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Explicações e Aplicações 29 Rev Dental Press Periodontia Implantol. 2010 jul-set;4(3):29-37 Anquilose e Reabsorção Dentária por Substituição não atrapalham a osseointegração dos implantes Alberto Consolaro, Alexandre Vieira Fernandes, Renata Bianco Consolaro Existemduassituações,formasoumecanis- mos para uma reabsorção se instalar em um dente humano 1 : 1ª SITUAÇÃO: REABSORÇÃO DENTÁRIA INFLAMATÓRIA Ocorre quando alguma causa de natureza física, química e/ou biológica atua sobre a su- perfície radicular e destrói, focal ou difusamen- te, a camada de cementoblastos que recobre a raiz por entre as fibras colágenas que se inse- rem diretamente no cemento. Essa mesma causa induz um processo in- flamatório no ligamento periodontal sem que ocorra a morte dos fibroblastos, osteoblastos e clastos, e sem o desaparecimento dos vasos, nervos e outros componentes teciduais, como os restos epiteliais de Malassez. Em outras palavras, teremos uma inflamação local do ligamento periodontal com morte quase ex- clusivamente dos cementoblastos da região. Esse processo patológico passa a ser identifi- cado como Reabsorção Dentária Inflamatória. Uma vez identificada a causa e removi- da ou controlada, a inflamação desaparece e os mediadores químicos trazidos por ela não se acumulam mais na área. O estímulo inflamatório para manter a reabsorção den- tária desaparece e dá lugar à reparação da camada cementoblástica, reinserção de fi- bras colágenas concomitantemente com a neoformação de cemento. Oprognósticodareabsorçãodentáriainfla- matória é bom, desde que identificada a causa e o processo diagnosticado o mais cedo pos- sível, pois perdas substanciais de estruturas podem fragilizar irreversivelmente o dente. Em muitos casos, a reabsorção dentária in- flamatória está associada à contaminação mi- crobiana da estrutura dentária e tecidos circun- jacentes, como ocorre nas lesões periapicais crônicas e dentes traumatizados infectados secundariamente via periodontal ou pelo ca- nal radicular. Nesses casos, o controle da con- taminação pode ser difícil e o processo pode levar à perda do dente. Nessa região, após a exodontia,talvezpermaneçamremanescentes microbianos que podem, eventualmente, con- tribuir para lesões peri-implantares inflamató- rias, inclusive a Lesão Periapical Implantar.

Anquilose e Reabsorção Dentária por Substituição não ...primerodontocenter.com.br/wp-content/uploads/2013/04/anquilose-e... · média do dente em relação ao osso de aproxi-

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Explicações e Aplicações

29Rev Dental Press Periodontia Implantol. 2010 jul-set;4(3):29-37

Anquilose e Reabsorção Dentária por Substituição não atrapalham a

osseointegração dos implantes

Alberto Consolaro, Alexandre Vieira Fernandes, Renata Bianco Consolaro

Existem duas situações, formas ou mecanis-

mos para uma reabsorção se instalar em um

dente humano1:

1ª SITUAÇÃO: REABSORÇÃO DENTÁRIA

INFLAMATÓRIA

Ocorre quando alguma causa de natureza

física, química e/ou biológica atua sobre a su-

perfície radicular e destrói, focal ou difusamen-

te, a camada de cementoblastos que recobre a

raiz por entre as fibras colágenas que se inse-

rem diretamente no cemento.

Essa mesma causa induz um processo in-

flamatório no ligamento periodontal sem que

ocorra a morte dos fibroblastos, osteoblastos

e clastos, e sem o desaparecimento dos vasos,

nervos e outros componentes teciduais, como

os restos epiteliais de Malassez. Em outras

palavras, teremos uma inflamação local do

ligamento periodontal com morte quase ex-

clusivamente dos cementoblastos da região.

Esse processo patológico passa a ser identifi-

cado como Reabsorção Dentária Inflamatória.

Uma vez identificada a causa e removi-

da ou controlada, a inflamação desaparece

e os mediadores químicos trazidos por ela

não se acumulam mais na área. O estímulo

inflamatório para manter a reabsorção den-

tária desaparece e dá lugar à reparação da

camada cementoblástica, reinserção de fi-

bras colágenas concomitantemente com a

neoformação de cemento.

