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APLICAÇÃO DO MÉTODO DE ANÁLISE
ERGONÔMICA DO TRABALHO EM
UMA EMPRESA ALIMENTÍCIA DE
PEQUENO PORTE OBJETIVANDO
PROPOSTAS DE MELHORIA DAS
CONDIÇÕES DE TRABALHO
gabriela franco dos santos vasconcelos maciel (UFF )
NISSIA CARVALHO ROSA BERGIANTE (UFF )
Ramon Lopes do Nascimento (UFF )
Isadora Santos Jardim (UFF )
mariana navega custodio de souza (UFF )
O estudo analisa as questões ergonômicas de uma empresa alimentícia
de pequeno porte, lançando mão do método de Análise Ergonômica do
Trabalho (AET), a fim de identificar questões passíveis de melhoria no
que diz respeito à saúde do trabalhhador e, consequentemente, ao
funcionamento da organização como um todo. Através de entrevistas,
aplicação de questionários e observação da execução de atividades foi
possível propor soluções eficazes e que, ao mesmo tempo, respeitassem
as limitações de investimento de uma pequena empresa. Todo o estudo
foi pautado em conceitos e teorias da Ergonomia e os resultados
mostram que mudanças simples no ambiente de trabalho podem trazer
grandes benefícios para o trabalhador e para a empresa, aumentando
a sua produtividade, prevenindo doenças ocupacionais e, por
conseguinte, diminuindo os casos de absenteísmo e de afastamentos.
Palavras-chaves: Análise Ergonômica do Trabalho, indústria de
alimentos, ambiente de trabalho, saúde do trabalhador
XXXIII ENCONTRO NACIONAL DE ENGENHARIA DE PRODUCAO A Gestão dos Processos de Produção e as Parcerias Globais para o Desenvolvimento Sustentável dos Sistemas Produtivos
Salvador, BA, Brasil, 08 a 11 de outubro de 2013.
XXXIII ENCONTRO NACIONAL DE ENGENHARIA DE PRODUCAO A Gestão dos Processos de Produção e as Parcerias Globais para o Desenvolvimento Sustentável dos Sistemas Produtivos
Salvador, BA, Brasil, 08 a 11 de outubro de 2013.
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1. Introdução
O mundo corporativo se apresenta cada vez mais competitivo e, a fim de garantir espaço no
mercado, muitas empresas acabam por exigir demais de seus colaboradores sem lhes
proporcionar um ambiente de trabalho adequado. Assim, para que as atividades sejam
executadas no ritmo demandado, o trabalhador tem, muitas vezes, sua saúde, seja ela física
e/ou mental, prejudicada.
A Ergonomia, nesse contexto, se apresenta como peça fundamental para proporcionar um
ambiente de trabalho que atenda às necessidades do trabalhador. Segundo Abrahão e Pinho
(1999), uma das atribuições da ergonomia seria intervir em situações dos mais diversos tipos,
desde aquelas extremamente automatizadas, passando por questões referentes ao trabalho
manual, sem esquecer as que envolvem problemas de saúde, em particular, os decorrentes das
lesões por esforços repetitivos.
Apesar de toda legislação e tecnologia disponíveis atualmente, não é incomum encontrar
organizações, independente do seu porte, que deixam a desejar quando o assunto é segurança
e saúde ocupacionais. Para auxiliar as organizações a adequar o ambiente de trabalho de modo
a beneficiar o trabalhador, lança-se mão de ferramentas, tais como a Análise Ergonômica do
Trabalho (AET).
Para Bouyer (2007), o arcabouço ferramental trazido pela AET é de fundamental importância
para uma maior compreensão do objeto de análise ergonômica, a atividade, o trabalho e o
sujeito que exerce a ação. Daniellou (2004) vai ao encontro desta opinião reforçando que,
sendo uma atividade multidisciplinar, a ergonomia carece de um método ajustado que
propicie a geração de dados brutos para a análise.
O presente artigo tem por objetivo aplicar o método de Análise Ergonômica do Trabalho
(AET) em uma empresa alimentícia de pequeno porte, a fim de propor melhorias nas
condições de trabalho, através da adequação do ambiente laboral às características e
necessidades psicofisiológicas do trabalhador.
