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apostila concurso aeronáutica
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Vários autores
Sínteses pedagógicas e legislação
Compêndio de sínteses pedagógicas para
concursos públicos de professores
Tessa – manufatura de livros e e-books
Velhos conceitos que inovam
Pestalozzi
Acesse e conheça
http://tessaeditora.blogspot.com
Catalogação
Sínteses pedagógicas e legislação. Vários autores. Cravinhos:
Tessa,2011
Material de divulgação, distribuição gratuita.
DEVIDA EXPLICAÇÃO.
Esse material consiste em várias sínteses de obras pedagógicas
que eu venho acumulando e compartilhando com companheiros de
profissão. Nele também estão contidas algumas leis que sempre são
solicitadas em concursos públicos para professores.
Não detenho, de forma alguma, direitos autorais sobre esses
escritos. Por isso a distribuição é totalmente gratuita. Para a execução
desse compêndio, como resolvi chamar, eu diagramei, adaptei e reuni
vários materiais que estavam dispersos, os quais eu havia conseguido
gratuitamente em vários sites e blogs que os disponibilizaram na rede
e tentei fazer com que as letras e a distribuição fossem adequados
para leitura online. Ou seja, meu trabalho foi juntar tudo no intuito
de facilitar a leitura. Uma intenção antiga que se concretizou. Creio
que dessa forma quando formos estudar não precisaremos abrir vários
documentos.
Toda sugestão e acréscimo serão bem-vindos. De minha autoria
aqui tem apenas uma síntese. Conforme eu consigo novos materiais
ou faço novas sínteses acrescento e torno a disponibilizar na rede.
Boa parte do que aqui está foi conseguido via APEOESP
(Sindicato dos Professores do Estado de São Paulo), o qual
disponibiliza muitos materiais em seu site para ser baixado. Dentro
do possível eu cito o nome do autor e a fonte de onde eu tirei o
material, porém alguns não tinham nomes, outros foram enviados
para mim por e-mail. Diante disso, se algum escrito não estiver
creditado comunique-me que eu dou o crédito ao autor.
Se algum material aqui tiver protegido por direitos autorais me
comunique que eu o retiro. Reafirmo que minha intenção é
compartilhar materiais que eu recebi e compilei. A única coisa que
aqui pode me dar algum retorno é a divulgação do meu site/blog
Tessa – manufatura de livros e e-books. No qual eu também
disponibilizo muita coisa e tento, até agora sem resultados, vender
alguns livros que eu insisto em escrever.
Com altas considerações, Alexandre de Freitas.
Contatos:
ÍNDICE
História das ideias pedagógicas no Brasil, Demerval Saviani................5
Metáforas nova para reencantar a educação, Hugo Assmann..............19
O construtivismo em sala de aula, César Coll.......................................27
Formação docente e profissional – para a mudança e a incerteza, Francisco Imberón..................................................................................39
Ler e escrever na escola: o real , o possível, o necessário. Délia Lerner.......................................................................................................46
Formação social da mente, Vygotski.....................................................65
Bullyng e Desrespeito: como acabar com essa cultura na escola, Marie N. Beaudoin e Maureen Taylor..............................................................69
Estratégia de leitura. Isabel Solé.............................................................75
Aprender conteúdos e desenvolver capacidades; César Coll, Elena Martins e colaboradores.........................................................................89
O ensino na sociedade de conhecimento, Andy Hargreaver...............95
Avaliar para promover: setas do caminho, Jussara Hoffmann...........109
10 novas competências para ensinar, Philippe Perrenoud...................171
Para onde vai a educação, Jean Peaget.................................................192
Inclusão escolar – o que é? Por quê? como fazer? Cotidiano escolar, Maria Tereza Egler Mantoan.................................................................197
Artigo 5º da Constituição......................................................................200
Resolução nº 4 de 13 de julho de 2010. Define diretrizes curriculares nacionais gerais para educação básica..................................................213
Resulução nº 4 de 2 de outubro de 2009. Institui diretrizes operacionais para o atendimento educacional especializado na educação básica modalidade especial..................................................257
5
SÍNTESES PEDAGÓGICAS
História das ideias pedagógicas no Brasil
Demerval Saviani
Síntese elaborada pelo Prof. Alexandre de Freitas, graduado em Geografia pela Faculdade Dom
Bosco de Monte Aprazível e especialista em Cidadania e Cultura pela Unicamp. Professor de
Geografia efetivo no estado de São Paulo.
SAVIANI, Demerval. História das idéias pedagógicas no Brasil. 3ed.
Campinas: Autores Associados, 2010 (Coleção memória da educação)
Histórias das idéias pedagógicas no Brasil de Demerval Saviani,
em suas 474 páginas, trata-se de uma visão de conjunto das idéias
pedagógicas neste país desde o “descobrimento” no século XVI até o
início do século XXI. O livro foi estruturado em quatro períodos
subdivididos em fases. Primeiro período (1549-1759) monopólio da
vertente religiosa da pedagogia tradicional. Segundo período (1759-
1932) coexistência entre as vertentes religiosa e leiga. Terceiro período
(1932-1969) predomínio da pedagogia nova. Quarto período (1969-
2011) concepção pedagógica produtivista.
6
Primeiro período (1549-1759).
Nesta parte o autor destaca que com a chegado dos
portugueses no Brasil houve uma desestruturação de uma sociedade
indígena a qual não dispunha de instituições educacionais específicas
e organizadas para tal fim. O que havia até então era: a força da
tradição, a força da ação e a força do exemplo. Que caracterizava a
aprendizagem dos povos que viviam no Brasil.
Para que os portugueses pudessem governar houve, então, a
implantação de uma prática educativa que visava o domínio do
território brasileiro. Nessa fase o grande destaque se dá com a
educação promovida pelas ordens religiosas no Brasil.
Os jesuítas foram os principais responsáveis pela educação
neste período. Mas antes deles atuaram os franciscanos e os
beneditinos. Manoel da Nóbrega foi a responsável pela elaboração do
primeiro plano de instrução que consistia em três aspectos: a filosofia
da educação, a teoria da educação e os procedimentos de ensino para
a realização do trabalho educacional. E o padre Anchieta foi o
responsável as idéias educacionais em idéias pedagógicas adaptando
os métodos para atingir a finalidade, colaborou para isso o grande
domínio que o jesuíta tinha do idioma local e dos idiomas europeus,
em especial o português e o espanhol.
O método (modo) que se destacou neste primeiro período foi o
Ratio Studiorum, que pode ser considerado um plano de estudos da
Cia. de Jesus, o qual apresentava um código com 467 regras
distribuídas desde regras para o reitor até regras para bedel. Sobre o
Ratio Studiorum pode-se considerar suas origens remontam a
7
formação da Cia. de Jesus elaborada por Inácio de Loyola que
entraram em vigor em 1552. O caráter do plano contido neste método
era universalista e elitista. Pois era adotado por todos os jesuítas e
destinado aos filhos dos colonos e excluindo os indígenas.
No geral, a educação dos jesuítas estava mais ligada à Idade
Média do que a modernidade, defendiam a igreja católica da reforma
protestante para isso apoiavam-se na herança clássico-medieval. De
todo modo, incorporaram elementos próprios da época de
características renascentistas com destaque para a questão do livre-
arbítrio.
“Daí o fervor missionário, de caráter militante e combatente que moveu
os inacianos levando-os a considerar a cruz e a espada como faces de
uma mesma moeda. Para isso, certamente contribuiu a experiência
prévia e a mentalidade militar do fundador da Companhia de Jesus,
Inácio de Loyola.” (p. 59)
Segundo período (1759-1932).
Os jesuítas acumularam um grande patrimônio em prédios e
instalações em todo território brasileiro, latifúndios etc. Esse quadro,
dentre outros fatores, fez com que o os jesuítas se indispusessem com
a coroa. Agora a educação passa para o controle do Marquês de
Pombal.
O Marquês de Pombal pretende modernizar o Estado português
com a implantação dos ideais iluministas com base no nas
concepções do Século das Luzes. Pombal promove a reforma dos
estudo menores, correspondente ao ensino primário e secundário e
8
dos estudos maiores, que corresponde aos estudos superiores. Neste
último destaca-se as mudanças na Universidade de Coimbra.
Toda reforma promovida pelo Marquês de Pombal estava centrada
com o desenvolvimento da sociedade portuguesa nos moldes do
capitalismo e com referência em países como a Inglaterra.
Essas mudanças atingiram o Brasil a princípio com concurso
para cadeiras de latim e retórica e dos primeiros professores régios em
Pernambuco. As aulas régias foram estabelecidas sob precária
condições salários de professores reduzidos e falta de pagamento.
O funcionamento dessas aulas não impediu que funcionassem
colégios de ordens religiosas no Brasil, sendo que algumas dessas
instituições foram criadas nos moldes da reforma pombalina. O
Convento Santo Antônio no Rio de Janeiro e o Seminário de Olinda
são exemplos. Com destaque para esse último, que foi considerado o
melhor colégio secundarista do Brasil na época.
Abaixo as características básicas da reforma pombalina.
“a) estatização e secularização da administração do ensino
concentrando a gerência de todos os assuntos ligados à instrução na
figura do diretor-geral de Estudos (...)
b) estatização e secularização do conteúdo do magistério, organizando
exames de estado conduzidos pela Diretoria-geral dos Estudos como
mecanismo de controle e condição de exercício docente (...)
c) estatização e secularização do conteúdo do ensino que passou a ser
controlado pela Real Mesa Censória mediante a censura de livros,
antes exercida pelo Santo Ofício e obrigando os professores a
9
encaminhar relatórios das atividades por eles realizadas, assim como
do desempenho de seus alunos, (...)
d) estatização e secularização da estrutura organizacional dos estudos
mediante a criação de aulas régias de primeiras letras e de
humanidades mantidas pelo Estado com recurso provenientes do
‘Subsídio Literário’, criado especificamente por esse fim;
e) estatização e secularização dos estudos superiores por meio de uma
ampla e profunda reforma da Universidade de Coimbra.” (pp. 113-114)
Portugal assistiu nestes períodos o avanço do mercantilismo
inglês, a Revolução Industrial promovida neste país e a Revolução
Francesa na França. Portuga torou-se dependente da Inglaterra e
tinha como moeda de troca apenas suas colônias.
No início do século XIX vários processos político-econômicos
colaboraram com a “independência” do Brasil. A primeira
constituição previa uma comissão para especial para Instrução
Pública no Brasil para atender a necessidade da população.
Começa aí a concepção de escola laica formulada pela burguesia
e pela elite que esteve á frente do movimento de independência.
Condorcet, citado no livro, esclarece que a instrução se faz necessário
porque evitar o erro é uma condição essencial da liberdade.
A educação também deverá ser pública pois que diz respeito ao
exercício da soberania e é uma questão de liberdade pública e não de
liberdade privada. Sem a qual a população não pode exercer a
soberania. No entanto, todo esse projeto não vigorou, visto que Dom
Pedro I dissolveu a Assembleia Constituinte em 12 de novembro. Era
10
um conteúdo em sintonia com o que havia de moderno em vários
países.
Durante o segundo período surgiram várias ideias pedagógicas,
em 1826 o problema da instrução pública foi novamente colocado em
pauta e o ensino foi distribuído em quatro graus: 1º pedagogias, 2º
liceus, 3º ginásio e 4º academias.
Por volta de meados do século XIX surge a obrigatoriedade do
ensino com as idéias pedagógicas de Couto Ferraz. Estipula-se multas
de 20 mil a 100 mil réis aos pais ou responsáveis por crianças de mais
de 7 anos que a elas não possibilitem frequentar o ensino elementar.
Leôncio de Carvalho dá continuidade à reforma de Couto
Ferraz, com algumas diferenças. Rompe com a reforma anterior ao
regulamentar o funcionamento das Escolas Normais e fixa no
currículo a nomeação dos decentes, prevê a criação de jardins de
infância para crianças entre 3 e 7 anos, subvenção ao ensino
particular, regulamentação do ensino superior, etc.
Ainda podemos destacar neste período o desenvolvimento de escolas
particulares, uma quantidade significativa de páginas são dedicadas
ao Barão de Macahubas, pessoa que atuou significativamente na
política e na educação brasileira na segunda metade do século XIX.
A instrução pública neste período se explica parcialmente
devida às características da economia cafeeira, a qual precisava de
pessoas capazes de exercer atividades no comércio. Dessa forma, a
elite que comandava a produção do café tinha que ter à disposição
uma classe de pessoas capazes de executar tarefas para as quais a
instrução era pré-requisito.
11
A instrução popular foi mantida com a proclamação da
república, agora sob a responsabilidade das antigas províncias que
tornaram-se estados. Em 1890, Benjamin Constant realizou uma
reforma nos ensinos primário e secundário, ela pretendia conciliar o
estudos literários com os científicos e foi duramente criticada, até
mesmo pelos adeptos do positivismo.
Em boa parte do século XIX foram realizadas tentativas de
organização prática de um sistema educacional no Brasil, foi
detectado que se precisaria de grandes investimentos financeiros, o
que não aconteceu. No segundo reinado a média anual de
investimento em educação foi de 1,8% do orçamento do governo
imperial.
O autor constata que as dificuldades para a implantação de um
sistema educacional integrado parte de problemas como a falta de
estruturas materiais e na mentalidade pedagógica. Então acontece
que:
“(...) o caminho da implantação dos respectivos sistemas nacionais de
ensino, por meio do qual os principais países do Ocidente lograram
universalizar o ensino fundamental e erradicar o analfabetismo, não foi
trilhado pelo Brasil. E as consequências desse fato projetam-se ainda
hoje, deixando-nos um legado de agudas deficiências no que se refere ao
atendimento das necessidades educacionais do conjunto da população.”
(p. 168)
No período republicano nota-se a influência do positivimo e
abolicionismo nas ideias pedagógicas. Nas primeiras décadas do
12
século XX discute-se a extensão universal da educação por meio do
Estado, a educação seria um instrumento de participação política.
A criação da Associação Brasileira de Educação em 1924 deu
impulso a concepção humanista moderna de filosofia. As idéias
anarquistas e socialistas também se fizeram presentes na primeira
metade do século XX. Onde para muitas vertentes:
“A educaç~o ocupava posiç~o central no ide|rio libert|rio e
expressava-se num duplo e concomitante movimento: a crítica à
educação burguesa e a formulação da própria concepção pedagógica
que se materializava na criaç~o de escolas autônomas e autogeridas.”
(p. 182).
Terceiro período (1932-1969).
O Brasil se modificou significativamente a partir de 1930, pode-
se dizer que ele começa a caminhar para se tornar um país urbano-
industrial. Isso reflete na educação.
Quando Vargas chega ao poder em 1930, uma das primeiras
medidas foi criar o Ministério da Educação e Saúde Pública. A
Reforma Francisco Campos baixou um conjunto de decretos que
mexem plenamente com a educação no Brasil. Em síntese, os decretos
regulamentam dos diversos níveis de educação a partir de um poder
central. O ensino religioso foi pela primeira vez instituído no país,
isso prova o atendimento de uma reivindicação católica, pois a igreja
vinha se mostrando descontente com os rumos da educação para
todos.
13
No geral, esse período mostra-nos um predomínio da pedagogia
nova no Brasil. Sendo que entre os anos de 1932 e 1947 houve um
equilíbrio entre a pedagogia nova e a pedagogia tradicional.
Várias publicações nas primeiras décadas do século XX apontam
para uma clara tendência às ideias da escola nova. Lourenço Filho foi
um grande nome dessa escola pedagógica, seus escritos foram
publicados em sucessivas edições até meados do século XX. Além
desse estudioso, destacam-se os nomes de Fernando de Azevedo que
participou intensamente do campo educacional do Brasil. Integrou o
grupo que criou a Sociedade de Educação de São Paulo foi ele que
implantou a reforma da escola única entendida como uma educação
inicial obrigatória e gratuita. Segue-se como nome importante nome
da educação no período Anísio Teixeira, para esse pensador “(...) a
educação aparecia como elemento-chave no processo revolucionário.”
Ainda segundo Anízio Teixeira o Estado tinha que abandonar o papel
de espectador assumindo o papel de regulador, um pensamento
tipicamente Keynesiano.
Sobre as ideias pedagógicas nesse período o chamado Manifesto
dos Pioneiros da Educação Nova nos dá bons indicadores do que
vinha a ser a Educação Nova no Brasil. No documento enfatiza-se a
necessidade de romper com a estrutura tradicional que marca o
divórcio entre o ensino primário e profissional, de um lado, e o ensino
superior, de outro, característica que formava um estanque
concorrendo para a estratificação da sociedade. A proposta era um
sistema orgânico com uma escola primário organizada sobre a base
das escolas maternais e jardins de infãncia , tudo articulado com a
escola secundária possibilitando o acesso ao ensino superior.
14
Rompe-se também com a excessiva formação literária e dá
ênfase a um caráter predominantemente científico e técnico o qual
vincula a escola ao meio social produtivo. Porém, não nega os valores
da literatura.
A predominância da Pedagogia Nova se dá entre 1947 e 1961,
uma época de guerra fria, de ideias comunistas, de conflitos entre
escola particular e pública e de reações da igreja católica. A ponto de:
“(...) na medida em que a pedagogia nova foi ampliando sua influência,
também foi sendo modificada a sua relação com a pedagogia católica.
Alis, a visão dos católicos não se resumiu a um puro e exclusivo
confronto, inteiramente irredutível, com a pedagogia nova. Mesmo os
mais acerbos críticos da Escola Nova não deixaram de reconhecer
pontos de convergência.” (p.299)
A Pedagogia Nova começa a entrar em crise em 1961, surgem
novos teóricos e começa a articulação da Pedagogia Tecnicista.
A cultura popular e a educação popular ganham força, o
desenvolvimento nacional e a política populista colaboram com essa
tendência. Surgem campanhas de erradicação de analfabetismo,
campanhas para construção de prédios públicos, campanha para
extensão da escolaridade, etc.
O autor frisa que o significado de popular por volta da década
de 1960 é diferente daquele do significado que possuía no século XIX.
Lá popular coincidia com instrução pública com a implantação de
escolas primárias numa tentativa de erradicar o analfabetismo, em
meados do século XX popular refere-se à participação política das
massas com tomada de consciência da situação brasileira, a educação
15
é um instrumento de conscientização. Paulo Freire e sua Pedagogia
Libertadora teve uma grande influência nesse período.
A Pedagogia Tecnicista encera o terceiro período abordado no
livro. E reaparece com maiores e mais profundas abordagens na parta
parte. Nessa pedagogia o investimento em educação tinha que
colaborar com o aumento da produtividade e da renda, dessa forma o
ensino médio deveria ser profissionalizante e os cursos superiores
deveriam ter foco na formação tecnológica com empresas.
Para Saviani:
“Pedagogicamente, a perspectiva eu orientava a execução do Programa
pode ser definida como tecnicista, evidenciada na ênfase nos métodos e
técnicas de ensino, na projeção de filmes didáticos confeccionados nos
Estados Unidos e na valorização dos recurso audiovisuais que os
bolsistas deveriam aprender não apenas a utilizar, mas também a
produzir.” ( 346)
Era um a pedagogia objetiva, operacional e neutra. O trabalho
pedagógico tinha que primar pela objetividade.
Quarto período (1969-2011)
Nessa última parte as tendências pedagógicas apresentam ideias
e fases de transição entre a pedagogia tecnicista, a pedagogia crítica e
a pedagogia contra-hegemônicas.
Com a pedagogia1 crítica vem à tona a ideia da escola como
aparelho ideológico do Estado. Intelectuais brasileiros se
1 Para o autor essa visão (crítica-produtivista) não é uma pedagogia mas sim teoria. Destaca ainda que
toda pedagogia é teoria da educação mas nem toda teoria da educação é pedagogia.
16
empenharam em denunciar essa posição pedagógica, que era a
utilização da educação por setores dominantes da sociedade através
de regimes autoritários. Para essa pedagogia:
“A visão crítico-reprodutivista desempenhou, pois, um papel
importante na década de 70. Suas análises constituíram-se em armas
teóricas utilizadas para fustigar a plítica educacional do regime militar,
que era uma política de ajustamento da escola utilizada como
instrumento de controle da sociedade visando a perpetuar as relações
de dominação vigentes.” (p. 397)
Em síntese, a teoria crítico-reprodutivista criticava a hegemonia
que foi instalada na sociedade capitalista.
Finalizando as abordagens do livro, entre os anos de 1980 até
1991 vê-se muitas tendências e ideias pedagógicas. As quais tiveram
influência da abertura política e de muitas publicações acadêmico-
científicas.
As chamadas pedagogias contra-hegemônicas são as seguintes:
a) Pedagogia da educação popular – inspirada na concepção
libertadora advogavam a organização junto aos movimentos
populares;
b)Pedagogia prática – formulavam propostas de inspiração libertária,
com certas tendência anarquista, trabalhavam com o conceito de
classe;
c) Pedagogia crítico-social dos conteúdos – o pensador que se destaca
nessa pedagogia é Carlos Libâneo, inspira-se no marxismo e objetiva
17
a democratização da escola pública e o papel essencial é difundir
conteúdos vivos, concretos, indissociáveis das realidade sociais;
d) Pedagogia histórico-crítica – é tributária da concepção dialética,
em especial na versão do materialismo histórico tendo afinidade nas
bases psicológicas com a psicologia histórico-cultural de Vigotski.
Nos anos entre 1991 e 2001 surge o neoprodutivismo com suas
vertentes neoescolanovismo, neoconstrutivismo e neotecnicismo.
O cenário econômico desse período é o do neoliberalismo
econômico em clima pós-moderno. Nesse contexto nota-se a
importância da educação na formação de trabalhadores capazes de
serem flexíveis com preparo polivalente e se apoiando no domínio de
conceitos gerais e abstratos.
O conhecido lema aprender a aprender tem bases na escola
nova onde se referia a adquirir a capacidade de buscar conhecimento
por si mesmo para poder se adaptar numa sociedade que era
entendida como um organismo em que cada indivíduo tinha um
lugar. Agora, o entendimento está ligado à necessidade de constantes
atualizações exigidas pelas necessidades de cada vez mais ampliar a
esfera da empregabilidade.
Na conclusão dessa parte o autor fala-nos sobre um processo
que estamos passando inegavelmente na educação, trata-se da
inclusão excludente. A qual para Saviani:
“ (...) manifesta-se no terreno produtivo como um fenômeno de
mercado. Trata-se das diferentes estratégias que conduzem à exclusão
do trabalhador do mercado formal, seguida de sua inclusão na
18
informalidade ou reinclusão no próprio mercado formal. Os
mecanismos utilizados são a dispensa do trabalhador, que, assim,
perde todos os direitos trabalhistas e previdenciários. Excluído, esse
trabalhador só pode voltar a ser incluído nas seguintes circunstâncias:
com carteira assinada, mas com diminuição de salário e de direitos;
como empregado de empresa terceirizada. Ou trabalhando para a
mesma empresa, porém na informalidade. Eis aí a inclusão includente.”
E no terreno educativo também vemos que:
“(...) a estratégia consiste em incluir estudantes no sistema escolar em
cursos de diferentes níveis e modalidades sem os padrões de qualidade
exigidos para o ingresso no mercado de trabalho. Essa forma de
inclusão melhora as estatísticas educacionais porque permite
apresentar números que indicam a ampliação do atendimento escolar
se aproximando da realização de metas como a universalização do
acesso ao ensino fundamental. No entanto, para atingir essas metas
quantitativas, a política educacional lança mão de mecanismos como a
divisão do ensino em ciclos, a progressão continuada, as classes de
aceleração que permitem às crianças e aos jovens permanecerem um
número maior de anos na escola, sem o correspondente efeito da
aprendizagem efetiva. Com isso, embora incluídas no sistema escolar,
essas crianças e esses jovens permanecem excluídos do mercado de
trabalho e da participação ativa na vida da sociedade. Consumando-se,
desse modo, ‘inclusão excludente.” (p. 442)
19
ASSMANN, Hugo. Metáforas novas para reencantar a educação - epistemologia e didática.
Piracicaba: Unimep, 2001. Fonte: Revista da Apeoesp. As partes e negritos e a os demais destaques do texto são dos autores das sínteses.
Palavras chaves do autor: reencantamento, aprendente,
acessamento, esperançador, sobrante
O autor inicia sua obra analisando os vários aspectos
importantes relacionados com a qualidade cognitiva e social da
educação.
Ele afirma que o processo educacional, a melhoria pedagógica e
o compromisso social têm que caminhar juntos, e que um bom ensino
da parte dos docentes não é sinônimo automático de boa
aprendizagem por parte dos alunos, ou seja, que há uma
pressuposição equivocada de que uma boa pedagogia se resume num
bom ensino.
Este explica que a escola não deve ser concebida como simples
agência repassadora de conhecimentos prontos, mas como contexto e
De acordo com o autor é imprescindível melhorar qualitativamente o ensino
nas suas formas didáticas e na renovação e atualização constante dos conteúdos.
Ele define que educar não é apenas ensinar, mas criar situações de aprendizagem
nas quais todos os aprendentes possam despertar, mediante sua própria
experiência do conhecimento.
20
clima organizacional propício à iniciação em vivências
personalizadas do aprender a aprender. A flexibilidade é um
aspecto cada vez mais imprescindível de um conhecimento
personalizado e de uma ética social democrática.
Sociedade aprendente
Fala-se muito em sociedade do conhecimento e agora também em
sociedade aprendente. É importante saber decodificar criticamente e
encarar positivamente o desafio pedagógico expressado numa série de
novas linguagens.
Toda educação implica doses fortes de instrução, entendimento
e manejo de regras, e reconhecimento de saberes já acumulados pela
humanidade. Essa instrução não é o aspecto fundamental da
educação, já que este reside nas vivências personalizadas de
aprendizagem que obedecem à coincidência básica entre processos
vitais e processos cognitivos.
No mundo atual, o aspecto instrucional da educação já não
consegue dar conta da profusão de conhecimentos disponíveis e
emergentes, mesmo em áreas específicas. Portanto, não deveria
preocupar-se tanto com a memorização dos saberes instrumentais,
privilegiando a capacidade de acessá-los, decodificá-los e manejá-los.
O aspecto instrucional deveria estar em função da emergência do
aprender, ou seja, da morfogênese personalizada do conhecimento.
Isso pode ser ilustrado, com a visão da
memória como um processo dinâmico.
21
O reencantamento da educação requer a união entre
sensibilidade social e eficiência pedagógica. O compromisso ético-
político do/a educador/a deve manifestar-se primordialmente na
excelência pedagógica e na colaboração para um clima esperançador
no próprio contexto escolar.
Na segunda parte do livro, Assman (2001) fala da pós-
modernidade e a globalização do mercado.
O objetivo desta reflexão é buscar a ponte entre pós-
modernidade/pós-modernismo e didática. O pós-moderno é uma
certa valorização da razão lúdica. Por algo a teoria de jogos é parte
substancial da engenharia de sistemas cognitivos complexos. O pós-
moderno é também um convite a relaxar, a não se levar tão a sério.
O pós-modernismo é,sem dúvida, a denúncia das fissuras da
racionalidade moderna, mas é também a tentativa de reintroduzir a
lógica nebulosa nas práticas culturais.
O marco referencial do debate pós-modernista, embora
importante, é insuficiente para discutir e encarar os novos desafios da
educação na situação pós-moderna. O debate pós-modernista
geralmente não consegue sair do meio-de-campo, confuso e
embolado, da crise das ciências humanas e sociais, onde o que mais se
escuta são lamúrias nostálgicas em relação a redenções falidas.
É preciso substituir a pedagogia das certezas e dos saberes pré-
fixados por uma pedagogia da pergunta, do melhoramento das perguntas e
do acessamento de informações. Em pedagogia da complexidade, que saiba
trabalhar com conceitos transversais, abertos para a surpresa e o imprevisto.
22
Em meio ao acirramento competitivo, planetariamente
globalizado, a educação se confronta como desafio de unir
capacitação competente com formação humana solidária, já que hoje
a escola incompetente se revela como estruturalmente reacionária por
mais que veicule discursos progressistas. Juntar as duas tarefas –
habilitação competente e formação solidária – ficou sumariamente
difícil, porque a maioria das expectativas do meio circundante
(mercado competitivo) se volta quase que exclusivamente para a
demanda da eficiência (capacidade competitiva).
O ciclo que termina concentrou-se, por décadas, no aumento
quantitativo da oferta escolar. Escolas por todo lado, tendência à
universalização do acesso à escola enquanto espaço disponível. Nisso
houve bastante êxito. A ênfase prioritária dessa fase (aumento
quantitativo) sobrevive como um eco interpelativo no mote: educação
para todos.Agora, , a ênfase se desloca do quantitativo para o
qualitativo. Daí o exuberante discurso sobre a qualidade, inscrito no
que se passou a chamar nova estratégia educacional.
A preocupação por atender, em termos quantitativos, a
demanda reprimida, ou nem sequer ativada, permanece. Argumenta-
se que faltou, no ciclo anterior, o vínculo dessa expansão escolar com
as exigências de modernização do processo produtivo, especialmente
em dois aspectos:1. aquisição de um colchão básico de competências
flexíveis e multi-adaptáveis e
2. concentração no eixo científico técnico, que se diz estar
comandando a dinâmica dos ajustes requeridos para o crescimento
econômico.
23
Cobra-se a ponte entre a escola e uma capacitação básica e flexível
diante de um mercado de trabalho cada vez mais exigente no que se
refere à versatilidade adaptativa do trabalhador e ao
acompanhamento atualizado dos avanços científico-técnicos.
Destacam-se cidadania competitiva e criatividade produtiva. Não há
como ignorar que, nessa proposta, há muitos aspectos irrecusáveis,
assim como os há carregado de ambigüidade.
Na quarta parte, o autor discorre sobre a qualidade vista desde
o pedagógico, afirmando que no futuro ninguém sobreviverá, em
meio à competitividade crescente do mercado, sem uma educação
fundamental que lhes entregue os instrumentos para a satisfação de
suas necessidades básicas de aprendizagem no que se refere a
competências mínimas e flexíveis. No fundo, é a isso que se refere à
questão da qualidade. E é também para isso que convergem os
interesses, ainda rudimentares e confusos, que setores do
empresariado começam a demonstrar numa verdadeira
universalização da educação básica.
Algumas manobras poderosas já acontecem para instaurar uma
verdadeira cruzada em favor da educação pela/para a qualidade, e até
se chega a falar, pomposamente, em pedagogia da qualidade, mesmo
havendo muitos que persistem em ignorar o fato, ou o têm como
insignificante, ou, ainda o consideram, um banal modismo
passageiro.
As linguagens sobre qualidade funcionam, hoje, como território
ocupado. Muitos ainda não se deram conta do fato de que o discurso
sobre a qualidade se encontra, agora, aprisionado dentro de um
24
campo de significação bem determinado. E, pelo menos por algum
tempo, não será fácil arrancá-lo de lá e libertá-lo para outros sentidos.
O núcleo do processo pedagógico deve ser localizado nas
experiências do prazer de estar conhecendo, nas experiências de
aprendizagem que são vividas como algo que faz sentido para as
pessoas envolvidas e é humanamente gostoso, embora possa implicar
também árduos esforços.
Assim, para refletir sobre a qualidade de um processo educativo,
nossa atenção deveria voltar-se, antes de tudo, para o problema
seguinte: como criar melhores situações de aprendizagem, melhores
contextos cognitivos, melhor ecologia cognitiva e melhores interações
geradoras da vibração biopsicoenergética do sentir-se como alguém
que está aprendendo.
Na quinta e última parte, o autor, relaciona a questão da
cidadania com a exclusão social. Ele diz que o maior desafio ético da
atualidade é, sem dúvida, a presença de uma estarrecedora lógica da
exclusão do mundo de hoje. Grandes contingentes da população
mundial passam ao rol de “massa sobrante” e faltam as decisões
políticas necessárias para uma efetiva dignificação de suas vidas.
O fascínio e a manipulabilidade da linguagem sobre a cidadania
faz com que ninguém dê mostras de querer desistir dela.
Não basta melhorar a qualidade do ensino, a questão de fundo é
melhorar a qualidade das experiências de aprendizagem.
25
Cidadania não pode significar mera atribuição abstrata, ou
apenas formalmente jurídica, de um conjunto de direitos e deveres
básicos, comuns a todos os integrantes de uma nação, mas deve
significar o acesso real, em juridicamente exigível, ao exercício efetivo
desses direitos e ao cumprimento desses deveres. Não há cidadania
sem a exigibilidade daquelas mediações históricas que lhe confira
conteúdo no plano da satisfação das necessidades e dos desejos,
correspondentes àquela noção de dignidade humana que seja
estendível a todos num contexto histórico determinado.
A mediação histórica fundamental da cidadania básica é o
acesso seguro aos meios para uma existência humana digna. Daí a
correlação estreita entre cidadania e trabalho (no sentido de emprego
justamente remunerado) na visão até hoje comum dessa temática.
Para o trabalhador e seus dependentes, a cidadania se alicerça no
direito ao trabalho.
CONCLUSÃO
O livro é um conjunto de reflexões integradas e direcionadas
aos vários aspectos que possam interferir na qualidade do processo
educacional.
Assman, (2001), demonstra uma série de descobertas
fascinantes acerca de como se dá a experiência do conhecimento na
a questão do emprego, de todos os modos, permanece como um dos
elos básicos entre cidadania e lógica da exclusão
26
vida das pessoas. Ele fundamenta a convicção de que hoje estamos em
condições de entender melhor a relação indissolúvel entre processos
vitais e processos de conhecimento, não apenas no sentido do ditado
“vivendo e aprendendo”, mas num sentido mais profundo que nos
leva a compreender que a própria vida se constitui intrinsecamente
mediante processos de aprendizagem.
Ao longo do livro Assman (2001) mostra que a complexidade
deve transformar-se num principio pedagógico pela simples razão de
que, os docentes devem estar atentos às formas complexas que
assumem na vida dos aprendentes, essa relação intrínseca entre os
processos vitais e processos do conhecimento. Nesta perspectiva
acredita-se em reformas curriculares no ensino universitário
brasileiro, que efetivamente possam contribuir com a formação
de profissionais.
27
COLL, César e outros. O construtivismo na sala de aula. São Paulo: Ática, 2006. Fonte: Revista da Apeoesp. Autor da síntese: Jeferson Anibal Gonzalez, Pedagogo
(FFCLRP/USP) e Mestrando em Educação (FE/UNICAMP). Membro do Grupo de
Estudos e Pesquisas “História, Sociedade e Educaç~o no Brasil” – HISTEDBR
(GT/UNICAMP).
1. Os professores a e concepção construtivista (Isabel Solé e César
Coll)
O construtivismo não é uma teoria, e sim uma referência
explicativa, composta por diversas contribuições teóricas, que auxilia
os professores nas tomadas de decisões durante o planejamento,
aplicação e a avaliação do ensino. Ou seja, o construtivismo não é
uma receita, um manual que deve ser seguido à risca sem se levar em
conta as necessidades de cada situação particular. Ao contrário, os
profissionais da educação devem utilizá-lo como auxílio na reflexão
sobre a prática pedagógica; sobre o como se aprende e se ensina,
considerando-se o contexto em que os agentes educativos estão
inseridos. Essas afirmações demonstram a necessidade de se
compreender os conteúdos da aprendizagem como produtos sociais e
culturais, o professor como agente mediador entre indivíduo e
sociedade, e o aluno como aprendiz social.
Tendo em vista uma educação de qualidade, entendida como
aquela que atende a diversidade, o processo educativo não é
responsabilidade do professor somente. Desse modo, o trabalho
coletivo dos professores, normas e finalidades compartilhadas, uma
direção que tome decisões de forma colegiada, materiais didáticos
28
preparados em conjunto, a formação continuada e a participação dos
pais são pontos essenciais para a construção da escola de qualidade.
A instituição escolar é identificada pelo seu caráter social e
socializador. É por meio da escola que os seres humanos entram em
contato com uma cultura determinada. Nesse sentido, a concepção
construtivista compreende um espaço importante à construção do
conhecimento individual e interação social, não contrapondo
aprendizagem e desenvolvimento. Aprender não é copiar ou
reproduzir, mas elaborar uma representação pessoal da realidade a
partir de experimentações e conhecimentos prévios. É preciso
aprender significativamente, ou seja, não apenas acumular
conhecimentos, mas construir significados próprios a partir do
relacionamento entre a experiência pessoal e a realidade. A pré-
existência de conteúdos confere certa peculiaridade à construção do
conhecimento, que deve ser entendida como a atribuição de
significado pessoal aos conteúdos concretos, produzidos
culturalmente.
Pensando especificamente o trabalho do professor, o
construtivismo é uma concepção útil à tomada de decisões
compartilhadas, que pressupõe o trabalho em equipe na construção
de projetos didáticos e rotinas de trabalho. Por fim, é importante
ressaltar que o construtivismo não é um referencial acabado, fechado
a novas contribuições; sua construção acontece no âmbito da situação
de ensino/aprendizagem e a ela deve servir.
29
2. Disponibilidade para a aprendizagem e sentido da
aprendizagem (Isabel Solé)
A aprendizagem é motivada por um interesse, uma necessidade de
saber. Mas o que determina esse interesse, essa necessidade? Não é
possível elaborar uma única resposta a essa questão. No entanto, um
bom caminho a seguir é compreender que além dos aspectos
cognitivos, a aprendizagem envolve aspectos afetivo-relacionais. Ao
construir os significados pessoais sobre a realidade, constrói-se
também o conceito que se tem de você mesmo (autoconceito) e a
estima que se professa (auto-estima), características relacionadas ao
equilíbrio pessoal. O autoconceito e a auto-estima influenciam a
forma como o aluno constrói sua relação com os outros e com o
conhecimento; reconhecer essa dimensão afetivo-relacional é
imprescindível ao processo educativo.
Em relação à motivação para conhecer, é necessário
compreender a maneira como alunos encaram a tarefa de estudar,
que pode ser dividida em dois enfoques: o enfoque profundo e o
enfoque superficial. No enfoque profundo, o aluno se interessa por
compreender o significado do que estuda e relaciona os conteúdos
aos conhecimentos prévios e experiências. Já no enfoque superficial, a
intenção do aluno limita-se a realizar atarefas de forma satisfatória,
limitando-se ao que o professor considera como relevante, uma
resposta desejável e não a real compreensão do conteúdo. Importante
ressaltar que o enfoque com que o aluno aborda a tarefa pode variar;
dessa forma, o enfoque profundo pode ser a abordagem de uma
relação a uma tarefa e o enforque superficial em relação a outras pelo
mesmo aluno. A inclinação dos alunos para um enfoque ou outro vai
30
depender, dentre outros fatores, da situação de ensino da qual esse
aluno participa. Entretanto, o enfoque profundo pode ser trabalhado
com os alunos de maneira intencional. Para isso, é preciso conhecer
as características da tarefa trabalhada, o que se pretende com
determinado conteúdo e a sua necessidade. Tudo isso demanda
tempo, esforço e envolvimento pessoal.
Outro ponto importante a ser ressaltado é que o professor, ao
entrar numa sala de aula, carrega consigo certa visão de mundo e
imagem de si mesmo, que influenciam seu trabalho e sua relação com
os alunos. Da mesma forma, os alunos constroem representações
sobre seus professores. Reconhecer esses aspectos afetivos e
relacionais é fundamental para motivação e interesse pela construção
de conhecimento, tendo em vista que o autoconceito e a auto-estima,
ligados às representações e expectativas sobre o processo educativo,
possuem um papel mediador na aprendizagem escolar.
As interações, no processo de construção de conhecimento,
devem ser caracterizadas pelo respeito mútuo e o sentimento de
confiança. É a partir dessas interações, das relações que se
estabelecem no contexto escolar, que as pessoas se educam. Levar isto
em consideração é compreender o papel essencial dos aspectos
afetivo-relacionais no processo de construção pessoal do
conhecimento sobre a realidade.
