista de uma relação amorosa estável e umemprego satisfatório.

Numa pesquisa conduzida por Twohig, Shoenberger e Hayes (2007)foi investigada a eficiência de uma versão abreviada da Terapia deAceitação e Compromisso no tratamento do abuso de maconha. Trêsadultos que atendiam aos critérios de dependência da droga frequentaramoito sessões semanais de 90 minutos cada e, com o utilização deautoregistro e testes químicos randomizados, foi percebido que o consumode maconha atingiu o índice 0 em todos os participantes do estudo apóso período de tratamento (Graf. 2)1. Os autores indicam que o tratamentodo abuso de substâncias químicas com a ACT proporciona um ambienteem que a sensação de necessidade incontrolável de consumir epensamentos acerca do uso podem ser experimentados sem que sejamtransformados em ação. Twohig, Shoenberger e Hayes apontam aindaque a abordagem da ACT se diferencia da dos demais tratamentos por

1 Título original em inglês, tradução nossa.

Gráfico 2 – Auto registro de frequência diária de consumo de maconha por 3 participantesdurante linha de base, tratamento e follow-up.

Fonte: TWOHIG, SHOENBERGER; HAYES, 2007, p.627.

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não focar intervenções no controle ou extermínio dos eventos privadosque hipoteticamente controlariam as recaídas. Uma vez que a esquivaexperiencial e a fusão cognitiva são substituídas por comportamentosdirigidos pelas contingências momentâneas o indivíduo aprende que elepode sentir intensamente o desejo pela maconha (aceitação); pensarque não conseguirá viver sem a droga; e ainda assim continuar abstinente.No follow-up da pesquisa após três meses, um indivíduo permaneciaabstinente e os outros dois haviam retomado o consumo, mas emquantidades muito menores quando comparadas à linha de base do iníciodo tratamento.

Numa segunda pesquisa em que a ACT foi aplicada no contexto dadependência de substâncias químicas, os autores concluíram que omodelo de tratamento proposto não somente influenciou na redução dafrequência do consumo, alcançando a manutenção da abstinência nofollow-up de 1 ano, como também foi responsável pela queda do índicerelativo à inflexibilidade psicológica (STOTTS, MASUDA, WILSON, 2009).Neste relato de programa de desintoxicação de Metadona, substânciasubstitutiva para o tratamento de dependência de heroína e outrosopiáceos, a ACT foi aplicada em 24 sessões semanais de 50 minutos emum voluntário de 57 anos que se candidatou ao tratamento. O programa,que foi dividido em duas fases que consistiam de um mês de estabilizaçãodo consumo e cinco meses de redução gradual do uso de Metadona,apresentou resultados bastante convincentes quanto à eficiência da terapiana redução do nível de medo da desintoxicação e do consumopropriamente dito (Graf. 3)2.

Stotts, Masuda e Wilson (2009) indicam que, atualmente, o programade Manutenção com Metadona (MM) é, apesar das críticas acerca dasquestões éticas envolvidas na substituição das dependências, o tratamentopor excelência para a adicção em opiáceos. Apesar da sua reconhecidaeficiência, os autores listam os intensos sintomas relacionados às tentativasde desintoxicação da Metadona durante o programa de MM, que vãodesde náusea, diarreia, e dor nos ossos à ansiedade, insônia e sofrimentopsicológico. Estratégias comportamentais como a dessensibilizaçãosistemática e o manejo de contingências têm apresentado resultados

2 Título original em inglês, tradução nossa.

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Fonte: STOTTS, MASUDA ; WILSON, 2009, p.12.

Gráfico 3 - Posologia da Metadona, experiências subjetivas na retirada dos opiáceos, o medoda desintoxicação e inflexibilidade psicológica no decorrer do programa ACT na desintoxicação

de Metadona.

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significativos para o processo de abandono da substância substitutiva,entretanto, a ACT surge como alternativa promissora uma vez que ensinaos indivíduos a lidar de um modo diferenciado com o estresse decorrenteda redução do consumo (HAYES et al., 20043, apud STOTTS, MAUDA,WILSON, 2010). A pesquisa aponta, ainda, que os intensos exercícios demindfulness, as estratégias de definição de valores e a mudança deperspectiva proporcionada pela psicoterapia tiveram sua eficiênciacomprovada por medições acuradas como o Inventário de Depressão deBeck-II, testes laboratoriais de amostras de urina, além de outras medidaspsicométricas que pretendiam avaliar e confirmar os sintomas queacompanharam o progresso do indivíduo até o alcance da abstinênciatotal.

