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1/24 Ação Penal 694 Mato Grosso Relatora : Min. Rosa Weber Revisor : Min. Roberto Barroso Autor(a/s)(es) : Ministério Público Federal Proc.(a/s)(es) : Procurador-geral da República Réu(é)(s) : Paulo Fernando Feijó Torres Adv.(a/s) : Marcelo Luiz Avila de Bessa e Outro(a/s) EMENTA: DIREITO PENAL. AÇÃO PENAL ORIGINÁRIA. CRIMES DE ASSOCIAÇÃO CRIMINOSA, FRAUDE À LICITAÇÃO. PRESCRIÇÃO PELA PENA EM ABSTRATO. CRIMES DE CORRUPÇÃO PASSIVA E LAVAGEM DE DINHEIRO. CONDENAÇÃO. 1. Os crimes de associação criminosa e de fraude à licitação encontram-se prescritos pela pena em abstrato, impondo-se a extinção da punibilidade. 2. Encontram-se comprovadas a materialidade e a autoria dos crimes de corrupção passiva e lavagem de capitais. 3. Pretensão punitiva estatal julgada parcialmente procedente. 4. Em se tratando de pena privativa de liberdade, em regime fechado, por prazo superior ao restante para a conclusão do mandato, sua perda se dá como

Ação Penal 694 Mato Grosso

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Page 1: Ação Penal 694 Mato Grosso

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Ação Penal 694 Mato Grosso

Relatora : Min. Rosa Weber

Revisor : Min. Roberto Barroso

Autor(a/s)(es) : Ministério Público Federal

Proc.(a/s)(es) : Procurador-geral da República

Réu(é)(s) : Paulo Fernando Feijó Torres

Adv.(a/s) : Marcelo Luiz Avila de Bessa e Outro(a/s)

EMENTA: DIREITO PENAL. AÇÃO PENAL ORIGINÁRIA.

CRIMES DE ASSOCIAÇÃO CRIMINOSA, FRAUDE À

LICITAÇÃO. PRESCRIÇÃO PELA PENA EM ABSTRATO.

CRIMES DE CORRUPÇÃO PASSIVA E LAVAGEM DE

DINHEIRO. CONDENAÇÃO.

1. Os crimes de associação criminosa e de fraude à

licitação encontram-se prescritos pela pena em

abstrato, impondo-se a extinção da punibilidade.

2. Encontram-se comprovadas a materialidade e a

autoria dos crimes de corrupção passiva e lavagem de

capitais.

3. Pretensão punitiva estatal julgada parcialmente

procedente.

4. Em se tratando de pena privativa de liberdade,

em regime fechado, por prazo superior ao restante

para a conclusão do mandato, sua perda se dá como

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resultado direto e inexorável da condenação, sendo a

decisão da Câmara dos Deputados vinculada e

declaratória, na linha do que afirmei no MS

32.326/DF, sob minha Relatoria.

RELATÓRIO:

1. Trata-se de ação penal ajuizada, na origem, pelo Ministério Público

Federal do Estado do Mato Grosso em face do Paulo Fernando Feijó

Torres, imputando-lhe a prática dos delitos previstos nos arts. 288 e 317

§1º do Código Penal, no art. 1º, V e VII, da Lei nº 9613/1998 e no art. 90 da

Lei 8.666/93.

2. O caso é um desmembramento da denominada Operação

Sanguessuga, em que se investigou desvio de recursos públicos por

prefeituras municipais mediante aquisição superfaturada de veículos. As

licitações fraudadas beneficiavam empresas ligadas ao Grupo Planam,

controlado por Darci José Vedoin e Luiz Antônio Trevisan Vedoin.

3. Segundo a denúncia, o réu teria recebido propina entre 2001 e 2003,

por intermédio de depósitos nas contas-correntes de Ricardo Jardim do

Amaral Mello (assessor e chefe de gabinete do réu), Daniela Rode

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Guimarães (mulher de Ricardo), Marco Antônio Lopes (intermediário em

Brasília a serviço da organização criminosa) e Zeila Cardoso de Mello

(ligada a Ricardo). A denúncia também aponta a amortização de um

empréstimo no valor de R$ 15.000,00 junto a Ivanildo da Silva Cordeiro,

saldado em benefício do réu mediante transferência bancária efetuada

pela empresa Klass Comércio e Rep. Ltda, pertencente ao grupo Planam e

beneficiária das licitações fraudadas. Os repasses descritos pela denúncia

totalizam R$ 544.919,45 (quinhentos e quarenta e quatro mil, novecentos e

dezenove reais e quarenta e cinco reais).

4. A denúncia atribui ao acusado os seguintes fatos: (i) que ele teria se

comprometido a apresentar emendas ao orçamento destinadas à

aquisição de unidades móveis de saúde para Municípios do Estado do

Rio de Janeiro integrantes de sua base eleitoral, em contrapartida ao

recebimento de propina (ii) que as licitações para aquisição das unidades

móveis, vencidas por empresas vinculadas ao grupo Planam, teriam sido

fraudadas (iii) que o recebimento de propina ocorreu por intermédio de

contas-correntes de terceiros conectados aos crimes.