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2. Estudo ergonômico
Neste item, serão apresentados os conceitos mais relevantes da Ergonomia para o presente
estudo, além de proporcionar um melhor entendimento sobre o método de Análise
Ergonômica do Trabalho (AET).
2.1. Aspectos gerais da Ergonomia
A Ergonomia é uma área cujo estudo tem avançado significativamente ao longo dos anos,
porém seu uso e aplicação são ainda pouco conhecidos pela sociedade em geral, embora seja
de imensa relevância para o trabalhador e consequentemente para as organizações que o
emprega.
Conforme Lima (2003) aponta, a Ergonomia permite analisar a adaptação do trabalho ao
homem e, por isso, sua importância no que diz respeito ao ambiente moderno de trabalho.
Assim, essa ciência tem por objetivo, de acordo com Abrahão et al (2009), ajustar a atividade
às características peculiares do homem, tornando adequada e saudável a interação entre ele o
processo produtivo em que atua.
Segundo a ABERGO (Associação Brasileira de Ergonomia), sendo uma disciplina científica,
está “relacionada ao entendimento das interações entre os seres humanos e outros elementos
ou sistemas, e à aplicação de teorias, princípios, dados e métodos a projetos a fim de otimizar
o bem estar humano e o desempenho global do sistema”. Neste sentido, a sua dimensão
determina a possibilidade de ampliação da qualidade de vida do trabalhador e do bem/serviço
produzido.
Em função de sua aplicação, Lida (2005) classifica a Ergonomia como de concepção,
correção e conscientização. Como explicado pelo autor, a Ergonomia de concepção ocorre
quando a contribuição ocorre na fase inicial do projeto do produto, do processo ou do
ambiente, antes de sua implantação. Já a Ergonomia de correção ocorre quando a contribuição
se faz em situações já existentes, com o objetivo de solucionar desde problemas físicos até
psicológicos das pessoas através, por exemplo, do redesenho ou até substituição completa de
máquinas e de postos de trabalho. Por último, a Ergonomia de conscientização provém da
necessidade de atuação proativa dos próprios trabalhadores, a qual ocorre por meio de
capacitação dos mesmos para identificação e correção das situações enfrentadas.
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A Análise Ergonômica do Trabalho (AET), método este utilizado pelo presente trabalho, se
apresenta como uma ferramenta da Ergonomia de correção.
2.2. Análise Ergonômica do Trabalho (AET)
A Análise Ergonômica do Trabalho (AET) é uma das metodologias que busca estudar tanto a
dimensão explícita do trabalho (tarefa), quanto a sua dimensão implícita (atividade).
Destarte, a AET é de certa forma uma ferramenta estratégica, já que anseia não apenas
proporcionar conforto e segurança ao trabalhador, mas como resultado deste processo de
melhoria, torná-lo mais produtivo com o objetivo de aumentar a eficiência operacional,
reduzindo as perdas e, por conseguinte, gerando mais lucros (LIMA 2003). O método em
questão é constituído por um conjunto de etapas e ações, segundo Abrahão et al (2009), onde
as hipóteses são construídas, validadas ou refutadas ao longo do processo, o que permite
investigar o trabalho real do sujeito, respeitando a sua variabilidade, bem como da situação de
trabalho e dos instrumentos.
As fases constituintes da AET estão representadas na Figura 1.
Figura 1 – Etapas da AET
Fonte: Adaptado de Abrahão et al (2009)
Vale ressaltar que este é um método interativo, não sendo necessário cumprir rigorosamente a
linearidade apresentada. A complexidade do objeto de estudo determinará o andamento de
cada trabalho.
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3. Desenvolvimento do estudo
3.1. Metodologia utilizada
Neste presente estudo utilizou-se uma metodologia baseada na AET, visando ao entendimento
do trabalho realizado na empresa escolhida, à definição do diagnóstico ergonômico e à
proposição de melhorias para o ambiente de trabalho e, consequentemente, para a saúde do
trabalhador.
Primeiro, foi feito um levantamento geral a respeito da empresa com o próprio dono, que
também ocupa a posição de gerente e participa ativamente de todos os setores. Neste
momento, procurou-se entender as características da empresa, o contexto no qual se insere
juntamente com os seus principais processos, cargos e funções.