3. Um ponto de partida para a aprendizagem de novos
conteúdos: os conhecimentos prévios (Mariana Miras)
Quando se inicia um processo educativo, as mentes dos alunos
não estão vazias de conteúdo como lousas em branco. Ao contrário,
quando chegam à sala de aula os alunos já possuem conhecimentos
31
prévios advindos da experiência pessoal. Na concepção construtivista
é a partir desses conhecimentos que o aluno constrói e reconstrói
novos significados.
Identificam-se alguns aspectos globais como elementos básicos
que auxiliam na determinação do estado inicial dos alunos: a
disposição do aluno para realizar a tarefa proposta, que conta com
elementos pessoais e interpessoais com sua auto-imagem, auto-
estima, a representação e expectativas em relação à tarefa a ser
realizada, seus professores e colegas; capacidades, instrumentos,
estratégias e habilidades compreendidas em certos níveis de
inteligência, raciocínio e memória que possibilitam a realização da
tarefa.
Os conhecimentos prévios podem ser compreendidos como
esquemas de conhecimento, ou seja, a representação que cada pessoa
possui sobre a realidade. É importante ressaltar que esses esquemas
de conhecimento são sempre visões parciais e particulares da
realidade, determinadas pelo contexto e experiências de cada pessoa.
Os esquemas de conhecimento contêm, ainda, diferentes tipos de
conhecimentos, que podem ser, por exemplo, de ordem conceitual
(saber que o coletivo de lobos é alcatéia), normativa (saber que não se
deve roubar), procedimental (saber como se planta uma árvore).
Esses conhecimentos são diferentes, porém não devem ser
considerados melhores ou piores que outros.
Para o ensino coerente, é preciso considerar o estado inicial dos
alunos, seus conhecimentos prévios e esquemas de conhecimentos
construídos. Esse deve ser o início do processo educativo: conhecer o
que se tem para que se possa, sobre essa base, construir o novo.
32
4. O que faz com que o aluno e a aluna aprendam os conteúdos
escolares? A natureza ativa e construtiva do conhecimento
(Teresa Mauri)
Entre as concepções de ensino e aprendizagem sustentadas
pelos professores, destacam-se três, cada uma considerando que
aprender é:
1) Conhecer as respostas corretas: Nessa concepção entende-se que aprender significa responder satisfatoriamente as perguntas formuladas pelos professores. Reforçam-se positivamente as respostas corretas, sancionando-as. Os alunos são considerados receptores passivos dos reforços dispensados pelos professores.
2) Adquirir os conhecimentos relevantes: Nessa concepção, entende-se que o aluno aprende quando apreende informações necessárias. A principal atividade do professor é possuir essas informações e oferecer múltiplas situações (explicações, leituras, vídeos, conferências, visitas a museus) nas quais os alunos possam processar essas informações. O conhecimento é produto da cópia e não processo de significação pessoal.
3) Construir conhecimentos: Os conteúdos escolares são aprendidos a partir do processo de construção pessoal do mesmo. O centro do processo educativo é o aluno, considerado como ser ativo que aprende a aprender. Auxiliar a construção dessa competência é o papel do professor.
A primeira concepção está ligada às concepções tradicionais,
diferenciada em relação às duas restantes por enfatizar o papel
supremo do professor na elaboração das perguntas. As outras duas
concepções, pelo contrário, ocupam-se de como os alunos adquirem
conhecimentos; no entanto, entendem de formas diferentes esse
processo.
33
Compreendendo-se que aprender é construir conhecimentos,
identifica-se a natureza ativa dessa construção e a necessidade de
conteúdos ligados ao ato de aprender conceitos, procedimentos e
atitudes. Nesse sentido, é preciso organizar e planejar
intencionalmente as atividades didáticas tendo em vista os conteúdos
das diferentes dimensões do saber: procedimental (como a
observação de plantas); conceitual (tipos e parte das plantas); e
atitudinal (de curiosidade, rigor, formalidade, entre outras). O
trabalho com esses conteúdos demonstra a atividade complexa que
caracteriza o processo educativo, trabalho que demanda o
envolvimento coletivo na escola.
5. Ensinar: criar zonas de desenvolvimento proximal e nelas
intervir (Javier Onrubia)
O ensino na concepção construtivista deve ser entendido como
uma ajuda ao processo de ensino-aprendizagem, sem a qual o aluno
não poderá compreender a realidade e atuar nela. Porém, deve ser
apenas ajuda porque não pode substituir a atividade construtiva do
conhecimento pelo aluno.
A análise aprofundada do ensino enquanto ajuda leva ao
conceito de “ajuda ajustada” e de zona de desenvolvimento proximal
(ZDP). No conceito de “ajuda ajustada” observa-se que o ensino,
enquanto ajuda o processo de construção do conhecimento, deve
ajustar-se a esse processo de construção. Para tanto, conjuga duas
grandes características: 1) a de levar em conta os esquemas de
conhecimento dos alunos, seus conhecimentos prévios em relação aos
conteúdos a serem trabalhados; 2) e, ao mesmo tempo, propor
desafios que levem os alunos a questionarem esses conhecimentos
34
prévios. Ou seja, não se ignora aquilo que os alunos já sabem, porém
aponta-se para aquilo que eles não conhecem, não realizam ou não
dominam suficientemente, incrementando a capacidade de
compreensão e atuação autônoma dos alunos.
O conceito de zona de desenvolvimento proximal (ZDP) foi
proposto pelo psicólogo soviético L. S. Vygotsky, partindo do
entendimento de que as interações e relações com outras pessoas são
a origem dos processos de aprendizagem e desenvolvimento humano.
Nesse sentido, a ZDP pode ser identificada como o espaço no qual,
com a ajuda dos outros, uma pessoa realiza tarefas que não seria
capaz de realizar individualmente. A contribuição do conceito de ZDP
está relacionada à possibilidade de se especificar as formas em aula,
ajudando os alunos no processo de significação pessoal e social da
realidade.
Para o trabalho com os conceitos acima arrolados, indicam-se
os seguintes pontos: 1) Inserir atividades significativas na aula; 2)
Possibilitar a participação de todos os alunos nas diferentes
atividades, mesmo que os níveis de competência, conhecimento e
interesses forem diferenciados; 3) Trabalhar com as relações afetivas e
emocionais; 4) Introduzir modificações e ajustes ao logo da
realização das atividades; 5) Promover a utilização e o
aprofundamento autônomo dos conhecimentos que os alunos estão
aprendendo; 6) Estabelecer relações entre os novos conteúdos e os
conhecimentos prévios dos alunos; 7) Utilizar linguagem clara e
objetiva evitando mal-entendidos ou incompreensões; 8)
Recontextualizar e reconceitualizar a experiência.
35
Trabalhar a partir dessas concepções caracteriza desafios à
prática educativa que não está isenta de problemas e limitações. No
entanto, entende-se que esse esforço, mesmo que acompanhado de
lentos avanços, é decisivo para a aprendizagem e o desenvolvimento
das escolas e das aulas.
6. Os enfoques didáticos (Antoni Zabala)
A concepção construtivista considera a complexidade e as
distintas variáveis que intervêm nos processos de ensino na escola.
Por isso, não receita formas determinadas de ensino, mas oferece
elementos para a análise e reflexão sobre a prática educativa,
possibilitando a compreensão de seus processos, seu planejamento e
avaliação.
Um método educacional sustenta-se a partir da função social
que atribui ao ensino e em determinadas idéias sobre como as
aprendizagens se produzem. Nesse sentido, a análise das tarefas que
propõem e conteúdos trabalhados, explícita ou implicitamente
(currículo oculto), requer a compreensão do determinante ideológico
que embasam as práticas dos professores. A discriminação tipológica
dos conteúdos, ou seja, a análise dos conteúdos trabalhados segundo a
natureza conceitual, procedimental ou atitudinal, mostra-se como
importante instrumento de entendimento do que acontece na sala de
aula.
Outro instrumento importante para a compreensão do processo
educativo é a concepção construtivista da aprendizagem, que
estabelece a aprendizagem como uma construção pessoal que o aluno
realiza com a ajuda de outras pessoas; processo que necessita da
36
contribuição da pessoa que aprende, implicando o interesse,
disponibilidade, conhecimentos prévios e experiência; implica
também a figura do outro que auxilia na resolução do conflito entre
os novos saberes e o que já se sabia, tendo em vista a realização
autônoma da atividade de aprender a aprender.
O problema metodológico para o fazer educativo não se
encontra no }mbito do “como fazemos”, mas antes na compreens~o
do “que fazemos” e “por quê”. Na elaboraç~o das sequências did|ticas
que devem auxiliar a prática educativa deve-se levar em consideração
os objetivos e os meios que se tem para facilitar o alcance desses
objetivos.
7. A avaliação da aprendizagem no currículo escola: uma
perspectiva construtivista (César Coll e Elena Martín)
A questão da avaliação do processo educativo tem sido muito
discutida. Com o desenvolvimento de propostas teóricas,
metodológicas e instrumentais, expressões e conceitos como o de
avaliação inicial, formativa e somatória povoam o vocabulário
educacional. Junto a isso, construiu-se o consenso de que não se deve
avaliar somente o aluno, mas também a atuação do professor, o
planejamento de atividades e também sua aplicação. No entanto,
muitas questões ainda se encontram sem respostas e se configuram
como desafios aos envolvidos com o tema.
Uma primeira questão a ser levantada é a relação entre a
avaliação e uma série de decisões relacionadas a ela, como promoção,
atribuição de crédito e formatura de alunos. Essas decisões não fazem
parte, em sentido estrito, do processo de avaliação, porém essas
decisões devem ser coerentes com as avaliações realizadas. O desafio
37
é alcançar a máxima coerência entre os processos avaliativos e as
decisões a serem tomadas.
Todo processo avaliativo deve levar em conta os elementos
afetivos e relacionais da avaliação. Desse modo, o planejamento das
atividades avaliativas parte do entendimento de que o aluno atribui
certo sentido a essa atividade, sentido que depende da forma como a
avaliação lhe é apresentada e também de suas experiências e
significações pessoais e sociais da realidade. É preciso levar em conta
também o caráter sempre parcial dos resultados obtidos por meio das
avaliações, devido à complexidade e diversificação das situações de
aprendizagem vivenciadas pelos alunos. Assim, as práticas avaliativas
privilegiadas devem ser aquelas que consideram a dinâmica dos
processos de construção de conhecimentos.
Ao contrário das concepções que buscam neutralizar as
influências do contexto nos resultados das avaliações, a concepção
construtivista ressalta a necessidade de considerar as variáveis
proporcionadas pelos diversos contextos particulares. Para isso,
recomenda-se a utilização de uma gama maior possível de atividades
de avaliação ao longo do processo educativo.
Partindo da consideração que é na prática que se utiliza o que se
aprende, um dos critérios, que devem ser levantados nas atividades
avaliativas, é o menor ou maior valor instrumental das aprendizagens
realizadas, ou seja, em que grau pode-se utilizar o que se aprendeu, o
que se construiu na significação dos saberes. Na medida em que
aprender a aprender significa a capacidade para adquirir, de forma
autônoma, novos conhecimentos, avaliar os aspectos instrumentais, é
de suma importância a qualidade da educação.
38
Por fim, ressalta-se a necessidade da abordagem da avaliação
em estreita ligação com o planejamento didático e o currículo escolar.
Dessa forma, “o quê”, “como” e “quando” ensinar e avaliar se unem
configurando uma prática educativa global, na qual as atividades
avaliativas não estão separadas das demais atividades de construção
de conhecimento pelos alunos.
39
FORMAÇÃO DOCENTE E PROFISSIONAL – FORMAR-SE PARA A MUDANÇA E A
INCERTEZA.
Imbernón, Francisco.
Resumo.
Fonte: http://decampinasleste.edunet.sp.gov.br/gabinete/formacaodocente.htm
A necessária redefinição da docência como profissão.
Passamos a pensar a educação como uma demanda que se aproxime mais dos aspectos éticos, coletivos, comunicativos, comportamentais, emocionais, dentre outros, todos eles necessários para se alcançar uma educação democrática dos cidadãos.
Essa necessária renovação da instituição educativa e esta nova forma de educar requerem uma redefinição importante da profissão docente e que se assumam novas competências profissionais no quadro de um conhecimento pedagógico, científico e cultural revistos. Em outras palavras, a nova era requer um profissional da educação diferente.
Hoje, a profissão já não é a transmissão de um conhecimento acadêmico ou a transformação do conhecimento comum do aluno em um conhecimento acadêmico. A profissão exerce outras funções: motivação, luta contra a exclusão social, participação, animação de grupos, relações com estruturas sociais, com a comunidade...E é claro que tudo isso requer uma nova formação: inicial e permanente.
Essa formação assume um papel que transcende o ensino que pretende uma mera atualização científica, pedagógica e didática e se transforma na possibilidade de criar espaços de participação, reflexão e formação para que as pessoas aprendam e se adaptem para poder conviver com a mudança e a incerteza.
Então como fica a questão do conhecimento do professor?
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O professor possui conhecimentos objetivos e subjetivos; A aquisição de conhecimentos por parte do professor é um
processo amplo e não linear; A aquisição de conhecimentos por parte do professor está
muito ligada à prática profissional e condicionada pela organização da instituição educacional em que esta é exercida;
A aquisição de conhecimentos por parte do professor é um processo complexo, adaptativo e experiencial.
Podemos concluir que:
A educação democrática precisa de outras instâncias de socialização que ampliem seus valores. Para tanto, é necessária uma reestruturação das instituições educativas;
Rejeitar a visão de um ensino técnico, como transmissão de um conhecimento acabado e formal, propondo um conhecimento em construção e não imutável, que analisa a educação como um compromisso político cheio de valores éticos e morais;
Os docentes precisam desenvolver capacidades de aprendizagem da relação, da convivência, da cultura do contexto e de interação de cada pessoa com o resto do grupo, com seus semelhantes e com a comunidade que envolve a educação;
A formação assume um papel que vai além do ensino que pretende uma mera atualização científica, pedagógica e didática e se transforma na possibilidade de criar espaços de participação, reflexão e formação para que as pessoas aprendam e se adaptem para poder conviver com a mudança.
Inovação educativa e profissão docente.
É interessante analisar a relação entre inovação educativa e profissão docente. Entendida como pesquisa educativa na prática, a inovação requer novas e velhas concepções pedagógicas e uma nova cultura profissional forjada nos valores da colaboração e do progresso social, considerado como transformação educativa e social.
41
O professor não deveria ser um técnico que desenvolve ou implementa inovações prescritas, mas deveria converter-se em um profissional que deve participar ativa e criticamente no verdadeiro processo de inovação e mudança, a partir de e em seu próprio contexto, em um processo dinâmico e flexível.
Tudo isso implica considerar o professor como um agente dinâmico cultural, social e curricular, capaz de tomar decisões educativas, éticas e morais, de desenvolver o currículo em um contexto determinado e de elaborar projetos e materiais curriculares com a colaboração dos colegas, situando o processo em um contexto específico controlado pelo próprio coletivo.
No entanto a instituição educativa, como conjunto de elementos que intervêm na prática educativa contextualizada, deve ser o motor da inovação e da profissionalização docente.
O debate sobre a profissionalização docente.
Ser um profissional, implica dominar uma série de capacidades e habilidades especializadas que nos fazem ser competentes e em um determinado trabalho, além de nos ligar a um grupo profissional organizado e sujeito a controle. (Schön, 1992).
O conceito de profissão não é neutro nem científico, mas é produto de um determinado conteúdo ideológico e contextual; uma ideologia que influencia a prática profissional já que as profissões são legitimadas pelo contexto. Ser um profissional da educação significa participar nas emancipações das pessoas. O objetivo da educação é ajudar a tornar as pessoas mais livres, menos dependentes do poder econômico, político e social.
O conhecimento profissional docente.
A profissão docente comporta um conhecimento pedagógico específico, um compromisso ético e moral e a necessidade de dividir a responsabilidade com outros agentes sociais, já que exerce influência sobre outros seres humanos e, portanto, não pode nem deve ser uma profiss~o meramente técnica de “especialistas infalíveis” que transmitem unicamente conhecimentos acadêmicos.
42
O conhecimento pedagógico comum existe logicamente na estrutura social, integra o patrimônio cultural de uma sociedade determinada e se transfere para as concepções dos professores.
A competência profissional necessária em todo processo educativo, será formada em última instância na interação que se estabelece entre os próprios professores, interagindo na prática de sua profissão. Nas próximas décadas, a profissão docente deverá desenvolver-se em uma sociedade em mudança, com um alto nível tecnológico e um vertiginosos avanço do conhecimento.
A profissão docente diante dos desafios da chamada sociedade globalizada, do conhecimento ou da informação.
É preciso desenvolver novas práticas alternativas baseadas na verdadeira autonomia e colegialidade como mecanismos de participação democrática da profissão que permitam vislumbrar novas formas de entender a profissão, revelar o currículo oculto das estruturas educativas e descobrir outras maneiras de ver a profissão docente, o conhecimento profissional necessário, a escola e sua organização educativa.
Um fator importante na capacitação profissional é a atitude do professor ao planejar sua tarefa docente não apenas como técnico infalível e sim como facilitador de aprendizagem, como um prático reflexivo, capaz de provocar a cooperação e participação dos alunos.
A formação do professor deveria basear-se em estabelecer estratégias de pensamento, de percepção, de estímulos e centrar-se na tomada de decisões para processar, sistematizar e comunicar a informação.
O desenvolvimento profissional do professor não é apenas o desenvolvimento pedagógico, o conhecimento a compreensão de si mesmo, o desenvolvimento cognitivo ou teórico, mas tudo isso ao mesmo tempo delimitado ou incrementado por uma situação profissional que permite ou impede o desenvolvimento de uma carreira docente.
A formação permanente do professor.
A formação deve apoiar-se em uma reflexão dos sujeitos sobre sua prática docente, de modo a lhes permitir examinar sua teorias
43
implícitas, seus esquemas de funcionamento, suas atitudes, etc., realizando um processo constante de auto-avaliação que oriente seu trabalho.
A formação permanente deve estender-se ao terreno das capacidades, habilidades e atitudes e questionar permanentemente os valores e as concepções de cada professor e da equipe como um todo.
Essa formação consiste em descobrir, organizar, fundamentar, revisar e construir a teoria. Se necessário, deve-se ajudar a remover o sentido pedagógico comum, recompor o equilíbrio entre os esquemas práticos predominantes e os esquemas teóricos que os sustentam.
Uma formação deve propor um processo que confira ao docente conhecimentos, habilidades e atitudes para criar profissionais reflexivos e investigadores. O eixo fundamental do currículo de formação do professor é o desenvolvimento de instrumentos intelectuais para facilitar as capacidades reflexivas sobre a própria prática docente, cuja meta principal é aprender a interpretar, compreender e refletir sobre a educação e a realidade social de forma comunitária.
A formação permanente do professor experiente.
O contato com a prática educativa enriquece o conhecimento profissional com outros âmbitos: moral e ético (por todas as características políticas da educação); tomada de decisões (discernimento sobre o que deve ser feito em determinadas situações: disciplina, avaliação, seleção, habilitação...).
A formação permanente deve ajuda o professor a desenvolver um conhecimento profissional que lhe permita: avaliar a necessidade potencial e a qualidade da inovação educativa que deve ser introduzida constantemente nas instituições; desenvolver habilidades básicas no âmbito das estratégias de ensino em um contexto determinado, do planejamento, do diagnóstico e da avaliação; proporcionar as competências para ser capazes de modificar as tarefas educativas continuamente, numa tentativa de adaptação à diversidade e ao contexto dos alunos e comprometer-se com o meio social.
É preciso revisar criticamente os conteúdos e os processos da formação permanente do professor para que gerem um conhecimento
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profissional ativo e não passivo, e não dependente de um conhecimento externo nem subordinado a ele.
Formação do professor e qualidade de ensino.
A escola deve deixar de ser “um lugar”, para ser uma manifestaç~o de vida em toda sua complexidade, em toda sua rede de relações e dispositivos com uma comunidade educativa, que mostra um modo institucional de conhecer e de querer ser.
O conceito de qualidade educativa não é estático, não há consenso sobre seu significado nem existe um modelo único, já que depende da idéia de formação e de ensino que se tem. Durante muito tempo, e pelo fato de provir do mundo da produção, a qualidade foi interpretada como conceito absoluto, próximo ás dimensões de inato e de atributo de um produto.
Hoje em dia há o risco de se fazer uma análise simples e linear, devido aos condicionantes de intencionalidade, de contexto, de interesses e de valores que constituem o significado da qualidade e das expectativas que suscitam.
A qualidade da instituição educativa depende da qualidade dos alunos por meio de suas contribuições à sociedade, da qualidade do que se aprendeu e da forma de aprendê-lo.
É preciso desenvolver novas formas de linguagem e, sobretudo, práticas críticas alternativas que permitam desvelar o currículo oculto da organização e descobrir outras maneiras de ver o mundo, a escola e sua organização.
Não é de admirar que nos últimos tempos não apenas o professor, mas também as instituições educacionais passem uma sensação de desorientação que faz parte da confusão que envolve o futuro da escola e o grupo profissional.
Os sistemas tendem a burocratizar-se, impondo modelos mais intervencionistas e formalizados, dificultando a autonomia e a democracia real e obstaculizando os processos de formação colaborativos.
Os processos de formação devem analisar os elementos que desqualificam para, a partir dos próprios grupos de professores,
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estabelecer mecanismos de reajuste profissional e para que suas atuações não se limitem apenas às salas de aula e às escolas, já que a profissionalização e o desenvolvimento profissional do grupo estão vinculados também as causas profissionais e sociais que devem ser abordadas em diversos âmbitos.
Um novo conceito de formação traz consigo um conceito de autonomia na colegialidade, e a autonomia de cada um dos professores só é compatível se for vinculada a um projeto comum e a processos autônomos de formação e desenvolvimento profissional, a um poder de intervenção curricular e organizativo, enfim, a um compromisso que transcenda o âmbito meramente técnico para atingir os âmbitos pessoal, profissional e social.
Para concluir o autor coloca que o processo de ancoragem do conhecimento teórico que apoia a prática educativa é o que pode favorecer uma melhor interpretação do ensino e da aprendizagem, e a aquisição de maior autonomia profissional.
Por isso, a formação deve aproximar-se da prática educativa, no interior das instituições educativas. O contato da formação com a prática educativa faz com que o conhecimento profissional se enriqueça com outros âmbitos: moral e ético, além de permitir que se fomente a análise e a reflexão sobre a prática educativa, tentando uma recomposição deliberativa dos esquemas, concepções e crenças que o conhecimento pedagógico tem sobre o ensino e a aprendizagem. Permitiria trabalhar em benefício do professor e da educação da humanidade.
46
LERNER, Délia. Ler e escrever na escola: o real,
o possível, o necessário. Porto Alegre: Artmed,
2002.
Fonte: Revista da Apeoesp.
Introdução
Embora seja difícil e demande tempo, a escola necessita de trans-
formações profundas no que concerne ao aprendizado da leitura e da
escrita, que só serão alcançadas através da compreensão profunda de
seus problemas e necessidades, para que então seja possível falar de
suas possibilidades.
Capítulo 1
Ler e Escrever na Escola: O Real, o Possível e o Necessário
Aprender a ler e escrever na escola deve transcender a decodificação
do código escrito, deve fazer sentido e estar vinculado à vida do
sujeito, deve possibilitar a sua inserção no meio cultural a qual
pertence, tornando-o capaz de produzir e interpretar textos que
fazem parte de seu entorno.
Torna-se, então, necessário reconceitualizar o objeto de ensino
tomando por base as práticas sociais de leitura e escrita,
ressignificando seu aprendizado para que os alunos se apropriem dele
'como práticas vivas e vitais, em que ler e escrever sejam instrumentos
poderosos que permitam repensar o mundo e reorganizar o próprio
pensamento, e em que interpretar e produzir textos sejam direitos que é
legítimo exercer e responsabilidades que é necessário assumir'.
47
Para tornar real o que compreendemos ser necessário, é preciso co-
nhecer as dificuldades que a escola apresenta, distinguindo as
legítimas das que fazem parte de 'resistências sociais' para que então
se possa propor soluções e possibilidades.
A tarefa é difícil porque, a própria especificidade do
aprendizado da leitura e da escrita que se constituem em construções
individuais dos sujeitos agindo sobre o objeto (leitura e escrita) torna
a sua escolarização difícil, já que não são passíveis de se submeterem
a uma programação sequencial. Por outro lado, trata-se de práticas
sociais que historicamente foram, e de certo modo continuam sendo,
patrimônio de certos grupos, mais que de outros, o que nos leva a
enfrentar e tentar buscar caminhos para resolver as tensões existentes
na instituição escolar entre a tendência à mudança (democratização
do ensino) e a tendência à conservação (reprodução da ordem social
estabelecida).
É difícil ainda, porque o ato de ensinar a ler e escrever na escola
tem finalidade puramente didática: a de possibilitar a transmissão de
saberes e comportamentos culturais, ou seja, a de preservar a ordem
preestabelecida, o que o distancia da função social que pressupõe ler
para se comunicar com o mundo, para conhecer outras possibilidades
e refletir sobre uma nova perspectiva.
É difícil também, porque a estruturação do ensino conforme um
eixo temporal único, segundo uma progressão linear acumulativa e
irreversível entra em contradição com a própria natureza da
aprendizagem da leitura e da escrita que, como vimos, ocorre por
meio de aproximações do sujeito com o objeto, provocando
48
coordenações e reorganizações cognitivas que lhe permite atribuir
um novo significado aos conteúdos aprendidos.
E, finalmente, a necessidade da escola em controlar a
aprendizagem da leitura
faz com que se privilegie mais o aspecto ortográfico do que os
interpretativos do ato de ler, e o sistema de avaliação, no qual cabe
somente ao docente o direito e o poder de avaliar, não propicia ao
aluno a oportunidade de autocorreção e reflexão sobre o seu trabalho
escrito, e conseqüentemente, não contribui para a construção da sua
autonomia intelectual.
Diante desses fatos, o que é possível fazer para que se possa conciliar
as necessidades inerentes à instituição escolar e, ao mesmo tempo,
atender as necessidades de formar leitores e escritores competentes
ao exercício pleno da cidadania?
Em primeiro lugar devem se tornar explícitos aos profissionais
da educação os aspectos implícitos nas práticas educativas que estão
acessíveis graças aos estudos sociolinguísticos, psicolinguísticos,
antropológicos e históricos, ou seja, aqueles que nos mostram como a
criança aprende a ser leitora e escritora; o que facilita ou quais são as
prerrogativas essenciais a esse aprendizado.
Em segundo lugar, é preciso que se trabalhe com projetos como
ferramenta capaz de articular os propósitos didáticos com os
comunicativos, já que permitem uma articulação dos saberes sociais e
os escolares. Além disso, o trabalho com projetos estimula a
aprendizagem, favorece a autonomia, pois envolve toda a classe, e
49
evita o parcelamento do tempo e do saber, já que tem uma aborda-
gem multidisciplinar.
"É assim que se torna possível evitar a justaposição de
atividades sem conexão - que abordam aspectos também sem
conexão com os conteúdos -, e as crianças tem oportunidade de
ter acesso a um trabalho suficientemente duradouro para resolver
problemas desafiantes, construindo os conhecimentos necessários
para isso, para estabelecer relações entre diferentes situações e
saberes, para consolidar o aprendido e reutilizá-lo... ".(p.23).
Finalmente, é possível repensar a avaliação, sabendo que esta é neces-
sária, mas que não pode prevalecer sobre a aprendizagem. Segundo a
autora, 'ao diminuir a pressão do controle, torna-se-se possível avaliar
aprendizagens que antes não ocorriam [...]' porqueno trabalho com
projetos, os alunos discutem suas opiniões, buscam informações que
possam auxiliá-los e procuram diferentes soluções, fatores
importantíssimos a formação de cidadãos praticantes da cultura
escrita.
Capítulo 2 - Para Transformar o Ensino da Leitura e da Escrita
"O desafio [...] é formar seres humanos críticos, capazes de ler
entrelinhas e de assumir uma posição própria frente à mantida,
explicita ou implicitamente, pelos autores dos textos com os
quais interagem em vez de persistir em formar indivíduos de-
pendentes da letra do texto e da autoridade dos outros", (p.27)
Para que haja uma transformação verdadeira do ensino da leitura e da
escrita, a escola precisa favorecer a aprendizagem significativa,
abandonando as atividades mecânicas, e sem sentido, que levam o
50
aluno a compreender a escrita como uma atividade pura e
unicamente escolar. Para isso, a escola necessita propiciar a formação
de pessoas capazes de apreciar a literatura e de mergulhar em seu
mundo de significados, formando escritores e não meros
copistas, formando produtores de escrita conscientes de sua função e
poder social. Precisa, também, preparar as crianças para a
interpretação e produção dos diversos tipos de texto existentes na
sociedade, fazendo com que a escrita deixe de ser apenas um objeto
de avaliação e passe a ser um objeto de ensino, capaz não apenas de
reproduzir pensamentos alheios, mas de refletir sobre o seu próprio
pensamento, enfim, promovendo a descoberta da escrita como
instrumento de criação e não apenas de reprodução. Para realmente
transformar o ensino da leitura e da escrita na escola, é preciso, ainda,
acabar com a discriminação que produz fracasso e abandono na
escola, assegurando a todos o direito de 'se apropriar da leitura e da
escrita como ferramentas essenciais de progresso cognoscitivo e de
crescimento pessoal'.
É possível a mudança na escola?
Ensinar e ler e escrever faz parte do núcleo fundamental da
instituição escolar, está nas suas raízes, constitui a sua missão
alfabetizadora e sua função social, portanto, é a que mais apresenta
resistência a mudanças. Além disso, nos últimos anos, foi a área de
que mais sofreu com a invasão de inovações baseadas apenas em
modismos.
"... O sistema de ensino continua sendo o terreno privilegiado
de todos os voluntarismos - dos quais talvez seja o último
51
refúgio. Hoje, mais de que ontem, deve suportar o peso de todas
as expectativas, dos fantasmas, das exigências de toda uma
sociedade para a qual a educação é o ultimo portador de
ilusões"2.
Sendo assim, para que seja possível uma mudança profunda da
prática didática, vigente hoje nas instituições de ensino, capaz de
tornar possível a leitura na escola, é preciso que esta esteja
fundamentada na evolução histórica do pensamento pedagógico,
sabendo que muito do que se propõe pode ser encontrado nas ideias
de Freinet, Dewey, Decroly e outros pensadores e educadores, o que
significa estarem baseadas no avanço do conhecimento científico
dessa área, que como em outras áreas do conhecimento científico,
teve suas hipóteses testadas com o objetivo de desvendar a gênese do
conhecimento humano - como os estudos realizados por Jean Piaget.
É preciso compreender também, que essas mudanças não dependem
apenas da capacitação adequada de seus profissionais, já que esta é
condição necessária, mas não suficiente, é preciso conhecer o
cotidiano escolar em sua essência, buscando descobrir os mecanismos
ou fenômenos que permitem ou atravancam a apropriação da leitura
e da escrita por todas as crianças que ali estão inseridas.
O que vimos até hoje, por meio dos trabalhos e pesquisas que
temos realizado no campo da leitura e da escrita, é que existe um
abismo que separa a prática escolar da prática social da leitura e da
escrita - lê-se na escola trechos sem sentido de uma realidade
desconhecida para a criança, já que foram produzidos sistematica-
mente para serem usados no espaço escolar - a fragmentação do
ensino da língua (primeiro sílabas simples, depois complexas,
52
palavras, frases...) não permite um espaço para que o aluno possa
pensar no que aprendeu dentro de um contexto que lhe faça sentido,
e ainda, fazem com que esta perca a sua identidade.
"Como o objetivo final do ensino é que o aluno possa fazer
funcionar o aprendido fora da escola, em situações que já não
serão didáticas, será necessário manter uma vigilância
epistemológica que garanta uma semelhança fundamental entre
o que se ensina e o objeto ou prática social que se pretende que
os alunos aprendam. A versão escolar da leitura e da escrita não
deve afastar-se demasiado da versão social não-escolar". (p.35)
O "Contrato Didático"
O Contrato Didático aqui é considerado como as relações
implícitas estabelecidas entre professor e aluno, sobretudo porque
estas exercem influência sobre o aprendizado da leitura e da escrita,
já que o aluno deve concentrar-se em perceber ou descobrir o que o
professor deseja que ele 'saiba' sobre aquele texto que o professor
escolheu para que ele leia e não em suas próprias interpretações: "A
'cláusula' referente à interpretação de textos parece estabelecer [...] que
o direito de decidir sobre a validade da interpretação é privativo do
professor...".
Se o objetivo da escola é formar cidadãos praticantes da leitura
e da escrita, capazes de realizar escolhas e de opinar sobre o que leem
e veem em seu entorno social, é preciso que seja revisto o Contrato
Didático, principalmente no âmbito da leitura e da escrita, e essa
revisão é encargo dos pesquisadores de didática - divulgando os
resultados obtidos bem como os elementos que podem contribuir
53
para as mudanças necessárias -, é responsabilidade dos organismos
que regem a educação - que devem levar em conta esses resultados -,
é encargo dos formadores de professores e de todas as instituições
capazes de comunicar à comunidade, e particularmente aos pais, da
importância que tem a análise, escolha e exercício de opinião de seus
filhos quando do exercício da leitura e da escrita.
Ferramentas para transformar o ensino
Vimos que transformar o ensino vai além da capacitação
dos professores, passa pela sua revalorização pessoal e
profissional; requer uma mudança de concepção da relação
ensino-aprendizagem para que se possa conceber o
estabelecimento de objetivos por ciclos que abrangem os
conhecimentos - objeto de ensino - de forma interdisciplinar,
visando diminuir a pressão do tempo didático e da fragmentação
do conhecimento.
Requer que não se percam de vista os objetivos gerais e de
prioridade absoluta, aqueles que são essenciais à educação e lhe
conferem significado. Requer, ainda, que se compreenda a
alfabetização como um processo de desenvolvimento da leitura e
da escrita, e que, portanto, não pode ser desprovido de
significado.
Essa compreensão só será alcançada na medida em que
forem conhecidos e compreendidos os estudos científicos
realizados na área, e que nos levaram a descobrir a importância
da atividade mental construtiva do sujeito no processo de
construção de sua aprendizagem, ressignificando o papel da
54
escola. Colocando em destaque o aprendizado da leitura e da
escrita, consideramos fundamental que sejam divulgados os
resultados apresentados pelos estudos psicogenéticos e
psicolingüísticos, não apenas a professores ou profissionais
ligados à educação, mas a toda sociedade, objetivando
conscientizá-los da sua validade e importância, levando-os a
perceber as vantagens das estratégias didáticas baseadas nesses
estudos, e, sobretudo, conscientizando-os de que educação
também é objeto da ciência.
Voltando à capacitação, enfatizando sua necessidade, é preciso
que se criem espaços de discussão e troca de experiências e
informações, que dentre outros aspectos, servirão para levar o(a)
professor(a) a perceber que a diversidade cultural não acontece ape-
nas em sua sala de aula, que ela faz parte da realidade social na qual
estamos inseridos, e que sendo assim, não poderia estar fora da
escola e, ainda, que esta diversidade tem muito a contribuir se o
nosso objetivo educacional consistir em preparar nossos alunos para
a vida em sociedade. No que concerne a leitura e escrita, parece-nos
essencial ter corno prioritária a formação dos professores como lei-
tores e produtores de texto, capazes de aprofundar e atualizar seus
saberes de forma permanente'.
Nossa experiência nos levou a considerar que a capacitação dos
professores em serviço apresenta melhores resultados quando é
realizada por meio de oficinas, sustentadas por bibliografias capazes
de dar conta das interrogações a respeito da prática que forem
surgindo durante os encontros, que devem se estender durante todo
o ano letivo, e que contam com a participação dos coordenadores
55
também em sala de aula, mas que, a longo prazo, capacitem
oprofessor a seguir autonomamente, sem que seja necessário o
acompanhamento em sala de aula.
Capítulo 3 – Apontamentos a partir da Perspectiva Curricular
É importante que, ao propor uma transformação didática para
uma instituição de ensino, seja considerada a sua particularidade, o
que se dá por meio do conhecimento de suas necessidades e
obstáculos, implícitos ou explícitos, que caberá a proposta suprir ou
superar. É imperativo que a elaboração de documentos curriculares
esteja fortemente amparada na pesquisa didática, já que será neces-
sário selecionar os conteúdos que serão ensinados, o que pressupõe
uma hierarquização, já que privilegiará alguns em detrimento de
outros.
"Prescrever é possível quando se está certo daquilo que se prescreve, e
se está tanto mais seguro quanto mais investigada está a questão do
ponto de vista didático".(p. 55).
As escolhas de conteúdos devem ter como fundamento os propósitos
educativos', ou seja, se o propósito educativo do ensino da leitura e da
escrita é o de formar os alunos como cidadãos da cultura escrita,
então o objeto de ensino a ser selecionado deve ter como referência
fundamental as práticas sociais de leitura e escrita utilizadas pela
comunidade, o que supõe enfatizar as funções da leitura e da escrita
nas diversas situações e razões que levam as pessoas a ler e escrever,
favorecendo seu ingresso na escola como objeto de ensino.
56
Os estudos em torno das práticas de leitura existentes, ou
preponderantes, no decorrer da história da humanidade mostraram
que, em determinados momentos históricos, privilegiavam-se leituras
intensas e profundas de poucos textos, como por exemplo, os
pensadores clássicos, seguidos de profundas reflexões realizadas por
meio de debates ou conversas entre pequenos grupos de pessoas ou
comunidades, se tomarmos como exemplo a leitura da Bíblia.
Com o avanço das ciências e o aumento da diversidade literária
disponível - nas sociedades mais abastadas - as práticas de leitura
passaram a se alternar entre intensivas ou extensivas (leitura de
vários textos com menor profundidade), mas sempre mantendo um
fator comum: elas, leitura e escrita, sempre estiveram inseridas nas
relações com as outras pessoas, discutindo hipóteses, ideias, pontos
de vista, ou apartes indicando a leitura de algum título ou autor.
O aspecto mais importante que podemos tirar acerca dos estudos
históricos é que aprende-se a ler, lendo (ou a escrever, escrevendo),
portanto, é preciso que os alunos tenham contato com todos os tipos
de texto que são veiculados na sociedade, que eles tenham acesso a
eles, que esses materiais deixem de ser privilégio de alguns, passando
a ser patrimônio de todos. Didaticamente, isto significa que os alunos
precisam se apropriar destes textos pelas práticas de leitura
significativas que propiciem reflexões individuais e grupais que,
embora demandem tempo, são essenciais para que o sujeito possa, no
futuro, ser um praticante da leitura e da escrita.
"...É preciso assinalar que, ao exercer comportamentos de
leitor e de escritor, os alunos têm também a oportunidade de
57
entrar no mundo dos textos, de se apropriar dos traços
distintivos[...] de certos gêneros, de ir detectando matizes que
distinguem a 'linguagem que se escreve' e a diferenciam da
oralidade coloquial, de pôr em ação [...] recursos linguísticos aos
quais é necessário apelar para resolver os diversos problemas que
se apresentam ao produzir ou interpretar textos [...[é assim que
as práticas de leitura e escrita, progressivamente, se transformam
em fonte de reflexão metalingüística". (p. 64).
Capítulo 4
E possível ler na escola?
"Ler é entrar em outros mundos possíveis. É indagar a
realidade para compreendê-la melhor, é se distanciar do texto e
assumir uma postura crítica frente ao que se diz e ao que se quer
dizer, é tirar carta de cidadania no mundo da cultura
escrita...".(p.73).
