Upload
others
View
4
Download
0
Embed Size (px)
Citation preview
1
ANAIS do XII Ciclo de Debates em Economia Industrial, Trabalho e
Tecnologia
Pontifícia Universidade Católica de São Paulo.Programa de Estudos Pós-Graduados em Economia Política.
Grupo de Pesquisas em Economia Industrial, Trabalho e Tecnologia .
XII CICLO DE DEBATES EM ECONOMIA INDUSTRIAL, TRABALHO E TECNOLOGIADias 12 e 13 de Maio de 2014 - PUC- SP Auditório - 117 A
8:00 - 8:30 h - Abertura
Prof. Dr. Antônio Correa de Lacerda - Coordenador do PEPGEP- PUC/SP
8:30 – 12:00 h
Economia do Trabalho - Coordenação Prof. Renaldo Antônio Gonsalves (PUCSP)•. Maria Cristina Cacciamali, Fábio Tatei e Tânia de Toledo Lima (USP) - Determinants of Unemployment Duration for Women and Men.•Patrícia Silva Gomes (PUC/SP) e João Batista Pamplona -Breve reflexão teórica da relação entre população e economia•Vladimir Sipriano Camillo (ESA) - Condicionantes da desigualdade da renda do trabalho brasileira no final da primeira década de 2000: algumas evidências empíricas.•Anita Kon (PUC/SP) - Economia Criativa e Trabalho no Brasil
_________________________________________________________________________________________________________
Organizadores: Profª Anita Kon, e Profª Elizabeth Borelli e Equipe EITT-PUCSPLocal : Pontifícia Universidade Católica de São Paulo- Rua Monte Alegre, 984 -São Paulo – SP.
Tels: (011) 3670-8516 (Programa de Economia Política).
12/05/2014 - Segunda-feira
14:30 -18:00 h
Economia Industrial e Tecnologia - Coordenação: Prof. Luiz Guilherme de Oliveira (UnB),•Francisco Carlos Ribeiro, Flaviano Agostinho de Lima, et alii (FATEC), -A simulação criativa, criando valor e tecnologia para pequenas empresas e microempresas no Parque Tecnológico de Sorocaba.•Neuza Santos Souza e Frederico Araujo Turolla (ESPM) -Análise da internacionalização de empresas multinacionais do setor de saneamento•Luiz Guilherme de Oliveira (UnB) -A política de offset e o Brasil: perspectivas da construção de uma agenda de política de transferência tecnológica de defesa à luz da experiência internacional.•Francisco Carlos Ribeiro, Sidney Benedito de Oliveira et alii (FATEC), Informações estratégicas e consolidação legal como estratégia de desenvolvimento industrial. O caso de Sorocaba.
13/05/2014 – Terça-feira
8:30 -12:00 h
Economia de Serviços e Atuária – Coordenação: Prof. Luis Patricio Ortiz Flores (PUCSP/SEADE)•Antônio Cordeiro Filho (PUCSP) - A previdência privada no Brasil•Luis P Ortiz Flores (PUCSP/SEADE) - Aspectos Demográficos da população economicamente ativa do Estado de São Paulo•Renaldo Antônio Gonsalves (PUCSP) - Variáveis que determinam a formação da taxa de juros no Brasil: Um estudo preliminar.•Luis P Ortiz Flores (PUCSP/SEADE) -Semelhanças e diferenças entre o Índice de Desenvolvimento Humano (IDH) das Nações Unidas e o Índice Paulista de Responsabilidade Social (IPRS) da Fundação Seade
14:30 -18:00 h
Economia da Sustentabilidade - Coordenação: Profa. Elizabeth Borelli
•Luiz Daniel Cilli (IPT) e Eduardo Luiz Machado (UNIFESP)• Sustentabilidade nas Instituições Financeiras: o caso do Itaú UnibancoPaula Meyer Soares (UnB), Fabio Konishi (FATEC) e Marcelo Santana (IFBA- Bahia) -Evolução da tecnologia biocombustível no Brasil: uma análise do segmento automobilístico e a sua correlação com o setor sucroalcooleiro.Luciana Schwandner Ferreira (FAU/USP) -O papel socioambiental da vegetação urbana: custos e benefícios.•Elizabeth Borelli (PUC/SP) -A questão da sustentabilidade urbana na Baixada Santista.
EITT20
2
Índice
Apresentação
Economia do Trabalho e População
Maria Cristina Cacciamali, Fábio Tatei e Tânia de Toledo Lima (USP)
Determinants of Unemployment Duration for Women and Men.
Patrícia Silva Gomes (PUC/SP) e João Batista Pamplona
Breve reflexão teórica da relação entre população e economia
Vladimir Sipriano Camillo (ESA)
Condicionantes da desigualdade da renda do trabalho brasileira no final da
primeira década de 2000: algumas evidências empíricas.
Anita Kon (PUC/SP)
Economia Criativa e Trabalho no Brasil
Economia Industrial e Tecnologia
Francisco Carlos Ribeiro, Flaviano Agostinho de Lima, Francisco de Assis Toti, Luiz
Carlos Rosa, Célio Olderigi De Conti e Antonio Carlos de Oliveira (FATEC)
A simulação criativa, criando valor e tecnologia para pequenas empresas e
microempresas no Parque Tecnológico de Sorocaba.
Neuza Santos Souza e Frederico Araujo Turolla (ESPM)
Análise da internacionalização de empresas multinacionais do setor de saneamento
Luiz Guilherme de Oliveira (UnB),
A política de offset e o Brasil: perspectivas da construção de uma agenda de
política de transferência tecnológica de defesa à luz da experiência internacional.
Francisco Carlos Ribeiro, Sidney Benedito de Oliveira e Geraldo Cesar Almeida
(FATEC), Informações estratégicas e consolidação legal como estratégia de
desenvolvimento industrial. O caso de Sorocaba.
Economia de Serviços e Atuária
Antônio Cordeiro Filho (PUCSP)
A previdência privada no Brasil
Luis P Ortiz Flores (PUCSP/SEADE)
Aspectos Demográficos da população economicamente ativa do Estado de São
Paulo
Renaldo Antônio Gonsalves (PUCSP)
Variáveis que determinam a formação da taxa de juros no Brasil: Um estudo
preliminar.
Economia da Sustentabilidade Luiz Daniel Cilli (IPT) e Eduardo Luiz Machado (UNIFESP)
Sustentabilidade nas Instituições Financeiras: o caso do Itaú Unibanco.
Paula Meyer Soares (UnB), Fabio Konishi (FATEC) e Marcelo Santana (IFBA- Bahia)
Evolução da tecnologia biocombustível no Brasil: uma análise do segmento
automobilístico e a sua correlação com o setor sucroalcooleiro.
Luciana Schwandner Ferreira (FAU/USP)
O papel socioambiental da vegetação urbana: custos e benefícios.
Elizabeth Borelli (PUC/SP)
A questão da sustentabilidade urbana na Baixada Santista.
3
Apresentação
O Grupo de Pesquisas em Economia Industrial, Trabalho e Tecnologia do
Programa de Estudos Pós-Graduados em Economia Política da PUC/SP, está
comemorando 12 anos de realizações de Ciclos de Debates e 20 anos de atividades.
As atividades de pesquisa desenvolvidas pelo EITT reúnem trabalhos sobre temas
relacionados às áreas que dão nome ao grupo, com o objetivo de constante
atualização da análise sobre as transformações estruturais e as questões
conjunturais pertinentes.
Durante estes 20 anos recebemos a colaboração de professores, mestrandos,
doutorandos e graduandos da PUC e de outras instituições. Estas contribuições
tomaram a forma de participação em reuniões, discussões teóricas e
metodológicas, apresentação de trabalhos em seminários e outros eventos internos
e externos à PUC, redação de textos para publicações do grupo, bem como
colaboração na organização e no apoio logístico às atividades do grupo.
Os integrantes do EITT desejam mostrar seu reconhecimento a pessoas e
instituições que colaboraram para a continuidade de suas atividades. A publicação
de livros e a organização de Ciclos de Debates tem sido possível graças ao apoio
financeiro da FAPESP, CNPq e da CAPES.
O XII Ciclo de Debates em Economia Industrial, Trabalho e Tecnologia
conta com a colaboração dos colegas especializados de várias instituições de Ensino
e Pesquisa, para o debate das recentes pesquisas nas áreas de Economia do
Trabalho, Economia Industrial e Tecnologia, Economia da Serviços e Atuária e
Economia da Sustentabilidade.
A mesa de debates sobre Economia do Trabalho, sob coordenação do Prof.
Renaldo Antônio Gonçalves (PUCSP) reúne os professores Maria Cristina
Cacciamali et alii (USP), Vladimir S. Camillo (ESA) e Anita Kon (PUC/SP), para a
discussão sobre políticas públicas e questões estruturais do mercado de trabalho
brasileiro.
Os trabalhos de pesquisas sobre Economia Industrial e Tecnologia, cujo
debate é coordenado pelo Prof. Luiz Guilherme de Oliveira (UnB) conta com
pesquisas dos professores Francisco Carlos Ribeiro, et alii (FATEC) que
apresentam duas pesquisas, Neuza S Souza e Frederico Araujo Turolla (ESPM) e
Luiz Guilherme de Oliveira (UnB) abordando as questões recentes que envolem
setores industriais estratégicos do Brasil.
Sobre Economia de Serviços e Atuária, sob coordenação do Prof. Luis
Patrício Ortiz Flores, (PUCSP/SEADE) as discussões contam com a participação
dos professores Antonio Cordeiro Filho (PUC/SP), Luis Ortiz (PUC/SP), Renaldo
A. Gonsalves (PUC/SP), que apresentarão suas recentes pesquisas.
Os debates sobre Economia da Sustentabilidade, coordenados pela Profa.
Elizabeth Borelli (PUCSP), serão apresentados pelos pesquisadores Luiz Daniel
Cilli (IPT) e Eduardo Luiz Machado (UNIFESP), Paul M. Soares (UnB), Fabio
Konishi (FATEC-SP), Marcelo Santana (IFBA) e Elizabeth Borelli, que apontam
os desafios recentes da sustentabilidade no Brasil e suas conseqüências sobre
setores econômicos específicos
O EITT espera continuar contando com a colaboração dos colegas em suas
futuras atividades.
Anita Kon
4
Economia do Trabalho
DETERMINANTS OF UNEMPLOYMENT DURATION FOR WOMEN AND
MEN
Maria Cristina Cacciamali1
Fábio Tatei
Tânia de Toledo Lima
RESUMO
O artigo tem objetivo de apresentar estimativas sobre os determinantes da duração
do desemprego, segundo sexo para as regiões metropolitanas brasileiras, nos anos de
2000 e 2010. Para tanto utilizamos a base de dados da PME para os anos 1992 -2012,
que permite acompanhar um mesmo indivíduo ao longo do tempo. Dentre os resultados
encontrados, destacamos que as mulheres tendem a apresentar maior probabilidade de
desocupação perante os homens, independente do tempo de duração do desemprego. O
resultado fornece indícios para duas situações: os homens chefes de família tendem a
aceitar mais facilmente uma ocupação, mesmo aquém de sua qualificação e/ou com
salários inferiores ao desejado; e concomitantemente, as mulheres tendem a permanecer
mais tempo na situação de desemprego para cuidar da família.
Abstract
This paper aims to present the determinants of the length of unemployment by sex
in the Brazilian Metropolitan Urban Areas during the period from 2000 e 2010. This
study highlights the higher probability of unemployment for women than men,
regardless unemployment duration. This result show two behaviors: male household
heads accept more easily an occupation to provide income to their family; and women
tend to stay longer in unemployment to take care of their family.
Classificação JEL: C14, J64, J71
1 Pesquisa realizada sob os auspícios do CNPq. Maria Cristina Cacciamali. Doutor e Livre
Docente pela Universidade de São Paulo, Coordenadora do Núcleo de Estudo e Pesquisa de
Política Internacional. Estudos Internacionais & Políticas Comparadas – NESPI/USP/CNPq,
Bolsista sênior CNPq. E-mail: [email protected]; Fábio Tatei, Mestre pela Universidade de
São Paulo, pesquisador pleno do NESPI/USP/CNPq. E-mail: [email protected]; Tânia de
Toledo Lima, Mestre pela Universidade Federal de São Carlos, e membro do NESP/USP/CNPq.
E-mail: [email protected]
5
1. INTRODUÇÃO
Desde os anos 1970 a participação feminina no mercado de trabalho aumentou
expressivamente, refletindo importantes transformações socioeconômicas e culturais
pelas quais o Brasil passava. Assim, tanto a expansão da economia como a deterioração
dos salários reais incentivaram a expansão feminina no mercado de trabalho, seja pelas
condições favoráveis de incorporação de um maior contingente de trabalhadores, seja
pela necessidade de complementação e manutenção da renda familiar.
Por outro lado, esse aumento da participação no mercado de trabalho se reflete,
muitas vezes, em dupla jornada de trabalho das mulheres responsáveis pelos afazeres
domésticos (Leone e Baltar, 2008). Ademais, a maior inserção das mulheres no mercado
de trabalho ocorre de maneira desigual perante os homens. O tratamento discriminatório
nas relações de trabalho se exacerba por meio dos diferenciais de salários por sexo
[Soares (2000); Biderman e Guimarães (2005); Oliveira e Rios-Neto (2006);
Cacciamali, Tatei e Rosalino (2009)], pela segregação ocupacional das mulheres em
atividades relacionadas principalmente ao setor de serviços [Oliveira (2003); King
(2009)], pelas dificuldades de acesso delas aos cargos de chefia [Bruschini e Puppin
(2004); Abreu e Meirelles (2012)] e pela elevada taxa de desemprego feminina [Barros,
Camargo e Mendonça (1997); Oliveira, Scorzafave e Pazello (2009)].
Posto isto, o objetivo do presente artigo é estimar os determinantes da duração do
tempo de desemprego nas regiões metropolitanas brasileiras, no período de 1992 a
2010, com o objetivo de verificar se as relações de gênero afetam distintamente esse
fenômeno. Este tema ainda foi pouco explorado pela literatura especializada brasileira e
ganha relevância por oferecer as bases necessárias para a concepção de políticas
públicas que visem combater as desigualdades e limitações nesse mercado.
Para tanto, aplicamos modelos paramétricos, semiparamétricos e não paramétricos
para a estimação dos determinantes aos microdados da Pesquisa Mensal de Emprego
(PME) do IBGE. A escolha dessa base de dados se deve ao fato de ela permitir a
construção de um painel de modo a acompanhar um mesmo indivíduo ao longo do
tempo, mesmo que por um período relativamente curto. Os achados encontrados
ratificam as evidências que reforçam a relevância das variáveis relacionadas ao capital
humano tanto sobre as chances de ocupação e tempo de desemprego, como para a
determinação dos salários, em uma situação sempre mais desfavorável para o sexo
feminino.
O artigo encontra-se estruturado em três seções, além desta introdução. A segunda
seção consiste de uma revisão teórica sobre a questão dos determinantes da duração do
tempo de desemprego. Na terceira seção apresentamos as estruturas das bases de dados
e os métodos que foram empregados para responder as hipóteses por nós formuladas.
Na quarta seção descrevemos e analisamos os resultados obtidos, além de contrastá-los
com aqueles que constam da literatura especializada. Por fim resenham-se as
considerações finais.
2. DETERMINANTES DA DURAÇÃO DO TEMPO DE DESEMPREGO E A
INFLUÊNCIA DESSA DURAÇÃO SOBRE OS DIFERENCIAIS DE SALÁRIOS
ENTRE HOMENS E MULHERES
A análise da duração do desemprego e de seus determinantes é objeto de diversos
estudos na literatura especializada, todavia, a questão de gênero nem sempre é
6
cotejada.2 Por outro lado, cresce na literatura a presença de autores que destacam a
importância de se analisar essa questão, pelo fato de permanecer mascarada na análise
agregada.
Por exemplo, Bowers e Harkess (1979) analisaram a duração do desemprego por
sexo e idade na Grã Bretanha entre 1967 e 1973, e a partir do modelo de função de
sobrevivência estimaram a probabilidade média de saída da situação do desemprego. Os
autores observam duas situações distintas: i) na recessão britânica de 1967 a 1971, a
duração do desemprego aumenta relativamente menos entre as mulheres frente aos
homens, sobretudo para as coortes etárias mais velhas; ii) por sua vez, no período de
1972 a 1973 há redução da duração do desemprego das mulheres e dos jovens, enquanto
para os homens essa probabilidade se mantém constante. Os autores argumentam que os
menores períodos de desemprego das mulheres em relação aos homens se devem ao
aumento da participação de mulheres com maior escolaridade, assim como à maior
rotatividade feminina no mercado de trabalho naquele país.
Gonzalo e Saarela (2000) também analisaram a probabilidade de saída da situação
de desemprego segundo o sexo, para a Finlândia no ano de 1996. Os autores aplicam o
modelo de Weibull para estimar a função de risco. As estimativas mostram que os
determinantes para a saída da situação de desemprego são distintos entre homens e
mulheres de até 30 anos de idade, e tendem a se igualar para os mais velhos. Esse
comportamento decorre da estrutura de participação de homens e mulheres no mercado
de trabalho finlandês, haja vista que a principal causa para a menor participação das
mulheres no mercado de trabalho reporta-se às restrições familiares. Uma conclusão
adicional dos autores é com relação ao número de filhos, para os homens essa variável é
não significativa, enquanto que para as mulheres o aumento do número de filhos tende a
elevar o tempo da busca por uma ocupação.
Aprofundando a análise para além da duração do desemprego e da probabilidade de
sair dessa situação, Tansel e Tasci (2004) investigaram os determinantes da duração do
desemprego por sexo na Turquia em 2000 e 2001. Os autores utilizam dois modelos: a
estimação não-paramétrica por meio da função de sobrevivência de Turnbull (Turnbull,
1976), que é uma generalização do estimador de Kaplan-Meier para dados censurados; e
uma estimação paramétrica por meio do modelo de riscos proporcionais, e
especificações log-logísticas e log-normais. Os resultados são similares entre os
modelos propostos, sendo que o principal achado refere-se ao fato de que as mulheres
apresentam menor probabilidade de saída do desemprego ante os homens; essa
constatação, segundos os autores, decorre tanto da maior discriminação das mulheres no
mercado de trabalho como de sua maior participação nas atividades domésticas,
sobretudo no caso das mulheres casadas.
Por sua vez, Du e Dong (2009) examinaram as razões que determinam o maior
período de desemprego das mulheres na China urbana, a partir dos dados de uma
pesquisa domiciliar nacional realizada em 2003. Os autores investigaram a questão por
meio da estimação da função de sobrevivência com o estimador Kaplan-Meier, e da
função de risco de desemprego por meio de dois métodos de regressão por máxima
verossimilhança, considerando a distribuição Weibull. Os resultados confirmam que as
mulheres têm relativamente aos homens menor probabilidade de sair da situação de
desemprego, assim como permanecem mais tempo desempregadas. Os autores não
2 Ver, entre outros, Nickell (1979), Lancaster (1979), Foley (1997), Bivar (1993), Menezes-
Filho e Picchetti (2000), Avelino (2001) e Penido e Machado (2002).
7
encontram evidências de que as mulheres supostamente realizassem menos esforços na
busca de uma ocupação vis-à-vis os homens. Mas, a estrutura do mercado de trabalho e
fatores institucionais, como, menor acesso às redes sociais, tratamento desigual nos
serviços públicos de emprego, entre outros, encontram-se entre os principais fatores que
explicam tanto o maior desemprego como os menores salários auferidos pelas
trabalhadoras chinesas.
No caso brasileiro, alguns estudos versam a respeito dos determinantes da duração
do desemprego (Menezes-Filho e Picchetti (2000); Oliveira e Camargo (2006)),
entretanto, a maior parcela da literatura sobre o tema não considera a especificidade de
cada sexo. Dentre os estudos que abordam essa questão, Barros, Camargo e Mendonça
(1997) relacionaram a probabilidade de saída do desemprego com o grau de
seletividade. Um dos exemplos para análise refere-se ao sexo, tal como o homem e
chefe de família que apresenta elevada probabilidade de saída do desemprego, devido à
baixa seletividade; enquanto as mulheres demonstraram baixa probabilidade de saída do
desemprego, pois apresentavam maior grau de seletividade, considerando baixo o custo
de busca por trabalho.
Costa e Teixeira (2008) estudaram os determinantes dos diferenciais da
probabilidade de desemprego para homens e mulheres para o caso brasileiro. Os autores
utilizam os microdados da PNAD de 1995 e 2002 para aplicar um modelo probit e a
decomposição de Oaxaca (1973) para estimar os efeitos do fenômeno da discriminação
no mercado de trabalho. Os resultados mostram que a probabilidade do desemprego
aumenta no período analisado e que, em ambos os anos, a probabilidade de desemprego
das mulheres foi superior ao dos homens. Ademais, os autores verificam que a
probabilidade de desemprego tende a ser maior entre os trabalhadores com menos anos
de escolaridade, os mais jovens e aqueles localizados nas regiões Norte e Nordeste. No
tocante a decomposição de Oaxaca, os resultados indicam que a parcela não explicada,
associada à discriminação, responde pela maior parcela do diferencial da probabilidade
de desemprego das mulheres ante os homens, todavia, essa proporção diminui entre
1995 e 2002.
Oliveira, Scorzafave e Pazello (2009), por sua vez, ampliam a análise anterior. Os
autores investigaram a evolução da estrutura de desemprego e inatividade nas regiões
metropolitanas no Brasil com os microdados da PNAD 2004, aplicando a metodologia
de Fernandes e Pichetti (1999), mas enfatizando as diferenças segundo homens e
mulheres. A probabilidade de desemprego para ambos os sexos é praticamente igual até
os cinco anos de escolaridade, depois desse nível, ela tende a ser maior para as
mulheres. As mulheres também apresentam maiores chances de desemprego perante os
homens, até os quarenta anos e nas famílias de renda mensal superior a seis salários-
mínimos. Por fim, com relação às demais variáveis, as mulheres sempre apresentam
probabilidade de desemprego superior à dos homens.
Em estudo mais recente, embora restrito ao mercado de trabalho cearense, Arruda,
Guimarães, Irffi e Castelar (2010) analisaram os determinantes de permanência no
desemprego por meio de um modelo probit a partir dos dados da PNAD 2007. Os
autores verificaram a maior probabilidade das mulheres permanecerem na situação de
desemprego, salvo no caso de os homens estarem em uma situação de desemprego
acima de 12 meses. Esses autores estimaram comportamentos distintos do desemprego
segundo sexo no Ceará, o que indica que diferenças regionais não podem ser
desconsideradas em estudos sobre o mercado de trabalho no Brasil.
8
Os estudos tomados como referência nesta seção não tem a pretensão nem de
esgotar o tema nem de exaurir as estimativas sobre as diferenças de duração do
desemprego e suas implicações sobre os homens e mulheres, muito menos de correr a
vasta literatura a respeito dos diferenciais de salário por sexo3. Vale notar, todavia, que
os trabalhos resenhados confirmam que o desemprego afeta distintamente homens e
mulheres e, na maior parte das vezes, em prejuízo destas últimas. As evidencias dos
estudos em países emergentes, por outro lado, indicam a maior vulnerabilidade das
mulheres perante os homens, seja pela maior dificuldade de sair da situação de
desemprego, seja pela maior duração nessa condição. Ademais, quer se destacar
também que, em muitos países, as diferenças no comportamento do desemprego e nos
salários são validadas pela estrutura de seu mercado de trabalho que assevera em maior
ou menor grau tanto a segregação como a discriminação contra as mulheres.
3. ASPECTOS E PROCEDIMENTOS METODOLÓGICOS
O presente estudo visa estimar a duração e determinantes do desemprego tendo
como referencial a estimação da função de sobrevivência e da função de risco a partir de
modelos paramétricos, semiparamétricos e não paramétricos, conforme apresentado em
Menezes-Filho e Picchetti (2000).
As hipóteses a respeito da duração do desemprego e seus determinantes serão
testadas por meio dos da PME/F.IBGE para dois subperíodos: 1992 a 2000 (PME
Antiga Metodologia) e 2002 a 2010 (PME Nova Metodologia). Neste caso é importante
mencionar que a abordagem em dois períodos se deve às alterações de metodologia da
PME em 2002. Dentre as alterações, destacam-se: i) os grupos rotacionais e as criação
de variáveis, que passou de 4 (quatro) grupos rotacionais por mês na antiga metodologia
para 8 (oito) grupos rotacionais na nova metodologia; ii) criação de variáveis derivadas
tais como “indivíduo desempregado” e “procura de emprego dentro do período de 30
dias”; e iii) identificação do desalentado. O ajustamento de 4 grupos rotacionais para 8
grupos rotacionais permitiu a superação do efeito blackout (amostra completamente
trocada há cada dois anos), o que possibilitou a redução de atritos para a identificação
dos indivíduos.4
A amostra considera apenas os indivíduos identificados nas quatro entrevistas
iniciais da PME de cada domicílio, desde que essas entrevistas estivessem no mesmo
ano. Sendo assim, os critérios utilizados quanto à amostra foram: i) seleção apenas do
indivíduo que declarou estar desempregado na primeira entrevista feita pela
PME/F.IBGE no domicílio e que, além disso, obrigatoriamente assim permaneceu nas
três entrevistas consecutivas; ii) consideraram-se as quatro entrevistas transcorrendo no
mesmo ano, ou seja, o indivíduo que respondeu à PME/F.IBGE ao final de um ano e
esteve presente no painel no início do ano seguinte não ingressou na amostra. Dessa
subamostra se excluiu também o indivíduo que passou para a situação de inativo em
quaisquer das entrevistas seguintes, assim como aquele que mudou de situação de
atividade mais de duas vezes.
3 Ver, entre outros: Kassouf (1998); Soares (2000); Crespo e Reis (2004); Biderman e
Guimarães (2005); Matos e Machado (2006); Oliveira e Rios-Neto (2006); Barros, Franco e
Mendonça (2007); Cacciamali e Hirata (2005); Cacciamali, Tatei e Rosalino (2009).
4 Para maiores detalhes sobre o painel rotacional da PME, ver Ribas e Soares (2008).
9
Uma vez tendo definido os modelos, a base de dados e os recortes necessários, vale
ressaltar que cada modelo foi estimado separadamente para cada região metropolitana e
para cada ano, buscando verificar possíveis diferenças entre as regiões metropolitanas.
A seguir apresentam-se, resumidamente, os modelos aplicados segundo a abordagem
econométrica considerada.
a) Caso não paramétrico:
Considerando t o tempo de duração de transição da situação de desempregado para a
mesma situação ou outra, o objetivo será calcular a função de risco e a função de
sobrevivência. A função de risco fornecerá a probabilidade de o desemprego terminar
em dado instante de tempo – neste caso o mês - , dado que o desemprego ocorreu até
aquele momento. Sendo assim, a função de risco se define como:
)(1
)()(lim)(
0 TF
tf
dt
tTdttTtPth
dt
(1)
Onde, h(t) é a função risco, t é uma variável aleatória denominada tempo de
duração, f(t) é a densidade de probabilidade da variável aleatória duração, F(t) é a
distribuição acumulada.
O cálculo da função de sobrevivência depende do método a ser estimado. No caso
do não paramétrico, o método aplicado é o de Kaplan Meier, utilizando os seguintes
dados: permanência no desemprego, responsável pela família (chefe de família) ou não
responsável, indivíduos que já trabalharam e indivíduos que procuram o primeiro
emprego, e gênero.
b) Caso semiparamétrico:
O modelo semiparamétrico permite analisar o efeito agregado de um conjunto de
variáveis covariadas sob a duração do desemprego. Sendo assim, a função de risco é
definida como:
)...exp()(),( 2211 kk XbXbXbtbXth (2)
A função de risco apresenta um termo comum a todos os indivíduos b(t) e outro que
depende das k variáveis. Todavia, o modelo também pode ser denominado como
“riscos proporcionais”, pois considera os riscos individuais como uma proporção do
risco comum. Neste caso que a única hipótese refere-se a consideração dos riscos
proporcionais, ou seja, não é feita nenhuma suposição forte a respeito da especificação
de (2). Logo, considerando dada hipótese, é possível estimar (2) pelo método de
máxima – verossimilhança.
c) Caso paramétrico:
Enquanto os modelos anteriores não consideram uma função de risco específica,
este modelo considera-a, e por isto não assume que os riscos são proporcionais. Em
concordância com esta especificação, a presente pesquisa assume como função risco a
log-logística. A escolha em dada especificação se pauta no fato de permitir uma análise
da duração condicional do desemprego sob as formas constante, crescente, e
decrescente com o tempo. Outrossim, uma vantagem do modelo paramétrico está em
poder estimar diretamente as funções de risco e de sobrevivência.
Os testes de especificação dos modelos de duração são calculados por meio da
variável aleatória construída (Z) integrada à função de risco de (0,T), cuja a distribuição
é uma exponencial com média igual a 1, como descrito abaixo:
10
1)(
);(0
ZE
dsxsZ
T
(3)
A especificação do modelo paramétrico pode ser testada de maneira ampla, pois a
função de risco é determinada por uma distribuição exponencial. Dessa forma temos o
cálculo da função de risco integrada a seguir:
Z
Zdsxs0
);( (4)
Esta função é integrada para cada observação, por meio do modelo, sendo este capaz
de prever a possibilidade de saída do desemprego considerando as características
individuais. Neste caso, as características individuais consideradas são as mesmas do
modelo semiparamétrico. Por último, tendo estimado a equação (4), os resíduos serão
padronizados a fim de comparar a distribuição empírica dos resíduos com a teórica.
4. ESTIMAÇÃO DOS DETERMINANTES DO TEMPO DE DESEMPREGO
Iniciamos a análise do tempo de duração do desemprego a partir do estimador de
Kaplan-Meier. Trata-se do método mais simples de estimação, pois não considera a
interação das diversas variáveis explicativas, mas que serve como um sinalizador básico
para o problema que está sendo tratado.
O gráfico a seguir sintetiza essa análise ao mostrar a probabilidade de um indivíduo
continuar desocupado em cada instante do tempo. Ressalvamos que para simplificar
ainda mais a análise, consideramos aqui apenas o ano de 2010, sem desagregar a
amostra por região metropolitana, uma vez que a análise pouco difere entre os anos e
entre as regiões metropolitanas.5
Observamos, assim, que as mulheres apresentam, em média, maiores chances de
permanecer na situação de desocupação perante os homens, sobretudo para aquelas que
estão buscando emprego entre 1 a 2 anos. Esse comportamento se inverte ligeiramente
nos extremos, isto é, as mulheres com pouco tempo de procura de emprego (até 1 ano)
ou com muito tempo (acima de 3 anos) apresentam probabilidades marginalmente
menores que os homens de continuar nessa condição.
5 Por limitação de espaço apresentamos no apêndice os resultados da estimação paramétrica
dos anos de 2000 e 2010. Os interessados podem entrar em contato com os autores para obter os
resultados da estimação não paramétrica, semiparamétrica e para os demais anos do período
1992 a 2011.
11
Gráfico 1 – Probabilidade de se manter desocupado. Função de Sobrevivência
(Estimador de Kaplan-Meier), segundo sexo. 2010.
Fonte: Elaboração própria a partir dos microdados da PME/F.IBGE.
Esses resultados nos indicam que dois comportamentos distintos possam estar
ocorrendo. A primeira é que a menor probabilidade de desocupação das mulheres em
períodos muito curtos ou muito longos esteja relacionada a uma redução de seu salário
de reserva pela necessidade de se conseguir algum tipo de ocupação, mesmo que aquém
de sua qualificação e/ou com salários inferiores ao desejado. Por outro lado, para o
tempo de desemprego entre 1 e 2 anos se acentuam as diferenças por sexo, sendo que as
mulheres se confrontam com piores chances de conseguir uma ocupação vis-à-vis os
homens.
Apesar de haver uma ligeira distinção nas probabilidades de saída da situação de
desemprego em 2010, nos demais anos estimados a duração nessa situação é sempre
maior para as mulheres do que para homens. É possível estimar de forma consistente
que, dada as restrições da amostra, a duração média do desemprego é de 12,3 meses
para homens e de 13 meses pra mulheres em 2010. Na realidade, esse quadro poderia
ser ainda pior caso fosse considerado o desemprego oculto pelo trabalho precário e pelo
desalento,6 apesar das estimativas indicarem que apenas no caso do desalento a taxa das
mulheres é superior ao dos homens (Vargas, 2006), reforçando o quadro de maior
pressão familiar para que as mulheres sejam responsáveis pelos afazeres domésticos.
6 Desemprego oculto pelo trabalho precário envolve os indivíduos que procuraram uma
ocupação, mas que exerceram, de forma descontínua e irregular, alguma forma de trabalho,
remunerado ou não, em atividades de parentes, ou que realizaram um trabalho recebendo em
espécie ou benefício. Desemprego pelo desalento abrange as pessoas que foram desestimuladas
a procurar um trabalho devido a baixa perspectiva de inserção no mercado de trabalho.
0.0
00.2
50.5
00.7
51.0
0
0 20 40 60tempo de desemprego (em semanas)
homem mulher
Estimador Kaplan-Meier
12
Quadro 1 – Determinantes do tempo de duração do desemprego
Recife
Salvad
or
Belo
Horizonte
Rio de
Janeiro
São
Paulo
Porto
Alegre
2000 2010 2000 2010 2000 2010 2000 2010 2000 2010 2000 2010
Chefe -
-
-
-
-
Mulher
+ +
+ +
+
Tamanho da
família +
-
-
Anos de
estudo +
+
+ +
+
+
Idade
+
+
Trabalhou
anteriormente - + -
-
-
-
-
Meses no
ultimo empr +
+
Demitido
-
- +
+
Formal +
+
+ - +
+
Setor
industrial
Horas
semana -
Salário real
+
-
Vendas
+
Nível de
emprego +
* O quadro indica o efeito que cada variável significativa tem sobre o tempo de
duração do desemprego, sendo que (+) indica que a variável aumenta a duração e para (-
) significa que a variável dependente impacta de forma a reduzir à duração. Os
resultados são significantes sob p-valor de 1%, 5% e 10%.
Fonte: Elaboração própria a partir dos microdados da PME/F.IBGE.
Todavia, conforme mencionado anteriormente, a estimação não-paramétrica não
permite identificar quais fatores são responsáveis por explicar o comportamento distinto
da duração do desemprego de homens e mulheres. Para tanto é necessário a aplicação de
modelo estatisticamente mais rigoroso para a análise dos determinantes da saída da
situação de desemprego. Posto isto, nos concentraremos nos resultados do modelo
paramétrico, conforme proposto por Menezes-Filho e Picchetti (2000). A vantagem
dessa modelagem perante os modelos não paramétricos e semipamétricos é o seu maior
poder de explicação, em contrapartida ao maior rigor na especificação das hipóteses,
além da possibilidade de estimar diretamente as funções de risco e de sobrevivência.
O quadro 1 sintetiza as variáveis significativas e seus efeitos sobre a probabilidade
de desemprego por meio da estimação paramétrica, sendo que os resultados completos
podem ser conferidos no apêndice. Em geral, as diferenças entre os anos estimados
foram principalmente de significância das variáveis, sendo que o efeito marginal de
cada uma delas praticamente não se altera. Assim para ilustração dos resultados foram
selecionados apenas dois anos representativos de cada metodologia da PME.
Primeiramente chama a atenção que, em geral, os determinantes do desemprego
foram estatisticamente mais significativos nas estimações por meio da antiga PME,
considerando que ambas foram construídas de maneira similar. Esses resultados não
13
significam uma maior debilidade da nova PME, mas apenas que para o objetivo do
presente estudo, a amostra da antiga PME se mostrou adequada, sobretudo se
considerarmos a restrição amostral adotada no estudo como assinalada na seção
anterior.
A despeito disso, destaca-se que, independente da RM ou do ano de referência, as
mulheres se defrontam com maiores probabilidades de duração da desocupação perante
os homens, corroborando sua situação de desvantagem no mercado de trabalho. Vale
ressaltar que esta maior probabilidade afeta a mulher de duas formas, primeiro através
da discriminação de gênero, segundo por meio dos anos de escolaridade, uma vez que
estas apresentaram elevação no grau de escolaridade no referente período. Sendo assim,
ambos os fatos favorecem o que Barros, Camargo e Mendonça (1997) haviam apontado,
ou seja, as mulheres demonstraram baixa probabilidade de saída do desemprego, pois
apresentaram maior grau de seletividade. Contudo, seria interessante verificar
futuramente se isto ainda ocorre devido ao baixo o custo de busca por trabalho, mesmo
depois do aumento do grau de escolaridade.
Ademais, é notório observar que mesmo a crise financeira (2008) tendo impacto do
Brasil em 2009 e de forma distinta das crises da década de 1990, conforme estudado por
Cacciamali e Tatei (2010), nota-se que a vulnerabilidade das mulheres aparenta ser
relevante ainda em 2010. Isto reforça o que Costa e Teixeira (2008) haviam encontrado
a respeito da duração do desemprego mais elevada no caso das mulheres, entretanto,
observa-se que esse comportamento não se verificava em um ano de expansão.
Outro resultado a destacar se refere aos chefes de família, que tendem a apresentar
menores probabilidades de duração do desemprego perante os demais membros da
família, resultado esperado, uma vez que estes são os principais provedores de renda na
família. Igualmente, a probabilidade da duração do desemprego é menor entre aqueles
que já trabalharam anteriormente, evidenciando a importância da experiência
profissional na probabilidade de se obter uma ocupação e as maiores dificuldades
enfrentadas por aqueles que buscam o primeiro emprego. Ambos os resultados
corroboram aqueles vistos por Menezes-Filho e Picchetti (2000), Avelino (2001), e
Penido e Machado (2002).7
No tocante à variável escolaridade verificamos que maiores anos de estudo se
refletem em maiores probabilidades da duração da desocupação. Uma hipótese para tal
resultado é a existência de escassez de postos de trabalho qualificados, de modo que
indivíduos mais capacitados possuem salários de reserva mais elevados e, portanto,
podem permanecer mais tempo fora do mercado de trabalho em busca de ofertas
compatíveis com sua qualificação. Tal padrão também é observado por Barros,
Camargo e Mendonça (1997) que constataram que a duração do desemprego é crescente
com o nível educacional.
7 Ressalta-se que o sinal positivo do coeficiente da variável “Trabalhou anteriormente” para
Recife em 2010. Esse comportamento aparenta ser um caso atípico, pois foi o único dessa
natureza entre todas as RMs e anos estimados. Assim, não se pode afirmar que esteja ocorrendo
alguma mudança no padrão ocupacional em Recife sem novas estimações para períodos mais
recentes, mas de todo modo é um resultado que se sobressaí e merece atenção caso esse
comportamento se mantenha, indicando que o mercado de trabalho em Recife esteja
momentaneamente mais propício para aqueles que buscam o primeiro emprego, representados,
em geral, por ocupações que exigem pouca qualificação.
14
A duração do desemprego também tende a ser maior para os indivíduos mais velhos
(significativa em São Paulo e Porto Alegre), a despeito das maiores taxas de
desemprego entre os mais jovens. Aparentemente contraditório esse quadro reflete dois
aspectos distintos. O primeiro caso indica que os indivíduos mais velhos tendem a
enfrentar maiores dificuldades de inserção à medida que permanecem mais tempo fora
do mercado de trabalho. O segundo caso reflete, principalmente, o problema da
assimetria de informações, no qual os empregadores dispõem de poucas ferramentas
para inferir as características de produtividade dos jovens, resultado em maiores taxas
de desemprego para esse grupo (Camargo e Reis, 2005).
Nesse mesmo sentido, a duração do desemprego tende a ser maior para aqueles que
permaneceram no trabalho anterior por um longo período e cujo último emprego era
registrado (exceção de Belo Horizonte e São Paulo em 2010). Assim, os desempregados
que possuíam vínculos com setor formal tendem a buscar novas ocupações que
ofereçam, no mínimo, as mesmas condições trabalhistas e benefícios do emprego
anterior. Obviamente, tal situação ocorre apenas para aqueles que dispõem de suficiente
apoio familiar para permanecer na situação de desemprego por longos períodos. Por
outro lado, estes resultados também podem ser considerados indícios de escassez de
postos de trabalho qualificados ou de melhor qualidade, o que eleva a probabilidade de
desocupação desses indivíduos que preferem esperar por ofertas de emprego
condizentes. Em geral, esse maior tempo de procura não é possível para todos os
indivíduos, todavia, o presente estudo não visa captar as distintas condições de inserção
ocupacional, assim, seria interessante um estudo que aprofundasse essa questão.
5. CONSIDERAÇÕES FINAIS
O presente estudo visou analisar os determinantes da duração do desemprego e
captar as distinções entre homens e mulheres. Para tanto, utilizamos a base de dados da
PME, a qual permite acompanhar a trajetória de um mesmo indivíduo ao longo de um
curto período de tempo. Para responder aos objetivos do estudo, os dados da PME
foram formados de modo a conter apenas os indivíduos desocupados em um dado
período e observado sua trajetória ao longo dos meses seguintes. Esse recorte é
essencial para se compreender os determinantes da duração do desemprego e dos
condicionantes para sair desse estado, entretanto, resulta em uma amostra de tamanho
bastante restrito.
O estudo seguiu as recomendações de Ribas e Soares (2008) para reduzir os
problemas de declaração incorreta e aumentar a eficácia do emparelhamento dos
indivíduos no painel da PME. Esse procedimento permitiu que fosse preparada uma
base de dados mais robusta em relação a estudos anteriores, como Menezes-Filho e
Picchetti (2001). Em relação à literatura existente, o artigo complementa a análise de
um tema relevante, mas que tem sido pouco abordada nos últimos anos. Assim, são
feitas estimativas atualizadas e que abrangem um período mais longo e com os mais
recentes dados disponíveis.
Os resultados estimados apresentaram evidências claras de que o fenômeno do
desemprego afeta o mercado de trabalho de forma mais complexa do que esperado.
Primeiramente ficou clara a importância das características pessoais, sobretudo aquelas
relacionadas ao capital humano, na determinação da duração de desemprego. A idade e
a experiência profissional tendem a apresentar comportamentos inversos sobre a
probabilidade de duração do desemprego, indicando maior restrição do mercado em
contratar trabalhadores mais velhos, mas a valorização daqueles que unem qualificação
15
e experiência profissional. Estes resultados estão em consonância com estimativas
realizadas por Menezes-Filho e Picchetti (2000), Avelino (2001) e Penido e Machado
(2002) para o Brasil, que utilizaram metodologias similares,
Por sua vez, os resultados da variável “ano de estudo” mostraram que os indivíduos
mais qualificados enfrentam menores taxas de desocupação, mas aqueles que estão em
busca de emprego tendem a permanecer mais tempo nessa condição, corroborando os
achados de Barros, Camargo e Mendonça (1997). Esse resultado sugere duas situações:
o desempregado mais escolarizado não aceita qualquer tipo de ocupação e procura
postos de trabalho mais condizente com sua qualificação; e podem existir escassez de
postos de trabalho neste período.
Ademais, os resultados corroboram que as mulheres apresentam menos
oportunidades de inserção no mercado de trabalho perante os homens. Ampliando os
resultados já observados pela literatura especializada, verificamos que as mulheres
apresentam maior probabilidade de desocupação, independente do tempo de duração do
desemprego. Tal constatação indica que os homens, em geral chefes de família, tendem
a aceitar mais facilmente uma ocupação, mesmo aquém de sua qualificação e/ou com
salários inferiores ao desejado, para garantir o sustento de sua família.
A questão do desemprego de longa duração é especialmente relevante, dado que tal
situação pode ser utilizada como um sinalizador negativo para o empregador, criando-
se, assim, um círculo vicioso em que o desempregado se defronta com condições cada
vez mais inóspitas para a obtenção de trabalho. Medidas que visem maximizar as
oportunidades de empregos para esse conjunto de indivíduos devem mirar,
principalmente, a qualificação e/ou reciclagem dos trabalhadores de modo que estes
estejam aptos a responder às demandas do mercado de trabalho.
No caso das diferenças de empregabilidade entre homens e mulheres, por outro lado,
estudos mostram que o problema é mais de discriminação do que de diferenciais de
qualificação [Soares (2000); Biderman e Guimarães (2005); entre outros]. Logo,
ressalta-se a importância de ações educativas de conscientização que visem equalizar as
oportunidades de emprego por sexo, sobretudo no acesso aos cargos de chefia.
Outro problema que tende a afetar mais as mulheres do que aos homens se refere à
maior responsabilidade delas com os cuidados da família, que, nesse caso, podem
permanecer mais tempo desempregadas em busca de uma ocupação de maior
flexibilidade de horário. Essa condição já foi observada por outros estudos como, por
exemplo, Bivar (1993), que verificou a maior probabilidade de transição do emprego
para inatividade para as mulheres do que para os homens, e não raro tal transição
ocorria por conta da família. Assim, programas e ações públicas que visem reduzir o
esforço doméstico, sobretudo no cuidado de crianças, como maior acesso a creches, por
exemplo, poderiam reduzir o tempo alocado pelas mulheres em seu próprio lar e
ampliariam o leque de oportunidades de emprego.
Os resultados reforçam, assim, a necessidade de estudos que analisem mais
profundamente essa questão, sobretudo, que abordem os efeitos distintos do
desemprego sobre homens e mulheres, dado que a melhor compreensão do mercado de
trabalho permite por em prática ações e políticas públicas mais eficientes e eficazes.
16
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
ABREU, M. A. A.; MEIRELLES, R. L. Mulheres e homens em ocupação de cargos de
Direção e Assessoramento Superior (DAS) na carreira de especialista em
políticas públicas e gestão governamental (EPPGG). Texto para Discussão
1797. Rio de Janeiro: Ipea, 2012.
ARRUDA, E. F; GUIMARÃES, D. B; IRFFI, G; CASTELAR, I. Determinantes da
permanência no desemprego no mercado de trabalho cearense. Fortaleza:
Caen/Universidade Federal do Ceará, 2009.
AVELINO, R. R. G. Os determinantes da duração do desemprego em São Paulo. Texto
para Discussão No. 11. São Paulo: USP/IPE, 2001.
BAFFOE-BONNIE; J.; EZEALA-HARRISON, F. Incidence and duration of
unemployment spells: implications for the male-female wage differentials. The
Quarterly Review of Economics and Finance (45), pp. 824-847, 2005.
BARROS, R. P., CAMARGO, J. M. & MENDONÇA, R. A estrutura do desemprego
no Brasil, IPEA, Rio de Janeiro, Texto para Discussão, n. 478, 1997.
BIDERMAN, C.; GUIMARÃES, N. A. Desigualdades, discriminação e políticas
públicas. Uma análise a partir de setores selecionados da atividade no Brasil.
In: Maria Helena Santana Cruz, Amy Adelina Coutinho de Faria Alves. (Org.).
Feminismo, Desenvolvimento e Direitos Humanos. Aracaju:
REDOR/NEPIMG/UFS/FAP-SE, p. 31-60, 2005.
BIVAR, W. S. B. Aspectos da estrutura do desemprego no Brasil: composição por sexo
e duração. BNDES, Rio de Janeiro, p. 11-101, 1993. 101 p. (17º Prêmio
BNDES de Economia, 1993; Originalmente apresentada como Dissertação de
Mestrado – Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro, 1991).
BOWERS, J. K.; HARKESS, D. Duration of unemployment by age and sex.
Economica, 46(183), pp. 239-260, 1979.
BRUSCHINI, C.; PUPPIN, A. B. Trabalho de mulheres executivas no Brasil no final do
século XX. Cadernos de pesquisa, v. 34, n. 121, p. 105-138, jan./abr. 2004.
CACCIAMALI, Maria Cristina; HIRATA, Guilherme Issamu. A influência da raça e do
gênero nas oportunidades de obtenção de renda - uma análise da discriminação
em mercados de trabalho distintos: Bahia e São Paulo. Estudos Econômicos,
São Paulo, v. 35, n. 4, Dec. 2005.
CACCIAMALI, M. C.; TATEI, F. Crise econômica mundial: mudanças nas
características do desemprego no mercado de trabalho brasileiro? In:
MORETTO, A; KREIN, J. D.; POCHMANN, M. e MACAMBIRA, J.
Economia, desenvolvimento regional e mercado de trabalho no Brasil.
Campinas – SP/ Fortaleza – CE: Instituto de Desenvolvimento do Trabalho,
Banco do Nordeste do Brasil e Centro de Estudos Sindicais e de Economia do
Trabalho, 2010;.
CACCIAMALI, M. C.; TATEI, F.; ROSALINO, J. W. Estreitamento dos diferenciais
de salários e aumento do grau de discriminação: limitações da mensuração
padrão. Planejamento e Políticas Públicas, v. 33, p. 195-222, 2009.
CAMARGO, J. M; REIS, M. C. Desemprego: o custo da desinformação. Revista
Brasileira de Economia, 59(3). Rio de Janeiro, 2005.
17
COSTA, J. S. da; TEIXEIRA, E. C. Desemprego no Brasil no período de 1995-2005:
uma análise dos seus determinantes enfatizando a discriminação segundo o
gênero. Cadernos de Economia, 12(23), 2008.
CRESPO, A. R. V.; REIS, M. C. Decomposição do componente de discriminação na
desigualdade de rendimentos entre raças nos efeitos idade, período e coorte. In:
Encontro da ANPEC, 2004, Natal. Encontro da ANPEC, 2004.
DU, F.; DONG; X. Why do women have longer durations of unemployment than men
in post-restructuring urban China? Cambridge Journal of Economics, 33, pp.
233-252, 2009.
FERNANDES, R.; PICCHETTI, P. Uma análise da estrutura do desemprego e da
inatividade no Brasil metropolitano, Pesquisa e Planejamento Econômico, Rio
de Janeiro, vol. 29, n. 1, 1999.
FOLEY, M. C. Determinants of unemployment duration in Russia. Discussion Paper
No. 779. Economic Growth Center, Yale University, 1997.
GONZALO, M. T.; SAARELA, J. Gender differences in exit rates from unemployment:
evidence from a local Finnish labour market. Finnish Economic Papers, 13(2),
pp. 129-139, 2000.
GUIMARÃES, P.S. Características dos trabalhadores e seus retornos salariais: um
estudo do mercado de trabalho brasileiro para 2011. Monografia (Graduação) –
Universidade de Brasília, Faculdade de Administração, Contabilidade e
Economia da UNB, Brasília: UNB, 2013. 48 pp.
KASSOUF, A. L. Wage gender discrimination and segmentation in the Brazilian labor
market. Economia Aplicada, v.2, n.2, p.243-269, 1998.
LANCASTER, T. The econometric analysis of transition data. Cambridge: Cambridge
University Press, 1990.
LEONE, E. T.; BALTAR, P. A mulher na recuperação recente do mercado de trabalho
brasileiro. Revista Brasileira de Estudos de População, 25(2). São Paulo, 2008.
MATOS, R. S.; MACHADO, A. F. Diferença de rendimento por cor e sexo no Brasil
(1987-2001). Econômica, Rio de Janeiro, v. 8, n.º 1, p. 5-27, junho 2006.
MENEZES-FILHO, N.; PICCHETTI, P. Os determinantes da duração do desemprego
em São Paulo, Pesquisa e Planejamento Econômico, Rio de Janeiro, vol. 30, n.
1, p. 23-48, 2000.
NICKELL, S. Estimating the probability of leaving unemployment. Econometrica, v.
47, n. 5, p. 1249-1266, Sept. 1979.
OLIVEIRA, V.H.; CARVALHO, J.R. Os determinantes da duração do desemprego no
Brasil: uma análise utilizando a pesquisa padrão de vida do IBGE. Fórum
BNB, Fortaleza, 2006. 22 pp. (Fórum BNB de Desenvolvimento - XI Encontro
Regional de Economia, 2009).
OLIVEIRA, A. M. H. C.; RIOS-NETO, E. L. G. Tendências da Desigualdade Salarial
para Coortes de Mulheres Brancas e Negras no Brasil. Estudos Econômicos,
São Paulo, vol. 36, n.º 2, pág. 205-236, abril-junho 2006.
OLIVEIRA, P. R.; SCORZAFAVE, L. G.; PAZELLO, E. T. Desemprego e inatividade
nas metrópoles brasileiras: as diferenças entre homens e mulheres. Nova
Economia, 19(21), pp. 291-324. Belo Horizonte, 2009.
18
OSBERG, L. The incidence and duration of individual unemployment: supply side or
demand side? Cambridge Journal of Economics, 10, pp. 13-33, 1986.
PENIDO, M. R. J.; MACHADO, A. F. Desemprego: evidência da duração no Brasil
metropolitano. Texto para discussão, 176. Belo Horizonte: Cedeplar, 2002.
RIBAS, R. P.; SOARES, S. S. D. Sobre o painel da Pesquisa Mensal de Emprego
(PME) do IBGE. Texto para Discussão No. 1348. Rio de Janeiro: IPEA, 2008.
SOARES, S. O perfil da discriminação no mercado de trabalho: homens negros,
mulheres brancas e mulheres negras. Texto para Discussão 769. Brasília:
IPEA, 2000.
TANSEL, A.; TASCI, H. M. Determinants of unemployment duration for men and
women in Turkey. Discussion Paper Series, IZA DP No. 1258, 2004.
TURNBULL, B.W. The empirical distribution function with arbitrarily grouped,
censored and truncated data. J. Royal. Statistics Society. Ser. B 38: 290 – 295,
1976.
VARGAS, F. E. B. Desemprego feminino: vulnerabilidade e invisibilidade nas
trajetórias de trabalho. In: 30º Encontro Anual da ANPOCS, Anais. Caxambu,
2066.
19
Apêndice A – Estimação da probabilidade de sair da situação de desemprego
a) Recife
Variável 2000 2010 Variável 2000 2010
chefe -0,58 *** 0,06 demitido -0,09 -0,7 **
-0,14 -0,32 -0,14 -0,27
0 0,86 0,51 0,01
gênero 0 -0,24 formal 0,21 * 0,29
-0,12 -0,24 -0,12 -0,32
1 0,32 0,08 0,37
tamanho da família -0,05 -0,08 setor industrial -0,01 0,43
-0,02 -0,09 -0,16 -0,75
0,07 0,41 0,93 0,57
anos de estudo 0,04 ** 0,05 horas semana 0,29 -0,19
-0,02 -0,03 -0,27 -0,22
0,01 0,17 0,28 0,39
idade 0,01 -0,01 salário 0,06 0,01
-0,01 -0,01 -0,09 -0,02
0,11 0,63 0,54 0,82
trabalhou anteriormente -0,46 ** 0,85 *** vendas real -0,05 -0,04
-0,23 -0,28 -0,06 -0,05
0,04 0 0,43 0,45
meses no último emprego
0 0,01 nível de emprego 0,07 0,27
0 -0,01 -0,28 -0,17
0,25 0,39 0,8 0,12
constante -26,27 -4,15
-29,1 -3,14
0,37 0,19
ln_gama -0,75 -0,76
-0,05 -0,11
0 0
gamma 0,47 -0,47
-0,03 -0,05
Número de Obs 332 74
Prob > chi2 0 0,14
20
b) Salvador
Variável 2000 2010 Variável 2000 2010
chefe -0,05 0,05 demitido 0,08 -1,14 ***
-0,11 -0,27 -0,12 -0,33
0,68 0,85 0,48 0
gênero 0,1 0,59 *** formal 0,25 ** 0,14
-0,1 -0,22 -0,1 -0,38
0,32 0,01 0,02 0,7
tamanho da família 0,06 *** 0,11 setor industrial -0,16 -0,76
-0,02 -0,07 -0,14 -0,48
0 0,13 0,28 0,11
anos de estudo 0,04 ** 0,03 horas semana 0,11 -0,84 ***
-0,01 -0,03 -0,25 -0,23
0,01 0,38 0,65 0
idade 0 0,01 salário 0,04 0,06 ***
-0,01 -0,01 -0,09 -0,02
0,88 0,33 0,65 0
trabalhou anteriormente -0,38 * -0,22 vendas real -0,03 0,1 **
-0,21 -0,33 -0,06 -0,04
0,07 0,51 0,67 0,01
meses no último emprego
0 ** 0,01 nível de emprego 0 1,26 ***
0 -0,01 -0,26 -0,3
0,01 0,39 1 0
constante -8,05 -60,3 ***
-26,87 -13,39
0,76 0
ln_gama -0,8 -0,17
-0,05 -0,08
0 0,04
gamma 0,45 0,84
-0,02 -0,07
Número de Obs 356 429
Prob > chi2 0 0
21
c) Belo Horizonte
Variável 2000 2010 Variável 2000 2010
chefe -0,22 ** -0,08 demitido 0,14 * -0,04
-0,1 -0,18 -0,08 -0,16
0,03 0,67 0,08 0,81
gênero 0,19 ** 0,2 formal 0,1 -0,24
-0,08 -0,15 -0,08 -0,17
0,01 0,19 0,22 0,16
tamanho da família 0 -0,01 setor industrial 0,13 0,11
-0,02 -0,05 -0,09 -0,24
0,86 0,91 0,14 0,63
anos de estudo 0,04 *** 0,04 * horas semana 0,11 -0,29
-0,01 -0,02 -0,12 -0,24
0 0,06 0,36 0,24
idade 0 0,01 salário -0,05 -0,01
0 -0,01 -0,04 -0,01
0,35 0,2 0,21 0,36
trabalhou anteriormente -0,37 ** 0,12 vendas real 0 -0,03
-0,16 -0,27 -0,03 -0,03
0,02 0,67 0,98 0,32
meses no último emprego
0 0 nível de emprego -0,02 0,43
0 0 -0,22 -0,34
0,19 0,5 0,92 0,2
constante -1,4 -9,01
-12,54 -9,87
0,91 0,36
ln_gama -0,79 -0,59
-0,04 -0,06
0 0
gamma 0,46 0,55
-0,02 -0,04
Número de Obs 488 208
Prob > chi2 0 0,48
22
d) Rio de Janeiro
Variável 2000 2010 Variável 2000 2010
chefe -0,56 *** -0,16 demitido 0,1 -0,47
-0,11 -0,23 -0,1 -0,3
0 0,49 0,33 0,12
gênero 0,18 * 0,43 ** formal 0,3 *** -0,55 **
-0,1 -0,2 -0,1 -0,3
0,09 0,03 0 0,07
tamanho da família -0,05 * 0,01 setor industrial 0,07 -0,45
-0,03 -0,07 -0,14 -0,3
0,05 0,89 0,63 0,13
anos de estudo 0,02 0 horas semana -0,39 -0,14
-0,01 -0,03 -0,23 -0,24
0,1 0,93 0,1 0,54
idade 0,01 ** 0 salário -0,05 -0,04 *
0 -0,01 -0,14 -0,02
0,01 0,66 0,7 0,03
trabalhou anteriormente -0,78 *** 0,2 vendas real 0,04 0
-0,19 -0,28 -0,03 -0,05
0 0,48 0,24 0,94
meses no último emprego
0 -0,01 nível de emprego 0,34 -0,11
0 0 -0,3 -0,23
0,25 0,13 0,25 0,65
constante 5,42 35,03
-4,72 -29,53
0,25 0,24
ln_gama -0,66 -0,42
-0,05 -0,09
0 0
gamma 0,52 0,66
-0,02 -0,06
Número de Obs 545 306
Prob > chi2 0 0
23
e) São Paulo
Variável 2000 2010 Variável 2000 2010
chefe -0,02 * -0,06 demitido 0,13 -0,25
-0,1 -0,18 -0,09 -0,19
0,83 0,73 0,16 0,18
gênero 0,05 0,31 ** formal 0,2 ** -0,29
-0,08 -0,14 -0,08 -0,2
0,57 0,03 0,02 0,14
tamanho da família 0,01 0,05 setor industrial -0,03 -0,2
-0,02 -0,06 -0,09 -0,2
0,61 0,37 0,74 0,32
anos de estudo 0,03 *** -0,01 horas semana 0 0,09
-0,01 -0,03 -0,11 -0,17
0 0,68 1 0,58
idade 0 0,01 salário -0,08 -0,02
0 -0,01 -0,06 -0,01
0,77 0,21 0,13 0,1
trabalhou anteriormente -0,79 *** -0,05 vendas real -0,01 -0,02
-0,18 -0,24 -0,03 -0,03
0 0,82 0,67 0,61
meses no último emprego
0 0 nível de emprego 0,12 -0,22
0 0 -0,16 -0,18
0,13 0,57 0,47 0,22
constante 0,78 19,39
-13,44 -17,38
0,95 0,27
ln_gama -0,67 -0,52
-0,04 -0,07
0 0
gamma 0,51 0,6
-0,02 -0,04
Número de Obs 709 364
Prob > chi2 0 0,01
24
f) Porto Alegre
Variável 2000 2010 Variável 2000 2010
chefe -0,3 ** -0,3 demitido 0,26 ** -0,35
-0,13 -0,2 -0,11 -0,19
0,02 0,14 0,02 0,07
gênero 0,19 -0,05 formal 0,21 * -0,29
-0,11 -0,17 -0,11 -0,21
0,07 0,79 0,05 0,17
tamanho da família -0,04 * 0,12 setor industrial -0,13 0,16
-0,03 -0,07 -0,12 -0,27
0,08 0,09 0,28 0,54
anos de estudo 0,01 0,1 *** horas semana 0,01 0,32
-0,02 -0,03 -0,04 -0,2
0,55 0 0,77 0,1
idade 0,01 * 0,03 salário -0,02
-0,01 -0,01 -0,01
0,09 0 0,1
trabalhou anteriormente -0,52 ** -0,7 vendas real -0,01 0
-0,21 -0,39 -0,02 -0,02
0,01 0,07 0,69 0,99
meses no último emprego
0 *** 0 nível de emprego 0,12 -0,72
0 0 -0,09 -0,32
0 0,78 0,21 0,03
constante -8,66 43,75
-9,59 -27,04
0,37 0,11
ln_gama -0,51 -0,6
-0,04 -0,08
0 0
gamma 0,6 0,55
-0,03 -0,05
Número de Obs 574 148
Prob > chi2 0 0
25
BREVE REFLEXÃO TEÓRICA ACERCA DA RELAÇÃO ENTRE
POPULAÇÃO E ECONOMIA
Patricia Silva Gomes8
João Batista Pamplona9
INTRODUÇÃO
Nos dias atuais os estudos que analisam o processo demográfico já não estão
mais preocupados em destacar a explosão demográfica das populações como descrito
nas previsões de Malthus, mas sim compreender o baixo crescimento populacional e o
processo de transição demográfica que muitos países estão vivenciando.
Além disso, nos últimos anos, a expectativa de vida da população aumentou e a
taxa de mortalidade declinou, gerando alterações em sua estrutura etária. A população
idosa relativa a determinado período é maior do que aquela do período anterior. Os
autores destacam que os avanços tecnológicos e civilizatórios são indiscutíveis, e, ao
mesmo tempo, são responsáveis por estas mudanças demográficas.
Os estudos sobre a estrutura da população iniciaram-se no momento que se
passou a observar um crescimento populacional expressivo. Destaca-se a teoria da
população de Malthus, que defendia que as populações não poderiam aumentar sem que
houvesse aumento dos meios de subsistência, ou seja, a consequência de um
crescimento da população maior do que os meios de subsistência seria a miséria.
No século XIX, muitos países capitalistas vivenciaram a revolução nas formas
de produção e nos meios de transporte, que também “influenciaram as migrações
internas e externas” (ALVES, 2006, p.7). O desenvolvimento econômico elevou a
produtividade per capita e, em muitos países, observou-se uma queda no ritmo de
crescimento populacional, o que representa uma contradição às previsões malthusianas.
As interpretações de Boserup (1987) e Kuznets (1974) destacam que o
crescimento populacional pode ser um incentivo para as mudanças tecnológicas, em
especial, para a produção de alimentos, e pode gerar um crescimento econômico
genuíno. Além disso, o crescimento populacional, a taxa de mortalidade, as tendências
nas taxas de natalidade e o impacto da migração internacional são influenciados pelo
crescimento econômico e, ao mesmo tempo, podem influenciá-lo, melhorando as
condições de vida das populações sem apresentar queda da taxa de crescimento do
produto per capita.
Independente do ponto de vista teórico, todas as faixas etárias das populações
possuem diferentes escolhas de consumo e diferentes capacidades produtivas. Neste
contexto, as características econômicas do país também são modificadas a partir das
mudanças demográficas de sua população. Logo, à medida que a população envelhece
suas escolhas individuais também se alteram, não sendo possível definir com precisão
um comportamento padrão. Mas, sugere-se que a partir do momento que a expectativa
de vida aumenta, os indivíduos optam por modificar suas escolhas. Além disso, o
próprio contexto institucional do país pode ser influenciado por modificações de sua
população (BLOOM; CANNING; FINK, 2010, p.584).
8 Mestre em Economia Política pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo
(PUC/SP). 9 Professor do Departamento de Economia e do Programa de Pós-Graduação em Economia
Política da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC/SP).
26
Dado o envelhecimento populacional, cabe definir o que é ser idoso. Em termos
internacionais, a pessoa é considerada idosa a partir de 65 anos de idade. No Brasil, uma
grande parte dos documentos pesquisados segue a recomendação da Política Nacional
do Idoso de 1994 que “considera idoso, para os efeitos da lei, a pessoa maior de 60
anos” (PRESIDÊNCIA DA REPÚBLICA, 1994, p.1). Neste caso, este trabalho segue a
idade de 60 anos como base para as declarações a respeito do idoso, portanto, todas as
vezes que esta palavra for mencionada segue-se tal recomendação.
Com a nova realidade representada pelo aumento da expectativa de vida, o
próprio envelhecimento da população, as políticas de aposentadoria, pensões,
financiamento de cuidados com a saúde, o mercado de trabalho, o mercado de capitais e
o sistema econômico tendem a se adaptar. O tamanho destas alterações depende do
comportamento político e da representatividade do grupo etário (BLOOM; CANNING;
FINK, 2010, p.584).
Alguns autores argumentam que uma população com maioria de idosos está
propensa a experimentar um crescimento econômico mais lento (BLOOM; CANNING;
FINK, 2010, p.593). Para outros, uma população representada por uma maioria de
indivíduos em idade ativa pode refletir-se em um crescimento econômico maior.
Neste contexto, o objetivo principal deste trabalho é apresentar uma breve
reflexão acerca do debate teórico presente na literatura internacional dos efeitos
econômicos do envelhecimento populacional especialmente sobre o mercado de
trabalho. Neste artigo é adotada uma pesquisa bibliográfica, composta por seleção,
análise, resumo, complementação e confrontação das referências bibliográficas.
A estrutura desse documento está composta das seguintes partes, além desta
introdução e da conclusão: o item 1 aborda alguns conceitos importantes que relacionam
população, demografia e economia; o item 2 destaca as abordagens teóricas e
econômicas acerca da relação entre a população e economia; no item 3 a visão
econômica do envelhecimento é descrito, em especial os seus impactos sobre o mercado
de trabalho.
1. POPULAÇÃO, DEMOGRAFIA E ECONOMIA: Conceitos Fundamentais
Uma população é constituída por um grupo de pessoas e qualquer pessoa no
mundo está inserida em um grupo populacional, em que a dinâmica de sua população
impacta em vários aspectos de sua vida, por exemplo, no local onde ela vive e, em
muitos momentos, no transcorrer de sua vida. A ciência que estuda as populações é
denominada demografia, a qual busca registrar dados brutos que caracterizam as
populações (por exemplo, registros de nascimentos e óbitos) e transformá-los em taxas,
proporções, razões ou outros tipos de estatísticas (CAMARANO, 2005, p.111).
Em todo o mundo, dinâmicas diferentes e específicas são observadas nas
populações, e todas as populações são modificadas demograficamente a partir de seus
componentes básicos: fecundidade, mortalidade e migração (CAMARANO, 2005,
p.113).
A fecundidade é o número de nascimentos contados em um período de tempo
determinado (normalmente, calculado para cada mil pessoas). É importante destacar que
fecundidade não pode ser confundida com o termo fertilidade. Fertilidade é o potencial
reprodutivo das mulheres, ainda não concretizado em nascimentos. Acrescenta-se a esta
temática o termo natalidade que se refere à relação entre os nascimentos vivos e a
população total (CARVALHO; SAWYER; RODRIGUES, 1998, p. 20-21).
Mortalidade é o número de pessoas mortas em um período ou grupo específico,
por exemplo, o número de crianças do sexo masculino que morreram em um ano.
27
Geralmente, utiliza-se a forma estatística de taxa, ou seja, taxa de fecundidade e/ou taxa
de mortalidade. Esta terminologia significa a razão entre uma subpopulação e o total da
população. Estas taxas também podem ser brutas ou específicas (CAMARANO, 2005,
p.113).
Migração é a contagem de pessoas que entraram (imigração) ou saíram
(emigração) de um determinado local em um período específico. Se a população for
fechada, a emigração não é considerada.
A partir destes três componentes, considera-se uma equação demográfica básica
(expressão 1):
(𝑃𝑡 + 1) = 𝑃𝑡 + (𝑁𝑡 − 𝑂𝑡) + (𝐼𝑡 + 𝐸𝑡) (1)
em que: 𝑃𝑡 é o número de pessoas da população no período 1; (𝑃𝑡 + 1) é o número de
pessoas da população no período 2; 𝑁𝑡 é o número de nascimentos da população no
período 1; 𝑂𝑡 é o número de óbitos ocorridos na população no período 1; (𝑁𝑡 − 𝑂𝑡) é o
incremento natural ou mudança natural10 no período 1; 𝐼𝑡 é o número de imigrantes da
população no período 1; 𝐸𝑡 é o número de emigrantes da população no período 1; (𝐼𝑡 +𝐸𝑡) é o saldo migratório (CAMARANO, 2005, p.113).
O total da população (𝑃𝑡 + 1) no período 2 também é chamado de balanço
demográfico (CAMARANO, 2005, p.113).
Outro indicador importante é representado pela esperança ou expectativa de vida
ao nascer, a qual refere-se ao número médio de anos que um recém-nascido pode
esperar viver, de acordo com as condições de mortalidade de sua população. Este
cálculo da expectativa de vida ao nascer é feito a partir das taxas específicas de
mortalidade de um determinado período. Existem muitas variações da esperança de
vida11: sexo, idade, raça, classes sociais e regiões. Logo, o cálculo do indicador pode ser
realizado para todos estes grupos (CAMARANO, 2005, p.118).
Causas externas, tais como, homicídios, acidentes de trânsito e de trabalho,
epidemias, saneamento básico, entre outros, são fatores que alteram as taxas de
mortalidade (CAMARANO, 2005, p.119).
As características mais básicas de uma população são idade e sexo. Cada
população apresenta uma composição etária diferente e por sexo, o que reflete na
história da dinâmica populacional daquele país, embora seja um aspecto estatístico
(CARVALHO; SAWYER; RODRIGUES, 1998, p.26). Esta estrutura etária possui
impactos sobre a demografia e as condições socioeconômicas em todos os períodos.
Uma população é caracterizada como velha ou jovem a partir da composição de pessoas
nas faixas extremas (HAUPT; KANE, 1998).
Tradicionalmente, a forma ilustrativa de representar a estrutura etária é por meio
de uma pirâmide etária por idade e sexo. Denomina-se pirâmide devido à distribuição
etária típica de regiões que vivenciaram alta fecundidade no passado. A base da
pirâmide larga ilustra uma população jovem. Com a queda da fecundidade, a base da
pirâmide se estreita formando uma tendência retangular, o que representa uma
população envelhecida (CARVALHO; SAWYER; RODRIGUES, 1998, p.26).
O movimento de alteração de altos níveis de mortalidade e fecundidade para
níveis cada vez menores é denominado transição demográfica, o qual, geralmente,
10 O termo mudança natural também é utilizado por Serban (2012, p.357) para descrever o
incremento natural. 11 Existe uma tendência generalizada, em quase todo o mundo, da taxa de mortalidade
masculina apresentar um valor sempre maior do que a taxa de mortalidade feminina
(CAMARANO, 2005, p.118).
28
ocorre paralelamente com o processo de modernização. A literatura destaca que o
processo de transição demográfica acontece em três fases: 1º) quando é observado um
baixo crescimento populacional, ou seja, altas taxas de fecundidade e mortalidade; 2º)
quando há alto crescimento populacional, relacionado à queda na taxa de mortalidade,
com uma taxa de fecundidade constante; e, 3º) quando existe baixo crescimento
populacional, em outras palavras, a taxa de fecundidade e mortalidade são baixas
(PRESSAT, 1985; IPEA, 2005, p.69).
Um cálculo muito utilizado é a razão entre os sexos, conforme expressão (2).
Usualmente, esta razão é expressa pelo número de homens para cada 100 mulheres, o
qual varia de acordo com a idade. Esta razão entre sexos pode diminuir por meio da
mortalidade masculina em relação à feminina.
𝑅𝑎𝑧ã𝑜 𝑠𝑒𝑥𝑜𝑠 = (𝑁ú𝑚𝑒𝑟𝑜 𝑑𝑒 ℎ𝑜𝑚𝑒𝑛𝑠
𝑁ú𝑚𝑒𝑟𝑜 𝑑𝑒 𝑚𝑢𝑙ℎ𝑒𝑟𝑒𝑠) 𝑥100 (2)
A razão de dependência é uma equação muito utilizada (nos artigos acadêmicos
em economia), principalmente, quando se relaciona ao mercado de trabalho, e expressa
à razão entre a população “dependente” e a população “economicamente produtiva”. A
população dependente convencionalmente é o grupo composto pelas pessoas com
menos de 15 anos de idade e com idade igual ou maior do que 60 anos. O grupo
economicamente produtivo é chamado de população economicamente ativa (PEA), o
qual é composto pelas pessoas, ocupadas e desocupadas, conforme expressão (3) (IPEA,
2005, p. 93).
𝑅𝑎𝑧ã𝑜 𝑑𝑒 𝐷𝑒𝑝𝑒𝑛𝑑ê𝑛𝑐𝑖𝑎 = (𝑃𝑜𝑝𝑢𝑙𝑎çã𝑜 ≤ 15𝑎𝑛𝑜𝑠 𝑒 ≥ 60 𝑎𝑛𝑜𝑠
𝑃𝐸𝐴) 𝑥100 (3)
A partir desta relação entre a população dependente e a PEA é possível verificar
o denominado “bônus demográfico”. Isto significa que a população está vivenciando
uma baixa razão de dependência, em outras palavras, destaca-se que uma população é
representada por uma parcela maior de pessoas ocupadas (trabalhando) ou em busca de
trabalho (desocupadas) em relação às populações denominadas dependentes. Neste
caso, há mais pessoas ativas economicamente e menos pessoas dependentes
(VASCONCELOS; ALVES; SILVEIRA-FILHO, 2008, p.12).
Uma população representada por uma maioria de participantes da população
economicamente ativa (PEA) tende a resultar em um aumento no produto per capita.
Refere-se a um benefício natural da própria distribuição etária da população que ilustra
uma baixa razão de dependência, em que pode ser observada uma tendência de maior
oferta de mão-de-obra, ou seja, uma quantidade maior de jovens participantes do
mercado de trabalho (VASCONCELOS; ALVES; SILVEIRA-FILHO, 2008, p.12).
Neste contexto, a menor taxa de razão de dependência também é verificada na
literatura como dividendo demográfico12, isto é, a população apresenta uma estrutura
etária que, se for bem aproveitada pelo poder público, pode favorecer o
desenvolvimento econômico e trazer muitos benefícios à população. Ou seja, é o
momento ideal para implementar políticas públicas devido a menor demanda sobre
recursos (VASCONCELOS; ALVES; SILVEIRA-FILHO, 2008, p.12).
12 Os termos bônus demográfico e dividendo demográfico são utilizados como sinônimos e
são destacados, respectivamente, em Wong e Carvalho (2006, p.9) e em Vasconcelos, Alves e
Silveira-Filho (2008, p.12).
29
Os conceitos de População em Idade Ativa (PIA) e População Economicamente
Ativa (PEA) podem ser facilmente confundidos. A PIA é o número total de pessoas com
10 anos ou mais de idade13. Já a PEA é formada pelo total de pessoas ocupadas e
desocupadas, conforme o seu grupo de faixa etária. Além disso, são denominadas
inativas (ou não economicamente ativas) as pessoas que na semana de referência não
foram classificadas como ocupadas ou desocupadas (IPEA, 2005, p. 93; IBGE, 2010, p.
310; IBGE, 2012 p.4-12).
O grupo considerado ocupado é composto por aquelas pessoas que tinham um
trabalho durante o período de referência, mesmo afastadas por motivo de férias, licença,
falta. As pessoas desocupadas são aquelas que não tinham trabalho, em um determinado
período de referência, mas estavam dispostas a trabalhar, e que, para isso, tomaram
alguma providência efetiva (consultando pessoas, jornais, etc.) (IBGE, 2010, p.310).
Cabe destacar ainda que a taxa de ocupação é a relação entre o número de
pessoas ocupadas e o número de pessoas economicamente ativas (PEA) na semana de
referência (IBGE, 2010, p.312). E taxa de participação ou taxa de atividade no mercado
de trabalho é o percentual de pessoas economicamente ativas (PEA) em relação às
pessoas em idade ativa (PIA) (IBGE, 2012, p.4).
2. TEORIA ECONÔMICA E POPULAÇÃO
Thomas Robert Malthus é citado em praticamente todos os trabalhos
relacionados à população. Em 1798, ele publicou anonimamente a primeira edição do
livro “Ensaio sobre a população”. Suas convicções religiosas influenciaram fortemente
a escrita do livro que ainda originou-se da polêmica a respeito da avareza, prodigalidade
(desperdício) e perfectibilidade humana. Malthus defendia a desigualdade, pois sua
extinção socializaria a miséria entre as pessoas. Ele acreditava que a pobreza era um
problema dos pobres (ALVES, 2002, p.17).
A teoria de Malthus possui como base dois postulados: 1) que o alimento é
necessário para a existência do homem; 2) que a paixão entre os sexos é necessária e
que permanecerá aproximadamente em seu atual estágio (MALTHUS, 1996, p.246).
Não conheço nenhum escritor que tenha admitido que
nesta terra o homem, fundamentalmente, seja capaz de
viver sem alimento. [...] com relação à extinção da paixão
entre os sexos, nenhum progresso, qualquer que ele seja,
foi feito até aqui. Ela parece existir com tanto ímpeto
agora como existia há dois ou há quatro mil anos. Existem
exceções hoje como sempre existiram. Mas, essas
exceções não parecem crescer numericamente
(MALTHUS, 1996, p.246).
O primeiro postulado corresponde a uma verdade incontestável. Já o segundo
apresenta muitas implicações. Malthus considera a heterossexualidade como absoluta e
imutável em seus resultados. Ele ainda não separa relação sexual de procriação, e
desconsiderou os avanços tecnológicos e da ciência, por exemplo, os métodos
13 Em grande parte dos artigos internacionais e alguns nacionais a PIA é composta pelo
grupo de pessoas entre 15 e 60 anos. O IBGE define população em idade ativa (PIA) todas as
pessoas com 10 anos ou mais idade (IBGE, 2010, p. 310).
30
anticoncepcionais. Portanto, um fator relevante sobre a taxa de fecundidade das
sociedades, em especial as atuais (ALVES, 2002, p.17).
Malthus escreveu esses dois postulados para afirmar a seguinte lei: “[...] a
população, quando não controlada cresce numa progressão geométrica. E os meios de
subsistência crescem apenas numa progressão aritmética” (MALTHUS, 1996, p.246).
(...)Tomando a população do mundo como qualquer número,
1 bilhão, por exemplo, a espécie humana cresceria na progressão
de 1, 2, 4, 8, 16, 32, 64, 128, 256, 512 etc. e os meios de
subsistência na progressão de 1, 2, 3, 4, 5, 6, 7, 8, 9, 10 etc. Em
dois séculos e um quarto a população estaria, para os meios de
subsistência, na proporção de 512 para 10; em três séculos, de
4096 para 13; em 2 milhões de anos a diferença seria quase
incalculável, embora a produção nesse período tivesse crescido
em larga medida... (MALTHUS, 1996, p.251).
Para fundamentar o princípio da população em sua teoria, Malthus utilizou os
dados estatísticos de crescimento da população dos EUA, a qual se duplicou em 25
anos. Em seguida, apresentou um contexto histórico da Inglaterra para descrever que os
meios de subsistência crescem no máximo em progressão aritmética (MALTHUS,
1996, p.249-250). Segundo Alves (2002, p.18), Malthus não baseou sua teoria em
nenhuma estatística confiável e as evidências das experiências dos séculos seguintes
também não confirmaram suas previsões. “Deliberadamente, o princípio malthusiano
superestima o poder de crescimento da população e subestima a capacidade de
crescimento dos meios de subsistência” (ALVES, 2002, p.18).
Em relação à primeira parte da teoria de Malthus, a respeito do crescimento
geométrico da população, baseia-se em (pre) conceitos religiosos, tais como, “crescei e
multiplicai-vos14”, contra os nascimentos fora do casamento, aborto, métodos artificiais
de contracepção, e controle de natalidade depois do casamento. A única prevenção
aceitável na visão do autor seria o adiamento do casamento (casar-se em idade mais
avançada), descrito por ele como “freio preventivo”. Neste contexto, a taxa de
natalidade diminuiria de forma voluntária (ALVES, 2002, p.18). Malthus considera
outro fator relevante se o homem não possui provisões econômicas (trabalho e salário)
para sustentar dignamente esposa e filhos deve adiar o casamento para uma época mais
propícia. Neste caso, seria considerado um bom cristão pela abstinência sexual, dada a
sua impossibilidade financeira (MALTHUS, 1996, p.8).
Quanto à segunda parte da “lei” sobre os meios de subsistência, Malthus
considerou a existência de um salário de subsistência que garantiria um equilíbrio entre
a população e o fundo de manutenção do trabalho. “Na concepção de Malthus, existe
um fundo de subsistência composto por produtos agrícolas que depende da
disponibilidade de terra e sua produtividade” (ALVES, 2002, p.19).
