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LIFEinLIFE books curates, designs and prints limited editions from personal image archives.
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José
Tol
entin
o M
endo
nça
O mistério está todo na infância:
é preciso que o homem siga
o que há de mais luminoso
à maneira da criança futura
ensaio: a experiência do inefável através da hemorragia do verbo
1
2
advento
(latim adventus, -us, chegada, vinda, aproximação) s. m.1. Chegada, vinda; exaltação; princípio.
3
4
Soph
ia d
e M
ello
Bre
yner
5Apenas sei que caminho como quem
É olhado amado e conhecido
E por isso em cada gesto ponho
Solenidade e risco
6
á Luz trazemos este paciente limite
não está em nós guiá-lo
ficará o amor
na sua grande maioria desconhecido
ensurdece a terra esta verdade
Tole
ntin
o de
Men
donç
a
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Ana MariaAna Maria
9
Maria HelenaMaria Helena
A cifra infinit a que doi s mundos combinam A cifra infinit a que
doi s mundos combinam A cifra infinit a que
2 0 D E J u L H o 2 0 1 1
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Deixai-me limpo
o ar dos quartos
e liso
o branco das paredes
Deixa-me com as coisas
fundadas no silêncioSo
phia
de
Mel
lo B
reyn
er
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A frase mística é uma artefacto de silêncio. Produz silêncio no rumor das palavras.
Le Breton
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Eu era quase um anjo
e escrevia relatórios
precisos
acerca do silêncio
...
isto foi antes de aprender a álgebra
Tole
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o de
Men
donç
a
20
E assim na trama doméstica consagramos
a trama terrestre, enquanto o fundo
da pupila refracta a taça desse instante
Ant
onio
Ram
os R
osa
21
em que bebemos o ouro da sombra,
esse fulgor do nada
2222
23
Mansa e amorosa acordas onde em segredo moras
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“Não te maravilhes que tenha dito: necessários vos é nascer de novo.”
( Jo 3, 1-5)
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Celebração do Baptismo
Capela de Nossa Senhora de Monserrate
23 Outubro de 2011
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Nota: A generosa contribuição de imagens tomadas pela Inês Clara ofereceram-nos uma frescura que sem elas nunca teria sido possível conjurar neste livro. Graças a ela pudemos polvilhar a páginas deste evento com a luminescente alegria dos primos.
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Os poderes do rito me esclareçam
Sejam meus limites sob o seu direito
De ressoar isento o que não muda
Tole
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diz-me se é certo
que o tempo
é um unico olhar
prolongado nos dias
se a vida é o avesso da vida
Tole
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Derramarei sobre vós água pura e dar-vos-ei um coração novo
Dar-vos –ei um coração novo e infundirei em vós um espírito novo.
Ezequiel 36-24-28
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a clandestina imensidão que se fareja
desesperadamente próxima,
atrás de ti um caminho luminoso
Tole
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Que pedis à Igreja de Deus para a Ana e Helena?
O Baptismo
Pedistes o Baptismo par as vossas filhas.
Deveis educa-las na fé, para que, observando os mandamentos,
amem a Deus e ao próximo, como Cristo nos ensinou.
Estais conscientes do compromisso que assumis?
Sim estamos.52
Oremos, irmãos caríssimos,
Para que o Senhor Deus todo-poderoso
Conceda a estas crianças a vida nova
pela água e pelo Espirito Santo.
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«O Espírito da Liturgia».
Lembro-me de um texto oportuníssi-mo de Romano Guardini intitulado «O Espírito da Liturgia». Aí, esse grave mestre alemão, que deixou uma marca incontornável na teo-logia contemporânea, ousa falar da Liturgia como jogo. E escreve: «Brincar diante de Deus, não criar, mas ser uma obra de arte, tal é a essência mais íntima da liturgia.Daí a sublime mistura de seriedade profunda e de divina alegria que nela se vê. O cuidado meticulosos com que ela determina em mil pre-scrições o detalhe das palavras, movimentos, vestes, cores e gestos, não pode ser compreendido senão por quem leva a sério a Arte e o Brinquedo».
Tole
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Salmo 22 (23)
O Senhor é meu pastor:
nada me falta.
Leva-me a descansar
em verdes prados,
Conduz-me às
águas refrescantes
E reconforta a minha alma.
Ele me guia por
sendas direitas
por amor do seu nome.
Ainda que tenha que andar
por vales tenebrosos,
Não temerei nenhum mal,
porque vós estais comigo:
O vosso cajado
e o vosso báculo
Me enchem de confiança.