O prognóstico da reabsorção dentária infla-

matória é bom, desde que identificada a causa

e o processo diagnosticado o mais cedo pos-

sível, pois perdas substanciais de estruturas

podem fragilizar irreversivelmente o dente.

Em muitos casos, a reabsorção dentária in-

flamatória está associada à contaminação mi-

crobiana da estrutura dentária e tecidos circun-

jacentes, como ocorre nas lesões periapicais

crônicas e dentes traumatizados infectados

secundariamente via periodontal ou pelo ca-

nal radicular. Nesses casos, o controle da con-

taminação pode ser difícil e o processo pode

levar à perda do dente. Nessa região, após a

exodontia, talvez permaneçam remanescentes

microbianos que podem, eventualmente, con-

tribuir para lesões peri-implantares inflamató-

rias, inclusive a Lesão Periapical Implantar.

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2ª SITUAÇÃO: ANQUILOSE ALVEOLODENTÁ-

RIA E REABSORÇÃO POR SUBSTITUIÇÃO

Essa segunda situação ocorre após o trau-

matismo dentário ou pela atrofia acentuada do

ligamento periodontal, que promovem o desa-

parecimento dos restos epiteliais de Malassez.

Os restos epiteliais, em forma de cordões ou

ilhotas com 4 a 8 células de espessura e 20 cé-

lulas de comprimento, formam uma verdadeira

rede — tal como em um cesto de basquetebol

— em torno do dente. Esses cordões epiteliais

se imiscuem-se entre as fibras colágenas, vasos

e nervos do ligamento periodontal.

Esse componente epitelial periodontal libera

constantemente o EGF, ou Fator de Crescimen-

to Epitelial, um mediador que, ao difundir-se pelo

ligamento periodontal, estimula a reabsorção

óssea alveolar e, assim, mantém-se a distância

média do dente em relação ao osso de aproxi-

madamente 0,25mm ou 250 micrômetros.

No traumatismo dentário, os restos epite-

liais de Malassez desaparecem nas áreas em

que o dente contata as paredes alveolares.

Isso pode ocorrer nas subluxações, luxações,

intrusões, reimplantes, transplantes, desloca-

mentos dentários e, especialmente, nas con-

cussões dentárias. As concussões são muito

especiais pois os pacientes permanecem

com seus dentes normalmente, sem mobili-

dade após os pequenos traumatismos e com

sensibilidade entre 1 e 3 dias, controlada fa-

cilmente por analgésicos comuns, que nem

sempre são necessários. Após alguns meses

ou anos, esses dentes afetados podem escu-

recer por obliteração do canal em decorrência

da metamorfose cálcica ou da necrose pulpar.

Nas radiografias periapicais depois de

transcorridos 3 a 6 meses, assim como po-

deremos identificar a metamorfose cálcica da

polpa ou a necrose pulpar asséptica com pro-

vável lesão periapical crônica, o dente afetado

também pode apresentar a Anquilose Alveolo-

dentária e a consequente Reabsorção Dentá-

ria por Substituição (Fig. 1, 2, 3, 4).

O desaparecimento focal dos restos epi-

teliais de Malassez também pode ocorrer no

ligamento periodontal atrofiado de dentes não

irrompidos após o seu tempo normal de erup-

ção. Sem função dentária, a espessura do li-

gamento periodontal pode perigosamente se

estreitar muito e células ósseas produtivas

podem se alojar na superfície cementária por

entre os, agora quiescentes e diminutos, restos

epiteliais de Malassez.

Após transcorrido o traumatismo dentário,

se a região não for contaminada secundaria-

mente por microrganismos, a inflamação logo

evoluirá para a fase reparatória e as células ós-

seas vizinhas, juntamente com os fibroblastos

e cementoblastos, participarão da reconstrução

periodontal. Mas, sem a presença dos restos

epiteliais de Malassez, haverá neoformação

óssea no espaço periodontal correspondente e

união com o dente, caracterizando a Anquilose

Alveolodentária (Fig. 1, 4).