De acordo com Lima (2011, p.17), Malthus considera relevante três proposições
para construir seu argumento: 1) A população não pode aumentar sem os meios de
subsistência; 2) A população cresce invariavelmente onde não há meios de subsistência;
e 3) O poder superior de crescimento populacional não pode ser controlado sem
produção de misérias e sofrimentos. Ou seja, a consequência de um crescimento da
população maior do que os meios de subsistência é um grave problema de miséria.
14 Refere-se a uma citação direta da Bíblia: Genesis capítulo 19, 30-38.
31
Segundo Vasconcelos, Alves e Silveira-Filho (2008, p.2), quando as condições
de vida eram favorecidas pela elevação do nível do “salário de subsistência”, ou seja, a
população crescia acima do valor de equilíbrio, eventos externos, tais como, “fome,
epidemias, guerras, ou o autocontrole da fecundidade se apresentavam como processos
que obrigatoriamente devolviam o estoque de população ao nível de equilíbrio”.
Conforme Alves (2002, p.22), Malthus considera que um aumento de salário
além do nível de subsistência incentivaria o ócio e o desperdício e seria gasto em
“bebedeira e esbanjamento15”. Ele considera que o mal existe no mundo não para criar o
desespero, mas a diligência. “A aprovação da virtude é resistir a toda tentação do mal”.
Malthus fecha sua filosofia mostrando que o aumento
do bem-estar geral da humanidade é impossível devido ao
seu princípio de população e que a riqueza e o ócio seriam
conquistas indesejadas (pelo menos para as classes
trabalhadoras), pois desestimularia a inteligência,
regrediria a mente humana ao seu nível animalesco e,
provavelmente, eliminaria os estímulos que tiraram os
seres humanos do seu estado selvagem. Homens e
mulheres estariam condenados a sofrer neste “vale de
lágrimas”, que é o planeta Terra, e o desenvolvimento
econômico e social seria uma utopia inatingível. O
crescimento desregrado da população inviabilizaria a
prosperidade e a redução da jornada de trabalho: “(...) a lei
[de população] se mostra decisiva contra a possível
existência de uma sociedade em que todos os membros
viveriam em tranquilidade, prosperidade e num relativo
ócio" (ALVES, 2002, p.23).
Entretanto, segundo Alves (2006, p.7), Malthus ignora o avanço tecnológico e o
progresso técnico. No século XIX, muitos países capitalistas vivenciaram a revolução
nas formas de produção e nos meios de transporte, que também “influenciaram as
migrações internas e externas”. O desenvolvimento elevou a produtividade per capita e,
em muitos países, observou-se uma queda no ritmo de crescimento populacional, o que
representa uma contradição às previsões malthusianas.
A visão sobre a população apresentada por Karl Marx é diferente daquela escrita
por Malthus, e ainda lhe inspirou a escrever uma crítica à teoria Malthusiana. Na teoria
da população escrita por Marx está presente a dinâmica populacional, ou seja, ela é
compreendida a partir do conjunto de relações sociais. Trata-se de uma teoria da
dinâmica populacional sob o capitalismo (VIANA, 2006, p.90).
Segundo Rosdolsky (2011, p.213), a única crítica detalhada de Marx à teoria da
população de Malthus é encontrada no livro “Grundrisse 16 ”. Refere-se à “lei de
população no capitalismo”, descrevendo a diferença desta lei em relação àquelas que
vigoravam em etapas anteriores da produção.
Marx (2011, p. 503-504) inicia a sua crítica a Malthus descrevendo que a
população não possui um limite de crescimento por meio de características externas: o
“limite é dado pelo próprio limite, ou, antes pela mesma causa que põe o limite”. Marx
15 Trata-se do (pre) conceito Malthusiano de que os pobres sempre gastam o dinheiro extra
que recebem com bebidas. 16 Exatamente entre as páginas 502-508 (ROSDOLSKY, 2011).
32
quer dizer que o limite da população é dado pelas condições de produção, dentro do
processo que a população está inserida. Assim como, o “trabalho necessário e o trabalho
excedente, tomados em conjunto, constituem a totalidade do trabalho sobre uma base
dada” (MARX, 2011, p. 504).
É importante compreender a definição de superpopulação ou população
“excedente” para Marx. A partir do desenvolvimento capitalista, “aumenta-se a
velocidade das mudanças na composição orgânica do capital e na sua forma técnica, e
um número maior de ramos de produção é atingido”. Ou seja, “a população trabalhadora
ao produzir a acumulação do capital, produz, em proporções crescentes, os meios que
fazem dela relativamente uma superpopulação”, denominada por Marx um “exército
industrial de reserva” (MARX, 1980, p. 732).
(...) população trabalhadora excedente é o produto
necessário da acumulação ou do desenvolvimento da
riqueza no sistema capitalista, ela se torna por sua vez a
alavanca da acumulação capitalista, e mesmo condição de
existência do modo de produção capitalista. Ela constitui
um exército industrial de reserva disponível, que pertence
ao capital de maneira tão absoluta como se fosse criado e
mantido por ele. Ela proporciona o material humano a
serviço das necessidades variáveis de expansão do capital
e sempre pronto para ser explorado, independentemente
dos limites do verdadeiro incremento da população. (...)
As alternativas do ciclo industrial recrutam a população
excedente e se tornam os mais poderosos agentes de sua
reprodução. (MARX, 1980, p. 733-734).
Marx dirigindo-se diretamente a Malthus, observa que a “concepção
[malthusiana] 17 é inteiramente falsa e pueril”. Porque Malthus “considera a
superpopulação nas diferentes fases do desenvolvimento econômico como algo da
mesma espécie” (MARX, 2011, p. 504).
Marx descreve que Malthus relaciona duas séries naturais, complexas e
variáveis, em uma única relação. Por um lado, os meios de subsistência (reprodução
natural dos vegetais), a qual se reproduz em progressão aritmética. Por outro lado, o
crescimento populacional, que cresce em progressão geométrica. “Desse modo,
transforma as relações historicamente distintas em uma relação numérica abstrata, tirada
simplesmente do nada, que não se baseia nem em leis naturais nem em leis históricas”
(MARX, 2011, p. 504).
O imbecil subentende com isso que o aumento do ser
humano é um processo puramente natural que precisa de
limitações, controles externos para não continuar em uma
progressão geométrica. (...) Uma superpopulação de
atenienses livres convertidos em colonos é
significativamente diferente de uma superpopulação de
trabalhadores convertidos em internos de asilo de pobres.
Da mesma forma, a superpopulação de mendigos que
consome o produto excedente de um mosteiro é diferente
17 Grifo nosso.
33
da superpopulação que se forma em uma fábrica. (MARX,
2011, p. 505).
Marx ainda descreve que Malthus se aproveita da história real, de reprodução do
ser humano, para aplicar seus ideais. Nas palavras de Marx, “o ser humano malthusiano,
abstraído do ser humano historicamente determinado, existe apenas em seu cérebro”
(MARX, 2011, p. 505).
“A produção dos meios de subsistência – marcada e determinada pela ação
humana como o é – aparece como limitação que ela põe a si mesma”. (MARX, 2011, p.
505). Marx observa que qualquer planta cresceria até onde existisse terra. A reprodução
só pararia quando o espaço acabasse. A planta não observaria qualquer proporção
aritmética.
Ricardo18 apud Marx (2011, p.505) explica que uma determinada quantidade X
de pessoas relacionadas a uma determinada quantidade X de meios de subsistência não
podem ser interligadas. Pois, uma determinada quantidade X de “cereais disponível é
completamente indiferente para o trabalhador se ele não tem nenhuma ocupação; que,
portanto, são os ‘meios de emprego’, e não os de ‘subsistência’, que o colocam ou não
na categoria de superpopulação”.
Na economia capitalista, os capitalistas industriais apropriam-se do trabalho
alheio, ou seja, de trabalho necessário para o processo de circulação do capital. “A
expressão ‘superpopulação’ refere-se exclusivamente as capacidades de trabalho,
população necessária, excesso de capacidade de trabalho”. Em outras palavras, “da
fração da população trabalhadora cujo trabalho necessário não é supérfluo, mas
necessário para o capital” (MARX, 2011, p. 507).
Por um lado, o capitalista, em partes, não tem custo de reprodução da classe
trabalhadora excedente. Por outro lado, se reproduz como capital excedente.
Sistematicamente, isto significa: 1) é preciso que se tenha uma população excedente
disponível para ser colocado em movimento. Isto é, se a população que o capital precisa
ficou menor, ele próprio ficou maior; 2) uma superpopulação relativa é importante ao
capital, pois ele necessita de uma reserva da população disponível para o crescimento do
capital excedente; 3) pode existir uma população excedente, entretanto não na
proporção necessária para produção acrescida. ”Em síntese, de tudo o que o processo de
muitos capitais pressupõe” (MARX, 2011, p. 508).
Por fim, Marx descreve que a teoria de Malthus só é significativa sob dois
aspectos: 1)”porque empresta uma expressão brutal ao brutal ponto de vista do capital; e
2) porque afirmou o fato da superpopulação em todas as formas de sociedade” (MARX,
2011, p. 504).
Nos últimos duzentos anos, os avanços tecnológicos e civilizatórios são
indiscutíveis. Sob o ponto de vista da teoria da população de Malthus, é possível
concluir que o autor fundamentou sua teoria em princípios conservadores, (pre)
conceituosos, e de caráter pessimista. Além de utilizar instrumentos estatísticos e
históricos tendenciosos e subjetivos. Portanto, embora a população tenha aumentado,
em todas as sociedades, este crescimento não ocorreu de forma geométrica, conforme
Malthus previu. Já os meios de subsistência, dado os avanços tecnológicos, podem ser
produzidos e/ou extraídos em progressão ampliada e não simplesmente de forma
aritmética.
18 David Ricardo (1772-1823) informações adicionais são encontradas em Lenz (1985, 81-
104).
34
Entretanto, devemos esclarecer que a crítica de Marx e a construção de sua
própria teoria da população, tratam-se de uma obra incompleta. Marx fundamentou esta
teoria sob o ponto de vista dos trabalhadores e capitalistas. É importante destacar que o
capitalismo se transformou ao longo desses anos e, portanto, não é exatamente igual sob
todos os aspectos considerados por Marx (VIANA, 2006, 98).
2.1 As interpretações que inter-relacionam população e crescimento econômico
A população mundial tem sofrido profundas transformações nas últimas
décadas, proporcionando enormes repercussões em termos sociais e econômicos. Com
destaque, o processo de transição demográfica tem chamado a atenção de muitos
autores, devido à desaceleração no ritmo do crescimento populacional e às modificações
em sua estrutura etária.
Frequentemente, a literatura destaca a divisão dos autores a respeito de seus
pontos de vista da relação entre população e crescimento econômico: por um lado, as
interpretações pessimistas; e, do outro lado, as visões contrárias às pessimistas.
Malthus, apresentado anteriormente, encaixa-se exatamente na visão pessimista
a respeito do crescimento populacional e desenvolvimento econômico.
A história corrobora que a abordagem Malthusiana estava equivocada.
Principalmente, a partir da Revolução Industrial quando as populações europeias
apresentaram crescimento populacional acompanhado de crescimento econômico,
“tanto das condições de vida quanto das tecnologias de produção (agrícola ou
manufatureira)” (VASCONCELOS; ALVES; SILVEIRA-FILHO, 2008, p.5).
O fenômeno da transição demográfica iniciou-se, em especial, no continente
europeu, permitindo melhora das condições de vida acima dos salários de subsistência,
exatamente ao contrário do que a teoria Malthusiana havia previsto (SARTORIS;
SOUZA, 2004, p.5).
Coale e Hoover (1966, p.23 e p. 33), com base em estudos sobre a Índia e o
México, destacaram duas direções acerca da interação entre demografia e economia. A
primeira relaciona os efeitos do desenvolvimento econômico sobre o crescimento da
população, e a segunda relaciona os efeitos do crescimento da população sobre o
desenvolvimento econômico.
Na primeira direção, os efeitos do desenvolvimento econômico sobre o
crescimento da população são influenciados principalmente por dois determinantes do
crescimento da população: nascimentos e óbitos. A denominada teoria da “transição
demográfica” é explicada por estes determinantes (COALE; HOOVER, 1966, p. 23).
A teoria da transição demográfica em sua origem é explicada por um grupo de
pessoas que apresenta uma alta taxa de óbitos e uma relativa estabilidade na taxa de
nascimentos. A alta taxa de mortalidade é justificada por uma alimentação pobre,
condições sanitárias antigas e falta de serviços médicos (COALE; HOOVER, 1966, p.
24).
Segundo a teoria da transição demográfica, o desenvolvimento econômico
provoca uma redução da taxa de óbitos. O termo desenvolvimento econômico engloba
uma evolução, a exemplo do que ocorreu com a Revolução Industrial, trazendo
modificações em cadeia 19 . Depois de algum tempo, a taxa de natalidade também
19 Modificações de uma economia rural para uma economia com maior divisão do trabalho
(ferramentas e maquinários), economia urbanizada (mercado), transformações técnicas e
melhorias em transporte, comunicações, etc. Por consequência, desenvolvimento nas áreas:
médica, construção, infraestrutura, etc.
35
declina, devido às alterações culturais e aos hábitos enraizados até manter certa
estabilidade (COALE; HOOVER, 1966, p. 24-32).
Na outra direção são destacados os efeitos do crescimento da população sobre o
desenvolvimento econômico. Os aspectos examinados para analisar os efeitos do
crescimento da população sobre o crescimento da renda per capita são: o volume da
população; a taxa de crescimento; e, a distribuição por idade (COALE; HOOVER,
1966, p. 33).
Os autores descrevem que examinar a relação direta entre o volume da
população e a renda per capita significa detectar um problema não considerado nas
análises anteriores. Ou seja, não é observado o efeito dinâmico das modificações do
volume da população sobre a taxa de crescimento (COALE; HOOVER, 1966, p. 34-37).
Segundo Paiva e Wajnmam (2005, p.306), os autores Coale e Hoover (1966)
“inovaram ao incorporar o conhecimento sobre a dinâmica demográfica nos modelos de
crescimento econômico”.
Paiva e Wajnamn (2005, p.306), e Vaconcelos, Alves e Silveira-Filho (2008,
p.7) destacam que a conclusão mais importante da obra de Coale e Hoover (1966) está
associada às análises efetuadas sobre as alterações na estrutura etária dos países (Índia e
México) sobre o processo de crescimento econômico.
Neste contexto, os pesquisadores Coale e Hoover (1966) verificaram que
mudanças na estrutura etária da população, decorrente das quedas nas taxas de
mortalidade e fecundidade, impactaram no crescimento econômico dos países (PAIVA;
WAJNAMN, 2005, p.306).
Ou seja, o aumento da razão de dependência, em especial para o grupo mais
jovem, resulta em aumento no consumo das famílias e, por consequência, diminuição da
poupança. E ainda, altera a trajetória dos investimentos públicos que estavam
direcionados para o crescimento econômico como, por exemplo, em infraestrutura,
obrigando os governos a direciona-los para gastos com as famílias, tais com, educação e
saúde. Como implicação, baixas taxas de poupança, e, consequentemente, um baixo
crescimento econômico dos países mais pobres passam a ser observados. Entretanto, um
declínio da razão de dependência resulta em baixo consumo das famílias e aumento de
poupança (VASCONCELOS; ALVES; SILVEIRA-FILHO, 2008, p.7-8).
Boserup (1987, p.7) apresenta a inter-relação entre o crescimento demográfico e
o crescimento econômico. Porém, ela parte da relação de causa na direção inversa
apresentada por Malthus. Ou seja, o crescimento populacional como variável
independente e as alterações na agricultura como fator dependente, incluindo
“desenvolvimento de padrões e técnicas de cultivo, estruturas sociais e comunidades
agrárias” (BOSERUP, 1987, p.8).
Boserup (1987, p.43 e p.136) destaca ainda que a partir de uma dada densidade
populacional gera-se um incentivo para intensificar a produção, e adotar novas técnicas
de cultivo, ferramentas específicas, fertilizantes, entre outros.
De acordo com Boserup (1981) citado por Paiva e Wajnman (2005, p.306),
“mudanças tecnológicas seriam induzidas pelo crescimento populacional”. Neste
contexto, o aumento populacional ocasiona a necessidade de aumento de investimentos
na agricultura, como alterações tecnológicas, por conseguinte, aumento da
produtividade que, por sua vez, gera crescimento econômico.
Outro argumento interessante utilizado por Boserup (1987, p.139-140)
demonstra que em "muitos países desenvolvidos com a expansão sustentada da
produção foi possível gerar excedentes para exportação”.
36
Neste contexto, a autora acredita que o crescimento populacional sustentado20
não traz maiores dificuldades para a demografia e a economia, mas representa um fator
positivo para gerar inovações tecnológicas permitindo que a população tenha mais
alternativas 21 para ampliar a produção de alimentos. Portanto, o crescimento
populacional sustentado pode “desencadear um processo genuíno de crescimento
econômico” (BOSERUP, 1987, p.137-138).
Kuznets (1974, p.38) destaca que os principais movimentos das alterações
populacionais no mundo moderno são o próprio aumento populacional, declínio da taxa
de mortalidade, tendências nas taxas de natalidade e impacto da migração internacional.
Além disso, estes movimentos são resultados e, ao mesmo tempo, são influenciados
pelo crescimento econômico.
Segundo Kuznets (1974, p.38-39), o crescimento demográfico sem queda no
produto per capita pode ser em parte justificável pelo impacto do aumento populacional
sobre o crescimento econômico, devido a algumas características, tais como,
deslocamento da estrutura demográfica, o qual ocasiona aumento da população em
idade ativa; queda da mortalidade infantil, o qual diminui o custo econômico que
impede as crianças de chegarem à idade de se tornarem economicamente ativas;
diminuição das taxas de morbidez, devido aos avanços da medicina; aumento no
produto total, devido à produção de escala, controle de epidemias; e, por fim, melhores
condições de vida que contribuem com “níveis elevados de treinamento e habilidade, ou
seja, potenciais contribuintes para suprimento disponível de conhecimento útil”.
A partir de observações estatísticas efetuadas por Kuznets (1974, p.43-46), o
crescimento econômico moderno e suas pequenas variações ao longo do tempo
apresentam alguns aspectos interessantes: estabilidade no crescimento populacional;
progresso agrícola (diminuição de risco de colheitas ruins); outras possibilidades de
transportes; queda da participação da agricultura no produto total; e, aumento na
participação da indústria.
“O crescimento populacional proporcionava sustentação à elevação dos níveis de
vida, à ampliação da força de trabalho e conhecimento útil – aspecto importante que
mais tarde viria a ser chamado de capital humano”, citado por Vasconcelos, Alves e
Silveira-Filho (2008, p.6-7) a respeito da contribuição de Kuznets (1974) sobre as
abordagens teóricas dos estudos da demografia e economia.
Em resumo, o trabalho de Kuznets (1974) apresenta um fator essencial e notável
caracterizado por uma mistura de alto crescimento populacional com alto crescimento
do produto per capita (VASCONCELOS, ALVES e SILVEIRA-FILHO, 2008, p.7).
A visão Malthusiana estava equivocada, pois se provou a possibilidade da
melhora nas condições de vida, acima dos salários de subsistência. Segundo Muniz
([s.d], p.2), “Malthus não poderia prever os avanços na medicina e a revolução da
agricultura” e “não pode ser apontado como culpado por seus erros de previsão”, afinal
ele publicou seu trabalho no início do desenvolvimento industrial.
Apesar disso, a teoria Malthusiana merece destaque e “dita muitos dos aspectos
fundamentais presentes nas teorias neoclássicas de crescimento de longo prazo”, pois de
acordo com a “hipótese de crescimento constante da população – resulta em um
20 Boserup (1987, p. 138) descreve que não significa que todos os países e suas populações
apresentaram a mesma explicação para o crescimento populacional e, por fim, crescimento
econômico. 21 São destacados dois lados para estas alternativas: por um lado, intensifica-se a produção
agrícola; e, por outro lado, o aumento demográfico “facilita a divisão do trabalho, a expansão da
comunicação e da educação” (BOSERUP, 1987, p.138).
37
equilíbrio de longo prazo na relação entre população e economia” (VASCONCELOS,
ALVES e SILVEIRA-FILHO, 2008, p.5).
Segundo Muniz ([s.d.], p.5) apud Coale e Hoover (1966), uma taxa de razão de
dependência alta, originada por uma fecundidade elevada, pode gerar consequências
negativas sobre o crescimento econômico do país. Pela visão macroeconômica, o
aumento populacional pode ocasionar consequências negativas na área da educação e
saúde. E pela visão Microeconômica (dentro dos domicílios), a taxa elevada de
fecundidade pode gerar diminuição da renda per capita das famílias, aumentando ainda
mais o “agravamento da desigualdade entre gêneros”.
Em contrapartida, destaca a visão de Kuznets (1974), o qual mostrou a
possibilidade de ao mesmo tempo um país apresentar alto crescimento populacional e
alto crescimento do produto per capita. Segundo Vasconcelos, Alves e Filho (2008,
p.7), o autor Kuznets (1974) parte de uma “premissa de que é o crescimento econômico
que engendra a possibilidade de crescimento populacional”.
As visões teóricas com interpretações pessimistas, orientadas por Malthus
(1996) e Coale e Hoover (1966), consideram que o crescimento populacional pode ser
um obstáculo para o crescimento econômico, ocasionando pobreza, fome e/ou baixas
taxas de poupança.
No sentido contrário à visão Malthusiana, a abordagem de Boserup (1987)
destaca que o crescimento populacional pode ser um incentivo para as mudanças
tecnológicas, em especial, para a produção de alimentos, e pode gerar um crescimento
econômico genuíno.
Corroborando com as interpretações de visões contrárias, o trabalho de
Kuznets(1974) interpreta que o crescimento populacional, a taxa de mortalidade, as
tendências nas taxas de natalidade e o impacto da migração internacional são
influenciados pelo crescimento econômico e, ao mesmo tempo, podem influenciá-lo,
melhorando as condições de vida das populações sem apresentar queda da taxa de
crescimento de produto per capita.
A interação entre demografia e economia é perceptível na maioria dos estudos
relacionados ao tema das dinâmicas populacionais, e mostrou-se um ramo
interdisciplinar na área acadêmica.
3. VISÃO ECONÔMICA DO ENVELHECIMENTO POPULACIONAL
Atualmente, os estudos a respeito do fenômeno da transição demográfica não
estão mais tão preocupados em destacar a explosão demográfica, mas sim compreender
o baixo crescimento populacional que muitos países estão vivenciando, com destaque
para as baixas taxas de fecundidade.
Junior e Costa (2006, p.12) descrevem que “a demografia é uma ciência
fundamental para o entendimento desse novo fenômeno [envelhecimento] e de seus
impactos sociais e econômicos”. Por isso, em especial no âmbito acadêmico, é de
grande importância conhecer e compreender as teorias que buscam apresentar e
justificar esta temática.
As faixas etárias possuem diferentes escolhas de consumo e diferentes
capacidades produtivas. Neste contexto, as características econômicas do país também
são modificadas a partir das mudanças demográficas de sua população. Logo, a medida
que a população envelhece suas escolhas individuais também alteram-se, entretanto, não
é possível definir com precisão um comportamento padrão. Mas, sugere-se que a partir
do momento que a taxa de expectativa de vida aumenta, os indivíduos optem por
modificar suas opções em relação as suas vidas. Além disso, o próprio contexto
38
institucional do país pode ser influenciado por modificações de sua população
(BLOOM; CANNING; FINK, 2010, p.584).
Neste caso, o aumento da expectativa de vida, o envelhecimento da população,
as políticas de aposentadoria, pensões, financiamento de cuidados com a saúde, a
eficiência do mercado de trabalho e mercado de capitais, e todo o sistema econômico e
regional tendem a se adaptar à nova realidade presente. O tamanho destas alterações
depende do comportamento político e da quantidade representativa do grupo etário, se
houver influência do regime democrático (BLOOM; CANNING; FINK, 2010, p.584).
Esta alteração demográfica é um fator determinante do crescimento econômico.
Existem na literatura muitas intepretações econômicas dos determinantes do
crescimento econômico, algumas já destacadas neste trabalho. Alguns autores estão
preocupados com a produtividade dos setores da economia, ou seja, a realocação da
mão-de-obra da agricultura para a indústria e, mais recentemente, para os setores de
serviços. Para outros autores, a importância dada ao progresso tecnológico, ao capital
humano, às instituições e governança, às políticas macroeconômicas e do comércio, e
aos choques aleatórios. E ainda, outros pesquisadores apontam os efeitos de feedback
entre o crescimento econômico, o progresso técnico, e a acumulação de capital humano
e, consequentemente, as suas influências sobre o crescimento econômico (BLOOM;
CANNING; FINK, 2010, p.593).
3.1 Mercado de trabalho e envelhecimento
Os efeitos diretos do envelhecimento populacional ocorrem sobre a oferta de
trabalho, a qualidade do trabalho (por meio da estrutura etária e o sobre o capital
humano), a taxa de poupança, retorno marginal do capital e intensidade do capital, e o
progresso técnico e as inovações. Todos estes efeitos diretos também afetam o PIB per
capita e o crescimento do PIB no médio prazo de seus países, conforme ilustrado na
figura 1 (CARONE et al., 2005, p.8).
Já os efeitos indiretos do envelhecimento populacional ocorrem sobre as taxas de
dependência econômica e os desequilíbrios orçamentários (impostos fiscais). Este
orçamento fiscal, por sua vez, também tem impacto indireto sobre todos os efeitos
diretos do envelhecimento das populações (descritos anteriormente) e, ainda, sobre os
sistemas de pensões e de impostos22 (figura 1).
A partir da Figura 1, Serban (2012, p.359-360) apresentou os efeitos destacados
acima que foram divididos em dois grupos principais: 1) os efeitos diretos que
impactam no tamanho e na qualidade do emprego; e, 2) os efeitos indiretos que
influenciam na redução dos recursos econômicos necessários para lidar com o
envelhecimento, interferem nas decisões dos indivíduos e, ainda, exercem pressão sobre
os sistemas de educação, de seguro social e de saúde.
22 Os efeitos do envelhecimento populacional ocorrem de muitas maneiras sobre as
economias. Neste contexto, alguns aspectos não fazem parte do escopo deste trabalho, em que
informações adicionais podem ser obtidas em Carone et al. (2005).
39
Figura 1 - Os efeitos do envelhecimento populacional
Fonte: Adaptado de Carone et al. (2005, p.8).
Uma variável importante é a taxa de participação no mercado de trabalho23, a
qual pode elucidar parcialmente os efeitos diretos do envelhecimento populacional
relacionados ao tamanho e à qualidade do emprego sobre o mercado de trabalho.
A proporção da população idosa que participa da força de trabalho da população
economicamente ativa varia por região de desenvolvimento e de gênero (NAÇÕES
UNIDAS, 2012, p.1). Cooke (2006, p.390) descreve que nos países desenvolvidos está
ocorrendo uma queda na participação dos trabalhadores mais velhos24 no mercado de
trabalho, em especial, os trabalhadores homens. A saída precoce do mercado de trabalho
destes trabalhadores mais velhos é um resultado indesejado, pois interfere diretamente
na antecipação dos pagamentos das pensões públicas por períodos mais longos e na
necessidade de criação de uma nova legislação para lidar com esta questão.
O envelhecimento da população é descrito por Hagemann e Nicoletti (1989,
p.78) que correlaciona às economias industrializadas com o envelhecimento, por meio
de alterações significativas no tamanho e na estrutura da população em idade ativa
(PIA). Ou seja, o efeito do envelhecimento populacional sobre o crescimento
econômico e, finalmente, sobre o bem estar. Em grande medida, esta relação é
observada pelas consequências sobre o mercado de trabalho.
O declínio da taxa de fecundidade é destacado como o primeiro motor da
modificação da estrutura etária. As justificativas de melhora nas condições sanitárias,
saúde e avanços tecnológicos são destacados, em especial, seus efeitos sobre o aumento
da expectativa de vida. Destaque também para a participação da população feminina no
mercado de trabalho ao longo da história. Segundo Machado (2009, p.4-5), o aumento
da participação feminina no mercado de trabalho deve ser considerado ao mesmo tempo
como causa e consequência das quedas de fecundidade dos países.
O segundo motor é o aumento da expectativa de vida. Este aumento expressivo
da expectativa de vida não foi previsto, nem mesmo nas projeções dos autores mais
otimistas. Os avanços tecnológicos foram significativos e ninguém poderia prever sua
interferência nestas taxas. De acordo com Bloom, Canning e Fink (2011, p.1), o número
de idosos em todo o mundo está crescendo rapidamente, não apenas em números
23 A taxa de participação ou taxa de atividade no mercado de trabalho é o percentual de
pessoas economicamente ativas (PEA) em relação às pessoas em idade ativa (PIA) (IBGE,
2012, p.4). 24 A denominação “trabalhadores mais velhos” refere-se aos trabalhadores com idade acima
de 50 anos.
Oferta de Trabalho
Qualidade do Trabalho
(Estrutura Etária +
Capital Humano)
Taxa de Poupança,
Retorno Marginal do
Capital e Intensidade
do Capital
Progresso Técnico e
Inovação
PIB per capita +
Crescimento do
PIB no Médio
Prazo
Taxa de
Dependência
Econômica
Sistemas de Pensão + Impostos
Desequilíbrios Fiscais
Envelhecimento
Populacional
Impacto Econômico Direto do Envelhecimento
PopulacionalImpacto Econômico Indireto do Envelhecimento
Populacional
Outros Efeitos
40
absolutos, mas este grupo apresenta uma vida substancialmente mais saudável. Segundo
os especialistas em saúde, um fenômeno chamado de compreensão da morbidade
destaca que o aumento da duração da vida, em parte atribuído por períodos de doenças
mais curtos e em idades cada vez mais avançadas, resulta no efeito líquido de um
aumento no número de anos vividos na velhice sem problemas de saúde.
O terceiro motor corresponde ao processo de envelhecimento, devido às
alterações da estrutura etária e ao envelhecimento relacionado às taxas de variações
passadas entre nascimentos e mortes. Por exemplo, após a Segunda Guerra Mundial,
houve um grande crescimento demográfico, conhecido como “baby boom”, com grande
aumento da fecundidade. Em partes, o aumento da fecundidade vivenciado nos anos 60
somado ao declínio nas taxas de mortalidade infantil reflete na estrutura etária da
população com 60 anos ou mais nos dias atuais (BLOOM; CANNING; FINK, 2011,
p.8).
Bloom, Canning e Fink (2010, p.593) utilizam como premissa que as variações
na estrutura etária influenciam significativamente o crescimento econômico. Eles
adotam o modelo de “ciclo de vida” baseado nas necessidades econômicas e nas
contribuições das pessoas, e que estas variáveis sofrem modificações ao longo das
várias fases da vida dos indivíduos.
Segundo estes autores, o consumo tende a ser elevado para os grupos de jovens e
idosos, e mais baixo para as pessoas na faixa de idade para trabalhar. Ou seja, quando
considera-se o grupo etário com maior população, estas pessoas representam uma fase
no ciclo de vida e o crescimento econômico daquela população irá variar de acordo com
a oferta de trabalho, produtividade, consumo e poupança. A oferta de trabalho e a
poupança são mais elevados entre os adultos em idade ativa25 do que a população com
60 anos ou mais. Portanto, uma população representada por uma maioria de população
em idade ativa reflete um crescimento econômico maior. Enquanto que uma população
com maioria de idosos está propensa a experimentar um crescimento econômico mais
lento (BLOOM; CANNING; FINK, 2010, p.593).
Herrmann (2011, p.24) tem uma intepretação mais otimista e diferente da
apresentada por Bloom, Canning e Fink (2010, p.593) a respeito do envelhecimento
populacional. Ele inicia sua discussão a partir da razão de dependência, dois problemas
surgem desta razão: a falta de força de trabalho e o aumento exagerado dos custos com
pensões ou cuidados com saúde.
Segundo Herrmann (2011, p.25-26), a escassez de força de trabalho não pode ser
apenas analisada pela razão de dependência. O fato da população em idade ativa
demonstrar uma participação menor não significa baixa produtividade do mercado de
trabalho, ou seja, declínio da produção econômica. O autor acrescenta que a única
medida significativa de escassez de trabalho é a queda da taxa de desemprego. Mesmo
assim, não significa que a produtividade seja baixa, a produtividade do trabalho é uma
medida mais importante do que o tamanho da força de trabalho. Além disso, os países
possuem instrumentos para lidar com o problema da escassez de trabalhadores se for
necessário.
De acordo com Herrmann (2011, p.26), é mais apropriado, para fins
econômicos, utilizar como medida a relação de “dependência econômica”, isto é, o
número de pessoas empregadas em relação ao total da população, em vez da taxa de
dependência comum que sublinha a maioria das análises. Por meio desta medida, é
possível incluir todas as pessoas (desempregados, jovens, pessoas sem trabalho, as
25 Neste trabalho, os termos população em idade para trabalhar e/ou a população em idade
ativa (PIA) são utilizados como sinônimos.
41
pessoas que possuem trabalho, mas ainda sofrem com a pobreza, ou seja, todos),
evitando assim a execução de políticas ineficazes para lidar com a questão do
envelhecimento populacional.
Um mercado de trabalho que possui alta relação de dependência econômica
associada à alta taxa de desemprego enfrenta maiores problemas econômicos do que um
mercado de trabalho com alta relação de dependência econômica com baixa taxa de
desemprego. Herrmann (2011, p.26) destaca que alguns países em desenvolvimento
sofrem com o mercado de trabalho com alto desemprego, em que há muitos
dependentes jovens e muitos desempregados também jovens. Enquanto que algumas
economias desenvolvidas possuem muitos dependentes idosos e pouco desempregados.
Ele ainda destaca que é mais fácil para os países lidar com a falta de mão-de-obra do
que precisar criar oportunidade de emprego para resolver o problema do desemprego.
Segundo Herrmann (2011, p.26), mesmo os países com uma dependência maior
de pessoas idosas não estão sofrendo com a falta de força de trabalho. Alguns países da
OCDE, por exemplo, possuem desempregados e inativos que podem suprir a
necessidade do mercado.
Machado (2009, p.10) acrescenta o argumento de que uma força de trabalho
mais educada aumenta a produtividade do trabalho, sendo um fator fundamental para o
crescimento econômico. A educação (ou escolaridade) da força de trabalho é um
componente positivo quando considerado seu impacto sobre as taxas de participação das
futuras coortes26 de indivíduos mais velhos.
Segundo Bloom, Canning e Fink (2010, p.606), a medida de bem estar das
famílias é o consumo e não a renda. No geral, a renda familiar cai com a aposentadoria,
enquanto que o consumo pode permanecer constante ou aumentar. Os autores destacam
que uma renda per capita menor não significa necessariamente uma diminuição de bem
estar. Pois, as populações podem ter a sua renda per capita variando de acordo com a
estrutura etária, mas o bem estar da vida seria relativamente igual.
As principais implicações descritas na literatura sugerem políticas de reinserção
da força de trabalho inativa ou desempregada, considerando que as populações possuam
uma potencial força de trabalho disponível (HAGEMANN; NICOLETTI, 1989, p.80).
Para as populações que já estão vivenciando o envelhecimento populacional,
praticamente todos os autores destacam que políticas voltadas para a manutenção ou
reinserção dos idosos saudáveis no mercado de trabalho são fundamentais para o
crescimento econômico dos países (HERRMANN, 2011, p.26).
Segundo Hagemann e Nicoletti (1989, p.80), a força de trabalho resultante do
envelhecimento da população levanta muitas perguntas sobre a mobilidade e
flexibilidade do mercado de trabalho, que pode afetar o dinamismo da economia.
Programas de reciclagem de emprego podem exercer influência sobre o
dinamismo do mercado de trabalho, mesmo com o envelhecimento populacional. Sob
esse ângulo, o baixo crescimento da população pode gerar efeitos positivos sobre o
mercado de trabalho. Pois, uma força de trabalho mais velha e experiente pode gerar
aumento de produtividade no trabalho (HAGEMANN; NICOLETTI, 1989, p.81).
Bloom, Canning e Fink (2010, p.603-604) destacam que as empresas podem ter
um papel fundamental no processo de envelhecimento populacional. Pois, se os idosos
tiverem espaço para manterem-se por mais tempo no mercado de trabalho, de forma
26 Coorte é um conceito utilizado para definir um conjunto de pessoas que possuem algum
evento em comum em um mesmo período (CARVALHO; SAWYER; RODRIGUES, 1998,
p.15).
42
produtiva, isto pode significar menos recursos públicos gastos com pensões,
aposentadorias e benefícios.
As empresas não teriam qualquer perda, pois se beneficiariam de trabalhadores
mais experientes e confiáveis. Carga horária flexível, formação em novas tarefas,
programas de bem estar e recolocação em atividades menos exigentes fisicamente
(permitindo que trabalhadores mais jovens executem estas tarefas) são exemplos de
medidas que facilitam a permanência dos idosos no mercado de trabalho (BLOOM;
CANNING; FINK, 2010, p.603-604).
Destaca-se que o mercado de trabalho ainda não sinalizou esta preocupação,
mesmo nos países em que já se vivencia o envelhecimento populacional (embora se
possa encontrar um ou outro exemplo de empresas com ações nesta direção27). Segundo
Bloom, Canning e Fink (2010, p.603-604), novas formas de organizar a remuneração
destes trabalhadores serão necessárias, e o governo e os sindicatos (as instituições
interligadas neste processo) precisarão contribuir para as novas regulamentações.
Aproveitar esta força de trabalho mais velha pode significar uma vantagem
comparativa para as empresas. Além dos benefícios com ganho de produtividade, pode-
se aumentar os benefícios dos investimentos em treinamento, investimento em saúde de
todos os funcionários (que evitam custos), assim como prevenção de riscos (que
também reduz custos). Ou seja, a partir do momento que o envelhecimento populacional
diminuir a força de trabalho disponível, a resposta natural das empresas e da economia
como um todo será a de investir em equipamentos que tornem o trabalho mais produtivo
(BLOOM; CANNING; FINK, 2010, p.603-604).
Herrmann (2011, p.24) chama a atenção que cada país deve fazer uma análise
macroeconômica sobre seu próprio mercado de trabalho, a fim de facilitar a tomada de
decisão e a adoção de medidas necessárias para lidar com o envelhecimento
populacional.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
A interação entre demografia e economia é perceptível na maioria dos estudos
relacionados ao tema das dinâmicas populacionais o que gerou um novo ramo
interdisciplinar na área acadêmica. Por meio da integração entre a economia e a
demografia, foi possível verificar que os estudos a respeito do fenômeno demográfico
não estavam mais preocupados em destacar a explosão demográfica, mas sim
compreender o baixo crescimento populacional e o processo de transição demográfica
que muitos países estão vivenciando.
As variações na estrutura etária influenciam significativamente o crescimento
econômico. O consumo tende a ser elevado para os grupos de jovens e idosos, e mais
baixo para as pessoas na faixa de idade para trabalhar. A oferta de trabalho e a poupança
são mais elevados entre os adultos em idade ativa do que a população com 60 anos ou
mais. Portanto, uma população representada por uma maioria de população em idade
ativa reflete um crescimento econômico maior. Enquanto que uma população com
maioria de idosos está propensa a experimentar um crescimento econômico mais lento.
O envelhecimento das populações não é caracterizado pelo aumento isolado da
população mais velha e idosa, mas, também, representa o declínio da população em
idade ativa. Ou seja, a cada geração, as populações mais velhas são substituídas por
27 A Empresa BMW em 2007 instituiu um conjunto de medidas depois de verificar que a
sua força de trabalho possuiria um perfil de funcionários mais velhos em 10 anos, mais detalhes
estão disponíveis em Loch et al.(2010).
43
coortes mais jovens menos numerosos. Como resultado, ter-se-ia um impacto negativo
decorrente de uma proporção cada vez menor de pessoas em idade potencial para
trabalhar.
Por outro lado, a escassez de força de trabalho não pode ser apenas analisada
pela razão de dependência. O fato da população em idade ativa demonstrar uma
participação menor não significa necessariamente baixa produtividade do mercado de
trabalho, ou seja, declínio da produção econômica.
Os impactos econômicos do envelhecimento populacional sobre o mercado de
trabalho podem ser caracterizados como efeitos diretos e indiretos. Os efeitos diretos
impactam no tamanho e na qualidade do emprego e os efeitos indiretos influenciam na
redução dos recursos econômicos necessários para lidar com o envelhecimento,
interferem nas decisões dos indivíduos e, ainda, exercem pressão sobre os sistemas de
educação, de seguro social e de saúde.
Nos países desenvolvidos está ocorrendo uma queda na participação dos
trabalhadores mais velhos no mercado de trabalho, em especial, os trabalhadores
homens. A saída precoce do mercado de trabalho destes trabalhadores mais velhos é um
resultado indesejado, pois interfere diretamente na antecipação dos pagamentos das
pensões públicas por períodos mais longos e na necessidade de criação de uma nova
legislação para lidar com esta questão.
Os mais diversos países que já estão vivenciando o envelhecimento
populacional. Assim, políticas voltadas para a manutenção ou reinserção dos idosos
saudáveis no mercado de trabalho podem ser fundamentais para o crescimento
econômico futuro destes países.
REFERÊNCIAS
ALVES, J. E. D. A polêmica Malthus versus Condorcet reavaliada à luz da
transição demográfica. Rio de Janeiro: IBGE, 2002. Disponível em:
<http://sociales.cchs.csic.es/jperez/ pags/Teorias/Textos/Diniz2002.pdf>. Acesso em: 20
jan. 2012.
ALVES, J. E. D. População, bem-estar, e tecnologia: debates históricos e perspectivas.
Multiciência, n.6, mai. 2006.
BLOOM, D.E.; CANNING, D.; FINK, G. Implications of population ageing of
economic growth. Oxford review of economic policy, v. 26, n. 4, 2010.
BLOOM, D.E.; CANNING, D.; FINK, G. Implications of population aging for
economic growth. Program on the global demography of aging. Working paper, n.
64, 2011.
BOSERUP, E. Population and Technological Change: a study of long-term trends.
Chicago: University of Chicago Press, 1981.
BOSERUP, E. Evolução Agrária e Pressão Demográfica. Editora Hucitex e
Editora Polis: São Paulo, 1987.
CAMARANO, A.A. A demografia e o envelhecimento populacional. Org.:
CAMARANO, A.A.; KANSO, S.; DAMASCENO, P.; FIGUEIREDO S. Texto
didático. Rio de Janeiro: 2005.
44
CARONE, G.; COSTELLO, D.; GUARDIA, N.D.; MOURRE, G.; PRZYWARA,
B.; SALOMÄKI, A. The economic impact of ageing populations in the EU25
Member States. Brussels: European Commission, n. 236, dez. 2005.
CARVALHO, J.A.M.; SAWYER, D.O.; RODRIGUES, R.N. Introdução a alguns
conceitos básicos e medidas em demografia. São Paulo: Associação Brasileira de
Estudos Populacionais, 1998.
COALE, A. J.; HOOVER, E. M. População e desenvolvimento econômico. Editora
Fundo de Cultura, 1966.
COOKE, M. Policy changes and the labour force participation of older workers:
Evidence from six countries. Canadian Journal on Aging, ed. 25, v.4, p. 387-400,
2006.
HAGEMANN, R. P.; NICOLETTI, G. Population ageing: Economic effects and
some policy implications for financing public pensions. OCDE Economic studies,
1989.
HAUPT, A.; KANE, T. Population handbook. Washington, D.C.: Population
Reference Bureau, 4º ed., 1998.
HERRMANN, M. Population aging and economic development: anxieties and
policy responses. New York: Population Ageing, n.5, p. 23-46, 2011.
IBGE. Censo demográfico 2010: Características da população e dos domicílios.
Resultado do Universo. 2010. Disponível em:
<http://www.ibge.gov.br/home/estatistica/
populacao/censo2010/caracteristicas_da_populacao/resultados_do_universo.pdf>.
Acesso em: 18 jan. 2012.
IBGE. Pesquisa nacional por amostra de domicílios: Síntese dos indicadores
sociais 2011. 2012. Disponível em:
<http://www.ibge.gov.br/home/estatistica/populacao/trabalhoerendimento/pnad2011/def
ault_sintese.shtm>. Acesso em: 10 dez. 2013.
IPEA. Brasil: o estado de uma nação. Rio de Janeiro, 2005.
JUNIOR, C. S. D.; COSTA, C. S. O Envelhecimento da População Brasileira: uma
análise de conteúdo das páginas da REBEP. Minas Gerais: XV Encontro Nacional de
Estudos Populacionais, 2006.
KUZNETS, S. Teoria do Crescimento Econômico Moderno: Taxa, Estrutura e
Difusão. Rio de Janeiro: Zahar Editores, 1974.
LENZ, M. H. A teoria da renda da terra: Ricardo e Malthus. Porto Alegre:
Fundação de Economia e Estatística, v.6, n. 1, p. 81-104, 1985.
45
LIMA, D. L. Um estudo sobre a dinâmica econômica e o progresso técnico em
modelos de crescimento. Vitoria: Universidade Federal do Espírito Santo, 2011.
LOCH, C. H.; STING, F. J.; BAUER, N.; MAUERMANN, H. How BMW is
defusing the demographic time bomb. Harvard Business Review: p. 99-102, mar.
2010.
MACHADO, C. S. F. Population Aging and the Labor Market. 2009. 123 f. Tese
(Doutorado em Economia) - Universidade do Minho, Braga, 2009.
MALTHUS, T. R. Ensaio sobre a população. Apresentação: Galvêas, E.;
Tradução: Andrade, R. C.; Azevedo, D. A.; Cury, A. A. São Paulo: Editora Nova
Cultural, 1996.
MANKEKAR, P. Population aging: Economic and social consequences.
International Encyclopedia of the social & behavioral sciences. Elsevier Science,
p.11737-11741, 2001.
MARX, K. Grundrisse: Manuscritos econômicos de 1857-1858. Esboços da crítica
da economia política. São Paulo: Editora Boitempo, 2011.
MARX, K. O Capital. Livro I. Volume II. Rio de Janeiro: Editora Civilização
brasileira, 1980.
MUNIZ, J. O. Um Ensaio sobre as consequências positivas e negativas do
Crescimento Populacional. Minas Gerais: UFMG/CEDEPLAR, [s. d.].
NAÇÕES UNIDAS. Population Ageing and Development 2012. 2012. Disponível
em:<http://www.un.org/en/development/desa/population/publications/pdf/ageing/2012P
opAgeingandDev_WallChart.pdf>. Acesso em: 4 set. 2013.
PAIVA, P. T. A.; WAJNMAN, S. Das causas às consequências econômicas da
transição demográfica no Brasil. Revista Brasileira de Estudos Populacionais, v.22,
n. 2, p.303-322, jul. - dez. 2005.
PRESIDÊNCIA DA REPÚBLICA. Política Nacional do Idoso. Lei n. 8.842, de 4
de Janeiro de 1994.
PRESSAT, R. The dictionary of demography. Oxford, Blackwell Reference,
1985.
ROSDOLSKY, R. Gênese e estrutura de O Capital de Karl Marx. Rio de
Janeiro: Editora Contraponto, 2011.
SARTORIS, A.; SOUZA, J. M. Interações Entre Economia e Demografia: As
Previsões da Teoria e o Caso Brasileiro. In: I Congresso da Associação Latino
Americana de População. Caxambú, set. 2004.
46
SERBAN, A. C. Aging population and effects on labour market. Procedia
Economics and Finance. In: International Conference On Applied Economics
(ICOAE), n.1, p. 356-364, 2012.
VASCONCELOS, D. S.; ALVES, J. E. D.; SILVEIRA-FILHO, G. B. Crescimento
econômico, estrutura etária e dividendo demográfico: avaliando a interação com dados
em painel. Minas Gerais: XVI Encontro Nacional de Estudos Populacionais, 2008.
VIANA, N. A teoria da população em Marx. Goiânia: Instituto de estudos
socioambientais. Boletim Goiano de Geografia, v.26, n. 2, p. 87-102, jul.- dez, 2006.
Disponível em: <http://www.revistas.ufg.br/index.php/bgg/article/view/4142> . Acesso
em: 10 jun. 2012.
WONG, L. L. R.; CARVALHO, J. A. M. O rápido processo de envelhecimento
populacional do Brasil: sérios desafios para as políticas públicas. Revista Brasileira de
Estudos de Populacionais, v. 23, n.1, p.5-26, 2006.
47
CONDICIONANTES DA DESIGUALDADE DA RENDA DO TRABALHO
BRASILEIRA NO FINAL DA PRIMEIRA DÉCADA DE 2000: ALGUMAS
EVIDÊNCIAS EMPÍRICAS28
Vladimir Sipriano Camillo29
Resumo
O objetivo específico é identificar alguns condicionantes da desigualdade da renda
do trabalho brasileira no final da década de 2000, especificamente para 2009. Para
atingir tal objetivo, o texto foi dividido em duas partes. Na primeira parte foi
desenvolvida (de forma sucinta) uma base teórica. Na segunda foram testadas, por meio
de regressões lineares múltiplas, algumas hipóteses sobre os condicionantes da
desigualdade da renda do trabalho. Dentre os resultados sobre os condicionantes da
desigualdade da renda do trabalho, destacam-se os hiatos salariais entre alguns níveis de
escolaridade, a rotatividade como um dos aspectos da demanda por trabalho e as
segmentações urbano-rurais, além de um tipo de discriminação por sexo controlada por
escolaridade.
Palavras-chave: rotatividade, crescimento econômico, capital humano,
segmentações e discriminação
Introdução
A queda da desigualdade da renda do trabalho no Brasil, ocorrida a partir da
primeira década de 2000, despertou uma discussão nacional sobre os seus possíveis
condicionantes. Nesse debate ainda predominam as abordagens sobre capital humano,
que em alguma medida se filiam ao modelo de Langoni da década de 1970. Contudo,
também são inseridos novos elementos teóricos e empíricos na atual discussão. Foram
selecionadas da literatura nacional algumas abordagens (sucintas) sobre a influência do
mercado de trabalho na desigualdade, tendo como perspectiva metodológica a interação
entre a oferta e a demanda por trabalho.
Na primeira parte desse artigo foi desenvolvida uma base teórica que inclui a
associação (exploratória) entre a rotatividade no mercado formal de trabalho e a
distribuição da renda do trabalho. Essa rotatividade costuma reduzir os maiores salários
e assim aproximá-los dos menores, influenciando a desigualdade da renda do trabalho.
Também foi inserido o crescimento econômico como outro elemento da demanda por
trabalho, capaz de influenciar a distribuição da renda, mas com claros indícios de que o
28 Algumas variáveis da parte teórica e da parte empírica se assemelham ao artigo de Kon e
Camillo (2013), apresentado na ABET-2013. Contudo, o conteúdo dessa base teórica e as
técnicas econométricas diferenciam-se significativamente do referido texto dos dois autores
mencionados.
29 Aluno do Programa de Estudos Pós Graduados da PUC-SP. Resultados extraídos da
pesquisa de pós doutorado do autor, supervisionada e orientada pela professora Anita Kon.
Contudo, a responsabilidade por possíveis erros e omissões é exclusiva do autor.
48
crescimento econômico nacional não costuma promover a distribuição da renda do
trabalho.
Para retratar alguns aspectos da oferta de trabalho e sua correlação com a
desigualdade da renda foram selecionadas algumas abordagens sobre o capital humano,
as múltiplas segmentações e discriminações no mercado de trabalho. Os resultados dos
modelos sobre capital humano mostram que a queda da desigualdade na primeira
metade da década de 2000 está predominantemente associada aos avanços de
escolaridade dos ocupados. As segmentações no mercado de trabalho, principalmente as
segmentações entre os grandes setores econômicos e entre as áreas urbanas e rurais, são
inseridas na literatura como condicionantes da queda da desigualdade da renda do
trabalho. A discriminação, por sua vez, é inserida com resultados controversos,
aparecendo (as vezes) como pouco importante para a queda da desigualdade da renda do
trabalho e noutras vezes com peso significativo para tal queda. Aliás, é importante
considerar que as várias formas de discriminação extrapolam os limites dos mercados de
trabalho e possuem dinâmicas que ultrapassam, por vezes, a própria teoria econômica.
A opção metodológica de se tratar a demanda por trabalho interagindo com a oferta
de trabalho supõe que o mercado de trabalho atua como condicionante da desigualdade
da renda do trabalho, mas esse mesmo mercado de trabalho também interage com a
estrutura produtiva em movimento, do ponto de vista quantitativo e qualitativo 30 .
Quantitativamente a estrutura produtiva se expande por meio do crescimento econômico
e muda qualitativamente quando há investimentos que alteram suas características
tecnológicas e sua eficiência em termos de produtividade. Também merece destaque
metodologicamente a construção de quatro modelos por meio de regressões lineares
múltiplas, com amostras cross section estaduais para 2009, gerados na segunda parte do
artigo. Esses modelos foram construídos a partir da base teórica sucintamente
desenvolvida na primeira seção do artigo. O número original de variáveis selecionadas é
relativamente elevado quando comparado com os modelos finais apresentados. Optou-
se por dois modelos de regressões Stepwise e outros dois por regressões construídas por
meio de combinações aleatórias das variáveis explicativas. Os principais resultados
econométricos obtidos convergem, em grande medida, para a literatura nacional, exceto
os referentes à rotatividade no mercado de trabalho formal.
1. Condicionantes da desigualdade da renda do trabalho no Brasil
1.1. Demanda por trabalho: rotatividade e crescimento econômico
“Conceitualmente, a rotatividade representa a substituição do ocupante de um
posto de trabalho por outro, ou seja, a demissão seguida da admissão, em um posto
específico, individual, ou em diversos postos, envolvendo vários trabalhadores
30 Kon e Camillo (2013) desenvolveram um modelo de análise fatorial, com recorte cross
section estadual para 2009, que evidencia um tipo particular e até inesperado de interação entre
alguns indicadores de demanda e oferta de trabalho. Nesse modelo os indicadores de demanda e
oferta de trabalho foram reunidos num único fator, que suporta a ideia de variações comuns e
multidirecionais. Dessa forma, a desigualdade da renda do trabalho (medida pelo índice de Gini)
associou-se ao capital humano, a rotatividade, ao salário mínimo e a mobilidade intergeracional
de renda, dentre outras variáveis. (ABET, 2013).
49
(DIEESE, 2011). Essa rotatividade, para a realidade brasileira, se comporta de maneira
pró cíclica com o crescimento econômico nacional, significando que, com a aceleração
do crescimento ocorre a expansão da rotatividade. (MACEDO e CHAHAD, 1985 apud
DIEESE, 2011). A demanda por trabalho representada pela rotatividade, na primeira
década de 2000 no Brasil, superou expressivamente a demanda por trabalho gerada pelo
crescimento econômico nacional. Algumas estimativas para 2011, baseadas no
crescimento médio do período de 2005 a 2010, indicam uma demanda por trabalho que
atinge 21 milhões de empregos, distribuídos da seguinte forma: 1,7 milhão criado pela
abertura de novos postos de trabalho e 19,3 milhões gerados pela rotatividade do
trabalho (IPEA, 2011). Sendo assim, essas estimativas indicam que a rotatividade do
trabalho gerou a maior parte da demanda por trabalho em 2011.31 De 1,7 milhão de
novos empregos criados, 40% pertencem a indústria de transformação (incluindo a
construção civil) e os restantes 60% pelos serviços.32 Dos 19,3 milhões de empregos
gerados pela rotatividade, 34% estão alocados na indústria de transformação; 7% na
agricultura e 59% nos serviços.
A rotatividade está muito associada com a liberdade institucional de se demitir
no Brasil. O mercado de trabalho usufrui de uma oferta de trabalho relativamente
elevada combinada com uma flexibilidade contratual (DIEESE, 2011). Essa
flexibilidade permite manter por pouco tempo os trabalhadores empregados num
mesmo emprego, reduzindo o tempo de permanência nas empresas. Em 2009, 60% dos
empregados formais tiveram empregos por um período inferior a dois anos (DIEESE,
2011), indicando a baixa permanência dos trabalhadores num mesmo posto de trabalho,
implicando em perda de experiência. Ao recortar apenas os desligados em 2009,
percebe-se a magnitude da curta duração da permanência no emprego: 79% dos
desligados tinham contratos de trabalho a menos de dois anos (DIEESE, 2001). Os
empregados com maior tempo no emprego diminuíram entre 2000 e 2009, passando de
19,3% para 16,1%, enquanto os empregados com até dois anos de vínculos
aumentaram, de 44% em 2000 para 50% em 2009. Com a predominância de
empregados por um curto período de tempo, pode-se remunerá-los menos, pois não
terão os ganhos de permanência e experiência nos empregos. Com um número de
empregados de alta permanência em queda, torna-se possível reduzir os maiores
salários, aproximando-os (ainda que continuem distantes) dos menores salários dos
empregados menos experientes. A aproximação entre os empregados de menor tempo
no emprego com os de maior tempo, poderá ser ainda maior, pois parte significativa dos
menos experientes recebem salários próximos do salário mínimo em expansão. Essa
aproximação se intensifica quando se analisa o saldo entre os admitidos e desligados.
“Em 2007, o saldo positivo de emprego situou-se na faixa de remuneração de até dois
salários mínimos, com destaque para a faixa de 1 a 1,5, que teve um saldo de mais de 1
31 Essas estimativas do IPEA (2011) utilizam como metodologia de cálculo da rotatividade
“o emprego desocupado pela demissão”. Na literatura nacional é usual medir a rotatividade por
meio do “(...) valor mínimo observado entre o total de admissões e o total de desligamentos
anuais, comparado ao estoque médio de cada ano” (DIEESE, 2011). A OCDE calcula utilizando
a soma dos admitidos com os desligados em relação ao estoque anual (apud RAMOS e
CARNEIRO, 2002). 32 A agricultura, nessas estimativas, perderia quase três milhões de empregos. Essa
estimativa é compatível com o crescimento da produtividade total dos fatores (PTF) verificado
para a agropecuária nacional entre 1996 e 2006. Cabe uma consideração metodológica sobre
essas estimativas do IPEA: foram construídas utilizando o emprego formal na RAIS. É um
procedimento usual na literatura nacional estimar a rotatividade utilizando a RAIS.
50
milhão de postos de trabalho. Para as remunerações acima de 2,0 salários mínimos o
saldo de emprego foi negativo” (NETO e COSTA, 2008). Com os salários maiores
perdendo espaços na massa salarial e os menores ganhando, espera-se distâncias
salariais menores entre os rendimentos mais elevados e os menores no emprego formal.
Algumas reduções salariais foram elevadas nos primeiros anos da década de 2000 e
ocorreram em atividades com maior remuneração média, tais como nas instituições
financeiras (redução de 35,1% em 2007), no material de transportes (redução de 27,5%)
e indústria química (queda de 19%).
Tradicionalmente a literatura costuma correlacionar o crescimento econômico a
desigualdade pessoal de renda utilizando o modelo de Kuznets. Nesse modelo “após
uma migração considerável da população rural par a região urbana, a desigualdade
passa a cair, pois grande parte da população passa a receber uma renda mais alta no
setor industrial e urbano.” (BARROS e GOMES, 2008). No modelo de Kuznets está
implícita a ideia de que as atividades industriais, depois de atingido determinado nível
de desenvolvimento, apresentarão baixa dispersão salarial, promovendo uma redução da
desigualdade de renda durante o processo de crescimento econômico subseqüente.
Dessa forma, nota-se que nas etapas iniciais do desenvolvimento econômico, o
crescimento e a desigualdade pessoal de renda se correlacionarão positivamente; depois
haverá uma etapa intermediária de inflexão da curva crescimento-desigualdade até
atingir um período no qual o crescimento e a desigualdade apresentarão correlação
negativa. Essa correlação negativa indica que o crescimento econômico distribuirá
renda, numa etapa mais avançada de desenvolvimento econômico.
Para o caso brasileiro não há muitas evidências robustas sobre a aderência do
modelo de Kuznets, provavelmente porque a estrutura produtiva nacional mantenha
uma forte polarização entre as poucas atividades mais modernas e as predominantes
atividades mais tradicionais. A estrutura produtiva da economia brasileira condiciona a
desigualdade de renda do trabalho ao criar um perfil de demanda por trabalho muito
heterogêneo. Parece razoável supor que a estrutura produtiva brasileira é polarizada: de
um lado, predominam atividades econômicas mais tradicionais, de baixa e média
intensidades tecnológicas, que demandam uma força de trabalho de menor qualificação
e de baixa remuneração; de outro lado, há poucas atividades mais avançadas, com
elevada intensidade tecnológica, que demandam um tipo de trabalho mais qualificado e
de melhor remuneração. Sendo assim, a estrutura produtiva gera uma polarização em
termos tecnológicos e salariais, mantendo elevada a dispersão salarial e a desigualdade
de renda. Na primeira década de 2000, houve uma maior demanda por trabalho de baixa
e média qualificação, expandindo seus rendimentos (embora continuem relativamente
baixos) e aproximando-os dos ocupados de maior qualificação que perderam
participação na renda do trabalho.
Essa polarização na demanda por trabalho gerada pela estrutura produtiva
nacional também está presente no seu crescimento econômico, que a expande, mas não
parece modificá-la estruturalmente em favor de uma melhor distribuição de renda.
ALMEIDA e GUILHOTO (2006) analisam a correlação entre o crescimento econômico
setorial brasileiro e suas respectivas distribuições de renda. Utilizando a matriz insumo
produto do IBGE (2002) os autores construíram estimativas para 39 setores econômicos
e concluiram “(...) que os setores que mais contribuíram para o crescimento econômico
diferem daqueles que melhoram a distribuição de renda”. Sendo assim, uma inferência
possível desse resultado é que o crescimento econômico setorial brasileiro estabelece
51
um tipo de trade off com a distribuição de renda do trabalho. Outra inferência possível
desse mesmo resultado matemático diz respeito ao fato de que o crescimento econômico
nacional, no sentido macroeconômico, não distribui renda porque os seus principais
setores, do ponto de vista produtivo, são os piores sob a ótica distributiva. Ou seja: o
crescimento econômico brasileiro é estimulado por setores com elevadas dispersões
salariais que ampliam a desigualdade da renda do trabalho.
Um resultado que converge para as estimativas de ALMEIDA e GUILHOTO
(2006), refere-se ao tipo de crescimento da economia brasileira, que não se caracteriza
como favorável aos menores salários (também classificado como crescimento não pró
pobre). Nessa linha, os resultados de RESENDE et al.(2006), para a economia brasileira
da década de 1990, “apontam que nenhuma capital estadual apresentou um crescimento
do tipo pró pobre. Isto mostra o padrão perverso de crescimento do Brasil, em que
regiões que englobam a maioria da população estão apresentando um crescimento que
aumenta a desigualdade de renda”33.
1.2. Oferta de trabalho: capital humano, segmentações e discriminação no mercado de
trabalho
O capital humano foi utilizado por LANGONI (1973) para explicar a ampliação da
desigualdade da renda do trabalho entre 1960 e 1970. A escolaridade foi a principal
variável explicativa do modelo de LANGONI. A principal causa para a elevação da
desigualdade de renda foi a “(...) expansão diferenciada da demanda de mão-de-obra
que, devido à tecnologia utilizada, beneficiou desproporcionalmente os níveis de
educação mais elevados” (LANGONI, 2005). Essa demanda diferenciada ocorreu em
função do elevado crescimento econômico34 do período, liderado pela indústria que
demandou um número expressivo de trabalhadores qualificados, promovendo a
elevação dos seus rendimentos e distanciando-os dos menores. As estatísticas
descritivas de LANGONI indicam um crescimento maior das rendas dos trabalhadores
mais escolarizados (com ensino médio e curso superior). Os trabalhadores mais
experientes também obtiveram ganhos salariais acima das faixas etárias menores. Nos
resultados econométricos, para 1970, a escolaridade contribuiu, marginalmente, com
15,43% da elevação da desigualdade, enquanto a experiência do trabalhador (medida
pela idade) contribuiu com 7,74%.(LANGONI, 2005). No modelo de LANGONI
predominam as variáveis ligadas a oferta de trabalho (escolaridade e experiência), mas
supõe uma “(...) interação entre a oferta e demanda por mão-de-obra de diversas
qualificações”. Essa suposição de interação entre a oferta e a demanda por trabalho
contida no modelo de LANGONI não se ampara numa descrição mais ampla dos
indicadores sobre a demanda por trabalho. Ou seja, o modelo se apóia
predominantemente em alguns indicadores da oferta de trabalho, com algumas
suposições sobre o comportamento da demanda por trabalho.
Para a primeira metade da década de 2000, o IPEA identificou a escolaridade e a
experiência do trabalhador como determinantes importantes da queda da desigualdade
33 Talvez a baixa aderência do modelo de Kuznets ao Brasil possa ser parcialmente
explicada pelo fato da economia brasileira ainda não ter atingido a etapa de desenvolvimento
mais avançada, capaz de transferir o crescimento econômico para a distribuição mais igualitária
da renda do trabalho. 34 Há, nessa associação entre crescimento econômico e desigualdade da renda, uma certa
influência do modelo de U invertido de Kuznets.
52
da renda do trabalho, com contribuições entre 24% e 40% para a escolaridade e 6,8%
para a experiência (RAMOS, 2007 e BARROS et al.,2007). Para a primeira metade da
década de 2000 há evidências empíricas indicando que a “(...) demanda no mercado de
trabalho tem sido lenta e não tem acompanhado a maior escolarização da oferta de
trabalhadores, gerando redução nas taxas de salário” (NERI, 2007). Parte dessa redução
da capacidade explicativa da escolaridade parece estar associada à redução dos hiatos de
escolaridade, decorrente da expansão, por exemplo, do número de trabalhadores com
ensino médio35.
As maiores reduções nos rendimentos médios do trabalho entre 2002 e 2009
ocorreram para os ocupados com nível médio e superior. Os resultados da renda média
do trabalho indicam que os trabalhadores menos escolarizados (sem instrução e com
fundamental completo) aproximaram-se dos mais escolarizados (com nível médio e
curso superior), em decorrência de uma interação da demanda por trabalho com a oferta
de trabalho que favoreceu mais os postos de trabalho com menor qualificação,
ampliando sua massa salarial real e sua participação relativa nos decis da distribuição da
renda do trabalho total, além de ter diminuído a participação relativa das maiores rendas
nos decis superiores. (PNAD’s de 2002 e 2009). Embora a renda média do trabalho dos
ocupados com nível médio tenha se aproximado da renda média do trabalho com nível
superior no período entre 2002 e 2009 no Brasil, ainda há diferenças expressivas entre
as rendas desses dois níveis de escolaridade.
Com relação a contribuição dos grandes setores de atividades para a queda da
desigualdade da renda do trabalho no Brasil, entre 2001 e 2005 (agropecuária, serviços
e indústria), nota-se cifras entre 12% e 17,5% (BARROS, et. al. 2007 e ULYSSEA,
2007). Nota-se que entre 2002 e 2009 os hiatos entre a renda do trabalho na
agropecuária e os outros dois setores (indústria e serviços) apresentam quedas, porque a
renda média do trabalho agrícola cresceu mais. Os hiatos entre os serviços e a indústria
mantiveram-se constantes. A redução dos hiatos entre a agricultura e os outros dois
setores talvez tenha ocorrido porque a demanda por trabalho na agropecuária pode ter se
concentrado em ocupações próximas ao salário mínimo, enquanto a demanda por
trabalho mais qualificado na indústria e nos serviços deve ter crescido pouco, fazendo
com que os seus rendimentos tenham crescido menos do que na agricultura. Sendo
assim, as rendas da agricultura com os dois setores aproximam-se, porque ocorre um
crescimento menor dos maiores rendimentos (serviços e indústria) e um crescimento
maior da agropecuária.
As diferenças de renda do trabalho entre as várias regiões brasileiras, embora
continuem relativamente elevadas, apresentaram algumas reduções na primeira década
de 2000, particularmente entre 2001 e 2005. Simulações contrafactuais para 2005
indicam que a redução das diferenças de rendimentos entre as unidades da federação
contribuíram em 7% para a queda da desigualdade da renda do trabalho total. As quedas
nas diferenças da renda do trabalho entre as regiões metropolitanas e os municípios de
pequeno e médio portes contribuíram com 12%. As reduções nas diferenças da renda
do trabalho entre as áreas urbanas e rurais contribuíram com apenas 4% para a queda da
desigualdade da renda do trabalho (BARROS et al., 2007). Entre 2002 e 2009, o hiato
entre a renda média do trabalho das áreas urbanas e rurais reduziu-se de 256% para
35 Nas PNAD’s (microdados) de 2002 e 2009 há um aumento relativo dos ocupados com
nível médio de escolaridade.
53
172%, influenciado pelo aumento da renda das áreas rurais, que atingiu 46% no período,
contra 12% das áreas urbanas. (PNAD’s de 2002 e 2009).
A segmentação formal-informal está associada com a desigualdade da renda do
trabalho no Brasil. Apesar do trabalho informal não possuir uma definição estrita, é
comum na literatura nacional utilizar como parâmetros para o trabalho informal os
ocupados sem carteira e os trabalhadores por conta própria.36 Para a primeira metade da
década de 2000, alguns resultados econométricos nacionais mostram que a elevação do
hiato salarial entre os ocupados formais e informais prejudicou a queda da desigualdade
da renda do trabalho (ULYSSEA, 2007; BARROS et al., 2007). Os hiatos salariais entre
os ocupados formais (com carteira) e os informais (sem carteira e por conta própria)
diminuíram entre 2002 e 2009.37 Os ocupados com carteira apresentavam, em 2002, um
hiato salarial de 85% em relação aos ocupados sem carteira, passando para 67% em
2009. A menor redução no hiato salarial ocorreu entre os ocupados com carteira e os
ocupados por conta própria, que atingiu, em 2009, o patamar de 31%. (PNAD’s de 2002
e 2009).
Com relação a contribuição da discriminação sofrida no mercado de trabalho, a
literatura nacional costuma recortar a cor e o sexo, associando-os a queda da
desigualdade da renda do trabalho ocorrida na primeira década de 2000.38 Contudo, essa
mesma literatura mais recente apresenta alguns resultados distintos. Para parte da
literatura nacional a discriminação por cor e sexo explica uma parcela relativamente
pequena da desigualdade da renda do trabalho, embora não seja desprezível essa
parcela. Para outra parte da literatura, a discriminação por cor e sexo explica parcela
substancial da desigualdade da renda do trabalho.39 RAMOS (2007), por exemplo, ao
decompor a desigualdade da renda do trabalho, obteve resultados que indicam a baixa
capacidade da discriminação por cor e por sexo em explicar a desigualdade da renda do
trabalho nacional, sendo que a cor explicou marginalmente aproximadamente 2,0% em
36 Cacciamali entende o informal como “(...) um conjunto de formas de organização da
produção e distribuição que se estabelece nos interstícios da produção capitalista de forma
integrada e subordinada”. Nessa abordagem o trabalho informal ocupa as “brechas” deixadas
pelas atividades formais. No informal “inserem-se trabalhadores que por opção, pelas
habilidades e pela qualidade dos serviços prestados auferem relativamente altos níveis de renda
quando comparados com a média dos assalariados, como também existem indivíduos que, sem
nenhuma qualificação, não podem ser absorvidos por firmas organizadas e que findam por
receber remunerações insuficientes perante o padrão médio de vida social” (CACCIAMALI,
1991). Também o informal é concebido como “auto emprego” e nessa perspectiva “o negócio
informal é antes de tudo uma forma de criar o próprio emprego de seu proprietário”
(PAMPLONA, 2001).
37 Esses resultados são diferentes dos encontrados na literatura nacional para a primeira
década de 2000. 38 A discriminação pode ocorrer antes de se ingressar no mercado de trabalho e assumir
outras formas além da cor e do sexo. 39 Os resultados que mostram a discriminação por cor e sexo com uma capacidade
relativamente elevada na explicação da desigualdade da renda do trabalho, costumam utilizar a
técnica de decomposição de OAXACA-BLINDER. Cacciamali e Rosalino (2008), utilizando o
método de decomposição de OAXACA-BLINDER para o período de 2002 a 2006, mostraram
cifras expressivas da desigualdade salarial por cor e sexo atribuída a discriminação. “Os
resultados produzidos indicam que, entre 2002 e 2006, o mercado de trabalho brasileiro
manteve práticas de discriminação”
54
2001 e 2005 e o sexo atingiu uma capacidade explicativa próxima a 4,5%. BARROS et
al. (2007) estimaram que a discriminação por cor e sexo, entre 2001 e 2005, explicaram
7% e 2% , respectivamente,da queda da desigualdade da renda do trabalho.
2. Parte empírica: modelos econométricos exploratórios
2.1.Considerações metodológicas
Foram construidos quatro modelos econométricos. Dois foram gerados por meio de
regressões Stepwise, que selecionam as variáveis explicativas mais significativas. Os
outros dois modelos foram rodados a partir de combinações aleatórias das variáveis
explicativas. As amostras selecionadas foram cross section estaduais para o ano de
2009. Naturalmente que o recorte de apenas um ano impõe limitações, pois não permite
observar o relacionamento entre as variáveis explicativas e a desigualdade da renda do
trabalho ao longo do tempo. Optou-se em incluir dois indicadores de desigualdade da
renda do trabalho principal: 1. O índice de Gini e 2. O índice de Theil. Na literatura
nacional é usual utilizar o Gini. A escolha do índice de Theil decorre do fato da
distribuição de renda do trabalho no Brasil possuir uma cauda pesada, em função de sua
concentração nos decis superiores. Essa “cauda pesada” é captada melhor pelo Theil do
que pelo Gini. A fonte dos dados é a PNAD (microdados de 2009) e a RAIS de 2009.
Os modelos foram construídos a partir da base teórica anteriormente desenvolvida. Para
facilitar a visualização desses modelos, optou-se pela formalização com suas respectivas
variáveis:
2.2.Formalização dos modelos
THEIL = f (LnRota, LnVA, LnEscSupMed, LnEscSupFund, LnEscMedFund,
LnExpCinqQua, LnExpQuaTrin, LnExpTrinVinte, LnDiscCorSup, LnDiscCorMed,
LnDiscCorFund, LnDiscSexoSup, LnDiscSexoMed, LnDiscSexoFund, LnSegSerInd,
LnSegSerAgri, LnSegIndAgri, LnSegUrbRur, LnSegComSem, LnSegComConta)
[1]
GINI = f (LnRota, LnVA, LnEscSupMed, LnEscSupFund, LnEscMedFund,
LnExpCinqQua, LnExpQuaTrin, LnExpTrinVinte, LnDiscCorSup, LnDiscCorMed,
LnDiscCorFund, LnDiscSexoSup, LnDiscSexoMed, LnDiscSexoFund, LnSegSerInd,
LnSegSerAgri, LnSegIndAgri, LnSegUrbRur, LnSegComSem, LnSegComConta)
[2]
Os quatro modelos serão estimados a partir dessas duas equações, sendo duas
regressões Stepwise e duas rodadas aleatoriamente por meio de combinações aleatórias
das variáveis que resultem em estatísticas t e F significativas a 5%. Uma síntese das
conexões causais entre as variáveis explicativas da desigualdade da renda do trabalho e
as variáveis dependentes será descrita a seguir, além das metodologias de cálculo dessas
variáveis:
2.3. Síntese teórica e metodologias de cálculo das variáveis
a) Rotatividade [LnRota]: a rotatividade é parte expressiva da demanda de trabalho na
economia brasileira, gerada pela flexibilidade no mercado de trabalho (DIEESE, 2011).
55
Tradicionalmente mensurada apenas para o emprego formal, atingiu quase 50% desses
empregos em 2010. Na literatura costuma-se utilizá-la para se avaliar parte do
funcionamento do mercado de trabalho e raramente como parte da demanda de trabalho.
Contudo, ligar a rotatividade à desigualdade da renda do trabalho não é usual na
literatura nacional. Parece razoável supor que, como a rotatividade geralmente reduz os
salários dos admitidos em relação aos desligados, os maiores salários cairão mais que os
menores, aproximando-os e reduzindo a desigualdade. É paradoxal a possibilidade da
rotatividade ter contribuído com a queda da desigualdade da renda do trabalho no
Brasil, na primeira década de 2000. Utilizou-se como metodologia de cálculo a proposta
do DIEESE, que considera o menor valor entre admitidos e desligados em relação ao
estoque de empregados da RAIS. Uma vez aplicada essa metodologia, apenas efetua-se
a transformação em Ln para todas as unidades da federação. Como na literatura a
rotatividade é pró cíclica (aumenta em períodos de maior crescimento econômico),
pode-se deduzir que há a possibilidade de convivência entre crescimento econômico,
expansão da demanda por trabalho e elevada rotatividade. A fonte dos dados é a PNAD
de 2009 (microdados).
b) Crescimento econômico [LnVA]: na literatura notou-se que o crescimento econômico
nacional, ocorrido a partir de uma estrutura produtiva predominantemente heterogênea,
é capaz de criar emprego e trabalho. Caso essa estrutura se modernize tecnologicamente
e ocorra o repasse dos ganhos de produtividade para os salários, poderá ocorrer a queda
da desigualdade da renda do trabalho. Contudo, não há evidências robustas que
indiquem a possibilidade do crescimento econômico nacional ter gerado uma demanda
por trabalho capaz de equalizar os rendimentos do trabalho na década de 2000. Ao
contrário, há evidências de que as atividades produtivas com maior elasticidade
produto-emprego, são aquelas que possuem as maiores desigualdades de renda
(ALMEIDA & GUILHOTO, 2006). Para mensurar o crescimento econômico para
amostras cross section estaduais utilizou-se o valor adicionado das Contas Regionais do
IBGE (2009), transformando-os em logaritmos naturais.
c) Capital humano [LnEscSupMed, LnEscSupFund, LnEscMedFund, LnExpCinqQua,
LnExpQuaTrin, LnExpTrinVinte]: espera-se que com a expansão do capital humano,
adquirido por meio da escolaridade e experiência do trabalhador, seja possível aumentar
a produtividade do trabalho e os salários. Caso os menores salários cresçam mais que os
maiores, ao longo do tempo, poderá ocorrer uma convergência dos rendimentos,
diminuindo a dispersão salarial e a desigualdade. Para a realidade brasileira da primeira
década de 2000, nota-se uma elevação da escolaridade média dos ocupados, mas a
demanda por trabalho concentrou-se nas ocupações de baixa e média qualificações, que
dispensam qualificações muito elevadas. Ou seja, mesmo com o crescimento do capital
humano em sua forma mais clássica (escolaridade e experiência), não houve uma
demanda compatível para os todos os trabalhadores mais qualificados, surgindo um
excedente de qualificação que reduziu os maiores salários, enquanto os salários menores
sofriam elevação pelo crescimento da demanda de trabalho e pelo aumento do salário
mínimo, gerando uma aproximação entre os decis superiores e inferiores da distribuição
da renda. Para mensurar o capital humano, optou-se pelas seguintes metodologias: 1. Ln
na razão entre a renda média do trabalho principal dos ocupados com curso superior e a
renda média do trabalho principal dos ocupados com ensino médio (LnEscSupMed) ; 2.
Ln na razão entre a renda média do trabalho principal dos ocupados com curso superior
e a renda média do trabalho principal dos ocupados com ensino fundamental completo
(LnEscSupFund); 3. Ln na razão entre a renda média do trabalho principal dos
56
ocupados com ensino médio e a renda média do trabalho principal dos ocupados com
ensino fundamental completo (LnEscMedFund) ; 4. Ln na razão entre a renda média do
trabalho principal dos ocupados com 50 anos e a renda média do trabalho principal dos
ocupados com 40 anos (LnExpCinqQua) ; 5. Ln na razão entre a renda média do
trabalho principal dos ocupados com 40 anos e a renda média do trabalho principal dos
ocupados com 30 anos (LnExpQuaTrin) ; 6. Ln na razão entre a renda média do
trabalho principal dos ocupados com 30 anos e a renda média do trabalho principal dos
ocupados com 20 anos (LnExpTrinVinte). A fonte dos dados é a PNAD de 2009
(microdados).
d) Discriminação [LnDiscCorSup, LnDiscCorMed, LnDiscCorFund, LnDiscSexoSup,
LnDiscSexoMed, LnDiscSexoFund]: ocupados com atributos produtivos “idênticos”
que auferem rendimentos diferentes, representam um forte indício de presença de
discriminação no mercado de trabalho. A discriminação pode ocorrer de várias formas
(todas injustificáveis), mas na literatura é comum recortá-la por cor e sexo. As técnicas
econométricas costumam medir a discriminação pelos hiatos salariais existentes entre
homens e mulheres, brancos e negros ou até mesmo cruzando o sexo com a cor
(mulheres negras versus homens brancos), mas sempre controlando esses hiatos por
meio de alguns atributos produtivos, como a escolaridade, o setor de atividade, a
posição na ocupação, etc. Os resultados empíricos desses modelos indicam presença de
discriminação no mercado de trabalho por cor e sexo, na primeira metade da década de
2000, embora tenha ocorrido um estreitamento dos hiatos salariais que a caracterizam
(CACCIAMALI, 2008 ; BARROS et. al. 2007).
Optou-se nesse estudo em estimar a discriminação por cor e sexo controlando os
diferenciais de rendimentos do trabalho por meio de níveis educacionais (superior,
médio e fundamental completo). Controlar as diferenças salariais apenas por níveis
educacionais apresenta limitações. O ideal seria controlar por um número maior de
atributos produtivos, a exemplo da técnica de decomposição OAXACA-BLINDER.
Sendo assim, utilizou-se as seguintes metodologias de cálculo (todas como proxies): 1.