Para mim preparais a mesa
À vista dos meus adversários;
Com óleo me perfumais a cabeça
E meu cálice transborda.
O Senhor é meu pastor:Nada me faltará
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A bondade e a graça
hão de acompanhar-me
Todos os dias da minha vida,
E habitarei na casa do Senhor
para todo o sempre.
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Esta é a fé que nos gloriamos de professar.
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“(...) Um texto sagrado não é um texto intocável. A leitura deve operar sobre o texto, desconstruindo-o e recompondo-o. É impossível accionar o processo interactivo sem o manuseio. A voz, os acentos, os sentidos, a cadência rítmica tornam-se procedimentos hermenêuticos relevantes para «apreciarmos o plural de que o texto é feito». A leitura não é só leitura, mas rasgão, espanto, audição, respeito e despeito, entrar eficar à porta, continuar e recriar. Só desse modo se pode entender o que o último dos Padres da Igreja do Ocidente, Gregório Magno, deixou escrito nas suas Homilias ao Livro de Ezequiel: Scriptura cum legentibus crescit, «A Escritura cresce com os quem a lêem». A palavra Bíblia é relativamente recente para definir o corpus literário sagrado. Durante séculos ele chamou-se Miqra (termo hebraico para leitura comunitária e em alta voz). Quer dizer: A Bíblia foi leitura antes de ser livro. E nela persistem marcas dessa gestação oral, puramente sonora; dessa recitação ininterrupta, por gerações. Foi nessa espécie de conversa humana que a leitura é, que ela se organizou como laboratório de linguagens, máquina de proliferação de ritmos, câmara de ecos, montanha santa de paradoxos, palimpsesto, emaranhado, sobreposição experimental de signos e de relatos, súmula, vibração polifónica, work in progress e Revelação. O que a Bíblia é só a leitura o mostra. Apartir dos IIIº e IIº séculos a.c. (quando na Alexandria helenística se compôs a tradução grega chamada dos LXX ou Septuaginta), é que o corpus bíblico passou a ser chamado ta biblia («os livros»). Mas diz o Talmud que os anjos choraram nesse dia. (...)”
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a tua
palavra
é
o fio
de prata
que guia
as
folhas
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Rom 8 28-32
Leitura da Epistola de São Paulo aos Romanos
Irmãos: Nós sabemos que Deus concorre em tudo para o bem daqueles que o amam, dos que são chamados, segundo o seu desígnio. Porque os que Ele de antemão conheceu, tam-bém os chamou; àqueles que chamou, também os justificou; e àqueles que justificou, também os glorificou. Que diremos a tudo isto? Se Deus está por nós, quem estará contra nós? Deus, que não poupou o seu próprio filho, mas O entregou à morte por todos nós, com não havia de nos dar, com Ele, todas as coisas?
Mt 22, 34-40
Naquele tempo, os fariseus ouvindo dizer que Jesus reduzira os saduceus ao silencio, reuniram-se em grupo. E um deles, que era legista, perguntou-lhe para o embaraçar: Mestre qual é o maior mandamento da Lei? Jesus disse-lhe:
Amarás ao Senhor teu Deus, com todo o teu coração, com toda a tua alma e com to da a tua mente. Este é o maior e o primeiro mandamento. O segundo é semelhante: Amarás ao teu próximo como a ti mesmo. Destes dois mandamentos dependem toda a Lei e os Profetas.
Palavra da salvação.
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derramarei o meu espírito, e os vossos jovens terão visões e os vossos anciãos terão sonhos
Actos do Apóstolos 2, 14-19 67
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Pela Ana e pela Helena, para que, renascidas na água do Baptismo, vivam o mistério da morte e ressurreição de Cristo.
Para que a Ana e a Helena sejam santas. Para que sejam testemunhas do evangelho e, depois da sua passagem pela terra, venham a viver para sem-pre na casa de Deus.
Pelos pais e padrinhos destas gémeas, para que a graça de Deus os ajude a ser um exem-plo claro de fé, esperança e caridade.
Por todos os familiares e ami-gos destas crianças, para que se revistam de misericórdia, bondade, mansidão e paciên-cia , vendo em nome de Jesus Cristo e dando Graças por Ele a Deus Pai.
Pelos familiares defuntos. Em especial pelos avós Alber to, Aulácio e Alice, e pelos tios António, Ninó, Helena, Mila e Fernando.