Ensinar a ler e escrever foi, e ainda é, a principal missão da escola,
no entanto, dois fatores parecem contribuir para que a escola não ob-
tenha sucesso:
1. A tendência de supor que existe uma única interpretação possível
a cada texto;
2. A crença - como diria Piaget 2- de que a maneira como as crianças
aprendem difere da dos adultos e que, portanto, basta ensinar-
2 Piaget afirmou que a modalidade adotada pelo ensino parece estar fundada numa consideração das
semelhanças e diferenças entre as crianças e os adultos enquanto sujeitos cognitivos que é exatamente
oposta à que se percebe pelas investigações psicogenéticas. Estas últimas mostraram que a estrutura
intelectual das crianças é diferente da dos adultos (heterogeneidade estrutural), mas o funcionamento de umas
e outras é essencialmente o mesmo (homogeneidade funcional); no entanto, ao ignorar o processo construtivo
58
lhes o que julgarem pertinente, sem que haja preocupação com o
sentido ou significado que tais conteúdos tem para as crianças, o
que, além de tudo, facilita o controle da aprendizagem, já que
essa concepção permite uma padronização do ensino.
Para que seja possível ler na escola, é necessário que ocorra uma
mudança nessas crenças, é preciso, como já vimos, que sejam
considerados os resultados dos trabalhos científicos em torno de
como ocorre o processo de aprendizagem nas crianças: que ele se
dá através da ação da criança sobre os objetos (físicos e sociais),
sendo a partir dessa ação que ela (a criança) lhe atribuirá um
valor e um significado.
Sabendo que a leitura é, antes de tudo, um objeto de ensino que
na escola deverá se transformar em um objeto de aprendizagem, é
importante não perder de vista que sua apropriação só será possível
se houver sentido e significado para o sujeito que aprende, que esse
sentido varia de acordo com as experiências prévias do sujeito e que,
portanto, não são suscetíveis a uma única interpretação ou
significado e que o caminho para a manutenção desse sentido na es-
cola está em não dissociar o objeto de ensino de sua função social.
O trabalho com projetos de leitura e escrita cujos temas são
dirigidos à realização de algum propósito social vem apresentando
resultados positivos. Os temas propostos visam atender alguma
necessidade da comunidade em questão e são estruturados da
seguinte forma:
dos alunos e supor que podem dedicar-se a atividades desprovidas de sentido, a escola os trata como se sua
estrutura intelectual fosse a mesma que a dos adultos e seu funcionamento intelectual fosse diferente. (Nota
da autora).
59
a) Proposta do projeto às crianças e discussão do plano do trabalho;
b) Curso de capacitação para as crianças, visando prepará-las para a
busca e consulta autônoma dos materiais a serem utilizados
quando da realização das etapas do projeto;
c) Pesquisa e seleção do material a ser utilizado e/ou lugares a
serem visitados;
d) Divisão das tarefas em pequenos grupos;
e) Participação dos pais e da comunidade;
f) Discussão dos resultados encontrados pelos grupos;
g) Elaboração escrita dos resultados encontrados pelos grupos (que
passará pela revisão de outro grupo e depois pelo professor);
h) Redação coletiva do trabalho final;
i) Apresentação do projeto à comunidade interessada.
j) Avaliação dos resultados.
Nesses projetos tem-se a oportunidade de levar a criança a
extrair informações de diversas fontes, inclusive de textos que não
foram escritos exclusivamente para elas e que apresentam um grau
maior de dificuldade. A discussão coletiva das informações que vão
sendo coletadas propicia a troca de ideias e a verificação de diferentes
pontos de vista, como acontece na vida real, e, ainda, durante a
realização desses projetos, as crianças não leem e escrevem só para
'aprender'. A leitura assume um propósito, um significado, que atende
60
também aos propósitos do docente - de inseri-las no mundo de
leitores e escritores. Os projetos permitem, ainda, uma administração
mais flexível do tempo, porque propiciam o rompimento com a
organização linear dos conteúdos, já que costumam trabalhar com os
temas selecionados de forma interdisciplinar, o que possibilita a
retomada dos próprios conteúdos em outras situações e, ainda, a
análise destes a partir de um referencial diferente.
Acontecem concomitantemente e em articulação com a
realização dos projetos, atividades habituais, como 'a hora do conto'
semanal ou momentos de leitura de outros gêneros, como o de
curiosidades científicas e atividades independentes que podem ter
caráter ocasional, como a leitura de um texto que tenha relevância
pontual ou fazer parte de situações de sistematização: passar a limpo
uma reflexão sobre uma leitura realizada durante uma atividade
habitual ou pontual. Todas essas atividades contribuem com o
objetivo primordial de 'criar condições que favoreçam a formação de
leitores autônomos e críticos e de produtores de textos adequados à
situação comunicativa que os torna necessário' já que em todos elas
observam-se os esforços por produzir na escola as condições sociais
da leitura e da escrita.
"É assim que a organização baseada em projetos permite
coordenar os propósitos do docente com os dos alunos e
contribui tanto para preservar o sentido social da leitura como
para dotá-la de um sentido pessoal para as crianças". (p.87).
Ainda, o trabalho com projetos, por envolver grupos de trabalho e
abrir espaço para discussão e troca de opiniões, permite o
61
estabelecimento de um novo contrato didático, ou seja, um novo
olhar sobre a avaliação, porque admite novas formas de controle
sobre a aprendizagem, nas quais todos os sujeitos envolvidos tomam
parte, o que contribui para a formação de leitores autônomos, uma
vez que estes devem justificar, perante o grupo, as conclusões ou
opiniões que defendem. É importante ressaltar que essa modalidade
de trabalho torna ainda mais importante o papel das intervenções do
professor - fazendo perguntas que levem a ser considerados outros
aspectos que ainda não tenham sido levantados pelo grupo, ou a
outras interpretações possíveis do assunto em questão. Em suma, é
importante que a necessidade de controle, inerente à instituição
escolar, não sufoque ou descaracterize a sua missão principal que são
os propósitos referentes à aprendizagem.
O professor: um ator no papel de leitor
É muito importante que o professor assuma o papel de leitor
dentro da sala de aula.
Com esta atitude ele estará propiciando à criança a opor-
tunidade de participar de atos de leitura. Assumir o papel de leitor
consiste em ler para os alunos sem a preocupação de interrogá-los
sobre o lido, mas de conseguir com que eles vivenciem o prazer da
leitura, a experiência de seguir a trama criada pelo autor exatamente
para este fim e, ao terminar, que o professor comente as suas im-
pressões a respeito do lido, abrindo espaço para o debate sobre o texto
- seus personagens, suas atitudes.
62
Assumir o papel de leitor é fator necessário, mas não suficiente,
cabe ao professor ainda mais; cabe-lhe propor estratégias de leitura
que aproximem cada vez mais os alunos dos textos.
A Instituição e o sentido da leitura
Quando os projetos de leitura atingem toda a instituição
educacional, cria-se um clima leitor que atinge também os pais, e que
envolvem os professores numa situação de trabalho conjunta que tem
um novo valor: o de possibilitar uma reflexão entre os docentes a
respeito das ferramentas de análise que podem contribuir para a
resolução dos problemas didáticos que por ventura eles possam estar
vivendo.
As propostas de trabalho e as reflexões aqui apresentadas
mostram que é possível sim! Ler e escrever na escola, desde que se
promova uma mudança qualitativa na gestão do tempo didático,
reconsiderando as formas de avaliação, não deixando que estas
interfiram ou atrapalhem o propósito essencial do ensino e da
aprendizagem. Desde que se elaborem projetos onde a leitura tenha
sentido e finalidade social imediata, transformando a escola em uma
'micros-sociedade de leitores e escritores em que participem crianças,
pais e professores...". (p. 101).
Capítulo 5
O Papel do Conhecimento Didático na Formação do Professor
"O saber didático é construído para resolver problemas
próprios da comunicação do conhecimento, é o resultado do
estudo sistemático das interações que se produzem entre o
63
professor, os alunos e o objeto de ensino; é produto da análise
das relações entre o ensino e a aprendizagem de cada conteúdo
específico; é elaborado através da investigação rigorosa do
funcionamento das situações didáticas". (p. 105).
É importante considerar que o saber didático, como qualquer
outro objeto de conhecimento, é construído através da interação do
sujeito com o objeto, ele se encontra, portanto, dentro da sala de aula,
e não é exclusividade dos professores que trabalham com crianças, ele
está presente também em nossas oficinas de capacitação. Então, para
apropriar-se desse saber, é preciso estar em sala de aula, buscando
conhecer a sua realidade e as suas especificidades.
A atividade na aula como objeto de análise
O registro de classe apresenta-se como principal instrumento
de análise do que ocorre em sala de aula. Esses registros podem ser
utilizados durante a capacitação, objetivando um aprofundamento do
conhecimento didático, já que as situações nele apresentadas
permitem uma reflexão conjunta a respeito das situações didáticas
requeridas para o ensino da leitura e escrita.
Optamos por utilizar, a princípio, os registros das 'situações
boas' ocorridas em sala de aula, porque percebemos, por meio da
experiência, que a ênfase nas 'situações más' distanciava
capacitadores e educadores, e para além, criavam um clima de in-
certeza, por enfatizar o que não se deve fazer, sem apresentar
direções do que poderia ser feito; - em suma, quando enfatizamos
'situações boas´ estamos mostrando o que é possível realizar em sala
de aula, o que por si só, já é motivador.
64
É importante destacar que as 'situações boas' não se constituem
em situações perfeitas, elas apresentam erros que, ao serem
analisados, enriquecem a prática docente, pois são considerados
como importantes instrumentos de análise da prática didática - ponto
de partida de uma nova reflexão - sendo vistos como parte integrante
do processo de construção do conhecimento.
"... a análise de registros de classe opera como coluna vertebral
no processo de capacitação, porque é um recurso insubstituível
para a comunicação do conhecimento didático e porque é a
partir da análise dos problemas, propostas e intervenções
didáticas que adquire sentido para os docentes se aprofundarem
no conhecimento do objeto de ensino e de processos de
aprendizagem desse objeto por parte das crianças", (p. 16).
Palavras Finais
Quanto mais os profissionais capacitadores conhecerem a prática
pedagógica e os que exercitam essa prática no dia-a-dia: as crenças
que os sustentam e os mecanismos que utilizam; quanto mais
conhecerem como se dá o processo de ensino e aprendizagem da
leitura e escrita na escola, mais estarão em condições de ajudar o
professor em sua prática docente.
65
VYGOTSKY, Lev. A formação Social da Mente.
São Paulo: Martins Fontes, 1984.
Fonte: http://lidialindislay.blogspot.com/2010/03/resumo-de-livros-vygotsky-lev-
formacao.html
Autora: Profª Lídia.
No livro Formação Social da Mente – Vygotsky tem por objetivo
caracterizar os aspectos tipicamente humanos do comportamento e
elaborar hipóteses de como essas características se desenvolveram
durante a vida do indivíduo e enfatiza três aspectos:
• Relaç~o entre seres humanos e o seu ambiente físico e social.
• Novas formas de atividade que fizeram com que o trabalho fosse o
meio fundamental de relacionamentos entre o homem e a natureza e
as conseqüências psicológicas dessas formas de atividade.
• A natureza das relações entre o uso de instrumento e
desenvolvimento da linguagem.
O estudo do desenvolvimento infantil começou a ser feita por
comparação à botânica, associado à maturação do organismo como
um todo. Como maturação por si só, é um fator secundário e não
explica o desenvolvimento de formas mais complexas do
comportamento humano, a psicologia moderna passou a estudar a
criança a partir dos modelos zoológicos, isto é, da experimentação
animal.
Segundo Vygotsky, o momento de maior significado no curso
do desenvolvimento intelectual, que dá origem às formas puramente
humanas de inteligência prática e abstrata, acontece quando a fala e a
atividade prática estão juntas.
A criança, antes de controlar o próprio comportamento, começa
a controlar o ambiente com a ajuda da fala, produzindo novas
relações com o ambiente, além de uma nova organização do próprio
ambiente. A criação dessas formas caracteristicamente humanas de
66
comportamento produz o intelecto, e constitui a base do trabalho
produtivo: à forma especificamente humana do uso de instrumento.
Experiências feitas por Vygotsky concluíram que a fala da
criança é tão importante quanto a ação para atingir um objetivo. Sua
fala e ação fazem parte de uma mesma função psicológica complexa,
dirigida para a solução do problema em questão.
Conclui-se também que quanto mais complexa a ação exigida
pela situação e menos direta a solução, maior a importância que a fala
adquire na operação como um todo.
“Essas observações, me levam a concluir que as crianças resolvem
suas tarefas práticas com a ajuda da fala, assim como dos olhos e das
m~os”. (Vygotsky)
A criança quando se confronta com um problema mais
complicado, apresenta ótima variedade complexa de respostas que
incluem tentativas diretas de atingir o objetivo, uso de instrumentos,
fala dirigidas as pessoas ou que simplesmente acompanha a ação e
apelos verbais direto ao objeto de atenção. O desenvolvimento da
percepção e da atenção, o uso de instrumentos e da fala afeta várias
funções psicológicas:
Operações sensório-motoras e atenção – cada uma das quais é
parte de um sistema dinâmico de comportamento.
Para o desenvolvimento da criança principalmente na primeira
infância, o que se reveste de importância primordial são as interações
com os adultos (assimétricas), portadores de todas as mensagens de
cultura. Nessa interação o papel essencial corresponde aos diferentes
sistemas semióticos seguida de uma função individual: começam a ser
utilizado como instrumentos de organização e de controle do
comportamento individual.
A abordagem dialética, admitindo a influência da natureza
sobre o homem, afirma que o homem, por sua vez, age sobre a
natureza e cria, através das mudanças por ele provocadas, novas
condições naturais para a sua existência. Essa posição representa o
67
elemento-chave da abordagem de estudo e interpretação das funções
psicológicas superiores FPS, do homem e serve como base dos novos
métodos de experimentação e análise.
Com relação à interação entre aprendizado e ensino – O
aprendizado é considerado um processo puramente externo que não
esta envolvido ativamente no desenvolvimento, simplesmente se
utilizará dos avanços do desenvolvimento ao invés de fornecer um
impulso para modificar seu curso.
Para Vygotsky não existe melhor maneira de descrever a
educação do que considerá-la como a organização dos hábitos de
conduta e tendências comportamentais adquiridos. O aprendizado
não altera nossa capacidade global de focalizar a atenção, ao invés
disso, desenvolve várias capacidades de focalizar a atenção sobre
várias coisas.
Numa abordagem sobre a zona de desenvolvimento proximal, o
ponto de partida da discussão é o fato de que o aprendizado das
crianças começa muito antes delas freqüentam a escola.
A zona de desenvolvimento proximal é resumidamente à
distância entre o nível de desenvolvimento real, que se costuma
determinar através da solução independe de problemas e o nível de
desenvolvimento potencial, determinado através da solução de
problemas sob orientação de um adulto.
O brinquedo tem um papel marcante para desenvolvimento, o
brinquedo não é uma atividade pura e simples de prazer a uma
criança, pois há outras atividades que dão mais prazer, como o habito
de chupar chupeta, em relação aos jogos que marcam a perda e ganho
com freqüência e é acompanhado pelo desprazer da perda. A criança
em idade pé-escolar envolve-se num mundo ilusório para resolver
suas questões e considera essencial e reconhece a enorme influência
do brinquedo no desenvolvimento da criança.
O brinquedo não é o aspecto predominante da infância, mas um
fator muito importante do desenvolvimento, demonstra o significado
da mudança que ocorre no desenvolvimento do próprio brinquedo,
68
de uma predominância de situações imaginárias para as
predominâncias de regras e mostra as transformações internas das
crianças que surgem em conseqüência do brinquedo.
69
Bullying e Desrespeito: Como Acabar com
essa Cultura na Escola. Marie Nathalie Beaudoin
e MaureenTaylor.
Fonte: Espaço Educar 2011. http://espacoeducar-
liza.blogspot.com/2010/11/resumo-do-livro-bullying-e-desrespeito.html
Autoras: Naiara Guimarães Gasparoni e Jordana de Paula da Silva
A obra é composta por duas partes: a primeira traz os
fundamentos teóricos e as novas perspectivas para investigação da
questão do Bullying e do desrespeito; a segunda contém exemplos
que mostraram ser eficientes na tentativa de contornar os efeitos
dessas práticas. O livro conta, ainda, com uma sessão de material de
apoio contendo cartas de professores e o relato de experiências
envolvendo o Bullying e o desrespeito no ambiente escolar.
O livro retrata o fenômeno do Bullying, caracterizado por formas
de intimidação diretas ou indiretas que vão desde simples gozações
até atitudes violentas desencadeadas pela incapacidade de lidar com a
diferença.
Na parte I, intitulada “Estabelecendo os fundamentos”, as autoras
abordam o panorama de influências culturais que limitam as
possibilidades de opções de ação do sujeito para solucionar
problemas. Tais possibilidades somente se tornam possíveis dentro de
discursos sociais nos quais estão inseridas. Dessa forma, a cultura age
no indivíduo de forma a criar bloqueios que vão restringir as opções
em determinadas situações da vida.
70
Para entender o Bullying, é preciso analisar o contexto cultural e
as questões psíquicas que fazem com que o sujeito o desenvolva.
As autoras mostram como os incentivos à competição no
ambiente escolar influenciam os problemas relacionados ao
desrespeito. Tal metodologia vem sendo muito empregada, trazendo
várias implicações como estimular o individualismo e atrapalhar a
convivência cooperativa entre os alunos.
Nas instituições escolares da sociedade capitalista, onde
prevalecem as regras, a competição e a avaliação, os alunos são vistos
como produtos que podem ser constantemente melhorados para ser
mais produtivos. Essa maneira quantitativa de avaliar os
desempenhos mostra um retrato momentâneo de um aspecto do
contexto que pode contribuir para aumentar a prática do Bullying.
De acordo com Marie-Nathalie e Maureen Taylor, não se pode
mudar uma determinada cultura de uma só vez. Desta forma, as
práticas inovadoras devem permitir aos alunos uma reflexão crítica
sobre elas.
Os educadores, antes de rotular os alunos como adequados ou
inadequados, precisam transformar sua percepção diante dos fatos e
passar a ter uma compreensão contextual para alguns problemas
considerados “fora de padr~o”.
Outra forma de visualizar esse contexto vem disposta pelas
autoras no livro, em forma de 4 ‘C’: curiosidade, compaix~o,
colaboração e contextualização da perspectiva. A curiosidade se
encontra na habilidade dos educadores em fazer perguntas úteis; a
71
compaixão se refere a olhar para a boa intenção para que o indivíduo
possa adotar condutas mais respeitosas; a colaboração implica
minimizar o desequilíbrio de poder entre professores e alunos e, por
último, a contextualização da perspectiva, que vem desconstruir e
examinar as influências culturais que o indivíduo sofre em dada
circunstância.
Como forma de observar o problema, as autoras trazem o
conceito de “exteriorizaç~o”, baseado na idéia de que os problemas,
assim como os hábitos indesejados, desenvolvem-se devido a uma
série de circunst}ncias, o que implica a “exteriorizaç~o” para uma
percepção do problema, distinguindo-o da identidade da pessoa.
Para evitar o Bullying não é preciso falar em respeito, pois nem
sempre essa palavra encontra elo na vida do sujeito. Ele pode até
saber o que significa, porém não lhe será útil, caso não seja
vivenciado.
Dessa forma, os educadores devem advir de experiências
respeitosas para que essas sejam mais importantes e significativas
para a vida dos alunos.
Conforme elucidado pelas autoras, a compreensão das
experiências pode trazer mudanças que devem ser encaradas como
processo e não como algo que decorre instantaneamente. Para que
essas mudanças permaneçam é preciso encarar os vários “eus” que
compõem uma pessoa, pois o “eu” se constitui nas experiências com
outros indivíduos, daí ele ser composto por diferentes “eus”.
72
Como forma de evitar a prática do Bullying, é preciso que os
alunos reconheçam um “eu” preferido (positivo) e que sejam
estimulados a manter esse reconhecimento como algo seqüencial e
não isolado.
A parte dois do livro traz exemplos de sucesso na superação do
Bullying e do desrespeito. Para isso, Marie-Nathalie e Maureen Taylor
contaram com apoio de 230 educadores e alunos do Ensino
Fundamental. O livro ainda traz entrevistas com alunos, mostrando
como eles vêem o sistema educacional.
A obra apresenta uma forma de cultivar o respeito no ambiente
escolar e tornar isso uma prática, criada por meio de vínculos pessoais
e do trabalho de aceitação do outro, fazendo com que os alunos sejam
tolerantes e aceitem as diferenças.
Infere também uma forma de tornar o meio acadêmico um lugar
menos susceptível aos problemas do desrespeito através da
apreciação, ou seja, da expressão do reconhecimento, da gratidão e da
admiração nas relações interpessoais. Essa apreciação deve abranger
alunos, professores e funcionários da escola em geral.
Aos educadores, cabe incentivar a colaboração e evitar a
concorrência entre os alunos, além de disponibilizar tempo e
estimular a auto-reflexão, pois, será nesses momentos que o indivíduo
irá se reenergizar e construir um propósito de vida.
A escola deve permitir o envolvimento com a comunidade,
valorizar as diferenças que compõem os grupos e mostrar que cada
uma dessas diferenças traz aspectos positivos às experiências grupais,
73
sem esquecer de que se deve evitar as práticas adultistas, ou seja, não
permitir que os adultos exerçam poder extremado sobre as crianças.
As autoras apresentam o projeto “Bicho que irrita”, uma pr|tica
inovadora que envolve atividades de diversão e de expressão, para que
o ambiente escolar seja repleto de respeito. Esse projeto é diferente
dos outros métodos que vêm apenas tratando do desrespeito de
forma didática. Ele, ao contrário, permite o envolvimento da criança
com a necessidade de exteriorização do que a irrita, de forma lúdica,
favorecendo o desenvolvimento de um ambiente escolar de respeito e
acolhida.
O livro disponibiliza formas de trabalhar o indivíduo envolvido
com o Bullying, observando todos os aspectos que possa influenciar
essa prática, como o ambiente familiar, escolar e social, salientando a
importância do contexto em que esse sujeito se encontra, bem como
ele se vê nesse contexto.
Se os educadores conseguirem estabelecer um clima de atenção e
de vínculo entre os alunos, gerando um ambiente respeitoso e
acolhedor, onde as diferenças sejam discutidas sem que o professor se
imponha como detentor do poder e do saber, o Bullying e o
desrespeito tenderão a desaparecer.
Diante de tudo que foi exposto, “Bullying e desrespeito: como
acabar com essa cultura na escola” é voltado para aqueles que est~o
inseridos na área educacional ou para os que desejarem informações
sobre o desrespeito nas escolas e nas instituições. A linguagem, de
fácil compreensão, e os exemplos trazidos na obra ajudam a entender
74
os mecanismos em que se dá a prática. O livro apresenta, ainda, uma
visão diferenciada da Educação e incentiva os estudos nessa área.
75
SOLÉ, Isabel. Estratégias de leitura. Porto
Alegre: Editora Artmed, 1998.
Fonte: http://educacadoresemluta.blogspot.com/2009/12/sole-isabel-estrategias-
de-leitura_11.html
O objetivo desse livro é ajudar educadores e profissionais a
promover a utilização de estratégias de leitura que permitam
interpretar e compreender os textos escritos.
Capítulo 1 - O desafio da Leitura
A leitura é um processo de interação entre o leitor e o texto para
satisfazer um propósito ou finalidade. Lemos para algo: devanear,
preencher um momento de lazer, seguir uma pauta para realizar uma
atividade, entre outras coisas.
Para compreender o texto leitor utiliza seus conhecimento de
mundo e os conhecimentos do texto. Controlar a própria leitura e
regulá-la, implica ter um objetivo para ela, assim como poder gerar
hipóteses sobre o conteúdo que se lê. Por isso a leitura pode ser
considerada um processo constante de elaboração e verificação de
previsões que levam a construção de uma interpretação.
Na leitura de um texto encontramos, inicialmente o título,
subtítulo, negrito, itálico, esquema. Isso pode ser utilizado como
recursos para prever qual será o assunto do texto, por exemplo.
Esses indicadores servem para ativar o conhecimento prévio e
serão úteis quando se precisar extrair as idéias centrais.
76
O que foi apresentado até agora pode dar pistas de como as
práticas pedagógicas podem organizar situações de ensino e
aprendizagem que tragam em si essas análises.
A leitura na escola
Um dos objetivos mais importante das escolas é fazer com que os
alunos aprendam a ler corretamente. Essa aquisição da leitura é
indispensável para agir com autonomia nas sociedades letradas.
Pesquisas realizadas apontam que a leitura não é utilizada tanto
quanto deveria, isto é, não lemos o bastante.Uma questão que se
coloca é a seguinte: será que os professores e a escola têm clareza do
que é ler?A leitura, um objeto de conhecimento
No Ensino Fundamental a leitura e a escrita aparecem como
objetivos prioritários. Acredita-se que ao final dessa etapa os alunos
possam ler textos de forma autônoma e utilizar os recursos ao seu
alcance para referir as dificuldades dessa área.
O que se vê nas escolas, no ensino inicial da leitura, são esforços
para iniciar os pequenos nos segredos do código a partir de diversas
abordagens. Poucas vezes considera-se que essa etapa tem início
antes da escolaridade obrigatória.
O trabalho de leitura costuma a se restringir a ler o texto e
responder algumas perguntas relacionadas a ele como: seus
personagens, localidades, o que mais gostou, o que não gostou, etc.
isso revela que o foco está no resultado da leitura e não em seu
processo.
77
Percebe-se que as práticas escolares dão maior ênfase no domínio
das habilidades de decodificação.
Capítulo 2 - Ler, compreender e aprender
É fundamental que ao ler, o leitor se proponha a alcançar
determinados para determinar tanto as estratégias responsáveis pela
compreensão, quanto o controle que, de forma inconsciente, vai
exercendo sobre ela, à medida que lê. O controle da compreensão é
um requisito essencial para ler de forma eficaz. Para que o leitor se
envolva na atividade leitura é necessário que esta seja significativa. É
necessário que sinta que é capaz de ler e de compreender o texto que
tem em mãos. Só será motivadora, se o conteúdo estiver ligado aos
interesses do leitor e, naturalmente, se a tarefa em si corresponde a
um objetivo. Como isso pode ser transferido para a sala de aula: sabe-
se que na diversidade da classe torna-se muito difícil contentar o
interesse de todas as crianças com relação à leitura, portanto, é papel
do professor criar o interesse.
Uma forma possível de propiciar esse interesse é possibilitar o a
diferentes suportes para a leitura, que sejam e incentivem atitudes de
interesse e cuidado nos leitores.
Ao professor cabe o cuidado de analisar o conteúdo que veiculam.
Compreensão leitora e aprendizagem significativa.
A leitura nos aproxima da cultura. Por isso um dos objetivos da
leitura é ler para aprender. Quando um leitor compreende o que lê,
78
está aprendendo e coloca em funcionamento uma série de estratégias
cuja função é assegurar esse objetivo.
Isso nos remete a mais um objetivo fundamental da escola:
ensinar a usar a leitura como instrumento de aprendizagem. Devemos
questionar a crença de que, quando uma criança aprende a ler, já
pode ler de tudo e também pode ler para aprender. Se a ensinarmos a
ler compreensivamente e a aprender a partir da leitura, estamos
fazendo com que aprenda a aprender.
Capítulo 3 - O ensino da leitura
Vamos apontar nesse capítulo a idéia errônea que consiste em
considerar que a linguagem escrita requer uma instrução e a
linguagem oral não a requer.
Código, consciência metalingüística e leitura
Devemos considerar como fundamental a leitura realizada por
outros (família, amigos, pessoas) por familiarizar a criança com a
estrutura do texto escrito e com sua linguagem.
Na escola ao se deparar com a linguagem escrita, a crianças, em
muitos casos se encontra diante de algo conhecido, sobre o que já
aprendeu várias coisas. O fundamental é que o escrito transmite uma
mensagem, uma informação, e que a leitura capacita para ter acesso a
essa linguagem. Na aquisição deste conhecimento, as experiências de
leitura da criança no seio da família desempenham uma função
importantíssima. Para além da existência de um ambiente em que se
promova o uso dos livros e da disposição dos pais a adquiri-los e a ler,
79
o fato de lerem para seus filhos relatos e histórias e a conversa
posterior em torno dos mesmos parecem ter uma influência decisiva
no desenvolvimento posterior destes com a leitura.
Assim, o conhecimento que a criança tem das palavras e suas
características aumentará consideravelmente quando ela começar a
manejar o impresso.
O trabalho que se deve realizar com as crianças é mostrá-las que
ler é divertido, que escrever é apaixonante, que ela pode fazê-lo.
Precisamos instigá-las a fazer parte desse mundo maravilhoso e cheio
de significados.
O ensino inicial da leitura
Na escola, as atividades voltadas para o ensino inicial da leitura
devem garantir a interação significativa e funcional da criança com a
língua escrita, como um meio de construir os conhecimentos
necessários para poder abordar as diferentes etapas de sua
aprendizagem.
Para isso é fundamental trazer para a sala de aula, como ponto de
partida, os conhecimentos que as crianças já possuem e a partir de
suas idéias, ampliar suas significações.
A leitura e a escrita são procedimentos e devem ser
trabalhados como tal em sala de aula.
Um aspecto importante que precisa ser garantido é o acesso a
diferentes materiais escritos para as crianças: jornais, revistas, gibis,
livros, rimas, poemas, HQ, e gêneros diversos.
80
Capítulo 4 - O ensino de estratégias de compreensão leitora
Já tratamos no capítulo anterior que os procedimentos precisam
ser ensinados. Se estratégias de leitura são procedimentos, então é
preciso ensinar estratégias para a compreensão dos textos: não como
técnicas precisas, receitas infalíveis ou habilidades específicas, mas
como estratégias de compreensão leitora que envolvem a presença de
objetivos, planejamento das ações, e sua avaliação.
Estas estratégias são as responsáveis pela construção de uma
interpretação para o texto. E uma construção feita de forma
autônoma.
Que estratégias vamos ensinar? O papel das estratégias na leitura
São aquelas que permitem ao aluno planejar sua tarefa de modo
geral. Perguntas que o leitor deve se fazer para compreender o texto:
1. Compreender os propósitos implícitos e explícitos da leitura.
Que/Por que/Para que tenho que ler?
2. Ativar e aportar à leitura os conhecimentos prévios relevantes
para o conteúdo em questão. Que sei sobre o conteúdo do texto?
3. Dirigir a atenção ao fundamental, em detrimento do que pode
parecer mais trivial.
4. Avaliar a consistência interna do conteúdo expressado pelo
texto e sua compatibilidade com o conhecimento prévio e com o
“sentido comum”. Este texto tem sentido?
81
5. Comprovar continuamente se a compreensão ocorre mediante a
revisão e a recapitulação periódica e a auto-interrogação. Qual é a
idéia fundamental que extraio daqui.
6. Elaborar e provar inferências de diversos tipos, como
interpretações, hipóteses e previsões e conclusões. Qual poderá ser o
final deste romance?
Um conjunto de propostas para o ensino de estratégias de
compreensão leitora pode ser considerado segundo BAUMANN
(1985;1990) nos processos:
1. Introdução. Explica-se aos alunos os objetivos daquilo que será
trabalhado e a forma em que eles serão úteis para a leitura.
2. Exemplo. Exemplifica-se a estratégia a ser trabalhada mediante
um texto.
3. Ensino Direto. O professor mostra, explica e escreve a
habilidade em questão, dirigindo a atividade.
4. Aplicação dirigida pelo professor. Os alunos devem por em
prática a habilidade aprendida sob o controle e supervisão do
professor.
5. Prática individual. O aluno deve utilizar independentemente a
habilidade com material novo.
Tipos de texto e expectativas do leitor
Alguns autores, entre eles ADAM (1985), classificam os textos da
seguinte forma: 1. Narrativo: texto que pressupõe um
82
desenvolvimento cronológico e que aspira explicar alguns
acontecimentos em uma determinada ordem.
2. Descritivo: como o nome diz, descreve um objeto ou fenômeno,
mediante comparações e outras técnicas.
3. Expositivo: relaciona-se à análise e síntese de representações
conceituais ou explicação de determinados fenômenos.
4. Instrutivo-indutivo: tem como pretensão induzir a ação do
leitor com palavras de ordem, por exemplo.
Seria fundamental que essa diversidade de textos aparecesse na
escola e não um único modelo. Principalmente os que freqüentam a
vida cotidiana.
Trata-se de organizar um ensino que caracterize cada um destes
textos, mostrando as pistas que conduzem a uma melhor
compreensão, fazendo com que o leitor saiba que pode utilizar as
mesmas chaves que o autor usou para formar um significado, e além
de tudo interpretá-lo.
Capítulo 5 - Para compreender... Antes da leitura
Apresentam-se aqui seis passos importantes para a compreensão,
que devem ser seguidos antes da leitura propriamente dita:
1. Idéias Gerais
São algumas idéias que o professor tem sobre a leitura:
83
· ler é muito mais do que possuir um rico cabedal de estratégias e
técnicas.
· ler é um instrumento de aprendizagem, informação e deleite.
· a leitura não deve ser considerada uma atividade competitiva.
· quem não sente prazer pela leitura não conseguirá transmiti-lo
aos demais.
· a leitura para as crianças tem que ter uma finalidade que elas
possam compreender e partilhar.
· a complexidade da leitura e a capacidade que as crianças têm
para enfrentá-la.
2. Motivação para a leitura
Toda atividade deve ter como ponto de partida a motivação das
crianças: devem ser significativas, motivantes, e a criança deve se
sentir capaz de fazê-la.
3. Objetivos da leitura
Os objetivos dos leitores, ou propósitos, com relação a um texto
podem ser muito variados, de acordo com as situações e momentos.
Vamos destacar alguns dos objetivos da leitura, que podem e devem
ser trabalhados em sala de aula:
· ler para obter uma informação precisa;
· ler para seguir instruções;
84
· ler para obter uma informação de caráter geral;
· ler para aprender;
· ler para revisar um escrito próprio;
· ler por prazer;
· ler para comunicar um texto a um auditório;
· ler para praticar a leitura em voz alta; e
· ler para verificar o que se compreendeu.
4. Revisão e atualização do conhecimento prévio
Para compreender o que se está lendo é preciso ter
conhecimentos sobre o assunto. Mas algumas coisas podem ser feitas
para ajudar as crianças a utilizar o conhecimento prévio que têm
sobre o assunto, como dar alguma explicação geral sobre o que será
lido; ajudar os alunos a prestar atenção a determinados aspectos do
texto, que podem ativar seu conhecimento prévio ou apresentar um
tema que não conheciam.
5. Estabelecimento de previsões sobre o texto
É importante ajudar as crianças a utilizar simultaneamente
diversos indicadores: como títulos, ilustrações, o que se pode
conhecer sobre o autor, cenário, personagem, ilustrações, etc. para a
compreensão do texto como um todo.
6. Formulação de perguntas sobre ele
85
Requerer perguntas sobre o texto é uma estratégia que pode ser
utilizada para ajudar na compreensão de narrações ensinando as
crianças para as quais elas são lidas a centrar sua atenção nas
questões fundamentais.
Capítulo 6 - Construindo a compreensão... Durante a leitura
Para a compreensão do texto uma das capacidades envolvidas é a
elaboração de um resumo, que reproduz o significado global de forma
sucinta.
Para isso, deve-se ter a competência de diferenciar o que constitui
o essencial do texto e o que pode ser considerado como secundário.
O professor pode utilizar em sala de aula a estratégia da leitura
compartilhada, onde o leitor vai assumindo progressivamente a
responsabilidade e o controle do seu processo é uma forma eficaz
para que os alunos compreendam as estratégias apontadas, bem
como, a leitura independente, onde podem utilizar as estratégias que
estão aprendendo.
Não estou entendendo, o que eu faço? Os erros e as lacunas de
compreensão
Para ler eficazmente, precisamos saber quais as nossas
dificuldades. Podem ser: a compreensão de palavras, frases, nas
relações que se estabelecem entre as frases e no texto em seus
aspectos mais globais. Para isso devemos ter estratégias como o uso
do dicionário ou a continuação da leitura que pode sanar alguma
dúvida.
86
Capítulo 7- Depois da leitura: continuar compreendendo e
aprendendo...
A compreensão do texto resulta da combinação entre os objetivos
de leitura que guiam o leitor, entre os seus conhecimentos prévios e a
informação que o autor queria transmitir mediante seus escritos. Para
que os alunos compreendam a idéia principal do texto, o professor
pode explicar aos alunos o que consiste a “idéia principal”, recordar
porque vão ler concretamente o texto - função real, ressaltar o tema, à
medida que vão lendo informar aos alunos o que é considerado mais
importante, para que, finalmente concluam se a idéia principal é um
produto de uma elaboração pessoal.
O resumo
Utilizar essa estratégia pode ser uma boa escolha para estabelecer
o tema de um texto, para gerar ou identificar sua idéia principal e
seus detalhes secundários.
É importante, também, que os alunos aprendam porque precisam
resumir, e como fazê-lo, assistindo resumos efetuados pelo seu
professor, resumindo conjuntamente, passando a utilizar essa
estratégia de forma autônoma
COOPER (1990), afirma que para ensinar a resumir parágrafos de
texto é importante que o professor:
1. ensine a encontrar o tema do parágrafo e a identificar a
informação trivial para deixá-la de lado.
2. ensine a deixar de lado a informação repetida.
87
3. ensine a determinar como se agrupam as idéias no parágrafo
para encontrar formas de englobá-las.
4. ensine a identificar uma frase-resumo do parágrafo ou a
elaborá-la.
Capítulo 8- O ensino e a avaliação da leitura
Considerando o que foi visto até agora em relação aos processos
de leitura e compreensão é interessante ressaltar que:
Aprender a ler significa aprender a ser ativo ante a leitura, ter
objetivos para ela, se auto-interrogar sobre o conteúdo e sobre a
própria compreensão.
Aprender a ler significa também aprender a encontrar sentido e
interesse na leitura.
Aprender a ler compreensivamente é uma condição necessária par
poder aprender a partir dos textos escritos. Aprender a ler requer que
se ensine a ler, e isso é um papel do professor.
Ensinar a ler é uma questão de compartilhar. Compartilhar
objetivos, compartilhar tarefas, compartilhar os significados
construídos em torno deles.
Ensinar a ler exige a observação dos alunos e da própria
intervenção, como requisitos para estabelecer situações didáticas
diferenciadas capazes de se adaptar à diversidade inevitável da sala de
aula. É função do professor promover atividades significativas de
88
leitura, bem como refletir, planejar e avaliar a própria prática em
torna da leitura.
Para finalizar esse livro se faz necessário ressaltar que as
mudanças na escola acontecem quando são feitas em equipe.
Reestruturar o ensino da leitura deve passar por isso: uma construção
coletiva e significativa para os alunos, e também para os professores.
89
COLL, César; MARTÍN, Elena e
colaboradores. Aprender conteúdos &
desenvolver capacidades. Porto Alegre: Artmed,
2004.
Fonte: Revista da Apeoesp.
O primeiro objeto de qualquer ato de aprendizagem, além do
prazer que nos possa dar, é o de que deverá servir-nos no presente e
valer-nos no futuro. Aprender não deve apenas levar a algum lugar,
mas também permitir, posteriormente, ir além de maneira mais fácil.
Também é a construção de significados relativos ao conteúdo da
mesma por parte do aluno. Acredito que há vários modos pelos quais
a aprendizagem será útil para o futuro. Deste modo, a aprendizagem
escolar aparece como resultado de uma interação de três elementos:
O aluno, que constrói os significados;
os conteúdos de aprendizagem pelos quais o aluno constrói os
significados;
o professor, que atua como mediador entre o conteúdo e o
aprender do aluno.