Ln na razão entre a renda média do trabalho principal dos ocupados “brancos” com
curso superior e a renda média do trabalho principal dos ocupados “pardos”com o
mesmo curso superior (LnDisCorSup) ; 2. Ln na razão entre a renda média do trabalho
principal dos ocupados “brancos” com ensino médio completo e a renda média do
trabalho principal dos ocupados “pardos”com o mesmo ensino médio completo (
LnDisCorMed ) ; 3. Ln na razão entre a renda média do trabalho principal dos ocupados
“brancos” com ensino fundamental completo e a renda média do trabalho principal dos
ocupados “pardos” com o mesmo ensino fundamental completo (LnDisCorFund ) ; 4.
Ln na razão entre a renda média do trabalho principal dos “homens” com curso superior
e a renda média do trabalho principal das “mulheres”com o mesmo curso superior (
LnDisSexoSup) ; 5. Ln na razão entre a renda média do trabalho principal dos
“homens” com ensino médio completo e a renda média do trabalho principal das
“mulheres”com o mesmo ensino médio (LnDisSexoMed) ; 6. . Ln na razão entre a
renda média do trabalho principal dos “homens” com ensino fundamental completo e a
renda média do trabalho das “mulheres”com o mesmo ensino fundamental completo (
LnDisSexoFund). A fonte dos dados é a PNAD de 2009 (microdados)
e) Segmentações [LnSegSerInd, LnSegSerAgri, LnSegIndAgri, LnSegUrbRur,
LnSegComSem, LnSegComConta]: as segmentações, embora sejam conceitualmente
distintas, operam como se fossem fatores que estimulam a desigualdade da renda do
trabalho. Os grandes grupos de atividades econômicas (agropecuária, serviços e
57
indústria), por natureza e estrutura interna, apresentam disparidades salariais entre si.
Tradicionalmente, o olhar teórico sobre os serviços e as atividades agropecuárias no
Brasil os coloca como de baixa produtividade e de baixos salários, responsáveis, em
grande medida, pela desigualdade de renda. Contudo, vale notar que a média da renda
do trabalho dos serviços superou a da indústria em 2009 e que a agropecuária, segundo
o Censo agropecuário de 2009, apresentou elevação da PTF (proxy da tecnologia).
Algumas evidências indicam que a segmentação entre os grandes setores econômicos
diminuiu, ajudando na queda da desigualdade da renda do trabalho nos primeiros cinco
anos da década de 2000 (BARROS et. al. 2007). A segmentação espacial também
reduziu-se, indicando mudanças nos mercados de trabalho regionais ((ULYSSEA,
2007). Análises contrafactuais indicam que a segmentação formal-informal ampliou-se
e prejudicou a distribuição da renda do trabalho (ULYSSEA, 2007). Diante desses tipos
de segmentações, foram utilizadas as seguintes metodologias de mensuração para as
proxies: 1. . Ln na razão entre a renda média do trabalho principal dos ocupados nos
serviços e a renda média do trabalho principal dos ocupados na indústria
(LnSegSerInd) ; 2. Ln na razão entre a renda média do trabalho principal dos ocupados
nos serviços e a renda média do trabalho principal dos ocupados na agricultura
(LnSegSerAgri) ; 3. Ln na razão entre a renda média do trabalho principal dos ocupados
na indústria e a renda média do trabalho principal dos ocupados na agricultura
(LnSegIndAgri) ; 4. Ln na razão entre a renda média do trabalho principal dos
ocupados nas áreas urbanas e a renda média do trabalho principal dos ocupados nas
áreas rurais (LnSegUrbRur) ; 5. Ln na razão entre a renda média do trabalho principal
dos ocupados com carteira assinada e a renda média do trabalho principal dos ocupados
sem carteira assinada (LnSegComSem) ; 6. Ln na razão entre a renda média do trabalho
principal dos ocupados com carteira assinada e a renda média do trabalho principal dos
ocupados por conta própria (LnSegComConta). A fonte dos dados é a PNAD de 2009
(microdados)
Resultados econométricos
a) Regressões Stepwise
Theil = 0,13 + 0,28LnEscSupMed + 0,28LnSegSerInd + 0,15LnSegComSem
R2 aj.= 0,72 (4,21)* (3,43)* (2,94)*
F = 23*
Breusch-Pagan = 0,20
Ramsey = 0,005
VIF (média) = 1,43
*significativo a 5%
As três variáveis mostraram-se significativas a 5%, indicando que isoladamente
influenciam a desigualdade da renda do trabalho medida pelo índice de Theil. Além de
isoladamente, as mesmas variáveis conjuntamente são significativas a 5% para explicar
a variação da desigualdade. Juntas explicam 72% da desigualdade da renda do trabalho.
Contudo, pelo teste de Ramsey, há omissão de variáveis explicativas ou alguma falha na
especificação da equação. O teste de Breusch-Pagan mostrou que o modelo é
homocedástico. Também há evidências de ausência de multicolinearidade, identificadas
pelo teste VIF (variance inflation factor).
58
A variável proxy indicativa de capital humano (LnEscSupMed) apresentou a maior
estatística t e correlacionou-se positivamente com a desigualdade, indicando que a
redução no hiato de rendimentos entre os ocupados com nível superior e os ocupados
com nível médio poderá auxiliar na queda da desigualdade da renda do trabalho.
Contudo, apenas para contextualizar esse resultado com a realidade nacional, nota-se
que entre 2002 e 2009 os rendimentos dos dois níveis de ocupados caíram, sendo que
com nível superior a queda foi maior. Dessa forma, a redução no hiato de rendimentos
entre os níveis superior e médio de escolaridade pode ter ocorrido porque a renda média
dos ocupados com nível superior caiu mais do que a renda dos ocupados com nível
médio. O crescimento maior da renda do trabalho de nível médio parece associar-se ao
crescimento real do salário mínimo, uma vez que parte expressiva dos ocupados com
nível médio aufere rendimentos próximos ao mínimo ou no seu entorno. Na literatura
nacional predominam os resultados econométricos em que o capital humano é a
principal variável determinante da distribuição de renda. Entretanto, na literatura
nacional as proxies para o capital humano costumam ser diferentes das adotadas nesse
estudo.
As diferenças entre os rendimentos médios dos ocupados nos serviços e os ocupados
na indústria representadas pela variável proxy LnSegSerInd, correlacionaram-se
positivamente com a desigualdade da renda do trabalho principal e indicam que a
redução nesse hiato de renda entre os dois setores tem capacidade de reduzir a
desigualdade da renda do trabalho. Esse hiato praticamente foi mantido entre 2002 e
2009, situando-se próximo a 12%. Destaca-se que a renda média do trabalho dos
serviços na primeira década de 2000 foi maior que a renda média dos ocupados na
indústria de transformação.
A segmentação formal-informal indicada pela variável proxy LnSegComSem
correlacionou-se positivamente com a desigualdade da renda do trabalho, mostrando
que a redução no hiato salarial entre os ocupados formais e os informais poderá
contribuir para a redução da desigualdade. Apesar do crescimento expressivo do
emprego formal entre 2002 e 2009, os rendimentos médios do trabalho dos ocupados
sem carteira cresceram mais do que os rendimentos médios dos ocupados com carteira,
contribuindo para a queda das diferenças de rendimentos entre o formal e o informal.
Na literatura nacional esse tipo de segmentação formal-informal atrapalhou a queda da
desigualdade da renda do trabalho nos primeiros cinco anos da década de 2000.
Gini = 0,30 + 0,14LnEscSupFund + 0,07LnSegSerInd
R2 aj.= 0,74 (7,8)* (2,2)*
F = 38,3*
Breusch-Pagan = 0,98
Ramsey = 0,14
VIF (média) = 1,05
*significativo a 5%
Substituindo o índice de Theil pelo índice de Gini como indicador da desigualdade
da renda do trabalho principal, nota-se algumas mudanças nas principais variáveis
explicativas selecionadas pelo critério Stepwise. Contudo, outra variável proxy do
capital humano mostrou-se significativa (LnEscSupFund).Aliás, essa variável
apresentou a maior estatística t, mostrando-se com o maior poder explicativo do
modelo.Uma possível redução no hiato salarial entre os ocupados com nível superior e
59
os ocupados com ensino fundamental, no modelo, reduzirá a desigualdade da renda do
trabalho, mas essa redução do hiato pode ocorrer em função da estrutura produtiva
nacional, que expandiu a demanda por trabalho menos qualificado numa proporção
maior do que a demanda pelos mais qualificados. A variável proxy da segmentação
entre os serviços e a indústria de transformação (LnSegSerInd) mostrou-se significativa
para o modelo (a exemplo do que tinha ocorrido no modelo anterior), indicando que as
diferenças dos rendimentos entre os dois setores são importantes para a queda da
desigualdade da renda do trabalho. A compreensão desse tipo de segmentação entre
serviços e indústria requer um detalhamento maior da dinâmica do setor de serviços no
Brasil. No conjunto as variáveis são significativas e alguns dos problemas
econométricos usuais nas regressões não estão presentes no modelo
(heterocedasticidade, multicolinearidade e especificação inadequada). Juntas as duas
variáveis explicativas explicaram 74% do comportamento da desigualdade da renda do
trabalho principal medida pelo Gini.
b) Regressões (combinações aleatórias das variáveis explicativas)
Theil = 0,54-0,16LnRota + 0,14LnSegUrbRur + 0,20LnDiscSexoSup+ 0,03LnVA
R2 aj. = 0,61 (-3,43)* (3,53)* (3,22)* (2,37)*
F = 10,95*
Breusch-Pagan = 0,93
Ramsey = 0,27
VIF (média) = 1,53
*significativo a 5%
Excluidos os problemas mais freqüentes nas análises de regressão
(heterocedasticidade, multicolinearidade e especificação inadequada), nota-se que o
modelo perdeu capacidade explicativa (passando dos quase 75% dos modelos anteriores
para 61% do novo modelo), mas ampliou o número de variáveis explicativas. Além de
ampliar, inseriu variáveis proxies da demanda por trabalho, representativas da
rotatividade no mercado formal do trabalho (LnRota) e do crescimento econômico
(LnVA). A rotatividade correlacionou-se negativamente com a desigualdade, indicando
que talvez sua elevação possa reduzir os maiores salários da economia brasileira e
aproximá-los dos menores, promovendo uma queda da desigualdade da renda do
trabalho principal. Os salários menores foram fortemente influenciados pelo
crescimento do salário mínimo da última década e pelo crescimento econômico nacional
predominantemente gerador de ocupações com rendimentos próximos ao mínimo.
Contudo, a variável indicativa do crescimento econômico (LnVA) apresentou uma
correlação positiva com a desigualdade, indicando que será incapaz de auxiliar na queda
da desigualdade da renda do trabalho nacional. Na literatura nacional há resultados
próximos a esse, que mostram que o crescimento da economia brasileira não costuma
distribuir renda. Essa incapacidade do crescimento econômico brasileiro em promover a
queda da desigualdade da renda do trabalho parece associar-se a estrutura produtiva
nacional que é predominantemente composta por atividades que demandam baixa e
média qualificação do trabalho e acabam estimulando uma forte desigualdade em
relação as poucas atividades mais sofisticadas tecnologicamente, que demandam menos
trabalhadores bem remunerados. O hiato entre os rendimentos dos ocupados urbanos e
rurais representado pela variável LnSegUrbRur mostrou-se significativo nesse modelo,
60
sugerindo mudanças regionais nos mercados de trabalho. A discriminação salarial
presente na variável LnDiscSexoSup capta uma parcela muito pequena das múltiplas
formas de discriminação, indicando uma correlação positiva com a desigualdade e
permitindo que se admita que uma redução no hiato de rendimentos entre homens e
mulheres com curso superior poderá reduzir a desigualdade da renda do trabalho no
Brasil.
GINI = 0,58 – 0,08LnRota + 0,12LnSegUrbRur + 0,01LnVA – 0,05LnSegIndAgri
R2 aj. = 0,62 (-3,87)* (4,71)* (2,67)* (-2,54)*
F = 11,4*
Breusch-Pagan = 0,76
Ramsey = 0,66
VIF (média) = 2,59
*significativo a 5%
Nesse último modelo, nota-se que a variável proxy indicativa das diferenças de
rendimentos entre os ocupados na indústria e nos serviços (LnSegIndAgri) substituiu a
variável indicativa da discriminação salarial (LnDiscSexoSup) contida na equação
anterior. A correlação negativa entre a segmentação da indústria e a agricultura
(LnSegIndAgri) sugere que uma ampliação nessa segmentação reduzirá a desigualdade
da renda do trabalho, talvez porque a indústria possa gerar ocupações com maiores
rendimentos. O crescimento econômico representado pela variável LnVA continua
comprometendo a queda da desigualdade da renda do trabalho. A rotatividade no
mercado formal de trabalho também se correlacionou negativamente com a
desigualdade, conforme esperado teoricamente. Cabe destacar que esse indicador de
rotatividade ainda não capta com maior precisão a ideia teórica central: espera-se que a
rotatividade dos maiores salários reduza a massa salarial dos decis superiores da
distribuição de renda do trabalho; no indicador de rotatividade incluído no modelo não
há essa especificidade dos maiores salários, incluindo todos os níveis de rendimentos.
Em suma, os modelos sugerem mudanças nos mercados de trabalho no Brasil.
Mudanças regionais, na discriminação, na demanda por trabalho e no capital humano.
Talvez essas mudanças não sejam suficientemente captadas por modelos
uniequacionais. As duas regressões Stepwise excluíram as duas variáveis proxies da
demanda por trabalho (rotatividade e crescimento econômico). As outras duas
regressões (com combinações aleatórias) incluíram outras variáveis explicativas
significativas, com destaque para as representativas da demanda por trabalho
(rotatividade e crescimento econômico).
Considerações finais
A primeira década de 2000 apresenta uma queda da desigualdade da renda do
trabalho no Brasil, trazendo a necessidade de se identificar os condicionantes dessa
queda. Metodologicamente optou-se por uma tentativa de interação entre algumas
variáveis indicativas da demanda por trabalho com variáveis representativas da oferta de
trabalho. Essa opção justifica-se porque a renda do trabalho é fortemente influenciada
pela dinâmica do mercado de trabalho nacional, que depende dessa interação.
Naturalmente que os resultados obtidos não são muito robustos porque foi selecionado
61
apenas um ano da primeira década de 2000, impedindo um acompanhamento dinâmico
ao longo desse período.Além dessa fragilidade, é importante destacar que a inclusão da
rotatividade nos testes ainda é experimental, uma vez que não foram encontrados na
literatura testes que a incluam, ligando-a a desigualdade da renda do trabalho. Contudo,
há na literatura nacional evidências que indicam que essa mesma rotatividade, no
mercado formal de trabalho, costuma reduzir os salários.
Os testes indicaram que o crescimento econômico não contribuiu para a queda da
desigualdade da renda do trabalho, ao contrário, ampliou a desigualdade. Esse resultado
pode ser explicado pelo fato de que as atividades produtivas que geralmente contribuem
para o crescimento econômico nacional são as mais desiguais. Ou seja, as maiores taxas
de crescimento ocorrem nas atividades com as piores distribuições da renda do trabalho,
caracterizando o crescimento nacional como desfavorável aos menores rendimentos do
trabalho. Outra possível explicação para o crescimento econômico nacional não
favorecer a distribuição da renda do trabalho, diz respeito a estrutura produtiva nacional.
Essa estrutura é predominantemente tradicional e possui poucas atividades geradoras de
empregos de maior remuneração. Sendo assim, o crescimento econômico gera mais
empregos e ocupações com rendimentos baixos e médios e poucos empregos com
maiores salários, propiciando a queda da desigualdade da renda do trabalho, uma vez
que esses menores salários se aproximam dos maiores em função da elevação do salário
mínimo e da criação de empregos e ocupações próximos a esse salário base da
economia.
A rotatividade mostrou-se significativa apenas em dois dos quatro modelos,
justamente nos modelos com variáveis explicativas combinadas aleatoriamente. A
correlação negativa entre a rotatividade e a desigualdade da renda do trabalho mostra
que enquanto a rotatividade aumenta e desigualdade cai. Essa correlação negativa pode
ser interpretada (de forma exploratória) como decorrente da redução de alguns
rendimentos pela rotatividade, promovendo uma aproximação com os menores
rendimentos e gerando uma queda da desigualdade da renda do trabalho. Vale destacar
que o indicador de rotatividade utilizado refere-se apenas ao emprego formal. A
rotatividade do emprego formal mostra que há flexibilidade no mercado formal de
trabalho no Brasil.
Nas duas regressões Stepwise dois indicadores de capital humano mostraram-se
significativos, mas não podem ser interpretados como decorrentes de um amplo avanço
produtivo e educacional, porque sugerem que houve uma aproximação dos rendimentos
dos ocupados de menor escolaridade (médio e fundamental) com os de maior
escolaridade, em função de um baixo crescimento da renda dos ocupados com nível
superior. Os ocupados de nível médio ampliam sua participação na estrutura
ocupacional. Esses resultados para o capital humano são compatíveis com uma demanda
por trabalho concentrada nos níveis medianos de escolaridade, incapaz de promover
uma expressiva modernização na estrutura ocupacional nacional. Nessas mesmas
regressões Stepwise tiveram destaque a segmentação entre os rendimentos dos serviços
e da indústria, indicando que uma redução no hiato salarial entre serviços e indústria
ajudará na queda da desigualdade da renda do trabalho. Contudo, no período de 2002 a
2009, esse hiato salarial entre os dois setores praticamente ficou inalterado. A variável
representativa da segmentação formal-informal mostrou-se significativa em um dos
modelos Stepwise, indicando que uma redução no hiato de rendimentos entre os
62
ocupados com carteira e os sem carteira poderá contribuir para a queda da desigualdade
da renda do trabalho.
As mudanças regionais nos mercados de trabalho urbanos e rurais auxiliam na
compreensão da segmentação urbano-rural e sugerem que a diminuição nos hiatos de
rendimentos entre os ocupados urbanos e rurais contribuirá para a queda da
desigualdade da renda do trabalho. Para as duas variáveis dependentes (Theil e Gini) a
segmentação urbano-rural mostrou-se significativa, indicando a necessidade de se
avaliar a hipótese de integração regional entre alguns mercados de trabalho. A
segmentação entre os rendimentos da indústria e da agropecuária também mostrou-se
significativa em um dos modelos, mostrando que uma ampliação do hiato de
rendimentos entre os ocupados na indústria e na agropecuária poderá contribuir com a
redução da desigualdade de renda do trabalho, mas não pode ser interpretado como um
avanço significativo dos mercados de trabalho agropecuários no Brasil ,que ainda
mantém ocupações de baixa remuneração e forte sazonalidade do trabalho. A correlação
negativa entre a segmentação indústria-agropecuária sugere que a desigualdade da renda
do trabalho poderá cair mesmo com os rendimentos agropecuários se afastando da
indústria.A discriminação “salarial” por sexo, controlada por escolaridade (nível
superior), também mostrou-se significativa, embora o controle por escolaridade seja
insuficiente para isolar,das diferenças salariais entre homens e mulheres, o efeito
discriminação a exemplo do que faz a técnica OAXACA-BLINDER. Contudo, o
resultado para a discriminação por sexo indica que a redução das diferenças salariais
entre homens e mulheres com curso superior pode contribuir para a queda da
desigualdade da renda do trabalho. Cabe outra consideração sobre a discriminação: as
múltiplas formas de discriminação ocorrem também fora do mercado de trabalho e
ortanto precisam ser captadas por outras metodologias que vão além desse estudo.
Sintetizando os resultados teóricos e empíricos, nota-se que talvez a desigualdade da
renda do trabalho no Brasil seja multidimensional e para ser compreendida um pouco
melhor necessitará de outras ferramentas. Os indicadores da demanda por trabalho e da
oferta de trabalho que se destacaram nos modelos, além de associarem-se a
desigualdade da renda do trabalho, também trazem consigo algumas perguntas, tais
como: a rotatividade não é algo defensável em economia do trabalho e como sua
elevação poderá reduzir a desigualdade? ; o crescimento econômico nacional, além de
relativamente reduzido na última década, poderá ampliar a desigualdade da renda do
trabalho? ; a discriminação por sexo só se reduziu para os ocupados com curso superior?
; as diferenças nos rendimentos entre os ocupados na indústria e na agropecuária
mostram que os mercados de trabalho estão se integrando? Naturalmente que os
modelos são tentativas de se simplificar a realidade, mas suas limitações e restrições
também fornecem outros caminhos. Ampliar e diversificar os testes e a base teórica
serão muito úteis na compreensão desse fenômeno que possui desdobramentos sociais,
econômicos e políticos. Os resultados exploratórios apresentados são apenas uma
tentativa de se adicionar algumas “gotinhas” nesse oceano de possibilidades.
63
Referências bibliográficas
ALMEIDA, Leandro de Oliveira e GUILHOTO, Joaquim José Martins.
Crescimento econômico e distribuição de renda: uma análise a partir das
estruturas econômicas do Brasil contemporâneo. ANPEC, 2006.
BARROS, Ricardo Paes de; FRANCO, Samuel e MENDONÇA, Rosane. A recente
queda da desigualdade de renda e o acelerado progresso educacional brasileiro da
última década. . In: BARROS, Ricardo Paes de; FOGUEL, Miguel & ULYSSEA,
Gabriel (orgs.). Desigualdade de renda no Brasil: uma análise da queda recente.
Brasília: IPEA, V.3, 2007.
BARROS, Laura Correa de e GOMES, Fábio Augusto Reis. Desigualdade e
desenvolvimento: a hipótese de Kuznets é válida para os municípios brasileiros? In:
Revista Análise Econômica. Porto Alegre: nº 50, setembro de 2008.
CACCIAMALI, Maria Cristina. As economias informal e submersa: conceitos e
distribuição de renda. In: CAMARGO, José Márcio et al. (organizadores).
Distribuição de renda no Brasil. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1991.
DEPARTAMENTO INTERSINDICAL DE ESTATÍSTICA E ESTUDOS
SOCIOECONOMICOS (DIEESE). Rotatividade e flexibilidade no mercado de
trabalho. São Paulo: DIEESE, 2011.
INSTITUTO BRASILEIRO DE GEOGRAFIA E ESTATÍSTICA (IBGE). Pesquisa
nacional por amostra de domicílios. Brasília: 2002 e 2009 (microdados)
______________________________. Contas Regionais do Brasil (2005-2009).
Rio de Janeiro: 2011.
INSTITUTO DE PESQUISA ECONÔMICA APLICADA (IPEA). Emprego e
oferta qualificada de mão de obra no Brasil: projeções para 2011. Brasília:
Comunicados do IPEA, 2011
KON, Anita e CAMILLO, Vladimir Sipriano. Condicionantes da desigualdade da
renda do trabalho no Brasil. Curitiba: XIII Encontro Nacional da ABET, 2013
LANGONI, Carlos Geraldo. Distribuição da renda e desenvolvimento econômico
no Brasil: 3ª edição. Rio de Janeiro: Editora FGV, 2005.
LANGONI, Carlos Geraldo. Distribuição da renda e desenvolvimento econômico
no Brasil: uma reafirmação. Rio de Janeiro: FGV-EPGE,1973.( Ensaios Econômicos
EPGE, nº7)
MINISTÉRIO DO TRABALHO E EMPREGO. Relatório anual de informações
sociais (RAIS). Brasília: 2009.
NETO, Miguel Huertas e COSTA, Patrícia Lino. Impactos da rotatividade na
renda dos trabalhadores: uma análise do período atual. In: COLÓQUIO
INTERNACIONAL DE LA SEPLA, 4. Anais... Buenos Aires, 2008.
64
NERI, Marcelo. Miséria, desigualdade e estabilidade: o segundo Real. In:
Ministério do trabalho e emprego. Análise da pesquisa nacional por amostra de
domicílios. Brasília: MTE, 2007.
PAMPLONA, João Batista. Erguendo-se pelos próprios cabelos: auto – emprego
e reestruturação produtiva no Brasil. São Paulo: Germinal, 2001.
RAMOS, Lauro. Desigualdade de rendimentos do trabalho no Brasil de 1995 a
2005. In: Desigualdade de renda no Brasil: uma análise da queda recente. BARROS et.
al. (orgs.). Brasília: v.2, 2007.
RAMOS, Carlos Alberto e CARNEIRO, Francisco Galrão. Os determinantes da
rotatividade do trabalho no Brasil: instituições x ciclos econômicos. Belo Horizonte:
Nova Economia, 12 (2), julho-dezembro de 2002.
RESENDE, Guilherme Mendes ; MATA, Daniel da e CARVALHO, Alexandre
Xavier Ywata. Crescimento pró pobre e distribuição de renda das capitais dos
estados brasileiros. IPEA (livro). Brasília: 2006.
ULYSSEA, Gabriel. Segmentação no mercado de trabalho e desigualdade de
rendimentos no Brasil: uma análise empírica. In: BARROS, Ricardo Paes de;
FOGUEL, Miguel & ULYSSEA, Gabriel (orgs.). Desigualdade de renda no Brasil: uma
análise da queda recente. Brasília: IPEA, V.3, 2007.
65
ECONOMIA CRIATIVA E TRABALHO NO BRASIL
Anita Kon40
"...[a] gama maravilhosa de culturas que já surgiram sobre a
terra testemunha o fabuloso potencial da inventividade do
homem. Se algo sabemos do processo de criatividade cultural é
exatamente que as possibilidades do homem são insondáveis"
(Furtado 1978, p. 73).
1. Introdução
A economia criativa tem sido foco de discussões internacionais, sob o estímulo
de instituições como a UNCTAD (Conferência das Nações Unidas para o Comércio e o
Desenvolvimento), o PNUD (Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento) e
a Unesco (Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura). Esta
nova abordagem serve de eixo estratégico de desenvolvimento para diversos países no
século XXI, particularmente após as crises econômicas internacionais, pelo fato de
apresentar possibilidades de aproveitamento de recursos específicos das sociedades para
a geração de emprego e renda, conduzindo a novas soluções para a retomada do
crescimento.
A sociedade brasileira é reconhecida pela sua diversidade cultural e potencial
criativo, no entanto sua indústria criativa figura nas pesquisas internacionais como
estratégia de planejamento ainda em formação. A preocupação pelo aproveitamento da
potencialidade da Economia Criativa no Brasil é muito recente e oficialmente tem sido
estimulado pelas políticas públicas, a partir da criação da Secretaria da Economia
Criativa (SEC) em 2011, como agência do Ministério da Cultura (MinC), tendo como
missão:
“conduzir a formulação, a implementação e o monitoramento de políticas
públicas para o desenvolvimento local e regional, priorizando o apoio e o
fomento aos profissionais e aos micro e pequenos empreendimentos criativos
brasileiros. O objetivo é contribuir para que a cultura se torne um eixo
estratégico nas políticas públicas de desenvolvimento do Estado brasileiro”
(Brasil, 2012, p. 39).
O primeiro Plano de Gestão da Economia Criativa da SEC foi lançado para o
período de 2001 a 2014 e em fevereiro de 2012 foi instituído o Observatório Brasileiro
da Economia Criativa (OBEC), como instância responsável pela produção e difusão de
pesquisas, dados e informações sobre a economia criativa brasileira, e ainda pelo
estímulo ao debate. O Plano da SEC visa a implementação de políticas públicas
transversais dirigidas a setores do poder público, da iniciativa privada e da sociedade
civil, tendo como ponto de partida a construção de marcos conceituais e de princípios
norteadores para fundamentar a institucionalização de uma política nacional voltada
para o estímulo da indústria criativa no país.
As crises em diversos âmbitos vividas pelo país sejam sociais, econômicas,
ambientais e culturais, exprimem a necessidade de rever e reformular o modelo de
desenvolvimento até então aplicado. Como já salientava Celso Furtado em seu livro
40 Professora Titular da PUC/SP. Coordenadora do Grupo de Pesquisas em Economia
Industrial, Trabalho e Tecnologia do Programa de Estudos Pós-Graduados em economia
Política da PUC/SP.
66
“Criatividade e Dependência na Civilização Ocidental” (1978), desenvolvimento está
relacionado à ideia de Criatividade. A saída para problemas estruturais e conjuntais da
economia brasileira constitui um desafio para a inventividade que conduza à geração de
um excedente econômico que impulsione a retomada do desenvolvimento.
Este artigo apresenta uma análise do perfil da Indústria Criativa no Brasil,
mostrando seu potencial de desenvolvimento e as possibilidades de aproveitamento par
a geração de renda e emprego voltados para o impulso à retomada de crescimento no
país.
2. Conceitos e objetivos da Economia Criativa
Desde a década de 2000, vem sendo discutida internacionalmente a noção teórica
de “Economia Criativa”41, como geradora de desenvolvimento econômico, funcionando
como impulsora de economias desenvolvidas e em desenvolvimento à medida que as
economias trocam empregos altamente baseados em capacidades de operacionalizar
técnicas físicas de engenharia produtiva ou baseadas em tarefas físicas repetitivas, por
empregos que requerem capacidades intelectuais de análise e de julgamento. O
surgimento deste novo conceito de Economia Criativa foi usado inicialmente no
Relatório Australiano de 1994 Creative Nation e a noção de Indústrias Criativas
começou a ser discutida em 1997.
Estes conceitos foram posteriormente melhor desenvolvidos na Inglaterra e
refletem as mudanças que estão ocorrendo na economia global, como visto
anteriormente, em que as economias cujo crescimento é centrado na produção de bens,
passam a dar espaço para crescimento impulsionado por setores de serviços. Estas
atividades criativas abrangem empresas que exploram a propriedade intelectual
originada na criatividade, como motriz para a geração de riqueza e trabalho,
ocasionando efeitos em setores correlatos e adquirindo influência como agente de
mudanças sociais, políticas e educacionais de sua sociedade.
O termo indústria cultural é muito utilizado como representando a indústria
criativa, se refere a indústrias, que combinam a criação, produção e comercialização de
conteúdo criativo que são de natureza cultural e intangível. Seus conteúdos são
tipicamente protegidos por copyright e podem tomar a forma de um bem material ou um
serviço. As indústrias culturais, de uma forma geral, incluem atividades de imprensa,
editoras e multimídia, audiovisuais, produções fonográficas e cinematográficas e ainda
artes e desenho gráfico. O termo indústrias criativas abrange uma série mais ampla de
atividade que inclui não só as indústrias culturais, mas também toda produção cultural e
artística produzida por uma unidade individual. Assim, as indústrias criativas são
aquelas que o produto ou serviço contem um elemento substancial de conteúdo criativo
e inclui também atividades como arquitetura e publicidade (Kon, 2014).
Dessa forma, a diversidade destes segmentos não deve mais ser compreendida
apenas em seu contexto de produto a ser valorizado, mas como um ativo econômico
tangível ou intangível fundamental para uma nova compreensão do desenvolvimento,
que possibilita construir alternativas e soluções para novos empreendimentos, para um
41 Outras terminologias são aplicadas ao mesmo conceito: Indústrias Criativas; Economia da
Experiência; Economias Criativas; Economia da Criatividade; Economia Púrpura; Economia do
Significado; Cidades Criativas; Distritos criativos; e Criaticidade.
67
novo trabalho e para novas formas de produção de riqueza, também através do efeito
multiplicador de geração de valor e trabalho que difunde para o resto da economia.
O Relatório sobre Economia Criativa da ONU mostra que durante a erupção da
crise financeira e econômica mundial de 2008, houve uma queda na demanda global e
uma contração de 12% do comércio internacional. No entanto, as exportações mundiais
de bens e serviços criativos continuaram a crescer em uma taxa média anual de 14%
desde 2002. Segundo a publicação, isto é uma confirmação de que as empresas criativas
possuem um potencial para os países em desenvolvimento que procuram diversificar
suas economias e buscam setores mais dinâmicos para participarem da economia
mundial (UN, 2010).
Para a UNCTAD (United Nations Conference on Trade and Development), a
economia criativa é um conceito em evolução, baseado em ativos intangíveis que tem o
potencial de gerar crescimento e desenvolvimento econômico: pode estimular a geração
de renda, criação de empregos e ganhos de exportações, ao mesmo tempo em que
promove a inclusão social, a diversidade cultural e o desenvolvimento humano.
Compreende aspectos culturais e sociais que interagem com a tecnologia, propriedade
intelectual e objetivos de turismo. É um conjunto de atividades econômicas baseadas no
conhecimento, com uma dimensão de desenvolvimento e de inter-relações em níveis
micro e macroeconômicos na economia como um todo. Consiste, dessa forma, em uma
opção factível de desenvolvimento, através da inovação, com respostas de política
pública multidisciplinar e ação interministerial. No cerne da economia criativa estão as
indústrias criativas (UNCTAD, 2011, pg. xxiv).
A criatividade pode ser definida também como o processo pelo qual as ideias são
geradas, conectadas e transformadas em coisas e produtos tangíveis ou intangíveis que
possuem valor, ou seja, criatividade é o uso de ideias para produzir novas ideias. A
ONU salienta que o debate conceitual não deve confundir criatividade com inovação,
pois são dois meios diferentes, no entanto a inovação possui um elemento de
criatividade, ou seja, criação ou renovação de algo a partir de nada ou a partir de ideias.
Na atualidade o conceito de inovação, como será visto posteriormente, tem sido
ampliado para além da natureza científica e tecnológica, envolvendo também mudanças
estéticas, artísticas e outras intangíveis (UN, 2010, p.4).
Na atualidade a definição mais citada de economia criativa é a publicada pelo
Departamento de Cultura, Mídia e Esportes (DCMS) da Inglaterra:
“those industries which have their origin in individual
creativity, skill and talent and which have a potential for wealth
and job creation through the generation and exploitation of
intellectual property” (DCMS, 1998, p.3).
Este conceito da DCMS (1998), define as indústrias criativas como as que
apresentam requisitos de criatividade, capacitação (skill, no conceito de economia
evolucionária) e talento com o potencial para a criação de empregos e riqueza, através
da exploração de sua propriedade intelectual. Uma complementação deste conceito da
DCMS foi elaborada pela National Endowment for Science, Technology and the Arts
(NESTA) também na Inglaterra, que incorpora a observação das diferenças entre setores
e no interior destes, objetivando extrair elementos comuns entre estes, com base na
forma em que o valor comercial é criado, onde está alocado este valor e,
consequentemente, como pode ser ampliado e ressaltado.
A relevância das empresas criativas pode ser visualizada pela capacidade de alguns
tipos de capital intelectual que possibilitam a tradução de talento criativo, de
informações e outras formas de comunicação em produção efetiva de novos produtos e
serviços ou novas formas de tomada de decisão. Embora as tecnologias de informação e
68
comunicação tenham importância em todos os setores econômicos, a forma de sua
utilização é dependente da intensidade do capital intelectual de seu operador. A partir
disso, estas empresas são muitas vezes definidas como produtoras e distribuidoras de
bens e serviços que são centrados em textos, símbolos, imagens ou softwares, que
constituem um grupo específico de atividades baseadas em conhecimento, que
usualmente combinam talento criativo com tecnologia avançada, cujo produto pode ser
protegido por direitos de propriedade. Os melhores exemplos destas atividades são as
artes audiovisuais e performáticas, como música, cinema e televisão, videogames,
imprensa e rádio (Greffe, 2006).
Uma característica da economia criativa, particularmente em países em
desenvolvimento, é a alta predominância de sistemas, processos e instituições culturais
informais. Nestes países muitos trabalhadores criativos, incluindo músicos, artesãos,
artistas plásticos e outras formas de arte, bem como desenhistas gráficos e outros
profissionais trabalham em condições de informalidade. A informalidade dá forma à
política econômica das indústrias criativas embora gerem parcela considerável de renda
da economia, sua contribuição para a geração de valor adicionado é de difícil
mensuração e pode prejudicar o diagnóstico governamental para a criação de políticas
públicas adequadas.
Finalmente, é necessário observar-se que durante as duas últimas décadas, as
prioridades de crescimento têm mudado da aquisição de propriedades físicas para a
propriedade intelectual, ou seja, de ativos tangíveis para intangíveis e com a ajuda da
nova atitude em relação à ciência a ecologia criativa está se tornando uma forma
moderna de sustentabilidade, desenvolvimento e gerenciamento dos novos conceitos de
economia criativa, para a retomada da dinâmica econômica mundial, ou seja, o uso da
eco-criatividade trata os recursos naturais de modo diferente de simples consumo
mecânico, ao adotar a poupança criativa destes recursos.
A economia criativa é, portanto, a economia do intangível, do simbólico, que se
alimenta de talentos criativos, organizados individual ou coletivamente para produzir
bens e serviços criativos. Esta nova visão da economia possui dinâmica própria e, por
isso, requer a elaboração de modelos econômicos diferentes dos tradicionais. Seus
novos modelos de negócio ainda se encontram em construção, carecendo de marcos
legais e de bases conceituais adequadas e adaptadas à nova situação econômica
mundial.
3. A indústria Criativa no Brasil
O Plano de Gestão da Economia Criativa da SEC estabelece algumas categorias
culturais e setores selecionados pelo Ministério da Cultura como objetos iniciais de
estímulo das políticas públicas, como apresentados no Quadro 1.
No entanto, a indústria criativa não se resume a estes setores culturais
selecionados, mas inclui também setores de Software, Computação &Telecom, Pesquisa
& Desenvolvimento e Biotecnologia, como relevantes para a criação de renda e
emprego a partir de elementos intangíveis intrínsecos a suas atividades.
A mensuração desta indústria no Brasil ainda é incipiente e escassa desde que a
produção de dados estatísticos mais específicos ainda está na fase de discussões
conceituais e os poucos estudos existentes ainda não definiram uma metodologia que
compatibilizasse as visões diversificadas. Ainda não existe uma Conta Satélite
específica nos levantamentos do IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística)
para mensurar as atividades e produtos dos setores criativos. Por outro lado, também
não foi definida uma diretriz dos órgãos públicos relacionada à uniformização da
69
classificação e enquadramento destas atividades econômicas e da força de trabalho
criativas. Algumas instituições empresariais, como a Federação da Indústria do Rio de
Janeiro (FIRJAN), ou governamentais específicas como a Fundação de
Desenvolvimento Administrativo (FUNDAP), fizeram estudos empíricos específicos
baseados em dados da Relação Anual de Informações Sociais (RAIS), da quantidade de
empreendimentos considerados criativos de acordo com a Classificação Nacional de
Atividades Econômicas (CNAE 2.0) do IBGE e informações da United Nations
Conference on Trade and Development (UNCTAD/ONU, 2012).
Quadro 1. – Categorias culturais e setores selecionados da Economia Criativa no
Brasil
Categorias Culturais Setores
Patrimônio a) Patrimônio Material
b) Patrimônio Imaterial
c) Arquivos
d) Museus
Expressões Culturais e) Artesanato
f) Culturas Populares
g) Culturas Indígenas
h) Culturas Afro-Brasileiras
i)Artes Visuais
j) Artes Digitais
Artes de Espetáculo k) Dança
l) Música
m) Circo
n) Teatro
Audiovisual, Livro, Leitura e
Literatura
o) Cinema e Vídeo
p) Publicações e mídias impresas
Criações Culturais e Funcionais q) Moda
r) Design
t) Arquitetura
Fonte: Brasil, (2012, p. 30).
As informações empíricas aqui apresentadas foram elaboradas a partir destas
fontes de dados disponíveis. No entanto, deve ser destacada que as estimativas e
análises apresentadas em sequência não representam a real dimensão, a potencialidade e
a relevância da indústria criativa brasileira. Deve ser levado em conta ainda que o alto
grau de informalidade destas atividades ainda não foi devidamente estudado e grande
parte da produção e circulação doméstica de bens e serviços criativos nacionais não
é
incorporada de forma explícita nos relatórios estatísticos. Fica em aberto, portanto,
um estudo complementar que enfoque estas ocupações e setores informais, através da
disponibilidade de dados do IBGE.
Diante do reconhecimento por alguns especialistas de que a cultura também gera
um montante não desprezível de renda, emprego e receita de exportações, uma das
primeiras estimativas de mensuração da indústria criativa brasileira foi efetuada em
70
2004, quando o Ministério da Cultura o Ministério da Cultura solicitou um mapeamento
nacional para identificar o tamanho do setor cultural do país. Esta pesquisa coletou
informações de mais de 320.000 negócios culturais, concluindo que as indústrias
culturais eram responsáveis por 1,6 milhão de empregos, 5,7% do total de negócios e
4% da mão de obra do país de 2003-2005. Porém, a pesquisa se ressentiu da falta de
indicadores nacionais sobre a oferta, a demanda e o acesso aos produtos e serviços
culturais, o que foi uma limitação para a formulação de políticas culturais (UNCTAD,
2014).
A FIRJAN realizou um estudo empírico mais amplo, cujos resultados foram
publicados em 2008, para definir a cadeia da Indústria Criativa brasileira, visando
estimar sua relevância econômica. Esta cadeia foi definida por três esferas, a saber, o
Núcleo, composto por 12 setores líderes, cujo principal insumo é a criatividade; as
Atividades Relacionadas, envolvendo segmentos de provisão direta de bens e serviços
ao núcleo, em grande parte formado por indústrias e empresas de serviços fornecedoras
de materiais e elementos fundamentais para o seu funcionamento; e as Atividades de
Apoio, que engloba ofertantes de bens e serviços de forma mais indireta.
O estudo mostrou que em 2006 os 12 setores do Núcleo, juntamente com as
Atividades de Apoio foram responsáveis por 21,8% (7,6 milhões de pessoas) do total de
empregos formais do país, contribuindo para 16% do PIB nacional (Tabela 1).
Considerando-se apenas as atividades do Núcleo, são empregados 638 mil trabalhadores
nas atividades formais, que correspondem a 1,8% do total de trabalhadores. A Indústria
de Transformação, fornecedora de insumos e bens finais ao núcleo criativo, empregou
67% dos trabalhadores das Atividades Relacionadas. Por outro lado, os trabalhadores do
Núcleo desta cadeia são em média mais bem remunerados que a média nacional, ou
seja, 42% superior a esta média.
Tabela 1 - Indicadores de Trabalho da Economia Criativa - Brasil, 2006
Setores
Criativos
Número
de
Trabalhadore
s (em mil)
Número de
Estabeleciment
os (em mil)
Renda
do
Trabalho
Renda
por
Trabalhado
r (R$)
Trabalhador
es por
Estabeleciment
o
(R$
milhões)
Núcleo e Ativ.
Apoio
Arquitetura 3.305,
40
386,5 2.642,30 799 8,6
Moda 2.320,
90
302,6 1.513,80 652 7,7
Design 704 70,8 812,1 1.154 9,9
Software 431,9 48,5 695,3 1.610 8,9
Mercado
Editorial
371,3 52,5 408,8 1.101 7,1
Televisão 127,6 9,3 210 1.646 13,7
Filme e Vídeo 120,4 20,4 107,8 895 5,9
Artes Visuais 82,3 2,9 132,2 1.606 28,3
Música 74,5 9,3 71,1 954 8
Publicidade 54,4 6 83 1.526 9
Expressões
Culturais
44,2 9,6 32,7 739 4,6
Artes Cênicas 11,5 2,3 11,6 1.013 5
Total 7.648,40 920,8 842,68 879 8,3
Parcela sobre o
total da economia
nacional (%)
21,80
32,50 16,30 75,10 66,90
Total da
Economia Nacional
35.155
2.834 41.117 1.170 12,4
FONTE: RAIS 2006. Elaboração da FIRJAN (2008).
71
As estimativas mostram que em 2006, a cadeia criativa total brasileira
correspondia a cerca de 16,4% do PIB nacional, dos quais o Núcleo correspondeu a
2,6%, as Atividades Relacionadas a 5,4% e as de Apoio a 8,4%. Dos setores líderes, a
Arquitetura, Moda e Design juntos representam 82,8% do mercado de trabalho criativo,
82,5% dos estabelecimentos e 73,9% da massa salarial.
A evolução da indústria criativa após 2006 foi superior à da média nacional.
Observa-se no Gráfico 1. Com remuneração e empregados crescendo acima da média,
as atividades do núcleo criativo ganharam maior representatividade na economia
nacional. Enquanto em 2006 respondiam por 2,4% do PIB, em 2009 alcançaram
participação de 2,5%. Em termos nominais, o núcleo da indústria criativa movimentou
R$ 93 bilhões na economia brasileira em 2010.
A renda média dos trabalhadores brasileiros do núcleo da indústria criativa
passou de R$ 1.663 em 2006 para R$ 2.296 em 2010, o equivalente a um
crescimento real de 13%. Para efeito de comparação, a renda média do
trabalhador brasileiro cresceu 11% nesse período. As atividades de Televisão & Rádio
continuaram como as que melhor remuneram seus empregados, com salário médio de
R$ 2.757 neste último período.
Gráfico 1 Taxa de Formalização na Economia e nos Setores Criativos, Brasil,
2006-2010
Fonte: FIRJAN (2011). Elaboração própria.
No núcleo da economia criativa formal, o número de trabalhadores n o total no
Brasil saltou de 599 mil para 771 mil entre 2006 e 2010, se elevando em média,
8,5% ao ano nesse período (ou 29% em quatro anos), ritmo mais acelerado que
o mercado de trabalho brasileiro em geral (5,8% a.a. ou 25% no período). N o
c o n t e x t o g l o b a l , os empregados no núcleo criativo representaram em 2009
1,75% do total dos trabalhadores brasileiros, ante 1,70% em 2006, elevação que
pode não ser considerada significativa ante as potencialidades da força de trabalho
brasileira, porém é necessário salientar-se que correspondeu ao período de crise
mundial, quando no Brasil em 2009 verificou-se decréscimo da evolução da economia
(Gráfico 2).
Por sua vez, a contribuição ao PIB dos setores criativos no Brasil em 2010
correspondia 2,84% do PIB global, um valor não desprezível de R$ 104,37 bilhões,
compreendendo setores de grande dinamismo econômico que geram um valor
adicionado superior a algumas atividades econômicas, como a indústria extrativa e a
indústria de produção e distribuição de energia elétrica, água, esgoto e limpeza urbana.
50
60
70
2006 2010Economia Set. Criativos
72
Gráfico 2 Emprego formal na Economia e nas atividades criativas do Brasil,
2006-2009
Fonte: : FIRJAN (2011). Elaboração própria.
O crescimento anual do setor criativo nos anos de 2006 a 2010 não foi baixo
(6,13% ao ano) sendo maior que o crescimento médio anual do PIB (4,3%),
evidenciando a necessidade de melhor exploração de suas possibilidades, desde que
existe uma tendência deste setor ganhar maior relevância econômica na geração do PIB
(FIRJAN, 2012 p.30).
Pesquisa da FUNDAP (2011) para diagnosticar a economia criativa no
Município de São Paulo, para dados de 2009, permitiu visualizar-se primeiramente
quais atividades se destacam no núcleo de emprego formal no país e na cidade, com
base nas informações da Relação Anual de Informações Sociais – Rais do Ministério
do Trabalho e Emprego. Mostrou que algumas atividades apresentam relativamente
localmente maior concentração de emprego do que o país (Gráfico 3).
Observe-se que o segmento de I n f o r m á t i c a ( Software e Computação)
apresentou o maior saldo de contratações formais no período (86 mil novos
empregados), s i t u a n d o - s e como maior empregador do país dentre as atividades
do núcleo criativo (328 mil empregados em 2010). Por outro lado, o segmento de
Música apresentou saldo de demissões nesse período (1.300 postos de trabalho
fechados), sobretudo nas atividades de gravação de som e edição de música.
Gráfico 3 Distribuição Setorial do Trabalho Formal em Atividades e Ocupações
Criativas - Brasil e Município de São Paulo, 2009(em %)
A pesquisa mostrou ainda que a queda da representatividade no número de
unidades criativas em relação ao total de unidades locais no período de crise de 2009, se
30000
35000
40000
45000
2006 2007 2008 2009Ativ criativas Economia
73
verificou no Brasil e em quase todas as agregações regionais de São Paulo, com exceção
do Município de São Paulo (Gráfico 4).
Gráfico 4 -Participação do Número de Unidades Locais Criativas no Total das
Unidades Locais
Brasil, Região Sudeste, Estado de São Paulo, RMSP e Município de São Paulo -
2006-2009
Fonte: FUNDAP (2011). Elaboração própria.
No que se refere ao trabalho informal, a FUNDAP, fez estimativas a partir das
informações da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílio (PNAD), observando que
no Brasil, o número de empregos formais e informais nas atividades criativas, entre
2006 e 2009 passou de 87,2 milhões para 91,6 milhões, uma variação de 5% e
corresponde em 2009 a cerca de 3,5% do total do trabalho formal e informal do país,
4,7% na região Sudeste e 5,2% no Estado de São Paulo.
Gráfico 5 - Distribuição do emprego formal e informal nas atividades criativas
- Brasil e SP, 2009
Fonte: FUNDAP (2011). Elaboração própria
O Gráfico 5 permite observar adicionalmente que a representatividade do setor
Informal no Brasil é relativamente superior à de São Paulo do que nas atividades
formais reafirmando a forte concentração de trabalhadores criativos nesta região. A
análise segundo unidades da federação confirma esta concentração do Estado em
relação aos demais pesquisados (Gráfico 6). Em São Paulo a participação do trabalho
criativo na Indústria
0
1
2
3
4
Brasil Sudeste Estado SP RMSP MunicípioSP
2006 2009
0
1.000.000
2.000.000
3.000.000
Formal Informal
753.178
2454313
296.231669164
Brasil Estado de SP
74
Gráfico 6 Participação de trabalhadores da indústria criativa no total do Brasil,
segundo setor econômico e unidade da federação, 2010
FUNDAP (2011). Elaboração própria.
corresponde a 27,5% do total do Brasil nestas atividades, enquanto no comércio é de
29,8% e nos serviços de 37%. Apenas no Rio de Janeiro parcela do trabalho industrial
também é relativamente inferior à dos demais setores, respectivamente de 6%, 9,5% e
13,7% 3 o contrários ocorrendo nas demais regiões. Por sua vez, observando-se
separadamente a distribuição do trabalho entre setores no total destas atividades do país,
a indústria participa com 471%, o comércio com 27,6% e os serviços com 25,2%
(Gráfico 7).
Gráfico 7 Participação de trabalhadores da economia criativa segundo setor
econômico por unidade da federação, 2010
FUNDAP (2011). Elaboração própria
Esta distribuição apresenta um padrão semelhante em todas as regiões pesquisadas,
verificando se no Ceará e em Santa Catarina a maior concentração na Indústria.
Os dados recentes mostram que as pessoas que exerciam ocupações formais nos
setores criativos em 2010 correspondiam a 8,54% dos empregos formais no Brasil,
considerando-se toda a cadeia produtiva e as ocupações formais no Núcleo dos setores
criativos correspondiam a 1,96% do total de trabalhadores formais. Por sua vez a renda
média destes trabalhadores formais no Núcleo foi de R$ 2.293,64, que situou-se 44%
acima da média da renda dos trabalhadores formais do Brasil (R$ 1.588,42). Note-se
que, para cada emprego gerado neste Núcleo há um efeito multiplicador para
os outros segmentos econômicos da cadeia produtiva., ou se ja para cada
emprego gerado no núcleo, há 4 empregos em atividades relacionadas2 ao
setor. No entanto este efeito pode ser ainda maior caso se considere o setor
informal que não entra no cômputo destas estatísticas (FIRJAN, 2011).
0,0
10,0
20,0
30,0
40,0
Indústria Comércio Serviços
0,0
50,0
100,0
Indústria Comércio Serviços
75
A pesquisa da FINJAN mostra que o número de empresas que atuam no
núcleo dos setores criativos corresponde a 1,88% do total do país e se
caracterizam pela prevalência de empresas de pequeno porte, com uma média de
empregado por setor de 13,7, superior à média de 2006 que era de 8,3. O país
tem exportado a produção da economia criativa e as exportações de bens e de
serviços criativos em 2010 foram respectivamente de US$ 1,222 milhões e de
US$ 6.331 milhões, que embora em relação ao resto do mundo represente valores
pequenos, estes não são desprezíveis para o país e existe um espaço considerável
para a ampliação destas vendas ao exterior.
As estimativas mais recentes sobre o panorama do trabalho formal na economia
criativa brasileira em 2011, como visualizado na Tabela 2, mostram crescimento
considerável no número de trabalhadores e na remuneração média do trabalhador em
relação a 2006. Paralelamente ao crescimento anual do PIB do setor criativo de 2006 a
2011 de 6,13% ao ano, observa-se que o trabalho nas atividades criativas também
registrou uma evolução considerável no período, tanto no número de trabalhadores
quando na remuneração média recebida. Observa-se inicialmente que no ano de 2011,
duas novas modalidades de atividades, antes não mensuradas, foram incorporadas ao
Núcleo criativo: Biotecnologia e Pesquisa e Desenvolvimento, cuja remuneração média
é considerável, particularmente nesta última modalidade que se situa no topo dos
ganhos do trabalho.
Por outro lado, a distribuição de trabalhadores entre os segmentos teve uma
transformação relevante, desde que no ano de 2006 mais de 43% dos trabalhadores
formais se incorporavam ao grupo de serviços de Arquitetura e Engenharia e 30% em
Moda, e no período final observado, os demais serviços aumentaram relativamente sua
representatividade, ultrapassando mesmo a participação deste último grupo.
Tabela 2 Indicadores de Trabalho formal da Economia criativa do Brasil, 2006 e
2011
Trabalhadores
Remuneração média
Segmentos Número
Participação
(%) R$
Índice de
Dispersão*
2011 2006 2011 2011 2006 2011
Arquitetura & Engenharia 230.258 43,2 28,4 7.518 3,13 1,60
Publicidade 116.425 0,7 14,4 4.462 0,10 0,95
Design 103.191 9,2 12,7 2.363 0,96 0,50
Software, Comput. eTelecom 97.241 5,6 12,0 4.536 0,82 0,97
Mercado Editorial 49.661 4,9 6,1 3.324 0,48 0,71
Moda 44.062 30,3 5,4 1.193 1,80 0,25
Pesquisa & Desenvolvimento 37.251 - 4,6 8.885 - 1,89
Artes Visuais 32.930 1,1 4,1 2.195 0,16 0,47
Televisão & Rádio 26.004 1,7 3,2 2.015 0,25 0,43
Biotecnologia 23.273 - 2,9 4.258 - 0,91
Filme & Vídeo 20.693 1,6 2,6 1.661 0,13 0,35
Música 11.878 1,0 1,5 1.944 0,08 0,41
Artes Cênicas 9.853 0,2 1,2 2.767 0,04 0,59
Expressões Culturais 6.813 0,6 0,8 939 0,01 0,20
Total 809.533 100,0 100,0
0
2.234,0
0
1,00
1,00
Fonte: FIRJAN (2008 e 2012). Elaboração própria. *Dispersão em relação à média anual que
corresponde à unidade.
76
Com relação à remuneração dos trabalhadores, além do aumento da remuneração em
termos reais para todas as modalidade, observa-se pelo Índice de Dispersão em relação à
media global destas atividades criativas, uma maior convergência em relação à média, e
as atividades de Arquitetura & Engenharia e Pesquisa& Desenvolvimento auferem
remunerações respectivamente 60% e 89% acima da média. Os serviços relacionados à
Moda, que em 2006 registravam remunerações 80% acima da média, em 2011
mostraram relativamente uma queda considerável na média, tendo em vista que o
aumento considerável de atividades e trabalhadores neste segmento se verificou de
maneira a expandir as empresas menores que produzem artigos mais populares em
regiões mais afastadas dos polos econômicos. Estes resultados revelam a dinâmica
favorável da economia criativa e as potencialidades de aumento da contribuição dos
segmentos criativos à geração de trabalho, bem como a incorporação de outros setores
criativos à cadeia criativa.
4. Considerações finais: desafios para as políticas públicas
A preocupação com o desenvolvimento de uma economia criativa mais dinâmica no
país é bem recente e as políticas públicas voltadas para o estímulo estas atividades são
bem recentes, com a criação da SEC e ainda em formulação. A contribuição da
economia criativa à geração de trabalho é patente pelas estimativas analisadas e os
desafios da dinamização destes segmentos se colocam para os formuladores das
políticas de apoio.
Inicialmente, para o efetivo conhecimento da realidade e das potencialidades desta
economia, uma das primeiras ações públicas se refere ao levantamento de dados e outras
informações da Economia Criativa no país, de modo a propiciar conhecimento mais
específico e confiável para o diagnóstico da situação e das potencialidades brasileiras,
bem como da adoção de medidas específicas de apoio. Com esta base faz-se premente a
articulação e estímulo ao fomento de empreendimentos criativos, que inclui
prioritariamente a Educação para competências criativas, além da criação de uma
infraestrutura física e regulatória que possibilite a criação, produção, distribuição,
consumo e exportação de bens e serviços criativos. Se dúvida, aspecto determinante será
a criação e adequação de marcos legais para estes setores criativos que permitam o
aproveitamento das potencialidades regionais em espaços mais afastados dos polos
econômicos do país, possibilitando maior convergência regional.
77
Bibliografia
BRASIL, Plano da Secretaria de Economia Criativa. Políticas diretrizes e ações,
2011 a 2014, Ministério da Cultura, Brasília, 2012.
FIRJAN, A cadeia da Indústria Criativa no Brasil, DECON/ FIRJAN, Rio de
Janeiro, 2008.
FIRJAN, Indústria Criativa. Mapeamento da Indústria Criativa no Brasil, FIRJAN,
Rio de Janeiro, 2012.
FUNDAP, Economia criativa, FUNDAP. São Paulo, 2011.
FURTADO, C. , Pequena introdução ao desenvolvimento: um enfoque
interdisciplinar, Editora Nacional (2ª edição), São Paulo, 1981.
FURTADO, Celso, Criatividade e Dependência na Civilização Industrial, Paz e
Terra, RJ,1978.
GREFFE, Xavier, Creative industries, UN / World Intelectual Property
Orbanization (WIPO), Booklet No. 3, Geneva, 2006.
KON, Anita, A Nova Economia Política dos Serviços, Editora Perspectiva, São
Paulo, 2014 (no prelo).
UNCTAD, Creative Economy a feasible development option, CREATIVE
ECONOMY REPORT 2010, Geneve, 2011.
UNCTAD, Widening Local Development Pathways, CREATIVE ECONOMY
REPORT 2013, Geneve, 2014.
78
Economia Industrial e Tecnologia
A SIMULAÇÃO CRIATIVA: CRIANDO VALOR E TECNOLOGIA PARA
PEQUENAS EMPRESAS E MICROEMPRESAS NO PARQUE
TECNOLÓGICO DE SOROCABA.
Francisco Carlos Ribeiro
Celio Olderigi De Conti
Sergio Moraes
Flaviano Agostinho de Lima
Francisco de Assis Toti
Luiz Carlos Rosa
Resumo:
O presente artigo aponta como a simulação pode criar valor ao empresário. Ao
mesmo tempo aponta como é custoso para o micro e pequeno empresário manter uma
pequena estação de simulação. Por outro lado, ao integrar a universidade, os micro
empreendedores e o poder público no parque Tecnológico de Sorocaba, implantando
estações de simulação no Laboratório da Fatec Sorocaba em seu espaço no Parque
Tecnológico, essas ações não só cumprem a Lei de Diretrizes e Bases da Educação
Nacional, bem como cumpre e corrobora com os objetivos previstos em leis municipais
do que o poder público entende como uma das funções do parque Tecnológico. Ao fazê-
lo permite que os microempreendedores tenham acesso a recursos e simulação que de
outra forma seria muito difícil e permitindo-lhes agregar valor (ou diminuir custos) do
seu empreendimento.
1. Aplicando a simulação e a prototipagem para análise e viabilidade de produto.
No estudo feito por Toti et. al. (2012), como título “Influência da Orientação no
Posicionamento do Modelo 3D Prototipado por Deposição de Material Fundido-FDM”
desenvolvido no Núcleo Avançado na Área de Projetos da Faculdade de Tecnologia de
Sorocaba, apresentado no VII Congresso Nacional de Engenharia Mecânica CONEM
2012), os autores apontam que dependendo do posicionamento do modelo 3D pode-se
obter protótipos com melhor acabamento e menor tempo de construção. (Toti et. al.,
2012).
O objeto do estudo destes pesquisadores foi a prototipagem de mancal de rolamento,
por apresentar uma geometria relativamente complexa, ser bipartido e necessitar de
diversos tipos de processos para sua fabricação. (Toti et. al., 2012). A lógica subjacente
é que geometrias complexas dificultam a prototipagem, os diversos processos geram a
princípio, perdas e por ser bipartido o acabamento se torna imperativo.
Segundo apontam os autores, “
Fatec Sorocaba Fatec Sorocaba Fatec Sorocaba Fatec Tatuí Fatec Sorocaba Fatec Sorocaba
79
O modelo 3D do mancal foi construído no software
SolidWorks® versão 2011 em arquivo prt. Posteriormente,
esse arquivo foi trabalhado a sua resolução e exportado no
formato STL para o software Catalyst EX, da máquina de
prototipagem rápida Dimension modelo SST 678. (Toti et.
al., 2012 p. 1)
Observou-se nesse estudo que conforme o posicionamento do modelo face a
seus eixos de construção consome-se menos material para a confecção do suporte,
menos tempo de prototipagem além de melhor acabamento.
Menos material utilizado na prototipagem, menos horas despendidas e melhor
acabamento representam respectivamente menores custos médios e menores custos de
retrabalho (acabamento posterior ou corretivo) que, novamente impactará o custo
médio. Portanto como podemos perceber, até a maneira que se produz um protótipo
pode influenciar na produtividade industrial.
1.2.– Simulação como experimento de produto.
A simulação criativa quer seja através de softwares como, CAD/CAE/CARP/CAM
(Computer Aided Design/Computer Aided Engineering/Computer Aided Rapid
Prototyping/Computer Aided Manufacture) bem como outros aplicativos de realidade
virtual, permite testar protótipos e produtos de maneira a evitar dispêndios com a
produção de muitos protótipos físicos e criar situações de testes, virtualmente
elaborados de maneira a economizar muito protótipos para teste que implicam gasto de
material e mão de obra e ás vezes, serviços externos de acabamento.
Segundo Valério Netto, et. al. (1998, p. 105), TEMOS QUE:
Visando buscar novas formas de obter uma melhoria organizacional e
propiciar uma modernização do sistema produtivo da empresa, a
simulação de equipamentos, treinamento de funcionários, validação do
planejamento da produção, visualização de layouts de fábricas e
protótipos de produtos estão sendo utilizados com o auxílio da realidade
virtual.
Ainda tais autores apontam que:
Na área de jogos de entretenimento encontramos muitas aplicações da
realidade virtual, mas já verificamos que empresas na área de manufatura
também têm adotado os recursos de realidade virtual como uma forma mais
acessível financeiramente de projetar o futuro ou uma maneira mais eficaz de
vender seus produtos, mais rápida de validar seus protótipos e como uma outra
forma para treinar seus funcionários, ou alunos (VALERIO NETTO et al.,
1997). A RV tem contribuído para aprimorar o desempenho de técnicas em
muitas áreas, gerando principalmente mais flexibilidade às ferramentas visuais.
(VALERIO NETTO et. al., 1998 p. 107)
Também os autores discutem o uso de simulações na manufatura
especificamente como apontado abaixo:
Alguns artigos (Intelligent Manufacturing, 1995; KREITLER et al.,
1995; Simulation Based Design, 1997) citam as vantagens e facilidades
80
de se utilizar a realidade virtual na indústria, principalmente na área de
manufatura, por exemplo (EXHIBITORS, 1997):
projetar máquinas que podem ter suas propriedades
estruturais avaliadas e testadas; desenvolver uma ergonomia
funcional e confiável, sem ter que construir um modelo em escala
real;
projetar produtos que possuam design de acordo com a
preferência de cada cliente;
garantir que os equipamentos fabricados estejam dentro
das normas estabelecidas pelos órgãos governamentais; facilitar
operações remotas e controle de equipamentos;
desenvolver e avaliar processos que assegurem a
manufaturabilidade, antes de produzir o produto em escala
comercial; desenvolver planos de produção e schedules e simular
sua correção; educar funcionários em técnicas avançadas de
manufatura, com ênfase em segurança no trabalho.
Alguns trabalhos tratam de aplicações das técnicas de
realidade virtual em projetos de processos de manufatura e
aspectos importantes no desenvolvimento de produtos mais
competitivos. Outro ponto abordado é relativo à eficiência e
qualidade dos projetos desenvolvidos em RV para sistemas de
manufatura (KREITLER et al., 1995, apud VALERIO NETTO,
1998, p. 107).
1.3.O conceito de manufatura virtual.
VALERIO NETTO et. al. (1198) chama a atenção para o conceito de “manufatura
virtual” e de “prototipagem virtual”. Para eles manufatura virtual nada mais é do que a
integração de modelos computacionais que demonstram e representam a estrutura
completa de manufatura, bem como a capacidade desses sistemas projetarem com
inúmeros graus de liberdade os possíveis resultados-situações.
Por outro lado, “prototipagem virtual” mais especificadamente é apontada como
importante uma vez que a realidade virtual permite o desenho de produtos mais
competitivos ao tornar possível analisar a topologia do projeto antes mesmo da sua
construção, tolerância do material (via modelos de simulação) com visões muito
realistas. (VALERIO NETTO, 1998).
Assim, a manufatura virtual permite não só analisar e prever problemas utilizando
inclusive de estudos de probabilidade, simular planos de manutenção preditiva e
corretiva, capacitar funcionários para as mais diversas situações e prototipar
virtualmente inclusive fazendo testes virtuais cuja curva com a realidade está cada vez
mais encostada conforme avançam os softwares sofisticados e computadores com maior
capacidade de processamento.
Mas investir em realidade virtual, em manufatura virtual e em prototipagem, requer
investimentos.
81
2. Entendendo os pré-requisitos para a simulação criativa com vistas ao Produto.
2.1. O processo.
A multiplicidade de novos processos, o crescente aumento da variedade de
produtos, a diminuição dos ciclos de vida e o aumento da competência exigida pelo
mercado são fatores que exercem pressão na necessidade de se apressar o
desenvolvimento de novos produtos nos estágios de projeto e manufatura do ferramental
necessário. Tal realidade impõe às empresas um conceito de utilização de engenharia
digital, que se caracteriza por um ambiente virtual integrado que possibilite projetar,
desenvolver, simular e gerenciar todas as informações do produto.
De um modo geral, uma automação pode ser obtida com a combinação de modelos
tridimensionais (3D) de um produto gerado no CAD (Computer Aided Design), onde o
arquivo contendo as Features (características geométricas) é transferido para a
simulação no módulo CAE (Computer Aided Enginnering), onde são avaliados por
exemplo, a resistência do produto a determinados esforços que ele possa ser submetido,
em seguida o arquivo pode ser exportado na extensão STL(Standard Triangulation
Language) para o CARP (Computer Aided Rapid Prototyping)onde o produto é
produzido por adição de material polimérico, dentre outros, que após análise e ser for
aprovado, o arquivo pode ser transferido para a etapa final que é a simulação da sua
manufatura no módulo CAM (Computer Aided Manufacture).
O desenho bidimensional (2D) de um produto com geometria complexa requer
para sua fabricação a utilização de vistas e cortes. A solução moderna e econômica é o
emprego de programas computacionais que automatizam o processo de visualização
desses componentes. Desta forma obtém-se uma visão de toda a peça do que se deseja,
podendo-se efetuar ou simular cortes localizados para observação de detalhes
dimensionais, pode-se efetuar cálculos rápidos dos volumes, etc. A visualização
tridimensional de desenhos técnicos de componentes com geometrias complexas pode
ser obtida por intermédio de softwares comerciais denominados CAD.
É recomendável salientar que a simulação do processo com o uso de programas
computacionais torna-se importante, pois evita o procedimento convencional baseado na
técnica da tentativa e erro, muitas vezes utilizados pelas empresas, situação em que uma
peça é retocada diversas vezes até que se produza um componente dentro das
especificações desejadas. Com o uso da simulação pode-se observar antecipadamente os
efeitos das diversas fases do processo.
Portanto, a combinação do desenho técnico (CAD) com o processo de simulação
(CAE) pode reduzir enormemente o custo de fabricação de um componente. Também
com isso espera-se reduzir o tempo de set-up, que é o procedimento operacional até a
produção do primeiro componente aceitável pelo controle de qualidade.
2.1.1. Potencial uso do CAD
A princípio a obtenção dos desenhos das peças a serem fabricadas levava ao uso
de pranchetas e canetas diversas para visualizar a peça. Atualmente com o uso de
sistemas computacionais de edições gráficas, dados pelos sistemas CAD, a produção e a
edição destes desenhos tornaram-se uma tarefa fácil e prática. Tais programas também
possibilitaram a visualização em 3D e a criação de modelos geométricos incorporando
solicitações térmicas ou mecânicas. Observe-se, também, que a visualização de diversos
formatos pelo projetista permite também definir seu plano de fabricação. Tudo isso
aliado a padronização gráfica que permite que vários editores gráficos interpretem um
desenho armazenado num arquivo padrão. A descrição tridimensional de um
componente num sistema CAD, dentro de tolerâncias que atingem 1/10mm, no mínimo,
82
é fundamental para o uso destas informações para as etapas seguintes: a simulação por
um sistema CAE e a etapa de fabricação do ferramental (CAM).
2.1.2 – Uso Potencial do CAE
Nesta fase são realizadas as etapas de simulação do processo, quando se
visualizam as tensões e deformações, a análise estrutural empregando o método de
elementos finitos, a revisão de diversos aspectos relacionados.
Observe-se que na etapa de simulação são executadas operações de controle de
um projeto estabelecido preliminarmente pelo projetista na etapa de desenho (CAD).
Exemplo de necessidades do CAE. Estes são alguns exemplos da etapa de simulação.
Anteriormente tais etapas eram sempre analisadas em prolongadas e onerosas operações
experimentais. Empregando-se os módulos de simulação podemos também avaliar o
comportamento dinâmico de peças móveis.
Assim sendo, a simulação de uma peça pode determinar as condições para a sua
fabricação final, tratando de otimizar a matéria prima, tempo e ferramental neste
processo. É possível que ocorra um processo interativo entre o desenho e a simulação
até a otimização final do projeto. 42
2.2.Célula Básica para Desenvolvimento de Produto com Auxílio Computacional
2.2.1 Configuração Standard
A configuração standard descreve um módulo computacional básico que suporte
do ponto de vista de hardware e software os elementos mínimos necessários, que
configurem uma instalação operacional a ser utilizada nas operações de CAD e CAE em
uma empresa iniciante no conceito de utilização de engenharia digital. Ela se caracteriza
por um ambiente virtual integrado que possibilita projetar, desenvolver, simular e
gerenciar todas as informações do produto.
2.2.2.1 Servidor de arquivo
É aquele que armazena e disponibiliza arquivos para os outros Micros na Rede
Local. É possível configurá-lo de forma que faça exclusivamente backup de dados,
compartilhamento de arquivos ou de armazenamento de dados.
2.2.2.2 Plataforma de software
Composto de um sistema operacional bem como de todos os programas
específicos que serão necessários para que a estação opere nos moldes planejados.
2.2.2.3 Plataforma de hardware
42 Nesse estudo não entraremos na discussão do CAM. Mas se fôssemos continuar a
discussão, seria a mesma completada com a seguinte explicação: “Após a otimização do projeto
da peça (CAD) com um rigoroso acompanhamento da análise sobre o efeito das variáveis no
processo (CAE) passa-se a etapa de fabricação do componente (CAM). A construção por
intermédio de máquinas de usinagem com controle numérico (CNC) necessitam de informações
transmitidas diretamente da área de projetos onde as superfícies ou volumes foram precisamente
descritas por intermédio de modelos matemáticos via CAD 3D. Da mesma forma as máquinas
de usinagem também necessitam disponibilizar de um sofisticado sistema CAD/CAM 3D para
receber os dados e iniciar a operação de usinagem. O sistema CAD não trabalha completamente
automatizado e sempre é necessário técnicos especializados e altamente treinados”
83
Uma prática muito comum em empresas é a aquisição de um servidor, que
irá armazenar todos os projetos realizados, isto poupa a necessidade de cada
máquina possuir um HD com grande capacidade.
2.2.3. Estação de trabalho 01 - para CAD. Observações.
2.2.3.1 Plataforma de software
A solução oferecida deve operar nas estações de trabalho com o seguinte
sistema operacional: Sistema Operacional Microsoft Windows 7 ou mais
recente.
2.2.3.2 Plataforma de hardware
Processador: O poder de um processador fará com que seu computador realize as
tarefas necessárias em um menor ou maior tempo. Quando se cria um objeto, por
exemplo, uma superfície, um CAD 3D realiza inúmeros cálculos para transformar a
informação inserida em um objeto tridimensional, que dependendo do processador pode
se tornar uma tarefa extremamente difícil. A partir de processadores disponíveis no
mercado pode-se classificar na seguinte ordem:
Intel i7: Dentre as opções, da linha i, este é o mais indicado para
o trabalho com um CAD 3D por já ser considerado um processador
voltado para estações de trabalhos mais sofisticadas.Caso se queira
investir um pouco mais, também se encontram disponíveis processadores
da série Xeon, que são processadores mais robustos que os i7, o que trará
um maior poder de processamento para o seu computador.
Convém observar o fato de sempre buscar processadores 64 bits, pois são
capazes de gerenciar uma maior quantidade de memória RAM.
Memória RAM: No tocante a memória RAM, a regra é quanto mais,
melhor. Nas configurações mínimas solicitadas por diversos fabricantes
está indicado que a quantidade mínima de Memória RAM é de 4GB, mas
trata-se de um valor conservador, já que este é um valor mínimo. Indica-
se pelo menos uma quantidade mínima de 8GB para que se possa
trabalhar de modo satisfatório com este software.
Disco rígido: Os diversos fabricantes de software solicitam como
requisito de sistema, aproximadamente em até 22GB, entre espaço de
instalação, atualizações e pós-instalação. Novamente estes valores são
conservadores e, portanto, pensando em termos de uso, pós-instalação e
outros recursos que são acrescentados ao longo do tempo. O ideal é pelo
menos um HD de 1TB, lembrando-se que os backups dos projetos
deverão ser realizados no servidor de arquivo.
Monitor de Vídeo: Placa de Vídeo: Em termos de placas de vídeo, os trabalhos
profissionais exigem placas mais robustas, como por exemplo, as Placas
Quadro e Tesla da Nvidia. Apesar de ser um investimento mais alto estas
placas auxiliam na hora de trabalhar com objetos tridimensionais.
Estação de trabalho 02 - para CAE
Obedece as mesmas configurações da estação de CAD, acrescida de
software mais apropriados para simulação como o Pro-Engineer.
Impressora/scanner padrão
HUB
No-break
84
Figura 1 – Estação de Trabalho-CAD-CAE
Fonte: Elaboração própria.
2.3. Orçando a Célula Básica.
As configurações dos equipamentos de informática necessários à montagem da
célula e que deram origem a esses valores, estão constantes nos apêndices deste
artigo.
Os valores, são apresentados na Tabela 1
Tabela 1 – Elementos de Custo de Informática ELEMENTO VALO
R R$
QUANTID
ADE
VALO
R
SERV IDOR DE ARQUIVO 5.123,00 1 5.123,
00
ESTAÇÃO DE TRABALHO 11.203,0
0
2 22.406
,00
HUB 49,00 2 92,00
IMPRESSORA 799,00 1 799,00
NO-BREAK 1.086,00 2 2.172,
00
ESTAÇÃO DE TRABALHO COMPLETA
(moveis)
1.000,00 2 2.000,
00
TOTAL 32.592
,00
Fonte: Elaboração Própria. Pesquisa de Mercado.
Considerando, uma depreciação de 10% a.a. sem contar a obsolescência, temos
um custo anual para a empresa de R$ 3.259,20.
Acrescentando o custo de licenças anuais, os resultados são apresentados na Tabela 2
Tabela 2 – Elementos de Custo- Softwares.. SOLIDWORKS PROFISSIONAL 1 LICENÇA
(anual)
8.97
8,00
1 8.97
8,00
PRO-ENGINEER-AVANÇADO 1 licença (anual) 11.2
26,00
1 11.3
36,00
Fonte: Elaboração Própria. Pesquisa de Mercado.
E considerando que um projetista com plena capacidade de operar esses sistemas
custa em média R$ 4.400,00 e um assistente cadista R$ 2.000,00 mensais (ambos com
todos os encargos), o custo anual é apresentado na Tabela 3:
85
Tabela 3 – Elementos de Custo para uma Célula de Simulação (Duas Estações) ELEMENTO DE CUSTO VAL
OR
DEPRECIAÇÃO DE MOVEIS E
EQUIPAMENTOS
3.259,
20
LICENÇAS ANUAIS 20.31
4,00
MÃO DE OBRA QUALIFICADA 76.90
0,00
TOTAL ANUAL 100.4
73,20
CUSTO MENSAL PARA A EMPRESA 8.372,
77
Fonte: Elaboração própria, Pesquisa de Mercado.
3. Microempresas e Pequenas Empresas em Sorocaba.
Com base nos dados de empresas divulgados pelo IBGE por meio do sistema
SIDRA, adotaremos para análise do porte das empresas em Sorocaba as referências de
faixa de pessoal ocupado definido tanto pela Oficina Estatística da Comunidade
Europeia - Eurostat (Statistical Office of the European Communities) como pela
Organização das Nações Unidas – ONU, na Recomendação 2003/361/CE, de 20 de
maio de 2003, da Comissão das Comunidades Europeias. Referida metodologia também
é adotada pelo IBGE por conta das estatísticas anuais do Cadastro Central de Empresas
CEMPRE e pode ser analisada na tabela a seguir:
Tabela 4: Classificação do Porte de Empresas pelo IBGE
Classificação Número de empregados
Microempresas 0 a 9 pessoas ocupadas
Pequenas Empresas 10 a 49 pessoas ocupadas
Médias Empresas 50 a 249 pessoas ocupadas
Grandes Empresas > 250 pessoas ocupadas
Fonte: IBGE; Tabela elaborada pelos autores.
Outra forma de classificar as empresas pelo porte pode ser encontrada no Estatuto
Nacional da Microempresa e Empresa de Pequeno Porte regido pela Lei Complementar
nº 123/2006 que assim define o porte das empresas:
Tabela 5: Classificação Nacional do Porte de Pequenas Empresas
Classificação Faturamento Anual
Microempresa R$ 0,00 a R$ 360.000,00
Empresa de Pequeno Porte R$ 360.000,01 a R$ 3.600.000,00
Fonte: Elaboração dos autores.
86
Tabela 6: Sorocaba (SP): Nº de Empresas segundo a CNAE 2.0 em 2011
SETOR DE ATIVIDADE (CNAE 2.0) 0a 9peso %
0 a 910 a 49
peso %
10 a 49
50 a
249
peso %
50 a 249
250 ou
mais
peso %
> 250Total
peso %
setor
A Agric., pec., prod. florestal, pesca e aquic. 46 0,22% 4 0,2% 0 0,0% 0 0,0 50 0,2%
92% 8,0% 0,0% 0,0%
B Indústrias extrativas 10 0,05% 1 0,0% 1 0,3% 0 0,0 12 0,1%
83% 8,3% 8,3% 0,0%
C Indústrias de transformação 1.120 5,42% 416 17,8% 117 30,9% 37 0,5 1.690 7,2%
66% 24,6% 6,9% 2,2%
D Eletricidade e gás 5 0,02% 1 0,0% 0 0,0% 0 0,0 6 0,0%
83% 16,7% 0,0% 0,0%
E Água, esgoto, ativ. de gestão de resíd. e descontam. 33 0,16% 6 0,3% 0 0,0% 2 0,0 41 0,2%
80% 14,6% 0,0% 4,9%
F Construção 955 4,62% 131 5,6% 38 10,0% 3 0,0 1.127 4,8%
85% 11,6% 3,4% 0,3%
G Comércio; repar. de veículos autom. e motocicletas 9.453 45,73% 880 37,7% 73 19,3% 7 0,1 10.413 44,4%
91% 8,5% 0,7% 0,1%
H Transporte, armazenagem e correio 783 3,79% 107 4,6% 19 5,0% 4 0,1 913 3,9%
86% 11,7% 2,1% 0,4%
I Alojamento e alimentação 1.418 6,86% 200 8,6% 18 4,7% 1 0,0 1.637 7,0%
87% 12,2% 1,1% 0,1%
J Informação e comunicação 600 2,90% 34 1,5% 2 0,5% 0 0,0 636 2,7%
94% 5,3% 0,3% 0,0%
K Atividades financeiras, de seguros e serv. Relac. 327 1,58% 19 0,8% 1 0,3% 0 0,0 347 1,5%
94% 5,5% 0,3% 0,0%
L Atividades imobiliárias 367 1,78% 18 0,8% 0 0,0% 0 0,0 385 1,6%
95% 4,7% 0,0% 0,0%
M Atividades profissionais, científicas e técnicas 1.147 5,55% 77 3,3% 8 2,1% 0 0,0 1.232 5,3%
93% 6,3% 0,6% 0,0%
N Atividades administrativas e serviços complem. 1.925 9,31% 181 7,8% 53 14,0% 11 0,1 2.170 9,2%
89% 8,3% 2,4% 0,5%
O Administração pública, defesa e segurid.social 4 0,02% 1 0,0% 1 0,3% 1 0,0 7 0,0%
57% 14,3% 14,3% 14,3%
P Educação 380 1,84% 86 3,7% 17 4,5% 3 0,0 486 2,1%
78% 17,7% 3,5% 0,6%
Q Saúde humana e serviços sociais 625 3,02% 76 3,3% 20 5,3% 5 0,1 726 3,1%
86% 10,5% 2,8% 0,7%
R Artes, cultura, esporte e recreação 239 1,16% 16 0,7% 2 0,5% 0 0,0 257 1,1%
93% 6,2% 0,8% 0,0%
S Outras atividades de serviços 1.236 5,98% 81 3,5% 9 2,4% 4 0,1 1.330 5,7%
93% 6,1% 0,7% 0,3%
T Serviços domésticos 0 0,00% 0 0,0% 0 0,0% 0 0,0 0 0,0%
U Organismos intern. e outras inst. extraterritoriais 0 0,00% 0 0,0% 0 0,0% 0 0,0 0 0,0%
TOTAL POR PORTE 20.673 100% 2.335 100% 379 100% 78 100% 23.465 100,0%
88,1% 10,0% 1,6% 0,3% 100,0%
Fonte: IBGE/SIDRA - Tabela 993; Tabela elaborada pelos autores.