Pela pessoa e pelas intenções de Sua Santidade o Papa Ben-to XVI, para que continue a guiar a Igreja e sabedoria e verdade.
Pelas necessidades de toda a nossa comunidade e para que as dificuldades do presente en-contrem no Evangelho uma res-posta verdadeira.
Oremos ao Senhor.
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Para que Deus nos dê a todos
um coração novo para sermos
mais amigos de Jesus.
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Deus todo-poderoso e eterno,
Que enviastes ao mundo o vosso Filho
Para expulsar de nós o espírito do mal,
E transferir o homem, arrebatado às trevas,
Para o reino admirável da vossa luz,
Humildemente Vos pedimos que estas crianças,
Libertadas da mancha original,78
Se tornem morada do Espirito Santo
E templo da vossa glória.
O poder de Cristo Salvador vos fortaleça,
Em sinal desse poder vos fazemos esta unção,
Em nome do mesmo Cristo nosso Senhor,
Que vive e reina por todos os séculos.
Amén. 79
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N a palma da minha mão t e gravei.
Isaias 49:16:
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Oremos, irmãos caríssimos,
Para que o Senhor Deus
Todo-poderoso
Conceda a estas crianças a
vida nova pela água e pelo
Espirito Santo.
Senhor nosso Deus:
Pelo vosso poder invisível,
Realizais maravilhas
nos vossos sacramentos.
Ao longo dos tempos
preparastes a água
Para manifestar a
graça do Baptismo.
Logo no principio do mundo
O vosso Espírito pairava
sobre as águas
Prefigurando o seu
poder de santificar.
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pri
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pio
da
sa
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da
de
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Nas Águas do dilúvio
Destes-nos uma imagem
do Baptismo
Sacramento da vida nova,
Porque as águas
significam ao mesmo tempo
O fim do pecado e o
principio da santidade.
O vosso filho Jesus Cristo,
ao ser baptizado por
João Baptista nas águas do Jordão,
recebeu a unção do
Espírito Santo; suspenso na cruz,
Do seu lado aberto fez brotar
sangue e água e, depois de
ressuscitado ordenou aos seus
discípulos:
Ide e ensinai todos os povos e
baptizai-os em nome do Pai e do
Filho e do Espírito Santo.87
88
Eu te baptizo
em nome do Pai,
e do Filho,
e do Espirito Santo.
Ana e Helena:
Agora sois nova criaturas
e estais revestidas de Cristo.
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Esta veste branca seja
para vós símbolo da
dignidade cristã.
Ajudados pela palavra
e pelo exemplo
das vossas famílias,
conservai-a imaculada
até à vida eterna.
Amén.
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Recebei a luz de Cristo.
A vós pais e padrinhos, se confia o encargo
de velar por esta luz, para que as vossas
pequeninas, iluminadas por Cristo, vivam
sempre como filhas da luz, perseverem na
fé, e quando ao Senhor vier possam ir ao
seu encontro com todos os Santos, no reino
dos céus.
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EF
FE
TH
A
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O Senhor Jesus, que fez ouvir
os surdos e falar os mudos,
vos dê a graça de, em breve,
poderdes ouvir a sua palavra
e professar a fé para louvor e
glória de Deus Pai.
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Abençoai esta mãe, agradecida pelo dom das
suas filhas, para que persevere com elas em acção
de graças para sempre.
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Abençoai o pai destas crianças, para que juntamente
com a esposa, pela palavra e pelo exemplo, seja para
as suas filhas a primeira testemunha da fé.
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A L L E L U YA .
PA R A C L I T U S S P I R I T U S S A N C T U S ,
Q U E M M I T T E T PA T E R I N N O M I N E M E O,
I L L E V O S D O C E B I T O M N E M V E R I T A T E M .
S A N C T U S , S A N C T U S ,
S A N C T U S D O M I N U S D E U S S A B A O T H .
P L E N I S U N T C A E L I E T T E R R A G L O R I A T U A .
H O S A N N A I N E X C E L S I S .
A G N U S D E I , Q U I T O L L I S P E C C A T A M U N D I ,
M I S E R E R E N O B I S .
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p a x v o b i s c u m104
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Tole
ntin
o de
Men
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A minha arte é uma espécie de pacto:
não distingo as áreas selvagens das cultivadas
e elas não distinguem a minha sombra
da minha luz
as coisas tal como eram
terás debaixo do céu branco
em fracções reluzentes
...
terás contigo um pensamento
antes de uma jornada devorada
que não se deixa aprisionar
...
os teus olhos são o que resta
dos livros sagrados
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Maria, mater gratiae,
Dulcis parens clementiae,
Tu nos ab hoste protege,
Et mortis hora suscipe.
