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09/06/13 .:.caleidoscópio.:. www.caleidoscopio.psc.br/ideias/bardin.html 1/5 ANÁLISE DE CONTEÚDO: A PROPOSTA DE LAURENCE BARDIN Este trabalho tem por objetivo apresentar a análise de conteúdo como uma das formas possíveis de tratamento de dados em pesquisa. A proposta aqui discutida é da professora da Universidade de Paris V, Laurence Bardin. Situando a análise de conteúdo na história, vemos que seu berço foi nos Estados Unidos como um instrumento de análise das comunicações, há mais de meio século. Porém, a interpretação de textos já era abordada há muito tempo e de diversas formas, como na hermenêutica, que é a arte de interpretar os textos sagrados ou misteriosos. Então, o que pode ser interpretado? Bardin (1977) nos responde que: “Mensagens obscuras que exigem uma interpretação, mensagens com um duplo sentido cuja significação profunda só pode surgir depois de uma observação cuidadosa ou de uma intuição carismática. Por detrás do discurso aparente, geralmente simbólico e polissêmico, esconde-se um sentido que convém desvendar.” O pesquisador que trabalha seus dados a partir da perspectiva da análise de conteúdo está sempre procurando um texto atrás de outro texto, um texto que não está aparente já na primeira leitura e que precisa de uma metodologia para ser desvendado. A análise de conteúdo percorreu um caminho por diversas fontes de dados: as notícias dos jornais, os discursos dos políticos, as cartas trocadas, os anúncios publicitários, os romances autobiográficos, os relatórios oficiais. No início desse caminho, a objetividade da análise era perseguida com empenho. Baldiwn, citado por Bardin (1977), numa tentativa de análise das estruturas de personalidade pelo estudo sistemático de cartas, propõe uma das primeiras tentativas de análise de contingência, ou seja, análise de co-ocorrências de associações ou exclusões de palavras ou temas presentes no material de análise. Aos poucos, a análise de conteúdo foi interessando pesquisadores da lingüística, da etnologia, da história, da psiquiatria, da psicanálise, que vieram para somar com suas pesquisas aos trabalhos de colegas nas áreas da psicologia, das ciências políticas e do jornalismo. Surgiram as discussões sobre as diferenças que existiriam na análise de conteúdo se fosse enfatizada a abordagem qualitativa ou quantitativa nas pesquisas. Na análise quantitativa, o que serviria de referencial seria a freqüência com que surgem certas características do conteúdo. Na análise qualitativa seria a presença ou a ausência de uma dada característica de conteúdo ou de um conjunto de características num determinado fragmento de mensagem que é tomado em consideração. Moreira (2003) traz essa discussão a partir das posições dos autores Souza Filho e Vala. Aos poucos, a exigência da objetividade tornou-se menos rígida e se aceitou a combinação da compreensão clínica com a contribuição estatística. A análise de conteúdo começou a ser vista não apenas com um alcance descritivo, mas com um objetivo de inferência, ou seja, pelos resultados da análise, poder-se-ia regressar às causas. Bardin (1977) nos conta que a partir 1960 três fenômenos afetaram a investigação e a prática da análise de conteúdo: (1) o recurso de programas de computadores; (2) o interesse pelos estudos relacionados à comunicação não verbal; (3) a inviabilidade de precisão dos trabalhos lingüísticos. O s programas de computadores permitiram uma análise mais detalhada dos textos, no que diz respeito à sua mensuração, ou seja, à freqüência de uma determinada unidade de análise; técnicas estatísticas avançadas puderam ser aplicadas. A semiologia começou, também, a explorar o campo de sistema de signos não lingüísticos, campo até então inexplorado: a imagem, a tipografia e a música surgiram como possibilidades de serem trabalhadas através da abordagem da análise de conteúdo. Da mesma forma, os fundamentos teóricos desses novos campos (estruturalismo, psicanálise, por exemplo) começaram a questionar o movimento relativamente linear da análise de conteúdo. Já com a lingüística, surge um questionamento, visto que a análise de conteúdo é confrontada com uma disciplina solidamente constituída e metodologicamente confirmada, mas com finalidade diferente. Há na análise de conteúdo dois pólos: a rigorosidade e a necessidade de ir além das aparências. Metodologicamente, existem duas orientações que ao mesmo tempo em que se confrontam também se complementam: a verificação prudente ou a interpretação brilhante. Para Bardin (1977) a análise de conteúdo de mensagens tem duas funções: · Uma função heurística: - A análise de conteúdo enriquece a tentativa exploratória, aumenta a propensão à descoberta; é a análise de conteúdo para ‘ver o que dá’; · Uma função de administração da prova: - Hipóteses sob a forma de questões ou de afirmações provisórias servindo de diretrizes, apelarão para o método de análise sistemática para serem verificadas no sentido de uma confirmação ou de uma infirmação; é a análise de conteúdo para ‘servir de prova’. Na prática essas duas funções se complementam. Bardin (1977) afirma que: “A análise de conteúdo (seria melhor falar de análises de conteúdo) é um método muito empírico, dependente do tipo de ‘fala’ a que se dedica e do tipo de interpretação que se pretende como objetivo. Não existe o pronto-a- vestir em análise de conteúdo, mas somente algumas regras de base, por vezes, dificilmente transponíveis. A técnica de análise de conteúdo adequada ao domínio e ao objetivo pretendidos, tem que ser reinventada a cada momento, exceto para usos simples e generalizados, como é o caso do escrutínio próximo da decodificação e de respostas a perguntas abertas de questionários cujo conteúdo é avaliado rapidamente por temas.” A análise de conteúdo, como um conjunto de técnicas de análise das comunicações, apesar de poder ser considerada como um instrumento de análise, é marcada por uma grande diversidade de formas e é adaptável a um campo de aplicação muito vasto, ou seja, o campo das comunicações. A análise de conteúdo pode ser uma análise dos ‘significados’, como na análise temática, ou uma análise de ‘significantes’, como na análise léxica. Hoje, de acordo com Bardin (1977), a análise de conteúdo é definida como: “Um conjunto de técnicas de análise das comunicações visando obter, por procedimentos, sistemáticos e objetivos de descrição do conteúdo das mensagens, indicadores (quantitativos ou não) que permitam a inferência de conhecimentos relativos às condições de produção/recepção (variáveis inferidas) destas mensagens.” era uma vez... | enquanto tomava um chá... | quando foi ver... | olhando o mar... | e foi assim que aconteceu! | home