Ainda que se tenham outros critérios de classificação, como do BNDES há, ainda,
um grande caminho a ser percorrido que depende, em suma, da base disponível de
dados, sendo a do IBGE a de maior amplitude, mas ainda, não faz o recorte pela receita.
Considerando a classificação proposta pelo IBGE, as microempresas e empresas
de pequeno porte, aquelas com até 49 empregados, Sorocaba contava, segundo os dados
do IBGE/CEMPRE para 2011, com 23.008 unidades nesse segmento, ou 98,1% de um
total de 23.465 empresas. Dessas empresas, somente 1.690 unidades ou 7,2% do
universo pertencem ao setor industrial, sendo que 1.536 ou 90,9% são microempresas e
empresas de pequeno porte industrial.
87
Logo, é sabido que para esse grande universo de micro e pequenas empresas, em
especial quanto ao estudo deste artigo voltado ao segmento industrial, praticamente não
há possibilidades para essas empresas arcarem com gastos mensais de R$ 9.000,00 ou
R$ 108.000,00 por ano com manufatura virtual e prototipagem sendo, portanto,
fundamental a existência desse projeto no Parque Tecnológico de Sorocaba.
4. Extensão Universitária, Acesso á tecnologia e o potencial das Fatecs no Parque
Tecnológico de Sorocaba.
Segundo a Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional, em seu artigo 43,
que aponta as finalidades da educação superior, temos o inciso VII: “promover a
extensão, aberta à participação da população, visando à difusão das conquistas e
benefícios resultantes da criação cultural e da pesquisa científica e tecnológica geradas
na instituição” (BRASIL, 1996).
A Lei Municipal 9449 de 22 de dezembro de 2010, dispõe sobre o Programa de
Incentivos para o desenvolvimento(grifo nosso) da economia solidária, turística e
tecnológica de Sorocaba, com tratamento favorecido diferenciado e simplificado aos
micro empreendedores individuais, microempresas e empresas de pequeno porte de
Sorocaba(GRIFO NOSSO).]
Nesta Lei, no seu artigo 59, temos;
Art. 59. O Poder Executivo Municipal incentivará o
desenvolvimento de incubadoras de empresas e projetos nas
modalidades tecnológicas, tradicionais, mistas, corporativas,
cooperativas e sociais, como parte de sua estratégia para
incentivar o empreendedorismo, com o objetivo de
desenvolvimento de novos negócios, trabalho e renda que
ampliem a competitividade da economia da região 43
(SOROCABA, 2010)
Ainda no mesmo diploma legal temos um capítulo específico sobre o
estímulo à inovação:
CAPÍTULO IX - DO ESTÍMULO À INOVAÇÃO
Art. 68. Para os efeitos desta Lei considera-se inovação como
a concepção de um novo produto ou processo de produção, bem
como a agregação de novas funcionalidades ou características ao
produto ou processo que implique em melhorias incrementais e
efetivo ganho de qualidade ou produtividade, resultando em maior
competitividade no mercado.
Art. 69. O Poder Executivo Municipal incentivará os esforços
inovativos dos microempreendedores individuais, cooperativas,
microempresas e empresas de pequeno porte locais, por ação
própria ou em parceria com agências de fomento, instituições
científicas e tecnológicas, núcleos de inovação tecnológica,
instituições de apoio e outros órgãos promotores da ciência,
tecnologia e inovação.44
43 Grifo nosso. 44 idem
88
Art. 70. O Poder Executivo Municipal poderá instituir
mecanismos de incentivo à inovação visando estimular os
esforços inovativos de microempreendedores individuais,
microempresas, empresas de pequeno porte e cooperativas,
visando incentivar a inserção destes no Sistema Local de
Inovação.45
Art. 71. O Poder Executivo Municipal incentivará e
coordenará à criação de parques tecnológicos e incubadoras de
empresas e outros instrumentos que estimulem 46 os esforços
inovativos de microempreendedores individuais, microempresas,
empresas de pequeno porte e cooperativas.
Art. 72. O Poder Público Municipal instituirá mediante lei
específica e em prazo apropriado medidas indutoras, normas e
comissões relacionadas à inovação e atividades afins. (Sorocaba,
2010).
A Lei Municipal nº 9892, que autorizou a constituição da empresa
pública “Empresa Municipal Parque Tecnológico de Sorocaba”, para fins que
especifica, e dá outras providências, em seu artigo sétimo aponta:
Art. 7º A Empresa Municipal Parque Tecnológico de
Sorocaba terá por objeto gerenciar, organizar e estruturar o
Parque Tecnológico de Sorocaba - PTS para promover e estimular
as atividades econômicas do Município, através do
desenvolvimento da infraestrutura, da base empresarial, da ciência
e da tecnologia do PTS, visando contribuir para o
desenvolvimento socioeconômico e ambiental de Sorocaba e da
sua população.47
E, nesse sentido as alíneas “e” e “f” deixam bem claro a conexão com o objeto
que estamos tratando, quando dispõe:
e) promover o desenvolvimento científico e tecnológico
objetivando a melhoria das condições de vida de sua população;
f) propiciar apoio financeiro e institucional a projetos e
programas voltados à sistematização, geração, absorção e
transferência de conhecimentos científicos e tecnológicos.48
(SOROCABA, 2011)
A implantação de um laboratório para simulação, com estação informatizada
para projetos de simulação CAD-CAE com acesso direto á microempresa vai ao
45 idem 46 idem 47 idem 48 idem
89
encontro dos objetivos de política industrial do município, por serem um fator de
corroboração dos objetivos constantes em Lei.
Soma-se a isso ao fato de a maioria das microempresas e pequenas empresas em
Sorocaba, não poder contar com uma estrutura de simulação que é deveras custosa para
o pequeno empreendedor.
4.1. Oportunidade para aprender a pesquisa aplicada unindo eficácia e
efetividade.
No artigo “Potencialidades e desafios dos parques tecnológicos: o caso de
Sorocaba (SP)”, Ribeiro et. al., apontam com otimismo, mas com prudência, que um
Parque Tecnológico deve prover criação e sinergia entre pesquisa, inovação e setor
produtivo. Que, a cidade de Sorocaba tem sido destacada em formar mão de obra
universitária qualificada, mas ainda em muitos casos está incipiente em pesquisa e
extensão. Daí a importância de projetos como esse de oferecer possibilidades de
simulação e acesso á empreendedores que, de outra forma não os teriam.
Ao permitir a interação universidade-pesquisa ao microempreendedor, seja
através de projetos como esse de simulação, ou seja, produzindo novas ideias, estaremos
cumprindo e ampliando as potencialidades que o poder público visualizou ao promulgar
as legislações específicas citadas neste artigo.
Ribeiro et. al. (2012, p. 123) apontam:
Sorocaba e região tem instituições universitárias com potencial
capacidade a ser desenvolvida no âmbito da pesquisa. Mas e preciso
mais.
Senão vejamos:
Sorocaba, pela qualidade das suas instituições de ensino48 por
sua vez, e uma cidade fornecedora de mão de obra para indústrias já
consolidadas. No caso de Sorocaba ainda existe carência de trabalho
intensivo na geração de ideias inovadoras e formação de mão de obra
voltada a inovação, 49.
Um Parque Tecnológico não e um condomínio de empresas.49 Se
observarmos o documento (termo de referencia) sobre Parques
Tecnológicos elaborado pela Prefeitura Municipal, o documento esta
muito mais focado em apresentar os benefícios potenciais as empresas e
instituições de ensino que ali se instalarem (em especial as empresas) do
que, um documento mais analítico sobre o processo de inovação como
um todo e que da sustentabilidade ao conceito de Parque Tecnológico.
Num primeiro momento, para maximizar recursos públicos e
capital político transformado na capacidade de implementar, pode ser
oportuno. Mas se a concepção da inovação não for a base estruturante
dele, o resultado poderá ser frustrante.
Por outro há que se distribuírem responsabilidades às instituições
universitárias. Não é possível abdicar da capacidade de gerar excelentes
quadros para as empresas locais. Mas também haverá a necessidade de
produzir pesquisa de maneira sistemática e sustentada50, que será o
amparo da produção de tecnologia de fato. Sem isso, poderá ser parque
49 Grifo nosso.
90
empresarial, centro de negócios, mas com certeza não será parque
tecnológico digno desse nome.
Esses erros não podem passar despercebidos e devem a todo custo
serem evitados por todas as lideranças que estão gerindo o processo.
E nas notas de rodapé 49 a 50 os autores ainda apontam:
48 A Faculdade de Tecnologia de Sorocaba esta, por vários
indicadores, entre as melhores do pais. Alem disso, temos a UNESP,
UFSCar e duas Universidades Comunitárias, PUC e Uniso. Essas
formam profissionais com qualidade para o mercado de trabalho. A taxa
de empregabilidade do egresso da Fatec e de 92%.
Apesar dessa tradição em formar pessoal qualificado, o
processo de pesquisa na Fatec ainda e incipiente que, por sua
própria historia, busca agora desenvolver a mesma tradição de
qualidade em pesquisa. As Comunitárias sempre se deparam com
as restrições orçamentárias (inclusive de pessoal em tempo
integral para desenvolver pesquisa) e as Universidades Publicas,
seus campi ainda se consolidam no município.50
49 Pelas limitações apontadas acima.
50 Estamos falando aqui pesquisa sustentada, desde que propicie
recursos orçamentários, ambiente, condições materiais para produzir
inovação (protótipos, processos inovadores etc.), pessoal capacitado e
fontes de financiamento e credito para que as ideias prosperem. Ou seja,
a criação de um Parque Tecnológico envolve a participação de varias
frentes de trabalho com recursos humanos mais variados. (RIBEIRO, et.
al. 2012, pp. 123-124).
Assim é uma oportunidade impar para a Universidade enfrentar seus próprios
fantasmas, obtendo soluções criativas e desenvolvendo um know-how, através de um
processo “learning by doing”, que a capacitará se deparar, enfrentar e eliminar seus
próprios fantasmas e mitos no que se refere a efetividade da pesquisa aplicada.
5. Considerações Finais.
A literatura vem demonstrando as vantagens de economia de materiais e demão
de obra, ao utilizar realidade virtual e programas simuladores, entre eles os de CAD-
CAE para analisar propriedades dos materiais e dos protótipos, analisando-os de forma
estática e dinâmica. Ao fazer isso, pode detectar problemas que só seriam descobertos
depois de despender tempo, mão de obra, materiais e em muitos casos moldes. Assim a
literatura em vários artigos reconhece as vantagens da simulação.
A Faculdade de Tecnologia de Sorocaba planeja instalar no parque Tecnológico
de Sorocaba duas estações de simulação para atendimento não só de desenho técnico
(LaBDetec) como também propiciar a pequenos e empresários acesso a simulações e
análises de protótipos. Para isso existe um quadro de professores tratando essa linha de
pesquisa, publicando e que podem colaborar com os pequenos empreendedores.
A atividade de pesquisa bem como a de extensão são funções inerentes ao ensino
superior como aponta a Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional, em seu artigo
43. Promovê-las é obrigação das instituições de ensino.
50 Grifo nosso.
91
Como pudemos constatar as microempresas e empresas de pequeno porte,
aquelas com até 49 empregados, Sorocaba contava, segundo os dados do
IBGE/CEMPRE para 2011, com 23.008 unidades nesse segmento, ou 98,1% de um
total de 23.465 empresas. Dessas empresas, somente 1.690 unidades ou 7,2% do
universo pertencem ao setor industrial, sendo que 1.536 ou 90,9% são microempresas e
empresas de pequeno porte industrial.
Uma rápida análise de configuração e custo de estações de simulação apontam
para a inviabilidade de uma pequena empresa sustentar o custo dessas estações.
Obviamente isso fica minimizado se as mesmas atuarem de forma colaborativa. Mas
para que fazê-lo e movimentar tantas se o Parque tecnológico está aí, a Universidade
precisa fazer pesquisa e extensão e o Poder Público criou toda uma legislação de
maneira a facilitar e incentivar a integração desses atores?
Desta feita, reputamos à instalação de uma célula de simulação com ao menos
duas estações muito apropriada aos objetivos de todos, gerando benefícios aos atores
envolvidos.
Referências
BRASIL. Lei nº 9.394, de 20 de dezembro de 1996. Lei de Diretrizes e Bases da
Educação Nacional. DF 1996.
RIBEIRO, Francisco Carlos et. al. Potencialidades e desafios dos parques
tecnológicos: o caso de Sorocaba(SP). In: ANITA KON; ELIZABETH BORELLI.
(Org.). Industria, tecnologia e trabalho: desafios da economia brasileira. 1ed.são
paulo: eitt/pucsp, 2012, v. , p. 111-129.
SOROCABA. Lei Municipal 9449 de 22 de dezembro de 2010 Dispõe sobre o
Programa de Incentivos para o desenvolvimento da economia solidária, turística e
tecnológica de Sorocaba, com tratamento favorecido diferenciado e simplificado aos
micro empreendedores individuais, microempresas e empresas de pequeno porte de
Sorocaba. Sorocaba, 2010.
__________, Lei Municipal 9.892 de 28 de dezembro de 2011. Autoriza a
Constituição da Empresa Pública “Empresa Municipal Parque Tecnológico de
Sorocaba”, para fins que especifica, e dá outras providências. Sorocaba, 2011.
TOTI, Francisco de Assis et. al. Influência da orientação no posicionamento do
modelo 3D prototipado por deposição de material fundido – FDM. In: VII Congresso
Nacional de Engenharia Mecânica, CONEM – 31 jul.-03 ag. São Luis-Maranhão-Brasil.
VALERIO NETTO, Antonio et. al. Realidade virtual e suas aplicações na área de
manufatura, treinamento, simulação e desenvolvimento de produto. Gestão e
Produção. v.5, n.2, p. 104-116, ago. 1998. Disponível em:
http://www.scielo.br/pdf/gp/v5n2/a02v5n2 Acesso em: 07;04;2014
92
ANÁLISE DA INTERNACIONALIZAÇÃO DE EMPRESAS
MULTINACIONAIS DO SETOR DE SANEAMENTO Neusa Santos Souza51
Frederico Araujo Turolla52
Resumo
Este artigo trata da internacionalização de firmas pertencentes à indústria de
saneamento básico, atividade tipicamente monopolista em que o Estado, responsável
pelos serviços, pode delegar o direito de sua exploração através de concessões públicas
ou outras formas de parceria público-privada. O objetivo geral desta pesquisa é
confrontar as características de internacionalização das empresas saneamento básico
com aquelas previstas nas abordagens e modelos selecionados de Negócios
Internacionais. Foram selecionadas a abordagen de Upsalla e a Teoria dos Custos de
Transação, sendo que o referencial teórico utiliza elementos da teoria institucional e da
Economia Industrial, considerando as falhas de mercado específicas presentes nessa
indústria. A pesquisa é de caráter qualitativo, ancorada na técnica de análise
documental. As empresas selecionadas são: Veolia, Suez, Agbar, FCC, United Utilities,
ACEA, RWE, Saur, Cascal e Biwater, que correspondem às dez maiores do mundo e
respondem por cerca de um quinto do fornecimento mundial de água. As proposições
verificadas dizem respeito ao padrão de internacionalização, que na indústria do
saneamento, é definido mais em função de janelas de oportunidade específicas e não
conforme o padrão de Uppsala; e que a necessidade de conhecimento dos mercados
locais dos países hospedeiros torna relevante a conjugação de competências de natureza
político-institucional com competências técnicas específicas. As proposições foram
confirmadas e, com isto, a análise aponta para a inadequação de alguns pressupostos dos
modelos teóricos dominantes e para a necessidade de elaboração teórica para suportar a
análise dos processos de internacionalização destas empresas.
Palavras-Chave: Internacionalização. Saneamento. Água. Abordagens.
Analysis of internationalization of water sector multinational companies
Abstract
This work deals with the internationalization of firms belonging to the basic
sanitation industry, a typically monopolist activity in which the State, held responsible
for the services, may delegate the rights to exploration through public service
concessions or other forms of public-private partnership. The general objective of the
research is to compare the characteristics of the internationalization of sanitation firms
with those foreseen by the selected International Business approaches and models.
There were selected the Uppsala and the Transaction Costs Theory, the theoretical
references having used elements of institutional theory and Industrial Economics, taking
the specific market failures of this industry into account. This is a qualitative research,
based in documental analysis. Firms selected were: : Veolia, Suez, Agbar, FCC, United
Utilities, ACEA, RWE, Saur, Cascal and Biwater, which correspond to the ten largest in
the world and they are responsible for roughly one fifth of the world water supply.
Propositions verified are related to the pattern of internationalization, which in the
51 Economista, Mestre e Doutoranda em Administração de Empresas pelo PMDGI –
Programa de Mestrado e Doutorado em Gestão Internacional da ESPM. 52 Economista, Mestre e Doutor em Economia de Empresas pela FGV. Vice-Coordenador
do PMDGI – Programa de Mestrado e Doutorado em Gestão Internacional da ESPM.
93
sanitation industry is defined more upon specific windows of opportunity and not
following the Uppsala pattern; and that the need for knowledge of local markets in host
countries makes relevant the conjunction between political-institutional competences
with specific technical competences. Propositions were confirmed and, against that
background, the analysis suggests inadequacy of some assumptions of dominant
theoretical models and the need of further theoretical elaboration so as to provide
support to the internationalization process of this kind of firm
Keywords: Internacionalization. Sanitation. Water. Approaches.
1. Introdução Nas últimas décadas do século XX, nota-se uma intensificação do processo de
internacionalização de empresas de vários segmentos econômicos, dando origem as
EMNs (empresas multinacionais) voltadas para a operação nos mercados de
telecomunicação, energia, saneamento e outros. Segundo Michalet (1983), pode-se
definir a firma multinacional como uma grande empresa que possui ou controla
subsidiária de produção em outro país que não o de origem. O objeto de pesquisa deste
trabalho é a internacionalização de firmas pertencentes à indústria de saneamento
básico.
Na abordagem típica da Economia Industrial, a indústria do saneamento básico se
caracteriza por elevados custos fixos e pela elevada necessidade relativa de capital
técnico específico, em consequência destas características o setor tem sua produção
dividida entre a eficiência produtiva e a eficiência alocativa, o que enseja a configuração
de monopólio natural. Adicionalmente, apresenta baixo incentivo ex ante ao
investimento, gerando sub-atendimento da demanda em diversas áreas, o que acarreta
importantes externalidades negativas em relação à saúde pública, meio ambiente e
outros aspectos.
Diante desse contexto, pode-se entender o setor de saneamento básico como uma
atividade econômica tipicamente monopolista, monopólio este exercido pelo Estado, ao
qual cabe delegar às empresas o direito de explorar estes serviços, através de concessões
públicas ou de outras formas de parceria público-privada. O investimento neste setor é
elevado inclusive por demandar constantes investimentos em obras de melhoramento.
O estudo foi realizado a partir de um recorte que contempla as maiores empresas
deste segmento no mundo, segundo o ranking da Pinsent Mansons (2010).
Considerando o critério número de clientes, a amostra selecionada equivale a dez
empresas, que representam o atendimento de aproximados 370 milhões de domicílios
no mundo. Considerando-se que o mundo conta com aproximados 1,7 bilhões
domicílios atendidos com água segundo dados do PNUD (2011), estas empresas têm
uma representatividade aproximada de 20% do fornecimento de água no mundo,
número expressivo numa indústria que está no início do seu processo de
internacionalização.
O objetivo geral desta pesquisa é confrontar as características de
internacionalização das empresas saneamento básico com aquelas previstas nas
abordagens e modelos selecionados de Negócios Internacionais.
O problema de pesquisa é relativo à adequação das abordagens estabelecidas de
Negócios Internacionais na explicação das idiossincrasias do percurso de
internacionalização das firmas da indústria de água e saneamento básico.
As abordagens de Negócios Internacionais estabelecidas e relevantes para o
setor de infraestrutura são, por exemplo, as que foram definidas por Sarkar, Cavusgil e
Aulakh (1999), para descrever a internacionalização no setor de infraestrutura no
94
contexto específico do setor de telecomunicações. Esses autores escolheram o modelo
de Upsalla (JOHANSON e VAHLNE, 1977, 1995) e a Teoria dos Custos de Transação
(WILLIAMSON, 1975; 1985) como base para a análise da internacionalização de
infraestrutura de telecomunicações, mas indicaram a importância das idiossincrasias
setoriais que não são adequadamente explicadas pelas abordagens selecionadas.
Nesse estudo optou-se por uma pesquisa de caráter qualitativo ancorada na
técnica de análise documental. A pesquisa inicia-se com um levantamento da literatura
sobre internacionalização de empresas, ou seja, uma pesquisa bibliográfica. No passo
seguinte tratou-se da realização de uma análise documental, com objetivo de identificar,
analisar e compreender os variados documentos disponíveis sobre a indústria de
saneamento, a fim de traçar um caminho de internacionalização. A técnica de análise de
conteúdo foi, assim, utilizada de forma sistemática como meio de descrição dos
conteúdos dos documentos observados.
2. Referencial teórico de internacionalização
Além das teorias que embasam as principais abordagens de Negócios
Internacionais, em particular a abordagem econômica e a abordagem comportamental. É
ainda relevante, no contexto deste trabalho, a consideração sobre o ambiente
institucional e a governança das organizações.
2.1 Instituições, organizações e internacionalização
Tanto a internacionalização das empresas quanto o desenvolvimento do setor de
saneamento são altamente influenciados pelo ambiente institucional e pelas
considerações organizacionais. Uma proposta de classificação dessas duas dimensões e
de apresentação
Figura 1. Esquema do campo da Nova Economia Institucional
Fonte: Oliveira e Turolla (2013), baseado em Farina, Azevedo e Saes (1997),
adaptado pela autora.
AMBIENTE INSTITUCIONAL
ESTRUTURA DE GOVERNANÇA
INDIVÍDUO
Governança condiciona
comportamentos individuais .
Organizações procuram estrategicamente alterar as regras do jogo.
Preferências
Regras de comportamento, constituições de empresas, direitos de propriedade, contratos entre outros.
95
do relacionamento entre instituições, organizações e indivíduos pode ser encontrada em
Farina, Azevedo e Saes (1997), conforme a Figura 1.
Os itens a seguir detalham os elementos superiores da figura, notadamente o
ambiente institucional e a estrutura de governança.
2.1.1Ambiente Institucional
O ambiente institucional, por meio da teoria institucional, propicia elementos
relevantes de explicação da decisão de expansão da firma para novos mercados,
incluindo tanto os elementos determinantes da internacionalização quanto propondo que
a decisão do modo de entrada é conseqüência das pressões isomórficas do ambiente
interno e externo (DIMAGGIO e POWELL, 1983).
Esta teoria sustenta uma nova visão para a decisão do modo de entrada,
baseando-se nos critérios de legitimidade, os quais afirmam que as organizações tendem
a imitar umas às outras, pois, elas encontram-se numa competição não apenas por
recursos e clientes, mas por poder político e legitimidade institucional (DIMAGGIO e
POWELL, 1983). Sendo assim, a organização enfrenta uma dupla pressão de
conformidade: uma proveniente do país alvo da expansão, buscando legitimidade com o
ambiente externo, e outra da própria empresa, evidenciado pelas preferências e por
práticas internas que obtiveram sucesso (ROSENZWEIG e SINGH, 1991).
As exigências informacionais e institucionais necessárias para atingir mercados
eficientes são rigorosas, em função da racionalidade instrumental que os players detém,
podendo conduzir a modelos equivocados, assim a arbitragem e o feedback
informacional considerados os que corrigem os modelos e punem os comportamentos
desviantes, conduzindo os players sobreviventes ao modelo correto (FOGEL, NORTH,
1993).
2.1.2 Organizações e Internacionalização
Buckley e Casson (1976, 1998) apontaram que tanto a teoria do poder de
mercado quanto a teoria do ciclo do produto 53 focavam apenas na opção entre
exportação e investimento direto no exterior. Por outro lado, a abordagem da
internalização, ou da integração, diz respeito à decisão da firma de realizar suas
atividades da sua cadeia de produção dentro da empresa. A internalização que se origina
na pesquisa de Coase (1937), identificou outras opções estratégicas para as empresas:
licenciamento, franchising ou franchise bidding (doravante, franquia) e subcontratação.
Aqueles teóricos favoráveis a teoria da internalização defendem a existência de
um melhor modo de entrada ou estabelecimento da firma no estrangeiro, de acordo com
a configuração dos custos de transação da empresa e dos mercados escolhidos. O
enfoque é o das transações entre as unidades produtoras, baseado na literatura de custo
de transação (Williamson, 1975 e 1979), assim a tomada de decisão da firma sobre
quando internalizar (governança hierárquica) ou usar o mercado, num dos modelos
contratuais vigentes é dependente da análise de custo versus benefício. Assim a empresa
segue internalizando até que os custos superem os benefícios.
53 Teoria do ciclo de vida do produto, Vernon (1966), mostra o ciclo de vida do produto e o
investimento internacional. Vermon mostrou que as vantagens competitivas que haviam
permitido às empresas competir com sucesso nos EUA, em um estágio inicial do ciclo de vida
do produto, eram as mesmas vantagens que permitiam às empresas multinacionais norte-
americanas penetrar com sucesso nos mercados estrangeiros.
96
A abordagem dos custos de transação tem sua origem no artigo The Nature of
The Firm, de Ronald Coase (1960), e foi posteriormente discutida por Oliver
Williamson (1985). A abordagem dos custos de transação consiste na análise não
diretamente relacionada à atividade produtiva em si, mas aos contratos e aos custos de
coletar informações, de negociação e estabelecimento de contratos, garantindo que os
termos contratuais se concretizem. Assim, quanto maior for o custo na busca de
informação, menores os problemas decorrentes do fechamento de um contrato e vice-
versa.
Os custos de transação são divididos em ex ante: relacionados à coleta de
informações, principalmente na elaboração do contrato, aos mecanismos que fornecem
o cumprimento do contrato, além de salvaguardas e em ex post: relacionados à má
adequação às condições contratuais. A presença de custos de transação constitui um
determinante tanto da integração vertical, conhecida na literatura como governança
hierárquica, quanto da internacionalização das firmas que evitariam assim os custos de
transação presentes no mercado (WILLIAMSON, 1985).
Um tipo importante de imperfeição do mercado é a presença de custos
associados às transações feitas nele, como os custos de encontrar fornecedores, negociar
contratos, monitorar as obrigações contratuais, lidar com a incerteza quanto aos preços
futuros e assim por diante. Outro tipo de imperfeição refere-se às dificuldades clássicas
de se transacionar conhecimento e informação. A firma também incorre em um custo de
oportunidade ao usar transações de mercado, por não explorar vantagens oligopolistas
no país estrangeiro. Finalmente, existem custos associados com a intervenção do
governo nas transações internacionais, como cotas, tarifas, controle de preços, impostos
diferenciados e outros. Nesta situação a firma escolhe internalizar certas atividades que
pela hierarquia tem os custos mais baixos que os custos de transação que seriam
incorridos se ela usasse o mercado como mecanismo de coordenação (COASE, 1937;
WILLIAMSON, 1975).
2.2 Abordagem comportamental
A abordagem comportamental considera o processo de internacionalização como
dependente de atitudes, percepções e comportamento dos tomadores de decisão, que por
sua vez seriam orientados pela busca de redução de risco nas decisões sobre como e
onde expandir a firma. Essa linha foi desenvolvida na Universidade de Uppsala, um
modelo construído a partir de estudos de casos em grandes empresas suecas, nos anos
1970.
A hipótese básica do modelo de Uppsala é que a falta de conhecimento é um
importante obstáculo para desenvolver operações em mercados de outros países e o
conhecimento necessário para estas atividades pode ser adquirido principalmente na
condução de tais operações (JOHANSON e VAHLNE, 1977).
Desta forma quando se conhece melhor as operações em determinado mercado
externo, a empresa investe e compromete maiores recursos neste mercado, a
internacionalização é, portanto um processo gradual, resultante de decisões
incrementais, representados pelos quatro estágios a seguir: 1) atividades de exportação
não regulares; 2) exportação via agentes de exportação; 3) estabelecimento de uma
subsidiária de vendas no exterior; 4) estabelecimento de uma unidade de produção no
exterior (JOHANSON e VAHLNE, 1977). Esta sequência é conhecida como cadeia de
estabelecimento.
O gestor da empresa não conhece perfeitamente todas as opções de mercado à
disposição antes de experimentar o mercado em questão (JOHANSON e VAHLNE,
97
1990). O modelo assume que existem informações disponíveis a respeito dos custos
envolvidos antes que a empresa escolha qual mercado e qual estrutura adotar. Baseia-se
na racionalidade limitada dos agentes Simon (1965), na sua visão a organização é um
sistema de decisão onde a pessoa participa de forma racional e consciente, escolhendo
entre as alternativas para maximizar vantagens, ainda que com as mesmas informações
disponíveis cada empresa por ser única reaja ao ambiente de forma distinta. O processo
de internacionalização atenua os custos durante o processo de aprendizagem à medida
que as atividades se desenvolvem no exterior (JOHANSON e VAHLNE, 1990).
Em 2006 os autores Johanson e Vahlne revisitaram o modelo de Uppsala
substituíram o conceito chave da teoria original, liability of foreignness, relativo a
distância psíquica,por outro outsidership, construção da confiança, criação do
conhecimento e desenvolvimento do relacionamento por meio de novos
conhecimentos,tornando-se o último o mais relevante, pois é o que determina a
incerteza, afora isto a essência do modelo revisitado permanece.Conforme Eden (2009,
p. 1409, apud TUROLLA, 2007), “o outsidership em relação à rede causa, ao invés de
distância psíquica, a raiz de incerteza e precipita o processo de internacionalização”.
3. O setor de infraestrutura
Conforme Turolla (2007) a indústria de infraestrutura possui uma peculiaridade
que a torna fundamental para o desenvolvimento econômico de qualquer país, qual seja,
sua capacidade de gerar externalidades positivas de várias naturezas, incluindo ganhos
de eficiência para a economia como um todo e vantagens sociais. No caso do setor de
saneamento, as externalidades são notórias. A insuficiência do saneamento está
associada ao desperdício de oportunidades preciosas de redução da pobreza, aumento da
inclusão social e promoção do desenvolvimento econômico.
O setor de infraestrutura caracteriza-se fundamentalmente pela presença de
custos fixos elevados em capital específico (BID, 1997). Tais custos produzem um
dilema econômico entre eficiência produtiva e alocativa, enquanto a especificidade de
capital produz sub-incentivo ao investimento.
A importância relativa dos custos fixos faz com que o conjunto de vetores de
produção relevante recaia sobre a faixa em que o custo médio é declinante. Economias
de escala dessa natureza, quando consideradas em um contexto de monoprodução,
identificam, conforme Baumol (1986), um monopólio natural.
Um monopólio natural surge quando existe a possibilidade de explorar
economias de escala ao longo de um intervalo muito grande de produção. Como
resultado esta escala de eficiência ótima torna-se muito elevada à proporção da demanda
do mercado total do produto ou serviço presente em cada país estrangeiro, organizando
suas operações num local ao invés de uma lógica global, (BONARDI, 2004).
Dada a estrutura de monopólio natural, a maior eficiência produtiva pode ser
conseguida através da operação de um produtor único. Entretanto, as distorções
alocativas resultantes do poder de monopólio precisam ser controladas através de algum
mecanismo (TUROLLA, 2007).
Modernamente, costuma-se usar um conceito mais amplo que o de monopólio
natural, que é o de sub-aditividade de custos, como tratado por Braeutigam (1989).
Neste conceito, a redução de custos com o aumento da produção pode advir do rateio
entre dois ou mais serviços, ou seja, se admite economias relacionadas à multi-
produção. Trata-se do conceito mais amplo que o de monopólio natural, onde não há
necessidade de economia de escala global, bastando que uma firma produza um vetor y
de produtos com custo menor que o somatório dos custos de um conjunto de firmas
(TUROLLA, 2007).
98
Por sua vez, a especificidade do capital tem impacto, principalmente, no
incentivo ao investimento, na medida em que reduz fortemente o valor de revenda dos
ativos após a sua construção ou aquisição. O efeito é ainda mais grave por se tratar de
um setor com volume de investimento requerido bastante superior à média dos demais
serviços públicos. Corrales (1998) reporta estudo do Banco Mundial que aponta uma
relação de ativos necessários para gerar um dólar anual de faturamento como sendo 3-4
em telecomunicações e 7 em rodovias e 10-12 para saneamento. Assim, quando o
investimento é feito pela iniciativa privada, há elevada incerteza em relação à
rentabilidade futura do projeto, que pode ser irreversivelmente comprometida pela
eventual entrada de um concorrente. Adicionalmente, no caso de propriedade privada
dos ativos, o poder de barganha entre o proprietário privado e o governo pode mudar
radicalmente após o investimento ser feito (TUROLLA, 2007).
De acordo com Guasch, Laffont e Straub (2007) cenários típicos são um
governo, local ou regional, decidir de forma unilateral por cortar tarifas ou não honrar
os aumentos acordados durante uma campanha de reeleição para assegurar o apoio
popular. Outra é no cenário de uma nova administração, a decisão de não honrar o
aumento de tarifas
estabelecido no contrato de concessão firmado pelas administrações anteriores.
Empresas em setores regulados enfrentam um grande dilema quando vão se
expandir para o exterior. Por um lado há o estabelecimento teórico e a recomendação de
internacionalização gradual, um modelo de internacionalização assim minimiza riscos e
diminui as incertezas, (Johanson e Vahlne, 1977; Chang, 1994; Rivoli e Salorio, 1996;
Guill´en,2002; Vermeulen e Barkema, 2002), e permite superar a chamada liability of
foreignness (HYMER, 1976; KOSTAVA e ZAHEER, 1995).
Por outro lado a natureza regulada desta indústria pede um grande
comprometimento de recursos e rápida entrada em mercados estrangeiros. Esta situação
é devido a três razões: primeiro estas indústrias tendem a ser altamente concentradas e
elas exibem características de monopólio. Segundo a entrada pode ser restringida pelo
Governo, freqüentemente sob um sistema de licenças. Terceiro o Governo pode possuir
parte significativa da indústria. Algumas das empresas mais ativas em setores regulados
em expansão no exterior são monopólios em que o Estado tem ou teve uma participação
de controle (DOH, TEEGEN e MUDAMBI, 2004).
Nestas circunstâncias os concorrentes estrangeiros enfrentam dificuldades por
comprometer grandes somas de recursos e estabelecer operações de forma rápida,
quando e onde surgir à oportunidade, na forma de aquisições em oposição ao
investimento greenfield, construção de planta industrial no exterior, (Sarkar et al,1999).
Assim regulado, este mercado de natureza oligopolista gera grandes vantagens (DOH et
al, 2004; KNICKERBOCKER,1973).
Conforme Sarkar (1991), as empresas desta indústria seguem uma assimetria
estratégica em que procuram defender a posição do seu país de origem, impedindo as
rivais de competir em condições equitativas e prosseguindo entrada no mercado
estrangeiro, até que ocorra a desregulamentação. Considerando que a
desregulamentação ocorre no tempo em graus diferentes de país para país, empresas em
setores regulados tendem a seguir uma estratégia multidoméstica de expansão
internacional, ou seja, elas ao escolherem um mercado para entrar o fazem em função de
circunstâncias específicas (SARKAR, 1999).
Eliminando-se pelo critério de eficiência produtiva a possibilidade de
competição direta, a obtenção de eficiência alocativa requer o emprego de competição
pelo direito à franquia para servir um determinado mercado, conforme conceito
competição estabelecido por Demsetz (1968), ou ainda um mecanismo de regulação. Na
99
prática é possível combinar as duas alternativas, com a realização de leilões pela
franquia e o estabelecimento de mecanismos de regulação.
3.1 Estratégia de entrada
A empresa que busca desenvolver uma operação internacional fora do seu
entorno geográfico deve escolher o melhor modo de entrada. Variadas pesquisas
relacionadas à entrada em mercados estrangeiros mostraram que há pouco entendimento
por parte da firma com relação à estratégia de análise de custos e benefícios com relação
à decisão de como iniciar sua operação no exterior. No entanto os modos de entrada são
distintos especialmente no que diz respeito às suas relações de custos e benefícios
(ANDERSSON e GATIGNON, 1986).
Quadro 1. Características dos principais de contratos de privatização Tipo de Contrato/
Características
O&M54 Lease BOOT;55
Concessã
o Plena
Asset
Sale56
Duração 2-5 até 10 anos 10 - 15 e
até 25 anos
10 – 30 e até
95 anos
20 – 30 anos Perpétuo
Cliente Governo ou
Municipio
Varejo Governo ou
Municipio
Varejo Varejo
Fluxo de Caixa Taxa fixa
por serviço
Sujeito ao
risco de
mercado
Pago na
conclusão
Sujeito ao
risco de
mercado
Sujeito ao
risco de
mercado
Risco de construção Não se aplica Não se
aplica
Alto Baixo Muito
baixo
Risco regulatório Não se
aplica
Médio Baixo Alto se há
volatidade
política
Muito alto
Propriedade Pública Pública Pública Pública Privada
Investimento Pública Pública Privada Privada Privada
Operação Pública Privada Privada Privada Privada
Recebimento de
tarifa
Pública/privada Privada Pública Privada Privada
Fonte: BIRD (2002).
De acordo com Kogut (2002), o modo de entrada é uma das decisões mais
importantes para a estratégia de crescimento internacional da firma no mercado
estrangeiro, pois esta escolha define o grau de controle que a firma terá sobre a
atividade no exterior e o grau comprometimento de recursos que a firma assume. A
economia globalizada e a rapidez dos acontecimentos tanto econômicos quanto nos
sistemas políticos, fazem com que a empresa análise melhor a questão da vantagem
54 O&M - Operação e Manutenção. A empresa do setor privado opera e mantém os ativos
existentes para um determinado período de tempo, mas não está envolvida no desenvolvimento
desses ativos ou de novas instalações. 55 BOOT - Build-Operate-Transfer. Uma forma de concessão, nesta estratégia de entrada a
firma é contratada para construir uma instalação, geralmente de grande porte, para em seguida
transferir a propriedade para o patrocinador do projeto, que normalmente é o país sede ou
entidade pública. 56 Asset Sale – Venda de Ativos, também conhecido como modelo britrânico. A privatização
completa de serviços de utilidade pública através da venda direta de seus bens e uma licença de
exploração para os acionistas ou para uma empresa do setor privado.
100
competitiva, transmissão de tecnologia, conhecimento e a localização (Anderson e
Gatignon, 1986), com objetivo de compreender a eficácia da escolha do modo de
entrada no exterior.
Empresas multinacionais como as destacada neste estudo costumam valer-se de
investimento direto estrangeiro - IDE, esta estratégia garante um alto controle do
negócio no exterior, ao mesmo tempo em que o comprometimento da empresa com a
operação no exterior é igualmente alto. O IDE possui 2 formatos: participação no capital
e empréstimos intercompanhias.
A participação no capital que representa os ingressos de moeda e as conversões
externas em investimeno estrangeiro direto, considerando-se os valores destinados aos
programas de privatizações relacionados com aquisição, subscrição, aumento de capital,
total ou parcial do capital social de empresa residentes. Empréstimos intercompanhias
compreendem os créditos concedidos pelas matrizes, seadiadas no exterior, as suas
subsidiárias ou filiais estabelecidas no país.
Os tipos principais de IDE são o investimento greefield, fusão, e aquisição. Com
relação ao nível de propriedade no IDE, o controle da propriedade por ser total ou
parcial. As possibilidades variam entre joint venture, participação acionária,
investimento direto integral e consórcios. Notadamente no setor de infraestutura em
saneamento básico prevalece o formato joint venture, seguido de consórcio e
participação acionária.
O quadro resume as características dos principais tipos de contrato do setor de
água e saneamento básico. O contrato do tipo O&M é a operação que envolve menor
risco para ambas as partes, enquanto o lease acarreta maior envolvimento de ambas as
partes se comparado ao O&M, este contrato está sujeito pelo menos aos riscos de
mercado e a dependência de regulação. Os contratos do tipo BOOT são concessão para
construção, portanto, enquanto investimento e operação são privados enquanto a
propriedade e o recebimento de tarifa são públicos, esta combinação resulta em alto
risco de construção, o fato de ser um dos contratos de mais longo prazo potencializa os
riscos, embora sejam os tipos mais utilizado de contrato identificado nesta pesquisa.
A concessão plena é um contrato de alto risco e que está sujeito ao marco
regulátório, por fim o asset sale é o mais radical dos tipos de contrato e também o
menos utilizado. Destaca-se a questão da perpetuidade, observa-se que ocorrem revisões
a cada 25 anos em média, permite que propriedade, investimento, operação e
recebimento de tarifas sejam privados.
A hipótese de Johanson e Vahlne (1977) analisa as empresas que se
internacionalizam de forma gradual, ou seja, iniciando atividades por meio de
exportação, seguido por joint-ventures e operação própria no exterior. A empresa
demonstra um crescente nível de comprometimento de recursos no exterior que
acontece à medida que se tornam mais experientes e ou detêm maior conhecimento
sobre o mercado que estão atuando. Nota-se assim que o comprometimento financeiro
da empresa é um fator que está relacionado ao sucesso da internacionalização das
empresas, assim o comprometimento de recursos cresce à medida que diminui a
distância psíquica entre os mercados (JOHANSON e VAHLNE, 1977; ROOT, 1994).
O tamanho da firma é uma variável considerada nos estudos que tratam da
decisão de escolha do modo de entrada, de acordo com Buckley e Casson, (1976), pois
demonstra a capacidade das empresas de assumir os custos da operação no estrangeiro.
Ainda, o tamanho da firma determina o nível de absorção dos riscos e o grau de
comprometimento de recursos financeiros. Empresas grandes estão mais aptas a
estabelecer modos de entrada com domínio completo da propriedade e ou partilhadas no
101
formato de joint-ventures (TERPSTRA e YU, 1988; AGARWAL E RAMASWANI,
1992).
A teoria institucional, numa abordagem sociológica, amplia a explicação com
relação à decisão do modo de entrada em novos mercados sugerindo que a decisão do
modo de entrada é resultado das pressões isomórficas do ambiente interno e externo
(DIMAGGIO e POWELL, 1983; MEYER e ROWAN, 1977; SCOTT, 1995) apontando
que o ambiente institucional determina o grau de controle da propriedade da empresa.
Nesta teoria a decisão do modo de entrada, deve-se os critérios de legitimidade, ou seja,
as organizações tendem a imitar umas às outras, pois estão em competição por recursos
e clientes, assim imitam para inovar e não perder espaço de mercado, ao poder político e
a legitimidade institucional (DIMAGGIO e POWELL, 1983). Desta forma a empresa
tem a pressão de conformidade originária do país alvo da estratégia de expansão, a
pressão pela busca da legitimidade junto ao ambiente externo, e por fim a pressão da
própria empresa, evidenciada por preferências e práticas internas que já tenham
alcançado êxito (ROSENZWEIG e SINGH, 1991).
O modo de entrada na indústria de saneamento básico reflete o previsto em
Buckley e Casson, (1976) e Williamson (1985), nesta indústria a necessidade de diluir
custos e ganhar escala, impulsiona a firma para realização de grandes investimentos no
exterior, que ocorrem predominantemente com aquisição e fusão, a firma internacional
é guiada pela janela de oportunidade criada no ambiente institucional do país de destino,
para tanto a variável tamanho da firma é determinante na sua capacidade de assumir
riscos no exterior.
3.4 Proposições do estudo
A indústria do saneamento possui características idiossincráticas, notadamente
falhas de mercado, que têm influência sobre os padrões de comportamento dos agentes
setoriais e a dinâmica da indústria, notadamente nos processos de internacionalização.
Como apontam Sarkar, Cavusgil e Aulakh (1999) para o setor de telecomunicações, a
internacionalização das firmas de saneamento têm características singulares, sendo que,
como foi mostrado nas seções anteriores, as falhas de mercado subjacentes são, no setor
de saneamento, ainda mais marcantes que em telecomunicações. Estas especificidades
levam à proposição das seguintes afirmações, que serão avaliadas com base no estudo
do caso das mais importantes empresas internacionalizadas de saneamento no mundo.
Proposição 1A: em função das falhas de mercado e custos de
transação que constituem importantes idiossincrasias do setor, a
sequência de internacionalização das firmas da indústria de saneamento
básico não segue o padrão sequencial de Uppsala.
Proposição 1B. O padrão de internacionalização, na indústria do
saneamento, é definido mais em função de janelas de oportunidade
específicas do que na escolha sequencial de mercados com aumento
sequencial do comprometimento com mercados internacionais a partir da
redução concomitante do risco subjacente.
A teoria dos custos de transação indica que a negociação de operações
internacionais em infraestrutura envolve elevados custos de transação, tanto de natureza
ex ante quanto ex post, assim como uma proporção bastante elevada de ativos
específicos nos projetos de investimento. A irreversibilidade dos investimentos e o
longo período de sua recuperação são falhas de mercado típicas, afetando tanto as
decisões de adjudicação de contratos de infraestrutura quanto às decisões e negociações
bilaterais ao longo da vida do contrato e nos períodos de sua renovação.
102
Proposição 2A. A entrada em mercados internacionais de
saneamento envolve um elevado grau de conhecimento dos mercados
locais dos países hospedeiros. As características institucionais
idiossincráticas são relativas tanto às diferenças entre as jurisdições
nacionais quanto aos elementos culturais e políticos do ambiente
subnacional dos municípios ou regiões em que se realiza o investimento
direto estrangeiro em saneamento.
Proposição 2B. O sucesso na adjudicação de um contrato de
saneamento, nas suas mais variadas formas, implica uma conjugação de
competências de natureza político-institucional com competências
técnicas específicas. As primeiras incluem o capital de relacionamento
político do operador interessado e a observância de regras, formais e
implícitas, bastante específicas ao local de destino. As últimas se referem
ao potencial de eficiência operacional com que um operador pode contar
a partir de seus recursos estabelecidos nas operações atuais e que podem
ser transferidas para o novo ambiente operacional em que deseja se
estabelecer através de investimento direto ou de outras formas de
internacionalização.
4. Metodologia
O recorte deste estudo contempla as empresas mais importantes deste segmento,
no mundo, segundo o ranking da Pinsent Mansons (2010), sendo elas, respectivamente:
Veolia, Suez, Agbar, FCC, United Utilities, ACEA, RWE, Saur, Cascal e Biwater.
O critério utilizado para considerar a sua importância relativa, conforme Pinsent
Mansons (2010), as maiores empresas do cenário mundial, no que tange às atividades de
saneamento básico, é número de clientes atendidos, excluindo-se as empresas não
internacionalizadas57. A análise qualitativa dos dados, que se deu por meio da técnica de
análise de conteúdo, na proposição da busca da construção do caminho de
internacionalização percorrido pelas empresas selecionadas da indústria de saneamento
básico.
O percurso de internacionalização considera: a) região de atuação; ano de início
da operação; c) estratetégia de entrada; d) características contratuais. Os aspectos
contratuais referem-se a) ruptura ou renegociação contratual; b) mercado aberto ou
regulado; c) garantias governamentais; d) lobby; e) bid rigging58.
O recorte que contemplou as maiores empresas deste segmento, no mundo,
considerando o critério de número de clientes. A amostra selecionada equivale as
seguintes 10 empresas: Veolia, Suez, Agbar, FCC, United Utilities, ACEA, RWE, Saur,
Cascal e Biwater, que representavam o atendimento de aproximados 370 milhões de
57 Note-se, por exemplo, que Sabesp não está incluída no ranking por não ter sido
considerada internacionalizada. Essa empresa já possuía operações internacionais mas, na data
base do ranking, atuava fora do país basicamente em consultoria técnica, sem operar
diretamente sistemas no exterior. 58 Bid rigging (anilhamento de propostas): expressão que equivale em português a cartel de
licitação, relaciona-se ao fato de as empresas dividirem sua participação nos processos de
concessão, alternando vencedores para preservar posições de interesse conjunto dos
participantes do cartel.
103
clientes no mundo em 2010, considerando-se que em 2010 o Planeta contava com
aproximados 1,7 bilhões domicílios atendidos com água tratada, segundo dados do
PNUD (2011), nesse sentido, um quinto do fornecimento mundial de água é realizado
pelas empresas selecionadas, número expressivo numa indústria que está que teve o
auge da internacionalização no fim do século XIX.
Quadro 1. Ranking das maiores empresas do mundo
Posição Empresa Milhões de clientes País de origem
01 Veolia 121,97 França
02 Suez 111,49 França
03 Agbar 29,69 Espanha
04 FCC 27,34 Espanha
05 United
Utilities
24,03 Inglaterra
06 ACEA 14, 945 Itália
07 RWE 18, 265 Alemanha
08 Saur 12,97 França
09 Cascal 4, 524 Inglaterra
10 Biwater 0,5 Inglaterra
Fonte: adaptado pela autora de: PNUD (2011).
5. Análise e discussão dos resultados
Em primeiro lugar, entre as dez mais importantes empresas internacionalizadas
de saneamento, o processo de entrada não segue uma linha incremental de redução de
risco à la Uppsala, portanto confirmando a proposição 1A. Na mesma linha,
identificamos que as empresas investem em mercados estrangeiros segundo as janelas
de oportunidade disponíveis nesses mercados, o que confirma a proposição 1B.
Em segundo lugar, verifica-se que a entrada em mercados internacionais de
saneamento envolve elevado grau de conhecimento dos mercados locais dos países
hospedeiros. Para reduzir o custo desse conhecimento, verificamos o estabelecimento
preemptivo de escritórios de representação e a realização de missões de relacionamento
junto a países-alvo. No caso de algumas firmas estudadas, o escritório do operador no
país de destino é estabelecido muito antes da adjudicação ou aquisição no país. Em boa
medida, o estabelecimento desse escritório é um investimento no conhecimento de
mercados locais, sendo que este conhecimento envolve muito mais a busca de parceiros
e o mapeamento das variáveis político-institucionais relevantes do que propriamente a
inspeção dos aspectos técnicos da operação pretendida. Confirma-se, assim, a
proposição 2A.
Adicionalmente, as competências políticas necessárias são obtidas,
principalmente, por intermédio de parcerias locais. Operações sem parceiros locais
apresentam propensão elevada a renegociações contratuais na linha das que foram
identificadas por Guasch, Laffont e Straub (2007). Assim, a proposição 2B se mostra
relevante neste contexto da indústria de saneamento.
Entre os aspectos gerais que podem ser observados na pesquisa, pode-se
mencionar a importância do caráter multiutility na propensão à internacionalização,
assim como na trajetória do processo de internacionalização. The Economist (2004)
destaca que as três maiores empresas da indústria de saneamento pelo critério
multiutility e que atingiram uma fase de excelência, associando atividades elétricas, de
104
gás natural, de água e de saneamento, são: Suez, Veolia e RWE, pertencentes à amostra
selecionada neste estudo.
6. Considerações finais
As abordagens teoricas de origem comportamental, entre elas a mais
significativa é o modelo de Uppsala, não se ajustam de forma plena à
internacionalização das empresas de água e saneamento básico, pois a seqüência de
passos não obedece à menor distância psíquica. O motivo para esta falta de aderência
está nas falhas de mercado do setor de saneamento e nas respostas típicas a essas falhas,
previstas nas teorias de origem econômica, no segmento da organização industrial e na
teoria dos custos de transação. Estas últimas apresentam maior aderência quando se
analise o processo de internacionalização deste segmento. Em particular, a presença de
custos fixos elevados em ativos altamente específicos leva a um tradeoff entre eficiência
alocativa e produtiva, exigindo regulação ou competição pelo mercado, além de
contratos muito longos. Com isto, a entrada de novas empresas se dá, principalmente,
nos períodos de renovação contratual, que constituem janelas de oportunidade limitadas
no tempo. Não há, portanto, mercados disponíveis para entrada baseada em escolha
estratégica de mercados-alvo, o que leva as empresas a não obedecerem à seqüência
típica de passos de Uppsala. O mesmo se observa para as demais teorias de origem
comportamental.
Analisando as trajetórias de internacionalização de 10 empresas: Veolia, Suez,
Agbar, FCC, United Utilities, ACEA, RWE, Saur, Cascal e Biwater observa-se que as
empresas não seguem o gradualismo em termos de etapas seqüenciais, e também não
segue a premissa da empresa de procurar países com menor distância cultural. A análise
aponta para a inadequação de alguns pressupostos dos modelos teóricos dominantes e
para a necessidade de elaboração teórica para suportar a análise dos processos de
internacionalização destas empresas.
A leitura conjunta das duas linhas teóricas de institucionalismo: econômica e
sociológica demonstra maior poder explicativo com relação à decisão do modo de
entrada das organizações empresariais nos países anfitriões, especialmente na estratégia
de internacionalização das empresas de infraestrutura em água e saneamento básico, se
observa que o poder de explicação da decisão dos modos de entrada é maior quando a
teoria institucional é testada em conjunto com a teoria dos custos de transação, assim
podemos concluir que ambiente interno e externo impactam na decisão do modo de
entrada. O processo de internacionalização das empresas de água e saneamento básico é
melhor explicado pelo conjunto formado pela abordagem econômica do custo de
transação e a abordagem sociológica prevista na teoria institucional.
Por outro lado, a analise da internacionalização do conjunto das empresas
representadas neste estudo sugere que os conhecimentos políticos-institucionais são de
alta relevância e que a entrada nos mercados não pode se dar com base apenas em
conhecimentos técnicos específicos. A conjugação dos dois elementos é necessária para
a internacionalização bem sucedida, o que fica patente no elevado número de casos de
quebras contratuais e de fracasso na entrada em países estrangeiros, particularmente em
países latino-americanos. Este aspecto reforça a importância da teoria institucional e da
Economia de Custos de Transação, como diretamente sugerido por Williamson (1985),
na análise de internacionalização das empresas de saneamento. Nessa linha, a
abordagem da internacionalização de empresas de infraestrutura deve incluir elementos
105
de colusão entre concorrentes, corrupção e troca de favores, que estão fortemente
relacionados às competências político-institucionais mencionadas.
Embora sem conclusões firmes, estes resultados ensejam interessantes questões
de pesquisa futura acerca da dinâmica de formação de multiutilities, assim como sobre a
interação entre os diversos segmentos de serviços públicos no portfolio de um operador.
É possível que as economias de escopo intersetoriais desempenhem papel relevante,
assim como o aprendizado institucional obtido em um setor regulado seja relevante na
formação de economias de aprendizagem que criam vantagens para a operação de
outros setores.
Finalmente, é importante notar que a pesquisa sobre internacionalização de
empresas é bastante limitada, e ainda mais limitada no tocante às empresas de
saneamento básico. Essa dissertação procurou contribuir com a análise da trajetória e
das especificidades principais das mais importantes empresas internacionalizadas de
saneamento no âmbito mundial, à luz das principais abordagens e teorias dominantes de
Negócios Internacionais, como o apoio das teorias econômicas e sociológicas.
Desdobramentos interessantes desta pesquisa poderiam ser realizados, por exemplo,
com o tratamento mais detalhado dos casos aqui trabalhados, ou com a proposição de
abordagens quantitativas para o estudo do fenômeno aqui analisado.
7. Referências
AGARWAL, S.; RAMASWAMI, S.N. Choice of foreign market entry mode:
impact of ownership, location and internalization factors, in: Journal of International
Business studies. Michigan [USA], first quarter, pp.1-27, 1992.
ANDERSON, E; GATIGNON, H. Modes of foreign entry: A transaction cost
analysis and propositions. Journal of International Business Studies. Michigan
[USA], v. 17, p. 1-26, 1986.
BARDIN, L. Análise de conteúdo. Lisboa: Edições 70, 1977.
BAUMOL, William J. On Proper Cost Tests for Natural Monopoly in a
Multiproduct Industry. In: BAUMOL, W. J. Microtheory: Applications and Origins.
Cambridge. MA: The MIT Press, 1986.
BID. Private Participation in Infrastructure Projects: Determinants of the
Observed Contractual Arrangements - Terms of Reference. Banco Interamericano de
Desarrolo. Proyecto Red de Centros de Investigación, Anexo A, 1997.
BIRD. Water Supply and Sanitation in PRSP Inititiatives- A Desk Review of
Emerging Experience in Sub-Saharan Africa (SSA). 2002. Disponível em:
http://www.wsp.org/wsp/sites/wsp.org/files/publications/af_prsp.pdf. Acesso em
05/02/2012.
BONARDI J.P. Global and political strategies in deregulated industries: the
asymmetric behaviors of former monopolies. Strategic Management Journal. Chicago
[EUA], 25(2): 101–120, 2004.
BRAEUTIGAM, Ronald R. Optimal Policies for Natural Monopolies. In:
SCHMALENSEE, R. and R. D. Willig (ed). Handbook of Industrial Organization.
Volume II. Elsevier Science Publishers, 1989.
106
BUCKLEY, P. J. The limits of Explanation: Testing the Internalization Theory.
Journal of Internacional Business Studies. Michigan [USA], v.19, n.2, p.181-193,
1988.
BUCKLEY, Peter J. CASSON, Mark. The future of Multinational Entreprise.
Houndmills; Macmillan, 1976.
CAVES, R. E. Multinational Enterprise and Economical Analysis. Cambridge
[UK]: Cambridge University Press, 1982
CAVUSGIL, S. Tamer. On the Internationalization Process of Firms. European
Research. Vol. 8 pp. 273-81.1980.
CAVUSGIL. S. Tamer, KNIGHT, Gary. RIESENBERGER, John R. Negócios
Internacionais: estratégia, gestão e novas realidades. São Paulo: Pearson, 2010.
CHANG, S.J., ROSENZWEIG, M. The choice of entry mode in sequential foreign
direct investment. Strategic Management Journal. Chicago [EUA], 22(8): 747-776,
2001.
COASE, Ronald. The nature of the firm. Economic New Series. v4, pp. 386-405,
1937.
CORRALES, Maria. La regulación en períodos de transición: el caso de los
servicios de agua potable y saniamiento en América Latina. In: Barrionuevo Filho,
Arthur. Lahera P., Eugenio (eds). Qué hay de nuevo en las regulaciones?
Telecomunicaciones, electricidad y agua en América Latina. Eudeba/CLAD, 1998.
DAVIDSON, W. The Location of Foreign Direct Investment Activity: Country
Characteristics and Experience Effects, in: Journal of International Business Studies.
Michigan [USA], outono, pp. 9-23, 1980.
DIB, Luis A; CARNEIRO, Jorge. Avaliação Comparativa do Escopo Descritivo e
Explanatório dos Principais Modelos de Internacionalização de Empresas.
ENANPAD. 2006.
DIKOVAL, Desilava.,WITTELOOSTUIJN, Arjen van. Foreign direct investment
mode choice: entry and establishment modes in transition economies. Journal of
International Business Studies. Michigan [USA], Michigan [USA], (2007) 38, 1013-
1033.
DIMAGGIO, P. J.; POWELL, W. W. The iron cage revisited: Institutional
isomorphism and collective rationality in organizational fields. American Sociological
Review. Washington, DC [EUA], v. 48, p. 147-160, 1983.
DOH, J.P; TEEGEN, H; MUNDAMBI, R. Balancing private and state ownership in
emerging markets’ telecommunications infrastructure: country, industry, and firm
influences. Journal of International Business Studies. Michigan [USA], 35: 233–250,
2004.
107
ERRAMILLI, M.K.; RAO, C.P. Choice of foreign market entry modes by service
firms: role of market knowledge, in: Management International Review. Kiel
[Germany]: Universität Kiel,, 30,(2), pp. 135-150, 1990.
GATIGNON, H; ANDERSON, E. The multinational corporation's degree of control
over foreign subsidiaries: an empirical test of a transaction cost explanation. Journal of
Law Economics and Organization. Chicago [EUA], University of Chicago Press, 4
(2): 305-337.1988.
GOMES-CASSERES, B. Ownership structure of foreign subsidiaries: Theory and
evidence. Journal of Economy Behavior and Organization. Knoxville, TN [USA],
University of Tennessee: Dept. of Economics, v. 11, p. 1-25, 1989.
GUASCH, J.L., LAFFONT, J. J.; STRAUB, S. Concessions of Infrastructure in
Latin America: Government Led Renegotiation. Journal of Applied Econometrics, 27
(2007), pp. 1267–1294.
HEMAIS, C. A.; HILAL, A. Teorias, Paradigma e Tendências em Negócios
Internacionais: de Hymer ao empreendedorismo. In: HEMAIS, C. O. O desafio dos
mercados externos. Rio de Janeiro: Mauad, 2004, p. 17-39.
HENNART, Jean François e Larimo.The impact of culture on the strategy of
multinational enterprises: does national origin affect ownership decisions? Michigan
[USA], 29 (3): 515-538 1998.
HENNART, Jean François.The transaction costs theory of joint ventures: an
empirical study of Japanese subsidiaries in the United Sates. Management Science, 37
(4): 483-497, 1991. Disponível em: <http://mansci.journal.informs.org/>. Acesso em 20
de novembro de 2011.
HENNART, Jean François; PARK, Y. R. Greenfield vs. Acquisition: The strategy
of Japanese investors in the United States. Management Science, v. 39, p. 1054-1070,
1993. Disponível em: <http://arno.uvt.nl/show. cgi?fid=44231>. Acesso em 20 de
novembro de 2011.
HYMER, Stephen. The internationals operations of national firms: a study of
direct foreign investment 1960. Tese (Doutorado). Cambridge: MIT Press, 1976.
JOHANSON, J.; MATTSON, L. G. Internalization in Industrial System: a network
Approach. In: HOOD, N. VAHLNE, J.E. Strategies in Global Competition. London:
Croom Helm, p.287-314, 1998.
JOHANSON, J.; WIEDERSHEIM-PAUL, F. The internationalization of the firm:
four Swedish cases. Journal of Management Studies. Michigan [USA], v. 12, p. 305-
22, 1975.
JOHANSON, Jan; VAHLNE, Jan-Erick. Commitment and Opportunity
Development in the Internationalization Process: A Note on the Upsalla
Internationalization Process Model. Management International Review, Vol. 46.
P.165-178, 2006.
108
JOHANSON, Jan; VAHLNE, Jan-Erick. The internationalization process of the
firma model of knowledge development and increasing foreign market commitments.
Journal of International Business Studies. Michigan [USA], 8(1): 23–32, 1977.
JOHANSON, Jan; VAHLNE, Jan-Erick. The mechanism of Internationalization.
International Marketing Review. Scotland [UK]: Westburn Publishers Ltd, Vol. 7 Iss:
4 Publisher: MCB UP Ltd, 1990.
KOSTOVA, T.; ZAHEER, S. Organizational legitimacy under conditions of
complexity.Academy of Management Review.New York, v. 24, p. 64-81, 1999.
KNICKERBOCKER, F.T. Oligopolistic Reaction and Multinational Enterprise.
Harvard University Press: Cambridge, MA.1973.
KOGUT, B. Internacional Management and Strategy. In: THOMAS, H.P.;
ANDREW M.; WHITTINGTON, RICHARD. Handbook of Strategy and Management.
Londres: Sage Publications Inc, 12, p.261-278, 2002.
MARIOTTO, Fábio. L. Estratégia Internacional da Empresa. São Paulo:
Thomson Learning. 2007.
MEYER, J. W.; ROWAN, B. Instiutionalized organizations: Formal structure as
myth and ceremony. American Journal of Sociology. Chicago: University of Chicago
Press, v. 83, p. 340-363, 1977.
MICHALET, Charles-Albert. O capitalismo mundial. Rio de Janeiro: Paz e Terra,
1983.
NORTH, Douglass. C. Institutions, institucional change and economic
performance. Cambridge, UK: Cambridge University Press, 1990.
NORTH, Douglass C. Institutions, institutional change, and economic performance.
New York: Cambridge University Press, 1990a. __ "A Transactions Cost Theory of
Politics." Journal of Theoretical Politics, 1990b, 2(4), pp. 355-67.
OLIVEIRA, A. V. M.; TUROLLA, F. A. Financiamento da Infraestrutura de
Trasnportes. Journal of Transport Literature. Manaus, AM: Faculdade de
Tecnologia- FT. Núcleo Interinstitucional de Pesquisas e Estudos em Transporte,
Logística e Construção Naval na Amazônia. JTL/RELIT. Vol. 7, n.1 (2013), [no prelo].
PENROSE, E. The theory of the growth of the firm. Oxford: Basil Blackwell,
1959.
PINSENT MANSONS Water Year Book 2009-2010. The essential guide to the
water industry from leading infrastructure Law firm Pinsent Mansons. London:
Pinsent Mansons, 2010. Disponível em:
http://wateryearbook.pinsentmasons.com/PDF/Water%20Yearbook%202009-2010.pdf.
Acesso em 08/11/2011.
PINSENT MANSONS Water Year Book 2007-2008. The essential guide to the
water industry from leading infrastructure Law firm Pinsent Mansons. London:
109
Pinsent Mansons, 2008. Disponível em:
http://wateryearbook.pinsentmasons.com/pdf/Water%20Yearbook%202007-2008.pdf
Acesso em 08/07/2011.
PNUD (2011). Human Development Report 2011 - Sustainability and Equity: a
Better Future for All. PNUD – Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento.
Nova Iorque: PNUD, 2011. Disponível em:
http://hdr.undp.org/en/media/HDR_2011_EN_Complete.pdf. Acesso 10/10/2011.
RECEITA FEDERAL. O Investimento Direto Estrangeiro. Disponível em:
http://www.receita.fazenda.gov.br/aduana/IDE/IDEBrasilCuba/ide.htm. Acesso em
20/12/2011.
REZENDE, S. F. Internationalization processes: an analytical framework. In:
Revista de Ad-ministração Contemporânea, 2003, v. 7, n. 3, p. 137-156.
RIVOLI, Pietra., SALORIO, Eugene. Foreign Direct Investment under Uncertainty.
Journal of Internationals Business Studies. Michigan [USA], 1996.
ROHMANN, C. O livro das idéias: um dicionário de teorias, conceitos, crenças
e pensadores, que formam nossa visão de mundo. 2 ª ed. Rio de Janeiro: Campus,
2000.
ROOT, F. R. Entry Strategies for International Markets. New York: Lexington,
1994.
ROSENZWEIG, P. M.; SINGH, J. V. Organizational environments and the
multinational enterprise. Academy of Management Review. New York, v. 16, p. 340-
361, 1991.
SANTOS, Boaventura de Sousa. Um discurso sobre as ciências. 6ª ed. São Paulo:
Cortez, 1987.
SARKAR, MB; CAVUSGIL, Tames; ALUAKH, Prett. International expansion of
telecommunications carriers: the influence of market structure, network characteristics
and entry imperfections. Journal of International Business Studies. Michigan [USA],
30: 361–382. 1999.
SCOTT, W. R. Institutions and organizations. London: Sage, 1995.
TERPSTRA, V., YU, C. Determinants of Foreign Investment of U.S. 1998. Journal
of International Business Studies. Michigan [USA], primavera, pp. 33- 47, 1998.
Disponível em: <http://www.jstor.org/pss/154985>. Acesso em 21 de novembro de
2011.
THE ECONOMIST. The flood dries up. Life is not easy for the three-biggest
private-sector water. The Economist, página 55, 2004.
TUROLLA, 2002. Política de Saneamento Básico: Avanços Recentes e Opções
Futuras de Políticas Públicas. Brasília: IPEA, 2002.
110
TUROLLA, Frederico. Pontos para uma Discussão sobre Eficiência e Regulação em
Saneamento. In Ohira, T.H. Regulação e Concorrência no Brasil: Governança,
Incentivos e Eficiência. Rio de Janeiro: Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada
(IPEA), 2007.
TUROLLA, Frederico Araujo; PAIVA, André Ricardo Noborikawa; MONTEIRO,
Érika Roberta. Internacionalização de empresas de infra-estrutura. Internext –
Revista Eletrônica de Negócios Internacionais, São Paulo, v. 4, n. 1, p. 40-59, jan./jul.
2009.
VERMEULEN, F; BARKEMA, H. Pace, rhythm, and scope: process dependence in
building a profitable multinational corporation. Strategic Management Journal.
Chicago [EUA], 2002.
WELCH, L. S.; LUOSTARINEN, R. Internationalization: Evolution of a Concept.
Journal of General Management. Henley-on-Thames [UK]. The Braybrooke Press
Ltd., v.14, n.2, p.34, 1988.
WILLIAMSON, Oliver Eugene. As Instituições Econômicas do Capitalismo. São
Paulo: Pezco Editora, 2012.
WILLIAMSON, Oliver Eugene. Transaction Cost Economics: The Governance of
Contractual Relations, Journal of Law and Economics. Chicago [EUA], 1979.
WILLIAMSON, Oliver Eugene. Corporate Finance and Corporate Governance.
Jstor Journal of Financial. Vol. XLIII. N3. 1988.
WILLIAMSON, Oliver. Markets and hierachies, analysis and antitrust
implication: A study in the economics of internal organization. New York: The Free
Press, 1975.
WILLIAMSON, Oliver. The economic institutions of capitalism: firms, markets,
relational contracting. New York: The Free Press, 1985.
WILSON, B. D. The Propensity of Multinational Companies to expand through
acquisitions. Journal of International Business Studies. Michigan [USA], 11: p.59-
65, 1980.
111
A POLÍTICA DE OFFSET E O BRASIL: PERSPECTIVAS DA CONSTRUÇÃO
DE UMA AGENDA DE POLÍTICA DE TRANSFERÊNCIA TECNOLÓGICA
DE DEFESA À LUZ DA EXPERIÊNCIA INTERNACIONAL
Luiz Guilherme de Oliveira59
Resumo O objetivo deste trabalho é subsidiar a formulação de políticas públicas
relacionadas a transferência de tecnologia através de mecanismos de offset. Como
objetivos específicos procuramos observar e comparar a experiência internacional da
“política de offset ” a partir de alguns países selecionados e traçar um fio condutor de
“boas práticas” de “políticas de offset” a partir da experiência internacional.
Introdução
Este trabalho busca descrever e contextualizar a questão da “política de offset” no
Brasil. Para isso, destaca-se a importância estratégica da agenda tecnológica para o setor
de defesa nos países, em especial os países de desenvolvimento tardio e de importante
relevância econômica (ex. Brasil). Dois aspectos importantes, e complementares, da
indústria de defesa no Brasil devem ser ressaltados: i) o papel da indústria de defesa no
Brasil, como destaque o potencial exportador desta indústria, ii) a necessidade de
autonomia tecnológica para o setor de defesa considerando a agenda de defesa nacional.
Neste contexto verifica-se o histórico e a trajetória da indústria de defesa no país e a
utilização da política de offset, destaque para o setor aeronáutico, como mecanismo de
indução tecnológica.
Metodologia
Inicialmente buscou-se uma perspectiva histórica dos números de produção do
setor de defesa no Brasil e no mundo. As fontes e dados são diversos sendo observados:
i) dados secundários a partir de trabalhos de pesquisadores no Brasil, do Stockholm
International Peace Research Institute (SIPRI) e do Institute of War and Peace da
Universidade de Columbia (SIWPS); ii) dados primários a partir do Ministério da
Ciência, Tecnologia e Inovação (MCTI), Ministério do Desenvolvimento Indústria e
Comércio (MDCI) e Ministério da Defesa (MD). A ideia é contextualizar a trajetória da
indústria, e do mercado de defesa no Brasil. Posteriormente, estes números irão auxiliar
a análise do peso deste setor na balança comercial brasileira, o objetivo é deixar claro a
importância econômica do setor para o país.
Na sequência, buscaremos um histórico da “política de offset” no Brasil, a partir
de final da década de 60. O objetivo desta etapa é buscar mapear a trajetória da
utilização da “política de offset” ao longo das últimas cinco décadas, a fim de se buscar
localizar a existência, ou não, de uma lógica na utilização deste instrumento, offset, para
o desenvolvimento do parque industrial e tecnológico de defesa no país.
59 Professor da Universidade de Brasília (UnB) e Pesquisador do CEAG. O autor agradece
os comentários e contribuições da Profa. Susan Elizabeth M.C. de Oliveira, Prof. Eduardo
Freitas e do pesquisador Luciano Souza. Erros ou equívocos são de responsabilidade do autor.
112
Na seção seguinte, a experiência internacional, o objetivo é observar de que
maneira alguns países selecionados lidam com a agenda “política de offset”. Para a
seleção dos países serão considerados aspectos relacionados a importância do países no
contexto de transferência ativa de tecnologia. Inicialmente pensou-se em buscar os
países inseridos no bloco de países emergentes sob a descrição de BRICS (Brasil,
Rússia, China, Índia e África do Sul) entretanto, constatou-se que a maioria destes
países são pouco ativos na agenda de transferência tecnológica via política de offset.
Desta forma, buscou-se elencar alguns países que possuem papel relevante na agenda
“política de offset”, também buscou-se países que, embora não sejam grandes players no
segmento de transferência tecnológica, possuem uma tradição neste tipo de ação
(Estados Unidos, Canadá, Itália, Suécia, Reino Unido, Índia e Espanha). Por fim, foi
verificado, brevemente, de que maneira a discussão da “política de offset” esta sendo
analisada no âmbito da Organização Mundial do Comércio (OMC).
Esgotada a observação dos países selecionados foi construída uma matriz para
comparação das “políticas de offset” adotadas por estes países. As variáveis foram
selecionadas após a fase de coleta de dados. As bases de dados selecionadas foram:
Organização Mundial do Comércio (OMC), Orgãos de Estado do países selecionados
(Estados Unidos, Canadá, Itália. Suécia, Reino Unido, Índia e Espanha), dados
secundário do Stockholm International Peace Research Institute (SIPRI) e do Institute
of War and Peace da Universidade de Columbia (SIWPS).
Na última seção são tratados as conclusões do trabalho.
Mercado internacional de defesa
O comércio internacional de equipamentos de defesa atingiu o pico em 1982,
com US$ 46,4 bilhões transacionados. Com o declínio da União Soviética e fim da
guerra fria, houve uma significativa redução dos investimentos na área de defesa, com
as exportações reduzindo-se para US$ 17,9 bilhões em 2002. A partir de então tem
havido um reaparelhamento das forças armadas em diversos países, com as exportações
atingido um valor de US$ 30 bilhões em 2011, um aumento de 55,75% em comparação
a 2002. Conforme pode ser observado na Figura 1, os aviões sempre representaram uma
parte significativa do comércio internacional no segmento defesa, tendo correspondido à
52,71% do montante transacionado em 2011.
Figura 1 – Comércio internacional de equipamentos de defesa
Dados originais: (SIPRI, 2012). Valores expressos em US$ à preços constantes de 1990.
113
Uma característica dos produtos e equipamentos de defesa é que estes não se
restringem a um setor específico, portanto não podem ser facilmente identificados a
partir de classificações normalmente utilizadas no comércio internacional, como o
Harmonized System Code, ou a Nomenclatura Comum do Mercosul (NCM). Também
deve ser considerado algumas idiossincrasias relacionadas entre a metodologia utilizada
pelo MDIC e pelo SIPRI60.
Figura 2 – Balança comercial brasileira – equipamentos relacionados ao
segmento de defesa
Fonte: MDIC (2012)
Obs: dados de 2012, referentes ao período de 01 à 09/2012.
Historicamente, é possível constatar que o Brasil ocupou uma posição de
destaque entre os países produtores de equipamentos de defesa61. Atualmente, o quadro
apresentado indica que a exportação de armas e munições saltou de US$ 60 para US$
292 milhões de 1997 à 2011, com um crescimento de 274,13%, mantendo um saldo
positivo significativo. Os equipamentos de radar foram aqueles que representaram
60 Comparando dados do MDIC, referentes à exportação e importação, com os dados do
SIPRI, observa-se diferenças significativas. Como os dados do MDIC são os dados estatísticos
oficiais referentes ao comércio exterior brasileiro, foi realizada uma análise destes dados, nas
classificações relacionadas ao segmento de defesa, a partir dos códigos NCM: 93 - armas e
munições, suas partes e acessórios; 8526 - Aparelhos de radiodetecção e de radiossondagem
(radar), aparelhos de radionavegação e aparelhos de radiotelecomando; 8710 - Veículos e carros
blindados de combate e suas partes; 8805 - Aparelhos e dispositivos para lançamento de
veículos aéreos; aparelhos e dispositivos para aterragem de veículos aéreos em porta-aviões e
aparelhos e dispositivos; e 8906.10 - Navios de guerra. Ressalva-se que não foi analisada a
destinação dos equipamentos importados ou exportados, podendo os mesmos serem utilizados
para fins civis. Mas, como a correlação destes equipamentos com o segmento de defesa é
relevante, optou-se por avaliar estes dados, que são mais precisos que os levantamentos feitos
por instituições como o SIPRI (nos levantamentos utilizados pelo SIPRI, existem vários
critérios, como o uso para o exercício da função de Defesa Nacional).
61 O Brasil já foi o 8º maior exportador mundial de equipamentos de defesa (ABDI, 2010).
114
maiores impactos na importação, impulsionados pelo Sistema de Vigilância da
Amazônia (SIVAM). Para os demais equipamentos os números são relativamente
baixos, tanto na importação quanto na exportação.
Na NCM não são segmentados aviões para uso civil ou de defesa, a
diferenciação dá-se pelo tipo de motorização: hélice, turboélice ou turbojato; e pelo
peso: inferior à 2t, entre 2t e 7t, entre 7t e 15 t e acima de 15t. O valor total de
exportação dos segmentos analisados como relacionados com o setor de defesa, entre 01
e 09/2012 foi de US$ 323 milhões, de um total de 180,5 bilhões exportados pelo país,
correspondendo à 0,18%.
Histórico da política de “offset tecnológico” no Brasil
O histórico da política de offset tecnológico no Brasil remonta aos anos 1950,
quando a Aeronáutica adquiriu aviões Gloster Meteor TF-7 e F-8 ingleses. Naquela
ocasião, a compensação foi do tipo comercial, com o Brasil entregando algodão ao
Reino Unido.
Em 1974, a Aeronáutica utilizou mais uma vez o offset na aquisição aviões F-
5E. Desta feita, a compensação foi do tipo “transferência de tecnologia” ou “offset
tecnológico”, materializada pela instalação de uma linha de produção e montagem de
estabilizadores verticais e de pilones das aeronaves F-5E pela Embraer. Nesse processo,
algumas tecnologias importantes, tais como materiais compostos (honeycomb bonding),
de tratamentos térmicos e de usinagens especiais foram absorvidas pela empresa e,
posteriormente, usadas nos projetos das aeronaves nacionais EMB-Xingu e EMB-120
Brasília.
Em 1976 foi ativado o Centro Integrado de Defesa e Controle do Tráfego Aéreo
- Cindacta I, à empresa francesa Thomson. Nessa operação, a aeronáutica empregou
offset do tipo “compensação comercial”, por meio da qual a França adquiriu 41
aeronaves Xingu, para a força aérea daquele país.
Em 1979, o Ministério da Aeronáutica, juntamente com a empresa brasileira
Aeromot, entabularam negociações com as empresas Boeing, americana, e Airbus,
europeia, para que as poltronas das aeronaves vendidas ao Brasil fossem produzidas
pela empresa Aeromot. Para tanto, as empresas estrangeiras deveriam transferir a
tecnologia de produção dessas poltronas, incluindo processo de fabricação e
treinamento, o que se caracterizou como “offset tecnológico”.
Ao longo dos anos 1970 e 1980, o Centro Tecnológico da Aeroespacial (CTA),
por intermédio do seu Instituto de Fomento e Coordenação Industrial (IFI),
implementou diversas ações de “offset tecnológico”, visando principalmente a
fabricação de componentes de aeronaves no país, incluindo motores. Essa ação
favoreceu o desenvolvimento de inúmeras empresas do setor aeroespacial.
Em 1988 o Exército Brasileiro adquiriu 52 helicópteros, sendo 36 AS 365K-
Pantera e 16 HB 350L1-Esquilo, ambos os modelos fabricados pela empresa francesa
Aeroespatiale. A compensação incluída como offset contemplou o seguinte: exportação
de 50 aviões Tucano da Embraer para a França, em valor superior a US$100 milhões;
exportação de máquinas agrícolas; transporte das aeronaves por empresas brasileiras;
modernização da empresa Helibrás (fabricante de helicópteros); instalação da empresa
Turbomeca de manutenção de turbinas; realização de capacitação de pilotos, instrutores,
mecânicos de voo, de elétrica, de aviônica, de estruturas, de motores, de hidráulica e de
inspetores, dentre outros itens.
Em 1992, o contrato de aquisição de aeronaves MD-11 pela Varig contemplou o
“offset tecnológico” de transferência de tecnologia para fabricação, pela Embraer, de
conjuntos de flaps, incluindo o treinamento necessário. O contrato contemplou,
115
também, offset comercial, com a venda de aviões EMB-120 Brasília para os Estados
Unidos da América.
Em 1991 e 1992, O Ministério da Aeronáutica aprovou a sua Política de
Compensação Comercial, Industrial e Tecnológica, bem com a Diretriz 360-1, que
regulava a política de compensação comercial. Esses documentos possibilitaram a
inclusão de offset em praticamente todos os projetos posteriores da Aeronáutica, tais
como: modernização dos aviões F-5BR; aquisição de aeronaves de caça (F-X);
aquisição de aeronaves de transporte (CL-X); aquisição de aeronaves de patrulhamento
marítimo (P-3BR); aquisição de sistemas e sensores; e a modernização das aeronaves
A-1M.
Em 27 de dezembro de 2002, foi aprovada a Política de Compensação
Comercial, Industrial e Tecnológica do Ministério da Defesa, por intermédio da Portaria
Normativa n.º 764/MD, que, com isso, passa a assumir a coordenação estratégica das
compensações em benefício da indústria de defesa, a partir das importações de sistemas
e equipamentos pelas Forças Armadas.