5. A denúncia foi recebida pelo Juízo da 2ª Vara Federal da Seção

Judiciária do Mato Grosso em 06 de agosto de 2007 (fls. 15)

6. Na origem, o réu foi citado e interrogado (fls. 1088/1090, volume 5)

e apresentou defesa prévia (fls. 1091/1095). As testemunhas de acusação e

de defesa foram ouvidas (fls. 1.105-1.110, 1.152-1.158, 1.224-1.227, 1.243,

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1.263, 1.275, 1.282, 1.286, 1.290) e o acusado foi interrogado novamente

(fls. 1.422-1.424, volume 6).

7. Em razão da diplomação do réu como Deputado Federal, o Juízo

da 2ª Vara Federal da Seção Judiciária do Mato Grosso declinou da

competência para este Supremo Tribunal Federal, onde distribuído o feito

à Exma. Srª Ministra Rosa Weber.

8. Após manifestação ministerial (fls. 1554/1558), a Relatora, às fls.

1069/1073: (i) julgou válidos os atos processuais até então praticados e (ii)

determinou renovação da quebra de sigilo bancário de Paulo Fernando

Feijó Torres, Ricardo Jardim do Amaral Mello, Daniela Rode Guimarães

Melo, Zeila Cardoso de Melo e Ivanildo da Silva Cordeiro.

9. Na fase do art. 10 da Lei nº 8038, o Procurador-Geral da República

nada requereu, ao passo que a Defesa requereu: (i) expedição de ofícios

ao juiz da Seção Judiciária do Mato Grosso para que encaminhasse cópia

da sentença proferida no processo nº 2006.36.00.012426-6 e ao TCU para

que encaminhasse cópia da Tomada de Contas 020.526/2009-5. Ambos os

requerimentos foram indeferidos pela Relatora, encerrando-se a instrução

processual.

10. Em alegações finais, o Procurador-Geral da República pugnou pela

condenação do réu pelos crimes dos arts. 288 e art. 317, § 1º, ambos do

Código Penal, e 1º, V e VII, da Lei nº 9613/98, comprovados, no seu

entender, materialidade e autoria dos delitos.

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12. A Defesa, em sede de alegações finais, aduziu: (i) inépcia da

denúncia, tendo em vista a ausência da necessária descrição das supostas

condutas imputadas ao réu; (ii) ausência de prova de que o acusado tenha

recebido qualquer valor pela liberação das emendas (iii) negativa de

titularidade dos valores depositados em contas de terceiros (iv)

inexistência de provas quanto à solicitação/recebimento de vantagem por

parte do acusado (v) desconhecimento por parte do réu sobre a origem

ilícita das quantias depositadas; (vi) que o réu jamais interferiu em

decisões licitatórias; (vii) que não há provas de que o réu tenha se

vinculado a qualquer pessoa com a intenção de praticar delitos; (viii)

inexistência de prática de ato ilícito apto a tipificar a corrupção passiva.

Requereu sua absolvição

13. É o relatório.

VOTO:

O Senhor Ministro Luís Roberto Barroso (Revisor):

I. PRELIMINARES: PRESCRIÇÃO E INÉPCIA DA DENÚNCIA.

1. De início, com relação aos crimes de associação criminosa

(quadrilha, à época dos fatos), previsto no art. 288 do CP e fraude à

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licitação, previsto no art. 90 da Lei 8.666/93, verifico a ocorrência da

prescrição da pretensão punitiva estatal.

2. A pena máxima cominada aos delitos dos arts. 288 do CP e 90 da

Lei 8666/93 é, respectivamente, de 03 (três) e 04 (quatro) anos, de modo

que a prescrição ocorre em 08 (oito) anos (art. 109, IV do CP). A denúncia

foi recebida em 06 de agosto de 2007 e não ocorreu outro marco

interruptivo da prescrição da pretensão punitiva estatal. Deste modo,

verificado o decurso de mais de 08 (oito) anos desde o último marco

interruptivo do lapso prescricional, reconheço e pronuncio a prescrição

em relação aos crimes previstos nos arts. 288 do CP e 90 da Lei 8666/93.

3. Com relação ao crime de lavagem de dinheiro, previsto no art. 1º da

Lei nº 9613/98, é necessário observar que, à época dos fatos, ainda vigiam

os incisos do referido artigo, que estabeleciam rol taxativo de crimes

antecedentes ao crime de lavagem de dinheiro. Por este motivo, o réu foi

denunciado pela prática dos crimes do art. 1º, V e VII, da Lei nº 9613/98.

De outro lado, não observo maior relevância neste fato, já que a pena não

foi alterada.

4. Este o quadro, resta hígida a pretensão punitiva estatal com

relação aos delitos de lavagem de capitais (art. 1º da Lei nº 9.613/1998) e

de corrupção passiva, na forma majorada (art. 317 c.c § 1º do Código

Penal).