Análise de Conteúdo. a Proposta de Laurence Bardin

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Texto sobre a proposta de análise de conteúdo apresentada por Laurence Bardin.

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ANÁLISE DE CONTEÚDO:A PROPOSTA DE LAURENCE BARDIN

Es te trabalho tem por objetivo apresentar a análise de conteúdo como uma das formas poss íveis de tratamento de dados em

pesquisa. A propos ta aqui discutida é da professora da Univers idade de P aris V , Laurence Bardin.

Situando a análise de conteúdo na his tória, vemos que seu berço foi nos Es tados Unidos como um ins trumento de análise das

comunicações , há mais de meio século. P orém, a interpretação de textos já era abordada há muito tempo e de diversas formas ,

como na hermenêutica, que é a arte de interpretar os textos sagrados ou mis teriosos .

Então, o que pode ser interpretado? Bardin (1977) nos responde que:

“Mensagens obscuras que exigem uma interpretação, mensagens com um duplo sentido cuja s ignificação profunda

só pode surgir depois de uma observação cuidadosa ou de uma intuição carismática.

P or detrás do discurso aparente, geralmente s imbólico e polis sêmico, esconde-se um sentido que convém

desvendar.”

O pesquisador que trabalha seus dados a partir da perspec tiva da análise de conteúdo es tá sempre procurando um texto atrás de

outro texto, um texto que não es tá aparente já na primeira leitura e que prec isa de uma metodologia para ser desvendado.

A análise de conteúdo percorreu um caminho por diversas fontes de dados: as notíc ias dos jornais , os discursos dos políticos , as

cartas trocadas , os anúnc ios public itários , os romances autobiográficos , os relatórios ofic iais . No iníc io desse caminho, a

objetividade da análise era perseguida com empenho. Baldiwn, c itado por Bardin (1977), numa tentativa de análise das es truturas

de personalidade pelo es tudo s is temático de cartas , propõe uma das primeiras tentativas de análise de contingênc ia, ou seja,

análise de co-ocorrênc ias de assoc iações ou exc lusões de palavras ou temas presentes no material de análise. A os poucos , a

análise de conteúdo foi interessando pesquisadores da lingüís tica, da etnologia, da his tória, da ps iquiatria, da ps icanálise, que

vieram para somar com suas pesquisas aos trabalhos de colegas nas áreas da ps icologia, das c iênc ias políticas e do jornalismo.