Jesu tibi sit gloria,
Qui natus es de Virgine,
Cum Patre et almo Spiritu,
In sempiternam saecula.
Amen.
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Agradeçemos, Senhor, a Tua alegria. Seja ela o dom que sustém esta hora da nossa vida. Tenha o poder de reedificar, em nós, o caído, de aclarar a tenda que a noite atribulou, de unir aquilo que a pressa ou o cansaço interromperam.
Seja ela o sinal da leveza com que nos vês, a carícia que nos estendes no tempo, o assobio do Pastor que inaugura as tréguas.
Dá-nos Senhor, a alegria como alento revitalizador: inscreva ela em nós o sabor da vida abundante e multiplicada; perfume cada um dos nossos gestos; traga às nossas palavras a luz que o Baptismo para sempre acendeu.
Que este Baptismo inspire cada um dos nossos renascimentos. Que a Tua presença, nos ensine o que significa tornar-se presente. E o dom que são a Ana e a Helena, nos ajudem a tecer a vida como uma história de amor.
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«O que habita nos Céus, sorri»
“Os símbolos não se inventam, é preciso ir buscá-los ao fundo da alma dos homens.”
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A L L E L U Y A
A N A M A R I A
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PA R A C L I T U S S P I R I T U S S A N C T U S ,
Q U E M M I T T E T PAT E R I N N O M I N E M E O,
I L L E V O S D O C E B I T O M N E M V E R I TAT E M
M A R I A H E L E N A
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Dá Senhor à nossa vida a Tua sabedoria. Ajuda-nos a jejuar das palavras que Te es-condem, das palavras onde o amor não emerge, das palavras confusas, extenuadas, atiradas como pedras ou como alarde, das palavras que muralham a comunicação, das palavras que nada mais permitem senão palavras. Que o nosso coração se abra ao silêncio activo e comprometido que é a mar-ca da hospitalidade verdadeira, a marca do Baptismo verdadeiro.
Dá-nos a força de insinuar, nos invernos gelados que interiormente vivemos, o ramo verde, a inesperada flor, o irreprimível con-vite que Tu fazes ao nosso renascer.
É dizer sim,com maior entusiasmo ainda, à liberdade de afirmar o essencial:
Fé, justiça, reconciliação, solidariedade e alegria.
Tole
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Dá-nos Senhor a coragem dos recomeços. Não nos deixes acomodar ao saber daquilo que foi: dá-nos largueza de coração para abraçar aquilo que é. Afasta-nos do repetido, do juízo mecânico que banaliza a história, pois a priva de surpresa e de esperança. Torna-nos atónitos como os seres que florescem. Torna-nos inacabados como quem deseja.
Torna-nos atentos como quem cuida. Torna-nos confiantes como os que se atrevem a olhar tudo, e a si mesmos, de novo pela primeira vez.
Dá-nos o saber de reparar a fundo, de escutar o indizível segredo que torna todos e tudo espelho do Teu assombro. Impele-nos à descoberta de um real que nos é tão próximo, mas afinal desconhecido. Que o nosso coração esteja vigilante para acolher o modo surpreendente como Tu, ó Deus, sempre Te revelas!
Hoje. Agora.
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Era uma luz
como
uma árvore
quando cresce
E estando em flor
era um dia
inteiro
Daniel Faria
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A espantosa realidade das coisasé a minha descoberta de todos os dias.Cada coisa é o que é,é dificil explicar a alguém quanto isso me chega,E quanto isso me basta.
Basta existir para se ser completo.
Alberto Caeiro
O alimento essencial não vem das coisasmas sim do laço que liga as coisas.
Saint-Exupéry
J. C
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Fotó
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Nota: agradecemos as maravilhosas imagens generosamente cedidas por Joaquim Almeida que muito enriqueceram este livro.
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“É bom estarmos aqui !”
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A casa compõe uma por uma as
suas sombras
A casa prepara a tarde
Frutos e canções se multiplicam
Nua e aguda
A doçura da vida
Soph
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e M
ello
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«Fazei coisas belas, mas sobretudo tornai as vossas vidas lugares de beleza»
Discurso de Bento XVI ao mundo da cultura, 12 de Maio de 2010162
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Enganam-se os que pensam que só nascemos uma vez.
Para quem quiser ver a vida está cheia de nascimentos.