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5. Quanto à preliminar de inépcia da denúncia, a orientação

jurisprudencial do Tribunal é no sentido de que o exame de sua

admissibilidade se limita à existência de substrato probatório mínimo e à

validade formal da inicial acusatória (CPP, art. 41). Nesse sentido, o INQ.

1926, Rel.ª Min.ª Ellen Gracie; e o INQ. 2449, Rel. Min. Ayres Britto.

6. Nestes termos, a denúncia foi formulada de modo claro e permitiu

ao acusado o pleno exercício do direito de defesa durante a instrução

criminal. Os elementos de funcionamento dos fatos delituosos, com a

menção expressa à sua mecânica, bem como a atuação do denunciado,

estão descritos na denúncia. O Parquet afirma que o acusado se utilizou

do mandato para favorecer proprietários do grupo Planam: apresentou

uma série de emendas parlamentares, obtendo, assim, recursos

provenientes de licitações fraudadas em diversos municípios

componentes de sua base eleitoral. Em contrapartida, recebeu vantagem

patrimonial indevida por métodos de ocultação e dissimulação de

patrimônio. Os crimes teriam ocorrido entre os anos de 2001 e 2003.

7. Esta a descrição dos fatos apresentada, não considero inepta a peça

inicial acusatória e rejeito a preliminar.

II. MÉRITO.

8. No mérito, quanto ao crime de corrupção passiva, o Ministério

Público aponta que acusado teria se utilizado do mandato em favor de

interesses privados do grupo Planam, tendo, como contrapartida, o

recebimento de propina via depósitos nas contas-correntes de Ricardo

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Jardim do Amaral Mello (assessor e chefe de gabinete do réu), Daniela

Rode Guimarães (esposa de Ricardo), Marco Antônio Lopes

(intermediário em Brasília a serviço da organização criminosa) e Zeila

Cardoso de Mello (ligada a Ricardo). A denúncia também descreve a

amortização de um empréstimo no valor de R$ 15.000,00 tomado junto a

Ivanildo da Silva Cordeiro, e saldado em benefício do réu mediante

transferência bancária efetuada pela empresa Klass Comércio e Rep. Ltda,

pertencente ao grupo Planam e beneficiária das licitações fraudadas. Os

repasses referidos na denúncia totalizam R$ 544.919,45 (quinhentos e

quarenta e quatro mil, novecentos e dezenove reais e quarenta e cinco

reais).

9. O recebimento de propinas caracteriza o crime de corrupção

passiva, previsto no art. 317 do Código Penal. Na hipótese de serem

praticados atos de ofício para atender interesses de grupo econômico

privado, aplica-se também a causa de aumento de pena de que cuida o

§1º do referido dispositivo.

10. No caso sob exame, a materialidade é inconteste, e pode ser

comprovada pelos seguintes documentos: (i) Livro-caixa apreendido na

sede do grupo Planam, em que constam os seguintes registros de

pagamento ao acusado: (a) 14/06/2002 - R$ 3.000,00, por intermédio de

Ricardo; (b) 18/06/2002 - R$ 10.000,00, por intermédio de Marco Antônio

Lopes; (c) 20/03/2002 - R$ 2.000,00, por intermédio de Daniela Rode

Guimarães; (ii) documentação “Movimentação”, também apreendida na

sede do grupo Planam, em que constam as seguintes referências ao

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acusado: (a) 14/06/2002 - R$ 3.000,00, por intermédio de Ricardo; (b)

18/06/2002 - R$ 10.000,00, por intermédio de Marco Antônio Lopes (fls.

19-21, volume 1); (iii) perícia, elaborada pela Polícia Federal, nos registros

contábeis do grupo Planam, em que constam as seguintes anotações de

repasses ao acusado: “DEPÓSITO C/C DANIELLA R. GUIMARÃES -

DEP FEIJÓ, 20/03/2002” (fl. 121); “DEPÓSITO C/C RICARDO - DEP.

PAULO FEIJÓ, 14/6/2002, R$ 3.000,00” (fls. 122 e 186) e “DEPÓSITO

MARCO LOPES - DEP. PAULO FEIJÓ, 18/6/2002, R$ 10.000,00” (fl. 122 e

fl. 189; fls. 101-264); (iv) “Documentação apresentada por Luiz Vedoin

como comprovante de pagamentos efetuados ao Parlamentar”, em que

retratadas transferências bancárias (DOC e TED) e depósitos em dinheiro,

efetuadas por empresas ligadas ao grupo Planam (Santa Maria Comércio

e Representações, Klass Comércio e Representações, Frontal Indústria e

Comércio, Planam Comércio e Representações, Manoel Medeiros - ME),

em favor de Daniella Rode Guimarães, Ricardo José Amaral Melo, Marco

Antônio Lopes, Zeila Cardoso de Melo e Ivanildo Cordeiro - ME,

representadas em 20 (vinte) operações (fls. 40-42 do apenso 1); (v)