Strosahl (2004) afirma que o modelo da ACT é útil também notratamento de indivíduos diagnosticados com transtorno de personalidadeborderline. A partir da estimativa de que entre 1 e 1,5% da populaçãoapresentam transtornos de personalidade (LIVESLEY, 20014 apudSTROSAHL, 2004) e que esta estreita faixa nosográfica consome cercade 40% de todos os recursos disponíveis para a saúde mental (STROSAHL,19915 apud STROSAHL, 2004) surge a necessidade de tecnologiascomportamentais capazes de unirem-se aos tratamentos tradicionais, comespecial ênfase a Terapia Comportamental Dialética (DBT), e minimizaros efeitos do referido eixo de psicopatologias. No estudo apresentado porStrosahl (2004), a eficácia da ACT foi testada a partir do resultado de umprograma de 12 sessões em grupo com um total de 60 pacientes. Naquelesindivíduos que completaram a agenda estipulada pelos pesquisadores,foi identificada uma queda acentuada nos índices de depressão além deprogressos significativos no que tange à conquista de objetivos de vida econsecução de metas. O autor atesta, ainda, que o grande trunfo da ACT,

3 HAYES et al. Measuring experiential avoidance: A preliminary test of a working model. ThePsychological Record, [S.l.], vol.54, p.553-578, 2004.4 LIVESLEY, W. Handbook of personality disorders: Theory, research and treatment. New York:Guilford Press, 20015 STROSAHL, K. Treatment of the personality disordered patient. In: AUSTAD, C; BERMAN, W.Psychotherapy in managed health care: The optimal use of time and resources. Washington DC:American Psychological Association. 1991, p.185-201.

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enquanto base terapêutica para indivíduos multiproblemáticos, rótulo,segundo Strosahl (2004), mais adequado para pacientes bordelíneos, é aatitude não avaliativa oriunda do pragmatismo que apoia tal modelo deintervenção. Uma vez que as análises comportamentais são efetuadas apartir da função das respostas, e não através da sua estética, o terapeutapode, doravante, modelar comportamentos que estejam de acordo comas consequências e valores estipulados pelo indivíduo.

Foi encontrado, na literatura, um relato da aplicação da ACT emcontexto hospitalar. Robinson et al. (2004) atestam que o Modelo de Atençãoà Saúde da ACT (ACT-HC Model) tem se mostrado responsivo nos maisdiversos grupos de pacientes atendidos por profissionais dos serviços decuidado primário. Entre os maiores beneficiados de tratamentos queenglobam intervenções embasadas na ACT-HC Model estão os indivíduosque apresentam como sintomas desordens somáticas, síndrome da fadigacrônica, crianças com transtorno do déficit de atenção e hiperatividade(TDAH), além dos acometido por doenças crônicas como o diabetes e aepilepsia. Robinson e colaboradores (2004, p. 295) 6 afirmam que

o objetivo da ACT no contexto hospitalar é ajudar os pacientes aimplementar com sucesso comportamentos consistentes com seusvalores na presença de eventos privados aversivos disparados pordesconforto médico, condições crônicas e/ou elevado risco de morte.

Os autores apontam ainda que mais de 14% das queixas nosatendimentos de cuidado básico envolvem desordens somatoformes quese relacionam intimamente com tentativas de controle de sensaçõescorporais, emoções e pensamentos. Um dos casos que ilustra o relato éde um garoto de 7 anos que apresentou quadro de insônia e dor abdominaldissociado de base orgânica. Após uma série de intervenções, que incluíamexercícios de mindfulness, o garoto foi ensinado a lidar de uma novamaneira (aceitação) com suas sensações internas e inevitavelmente suasqueixas cessaram completamente. Outro exemplo dado por Robinson etal. (2004) de aplicação da ACT em moldes hospitalares enfatiza o papeldo terapeuta na tarefa de reestruturar as concepções dos pacientes acercadas crises de epilepsia e das variáveis que as desencadeiam. Segundo osautores estratégias de intervenção consistentes com o modelo da ACT

6 Original em inglês, tradução nossa.

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são capazes de aumentar a flexibilidade comportamental e reduzir aprobabilidade de ocorrência de crises.

No contexto do tratamento dos transtornos de ansiedade, a ACTencontra fortes aliados. Gould, Otto e Pollack (19957 apud ORSILLO et al,2004) identificaram que a CBT alcançou resultados positivos em 68-88%dos casos de transtorno do pânico, e nos casos de transtorno ansiedadesocial (fobia social) alcançou 89% de efetividade (HEIMBERG et al, 19988

apud ORSILLO et al., 2004). Ao lado dos tratamentos de exposição e dosmodelos de prevenção de resposta, a CBT é o estado-da-arte para controledo transtorno de ansiedade generalizada (TAG), transtorno obsessivocompulsivo (TOC), e juntos têm apresentado efeitos significativos que semantêm ou até progridem em follow-ups de 6-12 meses (BORKOVEC;RUSCIO, 20019 apud ORSILLO et al., 2004). Orsillo e colaboradores (2004)defendem que a ACT aparece como uma promessa significante nessecontexto já que, como proposta integrativa, é em muitos momentosconsistente com a terapia de exposição. Os autores apontam que asestratégias de intervenção da ACT objetivam o desmembramento denúcleos patológicos coincidentes com as variáveis psicopatogênicas dediversos transtornos de ansiedade, dentre eles o transtorno do pânico, oTOC, o TAG, as fobias específicas e a fobia social. Casos citados porOrsillo et al. (2004) – por exemplo Block e Wulfert (2002)10; Luciano e