Surgiram as discussões sobre as diferenças que exis tiriam na análise de conteúdo se fosse enfatizada a abordagem qualitativa ou

quantitativa nas pesquisas . Na análise quantitativa, o que serviria de referenc ial seria a freqüênc ia com que surgem certas

carac terís ticas do conteúdo. Na análise qualitativa seria a presença ou a ausênc ia de uma dada carac terís tica de conteúdo ou de

um conjunto de carac terís ticas num determinado fragmento de mensagem que é tomado em cons ideração. Moreira (2003) traz

essa discussão a partir das pos ições dos autores Souza Filho e V ala.

A os poucos , a exigênc ia da objetividade tornou-se menos rígida e se aceitou a combinação da compreensão c línica com a

contribuição es tatís tica. A análise de conteúdo começou a ser vis ta não apenas com um alcance desc ritivo, mas com um objetivo

de inferênc ia, ou seja, pelos resultados da análise, poder-se-ia regressar às causas .

Bardin (1977) nos conta que a partir 1960 três fenômenos afetaram a inves tigação e a prática da análise de conteúdo: (1) o

recurso de programas de computadores; (2) o interesse pelos es tudos relac ionados à comunicação não verbal; (3) a inviabilidade

de prec isão dos trabalhos lingüís ticos . O s programas de computadores permitiram uma análise mais detalhada dos textos , no que

diz respeito à sua mensuração, ou seja, à freqüênc ia de uma determinada unidade de análise; técnicas es tatís ticas avançadas

puderam ser aplicadas . A semiologia começou, também, a explorar o campo de s is tema de s ignos não lingüís ticos , campo até

então inexplorado: a imagem, a tipografia e a mús ica surgiram como poss ibilidades de serem trabalhadas através da abordagem

da análise de conteúdo. Da mesma forma, os fundamentos teóricos desses novos campos (es truturalismo, ps icanálise, por

exemplo) começaram a ques tionar o movimento relativamente linear da análise de conteúdo. Já com a lingüís tica, surge um

ques tionamento, vis to que a análise de conteúdo é confrontada com uma disc iplina solidamente cons tituída e metodologicamente

confirmada, mas com finalidade diferente.

Há na análise de conteúdo dois pólos : a rigoros idade e a necess idade de ir além das aparênc ias . Metodologicamente, exis tem

duas orientações que ao mesmo tempo em que se confrontam também se complementam: a verificação prudente ou a

interpretação brilhante.

P ara Bardin (1977) a análise de conteúdo de mensagens tem duas funções:

· Uma função heurís tica:

- A análise de conteúdo enriquece a tentativa exploratória, aumenta a propensão à descoberta; é a

análise de conteúdo para ‘ver o que dá’;

· Uma função de adminis tração da prova:

- H ipóteses sob a forma de ques tões ou de afirmações provisórias servindo de diretrizes , apelarão

para o método de análise s is temática para serem verificadas no sentido de uma confirmação ou de

uma infirmação; é a análise de conteúdo para ‘servir de prova’.

Na prática essas duas funções se complementam. Bardin (1977) afirma que:

“A análise de conteúdo (seria melhor falar de análises de conteúdo) é um método muito empírico, dependente do

tipo de ‘fala’ a que se dedica e do tipo de interpretação que se pretende como objetivo. Não exis te o pronto-a-

ves tir em análise de conteúdo, mas somente algumas regras de base, por vezes , dific ilmente transponíveis . A

técnica de análise de conteúdo adequada ao domínio e ao objetivo pretendidos , tem que ser reinventada a cada

momento, exceto para usos s imples e generalizados , como é o caso do esc rutínio próximo da decodificação e de

respos tas a perguntas abertas de ques tionários cujo conteúdo é avaliado rapidamente por temas .”