transferências bancárias (DOC e TED) e depósitos em dinheiro, efetuadas

por empresas ligadas ao grupo Planam (Santa Maria Comércio e

Representações, Klass Comércio e Representações, Frontal Indústria e

Comércio, Planam Comércio e Representações, Manoel Medeiros - ME),

em favor de Daniella Rode Guimarães, Ricardo José Amaral Melo, Marco

Antônio Lopes, Zeila Cardoso de Melo e Ivanildo Cordeiro - ME,

representadas em 22 (vinte e duas) operações (fls. 59-86 do apenso 1); (vi)

relatório de Análise das quebras de sigilo bancário, elaborado pela

Procuradoria-Geral da República (RI Nº 04050/2013 - ASSPA/PGR), que

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atestou 28 (vinte e oito) operações entre empresas ligadas ao grupo

Planam (Santa Maria Comércio e Representações, Klass Comércio e

Representações, Frontal Indústria e Comércio, Planam Comércio e

Representações, Manoel Medeiros - ME) em favor de Daniella Rode

Guimarães, Ricardo José Amaral Melo, Marco Antônio Lopes, Zeila

Cardoso de Melo e Ivanildo Cordeiro - ME (mídia à fl. 1650, volume 7).

11. No que se refere à autoria, existem provas suficientes para embasar

a condenação do réu, indicando sua participação nos fatos acima de

qualquer dúvida razoável. Estas provas consistem, sobretudo, nos

inúmeros depoimentos colhidos e juntados aos autos deste processo.

12. Darci Vedoin e Luiz Vedoin, ambos declararam em juízo que os

recursos recebidos por Paulo Feijó provinham de valores depositados nas

contas-correntes de pessoas indicadas por Ricardo Jardim do Amaral

Mello, assessor parlamentar designado pelo acusado para gerenciar a

“parte burocrática” da trama. (fls. 1105/1106 e 1109/1110, volume 5).

13. As declarações de Ronildo Pereira de Medeiros, por sua vez,

corroboram os depoimentos de Darci Vedoin e Luiz Vedoin no sentido de

que o réu teria realizado acordo com o grupo Planam, por meio do qual

eram pagas comissões sobre o valor das licitações direcionadas (fls.

1107/1108, volume 5).

14. A testemunha Daniela Rode Guimarães, mulher do assessor

parlamentar Ricardo Jardim Amaral Mello e acusada de receber recursos

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por parte de empresas ligadas ao grupo Planam, apresentou em juízo

explicações não muito consistentes quanto aos depósitos efetuados em

sua conta corrente. Disse que conheceu o acusado por intermédio de seu

marido e que nunca teve relacionamento comercial com nenhuma das

pessoas que depositou dinheiro em sua conta. Afirmou, ainda, que seu

marido não tinha explicações de “como a conta dela foi cair na mão dessas

pessoas”. Ocorre que a versão dos fatos dada por Daniela em juízo difere

daquela apresentada na esfera policial, ocasião em que declarou: “QUE

RICARDO afirmou que estava para receber um dinheiro e que havia repassado o

número da conta corrente da interrogada para essas pessoas; QUE a interrogada

deduziu que as pessoas mencionadas por RICARDO estivessem ligadas à

empresa PLANAM; QUE chegou a essa conclusão pois os comprovantes de

depósitos acima estavam com LUIZ ANTONIO VEDOIN” (fls. 89/91, apenso

1). Diante da ausência de justificativa razoável para os depósitos

efetuados em sua conta corrente, fica fortalecida a tese de vinculação

dela, de seu marido e do acusado ao grupo Planam, no sentido de que a

conta de Daniela teria sido utilizada para a consecução do ilícito criminal.

15. A testemunha Ivanildo da Silva Cordeiro, em fls. 1158/1159, afirmou

que o acusado pediu o número de sua conta corrente por intermédio do

assessor Ricardo. Nesta conta, o grupo Planam realizou um depósito de

R$ 15.000,00, utilizado para saldar dívidas da campanha de 2002.

16. As demais testemunhas arroladas pela acusação, apesar de não

fazerem menção expressa aos depósitos, confirmaram o papel de

interlocutor do acusado na destinação das emendas para aquisição das

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ambulâncias via grupo Planam. Nesse sentido, a testemunha Makhoul

Moussalem afirmou que o hospital que dirigia recebeu ambulância via

emenda do acusado. A mesma afirmação foi feita por Benedito Marques,

que, na condição de testemunha, salientou que o acusado entrou em

contato com ele para oferecer pessoalmente as ambulâncias e que enviou

via fax o “plano de trabalho” necessário à aquisição dos veículos (fls.

1156/1157, volume 5).