7 GOULD, R; OTTO, M; POLLACK, M. A meta-analysis of treatment outcome for panic disorder.Clinical Psychology Review, [S.l.], vol.15, p.819-844.8 HEIMBERG, R; LIEBOWITZ, M; HOPE, D; SCHNEIER, F; HOLT, C; WELKOWITZ, L;JUSTER, H; CAMPEAS, R; BRUCH, M; CLOITRE, M; FALLON, B; KLEIN, D. Cognitivebehavioral group therapy vs. phenelzine therapy for social phobia: 12-week outcome. Archives ofGeneral Psychiatry, [S.l.], vol.55, p.1133-1141.9 BORKOVEC, T; RUSCIO, A. Psychotherapy for generalized anxiety disorder. Journal ofClinical Psychiatry, [S.l.], vol.62, 2001, p. 37-45.10 BLOCK, J; WULFERT, E. Acceptance or change of private experiences: A comparativeanalysis in college students with a fear of public speaking. In: ZETTLE, R. Recent outcomeresearch on Acceptance and Commitment Therapy (ACT) with anxiety disorders. Symposiumconducted at the 28th Annual Meeting of the Association for Behavior Analysis,Toronto, Ontario.

2002.

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Gutierrez (2001)11; e Zettle (2003)12 – demonstram a efetividade dastécnicas da ACT no tratamento da ansiedade através de abordagensdirecionadas para a redução do controle emocional, da esquivaexperiencial e da fusão cognitiva, bem como para o aumento do contatocom o momento presente, do descolamento do passado conceitual e dapercepção do self como um contexto.

No que tange o uso da ACT como medida terapêutica em casos dedepressão é notória a contribuição de Dougher e Hackbert (2003). Emseu estudo os autores deram maior ênfase no quesito etiológico dotranstorno que acomete cerca de 2,2% da população masculina dosEstados Unidos da América. Kanter, Baruch e Gaynor (2006) afirmam que,por ter se tornado um diagnóstico tão comum, a depressão passou a serconhecida como a “gripe da doença mental”. Apesar de sua prevalência,dos prejuízos sociais e econômicos desencadeados pela sua eclosão areferida psicopatologia foi relativamente negligenciada pelos analistas docomportamento por muitos anos. Como já foi dito anteriormente, Fukahori,Silveira e Costa (2005) acenam para a boa relação entre farmacoterapiae a ACT, Dougher e Hackbert (2003) vão ao encontro desta posição quandoconfirmam os amplos efeitos benéficos da combinação entre asmodalidades terapêuticas nos casos de depressão. A eficácia de umaversão seminal da ACT, chamada de distanciamento compreensivo, foitestada primeiramente em uma amostra de 18 mulheres portadoras dodiagnóstico de transtorno depressivo maior. Zettle e Hayes (198613 apudKANTER; BARUCH; GAYNOR, 2006) dividiram a amostrarandomicamente em três grupos que foram tratados pelo mesmo terapeuta,entretanto através de técnicas diferentes: um grupo foi tratado a partir dodistanciamento compreensivo, outro a partir de terapia cognitiva semtécnicas de distanciamento e o último foi tratado com terapia cognitivacompleta. Os autores compararam os resultados obtidos e concluíram

11 LUCIANO, C; GUTIERREZ, O. Anxiety and Acceptance and Commitment Therapy (ACT).Análisis y Modificación de Conducta, [S.l.], vol. 27, 2001, p. 373-398.12 ZETTLE, R. Acceptance and commitment therapy (ACT) versus systematic desensitization intreatment of mathematics anxiety. Psychological Record, [S.l.], vol. 53, 2003, p. 197-215.13 ZETTLE, R; HAYES, S. Dysfunctional control by client verbal behavior: The context of reason-giving. The Analysis of Verbal Behavior. [S.l.], vol. 4, 1986, p. 30-38.