A análise de conteúdo, como um conjunto de técnicas de análise das comunicações , apesar de poder ser cons iderada como um

ins trumento de análise, é marcada por uma grande divers idade de formas e é adaptável a um campo de aplicação muito vas to, ou

seja, o campo das comunicações . A análise de conteúdo pode ser uma análise dos ‘s ignificados ’, como na análise temática, ou

uma análise de ‘s ignificantes ’, como na análise léxica.

Hoje, de acordo com Bardin (1977), a análise de conteúdo é definida como:

“Um conjunto de técnicas de análise das comunicações visando obter, por procedimentos , s is temáticos e

objetivos de desc rição do conteúdo das mensagens , indicadores (quantitativos ou não) que permitam a inferênc ia

de conhec imentos relativos às condições de produção/recepção (variáveis inferidas) des tas mensagens .”

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Ferreira (2003), a partir da abordagem de Bardin, relac iona as poss ibilidades de uso da análise de conteúdo:

“A análise de conteúdo é usada quando se quer ir além dos s ignificados , da leitura s imples do real. A plica-se a

tudo que é dito em entrevis tas ou depoimentos ou esc rito em jornais , livros , textos ou panfletos , como também a

imagens de filmes , desenhos , pinturas , cartazes , televisão e toda comunicação não verbal: ges tos , pos turas ,

comportamentos e outras expressões culturais .”

A tabela abaixo (Tabela 1), extraída de Bardin (1977, p. 35) resume as poss ibilidades de aplicação da análise de conteúdo.

Tabela 1 – Domínios da análise de conteúdo

De acordo com Bardin (1977), a intenção da análise de conteúdo é:

“A inferênc ia de conhec imentos relativos às condições de produção (ou, eventualmente, de recepção), inferênc ia

es ta que recorre a indicadores (quantitativos ou não).

(...)

Se a desc rição (a enumeração das carac terís ticas do texto, resumida após tratamento) é a primeira etapa

necessária e se a interpretação (a s ignificação concedida a es tas carac terís ticas) é a última fase, a inferênc ia é o

procedimento intermediário que vem permitir a passagem explíc ita e controlada de uma à outra.”

Es tas inferênc ias procuram esc larecer as causas da mensagem ou as conseqüênc ias que a mensagem pode provocar.

P ara que possa realizar a sua função de análise das mensagens , a análise de conteúdo conta com a lingüís tica e com as técnicas

documentais , apesar de cons truir para s i um campo próprio de inves tigação. O objeto da lingüís tica é a língua, no que se refere

ao seu uso coletivo e virtual (como poss ibilidades de uso) da linguagem; já a análise de conteúdo tem como objeto a palavra, no

que se refere ao aspec to individual e atual (em ação) da linguagem. P ara Bardin (1977), “a análise de conteúdo é uma busca de

outras realidades através das mensagens”. No que se refere às técnicas documentais , o autor afirma que se suprimirmos da

análise de conteúdo a inferênc ia, ficando-nos limitados à análise categorial ou temática, teremos uma identificação muito grande

entre as duas formas de tratarmos o dado de pesquisa. P orém, apesar das semelhanças aparentes , exis tem algumas

espec ific idades de cada uma das abordagens , como resumido na Tabela 2:

Tabela 2 – Análise Documental X Análise de Conteúdo

ANÁLISEDOCUMENTAL

ANÁLISE DE CONTEÚDO

T rabalha com

documentos

T rabalha com mensagens (comunicações)

C lass ificação-

indexação

C ategorial-temática (é apenas uma das

poss ibilidades de análise)

O bjetivo:

representação

condensada da

informação para

consulta e

armazenagem

O bjetivo: é a manipulação de mensagens (conteúdo

e expressão desse conteúdo) para evidenc iar os

indicadores que permitam inferir sobre uma outra

realidade que não a da mensagem

A análise de conteúdo se organiza em três momentos:

Na pré-análise se organiza o material, que cons titui o C O RPUS da pesquisa. Na exploração do material há três etapas: a) a

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Na pré-análise se organiza o material, que cons titui o C O RPUS da pesquisa. Na exploração do material há três etapas: a) a

escolha das unidades de contagem, b) a seleção das regras de contagem e c ) a escolha de categorias . O tratamento dos

resultados compreende a inferênc ia e a interpretação.