17. Como se sabe, o direito processual penal não distingue as provas

crítico-lógicas das histórico-descritivas, de modo que a prova indiciária

pode levar à condenação do réu quando corroborada, como no caso sob

exame, pelo conjunto probatório produzido. Neste caso, cabe ao réu

produzir outros elementos de prova que possam desfazer a força

persuasiva da prova produzida em seu desfavor, conforme estabelecido,

por esta Suprema Corte, na AP 481/PA, sob relatoria do Min. Dias Toffoli.

18. Quanto aos elementos de prova produzidos pelo réu, as

testemunhas arroladas pela defesa pouco contribuíram para o

esclarecimento dos fatos, na medida em que nenhuma delas demonstrou

conhecimento sobre o suposto vínculo ilícito entre o acusado e o grupo

Planam.

19. Antes mesmo da oitiva de testemunhas, Paulo Feijó já prestara

declarações a esta Corte. Durante o curso de seu Inquérito, o acusado já

havia negado o recebimento de valores pelo grupo Planam e afirmou

desconhecer a razão pela qual o seu nome consta como beneficiário dos

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pagamentos mencionados, conforme registros verificados no Livro-Caixa

e em planilhas eletrônicas de contabilidade da empresa PLANAM

COMÉRCIO E REPRESENTAÇÕES LTDA. Ocorre que, posteriormente, o

acusado foi interrogado por duas vezes e, apesar de continuar negando o

recebimento de vantagens indevidas, apresentou novas justificativas para

a origem dos depósitos suspostamente ilícitos.

20. Quando interrogado, Paulo Feijó afirmou que os valores recebidos

na conta de seu assessor por empresas ligadas ao grupo Planam

advinham do fato de ser credor de um primo seu, de nome Rubens Feijó,

que havia sido cooptado por empresas ligadas ao grupo Planam. Os

valores repassados teriam o fim de quitar dívidas. Sobre o fato do

montante ter sido depositado na conta de seu assessor, esclareceu que era

Ricardo quem fazia o controle dos empréstimos e pagava algumas de

suas despesas pessoais (hospedagem, IPVA). Segundo o réu, parte dos

depósitos foi direcionada a quitar dívidas “contraídas com a aquisição de

um apartamento em Brasília”. Outra parte serviu para amortizar uma

dívida que o acusado tinha com Ivanildo. Informou, por fim, que

desconhece Marco Antônio Lopes e Zeila Cardoso de Melo e que conhece

“de vista” Daniele Rode Guimarães (fls. 1088/1090, volume 5 e 1422/1424,

volume 6). Confrontando estas declarações com aquelas que foram

colhidas na ocasião do Inquérito, observo que o acusado aduziu de modo

conflitante os mesmos fatos.

21. No que concerne especificamente ao argumento de que o corréu

Ricardo Jardim do Amaral, apontado como o operador do recebimento de

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propina, teria sido absolvido pelos mesmos fatos, na ação penal nº

2006.36.00.012426-6, julgada em primeiro grau de jurisdição pela Justiça

Federal da Seção Judiciária do Estado do Mato Grosso, necessário

esclarecer que tal absolvição se deu, naquele Juízo, por falta de provas e

que esta absolvição não se estende automaticamente para o reú cuja

responsabilidade penal se apura neste feito.

22. Por outro lado, na sentença (fls. 1748/1756) o magistrado

expressamente consigna que o ali acusado não nega o recebimento dos

valores, mas somente que desconhecia sua origem ilícita e, ainda, que

todos os valores que o Deputado informou que seriam depositados em

sua conta foram, posteriormente, a ele devolvidos.

23. A denúncia narra condutas de recebimento de propina

materializadas em depósitos nas contas de Ricardo Jardim do Amaral

Mello, Daniela Rode Guimarães, Marco Antônio Lopes e Zeila Cardoso

de Mello, bem como uma amortização de empréstimo no valor de R$

15.000,00 junto a Ivanildo da Silva Cordeiro, saldado em benefício do réu

mediante transferência bancária efetuada pela empresa Klass Comércio e

Rep. Ltda, pertencente ao grupo Planam. Pelo conjunto probatório, é

possível atribuir responsabilidade ao acusado quanto aos depósitos

efetuados nas contas de Ricardo Jardim do Amaral Mello, Daniela Rode

Guimarães e Ivanildo da Silva Cordeiro. Quanto a estes, ficou provado

que os valores recebidos via depósito tiveram relação com o vínculo

ilícito estabelecido entre o acusado e o grupo Planam. Os valores

depositados nas contas correntes das citadas pessoas interpostas tiveram

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lastro documental que corroborou as declarações dos colaboradores, e

foram reafirmados por provas colhidas sob o crivo do contraditório e da

ampla defesa.

24. Releva afirmar que a apresentação de emendas parlamentares, em

si, é um ato lícito. Porém, no presente caso, verifica-se a infração do dever

funcional, na medida em que o réu apresentou as referidas emendas com

o claro intuito de beneficiar um grupo com o qual mantinha acordo

prévio, conforme demonstrado acima, situação que constitui flagrante

violação dos princípios da moralidade e da impessoalidade da

administração pública, e, no caso dos autos, infração penal. No ponto, de

se destacar que desimporta à configuração do crime de corrupção passiva

a prática de ato ilícito como contrapartida, podendo ser lícito o ato a ser

praticado com o fim de beneficiar terceiros.