A Anquilose Alveolodentária implica em in-

tegrar o dente no processo de remodelação

óssea constante (Fig. 1, 2, 4). O osso e, ago-

ra, o dente irão constantemente ser reabsor-

vidos e neoformados. No entanto, os tecidos

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O

D

P

P

MO

O

D

D

Figura 1 - Reabsorção dentária por substituição e vitalidade pulpar em incisivo central superior. Os limites pulpares são

preservados, como indicam as setas pretas. Em cortes transversais, como o representado pela seta dupla branca, pode-

se notar a preservação completa das estruturas pulpares (P) e a união direta da dentina (D) com o tecido ósseo (O). Na

remodelação óssea, a dentina vai sendo reabsorvida e substituída por tecido ósseo trabecular e seus espaços medulares

(M). Em C, nota-se a dentina e o osso em continuidade estrutural, assim como as estruturas pulpares (P) preservadas

(H.E.; B = 40X e C = 100X).

dentários mineralizados, como o cemento e a

dentina, não serão neoformados e redeposi-

tados, mas sim substituídos por tecido ósseo

(Fig. 2). Assim decorre a terminologia de Re-

absorção Dentária por Substituição.

FRAGMENTOS RADICULARES NO INTERIOR

DO TECIDO ÓSSEO: UM EXEMPLO DE

OCORRÊNCIA DESEJÁVEL DA REABSORÇÃO

POR SUBSTITUIÇÃO

Quando ocorrem fraturas apicais em dentes

vitalizados nas quais fragmentos apicais perma-

necem isolados no interior do osso maxilar, se a

vitalidade pulpar continuar ou a necrose pulpar

for asséptica, pode:

a) Ocorrer a anquilose na linha de fratu-

ra radicular e iniciar-se um processo lento de

reabsorção por substituição durante meses

e anos, até o completo desaparecimento do

fragmento radicular.

b) Lesar-se o ligamento periodontal na

exodontia e a anquilose envolver quase toda

a superfície do fragmento radicular e a reab-

sorção por substituição promover a eliminação

dos tecidos dentários remanescentes no con-

texto da remodelação óssea em um período

mais curto de tempo.

c) Ocorrer o reparo na linha de fratura e

no ligamento periodontal, com reposição de

cemento e camada de cementoblastos, inclu-

sive com manutenção e formação de restos

epiteliais de Malassez. Nessa situação, o frag-

mento radicular permanecerá indefinidamen-

te no local.

d) Contaminar o fragmento radicular, com as

bactérias se alojando nos túbulos dentinários e

no canal radicular remanescente, promovendo-

se lesão inflamatória aguda ou crônica. Quando

aguda, pode ocorrer drenagem de exsudato e o

fragmento ser eliminado via fístula. Nos casos

A B C

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de lesão crônica, o granuloma periapical e/ou

cisto periodontal apical poderão eventualmente

ser diagnosticados em exames imaginológicos

eventuais, pois são assintomáticos.

ANQUILOSE ALVEOLODENTÁRIA E REABSOR-

ÇÃO DENTÁRIA POR SUBSTITUIÇÃO:

O OSSO NEOFORMADO E OS REMANESCEN-

TES DENTÁRIOS ATRAPALHAM A OSSEOINTE-

GRAÇÃO DOS IMPLANTES NO LOCAL?

Quando um dente anquilosado e com Re-

absorção Dentária por Substituição se apre-

senta sem contaminação bacteriana — com

vitalidade pulpar ou com tratamento endo-

dôntico adequado — o tecido ósseo se inter-

põe com a dentina e cemento, formando um

verdadeiro labirinto (Fig. 1, 2). Biologicamen-

te, os tecidos radiculares e o tecido ósseo

têm a mesma origem filogenética e se mistu-

ram indistintamente. Para as células reabsor-

tivas e sintetizadoras de osso, não importa se

o tecido a ser reabsorvido e substituído for

dentina, cemento ou osso.