Cada geração e projetos pedagógicos dão nova forma às
aspirações que modelam a educação em seu tempo. O que talvez
esteja surgindo, como marca nossa, é um amplo renovar da
90
preocupação com a qualidade e os objetivos intelectuais da educação,
sem que abandonemos, porém o ideal de que ela deve ser um meio de
preparar homens bem equilibrados para uma vida saudável. Aí
surgem os conceitos, as teorias e os conflitos sociocognitivos baseados
em fatos da realidade. Como:
Psicologia genética e ciências experimentais na escola primária,
investigando as “condutas exploratórias” que se referem ao interesse
pelos padrões de condutas que habitualmente designamos com os
nomes de “curiosidade” e “exploraç~o”, assunto recente na história da
psicologia cientifica. S~o v|rias as atividades “exploratórias” existentes
no ambiente escolar como Hipóteses diretrizes. A partir daí adota-se
uma definição ampla das atividades espontâneas de exploração e
qualifica-se como tal todos os comportamentos ou seqüências de
comportamentos. O aspecto metodológico deve respeitar dois
princípios básicos: favorecer o aparecimento de atividades
espontâneas de exploração e respeitar, na medida do possível, as
principais variáveis da situação escolar. A discussão dos resultados, na
concepção atual, após os distintos ensaios realizados propõe uma
articulação de três níveis de intervenção:
1) as atividades espontâneas, tal como foram expostas:
2) as sessões de síntese,durante as quais o conjunto da classe
discute sobre os problemas que apareceram espontaneamente nas
sessões de manipulação livre cuja finalidade é provocar uma
confrontação de idéias e opiniões:
3) e as atividades propostas que recolhem os problemas que
suscitaram mais interesse nas sessões precedentes. Estas três fases
91
não são concebidas em termos de sucessão rígida e sua única
constante é partir das atividades espontâneas, isto é, das sessões de
manipulação livre. Cabe, no entanto, supor a possibilidade de
estabelecer uma tipologia das condutas segundo a sua finalidade
exploratória, na esperança de se chegar, assim, a uma hierarquização
das mesmas, acontecendo assim a atividade exploratória e
investigação da realidade.
Portanto, conceitos, teorias e metodologia sobre o ensino da
criança colocam em realce o fato de que, em cada estágio de
desenvolvimento, ela possui um modo característico de visualizar,
perceber e entender o mundo e explicá-lo para si mesma. A tarefa de
ensinar determinada matéria a uma criança, em qualquer idade, é a
de representar a estrutura da referida matéria em termos da
visualização que a criança tem das coisas. A hipótese geral que se
estabelece tem como premissa o amadurecido juízo de que toda
“ideia”, “teoria” pode e deve ser representada de maneira honesta e
útil nas formas de pensamento da criança em idade escolar. Podendo
se confirmar na obra de Piaget e outros teóricos.
A importância da atividade do educador, ou todas as atuações
do educador e do aluno, são igualmente determinantes do rumo que
o desenvolvimento de uma tarefa vai tomar. A hipótese é que algumas
destas decisões e atuações merecem uma atenção especial, a tal
ponto que sua confluência permite determinar diferentes
modalidades de interatividade ou, o que é a mesma coisa, analisar as
tarefas escolares em termos de atividade do aluno e do professor, que
se destacam como dimensões como: levar em conta qual é a
finalidade educativa que se pretende alcançar com a realização da
92
tarefa; referir-se à existência, ou não, de um saber específico
(conhecimentos, normas, hábitos, habilidades) ao redor do qual
organiza-se a totalidade da tarefa ou inclusive uma série de tarefas
sucessivas; outra dimensão é a que concerne a maneira como o
educador planeja,organiza e propõe a tarefa a realizar. No que tange
ao professor, a ultima dimensão retida refere-se ao tipo de
intervenções que ele faz durante a realização da tarefa.
Já no campo de atuações do aluno, o primeiro fator a se levar em
conta é o grau de iniciativa que tem para escolher a tarefa e seu
conteúdo, o grau de iniciativa do mesmo na realização da tarefa e no
estabelecimento na diferença entre atividades. Quanto às dimensões
para a análise da interatividade, referem-se à finalidade educativa
que pretende o professor com a tarefa proposta, tais como:
potencializar a apropriação de um saber (conhecimento, habilidade,
hábito,norma); potencializar a atividade do aluno (com o fim de
favorecer a autonomia, a independência, a iniciativa, a apropriação de
um saber. Existência ou não de um saber, há um saber escolhido pelo
educador ou não há, mas com a introdução, durante a realização da
tarefa, a partir da observação do que as crianças fazem ou de suas
propostas. Não há nada em absoluto. Planejamento pelo educador.
Ausência de planejamento, propostas de materiais diversos com
diretrizes precisas sobre as tarefas a realizar. Proposta de uma tarefa
concreta sem diretrizes precisas sobre como executá-la e proposta de
uma tarefa detalhada e planejada com instruções precisas para
executá-la. Por último, as intervenções do educador durante a
realização das tarefas, que são:sem intervenção, intervenções de
disciplina e controle, intervenções de direção e supervisão,
93
intervenções de valorização da tarefa, intervenções de reflexo,
intervenções de ajuda e intervenções de proposta.
No entanto, e , apesar de tudo, o professor constitui o
principal “recurso” no processo de ensino em nossa escolas. Não são
necessárias pesquisas elaboradas para saber que comunicar,
transmitir conhecimentos depende, em grande medida, do domínio
que se possui sobre o conhecimento a ser transmitido. Isto é bastante
óbvio, quer o professor utilize ou não outros recursos. Há, claro,
certas medidas que devem ser tomadas para melhorar as condições de
trabalho desses profissionais, devendo ser perseguido como objetivos
primordiais. Para comunicar conhecimentos e oferecer um modelo de
competência, o professor deve ter liberdade para ensinar e para
aprender. O professor é também um símbolo pessoal imediato do
processo educativo, figura com a qual os alunos podem se identificar
e se comparar.
Um marco Psicológico para o Currículo Escolar.
Embora na elaboração de um currículo escolar seja
absolutamente imprescindível utilizar e integrar informações que
provêm de fontes distintas (da análise sócio-antropológica, da análise
pedagógica e também da análise disciplinar) , as que têm sua origem
na análise psicológica possuem, , uma importância especial. O tema
das contribuições da psicologia ao currículo, e à educação escolar em
geral, é muito complexo e não podemos abordá-lo aqui em todas as
suas vertentes.
O marco de referência psicológica representa o quanto a
psicologia vem trazendo contribuições para a elaboração do currículo.
94
No entanto, é conveniente fazer uma reflexão prévia sobre um tema
que está na origem das intenções de utilizar as contribuições da
psicologia no âmbito curricular, para não corrermos o risco de criar
confusões, referindo a maneira de entender as relações entre
desenvolvimento, aprendizagem e ensino e, conseqüentemente, a
própria concepção que se tem da educação em geral, e da educação
escolar em particular.
Princípios psicopedagógicos do currículo escolar e seus
possíveis efeitos das experiências educacionais escolares sobre o
desenvolvimento pessoal do aluno que estão fortemente e igualmente
condicionados por sua aptidão cognitiva e pelos conhecimentos
prévios e seu nível de desenvolvimento operatório, pertinentes com
os quais inicia a sua participação nas mesmas.
Sendo assim, fazendo as considerações finais, a questão
relacionada com a elaboração do currículo escolar não manifesta uma
preocupação somente de estudos sistematizados e baseados em
processos científicos, como também manifestada pela população que
passou a se interessar por um problema que até recentemente dizia
respeito apenas a especialista como: “Quem vamos ensinar, e com que
fim?Esse novo espírito talvez reflita nossos tempos. Um dos pontos
sobre o qual se tem manifestado essa preocupação renovada é o
planejamento de currículos para as escolas primária e secundária com
participação sem precedentes no desenvolvimento de currículos, por
parte de estudiosos e cientistas.
95
HARGREAVES, Andy. O ensino na
sociedade do conhecimento: educação na
era da insegurança. Porto Alegre: Artmed,
2003.
Fonte: Revista da Apeoesp.
Autora: Profa. Dra. Eunice Almeida da Silva, em 10/4/06. Dra. em Educação –USP
INTRODUÇÃO
O livro baseia-se nos resultados de duas pesquisas sobre o
aprimoramento e a reforma do ensino médio. Tais pesquisas foram
realizadas em oito escolas localizadas no Canadá e nos Estados
Unidos, foram financiadas pela fundação Spencer com sede neste
último país, e teve o apoio de uma parceria financiada pelo Comitê de
Educação da região de Peel e pelo Ministério da Educação e Formação
de Ontário.
Esta obra focaliza fundamentalmente a natureza, o impacto da
aprendizagem e do desenvolvimento profissionais no ensino.
O autor considera a época atual como propícia para uma reforma
educacional ampla, uma vez que políticas, prática e conhecimento de
pesquisa estão caminhando paralelamente e tentando um
intercâmbio de aprendizagem entre si. Com este propósito, há um
interesse mundial na maneira como as estratégias Key Stage3,
96
integraram os sistemas de ensino à pedagogia baseada em pesquisas e
a um intenso aprimoramento profissional.
A sociedade atual pode ser considerada como sociedade de
conhecimento e esta se caracteriza, sobretudo, por produzir
economias do conhecimento que são estimuladas e movidas pela
criatividade e pela inventividade. Portanto, as escolas atuais, uma vez
que fazem parte desta sociedade, deverão ter como norteador do
processo ensino-aprendizagem a criatividade e a inventividade.
CAPÍTULO 1- O ENSINO PARA A SOCIEDADE DO
CONHECIMENTO: EDUCAR PARA A INVENTIVIDADE
Neste capítulo, o autor aponta a profissão de professor como
paradoxal. O paradoxo está no fato de ser uma profissão que deve
gerar as habilidades e as capacidades necessárias ao fazer profissional
na sociedade do conhecimento. Este fazer profissional está
diretamente relacionado à construção e inovação contínua da
sociedade do conhecimento, o que é essencial para a prosperidade
econômica. Ao mesmo tempo, os professores também devem lutar
contra os resultados problemáticos provenientes da forma como está
organizada a sociedade e a economia do conhecimento. Um destes
resultados é a desigualdade social (o distanciamento entre ricos e
pobres).
Na Revolução Industrial os recursos do trabalho humano se
deslocaram do campo para a cidade. Este movimento gerou fortes
impactos na organização social resultantes da superpopulação e,
consequentemente, da miséria urbana. Este fato provocou um re-
direcionamento dos recursos voltados à criação de grandes
97
instituições da vida e do espaço públicos, tais como a educação, as
bibliotecas públicas e os grandes parques municipais visando a
beneficiar as pessoas.
A Revolução do conhecimento também tem provocado um
redirecionamento dos recursos, mas este tem privilegiado bolsos
privados como forma de aumentar as despesas dos consumidores e
estimular o investimento no mercado de ações, o que resulta em
especulações intermináveis. Esta situação favorece gastos públicos e a
promoção de iniciativas privadas, o que coloca em risco muitas
instituições, inclusive a educação. Em uma sociedade em que
deveríamos obter o máximo do trabalho dos professores e de
investimento nestes, uma vez que são os profissionais que preparam
as crianças para a sociedade do conhecimento, seus salários têm sido
reduzidos pela limitação e retenção dos recursos para este setor.
A profissão de professor vem sendo desvalorizada. Muitos
professores têm abandonado a profissão, e desestimulados ,outros a
seguem. Estes se encontram presos em um triângulo de interesses e
questões conflitantes, em que as laterais do triângulo podem ser
representadas pela condição de catalisadores da sociedade do
conhecimento e por responsáveis de criar contrapontos à sociedade
do conhecimento e a suas ameaças à inclusão, à segurança pública e à
vida pública. A base do triângulo representa as baixas da sociedade do
conhecimento em um mundo onde as crescentes expectativas com
relação à educação estão sendo respondidas com soluções
padronizadas, ofertadas a custos mínimos.
98
As explosões demográficas durante o que Eric Hobsbawn
denominou como “a era de ouro da história”, épocas posteriores {
Segunda Guerra Mundial, resultam em uma maior demanda por
professores, pois havia um otimismo sobre o poder da educação e
orgulho em exercer a profissão. É a era do profissional autônomo, com
elevados salários e status. Mas, foram poucas as inovações, criadas
nesta era, que perduraram. O que vemos, atualmente, é ainda a
utilização de estratégias metodológicas tradicionais: alunos em sala
de aulas, aulas expositivas, trabalhos a serem realizados por alunos e
métodos de pergunta e resposta.
Os países menos desenvolvidos não foram contemplados de forma
digna com a riqueza econômica mundial. A ajuda foi direcionada ao
estabelecimento ou à ampliação da educação básica fundamental, de
nível médio e a alfabetização, níveis de escolaridade considerados
necessários para o desenvolvimento econômico. Porém, os recursos
foram limitados repercutindo em baixos salários de professores e na
desqualificação destes.
Na década de 90, a média de idade dos professores em muitos
países da OCDE (Organização para a Cooperação Econômica e
Desenvolvimento) estava acima dos 40 anos. Sob as pressões da
reforma, desânimo, níveis de estresse, as taxas de esgotamento de
professores aumentaram, mesmo em países como o Japão, onde os
ciclos de reforma educacional haviam começado mais tarde. Muitos
professores começaram a se sentir desprofissionalizados à medida que
os efeitos da reforma e da reestruturação se faziam sentir.
99
A reforma escolar nas nações ocidentais se justificava à medida
que se faziam comparações internacionais com outras formas de
avaliar o processo de ensino-aprendizado: o milagre econômico dos
“tigres” asi|ticos de Hong Kong, Cingapura, Coréia, Taiwan e Jap~o.
Contudo, a emergente sociedade do conhecimento necessita de muito
mais flexibilidade no ensino e na aprendizagem do que foi permitido
por essas tendências.
Nessa sociedade, em constante transformação e autocriação, o
conhecimento é um recurso flexível, fluido, em processo de expansão
e mudança incessante. Na atualidade, conhecimento, criatividade e
inventividade são intrínsecos a tudo o que as pessoas realizam
A exigência que hoje se tem de educar para a inventividade está
pautada nas dimensões que envolvem a sociedade do conhecimento:
primeiro, esta engloba uma esfera científica, técnica e educacional
ampliada; segundo, envolve formas complexas de processamento e
circulação de conhecimento e informações em uma economia
baseada em serviços; terceiro, implica transformações básicas da
forma como as organizações empresariais funcionam de modo a
poder promover a inovação contínua em produtos e serviços, criando
sistemas , equipes e culturas que maximizem a oportunidade para a
aprendizagem mútua e espontânea.
CAPÍTULO 2- O ENSINO PARA ALÉM DA SOCIEDADE DO
CONHECIMENTO: DO VALOR DO DINHEIRO AOS VALORES
DO BEM
Ensinar para além da economia do conhecimento significa
desenvolver os valores e as emoções do caráter dos jovens, ressaltar a
100
aprendizagem emocional na mesma medida que a cognitiva,
estabelecer compromissos com a vida coletiva e não apenas com o
trabalho em equipe de curto prazo e cultivar uma identidade
cosmopolita que suporte tolerância com diferenças de raça e gênero,
responsabilidade para com os grupos excluídos dentro e além da
própria sociedade.
Com este propósito, os professores devem se comprometer com o
desenvolvimento e com a aprendizagem profissional formal, trabalhar
com os colegas em grupos de longo prazo, e ter oportunidades para
ensinar e aprender em diferentes contextos e países. Para tais
compromissos existem desafios, um destes é equilibrar as forças
caóticas do risco e da mudança com uma cultura de trabalho capaz de
gerar coerência entre as muitas iniciativas que a escola tem buscado.
A sociedade do conhecimento é, de várias maneiras, mais uma
sociedade do entretenimento na qual imagens fugazes, prazer
instantâneo e pensamento mínimo fazem com que “nos divirtamos
até a morte”.
Na economia do conhecimento, o consumidor é o centro, para a
maioria das pessoas, a opção está inversamente relacionada à
significação.
Ensinar, para além do conhecimento, implica resgatar e reabilitar
a ideia do ensino como vocação sagrada, que busca uma missão social
atrativa.
CAPÍTULO 3 – O ENSINO APESAR DA SOCIEDADE DO
CONHECIMENTO I: O FIM DA INVENTIVIDADE
101
Este capítulo aponta para alguns resultados da pesquisa realizada
nos Estados de Nova York e Ontário. Estes mostram que a reforma
educacional, até aqui realizada, não tem preparado as pessoas para a
economia do conhecimento e também não há preparo para o
enfrentamento da vida pública para além desta economia.
Os dados também apontam para os padrões curriculares: são
suscetíveis a padronizações insensíveis à realidade. Este fato traz
diversas consequências, como por exemplo, a degradação da própria
graduação, o fracasso e a frustração dos professores.
Ensinar para a sociedade do conhecimento, e ensinar para além
dela, não precisam ser objetivos incompatíveis. Não é adequado
tender para um lado específico do “pêndulo”: educando jovens para a
economia ou para a cidadania e a comunidade. Essas posições
polarizadas trazem poucos benefícios a eles, uma vez que ensinar
apenas para a sociedade do conhecimento prepara os alunos e as
sociedades para a prosperidade econômica, mas limita as relações das
pessoas àquelas instrumentais e econômicas, além de restringir as
interações de grupo ao mundo mec}nico da “catraca” do trabalho em
equipe temporário, canaliza as paixões e os desejos das pessoas para a
terapia varejista das compras e do entretenimento e para longe das
interações interpessoais.
Ensinar exclusivamente para além da sociedade do conhecimento
também poderá acarretar complicações, porque se, por um lado,
favorece a atitude de cuidado e solidariedade, desenvolve caráter e
constrói identidade cosmopolita, por outro, as pessoas estão
102
despreparadas para a economia do conhecimento, o que poderá
possibilitar a exclusão delas.
Os professores e outros deverão agora se dedicar a unir essas duas
missões, de ensinar para a sociedade do conhecimento e para além
dela, em uma só, tornando-a o ponto alto de seu propósito.
CAPÍTULO 4 -O ENSINO APESAR DA SOCIEDADE DE
CONHECIMENTO II: A PERDA DA INTEGRIDADE
A melhoria dos padrões de desempenho, na forma de metas com
base em disciplinas, ou ainda a ênfase excessiva com base na
alfabetização e nos cálculos aritméticos, acabam por minimizar a
questão interdisciplinar importante à educação global, que está no
centro da identidade cosmopolita. É também notório que, na reforma
padronizada, os professores são tratados como geradores de
desempenhos padronizados, monitorados de perto. Estes têm a vida
profissional supercontrolada, o que gera uma insatisfação quanto à
perda da autonomia, criatividade, flexibilidade restrita e capacidade
limitada para exercer seu julgamento profissional. Este fato faz
desabar a comunidade profissional, uma vez que os professores lutam
de forma solitária, fazendo com que o amor pela aprendizagem
desapareça.
CAPÍTULO 5- A ESCOLA DA SOCIEDADE DO
CONHECIMENTO: UMA ENTIDADE EM EXTINÇÃO
Este capítulo mostra a experiência de uma escola bem sucedida.
A escola de nível médio Blue Mountain, de Ontário, é exemplo de
uma escola da sociedade do conhecimento. Destaca-se, sobretudo por
103
ter, desde sua criação, seguido os princípios de uma organização de
aprendizagem e de uma comunidade de aprendizagem.
Esta escola promove equipes, envolve a todos no contexto geral de
suas diretrizes, utiliza a tecnologia para promover a aprendizagem
pessoal e organizacional, compartilha os dados e, com base no
consenso, toma decisões, envolve os pais na definição das metas para
os estudantes quando estes deixam a escola.
A escola referida, além de ser uma comunidade de cuidado e
solidariedade, caracterizou-se por ser uma comunidade de
aprendizagem que dá valor diferenciado à família, aos
relacionamentos e à preocupação cosmopolita com os outros no
mundo. Portanto, além desta escola ensinar para a possibilidade de
construção e de revitalização da economia do conhecimento, ensina
para além desta possibilidade. No entanto, a reforma padronizada foi
uma ameaça a essa escola, uma vez que reciclou as transformações
em políticas e as direcionou de volta à escola em formatos rígidos que
acabaram por tornar as mudanças inviáveis.
CAPÍTULO 6- PARA ALÉM DA PADRONIZAÇÃO:
COMUNIDADES DE APRENDIZAGEM PROFISSIONAL OU
SEITAS DE TREINAMENTO PARA O DESEMPENHO?
O Capítulo 6 traz uma análise das políticas de países que não
pertencem a América do Norte, que passaram pela experiência de
seguir um sistema educacional padronizado e, agora, aderiram à
urgência de ir além dela. Esta urgência se caracteriza, sobretudo, pela
crise de recrutamento de professores e pela necessidade de atrair e
manter pessoas capazes na profissão.
104
Existem outras tendências de mudança educacional, mas são
conflituosas. Tanto os professores, quanto as escolas das nações e
comunidades mais pobres, estão sendo submetidas a intervenções
microgestadas nas áreas de alfabetização e aritmética, assumindo um
modelo de seitas de treinamento para o desempenho. Estas
proporcionam aos professores apoio intensivo para a implementação
das intervenções altamente prescritivas em |reas “b|sicas” do
currículo, que demandam benevolência profissional.
Os riscos de ir além da padronização está na possibilidade do
aparecimento de sistema de apartheid no desenvolvimento
profissional, caracterizado pelos privilégios aos ricos e bem-sucedidos
em participar da comunidade de aprendizagem profissional,
enquanto os pobres e os fracassados sejam submetidos ao
treinamento de desempenho sectário.
CAPÍTULO 7- O FUTURO DO ENSINO NA SOCIEDADE DO
CONHECIMENTO: REPENSAR O APRIMORAMENTO, ELIMINAR
O EMPOBRECIMENTO
O Capítulo 7 traz o posicionamento contra o apartheid apontado
anteriormente. Este posicionamento se caracteriza pela tarefa
essencial de redesenhar a melhoria escolar a partir de linhas de
desenvolvimento, voltadas a disponibilizar a comunidade profissional
a todos, e pôr fim ao empobrecimento educacional e social que
prejudica a potencialidade de avanço que muitas nações e
comunidades possam ter. Sob este propósito, a busca da melhoria e o
fim da pobreza deveriam ser missões sociais e profissionais
105
fundamentais da reforma educacional no século XXI, em um dos seus
grandes projetos de inventividade social.
CONCLUSÃO
O propósito deste livro é apontar a natureza e a importância da
sociedade do conhecimento, do mundo no qual os professores fazem
atualmente seu trabalho.
Os professores devem preparar os jovens para ter sucesso na
economia do conhecimento, com a finalidade de sustentar a própria
prosperidade e a de outros, como uma questão necessária à inclusão
social, em que as chances sejam disponibilizadas a alunos de todas as
raças, origens e habilidades iniciais. Nossa prosperidade futura está
diretamente relacionada com a nossa capacidade de inventividade, de
aproveitar e desenvolver nossa inteligência coletiva para os atributos
centrais da economia do conhecimento, ou seja, para inventividade,
criatividade, resolução de problemas, para a cooperação, para
flexibilidade, para a capacidade de desenvolver redes e para lidar com
a mudança e com o compromisso da aprendizagem para toda vida.
O livro também aponta os custos da economia do conhecimento e
algumas conseqüências trazidas por esta. Estas consequências podem
ser percebidas em um mundo fragmentado e frenético que fragiliza as
comunidades, corrói os relacionamentos, espalha a insegurança e
prejudica a vida pública. Tendo em vista estes fatores prejudiciais,
fruto deste tipo de economia, os professores devem ter como meta a
preservação e fortalecimento dos relacionamentos.
106
Ensinar para além da economia do conhecimento significa
acrescentar à agenda da reforma valores que construam comunidade,
desenvolvam capital social e uma identidade cosmopolita.
As reformas educacionais têm visado à padronização insensível, o
que torna quase impossível para muitos professores lecionar para a
sociedade do conhecimento e além desta.
A proposta, apontada neste livro, é que se estabeleçam estratégias
mais sofisticadas para a melhoria na sociedade do conhecimento, que
combinem elementos de treinamento para o desempenho e de
comunidade profissional em quase todas as escolas, possibilitando
um diálogo crítico desde o início para impedir que o treinamento se
torne seita complacente.
Uma das grandes tarefas dos educadores é ajudar a construir um
movimento social dinâmico e includente de educação pública na
sociedade do conhecimento, visando às seguintes propostas:
Reacender seus próprios propósitos e missões morais em um
sistema que começou a perdê-los de vista.
Abrir suas ações e mentes a pais e comunidades e também se
envolver com suas missões.
Trabalhar com seus sindicatos para que se tornem agentes de
sua própria mudança.
Levantar-se corajosamente contra a injustiça e a exclusão, onde
quer que a vejam.
107
Reconhecer que têm uma responsabilidade profissional com
todos, demonstrando isto por meio de redes de cuidado de
solidariedade.
Para que tais propostas sejam efetivas, cinco tarefas são exigidas
de nós:
Precisaremos reviver e reinventar o ensino como uma missão
social apaixonada, vinculada à criação de uma sociedade do
conhecimento includente, inventiva e cosmopolita, à
transformação do mundo dos professores tanto quanto do seu
trabalho. Todos, inclusive os governos, terão que ajudar nisto.
Precisaremos ajudar a construir um movimento social que lute a
favor do investimento em um sistema educacional e em uma
sociedade de inventivos e includentes, que beneficiem a todos.
Precisaremos desenvolver estratégias mais sofisticadas de
melhoria escolar, que reconheçam as diferenças entre
professores e escolas e construam caminhos distintos de
desenvolvimentos para todos eles.
Precisaremos reconhecer que a inventividade, a experimentação
e a flexibilidade mais elevadas não deveriam ser oferecidas
apenas como recompensa a escolas afluentes e seus professores
com desempenho superior, mas como incentivos poderosos aos
melhores professores e líderes, para que assumam o desafio do
trabalho transformador com crianças e escolas em comunidades
pobres nos níveis inferiores.
108
Precisaremos demonstrar coragem política e integridade,
reconectando a agenda da melhoria educacional a um combate
renovado ao empobrecimento social.
A inventividade, o investimento e a integridade, assim como a
identidade cosmopolita, são exigidas de todos nós. De outra maneira,
a insegurança e o pior serão tudo o que teremos, e não menos do que
merecemos.
109
HOFFMANN, Jussara. Avaliar para
promover: as setas do caminho. Porto Alegre:
Mediação, 2001.
Fonte: Revista da Apeoesp.
Para Hoffmann, o trajeto a ser percorrido, quando praticamos a
avaliação, é impulsionado pelo inusitado, pelo sonho, pelo desejo de
superação, pela vontade de chegar ao objetivo/destino que vai sendo
traçado, assim como quando realizamos o caminho a Santiago de
Compostela, na Espanha. Da mesma forma, avaliar necessita da
conversa uns com os outros, para compartilhar dos sentimentos de
conquista, da compreensão das setas.
A ousadia do ato de avaliar, neste caminho, tem o sentido de
avançar sempre: promover e a autora nos apresenta as setas do
caminho.
Buscando Caminhos
A avaliação, compreendida como a avaliação da aprendizagem
escolar, deve servir à promoção, isto é, acesso a um nível superior
de aprendizagem por meio de uma educação digna e de direito de
todos os seres humanos.
Hoffmann é contrária à ideia de que primeiro é preciso mudar a
escola e a sociedade para depois mudar a avaliação. Pelo contrário, a
avaliação, por ser uma atividade de reflexão sobre os próprios atos,
interagidos com o meio físico e social, influi e sofre a influência desse
110
próprio ato de pensar e agir. Assim, é a avaliação reflexiva que pode
transformar a realidade avaliada.
Para transformar a escola, lugar em que ocorre a gestão
educacional de um trabalho coletivo, é necessário que ocorra uma
reflexão conjunta de professores, alunos e comunidade, pois a partir
disso desencadeiam-se processos de mudança muito mais amplos do
que a simples modificação das práticas de ensino.
Esse processo, assim como no caminho a Santiago de Compostela,
gera inquietação e incertezas para os professores, as quais devem ser
respeitadas, por meio de oportunidades de expressão desses
sentimentos, de compreensão de outras perspectivas e de reflexão
sobre as próprias crenças. É no confronto de ideias que a avaliação vai
se construindo para cada um dos professores à medida que discutem,
em conjunto, valores, princípios e metodologias.
Rumos da Avaliação neste século
O problema da avaliação da aprendizagem tem sido discutido
intensamente neste último século. Nas últimas décadas, adquiriu um
enfoque político e social, que intensificou a pesquisa sobre o assunto.
A tendência, dentre os principais estudiosos do assunto, é a de
procurar superar a concepção positivista e classificatória das
práticas avaliativas escolares (baseada em verdades absolutas,
critérios objetivos, medidas padronizadas e estatísticas) em favor de
uma ação consciente e reflexiva sobre o valor do objeto avaliado, as
situações avaliadas e do exercício do diálogo entre os envolvidos.
111
Dessa maneira, assume-se conscientemente o papel do avaliador
no processo, dentro de um dado contexto, que confere ao educador
uma grande responsabilidade por seu compromisso com o objeto
avaliado e com sua própria aprendizagem - a de como ocorre o
processo avaliativo.
Essa reflexão envolve os próprios princípios da democracia,
cidadania e direito à educação, que se contrapõem às concepções
avaliativas classificatórias, que se fundamentam na competição, no
individualismo, no poder, na arbitrariedade, que acabam enlaçando
tanto os professores quanto os alunos em suas relações pessoais verti-
cais e horizontais.
A avaliação a serviço da ação
A contraposição básica estabelecida por este princípio é
estabelecida entre uma concepção classificatória de avaliação da
aprendizagem escolar e a concepção de avaliação mediadora.
A avaliação mediadora, fundada na ação pedagógica reflexiva,
implica necessariamente uma ação que promova melhoria na situação
avaliada. Em se tratando da avaliação da aprendizagem, sua finalidade
não é o registro do desempenho escolar, mas sim a observação
contínua das manifestações de aprendizagem para desenvolver ações
educativas que visem à promoção, a melhoria das evoluções
individuais.
Da mesma forma, a avaliação de um curso só terá sentido se for
capaz de possibilitar a implementação de programas que resultem em
melhorias do curso, da escola ou da instituição avaliada.
112
No entanto, a despeito das inovações propostas pela nova LDB
(9394/ 96), observa-se na maioria das escolas brasileiras, de todos os
níveis, a dificuldade para incorporar e compreender a concepção de
avaliação mediadora. Em seus regimentos escolares enunciam-se
objetivos de avaliação contínua, mas, ao mesmo tempo, estabelecem-
se normas classificatórias e normativas, o que revela a manutenção
das práticas tradicionais e a resistência à implementação de regimes
não seriados, ciclos, programas de aceleração, evidenciando o caráter
burocrático e seletivo que persiste no país.
É a compreensão e definição da finalidade da avaliação da
aprendizagem que deve nortear as metodologias e não o inverso,
como se tem observado até agora.
A autora resume os princípios básicos – as setas do caminho – a
seguir, apontando para onde vamos:
DE PARA
Avaliação para classificação,
seleção, seriação.
Avaliação a serviço da
aprendizagem, da formação, da
promoção da cidadania.
Atitude reprodutora,
alienadora, normativa
Mobilização em direção à
busca de sentido e significado da
ação.
Intenção prognóstica,
somativa, explicativa e de
desempenho.
Intenção de acompanhamento
permanente de mediação e
intervenção pedagógica favorável
a aprendizagem.
Visão centrada no professor e Visão dialógica, de
113
em medidas padronizadas de
disciplinas fragmentadas.
negociação, referenciada em
valores, objetivos e discussão
interdisciplinar.
Organização homogeneizada,
classificação e competição.
Respeito às individualidades,
confiança na capacidade de todos,
na interação e na socialização.
A finalidade da avaliação mediadora é subsidiar o professor, como
instrumento de acompanhamento do trabalho, e a escola, no processo
de melhoria da qualidade de ensino, para que possam compreender
os limites e as possibilidades dos alunos e delinear ações que possam
favorecer seu desenvolvimento, isto é, a finalidade da avaliação é
promover a evolução da aprendizagem dos educandos e a promoção
da qualidade do trabalho educativo.
Regimes seriados versus regimes não-seriados
Uma das maiores dificuldades de compreensão das propostas
educacionais contemporâneas reside no problema da organização do
regime escolar em ciclos e outras formas não seriadas. A razão dessa
dificuldade reside justamente no apego às ideias tradicionais às quais
se vinculam o processo de avaliação classificatória e seletiva.
Os regimes seriados estabelecem oficialmente uma série de
obstáculos aos alunos, por meio de critérios pré-definidos
arbitrariamente como requisitos para a passagem à série seguinte. Os
desempenhos individuais dos alunos são utilizados para se comparar
uns com os outros, promovendo os "melhores" e retendo os "piores".
114
As diferenças individuais são reconhecidas, não como riqueza, mas
como instrumento de dominação de uns poucos sobre muitos.
Os regimes não seriados, ao contrário, fundamentam-se em
concepções desenvolvimentistas e democráticas, focalizando o
processo de aprendizagem, e não o produto. O trabalho do aluno, a
aprendizagem, é comparado com ele próprio, sendo possível observar
sua evolução de diversas formas ao longo do processo de ensino-
aprendizagem, reconhecer suas possibilidades e respeitá-las. Dessa
forma, a avaliação contínua adquire o significado de avaliação
mediadora do processo de desenvolvimento e da aprendizagem de
cada aluno, de acordo com suas possibilidades e da promoção da
qualidade na escola.
Isso está longe de ser menos exigente, rigorosa e mais permissiva.
Pelo contrário, essa organização de trabalho escolar exige a realização
de uma prática pedagógica que assuma a diversidade humana como
riqueza, as facilidades e dificuldades de cada um como parte das
características humanas, que devem ser respeitadas e, ao fazê-lo,
novas formas de relações educativas se constituem a partir da
cooperação e não da competição.
Deste modo, se torna possível acolher a todos os alunos, porque
não há melhores nem piores, sendo que, num processo de avaliação
classificatória, estes últimos, "os piores" estarão predestinados ao
fracasso e à exclusão.
Provas de recuperação versus estudos paralelos
115
A ideia de recuperação vem sendo concebida como retrocesso,
retomo. As provas de recuperação se confundem com a
recuperação das notas já alcançadas, com repetição de conteúdos.
Estudos paralelos de recuperação são próprios a uma prática de
avaliação mediadora. Neste processo o conhecimento é construído
entre descobertas e dúvidas, retomadas, obstáculos e avanços. A
progressão da aprendizagem, nos estudos paralelos, está direcionada
ao futuro do desenvolvimento do aluno.
Os estudos paralelos precisam acompanhar os percursos
individuais de formação dos alunos e considerar os princípios da
pedagogia diferenciada, para a qual nos chama a atenção Perrenoud
(2000), que alerta:
“o que caracteriza a individualização dos percursos não é a solidão
no trabalho, mas o caráter único da trajetória de cada aluno no
conjunto de sua escolaridade”.
Nesse sentido, o reforço e a recuperação (nas suas
modalidades contínua, paralela ou final) são considerados
parte integrante do processo de ensino e de aprendizagem para
atendimento à diversidade das características, das necessidades
e dos ritmos dos alunos.
Alertamos para o fato de que Hoffman defende que o termo para-
lelo pressupõe estudos desenvolvidos pelo professor em sua classe e
no decorrer natural do processo. Cada professor estabelece uma
relação diferenciada de saber com seus alunos. É compromisso seu
orientá-los na resolução de dúvidas, no aprofundamento das noções,
116
e a melhor forma de fazê-lo é no dia-a-dia da sala de aula, contando
com a cooperação de toda a turma. (1)
Conselhos de classe versus "conselhos de classe"
Os conselhos de classe vem sendo realizados, em grande parte das
escolas, orientados por modelos avaliativos classificatórios e com
caráter sentencitivo - se propondo a deferir uma sentença ao aluno.
Nestas sessões, o privilégio ao passado é evidente.
Hoffman defende que esta deve ser uma ação voltada para o
futuro, de caráter interativo e reflexivo, deliberadora de novas ações
que garantam a aquisição de competências necessárias à
aprendizagem dos alunos.
Os momentos do conselho de classe precisam ser repensados
pelas escolas e serem utilizados para a ampliação das perspectivas
acerca dos diferentes jeitos de ser e de aprender do educando que
interage com outros educadores e com outros conhecimentos. As
questões atitudinais não devem ocupar um tempo enorme em
detrimento das questões do ensino-aprendizagem.
Para Hoffman...projetar a avaliação no futuro dos alunos significa
reforçar as setas dos seus caminhos: confiar, apoiar, sugerir e,
principalmente, desafiá-los a prosseguir por meio de provocações
significativas.
Uma atividade ética
Não basta desenvolver a avaliação educacional a serviço de uma
ação com perspectiva par o futuro, mas torná-la referência para
117
decisões educativas pautadas por valores, por posturas políticas,
fundamentos filosóficos e considerações sociais.
Os protagonistas da avaliação precisam ser levados a refletir sobre
o que fazem e por que fazem. As práticas educacionais exigem, além
de conhecimento, metodologia, trabalho científico, a inclusão da
dimensão ética e sensível. Nesse sentido programas e projetos
desenvolvidos para dar conta de problemas apresentados para o
estudo de uma área de conhecimento ou para resolver questões de
determinadas escolas, estariam respondendo às dimensões ético-
políticas neste contexto avaliativo.
As reformas educacionais
Oriundas de posturas políticas que não devem se sobrepujar aos
atos educativos, as novas medidas em avaliação educacional afetam os
sentimentos dos atores envolvidos, por se tratar de uma atividade
prática, ética em seu sentido mais original, porque está embasada em
juízo de valor.
Não concordamos que deva haver regra única em avaliação, ainda
que elencada no bojo de diretrizes unificadoras das reformas
educacionais, porque cada situação envolve a singularidade dos
participantes do processo educativo.
Não encontramos mecanismos únicos, classificatórios que dêem
conta da complexidade do ato avaliativo. É preciso considerar, como
alerta Morin, a complexidade inerente a tal finalidade.
A participação das famílias
118
Os pais devem participar da escolaridade de seus filhos,
considerando, entretanto, a natureza do envolvimento; a realidade
social destes pais; a constituição de suas famílias; a luta pela so-
brevivência, etc., nos faz ponderar que as dificuldades de
aprendizagem dos alunos não podem ser atribuídas às famílias, muito
menos o trabalho de superação destas dificuldades não pode recair
sob a responsabilidade destes, mas dos profissionais que atuam nas
escolas, bem como são de sua responsabilidade a aquisição de
atitudes e habilidades que favoreçam o enriquecimento das relações
interpessoais no ambiente escolar.
É compromisso dos pais acompanhar o processo vivido pelos
filhos, dialogar com a escola, assumir o que lhes é de
responsabilidade. (34)
Promover o diálogo entre os pais e os professores é função da
escola, que não significa atribuir a eles a tarefa da escola.
A educação inclusiva
Num processo de avaliação mediadora, a promoção se baseia na
evolução alcançada pelo aluno, na sua singularidade e de acordo com
suas possibilidades, desde que se tenha garantido as melhores
oportunidades possíveis à aprendizagem e ao desenvolvimento de
todos e de cada um.
Nesse contexto, a responsabilidade pelo fracasso não pode ser
atribuída ao aluno, às suas dificuldades ou à sua incapacidade. A
responsabilidade pelo desenvolvimento da aprendizagem contínua do
aluno recai sobre os educadores e sobre a comunidade.
119
Dessa compreensão decorre o princípio da educação inclusiva:
oferecer ao aluno oportunidade máxima de aprendizagem e de
inserção social, em condições de igualdade educativa, isto é, oferece
ao aluno condições adequadas de aprendizagem de acordo com suas
características, suas possibilidades. Isso significa encontrar meios
para favorecer aprendizagem de todos os alunos.