25. Quanto aos depósitos efetivados nas contas de Zeila e Marco

Antônio, considero não haver comprovação. Não houve qualquer

referência a eles pelas testemunhas ouvidas (exceto Ivanildo, que afirmou

desconhecê-los) e seus nomes não foram mencionados em juízo por

qualquer dos colaboradores. Zeila e Marco Antônio, vale mencionar, não

foram sequer ouvidos na presente ação, já que nem a defesa nem o

Ministério Público os arrolaram como testemunhas. Por fim, o acusado

afirmou desconhecê-los, de modo que não ficou demonstrado o vínculo

criminal entre Zeila, Marco Antônio e o acusado, no que tange aos

depósitos ora analisados.

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26. No presente caso, portanto, tenho que o delito se consumou

quando o réu recebeu os valores por intermédio dos depósitos efetuados

nas contas de Ricardo, Daniele e Ivanildo. O dolo do réu está

consubstanciado pelo fato de haver recebido propina mediante pessoas

interpostas a ele vinculadas.

26. Como já ficou demonstrado, as provas apontam no sentido de um

acordo prévio entre o acusado e o grupo Planam para viabilizar emendas

parlamentares destinadas à licitações, em contrapartida ao recebimento

de vantagens indevidas por parte de Paulo Feijó.

27. A causa de aumento de pena, prevista no § 1º do art. 317 do CP, se

verifica em razão da prática de ato de ofício com infringência de seu

dever funcional.

28. Destaco que se considera cada depósito sem causa jurídica válida

um crime de corrupção passiva. Assim, considerando os 19 depósitos

efetuados nas contas de Ricardo, Daniele e Ivanildo crimes de mesma

espécie, praticados nas mesmas condições de tempo, lugar e modo de

execução, e considerando, ainda, ser o crime continuado – espécie do

gênero concurso de crimes -, uma ficção jurídica que concretiza política

criminal judicial, evitando-se penas exorbitantes, reconheço a

continuidade delitiva, nos exatos termos preconizados pela Relatora.

29. Quanto ao delito de lavagem de capitais, o Parquet requereu a

condenação com fundamento no art. 1º da Lei 9613/98, incisos V e VII,

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vigentes à época dos fatos. A denúncia narra que os 21 atos de lavagem

consistiram no recebimento de vantagens indevidas mediante contas de

pessoas interpostas, com a intenção de ocultar e dissimular a origem e a

natureza ilícita dos recursos. O dolo de ocultar e dissimular a origem e a

natureza ilícita dos recursos também esteve presente nos crimes

licitatórios. Assim, segundo a denúncia, tanto a corrupção passiva quanto

a fraude à licitação configuram delitos antecedentes à lavagem de

capitais.

30. Importante ressaltar que a caracterização da lavagem de dinheiro

pressupõe realização de atos tendentes a conferir uma aparência de ativo

lícito ao produto de crime antecedente, já consumado. Tal entendimento

foi fixado por esta Corte para evitar a dupla incriminação pelo mesmo

fato. No caso dos autos, existe possibilidade de imputação por lavagem

de capitais, eis que a conduta teria ocorrido subsequentemente à

consumação dos outros delitos descritos.

31. Explica-se: diante do contexto fático apresentado nos autos, as

sucessivas transações econômicas entre o acusado e seu assessor revelam-

se como atos de reciclagem que objetivaram transformar os recursos

provenientes de atividade criminosa em ativos lícitos: as operações

realizadas por Ricardo Jardim do Amaral Mello em favor do acusado

constituíram atos posteriores de higienização do dinheiro obtido

ilicitamente, no intento de assegurar a impunidade dos crimes primários.

O uso de interpostas pessoas para o recebimento da propina não encerrou

o ciclo delitivo com o próprio exaurimento da corrupção. Em vez disso, a

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conversão da propina em capitais supostamente lícitos prolongou a trama

e dificultou o rastreamento do montante indevidamente adquirido.

32. Conforme consta no depoimento de Luiz Vedoin, Ricardo foi

designado pelo acusado para “gerenciar e agilizar toda a parte

burocrática” da trama (fls. 1105/1106, volume 5). Ricardo, por sua vez,

afirma que os valores restituídos ao acusado provinham de eventuais

diferenças que excediam o pagamento das despesas relacionadas aos

imóveis e veículos de Paulo Feijó. Contudo, as provas juntadas aos autos

não sustentam a versão de Renato. Apontam, em verdade, que houve um

fluxo financeiro em datas sincronizadas entre a conta corrente do acusado

e de seu assessor, logo após o abastecimento da conta deste último com

depósitos promovidos pelo grupo Planam, o que reforça a materialidade

do crime de lavagem de capitais.