Da mesma forma que o osso ao ser rea-

bsorvido — ou desmontado bioquimicamente

pelas células — libera moléculas de colágeno,

citocinas e fatores de crescimento, como a BMP

por exemplo, a dentina também tem a mesma

propriedade. A liberação dessas moléculas dos

tecidos mineralizados durante o processo da

reabsorção clástica ocorre para estimular a neo-

formação óssea nas áreas vizinhas, ou na mes-

ma área, logo após terminada a fase reabsortiva

do processo localmente (Fig. 1, 2).

Na superfície dos implantes, a neoforma-

Figura 2 - Em estágio avançado da reabsorção dentária

por substituição, por questões físicas como microfraturas

decorrentes da carga mastigatória, promove-se a desor-

ganização focal da camada odontoblástica e da pré-den-

tina (setas) e o osso (O) se deposita em contiguidade

com os tecidos pulpares, imiscuindo-se remanescentes

pulpares (P) e dentina remanescente (D) no meio do te-

cido ósseo que substituiu gradativamente a raiz dentária.

Nesse estágio, a osseointegração de implantes não será

prejudicada em função desses remanescentes radiculares

que, por ventura, possam ficar na área sem que sejam

vistos imaginologicamente, pois a ausência de inflamação

sinaliza a não contaminação microbiana (M = espaços

medulares) (H.E.=40X).

DD

D

P

O

OM

M

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Consolaro A, Fernandes AV, Consolaro RB

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ção óssea obedece os princípios biológicos da

osseointegração, independentemente de existi-

rem áreas em que se têm fragmentos de denti-

na e cemento imiscuídos por entre as estruturas

ósseas da região.

O importante é a região não estar contami-

nada, assim como os remanescentes dentinários

e cementários que, por ventura, possam existir

na área de colocação dos implantes osseointe-

gráveis. Durante o processo de osseointegração,

os fragmentos de dentina e cemento serão re-

modelados, integrados e substituídos por osso

neoformado (Fig. 2).

Quando fragmentos ósseos, dentinários e

cementários estão contaminados por bacté-

rias e seus produtos, o processo inflamatório,

via exsudato, tende a absceder e carregá-los

via fístula para a superfície, eliminando-os.

Isso independe de os fragmentos serem de

dentina, cemento ou osso, e até corpos es-

tranhos contaminados.

Em síntese: um dente anquilosado e em

reabsorção por substituição em áreas não

contaminadas não impede o planejamento

e nem piora o prognóstico de implantes os-

seointegráveis no local.

Quanto contaminado, o dente anquilosado

e em reabsorção por substituição, em decor-

rência de necrose pulpar, fraturas e problemas

periodontais, os cuidados para a aplicação de

implantes osseointegráveis são os mesmos

para o local onde estava um dente com necro-

se pulpar contaminada ou doença periodontal

avançada. Entre esses cuidados estão: elimi-

nação de fragmentos de tecidos mineralizados

contaminados, curetagem cirúrgica, cobertura

antibiótica e controle pós-operatório para de-

tectar a volta à normalidade dos tecidos rema-

nescentes. Depois desses procedimentos, será

pertinente uma avaliação, e o planejamento

geralmente vai incluir enxertos ósseos, gen-

givais e outros procedimentos para recompor

uma anatomia local que favoreça a aplicação

de implantes osseointegráveis na área.

Figura 3 - Paciente de 17 anos com incisivo central reimplantado (box) após 48 horas do acidente. A superfície radicular

foi tratada por 20 minutos com gel de fluoreto de sódio 2,4% e pH 5,5. Houve contenção rígida e tratamento antibiótico. Em

B, após 8 anos, nota-se o dente reimplantado com discreto desnível gengival e incisal.

A B

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OS REIMPLANTES E TRANSPLANTES

DENTÁRIOS NÃO ATRAPALHAM UMA

POSTERIOR COLOCAÇÃO DE IMPLANTES

OSSEOINTEGRÁVEIS

Os reimplantes dentários, quando realizados

com protocolos adequados — em que o tempo

fora do alvéolo seja de no máximo 30 minutos;

armazenado nesse período em leite, saliva ou

soro fisiológico; não manipulado em suas raí-

zes; submetido a tratamento endodôntico ne-

cessariamente após 14 dias; fixado aos demais

dentes de forma semirrígida e com cobertura

antibiótica —, tendem a ter sucesso, com re-

construção do ligamento periodontal.