Assim, são professores e escolas que precisam adequar-se aos
alunos e não os alunos que devem adequar-se às escolas e aos
professores.
A, dimensão da exclusão de muitos alunos da escola pode ser
medida:
• pela constataç~o das pr|ticas reprovativas baseadas em
parâmetros de maturidade e de normalidade;
• pela ocorrência dos encaminhamentos de alunos para classes e
escolas especiais por erros na avaliação pedagógica.
A inclusão nas classes regulares de alunos que necessitam de
atendimento especializado, sem que haja a preparação do professor
no desempenho de seu papel, priva os alunos com necessidades
especiais de uma escolaridade digna.
Para Hoffman, um sério compromisso irá mobilizar a escola
brasileira deste século: formar e qualificar profissionais conscientes de
sua responsabilidade ética frente à inclusão.
120
Se incluir é fundamental e singular,como no caminho de Santiago,
é necessário valorizar cada passo do processo, sem pressa, vivendo
cada dia o inusitado.
Capítulo 2 - Outra concepção de tempo em avaliação
O tempo é um tema recorrente nas discussões sobre avaliação,
principalmente nas séries finais do Ensino Fundamental e do Ensino
Médio.
Os professores do Ensino Médio, premidos pelo vestibular,
desaguam os conteúdos que têm que dar conta, no afã de estarem
sempre concluindo caminhos que, na verdade, são inconclusos.
A trajetória a ser percorrida pela avaliação requer diálogo,
abertura e interação, não havendo como delimitar tempos fixos. Na
última década, as trajetórias da avaliação se propõem a respeitar os
tempos e percursos individuais de formação, no sistema de ensino e
na sala de aula.
O aprendiz determina o próprio tempo da aprendizagem
É preciso conhecer o aluno enquanto aprendiz, enquanto pessoa,
membro de uma família, de uma comunidade, com o qual interage
ativa e continuamente.
O aprendiz é sujeito de sua história. É preciso respeitar seu tempo
de aprender e de ser, o que implica desagregar-se do tempo
determinado para aprender dado conteúdo.
121
Tendo oportunidade de confrontar suas ideias com as dos colegas,
ou em textos, vivendo situações problema, o aluno irá
progressivamente compreender e evoluir conceitualmente. Desta for-
ma, o ensino não está centrado no professor, nas aulas frontais,
pois cada participante do processo pode colaborar com a
aprendizagem dos outros. Sendo assim, o tempo é determinado pelo
aprendiz e o conteúdo pode ser proposto e explorado de diversas
formas, tanto pelo professor, como pela turma.
Cada passo é uma grande conquista
A autora oferece sugestões e exemplos de oportunidades de
aprendizagem que podem ser oferecidas, mesmo em condições
limitantes (classes superlotadas, escassez de materiais e outras
situações apontadas por muitos como justificativa para a má
qualidade do ensino):
Avaliação mediadora significa: busca de significado para todas as
dimensões do processo por meio de uma investigação séria sobre as
características próprias dos aprendizes; conhecer para promover e
não para julgar e classificar; convicção de que as incertezas são parte
da educação porque esta é fruto de relações humanas, fun-
damentalmente qualitativas.
Outro problema passa a se constituir aqui, quando não se
compreende que o processo de aquisição de conhecimentos é não-
linear e infinito, além de impossível de se determinar a priori: a
questão dos conteúdos acadêmicos e do tempo. Sobre isso, a autora
afirma que uma pedagogia diferenciada pode se desenvolver na
experiência coletiva da sala de aula... desde que haja a clareza de que
122
o aluno aprende na relação com os outros, interativamente, mas
aprende ao seu tempo e de forma única e singular.
Todo o aprendiz está sempre a caminho
Constatamos, no caminho, que há um conjunto de variações de
respostas dos alunos de todo os níveis de ensino. Esta variabilidade de
manifestações nos aponta que muitas tentativas de acerto são feitas
por meio de ensaios e erros. Essas estratégias são desenhadas por
meio de respostas que chamamos de erro, são comuns e o professor
precisa compreender que trata-se de:
uma resposta incorreta, mas indicadora de progresso, de
avanço em relação a uma fase anterior do aprendizado, dizendo
muito sobre "qualidade".
É preciso reconhecer que nas práticas atuais, a padronização dos
percursos incorre em sérios prejuízos para os alunos, porque:
Notas e conceitos são superficiais e genéricos em relação à
qualidade das tarefas e manifestação dos alunos.
Notas e conceitos classificatórios padronizam o que é diferente,
despersonalizando as dificuldades de avanços de cada aluno.
Superficializam e adulteram a visão da progressão das
aprendizagens e do seu conjunto tanto em uma única tarefa, quanto
em um ao letivo, pelo caráter somativo que anula o processo.
123
Baseiam-se, arbitrariamente, em certos e errados absolutos,
negando a relativização desses parâmetros em diferentes condições
de aprendizagem.
Produzem a ficção de um ensino homogêneo pela impossibilidade
de acompanhar a heterogeneidade do grupo.
Reforçam o valor mercadológico das aprendizagens e das relações
de autoritarismo em sala de aula.
Privilegiam a classificação e a competição em detrimento da
aprendizagem.
Entravam o diálogo entre os professores, entre professores e
alunos e da escola com os pais, em termos de avaliação, pela
superficialidade do acompanhamento.
Qualidade significa intensidade, profundidade, criação, perfeição.
Como tal, sua magnitude não pode ser medida em "escalas
métricas" ou por recursos de "conversão entre sistema de
mensuração",
É importante refletir a cada passo
Mediar é aproximar, dialogar, acompanhar, ajudar, sem interferir
no direito de escolha do aprendiz sobre os rumos de sua trajetória de
conhecimento.
Classes numerosas podem dificultar essa aproximação, mas umas
das alternativas é justamente o trabalho em equipe por parte dos
124
professores, que podem dividir entre si a tarefa de acompanhar mais
de perto um grupo de alunos (tutoria).
O trabalho em equipe de professores envolve o compromisso de
compartilhamento das experiências, favorecendo a abordagem
interdisciplinar, a ampliação das perspectivas acerca da aprendizagem
dos alunos.
A auto-avaliação como processo contínuo
A auto-avaliação é um processo contínuo que só se justifica
quando se constitui como oportunidade de reflexão, tomada de
consciência sobre a própria aprendizagem e sobre a própria conduta,
para ampliar suas possibilidades e favorecer a superação de
dificuldades. Ao ser solicitado a explicar como chegou a uma dada
solução de uma situação, o aluno é levado a pensar e explicitar suas
próprias estratégias de aprendizagem, ampliando sua consciência
sobre seu próprio fazer e pensar, sobre o seu aprender a aprender.
O mesmo processo se aplica aos próprios professores, no processo
de orientação e apoio de colegas, supervisor e demais profissionais de
suporte pedagógico.
Capítulo 3-As múltiplas dimensões do olhar avaliativo
Avaliar, em sua totalidade, implica em prestar atenção aos seus
fundamentos. Como um grande iceberg do qual só se percebem os
registros, precisamos construir olhares mais profundos, para poder ter
acesso às suas dimensões sobre:
Os registros obtidos;
125
O processo de avaliação;
As concepções de avaliação;
Os valores sociais e éticos.
Avaliação é controle. No âmbito escolar, isso reverte o
compromisso do profissional do educador: quais os princípios e
valores morais, sociais, educacionais que fundamentam as tomadas de
decisões com base nos processos de avaliação realizados; quais os
critérios utilizados, até que ponto são claros e transparentes para
todas a comunidade (escola, família, os próprios alunos); quais os
benefícios ou prejuízos que podem advir desse processo de controle
outorgado à escola e aos professores. Daí o compromisso ético
implícito no processo de avaliação mediadora.
Avaliar para reprovar não é indicador da qualidade da escola ou
do professor. Isso só tem sentido dentro de uma perspectiva
classificatória e seletiva.
A finalidade do controle deve ser entendida a favor do aluno e não
como obrigação imposta pelo sistema. Os trajetos de cada aprendiz
são únicos, obedecem a ritmos e interesses diversos, mesmo vivendo a
mesma experiência, cada um a experimenta de uma forma singular, o
que implica em aprendizagens diferentes dentro de um mesmo
contexto.
Delineando objetivos
Definir os rumos, delinear o norte, o destino essencial das ações
educativas precisa ser o compromisso fundamental do educador no
126
processo de avaliação da aprendizagem. Entretanto este trabalho se
dá em um contexto escolar concreto em que
"a escola enfrenta muitos limites nesse sentido: behaviorismo,
taxionomias intermináveis, excessivo fracionamento dos objetivos, e
permanente tensão no ambiente escolar entre os que querem
transmitir conhecimentos e os que querem desenvolver práticas
sociais".(Perrenoud, 2000).
Metas e objetivos não se constituem em pontos de chegada
absolutos, mas pontos de passagem, novos rumos para a
continuidade do trabalho educativo.
Avaliar segundo esses princípios implica refletir sobre as crenças,
intenções, ideias, estratégias, a quem se destinam, quais as condições
existentes, quais possibilidades e alternativas que pode ser citadas em
favor do aprendiz.
O plano epistemológico
A intervenção pedagógica é determinada pela compreensão dos
processos realizados pelo aprendiz em sua relação com o objeto de
conhecimento.
Aprender exige engajamento do aprendiz na construção de
sentidos o que implica busca de informações pertinentes momentos
diversificados de aprendizagem contínua. Isso resulta em que o
trabalho do professor acerca dos conceitos que pretende ensinar
consiste em provocar gradativamente os aprendizes, oferecendo
oportunidade para que estabeleçam relações entre conceitos e entre
127
as várias áreas do conhecimento. Assim, interdisciplinaridade e
transversalidade são inerentes ao processo educativo. A compreensão
que o aluno tem de uma dada disciplina interfere em sua
aprendizagem em outras disciplinas.
Os conteúdos
Cabe ao professor:
atentar às concepções prévias dos alunos e seus modos de ex-
pressarem-se sobre elas para poder organizar situações de
aprendizagem capazes de envolver esses alunos;
estar alerta aos desdobramentos dos objetivos traçados
inicialmente, que constituirão diversos rumos de
prolongamento dos temas em estudo, dentro de uma visão
interdisciplinar, e diversificação dos procedimentos de
aprendizagem;
organizar momentos de estruturação do pensamento,
favorecendo aos alunos oportunidades para objetivação de suas
ideias e a consolidação dos conceitos e noções desenvolvidas.
O planejamento pedagógico revela múltiplos direcionamentos e
está diretamente vinculado ao processo avaliatório, uma vez que as
decisões metodológicas estabelecem as condições de aprendizagem
ampliando ou restringindo o processo de conhecimento.
A intervenção pedagógica deve estar comprometida com a supera-
ção de desafios que possam ser enfrentados pelos alunos,
favorecendo-os avançar sempre.
128
Perguntar mais do que responder
Avaliar é questionar, formular perguntas, propor tarefas
desafiadoras em processo consecutivo/contínuo.
A avaliação contínua significa acompanhamento da construção do
conhecimento por parte do aprendiz, exigindo alterações qualitativas
nas formas registro e tomadas de decisão sobre aprovação. Cabe ao
professor perguntar mais do que responder, oferecendo ao aluno
múltiplas oportunidades de pensar, buscar conhecimentos, engajar-se
na solução de problemas, repensar, comprometer-se com seus
próprios avanços e dificuldades.
Transformar respostas em novas perguntas
1. Cada resposta deve suscitar mais perguntas, tanto por parte dos
aprendizes como do próprio professor. A continuidade da ação
pedagógica condiciona-se aos processos vividos, interesses, avançados
e necessidades dos alunos. Assim:
Experências coletivas resultam em construções individuais (cada
aluno aprenderá a seu jeito, a seu tempo, responderá a sua maneira).
A interpretação das respostas dos alunos possibilita ao professor
perceber necessidades e interesses individuais de múltiplas
dimensões (análise qualitativa)
Novas experiências educativas, enriquecedoras e complementares,
articuladas às observações feitas, são propostas e/ou negociadas com
os alunos (explicações do professor, atividades que podem ser para
129
todo o grupo, em pequenos grupos ou específicas para determinados
alunos).
Novas tarefas e/ou atividades são propostas para acompanham o
aluno em sua evolução (preferencialmente tarefas avaliativas
individuais).(p.74)
Capítulo 4 - Avaliação e mediação
... os melhores guias são os próprios peregrinos, que percorrem o
caminho conosco, enfrentando as mesmas dificuldades e provocando-
nos a andar mais depressa.
Avaliação mediadora é um processo interativo, de troca de
mensagens e de significados, de confronto.
A mediação, conforme Vygotsky e Piaget, é essencial na
construção do conhecimento.
Para Vygotsky a reconstrução é importante porque, no processo
de internalização o aluno atribui sentido à informação criando e
recriando significados com o uso e a audição/leitura da língua falada e
escrita.
Para Vygotsky e Piaget, a linguagem é a mediação do pensamento.
Note-se ainda que a interação social é fundamental, pois nela se
dará a aprendizagem.
A avaliação é um processo dinâmico e espiralado que acompanha
o processo de construção do conhecimento, sendo uma interpretação
130
que assume diferentes significados e dimensões ao longo do processo
educacional, tanto por parte do professor como do aluno.
A dinâmica do processo avaliativo
A dinâmica da avaliação é complexa, uma vez que o processo de
aprendizagem, entendido como construção do conhecimento, é ao
mesmo tempo individual e coletivo, pois resulta da ação do aprendiz
sobre o objeto de conhecimento e da interação social, que o leva a
uma interpretação que necessita, e pode ser reformulada, ampliada
progressivamente, tornando-o capaz de pensar sobre seus próprios
pensamentos elaborando seus conceitos e reelaborando outros.
Pela mobilização chegamos à expressão do conhecimento,
realizamos a experiência educativa, o que nos possibilita mobilizar
novas competências adquiridas no processo.
Mediando a mobilização
A expressão/construção da "aprendizagem significativa" pode se
realizar de múltiplas formas e em diferentes níveis de compreensão.
A avaliação mediadora destina-se a mobilizar, favorecer a
experiência educativa e a expressão do conhecimento e a abertura a
novas possibilidades por parte do aprendiz.
Não há sentido em avaliar tarefas coletivas atribuindo valores
individuais ou somar pontos por participação e outras atividades,
uma vez que essas atividades são oportunidades de interação em meio
ao processo e não pontos de chegada.
131
Para Charlot, o conceito de mobilização implica a ideia do
movimento.
Qual o papel do educador/ avaliador?
É o papel de mediador, exigindo-lhe manter-se flexível, atento,
crítico sobre seu planejamento. É preciso que ele seja propositivo,
sem delimitar, consiga questionar e provocar, sem antecipar respostas
prontas; articular novas perguntas a um processo contínuo de
construção do conhecimento.
O papel do educador ao desencadear processos de aprendizagem
é o de mediador da mobilização para o aprender.
A investigação de concepções prévias
A análise das concepções prévias dos alunos não pode ser
confundida com as condições prévias do aluno. O que o aluno já sabe
é baseado em elaborações intuitivas sobre dados da realidade, que
necessita ser aperfeiçoado. As condições prévias referem-se a história
escolar e de vida de cada aluno, que devem ser conhecidas em favor
do alunos e não para fortalecer pré-conceitos sobre ele.
A finalidade da avaliação no que se refere à mobilização é de
adequar as propostas e as situações às necessidades e possibilidades
dos alunos, para poder fornecer-lhes a aprendizagem significativa.
Conhecer as concepções prévias do aluno favorece o planejamento
em termos de pontos de partida, e os possíveis rumos a seguir, mas
estes necessitam ser redimensionados continuamente ao longo do
processo. Conhecer as condições prévias permite planejar tempos de
132
descobertas, de diálogos, de encontros, de interação de trocas, de
expressão, ao longo do período letivo.
Os processos de educação e de avaliação exigem do professor a
postura investigativa durante todo o percurso educativo.
Como mediar o desejo e a necessidade de aprender?
O trabalho do professor consiste em:
mediar o desejo e a necessidade de aprender;
mediar as experiências educativas;
mediar as estratégias de aprendizagem no meio de atividades
diversificadas e diferenciadas;
mediar a expressão do conhecimento ao longo de tarefas
gradativas e articuladas.
Mediar a mobilização significa suscitar o envolvimento do aluno
no processo de aprendizagem, criando perguntas mobilizadoras,
experiências interativas e oportunidades de expressão do pensamento
individual, mesmo que as respostas não sejam ainda corretas.
Mediando a experiência educativa
Mediar as experiências educativas significa acompanhar o aluno
em ação-reflexão-ação, nos processos simultâneos de busca
informações, refletir sobre seus procedimentos de aprendizagem,
interagir com os outros, refletir sobre si próprio enquanto aprendiz
(p.94).
Duas perguntas se tornam essenciais na mediação:
133
Qual a dimensão do envolvimento do aluno com a atividade de
aprender?
Como ele interage com os outros?
As estratégias de aprendizagem
Mediar as estratégias de aprendizagem significa intervir no
processo de aprendizagem provocando no aprendiz, e no próprio
professor, diferentes graus de compreensão, levando a refletirem
sobre seus entendimentos no diálogo educativo. Significa oferecer aos
aprendizes: experiências necessárias e complementares (diversificadas
no tempo), com diversos graus de dificuldades, de forma individual,
em parcerias, em pequenos grupos, em grandes grupos para promover
confronto de ideias entre aprendizes e entre estes e o professor, por
meio de diversos recursos didáticos e de diversas formas de expressão
do conhecimento, por meio de diferentes linguagens.
Os desafios propostos durante a atividade educativa são
observados por Hoffmann:
• Nem sempre o que o professor diz ao estudante é entendido
como ele gostaria;
• A estratégia utilizada pelo aluno, ao fazer algo, só pode ser
intuída pelo professor e ajudá-lo ou confundi-lo;
• O professor sabe onde o aluno poderá chegar, mas não deverá
dizê-lo assim suas orientações serão sempre incompletas.
134
• O aluno nem sempre expressa suas dúvidas ou as expressa
claramente, uma vez que "são dúvidas" - o professor precisa
interpretar perguntas.
• Ouvir o aluno antes de intervir assegura melhores interpretações
sobre suas estratégias.
• Posturas afetivas, nessas intervenções, minimizam a pressão
exercida pelo questionamento do professor.
Esses desafios possibilitam a aquisição de competências
necessárias aos professores/profissionais reflexivos.
Atividades diversificadas ou diferenciadas?
Diversificar experiências educativas representa alguns princípios
importantes em avaliação mediadora: diversificá-las em tempo, graus
de dificuldade, termos de realização individual, termos dos recursos
didáticos e termos da expressão do conhecimento.
Diferenciar experiências educativas atende aos pressupostos
básicos da ação docente:
• Aprender sobre o aprender;
• Reconhecer que o processo de conhecimento é qualitativamente
diferente;
• Mediar o desenvolvimento de aprendizagens coletivas e de
atendimento individual;
135
• Valorizar a heterogeneidade os grupo no processo de formação a
diversidade;
• Oferecer ajuda específica se discriminar; sem desrespeitar; sem
subestimar.
Mediando a expressão do conhecimento
Mediar a expressão do conhecimento implica a reutilização de
instrumentos de avaliação como desencadeadores da continuidade da
ação pedagógica, sendo o desempenho do aluno considerado como
provisório, uma vez que está em processo de aprendizagem.
Nesse sentido, notas ou conceitos não podem ser consideradas
definitivas, mas apenas relativas ao conjunto de aprendizagens
ocorridas em um dado período. Implica também refletir sobre as
condições oferecidas para que tal conjunto de aprendizagem ocorra.
Tarefas gradativas e articuladas
Para Hoffmann, a avaliação mediadora é mais exigente e rigorosa
para alunos e professores porque suscita a permanente análise do
pensamento em construção, o que significa muitas tarefas individuais
e análise imediata do professor.
O que o aluno fala, escreve ou faz não é seu pensamento, mas sua
expressão, que também evolui e se aprimora progressivamente e
necessita ser trabalhada. Os instrumentos de avaliação devem
respeitar as diferentes formas de expressão do aluno, ao mesmo
tempo em que definem a dimensão do diálogo entre alunos e profes-
sor. A interpretação que o professor faz das expressões do aluno está
136
sempre sujeita a ambiguidades, inseguranças, indefinições, daí a
necessidade do diálogo, da troca de ideias que favoreça a
convergência de significados.
Na perspectiva mediadora, toda avaliação, desde um simples
comentário do professor até o uso de instrumentos formais, tem por
finalidade a evolução do aluno em termos de postura reflexiva sobre o
que aprende, as estratégias que utiliza e sua interação com os outros.
Isso só ocorre mediante a postura igualmente reflexiva do educador.
Respeito às diferentes formas de expressão
Os instrumentos de avaliação, em termos do planejamento e
análise, definirão a dimensão do diálogo entre alunos e professor.
O principio fundamental da expressão do conhecimento: o que
ouvimos, vemos ou lemos não é o pensamento do aluno, mas a sua
expressão, que também evolui, se aprimora e precisa ser trabalhada.
Os limites no diálogo entre professores e alunos devem ser consi-
derados como positivos na busca de sintonia. A interpretação dos
sentidos, expressos por ambos, está sempre sujeita a ambiguidade,
inseguranças e indefinições.
Uma postura reflexiva do aluno e do professor
As tarefas avaliativas operam funções de reflexão que possibilitam:
• para o professor: elemento de reflexão sobre os conhecimentos
expressos pelos alunos x elemento de reflexão sobre o sentido da sua
ação pedagógica;
137
• para o aluno: oportunidade de reorganizaç~o e express~o de
conhecimentos x elemento de reflexão sobre os conhecimentos
construídos e procedimentos de aprendizagem.
Mediar a aprendizagem significa, favorecera tomada de
consciência do aluno sobre limites e possibilidades no processo de
conhecimento, possibilitando ao educando refletir sobre sua apropria
aprendizagem, a partir de ações do cotidiano, originando sig-
nificativas práticas de auto-avaliação.
Capítulo 5 - Registros em avaliação mediadora
...Se estivermos contando uma história, precisamos agir como
historiadores, registrando e organizando dados da nossa memória,
para não cairmos no erro do esquecimento...
Os registros em avaliação mediadora envolvem desde o uso de
instrumentos comumente utilizados, tais como: provas (objetivas e
dissertativas) exercícios, preenchimento de lacunas, escolha de
afirmações verdadeiras ou falsas, itens de múltipla escolha, questões
combinadas, etc., pois o que verdadeiramente importa é a clareza da
tarefa para o aluno e a reflexão do professor sobre a interpretação que
será dada as expressões dos alunos em termos de encaminhamentos
pedagógicos a serem realizados a seguir.
A organização de dossiês dos alunos, portfólios, relatórios de
avaliação envolve meios de registro de um conjunto de aprendizagem
do aluno que permitam ao professor, ao próprio aluno e a suas
famílias uma visão evolutiva do processo. Esses instrumentos tornam-
se mediadores na medida em que contribuem para entender a
138
evolução do aluno e apontar ao professor novos rumos para sua
intervenção pedagógica sempre o mais favorável possível à
aprendizagem do aluno, de todos os alunos, de acordo com suas
necessidades e possibilidades.
Os registros escolares precisam refletir com clareza os princípios
de avaliação mediadora delineados, de tal forma que registros
classificatórios sejam superados em favor de registros que assumam o
caráter de experiências em construção, confiantes em sua perspectiva
ética e humanizadora. Nada, em avaliação, serve como regra geral, ou
vale para todas as situações, em termos de procedimento.
O processo de avaliação precisa ser coerente com todo o processo
de aprendizagem, desde sua concepção, definição de sua finalidade,
planejamento de estratégias de intervenção, compreensão do
processo de construção está atrelado às concepções sobre a finalidade
de educação, as quais determinam as estratégias metodológicas de
ensino.
Instrumentos a serviço das metodologias
Quando a autora se refere a instrumentos de avaliação, está falan-
do sobre testes, trabalhos e todas as formas de expressão do aluno
que me permitam acompanhar o seu processo de aprendizagem -
tarefas avaliativas.
Instrumentos de avaliação são registros de diferentes naturezas.
Ora é o aluno que é levado a fazer os próprios registros, expressando
o seu conhecimento em tarefas, testes, desenhos, trabalhos e outros
139
instrumentos, ora é o professor quem registra o que observou do
aluno, fazendo anotações e outros apontamentos.
Critérios de correção de tarefas
Critérios de avaliação podem, serem entendidos por orientações
didáticas de execução de uma tarefa, por seus aspectos formais:
número de páginas, organização no papel, itens de resposta, normas
de redação técnica, etc.
Tarefas avaliativas, numa visão mediadora, são planejadas tendo
como referencia principal a sua finalidade, a clareza de intenções do
professor sobre o uso que fará dos seus resultados, muito mais do que
embasados em normas de elaboração.
O significado dos registros para os professores
A prática classificatória assumiu "status" de precisão, objetividade
e cientificidade, sendo necessário, para sua superação, a reflexão em
ação e a reflexão sobre a ação (trocando ideias com outros colegas).
Os registros não necessitam ser genéricos, nem de ordem
atitudinal, nem devem ser centrados em cumprimento de tarefas
quantitativos ou organização de cadernos e materiais.
140
MORIN, Edgar. Os sete saberes
necessários à educação do futuro. São Paulo:
Cortez, 2006..
Síntese elaborada por Carlos R. Paiva: Publicada na Revista de
Educação nº 15
Em relatório da UNESCO, coordenado por Jacques Delors,
estabeleceram-se os quatro pilares da educação contemporânea:
aprender a ser, a fazer, a viver juntos e a conhecer. Ela só pode ser
viável se for uma educação integral do ser humano.
Com o objetivo de aprofundar a visão transdisciplinar da
educação, a UNESCO solicitou a Edgar Morin que expusesse suas
idéias sobre a educação do amanhã.
Este texto apóia-se sobre o saber científico, provisório, para situar
a condição humana, mas também desemboca em profundos mistérios
referentes à vida, ao ser humano, ao universo...
Capítulo I: AS CEGUEIRAS DO CONHECIMENTO: O ERRO E
A ILUSÃO
141
A educação que visa a transmitir conhecimentos é cega quanto ao
que é o conhecimento humano, seus dispositivos, enfermidades,
dificuldades, tendências ao erro e à ilusão, e não se preocupa em fazer
conhecer o que é conhecer. O conhecimento não é uma ferramenta
ready made, utilizada sem que sua natureza seja examinada. O
conhecimento do conhecimento deve ser uma necessidade primeira,
uma preparação para enfrentar os riscos permanentes de erro e de
ilusão, que não cessam de parasitar a mente humana. Trata-se de
armar cada mente no combate vital à lucidez.
É necessário introduzir e desenvolver na educação o estudo das
características cerebrais, mentais, culturais do conhecimento
humano, seus processos e modalidades, o estudo das disposições
psíquicas e culturais que o conduzem ao erro ou à ilusão. O maior
erro seria subestimar o problema do erro; a maior ilusão seria
subestimar o problema da ilusão. A educação deve mostrar que não
há conhecimento que não esteja ameaçado por tais riscos.
Todas as percepções são traduções, reconstruções cerebrais com
base em estímulos captados e codificados pelos sentidos. Ao erro da
percepção acrescenta-se o erro intelectual. O conhecimento sob
forma de palavra, de idéia, de teoria, é o fruto de uma
tradução/reconstrução por meio da linguagem e do pensamento e
está sujeito a erro.
A projeção dos desejos ou medos e as perturbações mentais
trazidas pelas emoções multiplicam os riscos de erro. O
desenvolvimento da inteligência é inseparável do mundo da
afetividade, da curiosidade, da paixão, que, por sua vez, são a mola da
142
pesquisa filosófica ou científica. Não há um estágio superior da razão
dominante da emoção, mas um eixo intelecto x afeto e, de certa
maneira, a capacidade de emoções é indispensável ao
estabelecimento de comportamentos racionais.
A educação deve dedicar-se, por conseguinte, à identificação da
origem de erros, ilusões e cegueiras.
Os erros mentais
Nenhum dispositivo cerebral distingue a alucinação da percepção,
o imaginário do real, o subjetivo do objetivo. É grande a importância
do imaginário no ser humano - as vias do sistema neurocerebral, que
colocam o organismo em conexão com o mundo exterior,
representam 2%, enquanto 98% se referem ao funcionamento
interno. Tal fato constitui um mundo psíquico relativamente
independente, em que fermentam sonhos, desejos, imagens, fantasias,
e esse mundo infiltra-se em nossa visão ou concepção do mundo.
A mente é dotada de potencial de mentira para si próprio (self-
deception). O egocentrismo, a necessidade de autojustificativa, a
tendência a projetar sobre o outro a causa do mal fazem com que
cada um minta para si próprio, sem detectar a mentira da qual é
autor. A memória é também fonte de erros - não regenerada pela
rememoração, tende a degradar-se. A mente, inconscientemente,
tende a selecionar as lembranças que convêm e a recalcar ou apagar
as que incomodam. Tende a deformar as recordações por projeções
ou confusões inconscientes. Existem falsas lembranças.
Os erros intelectuais
143
Teorias, doutrinas, ideologias estão sujeitas ao erro, que é
protegido por esses sistemas de idéias. As teorias resistem à agressão
das teorias inimigas ou dos argumentos contrários. As doutrinas
(teorias fechadas sobre elas mesmas e absolutamente convencidas de
sua verdade) são invulneráveis a qualquer crítica que denuncie seus
erros.
Os erros da razão
A racionalidade é corretiva. Ela é a melhor proteção contra o erro
e a ilusão.
Existe a racionalidade construtiva, que deve manter-se aberta ao
que a contesta para evitar que se feche em doutrina e se converta em
racionalização; por outro lado, há a racionalidade crítica exercida,
particularmente, sobre os erros e ilusões das crenças, doutrinas e
teorias. A racionalidade traz a possibilidade de erro e de ilusão
quando se perverte em racionalização, que é fechada. O racionalismo
ignora os seres, a subjetividade, a afetividade e a vida; é irracional. A
verdadeira racionalidade negocia com a irracionalidade. É não só
crítica, mas autocrítica.
A racionalidade não é uma qualidade da qual são dotadas todas as
mentes. É possível ser sábio em uma área de competência e irracional
em outra. Da mesma forma, a racionalidade não é uma qualidade
exclusiva da civilização ocidental. Em qualquer sociedade, mesmo
arcaica, há racionalidade na elaboração de ferramentas, na estratégia
da caça, no conhecimento das plantas, dos animais, do solo, ao
mesmo tempo em que há mitos, magia e religião.
144
Começamos a nos tornar racionais quando reconhecemos a
racionalização até em nossa racionalidade e reconhecemos os
próprios mitos. Daí decorre a necessidade de reconhecer na educação
do futuro um princípio de incerteza racional.
As cegueiras paradigmáticas
O paradigma cartesiano separa o sujeito e o objeto; determina a
dupla visão do mundo: sujeito/objeto, alma/corpo, espírito/matéria,
qualidade/ quantidade, finalidade/causalidade, sentimento/razão. Ao
determinismo de paradigmas e modelos explicativos associa-se o
determinismo de convicções e crenças, que impõem a todos a força
do sagrado, do dogma e do tabu. O poder imperativo e proibitivo dos
paradigmas, crenças oficiais, doutrinas reinantes e verdades
estabelecidas, determina os estereótipos cognitivos, as idéias
recebidas sem exame, as crenças estúpidas não-contestadas, os
absurdos triunfantes, a rejeição de evidências em nome da evidência,
e faz reinar em toda parte os conformismos cognitivos e intelectuais.
O imprinting cultural (marca indelével imposta pelas primeiras
experiências do recém-nascido) inscreve o conformismo a fundo, e a
normalização elimina o que poderia contestá-lo.
A noologia: possessão
As crenças e as idéias não são somente produtos da mente, são
também seres mentais que têm vida e poder. Podem possuir-nos.
Desde o alvorecer da humanidade, encontra-se a noção de noosfera (a
esfera das coisas do espírito) com o surgimento dos mitos, dos deuses
e dos seres espirituais, que impulsionou e arrastou o Homo sapiens a
145
delírios, massacres, adorações e sublimidades desconhecidas do
mundo animal. Produto de nossa alma e mente, a noosfera está em
nós e nós estamos na noosfera. Os mitos tomaram forma e realidade
com base nos sonhos e na imaginação. As ideias, com base nos
símbolos e nos pensamentos de nossa inteligência. Mitos e ideias
invadiram-nos, deram-nos emoção. Os humanos possuídos são
capazes de morrer ou de matar por um deus, por uma ideia. As ideias
existem pelo homem e para ele, mas o homem existe também pelas
ideias e para elas.
A idealidade (modo de existência necessário à ideia para traduzir
o real) e o idealismo (possessão do real pela ideia), a racionalidade
(diálogo entre a ideia e o real) e a racionalização (que impede o
diálogo) são oriundos da mesma fonte. Entretanto, são as ideias que
nos permitem conceber as carências e os perigos da ideia. Daí resulta
este paradoxo: devemos manter uma luta crucial contra as ideias, mas
somente podemos fazê-lo com a ajuda de ideias.
A incerteza do conhecimento
O conhecimento do conhecimento deve ser, para a educação, um
princípio e uma necessidade permanentes. Existem condições
bioantropológicas, socioculturais e noológicas que permitem
interrogações sobre o mundo, o homem e sobre o próprio
conhecimento. A procura da verdade pede a busca e a elaboração de
metapontos de vista. Devemos jogar com as duplas possessões, a das
ideias por nossa mente, a de nossa mente pelas ideias. Instaurar a
convivialidade entre ideias e mitos.
146
É preciso evitar idealismo e racionalização. Necessitamos de que
se cristalize e se enraíze um paradigma que permita o conhecimento
complexo. O problema cognitivo é de importância antropológica,
política, social e histórica. As pessoas não podem mais ser brinquedos
inconscientes de suas próprias mentiras.
Capítulo II: OS PRINCÍPIOS DO CONHECIMENTO
PERTINENTE
O conhecimento fragmentado em disciplinas impede o vínculo
entre as partes e a totalidade e deve ser substituído por um modo
capaz de apreender os objetos em seu contexto, sua complexidade,
seu conjunto. É necessário desenvolver a aptidão humana para situar
as informações em um contexto de um mundo complexo. A
contextualização é condição essencial da eficácia do funcionamento
cognitivo.
O conhecimento do mundo é uma necessidade intelectual e vital.
É o problema atual de todo cidadão: como ter acesso às informações e
poder articulá-las e organizá-las? Para tal, é necessária a reforma do
pensamento, que deve ser paradigmática, e não programática. A esse
problema confronta-se a educação do futuro, que existe entre os
saberes desunidos, divididos, compartimentados e as realidades/
problemas multidisciplinares, transversais, multidimensionais,
transnacionais, globais e planetários. Para que o conhecimento seja
pertinente, a educação deverá tornar evidente o contexto, o global; o
multidimensional e o complexo. A educação do futuro deverá
inspirar-se no princípio de Pascal: "sendo todas as coisas causadas e
147
causadoras, mediatas e imediatas... considero ser impossível conhecer
as partes sem conhecer o todo, tão pouco conhecer o todo sem
conhecer particularmente as partes".
Unidades complexas, como o ser humano ou a sociedade, são
multidimensionais. O ser humano é ao mesmo tempo biológico,
psíquico, social, afetivo e racional. A sociedade comporta as
dimensões histórica, econômica, sociológica, religiosa. Não se pode
isolar uma parte do todo, mas as partes umas das outras.
Complexus significa o que foi tecido junto. Há complexidade
quando elementos diferentes são inseparáveis constitutivos do todo, e
há um tecido interdependente, interativo e interretroativo entre o
objeto de conhecimento e seu contexto, as partes e o todo, o todo e as
partes, as partes entre si. Por isso, a complexidade é a união entre a
unidade e a multiplicidade.
Em conseqüência, a educação deve promover a "inteligência geral"
apta a referir-se ao complexo, ao contexto, de modo multidimensional
e dentro da concepção global.
A inteligência geral
Quanto mais poderosa é a inteligência geral, maior é sua
faculdade de tratar de problemas especiais e particulares. O
conhecimento, ao buscar construir-se com referência ao contexto e ao
global, deve mobilizar o que o conhecedor sabe do mundo.
A educação deve favorecer a aptidão da mente para formular e
resolver problemas essenciais e, de forma correlata, estimular o uso
148
total da inteligência geral. Esse uso pede o exercício da curiosidade.
As especializações disciplinares estão dispersas, desunidas. Os
sistemas de ensino provocam a disjunção entre as humanidades e as
ciências, assim como a separação das ciências em disciplinas hiper-
especializadas, fechadas em si mesmas. Os problemas fundamentais e
os problemas globais estão ausentes das ciências disciplinares. São
salvaguardados apenas na filosofia, que, por sua vez, tornou-se um
campo fechado sobre si mesmo.
As mentes formadas pelas disciplinas perdem suas aptidões
naturais para contextualizar os saberes, do mesmo modo que para
integrá-los em seus conjuntos naturais. O enfraquecimento da
percepção do global conduz ao enfraquecimento da responsabilidade
(cada qual tende a ser responsável apenas por sua tarefa
especializada), assim como ao enfraquecimento da solidariedade
(cada qual não mais sente os vínculos com seus concidadãos).
A hiper-especialização impede a percepção do global
(fragmentado em parcelas), a percepção do essencial, o tratamento
dos problemas particulares (que só podem ser propostos e pensados
em seu contexto) e o tratamento dos problemas essenciais (que nunca
são parcelados). O princípio de redução leva a restringir o complexo
ao simples. A lógica mecânica e determinista da máquina artificial
conduz a excluir tudo aquilo que não seja quantificável e mensurável,
eliminando o elemento humano do humano, isto é, paixões,
emoções...
Como a educação ensinou a compartimentar, e não a unir os
conhecimentos, o conjunto deles constitui um quebra-cabeça
149
ininteligível. A incapacidade de organizar o saber compartimentado
conduz à atrofia da disposição mental natural de contextualizar e de
globalizar. A inteligência compartimentada torna unidimensional o
multidimensional. Por isso, incapaz de considerar o contexto e o
complexo, a inteligência torna-se inconsciente e irresponsável. O
problema dos humanos é beneficiar-se das técnicas, mas não se
submeter a elas. Contudo as inteligências artificiais estão instaladas
nas mentes sob forma de pensamento tecnocrático, pertinente para
tudo que se relaciona com as máquinas artificiais e incapaz de
compreender o vivo e o humano aos quais se aplica, acreditando-se o
único racional. A pseudo-racionalidade, isto é, a racionalização
abstrata e unidimensional, triunfa. Não se trata de abandonar o
conhecimento das partes pelo conhecimento das totalidades, nem da
análise pela síntese; é preciso conjugá-las.
Capítulo III: ENSINAR A CONDIÇÃO HUMANA
O ser humano é uma unidade complexa, que adquiriu um caráter
desintegrado na educação por meio das disciplinas, tendo-se tornado
impossível aprender o que significa ser humano. Desse modo, a
condição humana deveria ser o objeto essencial de todo o ensino. É
possível, com base nas disciplinas atuais, reconhecer a unidade e a
complexidade humanas, reunindo e organizando conhecimentos
dispersos nas ciências da natureza, nas ciências humanas, na
literatura e na filosofia. Enraizamento/desenraizamento do ser
humano. Devemos reconhecer nosso duplo enraizamento no cosmos
físico e na esfera viva e, ao mesmo tempo, nosso desenraizamento
150
propriamente humano. Estamos simultaneamente dentro e fora da
natureza. Encontramo-nos no gigantesco cosmos em expansão,
constituído de bilhões de estrelas e galáxias. Essas macromoléculas
associaram-se em turbilhões dos quais um, cada vez mais rico em
diversidade molecular, metamorfoseou-se em organização de novo
tipo, em relação à organização estritamente química: uma auto-
organização viva. Uma porção de substâncias físicas organizou-se de
maneira termodinâmica sobre a Terra; por meio de imersão marinha,
banhos químicos e descargas elétricas, adquiriu vida.