Em seguida, foi feita uma entrevista coletiva com todos os funcionários que trabalham na sede
da empresa. Tal interação ocorreu no próprio local de trabalho durante uma pausa autorizada
pelo gerente e buscou-se criar um ambiente agradável, de modo que os entrevistados se
sentissem a vontade. Durante a entrevista, levantou-se uma série de dados, como idade,
função, tempo de serviço, nível de escolaridade peso e altura; foi aplicado um questionário, o
qual se encontra em anexo; e também foi solicitado que eles preenchessem o diagrama de
áreas dolorosas (CORLETT; MANENICA, 1980), em anexo, objetivando identificar as partes
do corpo mais exigidas durante a atividade laboral.
Após entrevista, procurou-se observar na seção crítica, definida a partir das etapas anteriores,
o processo de trabalho, o deslocamento neste local, as posturas, as comunicações verbais e
gestuais, as ações efetuadas, as tomadas de decisão, dentre outros fatores.
A partir das informações obtidas nas etapas supracitadas, foi definido um diagnóstico e, então,
foram desenvolvidas propostas de melhoria.
3.2. Informações sobre a empresa
O estudo foi realizado em uma empresa alimentícia de pequeno porte, localizada na cidade de
São Gonçalo, Rio de Janeiro, Brasil. A principal linha de produtos da empresa diz respeito a
pastas a base de soja, a qual serviu como objeto de estudo.
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A crescente demanda por produtos a base de soja é uma característica do setor e se apresenta
como uma oportunidade de ampliação para os negócios da empresa. Por fim, destaca-se no
setor alimentício a forte dependência dos grandes supermercados, responsáveis pela maior
quantidade de vendas. Uma alternativa que já vem sendo adotada é a conquista de novos
clientes de menor porte e políticas de parcerias de longo prazo com os principais clientes.
3.3. População de trabalho da empresa
A empresa conta com 23 funcionários, os quais se encontram distribuídos nas áreas conforme
mostra o organograma na Figura 2. Como a empresa não possuía uma estrutura
organizacional formalizada, o grupo de estudo a fez a partir da análise dos cargos existentes e
suas respectivas funções desempenhadas.
Figura 2 – Organograma da empresa
Tendo realizado as entrevistas e aplicado os questionários, foi possível fazer um levantamento
de dados importantes dos funcionários da empresa. Vale ressaltar que alguns funcionários não
possuem a sede da empresa como local fixo de trabalho, como aqueles que trabalham com
distribuição e vendas, e, por isso, não participaram da entrevista nem responderam o
questionário.
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Quanto à faixa etária, a idade dos funcionários varia entre 20 e 56 anos, sendo que 70% dos
funcionários têm até 40 anos, como pode ser observado na Figura 3. O cargo de Auxiliar de
Produção inclui embalador, cozinheiro e envasador.
Figura 3 – Quantidade de funcionários por faixa etária
Ao calcular o índice de massa corpórea (IMC) se constatou que 65% dos funcionários estão
com o peso acima do recomendável, que segundo a Associação Brasileira para o Estudo da
Obesidade e da Síndrome Metabólica (ABESO) varia entre 18,5 e 24,9. Esta situação pode ser
resultado de uma má alimentação e pouca atividade física, mesmo observando-se uma
atividade laboral intensa.
Figura 4 – Índice de massa corpórea dos funcionários
Quanto ao grau de escolaridade, é exigido o segundo grau completo para os cargos de
produção, motorista e promotor, no entanto, algumas vezes é preciso abrir exceções para o
Representante Comercial
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pessoal da produção, desde que passem em um teste realizado na seleção. Para as funções de
expedição e armazenagem e para o auxiliar administrativo é exigido também conhecimento de
informática, o qual é avaliado por meio de treinamento. A escolaridade dos funcionários é
mostrada na Figura 5.
Figura 5 – Escolaridade dos funcionários
3.4. Dados gerais sobre a organização do trabalho
A jornada de trabalho na empresa é das 09h às 18h, tendo uma hora de almoço às 12h. A
organização pode ser dividida, para melhor entendimento, nos setores administrativo, estoque
e produção, os quais serão apresentado a seguir.
3.4.1. Setor administrativo
Este setor é responsável pelo recebimento dos pedidos e pelo faturamento dos mesmos. Conta
com apenas uma funcionária que realiza a maior parte dos procedimentos no computador. Ela
também é responsável por atender aos telefonemas.