As experiências recentes sobre “offset tecnológico” tem se pautado pelas ações
de readequação de equipamentos de uso das três forças.
Em 2008, o Exército Brasileiro (EB) decidiu desenvolver e fabricar uma nova
Viatura Blindada de Transporte de Pessoal Média de Rodas (VBTP-MR), tendo sido
escolhida, após licitação, a empresa italiana Iveco. Como “offset tecnológico”, a viatura
deverá ser desenvolvida e fabricada no Brasil, em conjunto com pessoal do próprio
Exército. Para isso, uma nova linha de montagem foi instalada na cidade de Sete
Lagoas-MG. Dessa forma, espera-se que a tecnologia seja transferida para o Brasil.
Em 2011, o EB adquiriu um conjunto de rádios de comunicações de campanha
da empresa Harris e, como “offset tecnológico”, contemplou a transferência de
tecnologia por meio da montagem dos equipamentos em instalações do Centro de
Comunicações e Guerra Eletrônica do Exército (CComGEx), além de treinamento do
pessoal do próprio Exército em técnicas de fabricação e manutenção dos rádios.
A Marinha do Brasil vem conduzindo o projeto de aquisição de um submarino
nuclear francês da classe Scorpene. O contrato previu como “offset tecnológico” a
transferência de tecnologia de construção de submarinos, por meio de capacitação e
desenvolvimento conjunto.
Disciplinas da Organização Mundial do Comércio acerca de offset
A Organização Mundial do Comércio (OMC), no Artigo XVI do Acordo de
Compras Governamentais62 (ACG) proíbe, como regra geral, o uso de offsets63. O
Acordo, no entanto, abre duas importantes exceções a esta proibição, autorizando a
prática de offset nos seguintes casos:
i) Tratamento especial e diferenciado para países em desenvolvimento. Segundo
o Artigo XVI:2 do ACG, países em desenvolvimento podem negociar, no momento de
seu acesso ao Acordo, condições para o uso de offsets, garantindo que só serão usados
como qualificação para participar do processo de compra, e não como critério para
concessão de contratos;
62 The Agreement on Government Procurement (GPA), art. XVI(1) n.7, Apr. 15, 1994,
Marrakesh Agreement Establishing the World Trade Organization, Annex 4(b) 1994 disponível
em [ http://www.wto.org/english/docs_e/ legal_e/gpr-94_02_e.htm. 63 A definição de offset que consta no Acordo é a de que “offsets em compras
governamentais são medidas usadas para encorajar o desenvolvimento local ou aperfeiçoar as
contas de balanço de pagamentos por meio de conteúdo doméstico, licença de tecnologia,
requisitos de investimentos, comércio recíproco ou requisitos similares”.
116
ii) Compras governamentais relacionadas à segurança nacional, ou para fins
de defesa, como explicitado no Artigo XXIII:164.
É comum o entendimento da comunidade internacional sobre a permissão sob o
ACG da prática de offset para o setor de defesa. É importante ressaltar, no entanto, que
o ACG, apesar de emanado da Rodada Uruguai, é um acordo plurilateral (não fazendo
parte do “single-undertaking” da Rodada), sendo que o Brasil não é signatário do
Acordo65.
Política de offset “ofertante”
Iniciativa internacional para limitar os efeitos adversos do offset em compras do
setor de defesa
Em 2004, o governo dos Estados Unidos estabeleceu um grupo de trabalho
interministerial para iniciar um processo de diálogo com outros países e organismos
internacionais para discutir os impactos adversos do offset em compras do setor de
defesa. Esta iniciativa tem como principais objetivos: (i) promover o entendimento
global sobre como os diferentes tipos de offset impactam a base industrial; (ii) encorajar
o desenvolvimento de princípios globais para limitar os impactos negativos dos offsets;
e (iii) encorajar os países a dar o máximo de flexibilidade para o cumprimento dos
requisitos de offset.
Desde 2007, o grupo de trabalho vem adotando uma abordagem em duas vias
paralelas:
1) engajamento de outros países provedores de offset que possuam visões
similares às americanas para construir consenso e avançar objetivos comuns, para
alavancar esforços conjuntos de provedores de offset com demandantes de offset;
2) engajamento bilateral com países demandantes de offset para encorajar a
flexibilização de demandas de offset. O grupo de trabalho também busca o engajamento
de organizações multilaterais, assim como o diálogo contínuo com a Agência Europeia
de Defesa (EDA), a Comissão Européia (EC), e a Organização do Tratado do Atlântico
Norte (OTAN).
Estados Unidos e Offset
A política do Governo dos Estados Unidos sobre offset no comércio de
produtos de defesa considera que o offset seja uma prática “economicamente
ineficiente e distorciva ao comércio 66 ”, e proíbe qualquer Agência do governo
americano de encorajar, entrar diretamente em, ou comprometer firmas americanas em
qualquer arranjo de offset em conexão com a venda de artigos ou serviços de defesa
para governos de outros países. No entanto, na prática, as empresas dos Estados Unidos
argumentam que na realidade do mercado de empresas competindo em processos
internacionais de defesa, os offsets são geralmente necessários para a concretização da
venda.
64 “Nada neste acordo deve ser interpretado como impedindo uma parte de tomar qualquer
ação ou de não divulgar as informações que considere necessárias para a proteção dos seus
interesses essenciais de segurança relacionados com a aquisição de armas, munições ou material
de guerra, ou para compras indispensáveis à nacional segurança ou para fins de defesa
nacional”. 65 Atualmente, o acordo possui 41 países signatários. 66 Defense Production Act Amendments of 1992 (Pub. L. 102-558, Title I, Part C, §123)
117
Segundo dados do “16th Relatório sobre Offset no Comércio de Defesa”,
elaborado pelo Departamento de Comércio dos Estados Unidos, durante o período de
1993 a 2010, 52 empresas americanas reportaram terem participado de 763 contratos de
offset relacionados à exportação de artigos e serviços de defesa, no valor de US$ 111
bilhões, com 47 países. Os acordos de offset associados aos contratos responderam por
78 bilhões.
União Europeia e Offset
Em agosto de 2011 entrou em vigor na União Europeia uma Diretiva sobre
Compras Governamentais de Defesa. A diretiva visa trazer para a égide do Acordo da
União Europeia o comércio no setor de defesa. Apesar da Diretiva não usar
explicitamente o termo “offset”, guias publicados pela CE atestam que offsets não
seriam permitidos em compras realizadas segundo as regras da Diretiva. Se um Estado-
membro pretender impor obrigações de offset na aquisição de artigos de defesa, terá de
invocar o artigo 346 do Tratado da União Europeia (exceção de segurança nacional).
Considera-se que entrada em vigor da Diretiva, possa potencialmente reduzir o uso de
offset na Europa.
Ademais, a Agência Europeia de Defesa (EDA), em 2009, estabeleceu um
“Código de Conduta para Offset”, assinado por todos seus membros, exceto a Romênia.
Este Código se aplica quando um membro invoca o Artigo 346 do Tratado da União
Europeia, situação em que a diretiva sobre compras governamentais de defesa deixa
de ser aplicada. Segundo o Código, os offsets requeridos ou aceitos por Estados
membros não poderão exceder o limite do valor do contrato (limite de 100% para
offset). Além disso, prevê que os offsets deverão ter um peso inferior nos editais de
licitação (ou usados como critérios subsidiários naquelas ofertas de mesmo peso), para
assegurar que a decisão de compra seja baseada na melhor solução disponível, que traga
maiores vantagens econômicas. Por fim, o Código dispõe que os Estados-membros
permitirão que os licitantes internacionais selecionem seus parceiros ou receptores do
118
offset dentro do país comprador, propiciando uma competição justa e aberta dentro das
cadeias de fornecedores. Apesar do Código ser não-vinculante, segundo a EDA seus
membros geralmente adotam as disposições estabelecidas pela Agência.
Política de offset “demandante”
A análise sobre a política de offset foi estruturada a partir da verificação das
práticas adotadas pelos países selecionados 67 (ver quadros 1 a 3). As variáveis
consideradas estão organizadas da seguinte forma: Quadro 1 – base legal, autoridade
responsável, objetivos e período de execução; Quadro 2 – exigências, multiplicadores,
offset direto/indireto, atividades elegíveis; Quadro 3 – setores elegíveis, seleção de
receptores, monitoramento.
Quadro 1
No que diz respeito a base legal é possível verificar que todos os países
selecionados, a exceção da Itália, possuem um marco legal específico para a agenda
relacionada à offset. Em alguns casos (ex. Canadá e Reino Unido) o marco legal busca
convergir com a política industrial do país. Chama a atenção o fato da autoridade
responsável pela política de todos os países citados, exceção do Canadá, vincularem
suas políticas de offset com seus Ministérios da Defesa, por vezes atuando em
convergência outros departamentos vinculados a políticas industriais e tecnológicas,
como exemplo é possível destacar o Reino Unido na relação entre Ministério da Defesa
e Departamento de Comércio e Investimento. A proximidade entre os ministérios de
defesa e a agências de fomento industrial fica clara ao se observar os objetivos descritos
pelas políticas que focam essencialmente o fortalecimento da indústria local de defesa
através de acesso a tecnologias, ou ainda via acesso à novos mercados externos. No
tocante ao período do contrato, na maioria dos casos, com exceção da Índia, é
respeitado o período de vigência do contrato.
Quadro 1 – Comparativo de Políticas de Offset – países selecionados (parte 1)
Canadá Espanha Índia Itália Reino Unido Suécia
Base legal Política
Industrial e de
Benefícios
Regionais para
Grandes Projetos
da Coroa
(Industrial and
Regional
Benefits Policy
for Major Crown
Projects -1986)
Diretiva do
Secretario de
Estado de
Defesa
Revised Defense
Offset
Guidelines
(2012), anexo ao
Defence
Procurement
Procedure ,
publicado em-
2011
Não há
política de
offset formal.
Diretivas
internas da
Secretaria
Geral de
Defesa.
Offsets
aplicados em
cada licitação
caso a caso.
Política de
Participação da
Indústria
(Industry
Participation
Policy - 2003),
revista de
acordo com a
Estratégia
Industrial de
Defesa (2007).
Lei de
Compras
Governamentais;
Programa de
Participação
Industrial
(Industrial
Participation
Programme -
1999).
Autoridade
responsável
Ministério da
Indústria
(Industry
Canada) em
conjunto com
agencias de
desenvolvimento
Ministério da
Defesa
(National
Armaments
Director)
com o apoio
da Agência
Ministério da
Defesa (Ministry
of Defense –
Defense Offsets
Management
Wing e
Acquisition
Ministério da
Defesa
(Diretor
Nacional de
Armamentos)
Ministério da
Defesa
(Ministry of
Defense -
responsável pela
política ) e
Departamento
Ministério da
Defesa (FMV).
O Ministério é
obrigado a
consultar as
Forças Armadas
para decidir
67 Canadá, Espanha, Índia, Itália, Reino Unido e Suécia.
119
regional de
Cooperação
Industrial
(uma
empresa
pública,
liderada pelo
Secretário de
Estado para
Defesa,
possuindo
também
representação
do Ministério
da Ciência e
Tecnologia) .
Wing) do Comércio e
Investimento
(Department of
Trade and
Investment -
Defense and
Security Group
- responsável
pela
implementação).
sobre a
aplicação do
offset em
processos
licitatórios de
defesa
específicos.
Objetivos Desenvolvimento
industrial de
longo prazo;
desenvolvimento
de pequenas
empresas;
desenvolvimento
regional
Desenvolver
uma base
industrial de
defesa
competitiva;
Incentivar e
consolidar a
segurança
nacional de
oferta e todo
o ciclo de
vida; suporte
logístico e
manutenção
de principais
sistemas
militares;
Desenvolver
os setores
industriais
estratégicos
de defesa.
Desenvolver a
indústria de
defesa indiana,
por meio de (i)
incentivo ao
desenvolvimento
de empresas
competitivas a
nível
internacional;
(ii) aumento da
capacidade de
pesquisa,
desenvolvimento
e design,
relacionada a
produtos e
serviços de
defesa; (iii)
encorajar o
desenvolvimento
de setores
sinérgicos, como
o setor
aeroespacial
civil e o setor de
segurança
interna.
Manter e
fortalecer a
capacidade,
conhecimento
e potencial de
exportação da
base
industrial de
defesa
italiana.
Incentivar a
criação de
trabalho e
oportunidades
de negócios
para empresas
do reino unido e
assegurar seu
acesso a
mercados
externos por
meio do
estabelecimento
de parcerias de
longo prazo
com empresas
estrangeiras.
Apoiar a longo
prazo a
proteção de
interesses
básicos de
defesa e
segurança da
Suécia.
Assegurar a
participação da
indústria
doméstica
manufatureira.
Promover a
transferência de
tecnologias
avançadas à
indústria de
defesa.
Aumentar as
exportações de
produtos,
sistemas e
tecnologias
avançadas
suecas
relacionadas a
defesa.
Período de
execução
Geralmente o
período do
contrato.
Geralmente o
período do
contrato.
Pode ser
prorrogado por
até dois anos
apos a conclusão
da execução do
contrato
principal.
Negociado
caso a caso
Geralmente o
período do
contrato.
Geralmente o
período do
contrato.
Fonte: Elaboração do autor
Quadro 2
Ao se verificar as exigências é possível constatar que existe uma variação de
30% a 100% do contrato, em alguns casos (Canadá e Espanha) abre-se espaço para
redução destes percentuais. Na questão dos multiplicadores existe uma maior
diversidade de posições, o Canadá direciona a ação nas relações entre Universidade e
120
Institutos de Pesquisa com um teto de 5%. Já a Espanha geralmente não utiliza, a Índia
e a Itália, por sua vez, assumem uma postura mais agressiva. A Itália foca três aspectos
(i) tecnologia já possuída pela indústria doméstica, (ii) tecnologia parcialmente possuída
pela indústria doméstica, (iii) tecnologia é totalmente nova. O Reino Unido não
considera a questão. A Suécia por sua vez busca observar questões focadas na
necessidade das forças e no fomento a pequenas e médias empresas e em atividades de
P&D. No que toca a questão de offset, direto e indireto, não existe divergências visto
que todos os países selecionados consideram sua adoção. Nas atividades elegíveis é
verificado que, de forma geral, são considerados co produção, assistência técnica,
marketing e atividades de P&D. Aqui chama a atenção, novamente, o caso da Suécia
que considera transferência de tecnologia e know-how, cooperação/ colaboração em
tecnologia e P&D, compra de produtos e serviços de defesa, investimentos que
aumentem a competitividade da indústria de defesa, atividades que colaborem para
maior acesso a mercados para produtos suecos.
Quadro 2 – Comparativo de Políticas de Offset – países selecionados (parte 2) Canadá Espanha Índia Itália Reino
Unido
Suécia
Exigência
s
Normalm
ente 100% do
valor do
contrato;
somente o
valor de
conteúdo
canadense é
computado;
obrigatoriame
nte novas
atividades
econômicas;
distribuição
regional de
benefícios é
importante;
causalidade
deve ser
comprovada;
recentemente,
60% da
transação de
offset deve ser
identificada
antes da
assinatura do
contrato.
Geralmente
100% do valor
do contrato.
Pode ser
negociada uma
redução.
Normalmente,
30% do valor do
contrato. O
Defense Acquisition
Council poderá
estabelecer
patamares
superiores ou
aceitar a não
aplicação de offset
em casos especiais.
Dete
rminado
por
negociaç
ão,
girando
em torno
de 75% a
100% do
valor do
contrato.
Não há
uma
porcentagem
pré-
estabelecida,
mas até o
limite de
100% do
valor do
contrato.
Licitantes
propõe o nível
que será
negociado.
Mínimo
de 100% do
valor do
contrato.
Offsets não são
requeridos de
empresas de
países que não
possuem uma
política de
offset.
Multiplicad
ores
Geralmen
te usado
somente em
relação a
atividades de
offset
envolvendo
universidades
canadenses ou
institutos de
Geralmente
não são
utilizados.
Multiplicador
de 1.5 é permitido
nos casos em que
micro, pequenas e
médias empresas
são parceiras
indianas de offset.
Nos casos de
aquisição de
tecnologia pela
a)
tecnologi
a já
possuída
pela
indústria
doméstic
a (1);b)
tecnologi
a
nenhum Normalme
nte não são
aplicados.
Podem ser
considerados
para P&D não
ligada ao
contrato, e que
seja
desenvolvida
121
pesquisa, no
valor máximo
de 5%.
Defense Research
and Development
Organization, um
multiplicador de até
3 poderá ser
adotado.
parcialm
ente
possuída
pela
indústria
doméstic
a (2); c)
tecnologi
a é
totalment
e nova
(3)
na Suécia, para
a participação
de pequenas e
médias
empresas, e
em apoio a
áreas
prioritárias
para as Forças
Armadas.
Direto/indireto Ambas
categorias são
aceitas, mas
preferência
pelo offset
direto
Ambas
categorias são
aceitas, mas há
preferência pelo
offset direto
(geralmente
precisa ser 60%
do compromisso
de offset).
Proporção
requerida varia
de contrato para
contrato.
Ambas
categorias são
aceitas.
Amb
as
categoria
s são
aceitas.
Há
preferênc
ia pelo
offset
direto.
Benefícios
diretos, assim
como
propriedade
intelectual
indireta são
aceitáveis.
Ambas
categorias são
aceitas.
Atividades
elegíveis
Participação
direta de
empresas
canadenses na
produção e
sustentação do
equipamento
objeto de
licitação;
outras
compras
diretas através
de setores
industriais;
transferência
de tecnologia
e colaboração;
marketing e
assistência à
exportação.
Coprodução
(licenças e
patentes);compr
as de produtos e
serviços
domésticos;
colaboração em
P&D; provisão
de
equipamentos,
ferramentas e
software;
gerenciamento
técnico,
relacionado à
produção e
suporte logístico
integrado.
a) Compra direta de
produtos ou
serviços de
empresas indianas,
seguindo uma lista
de produtos
elegíveis; b)
Investimento
externo direto em
joint ventures com
empresas indianas;
c) Transferência de
tecnologia para
manufatura,
manutenção de
produtos ou
fornecimento de
serviços elegíveis;
d) investimento em
espécie em
empresas indianas
para fornecimento
de equipamentos ;
e) fornecimento de
equipamentos ou
transferência de
tecnologia para
instituições
governamentais; f)
Aquisição de
tecnologia pela
Defense Research
and Development
Organization.
Participa
ção no
desenvol
vimento,
produção
e
assistênci
a do
equipame
nto sendo
comprad
o.
Transferê
ncia de
tecnologi
a de
interesse
do
Ministéri
o.
Contratos para
o
desenvolvime
nto ou
produção de
equipamentos
de defesa.
Contratos
relacionados a
P&D no setor
de defesa;
Transferência
de tecnologia;
assistência de
marketing.
Transferência
de tecnologia e
know-how;
cooperação/
colaboração
em tecnologia
e P&D;
compra de
produtos e
serviços de
defesa;
investimentos
que aumentem
a
competitividad
e da indústria
de defesa;
atividades que
colaborem
para maior
acesso a
mercados para
produtos
suecos.
Fonte: Elaboração do autor
122
Quadro 3
Quanto aos setores elegíveis é verificado que o foco central dos países é a área
de Defesa. No que se refere à seleção de receptores o processo fica ao critério dos
li.citantes, sempre seguindo os requisitos anteriores (exemplo: exigências, objetivos,
etc). O monitoramento fica por conta das agências de fomento responsáveis envolvidas
no processo.
Quadro 3 – Comparativo de Políticas de Offset – países selecionados (parte 3) Canadá Espanha Índia Itália Reino Unido Suécia
Setores
elegíveis
Pode ser
direcionado a
todos os setores
de alta
tecnologia:
defesa,
aeroespacial,
automotivo,
tecnologia da
informação.
Preference
for defence
or civil with
a suitable
dual-use
technology
content.
Defesa Defesa Somente defesa Somente
defesa (desde
2004)
Seleção de
receptores
Industry Canada
e agências de
desenvolvimento
regional
trabalharão com
licitantes para
identificar
potenciais
empresas
canadenses, mas
os licitantes tem
liberdade para
escolher, tendo
como base
imperativos de
mercado e de
negócio.
Licitantes
tem total
liberdade
para
escolher
parceiros e
fornecedores
domésticos.
Licitantes tem
liberdade para
escolher o
parceiro
indiano, desde
que este
parceiro não
tenha sido
previamente
barrado a
realizar
negócios com o
Ministério da
Defesa.
Licitantes
tem liberdade
para escolher
parceiros na
indústria
doméstica de
defesa.
Licitantes
podem
escolher as
empresas do
Reino Unido
com quem irão
estabelecer
atividades de
offset.
Espera-se
que o
licitante
selecione a
opção de
melhor custo-
benefício ao
escolher
parceiros ou
fornecedores
suecos.
Monitoramento Avaliação anual
conduzida pela
Industry Canada
de contratos com
compromissos
de offset ativos
Reuniões
periódicas
entre
licitante e a
Agência de
Cooperação
Industrial.
Licitantes
devem fornecer
relatórios
semestrais ao
Defense Offset
Management
Wing
(DOMW),
seguindo um
formato pré-
estabelecido.
Se necessário,
o DOMW
poderá realizar
uma auditoria
para verificar o
nível de
implementação.
Contractors
are required
to submit bi-
annual
progress
reports to the
MoD.
Devem
submeter
relatórios
semestrais.
Licitantes
devem
entregar
relatórios
anuais de
progresso.
Fonte: Elaboração do autor
123
Melhores práticas
O quadro 4 busca listar as melhores práticas, entre as que foram apresentadas,
pelos países selecionados. As variáveis listadas são as mesmas presentes nos quadros 1,
2 e 3. É importante ressaltar que a seleção destas “melhores práticas” foi baseada em
critérios que buscou observar: 1) uma interação e penetração do setor de defesa na
adoção do offset, 2) convergência das políticas compensatórias com o desenvolvimento
tecnológico local a partir das relações entre Universidade/Institutos de
Pesquisa/Empresas locais, 3) construção de políticas a partir de sintonias entre
ministérios e secretarias industriais e tecnológicas.
Quadro 4 – Melhores práticas
Países Práticas
Base legal Reino Unido Política de Participação da
Indústria (Industry Participation
Policy - 2003), revista de
acordo com a Estratégia
Industrial de Defesa (2007).
Autoridade responsável Todos bastante semelhantes Inter ministerial com foco
especial em defesa
Objetivos Todos bastante semelhantes Fortalecer a Base Industrial
de Defesa
Período de execução Todos bastante semelhantes Período do contrato
Exigências Suécia Mínimo de 100% do valor
do contrato. Offsets não são
requeridos de empresas de
países que não possuem uma
política de offset.
Multiplicadores Suécia Normalmente não são
aplicados. Podem ser
considerados para P&D não
ligada ao contrato, e que seja
desenvolvida na Suécia, para a
participação de pequenas e
médias empresas, e em apoio a
áreas prioritárias para as Forças
Armadas.
Direto/indireto Todos bastante semelhantes Ambas categorias são
aceitas.
Atividades elegíveis Suécia Transferência de tecnologia
e know-how; cooperação/
colaboração em tecnologia e
P&D; compra de produtos e
serviços de defesa;
investimentos que aumentem a
competitividade da indústria de
defesa; atividades que
colaborem para maior acesso a
mercados para produtos suecos.
Setores elegíveis Todos bastante semelhantes Preferencialmente Defesa
Seleção de receptores Todos bastante semelhantes A critério dos licitantes
Monitoramento Todos bastante semelhantes Agências de fomento
responsáveis envolvidas no
processo
Fonte: Elaboração do autor
124
Em que pese uma forte similaridade nas formas de atuação entre os países é
possível afirmar que o “modelo sueco” tem uma maior sinergia com os critérios
adotados para a seleção de “melhores práticas”. Pesam a favor deste modelo o fato de se
buscar uma forte interação entre pequenas e médias empresas, em convergência com as
necessidades das forças. Este processo busca desconcentrar os investimentos dos
grandes grupos nacionais e pulverizá-los em empresas de base tecnológica de pequeno e
médio porte. Também deixa claro a importância da transferência de tecnologia e know
how para as empresas participantes.
Alguns casos, exemplo da Índia, deixam bastante claro suas opções tecnológicas
estratégicas para aquisição de tecnologias através de offset (ver caixa 1). Este tipo de
opção política, de deixar explícito o apoio e a necessidade da adoção de mecanismos de
suporte para o setor de defesa, é bastante interessante a partir do momento em que deixa
claro para a sociedade quais as intenções do Estado com a adoção de mecanismos de
indução para o desenvolvimento tecnológico do setor de Defesa.
Caixa 1: Lista de tecnologias críticas para o setor de Defesa na Índia, sujeitas a aquisição via
offset
1. MEMs based sensors, actuators, RF devices, Focal plane arrays.
2. Nano technology based sensors and displays.
3. Miniature SAR & ISAR technologies.
4. Fiber Lasers Technology.
5. EM Rail Gun technology.
6. Shared and Conformal Apertures.
7. High efficiency flexible Solar Cells technology.
8. Super Cavitations technology.
9. Molecularly Imprinted Polymers.
10. Technologies for Hypersonic flights (Propulsion,
Aerodynamics and Structures).
11. Low Observable Technologies.
12. Technologies for generating High Power Lasers.
13. High Strength, High-modulus, Carbon Fibers, Mesophase
pitch-based fiber, Carbon Fiber Production Facility.
14. Pulse power network technologies.
15. THZ Technologies.
Referencias bibliográficas
ABDI – AGÊNCIA BRASILEIRA DE DESENVOLVIMENTO INDUSTRIAL. Estudos
Setoriais de Inovação: Base Industrial de Defesa. Brasília: ABDI/IPEA, 2010.
SIPRI – STOCKHOLM INTERNATIONAL PEACE RESEARCH INSTITUTE. SIPRI
Yearbook 2012: Armaments, Disarmament and International Security. Oxford: Oxford
University Press, 2012
OMC – The Agreement on Government Procurement (GPA), art. XVI(1) n.7, Apr. 15,
1994, Marrakesh Agreement Establishing the World Trade Organization, Annex 4(b) 1994
disponível em http://www.wto.org/english/docs_e/ legal_e/gpr-94_02_e.htm
EUA – Defense Production Act Amendments of 1992 (Pub. L. 102-558, Title I, Part C,
§123), 2000.
125
CONSOLIDAÇÃO LEGAL E BUSINESS INTELLIGENCE COMO
FERRAMENTAS DE POLÍTICA INDUSTRIAL.
Francisco Carlos Ribeiro
Sidney Benedito de Oliveira**
Geraldo Cesar Almeida***
Resumo: O presente artigo aponta como a criação de diretrizes de política
industrial fruto da consolidação legal bem como a Business intelligence podem ser
ferramentas para aumentar a credibilidade das políticas públicas e diminuir custos de
transação. Tais ferramentas podem aumentar a credibilidade dos agentes públicos ao
transmitir mais claramente ao empreendedor o marco regulatório da política industrial
local e ao mesmo tempo que o poder público pode informá-lo de dados fundamentais
para a instalação de empreendimentos ou mesmo para avaliação da sua rejeição.
Palavras-Chave: política Industrial, política pública, business intelligence,
administração pública.
1. A intencionalidade e a política pública.
Uma política pública pressupõe intencionalidade. Mesmo que seja focada nos
problemas e não em suas soluções possíveis, ou através da construção da agenda via
advocacy coalition, ou por abordagem neoinstitucionalista, enfim a política pública
pressupõe uma intencionalidade.
Segundo Celina Souza (2006, p. 36):
A política pública é abrangente e não se limita a leis e regras.
A política pública é uma ação intencional, com objetivos a
serem alcançados.
A autora sobriamente aponta também a abrangência de uma política pública. Seu
caráter holístico mesmo quando utilizados a abordagem por soluções disponíveis (teoria
da lata de lixo).
Celina Souza aponta:
Disso pode-se concluir que o principal foco analítico da
política pública está na identificação do tipo de problema que a
política pública visa corrigir, na chegada desse problema ao
sistema político (politics) e à sociedade política (polity), e nas
instituições/regras que irão modelar a decisão e a implementação
da política pública (2006, p. 40).
Dessa maneira, uma política pública que visa partir de um estágio, estabelecer
correções ou implementações fruto de uma agenda, seja a sua inclusão por pressão
política ou por próprio gerenciamento estatal pressupõe um conjunto de diagnósticos do
atual estágio de uma demanda, do que se pretende atingir, dos recursos materiais e
FATEC - Faculdade de Tecnologia de Sorocaba ** UNISO - Universidade de Sorocaba e Secretaria de Desenvolvimento Econômico e
Trabalho de Sorocaba *** Secretário Municipal de Desenvolvimento Econômico e Trabalho de Sorocaba - SEDET
126
humanos necessários, e no tempo de sua implementação. Corroboram para a sua
avaliação as análises de eficiência, eficácia e efetividade.
2. A Credibilidade de uma política pública. A questão institucional-legal.
Segundo aponta Souza:
O elemento credibilidade das políticas públicas também
ganhou importância, ou seja, a prevalência de regras pré-
anunciadas seria mais eficiente do que o poder discricionário de
políticos e burocratas, contido nas políticas públicas. O fator
credibilidade passou a ser fundamental para políticas comoa
monetária, mas também influenciou o novo desenho das políticas
públicas em várias outras áreas. A credibilidade baseia-se na
existência de regras claras em contraposição à discricionariedade
dos decisores públicos e burocratas, a qual levaria à
inconsistência68 (2006, p. 35).
Segundo aponta o mestre do Direito Administrativo Helly Lopes Meirelles,
(2012, pp. 125-126):
A atividade discricionária encontra plena
justificativa na impossibilidade de o legislador catalogar na lei
todos os atos que a prática administrativa exige. O ideal seria que
a lei regulasse minuciosamente a ação administrativa, modelando
cada um dos atos a serem praticados pelo administrador; mas
como isto não é possível, dada a multiplicidade e diversidade dos
fatos que pedem pronta solução ao Poder Público, o legislador
somente regula a prática de alguns atos administrativos que reputa
de maior relevância, deixando o cometimento dos demais ao
prudente critério do administrador.
Mas, embora não cuidando de todos os aspectos
dos atos relegados à faculdade discricionária, o legislador
subordina-os a um mínimo legal, consistente na estrita
observância, por parte de quem os vai praticar, da competência,
da forma, da finalidade e dos princípios do regime jurídico
administrativo, deixando o mais à livre escolha do agente
administrativo.
Essa liberdade funda-se na consideração de que só
o administrador, em contato com a realidade, está em condições
de bem apreciar os motivos ocorrentes de oportunidade e
conveniência da prática de certos atos, que seria impossível ao
legislador, dispondo na regra jurídica – lei – de maneira geral e
abstrata, prover com justiça e acerto. b Só os órgãos executivos é
que estão, em muitos casos, em condições de sentir e decidir
administrativamente o que convém e o que não convém ao
interesse coletivo. Em tal hipótese, executa a lei vinculadamente,
quanto aos elementos que ela discrimina, e discricionariamente,
quanto aos aspectos em que ela admite opção.
Mesmo quanto aos elementos discricionários do
ato há
68 Grifo nosso
127
limitações, impostas pelos princípios gerais do Direito e pelas
regras da boa administração, que, em última análise, são preceitos
de moralidade administrativa.
Daí dizer-se, com inteira propriedade, que a
atividade discricionária permanece sempre sujeita a um duplo
condicionamento: externo e interno. Externamente pelo
ordenamento jurídico a que fica subordinada toda atividade
administrativa (...) internamente, pelas exigências do bem comum
e da moralidade administrativa.
Celso Antonio Bandeira de Mello, em seu Curso de Direito
Administrativo aponta que “Com efeito, a discricionariedade não é a instauração de uma
‘liberdade de conduta’ propriamente dita” (2012, p. 979) 69. Tal afirmação deriva da
natureza da administração pública. Na administração pública, portanto na gestão da rés
pública, Meirelles bem aponta:
Na administração pública não há liberdade e nem vontade
pessoal. Enquanto na administração particular é licito fazer tudo
que a lei não proíbe, na Administração Pública só é permitido
fazer o que a lei autoriza. A lei para o particular significa ‘pode
fazer assim’; para o administrador público significa ‘deve fazer
assim’(MEIRELLES, 2012 p. 89).
Isto posto, é função do legislador e reduzir ao máximo o poder discricionário do
agente administrativo. Para que o mesmo não, de posse de lacunas na lei, lacunas acima
do razoável, use essa discricionariedade de forma arbitrária e não necessariamente ao
interesse público.
Assim, quando estamos falando de atitudes de governo as regras, não só as leis, mas
as diretrizes de governo devem ser claras, tendo em vista os preceitos da legalidade, da
moralidade administrativa, da impessoalidade, da publicidade e da eficiência.
Portanto, a credibilidade de políticas públicas está condicionada ao interesse público
pactuado. Portanto como apontou Souza:
A credibilidade baseia-se na existência de regras claras em
contraposição à discricionariedade dos decisores públicos e
burocratas, a qual levaria à inconsistência70 (2006, p. 35).
E interesse público pactuado é agir segundo uma agenda, com regras claras e
objetivos bem definidos que caracterizem o agir em prol da comunidade, em prol do
interesse público.
3. O emaranhado de Leis e a cortina de fumaça.
Ainda que seguindo os princípios da legalidade, da moralidade, da
impessoalidade, da publicidade um emaranhados de legislações que, mesmo carregado
69 A discricionariedade e seus efeitos danosos para administração (falando tecnicamente
quando: quando a discricionariedade se confunde com arbitrariedade, ou ainda quando
desvinculada do interesse público) é assunto de suam relevância. Bandeira de Mello dedica um
capítulo inteiro (o de número XIX intitulado “Discricionariedade Administrativa e Controle
Judicial” no seu livro Curso de Direito Administrativo). 70 Grifo nosso
128
de interesse público, se não funcionarem de maneira orgânica, causa mais uma cortina
de fumaça e prejudica a credibilidade das intenções da administração pública e de
possíveis políticas públicas.
3.1. O exemplo da Agricultura e da Política Agrícola e d a Política Industrial
Uma consulta á legislação municipal com a palavra agricultura, retornaram 28
atos entre Decretos e Leis. Usando a palavra agricultura, à época retornaram mais 22.
Quando escrevemos a palavra política agrícola, à poça retornaram apenas quatro atos
que diziam respeito apenas a nomeação e alteração dos membros do Conselho
Municipal de Agricultura.
Desta forma, o Conselho Municipal de Agricultura, com o incentivo da
Secretaria de Desenvolvimento Econômico e Trabalho (SEDET) elaborou uma minuta
de diretrizes para a Política Agrícola Municipal.
Da mesma maneira isso vem ocorrendo com a questão da Política Industrial do
Município. Pesquisamos sobre a Legislação com a palavra industrial, temos 257 atos.
Ao usar a palavra indústria, sobe para 649 atos. Se acrescentarmos à pesquisa uma
pesquisa sobre Tecnológico, temos 263 atos. Mas se entrarmos com a expressão política
industrial, ela retorna zero.71
Assim esse conjunto de Leis, obviamente muitas delas nada ligadas a política
industrial uma vez que a busca se deu por palavras, mas a fixação de um marco
regulatório, fruto de uma Lei sobre Diretrizes de Política Industrial, traçando um marco
consolidado avocando as leis existentes que promovem a política industrial, permite não
só direcionar melhor a prática de uma política pública, no caso as políticas agrícolas e
industriais, bem como aumentar a credibilidade e diminuir os custos de transação dos
empreendedores na medida em que permite uma visualização mais clara das
intencionalidades e das ferramentas de política industrial que o Poder Público de
Sorocaba dispõe.
3.2.A Nova Política Industrial e a necessidade de uma “alinhamento legal”
Segundo Baptista (1997, p. 127) aponta que “política industrial positiva significa
a introdução de uma postura estratégica orientada por metas na economia política
pública.” (grifo meu).
Como ao pesquisar no site não se retorna nenhum elemento com a expressão
“política industrial”, mas retorna-se significativo volume de itens para os termos
indústria, industrial e tecnológica, estamos trabalhando a partir do princípio que o
município tem diversas leis que promovem a política industrial, mas não tem, de fato,
uma política industrial legalmente consolidada e articulada apesar da miríade de leis que
aportam sobre indústria e inovação no município.
Suzigan e Silva, no texto “Política Industrial do Governo Lula” (2010, p. 21-
22), apontam que:
O papel da Política Industrial assume, assim, caráter estratégico
como instrumento de estímulo ao desenvolvimento do país. Uma de suas
tarefas centrais é a de coordenação de esforços públicos e privados em
71 Lamentavelmente houve um problema técnico no site da Prefeitura, no hipertexto
legislação. Por enquanto, o hipertexto tem remetido á busca da legislação no site da Câmara
Municipal, limitando sobremaneira a pesquisa, pois não conseguimos levantar, a partir de então,
os decretos do Poder executivo. Isso impediu uma atualização mais precisa. Os dados são
respectivos são do início de 2013.
129
direção aos interesses maiores do país. Os países avançados não abriram
mão de exercer suas políticas industriais. Os agentes produtivos, que
precisam tomar decisões cruciais como investir e inovar em um ambiente
permeado de incertezas quanto aos resultados futuros de suas decisões,
são parte integrante desse esforço de construção (que é permanente) de
uma nação que se pretenda soberana.
Crescentemente, requer-se de uma política industrial a capacidade
de coordenar o todo (cada vez mais complexo), ao mesmo tempo em que
considera as especificidades da realidade em suas várias dimensões
(setorial, tecnológica, financeira, organizacional, institucional, regional),
apoiada em uma perspectiva dinâmica de longo prazo. 72 Também se
requer, frente à necessidade de maior seletividade, que o acesso aos
instrumentos de política seja acompanhado de uma maior exigência de
cumprimento de contrapartidas.
Também os mesmos autores apontam:
De acordo com os documentos oficiais, a PITCE
(consubstanciada em um conjunto de 57 medidas distribuídas em 11
programas de política) propunha-se articular três planos distintos: 1)
Linhas de ação horizontais (inovação e desenvolvimento tecnológico;
inserção externa; modernização industrial; ambiente
institucional/aumento da capacidade produtiva); 2) Opções estratégicas
(semicondutores, software, bens de capital e fármacos); 3) Atividades
portadoras de futuro (biotecnologia, nanotecnologia, biomassa/energias
renováveis). Eram dois os macroprogramas mobilizadores: I) Indústria
forte (visando fortalecer e expandir a base industrial brasileira); II) Inova
Brasil (visando aumentar a capacidade inovadora das empresas). Um
plano de ação que explicitava como objetivos o aumento da eficiência da
estrutura produtiva, o aumento da capacidade de inovação das empresas
brasileiras e a expansão das exportações. Esta seria a base para uma
maior inserção do país no comércio internacional, estimulando os setores
onde o Brasil teria maior capacidade ou necessidade de desenvolver
vantagens competitivas e abrindo caminhos para inserção nos setores
mais dinâmicos dos fluxos de troca internacionais.
Tratava-se de uma política governamental construída a partir de
uma visão da complexidade da estrutura produtiva do país e apoiada na
percepção de que os diversos setores e cadeias produtivas desempenham
papéis diferenciados na dinâmica do desenvolvimento, em termos de
geração e difusão de inovações, competitividade e dinamismo
internacional e atendimento das necessidades básicas da população, e que
se refletem na sua posição no desenho da política. Pode-se dizer que a
PITCE representa, assim, um esforço de conceber uma política industrial
e tecnológica contemporânea, em uma perspectiva de longo prazo, com
ênfase na dimensão da inovação e da agregação de tecnologia aos
produtos brasileiros. (SUZIGAN; SILVA, 2010, p. 7-8)
E mais à frente:
Em 12/05/2008, um novo programa de promoção à indústria
brasileira é lançado pelo governo federal, com maiores pretensões no
72 O grifo é nosso não dos autores.
130
sentido de sua abrangência, profundidade, articulações, controles e
metas, ampliando o número de setores e os instrumentos de incentivo em
relação à PITCE. 73 Entre os avanços, há a preocupação em definir
objetivos e estabelecer metas, fortalecer a coordenação entre diferentes
instituições do governo e o diálogo com o setor privado, dentro de uma
visão sistêmica voltada à construção da competitividade de longo prazo
dos mais diversos setores da economia brasileira.
Batizada de Política de Desenvolvimento Produtivo – PDP e
apoiando-se em diversos tipos de medidas (tributária/fiscal,
financiamento, poder de compra por parte do governo, aprimoramento
jurídico, regulação e apoio técnico), a nova política tem como objetivo a
sustentação de um longo ciclo de desenvolvimento produtivo, apoiado no
investimento, na inovação, na competitividade das empresas e na
ampliação das exportações. 74 Entre outros instrumentos, o novo
programa propõe a desoneração de diversos setores produtivos
correspondente a uma renúncia fiscal de R$ 21,4 bilhões entre 2008 e
2011 (Tabela 2). (SUZIGAN; SILVA, 2010, p. 11)
Ao observar, então, a Política de Desenvolvimento Produtivo, como sinônimo da
nova política industrial, temos os seguintes destaques:
O Complexo Automotivo, a Indústria de Bens de Capital (sob encomenda e
seriados), a Indústria Naval e de Cabotagem, a Indústria Têxtil e de Confecções, o
complexo de Couro75, Calçados e Artefatos, o setor de Higiene Pessoal, Perfumaria e
Cosméticos, o setor de Madeira e Móveis, Plásticos, o Complexo Produtivo do
Biodiesel, a Agroindústria76, a Construção Civil e o Complexo de Serviços são os
sistemas produtivos enquadrados nesta categoria de programas, cuja abrangência será
ampliada no tempo, com a inclusão de outros setores.
Além do mais, o segmento da Agroindústria, portanto, é um dos ramos de
qualquer política industrial. E não se faz agroindústria sem agricultura. A Lei Municipal
nº 9449, de 22 de dezembro de 2010, que dispõe sobre o Programa de Incentivos para o
Desenvolvimento da Economia Solidária, Turística e Tecnológica de Sorocaba, com
tratamento favorecido, diferenciado e simplificado aos micros empreendedores
individuais, microempresas e empresas de pequeno porte de Sorocaba e dá outras
providências, traz em seu artigo 69, o seguinte:
Art. 69. O Poder Executivo Municipal incentivará os esforços
inovativos dos micro empreendedores individuais, cooperativas,
microempresas e empresas de pequeno porte locais, por ação própria ou
em parceria com agências de fomento, instituições científicas e
tecnológicas, núcleos de inovação tecnológica, intuições de apoio e
outros órgãos promotores da ciência, tecnologia e inovação. (PMS, 2010)
E no seu artigo 92, temos:
Art. 92. Do total dos recursos financeiros repassados pelo FNDE,
no âmbito do PNAE, no mínimo 30% (trinta por cento) deverão ser
utilizados na aquisição de gêneros alimentícios diretamente da
73 Idem 74 O grifo é nosso não dos autores. 75 Idem 76 Idem
131
agricultura familiar e do empreendedor familiar rural 77 ou de suas
organizações.
Assim, cremos que uma política industrial não pode prescindir de uma política
agrícola consistente. Após ter uma política agrícola clara e consolidada como um
arcabouço jurídico é possível reunir num documento jurídico, unificando as leis sobre
política industrial do município, tendo as disposições referentes à agroindústria
vinculadas a política agrícola do município de maneira coerente. Em Sorocaba as
diretrizes de política agrícola estão em fase de finalização.
4. Business Intelligence e sua aplicação como ferramenta para a Política
Industrial.
Dentro de uma perspectiva de modernização da gestão pública o desenvolvimento
de novas tecnologias de informações tem sido uma constante no processo de
gerenciamento do setor público, segundo Han & Kamber (2001) business intelligence é
definido como o campo de estudo interdisciplinar, ligado à tecnologia da informação e
tem como objeto de estudo a elaboração de sistemas de informação computacionais
responsáveis por organizar grandes volumes de dados e facilitar a descoberta de
relações entre os dados estudados.
Para outro autor, Elmasri & Navathe as ferramentas de Business Intelligence
devem oferecer interfaces que facilitem ao usuário o entendimento das relações entre os
dados descritivos visando prover melhores informações para a tomada de decisão.
Assim, o B.I. tem uma ligação com a vertente tecnológica da gestão do conhecimento
auxiliando a ajudar tanto nos processos descritivos quanto nos normativos de
inteligência.
Dentro desse contexto observa-se a necessidade de informações e modernização
da gestão no setor público tanto nas esferas federal, estaduais e municipais. Com a
implantação da Lei de Responsabilidade Fiscal houve uma mudança estrutural no
regime fiscal introduzindo conceitos como o de responsabilidade na gestão pública,
harmonizando diferentes normas para a organização e o equilíbrio das finanças
governamentais.
A complexidade e distorções dos tributos e a multiplicidade de legislações tem
estimulado a chamada guerra fiscal entre Estados e Municípios. Nota-se também a
inexistência de neutralidade na alocação de investimentos. Alguns municípios oferecem
inclusive imóveis para estabelecimento da planta de fabrica além das isenções de
tributos de sua competência.
No entanto, temos que levar em conta as teorias da localização industrial para
compreender os processos de decisão. O oferecimento de área pode em muitos casos ser
irrelevante. Mas é bom notar a existência dessa prática.78
Diante do exposto o município de Sorocaba inicialmente desenvolveu um B.I.
business intelligence que permite a comparação dos indicadores econômicos entre os
municípios que apresentam estruturas semelhantes de população, infraestrutura e
vocação industrial, bem como a estrutura financeira de arrecadação que é
disponibilizado pela receita federal, tal ferramenta não tem a intenção de ampliar a
guerra fiscal, mas sim proteger o parque industrial instalado.
77 Grifo nosso. 78 Quanto a isso ver RIBEIRO, F. C.. O Plano Diretor e as Teorias da Localização. Revista de
Estudos Universitária (Sorocaba), Sorocaba, v. 25, n.2, p. 09-30, 1999.
132
Essa ferramenta é utilizada para mensurar e comparar o desempenho entre os
municípios, diagnosticar por meio de quais ações o município tem obtido melhor
desempenho no que se refere a arrecadação tributária. Outro aspecto se refere a
legislação de incentivos fiscais e fomento para o setor empresarial de inovação e
tecnologia de informação que se encontra em desenvolvimento criando uma sinergia
entre a Secretaria de Desenvolvimento Econômico e Trabalho e a Empresa Municipal
Parque Tecnológico.
A secretaria vem trabalhando também no desenvolvimento de um simulador que
permita comparar a renuncia fiscal das empresas beneficiadas pela Lei municipal de
incentivo fiscal, em relação ao valor adicionado gerado pela empresa, em especial a cota
referente ao ICMS que retorna a municipalidade no desenvolver de suas atividades
principal e intermediária.
É objeto de estudo o aprofundamento na produção de informações que
possibilite mensurar o impacto indireto da empresa no desenvolvimento das atividades
sociais e ambientais praticado no município pelas empresas, bem como analisar o
impacto econômico proporcionado pela massa de salários injetados na economia local.
É fundamental também desenvolver o conceito de elasticidades para a política
industrial. O conceito de elasticidade arrecadação, o conceito de elasticidade emprego,
o conceito de elasticidade de valor adicionado. Ao sabermos isso, poderemos tipificar,
esse segmento tem alta elasticidade em geração de emprego), portanto intensa em mão
de obra, outra intensa em valor adicionado, outra em arrecadação. Enfim o BI também
permite compor essas informações de maneira a que eu sabendo as estimativas e
elasticidades de cada tipo de empresa, consiga inclusive planejar quais os segmentos
demos incentivar e quais queremos evitar dada as saturações.
5. O município de Sorocaba e a indústria Sorocabana. Uma avaliação econômica.
O Produto Interno Bruto de Sorocaba vem tendo um crescimento médio 12,20%
ao ano, ao passo que o crescimento do PIB no Brasil no mesmo período foi de 11,44% e
de São Paulo 11,16%. Se, descontar-se a inflação do período, para uma aproximação de
preços constantes, tem-se que a taxa média anual de inflação foi 5,28%, tem-se então
um crescimento médio do PIB para Sorocaba de 6,57, no Brasil de 5,85 e de São Paulo
de 5,59.
Gráfico 1: Evolução do PIB a preços correntes de Sorocaba
Fonte: SEADE. Elaboração própria.
Gráfico 2: PIB Brasil a preços correntes. Elaboração Própria.
8.002,61 9.243,59 10.161,75 11.913,72 13.046,65 14.143,60 16.124,77 17.911,98
0,00
10.000,00
20.000,00
2004 2005 2006 2007 2008 2009 2010 2011
PIB-SOROCABA em milhões de reais
PIB
133
Fonte: IBGE
Gráfico 3: PIB do Estado de São Paulo a preços correntes (milhões de reais).
Fonte: SEADE. Elaboração Própria
Gráfico 4 – INPC – Inflação anual.
Fonte: IBGE. Elaboração Própria.
Pode-se perceber que o crescimento econômico de Sorocaba foi maior do que do
Estado de São Paulo e do Brasil no período 2004-2011.
1.941.498,002.147.239,00
2.369.484,002.661.344,00
3.032.203,003.239.404,00
3.770.085,004.143.013,00
0,00
1.000.000,00
2.000.000,00
3.000.000,00
4.000.000,00
5.000.000,00
2004 2005 2006 2007 2008 2009 2010 (1) 2011 (1)
PIB BRASIL MILHÕES DE REAIS
PIB
643.487,49726.984,04
802.654,61902.784,27
1.003.015,191.084.353,49
1.247.595,931.349.465,14
0,00
500.000,00
1.000.000,00
1.500.000,00
2004 2005 2006 2007 2008 2009 2010 2011
PIB SÃO PAULO (milhões de reais)
PIB São Paulo
6,13
5,05
2,81
5,16
6,48
4,11
6,476,08
0
2
4
6
8
2004 2005 2006 2007 2008 2009 2010 2011
INPC
134
Ao olhar o crescimento de empresas no município, no mesmo período tem-se
que o número de empresas em Sorocaba cresce 4,87% ao ano, ao passo que no Brasil o
crescimento de empresas foi de 3,56 % e no Estado de São Paulo foi de 4,26%.
Percebe-se então, que a taxa de criação de empresas em Sorocaba é maior que no
Brasil e maior do que no Estado de São Paulo como um todo.
Também, pode ser verificada a composição em 2007, do valor adicionado em
Sorocaba.
Grafico 5: Número de Empresas em Sorocaba.
Fonte: IBGE. Elaboração Própria.
Gráfico 6: Número de empresas. Brasil.
Fonte: IBGE. Elaboração Própria.
19.077 19.890 20.607 22.04623.767 24.199
0
5.000
10.000
15.000
20.000
25.000
30.000
2006 2007 2008 2009 2010 2011
NUMERO DE EMPRESAS SOROCABA
4.305.578 4.420.3454.607.261
4.846.6395.128.568 5.129.205
3.500.000
4.000.000
4.500.000
5.000.000
5.500.000
2006 2007 2008 2009 2010 2011
NUMERO DE EMPRESAS BRASIL
135
Gráfico 7: Número de Empresas no Estado de São Paulo
Fonte: IBGE. Elaboração Própria.
Se observarmos agora a participação do Valor Adicionado, ao longo da série
histórica, veremos que também Sorocaba tem uma participação um pouco maior na
indústria e uma participação ínfima no setor agropecuário.
Gráfico 8: Participação dos setores agropecuário, industrial e de serviços no valor
adicionado de Sorocaba ao longo dos anos
Fonte: SEADE. Elaboração Própria.
Gráfico 9: Participação percentual dos setores, agropecuário, industrial e de
serviços no valor adicionado do Estado de São Paulo ao longo dos anos.
Fonte: SEADE. Elaboração própria.
1.325.217 1.361.017 1.438.200 1.530.486 1.609.005 1.632.446
0
500.000
1.000.000
1.500.000
2.000.000
2006 2007 2008 2009 2010 2011
NÚMERO DE EMPRESAS ESTADO DE SÃO PAULO
63,34 64,73 65,29 64,18 65,28 61,3 62,33 62,52
0,09 0,08 0,08 0,08 0,1 0,11 0,15 0,14
36,58 35,19 34,63 35,73 34,61 38,59 37,52 37,34
2004 2005 2006 2007 2008 2009 2010 2011
PARTICIPAÇÃO DOS SETORES NO VALOR ADICIONADO-SOROCABA
Serviços Agricultura Indústria
63,99 66,46 67,71 68,41 69,03 69,34 69,05 70,46
2,18 1,84 2,16 1,97 1,45 1,62 1,87 2,1133,83 31,7 30,14 29,62 29,52 29,04 29,08 27,43
2004 2005 2006 2007 2008 2009 2010 2011
PARTICIPAÇÃO DOS SETORES NO VALOR ADICIONADO - SÃO PAULO
Serviços Agricultura Indústria
136
Gráfico 10: Participação dos setores no valor adicionado do Brasil ao longo dos
anos.
Fonte: IBGE. Elaboração Própria.
Como é possível perceber a participação média da agropecuária no valor
adicionado de Sorocaba é 0,10% do PIB ao passo que a média do Estado representa
1,9% e no Brasil representa 5,79%
É possível observar que o setor de serviços, em Sorocaba a média de
participação no valor adicionado é de 63,62%, contra 68,05% do Estado e 65,96% do
país. Portanto, tem-se menor participação no valor adicionado nos serviços quando
comparados ao Estado e ao país.
É bom notar, agora, que a participação média da indústria no valor adicionado,
em Sorocaba é de 37,34% ao passo que no Estado de São Paulo é de 30,04 e no país é
de 28,00%.
Essa diferença, por si só já justificaria uma preocupação com a política industrial
do município de Sorocaba. Soma-se a isso, que Sorocaba tem, agora, o Parque
Tecnológico de Sorocaba e junto com ele, toda uma legislação de incentivo à inovação
tecnológica.79.
6. Considerações Finais
Uma política pública pressupõe intencionalidade. Portanto, parte de um diagnóstico,
do que se pretende alcançar, do estabelecimento das metas, dos recursos materiais e
humanos para atingi-las. Também o prazo a ser atingindo, (prevendo inclusive
cronogramas) e depois a avaliação da sua eficácia, eficiência e efetividade. Uma política
pública terá mais credibilidade quanto mais claras forem as regras, demonstrando não
ser discricionária e sim de procedimentos legais e regulamentares, mas também tendo
em vista a transparência e o atendimento do interesse público.
Uma miríade de Leis que incentivam a indústria é melhor do que a ausência
delas. Mas a legislação principal e marginalia não sendo acessada de forma sistêmica e
orgânica não só dificulta a avaliação de eficácia, efetividade e eficiência, bem como não
79 Vide Ribeiro et. al. “Potencialidades e desafios dos parques tecnológicos: O caso de
Sorocaba in KON. Anita; BORELLI, Elizabeth “Indústria, Tecnologia e Trabalho: Desafios da
economia brasileira. São Paulo:EEIT-PUC, 2012.
6,9 5,7 5,5 5,6 5,9 5,6 5,3 5,5
30,1 29,3 28,8 27,8 27,9 26,8 28,1 27,5
63 65 65,8 66,6 66,2 67,5 66,6 67
0
20
40
60
80
2004 2005 2006 2007 2008 2009 2010 2011
PARTICIPAÇÃO DOS SETORES NO VALOR ADICIONADO-BRASIL
Agricultura
Indústria
Serviços
137
contribui como ferramenta que pode influenciar positivamente a ação de
empreendedores uma vez que a linearidade dos benefícios fiscais e outros não se
apresentam clara, havendo um esforço adicional para conhecer e compreender a miríade
de Leis disponíveis.
Assim traçar uma diretriz consolidada avocando as leis já existentes instituindo
uma diretriz para a Política Industrial Municipal permite evitar custos de transação aos
empreendedores e limpando a cortina de fumaça gerada pelo acumulado de Leis, mas
que, embora guardando conexões entre si, não se apresentam de maneira cristalina ao
empreendedor que terá de fazer uma busca legislativa para entender a quantidade e o
que versam as Leis que beneficiam a indústria.
A Business Intelligence, por sua vez, ajuda aos empresários a captar outras
variáveis importantes que independem da ação do poder público local. Elementos como
custos de logística entre outros são vitais na escolha de instalação de uma empresa. O
poder público tendo esses dados não só facilita os entendimentos para o progresso de
uma política industrial municipal como também consegue avaliar o que tipo de empresa
deseja e o que se quer evitar na sua localidade. Há que se pensar nisso enquanto
gestores público. Assim a criação de Diretrizes para uma Política Industrial Municipal,
avocando as demais leis existentes fazendo um todo orgânico aumentaria a credibilidade
dos gestores públicos e eliminaria custos de transação. Ainda que a credibilidade dos
atuais gestores seja alta.
Referências ELMASRI, R. NAVATHE, S.B. Fundamentals of database systems. 3ed.
Addison-Wesley, 2000.
HAN, J. KAMBER, M. Data mining: concepts and techniques. Morgan
Kaufmann Publishers. 2001
MELLO, Celso Antonio Bandeira de. Curso de Direito Administrativo. 29ª ed.
São Paulo, Malheiros Editores, 2012.
MEIRELLES. Helly Lopes. Direito Administrativo Brasileiro. 38ª. ed. São Paulo,
Malheiros Editores, 2012.
MINISTÉRIO DO DESENVOLVIMENTO, INDUSTRIA E COMERCIO
EXTERIOR. Política de Desenvolvimento produtivo. Brasília, 2008. Disponível em
http://www.pdp.gov.br/paginas/conheca_pdp.aspx?path=Conhe%C3%A7a%20a%20PD
P. Acessado em 01 fev. 2014
SOUZA, Celina. Políticas Públicas. Uma revisão da Literatura. Sociologias, Porto
Alegre, ano 8, nº 16, jul/dez 2006, p. 20-45. Disponível em
http://www.scielo.br/pdf/soc/n16/a03n16 acessado em 21 abr. 2014
SUZIGAN, Wilson; SILVA, Ana Lúcia Gonzalves da Silva. Política Industrial do
Governo Lula. Texto para Discussão IE/UNICAMP Nº 181. Campinas: Unicamp-IE,
2010. Disponível http://jornalggn.com.br/sites/default/files/documentos/texto181.pdf
em 01/02/2014
138
Economia de Serviços e Atuária
A PREVIDÊNCIA PRIVADA NO BRASIL, NA AMÉRICA LATINA E NO
MUNDO COMO UMA DAS GRANDES ALTERNATIVAS ECONÔMICAS
PARA FINANCIAMENTO DE DESENVOLVIMENTO.
Antonio Cordeiro Filho80
Resumo
Este artigo objetiva identificar e mostrar quais as contribuições da Previdência
Privada na Economia do Brasil e fazer comparações com outros países da
América Latina e de outros continentes como forma de financiamento do
desenvolvimento para o governo, as empresas e as Entidades financeiras. Para
entender a Previdência Privada é necessário ir mais fundo na pesquisa
relativamente a Previdência Pública e Regimes próprios de Servidores Públicos.
O volume de recursos econômicos abrangidos pelos dois Sistemas nos leva a
necessidade de análise e suas consequências.
Trata-se de uma pesquisa exploratória, ampla e com o objetivo de aprimorar
novas ideias e tendências a respeito de movimento dos capitais, poupança e riscos,
apresentando ao final do artigo, alternativas e observações que possam ser de grande
utilidade ao leitor. A Introdução se inicia com as perguntas de quanto é a ocupação
econômica desses capitais da Previdência Privada atualmente – hoje um número
percentual - considerável do volume do PIB brasileiro e de outros PIB’s mundiais
como veremos adiante. A Economia, o giro de recursos e muitos projetos de
desenvolvimento para governos, principalmente aqueles de infraestrutura estão nesse
contexto econômico e financeiro. Não se pode deixar de comentar também que muitos
recursos da Previdência Complementar, também estão em Aplicações de Risco, na
associação com novos projetos, inovações, tecnologias e investimentos de risco em
empresas que necessitam de capital. Tudo isso com referência naquilo que é o
embrião gerador principal de tudo isso: a seguridade.
Abstract // summary This article aims to identify and show what are the contributions of private
pension plan in Brazil's economy and make comparisons with other countries of Latin
America and other continents as a way of financing for development for the
Government, companies and financial entities. To understand the private pension
plan is necessary to go deeper into research for Public Welfare and own Schemes
of public servants. The volume of economic resources covered by two systems leads
to need for analysis and its consequences. This is an exploratory research, wide and
with the goal of enhancing new ideas and trends regarding movement of capital,
savings and risks, showing at the end of the article, alternatives and observations
which may be useful to the reader. The introduction begins with the questions of
80 Tem graduação/Ciências Atuariais/PUC-SP. - Mestre:Administração de Empresas.
Defesa: tema "Desenvolvimento das pequenas e médias empresas na área de Prestação de
Serviços em Saúde Suplementar" (maio/2006). Titulação: Doutor com TESE em Saúde
Suplementar e Pública em 07/02/2012.
139
how much the economic occupation of these capitals of private pension plan
currently – today a considerable number percentage-GDP volume and other world's
GDP as we will see below. The economy, turning resources and many development
projects for Governments, especially those of infrastructure are in this economic and
financial context. One can't help but comment that many features of the
supplementary pension plan, are also at risk Applications, in association with new
projects, innovations, technologies and risky investments in companies that require
capital. All this with reference to what is the main generator of embryo it all: security.
Introdução
Nem tudo pertence à natureza e nada aconteceu por acaso. Nas palestras
realizadas sobre Previdência e sempre que se dá start de inicio ao tema a
pergunta para a plateia, sala de alunos ou auditório é: “Por quê se desenvolvem
mecanismos de proteção às pessoas?” E para quê?
Esse questionamento que, nos dias de hoje, parece muito simples de responder,
vem de muito tempo. É uma pergunta para reflexão de todos, inclusive ao leitor deste
artigo. Será que eu protejo alguém ou alguém está me protegendo? Sempre fui
protegido.
Muitos e muitos anos atrás, quando descobriram que praticando a agricultura
seria possível se manter mais tempo num local e quem sabe viver ali - criando
animais e plantando - a necessidade da proteção tomou outro rumo.
As pessoas morriam muito cedo e trabalhavam até – em média – até falecer ou
ficar doente com 35 a 40 anos no máximo. 81 Havia um esforço físico muito
grande e a própria pessoa tinha que encontrar ou fabricar as ferramentas para reduzir
esse grande desgaste.
Com o passar do tempo, quando começa a ser gerada a Economia Monetária e
surge o dinheiro é que aparecem as especializações das pessoas, as vocações das
profissões e torna-se necessário criar artefatos, mas ainda os afazeres da agricultura
provoca um esforço muito pesado, desgastante.
Nessa viagem do tempo vão surgindo os elementos que deram origem a Revolução
Industrial. Jovens alunos de Colégios e Faculdades - em muitas das vezes –
imaginam que essa revolução apareceu de repente. Enganam-se. Ela foi lenta e
dolorosa para as pessoas da época. O que será descrito daqui em diante refere-se ao
Ocidente, Europa, que definiu o comportamento de muitas sociedades nos últimos
300 anos. É importante saber que o Oriente e a Ásia são outros contextos bem
diferentes.
A Europa e principalmente a Inglaterra, região do Reino Unido, tinham grande
influência econômica sobre muitas outras regiões ou países do que conhecíamos
como Ocidente. Resumidamente, enquanto o campo produzia os alimentos iniciavam-
se também aglutinações de pessoas. Essas aglomerações deram origem a
urbanizações e nelas surgem as vilas de trabalho. Na realidade, fábricas! Onde
pessoas trabalhavam 12, 14 até 18 horas / dia. Muito tempo depois já no final do
século XIX surgiram os motores a vapor e daí muitas fábricas de artefatos. Esses
locais eram próximos de fábricas e rios navegáveis. Essas fábricas começaram a
existir e os donos das fábricas davam também habitação – vilas operárias inglesas –
81 Ver OIT – Organização Internacional do Trabalho - História do Trabalho
140
como modelo Europeu para desenvolvimento e exemplos deste artigo. As famílias
saíam do campo para trabalhar em regiões urbanas e precisavam de habitações.
Eram casas onde não havia nenhum espaço para plantar. Conhecidas pela
história como as Vilas Inglesas. Algumas até copiadas para o Brasil no começo do
século XX. Era a urbanização chegando na Europa. Na medida do desenvolvimento
econômico mais fábricas e mais casas para operários.
As Vilas eram de propriedade dos donos da fábrica e o operário que por algum
motivo, seja doença, invalidez ou outras causas parava de trabalhar, tinha que deixar
a habitação para dar lugar a outro operário. Ou seja, parou de trabalhar? Estava fora da
habitação.
É difícil imaginar, mas naquela época era a forma de se pensar. Não havia
espaço físico para aquilo que não fosse o trabalho na fábrica. Não havia nas Vilas
outra forma de sobrevivência. Nenhuma plantação.82
O conceito de que o trabalho enobrece a vida das pessoas é algo que vem dos
nossos avós e tataravós, mas naquela época não se pensava de forma humanitária.
Os conceitos de humanismo viriam bem depois. Há quem diga que atualmente não
é nada diferente. Que existe uma pressão do sistema para que o trabalhador seja
dependente do patrão ou da empresa.
É o caso então de perguntarmos se hoje, em pleno século XXI somos livres.
Um aluno, certa vez, num questionamento respondeu que talvez, tenhamos - nos
dias atuais - o nosso tempo expropriado na frente de um computador. Assim
mesmo, a pergunta que não cala é se estamos protegidos?
Há uma empresa na Escócia que se denomina “Scottish Widows”
, em
Edimburgo, cuja tradução é “Viúvas Escocesas”. Em março de 1812, alguns
escoceses proeminentes se reuniram nos quartos Royal Exchange de café em
Edimburgo. Eles estavam lá para discutir a criação de "um fundo geral para garantir
provisões para viúvas, irmãs e outros parentes do sexo feminino" de detentores de
fundos a fim de que eles não seriam mergulhados em pobreza sobre a morte do
fundholder durante e depois das Guerras Napoleônicas. Scottish Widows Fundo e Life
Assurance Society abriu em 1815 como o primeiro escritório de vida mútuo da
Escócia.
Essa empresa surgiu para homenagear algo triste e verdadeiro que foram as
mulheres que se tornaram viúvas dos seus maridos que trabalhavam nas minas de
carvão e desciam a centenas de metros por um tosco elevador. Iam muito cedo
descendo cavernas de minas de carvão e muitos deles não voltavam ao final da
tarde, mortos por gases das minas, excesso de calor, doenças que desconheciam e
outras morbidades da época.
Uma delas era a tuberculose que acometia grande parte da população. Essa
doença no Brasil ainda tem grande incidência nos dias de hoje.83 Outra doença do
final do século XIX e início do século XX era o Saturnismo. Doença provocada por
aspiração de gases e contato manual de material contendo chumbo. O chumbo –
82 Nos resquícios brasileiros da época surge a Vila Maria Zélia. Há muitas outras vilas,
muitas já destruídas pelo tempo e pelo abandono. Como exemplo, entre 1872 e 1940, a
população da cidade de São Paulo cresceu de 31 mil para 1,3 milhão de habitantes. O
grande contingente era formado por imigrantes: espanhóis, portugueses e, principalmente,
italianos que deixaram a condição de pobreza em sua terra natal para buscar novas
oportunidades no Brasil. Naquela época, São Paulo dava os primeiros passos no seu processo
de industrialização. 83 Há um bom controle de doença atualmente no Brasil. São registrados ainda 70.000
casos/ano. (OMS, 2013).
141
na época - por ser um elemento muito utilizado nas fábricas, principalmente para
modelagens, foi um grande vilão de doenças fabris.
O que então as fábricas na Grã-Bretanha faziam com seus operários? Quais
eram as regras? Ficou doente? Não pode mais trabalhar? Está fora das turmas de
trabalho. Saia da casa onde mora. Morreu na mina? A viúva era obrigada a deixar a
casa onde morava com filhos e suas tralhas e iam morar onde fosse possível.
O conceito já existente no século XX do Papa Pio XII de que: “A pessoa humana é
o fim da economia, ao mesmo tempo, que é seu mais importante motor.”84
É algo
muito recente.
Dessa forma a história da proteção às pessoas no Brasil acompanhou, com
certo atraso, esses conceitos humanitários que começavam a se espalhar na
América. Mas quem deveria proteger as pessoas naquele século XVIII da Grã-
Bretanha? Quais as saídas existentes na época? Quem deveria resolver? A Igreja
poderia ajudar? O Estado? Que Estado existia onde o humanismo poderia estar
presente? Os donos de fábrica poderiam demitir, ou afastar do trabalho, todas as
pessoas que ficavam doentes? Havia pelo menos um dia de descanso do operário?
Pedir de volta a casa onde ele mora para colocar outro operário? Havia nessa época
alguma proteção ao trabalho?85 6
As raízes da Previdência
As raízes de Previdência estão na própria etimologia da palavra. A previdência
vem do latim previdentia, é a antevidência, ou seja, a qualidade ou ato de: "
previdente (do latim: previdente) que prevê; que é cauteloso, prevenido, precavido,
prudente" (Ferreira, 2001:1146).
A palavra previdência esta intimamente associada à raiz do verbo prevenir (do
latim: Praevnire ), que significa:
"vir antes; tomar a dianteira; dispor com antecipação;
preparar; chegar antes, adiantar-se ou antecipar-se; realizar
antecipadamente, acautelar-se; precaver- se; premunir-se ou
dispor de maneira que evite (dano, mal) " (Ferreira, 2001:
1146).
No âmbito da economia brasileira Previdência Pública já tem um sentido mais
amplo. Trata-se daquela previdência que permite amealhar para o futuro um valor
a mais daquilo que o trabalhador receberá do Instituto do governo lá pela época de se
aposentar. As pessoas sabem quanto tempo pode durar a nossa
84 Papa Pio XII (Papa entre 1939 a 1958) apud Almiro (1978, p. 35).
85 Como complemento: O descanso semanal remunerado aconteceu só em 1927. No
Japão, até 1994 não havia descanso semanal. Não há férias no Japão. A Ásia inteira tem
formas diferentes. Nos EUA também não tem férias. As férias são negociadas com os
Sindicatos e depende do tempo de casa. Na Rússia, há direitos a doze dias de férias no Verão.
No passado poderia ter direito a férias a serem trocadas por trabalho voluntário na Sibéria
aposentadoria? Em média o dobro do tempo de nossa infância. Já algum dia pensou nisso?
Normalmente quando se é jovem somos indiferentes para essas observações.
142
O futuro para os jovens de hoje
O resultado de aulas ou palestras sobre previdência com jovens é muito
interessante. Quando possível a pergunta básica: “quem é que acha que vai morrer nos
próximos 35 anos?”.
A pergunta choca inicialmente. Uns olham para outros para saber se alguém
tem coragem de dizer que não passará dos 50 ou 55 anos. Nem querem pensar
nisso! A faixa média de idades dos alunos de Graduação é de 18 a 22 anos. Nos
cursos de pós-graduação essa pergunta provoca em um ou outro jovem mais
atirado que levanta a mão. Não se sabe se é para brincar e provocar risos ou
porque realmente tem certeza de que não estará vivo nesse tempo todo.
Normalmente quando se comenta sobre aposentadoria se pensa em futuro. O
futuro será cinza com certeza por causa das cãs de nossas cabeças e com certeza
também será feminino porque as mulheres é que serão maioria como já são
atualmente. 7
Tais fatos todos sabemos.
Esse futuro também será pequeno, muito pequeno em relação aos espaços de
nossos avós, pais e de nós mesmos que estamos lendo este artigo agora. Imóveis
serão menores, carros serão minúsculos em relação aos SUV atuais. Nos
supermercados haverão mais opções de compras menores. Coca Cola “tamanho”
família tenderá a extinção. Será muito grande e vai se estragar muito
rapidamente. O tempo será de refrigerantes menores. Produtos em embalagens de
menor quantidade.
O futuro para os jovens de ontem
Quando nos referimos à previdência sempre passa pela cabeça o longo prazo. A
previdência em si, não importa qual sua origem, tipo, se privada, pública, aberta
fechada ou outros modelos de países nos retorna o assunto atualíssimo que é a
longevidade. Há países que estão envelhecendo muito rápido. Muitos deles entraram
em processo de crescimento vegetativo negativo.
Em partes da Europa há mais cadeiras de rodas do que carrinhos de bebê.
Pessoas acima de 65 anos na China são 165 milhões. Essa quantidade de pessoas
é mais numerosa do que a população atual da Rússia, em torno de 150 milhões e
vivem na zona rural. Por estimativas, no meio deste século a população do Japão
terá se reduzido a metade da atual e quase um terço dela terá mais do que 65 anos.
(MIT – AgeLab – Plano Internacional de Ação sobre o Envelhecimento da ONU).
O envelhecimento das populações ao longo do tempo
Em 1950 a população com mais de 60 anos era em torno de estimativa pelo
MIT – AgeLab em 54 milhões. Estimou-se também que em 2050 será de 247
milhões. Acrescente-se que em 1950 a estimativa de pessoas com mais de 80 anos
era de três milhões e por projeções demográficas e estudos de longevidade atual,
se estima também que em 2050 será de 58 milhões. Desse total, uns 10 milhões com
mais de 80 anos e o resto com média de 100 anos (MIT – AgeLab – Plano Internacional
de Ação sobre o Envelhecimento da ONU).
143
O futuro poderá ser também financeiramente apertado
Há um pesquisador de nome Jan H. Tamerus, que foi Diretor Atuarial do
PGGM, que sugere algumas novas ideias para Entidades de Previdência, tais como
uma indexação mais realista e estudos que considerem a longevidade projetada
com taxas de juros estruturalmente decrescentes conforme o país evidentemente.
Nesses estudos ele sugere também que se considere nesses estudos a volatilidade
dos mercados e uma inflação mais próxima da realidade, mais realista. Um modelo
complexo que deverá ser monitorável ano a ano.
Onde estão de fato as raízes da Previdência
Apesar de todo o conhecimento do que acontecia na Europa em finais do
século XIX e início do século XX e mais especificamente nas Regiões da Grã-
Bretanha a situação social e econômica das populações era de muitas dificuldades
e, com o aumento demográfico da época – urbanização - a proteção às pessoas
tornou-se um problema de saúde pública e de descaso com aqueles não favorecidos.
Com o tempo os conceitos de humanismo já parcialmente disseminado, algumas
leis tentaram ajudar a mitigar o sofrimento das pessoas e principalmente dos
trabalhadores, esposas e filhos. Todo esse processo proporcionou sementes que
deram origem a necessidades de proteção das pessoas e consequentemente da
Previdência estrangeira, inicialmente na Inglaterra. Mesmo antes da revolução
industrial, a Inglaterra foi considerada a pioneira na assistência aos pobres. Estava na
Lei.
Em 1601 “Poor Law”86 objetivou a instituição de um esquema assistencial para
atender aos pobres onde foi instituído um imposto sobre os chefes de família.
O tempo passou e o corporativismo medieval - como o imaginamos devido às
leituras nos livros de história e filmes - foi diminuindo. Esse corporativismo
medieval tinha criado legiões de “sem casa”, de famintos e de doentes. A rainha
Isabel I tentou mitigar os problemas com um sistema assistencial, servindo-se das
paróquias que foram instituídas como unidades básicas, que cobravam impostos, a
chamada taxa dos pobres.
Posteriormente foi promulgada a Nova Lei dos Pobres (New Poor Law), mas
sem que tivesse resolvido o problema a população inglesa – grande parte dela –
proletários – viviam às custas do Estado. Para as pessoas da época, na Inglaterra,
era muito difícil sair da situação de miséria e fome, pois a inércia de antigas decisões
do Reinado dizia também que os proletários deveriam se manter no mesmo
domicílio. Enfim, o consenso das elites que se utilizavam de mão de obra na época,
era de que algo deveria ser feito.
Foi constituída então a formação de um fundo, alimentado com as contribuições
pagas pelos funcionários públicos, de onde saiam as pensões de aposentadoria para o
funcionário contribuinte. Entretanto a consciência nacional, despertada pelos
intelectuais absorve a idéia de que, de fato, pertence ao Estado à responsabilidade
de Bem Estar Social, mas os passos foram lentos.
Deveria ser um Estado Providência? Deveria caber a sociedade definir, se a
função social do Estado deveria ser exclusivamente, a de garantir a
86 Lei dos pobres. A Lei dos Pobres 1601: Primeira Lei Assistencialista e Política de Bem
Estar Social. http://www.webartigos.com/artigos/a-lei-dos-pobres-1601-primeira-lei-
assistencialista-e-politica-de-bem-estar- social/101885/#ixzz2zIObJhMc
144
sobrevivência, ou se tal função deveria ser de garantir o bem estar básico de todo
cidadão. Restava saber a definição do que é “bem estar básico”.
O parlamento Inglês em 1908 promulgou a Lei de Pensões de Velhice (Old-Age
Pension Act), que proporcionava aos maiores de 70 anos uma pensão máxima de
pouco mais de 25 pences. Outros Old-Age Pension-Act existiram. Com o passar
dos anos o sistema foi aperfeiçoado, até que em 1942, com aceitação do Plano
Beveridge, foi desenhado um sistema de seguros sociais, sendo o sistema de ajuda
aos pobres, substituído por um sistema nacional de assistência. Essa foi,
poderíamos denominar como a primeira semente da Previdência no mundo Ocidental.
A colaboração Francesa na Proteção às Pessoas
A França também teve seu partido positivo nessa história da proteção às
pessoas. Encontramos na historia previdenciária da França a maior riqueza que
temos como antiga referencia. Em 1788 um matemático Francês Duvillard - ele era
também um sociólogo estudioso - e se preocupou, lutando para encontrar através
do seguro, esquemas sociais de ajuda aos pobres e concebeu um folheto de
propaganda que foi chamado de Prospectus. Foi ele quem criou uma das primeiras
tábuas de mortalidade com as características que temos até os dias de hoje. As
pressões de elites e de proletários e intelectuais eram crescentes. Nasceram os
meios corporativos, sobretudo nas associações profissionais. A revolução francesa
ao mesmo tempo em que apoiava o direito irrestritivo de associação também
condenava toda a forma da associação profissional, mas a pressão era muito forte. 87
Várias foram as sementes e esta pode ser considerada como a segunda semente.
Foi assim aceita a concepção do Estado-Providencia, cuja primeira manifestação
real, se bem que modesta, foi à criação, no ano de 1801, do Departamento de
Beneficência para Ajudar os Necessitados. A sociedade, principalmente a burguesia,
não se intimidou com a lei contra o direito da associação nem com a condenação
do seguro e do mutualismo e continuaram a atuar na clandestinidade.
Não se deve esquecer que a consciência da burguesia antes da Revolução
Francesa, perante o sofrimento e a miséria dos proletários pelos desmandos e
egoísmo das elites, era a de que só a fraternidade, a solidariedade e a filantropia
seriam capazes de minorá-los. Chega de associações e filantropia. Era a hora das
leis.88 13
Começa um despertar e a terceira semente começa a dar sinais de que quer
brotar. A primeira Caixa de Poupança popular foi constituída em 1818, que objetivava
a formação de uma poupança e apoio da ajuda mutua, já que os seus associados
pertenciam a todas as classes sociais. Havia a insensibilidade dos governos em
relação à questão social. Essa poupança popular foi firmada como uma solução
previdenciária, ocupando a mutualidade voluntária, pouco a pouco, o espaço que
deveria ser preenchido pelo Estado. Era tudo novidade.
87 O próprio Napoleão Bonaparte reconheceu, em 1802 a associação Filantrópica de Paris
e autorizou, em 1813 a constituição de uma associação de socorros mútuos formada por
mineiros. 88 A Lei Chapelier, de 17 de junho de 1791 denunciava como imoral toda forma de
seguro e de mutualismo, foi a grande responsável pelo insucesso do seguro de vida em todo o
século XIX.
145
E outras sementes começaram também a dar resultados. Isso abriu caminho
para operação dos seguros de vida. Proporcionando pensões aos inválidos do trabalho
e as viúvas dos empregados mortos no trabalho, particularmente a custo zero, já
que os custos do plano era suportado pela própria folha dos salários. Assim a
“seguridade” chegou aos esquemas privados de segurança social dos trabalhadores.
O movimento privado continuava, gerando concorrência entre as seguradoras.
Com a constituição, em 1890 da Ligue Nationale De La Prevoyance Etdela, que
estudou cientificamente a previdência e mostrou o que ela custa para a instituição
e os vários caminhos que poderia seguir dali em diante.
A quarta semente pode ser representada pela entrada dos Estados Unidos no
assunto previdenciário. Na verdade os Estados Unidos, cujo sistema de previdência
social só foi criado, pelo Social Security Act em 1935, oferecem referencia do
maior interesse no campo da instituição da Previdência ou Seguridade. Como
ilustração pode ser citado o primeiro fundo de pensão publico suportado pela
Administração Publica, data de 1857 e foi instituído na cidade de Nova York para os
membros de seu corpo de policia.
Outras semeaduras aconteceram. O primeiro fundo de pensão privado
suportado pelo empregador data de 1875 pela empresa American Express
Company. O primeiro fundo de pensão suportado em conjunto
proporcionando-lhes trabalho ou quer assegurando-lhes os meios de existência
àqueles que não se encontram em “estado de trabalhar”.
E no Brasil como tudo aconteceu?
Enquanto na Europa já se falava e se discutia formas de Seguridade Social,
embora pífias para análise nos dias de hoje, no Brasil colonial as Misericórdias é que
existiam sob a manta da Igreja Católica e algum auxílio das Províncias. O Brasil tem
uma longa história previdenciária – já comparada com referenciais europeus e
americanos - que começam ainda nos tempos coloniais. Tanto em estruturas
privadas como em estruturas governamentais observa-se que, na medida, na índole
do povo brasileiro, tem lugar destacado a preocupação com a segurança do porvir.