Em algumas situações especiais, podem es-

tar indicados os reimplantes dentários tardios.

Nesses casos, os remanescentes periodontais

não resistem pelo tempo em que o dente ficou

fora do alvéolo, em geral superior a uma hora,

independentemente do tipo de armazenamento

do dente. A reimplantação tardia visa obter a

anquilose alveolodentária como forma de fixa-

ção do dente no alvéolo sem necessidade de

contenção. Primariamente, não importa que

depois de alguns anos ocorra a perda dentá-

ria por Reabsorção por Substituição. O objetivo

principal é manter o dente em função e estética

adequadas por alguns anos, como por exemplo

à espera do fim do crescimento terminal dos

maxilares, para então providenciar a colocação

de implantes osseointegráveis, tal como o caso

apresentado nas figuras 3 e 4.

Nos casos de reimplantes tardios, o trata-

mento da superfície radicular com soluções fluo-

retadas parece prolongar o tempo de permanên-

cia do dente reimplantado, apesar da anquilose

alveolodentária e da reabsorção por substitui-

ção (Fig. 3, 4). O tratamento endodôntico com

materiais bem aceitos pelos tecidos periodon-

tais e a completa eliminação da contaminação,

auxiliada por uma antibioticoterapia por duas

semanas, também colaborarão para um tempo

maior do dente reimplantado tardiamente no al-

véolo, com função e estética satisfatórias, sem

comprometimento de estruturas ósseas e pe-

riodontais como sequela.

No casos de transplantes dentários —

muito praticados nos países escandinavos,

com elevada taxa de sucesso —, quando

ocorrem a anquilose alveolodentária e a re-

absorção por substituição, o processo segue

o mesmo caminho de dentes traumatizados

e/ou reimplantados.

Os reimplantes e transplantes dentários

constituem opções muito específicas e espe-

ciais para solucionar temporária ou definitiva-

mente perdas dentárias por traumatismos ou

anodontia parcial. Em pacientes adolescentes

ou adultos jovens, de até 22 anos para as mu-

lheres e 24 homens para homens, o crescimen-

to terminal dos maxilares pode promover um

deslocamento natural e harmonioso dos den-

tes. No entanto, quando os dentes estão anqui-

losados — o mesmo ocorre com os implantes

osseointegrados —, tendem a permanecer “fi-

xos” até chegar essa idade, sem acompanhar o

crescimento maxilar, ou seja, sem deslocamen-

to harmonioso dos dentes (Fig. 3). Ao chegar

a essa idade mencionada, os dentes anquilo-

sados e os implantes osseointegrados podem

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Consolaro A, Fernandes AV, Consolaro RB

Rev Dental Press Periodontia Implantol. 2010 jul-set;4(3):29-37

Figura 4 - Radiografias de controle do reimplante dentário tardio da figura 3 em paciente com 17 anos.

Destaca-se que a estrutura dentária não foi contaminada e a reabsorção dentária por substituição foi ocorrendo

lentamente, sem que o dente perdesse sustentação em plena função, mesmo após 8 anos de evolução. O nível

ósseo cervical manteve-se preservado e o tecido ósseo relacionado com a substituição dos tecidos dentários

radiculares apresenta-se imaginologicamente normal. No paciente com 25 anos, o implante osseointegrável a

ser colocado não sofrerá risco de inflaoclusão em relação aos demais dentes, pois o crescimento terminal dos

maxilares se encerra entre 23 e 24 anos de idade.

2 anos

6 anos

3 anos

8 anos

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revelar coroas em infraoclusão e linha gengival

do sorriso alterada.

Desse modo, em adolescentes e adultos

muito jovens, o reimplante dentário, mesmo que

tardio, pode representar uma solução tempo-

rária (Fig. 3, 4). A solução definitiva do pon-

to de vista estético e funcional viria na idade

mais adequada, com a colocação de implante

osseointegrável. A anquilose alveolodentária e

a reabsorção por substituição, se ocorrerem,

não inviabilizariam a osseointegração, mesmo

se houver a necessidade de enxertos gengivais

e ósseos, especialmente se não houver conta-

minação bacteriana no local.