Na entrevista, a funcionária se mostrou satisfeita com as atividades que executa, apesar de
ressaltar que o volume de trabalho aumentou cerca de três vezes ao longo dos dois anos que
está na empresa. Quanto ao posto de trabalho, houve algumas queixas. A cadeira, bastante
antiga, não é regulável e, por isso, gera desconforto e não há apoio para os pés. Também
houve queixa de dor nos olhos e nos pés. A temperatura às vezes incomoda quando o ar está
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regulado para temperaturas muito baixas, por volta dos 19ºC. O monitor tem altura regulável e
há apoio para os pulsos. Além disso, o ambiente apresenta iluminação satisfatória e não há
incidências de ruídos intensos.
3.4.2. Setor de estoque
Há um funcionário responsável pelo estoque que faz a verificação e a separação dos pedidos.
Ele também é responsável por levar os pedidos completos para o refrigerador com a ajuda de
um carrinho. Não há um limite de carga determinada para o funcionário carregar.
Na entrevista, o funcionário descreveu seu trabalho como bastante fácil e muitas vezes
monótono. Disse ser a sua primeira experiência de emprego formal e que o treinamento foi
feito com o um antigo funcionário da área. Conforme observado, o volume de produção não é
constante durante o dia e, com isso, não há necessidade de vários carregamentos de caixas até
o refrigerador. Segundo ele, no período próximo ao final do expediente há uma maior
agitação dos funcionários e ele tende a cometer mais erros. Essa agitação, de acordo com ele,
seria decorrente da afobação para terminar o trabalho mais rápido e poder ir embora.
Houve queixas relacionadas à iluminação do refrigerador, a qual está bem fraca, e com
relação à temperatura deste local, que é muito baixa. No estoque, ao contrário, costuma ser
quente e abafado. Não há incidência de ruídos intensos e, por trabalhar sozinho, não é comum
haver conversas.
3.4.3. Setor de produção
Neste setor, o treinamento que o funcionário novo recebe é dado pelos funcionários antigos,
ou seja, não há um responsável por isso e o aprendizado do funcionário é na prática. Todos
aprendem a executar todas as tarefas da linha de produção, o que possibilita a cooperação
entre eles. Com isso, quando um funcionário termina a execução de sua tarefa, ele ajuda o
funcionário daquele posto de trabalho que se encontra mais atarefado, adiantando o trabalho
de toda a equipe, pois os trabalhadores também são os responsáveis pela limpeza do ambiente
de trabalho no final do expediente. Para não saírem muito tarde, os trabalhadores tendem a
produzir o máximo que conseguirem durante a manhã, para que, caso cheguem novos pedidos
durante a tarde, eles possam produzir de modo que não atrapalhe o horário de saída.
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Ao longo de todo o processo produtivo, o qual é apresentado na Figura 6, todos os
trabalhadores do setor permanecem na posição em pé durante a maior parte da jornada de oito
horas de trabalho, o que acaba provocando dores nas costas e nas pernas.
Figura 6 – Processo produtivo da linha a base de soja
Como pôde ser visto, há um excesso de carga de trabalho, pois a quantidade de pedidos vem
aumentando e o número de funcionários se mantém o mesmo. Além disso, não há uma
distribuição uniforme de produção ao longo do dia, o que acaba sobrecarregando os
funcionários. Pode-se observar também que não há ventilação suficiente no setor, dentre
outros pontos que serão levantados mais adiante.
4. Definição e análise da situação crítica
A partir da análise realizada, foi definido como seção crítica o setor de produção, o qual
apresenta diversos fatores ergonômicos com potencial necessidade de melhoria e onde foram
reveladas queixas e reclamações entendidas como mais relevantes. Constatou-se sobrecarga
de trabalho dos funcionários; ausência de pausas para descanso; menos tempo do que devido
para realizar atividades fisiológicas, como ir ao banheiro; dores no corpo; e necessidade de
um ambiente mais confortável para pausas e almoço.