Ferreira (2003) traz o percurso do trabalho com dados de pesquisa a partir da perspec tiva da análise de conteúdo:

· P ré-análise

- Es te momento é o de organizar o material, de escolher os documentos a serem analisados ,

formular hipóteses ou ques tões norteadoras , elaborar indicadores que fundamentem a interpretação

final.

- Inic ia-se o trabalho escolhendo os documentos a serem analisados . No caso de entrevis tas , elas

serão transc ritas e a sua reunião cons tituirá o C O RPUS da pesquisa. P ara tanto, é prec iso

obedecer às regras de:

- exaus tividade – deve-se esgotar a totalidade da comunicação, não omitir nada;

- representatividade – a amostra deve representar o universo;

- homogeneidade – os dados devem referir-se ao mesmo tema, serem obtidos por

técnicas iguais e colhidos por indivíduos semelhantes ,

- pertinênc ia – os documentos prec isam adaptar-se ao conteúdo e objetivo da

pesquisa;

- exc lus ividade – um elemento não deve ser c lass ificado em mais de uma

categoria.

- O primeiro contato com os documentos se cons titui no que Bardin (1979) chama de "leitura

flutuante". É a leitura em que surgem hipóteses ou ques tões norteadoras , em função de teorias

conhec idas .

- A través da leitura flutuante, surgem as primeiras hipóteses e objetivos do trabalho. H ipótese é

uma explicação antec ipada do fenômeno observado, uma afirmação provisória, que nos propomos

verificar. O objetivo geral da pesquisa é sua finalidade maior, de acordo com o quadro teórico que

embasa o conhec imento. Nem sempre as hipóteses são es tabelec idas na pré-análise, afirma Bardin

(1979); elas podem surgir, ass im como as ques tões norteadoras , no decorrer da pesquisa.

- A pós a leitura flutuante deve-se escolher índices , que surgirão das ques tões norteadoras ou das

hipóteses , e organizá-los em indicadores .

- O s temas que se repetem com muita freqüênc ia podem ser índices – e "se recortam do texto em

unidades comparáveis de categorização para análise temática e de modalidades de codificação

para o regis tro dos dados"(op.c it.).

- A preparação do material se faz pela "edição" das entrevis tas transc ritas , dos artigos

recortados , das ques tões anotadas em fichas . A organização do material se realiza em colunas ,

com vazios à esquerda e à direita, para anotar e marcar semelhanças e contras tes . P ode-se usar

lápis colorido, para sublinhar as semelhanças com a mesma cor. Naturalmente, es tes

procedimentos dependem dos interesses do pesquisador e dos objetivos que o levam a realizar a

pesquisa.

· Exploração do material

- Es ta é a etapa mais longa e cansativa. É a realização das dec isões tomadas na pré-análise. É o

momento da codificação – em que os dados brutos são trans formados de forma organizada e

"agregadas em unidades , as quais permitem uma desc rição das carac terís ticas pertinentes do

conteúdo", segundo Hols ti, apud Bardin (1979: 104).

- A codificação compreende a escolha de unidades de regis tro, a seleção de regras de contagem e

a escolha de categorias .

- a escolha de unidades de regis tro (recorte);

· Unidade de regis tro é a unidade de s ignificação a codificar. P ode

ser o tema, palavra ou frase. Recorta-se o texto em função da

unidade de regis tro.

· Tema é a afirmação de um assunto. C omo unidade de regis tro, é a

unidade que se liberta naturalmente do texto analisado.

· Todas as palavras podem ser levadas em cons ideração como

unidades de regis tro. Serão palavras-chave; palavras-tema;

palavras plenas ou vazias ; categorias de palavras: subs tantivos ,

adjetivos , verbos , e etc .

· O personagem pode ser escolhido como unidade de regis tro:

traços de caráter, s tatus soc ial, papel, etc .

· Se o acontec imento for tomado como unidade de regis tro, o

recorte se fará em unidades de ação, nos casos de filmes , contos ,

relatos , lendas , etc .

· O documento serve como unidade de regis tro quando a idéia

princ ipal de um livro, um relato, uma entrevis ta é sufic iente para o

objetivo desejado.

· P ara es tabelecer as unidades de regis tro, é prec iso, às vezes ,

fazer referênc ia ao contexto da unidade que se quer regis trar.

Então, o contexto serve para compreender a unidade de regis tro.