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que as clientes que passaram pelo modelo seminal da ACT apresentarammenor crença nos pensamentos depressivos e menos sintomasdepressivos no follow-up de dois meses. No caso clínico relatado porDougher e Hackbert (2003) uma cliente de 23 anos que buscou terapiapara depressão foi tratada a partir de uma combinação entre elementosda Psicoterapia Analítico Funcional (FAP) e da ACT. Os autoresconfirmaram a aplicabilidade dos pressupostos da aceitação e docompromisso no tratamento dos transtornos de humor tomando comoponto de partida a remissão completa dos sintomas em não mais de 18sessões de terapia individual, mesmo não tendo estabelecido este fimcomo objetivo terapêutico.

Bach (2004) afirma que as psicoses de modo geral, em especial aesquizofrenia, têm sido consideradas psicopatologias relativamentedifíceis de tratar. Apesar da grande variedade e da comprovada eficáciados psicofármacos disponíveis no mercado, muitos pacientes seguemnão-responsivos à este tipo de tratamento. Os dados de Breier et al. (199114

apud BACH, 2004) confirmam que cerca de 75% dos indivíduos que fazemuso contínuo de anti-psicóticos permanecem experenciando alucinaçõese delírios. Além de intervenções químicas medidas psicossociais tem sidoadotadas na tentativa de solucionar os problemas familiares, financeirose sociais decorrentes da prevalência das psicoses. Estratégias com ênfaseno treino de habilidades, solução de problemas, economia de fichas,administração de medicação e reabilitação vocacional são amplamenteutilizadas nessas manobras terapêuticas. Bach (2004, p.208) 15 concluique:

Intervenções psicossociais com psicóticos são, apesar do seu valor,lamentavelmente subdesenvolvidas. Medicamentos são úteis paraesses pacientes, entretanto, frequentemente eles não são o bastante. AACT provê um novo e poderoso modelo para este tipo de trabalhoque envolve radicalmente a aceitação, a validação, é não-hierárquicoe focado no comportamento. O modelo da ACT merece ser exploradoe avaliado por mais estudiosos que trabalhem com esses clientes.

14 BREIER, A; SCHREIBER, J; DYER, J; PICKAR, D. National Institute of Mental Healthlongitudinal study of chronic schizophrenia: Prognosis and predictors of outcome. Archives ofGeneral Psychiatry. [S.l.], vol. 48, 1991, p. 239-246.15Original em inglês, tradução nossa.

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Tendo em vista que a maioria das pessoas que refere alucinações nãotem nenhum problema de saúde mental (TIEN, 199116 apud BACH, 2004),pela perspectiva da ACT, a mera presença de sintomas psicóticos não seconstitui necessariamente no núcleo do problema clínico (BACH; HAYES,2002). A atuação dos terapeutas da ACT neste tipo de psicopatologia se deslocada análise dos conteúdos dos sintomas e dirige-se à função que estescomportamentos exercem na vida dos pacientes. Bach (2004) informa que jáexistem dados empíricos que sustentam a utilização da ACT em indivíduospsicóticos. Em pesquisa conduzida pela mesma autora em companhia deHayes constatou-se que pacientes, sofrendo com alucinações e delírios,expostos a 3 horas de intervenção pautada na ACT estavam 50% menospropensos a episódios de re-hospitalização do que aqueles tratados apenascom medicação e medidas psicossociais durante um follow-up de 4 meses.Os dados do estudo demonstraram ainda declínio do nível de estresse napresença dos sintomas, aumento na adesão ao tratamento farmacológico eredução na crença dos conteúdos sintomáticos (BACH; HAYES, 2002).

Como exposto, estudiosos da ACT têm se empenhado na inserçãodo modelo no rol de possibilidades para o tratamento das mais diversaspsicopatologias. Por conta da sua consistente base teórica e do amplo raiode alcance das suas técnicas, a Terapia de Aceitação e Compromissopode ser aproveitada em uma infinidade de contextos, desde que se avalieconstantemente sua utilidade (HARRIS, 2009). Uma vez que não atacadiretamente os sintomas, mas sim os mecanismos do controle verbalineficiente que os gestam, a ACT tende a estabelecer-se como umaalternativa não aversiva (FUKAHORI; SILVEIRA; COSTA, 2005) capaz deminimizar o sofrimento humano e aumentar a probabilidade de um indivíduoviver uma vida plena e cheia de sentido. Esforços empíricos têm sido levadosa cabo intencionando dar sustentação científica para o modelo nos maisdiversos contextos, e tais investidas têm demonstrado que a ACT é tão oumais eficaz do que as terapias tradicionalmente utilizadas (HAYES, 2004).

Fletcher e Hayes (no prelo) defendem que o modelo está em francaexpansão, entretanto, como afirmam Hayes e Pistorello no prefácio daobra de Saban (2011), são raros os trabalhos em língua portuguesa erecentes os primeiros passos da ACT em território brasileiro.16 TIEN, A. Distributions of Hallucinations in the population. Social Psychiatry and PsychiatricEpidemiology, [S.l.], vol. 26, 1991, p. 287-292.