Essas preocupações nasceram por razões lógicas, nos primeiros anos da
colonização, tendo levado à instituição de uma verdadeira rede de
Misericórdias,8916 e continuando depois com as instituições de socorros mútuos,
cuja forma mais evoluída se traduziu na constituição dos Montepios.
Atribui-se a Brás Cubas a instituição do primeiro Montepio (organização por
iniciativa popular) no Brasil, no mesmo ano em que fundou a misericórdia de
Santos. Segundo o historiador Dr. Ernesto Pereira dos Reis, Brás Cubas, depois de
constituir a Santa Casa, em 1543, instituiu um plano de pensão para os seus
empregados. Este esquema previdenciário foi depois copiado e instituído para os
funcionários das Casas de Misericórdia de Salvador e Rio de Janeiro e outros locais.
89 Proteção à brasileira. Quando o frei Tomé de Souza aportou no Brasil como primeiro
governador-geral, no ano de 1548, já o núcleo populacional de Olinda tinha constituída a primeira Misericórdia, no ano de 1539. Contestada como sendo a primeira, pois os registros apontam para a de Santos criada por Brás Cubas no ano de 1543, como sendo a primeira. A verdade é que, quer em Olinda ou em Santos, quando o governador-geral veio para o Brasil já existia uma casa de Misericórdia. Há no Brasil, atualmente, até 2014 – mais de mil entidades. Só em São Paulo, até 2011 eram 398 Santas Casas de Misericórdia.
146
O embrião da previdência está na realidade nos Montepios – o nome de Montepio
– vem do italiano Monte di Pietà, chamado no plural Montes Pios, que eram
instituições de caridade e sociedades privadas de ingresso voluntário, para
fornecer empréstimos de pequena escala em condições mais favoráveis que as do
mercado em troca de uma promessa.
Nesse local os pobres poderiam obter uma quantidade de recursos – dinheiro -
penhorar seus pertences para satisfazer as suas necessidades mais básicas que
pudessem usufruir no futuro, como o de ser subsidiado em caso de doença, prisão ou
impossibilidade de ganhar, e o de deixar uma pensão após a morte para sua família.
Já eram formas de se tentar encontrar caminhos alternativos de proteção às pessoas.
Por outro lado, num passado recente, os empréstimos de recursos com juros era
proibido pela igreja. Esquema nascido no século XV, na Itália, por iniciativados
franciscanos, como forma de combater a Usura. A Usura era proibida pela Igreja,
bem como a cobrança de juros. Esse dogma moral acabou caindo por terra. Sabe-se
que a origem dos Montepios deu-se através de um italiano presbítero
franciscano Marcos de Montegallo que teria sido beatificado precisamente por ter
criado Montes-Pios em várias cidades, por essa altura.
Naquele tempo, essa prática não era permitida aos cristãos e apenas quem dela
fazia uso eram apenas os judeus, pois sua religião assim permitia. A palavra
"monte" já se referia uma caixa pública de dinheiro, para atender às necessidades
financeiras ou de obras públicas, e a ela foi acrescentado o nome da "misericórdia
(di Pietà)" de outros tipos de financiamento cumprindo caridade e solidariedade.
O Brasil e a proteção às pessoas – breve resumo
1543 – Santa Casa de Misericórdia de Santos foi considerado o primeiro Fundo de
Previdência caracteristicamente Fechado estabelecido no País. Somente em 1835
foi criado o Mongeral que até os dias atuais está em pleno funcionamento, embora
tenha passado por todos os planos econômicos e as dificuldades políticas e
financeiras do Brasil, em todos esses anos que se passaram.
Os demais fundos criados foram: 1889 – Fundo de Pensão dos Trabalhadores da
Oficina Régia; 1893 – Caixa dos Empregados da Casa da Moeda; 1904 – a Caixa dos
Funcionários do Banco do Brasil e em 1913 – GBOEX (Exército) para atender os
oficiais que iam para a Reserva. Observa-se que a maioria deles tinham relações
com o governo.
Muitos outros apareceram daí em diante. Tudo isso continuou, de uma forma ou
de outra até final de 1970 onde houve o total descrédito desses Fundos. A inflação
corroia todos os valores e os investimentos de muitos e muitos anos de participantes de
planos e fundos de Bancos viraram pó, à exceção dos Fundos das empresas estatais.
Por exemplo, em 1970 foi criado o Petros – Fundo fechado de Previdência dos
Funcionários da Petrobrás.
A 2ª. Fase da Previdência no Brasil foi marcada pela Lei Eloy Chaves e Caixas de
Aposentadorias e Pensões. O Decreto Lei 4.682 de 1923 implantou no Brasil a
Previdência Social. Nesse fértil período foram criadas as “caixas de aposentadoria
e pensões” para os empregados das empresas ferroviárias com os benefícios de
aposentadoria por invalidez, aposentadoria ordinária - atualmente aposentadoria por
tempo de contribuição - a pensão por morte e a assistência médica.
Com o passar do tempo os benefícios foram estendidos aos empregados das
empresas portuárias, serviços telegráficos, de água, energia, transporte aéreo, gás,
147
mineração, até atingir 183 caixas de aposentadoria e pensão. Posteriormente foram
unificadas na Caixa de Aposentadoria, Pensões dos Ferroviários e Empregados em
Serviços Públicos. (Funenseg, 2007, p. 8 e 15 e CVG, 2008, p. 5).
A uniformização da legislação e unificação administrativa marcou uma fase
importante da Previdência no Brasil, com a Lei 8.212/91, a Previdência Social passa a
assegurar aos seus beneficiários meios indispensáveis de manutenção, por motivo de
incapacidade, idade avançada, desemprego involuntário,encargos de família e
reclusão ou morte daqueles de quem dependiam economicamente (Funenseg, 2007,p.
8).
Em outra fase destacam-se os Institutos de Aposentadorias e Pensões dos
Marítimos criados em 1933, iniciando a organização dos institutos com
abrangência nacional, em seguida dos Comerciários e Bancários, Industriários,
criando uma Caixa Única de Aposentadoria e Pensões dos Ferroviários e Empregados
em Serviços Públicos em 1953.
Em 1960 foi promulgada a “Lei Orgânica da Previdência Social”, a revolução de
1964 fez o Presidente Marechal Humberto Castello Branco criar o INPS Instituto
Nacional da Previdência Social (1974), o General Ernesto Geisel promulgou o Estatuto
do Trabalhador Rural (FUNRURAL), criou o Ministério da Previdência e Assistência
Social, desmembrado do Ministério do Trabalho; implantou a Consolidação das
Leis da Previdência Social (1976) e criou o SINPAS Sistema Nacional da
Previdência e Assistência Social (1977) (Funenseg, 2007, p. 8 e 15 e CVG, 2008, p. 5).
Affonso Almiro (1978, p.35) confirmou a extraordinária repercussão alcançada
no Brasil, dos estudos e debates sobre a previdência supletiva, demonstrando o
amadurecimento do empresariado nacional, das suas responsabilidades sociais, frente
ao desenvolvimento econômico.
Dentro desta realidade econômica, se estruturou e desenvolveu a previdência
supletiva, completando e fortificando a previdência social, direito inalienável do
trabalhador e dever imperativo do Estado moderno.
No governo do Presidente Fernando Henrique Cardoso foi efetuado a reforma
constitucional e através da Emenda Constitucional 20 de 1998 modificou a
Previdência Social e estabeleceu normas de transição. Foi definido que a seguridade
social compreende um conjunto integrado de ações de iniciativa dos poderes
públicos e da sociedade, destinadas a assegurar os direitos relativos à saúde, à
previdência e à assistência social (CVG, 2008, p. 6)..
As mudanças propostas
começaram a ser implantadas pelo Presidente Luiz Inácio Lula da Silva.
Troca da aposentadoria por tempo de serviço por tempo de contribuição, extinção
das aposentadorias proporcional e por idade, alteração do regime financeiro,
alteração da base e da alíquota de Contribuição, cobrança de contribuição dos
funcionários públicos inativos, aplicação do Fator Previdenciário para cálculo da
aposentadoria.
Os tipos de aposentadoria assegurados pela Previdência Social são:
Aposentadoria por Idade, todo trabalhador que contribuiu para a Previdência
Social por 180 meses e tenha 65 anos, no caso dos homens, e 60 anos, no caso das
mulheres, tem direito a se aposentar. Para os trabalhadores rurais, a idade mínima é
reduzida: 60 anos para os homens e 55 anos para as mulheres.
Aposentadoria por Invalidez, trabalhador considerado incapacitado
definitivamente para o trabalho pela perícia médica do Instituto Nacional do
Seguro Social (INSS), por motivo de doença ou de acidente, depois que o
148
trabalhador se inscreveu na Previdência Social. O aposentado por invalidez
precisa passar pela perícia médica a cada dois anos.
Aposentadoria por Tempo de Contribuição, o homem deve comprovar, pelo
menos, 35 anos de contribuição e a mulher, 30 anos. Os professores têm esse tempo
reduzido em cinco anos.
Aposentadoria Especial, benefício concedido ao trabalhador empregado, avulso
e contribuinte individual filiado à cooperativa que tenha trabalhado em condições
prejudiciais à saúde ou à integridade física. Para ter direito, o trabalhador deve
comprovar o tempo de trabalho, a exposição efetiva a agentes nocivos físicos,
biológicos, químicos ou associação desses agentes prejudiciais por 15, 20 ou 25
anos, conforme o caso.
A proteção social tomava corpo de seguridade conforme a Constituição, faltava
todavia, dar regulamentação a Previdência privada.
A Previdência Privada – Brasil
O tempo passou, a inflação destruiu todos os tipos de poupança e era necessário
criar mecanismos para atrair novamente os recursos do público para os Fundos de
Investimentos. Aplicações de recursos em quaisquer planos estavam sem
credibilidade. Eram necessários marcos regulatórios. Um deles relativamente a
Previdência privada foi o primeiro alicerce em 1977 – Lei 6.435 de 1977 – que
formalizou a atividade de Entidades Privadas de Previdência Complementar no
Brasil, criando as seguintes entidades:
Abertas
Os planos dessas entidades são acessíveis a qualquer pessoa, mediante o
pagamento de contribuições periódicas por parte do participante ou de uma só vez
(BRASIL, SPC, Lei Complementar nº 109, 2001). Este tipo de plano pode ser
comprado em seguradoras e bancos por pessoas físicas, os chamados planos
individuais, ou por pessoas jurídicas, denominado também como planos coletivos.
Em resumo, as Entidades Abertas (Com fins lucrativos: Seguradoras) e as Sem
fins lucrativos chamados Montepios. Entidades Fechadas Fundos Multipatrocinados e
os Fundos Exclusivos. Tudo ainda, na época, muito confuso e difuso. Muitas foram as
tentativas de fazer essa estrutura crescer. Nas décadas de 70 e 80 economicamente o
Brasil não estava bem. A inflação destruía qualquer tipo de poupança da população e
das empresas. As pessoas desacreditavam da Previdência Complementar e quaisquer
outros tipos de aplicações. É óbvio. Muito dinheiro poupado por pessoas nessas
últimas três décadas 60, 70 e 80 tornou-se pó.
Aposentadoria e pessoas idosas têm grande grau de correlação e isso se
aplica na economia. Havia uma desconfiança generalizada dos mais velhos para
as novas gerações.
O Estatuto do Idoso veio para proteger a pessoa idosa e preservar as condições
mínimas de atendimento nas entidades governamentais e não governamentais. A
renda da Previdência Social é utilizada para substituir a renda do trabalhador
contribuinte quando ele perde a capacidade para o trabalho, seja por doença,
invalidez, idade avançada, morte e desemprego involuntário, ou mesmo a
maternidade e a reclusão. Neste mesmo período também foram criados os
Conselhos de Previdência Social, unidades descentralizadas do Conselho Nacional de
Previdência Social.
Maria da Glória Chagas Arruda (2004), mestra em Direito Previdenciário,
analisou em 2002, a Previdência Privada fundamentada no sistema de seguridade
social, como relação de consumo e os comandos do Código de Defesa do
149
Consumidor vigente desde 1990, identificando o consumidor com o participante e
beneficiário da previdência privada, assim como a entidade aberta de previdência com
a figura do fornecedor.
A previdência privada aberta tem o mesmo objetivo da seguridade social, que é o
de proporcionar o bem-estar aos indivíduos e, por conseqüência, a toda
coletividade, todavia, com exceções, é claro, trata-se apenas de mais um tipo de
aplicação financeira.
Fechadas
É necessário defini-la. A Previdência é fechada quando acessíveis
exclusivamente aos empregados de um grupo de empresas ou de uma só
empresa, as quais são denominadas patrocinadoras. As entidades sem fins
lucrativos, assistenciais, educacionais ou religiosas foram equiparadas às empresas,
podendo seus planos incluir seus empregados. Elas têm critérios próprios e muitas
são estatais.
Os planos desenhados para elas são específicos para cada entidade. Há a
criação de Estatutos e os planos têm os seus Regulamentos. Atualmente, todas
devem ser enquadradas na LC 109/2001 e suas normas posteriores. Há aquelas que
ainda mantêm os Planos chamados de “Benefícios Definidos”, mas há também
outros Planos como os de Contribuição Definida, Variáveis e os Mistos.
Deve existir patrocínio de uma empresa. São denominadas Patrocinadoras. Por
exemplo, o Fundo de Pensão Petros que é dos funcionários da Patrocinadora
Petrobrás e suas coligadas. A saída de patrocínio não é algo simples. Vejamos alguns
modelos:
Entidade UniPatrocinada - EFPC com apenas um patrocinador ou um instituidor,
normalmente com um único plano de benefícios aplicável a todos os participantes. Na
nova legislação recebem a denominação de Patrocinador Singular e Plano Comum.
Entidade Multipatrocinada e UniPlano - EFPC com vários patrocinadores ou
instituidores, mas com apenas um plano de benefícios, compartilhado de forma
solidária entre esses patrocinadores ou instituidores. É definida pela nova legislação
de Plano Comum e Multipatrocinada. É usual em conglomerado empresarial,
quando um único plano é oferecido a todos os trabalhadores do conglomerado, mas
tem diversas pessoas jurídicas patrocinando.
Entidade Multipatrocinada e Multiplano -EFPC com mais de um patrocinador
ou instituidor e mais de um plano de benefícios, para diversos grupos de
participantes. A nova legislação a define como Multiplano e Multipatrocinada.
Neste caso poderá haver diversos planos e vários patrocinadores sob guarida de
uma entidade multipatrocinada. Administração única para vários planos específicos,
um para cada conglomerado ou empresa patrocinadora.
As várias complementares - As Complementares foram regulamentadas pelo
Decreto 81.240/78, que definiu como "sociedades civis ou fundações criadas com o
objetivo de instituir planos privados de concessão de benefícios complementares ou
assemelhados aos da Previdência Social, acessíveis aos empregados de uma empresa
ou de um grupo de empresas, as quais são denominadas Patrocinadoras". As entidades
sem fins lucrativos, assistenciais, educacionais ou religiosas foram equiparadas às
empresas, podendo seus planos incluir seus empregados e os religiosos que as
150
servem. Até os Regimes Próprios de Servidores podem ter uma Previdência
Complementar, cujo Patrocínio é do Ente federativo. É o caso, por exemplo, da
Prevcom de São Paulo.
Especificidades das Entidades de Previdência.
Fundos de P Pensão: Denominação popular para Entidade Fechada de Previdência Complementar.
Sociedade sem fins lucrativos, constituida por uma Empresa ou por uma Entidade
de classe Sindical, cujo objetivo principal seja a concessão de benefícios de caráter
previdenciário, tendo como receita as contribuições dos participantes e se for o
caso das empresas Patrocinadoras. Os Fundos de Pensão podem ser Fundações e
também não tem fins lucrativos.
A Patrocinadora, que constitui a entidade fechada de previdência privada e
realiza contribuições em favor dos empregados, pode ser pública – no caso de
empresas públicas, sociedades de economia mista ou fundações vinculadas à
Administração Pública – ou privada. No caso de várias patrocinadoras, diz-se que
o fundo é multipatrocinado e exige-se a celebração de convênio de adesão entre elas
e a entidade de previdência.
As entidades fechadas têm como finalidade a administração e execução de
planos de benefícios de natureza previdenciária, sendo-lhes vedada a prestação
de quaisquer serviços que não estejam no âmbito de seu objeto.
Assim, a partir da Lei Complementar nº 109, ficou vedada a prestação de
serviços sociais, que pela legislação anterior não era proibida. Estão sob a égide
da LC 109/2001. Houve um período que poderíamos chamar de transição das
reformas. Como regra de transição, as entidades fechadas que, na data da
publicação dessa lei complementar, prestavam a seus participantes e assistidos
serviços assistenciais à saúde, podem continuar a fazê-lo, desde que seja
estabelecido um custeio específico para os planos assistenciais e que a sua
contabilização e o seu patrimônio sem mantidos em separado em relação ao plano
previdenciário. A Lei Complementar nº 109 também inovou ao trazer regras mais
detalhadas sobre a administração das entidades fechadas, que devem manter
estrutura mínima composta por Conselho Deliberativo, Conselho Fiscal e Diretoria
Executiva.
Outra inovação consistiu na exigência de representação dos participantes e
assistidos nos Conselhos Deliberativo e Fiscal, assegurado a eles, no mínimo, um
terço das vagas. Os membros do Conselho Deliberativo ou do Conselho Fiscal
devem atender aos seguintes requisitos: Comprovada experiência no exercício de
atividades nas áreas financeira, administrativa, contábil, jurídica de fiscalização ou
de auditoria; Não ter sofrido condenação criminal transitada em julgado; Não ter
sofrido penalidade administrativa por infração da legislação da seguridade social ou
como servidor público.
As entidades fechadas não podem solicitar concordata e não estão sujeitas a
falência, mas somente a intervenção ou liquidação extrajudicial.São previstas na
Lei Complementar nº 109 as modalidades de planos de benefícios, que podem
ser de Benefício Definido, Contribuição Definida e Contribuição Variável. As
definições foram normatizadas pela Resolução CGPC nº 16, de 22 de
novembro de 2005. O que é o CGPC?
O Conselho de Gestão de Previdência Complementar foi um órgão integrante
do Sistema Financeiro Brasileiro que era vinculado ao Ministério da Previdência
151
Social e possuia a função de normatizar e coordenar as atividades das Entidades
Fechadas de Previdência Complementar (conhecidas como fundos de pensão).
Também cabia ao CGPC julgar, em última instância, os recursos interpostos contra
as decisões da extinta Secretaria de Previdência Complementar - SPC. Em Março
de 2010 o CGPC foi extinto e em seu lugar foram criados o Conselho Nacional de
Previdência Complementar (CNPC) e a Câmara de Recursos da Previdência
Complementar (CRPC).
Os tipos de Planos nas Entidades Fechadas
Benefício Definido - Foram conceituados pelo artigo 2º da Resolução CGPC nº
16, da seguinte forma: “Entende-se por plano de benefício de caráter
previdenciário na modalidade de Benefício Definido aquele cujos benefícios
programados têm seu valor ou nível previamente estabelecidos, sendo o custeio
determinado atuarialmente, de forma a assegurar sua concessão e manutenção
(BRASIL Resolução CGPC nº 16, 2005). Os planos de Contribuição Variável estão
conceituados pelo artigo 4º da Resolução CGPC nº 16, da seguinte forma:
“Entende-se por plano de benefícios de caráter previdenciário na modalidade de
Contribuição Variável aquele cujos benefícios programados apresentem a
conjugação das características das modalidades de contribuição definida e benefício
definido.”( BRASIL Resolução CGPC nº 16, 2005).
Discussão: Qual a diferença entre o BD e o CD ?
No mundo Real
Hoje em dia, quase a totalidade dos Planos de Previdência Complementar são
oferecidos nas modalidades de Contribuição Definida ou de Contribuição Variável,
porque neste caso, o risco de não se acumular o valor esperado fica com o
participante do Plano, e não com a empresa que oferece o benefício, como ocorre
quando o plano de previdência é oferecido na modalidade de Benefício Definido.
Claro que tais Planos geram longas discussões, pois:
“O artigo 5º determina que na fase de acumulação
não haverá incidência de imposto de renda na fonte, no
caso de rendimentos pagos por instituições financeiras,
ou pago em separado, no caso de aplicações em bolsa e
assemelhadas, o que resulta na não tributação dos
rendimentos e ganhos auferidos na fase de acumulação.
Trata-se de demanda histórica do sistema de previdência
complementar e que torna a acumulação de recursos
por meio destes produtos totalmente livre de impostos, a
exemplo do que se verifica em outros países, sendo
este mais um incentivo à formação de poupança
previdenciária de longo prazo.” (José Roberto Carreta,
2005.)
Outro aspecto muito discutido e objeto de Decisão do STF é a probabilidade de
Penhora.
Planos coletivos - No caso de plano coletivo, o plano fica restrito a um grupo
152
exclusivo de participantes, podendo ser de funcionário de uma empresa, um grupo de
sócios. Estes planos serão denominados como averbados ou instituídos.
Plano averbado - No plano Averbado a empresa tem o papel de facilitador,
repassando as contribuições à Seguradora. A vantagem de um plano averbado é na
viabilização para os funcionários da compra de um plano de previdência com
condições privilegiadas, normalmente não disponíveis para pessoas físicas.
Isso significa melhores fundos e menos despesas de gestão ou administração que
traduz em maior rentabilidade dos investimentos. Porém, devido à falta de
contribuições da empresa, fica muito reduzida a adesão por parte dos
funcionários. No Instituído a empresa participa, total ou parcialmente, no custeio do
fundo. O mais comum nesse caso é o pagamento e a contribuição simétrica da
empresa, igualando até um patamar cada depósito feito pelo funcionário. Os planos
têm cada qual suas características próprias, mas muitos aspectos em comum, que
são os seus Institutos.
Alguns institutos
Portabilidade - Instituto pelo qual participante, após a cessação de seu vínculo
empregatício com o patrocinador, ou associativo com o instituidor, antes da
aquisição do direito a benefício pleno e desde que cumpridos os requisitos
regulamentares, desliga-se do plano de benefícios, transferindo os recursos
financeiros correspondentes ao seu direito acumulado para outro plano operado por
entidade fechada ou aberta de previdência complementar
Auto Patrocínio- Instituto que faculta ao participante, em caso de perda parcial
ou total da contribuição de seu patrocinador, manter a contribuição ao plano e
assumir a contribuição do patrocinador em relação à parcela reduzida. Desse modo,
o participante terá assegurado o recebimento futuro do benefício nos níveis
anteriormente pactuados.
Benefício proporcional Diferido - Instituto pelo qual o participante, após a
cessação de seu vínculo empregatício com o patrocinador, ou associativo com o
instituidor, e tendo cumprido a carência, opta por receber o benefício, em valor
proporcional ao tempo em que permaneceu contribuindo para o plano, na data
prevista para início do recebimento, ou seja, a partir do momento em que se tornar
elegível, conforme previsto originalmente no regulamento.
Resgate - Instituto que faculta ao participante receber, quando do seu
desligamento do plano, o valor das reservas constituídas. Neste caso algumas
variações existem conforme o plano. No mínimo, o valor do resgate deverá
corresponder à totalidade das contribuições vertidas pelo participante ao plano,
descontadas as parcelas de custeio administrativo que, na forma do regulamento e do
plano de custeio, sejam de sua personalidade. Todo plano de previdência possui um
regulamento, que é o Contrato de Natureza Civil, onde constam os direitos e
obrigações das entidades, patrocinadores, participantes e assistidos. O regulamento
define as regras de contribuição, os benefícios oferecidos e as condições de acesso
aos benefícios. Os planos de benefícios estão divididos em diversas modalidades,
cada qual com a sua particularidade.
Tipos de Benefícios Básicos - Aposentadoria, pensão, morte, rendas vitalícias ou
153
temporárias, pecúlio por morte e pagamento único; pecúlio por invalidez e
pagamento único.
Mas o que é Complementar?
Vamos entender tudo como “seguridade”. Não confundir com “assistência”. O
termo “Complementar” pode significar gestão do setor privado, mas pode apresentar–
se como obrigatoriedade para a comunidade assalariada por ramo profissional ou por
empresa. Em geral, o regime Complementar integra o sistema nacional de
seguridade social, assegurando pagamentos suplementares às oferecidas pelo regime
geral de previdência social. Em pesquisas que se faz pelo mundo os conceitos e os
conteúdos integrantes dos seguros sociais e Complementares nos distintos países não
são uniformes.
Variáveis que afetam os Benefícios
Estrutura da política de cargos e salários, esquema montado para promoções,
política de crescimento dos salários, políticas de contratação e demissão,
políticas deelegibilidade para aposentadoria, benefícios previstos na entrada
Benefícios previstos na saída ; Rotatividade na empresa. Todos esses
elementos estão na Legislação das EFPC. A legislação obriga ao monitoramento
Atuarial. Por isso as “Reavaliações Atuariais” são obrigatórias todos os anos.
Essas avaliações é que fornecem a análise do Equilíbrio Econômico Financeiro
do Plano. Os conhecimentos básicos dos aspectos jurídicos, administrativos e
atuariais também são ferramentas desse trabalho. Ter a visão técnica e jurídica
sobre todas as ferramentas que são utilizadas na Previdência Privada – seja fechada
ou seja aberta. Daí as consultorias nacionais e até internacionais. Essas noções
básicas resumidamente são: O que é Atuária, o que é um Regime Financeiro, como
se aplica, conhecimentos do Regime Geral de Previdência, Regime Próprio – RPPS
– dos Servidores, Base Legal, Regime dos Militares, como financiar, tábuas de
mortalidade, salário de benefício, Fator Previdenciário, expectativa de vida, tipos
de planos, período de diferimento, período de contribuição, período de percepção,
recebimento de rendas, o que é elegibilidade e outras regras ou institutos.
Quem pode dar Laudos técnicos
Contador não é Atuário e não pode fornecer Laudos em casos de Previdência,
Saúde Suplementar, Seguros e Capitalização.
As fases da Previdência
Os princípios são aqueles que estão na Constituição atual e se referem de
forma genérica. Necessário foi estabelecer leis e critérios. Como foram essas fases ?
Houveram muitos ajustes?Como funcionavam os Montepios até 1970 ?
A primeira fase da Previdência:
Montepios e Caixas de Socorro. O primeiro Montepio surgiu em 1835.
Montepio Geral dos Servidores do Estado (Mongeral). Ainda na primeira fase: A
154
Lei no. 3.397 de 1888 criou a ‘Caixa de Socorro’ para os trabalhadores das estradas
de ferro estatais. Em 1889, foi regulamentado um Montepio para os funcionários
dos Correios e um fundo de pensão para os empregados das Oficinas da
Imprensa Régia.
A segunda fase da Previdência:
A 2ª. Fase da Previdência no Brasil foi marcada pela Lei Eloy Chaves e Caixas de
Aposentadorias e Pensões. (Dec.Lei 4.682 de 1923 implantou no Brasil a
Previdência Social. Criação das ‘caixas de aposentadoria e pensões’ aos
empregados das empresas ferroviárias com benefícios de aposentadoria por
invalidez, aposentadoria ordinária (atualmente aposentadoria por tempo de
contribuição), a pensão por morte e a assistência médica. Ainda na segunda fase,
posteriormente os benefícios foram estendidos aos empregados das empresas
portuárias, serviços telegráficos, de água, energia, transporte aéreo, gás, mineração,
até atingir 183 caixas de aposentadoria e pensão. Posteriormente foram unificadas na
Caixa de Aposentadoria, Pensões dos Ferroviários e Empregados em Serviços
Públicos.
Numa terceira fase:
Na 3ª. Fase destacam-se os Institutos de Aposentadorias e Pensões dos Marítimos
criados em 1933. Tal fato deu início a organização dos institutos com abrangência
nacional, em seguida dos Comerciários e Bancários, Industriários, criando uma Caixa
Única de Aposentadoria e Pensões dos Ferroviários e Empregados em Serviços
Públicos em 1953.
Aqui começa a nascer o INSS e muito depois em 1991 a Seguridade:
Em 1960 foi promulgada a “Lei Orgânica da Previdência Social”, todavia, a Lei
“Orgânica da Seguridade Social” foi em 24 de julho de 1991, competindo ao poder
público, nos termos da lei, organizar a seguridade social, dando mais forma a
seguridade geral e a assistência, com base em princípios de:
I - universalidade da cobertura e do atendimento;
II - uniformidade e equivalência dos benefícios e serviços às populações
urbanas e rurais;
III - seletividade e distributividade na prestação dos benefícios e serviços IV -
irredutibilidade do valor dos benefícios;
V - eqüidade na forma de participação no custeio;
VI diversidade da base de financiamento;
VII -caráter democrático e descentralizado da gestão administrativa, com a
participação da comunidade, em especial de trabalhadores, empresários e
aposentados.
Podemos ainda dizer que aconteceu uma quarta fase:
A uniformização da legislação e unificação administrativa marcou a 4ª. fase da
Previdência no Brasil, com a Lei 8.212/91, a Previdência Social passa a
155
assegurar aos seus beneficiários meios indispensáveis de manutenção, por motivo
de incapacidade, idade avançada, desemprego involuntário, encargos de família e
reclusão ou morte daqueles de quem dependiam economicamente.
Dentro da realidade de 1977 criou-se a possibilidade de desenvolver os estudos
para uma Previdência Supletiva. Aí, dentro das situações do INPS começou a
nascer o INSS. Muitas mudanças aconteceram. A Lei 8.213/91 determina que
todo acidente do trabalho ou doença profissional deverá ser comunicado pela
empresa ao INSS. (Criação das AR’s – obrigatórias). Obrigatoriedade da criação
das Cipas, Exames médicos obrigatórios entre outras obrigações das empresas.
E depois? Neo-liberalismo?
No governo do Presidente F.H.C. foi efetuada a reforma constitucional através
da Emenda Constitucional 20 de 1998 modificou a Previdência Social e
estabeleceu normas de transição. Foi definido que a seguridade social
compreende um conjunto integrado de ações de iniciativa dos poderes públicos e da
sociedade. Destinadas a assegurar os direitos relativos à saúde, à previdência e à
assistência social. Dentro desse período de transição, iniciaram-se as articulações
para montar os Regimes Próprios dos Servidores Públicos já previstos em artigo
constitucional.
O RGPS – Regime Geral de Previdência Social
É necessário conhecer um pouco do Regime Geral da Previdência Social, seus
objetivos, para, em seguida, concluir a necessidade da complementação ou da
Previdência Privada. Como funciona e seus objetivos gerais.
Objetivos gerais da Previdência Social:
No mundo
Suprir as necessidades básicas de sobrevivência aos que se tornam incapazes para
o trabalho (ou seus dependentes), temporária ou definitivamente.
No Brasil:
A Constituição Federal de 1988 “ampliou” este conceito para “seguridade
social”, combinando três grandes sistemas: Previdência Social, Saúde e
Assistência Social.
O Direito a Previdência Social
No Brasil, o direito à Previdência Social, é garantido pela Constituição Federal,
em seu artigo 201, que exige: filiação obrigatória, caráter contributivo, e equilíbrio
financeiro-atuarial.
Regimes Previdenciários brasileiros:
Regime Geral de Previdência Social – RGPS, administrado pelo INSS (desde
1966); Regimes Próprios de Previdência Social para Servidores Públicos Civis
156
– RPPS (mais antigos), Regime de Previdência Social dos Militares. Outras:
Congressistas, Judiciário. Base legal: Artigo 201 da Constituição Federal e
outras. leis 8.212/91 e 8.213/91.
Segurados:
Todos os trabalhadores civis e seus dependentes, exceto os servidores públicos
efetivos, vinculados a Regimes Próprios – RPPS - Regime financeiro- atuarial:
Repartição Simples – simples divisão do “caixa” entre os segurados onde existe
o conhecido “pacto de gerações”. As contribuições dos atuais trabalhadores
ativos pagam as despesas com os atuais aposentados e pensionistas. Evoluiu, desde
o início, para “regime de caixa”.
São previstas três fontes de financiamento:
Empregador -
20 % da Folha de Pagamentos (portanto, contribuição sobre a remuneração
integral), mais contribuição variável de 1% a 3%, para acidentes de trabalho e mais
uma contribuição para aposentadorias especiais, se for o caso.
Empregado - Contribuição proporcional à remuneração (8%, 9% ou 11%), só até o
teto, atual de dez salários mínimos.
União - Nunca contribuiu, mas tem assumido o déficit (assim como se apropriou, no
passado, dos recursos excedentes).
Salário de Benefício (aposentadoria) - Média dos 80% dos maiores salários de
contribuição(corrigidos pelo IGP-M), a partir de julho/94 (início do Plano Real),
limitado ao teto e aplicado o fator previdenciário, que é um “redutor” que
combina tempo de contribuição com idade e expectativa de vida (com base nas
Tábuas Biométricas do IBGE).
O fator previdenciário, cuja equação é abaixo apresentada, foi instituído em 1999
(FHC) pela Lei 9.876. O Fator Previdenciário é, na verdade, um redutor de
proventos de aposentadoria criado com o objetivo de desestimular o trabalhador a
se aposentar cedo. De fato, quanto menor é a idade e menor o tempo de
contribuição, menor será o valor do provento a receber. Observe-se que
previdência complementar – não é “social”.
Onde: f = Fator Previdenciário;
TC = Tempo de contribuição;
ES = Expectativa de sobrevida no momento da aposentadoria;
Id = Idade no momento da aposentadoria;
a = alíquota de contribuição fixada em 0,31 [20% + 11%]
Características dos Regimes Próprios
Breve histórico dos RPPS Historicamente, as relações do funcionalismo com os entes estatais se
originam no séc. XIX, com a formação do Estado brasileiro. Tais relações eram
f T
c a I
1 d Tc a
157
vistas como pro labore facto - os cargos eram considerados doações do soberano,
sendo, em geral, vitalícios e a remuneração integral da atividade era convertida,
automaticamente, em proventos de inatividade. Não havia a “aposentadoria”, como
é hoje: o servidor nunca deixava de ser servidor apenas passava à inatividade, em
algum momento, sem perda salarial.
Os funcionários, proporcionalmente, não eram muitos e os entes estatais
adotavam uma estrutura administrativa híbrida, com contratações sem concurso
para funções temporárias ou interinas.
Houve mudanças no funcionalismo:
Não havia contribuição para a aposentadoria e os benefícios eram concedidos,
estendidos e ampliados sem avaliações de longo prazo. Na realidade não havia
critério técnico. A sociedade foi mudando com inovações nas políticas de gestão,
mas a previdência dos servidores até recentemente (1998), não acompanhou tais
mudanças.
Porque surgiu o RPPS?
Resumindo, a Constituição Federal de 1988 permitiu que os entes estatais
constituíssem seus regimes previdenciários próprios, mas isto não gerou de
imediato, nenhum movimento dos entes estatais (especialmente as prefeituras), no
sentido de construírem (ou “revitalizarem”) seus RPPS. Pagavam
asaposentadorias e benefícios com o dinheiro dos impostos comprometendo os
investimentos. E deviam muitos recursos ao INSS.
O início da crise: Mas, nos anos 80, havia uma grave crise econômica e uma das
formas de os municípios enfrentar foi encarar de frente o endividamento junto ao
INSS. Em 1989 Collor elege-se Presidente colocando como um dos principais
responsáveis pela crise, o próprio governo, que ele chamava de funcionários marajás
e apoiado nas teses neoliberais de estado mínimo resolveu tomar decisões
econômicas.
Muitos dos RPPS mais antigos apresentavam um “rombo” atuarial da ordem de
três ou quatro orçamentos de seu ente estatal. Era necessário dar um ponto final de
longo prazo para essa situação.
Saída para a crise: Entre outras medidas, Collor começou a cobrar as dívidas ao
INSS dos Estados e Municípios, fazendo aprovar a Lei 8.212/91 que permitia reter o
FPM e FPE (São fundos repassados aos municípios e estados pelo governo federal).
Diante da pressão, uma saída encontrada pelos municípios foi criar (ou reativar)
seus RPPS. Com isto passavam de devedores a “credores” do INSS, em razão da
compensação previdenciária. O Regime de RPPS começou a ser regulado na forma
abaixo e dentro do Regime Financeiro-Atuarial necessário ao caso. O profissional,
ao elaborar o estudo atuarial deve em conjunto com o Executivo do ente estatal,
definir o regime financeiro-atuarial.
158
Base legal
Os entes estatais - União, Estados e Municípios - tem autonomia para constituir
seus regimes previdenciários, para servidores . A Constituição Federal de 1988
“reconhece” a existência dos RPPS: Art. 40 assegura previdência para servidores.
Art. 149, § 1° permite aos entes estatais recolher contribuições previdenciárias e
Art. 201, § 9° institui a contagem recíproca e compensação financeira.
O que é contagem recíproca? A maioria das aposentadorias são concedidas em
função do tempo de contribuição (em geral, 35 anos para homens e 30 anos para
mulheres). Para isso, a Constituição (no § 9º do artigo 201) assegura que todo
tempo de contribuição ou trabalho seja computado, não importando para qual
regime foram recolhidas as contribuições.
Planos de Benefícios no RPPS
Benefício definido As contribuições são definidas pelo Atuário em função do valor
e do momento em que começarão a ser pagos os proventos de aposentadoria, valor
este definido “a priori”.
Contribuição definida A contribuição é definida pelo segurado - em função de suas
posses e interesses - e o valor do provento dependerá dos recursos acumulados à época
ou seja, o “risco” do investimento é assumido pelo segurado para salários que
ultrapassam o teto do RGPS.
Profissão do futuro: O Consultor Previdenciário
No exterior já é comum a figura do consultor previdenciário, mas no Brasil esse
profissional é o que dá entrada na aposentadoria.
Questões do tipo: “tenho 50 anos de idade e 35 anos de tempo de contribuição.
Peço a aposentadoria agora ou aguardo mais cinco anos e aumento meu
benefício em torno de 35%? Que efeito acontecerá em meu benefício
complementar?” Algumas rupturas vão acontecendo por fatores sociais que se
apresentam como, por exemplo:
A longevidade:
Em partes da Europa há mais cadeiras de rodas que carrinhos de bebê. Pessoas
acima de 65 anos na China (165 milhões) são mais numerosas que toda a população
da Rússia e vivem na zona rural. No meio desse século a população do Japão terá se
reduzido a metade da atual e quase 1/3 terá mais do que 65 anos. Não só o mundo
desenvolvido envelhece. O sudeste do Brasil e partes da África tem o mesmo perfil
demográfico de envelhecimento que a Europa. Em 2025, 57% da população acima
dos 80 anos estará vivendo nas regiões mais pobres do mundo e em 2050 serão 70% (
MIT – AgeLab e Plano Internacional de Ação sobre o Envelhecimento – ONU).
Como sabemos quando o País está envelhecendo?
O índice de envelhecimento de uma população é apresentado como a relação
entre o número de pessoas com 60 anos ou mais e o de jovens, com menos de 20 anos.
159
Segundo a ONU uma população está envelhecendo quando 7% de seus habitantes
têm mais de 65 anos.
Brasil: Flex Seguridade: o que é? É uma solução que traz consigo a quebra de velhos paradigmas surgidos em face da
interpretação do antigo marco regulatório do Regime, a lei nº 6.435, de 1977. A partir
da Emenda Constitucional nº 20, de 1998, os princípios que norteiam o Regime são bem
claros e permitem visões bem mais amplas e flexíveis do que antes e precisam ser vistos
pela ótica da inovação.
Tendências Latino Americanas na Previdência:
Outros países
O que acontece com os sistemas previdenciários? Na Inglaterra e na Austrália –
não é compulsória a aposentadoria e no Chile de 10 milhões em idade de trabalho, 3,5
milhões estão em período produtivo o que fornece 35% das pessoas. O estresse dos
sistemas previdenciários é mundial. O que de fato está acontecendo? Está havendo
uma exposição dos sistemas previdenciários implementados por alguns países latino
americanos. Fato interessante e que questiona os demais países da América Latina,
podendo fazer comparações ao longo do tempo.
Um deles é o modelo chileno - O modelo chileno teve seu sistema amplamente
reproduzido em todo o mundo, sendo sua divulgação efetuada pelos formuladores
políticos que projetaram sua composição, de formação neoliberal. A principal
característica deste modelo é a delegação total da geração de renda para
aposentadoria ao setor privado, mantendo-se o Governo como regulador e órgão
pagador dos beneficiários do antigo regime, cujos direitos de aposentadoria foram
adquiridos antes de 1981. O objetivo principal de sua implementação foi a
contenção do gasto público em Previdência e o incremento da poupança nacional,
tendo sido parcialmente atingidos. Sua aprovação, de cunho forçado, ocorreu durante
o regime militar de Augusto Pinochet e foi imposta à sociedade sem consultas prévias.
Dentre as reformas efetuadas na América Latina, Mesa-Lago (2003) destaca as dos
seguintes países: Peru, Colômbia, Argentina, Uruguai, México e Bolívia. A reforma
no Peru ocorreu no governo de Alberto Fujimori, no final da década de 1980.
Naquele período, o país estava em uma situação de desordem econômica geral,
com o sistema público de previdência beirando o colapso. O governo tentou então
efetuar uma reforma estrutural, baseada no modelo chileno cuja reestruturação
ocorrera em 1981, porém não obteve aprovação parlamentar.
O Poder Executivo foi então investido de amplos poderes para formular um
conjunto de normas que reestruturassem o sistema e, em 1991, foi apresentado um
novo projeto, cujo fundamento estava baseado nas idéias de privatização do modelo
chileno. Devido às eleições para Assembléia Constituinte que ocorreriam em 1992,
no entanto, o Governo voltou atrás em alguns pontos, deixando de fora da
obrigatoriedade de adesão ao novo sistema para as Forças Armadas e o funcionalismo
público.
Com critérios confusos e contraditórios com os do sistema público, o sistema
privado somente passou a funcionar de fato a partir de 1995/96, quando as
características das duas modalidades foram equiparadas(MESA-LAGO, 2003).
160
Colômbia A Colômbia instituiu em 1991 a Seguridade Social como sendo
responsabilidade exclusiva do Governo. Já para a Previdência Social, foram
propostas três modalidades: uma exclusivamente pública, com sugestões de ajustes
a serem efetuados de forma urgente, uma exclusivamente privada baseada no modelo
chileno e uma mista. Com uma concentração de políticos liberais à frente de
importantes cargos no Estado, como o Ministério das Finanças e o Banco Central, foi
encaminhado ao Congresso um projeto ancorado no sistema privado.
Uruguai No Uruguai a crise previdenciária em meados de 1980 já tomava proporções
mais severas do que nos outros países latinos, tornando a reforma iminente. No
entanto, foi também o país que teve as maiores dificuldades em aprová-la efetuando
várias tentativas, iniciadas ainda no regime militar, e concretizando sua reforma
somente em 1995, no segundo governo de Julio Sanguinetti. Em 1985, tentou-se um
acordo para redução do valor real das contribuições, porém o Governo foi derrotado
pela oposição, aliada a grupos de interesse, sindicatos e comissões de aposentados.
O Governo efetuou nova tentativa de reforma em 1987, cuja aprovação foi
revogada em 1989 através de um referendo popular com percentual de 82% de votos
contrários. No período 1991/92 foram efetuados três novos projetos, sugerindo
sistemas mistos, com diferentes proporções, porém todos foram rejeitados no
Congresso. Em 1995 os partidos políticos tradicionais, Blanco e Colorado,
formalizaram um acordo político e finalmente conseguiram aprovar o projeto de
reforma previdenciária, passando este a vigorar a partir de 1996.
Neste modelo, embora tenha excluído a polícia e os militares, os contribuintes na
sua integralidade foram divididos em dois segmentos por idade e em três
segmentos por renda, preservando os direitos dos segurados mais antigos. Em 1996 e
1999 houve novas tentativas de anular as reformas implementadas porém, ambas
foram rejeitadas. Em 1999, 51% dos segurados permanecia no esquema antigo.
Argentina Na Argentina o sistema público de Previdência também estava com sérias
dificuldades no início da década de 1990 e necessitava de reformas urgentes. Porém,
ao contrário de outros países latinos cujas reformas foram esquematizadas por
Governos militares, na Argentina a reforma foi iniciada no Governo democrático de
Carlos Menem. O novo ministro para assuntos internacionais, Domingo Cavallo,
providenciou um estudo técnico fundamentado nas reais necessidades da população
argentina e levou à discussão da sociedade um novo sistema previdenciário, que
seria composto por um segmento público, com garantia de renda básica, e um
segmento privado, a ser utilizado como complemento. O projeto foi apresentado em
1992 e aprovado em 1994, após diversas modificações e concessões efetuadas a
alguns segmentos de trabalhadores organizações trabalhistas e, em 1999, 78% dos
segurados estavam filiados ao mesmo (MESA-LAGO, 2003). Atualmente na
Argentina a Previdência está totalmente estatizada.
México No México o Partido da Revolução Institucionalizada (PRI) esteve no poder de
1920 a 2000 com um modelo de gestão política que aliava Governo, trabalhadores
e empregadores. Na década de 1990, após a crise da dívida externa da década
anterior e com uma inflação acentuada, o Instituto Mexicano de Seguridade Social
(IMSS), segmento previdenciário oficial, enfrentava uma crise acentuada, com uma
relação contribuinte/beneficiário chegando à proporção de um por um. Em 1990, o
161
Banco Mundial juntamente com algumas instituições internas, formulou um novo
projeto para a Previdência, baseado no modelo chileno, mas sem copiá-lo
integralmente.
O novo projeto foi rejeitado pelo IMSS que propôs uma reforma paramétrica.
Em 1992 foi aprovado o Sistema de Poupança para a Aposentadoria (SAR) um
sistema de poupança privada compulsório, com gerenciamento do setor privado e
financiado por contribuições dos empregadores9. Mesmo com a reforma, a crise do
sistema oficial continuou acentuada e, em 1995, foi proposta uma reforma estrutural
cuja aprovação ocorreu em 1996 e entrou em vigor a partir de 1997.
Destacam-se no novo modelo a adesão compulsória, embora tenha se permitido
aos participantes a opção de escolha no momento da aposentadoria por um dos dois
regimes; a exclusão da aposentadoria por idade pelo IMSS; a manutenção dos
privilégios de alguns grupos, notadamente servidores públicos e militares e a
introdução de múltiplas gerenciadoras de investimento, tanto públicas como
privadas. Sendo de caráter obrigatório, em 1999 100% dos segurados participavam
deste regime (MESA-LAGO, 2003).
Bolívia Na Bolívia a crise previdenciária começou ainda na década de 1970 e acentuou-
se na década seguinte. Em 1991 o Governo propôs uma reforma estrutural, mas
a proximidade das eleições gerou seu arquivamento. Já em 1993, o presidente
eleito Gonzalo Sánchez de Losada encaminhou novo projeto, baseado nas reformas
estruturais adotadas no Chile e com apoio das Instituições Financeiras Internacionais
(IFIs). Sua aprovação no Congresso foi imediata apesar de protestos da sociedade
civil e algumas associações de aposentados e pensionistas que não possuíam, no
entanto, força política enquanto oposição. A reforma boliviana se aproxima da
chilena, diferindo em alguns tópicos, como a não garantia de uma pensão mínima
pelo Estado, a transferência compulsória de todos os segurados para o novo regime e
a manutenção de somente duas administradoras para os novos fundos de pensão.
Países desenvolvidos Sob as mesmas condições fundamentais o mercado de previdência privada
tem crescido consistentemente ao longo das últimas décadas em diversos países
desenvolvidos e, particularmente em um país em desenvolvimento, o Chile.
Nestes países a proporção entre Ativos / PIB chega a 85% nos EUA, 120% na
Holanda e 50% no Chile. Constituí-se a previdência privada em uma importante
ferramenta de alavancagem da poupança interna, bem como em impulsora dos
mercados de capitais.
Nos Estados Unidos, os ativos totais chegam a quase US$ 9 trilhões,
distribuídos entre planos dos três níveis de governo e do setor privado. Praticamente
todo o funcionário de qualquer empresa norte-americana tem acesso a uma das
diversas modalidades disponíveis.33
Nos últimos oito anos, o patrimônio dos fundos
de pensão cresceu três vezes e o dos fundos abertos, mais de seis vezes. Ainda
assim, os ativos previdenciários são pequenos no Brasil, comparados aos de países
desenvolvidos - na Holanda, superam os 130% e na Grã-Bretanha, 80% do PIB,
com média de 75% do PIB nos países- membros da OCDE.
Outros dados relevantes: projeções – Brasil e comparações O volume de recursos acumulado nos fundos de previdência privada deve
passar dos atuais 21% para 52% do PIB brasileiro, em 2020. A previsão é da
consultoria Keyassociados e foi calculada com base no ritmo de crescimento dos
162
fundos de VGBL na última década, que superou 19% ao ano, dos fundos fechados
(10%) e do PIB (3,6%). Apesar da expectativa, ainda se trata de uma proporção
consideravelmente inferior à verificada em países como Austrália (90%), Estados
Unidos (72%) e Chile (64%), segundo dados da OCDE. A Keyassociados é
parceira da Mongeral Aegon no primeiro produto do mercadobrasileiro de previdência
baseado em conceitos de sustentabilidade (Keyassociados – por Marina Rossi – acessado
em 18/04/2014).
Outras Variáveis importantes As megatendências e os Fundos de Pensão Há um relatório desenvolvido pela KPMG (“The Future State 2030)
sobre o
futuro do Estado, que apresenta e detalha as nove megatendências globais que vão
exigir a atenção dos governos em todo o mundo, nas próximas duas décadas. Ao
divulgar o trabalho a consultora não correlaciona qualquer delas com nenhum
segmento em particular, mas chama a atenção para o fato de que logo as duas
primeiras têm um impacto direto com os fundos de pensão: Mudanças
demográficas e ascensão das classes sociais, enquanto uma terceira, urbanização
acelerada, é referida mais tarde.
As três alimentam uma relação direta com o nosso sistema, de vez que
especialmente o aumento da longevidade faz naturalmente crescer a demanda por
planos complementares e, da mesma forma, a melhoria no padrão de vida e
consequentemente o desejo de conservá-lo na aposentadoria. A presença de mais
gente nas cidades amplia o mercado de trabalho e, em decorrência, a massa
potencial de participantes.
A previsão é de que no ano de 2030 teremos no mundo mais de 1 bilhão de
pessoas com mais de 65 anos, fruto não só da maior longevidade mas também das
menores taxas de natalidade. Quando isso acontecer, e talvez até antes disso, os
sistemas de pensão e saúde estarão sob severa pressão, tendo a sua solvência colocada
em teste.
Por sua vez, estudo do BID aponta que a maior parte dos países da América
Latina e do Caribe ainda tem populações relativamente jovens, o que permite fazer
as reformas agora ou, ao menos, não deixar muito para depois. Segundo o estudo,
6,8% da população da região tinha mais de 65 anos em 2010. Mas as estimativas
apontam que em 2050 essa taxa será de 19,8%, ou 140 milhões de pessoas.
A região passará a ter 3,2 pessoas em idade ativa para cada idoso quando
chegar 2050, contra 9,6 em 2010. Nesse período, a cada ano o número de idosos
aumentará em 2,6 milhões. Assim, a população com mais de 65 anos representará entre
23% e 27% do eleitorado, dependendo do país. Em 2010, esse índice ainda era de 10%
em média (“O Futuro do Estado em 2030” (“The Future State 2030), desenvolvido pela
KPMG em 17/03/2014).
Redução das taxas de natalidade e aumento da longevidade O que os leitores fariam para tentar melhorar, a longo prazo, a situação geral
econômica, social e consequentemente um “Welfare State” mais convincente?
O Bônus demográfico
Por definição o Bônus Demográfico é um fenômeno que ocorre em um período de
tempo no qual a estrutura etária da população apresenta menores razões de dependência
(menos idosos, crianças e adolescentes) e maiores percentuais de população em idade
economicamente ativa, possibilitando que as condições demográficas atuem no sentido
de incrementar o crescimento econômico e a melhoria das condições sociais dos
cidadãos do país.
163
As relações de dependência
de 0 a 15 anos e acima de 65 anos >> Infância e Velhice Período Produtivo
Período pré-produtivo Período pós-produtivo
Velhice // Populações dependentes.
Qual é o nível de dependência do brasileiro? O perfil brasileiro de dependência é comparável ao de Índia e Indonésia na
Ásia, ao de México e Perú na América, ao da África do Sul, na África, a
nenhum país europeu.
Comparações de custeio: custo das pensões dos idosos e o PIB:
Alemanha: 16,0% de idosos gasta 12,5% do PIB
França 16,0% de idosos gasta 13,5% do PIB
Itália: 17,5% de idosos gasta 17,5% do PIB
Estados Unidos: 13,0% de idosos gasta 8,0% do PIB
Argentina: 10,0% de idosos gasta 4,1% do PIB
Chile: 7,0% de idosos gasta 6,0% do PIB
E no Brasil? Regime geral no Brasil: consome quase 10% do PIB entre: aposentados em
geral. Tudo isso considerando o Regime Geral, ou seja, Estados, Municipios e
União, e gerando um déficit em torno de 4,5 % do PIB valores esses cobertos por
impostos - orçamento do governo.
A média nem sempre funciona: As reformas têm vetores políticos, econômicos e sócio-culturais. Em 2002 fez -
se um levantamento de que o mundo produz 36 trilhões de dólares, que divididos
por 6,2 bilhões de pessoas, daria uma renda per - capital de 5.800 dólares por
pessoa. Será?
Ainda no Brasil:
Já somos 200 milhões de habitantes. Vejamos nosso período produtivo
Infância de 0 a 15 anos = mais de 52 milhões (improdutivo)
Maior que 65 anos = mais de12 milhões (improdutivo)
Sobram perto de 130milhões (tirando a informalidade e o desemprego) = em torno de
2,5 a 2,6 pessoas sendo sustentadas por 1 pessoa ativa. (quase 3) (IBGE)
Brasil de hoje - Abril / 2014 – Considerações finais.
Não nos surpreendemos com mais de 250 bilhões de ativos em previdência.
Com isso, o setor atingiu a participação recorde de 7% do Produto Interno Bruto
(PIB), segundo a Brasilprev, empresa de previdência do Banco do Brasil. A Brasilprev
164
projeta que o setor vá chegar a R$ 1 trilhão em ativos em 2018 Brasilprevi – Jornal do
Comércio – acessado em 18/04/2014).
Os mais otimistas já estão fazendo planos para 2019. Até 2019, o mercado de
previdência privada aberta tende a atingir 14% do Produto Interno Bruto (PIB)
brasileiro, ao somar R$ 1 trilhão em ativos em gestão de Entidades. No atual
momento, o setor corresponde a 7% do PIB e deve fechar 2012 com R$ 328 bilhões
em ativos, um crescimento de 22% contra o último ano. Os dados são projeções da
Brasilprev (Sex - 07 de Dezembro de 2012 - 08:49 DCI Online/SP
A ascensão de novas pessoas para a Classe C, que agora representa 53% da
população, foi apontada pela Brasilprev como uma das causas positivas para a
expansão do mercado. Estudo realizado pela companhia em sua carteira de clientes
revelou que, até setembro de 2012, a Brasilprev somou 409 mil planos de previdência
complementar aberta com a classe C, o que representa 23% dos planos da
companhia. Osvaldo Nascimento, da Fenaprevi, prevê um crescimento de mais de
30% ao ano na previdência privada brasileira a partir de 2013 e 2014 (Brasil Previ –
e Fenaprevi – acessado em 18/04/2014).
Referências bibliográficas
AMARO, Meiriane N. A Previdência Social na América do Sul. Disponível em:
www.senado.gov.br/conleg/artigos/politicasocial/PrevidenciaSocialnaAmericadoSul.pd
f Acesso em out 2007.
ANDERSEN, Gosta E. Uma Perspectiva Transatlântica da Política de Privatização
Latinoamericana.
In: COELHO, Vera S. P. (Org.). A Reforma da Previdência Social na
América Latina. Rio de Janeiro: Editora FGV, 2003. p.13-26.
ANUÁRIO Estatístico da Previdência Social 2005. Disponível em:
<http://www.mpas.gov.br/docs/pdf/aeps2005.pdf >. Acesso em set 2007.
APRENDA Sobre Previdência. Disponível em
<http://www.brasilprev.com.br/institucional/ entenda/ap_previdenciac.asp> Acesso em
out 2007.
BOLETIM de Políticas Sociais. Acompanhamento e Análise nº 13. Ed. Esp. 2007.
Disponível em: <http://www.ipea.gov.br/default.jsp> Acesso em out 2007.
BOLETIM ESTATÍSTICO da Previdência Social, set 2007. Disponível
em:<http://www.mpas.gov.br/pg_secundarias/previdencia_social_13_05.asp> Acesso
em set 2007.
CAETANO, Marcelo A.; MIRANDA, Rogério B., Comparativo Internacional
Para a Previdência Social. Disponível em:
<http://www.ipea.gov.br/sites/000/2/publicacoes/ tds/td_1302.pdf> . Acesso em set
2007.
CASTIGLIONI, Rosana Pensões e Soldados: o Papel do Poder, dos Atores
Políticos com Poder de Veto e das Ideologias sob o Regime Militar no Chile e no
Uruguai. In: COELHO,
165
Vera S. P. (Org.). A Reforma da Previdência Social na América Latina. Rio de
Janeiro: Editora FGV, 2003. p.13-26.
CORDEIRO, ANTONIO FILHO – “Cálculo Atuarial Aplicado” – Atlas 2010 – 1ª.
E 2ª. Edições.- São Paulo.
CECHIN, José; CECHIN, Andrei D., Desequilíbrios: Causas e Soluções. In:
TAFNER, Paulo; GIAMBIAGI, Fabio. Previdência no Brasil: debates, dilemas e
escolhas. Disponível em <http://www.ipea.gov.br> . Acesso em: abr. 2007.
CENSO Demográfico 2000. Disponível em <http://www.ibge.gov.br/censo/>.
Acesso em ago. 2007.
DELGADO, Ignácio G. Previd/ Social e Mercado no Brasil. SP: LTR - Editora,
2001.
FERREIRA, Sérgio G. Sistemas Previdenciários no Mundo: Sem “Almoço
Grátis”. In: TAFNER, Paulo; GIAMBIAGI, Fabio. Previdência no Brasil: debates,
dilemas e escolhas. Disponível em <http://www.ipea.gov.br> . Acesso em: abr.
2007.
GALLI, Ana P. Sua Aposentadoria em Cheque. Época, São Paulo, n. 416, p. 36-
39, 8 - maio 2006.
II Encontro de Economia Catarinense - Artigos
Científicos Área Temática: Mercosul – Políticas Sociais e
Econômicas 24, 25 e 26 de abril de 2008 – Chapecó, SC -
225
INDUSTRIALIZAÇÃO Brasileira. Disponível em:
<http://br.geocities.com/vinicrashbr/ historia/brasil/industrializacaobrasileira.htm>
Acesso em out 2007.
JARDIM, Maria A. C. A Previdência Social e o Mercado de Previdência Privada:
um olhar sociológico. Disp. em
<http://www.race.nuca.ie.ufrj.Br/abet/revista/artigos%205/ Maria.pdf>. Acesso em:
set.2006.
LACERDA, Antônio C. et alii. Economia Brasil. São Paulo: Edit. Saraiva,2006.
MACHADO, Nelson. Coletânea de Normas dos Fundos de Pensão. 2ª Edição
Revista e Ampliada, Brasília, 2006. Disponível em:
<http://www.mpas.gov.br/docs/pdf/Coletanea_2Edicao.pdf> Acesso em 08/ 2007.
MATOS, Carlos E. Diretas Já 20 Anos Depois, Edição 171, Abril 2004.
Disponível
em:<http://novaescola.abril.uol.com.br/index.htm?ed/171_abr04/html/diretas>
Acesso em ago. 2007.
MESA-LAGO, Carmelo, MÜLLER, Katharina Política e Reforma da Previdência
na América Latina. In: COELHO, Vera S. P. (Org.). A Reforma da Previdência Social
na América Latina. Rio de Janeiro: Editora FGV, 2003. p.27-63.
166
MPS - Disponível em: <http://www.previdencia.gov.br>. Acesso em ago 2007.
MORHY, Lauro. Reforma da Previdência em Questão. Brasília: UNB, 2003.
NEOLIBERALISMO, O que é? Disponível em
<http://www.suapesquisa.com/geografia/ neoliberalismo.htm> Acesso em out 2007
NOVOS PARADIGMAS na Previdência Social: Lições: Chile e Argentina.
Disponível em: < http://www.ipea.gov.br/pub/ppp/ppp19/Parte_3.pdf> Acesso em nov
2007.
PAIXÃO, Leonardo A. A Previdência Complementar Fechada: Uma Visão Geral.
Disponível em: < http://www.mpas.gov.br/docs/pdf/SPC-uma-visao-geral.pdf>
Acesso em ago. de 2007.
PINHEIRO, Ricardo P. A Demografia dos Fundos de Pensão. Coleção
Previd/Social Vol. 24. Disponível em:
<http://www.previdencia.gov.br/docs/pdf/volume24.pdf> Acesso em ago. 2007a.
PINHEIRO, Ricardo P.; PAIXÃO, Ricardo A.; CHEDEAK, José C. S. Regulação
dos Investimentos nos Fundos de Pensão: evolução histórica, tendências recentes e
desafios regulatórios. Disponível em: <http://www.mpas.gov.br/docs/pdf/DECON-
SPC_ Artigo_Invest_EFPC.pdf> Acesso em agos 2007b.
PNAD – Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios. Disponível em:
<http://www.ibge.gov.br/home/> Acesso em set 2007.
POR QUE Reformar a Previdência? Livro Branco da Previdência Social.
Disponível em http://www.planalto.gov.br/publi_04/COLECAO/PREBC.HTM.
Acesso em: jul. 2007.
REZENDE, Fernando; TAFNER, Paulo – Edit. Brasil: O estado de uma nação.
Brasília: IPEA, 2006. cap. VIII. Disponível em: <http://www.ipea.gov.br>. Acesso
em: mar. 2007. STEPHANES, Reinhold. Reforma da Previdência: . São Paulo: Ed.
Record, 1999.
TAFNER, Paulo; GIAMBIAGI, Fabio. Previdência no Brasil: debates, dilemas e
escolhas. Disponível em <http://www.ipea.gov.br>. Acesso em: abr. 2007.
167
ASPECTOS DEMOGRÁFICOS DA POPULAÇÃO ECONOMICAMENTE
ATIVA DO ESTADO DE SÃO PAULO
Luis P. Ortiz Flores 90
I Introdução
As estatísticas sobre a população economicamente ativa (PEA) 91 , são de muita
utilidade no esclarecimento de importantes aspectos da vida econômica e social e na
formulação de medidas encaminhadas a assegurar seu melhoramento.92 Servem de base
para formular programas de desenvolvimento econômico e social, possibilitando avaliar
a melhor utilização desses recursos, bem como as mudanças que poderiam ocorrer em
essas circunstâncias.
Nações Unidas define a oferta de mão-de-obra como o número potencial de
trabalhadores disponíveis para a produção de bens e serviços econômicos de uma
sociedade. Seu volume depende das condições demográficas, econômicas e sociais
imperantes em elas, num momento determinado. O número de pessoas que poderiam
participar na atividade econômica é determinado pelo tamanho da população e sua
estrutura segundo sexo e idade. Por sua vez, estas características estão relacionadas
pelas tendências das variáveis demográficas: fecundidade, mortalidade e migração.93
Também exercem influência no tamanho da população economicamente ativa outros
fatores econômicos, como o desenvolvimento econômico da área, a organização da
economia.
No Estado de São Paulo, nas últimas décadas, em torno de 55% da população de 10
anos e mais foram consideradas economicamente ativas. Entre os homens, essa
proporção tem se mantido praticamente constantes em 70%; enquanto que, entre as
mulheres registra-se um significativo incremento: passa de 30% em 1980, para 52%, em
2010. Nesse período, a esperança de vida aos 10 anos de idade aumentou 4,8 anos entre
os homens e, 5,6 anos entre as mulheres, aumentando ainda mais o diferencial por sexo
da mortalidade, em favor das mulheres.
Este trabalho faz parte de um projeto mais amplo, que tem por finalidade estudar
relações entre a mortalidade e as atividades econômicas da população de São Paulo.
Neste primeiro documento, se analisam aspectos demográficos da população
economicamente ativa (PEA), utilizando como fonte dos dados os Censos
Demográficos de 2000 e 2010, realizados pelo IBGE e, as estatísticas de óbitos do
Sistema de Estatísticas Vitais da Fundação SEADE.
II. Taxas de Atividade Masculina e Feminina
Uma medida do nível de participação dos trabalhadores na atividade econômica é a
taxa de participação geral e, outra são as taxas especificas por sexo e idade. Essas são
medidas básicas que possibilitam o conhecimento do aproveitamento da mão-de-obra
90 Professor Titular do Departamento de Atuária e Métodos Quantitativos/FEA/PUCSP e
Analista de Projetos da Fundação Sistema Estadual de Análise de Dados – SEADE. 91 População Economicamente Ativa (PEA) - É composta pelas pessoas de 10 a 65 anos de
idade que foram classificadas como ocupadas ou desocupadas na semana de referência da
pesquisa. 92 Elizaga, J. C. e Mello, R. Aspectos Demográficos de la Mano de Obra em America Litina.
CELADE, Série E. nº 9, 1971. 93 Nações Unidas. Princípios y recomendaciones relativas a los censos de población. Nieva
York, Departamento de Asuntos Económicos y sociales, 1970.
168
pelas forças produtivas de um país ou região. A participação masculina e feminina nas
atividades econômicas reflete, em grande medida, ou grau de desenvolvimento da
região, participação que está influenciada pelo período que o indivíduo fica na escola, a
atividade previdenciária e outros.
Para ilustrar a situação no Estado de São Paulo, a Tabela 1 mostra as Taxas Brutas
de Atividade (TBA), calculadas relacionado a população ativa com a população total,
nas datas censitárias de 2000 e 2010. Assim, temos um quadro comparativo da
dependência econômica da população total em relação à economicamente ativa,
desagregada por sexo.
Nota-se que, em 2000 a participação masculina já supera 50%, enquanto que a
feminina representa menos de um terço, mostrando que o grau de dependência da
população inativa em relação à ativa é maior entre as mulheres que nos homens. Nos 10
anos seguintes registra-se um incremento de mais de 40% na participação feminina,
alcançando uma TBA de 45%, já entre os homens, esse aumento é bem mais modesto,
chegando a menos de 20% e, a TBA praticamente atingindo 60%. Com esse aumento
diferencial por sexo, mais intenso entre as mulheres que nos homens, se reduz a
diferença de participação na atividade econômica entre os sexo, passando de 1,6 a favor
dos homens, em 2000, para 1,3 em 2010.
Na tabela 1, também são mostradas as Taxas Globais de Atividade (TGA),
calculadas como a proporção da população economicamente ativa com respeito à
população de 10 anos e mais. Embora esta taxa também este afetada pela distribuição
por idade da população, ao igual que a taxa bruta, nos dá informação mais apurada
sobre a parcela da população ativa em relação à potencialmente ativa em idade de
trabalhar.
Podemos notar que, no ano 2000, ao eliminar o desvio ocasionado pela população
menor de 10 anos, a TGA masculina, que supera os 62%, é bem maior que a feminina.
No período 2000-2010, em parte como reflexo das mudanças ocorridas na estrutura
etária da população paulistana, se registra um acentuado aumento na taxa feminina
(mais de 38%), bem maior que o registrado na população masculina, (11%). Dessa
forma, em 2010, a diferença entre os sexos se reduz, mas ainda assim as taxas
masculinas são 30% superiores às femininas.
Tabela 1
Estado de São Paulo
Taxas de Aitvidade Brutas e Globais segundo Sexo
2000 e 2010
Sexo Taxas de Atividade (%)
2000 2010 2000 2010
Homens 51,2 59,5 62,3 69,3
Mulheres 31,6 45,7 37,9 52,5
Total 41,2 52,4 49,8 60,6
Fonte: IBGE - Censos Demográficos de 2000 e 2010
Brutas Globais
169
III. Taxas Específicas de Atividade
Segundo a idade de trabalhar, a atividade econômica se distribui de forma
diferencial entre homens e mulheres. As taxas especificas de atividade por sexo e idade,
representam a proporção de pessoas ativas em uma faixa etária determinada, por sexo,
pelo total de pessoas dessa faixa etária. Trabalhando com essas taxas reduzimos os
desvios que se introduzem por conta das diferentes estruturas por idade da população e,
ao calculara-as por sexo, eliminamos as diferenças de níveis entre homens e mulheres.
Os níveis de participação masculina nas atividades econômicas são
sistematicamente mais elevados que os das mulheres, isto acontecendo para todas as
idades ativas, em 2000 e 2010. Entretanto, enquanto nesse período a participação
masculina apresenta uma queda de mais de 3%, a feminina mostra uma acentuado
aumento, superando os 9% (Tabela 2).
Devemos ter presente que o comportamento diferencial dos níveis de participação
masculina e feminina nas atividades econômicas, em grande parte está relacionado com
fatores sociais e econômicos, tanto ou mais importantes que as alterações demográficas
ocorridas na população de São Paulo, nos últimos anos.
Nas duas datas censitárias, a maior participação masculina ocorre entre as idades 30
– 39 anos, enquanto que entre as mulheres é entre 25 – 34 anos. Em 2010, nos homens,
entre os 30 e os 44 anos, a taxa de atividade supera os 90%. Por sua vez, as taxas de
atividades dos mais jovens (menores de 20 anos), idades mais diretamente relacionadas
com a estrutura econômico-social e as políticas governamentais, registram uma queda
nas taxas de participação, tanto entre os homens como entre as mulheres, mais
acentuada no sexo masculino (Gráfico 1).
Uma parte significativa da redução dessas taxas nessas idades, possivelmente é
produto do crescimento econômico ocorrido nesse período, criando entre os jovens
maiores possibilidades educacionais e previdenciárias.
Entre os homens, a variação dessas taxas continua sendo negativa até os 45 anos,
enquanto que entre as mulheres essa variação positiva é cada vez mais intensa ao se
avançar na idade, passando de 60 % entre as de 60 anos e mais.
Tabela 2
Estado de São Paulo
Taxas especificas de participação por sexo segundo Idade
2000 e 2010
2000 2010 Variação 2000 2010 Variação
Total 71,7 69,3 -3,5 48,0 52,5 9,3
10 a 14 7,7 5,2 -32,1 5,3 4,3 -18,5
15 a 19 63,0 48,7 -22,7 49,9 41,5 -16,8
20 a 24 90,3 83,2 -7,9 69,7 71,9 3,1
25 a 29 94,2 89,2 -5,3 68,3 75,4 10,4
30 a 34 95,1 91,0 -4,3 66,8 74,6 11,6
35 a 39 94,5 91,2 -3,6 66,0 73,1 10,8
40 a 44 92,8 90,4 -2,6 62,7 70,7 12,8
45 a 49 88,3 88,5 0,2 55,2 65,7 19,0
50 a 59 73,8 77,9 5,7 37,9 50,6 33,5
60 a 69 44,9 49,7 10,8 14,3 23,4 63,9
70 ou mais 16,6 19,7 18,8 4,1 7,4 81,4
Fonte: IBGE, Censos Demográficos de 2000 e 2010.
Grupos de
Idades
Homens Mulheres
170
Entre as mulheres, uma parte considerável do aumento das taxas de participação
deve ser creditado à acentuada redução das taxas de fecundidade, ocorrida no Estado
nos últimos anos. Efetivamente, desde os anos 60 a fecundidade em São Paulo vem
diminuindo acentuadamente. Estima-se que o número médio de filhos por mulher, em
2010 de 1,7, seja praticamente a metade do registrado em 1980; durante os anos 90, esse
índice se manteve praticamente constante, para voltar a diminuir durante a década de
2000. Em 2010, a fecundidade da mulher paulista caracteriza-se por apresentar nível
reduzido (1,7 filho por mulher) e estrutura etária mais dilatada, com as maiores taxas
entre as idades 20 e 29 anos.
Outro dado que aponta nessa direção se refere a idade média das mulheres que
tiveram filhos, que mostra que entre 2000 e 2010 passou de 25,9 anos para 27,1 anos,
refletindo a queda da proporção de mães adolescentes (menos de 20 anos) e das de 20 a
24 anos; no outro extremos, registrasse um aumento das proporções de mães acima dos
30 anos.
No período analisado a fecundidade das adolescentes retomou a tendência de
redução, enquanto que a correspondente às mulheres acima de 30 anos permaneceu
praticamente constante.
IV. Número de anos de Vida Ativa: Brutos e Líquidos
No estudo da população economicamente ativa, uns dos aspectos mais importante é
conhecer a duração média da vida ativa de uma geração. Ou seja, conhecer o número
médio de anos que se espera que um indivíduo permanecerá em atividade, na hipótese
de que as taxas de participação não se modificaram nesse período.
Uma forma de acompanhar essa geração é calcular o número bruto de anos de vida,
indicador fortemente influenciado pela idade de entrada e saída da atividade econômica
do indivíduo e pelas taxas de atividade nessas idades. A mortalidade somente incidiria
0,0
10,0
20,0
30,0
40,0
50,0
60,0
70,0
80,0
90,0
100,0
10 a 14 anos 15 a 19 anos 20 a 24 anos 25 a 29 anos 30 a 34 anos 35 a 39 anos 40 a 44 anos 45 a 49 anos 50 a 59 anos 60 a 69 anos 70 anos ou mais
Taxa
s d
e at
ivid
ade
(po
r m
il)
Grupos de Idades
Gráfico 1Taxas de Atividade segundo sexo. 2000 e 2010
Homens 2000 Homens 2010 Mulheres 2000 Mulheres 2010
171
após a idade limite de saídas. Assim, este indicador, reflete, então, a permanência e
integração da população na PEA, em ausência de mortalidade.
Por sua vez, o número líquido de anos de vida ativa, representa o número médio de
anos economicamente ativos de uma geração que em atividade sofresse também os
efeitos da mortalidade. A diferença entre anos de vida ativa brutos e líquidos é similar à
registrada entre as taxas bruta e líquida de reprodução, como medidas de fecundidade e
renovação da população.
Em São Paulo, em ausência de mortalidade, em média um trabalhador do sexo
masculino ficaria em atividade praticamente 45 anos, em um potencial máximo possível
de 70 anos, se todas as pessoas fossem economicamente ativas dos 10 aos 80 anos.
Entre as mulheres, esse número chega somente 28 anos, em 2000 e, aumenta para 31
anos, em 2010 (tabela 3).
Entretanto, ainda com esse aumento da participação feminina, o número de anos
brutos de atividade masculina é 30% maior que a participação feminina, fato que ilustra
as enormes dificuldades da mulher para se incorporar ao mercado produtivo.
É interessante notar o fato de se ter estimado em 44 anos a permanência dos homens
na atividade econômica, enquanto a previdência social estabelece esta permanência em
35 anos. Esta diferencia pode sugerir que uma parcela significativa da PEA não tenha
sido beneficiada pelo seguro social durante toda a vida ativa ou em parte dela. Além
disso, é possível que um parcela deste segmento tenha retornado a atividade econômica
depois da aposentadoria. Na prática esta permanência é menor pelo efeito redutor da
mortalidade, que na maioria dos casos ocorre antes do termo do período de atividade
econômica. Esta redução é maior para os homens pelo fato de a mortalidade masculina
ser mais elevada que a feminina, isto acontecendo especialmente a partir dos 10 anos de
idade. Para a população feminina, a diminuição da vida ativa não chega a 1 ano.
Por idade a situação é bastante diferencial segundo o sexo. Tomemos, por exemplo,
a situação do grupo de idades 30 a 39, onde as taxas de participação masculinas e
femininas são mais elevadas: em média, um trabalhador do sexo masculino deste grupo
etário ficará 9,1 anos em atividade, dentro dos 10 anos possíveis, enquanto que as
mulheres, nesse mesmo grupo etário ficaram somente 7, 4 anos (Tabela 3).
Este tipo de análise se completa, introduzindo os efeitos diferenciais da mortalidade,
por idade e sexo, isto é, o “número líquido de anos de vida ativa”. Aqui, estamos
levando em conta a influência da mortalidade, sendo que o efeito redutor desta variável
na atividade será dado pela diferença entre os dois indicadores: vida bruta e vida
líquida.
Para estimar os anos liquido utilizamos as Tábuas de Mortalidade, construídas
segundo sexo, para o Estado de São Paulo, centradas nos anos de 2000 e 2010, O índice
resultante, que contempla a variável mortalidade, é diretamente comparáveis com a
esperança de vida (e0) da Tábua de Mortalidade.
172
Combinando adequadamente as taxas especificas de atividade (nAx), com as funções
da Tábua de Mortalidade (lx e nLx), obtemos o número de sobreviventes
economicamente ativos nas diversas idades e as pessoas economicamente ativas da
população estacionária. Posteriormente, obtemos a população estacionária
economicamente ativa acumulada (Tx), isto é, o número de anos de vida ativa restante
desde cada idade até o fim da coorte. Finalmente, dividindo estes resultados pelos
respectivos sobreviventes, obtemos o número médio de anos ativos esperados à idade
considerada, isto é, o número líquido de anos de vida ativa (ea)0
10. As tabelas 4 e 5
ilustram esses cálculos para homens e mulheres, respectivamente.
.Nos últimos anos, a vida media da população paulista tem aumentado
consideravelmente. Estima-se que nos últimos 30 anos, a esperança de vida ao nascer
aumentou 8,4 anos, sendo 3,5 na última década, chegando há 75,1 anos. Entre 2000 e
2010, o ganho foi maior na população masculina, que passou de 67,2 anos para 71,5
anos, incremento de 4,3 anos. Na população feminina, esse aumentou foi de 2,4 anos, ao
avançar de 76,2 para 78,6 anos. Assim, a diferença de número de anos entre homens e
mulheres, em favor destas últimas, diminuiu de 9 anos, em 2000 para 7,1 anos, em
2010.
Tabela 3
Estado de São Paulo
Número Bruto de Anos de Vida Ativa por Sexo
2000 e 2010
2000 2010 2000 2010
10 a 19 3,6 2,7 2,9 2,3
20 a 29 9,2 8,6 6,9 7,4
30 a 39 9,5 9,1 6,6 7,4
40 a 49 9,1 9,0 5,9 6,8
50 a 59 7,4 7,8 3,8 5,1
60 a 69 4,5 5,0 1,4 1,6
70 e + 1,7 2,0 0,4 3,1
Total 44,9 44,1 28,0 33,7
Fonte: IBGE, Censo Demográfico 2000 e 2010.
Número Bruto de Anos de Vida Ativa
Homens Mulheres
Grupos
de Idades
(anos)
Tabela 4
Estado de São Paulo - 2010
Número Liquido de anos de vida ativa - Homens
Grupos de
idade nAx lx nLx nAx * lx Tx (ea)0
x
10 a 19 26,8 98.366 975.585 26.178.575 377.362.807 38,4
20 a 29 86,2 96.751 957.455 82.553.122 351.184.232 36,3
30 a 39 91,1 94.740 930.570 84.739.107 268.631.110 28,4
40 a 49 89,5 91.374 879.885 78.757.620 183.892.003 20,1
50 a 59 77,9 84.603 783.940 61.095.441 105.134.383 12,4
60 a 69 37,2 72.185 360.925 13.432.269 44.038.942 6,1
70 e + 19,7 62.961 1.553.442 30.606.674 30.606.674 4,9
Fonte: IBGE, Censo Demográfico 2010.
Fundação Seade. Tábuas de Mortalidade . 2000 e 2010
173
A tabela 6 sintetiza esses resultados. Comparando o número de anos brutos e
líquidos, temos uma medida da influência da mortalidade no número de anos
potencialmente ativos. Se examinamos, primeiro a situação para o sexo masculino
podemos notar que o efeito mortalidade reduz significativamente o tempo de
permanência na vida ativa: 6,5 anos em 2000 e, 5,3 anos, em 2010. Já entre as mulheres,
a redução no número de anos na ativa por conta da mortalidade é bem menor: chega a
1,5 anos em 2000 e, é praticamente nula em 2010.
Estes resultados estão fortemente influenciados pela elevada sobremortalidade
masculina que se registra nas idades adultas. O gráfico 2 ilustra esse fato, mostrando
que entre os 20 e 29 anos de idade a mortalidade masculina é quase 4 vezes maior que
feminina. Em termos de esperança de vida aos 10 anos de idade, os homens registram
8,2 anos a menos que as mulheres (Tabela 6).
Por sua vez, quando comparados os anos líquidos de vida ativa com a esperança de
vida ao início da atividade econômica (10 anos), podemos ter uma estimativa dos anos
potencialmente inativos, permitindo-nos avaliar o grau de utilização da mão-de-obra,
segundo sexo.
Podemos observar que a inatividade potencial masculina aos 10 anos, aumenta de
20,3 para 23,8 anos; enquanto que a feminina registra uma redução de 41,2 para 38,6
anos, mas que ainda resulta ser 60% superior à masculina.
Estes resultados possibilitam inferir o tempo não dedicado à atividade econômica,
motivado pelo retiro profissional, seja pela aposentadoria, voluntária ou não, seja pela
entrada mais tarde no mercado de trabalho. A tendência de aumento para os homens
pode estar relacionada com a elevada urbanização que se registra no Estado e, ao
processo de industrialização que vem ocorrendo nos últimos anos. Uma consequência
desse processo pode ser observada no fato de que os homens têm entrado mais tarde e
saído mais cedo da atividade econômica.
Já as mulheres, ainda que registram uma diminuição no número de anos de
inatividade potencial, apresentam uma perda significativamente mais elevada do que a
masculina (38,6 contra 23,6 anos), pela soma do efeito do retiro profissional precoce,
que ocorre pelo casamento ou pela fecundidade, com os fatores que afetam também a
população masculina.