33. Inequívoca, portanto, a conclusão de que ao menos parte da

propina foi reinserida no mercado formal de forma dissimulada, em

benefício da formação de patrimônio do acusado. Tendo em vista a

prática de atos posteriores e autônomos ao crime de corrupção passiva

objetivando conferir licitude ao montante indevidamente obtido, o crime

do art. 317 figura como delito antecedente à lavagem de capitais.

34. O pagamento por mecanismos de ocultação e dissimulação também

derivou de fraudes à licitações, de modo que não só a corrupção passiva

foi delito antecedente.

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35. Destaco que as fraudes às licitações, um dos crimes antecedentes ao

de lavagem, não só eram inequivocamente conhecidas pelo acusado como

contaram com sua atuação, de modo que Paulo Feijó não só direcionou

emendas para este fim, como, pessoalmente e por meio de sua assessoria

parlamentar teve conhecimento das fraudes licitatórias para as quais

direcionados os recursos liberados por estas mesmas emendas. Nesse

sentido, as declarações prestadas por Darci José Vedoin às fls. 1.109;

Ricardo Pereira Medeiros, fls. 1.107; Makhoul Moussalem, fls. 1.154/1.155;

Benedito Marques, 1.156/1.157 e 1.163/1.164, todas do volume 05.

36. No ponto, de se destacar que embora a denúncia tenha capitulado a

lavagem de dinheiro com indicação de crime cometido por organização

criminosa como crime antecedente, pondero que esta específica conduta,

a prevista no inciso VII, do art. 1º, da Lei nº Lei 9613/98 se mostra atípica

porquanto, à época dos fatos, entendia esta Suprema Corte que a ausência

de lei que regulamentasse o que se poderia compreender como

organização criminosa tornava este elemento normativo do tipo

instrumentalmente inapto a criminalizar a conduta.

37. De todo modo, remanesce hígida, como se viu, a capitulação da

lavagem com fundamento no inciso V, do mesmo dispositivo.

38. Em atenção ao princípio da correlação entre acusação e sentença,

limito-me à análise dos atos imputados na denúncia. Vale lembrar que ela

aponta suposta existência de 21 (vinte e um) atos de lavagem,

materializados em depósitos nas contas de pessoas interpostas vinculadas

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ao acusado (Ricardo Jardim do Amaral Mello, Daniela Rode Guimarães

Melo, Zeila Cardoso de Melo), bem como amortização de empréstimo em

favor de Ivanildo Silva Cordeiro, saldado em benefício do réu mediante

transferência bancária efetuada pela empresa Klass Comércio e Rep. Ltda.

39. Pelas mesmas razões aduzidas na decisão quanto ao cometimento

do crime de corrupção passiva, considero que o ato de lavagem de

capitais não alcança os fatos relacionados a Zeila Cardoso de Melo e

Marco Antônio. Por outro lado, reconheço a responsabilidade do acusado

quanto aos atos de lavagem realizados por intermédio de operações

efetuadas com Ricardo Jardim do Amaral Mello, Daniela Rode

Guimarães e Ivanildo da Silva Cordeiro.

40. No que concerne ao número de condutas de lavagem narradas na

denúncia, 21 ao todo, referentes às movimentações financeiras que

indicariam o branqueamento de capitais, observo, como faz a Relatora de

forma criteriosa, que, afastadas aquelas realizadas por intermédio de

Zeila e Marco Antônio, como se viu, algumas outras também não

poderiam ser havidas como realizadas em benefício do acusado, para

além de uma dúvida razoável. Explica-se: em se tratando do crime de

corrupção passiva, desimporta o destinatário final de vantagem, na

medida em que o tipo menciona seu recebimento “para si ou para

outrem”. No caso da lavagem, contudo, só o beneficiário da vantagem é

por ela responsável. Deste modo, não há como considerar, de acordo com

a prova produzida, que todas as operações intermediadas por Ricardo

destinavam-se ao parlamentar, na medida em que algumas declarações

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prestadas apontam que Ricardo era, por igual, beneficiário dos valores.

Assim, numa interpretação mais favorável ao réu, operada pela Relatora,

considera-se fruto de lavagem sob sua responsabilidade somente as

operações acima de R$ 4.000,00, o que restringe a 10 atos os atos de

lavagem comprovados nos autos cuja responsabilidade se pode,

seguramente, imputar ao acusado.

41. Aqui, nos mesmos moldes do delito de corrupção passiva,

reconheço a continuidade delitiva entre os 10 atos de lavagem de capitais,

pois as condições de tempo, lugar, maneira de execução e outras

semelhantes permitem inferir que os depósitos subsequentes foram nada

mais que uma continuação do primeiro depósito efetuado.

42. Este o quadro, julgo procedente em parte a pretensão punitiva

estatal para condenar o réu nas penas do art. 317, § 1º, do CP e art. 1º, V e

VII, da Lei nº 9613/1998, reconhecendo e pronunciado a prescrição da

pretensão punitiva estatal, em abstrato, quanto aos demais crimes a ele

imputados, na forma preconizada na fundamentação.