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CONSIDERAÇÕES FINAIS

Buscamos apresentar a Terapia de Aceitação e Compromisso aosinteressados nas tecnologias terapêuticas capazes de influenciar nos maisdiversos casos de psicopatologia. Uma vez que, como refere Harris (2006),a ACT tem sido valorizada e reconhecida por tantos especialistas,procuramos, com esta obra, facilitar o acesso de alunos e profissionais aessa ferramenta poderosa, ainda desconhecida de muitos clínicoscomportamentais brasileiros. Acredita-se que o presente trabalho, namedida em que se alinha à obra introdutória construída por Saban (2011)e aos esforços de Hayes, Pistorello e Biglan (2008), vem agregar potencialpara a mobilização dos analistas do comportamento brasileiros para otema.

Apesar da juventude dos não mais de 30 anos de modelo e dainsistência de Hayes, Strosahl e Wilson (1999) no pressuposto da eternaincompletude, seu sucesso é inquestionável. A influência direta do contextoterceira ondista, a popularização da AC no Brasil constatada por Pereira,Guimarães e Guedes (no prelo), e a comprovada eficácia da abordagemnas mais diversas situações clínicas (FUKAHORI; SILVEIRA; COSTA, 2005)são fatores que se aliados ao investimento em formação profissional,podem modificar radicalmente a forma de se fazer psicoterapia em territórionacional. O presente trabalho floresce como mais uma iniciativa queintenciona o desenvolvimento das tecnologias terapêuticas na medidaem que inclui a Terapia de Aceitação e Compromisso no rol depossibilidades para a clínica comportamental.

Como atestado por Vermes, Zamignani e Singer (2010) osmovimentos históricos da AC nunca foram marcados por processos

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abruptos e estanques. As três gerações de analistas do comportamentoque se sucederam num intervalo de trinta anos conviveram, nem semprede modo pacífico, com idas e vindas de assunções e postulados (HAYES,2004). A ACT, enquanto abordagem integrativa se beneficiou decontribuições técnicas oriundas tanto dos “modificadores docomportamento” quanto dos clássicos. O modelo é capaz então dedespontar como destaque das tecnologias de terceira onda da AC eassociar ao seu corpo teórico insumos dos períodos que o antecederamao passo que adota o paradigma operante como sustentáculo filosófico.Sob aporte do contextualismo funcional a Terapia de Aceitação eCompromisso leva para o setting terapêutico a discussão acerca do critériode verdade e da função dos comportamentos. A utilidade (workability) dasações dos indivíduos é analisada cuidadosamente e colocada emconfronto com os valores e metas estabelecidas pelos mesmos (HAYES;STROSAHL; WILSON, 1999). Não somente a clareza e desenvolvimentofilosófico da ACT tornam-na um modelo reconhecido pela sua robustez econsistência, Harris (2009) aponta que o suporte empírico provido pelapesquisa básica na área da linguagem e cognição humana conduzidapelos estudiosos da Teoria dos Quadros Relacionais foi bastantesignificativo para que a ACT se colocasse pari passu do estado-da-artedas intervenções em casos de depressão, TOC, TAG, transtorno dapersonalidade borderline, entre outros.

A literatura conta com diversos estudos empíricos em que osresultados apontam para uma similaridade, e até mesmo superioridade,da ACT quando comparada aos tratamentos clássicos no tocante ao êxitoterapêutico. Fukahori, Silveira e Costa (2005) além de inaugurarem ascontribuições nacionais para desenvolvimento do modelo, concluem queintervenções pautadas nos princípios da aceitação e do compromissosão úteis no tratamento das parafilias. Já Bach (2004) expõe as conquistasalcançadas por indivíduos com diagnóstico de psicose após curto períodode tratamento com ACT, além disso, sua contribuição expande-se nomomento em que aponta a entusiasmante interação entre o modelo e afarmacologia e denuncia o subdesenvolvimento das intervençõespsicossociais utilizadas no cuidado desse grupo de pacientes. No contextodos transtornos de ansiedade Orsillo e colaboradores (2004) atestam quea ACT apresenta resultados tão bons quanto a CBT, tratamento clássico

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para os casos de TOC e TAG. Os autores creditam tamanho sucesso aoprincípio básico das terapias comportamentais de terceira ordem,movimento de onde brota a ACT, que desloca o foco terapêutico daremoção dos sintomas. As estratégias clínicas consistentes com o modeloatacam principalmente os processos verbais que segundo Hayes, Strosahle Wilson (1999) geram os sintomas psicopatológicos.