4.1. Observação sistemática da situação crítica
Foi observado que há execução de movimentos repetitivos dos membros superiores, o que
provoca desconforto nas mãos e nos pulsos dos trabalhadores. Também foi possível observar
a grande movimentação dos trabalhadores, inclusive para transportar as duas balanças digitais
existentes de um posto de trabalho para outro devido à quantidade insuficiente desses
instrumentos.
O levantamento de peso ocorre em algumas etapas do processo. A pessoa que cozinha a soja
necessita despejar os grãos cozidos da panela para a centrífuga, carga esta que contém cerca
de 30 quilos. O transporte do extrato de soja da centrífuga para o cutter, utilizado para triturar
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alimentos, também é feito manualmente pelo trabalhador que vai preparar a pasta. Após o
preparo da pasta, a mesma precisa ser levada do cutter para a envasadora, a qual fica
localizada a uma altura de 2,15 metros. Neste transporte, o peso da carga é de
aproximadamente 20 quilos e é realizado, em média, dez vezes ao dia. Ao final do dia alguns
dos equipamentos precisam ser levados até a pia para serem lavados e, segundo os
trabalhadores, eles são bastante pesados, no entanto, não foi possível mensurar esses pesos.
Quanto ao ambiente de trabalho, observou-se que, apesar dos ventiladores de teto instalados, a
temperatura próxima ao fogão é bastante elevada e a sensação térmica do trabalhador que
utiliza a envasadora também não é confortável, pois há grande incidência do sol em seu posto
de trabalho. Vale ressaltar que apenas três das seis bocas do fogão se encontravam em
funcionamento, sendo apenas uma em fogo alto, aumentando o tempo que o trabalhador
permanece à frente do fogão. Quanto ao ruído, quando a centrífuga e/ou o cutter estão
ligados, não é possível haver comunicação verbal entre os trabalhadores, os quais passam a
utilizar gestos. Inclusive não é possível escutar o alarme que sinaliza o término da atividade
do cutter.
A iluminação é satisfatória na maior parte do espaço utilizado, inclusive há bastante
incidência de luz natural, como dito anteriormente. Porém, sobre a pia, a qual é bastante
utilizada no final do dia para a lavagem de alguns equipamentos, essa iluminação não pareceu
ser suficiente. Vale lembrar que, infelizmente, pelos autores não possuírem instrumento de
medição adequado para verificar o fluxo luminoso, o luxímetro, não foi possível quantificar
tal variável.
As dimensões da fábrica facilitam a execução das tarefas, assim como a disposição e a altura
de máquinas e bancadas no setor de produção. Ademais, os funcionários fazem uso dos
seguintes equipamentos de proteção individuais (EPI): touca de cabelo, bota de borracha e
cano alto, máscara e luvas.
4.2. Caracterização da organização do trabalho
No processo de produção da linha de produtos a base de soja trabalham três funcionários. Um
é responsável por preparar a massa (fogão e centrífuga), outro por envasar, selar e colocar a
data de validade do produto, e o último coloca a tampa e embala em caixas com 12 potes.
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Esse terceiro funcionário, que está em treinamento, ainda não apresenta o ritmo de trabalho
exigido pela linha de produção.
O funcionário responsável pelo envase também cuida da manutenção dos equipamentos e faz
a inspeção de pesagem do produto após o envase.
As massas têm que ser feitas exatamente conforme a receita, mas os movimentos não são pré-
estabelecidos nem especificados em documentos de prescrição de trabalho.
4.3. As três dimensões da carga de trabalho
Identificaram-se as dimensões da carga de trabalho segundo a classificação de Wisner (1994).
A primeira delas é a carga física que está associada principalmente às queixas de cansaço e
dores nos pés, pernas, coluna, punhos e mãos, devido aos movimentos repetitivos, à alta carga
de trabalho e ao peso das cargas transportadas.
A segunda dimensão é de natureza cognitiva. Os funcionários memorizam uma série de
informações referentes à receita da pasta de soja, assim como normas de higiene e vigilância
sanitária, essenciais na fabricação de alimentos.
Quanto à dimensão psíquica, os funcionários se sentem sobrecarregados e pressionados a
nunca faltar ao trabalho, se atrasar ou sair mais cedo, o que implicaria no não recebimento da
cesta básica no fim do mês.