A vida é solar: todos os seus elementos foram forjados em um sol
e reunidos em um planeta. Nós, os seres vivos, somos um elemento da
diáspora cósmica, algumas migalhas da existência solar, um diminuto
broto da existência terrena. Pertencemos ao destino cósmico;
estamos, porém, marginalizados: a Terra é o terceiro satélite de um
sol errante entre bilhões de estrelas em uma galáxia periférica de um
universo em expansão. Somos seres cósmicos e terrestres. Como seres
vivos, dependemos, vitalmente, da biosfera terrestre.
A importância da hominização é primordial à educação voltada
para a condição humana, porque nos mostra como a animalidade e a
humanidade constituem, juntas, a condição humana. O hominídeo
humaniza-se. O conceito de homem tem duplo princípio: biofísico e
psico-sócio-cultural, um remetendo ao outro.
O circuito cérebro/mente/cultura
O homem somente se realiza plenamente como ser humano pela
cultura e na cultura. Não há cultura sem cérebro humano, nem mente
151
sem cultura - é uma tríade entre cérebro/mente/cultura, em que cada
um dos termos é necessário ao outro. A mente é o surgimento do
cérebro que suscita a cultura, que não existiria sem o cérebro.
O circuito razão/afeto/pulsão
As relações entre as três instâncias são complementares e também
antagônicas, comportando conflitos entre a pulsão, o coração e a
razão. Correlativamente, a relação triúnica não obedece à hierarquia
razão/afetividade/pulsão; há uma relação instável, permutante,
rotativa entre estas três instâncias. A racionalidade não dispõe,
portanto, de poder supremo; é concorrente e antagônica às outras
instâncias de uma tríade inseparável.
O circuito indivíduo/sociedade/espécie
Os indivíduos são produtos do processo reprodutor da espécie
humana, que deve ser ele próprio realizado por dois indivíduos. Tais
interações produzem a sociedade, que testemunha o surgimento da
cultura e retroage sobre os indivíduos pela cultura.
A plenitude e a livre expressão dos indivíduos constituem nosso
propósito ético e político, sem, entretanto, constituírem a própria
finalidade da tríade indivíduo/sociedade/espécie. Todo
desenvolvimento verdadeiramente humano significa o
desenvolvimento conjunto das autonomias individuais, das
participações comunitárias e do sentimento de pertencer à espécie
humana.
Unitas multiplex: unidade e diversidade humana
152
Cabe à educação do futuro cuidar para que a idéia de unidade da
espécie humana não apague a idéia de diversidade e vice-versa. A
educação deverá ilustrar o principio unidade/diversidade em todas as
esferas.
Na esfera individual, existe unidade/diversidade genética. Todo ser
humano traz geneticamente em si a espécie humana e compreende
geneticamente a própria singularidade anatômica, fisiológica. Há
unidade/diversidade cerebral, mental, psicológica, afetiva, intelectual,
subjetiva.
Na esfera da sociedade, existe a unidade/diversidade das línguas
(que nos torna gêmeos pela linguagem e separados pelas línguas), das
organizações sociais e das culturas.
A cultura é o conjunto dos saberes, fazeres, regras, normas,
proibições, estratégias, crenças, idéias, valores, mitos que se transmite
de geração em geração, reproduz-se em cada indivíduo, controla a
existência da sociedade e mantém a complexidade psicológica e
social. Assim, sempre existe a cultura nas culturas. Mas a cultura
existe apenas por meio das culturas.
O duplo fenômeno da unidade/diversidade das culturas é crucial.
A cultura mantém a identidade humana naquilo que tem de
específico; as culturas mantêm as identidades sociais naquilo que têm
de específico.
As culturas são aparentemente fechadas em si mesmas para
salvaguardar sua identidade singular. Mas, na realidade, são também
153
abertas: integram nelas saberes e técnicas, e também idéias,
costumes, alimentos, indivíduos vindos de fora.
O ser humano é complexo e traz em si caracteres antagonistas:
sapiens e demens (sábio e louco), faber e ludens (trabalhador e lúdico),
empiricus e imaginarius (empírico e imaginário), economicus e
consumans (econômico e consumista), prosaicus e poeticus (prosaico
e poético). O homem da racionalidade é também o da afetividade, do
mito, do delírio (demens). O homem do trabalho é também o do jogo
(ludens). O homem empírico é também o imaginário (imaginarius). O
homem da economia é também o do consumismo (consumans).
Existem, ao mesmo tempo, unidade e dualidade no ser humano; o
desenvolvimento do conhecimento racional-empírico-técnico jamais
anulou o conhecimento simbólico, mítico, mágico ou poético.
O ser humano é um ser racional e irracional, capaz de medida e
desmedida; nutre-se dos conhecimentos comprovados, mas também
de ilusões e de quimeras. A loucura é também um problema central
do homem e não apenas dejeto ou doença. A demência não levou a
espécie humana à extinção (só as energias nucleares liberadas pela
razão científica e só o desenvolvimento da racionalidade técnica
dependente da biosfera poderão conduzi-la ao desaparecimento). Isso
significa que os progressos da complexidade se fazem, ao mesmo
tempo, com a loucura humana, apesar dela e por causa dela.
A educação deveria mostrar e ilustrar o destino multifacetado do
humano: o destino da espécie humana, o individual, o social, o
histórico, todos entrelaçados e inseparáveis. Isso conduziria à tomada
154
de conhecimento e de consciência da condição comum a todos os
humanos, sobre nosso enraizamento como cidadãos da Terra...
Capítulo IV: ENSINAR A IDENTIDADE TERRENA
O destino planetário do gênero humano é outra realidade-chave
até agora ignorada pela educação. Convém ensinar a história da era
planetária, que se inicia com o estabelecimento da comunicação entre
todos os continentes no século XVI, e mostrar como todas as partes
do mundo se tornaram solidárias, sem, contudo, ocultar as opressões
e a dominação que devastaram a humanidade e que ainda não
desapareceram. Será preciso indicar a crise que marca o século XX,
mostrando que todos os seres humanos, confrontados de agora em
diante com os mesmos problemas de vida e morte, partilham um
destino comum.
Na era das telecomunicações, da informação, da Internet, estamos
submersos na complexidade do mundo. As incontáveis informações
sufocam as possibilidades de inteligibilidade. É a complexidade que
apresenta problema. O planeta exige um pensamento policêntrico,
capaz de apontar o universalismo, não abstraio, mas consciente da
unidade/ diversidade da condição humana.
A era planetária
A história humana começou por uma diáspora que afetou todos os
continentes não produziu nenhuma cisão genética: pigmeus, negros,
amarelos, índios, brancos vêm da mesma espécie, possuem os
mesmos caracteres fundamentais de humanidade. Contudo, levou à
extraordinária diversidade de línguas, culturas, destinos. A riqueza da
155
humanidade reside na sua diversidade criadora, mas a fonte de sua
criatividade está em sua unidade geradora.
A partir de 1492, Espanha, Portugal, França e Inglaterra se lançam
à conquista do globo e, por meio de aventuras, guerras e morte,
engendram a era planetária que, desde então, leva os cinco
continentes à comunicação. A planetarização provoca, no século XX,
duas guerras mundiais, duas crises econômicas mundiais e, após 1989,
a generalização da economia liberal denominada mundialização. A
economia mundial é cada vez mais interdependente: cada uma de
suas partes tornou-se dependente do todo e, reciprocamente, o todo
sofre as perturbações e imprevistos que afetam as partes. Tudo está
instantaneamente presente, de um ponto do planeta ao outro, pela
televisão, telefone, fax, Internet. O indivíduo recebe ou consome
informações e substâncias oriundas de todo o universo. Enquanto o
europeu está num circuito planetário de conforto, grande número de
africanos, asiáticos e sul-americanos acha-se em um circuito de
miséria. Sofrem, no cotidiano, as flutuações do mercado mundial, que
afetam as ações das matérias-primas que seus países produzem.
Foram expulsos do campo por causa dos processos mundializados,
provenientes do Ocidente, como a monocultura industrial.
Camponeses auto-suficientes tornaram-se suburbanos em busca de
salário; suas necessidades agora são traduzidas em termos
monetários. Dessa maneira, cada ser humano traz em si, sem saber, o
planeta inteiro. A mundialização é ao mesmo tempo evidente,
subconsciente e onipresente. Ela é unificadora, mas também
conflituosa em sua essência. A unificação mundializante faz-se
acompanhar cada vez mais pelo próprio negativo que ela suscita, pelo
156
efeito contrário: a balcanização. Dessa maneira, o século XX criou e
dividiu um tecido planetário único; seus fragmentos ficaram isolados,
eriçados e intercombatentes. O século XX não saiu da idade de ferro
planetária; mergulhou nela.
O legado do século XX
O século XX foi o da aliança entre duas barbáries: a primeira traz
guerra, massacre, deportação, fanatismo. A segunda só conhece o
cálculo, ignora o indivíduo, seu corpo, seus sentimentos, sua alma e
multiplica o poderio da morte e da servidão técnico-industriais. As
forças autodestrutivas foram particularmente ativadas: o vírus da
AIDS, as drogas pesadas como a heroína. A possibilidade de extinção
global de toda a humanidade pelas armas nucleares não foi dissipada;
ao contrário, cresce com a disseminação e a miniaturização da
bomba. O potencial de auto-aniquilamento acompanha a marcha da
humanidade. Desde os anos 70, descobrimos que os dejetos, as
emanações; as exalações de nosso desenvolvimento técnico-industrial
urbano degradam a biosfera e ameaçam envenenar
irremediavelmente o meio vivo ao qual pertencemos: a dominação
desenfreada da natureza pela técnica conduz a humanidade ao
suicídio.
Se a modernidade é definida como fé incondicional no progresso,
na tecnologia, na ciência, no desenvolvimento econômico, então esta
modernidade está morta.
A esperança
157
A educação, que é ao mesmo tempo transmissão do antigo e
abertura da mente para receber o novo, encontra-se no cerne dessa
nova missão. O século XX deixou, como herança, contracorrentes
regeneradoras, em reação às correntes dominantes. Devemos
considerar:
• a contracorrente ecológica que, com o crescimento das
degradações e o surgimento de catástrofes técnicas/industriais, só
tende a aumentar;
• a contracorrente qualitativa que, em reação à invasão do
quantitativo e da uniformização generalizada, apega-se à qualidade
em todos os campos, a começar pela qualidade de vida;
• a contracorrente de resistência à vida prosaica puramente
utilitária, que se manifesta pela busca da vida poética, dedicada ao
amor, à admiração, à paixão, à festa;
• a contracorrente de resistência à primazia do consumo
padronizado, que se manifesta pela busca da intensidade vivida
("consumismo") e pela busca da frugalidade e da temperança;
• a contracorrente de emancipação em relação à tirania onipresente
do dinheiro, que, ainda tímida, busca contrabalançar-se por relações
humanas e solidárias, fazendo retroceder o reino do lucro;
• a contracorrente em reação ao desencadeamento da violência,
que, também tímida, nutre éticas de pacificação das almas e das
mentes.
158
Todas essas correntes prometem intensificar-se ao longo do
século XXI e constituir focos de transformação. Mas a verdadeira
transformação só poderia ocorrer com a intertransformação de todos,
operando assim uma transformação global, que retroagiria sobre as
transformações individuais.
Uma das condições fundamentais para a evolução positiva seria as
forças emancipadoras inerentes à ciência e à técnica poderem superar
as forças de morte e de servidão. As possibilidades oferecidas pelo
desenvolvimento das biotecnologias são igualmente prodigiosas para
o melhor e para o pior. Aquilo que porta o pior perigo traz também as
melhores esperanças: é a própria mente humana, e é por isso que o
problema da reforma do pensamento tornou-se vital.
A identidade e a consciência terrena
A união planetária pede a consciência e um sentimento de
pertencimento mútuo que nos una à Terra, considerada como
primeira e última pátria. É necessário aprender a estar no planeta, o
que significa aprender a viver, a dividir, a comunicar, a comungar;
não mais somente pertencer a uma cultura, mas também ser terrenos.
Devemos dedicar-nos não só a dominar, mas a condicionar, melhorar,
compreender. Devemos inscrever em nós:
• a consciência antropológica, que reconhece a unidade na
diversidade;
• a consciência ecológica, isto é, a consciência de habitar, com
todos os seres mortais, a mesma esfera viva (biosfera);
159
• a consciência cívica terrena, isto é, da responsabilidade e da
solidariedade para com os filhos da Terra;
• a consciência espiritual da condição humana que decorre do
exercício complexo do pensamento, e que permite criticar-nos
mutuamente, autocriticar-nos e compreender-nos mutuamente.
De toda maneira, a era de fecundidade dos Estados-nações,
dotados de poder absoluto está encerrada. O mundo confederado
deve ser policêntrico e acêntrico, não apenas política, mas também
culturalmente. O Ocidente que se provincializa sente a necessidade
do Oriente, enquanto o Oriente quer permanecer ocidentalizando-se.
A unidade, a mestiçagem e a diversidade devem desenvolver-se
contra a homogeneização e o fechamento.
O imperativo antropológico impõe-se salvar a unidade e a
diversidade humanas. Desenvolver identidades concêntricas e plurais:
de etnia, de pátria, de comunidade, de civilização, enfim, de cidadãos
terrestres. A educação do futuro deverá ensinar a ética da
compreensão planetária.
Capítulo V: ENFRENTAR AS INCERTEZAS
O século XX descobriu a imprevisibilidade do futuro. O abandono
das concepções deterministas da história humana que acreditavam
poder predizê-lo, o estudo dos grandes acontecimentos e desastres, o
caráter doravante desconhecido da aventura humana devem incitar as
mentes para esperar e enfrentar o inesperado. A educação deveria
160
incluir o ensino das incertezas que surgiram nas ciências físicas
(microfísicas, termodinâmica, cosmologia), nas ciências da evolução
biológica e nas ciências históricas. É preciso aprender a navegar em
um oceano de incertezas em meio a arquipélagos de certeza.
O universo é o jogo entre a ordem, a desordem e a organização. A
Terra, provavelmente, em sua origem se auto-organizou na dialógica
entre ordem/desordem/organização, erupções e terremotos. A
história avança, não como um rio, mas por desvios que decorrem de
inovações ou de criações internas, de acontecimentos ou acidentes
externos. O futuro chama-se incerteza. Toda evolução é fruto do
desvio bem-sucedido, cujo desenvolvimento transforma o sistema em
que nasceu: desorganiza, reorganizando-o. Não existem apenas
inovações e criações. Existem também destruições. Estas podem
trazer novos desenvolvimentos (avanços da técnica, da indústria e do
capitalismo levaram à destruição de civilizações tradicionais, por
exemplo). A história obedece, ao mesmo tempo, a determinismos e a
acasos. Ela tem sempre duas faces opostas: civilização/barbárie,
criação/destruição, gênese/morte. Os despotismos e totalitarismos
sabem que os indivíduos diferentes constituem um desvio potencial;
por isso eles os eliminam e aniquilam.
É preciso aprender a enfrentar a incerteza, já que vivemos em uma
época em que os valores são ambivalentes e tudo é ligado. É por isso
que a educação do futuro deve voltar-se para as incertezas ligadas ao
conhecimento, pois existem princípios:
• de incerteza cérebro-mental, que decorrem do processo de
tradução/ reconstrução próprio a todo conhecimento.
161
• de incerteza lógica: como dizia Pascal, "nem a contradição é sinal
de falsidade, nem a não-contradição é sinal de verdade".
• de incerteza racional, já que a racionalidade, se não mantém
autocrítica vigilante, cai na racionalização.
• da incerteza psicológica: é impossível ser totalmente consciente
do que se passa em nossa mente, que conserva algo de
fundamentalmente inconsciente. Existe, portanto, a dificuldade do
auto-exame crítico, para o qual nossa sinceridade não é garantia de
certeza, existindo limites para qualquer autoconhecimento.
As ideias e teorias podem traduzir a realidade de maneira errônea.
Nossa realidade não é outra senão nossa ideia da realidade. Importa
compreender a incerteza do real. É preciso saber interpretar a
realidade antes de reconhecer onde está o realismo.
O conhecimento é uma aventura incerta, que comporta em si
mesmo o risco de ilusão e de erro. É nas certezas doutrinárias,
dogmáticas e intolerantes que se encontram as piores ilusões. A ação
é decisão, escolha, mas também aposta. A ecologia da ação deve levar
em consideração a complexidade que ela supõe, através do aleatório,
da iniciativa, do imprevisto. Ela compreende três princípios: o circuito
risco/precaução; o circuito fins/meios e o circuito ação/ contexto.
Toda ação escapa à vontade de seu autor quando entra no jogo das
inter-retro-ações do meio em que intervém.
A ação pode ter três tipos de conseqüências: o efeito perverso, a
inanição da inovação e a colocação das conquistas em perigo.
162
A imprevisibilidade em longo prazo
Os efeitos de uma ação em longo prazo são imprevisíveis.
Nenhuma ação está segura de ocorrer no sentido de sua intenção. Há
dois meios para enfrentar tal incerteza:
• uma vez efetuada a escolha, a consciência da incerteza torna-se
consciência de uma aposta. A noção de aposta deve ser generalizada
quanto a qualquer fé: a fé em um mundo melhor, na justiça etc.;
• a estratégia deve prevalecer sobre o programa (que estabelece
uma seqüência de ações, que devem ser executadas sem variação em
um ambiente estável). Se houver modificação das condições externas,
bloqueia-se o programa. A estratégia elabora um cenário de ação que
examina as certezas e as incertezas da situação.
Tudo que comporta oportunidade comporta risco, e o
pensamento deve reconhecer as oportunidades de riscos como os
riscos das oportunidades.
Capítulo VI: ENSINAR A COMPREENSÃO
A compreensão é meio e fim da comunicação humana.
Entretanto, a educação para a compreensão está ausente do ensino. O
planeta necessita, em todos os sentidos, de compreensão mútua. O
desenvolvimento desta qualidade pede a reforma das mentalidades.
Essa deve ser a obra para a educação do futuro. A compreensão
mútua entre os seres humanos, quer próximos ou estranhos, é, daqui
163
para frente, vital para que as relações humanas saiam de seu estado
bárbaro de incompreensão.
Daí decorre a necessidade de estudar a incompreensão a partir de
suas raízes, modalidades e efeitos. Esse estudo é necessário porque
enfocaria não os sintomas, mas as causas do racismo, da xenofobia, do
desprezo.
Constituiria, ao mesmo tempo, uma das bases mais seguras da
educação para a paz, à qual estamos ligados por essência e vocação.
Educar para compreender uma disciplina é uma coisa; educar para
compreensão humana é outra - ensinar a compreensão entre as
pessoas como condição e garantia da solidariedade intelectual e moral
da humanidade.
O problema da compreensão é duplamente polarizado:
• Um pólo, agora planet|rio, é o da compreensão entre humanos,
os encontros e relações que se multiplicam entre pessoas, culturas,
povos de diferentes origens culturais.
• Um pólo individual é o das relações particulares entre próximos.
Estas estão cada vez mais ameaçadas pela incompreensão (como
será indicado mais adiante).
As duas compreensões
A comunicação não garante a compreensão. A informação, se bem
transmitida e compreendida, traz inteligibilidade, condição
necessária, mas não suficiente para a compreensão.
164
Há duas formas de compreensão: a intelectual ou objetiva e a
humana intersubjetiva. A compreensão intelectual passa pela
inteligibilidade e pela explicação. Explicar é considerar o que é
preciso conhecer como objeto e aplicar-lhe todos os meios objetivos
de conhecimento. A explicação é necessária para a compreensão
intelectual, mas é insuficiente para a compreensão humana. Esta
comporta um conhecimento de sujeito a sujeito e inclui,
necessariamente, um processo de empatia, de identificação e de
projeção. Sempre intersubjetiva, a compreensão pede abertura,
simpatia e generosidade.
Educação para os obstáculos à compreensão
A compreensão do sentido das palavras de outro, de suas idéias,
de sua visão do mundo está sempre ameaçada por todos os lados:
• Existe o "ruído" que parasita a transmissão da informação, cria o
mal-entendido ou não-entendido.
• Existe a polissemia de uma noç~o que, enunciada em um
sentido, é entendida de outra forma; assim, a palavra "cultura",
verdadeiro camaleão conceptual, pode significar tudo que não é
naturalmente inato.
• Existe a ignor}ncia dos ritos e costumes do outro.
• Existe a incompreens~o dos valores de outra cultura.
• Existe a incompreens~o dos imperativos éticos próprios a uma
cultura.
165
• Existe a impossibilidade de compreender as ideias ou os
argumentos de outra visão do mundo.
• Existe a impossibilidade de compreens~o de uma estrutura
mental em relação à outra.
Egocentrismo, etnocentrismo e sociocentrismo
A incompreensão de si é fonte importante da incompreensão de
outro. Mascaram-se as próprias carências e fraquezas, o que nos torna
implacáveis com as carências e fraquezas dos outros.
O egocentrismo amplia-se com o afrouxamento da disciplina e
das obrigações que, anteriormente, levavam à renúncia aos desejos
individuais, quando se opunham à vontade dos pais ou cônjuges.
Hoje, a incompreensão deteriora as relações. O mundo dos
intelectuais, escritores ou universitários, que deveria ser mais
compreensivo, é o mais gangrenado sob o efeito da hipertrofia do ego,
nutrido pela necessidade de consagração e de glória.
O etnocentrismo e o sociocentrismo nutrem xenofobias e
racismos e podem até despojar o estrangeiro da qualidade de ser
humano. Por isso, a verdadeira luta contra os racismos se operaria
mais contra suas raízes ,ego-sócio-cêntricas do que contra seus
sintomas.
A ética da compreensão
A ética da compreensão é a arte de viver que nos demanda
compreender de modo desinteressado, com grande esforço, pois não
pode esperar nenhuma reciprocidade. E compreender a
166
incompreensão - se soubermos compreender antes de condenar,
estaremos no caminho da humanização das relações humanas. O que
favorece a compreensão é:
• O "bem pensar": apreender o texto e o contexto, o ser e seu
meio, o local e o global.
• A introspecç~o (auto-exame crítico permanente).
• A consciência da complexidade humana: não se deve reduzir o
ser à menor parte dele próprio, nem mesmo ao pior fragmento de seu
passado.
• A abertura subjetiva (simp|tica) em relaç~o ao outro.
• A interiorizaç~o da toler}ncia.
• Compreens~o, ética e cultura planet|rias: a mundialização
deveria estar a serviço do gênero humano, através da compreensão,
da solidariedade intelectual e moral da humanidade. Dada a
importância da educação para a compreensão, o desenvolvimento da
compreensão necessita da reforma planetária das mentalidades que
deve ser a tarefa da educação do futuro.
Capítulo VII - A ÉTICA DO GÊNERO HUMANO
A concepção do gênero humano comporta a tríade
indivíduo/sociedade/ espécie. A cultura, no sentido genérico, emerge
dessas interações, reúne-as e confere-lhes valor. Assim, essa tríade é
inseparável e seus elementos são co-produtores um do outro; cada
um deles é, ao mesmo tempo,meio e fim dos outros.
167
A antropo-ética (ética propriamente humana) deve ser
considerada como a ética da qual emerge a consciência e o espírito
propriamente humanos. É a base para ensinar a ética do futuro. Supõe
a decisão consciente e esclarecida de:
• assumir a condiç~o humana indivíduo/sociedade/espécie na
complexidade do ser;
• alcançar a humanidade na consciência pessoal;
• assumir o destino humano em suas antinomias e plenitude;
A antropo-ética instrui-nos a assumir a missão antropológica do
milênio:
• trabalhar para a humanizaç~o da humanidade;
• efetuar a dupla pilotagem do planeta: obedecer { vida, guiar a
vida;
• alcançar a unidade planetária na diversidade;
• respeitar no outro, ao mesmo tempo, a diferença e a identidade
quanto a si mesmo;
• desenvolver a ética da solidariedade e da compreens~o;
• ensinar a ética do gênero humano.
A antropo-ética compreende a esperança na completude da
humanidade, como consciência e cidadania planetária, mas também
168
aposta no incerto. Ela é consciência individual além da
individualidade.
O circuito indivíduo/sociedade: ensinar a democracia
A democracia favorece a relação rica e complexa entre indivíduo e
sociedade. Fundamenta-se no controle da máquina do poder pelos
controlados. É a regeneração contínua de uma cadeia complexa e
retroativa: os cidadãos produzem a democracia que produz cidadãos.
A soberania do povo cidadão comporta, ao mesmo tempo, a auto-
limitação desta soberania pela obediência às leis e a transferência da
soberania aos eleitos. Necessita do consenso da maioria e do respeito
às regras democráticas. Contudo, necessita de diversidade. A
experiência do totalitarismo enfatizou o caráter-chave da democracia:
seu elo vital com a diversidade.
A democracia constitui, portanto, um sistema político complexo,
no sentido de que vive de pluralidade, concorrências e antagonismo,
permanecendo como comunidade. O desenvolvimento das
complexidades políticas, econômicas e sociais nutre os avanços da
individualidade. Esta se afirma em seus direitos (do homem e do
cidadão) e adquire liberdades existenciais (escolha autônoma do
cônjuge, da residência, do lazer).
A democracia une, de modo complementar, termos antagônicos:
consenso/ conflito, liberdade/fraternidade, comunidade
nacional/antagonismos sociais e ideológicos. Enfim, ela depende das
condições que dependem de seu exercício (espírito cívico, aceitação
da regra do jogo democrático). As democracias do século XXI serão
cada vez mais confrontadas ao gigantesco problema decorrente do
169
desenvolvimento da enorme máquina em que ciência, técnica e
burocracia estão intimamente associadas. Nessas condições, o
cidadão tem o direito de adquirir saber especializado, mas é
despojado de qualquer ponto de vista global e pertinente. Quanto
mais a política se torna técnica, mais a competência democrática
regride.
Impõe-se às sociedades, reputadas como democráticas, a
necessidade de regenerar a democracia, enquanto que, em grande
parte do mundo, se apresenta o problema de gerar democracia, ao
mesmo tempo em que as necessidades planetárias nos reclamam
gerar nova possibilidade democrática nesta escala. A regeneração
democrática supõe a regeneração do civismo, a regeneração do
civismo supõe a regeneração da solidariedade e da responsabilidade,
ou seja, o desenvolvimento da antropo-ética.
O circuito indivíduo/espécie: ensinar a cidadania terrestre
A partir do século XX, a comunidade de destino terrestre impõe
de modo vital a solidariedade: "Sou homem, nada do que é humano
me é estranho".
A humanidade como destino planetário
A comunidade de destino planetário permite assumir e cumprir
esta parte de antropo-ética, que se refere à relação entre indivíduo
singular e espécie humana como todo. A humanidade está enraizada
em uma "pátria", a terra. Sós, e em conjunto com a política do
homem, a política de civilização, a reforma do pensamento, a
antropo-ética, o verdadeiro humanismo, a consciência da Terra-Pátria
170
reduziriam a ignomínia no mundo. Não conhecemos o caminho: "El
camino se hace al andar".
171
PERRENOUD, Philippe. 10 novas
competências para ensinar. Porto Alegre:
Artmed, 2000.
Fonte: Revista da Apeoesp.
“A noç~o de competência designará aqui uma capacidade de
mobilizar diversos recursos cognitivos para enfrentar um tipo de
situaç~o”. p. 15
Essa definição insiste em quatro aspectos segundo Perrenoud:
- as competências não são elas mesmas saberes, savoir-faire ou
atitudes, mas mobilizam, integram e orquestram tais recursos;
- essa mobilização só é pertinente em situação, sendo cada
situação singular, mesmo que se possa tratá-la em analogia com
outras, já encontradas;
- o exercício da competência passa por operações mentais
complexas, subentendidas por esquemas de pensamento, que
permitem determinar (mais ou menos consciente e rapidamente) e
realizar (de modo mais ou menos eficaz) uma ação relativamente
adaptada à situação;
- as competências profissionais constroem-se, em formação, mas
também ao sabor da navegação diária de um professor, de uma
situação de trabalho à outra.
Capítulo 1
172
Organizar e dirigir situações de aprendizagem
“... é manter um espaço justo para tais procedimentos. É,
sobretudo, despender energia e tempo e dispor das competências
profissionais necessárias para imaginar e criar outros tipos de
situações de aprendizagem, que as didáticas contemporâneas
encaram como situações amplas, abertas, carregadas de sentido e de
regulação, as quais requerem um método de pesquisa, de
identificaç~o e de resoluç~o de problemas”. p. 25
- Conhecer, para determinada disciplina, os conteúdos a
serem ensinados e sua tradução em objetivos de aprendizagem.
Relacionar os conteúdos a objetivos e esses a situações de
aprendizagem. Hoje esses objetivos não podem ser estáticos, de
maneira mecânica e obsessiva, e sim:
“- do planejamento didático, não para ditar situações de
aprendizagem próprias a cada objetivo, mas para identificar os
objetivos trabalhados nas situações em questão, de modo a escolhê-
los e dirigi-los com conhecimento de causa;
- da análise posterior das situações e das atividades, quando se
trata de delimitar o que se desenvolveu realmente e de modificar a
seqüência das atividades propostas;
- da avaliação, quando se trata de controlar os conhecimentos
adquiridos pelos alunos”. p. 27
- Trabalhar a partir das representações dos alunos.
173
Não consiste em fazê-las expressarem-se, para desvalorizá-las
imediatamente. O importante é dar-lhes regularmente direitos na
aula, interessar-se por elas, tentar compreender suas raízes e sua
forma de coerência, não se surpreender se elas surgirem novamente,
quando as julgávamos ultrapassadas. Assim, deve-se abrir um espaço
de discussão, não censurar imediatamente as analogias falaciosas, as
explicações animistas e os raciocínios espontâneos, sob pretexto de
que levam a conclusões errôneas.
O professor que trabalha a partir das representações dos alunos,
tenta reencontrar a memória do tempo em que ainda não sabia,
colocar-se no lugar dos alunos, lembrar-se de que, se não
compreendem, não é por falta de vontade, mas porque o que é
evidente para o especialista parece opaco e arbitrário para os alunos. –
A competência do professor é, então, essencialmente didática.
- Trabalhar a partir dos erros e dos obstáculos à
aprendizagem.
Reestruturar seu sistema de compreensão de mundo – uma
verdadeira situação problema obriga a transpor um obstáculo graças a
uma aprendizagem inédita.
Quando se depara com um obstáculo é, em um primeiro
momento, enfrentar o vazio, a ausência de qualquer solução, até
mesmo de qualquer pista ou método, sendo levado à impressão de
que jamais se conseguirá alcançar soluções. Se ocorre a devolução do
problema, ou seja, se os alunos apropriam-se dele, suas mentes põem-
se em movimento, constroem hipóteses, procedem a explorações,
propõem tentativas. No trabalho coletivo, inicia-se a discussão, o
174
choque das representações obriga cada um a precisar seu pensamento
e a levar em conta o dos outros.
- Construir e planejar dispositivos e sequências didáticas
Sequências e dispositivos didáticos fazem parte de um contrato
pedagógico e didático, regras de funcionamento e instituições
internas à classe.
“Uma situaç~o de aprendizagem n~o ocorre ao acaso e é
engendrada por um dispositivo que coloca os alunos diante de uma
tarefa a ser realizada, um projeto a fazer, um problema a resolver”. p.
33.
A construção do conhecimento é uma trajetória coletiva que o
professor orienta, criando situações e dando auxílio, sem ser o
especialista que transmite o saber, nem o guia que propõe a solução
para o problema.
“A competência profissional consiste na busca de um amplo
repertório de dispositivos e de sequências na sua adaptação ou
construção, bem como na identificação, com tanta perspicácia quanto
possível, que eles mobilizam e ensinam”. p. 36
- Envolver os alunos em atividades de pesquisa, em projetos
de conhecimento
Capacidade fundamental do professor: tornar acessível e desejável
sua própria relação com o saber e com a pesquisa. O professor deve
estabelecer uma cumplicidade e uma solidariedade na busca do
conhecimento.
175
Para que os alunos aprendam, é preciso envolvê-los em uma
atividade de uma certa importância e de uma certa duração,
garantindo ao mesmo tempo uma progressão visível e mudanças de
paisagem.
Problemas – suspensão do procedimento para retomá-lo (mais
tarde, no dia seguinte, etc) – podem ser benéficas ou desastrosas – às
vezes, elas quebram o direcionamento das pessoas ou do grupo para o
saber; em outros momentos, permitem a reflexão, deixando as coisas
evoluírem em um canto da mente e retomando-as com novas idéias e
uma energia renovada.
Capítulo 2
Administrar a progressão das aprendizagens
Na escola não se podem programar as aprendizagens humanas
como a produção de objetos industriais. O professor também precisa
pensar na totalidade do processo.
- Conceber e administrar situações-problema ajustadas ao
nível e às possibilidades dos alunos.
1 – situação problema – organizada em torno da resolução de um
obstáculo (previamente identificado) pela classe;
2 – trabalhar em torno de uma situação concreta;
3 – tornar a situação um verdadeiro enigma a ser resolvido;
4 – os alunos não dispõem, no início, dos meios da solução
buscada, devido à existência do obstáculo a transpor para chegar a
176
ela. É a necessidade de resolver que leva o aluno a elaborar ou a se
apropriar coletivamente dos instrumentos intelectuais necessários à
construção de uma solução;
5 – trabalhar de acordo com a zona próxima – trabalhar com
situações problemas não problemáticas, mas sim de acordo com o
nível intelectual de seu aluno.
- Adquirir uma visão longitudinal dos objetivos do ensino.
“Essa vis~o longitudinal também exige um bom conhecimento das
fases de desenvolvimento intelectual da criança e do adolescente, de
maneira a poder articular aprendizagem e desenvolvimento e julgar
se as dificuldades de aprendizagem se devem a uma má apreciação da
fase de desenvolvimento e da zona próxima, ou se h| outras causas”.
p. 47
- Estabelecer laços com as teorias subjacentes às atividades
de aprendizagem.
“Escolher e modular as atividades de aprendizagem é uma
competência profissional essencial, que supõe não apenas um bom
conhecimento dos mecanismos gerais de desenvolvimento e de
aprendizagem, mas também um domínio das didáticas das
disciplinas”. p. 48
Ex: Dar um ditado, dizer que valor é atribuído a essa atividade,
evocando apenas a tradição pedagógica ou o senso comum, pode-se
pensar que o professor não domina nenhuma teoria da aprendizagem
da ortografia. Esta lhe permitiria situar o ditado no conjunto das
177
atividades possíveis e escolhê-lo conscientemente, por seu valor tático
e estratégico na progressão das aprendizagens, e não por falta de algo
melhor.
- Observar e avaliar os alunos em situações de
aprendizagem, de acordo com uma abordagem formativa.
Utilizar a observação contínua - sua primeira intenção é
formativa que significa que considera tudo o que pode auxiliar o
aluno a aprender melhor: suas aquisições, as quais condicionam as
tarefas que lhe podem ser propostas, assim como sua maneira de
aprender e de raciocinar, sua relação com o saber, suas angústias e
bloqueios eventuais diante de certos tipos de tarefas, o que faz
sentido para ele e o mobiliza, seus interesses, seus projetos, sua auto-
imagem como sujeito mais ou menos capaz de aprender seu ambiente
escolar e familiar.
- Fazer balanços periódicos de competências e tomar
decisões de progressão.
“A formaç~o escolar obriga, em certos momentos, a tomada de
decisões de seleção ou de orientação. É o que acontece no final de
cada ano letivo, ou no final de cada ciclo. Participar dessas decisões,
negociá-las com o aluno, seus pais e outros profissionais, bem como
encontrar o acordo perfeito entre os projetos e as exigências da
instituição escolar são elementos que fazem partes das competências
básicas de um professor”. p.51
- Rumo a ciclos de aprendizagem
178
A gestão da progressão dos alunos depende das representações
dos professores (responsabilidade); convicção preliminar de que cada
aluno é capaz de alcançar os objetivos mínimos; a progressão é gerada
no âmbito de um ciclo de aprendizagem; questionamento da
organização escolar atual; operacionalização de várias formas de
reagrupamento e de trabalho; questionamento dos modos de ensino e
de aprendizagem articulados à busca de um máximo de sentido dos
saberes e do trabalho escolar para o aluno; remanejamento das
práticas de avaliação; equipe docente que assuma coletivamente a
responsabilidade de toda decisão relativa ao percurso dos alunos;
progressão dos alunos, tanto em nível individual quanto coletivo, a
aquisição de novas competências pelos professores no âmbito de um
plano progressivo de reflexão e de formação.
Capitulo 3
Conceber e fazer evoluir os dispositivos de diferenciação.
“Diante de oito, três, ou até mesmo um só aluno, um professor
não sabe necessariamente propor a cada um deles uma situação de
aprendizagem ótima. Não basta mostrar-se totalmente disponível
para um aluno: é preciso também compreender o motivo de suas
dificuldades de aprendizagem e saber como superá-las. Todos os
professores que tiveram a experiência do apoio pedagógico, ou que
deram aulas particulares sabem a que ponto pode-se ficar
despreparado em uma situação de atendimento individual, ainda que,
aparentemente, ela seja ideal;
Certas aprendizagens só ocorrem graças a interações sociais, seja
porque se visa ao desenvolvimento de competências de comunicação
179
ou de coordenação, seja porque a interação é indispensável para
provocar aprendizagens que passem por conflitos cognitivos ou por
formas de cooperaç~o”. p. 56
- Administrar a heterogeneidade no âmbito de uma turma.
O sistema escolar tenta homogeneizar cada turma nela
agrupando alunos com a mesma idade, isso resulta a homogeneidade
muito relativa, devida às disparidades, da mesma idade, dos níveis de
desenvolvimento e dos tipos de socialização familiar. Melhora-se isso
com:
- jogo das dispensas de idade, integrando alunos mais jovens que
demonstram certa precocidade; - jogo das reprovações, graças às
quais os alunos que não têm a maturidade ou o nível requerido não
passam de ano e repetem o programa na companhia de alunos mais
jovens.
- Abrir, ampliar a gestão de classe para um espaço mais
vasto.
A organização oficial da escola em ciclos de aprendizagem
plurianuais facilita a cooperação, mas não é suficiente: em certos
sistemas formalmente estruturados em ciclos, cada professor trabalha
como antes, a portas fechadas, sozinho com sua turma.
“A gest~o de uma classe tradicional é objeto da formaç~o inicial e
consolida-se no decorrer da experiência. O trabalho em espaços mais
amplos exige novas competências. Algumas delas giram em torno da
cooperaç~o profissional”. p. 59
180
Com o trabalho docente realizado, esses espaços-tempos de
formação proporcionam mais tempo, recursos e forças, imaginação,
continuidade e competências para que se construam dispositivos
didáticos eficazes, com vistas a combater o fracasso escolar.
- Fornecer apoio integrado, trabalhar com alunos portadores
de grandes dificuldades
Saber observar uma criança na situação; dominar um
procedimento clínico (observar, agir, corrigir, entre outros); construir
situações didáticas sob medida; fazer um contrato didático
personalizado; praticar uma abordagem sistêmica; acostumar-se com
a supervisão; respeitar um código explícito de deontologia mais do
que apelar para o amor pelas crianças e para o senso comum; estar
familiarizado com uma abordagem ampla da pessoa, da comunicação,
da observação, da intervenção e da regulação, entre outros.