Apesar da variedade de exemplos em que foram encontrados relatosda aplicação da ACT em contexto clínico, o único ambiente diferente doconsultório em que se identificou o uso das técnicas da mesma foi nainstituição hospitalar. Robinson et al. (2004) apresentam os benefíciosque o ACT-HC Model pode conceder aos pacientes que chegam aosserviços de cuidado primário com desordens somáticas, dores crônicase epilepsia. Tendo em vista que a dependência de substâncias químicasé uma questão de bem-estar social, as investidas de Stotts, Masuda eWilson (2010), bem como as pesquisas conduzidas por Twohig,Shoenberger e Hayes (2007), são exemplos de situações em que a ACTpode ser utilizada como instrumento de saúde pública. Nestes trabalhosos autores demonstraram a efetividade do modelo no tratamento deindivíduos adictos a maconha e Metadona, respectivamente.

Paradoxalmente, os resultados apresentados pela ACT não têm sidosuficientes para que o modelo se fixe no campo dos tratamentoscomportamentais (HAYES, 2004). Fatores como a estranheza causadapela utilização das técnicas de mindfulness e o esforço de Hayes, Strosahle Wilson (1999) em diluir a aversividade dos jargões técnicos tornando osprincipais livros sobre a ACT acessíveis ao público não-especializadodevem ser considerados na análise de tal cenário. Classens (2010)defende que, apesar de encaixarem-se perfeitamente, ACT e mindfulnesstêm enfrentado preconceito e resistência por parte dos psicoterapeutas. Afuncionalidade da prática de exercícios de atenção plena foi comprovadapor Kabat-Zinn (19821, apud VANDENBERGHE; SOUSA, 2006) no princípioda década de 90, entretanto, a cultura ocidental ainda não vê com bonsolhos a participação de práticas provenientes da yoga e das tradiçõesmarciais orientais nas sessões de terapia.

1 KABAT-ZINN, J. An outpatient program in behavioral medicine for chronic pain patients based onpractice of mindfulness meditation: Theoretical considerations and preliminary results. GeneralHospital Psychiatry, [S.l.], vol. 4, 1982, p. 33-47

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Como ensina Saban (2011), a Terapia de Aceitação e Compromissoirrompe a superfície do tradicionalismo e se apresenta como umaalternativa viável para o cuidado psicológico dos indivíduos.

Concluímos que o atual quadro de desenvolvimento da Teoria dosQuadros Relacionais e da Terapia de Aceitação e Compromisso permite-nos afirmar que a ACT configura-se, como refere o subtítulo do presentetrabalho, em mais uma possibilidade para a clínica comportamental.Fazemos, então, nossas as palavras de Hayes, Pistorello e Biglan (2008,p.96-97):

Por serem calcadas em evidências, torna-se provável que a ACT e aRFT, por um longo período de tempo, farão parte do cenário terapêutico,inclusive em países de língua portuguesa. Assim, este artigo foi escritono intuito de despertar o interesse e um sério envolvimento deprofissionais e pesquisadores falantes do idioma para a presente terapia.A amplitude que tal abordagem pode atingir na pesquisa aplicada ebásica dependerá não apenas da adequação de tais ideias, mastambém de sua capacidade de atrair pesquisadores e terapeutas emtodo o mundo, uma vez que a terapia representa um sistema aberto,sendo que sua evolução depende de contribuições e desenvolvimentossubstanciais, e não de hierarquias.

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APÊNDICE A

GLOSSÁRIO EXPLICATIVO DE CONCEITOS DA ACT

Aceitação: Atitude de não estabelecer confrontos com eventos privadosque estão fora do controle pessoal. Envolve características de curiosidadee abertura. Não possui semelhanças com atitudes de conformismo ouinércia.

Análise do Comportamento Aplicada ou Análise Aplicada doComportamento: Modelo de previsão e controle de variáveiscomportamentais que sustenta teoricamente o modelo clínico da ACT.Sua importância é tão grande que seus reflexos são vistos na grandemaioria dos modelos clínicos da psicologia moderna.

Avaliação (Contexto de): Tendência, ensinada pela comunidade verbal,a categorizar eventos em bons ou ruins. Gera rigidez comportamental ereduz a variabilidade de respostas. Favorece o estabelecimento emanutenção de regras e auto regras. Ex.: “Depressão é uma doença grave,sendo assim, se eu tiver pensamentos tristes eu estou muito doente.”.

Cognição: Uso privado da linguagem. Compreende os pensamentos, ossentimentos, a memória, as imagens mentais, a fala, os desejos, etc.Termo do senso comum para o enquadramento relacional, capacidadede: derivar relações entre eventos; incluí-los na rede relacional; e transferirfunções entre os eventos.

Compromisso: Comprometimento pleno com atitudes que visem oenriquecimento da vida e o alcance dos valores. Estabelecimento decontrato com a mudança comportamental.