Tabela 5
Estado de São Paulo - 2010
Número Liquido de anos de vida ativa - Mulheres
Grupos de
idade nAx lx nLx nAx * lx Tx (ea)0
x
10 a 19 22,9 98.666 983.855 22.552.359 305.973.005 31,0
20 a 29 73,7 98.105 977.460 72.045.192 283.420.646 28,9
30 a 39 73,9 97.387 966.280 71.388.806 211.375.454 21,7
40 a 49 68,3 95.869 941.500 64.318.441 139.986.648 14,6
50 a 59 50,6 92.431 888.300 44.918.797 75.668.207 8,2
60 a 69 15,9 85.229 426.145 6.793.265 30.749.410 3,6
70 e + 7,4 78.827 3.230.615 23.956.144 23.956.144 3,0
Fonte: IBGE, Censo Demográfico 2010.
Fundação Seade. Tábuas de Mortalidade . 2000 e 2010
174
V. Considerações finais
Os dados analisados mostram que, nas últimas décadas a participação masculina na
atividade econômica tem permanecido praticamente constante, enquanto que a feminina
quase dobra. Ainda assim, as taxas masculinas são sistematicamente maiores que as
femininas, em todas as idades.
A elevada mortalidade masculina faz com que uma parcela considerável do tempo
de permanência na atividade econômica seja perdida. Entre as mulheres, os reduzidos
níveis de mortalidade não afetam de forma significativa sua participação na atividade
econômica.
Para compreender melhor essas relações, se faz necessário mensurar o impacto da
variação da mortalidade por causas especifica de morte, no tempo que a população
paulista permanece na atividade.
Tabela 6
Estado de São Paulo, 2000
Efeito da Mortalidade na Vida Ativa
2000
Brutos
(1)
Liquidos
(2)
Homens 44,9 38,4 58,75 6,5 20,3
Mulheres 28,0 26,4 67,63 1,5 41,2
2010
Brutos (1)Liquidos
(2)
Homens 44,1 38,8 62,62 5,3 23,8
Mulheres 31,3 31,0 69,65 0,3 38,6
Fonte: IBGE - Censos Demográficos de 2000 e 2010.
Fundação Seade. Tábuas de Mortalidade de 2000 e 2010
(1) - (2)Sexo e10 0 (3)
Sexo
Número de Anos de
e10 0 (3)
Número de Anos de
(3) - (2)
(3) - (2)(1) - (2)
0,0
1,0
2,0
3,0
4,0
5,0
6,0
10 a 19 anos 20 a 29 anos 30 a 39 anos 40 a 49 anos 50 a 59 anos 60 a 69 anos
Prop
orçã
o
Grupos de Idades
Gráfico 2Sobremortalidade masculina
2010
2000
175
VI. Bibliografia
ELIZAGA, J. C. e MELLO, R. Aspectos Demográficos de la Mano de Obra em
America Litina. CELADE, Série E. nº 9, 1971.
IBGE, Censos Demográficos 2000 e 2010. |Fundação IBGE
NAÇÕES UNIDAS. Princípios y recomendaciones relativas a los censos de
población. Nieva York, Departamento de Asuntos Económicos y sociales, 1970.
WALDVOGEL Bernadette Cunha, B., FERREIRA, C.E de C., YAZAKI, L.M.,
Perillo, S., Aranha, V. Mudanças nos componentes da dinâmica demográfica paulista. .
SPDemográfico. Ano 12. N 3. Outubro, 2012.
YAZAKI, L,M, Estatísticas de nascimentos: mães mais velhas e crescimento
desenfreado de cesáreas em São Paulo. SPDemográfico. Ano 13. N 2. Março, 2013.
176
Economia da Sustentabilidade
SUSTENTABILIDADE NAS INSTITUIÇÕES FINANCEIRAS: O CASO DO
ITAÚ UNIBANCO
Luiz Daniel Cilli (IPT)
Eduardo Luiz Machado (UNIFESP)
RESUMO
A preocupação com o meio ambiente nas instituições financeiras ainda é uma
característica recente. A crescente pressão de stakeholders externos levou a mudanças
na política ambiental das empresas, como a publicação e divulgação de relatórios de
sustentabilidade. O objetivo deste trabalho é realizar uma análise crítica da
sustentabilidade no Itaú Unibanco por meio da avaliação de indicadores das três
dimensões (ambiental, social e econômica), no período de 2008 a 2010. Para tanto,
aplicou-se modelo de referência simplificado contendo 50 indicadores, baseado na
proposta de Delai (2006). Como resultado, considerando-se os indicadores passíveis de
comparação 2008 foi o ano melhor avaliado, seguido por 2010, e por último, 2009.
Sugere-se adoção de um relatório padronizado, único, que englobe de forma consistente,
clara e concisa as três dimensões, possibilitando a comparação dos dados analisados ao
longo do tempo.
Palavras chave: Instituições Financeiras; Sustentabilidade; Relatório de
Sustentabilidade; Modelo de Avaliação da Sustentabilidade.
SUSTAINABILITY IN FINANCIAL INSTITUTIONS: THE CASE OF ITAÚ
UNIBANCO
ABSTRACT
The concern with the environment in financial institutions is still a recent
feature. The increasing pressure from external stakeholders led to changes in
environmental policy of companies like publication and dissemination of sustainability
reports. The goal of this study is to accomplish a critical analysis of sustainability in
Itaú Unibanco through the evaluation of indicators of the three dimensions
(environmental, social and economic) from 2008 up to 2010. To this purpose, it was
applied simplified reference model containing 50 indicators, based on the proposal of
Delai (2006). As a result, considering the comparable indicators, 2008 was the year best
rated, followed by 2010 and finally, 2009. It is suggested the adoption of a single
standardized report, which gathers in a consistent, clear and concise way, the three
dimensions, allowing the comparison over time.
Keywords: Financial Institutions; Sustainability Assessment; Sustainability
Reporting; Model of Sustainability Assessment.
177
1 INTRODUÇÃO
O presente artigo pretende abordar a questão da sustentabilidade nas instituições
financeiras, realizando uma análise crítica no caso do Itaú Unibanco. Essa análise
compreenderá uma avaliação das atividades/ações desenvolvidas por esta instituição
quanto ao tema, perante seus diversos stakeholders. É importante diferenciar dois
conceitos chaves: sustentabilidade e desenvolvimento sustentável.
Para Silva Júnior (2006), a questão ambiental nas instituições financeiras ainda é
uma característica bastante tímida e o tema meio ambiente aparentemente não faz
sentido, uma vez que as atividades destas instituições não são diretamente relacionadas
aos impactos ambientais mais usualmente conhecidos.
Porém, segundo FEBRABAN et al. (2008), há uma crescente preocupação das
instituições financeiras em inserir este tema em suas práticas. Esta preocupação deve-se,
principalmente, pela pressão exercida pelos diferentes stakeholders a favor da
sustentabilidade, ocasionando uma mudança de visão em que as estratégias passaram a
alinhar os interesses econômicos, sociais e ambientais.
Segundo Mattarozzi e Trunkl (2008), o conceito de sustentabilidade nas
instituições financeiras remete à necessidade destas integrarem a perspectiva sustentável
à sua própria missão e estratégias, adotando critérios socioambientais além dos
econômico-financeiros.
Segundo Tosini (2006), o sistema financeiro, um dos principais agentes do
desenvolvimento econômico, não pode ficar à margem dos problemas ambientais, pois
além da consciência da sociedade, o arcabouço legal em relação ao meio ambiente
também atinge estas instituições.
Neste contexto, observam-se algumas mudanças na atuação das instituições
financeiras, principalmente quanto à sua transparência e responsabilidade em relação ao
tema ambiental. Alguns exemplos são a publicação dos relatórios de sustentabilidade e
dos balanços sociais, a comercialização de fundos de investimentos socialmente
responsáveis, a divulgação de sua política de sustentabilidade, a adoção aos Princípios
do Equador, entre outros.
Almeida (2007) ressalta que o tema altera e dificulta o ambiente de negócios
para todas as empresas; porém, por outro lado, novas oportunidades surgirão por
intermédio da mitigação de impactos ambientais ou substituição de serviços, sendo
inovação e tecnologia detentoras de papel chave nesse processo.
Justifica-se este trabalho, diante do exposto acima, em que se espera verificar a
qualidade das informações disponibilizadas nos relatórios de sustentabilidade para
avaliação da sustentabilidade na instituição financeira Itaú Unibanco, nos anos de 2008
a 2010.
2 FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA
O objetivo desta seção é contextualizar os principais conceitos relacionados ao
tema deste artigo. Para isto foi abordada a questão ambiental, o desenvolvimento
sustentável e a sustentabilidade, a sustentabilidade nas instituições financeiras e, o
modelo de Delai.
2.1 A Questão Ambiental
A degradação ao meio ambiente é um tema discutido há tempos. Porém,
somente nas últimas décadas o assunto começa a tomar proporções preocupantes.
178
Para Dias (2009), nos últimos 300 anos, o desenvolvimento tecnológico da
humanidade foi inigualável, o que gerou uma incrível capacidade de produção e de
controle de elementos naturais. Em contrapartida, foi também o período no qual o
homem gerou os meios que podem levar a humanidade à extinção.
Segundo Sachs (2008), o ritmo da atividade econômica humana foi ampliado
oito vezes desde 1950 e, possivelmente, serão mais seis vezes até 2050. Tal crescimento
está causando uma destruição ambiental nunca prevista nos estágios anteriores da
história da humanidade.
Porém, segundo Dias (2009), a conscientização ambiental ocorreu ao longo da
segunda metade do século XX, devido aos problemas de contaminação do meio
ambiente, desencadeando grande número de normas e regulamentos internacionais, bem
como a criação de órgãos responsáveis por aplicar tais normas e regulamentos.
Recentemente, inicia-se a mudança de atitude nas organizações do setor privado e
público da economia, que passam a considerar de forma mais contundente à questão
ambiental.
Segundo Oliveira (2007), em relação ao meio ambiente, a preocupação mundial
caminha para um novo estilo de desenvolvimento combinando eficiência econômica,
justiça social e prudência ecológica.
Existe uma relação entre a classe social e a conscientização ambiental. Em todo
o mundo há consumidores engajados com a causa ambiental os quais aceitam pagar
mais caro por um produto ecologicamente correto e repudiam um produto que possa
causar danos ambientais em qualquer momento de sua cadeia produtiva, mesmo com
diferenças no preço. Nos países em desenvolvimento, embora exista um crescimento
sobre esta conscientização, ela ainda ocorre em menor escala, pois, em função da
desigualdade social, muitos consumidores não têm a opção de escolher um produto
ecologicamente correto.
O exemplo citado demonstra não ser possível implantar uma cultura de
conscientização ambiental se o indivíduo e/ou instituição não possuírem uma situação
econômica positiva e estável, bem como se estes não estiverem inseridos na sociedade,
tendo condições de participar e/ou decidir qual o melhor caminho tomar. Por isso, deve-
se tratar a questão ambiental juntamente com a social e econômica.
É cada vez mais claro o papel de toda a sociedade para a melhoria ambiental de
um país ou até mesmo do mundo, não bastando uma atuação particular ou local. É
necessário o envolvimento da população, empresas públicas e privadas, organizações
não governamentais (ONG), escolas, universidades e governo.
2.2 Desenvolvimento Sustentável e Sustentabilidade
Segundo van Bellen (2007), o conceito de desenvolvimento sustentável provém
de um histórico de reavaliação crítica na relação entre a sociedade civil e o meio natural.
Por isso, existe uma variedade de abordagens que tentam explicar o conceito de
desenvolvimento sustentável e sustentabilidade.
Neste artigo, são utilizados os seguintes conceitos:
Desenvolvimento sustentável é “aquele que atende às necessidades do
presente sem comprometer a possibilidade de as gerações futuras atenderem
suas próprias necessidades” (CMMAD, 1991, p.46);
Sustentabilidade é “uma característica de um processo ou estado que pode
manter-se indefinidamente” (IUCN; UNEP; WWF, 1980).
179
É crescente a preocupação da sociedade com a questão ambiental, uma vez que a
existência da primeira se deu como dependente da utilização (conservação) dos recursos
naturais. Algumas considerações sobre o tema merecem destaque:
Para Sachs (2008), a capacidade do mundo de combinar o crescimento
econômico em longo prazo com a saúde ambiental é amplamente discutida,
porém a atividade humana atual não é sustentável. Se não houver uma rápida
mudança, as limitações do ambiente derrotarão as aspirações globais de
prosperidade.
Para FEBRABAN et al. (2008), embora o tema sustentabilidade esteja em
foco das principais agendas mundiais das últimas décadas, ele sempre
acompanhou a humanidade, juntamente com o crescimento populacional e
aumento do consumo de recursos naturais.
Para Louette (2007), o desenvolvimento sustentável tornou-se uma fórmula
para expressar a necessidade de manter o equilíbrio entre as dimensões
econômica, social e ambiental.
Para Woltmann e Araújo (2007), o desenvolvimento sustentável é divulgado
pelo planeta como uma forma racional de prover qualidade de vida equânime
e socialmente justa, permeando as gerações.
Para Nahuz (2011) o conceito da sustentabilidade representou uma resposta
da ONU ao questionamento expresso em 1972 (Estocolmo), sobre a
sobrevivência do planeta face à demanda da sociedade em relação ao meio
ambiente. Posteriormente, quando da II Conferência das Nações Unidas sobre
Meio Ambiente e Desenvolvimento Humano, realizada em 1992, no Rio de
Janeiro (Rio 92), o conceito foi popularizado.
Percebe-se que a questão ambiental, bem com a sustentabilidade e
desenvolvimento sustentável devem ser observados também pelas instituições
financeiras, uma vez que estas podem promover o crescimento econômico da sociedade
em suas regiões de atuação.
2.3 Sustentabilidade nas Instituições Financeiras
Para Tosini (2006), as instituições estão expostas a riscos que podem trazer
prejuízos relevantes, comprometer a saúde financeira e sua própria continuidade. Ainda
segundo a autora, o risco ambiental para as instituições financeiras é o risco de dano ao
meio ambiente causado por qualquer atividade econômica.
Já para a Defesa Civil é a “possibilidade de dano, enfermidade ou morte
resultante da exposição de seres humanos, animais ou vegetais a agente ou condições
ambientais potencialmente perigosas” (DEFESA CIVIL, 2004).
É possível dizer que as duas definições de risco ambiental se completam, pois as
atividades econômicas podem propiciar a exposição a agentes ou condições ambientais
potencialmente perigosas, caso não sejam devidamente geridas.
Segundo FEBRABAN et al. (2008), devido à competitividade acirrada, as
organizações se preocupam cada vez mais com questões relacionadas ao meio ambiente
e à sociedade.
Esta ideia é ratificada por Silva Júnior (2006), que entende que as organizações
devem lançar mão de alguns diferenciais para que possam conquistar a simpatia e a
fidelidade de seus clientes atuais e futuros. Devido a isto, as ações ambientais e sociais
adotadas por alguns bancos, em breve, serão obrigatórias a todos eles.
180
A inserção do conceito de sustentabilidade nos negócios impõe um novo
paradigma, entre os fatores econômicos, sociais e ambientais das organizações, segundo
Tabet (2007), e, para Sousa (2006), as empresas precisam avaliar corretamente em que
ponto estão e em que ponto querem chegar ao que diz respeito à responsabilidade social
e desenvolvimento sustentável.
Para Tachizawa (2005), as organizações que integrarem as decisões estratégicas
à questão ambiental conseguirão vantagens competitivas e incremento nos lucros a
médio e longo prazos. “A gestão ambiental e da responsabilidade social, para um
desenvolvimento que seja sustentável econômica, social e ecologicamente, precisa
contar com executivos e profissionais nas organizações, públicas e privadas, que
incorporem tecnologia e produção inovadora, regras de decisão estruturadas e demais
conhecimentos sistêmicos exigidos no contexto em que se inserem” (TACHIZAWA,
2005, p.26).
Esty e Winston (2008) citam que os líderes ambientais que veem os negócios
sob a ótica do meio ambiente encontram oportunidades de reduzir custos e riscos além
de aumentar a receita. Essas estratégias geram um novo tipo de vantagem competitiva
sustentável chamada de ecovantagem: utilização de um processo ecologicamente
correto para gerar lucro, obtendo vantagens monetárias diretas, como a utilização de
matéria prima sustentável, até vantagens indiretas, como melhoria na visibilidade da
marca.
2.4 O Modelo de Delai
Segundo Delai e Takahashi (2008), o modelo de mensuração da sustentabilidade
foi elaborado seguindo-se dois estágios: a definição do método de desenvolvimento e o
desenvolvimento do sistema propriamente dito, com base na utilização das oito
iniciativas de mensuração da sustentabilidade para o desenvolvimento do modelo
proposto:
Indicadores de Desenvolvimento Sustentável da Organização das Nações
Unidas (Comissão para Desenvolvimento Sustentável da ONU);
Dashboard da Sustentabilidade;
Barômetro da Sustentabilidade;
Global Reporting Initiative (GRI);
Métricas de Sustentabilidade da Instituição dos Engenheiros Químicos da
Inglaterra (IChemE);
Índice Dow Jones de Sustentabilidade (DJSI);
Índice Triple Bottom Line (TBL);
Indicadores Ethos de Responsabilidade Social Empresarial.
Conforme Delai e Takahashi (2008), no primeiro estágio definiu-se o método de
desenvolvimento do sistema e o conjunto de categorias de análise para comparar as oito
iniciativas acima. O sistema foi dividido em quatro fases: a definição do conceito
sustentabilidade, a definição do conteúdo do sistema, o processo de mensuração e a
melhoria contínua.
Segundo Delai (2006), a estrutura do sistema apresenta hierarquia de quatro
níveis: dimensão (social, ambiental e econômica), temas (assuntos prioritários
relacionados a cada dimensão), subtemas (matérias prioritárias de cada tema), e os
indicadores propriamente ditos.
181
O modelo proposto por Delai (2006) é originalmente composto de 151
indicadores, dos quais 35 pertencem à dimensão ambiental, 25 à econômica e 91 à
social.
Para Delai e Takahashi (2008), o modelo padroniza e esclarece conceitos e
termos utilizados entre os sistemas analisados, e deve ser utilizado como o passo inicial
para o desenvolvimento de sistemas de mensuração da sustentabilidade da performance
organizacional.
3 MÉTODO DE PESQUISA
O método inicial a ser utilizado neste artigo é o indutivo, com o qual se espera
chegar a uma conclusão sobre quais as melhores práticas em relação à sustentabilidade
em cada ano, a partir da análise crítica dos indicadores do Itaú Unibanco.
Os procedimentos metodológicos para elaboração deste trabalho são:
I. pesquisa bibliográfica específica sobre o assunto;
II. caracterização do objeto de estudo;
III. identificação das práticas adotadas pelo Itaú Unibanco;
IV. sistematização dos dados obtidos;
V. análise e comparação dos indicadores;
VI. considerações finais e recomendações.
No item I, efetuou-se pesquisa bibliográfica a partir da consulta de livros,
artigos, dissertações e teses. Para caracterizar o objeto de estudo e identificar as práticas
adotadas (itens II e III), utilizou-se como base o Relatório Anual de Sustentabilidade
2008 do Itaú Unibanco Banco Múltiplo S.A.
A sistematização dos dados obtidos (item IV) e a análise e comparação (item V)
foram realizadas a partir de uma simplificação efetuada pelo autor do modelo proposto
por Delai (2006) em sua dissertação de mestrado.
Na realização da simplificação/adaptação proposta foram selecionados os 50
indicadores mais relevantes à aplicação em instituições financeiras, ou seja, aqueles que
podem ser diretamente relacionados a tais instituições, sendo 11 pertencentes à
dimensão ambiental, 8 à econômica e 31 à social. Procurou-se manter o percentual de
cada dimensão em relação ao modelo original, bem como selecionar os indicadores
mais relevantes ao objeto de estudo.
Com base nas informações obtidas nos itens II e III foi aplicado o modelo
simplificado para avaliar a sustentabilidade no Itaú Unibanco para o ano base 2008 e
comparados com os anos base 2009 e 2010.
A partir dos resultados obtidos foram efetuadas as considerações ao trabalho em
questão (item VI).
182
4 RESULTADOS DA PESQUISA
A seguir são apresentados os resultados obtidos por meio da aplicação do
modelo simplificado para mensuração da sustentabilidade na instituição pesquisada.
4.1 O Itaú Unibanco94
Em 03 de novembro de 2008, surgiu o Itaú Unibanco, provido da associação
entre o Itaú e o Unibanco e, em 18 de fevereiro de 2009, ocorreu a aprovação pelo
Banco Central do Brasil. A associação das duas instituições financeiras possibilitou ao
Itaú Unibanco se tornar o maior banco privado do Hemisfério Sul e um dos 20 maiores
do mundo em valor de mercado.
A visão do Itaú Unibanco é “Ser o banco líder em performance sustentável e em
satisfação de clientes” (ITAÚ UNIBANCO HOLDING S.A.; 2010a, p. 11).
Segundo o relatório anual de sustentabilidade 2008, o Itaú Unibanco foi criado
com a visão de se tornar líder do sistema financeiro no hemisfério sul, ocupando, em
dezembro de 2008, a 12ª posição no ranking mundial em valor de mercado e a primeira
posição na América Latina, de acordo com a Bloomberg. Segundo o relatório anual de
sustentabilidade de 2010, no final de dezembro de 2010, o Itaú Unibanco ocupava a 10ª
posição.
O Itaú Unibanco atua em mercados internacionais como Europa, Estados
Unidos, Ásia, América Latina e Caribe. No Brasil, está presente em mais de 1100
municípios. Suas prioridades são:
Consolidar liderança no mercado brasileiro;
Integrar operações de Itaú e Unibanco, buscando sinergias e ganhos de escala;
Expandir-se internacionalmente, com ênfase no mercado da América Latina.
4.1.11 A Sustentabilidade no Itaú Unibanco
Segundo o Relatório Anual de Sustentabilidade do Itaú Unibanco 2008,
“sustentabilidade é a manutenção dos negócios no curto, médio e longo prazos, para
uma entrega perene de valor às partes interessadas”.
No final de 2008 foi publicada a Política de Sustentabilidade do Itaú Unibanco,
tendo por objetivos:
Ratificar o compromisso com a busca pelo desenvolvimento sustentável;
Evidenciar as diretrizes que permeiam a estratégia e a gestão junto a todas as
partes interessadas;
Promover inovações, revisões e adequações nos negócios com base nos
conceitos de sustentabilidade.
As premissas da instituição são:
conscientização e engajamento de todos os colaboradores com a
sustentabilidade;
comprometimento da liderança com a evolução do tema na organização;
cultura organizacional alinhada aos valores e princípios do Itaú Unibanco;
94 As informações sobre o Itaú Unibanco foram obtidas segundo Itaú Unibanco Banco Múltiplo
S. A. (2009), Relatório Anual de Sustentabilidade 2008; algumas informações complementares
foram obtidas segundo Itaú Unibanco Holding S. A. (2010) e Itaú Unibanco Holding S. A.
(2011), Relatórios Anuais de Sustentabilidade de 2009 e 2010 respectivamente.
183
aprimoramento contínuo das práticas de governança corporativa;
postura ética e transparente;
cumprimento das leis e regulamentos.
Segundo IFC (2011), em junho de 2011, o Itaú Unibanco foi reconhecido como
o banco mais sustentável do mundo, sendo vencedor do FT/IFC Sustainable Finance
Awards, principal prêmio global para a Responsabilidade social e ambiental do setor
bancário e de investimentos. A edição de 2011 obteve um recorde de 187 inscrições de
161 instituições em 61 países.
Conforme Ideia Sustentável (2011), este é um dos reconhecimentos mundiais
mais relevantes na área da sustentabilidade, que há cinco anos elege as instituições
financeiras focadas no desenvolvimento sustentável. Em 2009 e 2010, o Itaú recebeu o
prêmio na categoria Banco Mais Sustentável da América Latina e de Mercados
Emergentes.
4.2. Modelo Simplificado de Delai
O objetivo desta seção é descrever e aplicar o modelo simplificado para
mensuração da sustentabilidade na instituição foco da pesquisa, a partir das informações
obtidas no tópico anterior, sistematizar, analisar e comparar os resultados obtidos. Para
seleção dos 50 indicadores aqui cotejados, identificaram-se os mais relevantes à
aplicação em instituições financeiras, uma vez que o modelo original foi elaborado com
base em oito iniciativas para mensuração da sustentabilidade e nem sempre os
indicadores são passíveis de aplicação em instituições financeiras. Procurou-se
selecionar aqueles possíveis de serem relacionados à atividade financeira e que podem
(e poderiam) ser divulgados em seus relatórios de sustentabilidade. Ressalta-se que
nesta etapa não foi verificado se tais indicadores estão presentes nos relatórios de
sustentabilidade do objeto de estudo. Abaixo são descritos os indicadores selecionados:
Dimensão Ambiental:
• Eficiência do uso de materiais;
• Proporção do consumo de matérias-primas recicladas;
• % dos produtos recicláveis;
• Definição específica de indicadores que mensurem a sua eficácia e efetividade
de acordo com as práticas de cada empresa;
• % do habitat preservado ou restaurado;
• Matriz energética;
• Eficiência energética;
• Monitoramento da cadeia de custódia;
• Impacto nos mananciais;
• Emissões de gases estufa;
• Emissões de gases que afetam a camada de ozônio.
Dimensão Econômica:
• Estudo regular da percepção do investidor e feedback dos resultados;
• Média de capital investido;
• Taxa de retorno;
• Gastos com pesquisa e desenvolvimento;
• Vendas Líquidas;
• Custos;
184
• Lucro antes dos impostos;
• Estrutura organizacional para gerenciamento de crises.
Dimensão Social:
• Inspeções em relação a práticas de responsabilidade social e sustentabilidade;
• Treinamentos, cursos, palestras ou reuniões sobre práticas de responsabilidade
social e sustentabilidade;
• Taxa de retenção;
• Participação de mercado;
• Clientes satisfeitos;
• % de reclamações atendidas pelo SAC;
• Inovações implantadas em razão da interferência do ouvidor e/ou do serviço de
atendimento a consumidores / clientes;
• Contribuições a campanhas político-partidárias;
• Cobertura dos códigos de conduta e anticorrupção e suborno;
• Encontro com stakeholders;
• Cumprimento da lei;
• % lucro líquido investido em ações sociais;
• Investimento em projeto social próprio;
• Investimento em infraestrutura;
• Resultados das ações sociais;
• Salários e benefícios pagos;
• Média salarial em relação ao mercado;
• Bonificações por resultados - tipos;
• Taxa de retenção de funcionários;
• % de satisfação dos funcionários;
• Total de empregos;
• Razão empregos indiretos e diretos;
• Empregos gerados;
• Acidentes - geral;
• Gastos com prevenção;
• Média de horas de treinamento por funcionário;
• Representatividade do investimento em treinamento em relação ao total de
salários e benefícios;
• Média de horas de desenvolvimento por funcionário;
• Proporção do faturamento investido em desenvolvimento de funcionários;
• Relação entre o investimento em educação e o investimento em treinamento;
• Endosso a acordos internacionais.
Efetuada a seleção dos indicadores, aplicou-se o modelo proposto.
4.2.1 A aplicação do modelo proposto
Para aplicação do modelo proposto utilizou-se como base os Relatórios de
Sustentabilidade dos anos de 2008 a 2010 em meio físico (publicação impressa) e em
meio eletrônico, disponível no site do Itaú Unibanco.
Dos 50 indicadores selecionados para avaliar a sustentabilidade no Itaú
Unibanco foram identificados 31 para o ano base 2008, 26 para 2009, e 28 para 2010,
conforme quantificados na tabela 1.
185
Tabela 1: Quantidade de indicadores identificados
Dimensã
o
Modelo
Proposto
200
8
2
009
20
10
Ambienta
l 11 08 0
7 08
Econômic
a 08 05 0
5 05
Social 31 18 1
4 15
Total 50 31 2
6 28
Fonte: Cilli, 2012
A descrição dos indicadores identificados em cada um dos anos avaliados, bem
como seus resultados, e os indicadores não identificados com suas justificativas podem
ser encontrados em Cilli (2012).
Abaixo consta a relação dos indicadores que foram utilizados na comparação
entre os três anos:
Dimensão Ambiental:
Proporção do consumo de matérias-primas recicladas;
Definição específica de indicadores que mensurem a sua eficácia e efetividade
de acordo com as práticas de cada empresa
% do habitat preservado ou restaurado;
Matriz energética;
Eficiência energética;
Impacto nos mananciais;
Emissões de gases estufa;
Emissões de gases que afetam a camada de ozônio;
Dimensão Econômica
Estudo regular da percepção do investidor e feedback dos resultados;
Média de capital investido;
Taxa de retorno;
Custos;
Estrutura organizacional para gerenciamento de crises.
Dimensão Social
Inovações implantadas em razão da interferência do ouvidor e/ou do serviço
de atendimento a consumidores / clientes;
Encontro com stakeholders;
Cumprimento da lei;
% lucro líquido investido em ações sociais;
Investimento em infraestrutura;
Salários e benefícios pagos;
Média salarial em relação ao mercado;
Taxa de retenção de funcionários;
% de satisfação dos funcionários;
Total de empregos;
Empregos gerados;
186
Acidentes – geral;
Média de horas de treinamento por funcionário;
Representatividade do investimento em treinamento em relação ao total de
salários e benefícios;
Média de horas de desenvolvimento por funcionário.
Na comparação entre os três anos, observa-se que os indicadores econômicos
são os principais para as instituições financeiras. Os 5 deles encontrados nos relatórios
foram os mesmos para os três anos pesquisados e todos os indicadores foram passíveis
de comparação.
Já os indicadores ambientais tiveram uma pequena variação quantitativa entre os
três anos. Foram identificados 8 em 2008 e 2010 e 7 em 2009. 7 deles estavam
presentes nos três anos; destes, um não foi passível de comparação: eficiência - uso de
materiais. Um indicador quantificado no relatório de 2008 não foi quantificado em 2009
e 2010: proporção do consumo de matérias-primas recicladas. Outro foi incorporado no
ano de 2010: % do habitat preservado ou restaurado. Tal mudança talvez ocorra em
razão de a reciclagem de matérias-primas não ser mais uma vantagem tão significativa
entre as instituições financeiras, enquanto que a proteção de habitats pode ser
considerada uma ecovantagem, principalmente para a imagem da instituição.
Os indicadores sociais mostraram a maior variação entre os três anos. Desses, 12
foram encontrados nos três anos pesquisados. Dessa parcela, 3 não foram passíveis de
comparação: contribuições a campanhas político-partidárias, resultados das ações
sociais e endosso a acordos internacionais - este último apresentou o mesmo resultado
nos 3 anos. Outros 3 foram encontrados nos anos de 2008 e 2010: investimento em
infraestrutura, salários e benefícios pagos, e empregos gerados. 2 indicadores foram
encontrados nos anos de 2008 e 2009: acidentes - geral e média de horas de treinamento
por funcionário. Um indicador foi encontrado somente no ano de 2008:
representatividade do investimento em treinamento em relação ao total de salários e
benefícios. Tal fato explica-se devido à ausência do quadro “principais indicadores de
desempenho econômico, social e ambiental”, quadro Ibase no ano de 2009 (4
indicadores) e a diferença de padrões entre os relatórios, onde alguns dos dados
encontrados em 2008 tiveram sua forma de quantificação diferenciada em 2010,
impedindo sua comparação (3).
Na comparação entre os três anos, 2008 é iniciado com 31 indicadores, caindo
para 26 em 2009 e aumentando para 28 em 2010.
Em linhas gerais, considerando-se os indicadores passíveis de comparação entre
os três anos, verificaram-se melhores resultados para o ano de 2008, seguido de 2010 e,
por último, 2009.
Na dimensão ambiental verificaram-se melhores resultados para o ano 2008,
seguido por 2009 e 2010; na dimensão econômica, melhores resultados para 2010,
seguido por 2008 e 2009 e; para a dimensão social, melhores resultados para 2008,
seguido por 2010 e 2009. Para chegar-se a tais resultados, comparou-se cada um dos
indicadores entre os três anos e efetuou-se um ranking, sendo o 1º para o melhor
resultado e o 3º para o pior resultado. Com isso, contou-se a quantidade de resultados
por ano (1º, 2º e 3º) para definir qual o ano vencedor na classificação geral e por
dimensão (ambiental, econômica e social). A tabela 2 demonstra a quantidade e
resultado dos dados comparados.
187
Tabela 2: Quantidade e resultado dos indicadores comparados por dimensão
2008 2009 2010
Ranking 1º 2º 3º Total 1º 2º 3º Total 1º 2º 3º Total
Ambiental 3 3 1 7 3 2 1 6 2 1 4 7
Econômica 2 0 3 5 1 3 1 5 2 2 1 5
Social 8 4 3 15 3 4 4 11 4 6 2 12
Total 13 7 7 27 7 9 6 22 8 8 7 24
Fonte: Cilli, 2012.
5 CONSIDERAÇÕES FINAIS
Apesar de extensa pesquisa realizada por Delai (2006) utilizando-se de oito
iniciativas para elaboração do modelo de referência proposto, verificou-se predomínio
de indicadores sociais, equivalendo a 60% do total. Em virtude do exposto, o modelo
simplificado utilizado na presente pesquisa mantém esta porcentagem.
A utilização de relatórios de sustentabilidade permite ter uma ideia do
engajamento da instituição com o tema. No entanto, devido à falta de padronização
entre os relatórios dos anos de 2008, 2009 e 2010, a análise de informações é
dificultada. Além disso, como tais relatórios são destinados aos stakeholders, seu valor
científico/acadêmico é questionável.
Ao analisar os indicadores divulgados nos relatórios de sustentabilidade,
selecionados na aplicação do modelo proposto ou não, verifica-se que a dimensão
ambiental está se tornando mais importante ao longo dos anos. Tal mudança é
observada na divulgação dos impactos causados por suas atividades, como por exemplo,
a emissão estimada de CO2, no aumento dos investimentos ambientais, na proteção de
áreas ambientais, entre outros, ressaltando-se o fato de as atividades destas instituições
não serem diretamente relacionadas aos impactos ambientais mais usualmente
conhecidos.
Alguns indicadores, como o consumo de materiais, ainda precisam ser
estruturados para divulgação, uma vez verificada falta de padronização entre os três
relatórios analisados.
Outros, como a destinação de resíduos, está relativamente bem estruturada,
sendo foi possível usá-la como dado para comparar os três anos. Ainda assim, nota-se
uma melhoria na apresentação dos dados, tomando por base o relatório de 2010, no qual
também foram divulgadas informações separadas sobre resíduos perigosos e não
perigosos, bem como o método de disposição de tais resíduos.
A dimensão social, divulgada principalmente pelas ações realizadas por meio de
suas fundações e institutos também precisa ser estruturada. O resultado das ações
sociais, por exemplo, não estava padronizado. Em outros casos, a ausência de
indicadores entre os relatórios dos três anos dificultou uma avaliação mais precisa
como, por exemplo, a ausência do quadro Ibase no ano de 2009.
Referente à dimensão econômica, ela apresentou melhor estrutura e
padronização, embora alguns indicadores não tenham sido identificados e outros foram
obtidos de relatórios específicos (demonstrações contábeis). Todos os itens
identificados puderam ser comparados. Certamente, essa comparação só se tornou
188
possível pelo fato de a dimensão econômica ser o foco principal de uma instituição
financeira.
Com o exposto acima, são necessários estudos aprofundados em parceria com a
instituição. Pesquisadores precisam ter acesso às informações em suas fontes e não
somente às informações públicas, possibilitando assim uma consistência maior e,
consequentemente, a identificação de todos os itens do modelo. Com isso, seria possível
uma conclusão fidedigna da situação da instituição quanto ao tema sustentabilidade.
Uma alternativa sugerida é a adoção de um relatório integrado, conforme
proposto pela iniciativa Accounting for Sustainability (2012) e pelo International
Integrated Reporting Comitee (2011) onde seja adotado um padrão de relatório que
utilize e relacione em um documento único, as informações financeiras e não
financeiras, permitindo então a comparação entre os anos e outras instituições,
financeira ou não.
Conforme pesquisa realizada neste artigo conclui-se que a integração das
informações financeiras e não financeiras em um único relatório é uma tendência para
os próximos anos.
REFERÊNCIAS
ACCOUNTING FOR SUSTAINABILITY (A4S). Consulta geral ao sítio
eletrônico oficial. Disponível em: <http://www.accountingforsustainability.org>.
Acesso em: 12 abr. 2012.
ALMEIDA, F. Os desafios da sustentabilidade: uma ruptura urgente. 3ª
reimpressão. Rio de Janeiro: Elsevier, 2007. 280 p.
CILLI, L. D. Sustentabilidade nas instituições Financeiras: o caso do Itaú
Unibanco. São Paulo, 2012. 112f. Dissertação (Mestrado) – Curso de Tecnologias
Ambientais – Coordenadoria de Ensino Tecnológico, Instituto de Pesquisas
Tecnológicas do Estado de São Paulo, São Paulo, 2012.
COMISSÃO MUNDIAL SOBRE MEIO AMBIENTE E DESENVOLVIMENTO
(CMMAD). Nosso Futuro Comum. 2. ed. Rio de Janeiro: Editora da Fundação Getúlio
Vargas, 1991. 430p.
DEFESA CIVIL. Glossário de Defesa Civil: estudos de riscos e medicina de
desastres. 5. ed. Brasília: Secretaria Nacional de Defesa Civil, 2004. 283 p. Volume
Único. Disponível em:
<http://www.defesacivil.gov.br/publicacoes/publicacoes/glossario.asp>. Acesso em: 09
maio 2011.
DELAI, I. Uma proposta de modelo de referência para mensuração da
sustentabilidade corporativa. Ribeirão Preto, 2006. 271 f. Dissertação (Mestrado) –
Curso de Administração de Organizações, Faculdade de Economia, Administração e
Contabilidade de Ribeirão Preto – Universidade de São Paulo, Ribeirão Preto, 2006.
DELAI, I; TAKAHASHI, S. Uma proposta de modelo de referência para
mensuração da sustentabilidade corporativa. Revista de Gestão Social e Ambiental,
Salvador, v. 2, n. 1, p.19-40, jan. /abr. 2008. Disponível em:
<http://www.gestaosocioambiental.net/>. Acesso em: 05 jun. 2010.
189
DIAS, R. Gestão Ambiental: responsabilidade social e sustentabilidade. 5ª
reimpressão. São Paulo: Atlas, 2009. 196 p.
ESTY, D. C.; WINSTON, A. S. O verde que vale ouro: como empresas
inteligentes usam a estratégia ambiental para inovar, criar valor e construir uma
vantagem competitiva. Rio de Janeiro: Elsevier, 2008. 347 p.
FEDERAÇÃO BRASILEIRA DE BANCOS (FEBRABAN); et al.
Sustentabilidade em instituições financeiras: uma visão geral sobre os conceitos e as
abordagens de auditoria. São Paulo: Instituto Brasileiro de Ciência Bancária – IBCB,
2008. 163p.
IDEIA SUSTENTÁVEL. Itaú Unibanco é eleito banco mais sustentável do
mundo. Disponível em: <http://www.ideiasustentavel.com.br/2011/06/reconhecimento-
itau-unibanco-e-eleito-banco-mais-sustentavel-do-mundo/>. Acesso em: 14 jul. 2011.
INTERNATIONAL FINANCE CORPORATION (IFC). Consulta geral ao sítio
eletrônico oficial. Disponível em: < http://www.ifc.org//>. Acesso em: 14 jul. 2011.
INTERNATIONAL INTEGRATED REPORTING COMITEE (IIRC). Consulta
geral ao sítio eletrônico oficial. Disponível em: < http://www.theiirc.org/>. Acesso em:
12 abr. 2011.
ITAÚ UNIBANCO BANCO MÚLTIPLO S. A. Relatório Anual de
Sustentabilidade 2008. São Paulo: Itaú Unibanco Banco Múltiplo S. A., 2009a. 168 p.
Disponível em: <http://www.itauunibanco.com.br/relatoriodesustentabilidade/>. Acesso
em: 14 set. 2009.
ITAÚ UNIBANCO HOLDING S.A. Relatório Anual de Sustentabilidade 2009.
São Paulo: Itaú Unibanco Holding S. A., 2010a. 132 p. Disponível em:
<http://www.itauunibanco.com.br/relatoriodesustentabilidade/>. Acesso em: 01 ago.
2010.
ITAÚ UNIBANCO HOLDING S.A. Relatório Anual de Sustentabilidade 2010.
São Paulo: Itaú Unibanco Holding S. A., 2011a. 155 p. Disponível em:
<http://www.itauunibanco.com.br/relatoriodesustentabilidade/>. Acesso em: 06 jun.
2011.
IUCN; UNEP; WWF. World Conservation Strategy: Living Resource
Conservation for Sustainable Development. Switzerland: IUCN / UNEP / WWF, 1980.
LOUETTE, A. (org.). Gestão do conhecimento: compêndio para a
sustentabilidade: ferramentas de gestão de responsabilidade socioambiental. São Paulo:
Antakarana Cultura Arte e Ciência, 2007. 187p.
MATTAROZZI, V.; TRUNKL, C. Sustentabilidade no setor financeiro: gerando
valor e novos negócios. São Paulo: Editora SENAC São Paulo, 2008. 157 p.
NAHUZ, M. A. R. Comunicação pessoal. São Paulo, 04 abr. 2011.
OLIVEIRA, C. A. A contabilidade ambiental e suas aplicações e contribuições.
São Paulo, 2007. 57f. Trabalho de Conclusão de Curso (Especialização) – Curso de
Perícia e Auditoria Ambiental – Coordenadoria de Ensino Tecnológico, Instituto de
Pesquisas Tecnológicas do Estado de São Paulo, São Paulo, 2007.
190
SACHS,J. A riqueza de todos. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 2008. 479 p.
SILVA JÚNIOR, E. B. Meio Ambiente nas atividades financeiras: o papel dos
bancos privados. São Paulo, 2006. 107 f. Dissertação (Mestrado) – Curso de Meio
Ambiente, Segurança e Saúde no Trabalho: Sistema Integrado de Gestão – Faculdade de
Ciências Ambientais – Centro Universitário SENAC, São Paulo, 2006. Disponível em:
<biblioteca.sp.senac.br/LINKS/acervo246729/Esio%20Betrao%20da%20Silva%20Juni
or.pdf>. Acesso em 10 abr. 2009.
SOUSA, A. C. C. Responsabilidade social e desenvolvimento sustentável: a
incorporação dos conceitos à estratégia empresarial. Rio de Janeiro, 2006. 213f.
Dissertação (Mestrado) Curso de Ciências em Planejamento Energético – Instituto
Alberto Luiz Coimbra de Pós Graduação em Engenharia - COPPE – Universidade
Federal do Rio de Janeiro, Rio de Janeiro, 2006. Disponível em:
<www.ppe.ufrj.br/ppe/production/tesis/sousacc.pdf>. Acesso em: 11 abr. 2009.
TABET, F. Prefácio. In: MATTAROZZI, V.; TRUNKL, C. Sustentabilidade dos
negócios no setor financeiros: um caso prático. São Paulo: Annablume; Brasília:
BNDES, 2007. Cap. 2, p. 13-15.
TACHIZAWA, T. Gestão ambiental e responsabilidade social corporativa:
estratégias de negócios focadas na realidade brasileira. 3 ed. São Paulo: Atlas, 2005.
427p.
TOSINI, M. F. C. Risco ambiental para as instituições financeiras. São Paulo:
Annablume, 2006. 192 p.
VAN BELLEN, H. M. Indicadores de sustentabilidade: uma analise comparativa.
Reimpressão. Rio de Janeiro: Editora FGV, 2007. 256p.
WOLTMANN, A.; ARAÚJO, L. E. B. Desenvolvimento x Sustentabilidade: uma
abordagem transdisciplinar. Panóptica, Vitória, v.1, n. 8, p.461-482, maio/jun. 2007.
Disponível em: <http://www.panoptica.org>. Acesso em: 10 abr. 2009.
191
EVOLUÇÃO DA TECNOLOGIA BICOMBUSTÍVEL NO BRASIL: UMA
ANÁLISE DO SEGMENTO AUTOMOBILÍSTICO E A SUA CORRELAÇÃO
COM O SETOR SUCROALCOOLEIRO
Paula Meyer Soares95
Fabio Konishi96
Marcelo Santana97
Resumo
Ao longo de quatro décadas a indústria do etanol aprimorou seus processos
produtivos graças ao apoio da iniciativa pública e a ampla utilização de incentivos
fiscais. As melhorias tecnológicas na produção de biocombustíveis alcançaram a
indústria automobilística. A produção de automóveis bicombustíveis cresceu
significativamente nesse período e o etanol se estabelece internamente e
internacionalmente como uma importante fonte alternativa de energia. O presente
trabalho realizará um estudo sobre a produção de etanol e produção de automóveis
bicombustíveis, com o intuito de verificar as possíveis correlações existentes entre os
segmentos automobilístico e sucroalcooleiro. A metodologia utilizada baseou-se em
analise de correlação e regressão multivariada utilizando dados estatísticos anuais
durante o período de 2003 a 2012. A realização do estudo utilizou o software SPSS -
Statistical Package for the Social Sciences – versão 16.0. Os resultados demonstram
uma correlação entre produção de cana de açúcar e etanol, associada à produção
automobilística.
Palavras-chave: Bicombustíveis, Indústria Automobilística, Etanol, Cana-de-açúcar.
Abstract
Over four decades the ethanol industry has improved the production processes by
the support of public initiative and the wide use of tax incentives. Technological
improvements in biofuel production reached the auto industry. The flex-fuel car
production grew significantly during this period and ethanol is established internally
and internationally as an important alternative source of energy. This paper will conduct
a study on the production of ethanol and flex-fuel production car, in order to verify
possible correlations between the automobile and sugarcane sector. The methodology
used was based on correlation analysis and multivariate regression using annual
statistical data during the period 2003-2012. The proposed study used SPSS - Statistical
Package for the Social Sciences - 16.0 version. The results demonstrate a correlation
between the production of sugarcane and ethanol with production automobile.
Key-words: Flex-fuel, Automobile Industry, Ethanol, Sugar cane.
95 Universidade de Brasilia, UnB 96 FATEC-SP 97 Instituto Federal da Bahia, IFBA
192
1. Introdução
O cultivo da cana-de-açúcar no Brasil data do período Colônia. Na época a
atividade açucareira influenciou de forma positiva outras atividades como a têxtil e a
manufatureira levando o desenvolvimento econômico para diversas regiões do país.
Durante o século XVII, Portugal detinha experiência na produção de açúcar nas ilhas do
Atlântico e uma posição favorável na comercialização do açúcar nos países da Europa.
Neste período, o cultivo da cana-de-açúcar em solo brasileiro consolidou a posição
portuguesa na venda de açúcar, produto tão cobiçado e valorizado nos mercados dessa
região.
Essa interação de Estado e iniciativa privada acompanhou o desenvolvimento do
setor açucareiro no século passado até os dias de hoje. Segundo Paulillo et al (2008) a
intervenção estatal passa pelo processo de regulação da atividade e estabelecimento de
subsídios até o desenvolvimento de novas tecnologias e aproveitamento de subprodutos
como forma a definir o que é relevante em um contexto concorrencial.
A avaliação da interação entre agentes públicos e privados requer uma leitura
dos arranjos institucionais e a relação dos interesses dos grupos privados e estruturas de
decisão situados dentro do aparelho estatal. (PAULILLO et al, 2007)
A efetivação das politicas públicas são tomada a partir do adensamento de
decisões estratégicas de alguns grupos de interesses e o Estado. Ou seja, tais decisões
não consideram apenas o aspecto técnico envolvem consequências politicas, financeiras,
jurídicas, tecnológicas e constitucionais. (PAULILLO et al 2007)
Com a eclosão dos choques I e II do petróleo nos idos dos anos 70 e a escassez
mundial de oferta do combustível fóssil deram um novo impulso ao setor
sucroenergético e tecnológico na busca outras fontes de energia. Na época as políticas
públicas visavam incentivar o cultivo e o desenvolvimento agrícola, tecnológico no
segmento de etanol.
Passadas quatro décadas, o Brasil colhe os frutos dessas iniciativas de fomento
tecnológico e de apoio à indústria produtora de etanol, dominando amplamente a
tecnologia de plantio, processos, produção e também na fabricação de motores
automobilísticos bicombustíveis.
Tal gênese e desenvolvimento de uma tecnologia automotiva para o uso de
biocombustíveis impactou na indústria automobilística observando uma sinergia nas
cadeias produtivas de etanol e automobilística.
Historicamente, o setor sucroalcooleiro brasileiro sempre ocupou posição de
destaque. Segundo estudo de Neves (2010), desenvolvido pela Markestrat do Centro de
Pesquisas e Projetos em Marketing e Estratégia da USP, o setor em 2008 gerou riqueza
na ordem de US$ 28,15 bilhões correspondendo a aproximadamente 2% do PIB e se
somados aos diversos sistemas de produção agroindustrial chega-se ao valor de US$
86,8 bilhões. O setor mantém ainda 1,28 milhões de postos de trabalho formais com
uma massa salarial de US$ 738 milhões.
Já o segmento automobilístico segundo dados da Associação Nacional dos
Fabricantes de Veículos Automotores, a Anfavea, o setor fechou 2012 com uma
participação de 18,7% do PIB industrial com uma produção de 3,3 milhões de veículos
e 150.000 empregos formais.
Desta forma o inicio do séc. XXI é marcado pelo retorno do etanol a posição de
destaque como combustível não somente pela nova tecnologia, mas também como fonte
de energia alternativa ao combustível fóssil, como uma das maneiras de contenção dos
chamados GEE (Gases de Efeito Estufa). Para Macedo (2007, p. 157), “os países
comprometidos com as metas do Protocolo de Kyoto, o uso de bicombustíveis
193
representa uma das formas mais efetivas de reduzir as emissões líquidas de gases de
efeito estufa associadas ao consumo energético no setor de transporte”.
O atual cenário contempla o Brasil em uma posição estratégica no campo
tecnológico e como grande produtor mundial no desenvolvimento global de uma fonte
alternativa de energia. Para Macedo (2007) a produção associada ao uso do etanol no
Brasil pode ser considerada um bom exemplo para o mundo na introdução de energia de
uma fonte renovável em grande escala de produção.
O referido artigo divide-se em quatro seções. A primeira seção tratará sobre a
tecnologia do biocombustível e suas relações com o crescimento da indústria
automobilística no Brasil. A segunda seção abordará sobre a tecnologia do etanol
ressaltando os tipos de etanol existentes e os seus usos. A terceira seção discorre a
metodologia utilizada e o modelo de correlação multivariada utilizada e seus resultados.
E por fim, as considerações finais.
2 A Tecnologia bicombustível
Com o advento de novas tecnologias associadas à políticas governamentais, os
carros flexíveis se consolidam no mercado brasileiro. Para Goldemberg (2007, p. 163)
“a tecnologia de produção de etanol de cana-de-açúcar no Brasil avançou de modo
importante nos últimos trinta anos e nos próximos dez ou vinte anos, o uso eficiente de
biomassa de cana poderá aumentar significativamente a gama de produtos e seu
valor”.
A partir de 2003, a produção nacional de automóveis bicombustíveis apresentou
crescimento significativo, consolidando a tecnologia de produção de etanol, uma vez
que no contexto brasileiro, os motores não passaram por adaptações para o uso de
ambos os combustíveis (etanol e gasolina). Conforme Nigro (2010 p.156) “o veiculo
flex, lançado em 2003 e que hoje responde por cerca de 90% das vendas, é o ponto alto
da história de sucesso do etanol brasileiro nesta década”.
O crescimento das vendas da indústria automobilística associado ao aumento da
produção de etanol, decorrente das ações governamentais e da nova tecnologia,
impulsionou o segmento sucroalcooleiro. Esta relação se consolida com indicadores
econômicos favoráveis, com o aumento do consumo, face aos índices baixos de
inflação.
Ressalta-se um futuro promissor, seja no âmbito nacional como no internacional,
onde acordos poderão surgir no segmento sucroalcooleiro com países desenvolvidos, na
transferência desta tecnologia, principalmente com aqueles comprometidos com o
protocolo de Kyoto para redução de gases de efeito estufa.
A partir de 1999 o preço do álcool como combustível passou a ser competitivo
novamente, porém as vendas ainda não eram satisfatórias, tal como nos anos 80, uma
vez que os motores eram desenvolvidos exclusivamente para um tipo de combustível.
Segundo Nigro (2010) “em março de 2003 foi lançado o primeiro veículo flexível
brasileiro, capaz de consumir etanol hidratado, gasolina C ou qualquer mistura entre
dois combustíveis”. Esta revolução em termos tecnológicos trouxe ao mercado
brasileiro uma opção de escolha no consumo de combustíveis, uma vez que para Nigro
(2010) ainda, a tecnologia brasileira baseou-se no conceito de não se modificar os
motores de gasolina original.
Esta nova fase para o etanol com a introdução dos veículos bicombustíveis é um
novo marco para o setor sucroalcooleiro, uma vez que 90% dos veículos produzidos
pela indústria automobilística, segundo dados da Anfavea (2012), são automóveis
194
bicombustíveis, totalizando mais de 17,3 milhões de veículos no período de 2003 a
2012.
3 Tecnologia do Etanol
É importante ainda destacar algumas questões técnicas envolvendo o etanol
como combustível veicular, uma vez que estas características serão um fator decisivo na
expansão da cultura da cana-de-açúcar e consequentemente da possibilidade de aumento
da produção de etanol. Segundo Nigro (2010, p.158) “o principal vetor de
desenvolvimento da tecnologia de motores a álcool na época era o aumento da
eficiência energética, coerente com os aspectos estratégico e econômico que pautaram
a criação do Proálcool.”
O etanol cuja formula molecular C2H6O, denominado também como álcool
etílico, é uma substância que pode ser utilizada como combustível em motores de
combustão interna, possuindo duas características básicas no país. A Portaria da ANP
nº 2, de 16/01/2002 –Dou 17/01/2002, classifica o etanol em duas categorias: a) o álcool
etílico anidro combustível, o AEAC, utilizado na mistura com a gasolina e b) o álcool
etílico hidratado combustível, o AEHC, como etanol puro, utilizado diretamente nos
veículos.
Em conformidade com a legislação supracitada, as diferenças entre o AEAC e
AEHC reside na composição dos teores. O AEAC possui em sua composição menos de
0,6% de água, enquanto AEHC esses índices são de 6,2% a 7,4% de água
respectivamente (Fonte: Regulamento Técnico ANP nº 5 de 2001)
Embora seja uma questão estritamente técnica, é importante salientar tais
características e especificações haja vista o progresso tecnológico ocorrido no
desenvolvimento dos motores fabricados para este tipo de combustível.
A tecnologia automotiva esta suficientemente desenvolvida
para permitir que veículos de etanol puro hidratado tenham
desempenho, dirigibilidade, condições de partida a frio e
durabilidade absolutamente similares aos motores a gasolina,
especialmente em países com invernos moderados.(BNDES
2008, p.42)
Desta forma com o desenvolvimento de tecnologia que permite a utilização de
ambos os combustíveis - gasolina e etanol, seja hidratado ou não em quaisquer
proporções, permitiu por sua vez a abertura e ampliação de um mercado para a cultura
da cana-de-açúcar e seus derivados
Nigro (2010) reitera a importância da tecnologia brasileira de motores flexíveis,
baseada no conceito de não modificação do motor a gasolina original. No inicio, a
primeira geração de motores exigia a adoção de modificações e adaptações para
atendimento dos requisitos de emissões sem a preocupação de consumo do etanol.
Experiências em diversos países como nos Estados Unidos onde a
proporcionalidade com etanol não ultrapassa a 10% na gasolina, ou mais conhecido com
E10, serviu de padrão para as demais indústrias em outros países como China,
Tailândia, Austrália e Colômbia, uma vez que não há necessidade de alterações nos
componentes dos motores, segundo o BNDES (2008), estas experiências, servirão de
base para que esta mistura possa ser introduzida sem a necessidade de maiores
alterações no parque veicular existente.
195
Segundo BNDES (2008) na visão da EMA (Engines Manufacturers
Association), que representa a indústria automobilística mundial, a proposta de etanol
em até 10% da mistura com a gasolina é bem aceita, desde que se cumpram ás
especificações de qualidade.
Desta forma, abre-se um leque de oportunidades para o mercado brasileiro, tanto
na questão de transferência da tecnologia de carros flexíveis, como no incremento a
exportação de álcool etílico para motores de combustão, uma vez que o Brasil ocupa
uma posição privilegiada no plantio e produção de etanol.
Na perspectiva da indústria automobilística, os fabricantes instalados no parque
industrial brasileiro, já aderiram de forma contundente, uma vez que a produção de
carros com a tecnologia bicombustível vem crescendo substancialmente no contexto
nacional, como demonstra o gráfico 1, na evolução das vendas de carros desde 2003, no
lançamento do carro.
Gráfico 1 – Produção de automóveis por Tipo de Combustível
Fonte: ANFAVEA 2012
Elaboração: Autores
Embora a produção de automóveis mantivesse crescente até o ano de 2010,
observamos uma inflexão no período de 2010-2012. Nesse período, o mercado mundial
de commodities entrou em crise devido a alterações climáticas.
Em 2010, o consumo no Brasil de etanol teve uma queda acumulada de 13%,
totalizando 7,1 bilhões de litros, ante os 8,2 bilhões de litros de igual intervalo de 2009.
(Jornal Valor Econômico, 2010)
O arrefecimento da demanda é um reflexo dos preços mais elevados do etanol,
que acabou perdendo competitividade para a gasolina - para ser viável ao consumidor
final nos postos, o etanol tem que custar até 70% do preço da gasolina.(Jornal Valor
Econômico, 2010)
Essa elevação no preço do etanol refletiu na produção de automóveis nos anos
subsequentes como verificamos no gráfico 1.
A reação do setor automobilístico era esperada uma vez que o etanol é um
elemento determinante nas vendas de automóveis. Assim como as mudanças de
impostos – estaduais ou de produção – que incidem no setor automobilístico.
0,00
1000000,00
2000000,00
3000000,00
4000000,00
5000000,00
6000000,00
7000000,00
20
03
20
04
20
05
20
06
20
07
20
08
20
09
20
10
20
11
20
12
TOTAL AUTO
FLEX
ALCOOL
GASOLINA
196
O gráfico 2 mostra que tal aumento no preço de mercado do etanol não pode ser
observado também do lado da oferta . A diminuição do consumo reflete no espírito de
cautela do produtor nacional e isso é claramente percebido na oferta de etanol em 2010.
A recuperação ocorre no ano seguinte de forma vigorosa vindo a diminuir em 2012
novamente. A diminuição em 2012 deve-se a diminuição da atividade econômica no
país em decorrência do desaquecimento e desaceleração mundial.
Gráfico 2 – Produção de Etanol
Fonte: ANFAVEA 2012
Elaboração: Autores
4. Metodo de Pesquisa
4.1. Fonte de Dados
Os dados utilizados para a execução desta pesquisa são originários de fontes
secundárias, provenientes de publicações específicas de órgãos reguladores e de
anuários estatísticos especializados em produção de automóveis e etanol.
4.2.Método de Análise
Para a realização do estudo acerca das relações entre a produção de etanol e a
produção de automóveis bicombustíveis, foram utilizadas ferramentas de análise
multivariada, em especial de correlação e regressão linear para apoiar a interpretação de
dados secundários históricos relativos ao período estudado.
Para a análise multivariada de dados foi utilizado o software SPSS – Statistical
Packge for the Social Sciences versão 16.0., Segundo Cooper e Schindler (2003, p.
454), “define-se análise multivariada como uma técnica estatística que focaliza e
apresenta destaque a estrutura de relações simultâneas entre três ou mais fenômenos”.
Segundo Hair et al (2009, p.23) a análise multivariada considera “ [...] todas as
variáveis devem ser aleatórias e inter-relacionadas de tal maneira que seus diferentes
efeitos não podem ser significativamente interpelados em separado” A seleção da
técnica de analise multivariada correta leva em consideração o fato de termos um
conjunto de dados que são interdependentes.
A determinação de um número ou coeficiente de correlação (r ) expressa
metricamente um grau ou força da relação entre as variáveis. Para Hair et al. (2009,
0,00
10000,00
20000,00
30000,00
40000,00
50000,00
60000,00
TOTAL
HIDRA
ANIDRO
197
p.150), “o sinal (+ ou -) indica a direção da relação. O valor pode variar de -1 a +1 onde
+1 indica uma perfeita relação positiva, 0 (zero) indica nenhuma relação e -1 uma
perfeita relação negativa ou reversa.”
O r de Pearson determina o efeito de colinearidade (entre duas) ou
multicolinearidade (mais de duas) variáveis independentes. Segundo Hair et al. (2009),
é a expressão de duas ou mais variáveis independentes, demonstrando sua força de
associação - altamente correlacionada variando de 0 (zero) a 1 (um) ou -1 (menos um),
ou seja, quanto mais próximo de um ou menos um, maior a correlação e quanto mais
próximo de 0 menor a correlação.
Para uma melhor análise dos resultados, foi calculado o r² ou coeficiente de
determinação que expressa o quadrado da correlação r de Pearson.
O coeficiente de determinação r² explica a equação da regressão onde se assume
que quanto maior o valor, melhor a previsibilidade da equação. Conforme Hair et al.
(2009, p.182) “o r² ajustado é particularmente útil na comparação entre equações de
regressão que envolvem diferentes números de variáveis independentes ou diferentes
tamanhos de amostra, pois ele dá um desconto para os graus de liberdade para cada
modelo.”
Para aplicação correta de uma análise de regressão e correlação é importante
destacar alguns cuidados para que se possa a validar as hipóteses do modelo. Hair
(2009) et al. destacam três suposições visando evitar erros de previsão ou uma ausência
das relações estudadas: 1) linearidade de um fenômeno; 2) variância constante
(homocedasticidade ou heterocedasticidade) e 3) normalidade.
4.3.Procedimentos Metodológicos: modelo
Para a realização do estudo foi adotado o seguinte modelo econômico:
Y= β1x1+β2x2+β3x3+β4x4+β5x5+β6x6+β7x7+β8x8, em que:
Y: produção de automóveis biocombustíveis
x1: produção de etanol anidro
x2: produção de etanol hidratado
x3: produção total de etanol
x4: produção de cana-de-açúcar
x5: produção de automóveis a gasolina
x6:produção de automóveis a etanol
x7:produção de automóveis bicombustíveis
x8:produção total de automóveis
4.4. Resultados e Discussão
Utilizou-se a técnica de correlação com dados secundários no período de 2003 a
2012 totalizando 10 observações para as variáveis: ANIDRO (produção de etanol
anidro), HIDRATADO (produção de etanol hidratado), TOTAL_ETANOL(produção
total de etanol), P_CANA (produção de cana-de-açúcar), PA_GAS (produção de
automóveis a gasolina), PA_ETANOL (produção de automóveis a etanol), PA_FLEX
(produção de automóveis bicombustíveis), PA_TOTAL (produção total de automóveis),
e de regressão para as variáveis TOTAL_ETANOL (produção total de etanol)
independente e PA_FLEX (produção de automóveis bicombustíveis) dependente.
198
A tabela 1 apresenta os coeficientes de correlação r = 0,908 de determinação r²
= 0,824, r² ajustado = 0,802 e de erro padrão de estimação = 4,45506E5, com todos os
valores positivos demonstrando uma associação crescente na produção total de etanol.
Destaca-se o valor de r² = 0,824 representando que aproximadamente 80% da produção
de etanol poderia ser explicada em relação à variável independente.
Tabela 1- Coeficientes de correlação e de determinação
Modelo R R2 R
ajustado
Erro
padrão
1 0,98 0,824 0,802 4,4556E5
O valor apresentado aponta uma forte multicolinearidade, que segundo Hair et
al. (2009, p.190), a presença de elevadas correlações (geralmente 0,90 ou maiores) é a
primeira indicação de colinearidade substancial.
A Analise Multivariada de Variância (MANOVA) apresentada na tabela 2
demonstra um valor F = 37,348 e um nível de significância igual a 0,000, este resultado
indica que pelo menos um dos coeficientes é significativamente diferente de 0 (zero).
H0: β1 = β2 = 0,00
H1: pelo menos um dos coeficientes β ≠ 0,00
Tabela 2- Análise de Variância
Modelo Soma dos
quadrados
df F Sig
Regressão
Residual
Total
7,413E12
1,588E12
9,000E12
1
8
9
37,348 0,000
Fonte: Pelo SPSS. Elaboração: Autores
Notas: a. Predictors: (Constant),
TOTAL_ET
b. Dependent Variable: PA_FLEX
De acordo com a tabela 3, podemos observar uma forte correlação entre a
produção de automóveis bicombustíveis e a produção total de etanol com valor de 0,908
e a produção total de automóveis com 0,979, neste ultimo caso justifica-se em função da
produção de carros bicombustíveis representar aproximadamente 90% da produção
automóveis, consequentemente a correlação entre produção de automóveis a gasolina
possui uma correlação negativa de -0,977 uma vez que sua representatividade destes
diminuiu significativamente.
199
Tabela 3 – Matriz de Correlação de Pearson ® para variáveis do estudo.
Fonte: pelo SPSS. Elaboração: Autores
O estimulo a produção nacional de automóveis é um traço da politica industrial
brasileira da década de 70 e que se perpetua nos dias atuais. Tais incentivos
capitaneados por isenções fiscais e linhas de credito de longo prazos para o consumidor
são exemplos de iniciativas adotadas pelo Estado visando o crescimento do setor e
demais segmentos atrelados ao automotivo.
Em 2012, o Brasil possuía uma frota de 31 milhões de automóveis sendo 17,3
milhões de automóveis bicombustíveis, mais da metade da frota nacional de autos. Em
2007, o numero total de automóveis biocombustíveis era de 4,5 milhões sendo que o
país possuía uma frota total de automóveis de 21,5 milhões. Um crescimento
significativo em 5 anos de quase 200%, (ÚNICA, 2012)
Na perspectiva da indústria automobilística, os fabricantes instalados no parque
industrial brasileiro, já aderiram de forma contundente, uma vez que a produção de
carros com a tecnologia bicombustível vem crescendo substancialmente no contexto
nacional.
Em relação a produção total de cana-de-açúcar os resultados apresentam uma
forte correlação entre produção de automóveis bicombustíveis com 0,929 a produção de
etanol hidratado com 0,981. Apesar da forte correlação obtida no estudo, o período pós-
crise mundial em 2008 e em 2010/11 a produção de etanol e cana-de-açúcar desacelerou
em relação aos anos anteriores. Tal retração deveu-se a mudança de cenário externo e a
baixa credibilidade dos agentes do setor com relação a reversão de tal quadro. A
produção de cana-de-açúcar caiu em 10% no período de 2008/09 (569.216 mil ton para
541.962 mil ton). A produção total de etanol também sofreu uma queda, passando de
27.526 mil m3 para 25.691 mil m3. (UNICA, 2013).
Em 2010, o consumo no Brasil de etanol sofreu uma queda acumulada de 13%,
totalizando 7,1 bilhões de litros, ante os 8,2 bilhões de litros de igual intervalo de 2009.
(Jornal Valor Econômico, 2010)
PA_FLEX ANIDRO HIDRATADO TOTAL_ET P_CANA PA_GAS PA_ETANOL
PA_FLEX Pearson Correlation 1
Sig. (2-tailed)
N 10
ANIDRO Pearson Correlation 0,231 1
Sig. (2-tailed) 0,521
N 10 10
HIDRATADO Pearson Correlation 0,903 0,153 1
Sig. (2-tailed) 0,000 0,674
N 10 10 10
TOTAL_ET Pearson Correlation 0,908 0,280 0,992 1
Sig. (2-tailed) 0,000 0,434 0,000
N 10 10 10 10 10
P_CANA Pearson Correlation 0,926 0,187 0,981 0,978 1
Sig. (2-tailed) 0,000 0,605 0,000 0,000
N 10 10 10 10 10
PA_GAS Pearson Correlation -0,977 -0,259 -0,874 -0,883 -0,882 1
Sig. (2-tailed) 0,000 0,471 0,001 0,001 0,001
N 10 10 10 10 10 10
PA_ETANOL Pearson Correlation -0,839 0,381 -0,879 -0,485 -0,514 0,979 1
Sig. (2-tailed) 0,161 0,619 0,121 0,515 0,486 0,021
N 4 4 4 4 4 4 4
PA_TOTAL Pearson Correlation 0,979 0,202 0,894 0,895 0,932 -0,913 -0,555
Sig. (2-tailed) 0,000 0,575 0,000 0,000 0,000 0,000 0,445
N 10 10 10 10 10 10 4
**. Correlation is significant at the 0.01 level (2-tailed).
*. Correlation is significant at the 0.05 level (2-tailed).
Correlations
200
O arrefecimento da demanda é um reflexo dos preços mais elevados do etanol,
que acabou perdendo competitividade para a gasolina - para ser viável ao consumidor
final nos postos, o etanol teria que custar até 70% do preço da gasolina.(Jornal Valor
Econômico, 2010)
A oscilação dos mercados financeiros mundiais influenciou de forma
significativa a atividade do setor sucroalcooleiro.
Em 2010 o BNDES lançou o Plano de Apoio Conjunto à Inovação Tecnológica
Agrícola no Setor Sucroenergético, o PAISS em parceria com o Finep com o objetivo
da dar fomento e incentivos as iniciativas que promovessem o desenvolvimento, a
produção pioneira e a adaptação de sistemas industriais nas cadeias produtivas da cana-
de-açúcar e de outras culturas energéticas compatíveis, complementares e/ou
consorciáveis com o sistema agroindustrial da cana-de-açúcar. A adoção de iniciativas
de fomento a inovação e aumento de produtividade estiveram presentes objetivando
uma reversão do quadro recessivo de produção agrícola vivido pelo setor pós-crise
2008.
Esse período de inflexão que o setor sucroalcooleiro passou nesse período pós-
crise. Essa inflexão é reflexo das dificuldades enfrentadas pelos produtores – politica
setorial fraca e desalinhada aos interesses do setor – e consumidores cujo grau de
confiança de consumo encontrava-se em patamares baixos.
5 Considerações Finais
O Brasil é um país reconhecido mundialmente pela capacidade de inovação
tecnológica no ramo de biocombustíveis. Na década de 70, com a adoção do Programa
Nacional de Álcool, o Proálcool, objetivando o fomento de novas tecnologias
combustíveis para o enfrentamento da enorme crise energética deflagrada nesse período,
o Brasil sai a frente e hoje colhe os frutos dessa iniciativa.
Em 2012, segundo dados da ÚNICA, o Brasil possuía uma frota de 31 milhões
de automóveis sendo 17,3 milhões de automóveis bicombustíveis, mais da metade da
frota nacional de autos. Em 2007, havíamos 4,5 milhões de automóveis bicombustíveis
e 21,5 milhões de automóveis no país. Um crescimento significativo em 5 anos de quase
200%,
A realização do estudo aponta para uma correlação positiva e forte para a
produção de automóveis bicombustíveis e a produção de etanol com valor de r de
Pearson = 0,908 e a produção total de automóveis com r = 0,979, demonstrando
efetivamente o reflexo da produção de aproximadamente em 90% de carros
bicombustíveis, em contrapartida uma correlação negativa para a produção de
automóveis a gasolina com r = -0,977.
Ainda se apresenta no estudo a relação positiva e para a produção de cana-de-
açúcar e etanol hidratado com r = 0,981, demonstrando que a produção destina-se ao
abastecimento da frota nacional de automóveis, em contrapartida uma baixa correlação
com o etanol anidro com r = 0,187 que pertence a mistura da gasolina.
É fato que o aumento da produção esta relacionada não somente com os índices
macroeconômicos favoráveis e políticas publicas para os setores, uma vez que existem
outras variáveis que impactam em conjunto como a capacidade de produção da
indústria, taxa de câmbio, renuncia fiscal, PIB entre outros, bem como a própria
maturidade do segmento.
A discussão é ampla e podendo gerar resultados diferenciados se associado com
outras variáveis e mesmo levando-se em consideração algumas perspectivas,
considerando o etanol como uma fonte de energia renovável e a possibilidade de
201
expansão do setor, seja para a produção ou pela transferência de tecnologia, know-how
adquirido pelo país ao longo dos últimos quarenta anos de programa.
O tema é abrangente possibilitando trabalhos futuros diante da perspectiva de
crescimento do setor sucroalcooleiro e do segmento automobilístico. E por essa
magnitude o presente trabalho não se finda nestas considerações, outros estudos
poderão ser desenvolvidos e novas contribuições poderão ser apresentadas no contexto
em análise.
6 Referencias Bibliográficas
ANFAVEA. Anuário Estatístico da Indústria Automobilística.
http://www.anfavea.com.br/anuario.htlm
São Paulo: ANFAVEA, 2012. Acesso em: 03 de jun. 2013.
BAJAY, Sergio V.; NOGUEIRA, Luiz Augusto H.; SOUZA, Francisco José R. O
Etanol na Matriz Energética. In: SOUSA, Eduardo L. Leão de; MACEDO, Isaias de
Carvalho (org.). Etanol e Bioeletricidade: A Cana-de-Açúcar no Futuro da Matriz
Energética. São Paulo: ÚNICA, 2010.
BRASIL. Agência Nacional do Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis.
Portaria 309, de 27 de dezembro de 2001.http://www.anp.gov.br Acesso em 03 de
marco de 2013
BRASIL. Banco de Desenvolvimento Social e Econômico e Centro de Gestão e
Estudos Estratégicos. Bioetanol de Cana-de-Açúcar: Energia para o Desenvolvimento
Sustentável. Rio de Janeiro: BNDES, 2008.
BATISTA, Fabiana. Consumo de etanol recua 11% no Brasil em outubro. Jornal
Valor Econômico, 2010. http://valoronline.com.br. Acesso em 29 de junho de 2013.
BRUNI, Adriano Leal. SPSS Aplicado a Pesquisa Acadêmica. São Paulo: Atlas,
2009.
COOPER, Donald R., SCHINDLER, Pamela. S. Métodos de pesquisa em
Administração. 7 ed. Porto Alegre: Bookman, 2003.
CORREA NETO, Vicente; RAMON, Dan. Análise de Opções Tecnológicas para
Projetos de Co-Geração no Setor Sucroalcooleiro. SETAP: Brasília, 2002.
http://www.ie.ufrj.br/infosucro/biblioteca/bim_CorreaNeto_OpcoesCogeracao.pdf
Acesso em: 25 de mai.2013.
HAIR, Joseph F. et al. Análise Multivariada de Dados. 6a. Edição. Porto Alegre:
Bookman, 2009.
HAIR, Joseph, F.; Junior. BABIN, Barry; MONEY, Arthur H.; SAMOUEL, Phillip.
Fundamentos de Métodos de Pesquisa em Administração. Porto Alegre: Bookman,
2005.
JUNIOR PRADO, C. Formação Econômica do Brasil, Ed Brasiliense, Brasilia,
2008. 334p.
202
MACEDO, Isaias de Carvalho (org). A Energia da cana-de-açúcar: Doze estudos
sobre a agroindústria da cana-de-açúcar no Brasil e sua Sustentabilidade. 2ª edição.
São Paulo: ÚNICA, 2007.
NEVES, M. F.; TROMBIN, V. G.; CONSOLI, M. O Mapa Sucroenergético do
Brasil. in: SOUSA, E. L. Leão de; MACEDO, I. de C. (org.). Etanol e Bioeletricidade:
A Cana-de-Açúcar no Futuro da Matriz Energética. São Paulo: ÚNICA, 2010.
NIGRO, Francisco; SZWARC, Alfred. O Etanol como Combustível in: SOUSA,
Eduardo L. Leão de; MACEDO, Isaias de Carvalho (org.). Etanol e Bioeletricidade: A
Cana-de-Açúcar no Futuro da Matriz Energética. São Paulo: ÚNICA, 2010.
PAULILLO, Luiz Fernando. VIAN, Carlos Eduardo. SHIKIDA, Pery Francisco.
MELLO, Fabiana Tanoue de (2007). “Álcool Combustível e Biodiesel no Brasil: Quo
Vadis?” In Revista de Economia e Sociologia Rural. Vol. 43, nr 3. Brasília, Sociedade
Brasileira de Economia Rural. Versão eletrônica encontrada em A Energia e seu
Controle Histórico BJIR, Marília, v.2, n.3, p.436-462, Set./Dez. 2013
http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0103-
0032007000300001&lng=en&nrm=iso&tlng=pt. Acesso em 25 de março de 2012.
PIRES, Adriano; SCHECHTMAN, Rafael. Politicas Internacionais de
Biocombustíveis. in: SOUSA, Eduardo L. Leão de; MACEDO, Isaias de Carvalho
(org.). Etanol e Bioeletricidade: A Cana-de-Açúcar no Futuro da Matriz Energética.
São Paulo: ÚNICA, 2010.
ÚNICA, Estatísticas sobre produção de etanol, 2011. http://www.unica.com.br.
Acesso em 23 de junho de 2013.
203
O PAPEL SOCIOAMBIENTAL DA VEGETAÇÃO URBANA: CUSTOS E
BENEFÍCIOS
Luciana Schwandner Ferreira98
RESUMO
A necessidade de cidades mais verdes parece consensual, porém faz-se necessário
compreender com maior profundidade os papéis da vegetação nas cidades e o impacto
de sua presença no cotidiano de seus habitantes.
Ao levantar os principais benefícios e custos associados à presença da vegetação nas
cidades este artigo objetiva contribuir com o planejamento das áreas verdes urbanas e
com a valorização do verde nas cidades.
Palavras-chave: Vegetação Urbana; Floresta Urbana; Microclima Urbano;
Conforto Ambiental; Impactos Ambientais.
INTRODUÇÃO
A importância geral da vegetação na ecologia urbana parece inquestionável, porém
seus benefícios e os papéis que a vegetação desempenha nas cidades ainda carecem de
maiores detalhamentos (SPANGENBERG, 2009).
A vegetação interage sobre o conjunto de elementos climáticos, contribuindo com
diversos aspectos tais como controle da radiação solar, temperatura, umidade, poluição
atmosférica, entre outros. Tipo, porte e idade da vegetação, bem como o período do ano
são parâmetros importantes para determinar o grau de influência da vegetação no clima
(MASCARÓ, 1996). Aparecem ainda como fatores determinantes dessa influência a
relação área vegetada/área construída e a forma e arranjo do plantio (GIVONI, 1998).
Comumente classificados em ambientais ou sociais, os benefícios da vegetação
urbana não receberão tal distinção no presente artigo por entendermos que em muitos
aspectos os benefícios ambientais e sociais estão relacionados, sendo por vezes
indissociáveis.
Distinção necessária é aquela a ser feita entre os efeitos ambientais de áreas verdes
em geral e plantas em particular. Grandes áreas verdes, como parques, geralmente
desempenham importante papel no estabelecimento da imagem da cidade e na provisão
de área para atividades sociais. Porém, sua influência nos aspectos climáticos não vai
muito além dos limites da área vegetada (GIVONI, 1998). Outra distinção necessária é
aquela entre os efeitos das plantas no clima global da área urbana e os efeitos das áreas
verdes nas condições microclimáticas do entorno dos edifícios e no desempenho
térmico das construções (GIVONI, 1998).
A seguir serão apresentados alguns dos mais citados aspectos influenciados pela
vegetação em áreas urbanas e os custos diretos e indiretos associados à sua presença nas
cidades.
98 Arquiteta, Urbanista e Mestra na área de Tecnologia da Arquitetura pela Faculdade de
Arquitetura e Urbanismo da Universidade de São Paulo.
Email: [email protected]
204
POLUIÇÃO ATMOSFÉRICA
Figura 1. Poluição atmosférica na cidade de São Paulo. Fonte: Agência Brasil,
2010.
A poluição atmosférica nas cidades compromete a saúde humana e já é considerada
uma das principais causas de mortalidade por enfarto agudo do miocárdio e doenças
respiratórias. Cardoso (2011) realizou um estudo na Zona Norte da cidade de São Paulo
correlacionando os óbitos registrados pelas duas doenças citadas com a localização das
vias de tráfego intenso, concluindo que há relação entre a concentração de poluentes e a
mortalidade por enfarto e doenças respiratórias (informação verbal)99i.
De acordo com Falcón (2007), em países desenvolvidos uma cidade de dimensões
médias produz entre três e oito toneladas de dióxido de carbono (CO2) /habitante/ano,
sendo o tráfego de veículos responsável por aproximadamente 40% do total de
emissões. Além do CO2, a poluição atmosférica é formada ainda por óxidos de enxofre
e de nitrogênio, monóxido de carbono, compostos orgânicos voláteis e partículas em
suspensão.
Por reter temporariamente as partículas suspensas no ar e absorver alguns gases
nocivos aos seres humanos, a vegetação é capaz de amenizar os efeitos indesejáveis da
poluição nas cidades. (NOWAK, 1994; LLARDENT, 1982).
A taxa de remoção de poluentes depende da quantidade destes na atmosfera, do
vigor e porte da vegetação, do tipo e densidade de galhos e folhas e de condições
climáticas (SPIRN, 1995; NOWAK, 1994; FALCÓN, 2007), sendo variável entre
espécies e entre indivíduos da mesma espécie (MASCARÓ, 2010). Estudos conduzidos
na cidade de Chicago (EUA) verificaram que árvores de grande porte são capazes de
remover 60 a 70 vezes mais poluentes que as árvores menores (NOWAK, 1994). É
importante ressaltar que quando os contaminantes atmosféricos são excessivos eles
também podem prejudicar a vegetação.
Apesar de a vegetação possuir grande contribuição na remoção de poluentes da
atmosfera, sua dispersão depende ainda do fluxo dos ventos no nível da rua para gerar a
mistura com as camadas de ar menos poluído. Em ruas com vegetação muito densa, a
dispersão pode ficar comprometida pela diminuição dos ventos, sendo importante
considerar este efeito em ruas de tráfego intenso (GIVONI, 1998).