- Desenvolver a cooperação entre os alunos e certas formas
simples de ensino mútuo
“O ensino mútuo não é uma ideia nova, já florescia no século
passado na pedagogia inspirada por Lancaster. O professor tinha 100
ou 200 alunos de todas as idades sob sua responsabilidade e,
evidentemente, não podia ocupar-se de todos, nem propor uma única
lição a um público t~o vasto e heterogêneo”. p. 62
Organiza-se subconjuntos.
“Toda pedagogia diferenciada exige a cooperaç~o ativa dos alunos
e de seus pais. Esse é um recurso, assim como uma condição, para que
181
uma discriminação positiva não seja vivenciada e denunciada com
uma injustiça pelos alunos mais favorecidos. Portanto, é importante
que o professor dê todas as explicações necessárias para conseguir a
adesão dos alunos, sem a qual suas tentativas serão todas sabotadas
por uma parte da turma”. p.64
Capítulo 4
Envolver os alunos em sua aprendizagem e em seu trabalho
Como trabalhar com a motivação dos alunos?
O prazer de aprender é uma delas, o desejo de saber é outra.
- Suscitar o desejo de aprender, explicitar a relação com o
saber, o sentido do trabalho escolar e desenvolver na criança a
capacidade de auto-avaliação
O desejo é múltiplo – deve-se saber para compreender, para agir
de modo eficaz, para passar em um exame, para ser amado ou
admirado, para seduzir, para exercer um poder.O desejo de saber não
é uniforme.
“Os mais alheios ao próprio conteúdo do saber em jogo oferecem,
inevitavelmente, menores garantias de uma construção ativa, pessoal
e duradoura dos conhecimentos. Todavia, diante de tantos alunos que
não manifestam nenhuma vontade de saber, uma vontade de
aprender, mesmo fr|gil e superficial, j| é um consolo”. p. 70
182
- Instituir e fazer funcionar um conselho de alunos
(conselho de classe ou de escola) e negociar com eles diversos
tipos de regras e de contratos
Os direitos imprescritíveis do aprendiz:
O direito de não estar constantemente atento; o direito de só
aprender o que tem sentido; o direito de não obedecer durante seis a
oito horas por dia; o direito de se movimentar; o direito de não
manter todas as promessas; o direito de não gostar da escola e de
dizê-lo; o direito de escolher com quem quer trabalhar; o direito de
não cooperar para seu próprio processo; o direito de existir como
pessoa.
- Oferecer atividades opcionais de formação
Quanto a atividade , seu sentido depende da possibilidade de
escolher o método, os recursos, as etapas de realização, o local de
trabalho, os prazos e os parceiros. Quando a atividade não tem
nenhum item escolhido pelo aluno, esta tem poucas chances de
envolvê-lo.
- Favorecer a definição de um modo pessoal do aluno
“Meu pai lia diariamente o Neue Freie Presse, e era um grande
momento quando ele desdobrava lentamente seu jornal. Depois que
começava a ler, não tinha mais olhos para mim, eu sabia que ele não
me responderia de modo algum, minha própria mãe não lhe
perguntava nada nesse momento, nem mesmo em alemão. Eu
procurava saber o que esse jornal podia ter de tão atraente; no início,
183
pensava que era seu odor; quando estava sozinho e ninguém me via,
eu subia na cadeira e cheirava ativamente o jornal. Apenas mais tarde,
percebi que a cabeça de meu pai não parava de se mexer ao longo de
todo o jornal; fiz o mesmo, nas suas costas, enquanto brincava no
chão, sem nem mesmo ter sob os olhos, portanto, o jornal que ele
segurava com as duas mãos sobre a mesa. Um visitante entrou uma
vez de imprevisto e chamou meu pai, que se voltou e me surpreendeu
lendo um jornal imaginário. Ele falou então comigo, antes mesmo de
atender o visitante, explicando-me que se tratava das letras, todas as
letrinhas, ali, e bateu em cima delas com o indicador. Vou ensiná-las
eu mesmo para você, logo, acrescentou, despertando em mim uma
curiosidade insaci|vel pelas letras”. p. 76
Capítulo 5
Trabalhar em equipe
Saber trabalhar eficazmente em equipe; saber discernir os
problemas que requerem uma cooperação intensiva, participar de
uma cultura de cooperação, estar aberto para ela, saber encontrar e
negociar as modalidades ótimas de trabalho em função dos problemas
a serem resolvidos; saber perceber, analisar e combater resistências,
obstáculos, paradoxos e impasses ligados à cooperação, saber se auto-
avaliar, lançar um olhar compreensivo sobre um aspecto da profissão
que jamais será evidente, haja vista sua complexidade.
- Elaborar um projeto de equipe, representações comuns
Os projetos que se organizam em torno de uma atividade
pedagógica (montagem de um espetáculo em conjunto, organização
184
de um campeonato, criação de oficinas abertas, etc.); necessitam de
cooperação, e esta é, então, o meio para realizar um empreendimento
que ninguém tem a força ou a vontade de fazer sozinho; ela se
encerra no momento em que o projeto é concluído.
O desafio é a própria cooperação que não tem prazos precisos, já
que visa a instaurar uma forma de atividade profissional interativa
que se assemelha mais a um modo de vida e de trabalho do que a um
desvio para alcançar um objetivo preciso.
- Dirigir um grupo de trabalho, conduzir reuniões
Queixas freqüentes – todo mundo fala ao mesmo tempo,
interrompe e não se escuta mais o outro; ninguém fala, todo mundo
parece perguntar-se, embaraçado: o que estou fazendo aqui?;
conversas começam em vários cantos, paralelamente à discussão
geral, não se sabe mais quem escuta quem; os participantes não
sabem mais muito bem por que se reuniram; a discussão toma
diversos rumos; uma ou duas pessoas falam sem parar, contam sua
vida; outras não dizem nada, não demonstram nenhuma vontade de
se expressar; alguns chegam atrasados; entre outros.
- Formar e renovar uma equipe pedagógica
Renovar uma equipe pedagógica requer ainda outras
competências. Trata-se de saber administrar, ao mesmo tempo, as
partidas e as chegadas das pessoas.
- Enfrentar e analisar ,em conjunto, situações complexas,
práticas e problemas profissionais
185
“O verdadeiro trabalho de equipe começa quando os membros se
afastam do ‘muro de lamentações’ para agir, utilizando toda a zona de
autonomia disponível e toda a capacidade de negociação de um ator
coletivo que está determinado, para realizar seu projeto, a afastar as
restrições institucionais e a obter os recursos e os apoios necess|rios”.
p. 89
- Administrar crises ou conflitos interpessoais
Em todos os grupos existem pessoas que são mediadores e que
antecipam e atenuam os confrontos. “Viver com as neuroses dos
outros exige não apenas uma certa tolerância e uma forma de afeição,
mas também competências de regulaç~o que evitam o pior”. p. 91
Capítulo 6
Participar da Administração da Escola
- Elaborar, negociar um projeto da instituição.
Formar um projeto é dizer “Eu”, é considerar-se como um forte,
que possui direitos e competências para modificar o curso das coisas.
Portanto, é complicado exigir de um aluno, cuja herança cultural não
predisponha a se conceber como um sujeito autônomo, que tenha
imediatamente um projeto. O desafio da educação escolar é, ao
contrário, proporcionar a todos os meios para conceber e fazer
projetos, sem fazer disso um pré-requisito.
- administrar os recursos da escola
186
“Administrar os recursos de uma escola é fazer escolhas, ou seja, é
tomar decisões coletivamente” p. 103
- Coordenar, Dirigir uma escola com todos os seus parceiros
O diretor na instituição tem como papel principal facilitar a
cooperação desses diversos profissionais, apesar das diferenças de
atribuições, de formação, de estatuto.
“Coordenar o tratamento dos casos que requerem intervenções
conjuntas será tanto mais fácil se as pessoas se conhecerem, se
falarem, se estimarem reciprocamente e tiverem uma boa
representação de suas tarefas e métodos respectivos de trabalho. Isso
supõe atitudes e competências da parte de todos e é ainda mais
necessário quando a organização escolar não prevê um chefe,
ninguém tendo explicitamente a tarefa e a autoridade de favorecer a
coexistência e a cooperaç~o de todos” p. 104
- Organizar e fazer evoluir, no âmbito da escola, a
participação dos alunos.
Vemos a participação dos alunos, por um duplo ponto de vista:
- é o exercício de um direito do ser humano, o direito de
participar, assim que tiver condições para isso, das decisões que lhe
dizem respeito, direito da criança e do adolescente, antes de ser
direito do adulto;
- é uma forma de educação para a cidadania, pela prática.
Sendo assim:
187
- a capacidade do sistema educativo de dar, aos estabelecimentos
e às equipes pedagógicas, uma verdadeira autonomia de gestão;
- a capacidade dos professores de não monopolizarem esse poder
delegado e de partilhá-lo, por sua vez, com seus alunos.
- Competências para trabalhar em ciclos de aprendizagem
“Uma nova organizaç~o do trabalho, pela introduç~o, por
exemplo, de ciclos de aprendizagem, modifica o equilíbrio entre
responsabilidades individuais e responsabilidades coletivas e torna
necessário, não somente um trabalho em equipe, mas também uma
cooperação da totalidade do estabelecimento, de preferência baseada
em um projeto” p. 107
Capítulo 7
Informar e Envolver os pais
Informar e envolver os pais é uma palavra de ordem e, ao mesmo
tempo, uma competência.
- Dirigir reuniões de informação e de debate
“Esta é uma das dificuldades do professor: decodificar, em
declarações aparentemente gerais, preocupações particulares e tratá-
las como tal, se não justificarem um debate global” p. 115
A competência dos professores consiste em aceitar os pais como
eles são, em sua diversidade.
- Fazer entrevistas
188
A competência consiste, amplamente, em não abusar de uma
posição dominante, em controlar a tentação de culpar e de julgar os
pais.
As competências de um profissional consistem em não gastar toda
sua energia para se defender, para afastar o outro, mas, ao contrário,
aceitar negociar, ouvir e compreender o que os pais têm a dizer, sem
renunciar a defender suas próprias convicções.
- Envolver os Pais na Construção dos Saberes
“É mais difícil compreender como os pais, desejosos que seu filho
tenha êxito, poderiam obstaculizar diretamente suas aprendizagens.
No entanto, é o que acontece, em geral involuntariamente, e
preocupa uma parte dos professores. Assim, inúmeros pais ainda
pensam que, para adquirir conhecimentos, é preciso sofrer, trabalhar
duro, aprender de cor, repetir palavras e seu manual, em suma, aliar
esforço e memória, atenção e disciplina, submissão e precisão. Os
professores que partilham dessa maneira de ver não têm muitos
problemas com esses pais. Eles podem dar mais deveres de casa,
multiplicar as provas, segurar as crianças depois da hora, punir e até
mesmo bater nas crianças que não trabalham, fazer o terror reinar,
dramatizar as notas baixas: terão o apoio incondicional daqueles pais
que pensam que só se aprende sob imposição e dor. Os professores
que praticam os métodos ativos e os procedimentos de projeto
suscitam, ao contrário, a adesão dos pais partidários dessa abordagem
e a desconfiança dos outros” p. 120
Capítulo 8
189
Utilizar Novas Tecnologias
- utilizar editores de textos;
- explorar as potencialidades didáticas dos programas em relação
aos objetivos do ensino;
- comunicar-se à distância por meio da telemática;
- utilizar as ferramentas multimídia no ensino.
Competências Fundamentais em uma Cultura Tecnológica – “A
verdadeira incógnita é saber se os professores irão apossar-se das
tecnologias como um auxílio ao ensino, para dar aulas cada vez mais
bem ilustradas por apresentações multimídia, ou para mudar de
paradigma e concentrar-se na criação, na gestão e na regulação de
situações de aprendizagem” p. 139
Capítulo 9
Enfrentar os Deveres e os Dilemas Éticos da Profissão
- Prevenir a violência na escola e fora dela
“A escola sabe que agora est| condenada a negociar, a n~o usar
mais a violência institucional sem se preocupar com as reações. Os
professores dos estabelecimentos de alto risco não ignoram isso: hoje
em dia, uma punição provoca represálias mais ou menos diretas. Se,
par a um professor, aplicar uma punição de duas horas retendo o
aluno – mesmo que plenamente justificada – tem como preço pneus
furados, a escalada da violência não é mais a solução. Importa,
portanto, que a escola se torne, segundo a expressão de Ballion (1993),
190
uma cidade a construir, na qual a ordem não está adquirida no
momento em que se entra nela, mas deve ser permanentemente
renegociada e conquistada” p. 146
- Lutar contra os preconceitos e as discriminações sexuais,
étnicas e sociais.
“Se um jovem sai de uma escola obrigatória, persuadido de que as
moças, os negros ou os mulçumanos são categorias inferiores, pouco
importa que saiba gramática, álgebra ou uma língua estrangeira. A
escola terá falhado drasticamente, porque nenhum dos professores
que pode intervir em diversos estágios do curso terá considerado que
isso era priorit|rio” p. 149
- Participar da criação de regras da vida comum referentes à
disciplina na escola, às sanções e à apreciação da conduta.
Saber como negociar, saber como agir – faz parte do seu ofício.
- Analisar a relação pedagógica, a autoridade e a
comunicação em aula.
“Sua competência é saber o que faz, o que supõe idealmente um
trabalho regular de desenvolvimento pessoal e de análise das práticas”
p. 152
- Desenvolver o senso de responsabilidade, a solidariedade e
o sentimento de justiça.
“A solidariedade e o senso de responsabilidade s~o estreitamente
dependentes do sentimento de justiça. Não se pode ser solidário com
191
aqueles que se julga infinitamente privilegiados e mobilizar-se em seu
favor quando sua sorte muda. Ainda aqui, os princípios de formação
disputam com as lógicas de ação. Até um professor indiferente ao
desenvolvimento do sentimento de justiça fora da escola não pode
ignorá-lo... porque seu trabalho cotidiano depende disto. Quando se
pergunta aos alunos do mundo inteiro o que eles esperam dos
professores, eles dizem grosso modo: um certo calor e senso de
justiça. O preferido do professor (...)é uma figura abominada pelo
universo escolar” p. 153
Capítulo 10
Administrar sua própria formação contínua
Segundo o autor administrar sua própria formação contínua é
uma coisa, administrar o sistema de formação contínua é outra. Este
último esteve durante muito tempo na dependência das
administrações escolares ou de centros de formação independentes,
principalmente as universidades. A profissionalização do ofício de
professor recruta parceiros entre os poderes organizadores da escola,
dos centros independentes de formação e das associações
profissionais de professores.
“Seria importante que cada vez mais professores se sentissem
responsáveis pela política de formação contínua e interviessem
individual ou coletivamente nos processos de decis~o” p. 169
192
PIAGET, Jean. Para onde vai a educação? Rio
de Janeiro: José Olimpio, 2007.
Fonte: Revista da Apeoesp.
“Afirmar o direito da pessoa humana à educação é assumir
uma responsabilidade muito mais pesada do que assegurar a
cada um a capacidade de ler, escrever e contar. É garantir a toda
criança o inteiro desenvolvimento de suas funções mentais e a
aquisição de conhecimentos e valores morais correspondentes
ao exercício de suas funções, até adaptação à vida social atual”.
Essa obra de Jean Piaget trata de compreender a forma como a
criança adquire o conhecimento lógico-matemático. Piaget lecionou
nas Universidades de Genebra e de Paris. Preocupava-se com vários
temas voltados ao ensino das Ciências, inclusive o da gratuidade do
ensino e de uma educação voltada para o pleno desenvolvimento da
personalidade humana, levando em consideração a diversidade dos
povos. Essa obra está dividida em duas partes.. A primeira parte é
uma retrospectiva da educação, que tem a finalidade de mostrar a
necessidade da transformação no modo de ensinar, a partir da
compreensão da forma lógica de aprender dos alunos.
“Qualitativo e quantitativo”
Piaget demonstra as diferenças individuais de aptidão do aluno
para determinados saberes, enfatizando que o fracasso escolar está
muito mais ligado à rápida passagem que os professores fazem do
aspecto qualitativo (lógico) para o quantitativo (numérico). Ele
193
mostra que a prática do ensino deveria utilizar o método ativo, por
meio do qual a criança vai reconstruir e reinventar, não somente
transmitir informações ao aluno. Portanto, o professor não deve se
limitar ao conteúdo específico de sua disciplina, mas deve conhecer
como ocorre o desenvolvimento psicológico da inteligência humana.
Experimentação:
O problema geral da Educação está focado na formação dos
professores, que é o aspecto de real mudança em qualquer reforma
pedagógica.
Na segunda parte, ele aborda a questão dos direitos expressos na
“Declaraç~o Universal dos Direitos do Homem”, em que lhe é
assegurado o pleno direito à educação e na qual os pais podem
escolher o tipo de educação que desejam para seus filhos. Piaget
advoga que esse direito não se restringe ao "pleno direito à educação"
mas que esta seja uma educação de qualidade e voltada para o pleno
desenvolvimento da personalidade humana, levando em consideração
a paz entre as várias nações. Para o desenvolvimento do ser humano é
preciso atentar para os dois fatores que o condicionam: os fatores da
hereditariedade e adaptação biológicas, e os fatores de transmissão ou
de interação sociais. O autor ressalta a diferença entre as sociedades
humanas e as sociedades animais, sendo que as principais condições
sociais humanas são as técnicas de produção e a linguagem, que
possibilita gerar os costumes e as regras. A concepção de que a lógica
do conhecimento seria inata no indivíduo foi quebrada com as
pesquisas piagetianas, cujos resultados apontaram que essa lógica se
constrói na interação do sujeito com o meio, como um processo de
194
desenvolvimento natural. Assim, a educação passa a ser vista como
fundamental para a formação do desenvolvimento natural do
indivíduo.
O autor reflete sobre como a criança, até seus sete anos, e
conforme sua nacionalidade, tem como responsável pela sua
educação a família e não a escola. Com isso, o autor quer nos lembrar
que a família não deve ter somente o papel formador e a escola o
papel de informar o aluno, mas que a escola, que também é
responsável em educar, não fosse separada da vida.
Discutindo o direito à educação, de acordo com o autor, na página
36,
"... é preciso não se deixar iludir: tal situação de direito não
poderia ainda corresponder a uma aplicação universal da lei, já que o
número de escolas e de professores permanece insuficiente
relativamente à população em idade escolar...".
Piaget vem mostrar que o direito por si só não é o bastante, e que
a gratuidade somente do ensino de primeiro grau, com um olhar de
justiça social, não passa de uma mera afirmação social. Entretanto,
para ele, não basta ampliar o ensino de primeiro grau e implantar o
segundo com caráter gratuito, mas é preciso também implementar
uma relação aluno/escola/aprendizagem, em que haja tarefas que
levem o aluno a compreender e participar ativamente da vida social.
Com relação aos pais, o autor reflete sobre como a família vem
perdendo seu poder de escolha e controle para o Estado; há famílias
constituídas por bons pais e outros nem tanto. Ao lidar com os pais,
195
principalmente quando da aplicação dos métodos ativos, deve-se
levar em consideração que é mais fácil a estes compreenderem os
métodos antigos do que uma nova proposta.
A educação não deve se prestar a moldar o aluno de acordo com
um modelo condizente com as gerações anteriores, mas em formar-
lhe a personalidade.
A respeito da educação moral, unicamente a vida social entre os
próprios alunos, isto é, um autogoverno levado tão longe quanto
possível e paralelo ao trabalho intelectual em comum, poderá
conduzir a esse duplo desenvolvimento de personalidades, donas de
si mesmas e de respeito mútuo.
Mostra ainda que a questão da educação internacional é muito
delicada, pois deve levar em consideração as variadas culturas. O
intercâmbio intercultural entre as sociedades faz-se principalmente
pelo respeito aos diferentes grupos étnicos que a formam, de forma a
conduzir a humanidade a uma paz mundial. Para isso é preciso levar
em conta qual método deve ser aplicado para fazer de um indivíduo
um bom cidadão. As ciências mostram o quão profundamente está
enraizada a atitude egocêntrica no ser humano, e o quanto é difícil
dela se desfazer, tanto pelo cérebro quanto pelo coração.
O pensamento de Piaget, expresso nesse livro, leva-nos a refletir
sobre a forma como a escola e a sociedade vêm lidando com a
educação dos indivíduos, na qual, muitas vezes, não se leva em
consideração a forma como estes desenvolvem sua inteligência. Mais
grave ainda é a formação dos professores, que não foram
desenvolvidos dentro de um processo ativo. Como esse docente,
196
assim formado, poderá ensinar seus alunos se ele mesmo não sabe
como acontece a passagem do processo quantitativo para o
qualitativo?
Esta obra é indicada para todos os profissionais da educação que
buscam entender um pouco mais sobre como se desenvolve o
pensamento humano e refletir sobre como se poderá agir dentro de
um processo educacional voltado ao desenvolvimento pleno da
pessoa e da sociedade.
197
Inclusão escolar: o que é? Por que? Como
fazer?
Maria Teresa Egler Montoan
Fonte: http://pt.shvoong.com/books/409300-inclus%C3%A3o-escolar-que-
%C3%A9-por/#ixzz1NQEB8ccF
O mundo está constantemente mudando, e algumas pessoas têm
a habilidade de prever as novas necessidades, as próximas
modificações; são essas pessoas que se destacam em meio às
novidades, pois estão sempre à frente, adotando os novos paradigmas.
A verdade é que estamos sempre seguindo paradigmas e, quando eles
entram em crise, vivemos um período de insegurança, mas também
de liberdade para inovar.No momento, a instituição escolar está
excessivamente burocrática, e faz-se necessário romper com este
paradigma para que ela volte a fluir, a atingir todos os alunos sem
preconceitos, tornando a inclusão um processo natural e banindo
qualquer preconceito cultural, social, étnico ou religioso.A escola
tem-se aberto a novos grupos sociais, mas sem reformulação de
conceitos e de conhecimentos. Assim, o ensino é massificado e não há
troca de experiências – isto é o que chamamos de democracia!O
pensamento que norteia o atual sistema é muito mecanicista, e
discrimina claramente os normais e os deficientes, o ensino regular e
o especial, como também cada uma das disciplinas estudadas na
escola. Aí está a burocracia excessiva, já que o conhecimento é
construído a partir da interação das diversas áreas, e não de maneira
segmentada. A parte criativa, subjetiva, foi desprezada. Mas a
198
educação deve ser voltada para uma cidadania plena.Polêmicas
envolvidas:Ø Professores da educação especial temem perder o que
conquistaram Professores do ensino regular são insegurosØ
Profissionais da saúde tratam alunos com dificuldades de adaptação
como pacientes Pais de alunos 'normais' temem uma queda na
qualidade do ensino. A integração escolar abrange turmas especiais
dentro do ensino comum, para que todos aprendam igualmente,
utilizando para isso todos os recursos necessários. Já a inclusão é mais
radical: exige modificações na perspectiva educacional, no paradigma,
trabalhando as diferenças de modo que elas enriqueçam o
aprendizado de todos, deficientes ou não, com problemas de
aprendizagem ou não.Igualdade não é homogeneidade: as diferenças
são produzidas a todo momento, e não podem ser passivamente
toleradas ou respeitadas, com pena, como se não houvesse mais nada
que pudéssemos fazer. A diferença é que deve ser tomada como
padrão, pois o normal é que um seja diferente do outro.
HOMOGENEIDADE ó DESVALORIZAÇÃOHOMOGENEIDADE
ESCOLAR ó DEMOCRATIZAÇÃO DE MASSAS Exemplo: Folclore"É
preciso que tenhamos o direito de ser diferentes quando a igualdade
nos descaracteriza, e o direto de ser iguais quando a diferença nos
inferioriza". (p. 34) É difícil incluir porque isso implica lidar com
culturas, desejos e emoções os mais variados, não se tratando
somente de números. Implica trabalhar a afetividade. Implica
modificar vidas, realidades, e não personagens fictícios.Nas escolas
que já praticam a inclusão, é possível observar diferenças: novos
desafios, esforços para que os objetivos se realizem e novas
perspectivas de vida para todos os alunos.A escola ideal não valoriza
as respostas-padrão, preocupando-se excessivamente em formar para
199
o futuro (próxima série? vestibular?). A escola de qualidade valoriza o
que os alunos podem aprender HOJE, o que podem descobrir cria,
desenvolvendo seus talentos. As relações entre alunos e professores
não são desprovidas de afetividade. A escola inclusiva, aberta a todos
que desejam aprender, certamente parece uma utopia. Mas, muito
pelo contrário, os alunos com que trabalhamos não são crianças
perfeitas – são seres humanos singulares. Assim é também a
instituição: simplesmente uma escola, de verdade, que não está presa
a modelos criados por quem não aceita a diversidade. A atual
tentativa de ensinar somente alunos perfeitos é que é utópica,
extremamente distante da realidade! Os professores devem ser
formados para lidar com todos os tipos de alunos; mas não é
necessário que tenham uma rigorosa preparação teórica e científica.
O que aprendem na prática, dividindo experiências, muitas vezes é
mais valioso.Isso contribui para o estreitamento das relações entre os
profissionais da educação, o que se reflete na maneira como tratam os
alunos. E quando os pais (e responsáveis) também participam dos
debates sobre o aprendizado e o futuro, chegamos cada vez mais
perto da concretização do sonho: ESCOLA DE QUALIDADE PARA
TODOS.
200
LEGISLAÇÃO
Constituição da República Federativa do Brasil,
artigo 5º.
Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer
natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes
no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à
segurança e à propriedade, nos termos seguintes:
I - homens e mulheres são iguais em direitos e obrigações, nos
termos desta Constituição;
II - ninguém será obrigado a fazer ou deixar de fazer alguma coisa
senão em virtude de lei;
III - ninguém será submetido a tortura nem a tratamento
desumano ou degradante;
201
IV - é livre a manifestação do pensamento, sendo vedado o
anonimato;
V - é assegurado o direito de resposta, proporcional ao agravo,
além da indenização por dano material, moral ou à imagem;
VI - é inviolável a liberdade de consciência e de crença, sendo
assegurado o livre exercício dos cultos religiosos e garantida, na forma
da lei, a proteção aos locais de culto e a suas liturgias;
VII - é assegurada, nos termos da lei, a prestação de assistência
religiosa nas entidades civis e militares de internação coletiva;
VIII - ninguém será privado de direitos por motivo de crença
religiosa ou de convicção filosófica ou política, salvo se as invocar
para eximir-se de obrigação legal a todos imposta e recusar-se a
cumprir prestação alternativa, fixada em lei;
IX - é livre a expressão da atividade intelectual, artística, científica
e de comunicação, independentemente de censura ou licença;
X - são invioláveis a intimidade, a vida privada, a honra e a
imagem das pessoas, assegurado o direito a indenização pelo dano
material ou moral decorrente de sua violação;
XI - a casa é asilo inviolável do indivíduo, ninguém nela podendo
penetrar sem consentimento do morador, salvo em caso de flagrante
delito ou desastre, ou para prestar socorro, ou, durante o dia, por
determinação judicial;
202
XII - é inviolável o sigilo da correspondência e das comunicações
telegráficas, de dados e das comunicações telefônicas, salvo, no
último caso, por ordem judicial, nas hipóteses e na forma que a lei
estabelecer para fins de investigação criminal ou instrução processual
penal; (Vide Lei nº 9.296, de 1996)
XIII - é livre o exercício de qualquer trabalho, ofício ou profissão,
atendidas as qualificações profissionais que a lei estabelecer;
XIV - é assegurado a todos o acesso à informação e resguardado o
sigilo da fonte, quando necessário ao exercício profissional;
XV - é livre a locomoção no território nacional em tempo de paz,
podendo qualquer pessoa, nos termos da lei, nele entrar, permanecer
ou dele sair com seus bens;
XVI - todos podem reunir-se pacificamente, sem armas, em locais
abertos ao público, independentemente de autorização, desde que
não frustrem outra reunião anteriormente convocada para o mesmo
local, sendo apenas exigido prévio aviso à autoridade competente;
XVII - é plena a liberdade de associação para fins lícitos, vedada a
de caráter paramilitar;
XVIII - a criação de associações e, na forma da lei, a de
cooperativas independem de autorização, sendo vedada a
interferência estatal em seu funcionamento;
XIX - as associações só poderão ser compulsoriamente dissolvidas
ou ter suas atividades suspensas por decisão judicial, exigindo-se, no
primeiro caso, o trânsito em julgado;
203
XX - ninguém poderá ser compelido a associar-se ou a
permanecer associado;
XXI - as entidades associativas, quando expressamente
autorizadas, têm legitimidade para representar seus filiados judicial
ou extrajudicialmente;
XXII - é garantido o direito de propriedade;
XXIII - a propriedade atenderá a sua função social;
XXIV - a lei estabelecerá o procedimento para desapropriação por
necessidade ou utilidade pública, ou por interesse social, mediante
justa e prévia indenização em dinheiro, ressalvados os casos previstos
nesta Constituição;
XXV - no caso de iminente perigo público, a autoridade
competente poderá usar de propriedade particular, assegurada ao
proprietário indenização ulterior, se houver dano;
XXVI - a pequena propriedade rural, assim definida em lei, desde
que trabalhada pela família, não será objeto de penhora para
pagamento de débitos decorrentes de sua atividade produtiva,
dispondo a lei sobre os meios de financiar o seu desenvolvimento;
XXVII - aos autores pertence o direito exclusivo de utilização,
publicação ou reprodução de suas obras, transmissível aos herdeiros
pelo tempo que a lei fixar;
XXVIII - são assegurados, nos termos da lei:
204
a) a proteção às participações individuais em obras coletivas e à
reprodução da imagem e voz humanas, inclusive nas atividades
desportivas;
b) o direito de fiscalização do aproveitamento econômico das
obras que criarem ou de que participarem aos criadores, aos
intérpretes e às respectivas representações sindicais e associativas;
XXIX - a lei assegurará aos autores de inventos industriais
privilégio temporário para sua utilização, bem como proteção às
criações industriais, à propriedade das marcas, aos nomes de
empresas e a outros signos distintivos, tendo em vista o interesse
social e o desenvolvimento tecnológico e econômico do País;
XXX - é garantido o direito de herança;
XXXI - a sucessão de bens de estrangeiros situados no País será
regulada pela lei brasileira em benefício do cônjuge ou dos filhos
brasileiros, sempre que não lhes seja mais favorável a lei pessoal do
"de cujus";
XXXII - o Estado promoverá, na forma da lei, a defesa do
consumidor;
XXXIII - todos têm direito a receber dos órgãos públicos
informações de seu interesse particular, ou de interesse coletivo ou
geral, que serão prestadas no prazo da lei, sob pena de
responsabilidade, ressalvadas aquelas cujo sigilo seja imprescindível à
segurança da sociedade e do Estado; (Regulamento)
205
XXXIV - são a todos assegurados, independentemente do
pagamento de taxas:
a) o direito de petição aos Poderes Públicos em defesa de direitos
ou contra ilegalidade ou abuso de poder;
b) a obtenção de certidões em repartições públicas, para defesa de
direitos e esclarecimento de situações de interesse pessoal;
XXXV - a lei não excluirá da apreciação do Poder Judiciário lesão
ou ameaça a direito;
XXXVI - a lei não prejudicará o direito adquirido, o ato jurídico
perfeito e a coisa julgada;
XXXVII - não haverá juízo ou tribunal de exceção;
XXXVIII - é reconhecida a instituição do júri, com a organização
que lhe der a lei, assegurados:
a) a plenitude de defesa;
b) o sigilo das votações;
c) a soberania dos veredictos;
d) a competência para o julgamento dos crimes dolosos contra a
vida;
XXXIX - não há crime sem lei anterior que o defina, nem pena
sem prévia cominação legal;
XL - a lei penal não retroagirá, salvo para beneficiar o réu;
206
XLI - a lei punirá qualquer discriminação atentatória dos direitos
e liberdades fundamentais;
XLII - a prática do racismo constitui crime inafiançável e
imprescritível, sujeito à pena de reclusão, nos termos da lei;
XLIII - a lei considerará crimes inafiançáveis e insuscetíveis de
graça ou anistia a prática da tortura , o tráfico ilícito de entorpecentes
e drogas afins, o terrorismo e os definidos como crimes hediondos,
por eles respondendo os mandantes, os executores e os que, podendo
evitá-los, se omitirem;
XLIV - constitui crime inafiançável e imprescritível a ação de
grupos armados, civis ou militares, contra a ordem constitucional e o
Estado Democrático;
XLV - nenhuma pena passará da pessoa do condenado, podendo a
obrigação de reparar o dano e a decretação do perdimento de bens
ser, nos termos da lei, estendidas aos sucessores e contra eles
executadas, até o limite do valor do patrimônio transferido;
XLVI - a lei regulará a individualização da pena e adotará, entre
outras, as seguintes:
a) privação ou restrição da liberdade;
b) perda de bens;
c) multa;
d) prestação social alternativa;
207
e) suspensão ou interdição de direitos;
XLVII - não haverá penas:
a) de morte, salvo em caso de guerra declarada, nos termos do art.
84, XIX;
b) de caráter perpétuo;
c) de trabalhos forçados;
d) de banimento;
e) cruéis;
XLVIII - a pena será cumprida em estabelecimentos distintos, de
acordo com a natureza do delito, a idade e o sexo do apenado;
XLIX - é assegurado aos presos o respeito à integridade física e
moral;
L - às presidiárias serão asseguradas condições para que possam
permanecer com seus filhos durante o período de amamentação;
LI - nenhum brasileiro será extraditado, salvo o naturalizado, em
caso de crime comum, praticado antes da naturalização, ou de
comprovado envolvimento em tráfico ilícito de entorpecentes e
drogas afins, na forma da lei;
LII - não será concedida extradição de estrangeiro por crime
político ou de opinião;
208
LIII - ninguém será processado nem sentenciado senão pela
autoridade competente;
LIV - ninguém será privado da liberdade ou de seus bens sem o
devido processo legal;
LV - aos litigantes, em processo judicial ou administrativo, e aos
acusados em geral são assegurados o contraditório e ampla defesa,
com os meios e recursos a ela inerentes;
LVI - são inadmissíveis, no processo, as provas obtidas por meios
ilícitos;
LVII - ninguém será considerado culpado até o trânsito em
julgado de sentença penal condenatória;
LVIII - o civilmente identificado não será submetido a
identificação criminal, salvo nas hipóteses previstas em
lei; (Regulamento).
LIX - será admitida ação privada nos crimes de ação pública, se
esta não for intentada no prazo legal;
LX - a lei só poderá restringir a publicidade dos atos processuais
quando a defesa da intimidade ou o interesse social o exigirem;
LXI - ninguém será preso senão em flagrante delito ou por ordem
escrita e fundamentada de autoridade judiciária competente, salvo
nos casos de transgressão militar ou crime propriamente militar,
definidos em lei;
209
LXII - a prisão de qualquer pessoa e o local onde se encontre serão
comunicados imediatamente ao juiz competente e à família do preso
ou à pessoa por ele indicada;
LXIII - o preso será informado de seus direitos, entre os quais o de
permanecer calado, sendo-lhe assegurada a assistência da família e de
advogado;
LXIV - o preso tem direito à identificação dos responsáveis por
sua prisão ou por seu interrogatório policial;
LXV - a prisão ilegal será imediatamente relaxada pela autoridade
judiciária;
LXVI - ninguém será levado à prisão ou nela mantido, quando a
lei admitir a liberdade provisória, com ou sem fiança;
LXVII - não haverá prisão civil por dívida, salvo a do responsável
pelo inadimplemento voluntário e inescusável de obrigação
alimentícia e a do depositário infiel;
LXVIII - conceder-se-á "habeas-corpus" sempre que alguém sofrer
ou se achar ameaçado de sofrer violência ou coação em sua liberdade
de locomoção, por ilegalidade ou abuso de poder;
LXIX - conceder-se-á mandado de segurança para proteger
direito líquido e certo, não amparado por "habeas-corpus" ou
"habeas-data", quando o responsável pela ilegalidade ou abuso de
poder for autoridade pública ou agente de pessoa jurídica no exercício
de atribuições do Poder Público;
210
LXX - o mandado de segurança coletivo pode ser impetrado por:
a) partido político com representação no Congresso Nacional;
b) organização sindical, entidade de classe ou associação
legalmente constituída e em funcionamento há pelo menos um ano,
em defesa dos interesses de seus membros ou associados;
LXXI - conceder-se-á mandado de injunção sempre que a falta de
norma regulamentadora torne inviável o exercício dos direitos e
liberdades constitucionais e das prerrogativas inerentes à
nacionalidade, à soberania e à cidadania;
LXXII - conceder-se-á "habeas-data":
a) para assegurar o conhecimento de informações relativas à
pessoa do impetrante, constantes de registros ou bancos de dados de
entidades governamentais ou de caráter público;
b) para a retificação de dados, quando não se prefira fazê-lo por
processo sigiloso, judicial ou administrativo;
LXXIII - qualquer cidadão é parte legítima para propor ação
popular que vise a anular ato lesivo ao patrimônio público ou de
entidade de que o Estado participe, à moralidade administrativa, ao
meio ambiente e ao patrimônio histórico e cultural, ficando o autor,
salvo comprovada má-fé, isento de custas judiciais e do ônus da
sucumbência;
LXXIV - o Estado prestará assistência jurídica integral e gratuita
aos que comprovarem insuficiência de recursos;
211
LXXV - o Estado indenizará o condenado por erro judiciário,
assim como o que ficar preso além do tempo fixado na sentença;
LXXVI - são gratuitos para os reconhecidamente pobres, na forma
da lei:
a) o registro civil de nascimento;
b) a certidão de óbito;
LXXVII - são gratuitas as ações de "habeas-corpus" e "habeas-
data", e, na forma da lei, os atos necessários ao exercício da cidadania.
LXXVIII a todos, no âmbito judicial e administrativo, são
assegurados a razoável duração do processo e os meios que garantam
a celeridade de sua tramitação. (Incluído pela Emenda Constitucional
nº 45, de 2004)
§ 1º - As normas definidoras dos direitos e garantias fundamentais
têm aplicação imediata.
§ 2º - Os direitos e garantias expressos nesta Constituição não
excluem outros decorrentes do regime e dos princípios por ela
adotados, ou dos tratados internacionais em que a República
Federativa do Brasil seja parte.
§ 3º Os tratados e convenções internacionais sobre direitos
humanos que forem aprovados, em cada Casa do Congresso Nacional,
em dois turnos, por três quintos dos votos dos respectivos membros,
serão equivalentes às emendas constitucionais. (Incluído pela
212
Emenda Constitucional nº 45, de 2004) (Atos aprovados na forma
deste parágrafo)
§ 4º O Brasil se submete à jurisdição de Tribunal Penal
Internacional a cuja criação tenha manifestado adesão. (Incluído pela
Emenda Constitucional nº 45, de 2004)
213
MINISTÉRIO DA EDUCAÇÃO CONSELHO NACIONAL DE EDUCAÇÃO
CÂMARA DE EDUCAÇÃO BÁSICA RESOLUÇÃO
Nº 4, DE 13 DE JULHO DE 2010 (*)
Define Diretrizes Curriculares Nacionais
Gerais para a Educação Básica.
O Presidente da Câmara de Educação Básica do Conselho
Nacional de Educação, no uso de suas atribuições legais, e de
conformidade com o disposto na alínea “c” do § 1º do artigo 9º da Lei
nº 4.024/1961, com a redação dada pela Lei nº 9.131/1995, nos artigos
36, 36- A, 36-B, 36-C, 36-D, 37, 39, 40, 41 e 42 da Lei nº 9.394/1996,
com a redação dada pela Lei nº 11.741/2008, bem como no Decreto nº
5.154/2004, e com fundamento no Parecer CNE/CEB nº 7/2010,
homologado por Despacho do Senhor Ministro de Estado da
Educação, publicado no DOU de 9 de julho de 2010.