- a seleção de regras de contagem (enumeração);

· a presença de elementos pode ser s ignificativa.

· a ausênc ia pode s ignificar bloqueios ou traduzir vontade

escondida, como acontece, freqüentemente, nos discursos dos

políticos;

· a freqüênc ia com que aparece uma unidade de regis tro denota-lhe

importânc ia. Se cons ideramos todos os itens de mesmo valor, a

regularidade com que aparece será o que se cons idera mais

s ignificativo.

· a intens idade será medida através dos tempos do verbo

(condic ional, futuro, imperativo), dos advérbios de modo, adjetivos e

atributos qualificativos;

· a direção será favorável, des favorável ou neutra. O s pólos

direc ionais podem ser: pos itivo ou negativo, bonito ou feio (c ritério

es tético), pequeno ou grande (c ritério de tamanho).

· a ordem de aparição das unidades de regis tro é poss ível ser

dec is iva. P or exemplo, se o sujeito A es tá em primeiro lugar e o

sujeito D em último, pode ter s ignificado importante.

· A co-ocorrênc ia é a presença s imultânea de duas ou mais

unidades de regis tro. Es te fato nos mostra a dis tribuição dos

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unidades de regis tro. Es te fato nos mostra a dis tribuição dos

elementos e sua assoc iação.

- a escolha de categorias (c lass ificação e agregação).

· A maioria dos procedimentos de análise qualitativa organiza-se

em torno de categorias .

· A categoria é uma forma geral de conceito, uma forma de

pensamento. A s categorias são reflexo da realidade, sendo

s ínteses , em determinado momento, do saber. P or is so, se

modificam cons tantemente, ass im como a realidade.

· Na análise de conteúdo, as categorias são rubricas ou c lasses

que reúnem um grupo de elementos (unidades de regis tro) em razão

de carac terís ticas comuns .

· P ara escolher categorias pode haver vários c ritérios : semântico

(temas), s intático (verbos , adjetivos , pronomes), léxico (juntar pelo

sentido das palavras , agrupar os s inônimos , os antônimos),

express ivo (agrupar as perturbações da linguagem, da esc rita).

· A categorização permite reunir maior número de informações à

cus ta de uma esquematização e ass im correlac ionar c lasses de

acontec imentos para ordená-los . A categorização representa a

passagem dos dados brutos a dados organizados .

· Na atividade de agrupar elementos comuns , es tabelecendo

categorias , seguem-se duas etapas: inventário (isolam-se os

elementos comuns) e c lass ificação (repartem-se os elementos e

impõem-se certa organização à mensagem).

· P ara categorizar, podem empregar-se dois processos inversos:

tendo es tabelec ido o s is tema de categorias , baseado em hipóteses

teóricas , repartem-se os elementos à medida em que são

encontrados; é o procedimento de "caixas", conforme Bardin

(1979:119); as categorias emergem da c lass ificação analógica dos

elementos , surgem da análise do trabalho; é o procedimento por

"milha", para Bardin.

· P ara serem cons ideradas boas , as categorias devem possuir

certas qualidades: exc lusão mútua – cada elemento só pode exis tir

em uma categoria; homogeneidade – para definir uma categoria, é

prec iso haver só uma dimensão na análise; pertinênc ia – as

categorias devem dizer respeito às intenções do inves tigador, aos

objetivos da pesquisa às ques tões norteadoras , às carac terís ticas

da mensagem, etc .; objetividade e fidelidade – se as categorias

forem bem definidas , se os índices e indicadores que determinam a

entrada de um elemento numa categoria forem bem c laros , não

haverá dis torções devido à subjetividade dos analis tas ;

produtividade – as categorias serão produtivas se os resultados

forem férteis em inferênc ias , em hipóteses novas , em dados exatos .

· T ratamento dos resultados

- A inferênc ia se orienta por diversos pólos de atenção, que são os pólos de atração da

comunicação. Numa comunicação há sempre o emissor e o receptor, os pólos de inferênc ia

propriamente ditos , além da mensagem e o seu suporte, ou canal.

- O emissor é o produtor da mensagem. É um indivíduo ou um grupo de indivíduos .

A mensagem que ele emite, representa-o.