5. Propostas de melhoria
A partir da análise da demanda, das tarefas e das atividades e, por conseguinte, da definição
do diagnóstico, foi possível estabelecer uma série de melhorias não só para a seção crítica, a
qual foi estudada em maior profundidade, mas também para os demais setores. Buscou-se
considerar as limitações de investimento da organização, por ser uma empresa de pequeno
porte. A Tabela 1 traz as propostas de melhoria para a seção crítica.
Tabela 1 – Propostas de melhoria para a seção crítica
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Problemas identificados Diagnóstico Recomendações
Tempo excessivo em pé
Dores nas costas e
nas pernas,
sensação
prolongada de
cansaço
Duas pausas de 15 min
ao longo do dia, além de
1 hora para o almoço
Movimentos repetitivos
dos membros superiores
Fadiga e cansaço
corporal, dores nos
punhos e nos braços
Revisão do método de
realização das tarefas
Levantamento de peso
inadequado
Dores nos ombros e
nos punhos
Utilização de tubo já
existente na empresa
para levar pasta de soja
do cutter para
envasadora
Temperatura elevada
Sensação térmica
desconfortável,
provocando mal-
estar e até desmaio
Aumento do número de
exaustores e ventiladores
Fogão precário
Aumento do tempo
de execução das
atividades elevando
o desconforto
resultante da alta
temperatura
Aquisição de um novo
fogão ou uma
manutenção corretiva do
fogão existente
Ruído excessivo
Impossibilidade de
comunicação entre
os trabalhadores,
dificultando a
execução do
trabalho
Utilização de protetores
auriculares quando todas
as máquinas estiverem
ligadas e avisos
luminosos ao invés de
sonoros
Luminosidade
inadequada sobre a pia
Esforço excessivo
da vista
Iluminação mais intensa
sobre a pia
Quantidade insuficiente
de balanças precisas
Movimentação
desnecessária dos
funcionários e atraso
na execução de
tarefas
Aquisição de novas
balanças para agilizar as
etapas do processo
produtivo
6. Considerações finais
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Através do presente trabalho foi possível perceber que problemas ergonômicos são uma
realidade nas organizações, porém muitas vezes não são priorizados ou nem ao menos
conhecidos. Essa negligência gera uma série de consequências, tanto no que diz respeito à
saúde e segurança dos trabalhadores, quanto ao resultado esperado no produto ou serviço
produzido, além do aumento da possibilidade de perdas e aumento de custos ao longo do
processo produtivo.
O método de AET utilizado, dada a realização de entrevistas e aplicação de questionários, se
mostrou adequado para a observação, não apenas das questões relacionadas ao aspecto físico
e às condições de trabalho mas também problemáticas relacionadas à cognição do trabalhador
e sua forma de convivência com os demais. Ficou claro aos autores que o estudo dessas
questões é primordial para a ampliação do entendimento da atividade e dos elementos de
ordem emocional intrínsecos a ela, e que de tal modo são inerentes a qualquer ser humano ao
desempenhar sua atividade laboral.
De todo modo, mesmo com o planejamento do trabalho e a utilização das ferramentas aqui
descritas para realização do estudo, não foi possível quantificar todas as variáveis exploradas,
como o fluxo luminoso, a temperatura do ambiente e do ruído gerado pelas atividades
analisadas.
Entretanto, mesmo com estas limitações, o estudo mostrou que algumas variáveis do processo
produtivo precisam ser revistas e melhoradas de modo a proporcionar ao trabalhador um
ambiente mais favorável à realização das suas atividades diárias e, assim, aumentar a
produtividade de toda a equipe.
REFERÊNCIAS
ABERGO. O que é Ergonomia. Disponível em:
<http://www.abergo.org.br/internas.php?pg=o_que_e_ergonomia> Acesso em: 22 abril 2013.
ABESO. Calcule seu IMC. Disponível em: < http://www.abeso.org.br/calcule-seu-
imc.shtml> Acesso em: 22 abril 2013.
ABRAHÃO, J; PINHO, D. Teoria e prática ergonômica: seus limites e possibilidades.
Escola, Saúde e Trabalho: estudos psicológicos. Brasília: Editora Universidade de Brasília,
1999.
XXXIII ENCONTRO NACIONAL DE ENGENHARIA DE PRODUCAO A Gestão dos Processos de Produção e as Parcerias Globais para o Desenvolvimento Sustentável dos Sistemas Produtivos
Salvador, BA, Brasil, 08 a 11 de outubro de 2013.