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Contexto ou Comunidade Verbal/Social: Conjunto de assunções,paradigmas, pressupostos, estereótipos, regras e instruções característicosde um determinado contexto que dirige o comportamento dos indivíduos.A política do Apartheid na África do Sul entre 1948 e 1994 é um exemploabominável do controle exercido pela comunidade verbal.

Contextos Sócio-Verbais Patogênicos: Conjunto de aprendizadossociais baseados na linguagem que geram sofrimento humano.Compreendem quatro contextos: Contexto de Literalidade, Contexto deAvaliação, Contexto de Controle e Contexto de Dar Razões

Contextualismo Funcional: Aporte filosófico no qual a ACT está embasada.Objetiva predizer e influenciar comportamentos de modo acurado e efetivo,utilizando para tal, princípios empiricamente embasados. Prega que nenhumelemento é inerentemente bom ou ruim, desse modo toda realidade deveser analisada a partir do seu contexto específico e da função de tal elementonaquele contexto. Radicalmente oposta ao mecanicismo.

Controle Emocional (Estratégias de): Tentativas diretas de controlaros eventos privados (sentimentos, pensamentos, etc.). Geralmente sãoinstalados e mantidos pela comunidade verbal, podem funcionar à curtoprazo mas, invariavelmente, apresentam efeitos desastrosos à longo termo.

Controle (Contexto de): Tendência, ensinada pela comunidade verbal,a tentar eliminar eventos privados que sejam desagradáveis. Fomentauma luta com pensamentos e sentimentos aversivos. Ex.: “Eu não possoter pensamentos tristes... não posso ter pensamentos tristes... não possoter pensamentos tristes”.

Controle Verbal: Capacidade da linguagem em dirigir o comportamentodo indivíduo. Situação na qual os sentimentos, pensamentos e demaiscognições impõem realidades. As respostas compulsivas das pessoasque sofrem de Transtorno Obsessivo Compulsivo refletem bem o poderdo controle verbal.

Dar Razões (Contexto de): Tendência, ensinada pela comunidade verbal,a buscar e expor explicações literais para problemas psicológicos.

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Geralmente é altamente reforçado pela sociedade de acordo com asofisticação das respostas. Favorece o afastamento das vivências diretasfrente à mudança nas contingências. Ex.: “Eu estou dormindo demaisporque estou deprimido”.

Desesperança Criativa (Estado de): Estado emocionaldeliberadamente provocado no qual o cliente frente à aparente exaustãode possibilidades de controle dos eventos privados inicia a busca pelaaceitação do sofrimento inerente a vida e compromete-se com alternativascomportamentais pautadas nos seus valores.

Desfusão Cognitiva: Processo de distanciamento, ou desapego, dospensamentos, crenças, memórias e outras cognições que afastam oindivíduo de uma vida rica e dirigida pelos seus valores. Situação na qualo cliente aprende a separar suas cognições do seu organismo e passa aenxergar-se como contexto onde elas ocorrem e não mais como sintomaspertencentes a ele.

Esquiva Experiencial: Processo de afastamento dos sentimentos epensamentos aversivos. Situação em que os indivíduos tendem àestabelecer uma luta contra os comportamentos encobertos dos quaissão contexto. São estratégias adaptativas e socialmente aprovadas quepossuem como refugo a ruminação mental dos conteúdos rejeitados elevam a um aumento involuntário da atenção seletiva para as variáveisambientais aversivas.

Evento Psicológico: Conjunto de interações em curso entre umorganismo como um todo e o contexto definido histórica esituacionalmente. É todo e qualquer tipo de resposta comportamentalque sofre influência de uma miríade de variáveis ambientais. Podem serde natureza pública (gestos, movimentos, entre outros eventos que podemser compartilhados com um observador) ou privada (sentimentos,pensamentos, sensações, memórias, entre outras ocorrências que sópodem ser observadas por quem os vivencia).

Fusão Cognitiva: Processo psicológico no qual o indivíduo não sediferencia das suas cognições. Situação na qual ocorre um

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amalgamamento entre o cliente e seus sintomas. Comportamento verbalassume o controle das respostas do indivíduo gerando sofrimento.

Linguagem: Conjunto de comportamentos verbais que sofre influênciados 3 níveis de seleção do comportamento característico dos sereshumanos (filogênese, ontogênese e cultura). Pouquíssimos são osexemplares de seres infra-humanos que a apresentam. Se por um ladoconstitui-se na ferramenta que possibilitou a sobrevivência do homo sapiensna superfície terrestre por sua capacidade de antecipar e solucionarsituações, por outro provoca armadilhas verbais que aprisionam e geramsofrimento.