99 Estudo apresentado pela Profa. Dra. Maria Regina Alves Cardoso no Seminário
Metrópoles: Políticas, Planejamento e Gestão em Saúde e Ambiente, realizado na Faculdade de
Saúde Pública da Universidade de São Paulo em 31/05/2011.
205
Outra importante influência da vegetação na composição atmosférica é a capacidade
de fixação e produção de determinados gases, como o sequestro e armazenamento de
CO2 na biomassa vegetal, que ocorre durante o crescimento das plantas.
Apesar de reduzir as quantidades de CO2 e de partículas suspensas no ar, a
vegetação é responsável pela emissão de compostos orgânicos voláteis (COV)100ii. De
acordo com Aquino (2006 apud SCHIRMER E QUADROS, 2010) a emissão de COV
biogênicos (emitidos pela vegetação) é aproximadamente sete vezes maior que a
emissão de COV antropogênicos (em termos globais). Os COV, juntamente com os
óxidos de nitrogênio (NOx) e a radiação solar, são responsáveis pela formação do
ozônio troposférico (i.e. aquele que ocorre na camada mais baixa da atmosfera),
importante poluente responsável por problemas respiratórios e nevoeiros fotoquímicos,
também chamados de smogs (do inglês smoke, fumaça, e fog, neblina).
Por esse motivo, na cidade de São Paulo é comum que as estações de
monitoramento do ar localizadas no Parque do Ibirapuera e na Cidade Universitária,
locais densamente vegetados, registrem altos níveis de concentração de ozônio.
A emissão de COV pela vegetação varia de acordo com a espécie e o metabolismo
da planta, a temperatura do ar, a temperatura das folhas, a umidade, a densidade foliar, a
radiação solar, a concentração de CO2 e de poluentes no ar (SCHIRMER e QUADROS,
2010). Apesar de a vegetação ser a principal responsável, em termos globais, pelas
emissões de compostos orgânicos voláteis, para que a transformação em ozônio ocorra
são necessários os óxidos de nitrogênio, emitidos principalmente pelos automóveis.
POLUIÇÃO DA ÁGUA E DO SOLO
De acordo com Morinaga (2007), em áreas urbanas o solo é o meio mais afetado
pela contaminação, superando o nível de contaminantes das águas dos rios e córregos.
Sua poluição apresenta baixa mobilidade de contaminantes (ainda que estes possam
passar para as águas subterrâneas) e está relacionada principalmente às regiões
industrializadas e aos locais de disposição de resíduos.
Por meio da absorção dos contaminantes pelas raízes e/ou concentração em sua
biomassa, a vegetação pode atuar na remoção ou imobilização desses contaminantes. As
plantas são capazes de remover metais pesados, pesticidas e outros contaminantes do
ambiente. Trata-se da fitorremediação, técnica caracterizada pela utilização de
processos naturais das plantas para a remoção de poluentes do solo, de lodos, de
sedimentos e das águas. De baixo custo e fácil implementação, esta técnica é indicada
para grandes áreas com pequeno nível de contaminação e que não apresentem riso
iminente à saúde (MORINAGA, 2007).
Morinaga (2007) alerta que o transporte de contaminantes para a superfície,
absorvidos pelas raízes e conduzidos às partes aéreas das plantas, pode ocasionar a
introdução desses contaminantes na cadeia alimentar da fauna local.
TEMPERATURA E UMIDADE
As temperaturas mais altas verificadas em áreas densamente construídas quando
comparadas a seu entorno rural vegetado configuram o fenômeno conhecido como “ilha
de calor”.
100 De acordo com Schirmer e Quadros (2010) compostos orgânicos compreendem todos os
compostos que, à exceção do metano, possuam carbono e hidrogênio, sendo os COV aqueles
facilmente vaporizados às condições de temperatura e pressão ambientes.
206
Esse fenômeno é predominantemente noturno, sendo as maiores diferenças de
temperatura entre áreas urbanas e não urbanas verificadas em noites de céu claro e
pouco vento. (GIVONI, 1998).
Figura 2– Ilha de calor urbana. Fonte: Bearkeley Lab.
Algumas características das estruturas urbanas, como a relação entre a largura das
ruas e a altura dos edifícios, os tipos de materiais construtivos utilizados e a quantidade
e localização das áreas verdes afetam a intensidade da ilha de calor (GIVONI, 1998;
LOMBARDO, 1985).
De acordo com Lombardo (1985), as maiores temperaturas dos centros urbanos
podem provocar uma alteração na distribuição de chuvas, fazendo com que ocorram de
maneira mais intensa sobre as áreas mais densamente construídas. Essa dinâmica, aliada
ao alto grau de impermeabilização de algumas cidades provoca o aumento das
inundações.
Em seu estudo sobre a região metropolitana de São Paulo, Lombardo (1985)
verificou diferenças de até 10°C entre o centro e as áreas rurais, sendo que as
temperaturas mais altas foram medidas nas áreas mais densamente construídas e com
pouca quantidade de vegetação e as temperaturas mais amenas nas regiões com maior
concentração de espaços livres vegetados e junto aos reservatórios de água.
No ambiente urbano, a vegetação barra a radiação solar, evitando que ela incida
sobre o solo e as construções, diminuindo assim o acúmulo e a irradiação de calor por
essas superfícies. A radiação absorvida pela vegetação é utilizada para a fotossíntese e
para a evapotranspiração; apenas uma porcentagem muito pequena é convertida em
calor sensível (SANTAMOURIS, 2001).
Givoni (1998) ressalta que é durante o processo de evapotranspiração, e não durante
a fotossíntese, que ocorre a maior parte do consumo de energia das plantas. Durante
esse processo as folhas são resfriadas, assim como o ar ao redor delas, ao mesmo tempo
em que ocorre o aumento de umidade do ar. A importância e o desejo de que esse
processo ocorra dependem das condições de temperatura e umidade locais.
De acordo com Magalhães e Crispim (2003), o processo de evapotranspiração é
responsável pelo consumo de 60% a 75% da energia solar incidente na vegetação, sendo
que uma árvore isolada saudável e com bom suprimento de água pode transpirar 400
litros de água/dia.
Spangenberg (2009) alerta para o fato de que a definição das frações de absorção,
transmissão e reflexão dos dosséis vegetais é mais complexa do que a dos materiais de
construção devido à arquitetura da copa das árvores, à distribuição heterogênea de
folhas, à diferença entre as espécies etc.
207
Labaki, et al. (2011) observam que a informação existente sobre o comportamento
da transmissão da radiação solar através de árvores, isoladas ou agrupadas, é bastante
reduzida, principalmente no que se refere às espécies da flora brasileira.
O impacto da vegetação no consumo de energia para aquecimento e resfriamento
dos edifícios pode ser bastante significativo. Em relação ao resfriamento, a sombra
produzida pela vegetação localizada próxima às paredes e janelas reduz o ganho de
calor solar sem obstruir completamente a circulação de ar. Ademais, áreas gramadas ao
redor dos edifícios reduzem a radiação solar refletida pelo solo e pavimentos,
diminuindo também os ganhos de calor da edificação. Em relação à diminuição do
consumo de energia para aquecimento, dependendo do arranjo de plantio e da
localização da vegetação ela é capaz de diminuir a velocidade do vento ao redor das
construções, minimizando assim as taxas de infiltração de ar (GIVONI, 1998).
Spangenberg (2009) ressalta que os benefícios proporcionados pelo sombreamento
durante o verão podem se converter em desvantagens durante o inverno em
determinados locais. Nessas situações, o plantio de espécies caducifólias pode
maximizar os benefícios.
VENTILAÇÃO
De acordo com Llardent (1982), as massas arbóreas conseguem reduções
importantes na velocidade do vento, entre 20% e 50%. Tais reduções ocorrem de
maneira gradual e, ao contrário das barreiras sólidas, não provocam zonas de
turbulências, sendo, portanto, mais eficientes. Segundo Givoni (1998), o impacto da
vegetação no fluxo de ar ocorre com maior intensidade próximo ao solo e depende do
arranjo de plantio e das espécies utilizadas.
O deslocamento do ar regula a sensação térmica, pois estimula a evaporação e as
perdas de calor por convecção (MASCARÓ, 1996). Em climas quentes e úmidos, a
redução da velocidade do vento pode gerar desconforto; porém, em climas frios é um
dos fatores mais benéficos da vegetação (GIVONI, 1998).
Além do efeito de obstrução mencionado acima, a barreira vegetal possui outros três
efeitos básicos: filtragem, deflexão e condução.
Figura 3. Efeitos da barreira vegetal. Fonte: Elaboração própria baseada em
Mascaró, 1996.
Acima de 1,5m/s e, sobretudo acima de 5m/s, a incidência de vento diminui as
diferenças de temperatura e umidade relativa do ar entre as áreas sombreadas e
ensolaradas, sendo mais significativa em relação à umidade do que em relação à
temperatura (MASCARÓ, 1996).
208
DRENAGEM
O problema das inundações em áreas urbanas está diretamente relacionado à
excessiva impermeabilização do solo, à escassez de áreas vegetadas e à canalização
maciça de rios e córregos, medidas que em conjunto contribuem para o aumento da
quantidade e da velocidade do escoamento superficial.
Figura 4 – Impacto da urbanização na vazão e no tempo do escoamento superficial. Fonte:
Netto (2004).
A vegetação impacta a drenagem urbana por meio da retenção da água de chuva em
sua copa, galhos e tronco, da contribuição para infiltração da água no solo, da proteção
do solo ao ravinamento e da diminuição da velocidade do escoamento superficial
(MAGNOLI,1982). A infiltração de água no solo depende diretamente do tipo de solo e
não apenas da presença da vegetação.
[...] a distribuição, estrutura espacial, estrutura de ramificação e
folhagem, densidade de ‘arquitetura’ foliar e da galharia, bem como a
distribuição, em extensão e profundidade, do raizame tem influência
direta na rapidez de formação da superfície do espelho d’água a
escoar. Após o encharcamento a influência se relaciona somente à
proteção do solo ao ravinamento (MAGNOLI, 1982, p.91).
Segundo a Agência Americana de Proteção Ambiental (EPA, 2003), a velocidade de
escoamento num quarteirão urbanizado pode ser cinco vezes maior do que em áreas de
mesmo tamanho com vegetação e solo exposto. A alta velocidade do escoamento
aumenta a erosão e a quantidade de sedimentos carreados para os rios e córregos,
diminuindo a vazão destes e provocando inundações (HOUGH, 1998).
Llardent (1982) alerta para o fato de que a grama fornece porosidade ao solo apenas
até 10cm de profundidade e com o tempo as raízes podem se entrecruzar de tal maneira
que deixam o solo compactado. Assim, uma superfície gramada pode não ser tão
permeável quanto se imagina, evidenciando que a análise do tipo de solo e do tipo de
vegetação a ser implantada é importante para determinar a contribuição da vegetação à
drenagem urbana.
209
Estabilidade do Solo
Figura 5. Deslizamento de terra em área urbana. Fonte: R7 Notícias.
As intervenções urbanas, ao promoverem a impermeabilização parcial da superfície,
modificam o regime hídrico do solo, soerguendo ou rebaixando o lençol freático. Tais
alterações podem provocar a destruição das estruturas do solo e causar abatimentos em
sua superfície (MANFREDINI, FERREIRA e QUEIROZ NETO, 2004).
Em grandes aglomerados urbanos, a estabilidade do solo é de fundamental
importância para a segurança da população e das construções, estando relacionada
também ao assoreamento de rios e córregos, como mencionado no item “drenagem”.
A vegetação contribui para a manutenção da umidade do solo, atenuando o
aquecimento e evitando a irradiação (LLARDENT, 1982). Quanto maior a temperatura
do solo, maior é a sua oxidação e maior é a sua decomposição, gerando, assim, maior
erosão em lençol e lixiviação (PENHALBER et al., 2004). Ademais, a presença de
vegetação pode diminuir o carregamento de materiais particulados durante chuvas
intensas, dependendo da granulometria do solo, bem como amortecer a força do impacto
da chuva, evitando a formação de sulcos ou ravinamento.
Segundo Falcón (2007), a vegetação mais indicada para a fixação do solo são as
gramíneas e os arbustos, pois suas raízes são pouco profundas e bastante densas. Já a
vegetação arbórea é indicada para diminuir o impacto da força da chuva no solo.
RUÍDO
A atenuação do ruído pela vegetação é um benefício bastante citado; porém, mesmo
em áreas densamente arborizadas a redução é pequena, especialmente em médias e
baixas frequências, devendo-se principalmente ao aumento da distância entre a fonte de
ruído e as edificações e à diminuição da intensidade do vento (GIVONI, 1998).
Diversos trabalhos citam diferentes níveis de redução conseguidos com a utilização
de barreira vegetal; porém, tais reduções podem ser consequência do aumento da
distância da fonte, efeitos da topografia, da direção e da intensidade dos ventos etc. Para
Givoni (1998), apesar da pequena capacidade na redução dos níveis de ruído, a
vegetação tem um importante papel psicológico, ao atuar como barreira visual, uma vez
que se o ruído não é visível ele se torna psicologicamente menos perceptível.
SAÚDE E BEM-ESTAR HUMANO
Um dos principais aspectos associados às áreas verdes em meio urbano é seu uso
recreacional e esportivo. A promoção de áreas de convívio social e de áreas
contemplativas está relacionada ao bem-estar e saúde da população, diminuindo o
estresse, a ansiedade e a depressão, e contribuindo no tratamento de pacientes
hospitalizados (GIVONI, 1998; ULRICH, 1984; ULRICH, et al., 1991).
210
Figura 6. Trilha da Pedra Grande. Parque Estadual da Cantareira. Imagem da
autora, mai. 2011.
Ao analisar pacientes em internação hospitalar após cirurgia Ulrich (1984) verificou
que aqueles que estavam em quartos com janelas voltadas para áreas verdes tinham
menor período de internação em relação àqueles cujas janelas estavam voltadas para
edifícios. Além do menor tempo de internação, esses pacientes utilizavam menor dose
de medicamentos e tinham avaliação mais favorável por parte das enfermeiras.
Diversas instituições de saúde estão incorporando “jardins de cura” em suas
instalações. Esses jardins, que devem incentivar o convívio e o apoio social e oferecer a
possibilidade de atividades físicas e contato com a natureza, podem desempenhar papel
complementar aos tratamentos medicamentosos, diminuindo o stress, a ansiedade, a
pressão sanguínea e a insônia, aumentando, assim, a qualidade de vida dos pacientes
(TEXAS A&M UNIVERSITY, 2003).
Os benefícios verificados nos jardins dos hospitais também se estendem às áreas
vegetadas e aos espaços livres da cidade, porém desde que estes recebam manutenção,
utilização e segurança adequados, oferecendo condições propícias para o
desenvolvimento de atividades sociais; do contrário, essas áreas podem aumentar a
sensação de insegurança gerando stress.
Para Lima (1996), o desenho da vegetação na cidade também deve considerar as
diversas formas de apropriação dos espaços urbanos. Dependendo da situação, uma
cobertura arbórea densa pode não ser desejável, como no caso de locais de grande
aglomeração de pessoas ou lugares onde o sombreamento é indesejável.
Ao atenuar a poluição da atmosfera, da água e do solo e contribuir com o conforto
térmico dos espaços abertos, a vegetação também contribui com a saúde humana. Os
benefícios associados à estabilidade dos solos e amortecimento de enchentes pela
vegetação também podem ser considerados como benéficos ao bem-estar dos habitantes
da cidade.
BIODIVERSIDADE101
De acordo com Spirn (1995), a transformação dos ambientes silvestres em centros
urbanos inviabilizou a manutenção de habitats para a fauna local, pois os resquícios de
vegetação nativa são poucos e dispersos. Assim, as espécies que prosperam no
101 101 De acordo com a Lei Federal n° 9.985/2000 biodiversidade, ou diversidade biológica
é: “a variabilidade de organismos vivos de todas as origens, compreendendo, dentre outros, os
ecossistemas terrestres, marinhos e outros ecossistemas aquáticos e os complexos ecológicos de
que fazem parte; compreendendo ainda a diversidade dentro de espécies, entre espécies e de
ecossistemas” (Art. 2° da Lei Federal n° 9.985/2000).
211
empobrecido ambiente urbano são espécies oportunistas, que adaptaram o seu
comportamento à uma paisagem dominada pelos homens.
Porém, o mosaico de ambientes encontrados em São Paulo ainda oferece locais
adequados ao abrigo, à alimentação e à reprodução da fauna, sendo significativo o
número de espécies cadastradas na cidade (SÃO PAULO (CIDADE), SVMA, 2004).
A adaptação da flora e da fauna ao hostil ambiente urbano, bem como a preservação
de áreas vegetadas, são fatores que colaboram para a existência de um número
significativo de espécies vegetais e animais em algumas cidades. De acordo com o
último Inventário da Fauna do Município de São Paulo (SÃO PAULO (CIDADE),
SVMA, 2010), a cidade possui 700 espécies catalogadas, das classes: Malacostraca
(caranguejo e lagostim), Arachnida (aranhas), Insecta (borboletas e grilo), Osteichthyes
(peixes), Amphibia (rãs, sapos e pererecas), Reptilia (cágados, crocodilos, lagartos e
cobras), Aves e Mammalia. Em relação à flora, segundo dados do Herbário Municipal
de São Pauloiii a cidade possui 4.037 espécies vegetais de 231 diferentes famílias.
A urbanização não afeta somente a diversidade biológica pela diminuição das áreas
vegetadas e alteração dos habitat naturais, mas também pela criação de novos habitats
que proporcionam o aparecimento de espécies indesejáveis ao convívio humano, como
insetos e ratos (SÃO PAULO (CIDADE), 2008).
Se a manutenção de áreas vegetadas em meio urbano colabora positivamente para a
manutenção da biodiversidade, a falta de conexões entre essas áreas e as dificuldades de
gestão das áreas que não possuem proteção efetiva tornam-se um impasse a ser vencido
para a proteção de animais e plantas. Nesse sentido, o Instituto Socioambiental
(INSTITUTO SOCIOAMBIENTAL, 2008) recomenda as seguintes ações para a
ampliação da proteção à biodiversidade: ampliação e manutenção das áreas
efetivamente protegidas; fiscalização das áreas preservadas; manejo da biodiversidade e
apoio à pesquisa para diminuição de lacunas de conhecimento.
Penhalber et al. (2004) mencionam a dependência entre a fauna e a flora. Segundo
os autores, a fauna silvestre é de suma importância para a sobrevivência das espécies
vegetais e vice-versa, sendo que a qualidade do verde depende da manutenção da fauna.
Abordar o papel da vegetação na cidade a partir dos benefícios fornecidos aos seres
humanos pode ser considerado uma visão antropocêntrica caso uma perspectiva mais
abrangente na gestão dos recursos não seja analisada. De acordo com Lima (1996), a
nossa relação com a natureza necessita mudanças. Não apenas o bem-estar humano é
importante, mas igualmente a utilização dos recursos em ritmos e escalas nas quais se
propiciem condições temporais e espaciais para uma regeneração da própria natureza
(LIMA, 1996).
CUSTOS, DESVANTAGENS OU INCONVENIENTES ASSOCIADOS À
VEGETAÇÃO URBANA
A presença da vegetação em meio urbano proporciona diversos benefícios
socioambientais aos habitantes da cidade, como mencionado nos itens anteriores.
Contudo, existem custos diretos e indiretos que devem ser considerados no seu
planejamento e implantação.
Como aponta Spirn (1995), a vegetação urbana tem que conviver com enormes
pressões biológicas, físicas e químicas que dificultam sua sobrevivência no ambiente
urbano, fazendo com que as árvores na cidade vivam menos. Estudos desenvolvidos nos
Estados Unidos pela American Forest Association concluíram que a sobrevida média de
uma árvore urbana (plantada em regiões centrais) é de apenas 13 anos, tempo
insuficiente para que atinja um porte capaz de desempenhar de forma plena os
benefícios citados nos itens anteriores. (ROTERMUND, MOTTA e ALMEIDA, 2012).
212
Essa diminuição da sobrevida das árvores em meio urbano deve-se à sua conflituosa
convivência com a massa edificada da cidade e seus habitantes.
As árvores das ruas [...] levam uma vida marginal, suas raízes presas
entre as fundações das edificações e das ruas, enroscadas entre as linhas de
telefones, eletricidade, gás e água, e envoltas por um solo tão compacto e
infértil como o concreto. Seus troncos são entalhados pelos para-choques
dos automóveis, correntes de bicicletas e até pelas grades instaladas para
protegê-las. Seus galhos são podados pelos ônibus. Folhas e cascas são
tostadas no calor refletido pelo calçamento e pelos muros ou condenadas a
uma sombra perpétua pelos edifícios adjacentes. As raízes são encharcadas
ou ressecadas pelo excesso ou pela falta de água; em qualquer caso, sua
capacidade de fornecer nutrientes essenciais à árvore é drasticamente
reduzida. [...] O fato de a árvore de ruas e calçadas sobreviver de alguma
forma é mais surpreendente do que o de ser tão curta sua média de vida
(SPIRN, 1995, p.193 e 194).
Parte dos custos associados à presença de vegetação nas cidades advém justamente
dos conflitos mencionados por Spirn (1995).
CUSTOS DIRETOS
A implantação e a perpetuação da vegetação em áreas urbanas demandam diversas
ações de planejamento e administração a cargo principalmente do poder público
municipal. Ações de plantio e manutenção, incluindo podas, irrigação e varrição,
demandam pessoal habilitado e equipamentos específicos.
A integração com a infraestrutura existente na cidade é um dos problemas mais
recorrentes associados à vegetação urbana. A interferência com as redes aéreas, a
proximidade com as edificações, gerando sombreamento excessivo e insegurança, o
entupimento de bueiros e bocas de lobo pelas folhas das árvores, a interferência com a
iluminação pública e com a sinalização, muitas vezes encoberta por galhos, além de
danos a pisos e pavimentos causados por raízes superficiais são alguns dos problemas
verificados.
A queda de árvores é um dos maiores transtornos que acometem as cidades
brasileiras durante o período de chuvas (que, podem ser mais intensas nas áreas
urbanas). De acordo com reportagem veiculada no jornal O Estado de São Paulo,
segundo dados da AES Eletropaulo, “mais da metade dos casos de apagões na cidade de
São Paulo acontece por culpa de queda de árvores ou galhos que se enroscam na fiação”
(O ESTADO DE SÃO PAULO, 2011).
CUSTOS INDIRETOS
Spangenberg (2009) cita como custos indiretos relacionados à presença de
vegetação nas cidades a possível diminuição da dispersão de poluentes ocasionada pela
diminuição da intensidade dos ventos, a diminuição dos níveis de luz natural provocada
pelo sombreamento da vegetação, o desconforto térmico no inverno, o possível aumento
da umidade nos edifícios e as questões ligadas à segurança, que, como mencionado no
item Saúde e Bem-Estar Humano, podem estar associadas à falta de manutenção e uso
das áreas vegetadas.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Quantitativamente, os benefícios associados à vegetação citados nos itens anteriores
dependem da densidade das folhas, dos tipos de folhas e galhos (e.g. folhas pilosas ou
lisas, grandes ou pequenas etc.), do porte da vegetação e de sua localização. Essas
213
características, com exceção da localização, variam conforme a idade, a espécie e a
época do ano.
Spangenberg (2009) cita a área de cobertura vegetal e a área foliar como
parâmetros-chave para a avaliação dos benefícios da floresta urbana. De acordo com
Nowak (1994), a maioria dos benefícios da vegetação urbana cresce com o aumento da
área foliar.
A área foliar varia conforme a espécie, a arquitetura da copa, o microclima, as
condições de crescimento da árvore e com as estações do ano, sendo considerada um
parâmetro dinâmico. Consequentemente, cada avaliação da área foliar descreve um
momento específico (SPANGENBERG, 2009).
De acordo com Givoni (1998) o efeito da vegetação no clima das áreas urbanas
depende da relação entre área vegetada (pública ou privada) e área construída, sendo
mais intenso na área vegetada e em seu entorno imediato. Dessa forma, é mais
significativo para o clima das áreas urbanas um maior número de áreas com dimensões
reduzidas do que poucas áreas verdes de grandes dimensões.
Os custos diretos associados à presença de vegetação são, aparentemente, mais
fáceis de serem quantificados e, como são mais perceptíveis no cotidiano da população
urbana, acabam, muitas vezes, deturpando a imagem da árvore na cidade, que fica
conhecida apenas pelos transtornos que causa. “Custos e benefícios calculados sem uma
avaliação do sistema como um todo e dos processos que o impelem subestimam
invariavelmente o valor da natureza na cidade” (SPIRN, 1995, p. 255).
Como mencionado por Lima (1996), faz-se necessária uma visão mais abrangente
da questão da vegetação urbana, que contemple aspectos ecológicos, paisagísticos,
culturais e sociais, aliando as necessidades da vegetação para um desenvolvimento
pleno e a diversidade de espaços urbanos e suas diferentes apropriações.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
AGÊNCIA BRASIL. [ ], 2010. 1 Fotografia color. Disponível em:
<ecourbana.wordpress.com>. Acesso em 20/dez./2011.
AQUINO, C. A. B. Identificação de compostos orgânicos voláteis (COVs)
emitidos por florestas na região amazônica. 2006. 106f. Dissertação (Mestrado em
Física e Meio Ambiente) – Universidade Federal do Mato Grosso, Cuiabá, 2006.
BERKELEY LAB. Heat Island Group. Disponível em: <http://heatisland.ldl.gov>.
Acesso em: 05/jan./2012.
EPA - ENVIRONMENTAL PROTECTION AGENCY. Protecting Water Quality
from Urban Runoff, 2003. Disponível em:
<http://cfpub.epa.gov/npstbx/files/NPS_Urban-facts_final.pdf>. Acesso em:
15/set./2011.
FALCÓN, A. Espacios verdes para una ciudad sostenible: planificación,
proyecto, mantenimiento y gestión. Barcelona: Gustavo Gili, 2007.
FERREIRA, L. S. Manejo da vegetação na cidade de São Paulo: supressão e
compensação. O caso do distrito da Vila Andrade. Dissertação (Mestrado) – Faculdade
de Arquitetura e Urbanismo da Universidade de São Paulo (FAUUSP). São Paulo,
2012.
214
GIVONI, B. Climate Considerations in Building and Urban Design. New York:
John Wiley & Sons, 1998.
HOUGH, M. Naturaleza y ciudad. Planificación Urbana y Processos Ecológicos.
Barcelona: Gustavo Gili, 1998.
ISA - INSTITUTO SOCIOAMBIENTAL. Além do Concreto: contribuições para a
proteção da biodiversidade paulistana. São Paulo: [s.n.], 2008.
LABAKI, L. C. et al. Vegetação e conforto térmico em espaços urbanos abertos.
Fórum Patrimônio - Ambiente Construído e Patrimônio Sustentável, v. 4, n. 1, 2011.
Disponível em: <http://www.forumpatrimonio.com.br/index.php>. Acesso em:
05/jan./2011.
LIMA, C. P. C. D. S. A natureza na cidade. A natureza da cidade. Tese
(Doutorado) - Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da Universidade de São Paulo
(FAUUSP). São Paulo. 1996.
LLARDENT, L. R.-A. Zonas Verdes y Espacios Libres en la Ciudad. Madrid:
Instituto de Estudios de Administración Local, 1982.
LOMBARDO, M. A. Ilha de Calor nas Metrópoles: O exemplo de São Paulo. São
Paulo: Hucitec, 1985.
MAGALHÃES, L. M. S.; CRISPIM, A. A. Vale a pena plantar e manter árvores
e florestas na cidade? Ciência Hoje n°193, p. 64 a 68, maio 2003.
MAGNOLI, M. M. Espaços livres e urbanização: uma introdução a aspectos da
paisagem metropolitana. Tese (Livre Docencia) - Faculdade de Arquitetura e
Urbanismo da Universidade de São Paulo (FAUUSP). São Paulo. 1982.
MANFREDINI, S.; FERREIRA, R. P. D.; QUEIROZ NETO, J. P. D. Reflexões
sobre o solo urbano. In: CARLOS, A. F. A.; OLIVEIRA, A. U. D. Geografias de São
Paulo. A Metrópole do século XXI. São Paulo: Contexto, 2004.
MASCARÓ, J. L.; MASCARÓ, L. Vegetação Urbana. Porto Alegre: Masquatro,
2010.
MASCARÓ, L. Ambiência Urbana. 3. ed. Porto Alegre: Masquatro Editora, 1996.
MORINAGA, C. M. Recuperação de Áreas Contaminadas. Um novo desafio
para projetos paisagísticos. Dissertação (Mestrado) - Faculdade de Arquitetura e
Urbanismo da Universidade de São Paulo (FAUUSP). São Paulo. 2007.
NETTO, O. M. D. C. Técnicas de Minimização da Drenagem de Águas Pluviais.
Gerenciamento do Saneamento em Comunidades Organizadas. São Paulo: [s.n.]. 2004.
Disponível em: <www.etg.ufmg.br/tim2/auladrenagem.ppt>. Acesso em 15/jul/2007.
NOWAK, D. J. Understanding the Structure. Journal of Forestry, n. 92, p. 42 -
46, 1994.
215
O ESTADO DE SÃO PAULO. Metade das falhas é provocada por queda de
árvores. São Paulo, 14 abr. 2011. Cidade, Metrópole, P.C3.
PENHALBER, E. D. F. et al. Aspectos Urbanísticos de Espaços Públicos e Áreas
Verdes. In: ROMERO, M. D. A.; JÚNIOR, A. P.; BRUNA, G. C. Panorama Ambiental
da Metrópole de São Paulo. São Paulo: Sigrus, 2004. Cap. 14, p. 305-349.
R7 NOTÍCIAS. Portal de notícias da Central Record de Comunicações.
Disponível em:<www.r7.com>. Acesso em: 20/dez./2011.
ROTERMUND, R. M.; MOTTA, V. P.; ALMEIDA, V. D. S. Estudo sobre a
perda de mudas arbóreas plantadas no sistema viário da cidade de São Paulo. Revista da Sociedade Brasileira de Arborização Urbana, Piracicaba, 2012. No prelo.
SÃO PAULO (CIDADE) SECRETARIA DO VERDE E DO MEIO AMBIENTE.
Inventário da Fauna do Município de São Paulo. In: ______ Diário Oficial da
Cidade de São Paulo (Suplemento). São Paulo: Imprensa Oficial, 21 mai. 2010.
______ Ações Locais para a Biodiversidade da Cidade de São Paulo. São Paulo.
2008.
______ Atlas Ambiental do Município de São Paulo - O Verde, o Território, o Ser
Humano: Diagnóstico e Bases para a Definição de Políticas para as Áreas Verdes no
Município de São Paulo. Coordenação de Patrícia Marra Sepe e Harmi Takiya. São
Paulo: SVMA, 2004.
SÃO PAULO (CIDADE) SECRETARIA MUNICIPAL DO VERDE E DO MEIO
AMBIENTE; INSTITUTO DE PESQUISAS TECNOLÓGICAS. GEO Cidade de São
Paulo: panorama do meio ambiente urbano. Brasília: PNUMA, 2004.
SCHIRMER, W. N.; QUADROS, M. E. Compostos orgânicos voláteis biogênicos
emitidos a partir de vegetação e seu papel noozônio troposférico urbano. REVSBAU v.5 n.1, Piracicaba, p. 25-42, Mar 2010. Disponível em:<
http://www.revsbau.esalq.usp.br/artigos_cientificos/artigo102-publicacao.pdf >. Acesso
em 7/ago./2011.
SPANGENBERG, J. Nature in Megacities. Tese (Doutorado) - Bauhaus
Universität. Weimar. 2009.
SPIRN, A. W. O jardim de granito: a natureza no desenho da cidade. São Paulo:
Editora da Universidade de São Paulo, 1995.
TEXAS A&M UNIVERSITY. Gardens Have The Potential To Improve Health,
Research Shows. ScienceDaily, 24 novembro 2003. Disponível em:
<http://www.sciencedaily.com/releases/2003/11/031124071045.htm >. Acesso em
11/set./2011.
ULRICH, R. S. View through a window may influence recovery from surgery.
Science, v. 224, p. 420-421, 1984.
ULRICH, R. S. et al. Stress recovery during exposure to natural and urban
environments. Journal of Environmental Psychology, v. 11, p. 201-230, 1991.
216
A Questão da Sustentabilidade Urbana na Baixada Santista
Profª Drª Elizabeth Borelli *
Resumo
Este artigo é parte de uma pesquisa acadêmica que se propõe a investigar aspectos sociais,
econômicos e ambientais importantes para a compreensão da nova realidade da Região
Metropolitana da Baixada Santista, tendo por objetivo propor uma reflexão inicial em termos
da problemática da sustentabilidade urbana. Essa preocupação se justifica pela nova
configuração do mercado regional que se vislumbra, com a descoberta de petróleo e gás, na
Bacia de Santos, e com a escolha do local para abrigar a sede administrativa da Unidade de
Negócios de exploração e produção da Petrobrás, no Estado de São Paulo, o que deverá
alterar sensivelmente a matriz econômica da região, tradicionalmente voltada ao turismo e às
atividades portuárias, com relevantes repercussões sobre a questão urbana.
Palavras-chave: sustentabilidade urbana; região metropolitana;
transformações urbanas.
Abstract
This article is part of an academic research that aims to investigate important for
understanding the new reality of the metropolitan area of Santos, aiming to propose an initial
reflection in terms of the problem of urban sustainability social, economic and environmental
aspects. This concern is justified by the new configuration of the regional market in sight,
with the discovery of oil and gas in the Santos Basin, and the choice of where to house the
administrative headquarters of the Business Unit Petrobras exploration and production in
State of Sao Paulo, which should substantially change the economic matrix of the region
traditionally geared towards tourism and port activities, with significant impact on the urban
question.
Keywords: urban sustainability; metropolitan area; urban transformations.
* Professora do Programa de Estudos Pós-Graduados em Economia Política da PUC-SP
217
Introdução
A proposta deste artigo, enquanto produto parcelar de uma pesquisa complexa e
diversificada, que pretende ter por escopo as relações de transformações urbanas e
econômicas da região administrativa da Baixada Santista, é promover uma reflexão inicial
em torno da questão da sustentabilidade urbana.
Hoje, a polarização da cidade de Santos em relação aos demais municípios é
indiscutível e a economia regional reforça o seu papel central nessa área metropolitana.
Nos últimos anos, o crescimento urbano da região ganhou novo impulso. A
divulgação da descoberta do petróleo na Bacia de Tupis, pela Petrobrás, em 2007, na
chamada camada Pré - Sal1- área localizada entre os Estados de Santa Catarina e Espírito
Santo - atraiu novos investimentos imobiliários e de negócios para a região.
E assim, em janeiro de 2006, a Petrobrás inaugurou a sua sede em Santos, para
gerenciar a área de produção de petróleo na Bacia do Pré-Sal. Foi anunciado um
investimento de cerca de U$ 73 bilhões até 2015 na cidade, com a implantação do Plansal
- Plano Diretor de Desenvolvimento Integrado do Polo Pré-sal da Bacia de Santos - que
prevê a construção da sede da empresa em bairro do centro histórico da cidade, próximo ao
Porto, que vem sendo cenário de grandes transformações urbanas.
Esses novos investimentos, particularmente no setor imobiliário no município de
Santos, estão transformando a paisagem e alterando o modo de vida da cidade. Observa-se,
no município de Santos, um notório crescimento de novos empreendimentos imobiliários,
com características bem diferentes das que existiam até então, como áreas de lazer internas
nos edifícios, apartamentos compactos e funcionais, empreendimentos com funções
comerciais e residenciais, aumento do número de vagas por unidade habitacional e, com
maior destaque, grande crescimento do número de pavimentos nos edifícios, fortalecendo o
processo de verticalização.
A partir destes fatos, a proposta que norteia esta reflexão é indagar até que ponto a
região está preparada, do ponto de vista da sustentabilidade, para enfrentar as
transformações urbanas inerentes à mudança na sua forma de inserção no grande capital.
Para tanto, o referencial teórico será pautado no conceito de sustentabilidade urbana,
procurando identificar as diversas visões sobre o tema. Em seguida, serão apresentadas
informações institucionais sobre as questões de região administrativa e política pública de
saneamento. Serão então levantados aspectos demográficos, econômicos e de
infraestrutura, na tentativa de se delinear um perfil das condições socioeconômicas da
região da Baixada Santista, à luz do processo de transformações urbanas.
Para a pesquisa que embasou este artigo, foi adotada a metodologia de análise
exploratória, para uma identificação de fatos e vertentes, em torno da literatura referente a
sustentabilidade e urbanização, e consultada a documentação oficial existente.
Sustentabilidade urbana e dinâmica socioeconômica
O conceito de sustentabilidade urbana, ao longo da década de 1990, consolidou a
convergência da questão ambiental e da questão urbana, ou seja, da oposição entre o natural
e o não-natural. Essa nova conceitualização surge com a mudança do enfoque do
ambientalismo, que passou de uma vertente preservacionista e conservacionista, em sua
origem, para a temática da sustentabilidade, nos anos 1980.
Assim, as questões vinculadas a desenvolvimento urbano, controle da poluição
atmosférica e hídrica nas cidades, e ainda, à utilização sustentável de recursos naturais - e
conservação de espaços verdes no interior dos espaços urbanos - ganharam relevo na agenda
das principais organizações multilaterais, voltadas para o desenvolvimento e para a questão
218
urbana na década de 1990, bem como nos critérios para aprovação de projetos e concessão de
financiamentos (BRAGA, 2006).
No âmbito das Conferências Internacionais, a questão ambiental no espaço urbano foi
incluída como um dos cinco grandes temas do Hábitat II102, e discutida na Rio 92103 , tendo
seus pontos principais sistematizados na Agenda 21 , que elegeu o tema cidades sustentáveis
como um dos seis pilares de construção da sustentabilidade ambiental, social e econômica dos
países. (NOVAES, 2000).
Acselrad (1999) define a sustentabilidade urbana como a capacidade das políticas
urbanas em se adaptarem à oferta de serviços, à qualidade e à quantidade das demandas
sociais, buscando o equilíbrio entre as demandas de serviços urbanos em investimentos em
estrutura. Considera, também, imprescindível para a sustentabilidade urbana, o uso racional
dos recursos naturais, além das respostas às necessidades urbanas com o mínimo de
transferência de dejetos e rejeitos para outros ecossistemas atuais e futuros.
Ele investiga os diversos discursos sobre a sustentabilidade urbana e identifica três
matrizes. A primeira, a que chamou de representação tecnomaterial da cidade, combina
modelos de racionalidade energética com modelos de equilíbrio metabólico e reduz a
sustentabilidade urbana a seu aspecto estritamente material. A segunda, conceituada como
representação da cidade como espaço da qualidade de vida, combina modelos de pureza, de
cidadania e de patrimônio e remete a sustentabilidade a um processo de construção de
direitos, que possam equacionar as externalidades negativas, responsáveis pela
insustentabilidade urbana. A terceira matriz centra-se na reconstituição da legitimidade das
políticas urbanas, combinando modelos de eficiência e equidade, e remete a sustentabilidade à
construção de pactos políticos capazes de reproduzir suas próprias condições de legitimidade.
( ACSELRAD,1999).
Em consonância com essa terceira matriz, o Urban World Forum (2002) define
sustentabilidade urbana a partir de um conjunto de prioridades, tais como: superar a pobreza,
promover a equidade, melhorar a segurança ambiental e prevenir a degradação. (BRAGA,
2006).
Por outro lado, para ser considerada sustentável, não é suficiente que uma cidade
confira aos seus habitantes, condições ambientais equilibradas, mas é necessário que isso
ocorra sem gerar externalidades negativas para outras regiões e para as gerações futuras.
(MCGRANAHAN e SATTERTHWAITE, 2002; MILLER e SMALL, 2003).
Nessa perspectiva, considera-se a escala regional - constituída pela cidade e suas
relações com o entorno - e a escala global - constituída pelos seus impactos sobre os
problemas ambientais globais, bem como por questões relativas aos impactos agregados da
rede mundial de grandes cidades.
Contudo, observa-se grande dificuldade de sistematização de informações para a
gestão ambiental urbana. A partir disso, desde o final da década de 1980, vêm surgindo
diversas iniciativas de construção de índices e indicadores, quase sempre aplicados à escala
nacional, com o objetivo de fornecer subsídios à formulação de políticas e acompanhar a
implementação de acordos internacionais.
No seu conteúdo, procuram descrever e mensurar a interação entre a atividade
antrópica e o meio ambiente, conferindo à ideia de sustentabilidade, uma maior
operacionalidade e funcionalidade.
No Brasil, destaca-se o trabalho: Indicadores de Desenvolvimento Sustentável- Brasil
2004, do IBGE - Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística - que calcula indicadores de
102 Conferência internacional da ONU sobre as cidades. 103 Conferência internacional da ONU sobre meio ambiente e desenvolvimento.
219
sustentabilidade nas dimensões ambiental, social, econômica e institucional para os Estados
brasileiros (IBGE, 2004).
Para a construção de medidas de sustentabilidade urbana são incluídos índices
tradicionais, como o Produto Interno Bruto (PIB) e o Índice de Desenvolvimento Humano
(IDHM); considere-se, ainda, a inexistência de consenso em relação aos conceitos de
sustentabilidade e de qualidade ambiental, o que dificulta o processo de escolha de variáveis
para a composição dos indicadores urbanos de sustentabilidade (ENVIRONMENTAL
SUSTAINABILITY INDICATORS, 2002).
Para Rogers e Gumuchdjian (2001), o processo de expansão das cidades não tem
considerado a fragilidade do ecossistema, evidenciando seu caráter predominantemente
quantitativo – associado à ideia de “modernização” - em detrimento do aspecto qualidade,
registrando-se, no mundo, um aumento global de riqueza, paralelamente ao aumento do grau
de pobreza e da população pobre. Consideram, ainda, que a problemática urbana assume
diferentes contornos, conforme o nível de industrialização de cada país. Nos países em
desenvolvimento, os problemas ambientais e sociais são agravados pelo aumento do tamanho
das cidades sem o acompanhamento de infraestruturas capazes de suportar tal crescimento.
Em todo o mundo, a pobreza ainda é um dos principais problemas enfrentados pelas
sociedades, e, geralmente, a camada mais pobre da população é amplamente negligenciada.
Diante disso, torna-se necessário um desenvolvimento urbano sustentável, diferente do
modelo atual, que é baseado no lucro e privilegia uma pequena parte da sociedade.
Diversos autores vêm discutindo acerca de uma base teórica da interdependência entre
as trajetórias do desenvolvimento urbano regional e as políticas territoriais em suas diversas
dimensões. A teoria da regulação (BOYER, 1990; BENKO, 1996) e a teoria do urbanismo
industrial (SCOTT, 1998; STORPER, 1997) enfatizaram a transição dos regimes fordistas
para os pós-fordistas de acumulação e regulação, bem como suas implicações territoriais,
enquanto Harvey (1989) analisou a mudança dos regimes urbanos gerenciais para um estilo
empresarial de governança. Swyngedouw (1997) enfocou as dimensões escalares desse debate
e elaborou o conceito de glocalização, visando destacar a natureza política interdependente
das escalas territoriais de poder.
Brenner (2004) fundamentou a reestruturação produtiva e territorial em uma análise
mais geral sobre a transformação dos “regimes de políticas públicas territoriais”, a partir da
década de 1970. Seu principal argumento é que, a partir desse período, o regime keynesiano
de organização e intervenção do Estado na produção do espaço, composto por projetos e
estratégias, evoluiu para um regime competitivo e reescalonado de organização e intervenção
territorial do Estado. Nessa ótica, projetos significam a organização administrativa interna das
políticas públicas territoriais, enquanto as estratégias seriam as intervenções efetivas do
Estado na produção do espaço, especialmente através de programas de investimento e
modelos de regulação.
Ainda que a pobreza medida por indicadores nacionais diminua com a urbanização, de
um modo geral, o número absoluto de moradores de favelas aumenta mais do que o
crescimento da população urbana (Un-Habitat, 2010). A concentração de pobres em
gigantescas favelas – que contam com domicílios congestionados e insalubres, sem água
potável, sem esgotos, sem coleta de lixo – com baixa taxa de emprego, com elevados índices
de violência, representa um aspecto qualitativo que caracteriza a pobreza urbana.
Em relação às cidades brasileiras, Maricato (2011), pontua que sua imagem está
drasticamente associada à violência, à poluição, ao tráfego caótico, às enchentes, à
desigualdade social, entre outros pontos de caracterização urbana e destaca a importância do
Sistema Financeiro habitacional nesse processo.
“O Sistema Financeiro da Habitação (SFH) e seu gestor, o Banco
Nacional da Habitação (BNH), foram, na verdade, os organismos
220
que mais impactaram o crescimento e o padrão de urbanização
brasileira, disseminando o apartamento de classe média,
fortalecendo os negócios de incorporação imobiliária e a
indústria da construção. Com a habitação social localizada fora
do tecido urbano, de um modo geral, o BNH e seu sistema
financeiro não só contribuíram para segregar as camadas sociais
de menor renda, como impediram o mercado de terras urbanas,
potencializado pelos recursos do financiamento residencial
oriundos da poupança privada (Sistema Brasileiro de Poupança e
Empréstimo - SBPE) e da poupança compulsória (Fundo de
Garantia por Tempo de Serviço - FGTS), de operar de forma
sustentável.” (MARICATO, 2011,11).
Em sua colocação, as transformações capitalistas, orientadas pelo pensamento
neoliberal (no Brasil, em 1980, 1990 e 2000), tiveram forte impacto sobre as cidades. A falta
de regulamentação do mercado imobiliário, o desemprego, a competitividade, a guerra fiscal,
o abandono de políticas sociais, como o transporte coletivo, as privatizações de serviços
públicos, o planejamento estratégico, o marketing urbano, entre outros, se uniram a uma
tradição histórica de falta de controle sobre o uso do solo e de segregação territorial e urbana.
A violência nas metrópoles se evidencia pelo aumento da taxa de homicídios, nesse
período, de forma inédita. Tragédias provocadas por enchentes e desmoronamentos tornam-
se, progressivamente, mais frequentes. (SALDIVA et al., 2010). A ocupação irregular de
beira de córregos, encostas desmatadas, mangues, dunas e áreas de proteção de mananciais
mostram a precariedade das condições de vida de uma grande parcela da população.
No âmbito das políticas socioeconômicas brasileiras, foram implementados, mais
recentemente, programas dirigidos à população mais miserável, com o objetivo de retirá-la do
nível de subsistência precário em que se encontravam, através de programas de transferência
de renda (Bolsa Família) e de um conjunto de políticas sociais destinadas a aumentar as
oportunidades de empreendedorismo e desenvolvimento econômico (ALMEIDA, 2005).
Por outro lado, cabe destacar a retomada do papel dos bancos e fundos públicos na
provisão de crédito e na alavancagem dos investimentos públicos e privados, através de
programas como o PAC - Programa de Aceleração do Crescimento , Minha Casa, Minha Vida
e o fomento a outros setores econômicos específicos. (SANT’ANNA, BORÇA Jr &
ARAUJO, 2009).
Do ponto de vista institucional, foram verificados avanços no campo do Direito à
Moradia e Direito à Cidade, a partir da incorporação à Constituição, em 1988, de um capítulo
de política urbana, estruturado em torno da noção de função social da cidade e da propriedade,
do reconhecimento dos direitos de posse de milhões de moradores das favelas e periferias das
cidades do país e da incorporação direta dos cidadãos aos processos decisórios sobre esta
política. O boom da construção civil reflete os sinais do crescimento econômico, ganhando
visibilidade em diversas cidades e metrópoles brasileiras. (ROLNIK, 2010).
As dinâmicas econômicas recentes vêm oferecendo um desafio às cidades, no sentido
de converter este crescimento em melhoria nas condições de urbanização, não apenas em
termos de expansão da infraestrutura das cidades para absorver um crescimento futuro, mas,
sobretudo, de mudança do modelo financeiro e de gestão sobre a qual se constituiu o processo
de urbanização, marcado por disparidades socioespaciais e grande degradação ambiental.
Apesar dos ganhos da política econômica e do Estatuto das Cidades, as marcas deste modelo
continuam presentes em várias dimensões do processo de urbanização. (ROLNIK 2010).
O padrão de investimentos em obras metropolitanas mostra a falta de integração entre
as ações de cada município que compõe as metrópoles. Macrodrenagem, coleta e distribuição
221
de água tratada, coleta e tratamento de esgoto, habitação, uso e ocupação do solo, transporte
de cargas e passageiros, são temas que exigem um tratamento integrado na metrópole.
Regiões Metropolitanas e Política de Saneamento
Há uma opinião generalizada, expressa em vários estudos acadêmicos e técnicos,
acerca da precariedade do quadro legal de Regiões Metropolitanas (RM) no Brasil,
advindos da diversidade de critérios - convencionados em cada Estado, após a Constituição
Federal de 1988. As trinta e cinco Regiões Metropolitanas, definidas legalmente em 2010,
às quais se somam três Regiões Integradas de Desenvolvimento Econômico (Rides) que
abrangem mais de um Estado, constituem um conjunto heterogêneo, dentro do qual
figuram aglomerações urbanas com importância demográfica, econômica, social e política
bastante diferenciada.
Na Baixada Santista, o processo de urbanização gerou a fusão de núcleos urbanos,
transformando-a em região metropolitana, com a cidade de Santos incorporando núcleos
vizinhos e estabelecendo com eles, relações correspondentes a um único núcleo urbano de
grandes proporções.(REIS FILHO, 1987).
Do ponto de vista urbanístico, a região é densamente urbanizada na faixa mais
próxima do mar, possuindo áreas de preservação de Mata Atlântica nos trechos mais
próximos à serra e em suas escarpas. Como unidade espacial, em função de suas
características políticas, socioeconômicas e urbanísticas, veio a se constituir na segunda
Região Metropolitana do Estado de São Paulo.
Nesse processo de conurbação, tanto os bairros nobres como os populares
ultrapassam os limites político-administrativos de seu município e ocupam áreas dos
municípios vizinhos, polarizados pelo centro urbano mais importante.
No processo de urbanização da Baixada Santista, as atividades urbanas –
industriais, portuárias, comerciais e residenciais- têm gerado efeitos negativos no sistema
natural, descaracterizando ou mesmo eliminando ecossistemas terrestres e estuarinos e
comprometendo os processos naturais. A condição de elevada poluição das águas, devido
aos efluentes e resíduos urbanos, tem provocado mudanças na diversidade biológica,
agravando a condição natural de estresse típica dos estuários. (AFONSO, 2006).
Genericamente, a causa mais frequente de degradação das águas costeiras próximas
às praias é a poluição por esgotos domésticos. A expansão urbana vem provocando
condições inadequadas de balneabilidade das praias, uma vez que não há sistemas
adequados de coleta e tratamento dos esgotos. Observa-se a ocorrência de lançamentos de
esgotos clandestinos nas galerias de águas pluviais, canais e córregos, com a afluência de
grande quantidade de dejetos no mar. A Baixada Santista apresenta similaridades com esse
cenário, com exceção do município de Santos, que conta com, praticamente, a totalidade
dos domicílios ligada à rede coletora de esgotos. Nos demais municípios da região, menos
da metade da população conta com esse serviço público, com córregos, canais e galerias de
águas pluviais recebendo esgotos clandestinos. (CETESB, 2012).
Por outro lado, a temática do saneamento básico surgiu em decorrência do grande
processo de urbanização e desenvolvimento das cidades, quando suas estruturas
habitacionais, terrenos, prestações de serviços à comunidade e emprego passaram a
configurar problemas socioambientais. Com a edição da Lei nº 11.445/07, saneamento
básico foi conceituado como o conjunto de serviços, infraestruturas e instalações de
abastecimento de água, esgotamento sanitário, limpeza urbana e manejo de resíduos
sólidos e drenagem de águas pluviais urbanas.
O modelo de gestão de saneamento revela a predominância da gestão por
Companhias Estaduais; dos municípios que integram regiões metropolitanas, em
222
aproximadamente 77% destes, a responsabilidade é de um prestador regional – as
companhias estaduais de saneamento (CESBs). Em 20% dos municípios, o serviço é
prestado por uma empresa local de direito público, e o restante é dividido entre empresas
de abrangência local de direito privado e empresas estritamente privadas.
Segundo o Sistema Nacional de Informações sobre Saneamento, as regiões
metropolitanas são responsáveis por um mercado de aproximadamente R$ 20,76 bilhões,
restando aos demais municípios brasileiros uma receita operacional total de R$ 11,08
bilhões. O mercado metropolitano corresponde a aproximadamente 65% do total
brasileiro, sendo deste total 65% concentrados nos municípios núcleos das metrópoles.
(SNIS, 2010). Estes dados atestam a predominância de uma gestão metropolitana do
saneamento.
O Plano Nacional de Saneamento Básico (Plansab), aprovado pelo Conselho
Nacional das Cidades (Concidades) em Junho de 2013, prevê um investimento de R$ 508,5
bilhões em obras de abastecimento de água potável, coleta e tratamento de esgoto e lixo e
em ações de drenagem, entre 2014 e 2030. O Plano orienta o planejamento para os
próximos 20 anos, e projeta que serão investidos entre R$ 10 bilhões e R$ 12 bilhões por
ano, até 2030. O documento é dividido em uma série de metas de curto, médio e longo
prazos – para 2018, 2023 e 2030 - e inclui as respectivas estratégias, ações e recursos
considerados necessários. As metas foram definidas a partir da evolução histórica e da
situação atual dos indicadores de cobertura destes serviços, com base na análise situacional
do déficit em todo o país. ( MINISTÉRIO DAS CIDADES, 2013).
A proposta expressa que esse documento sirva como um guia para os gestores,
com diretrizes e estratégias, metas, resultados esperados e programas de investimentos. A
implementação requer a atuação integrada do governo federal, estados e municípios, além
de todos os agentes públicos e privados, sob a coordenação do Ministério das Cidades.
Com isso, se anuncia uma nova forma de gestão para a questão do saneamento, rompendo
com o mecanismo de centralização que, até agora, vem caracterizando esta política. Para o
abastecimento de água potável, o Plansab prevê a universalização nas áreas urbanas no
decorrer dos próximos dez anos; para as ações de coleta e tratamento de esgoto, a meta é
atender 93% das áreas urbanas, no período de vinte anos.
O documento coloca, ainda, como objetivo, extinguir os esgotos sem tratamento -
de forma a não ser mais permitido o escoamento de esgotos no meio ambiente, visando
diminuir a contaminação de rios e córregos. O Plano Nacional de Saneamento Básico
determina, também, a extinção dos lixões, a partir de 2014, já que, além de contaminar e
degradar muitas áreas ambientais, também colaboram para a proliferação de doenças,
implicando na necessidade de se pesquisar novos processos de condução dos resíduos para
aterros sanitários. (MINISTÉRIO DAS CIDADES, 2013).
As políticas públicas voltadas para a melhoria das condições de saneamento básico
das comunidades são eficazes para diminuir a mortalidade infantil pós-neonatal, período
este em que os óbitos ocorrem, principalmente, devido a doenças relacionadas às condições
ambientais. Esse fato confirma que o aumento da cobertura populacional por sistemas de
esgotamento sanitário, pode contribuir para reduzir a mortalidade infantil no Brasil
(HOLCMAN, LATORRE e SANTOS, 2004).
Neste contexto, evidenciam-se os efeitos positivos do saneamento no crescimento
econômico e na redução da pobreza. Segundo um estudo da Organização Mundial da
Saúde, cada dólar investido na melhoria do saneamento para o alcance dos Objetivos de
Desenvolvimento do Milênio gera, em média, um benefício econômico de US$ 12
(PRÜSS-ÜSTÜN et al., 2008).
As deficiências de saneamento redundam em prejuízos à saúde, reduzem a
produtividade do trabalho e impactam a atividade econômica. A investigação dos reflexos
223
econômicos da ausência de saneamento básico revela, no entanto, uma consequência
relacionada à qualidade da ocupação urbana. Portanto, o saneamento qualifica o solo
urbano, pois possibilita construções de maior valor agregado e a valorização de
construções existentes, o que implica no aumento do capital imobiliário das cidades.
Contudo, as famílias de mais baixa renda são as que mais sofrem com problemas de
saneamento, em especial com a falta de coleta de esgoto. Dessa forma, avanços na
qualificação do espaço urbano em razão de investimento em infraestrutura de saneamento
implicam em valorização no capital residencial, inclusive, para as famílias de baixa renda.
Caracterização Regional da Baixada Santista
A Região Metropolitana da Baixada Santista – RMBS – localizada na porção
central do litoral do Estado de São Paulo, foi criada em 1996 por um decreto estadual,
abrangendo áreas insulares e continentais, sendo composta por nove Municípios: Bertioga,
Cubatão, Guarujá, Itanhaém, Mongaguá, Peruíbe, Praia Grande, Santos e São Vicente,
conforme mostrado no Mapa 1.
Mapa 1: Região Metropolitana da Baixada Santista (RMBS)
Fonte: EMPLASA (2007)
As tendências demográficas da Baixada Santista podem ser analisadas sob a ótica
da teoria da polarização, de Perroux (1950), como referência, que segmenta a organização
regional a partir da cidade-polo, sendo, portanto, perfeitamente aplicável às regiões
metropolitanas. A cidade-polo possui como característica principal as forças de atração
para novos investimentos, em função de seu histórico e de atividades econômicas
consolidadas; em contrapartida, apresenta os espaços de repulsão – ou seja, aqueles que
224
incluem atividades incompatíveis com suas características originais e desenvolvidas ao
longo dos anos.
Adaptando esta teoria ao caso da RMBS, Santos será considerada a cidade-polo.
Para este município, importa considerar a abordagem a partir de sua área insular, uma vez
que o índice populacional da área continental é pouco significativo. A área insular de
Santos conta com apenas 39 km2, onde vivem mais de 95% da população municipal .
(VAZQUEZ e VAZ ,2012).
A expansão imobiliária ocorrida entre os anos de 1960 e 1970, em função de
importantes fatores, tais como, a acessibilidade pelas rodovias Anchieta e Imigrantes, o
crescimento das atividades turísticas e a influência do polo industrial de Cubatão,
transformaram a paisagem e conduziram um processo de urbanização desordenado.
Mesmo com a criação da RMBS, em 1996, os municípios continuam pouco integrados,
especialmente na questão do trânsito. (VAZQUEZ e VAZ ,2012).
A região apresenta um recorte regional com características especiais, condicionadas
por obstáculos geográficos significativos, apresentando áreas de urbanização continental e
insular e uma malha urbana bastante densa.
A região é fortemente influenciada pela dinâmica econômica e social do Porto de
Santos, que se constitui, desde a origem da urbanização regional, no fator principal do
desenvolvimento dos processos de urbanização.
A presença de um polo energético, petroquímico, siderúrgico e industrial de grande
porte no município de Cubatão também foi fator importante no desenvolvimento regional,
contribuindo para atrair grande contingente populacional.
Em termos de especulação e de valorização imobiliária, verifica-se uma situação
diferenciada de processos que podem ser colocados como especiais, por serem ocasionados
pela existência de um mercado imobiliário turístico altamente desenvolvido e sua intensa
utilização, pelo fenômeno da segunda residência. Além do aspecto imobiliário e dos
processos econômicos, verifica-se, no caso das regiões metropolitanas em geral, e
especialmente no da Baixada Santista, que a conurbação das áreas urbanas dos vários
municípios que a compõem é grande e bastante significativa. A existência da conurbação
não chega a ser considerada um fato extraordinário, pois é uma exigência constitucional e
legal da Constituição do Estado, para a implementação do recorte institucional denominado
Região Metropolitana.(JACOB,2012).
No caso da RMBS, aliados ao alto grau de conurbação das cidades, existem ainda
uma gama de fatores limitadores de ordem física, geológica, geográfica e ambiental, que
facilitaram a implantação do processo de mobilidade populacional e da alteração do uso e
ocupação do solo.
A região apresenta cerca de 65 km contínuos de extensão litorânea, com cerca de
122 praias.
Em relação à acessibilidade à região, no modo ferroviário, dá-se por meio da
utilização de duas malhas ferroviária distintas – a antiga malha da Rede Ferroviária Federal
S.A., atualmente concessionada à empresa MRS Logística S.A., e pelo antigo acesso das
Ferrovias Paulista S.A. – Fepasa, atualmente concessionado à empresa Ferrovia dos
Bandeirantes S.A. – Ferroban.
Os acessos rodoviários são feitos entre sua parte mais central e a Região
Metropolitana de São Paulo – RMSP, através da Rodovia Anchieta (SP 150), Rodovia dos
Imigrantes (SP 160) - por onde ocorre o maior volume de tráfego, pela Rodovia Dom
Paulo Rolim Loureiro (Mogi—Bertioga/SP 098), ligando a região à RMSP e ao vale do
Rio Paraíba do Sul, pela Rodovia Prestes Maia (Rio—Santos/SP 055), fazendo a ligação
entre a RMBS e o litoral norte e a Padre Manoel da Nóbrega (SP 055), ligando a região
com o litoral sul e o vale do rio Ribeira do Iguape.
225
O município de Santos caracteriza-se como polo regional, porém, em função de sua
limitação geográfica e pelo fato de ser um município basicamente insular, pois sua área
continental é pouco ocupada e utilizada, o município exerce influência em toda a região,
pois concentra, além da maior parte das instituições estaduais e federais, a maior
população, comércio e serviços.
A influência da cidade é exercida, inclusive, em relação aos municípios próximos,
mas situados fora dos limites da região metropolitana, como no caso dos litorais sul e
norte, o que o caracteriza como um polo supra-regional.
A área de influência é mais forte e sentida nos municípios mais próximos, na região
conformada pela aglomeração dos municípios de São Vicente, Guarujá, Cubatão e Praia
Grande, onde o primeiro tem sua sede localizada na ilha de São Vicente; o segundo, na ilha
de Santo Amaro, e os demais estão localizadas em áreas continentais.
Numa área de mais de 2mil km2, vivem cerca de 1,8 milhão de habitantes, segundo
dados do Censo Demográfico do IBGE de 2010 - número esse que atinge, praticamente, o
dobro, no período de temporada de férias. Os turistas concentram-se em certos municípios,
com grande destaque para Praia Grande e Guarujá e em menor quantidade nos municípios
de Peruíbe, Bertioga, Itanhaém e Mongaguá.
Os municípios de Santos e São Vicente, apesar de apresentarem incrementos
populacionais muito pequenos, entre os Censos Demográficos de 2000 e 2010, são os
municípios que apresentam os maiores dados de populações residentes, como pode ser
observado na Tabela 1.
Tabela 1: População, taxas de crescimento populacional, saldos e taxas
anuais de migração – 1991/2010
Fonte: IBGE. Censo demográfico / SEADE (2010).
As maiores taxas de incremento populacional estão nos municípios de menor
população residente, como Bertioga e Mongaguá, enquanto nos municípios com população
226
superior, a taxa de incremento é pequena, como Santos, São Vicente e Cubatão. Esses três
municípios apresentam inclusive, como pode ser observado na Tabela 1, uma taxa de
incremento populacional inferior à média da região metropolitana.
Ainda no caso do município de Santos, sua taxa de incremento populacional é
inferior à média do Estado de São Paulo, chegando, na década de 1990, a apresentar, em
determinados anos, uma taxa negativa de crescimento populacional.
A densidade demográfica destes municípios é outro dado que merece atenção: os
municípios de Guarujá, Santos, São Vicente e Praia Grande apresentam uma elevada
densidade demográfica, com respectivamente 1851 hab/km2, 1488 hab/km2, 2089 hab/km2
e 1345 hab/km2.( JAKOB ,2012).
Essas elevadas densidades demográficas indicam um aspecto peculiar da
urbanização dessas áreas: a elevada concentração urbana e a falta de espaços livres na área
urbana desses municípios
A partir destes dados, constata-se que, desde 1980, Santos já estava com sua
população consolidada em virtude “da estagnação da população, da elevada densidade e
da preservação da área continental como reserva natural”. (VAZQUEZ, 2012, p. 271).
Entre os anos 2000 e 2010, há uma crescente migração intrametropolitana, como
uma “força centrífuga”, que parte de Santos em direção à periferia metropolitana, em
virtude de dois fatores: o preço do solo e o custo de vida mais baixo. Os municípios de
Bertioga e Praia Grande aumentaramm significativamente suas proporções de residentes
neste período..
Essa região abriga o maior porto em volume de comercialização da América Latina
e, conforme apresentado na Tabela 1, verifica-se que sua população é superior a 1,6 milhão
de habitantes. Com o décimo maior IDH (Índice de Desenvolvimento Humano) das regiões
metropolitanas do Brasil, a região se destaca pelos índices elevados de escolaridade,
alfabetização, expectativa de vida e PIB (Produto Interno Bruto) per capita, sendo
identificada, no Brasil, como uma região de alta qualidade de vida, o que historicamente
tem atraído uma migração com perfis etários e socioeconômicos muito diferentes.(
IBGE,2010).
Urbanização e Transformação Ambiental da Baixada Santista
Até meados do século XIX, a economia da região baseava-se na agricultura
e na pesca de subsistência, além da atividade portuária, ainda incipiente e não
organizada. A partir do início do século XX, a base agrícola e extrativa regional foi sendo
paulatinamente substituída pela bananicultura e pela atividade portuária organizada, que
passa a ter importância cada vez maior na região e no Estado. Essa atividade sofre grande
impulso no final do século XIX, com a implantação da ferrovia ligando a região - mais
especificamente o porto ao interior do Estado - fator este que veio a acelerar o processo de
urbanização e desenvolvimento econômico.
Inicialmente, as atividades que desencadearam mais fortemente o processo
de desenvolvimento econômico regional foram a bananicultura e, posteriormente, o
comércio e a exportação de café, através do porto. Essas atividades foram responsáveis
pelo crescimento da população urbana de Santos e pelo espalhamento e fixação da
população no entorno, especialmente nas áreas onde havia produção de banana visando à
exportação, situadas na parte mais ao sul da região. A cultura da banana foi responsável,
inclusive, pela extensão da malha ferroviária em direção ao sul da região e do Estado,
através do ramal Juquiá, da Estrada de Ferro Sorocabana.(BARROCAS,2013).
Por outro lado, a atividade portuária foi sendo ampliada conforme ocorriam o
crescimento das cidades do interior e o avanço da agricultura, especialmente a cultura do
227
café, no planalto paulistano, em direção ao interior. O aumento da produção, o comércio e
a exportação do café propiciaram, também, condições para a implantação e extensão das
estradas de ferro, para escoamento dos produtos agrícolas e importação e comércio de
produtos manufaturados do exterior.
A proximidade do Porto de Santos com São Paulo – aproximadamente 68 km, entre
o principal centro industrial e consumidor de produtos – assim como as propriedades do
porto, foram condicionantes significativas do desenvolvimento da própria cidade de São
Paulo, bem como de todo o Estado.
A partir da 2ª metade do século XX, com a instalação da Refinaria de Petróleo
Presidente Bernardes, no município de Cubatão, no sopé da serra do Mar, inicia-se a
implantação do ainda hoje importante polo petroquímico e siderúrgico de Cubatão, que
também foi o responsável pela atração e fixação de outro fluxo de migrantes e
imigrantes.(GONÇALVES,2006).
No contexto histórico atual, conjuntamente com o Porto de Santos, a economia da
região também se encontra fortemente alicerçada no polo industrial de Cubatão, que conta
com grandes instalações industriais de base, nos setores petroquímico e siderúrgico,
polarizados pela existência da Refinaria de Petróleo Presidente Bernardes e pela
Companhia Siderúrgica Paulista – Cosipa, onde se produz o maior percentual de aço
utilizado nas indústrias automobilísticas instaladas no Brasil.
A localização desse polo em Cubatão deveu-se, basicamente, aos fatores:
disponibilidade energética, localização estratégica e acessibilidade. A disponibilidade
energética foi viabilizada pelo aproveitamento dos desníveis topográficos, existentes entre
o planalto no alto da serra do Mar e a região litorânea, que se configuram num plano de
baixada, com grande disponibilidade energética.
Desde o início do século XX, são aproveitados os potenciais e condições favoráveis
à geração de energia elétrica para abastecimento residencial, portuário e industrial da
região, como também da Grande São Paulo, com a instalação do complexo hidroelétrico
Billings e Henry Borden. A disponibilidade hídrica formada pelos rios que nascem no
planalto e descem a vertente da serra, bem como a água resultante do processo de geração
de energia que é lançada no canal de fuga da usina, também proporcionaram uma farta
oferta de água para uso nos processos industriais. (AFONSO,2006).
Outro fator de desenvolvimento do polo foi a disponibilidade de transporte,
representada pela proximidade do Porto de Santos, que permitia a exportação de produtos e
a importação de matéria-prima e equipamentos, bem como o transporte ferroviário que
permitia o acesso à capital e, a partir daí, para o interior do país.
Por outro lado, lamentavelmente, ainda hoje, permanece a triste memória dos
graves problemas de descontrole da poluição ocorridos na década de 1970 e 1980, com
episódios críticos de poluição aérea, que geraram casos de anencefalia, chuva ácida, perda
de vegetação e escorregamentos na serra; contudo, após volumosos investimentos nos
processos e métodos de produção e controle ambiental, a situação foi revertida.
O polo industrial de Cubatão ainda se caracteriza por ser um dos mais importantes
do país, mantendo sua atratividade no tripé formado pela disponibilidade de energia – hoje,
não mais produzida pela usina Henry Borden, que funciona a plena carga somente em
momentos de pico – mas pelo sistema interligado de energia elétrica, o gás natural da bacia
de Merluza e do petróleo refinado na Refinaria Presidente Bernardes; o transporte
rodoviário e ferroviário, bem como pela localização estratégica, que permite a proximidade
com o mercado globalizado, representado pelo Porto de Santos, e o acesso fácil ao
mercado representado pela cidade e pelo Estado de São Paulo, bem como com os demais
mercados do país e do Mercosul. O polo industrial de Cubatão continua a ter sua base na
indústria petroquímica e siderúrgica. (GONÇALVES,2006).
228
O Porto de Santos – após o grande período de expansão e crescimento físico e de
movimentação de cargas, experimentado na primeira metade do século XX, nas décadas de
1980 e 1990, coincidindo com as crises econômicas conjunturais do país, com o processo
de estatização do porto e com o final da concessão à Companhia Docas de Santos – passou
por um período de reestruturação e concessão das áreas portuárias para empresas privadas,
que, de certa forma, tem resultado em sucessivos recordes de movimentação de carga,
embora com grande redução de empregos.
Com as concessões de operação para a iniciativa privada, houve um melhor
desempenho das cargas movimentadas, com uma significativa redução da massa de
trabalhadores na atividade, que passou de, aproximadamente, 16.000, no final da década de
1980, para cerca de 12.600, no final da década de 1990.(GONÇALVES,2006).
A pujança econômica propiciada pelas atividades portuárias e industriais, aliadas à
construção de infraestruturas de energia, abastecimento e acessibilidade à região, ocorridas
a partir da segunda metade do século XX - culminando com a construção da segunda pista
da Rodovia dos Imigrantes - atraiu uma grande massa de trabalhadores da construção civil
que, sem qualificação, findas as obras, se instalaram na região, acomodando-se na indústria
da construção civil, principalmente aquela voltada ao turismo de veraneio.
Recentemente, a região da Baixada Santista, com destaque para a sua maior cidade
– Santos – tem apresentado um crescimento urbano vultuoso que está associado aos
investimentos da indústria do petróleo no Brasil. A descoberta de novos campos de
exploração do recurso natural está atualmente alterando a paisagem e o espaço da área
metropolitana, com importantes transformações se refletindo na dinâmica demográfica
regional.
Considerações Finais
A indústria de transformação da RMBS encontra-se bastante concentrada na
produção do polo petroquímico, químico e siderúrgico de Cubatão e, em menor escala, na
fabricação de equipamentos de transporte – segmentos que deverão ter expressivo
desenvolvimento com o apoio às atividades de exploração de petróleo e gás.
O porto de Santos, o turismo de veraneio e a indústria do polo de Cubatão
caracterizaram, até recentemente, a estrutura econômica, a cultura, a urbanização e a
paisagem da região. Recentemente, a indústria extrativa vem ganhando espaço, em função
da exploração de petróleo e gás, contando com investimentos maciços por parte da
Petrobrás e empresas parceiras, em águas profundas da bacia de Santos. Vislumbra-se,
portanto, um novo ciclo econômico, trazendo, em seu bojo, diversos impactos sobre a
região.
A própria indústria de base de Cubatão, dentro da perspectiva de subsidiar a
exploração do petróleo e gás, vem se estruturando para agregar maior valor aos produtos
que fabrica. Nessas condições, a Baixada Santista enfrentará o desafio de interiorizar as
novas atividades de apoio requeridas pela Petrobrás e empresas parceiras, sem, contudo,
descaracterizar o meio ambiente e comprometer as demais atividades econômicas,
particularmente, o turismo.
Os ecossistemas costeiros estão constantemente expostos ao risco da degradação
ambiental, sob pressão do fluxo de transporte de cargas do Porto de Santos e de seu
entorno, da disposição de resíduos e esgotos do Porto e das cidades da região, dos
derramamentos de óleo e outras substâncias tóxicas. Some-se a isso, o aumento
populacional nos períodos de pico turístico sazonal, em alguns de seus municípios, além da
grande massa de trabalhadores da construção civil que se instalou nas encostas e nos
229
manguezais, ou ainda, em áreas periféricas, dada a inviabilidade de construção de
habitação popular na zona costeira.
A verticalização e a valorização imobiliária crescentes, aliadas às condições
naturais de uma área insular e com falta de espaço físico para a expansão horizontal da área
urbana, tem provocado uma intensificação do adensamento urbano no núcleo central da
região metropolitana. Com isso, observa-se uma elevação da renda da terra urbana,
transformando-a, cada vez mais, em um valor de troca pouco acessível à população de
baixa renda.
Na Baixada Santista, como em todas as áreas urbanas do litoral brasileiro, o preço
do solo é alto e as áreas centrais são ocupadas pelas camadas de maior poder aquisitivo; na
periferia, se concentram os imóveis de baixo valor imobiliário, próximo às áreas de
subemprego ou mais afastados, como os aterros ferroviários e rodoviários, encostas
serranas e manguezais, ou ainda, áreas sem interesse imediato para os empreendedores
imobiliários - essas terras vêm sendo ocupadas por bairros populares ou por assentamentos
espontâneos, não planejados. (AFONSO, 2006).
Do ponto de vista demográfico, dois movimentos contraditórios podem ser
observados: se, por um lado, há hoje uma migração de uma parcela da população de alto
poder aquisitivo e social para a região, atraída pela oportunidade de desfrutar de uma boa
qualidade de vida, associada às novas opções de moradia, lazer e trabalho na região, há
uma outra parcela da sociedade - a de menor poder aquisitivo - que vem sendo
gradualmente excluída desse espaço metropolitano central. A opção deste segmento da
população é migrar para os demais municípios da região metropolitana, como os
municípios de São Vicente, Praia Grande e Guarujá, que, forçosamente, também irão
passar por um processo de transformação urbana para acolher esses migrantes, que buscam
uma renda da terra menor e um custo de vida mais baixo.
Ou seja, as complexas transformações urbanas e demográficas da região irão
ocorrer no escopo da lógica social excludente e de fragmentação regional.
Confinada entre o litoral e a Serra do Mar, a região é dotada de complexa relação
ambiental, populacional e econômica, reunindo vocações econômicas aparentemente
contraditórias, como os complexos portuário e industrial de grande porte e a atividade
turística, em meio a reservas e áreas de proteção ambiental.
Retomando nossa questão inicial, acerca das condições de sustentabilidade urbana
de uma região, cabe ressaltar que, conforme fartamente explorado pela literatura, a
sustentabilidade urbana é definida a partir de um conjunto de prioridades, tais como:
superar a pobreza, promover a equidade, melhorar a segurança ambiental e prevenir a
degradação, sem gerar externalidades negativas para outras regiões e para as gerações
futuras.
A partir disso, prospecta-se para a RMBS um longo trabalho de gestão pela frente,
embasado em políticas públicas consistentes, de forma a vencer os aspectos sociais,
econômicos e ambientais deficitários, do ponto de vista da sustentabilidade.
230
Referências Bibliográficas
ACSERALD, H. (1999). Discursos da sustentabilidade urbana. Revista Brasileira
de Estudos Urbanos e Regionais, 1. Rio de Janeiro, ANPUR,1999.
ALMEIDA, M. H. T. A política social no governo Lula. Novos Estudos
CEBRAP,vol.1, São Paulo, 2005.
BARROCAS, R. A dinâmica demográfica recente na Região Metropolitana da Baixada
Santista (SP): apontamentos para a discussão da geografia da população em áreas
metropolitanas. Encontro de Geógrafos de America Latina. Lima, 2013.
BENKO, G. Economia, espaço e globalização na aurora do século XXI. São Paulo,
Hucitec, 1996.
BOYER, R. A teoria da regulação: uma análise crítica. São Paul, Nobel, 1990.
BRAGA,T. M. Sustentabilidade e condições de vida em áreas urbanas: medidas
e determinantes em duas regiões metropolitanas brasileiras. Revista Eure Vol.
XXXII, Santiago, 2006.
BRENNER, N. New state spaces: urban governance and the rescaling of statehood.New
York, Oxford University Press, 2004.
CETESB. disponível em : http://www.cetesb.sp.gov.br/agua/aguas-superficiais/
35-publicacoes-/-relatorios, acesso em 10/03/14.
Environmental Sustainability Index (2002). disponível em :
http://www.ciesin.columbia.edu/indicators/ESI/ acesso em 16/03/14.
GOLÇALVES, A. Desenvolvimento econômico da Baixada Santista. Santos,
Leopoldianum, 2006.
HOLCMAN, N.M.; LATORRE, M.R.D.O.; SANTOS, J.L.F. Evolução da mortalidade
infantil na região metropolitana de São Paulo, 1980-2000. Revista Saúde Pública, v. 38, n. 2,
São Paulo, 2004.
IBGE -Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística. Indicadores de desenvolvimento
sustentável: Brasil 2004. Brasília: Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística, 2004.
JAKOB, Alberto Augusto Eichman. Vetores de expansão urbana e fluxos migratórios na
Baixada Santista. In: In VAZQUEZ, Daniel A. (Org.). A questão urbana na Baixada Santista:
políticas, vulnerabilidades e desafios para o desenvolvimento. Santos, Editora Leopoldianum,
2012.
MARICATO, E. Indústria da construção e política habitacional. São Paulo, 1984. Tese
(Doutorado) - Faculdade de Arquitetura e Urbanismo, Universidade de São Paulo.
MARICATO, E. Metrópoles desgovernadas. Estudos avançados. vol.25 no.71, São
Paulo Jan./Apr. 2011.Instituto de Estudos Avançados da Universidade de São Paulo, 2011.
231
MCGRANAHAN, G. e D. SATTERTHWAITE . Theenvironmental dimensions
of sustainable development for cities”. Geography, 87, 3, 2002.
MILLER, R.B. e C. SMALL. Cities from space:potential applications of remote sensing
in urban environmental research and policy.Environmental Science& Policy, 6,
2003.
NOVAES, W. Agenda 21 brasileira:bases para discussão. Brasília: MMA/PNUD, 2000.
OBSERVATÓRIO DAS METRÓPOLES. Como Andam as Metrópoles. Disponível em
http://www.observatoriodasmetropoles.net. Acesso em 21/03/14.
Portal planalto. Disponível em: http://www2.planalto.gov.br/excluir-historico-nao-sera-
migrado/plano-nacional-de-saneamento-basico-e-aprovado-com-previsao-de-investimento-de-
r-508-5-bi-ate-2030. Acesso em : 20/03/14.
PRÜSS-ÜSTÜN, A. et al. Safer water, better health: costs, benefits and sustainability of
interventions to protect and promote health. Geneva, World Health Organization, 2008.
REIS FILHO, N.G. Urbanismo no Brasil: séculos XIX-XX. In : ALOMAR, G. Estúdios
de historia urbanaIberoamericana, Madrid, IEAL, 1987.
ROGERS, R. GUMUCHDJIAN, P. Cidades para um pequeno planeta. Barcelona,
Gustavo Gili, 2001.
SALDIVA, P. et al. (Org.) Meio ambiente e saúde, o desafio das metrópoles. São Paulo:
Ex-libris, 2010.
SANT’ANNA, A. A., BORÇA Jr., G. R. & ARAÚJO, P. Q. Mercado de crédito no
Brasil: Evolução recente e o papel do BNDES (2004 – 2008)”. Revista do BNDES: Rio de
Janeiro: BNDES, no 31, jun., 2009.
SCOTT, A. Regions and the world economy: the coming shape of global production,
competition, and political order. New York: Oxford University Press, 1998.Sistema
Nacional de Informação Sobre Saneamento. Disponível em: http://www.snis.gov.br.
Acesso em 20/03/14.
STORPER, M. The regional world: territorial development in a global economy. New
York, Guilford Press, 1997.
SWYNGEDOUW, E. Neither global nor local: “glocalization” and the politicas of
scale. In: COX, K. R. (Ed.). Spaces of globalization. New York, Guilford Press, 1997.
UN-HABITAT. The state of the world cities. London, Earthscan. 2010.
ZÜNDT, C. Expansão metropolitana, mobilidade espacial e segregação nos anos 90,
.Núcleo de Estudos Populacionais – Nepo, Unicamp. Disponível em:
http://www.nepo.unicamp.br/textos/.../vulnerab_cap_11_pgs_305_336.pdf .acesso em
22/03/14.
232
VAZQUEZ, D. A. Tendências demográficas e socioeconômicas nos municípios da
Baixada Santista. In VAZQUEZ, Daniel A. (Org.). A questão urbana na Baixada Santista:
políticas, vulnerabilidades e desafios para o desenvolvimento. Santos, Editora Leopoldianum,
2012.