- O receptor pode ser um indivíduo. A ss im, o es tudo da mensagem pode fornecer

dados sobre o público a que ela se des tina.

- A mensagem é o ponto de partida de qualquer análise. Na análise da mensagem,

é poss ível es tudar o continente ou o conteúdo, ou os s ignificantes ou os

s ignificados , ou o código ou a s ignificação.

- O canal, o meio, o ins trumento, o suporte material do código, serve mais para

procedimentos experimentais do que para análise de conteúdo.

- A o se descobrir um tema nos dados , é prec iso comparar enunc iados e ações entre s i, para ver

se exis te um conceito que os unifique.

- Q uando se encontram temas diferentes , é necessário achar semelhanças que possa haver entre

eles .

- A propos ição é um enunc iado geral baseado nos dados . Enquanto os conceitos podem ou não se

ajus tar, as propos ições são verdadeiras ou erradas , mesmo que o pesquisador possa ou não ter

condições de demonstrá-lo. O certo é que as propos ições derivam do es tudo cuidadoso dos dados .

- Durante a interpretação dos dados , é prec iso voltar atentamente aos marcos teóricos ,

pertinentes à inves tigação, pois eles dão o embasamento e as perspec tivas s ignificativas para o

es tudo. A relação entre os dados obtidos e a fundamentação teórica é que dará sentido à

interpretação.

- A s interpretações a que levam as inferênc ias serão sempre no sentido de buscar o que se

esconde sob a aparente realidade, o que s ignifica verdadeiramente o discurso enunc iado, o que

querem dizer, em profundidade, certas afirmações , aparentemente superfic iais .

- Bardin (1977) apresenta as poss íveis técnicas utilizadas na análise de conteúdo:

análise categorial, análise de avaliação, análise da enunc iação, análise da

expressão, análise das relações e análise do discurso.

Um discurso é determinado pelas condições de produção e pelo s is tema lingüís tico ao qual es tá submetido. C onhecendo-se essas

suas es feras de um discurso, pode-se compreender o processo de produção de um discurso. “O discurso es tá s ituado não só pelo

referente como pela pos ição do emissor nas relações de força e também pela sua relação com o receptor. O emissor e o receptor

do discurso correspondem a lugares determinados na es trutura de uma formação soc ial”. (Bardin, 1977)

Então, o objetivo de uma análise do discurso é descobrir as relações exis tentes entre o exterior e o próprio discurso. A técnica

da análise do discurso também envolve operações de desmembramento e de c lass ificação de suas unidades de regis tro

(c lass ificações semântica, s intática e lógica, s imultaneamente). O s operadores de ligação também são cons iderados e

desempenham um papel importante na análise.

A análise de conteúdo poss ibilita que uma ‘leitura profunda’ das comunicações ocorra, indo além da ‘leitura aparente’. O papel do

analis ta é semelhante ao do arqueólogo, do detetive ou do ps icoterapeuta. Freud já nos falava da ‘linguagem oculta’, V ygotsky

(2000) nos diz:

“P ara compreender a fala de outrem não bas ta entender as suas palavras – temos que compreender o seu

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“P ara compreender a fala de outrem não bas ta entender as suas palavras – temos que compreender o seu

pensamento. Mas nem mesmo isso é sufic iente – também é prec iso que conheçamos a sua motivação. Nenhuma

análise ps icológica de um enunc iado es tará completa antes de se ter atingido esse plano.”

Lembramo-nos do excelente filme Mente Brilhante, onde um pesquisador, em seu delírio, é contratado pelo governo americano

para dec ifrar mensagens de guerra ‘escondidas ’ em notíc ias e anúnc ios de jornal. Q ue magnífico exemplo da aplicação da análise

de conteúdo!

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

Bardin, L. (1977). A nálise de C onteúdo. Lisboa, P ortugal: Edições 70

Ferreira, B. A nálise de C onteúdo. http://www.ulbra.br/ps icologia/ps i-dicas-art.htm em 18/01/03

Moreira, E . A nálise de C onteúdo: duas perspec tivas metodológicas para interpretação de variáveis qualitativas e quantitativas .

http://www.funesc .com.br/engenho2/textos/ecul_x02.htm em 18/01/03

V igotski, L. S. (2000). P ensamento e linguagem. - 2a. ed. – São P aulo: Martins Fontes