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ABRAHÃO, J; SZNELWAR, L; SILVINO, A; SARMET, M; PINHO, D. Introdução à
Ergonomia: da prática à teoria. São Paulo, 2009.
BOUYER, G. C. A ciência ergonômica entre a epistemologização e a cientificidade. In:
ENCONTRO NACIONAL DE ENGENHARIA DE PRODUÇÃO, 27.2007, Foz do Iguaçu.
Anais... Foz do Iguaçu: PUC-PR, 2007.
CORLETT, E. N.; MANENICA, I. The effects and measurement of working postures.
Applied Ergonomics, v. 11, p. 7-16, 1980.
DANIELLOU, F. Introdução - questões epistemológicas acerca da ergonomia. In:
DANIELLOU, F. (Coord.). A ergonomia em busca de seus princípios: debates
epistemológicos. São Paulo: Edgard Blucher, 2004. p. 1-18.
LIDA I. Ergonomia Projeto e Produção. 2a edição revisada e ampliada. Editora EDGARD
BLÜCHER, 2005
LIMA, João. Metodologia de Análise Ergonômica. João Pessoa: UFPB, 2003. Monografia
(Especialização) – Departamento de Engenharia de Produção, Universidade Federal da
Paraíba, João Pessoa, 2003.
WISNER, A. Organização do Trabalho, carga mental e sofrimento psíquico. In: A
inteligência no Trabalho, São Paulo: Fundacentro, 1994.
ANEXO
Questionário
Nome: ___________________________________________________________________
Função e tempo de função: _________________________________________________
Estado Civil: __________________
Filhos: ________________
1) Conte-nos um pouco sobre o seu trabalho aqui:
* O que faz quando chega?
* Tem que preparar, limpar alguma máquina e/ou ferramenta?
* Quais são as máquinas e/ou ferramentas que utiliza?
* Quais são os movimentos que você faz?
* Há uma pausa durante o trabalho?
2) No primeiro dia de trabalho aqui, você tinha essa mesma função? Quem te ensinou? Havia regras
escritas ou alguém veio e te mostrou como fazia? Teve muita dificuldade? Qual foi sua primeira
impressão? O que mudou de lá pra cá?
3) Quanto tempo demora da sua casa aqui? Vem a pé?
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4) Quando tem dúvidas e/ou ocorre algum problema, a quem recorre? Você mesmo resolve?
5) Houve algum momento engraçado e/ou um aperto que já passou aqui na empresa? Pode ser durante
o expediente ou no caminho.
6) É comum erros repetitivos quando você está realizando o trabalho? Há algum período do dia que
isso mais ocorre?
7) Ao final do dia, qual a parte do seu corpo que você sente mais cansada?
8) Você considera que seu trabalho exige muito esforço de alguma parte do corpo específica: olhos,
pernas, braços, costas...
9) Como você avaliaria o nível de conforto visual do seu posto de trabalho, sendo 1 sem conforto e 4
muito confortável: _______
10) Como você avaliaria o nível de ruído do seu posto de trabalho, sendo 1 sem conforto e 4 muito
confortável: _______
11) Como você avaliaria o nível de conforto da temperatura em seu posto de trabalho, sendo 1 sem
conforto e 4 muito confortável: _______
12) Durante o ano, há períodos em que o nível de conforto da temperatura diminui? Explique:
13) Vocês trocam informações e/ou sugestões durante o trabalho ou cada um fica no seu posto quieto?
É comum momentos de descontração?
14) Vamos fazer de conta que o André foi viajar e te deu autonomia e dinheiro para poder alterar o seu
posto de trabalho, seja com novas ferramentas, máquinas, mobiliários, enfim, qualquer coisa. Quais
seriam as suas principais ações?
15) Agora, se tivesse que escolher apenas um setor na empresa toda e melhorá-lo, qual seria esse
setor? Por quê?
16) Sente falta de algum tipo de treinamento específico para a sua função ou para a fábrica como um
todo?
17) Vocês costumam a ficar até depois do horário?
18) Caso positivo, existe alguma remuneração por hora-extra?
19) Existe alguma hora de descanso, além da hora do almoço?
Diagrama de áreas dolorosas