A inclusão de dentes com reabsorção por

substituição no plano oclusal normal, ou em

sobreoclusão, pode representar um estresse

celular e processo inflamatório adicional, so-

brepondo muito mais mediadores químicos da

remodelação óssea no local. A substituição do

dente pelo osso pode ser acelerada pelo au-

mento local de mediadores da remodelação ós-

sea e, em poucas semanas, pode-se ter como

resultado um dente fixado no osso apenas pela

sua porção radicular mais cervical, facilitando

sua remoção cirúrgica sem necessidade de

intervenções com perdas ósseas indesejáveis,

que poderiam levar à necessidade de recons-

truções por enxertia.

ANQUILOSE ALVEOLODENTÁRIA E OSSEOIN-

TEGRAÇÃO: FENÔMENOS PARALELOS!

A osseointegração pode ser comparada mor-

fologicamente a uma anquilose alveolodentária.

O reparo ósseo invade o que seria o espaço

periodontal e as células ósseas colonizam a

superfície dentária ou a superfície de titânio im-

plantar. Nas superfícies dentárias e implantares,

inicia-se a osteogênese. Em pouco tempo o den-

te ou o implante estão inseridos ou integrados

na estrutura óssea.

A diferença entre o dente anquilosado e o

implante osseointegrado está no envolvimento

dos tecidos dentários mineralizados na remo-

delação ou turnover ósseo. Nos implantes, os

clastos não conseguem interagir com a su-

perfície e muito menos desmontar a estrutura

metálica, ao passo que o fazem com a estru-

tura dentária mineralizada. Uma comparação

primitiva: a anquilose alveolodentária evolui

para reabsorção por substituição, mas a os-

seointegração não!

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Os implantes osseointegráveis, quando

aplicados em áreas ósseas com fragmentos

radiculares de dentina e/ou cemento não con-

taminados por bactérias — muitas vezes im-

perceptíveis imaginologicamente —, não impe-

dirão que ocorra a osseointegração. Durante

o processo de remodelação óssea decorrente

do reparo peri-implantar ou da demanda fun-

cional do implante, esses fragmentos dentários

serão reabsorvidos e substituídos normalmente

por osso. As células ósseas, especialmente os

clastos, não são específicas para cada tecido

mineralizado. Os osteoclastos, dentinoclastos e

cementoclastos não são diferentes entre si, são

as mesmas células.

Os clastos que reabsorvem osso são as mes-

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Consolaro A, Fernandes AV, Consolaro RB

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mas células que reabsorvem cemento e dentina.

Em 1873, Kolliker descreveu essas células pela

primeira vez e as denominou de “osteoclastos”,

não imaginou que no cemento e na dentina elas

atuariam da mesma forma. Em função dessa sua

propriedade, esses macrófagos ósseos, mono ou

multinucleados, podem ser mais apropriadamen-

te chamados simplesmente de clastos.

O nome original “osteoclastos” derivou do

grego Οστό = osso e κλαστός = quebra-

do ou desmontado. Rudolf Albert von Kolliker

(1817-1905) foi um grande anatomista, histo-

logista e fisiologista suíço que contribuiu muito

para o conhecimento do corpo humano.

REFERÊNCIAS

1. Consolaro, A. Reabsorções dentárias nas especialidades

clínicas. 2ª ed. Maringá: Dental Press; 2005.

Alberto Consolaro E-mail: [email protected]

Endereço para correspondência

Alberto Consolaro

• Professor Titular da FOB-USP (Bauru) e da Pós-

graduação da FORP-USP (Ribeirão Preto).

Alexandre Vieira Fernandes

• Mestre em Estomatologia e Doutor em Cirurgia

Bucomaxilofacial – Clínica Privada em Uberlândia/MG.

Renata Bianco Consolaro

• Doutoranda em Patologia da FOB-USP e Professora de

Patologia da FOA-Unesp Araçatuba.