Literalidade (Contexto de): Situação na qual as emoções e pensamentosassumem o controle sob os demais comportamentos de um indivíduoretirando espaço para a flexibilidade comportamental e para aprendizadospela experiência direta. Característico de clientes dirigidos por regras eauto regras rígidas. Ex.: “Tenho tido pensamentos tristes, logo, soudeprimido”.

Mente: Conjunto complexo de cognições. Para a ACT nada mais é doque uma metáfora para a linguagem.

Metáfora: Técnica utilizada na ACT com a intenção de validar e empoderaras experiências dos clientes, diferentemente das análises lógicas tende aestabelecer funções novas e mais flexíveis nos quadros relacionais(cognições). Não visa o confronto de ideias nem persuadir o cliente,vislumbra apenas apontar alternativas. Recurso linguístico que transportaum tema sintomático, já enrijecido e sob controle emocional, para umanova cadeia relacional tornando possível o contato com a realidade etomada de consciência plena da experiência.

Mindfulness: Forma específica de atenção plena. Envolve aconcentração absoluta no momento atual de modo intencional e nãoavaliativo. Tem origem bastante antiga e é oriunda das tradições religiosas,espirituais e marciais orientais. Passa a ser incorporada na medicinacomportamental em programas de redução de stress nos anos 90.

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Normalidade Destrutiva: Modelo de pensamento no qual se acreditaque os processos psicológicos ordinários são capazes de levar aresultados destrutivos e disfuncionais. Apregoa que a origem do sofrimentohumano está calcada no uso corriqueiro da linguagem uma vez que a ditanormalidade psíquica é inalcançável.

Normalidade Saudável: Assunção de que a saúde mental é homeostáticae só é desequilibrada por distúrbios ou variáveis estressoras. Pensamentocaracterístico do modelo médico de saúde no qual a saúde é equiparadaa ausência de doença. Apregoa que sofrimento é algo anormal, dessemodo a normalidade psicológica é o critério avaliativo que distinguesaudável e patológico.

Rigidez Comportamental: Característica de indivíduos que nãoapresentam variabilidade comportamental e excesso de regras e autoregras que dirijam seu comportamento. Não diz respeito apenas àtopografia das respostas, mas também à sua função. Corresponde aocontexto daqueles indivíduos que frente às mudanças contingenciaispermanecem emitindo respostas moldadas por estímulos discriminativosjá cristalizados.

Self Conceitual: Conjunto de pensamentos, imagens, sentimentos, entreoutras cognições que um indivíduo possui acerca de si mesmo. Clientesprofundamente fundidos com o Self Conceitual podem sofrer bastantequando entram em contato com as distorções cognitivas causadas peloconfronto de suas percepções e a percepção alheia

Self Observador: Perspectiva transcendente na qual o indivíduo sepercebe como um contexto no qual diversas relações ambiente-organismose estabelecem e geram respostas comportamentais. Nesse estágioocorre um distanciamento completo entre o indivíduo e os seuspensamentos e sentimentos, o que facilita a aceitação dos estímulosaversivos e quebra a cadeia de confrontos cognitivos.

Self Vivencial: Conjunto de sentimentos e pensamentos experimentadosdiante do fluxo de mudanças do cotidiano. A fusão com o Self vivencial é

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um passo importante tendo em vista que favorece a percepção plena etotalmente consciente dos comportamentos.

Teoria dos Quadros Relacionais (RFT): Raiz teórica que apoia a ACT.É um programa de pesquisa básica em linguagem e cognição humana.Surge para superar a aproximação de Skinner sobre o tema. Reza que onúcleo da cognição humana é a habilidade de aprender a relacionareventos sob controle contextual arbitrário. Desse modo o indivíduo é capazde ampliar, por si só, seu repertório comportamental independentementede aprendizados diretos. A partir da influência arbitrária, ou seja, do contextoverbal, são estabelecidas derivações relacionais entre eventospsicológicos que passam a controlar o comportamento do indivíduo.Existem três propriedades fundamentais dos quadros relacionais: 1)Bidirecionalidade ou Implicação Mútua: Se o evento A é igual ao evento Bentão o evento B é igual ao A (A=B então B=A); 2) ImplicaçõesCombinatórias: Se o evento é A maior que o evento B e o evento é B igualao evento C então A é maior que C (A>B e B=C então A>C); 3) Transformaçãoda função do estímulo: Eventos derivados nos quadros relacionais adquirema função dos eventos primariamente aprendidos (Se A é melhor do que Be B é igual a C então A é melhor do que C).

Valores: Podem ser definidos como as qualidades da ação que podemser instanciados aos comportamentos, entretanto, não são objetos e dessemodo não são da ordem da posse ou da imutabilidade. Permitem identificarmetas alcançáveis, ações concretas que as tornem tangíveis e possíveisobstáculos a serem superados. Servem como guia para o qual seselecionam comportamentos úteis.