43. Passo à dosimetria da pena.

44. PARA O CRIME DE CORRUPÇÃO PASSIVA (ART. 317, DO CP).

45. Considerando as circunstancias de que cuida o artigo 59, do Código

Penal, tenho por desfavoráveis ao réu as circunstâncias judiciais da

culpabilidade e das consequências do crime. A culpabilidade é

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desfavorável porque o crime foi praticado por agente político, que ocupa

posto elevado na estrutura de Poder e, por isso, revela especial juízo de

reprovabilidade da conduta do acusado. Quanto às consequências, o

crime em análise impossibilitou que a administração pudesse fazer a

melhor escolha no que concerne à compra de equipamentos,

prejudicando assim a prestação de serviço essencial de saúde, além de

causar prejuízo ao erário no montante de R$ 492.455,18 (quatrocentos e

noventa e dois mil, quatrocentos e cinquenta e cinco reais e dezoito

centavos). Assim, fixo a pena-base acima do mínimo legal, em 03 (três)

anos e 06 (seis) de reclusão e 150 (cento e cinquenta) dias multa, fixado o

valor unitário em 02 (dois) salários mínimos, considerada a capacidade

econômica do réu que, à época e atualmente, ocupa funções de Deputado

Federal. Tomo por base o preceito secundário previsto no tipo em

momento anterior à alteração promovida pela Lei nº 10.763/2003,

considerado que o último fato descrito na denúncia é anterior à alteração

legislativa. Não há agravantes ou atenuantes. Considerada a causa de

aumento de que cuida o § 1º do art. 317, majoro a reprimenda em 1/3,

para encontrar 04 (quatro) anos e 08 (oito) meses de reclusão e 200

(duzentos) dias multa. Em razão da continuidade delitiva, majoro a

reprimenda em 1/3 e torno definitiva a pena em 06 (seis) anos e 02 (dois)

meses de reclusão e 220 (duzentos e vinte) dias multa. O regime inicial é o

semi-aberto (art. 33, § 2º, b, do Código Penal).

46. PARA O CRIME DE LAVAGEM DE DINHEIRO (ART. 1º, DA LEI Nº 9.613/98).

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47. Considerando as circunstancias de que cuida o artigo 59, do Código

Penal, tenho por desfavoráveis ao réu as circunstâncias judiciais da

culpabilidade e das consequências do crime. A culpabilidade é

desfavorável porque o crime foi praticado por agente político, que ocupa

posto elevado na estrutura de Poder e, por isso, revela especial juízo de

reprovabilidade da conduta do acusado. Quanto às consequências, o

crime em análise impossibilitou que a administração pudesse fazer a

melhor escolha no que concerne à compra de equipamentos,

prejudicando assim a prestação de serviço essencial de saúde. Os 10 atos

de lavagem movimentaram o montante de R$ 441.335,67 (quatrocentos e

quarenta e um mil, trezentos e trinta e cinco reais e sessenta e sete

centavos). Assim, fixo a pena-base acima do mínimo legal, em 05 anos de

reclusão e 100 (cem) dias multa, fixado o valor unitário em 02 (dois)

salários mínimos, considerada a capacidade econômica do réu que, à

época e atualmente, ocupa funções de Deputado Federal. Não há

atenuantes. A agravante de que cuida o art. 61, II, do CP (abuso de poder

ou violação de dever inerente ao cargo) não será considerada porque a

condição de agente público foi considerada na fixação da pena-base. Em

razão da continuidade delitiva, majoro a reprimenda em 1/3 e torno

definitiva a pena em 06 (seis) anos e 08 (oito) meses de reclusão e 140

(cento e quarenta) dias multa. O regime inicial é o semi-aberto (art. 33, §

2º, b, do Código Penal).

48. O concurso material entre os crimes de corrupção passiva e

lavagem de dinheiro impõe a soma das penas aplicadas cujo resultado é

12 (doze) anos e 10 (dez) meses de reclusão e 360 (trezentos e sessenta)

dias multa. O regime inicial é o fechado (art. 33, § 2º, a, do Código Penal).

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49. Quanto à pena substitutiva de liberdade, verifico que embora o Réu

preencha os requisitos subjetivos que autorizam sua substituição, o

quantum da pena fixada a impede, de modo que deixo de operá-la.

50. Por fim, destaco inaplicável o disposto no artigo 33, § 4º do CP,

porquanto posterior à pratica das condutas.

51. Por fim, embora a jurisprudência do Tribunal se direcione no

sentido de caber à Casa Legislativa a decisão sobre a perda do mandato,

entendo que em se tratando de pena privativa de liberdade, em regime

fechado, por prazo superior ao restante para a conclusão do mandato, sua

perda se dá como resultado direto e inexorável da condenação, sendo a

decisão da Câmara dos Deputados vinculada e declaratória, na linha do

que afirmei no MS 32.326/DF, sob minha Relatoria.

52. É como voto.