Nascemos muitas vezes ao longo da infância
quando os olhos se abrem em espanto e alegria.
Nascemos nas viagens sem mapa que a juventude arrisca.
Nascemos na sementeira da vida adulta,
entre invernos e primaveras maturando
a misteriosa transformação que coloca na haste a flor
e dentro da flor o perfume do fruto.
Nascemos muitas vezes naquela idade
onde os trabalhos não cessam, mas reconciliam-se
com laços interiores e caminhos adiados.
Nascemos quando nos descobrimos amados e capazes de amar.
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O corpo, devido ao peso, tende para o lugar que lhe é próprio, porque o
peso não tende só para baixo, mas também para o lugar que lhe é próprio.
Assim o fogo encaminha-se para cima, e a pedra para baixo. Movem-se
segundo o seu peso. Dirigem-se para o lugar que lhes compete. O azeite
derramado sobre a água aflora à superfície; a água vertida sobre o azeite
submerge-se debaixo deste: movem-se segundo o seu peso e dirigem-se para
o lugar que lhes compete. As coisas que não estão no próprio lugar agitam-
se, mas, quando o encontram, ordenam-se e repousam.
O meu amor é o meu peso. Para qualquer parte que vá, é ele quem me leva.
Confissões de Sto Agostinho
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O que é, por conseguinte, o tempo? Se
ninguém mo perguntar, eu sei; se o quiser
explicar a quem me fizer a pergunta, já
não sei.
Confissões de Sto. Agostinho
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Se a palavra perdida se perdeu, se a palavra usada
se gastou
Se a palavra inaudita e inexpressa
Inexpressa e inaudita permanece, então
Inexpressa a palavra ainda perdura
o inaudito Verbo,
O Verbo sem palavra
Aquela que no tempo flui entre o sono e a vigília
Rodopiando em torno do silente Verbo.
T.S.
Elio
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Assim se está na luz das coisas vivas
Atónitos no doce movimento
já não somos mais do que a frescura sem idade
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Num vértice de vegetal leveza encontra-se o ouro verde com a paixão da sombra e na pureza única o amor é só reconhecimento186
Num vértice de vegetal leveza encontra-se o ouro verde com a paixão da sombra e na pureza única o amor é só reconhecimento
Antonio Ram
os Rosa
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O silêncio inigualável de quem escuta
Daniel Faria
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Não acredito que cada um tenha o seu lugar.Acredito que cada um é um lugar para os outros
Daniel Faria
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Não cessaremos de explorar
E o fim de toda a nossa exploração
Será chegar aonde começámos
E conhecer o lugar pela primeira vez.
Uma condição de total simplicidade
(que custa nada menos do que tudo)
E tudo estará bem e
Toda a espécie de coisas estará bem
T. S. Eliot
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A criança fecha os olhos no muro
Conta o tempo que os amigos demoram
A transformar-se
Fecha os olhos no interior dos números
Olha para dentro e em redor e encontra-se
A si mesma
A criança pergunta se há-de ir ter consigo
Ela quer encontrar os amigos, ela quer
Que lhe respondam. Ela calcula a voz,
A altura do muro, a progressão do silêncio
Daniel Faria
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Obrigado, Senhor, pelos amigos que nos deste.
Os amigos que nos fazem sentir amados sem porquê.
Que têm o jeito especial de nos fazer sorrir.
Que sabem tudo de nós, perguntando pouco.
Que conhecem o segredo das pequenas coisas que nos deixam felizes.
Obrigado, Senhor, por essas e esses,
sem os quais caminhar pela vida não seria o mesmo.
Que nos aguentam quando o mundo parece um sítio incerto.
Que nos incitam à coragem só com a sua presença.
Que nos surpreendem, de propósito, porque acham mal tanta rotina.
Que nos dão a ver um outro lado das coisas (…).
Obrigado pelos amigos incondicionais.
Que discordam de nós, permanecendo connosco.
Que esperam o tempo que for preciso.
Que perdoam antes das desculpas.
Essas e esses são os irmãos que escolhemos.
Os que colocas a nosso lado para nos devolverem a luz aérea da alegria.
Os que trazem até nós o imprevisível do teu coração, Senhor.
232
“o inexprimível (o que considero misterioso
e não sou capaz de exprimir) talvez seja o
pano-de-fundo a part ir do qual recebe sentido
seja o que for que eu possa exprimir”
E p í l o g o
Wittgenstein
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234
“A beleza humana abre o rosto ao silêncio. Mas o silêncio – aquele que aqui se faz –, não é simples-mente suspensão do discurso, mas silêncio da própria palavra, a palavra a tornar-se visível. Por isso, no silên-cio do rosto o ser está verdadeiramente em casa”
(Agamben, 1999: 81).
Um rosto que sabemos inesgotável. Que nunca acabará de regressar.
Agora, obedeçendo ao poeta Antonio Ramos Rosa, “Pousa(mos) devagar a enxada sobre o ombro/Já ca-vou muito silêncio”.
Revolver os solos do silêncio será sempre uma iniciática aprendizagem, especialmente nesta tentativa indigente de transformar paisagens da infância através da busca da palavra, pois este é o tempo do homem que, por na-tureza, antecede a sua conquista (‘infans’ é aquele que ainda é incapaz de falar) e onde a escuta e a imagem assumem um papel de maior relevância.
O carácter interrogativo da criança precede o momen-to da criação da palavra e nele se concretiza a im-portância da interioridade e da reflexão que o silêncio lhe possibilita. Esta peregrinação de pixeis foi feita na companhia de poetas,“pastores deste siléncio”, pois segundo o testemunho de Ruy Belo, na medida em que “sempre que um poeta, ao criar hoje um verso, purifica uma palavra, rompe as relações estáticas, de vigilân-cia, que ela mantinha especialmente com o conceito e fá-la consistir toda numa relação.”
O corpo da linguagem acompanha o corpo do sujeito na vertigem do encontro, mas a velocidade tem de de-ter-se diante do desejo do corpo silencioso. O trabalho é de aprender a eliminar, partindo da descoberta.
As imagens nos “arredores do verbo” a condição do “instrumento difícil do silêncio” foram encontrando a sua concretização inacabável, re-abrindo-se ao infinito da nossa finitude partilhada.
235
O mistério está todo na infância:
é preciso que o homem siga
o que há de mais luminoso
à maneira da criança futura
Refrão:
236
Sabes, que estamos ambas na mesma página
E aproveito o facto de teres chegado agora
Para te explicar como
cresce um Livro entre as mãos. – podes pensar
Que te digo alguma coisa não necessária,
mas podia ter-te dito, acredita,
Que o Livro cresce sempre
Ou melhor – e essa é a verdade –
Apesar de nós.
(…) Se quiseres posicionar-te
Como alguém nadando para trás
entre ambas as faces da página
Que profundidade terias se afogada voltasses
À superfície?
Fecha os olhos que se fecham
por dentro dos teus olhos
Desenrolando-se. As pálpebras.
Indo e regressando nas pupilas
Perscruta no que te digo,
o aroma premeditado
que ao abrires é já um pouco de ti.
237
Há imagens-pessoas
imagens pregadas ao silêncio
de dizer-se como nunca foram ouvidas
E nelas dizerem-se podemos existir.
Habitamos nelas
Como Jonas o grande peixe.
Elas pronunciam-se
Trazendo-nos em viagem do nada para o silêncio.
Sustentam-nos
Como o jejum alimentando Nínive
E como salva a cinza em Nínive espalhando-se
Podemos propagá-las
Podemos amá-las até se transformarem
num livro para elas
– um livro não, outra coisa qualquer que não consigo
comparar – um lugar tão indeterminado
Que mesmo a luz
Só imprecisamente é capaz de assinalar
– exemplificam-se com a luz de seres que ressuscitam –
238
Tu és a criança sentada
Que olha para o céu. Há um tesouro
No céu – um coração novo. Reconheces
O interstício solar
Da pupila celeste ? Ela está sobre ti
E contempla – é verdade que é pelas lágrimas
Que começam as visões.
Sim. Agora podemos explicar-te o mistério das
águas: Quantas imagens — uma caligrafia de luz
que nos olha como se tudo o que vemos
nos vê e nos percorre como se fossemos
uma superfície translúcida – é verdade que é
pelas lágrimas
Que começam as visões.
(Invocação a partir de um poema de Daniel Faria)
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Nota:(Por meio do consentimento
na recordação)
O céu será dobrado como um livro, e agora, estende-se como um pergaminho sobre as nossas cabeças. Acariciou-nos, inflamou-nos no seu amor, e nós corremos atrás do aroma
do seu perfume.
Santo Agostinho emprega a mesma palavra (pellis) para significar “pele” e “pergaminho”.
(N. do T.)
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Madalena Machad o Fernand o Hern ande zCuradoria, Design e Impressão de Edições Limitades a partir de arquivos de imagens pessoais
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