RESOLVE:
Art. 1º A presente Resolução define Diretrizes Curriculares
Nacionais Gerais para o conjunto orgânico, sequencial e articulado
das etapas e modalidades da Educação Básica, baseando-se no direito
de toda pessoa ao seu pleno desenvolvimento, à preparação para o
exercício da cidadania e à qualificação para o trabalho, na vivência e
convivência em ambiente educativo, e tendo como fundamento a
responsabilidade que o Estado brasileiro, a família e a sociedade têm
de garantir a democratização do acesso, a inclusão, a permanência e
214
a conclusão com sucesso das crianças, dos jovens e adultos na
instituição educacional, a aprendizagem para continuidade dos
estudos e a extensão da obrigatoriedade e da gratuidade da Educação
Básica.
TÍTULO I
OBJETIVOS
Art. 2º Estas Diretrizes Curriculares Nacionais Gerais para a
Educação Básica têm por objetivos:
I - sistematizar os princípios e as diretrizes gerais da Educação
Básica contidos na Constituição, na Lei de Diretrizes e Bases da
Educação Nacional (LDB) e demais dispositivos legais, traduzindo-os
em orientações que contribuam para assegurar a formação básica
comum nacional, tendo como foco os sujeitos que dão vida ao
currículo e à escola;
II - estimular a reflexão crítica e propositiva que deve subsidiar a
formulação, a execução e a avaliação do projeto político-pedagógico
da escola de Educação Básica;
III - orientar os cursos de formação inicial e continuada de
docentes e demais profissionais da Educação Básica, os sistemas
educativos dos diferentes entes federados e as escolas que os
integram, indistintamente da rede a que pertençam.
Art. 3º As Diretrizes Curriculares Nacionais específicas para as
etapas e modalidades da Educação Básica devem evidenciar o seu
papel de indicador de opções políticas, sociais, culturais,
215
educacionais, e a função da educação, na sua relação com um projeto
de Nação, tendo como referência os objetivos constitucionais,
fundamentando-se na cidadania e na dignidade da pessoa, o que
pressupõe igualdade, liberdade, pluralidade, diversidade, respeito,
justiça social, solidariedade e sustentabilidade.
(*) Resolução CNE/CEB 4/2010. Diário Oficial da União, Brasília,
14 de julho de 2010, Seção 1, p. 824.
TÍTULO II
REFERÊNCIAS CONCEITUAIS
Art. 4º As bases que dão sustentação ao projeto nacional de
educação responsabilizam o poder público, a família, a sociedade e a
escola pela garantia a todos os educandos de um ensino ministrado
de acordo com os princípios de:
I - igualdade de condições para o acesso, inclusão, permanência e
sucesso na escola;
II - liberdade de aprender, ensinar, pesquisar e divulgar a cultura,
o pensamento, a arte e o saber;
III - pluralismo de ideias e de concepções pedagógicas;
IV - respeito à liberdade e aos direitos;
V - coexistência de instituições públicas e privadas de ensino;
VI - gratuidade do ensino público em estabelecimentos oficiais;
VII - valorização do profissional da educação escolar;
216
VIII - gestão democrática do ensino público, na forma da
legislação e das normas dos respectivos sistemas de ensino;
IX - garantia de padrão de qualidade;
X - valorização da experiência extraescolar;
XI - vinculação entre a educação escolar, o trabalho e as práticas
sociais.
Art. 5º A Educação Básica é direito universal e alicerce
indispensável para o exercício da cidadania em plenitude, da qual
depende a possibilidade de conquistar todos os demais
direitos, definidos na Constituição Federal, no Estatuto da Criança
e do Adolescente (ECA), na legislação ordinária e nas demais
disposições que consagram as prerrogativas do cidadão.
Art. 6º Na Educação Básica, é necessário considerar as dimensões
do educar e do cuidar, em sua inseparabilidade, buscando recuperar,
para a função social desse nível da educação, a sua centralidade, que é
o educando, pessoa em formação na sua essência humana.
TÍTULO III
SISTEMA NACIONAL DE EDUCAÇÃO
Art. 7º A concepção de educação deve orientar a
institucionalização do regime de colaboração entre União, Estados,
Distrito Federal e Municípios, no contexto da estrutura federativa
brasileira, em que convivem sistemas educacionais autônomos, para
assegurar efetividade ao projeto da educação nacional, vencer a
217
fragmentação das políticas públicas e superar a desarticulação
institucional.
§ 1º Essa institucionalização é possibilitada por um Sistema
Nacional de Educação, no qual cada ente federativo, com suas
peculiares competências, é chamado a colaborar para transformar a
Educação Básica em um sistema orgânico, sequencial e articulado.
§ 2º O que caracteriza um sistema é a atividade intencional e
organicamente concebida, que se justifica pela realização de
atividades voltadas para as mesmas finalidades ou para a
concretização dos mesmos objetivos.
§ 3º O regime de colaboração entre os entes federados pressupõe
o estabelecimento de regras de equivalência entre as funções
distributiva, supletiva, normativa, de supervisão e avaliação da
educação nacional, respeitada a autonomia dos sistemas e valorizadas
as diferenças regionais.
TÍTULO IV
ACESSO E PERMANÊNCIA PARA A CONQUISTA DA QUALIDADE
SOCIAL
Art. 8º A garantia de padrão de qualidade, com pleno acesso,
inclusão e permanência dos sujeitos das aprendizagens na escola e
seu sucesso, com redução da evasão, da retenção e da distorção de
idade/ano/série, resulta na qualidade social da educação, que é uma
conquista coletiva de todos os sujeitos do processo educativo.
218
Art. 9º A escola de qualidade social adota como centralidade o
estudante e a aprendizagem, o que pressupõe atendimento aos
seguintes requisitos:
I - revisão das referências conceituais quanto aos diferentes
espaços e tempos educativos, abrangendo espaços sociais na escola e
fora dela;
II - consideração sobre a inclusão, a valorização das diferenças e o
atendimento à pluralidade e à diversidade cultural, resgatando e
respeitando as várias manifestações de cada comunidade;
III - foco no projeto político-pedagógico, no gosto pela
aprendizagem e na avaliação das aprendizagens como instrumento de
contínua progressão dos estudantes;
IV - inter-relação entre organização do currículo, do trabalho
pedagógico e da jornada de trabalho do professor, tendo como
objetivo a aprendizagem do estudante;
V - preparação dos profissionais da educação, gestores,
professores, especialistas, técnicos, monitores e outros;
VI - compatibilidade entre a proposta curricular e a infraestrutura
entendida como espaço formativo dotado de efetiva disponibilidade
de tempos para a sua utilização e acessibilidade;
VII - integração dos profissionais da educação, dos estudantes, das
famílias, dos agentes da comunidade interessados na educação;
219
VIII - valorização dos profissionais da educação, com programa de
formação continuada, critérios de acesso, permanência, remuneração
compatível com a jornada de trabalho definida no projeto político-
pedagógico;
IX - realização de parceria com órgãos, tais como os de assistência
social e desenvolvimento humano, cidadania, ciência e tecnologia,
esporte, turismo, cultura e arte, saúde, meio ambiente.
Art. 10. A exigência legal de definição de padrões mínimos de
qualidade da educação traduz a necessidade de reconhecer que a sua
avaliação associa-se à ação planejada, coletivamente, pelos sujeitos da
escola.
§ 1º O planejamento das ações coletivas exercidas pela escola
supõe que os sujeitos tenham clareza quanto:
I - aos princípios e às finalidades da educação, além do
reconhecimento e da análise dos dados indicados pelo Índice de
Desenvolvimento da Educação Básica (IDEB) e/ou outros indicadores,
que o complementem ou substituam;
II - à relevância de um projeto político-pedagógico concebido e
assumido colegiadamente pela comunidade educacional, respeitadas
as múltiplas diversidades e a pluralidade cultural;
III - à riqueza da valorização das diferenças manifestadas pelos
sujeitos do processo educativo, em seus diversos segmentos,
respeitados o tempo e o contexto sociocultural;
220
IV - aos padrões mínimos de qualidade (Custo Aluno-Qualidade
Inicial – CAQi);
§ 2º Para que se concretize a educação escolar, exige-se um padrão
mínimo de insumos, que tem como base um investimento com valor
calculado a partir das despesas essenciais ao desenvolvimento dos
processos e procedimentos formativos, que levem, gradualmente, a
uma educação integral, dotada de qualidade social:
I - creches e escolas que possuam condições de infraestrutura e
adequados equipamentos;
II - professores qualificados com remuneração adequada e
compatível com a de outros profissionais com igual nível de
formação, em regime de trabalho de 40 (quarenta) horas em tempo
integral em uma mesma escola;
III - definição de uma relação adequada entre o número de alunos
por turma e por professor, que assegure aprendizagens relevantes;
IV - pessoal de apoio técnico e administrativo que responda às
exigências do que se estabelece no projeto político-pedagógico.
TÍTULO V
ORGANIZAÇÃO CURRICULAR: CONCEITO, LIMITES,
POSSIBILIDADES
Art. 11. A escola de Educação Básica é o espaço em que se
ressignifica e se recria a cultura herdada, reconstruindo-se as
221
identidades culturais, em que se aprende a valorizar asraízes próprias
das diferentes regiões do País.
Parágrafo único. Essa concepção de escola exige a superação do
rito escolar, desde aconstrução do currículo até os critérios que
orientam a organização do trabalho escolar em sua
multidimensionalidade, privilegia trocas, acolhimento e aconchego,
para garantir o bem-estar de crianças, adolescentes, jovens e adultos,
no relacionamento entre todas as pessoas.
Art. 12. Cabe aos sistemas educacionais, em geral, definir o
programa de escolas de tempo parcial diurno (matutino ou
vespertino), tempo parcial noturno, e tempo integral (turno e contra-
turno ou turno único com jornada escolar de 7 horas, no mínimo,
durante todo o período letivo), tendo em vista a amplitude do papel
socioeducativo atribuído ao conjunto orgânico da Educação Básica, o
que requer outra organização e gestão do trabalho pedagógico.
§ 1º Deve-se ampliar a jornada escolar, em único ou diferentes
espaços educativos, nos quais a permanência do estudante vincula-se
tanto à quantidade e qualidade do tempo diário de escolarização
quanto à diversidade de atividades de aprendizagens.
§ 2º A jornada em tempo integral com qualidade implica a
necessidade da incorporação efetiva e orgânica, no currículo, de
atividades e estudos pedagogicamente planejados e acompanhados.
§ 3º Os cursos em tempo parcial noturno devem estabelecer
metodologia adequada às idades, à maturidade e à experiência de
222
aprendizagens, para atenderem aos jovens e adultos em escolarização
no tempo regular ou na modalidade de Educação de Jovens e Adultos.
CAPÍTULO I
FORMAS PARA A ORGANIZAÇÃO CURRICULAR
Art. 13. O currículo, assumindo como referência os princípios
educacionais garantidos à educação, assegurados no artigo 4º desta
Resolução, configura-se como o conjunto de valores e práticas que
proporcionam a produção, a socialização de significados no espaço
social e contribuem intensamente para a construção de identidades
socioculturais dos educandos.
§ 1º O currículo deve difundir os valores fundamentais do
interesse social, dos direitos e deveres dos cidadãos, do respeito ao
bem comum e à ordem democrática, considerando as condições de
escolaridade dos estudantes em cada estabelecimento, a orientação
para o trabalho, a promoção de práticas educativas formais e não-
formais.
§ 2º Na organização da proposta curricular, deve-se assegurar o
entendimento de currículo como experiências escolares que se
desdobram em torno do conhecimento, permeadas pelas relações
sociais, articulando vivências e saberes dos estudantes com os
conhecimentos historicamente acumulados e contribuindo para
construir as identidades dos educandos.
§ 3º A organização do percurso formativo, aberto e
contextualizado, deve ser construída em função das peculiaridades do
223
meio e das características, interesses e necessidades dos estudantes,
incluindo não só os componentes curriculares centrais
obrigatórios, previstos na legislação e nas normas educacionais,
mas outros, também, de modo flexível e variável, conforme cada
projeto escolar, e assegurando:
I - concepção e organização do espaço curricular e físico que se
imbriquem e alarguem, incluindo espaços, ambientes e equipamentos
que não apenas as salas de aula da escola, mas, igualmente, os espaços
de outras escolas e os socioculturais e esportivorecreativos do
entorno, da cidade e mesmo da região;
II - ampliação e diversificação dos tempos e espaços curriculares
que pressuponham profissionais da educação dispostos a inventar e
construir a escola de qualidade social, com responsabilidade
compartilhada com as demais autoridades que respondem pela gestão
dos órgãos do poder público, na busca de parcerias possíveis e
necessárias, até porque educar é responsabilidade da família, do
Estado e da sociedade;
III - escolha da abordagem didático-pedagógica disciplinar,
pluridisciplinar, interdisciplinar ou transdisciplinar pela escola, que
oriente o projeto político-pedagógico e resulte de pacto estabelecido
entre os profissionais da escola, conselhos escolares e comunidade,
subsidiando a organização da matriz curricular, a definição de eixos
temáticos e a constituição de redes de aprendizagem;
IV - compreensão da matriz curricular entendida como
propulsora de movimento, dinamismo curricular e educacional, de tal
224
modo que os diferentes campos do conhecimento possam se
coadunar com o conjunto de atividades educativas;
V - organização da matriz curricular entendida como alternativa
operacional que embase a gestão do currículo escolar e represente
subsídio para a gestão da escola (na organização do tempo e do
espaço curricular, distribuição e controle do tempo dos trabalhos
docentes), passo para uma gestão centrada na abordagem
interdisciplinar, organizada por eixos temáticos, mediante
interlocução entre os diferentes campos do conhecimento;
VI - entendimento de que eixos temáticos são uma forma de
organizar o trabalho pedagógico, limitando a dispersão do
conhecimento, fornecendo o cenário no qual se constroem objetos de
estudo, propiciando a concretização da proposta pedagógica centrada
na visão interdisciplinar, superando o isolamento das pessoas e a
compartimentalização de conteúdos rígidos;
VII - estímulo à criação de métodos didático-pedagógicos
utilizando-se recursos tecnológicos de informação e comunicação, a
serem inseridos no cotidiano escolar, a fim de superar a distância
entre estudantes que aprendem a receber informação com rapidez
utilizando a linguagem digital e professores que dela ainda não se
apropriaram;
VIII - constituição de rede de aprendizagem, entendida como um
conjunto de ações didático-pedagógicas, com foco na aprendizagem e
no gosto de aprender, subsidiada pela consciência de que o processo
225
de comunicação entre estudantes e professores é efetivado por meio
de práticas e recursos diversos;
IX - adoção de rede de aprendizagem, também, como ferramenta
didático-pedagógica relevante nos programas de formação inicial e
continuada de profissionais da educação, sendo que esta opção requer
planejamento sistemático integrado estabelecido entre sistemas
educativos ou conjunto de unidades escolares;
§ 4º A transversalidade é entendida como uma forma de organizar
o trabalho didáticopedagógico em que temas e eixos temáticos são
integrados às disciplinas e às áreas ditas convencionais, de forma a
estarem presentes em todas elas.
§ 5º A transversalidade difere da interdisciplinaridade e ambas
complementam-se, rejeitando a concepção de conhecimento que
toma a realidade como algo estável, pronto e acabado.
§ 6º A transversalidade refere-se à dimensão didático-pedagógica,
e a interdisciplinaridade, à abordagem epistemológica dos objetos de
conhecimento.
CAPÍTULO II
FORMAÇÃO BÁSICA COMUM E PARTE DIVERSIFICADA
Art. 14. A base nacional comum na Educação Básica constitui-se
de conhecimentos, saberes e valores produzidos culturalmente,
expressos nas políticas públicas e gerados nas instituições produtoras
do conhecimento científico e tecnológico; no mundo do trabalho; no
226
desenvolvimento das linguagens; nas atividades desportivas e
corporais; na produção artística; nas formas diversas de exercício da
cidadania; e nos movimentos sociais.
§ 1º Integram a base nacional comum nacional:
a) a Língua Portuguesa;
b) a Matemática;
c) o conhecimento do mundo físico, natural, da realidade social e
política, especialmente do Brasil, incluindo-se o estudo da História e
das Culturas Afro-Brasileira e Indígena,
d) a Arte, em suas diferentes formas de expressão, incluindo-se a
música;
e) a Educação Física;
f) o Ensino Religioso.
§ 2º Tais componentes curriculares são organizados pelos sistemas
educativos, em forma de áreas de conhecimento, disciplinas, eixos
temáticos, preservando-se a especificidade dos diferentes campos do
conhecimento, por meio dos quais se desenvolvem as habilidades
indispensáveis ao exercício da cidadania, em ritmo compatível com as
etapas do desenvolvimento integral do cidadão.
§ 3º A base nacional comum e a parte diversificada não podem se
constituir em dois blocos distintos, com disciplinas específicas para
cada uma dessas partes, mas devem ser organicamente planejadas e
geridas de tal modo que as tecnologias de informação e comunicação
227
perpassem transversalmente a proposta curricular, desde a Educação
Infantil até o Ensino Médio, imprimindo direção aos projetos político-
pedagógicos.
Art. 15. A parte diversificada enriquece e complementa a base
nacional comum, prevendo o estudo das características regionais e
locais da sociedade, da cultura, da economia e da comunidade
escolar, perpassando todos os tempos e espaços curriculares
constituintes do Ensino Fundamental e do Ensino Médio,
independentemente do ciclo da vida no qual os sujeitos tenham
acesso à escola.
§ 1º A parte diversificada pode ser organizada em temas gerais, na
forma de eixos temáticos, selecionados colegiadamente pelos sistemas
educativos ou pela unidade escolar.
§ 2º A LDB inclui o estudo de, pelo menos, uma língua estrangeira
moderna na parte diversificada, cabendo sua escolha à comunidade
escolar, dentro das possibilidades da escola, que deve considerar o
atendimento das características locais, regionais, nacionais e
transnacionais, tendo em vista as demandas do mundo do trabalho e
da internacionalização de toda ordem de relações.
§ 3º A língua espanhola, por força da Lei nº 11.161/2005, é
obrigatoriamente ofertada no Ensino Médio, embora facultativa para
o estudante, bem como possibilitada no Ensino Fundamental, do 6º
ao 9º ano.
Art. 16. Leis específicas, que complementam a LDB, determinam
que sejam incluídos componentes não disciplinares, como temas
228
relativos ao trânsito, ao meio ambiente e à condição e direitos do
idoso.
Art. 17. No Ensino Fundamental e no Ensino Médio, destinar-se-
ão, pelo menos, 20% do total da carga horária anual ao conjunto de
programas e projetos interdisciplinares eletivos criados pela escola,
previsto no projeto pedagógico, de modo que os estudantes do Ensino
Fundamental e do Médio possam escolher aquele programa ou
projeto com que se identifiquem e que lhes permitam melhor lidar
com o conhecimento e a experiência.
§ 1º Tais programas e projetos devem ser desenvolvidos de modo
dinâmico, criativo e flexível, em articulação com a comunidade em
que a escola esteja inserida.
§ 2º A interdisciplinaridade e a contextualização devem assegurar
a transversalidade do conhecimento de diferentes disciplinas e eixos
temáticos, perpassando todo o currículo e propiciando a interlocução
entre os saberes e os diferentes campos do conhecimento.
TÍTULO VI
ORGANIZAÇÃO DA EDUCAÇÃO BÁSICA
Art. 18. Na organização da Educação Básica, devem-se observar as
Diretrizes Curriculares Nacionais comuns a todas as suas etapas,
modalidades e orientações temáticas, respeitadas as suas
especificidades e as dos sujeitos a que se destinam.
229
§ 1º As etapas e as modalidades do processo de escolarização
estruturam-se de modo orgânico, sequencial e articulado, de maneira
complexa, embora permanecendo individualizadas ao logo do
percurso do estudante, apesar das mudanças por que passam:
I - a dimensão orgânica é atendida quando são observadas as
especificidades e as diferenças de cada sistema educativo, sem perder
o que lhes é comum: as semelhanças e as identidades que lhe são
inerentes;
II - a dimensão sequencial compreende os processos educativos
que acompanham as exigências de aprendizagens definidas em cada
etapa do percurso formativo, contínuo e progressivo, da Educação
Básica até a Educação Superior, constituindo-se em diferentes e
insubstituíveis momentos da vida dos educandos;
III - a articulação das dimensões orgânica e sequencial das etapas
e das modalidades da Educação Básica, e destas com a Educação
Superior, implica ação coordenada e integradora do seu conjunto.
§ 2º A transição entre as etapas da Educação Básica e suas fases
requer formas de articulação das dimensões orgânica e sequencial
que assegurem aos educandos, sem tensões e rupturas, a
continuidade de seus processos peculiares de aprendizagem e
desenvolvimento.
Art. 19. Cada etapa é delimitada por sua finalidade, seus
princípios, objetivos e diretrizes educacionais, fundamentando-se na
inseparabilidade dos conceitos referenciais: cuidar e educar, pois esta
230
é uma concepção norteadora do projeto político-pedagógico
elaborado e executado pela comunidade educacional.
Art. 20. O respeito aos educandos e a seus tempos mentais,
socioemocionais, culturais e identitários é um princípio orientador de
toda a ação educativa, sendo responsabilidade dos sistemas a criação
de condições para que crianças, adolescentes, jovens e adultos, com
sua diversidade, tenham a oportunidade de receber a formação que
corresponda à idade própria de percurso escolar.
CAPÍTULO I
ETAPAS DA EDUCAÇÃO BÁSICA
Art. 21. São etapas correspondentes a diferentes momentos
constitutivos do desenvolvimento educacional:
I - a Educação Infantil, que compreende: a Creche, englobando as
diferentes etapas do desenvolvimento da criança até 3 (três) anos e 11
(onze) meses; e a Pré-Escola, com duração de 2 (dois) anos;
II - o Ensino Fundamental, obrigatório e gratuito, com duração de
9 (nove) anos, é organizado e tratado em duas fases: a dos 5 (cinco)
anos iniciais e a dos 4 (quatro) anos finais;
III - o Ensino Médio, com duração mínima de 3 (três) anos.
Parágrafo único. Essas etapas e fases têm previsão de idades
próprias, as quais, no entanto, são diversas quando se atenta para
sujeitos com características que fogem à norma, como é o caso, entre
outros:
231
I - de atraso na matrícula e/ou no percurso escolar;
II - de retenção, repetência e retorno de quem havia abandonado
os estudos;
III - de portadores de deficiência limitadora;
IV - de jovens e adultos sem escolarização ou com esta
incompleta;
V - de habitantes de zonas rurais;
VI - de indígenas e quilombolas;
VII - de adolescentes em regime de acolhimento ou internação,
jovens e adultos em situação de privação de liberdade nos
estabelecimentos penais.
Seção I
Educação Infantil
Art. 22. A Educação Infantil tem por objetivo o desenvolvimento
integral da criança, em seus aspectos físico, afetivo, psicológico,
intelectual, social, complementando a ação da família e da
comunidade.
§ 1º As crianças provêm de diferentes e singulares contextos
socioculturais, socioeconômicos e étnicos, por isso devem ter a
oportunidade de ser acolhidas e respeitadas pela escola e pelos
profissionais da educação, com base nos princípios da
individualidade, igualdade, liberdade, diversidade e pluralidade.
232
§ 2º Para as crianças, independentemente das diferentes
condições físicas, sensoriais, intelectuais, linguísticas, étnico-raciais,
socioeconômicas, de origem, de religião, entre outras, as relações
sociais e intersubjetivas no espaço escolar requerem a atenção
intensiva dos profissionais da educação, durante o tempo de
desenvolvimento das atividades que lhes são peculiares, pois este é o
momento em que a curiosidade deve ser estimulada, a partir da
brincadeira orientada pelos profissionais da educação.
§ 3º Os vínculos de família, dos laços de solidariedade humana e
do respeito mútuo em que se assenta a vida social devem iniciar-se na
Educação Infantil e sua intensificação deve ocorrer ao longo da
Educação Básica.
§ 4º Os sistemas educativos devem envidar esforços promovendo
ações a partir das quais as unidades de Educação Infantil sejam
dotadas de condições para acolher as crianças, em estreita relação
com a família, com agentes sociais e com a sociedade, prevendo
programas e projetos em parceria, formalmente estabelecidos.
§ 5º A gestão da convivência e as situações em que se torna
necessária a solução de problemas individuais e coletivos pelas
crianças devem ser previamente programadas, com foco nas
motivações estimuladas e orientadas pelos professores e demais
profissionais da educação e outros de áreas pertinentes, respeitados
os limites e as potencialidades de cada criança e os vínculos desta
com a família ou com o seu responsável direto.
Seção II
233
Ensino Fundamental
Art. 23. O Ensino Fundamental com 9 (nove) anos de duração, de
matrícula obrigatória para as crianças a partir dos 6 (seis) anos de
idade, tem duas fases sequentes com características próprias,
chamadas de anos iniciais, com 5 (cinco) anos de duração, em regra
para estudantes de 6 (seis) a 10 (dez) anos de idade; e anos finais, com
4 (quatro) anos de duração, para os de 11 (onze) a 14 (quatorze) anos.
Parágrafo único. No Ensino Fundamental, acolher significa
também cuidar e educar, como forma de garantir a aprendizagem dos
conteúdos curriculares, para que o estudante desenvolva interesses e
sensibilidades que lhe permitam usufruir dos bens culturais
disponíveis na comunidade, na sua cidade ou na sociedade em geral, e
que lhe possibilitem ainda sentir-se como produtor valorizado desses
bens.
Art. 24. Os objetivos da formação básica das crianças, definidos
para a Educação Infantil, prolongam-se durante os anos iniciais do
Ensino Fundamental, especialmente no primeiro, e completam-se nos
anos finais, ampliando e intensificando, gradativamente, o processo
educativo, mediante:
I - desenvolvimento da capacidade de aprender, tendo como
meios básicos o pleno domínio da leitura, da escrita e do cálculo;
II - foco central na alfabetização, ao longo dos 3 (três) primeiros
anos;
234
III - compreensão do ambiente natural e social, do sistema
político, da economia, da tecnologia, das artes, da cultura e dos
valores em que se fundamenta a sociedade;
IV - o desenvolvimento da capacidade de aprendizagem, tendo em
vista a aquisição de conhecimentos e habilidades e a formação de
atitudes e valores;
V - fortalecimento dos vínculos de família, dos laços de
solidariedade humana e de respeito recíproco em que se assenta a
vida social.
Art. 25. Os sistemas estaduais e municipais devem estabelecer
especial forma de colaboração visando à oferta do Ensino
Fundamental e à articulação sequente entre a primeira fase, no geral
assumida pelo Município, e a segunda, pelo Estado, para evitar
obstáculos ao acesso de estudantes que se transfiram de uma rede
para outra para completar esta escolaridade obrigatória, garantindo a
organicidade e a totalidade do processo formativo do escolar.
Seção III
Ensino Médio
Art. 26. O Ensino Médio, etapa final do processo formativo da
Educação Básica, é orientado por princípios e finalidades que
preveem:
I - a consolidação e o aprofundamento dos conhecimentos
adquiridos no Ensino Fundamental, possibilitando o prosseguimento
de estudos;
235
II - a preparação básica para a cidadania e o trabalho, tomado este
como princípio educativo, para continuar aprendendo, de modo a ser
capaz de enfrentar novas condições de ocupação e aperfeiçoamento
posteriores;
III - o desenvolvimento do educando como pessoa humana,
incluindo a formação ética e estética, o desenvolvimento da
autonomia intelectual e do pensamento crítico;
IV - a compreensão dos fundamentos científicos e tecnológicos
presentes na sociedade contemporânea, relacionando a teoria com a
prática.
§ 1º O Ensino Médio deve ter uma base unitária sobre a qual
podem se assentar possibilidades diversas como preparação geral para
o trabalho ou, facultativamente, para profissões técnicas; na ciência e
na tecnologia, como iniciação científica e tecnológica; na cultura,
como ampliação da formação cultural.
§ 2º A definição e a gestão do currículo inscrevem-se em uma
lógica que se dirige aos jovens, considerando suas singularidades, que
se situam em um tempo determinado.
§ 3º Os sistemas educativos devem prever currículos flexíveis, com
diferentes alternativas, para que os jovens tenham a oportunidade de
escolher o percurso formativo que atenda seus interesses,
necessidades e aspirações, para que se assegure a permanência dos
jovens na escola, com proveito, até a conclusão da Educação Básica.
CAPÍTULO II
236
MODALIDADES DA EDUCAÇÃO BÁSICA
Art. 27. A cada etapa da Educação Básica pode corresponder uma
ou mais das modalidades de ensino: Educação de Jovens e Adultos,
Educação Especial, Educação Profissional e Tecnológica, Educação do
Campo, Educação Escolar Indígena e Educação a Distância.
Seção I
Educação de Jovens e Adultos
Art. 28. A Educação de Jovens e Adultos (EJA) destina-se aos que
se situam na faixa etária superior à considerada própria, no nível de
conclusão do Ensino Fundamental e do Ensino Médio.
§ 1º Cabe aos sistemas educativos viabilizar a oferta de cursos
gratuitos aos jovens e aos adultos, proporcionando-lhes
oportunidades educacionais apropriadas, consideradas as
características do alunado, seus interesses, condições de vida e de
trabalho, mediante cursos, exames, ações integradas e
complementares entre si, estruturados em um projeto pedagógico
próprio.
§ 2º Os cursos de EJA, preferencialmente tendo a Educação
Profissional articulada com a Educação Básica, devem pautar-se pela
flexibilidade, tanto de currículo quanto de tempo e espaço, para que
seja(m):
I - rompida a simetria com o ensino regular para crianças e
adolescentes, de modo a permitir percursos individualizados e
conteúdos significativos para os jovens e adultos;
237
II - providos o suporte e a atenção individuais às diferentes
necessidades dos estudantes no processo de aprendizagem, mediante
atividades diversificadas;
III - valorizada a realização de atividades e vivências
socializadoras, culturais, recreativas e esportivas, geradoras de
enriquecimento do percurso formativo dos estudantes;
IV - desenvolvida a agregação de competências para o trabalho;
V - promovida a motivação e a orientação permanente dos
estudantes, visando maior participação nas aulas e seu melhor
aproveitamento e desempenho;
VI - realizada, sistematicamente, a formação continuada,
destinada, especificamente, aos educadores de jovens e adultos.
Seção II
Educação Especial
Art. 29. A Educação Especial, como modalidade transversal a
todos os níveis, etapas e modalidades de ensino, é parte integrante da
educação regular, devendo ser prevista no projeto político-pedagógico
da unidade escolar.
§ 1º Os sistemas de ensino devem matricular os estudantes com
deficiência, transtornos globais do desenvolvimento e altas
habilidades/superdotação nas classes comuns do ensino regular e no
Atendimento Educacional Especializado (AEE), complementar ou
suplementar à escolarização, ofertado em salas de recursos
238
multifuncionais ou em centros de AEE da rede pública ou de
instituições comunitárias, confessionais ou filantrópicas sem fins
lucrativos.
§ 2º Os sistemas e as escolas devem criar condições para que o
professor da classe comum possa explorar as potencialidades de todos
os estudantes, adotando uma pedagogia dialógica, interativa,
interdisciplinar e inclusiva e, na interface, o professor do AEE deve
identificar habilidades e necessidades dos estudantes, organizar e
orientar sobre os serviços e recursos pedagógicos e de acessibilidade
para a participação e aprendizagem dos estudantes.
§ 3º Na organização desta modalidade, os sistemas de ensino
devem observar as seguintes orientações fundamentais:
I - o pleno acesso e a efetiva participação dos estudantes no
ensino regular; II - a oferta do atendimento educacional
especializado;
III - a formação de professores para o AEE e para o
desenvolvimento de práticas educacionais inclusivas;
IV - a participação da comunidade escolar;
V - a acessibilidade arquitetônica, nas comunicações e
informações, nos mobiliários e equipamentos e nos transportes;
VI - a articulação das políticas públicas intersetoriais.
Seção III
Educação Profissional e Tecnológica
239
Art. 30. A Educação Profissional e Tecnológica, no cumprimento
dos objetivos da educação nacional, integra-se aos diferentes níveis e
modalidades de educação e às dimensões do trabalho, da ciência e da
tecnologia, e articula-se com o ensino regular e com outras
modalidades educacionais: Educação de Jovens e Adultos, Educação
Especial e Educação a Distância.
Art. 31. Como modalidade da Educação Básica, a Educação
Profissional e Tecnológica ocorre na oferta de cursos de formação
inicial e continuada ou qualificação profissional e nos de Educação
Profissional Técnica de nível médio.
Art. 32. A Educação Profissional Técnica de nível médio é
desenvolvida nas seguintes formas:
I - articulada com o Ensino Médio, sob duas formas:
a) integrada, na mesma instituição; ou
b) concomitante, na mesma ou em distintas instituições;
II - subsequente, em cursos destinados a quem já tenha concluído
o Ensino Médio.
§ 1º Os cursos articulados com o Ensino Médio, organizados na
forma integrada, são cursos de matrícula única, que conduzem os
educandos à habilitação profissional técnica de nível médio ao
mesmo tempo em que concluem a última etapa da Educação Básica.
240
§ 2º Os cursos técnicos articulados com o Ensino Médio, ofertados
na forma concomitante, com dupla matrícula e dupla certificação,
podem ocorrer:
I - na mesma instituição de ensino, aproveitando-se as
oportunidades educacionais disponíveis;
II - em instituições de ensino distintas, aproveitando-se as
oportunidades educacionais disponíveis;
III - em instituições de ensino distintas, mediante convênios de
intercomplementaridade, com planejamento e desenvolvimento de
projeto pedagógico unificado.
§ 3º São admitidas, nos cursos de Educação Profissional Técnica
de nível médio, a organização e a estruturação em etapas que
possibilitem qualificação profissional intermediária.
§ 4º A Educação Profissional e Tecnológica pode ser desenvolvida
por diferentes estratégias de educação continuada, em instituições
especializadas ou no ambiente de trabalho, incluindo os programas e
cursos de aprendizagem, previstos na Consolidação das Leis do
Trabalho (CLT).
Art. 33. A organização curricular da Educação Profissional e
Tecnológica por eixo tecnológico fundamenta-se na identificação das
tecnologias que se encontram na base de uma dada formação
profissional e dos arranjos lógicos por elas constituídos.
Art. 34. Os conhecimentos e as habilidades adquiridos tanto nos
cursos de Educação Profissional e Tecnológica, como os adquiridos na
241
prática laboral pelos trabalhadores, podem ser objeto de avaliação,
reconhecimento e certificação para prosseguimento ou conclusão de
estudos.
Seção IV
Educação Básica do Campo
Art. 35. Na modalidade de Educação Básica do Campo, a educação
para a população rural está prevista com adequações necessárias às
peculiaridades da vida no campo e de cada região, definindo-se
orientações para três aspectos essenciais à organização da ação
pedagógica:
I - conteúdos curriculares e metodologias apropriadas às reais
necessidades e interesses dos estudantes da zona rural;
II - organização escolar própria, incluindo adequação do
calendário escolar às fases do ciclo agrícola e às condições climáticas;
III - adequação à natureza do trabalho na zona rural.
Art. 36. A identidade da escola do campo é definida pela
vinculação com as questões inerentes à sua realidade, com propostas
pedagógicas que contemplam sua diversidade em todos os aspectos,
tais como sociais, culturais, políticos, econômicos, de gênero, geração
e etnia.
Parágrafo único. Formas de organização e metodologias
pertinentes à realidade do campo devem ter acolhidas, como a
pedagogia da terra, pela qual se busca um trabalho pedagógico
242
fundamentado no princípio da sustentabilidade, para assegurar a
preservação da vida das futuras gerações, e a pedagogia da
alternância, na qual o estudante participa, concomitante e
alternadamente, de dois ambientes/situações de aprendizagem: o
escolar e o laboral, supondo parceria educativa, em que ambas as
partes são corresponsáveis pelo aprendizado e pela formação do
estudante.
Seção V
Educação Escolar Indígena
Art. 37. A Educação Escolar Indígena ocorre em unidades
educacionais inscritas em suas terras e culturas, as quais têm uma
realidade singular, requerendo pedagogia própria em respeito à
especificidade étnico-cultural de cada povo ou comunidade e
formação específica de seu quadro docente, observados os princípios
constitucionais, a base nacional comum e os princípios que orientam
a Educação Básica brasileira.
Parágrafo único. Na estruturação e no funcionamento das escolas
indígenas, é reconhecida a sua condição de possuidores de normas e
ordenamento jurídico próprios, com ensino intercultural e bilíngue,
visando à valorização plena das culturas dos povos indígenas e à
afirmação e manutenção de sua diversidade étnica.
Art. 38. Na organização de escola indígena, deve ser considerada a
participação da comunidade, na definição do modelo de organização
e gestão, bem como:
243
I - suas estruturas sociais;
II - suas práticas socioculturais e religiosas;
III - suas formas de produção de conhecimento, processos
próprios e métodos de ensino-aprendizagem;
IV - suas atividades econômicas;
V - edificação de escolas que atendam aos interesses das
comunidades indígenas;
VI - uso de materiais didático-pedagógicos produzidos de acordo
com o contexto sociocultural de cada povo indígena.
Seção VI
Educação a Distância
Art. 39. A modalidade Educação a Distância caracteriza-se pela
mediação didáticopedagógica nos processos de ensino e
aprendizagem que ocorre com a utilização de meios e tecnologias de
informação e comunicação, com estudantes e professores
desenvolvendo atividades educativas em lugares ou tempos diversos.
Art. 40. O credenciamento para a oferta de cursos e programas de
Educação de Jovens e Adultos, de Educação Especial e de Educação
Profissional Técnica de nível médio e Tecnológica, na modalidade a
distância, compete aos sistemas estaduais de ensino, atendidas a
regulamentação federal e as normas complementares desses sistemas.
Seção VII
244
Educação Escolar Quilombola
Art. 41. A Educação Escolar Quilombola é desenvolvida em
unidades educacionais inscritas em suas terras e cultura, requerendo
pedagogia própria em respeito à especificidade étnico-cultural de
cada comunidade e formação específica de seu quadro docente,
observados os princípios constitucionais, a base nacional comum e os
princípios que orientam a Educação Básica brasileira.
Parágrafo único. Na estruturação e no funcionamento das escolas
quilombolas, bem com nas demais, deve ser reconhecida e valorizada
a diversidade cultural.
TÍTULO VII
ELEMENTOS CONSTITUTIVOS PARA A ORGANIZAÇÃO DAS
DIRETRIZES CURRICULARES NACIONAIS GERAIS PARA A
EDUCAÇÃO BÁSICA
Art. 42. São elementos constitutivos para a operacionalização
destas Diretrizes o projeto político-pedagógico e o regimento escolar;
o sistema de avaliação; a gestão democrática e a organização da
escola; o professor e o programa de formação docente.
CAPÍTULO I
O PROJETO POLÍTICO-PEDAGÓGICO E O REGIMENTO
ESCOLAR
245
Art. 43. O projeto político-pedagógico, interdependentemente da
autonomia pedagógica, administrativa e de gestão financeira da
instituição educacional, representa mais
do que um documento, sendo um dos meios de viabilizar a escola
democrática para todos e de qualidade social.
§ 1º A autonomia da instituição educacional baseia-se na busca de
sua identidade, que se expressa na construção de seu projeto
pedagógico e do seu regimento escolar, enquanto manifestação de seu
ideal de educação e que permite uma nova e democrática ordenação
pedagógica das relações escolares.
§ 2º Cabe à escola, considerada a sua identidade e a de seus
sujeitos, articular a formulação do projeto político-pedagógico com os
planos de educação – nacional, estadual, municipal –, o contexto em
que a escola se situa e as necessidades locais e de seus estudantes.
§ 3º A missão da unidade escolar, o papel socioeducativo, artístico,
cultural, ambiental, as questões de gênero, etnia e diversidade
cultural que compõem as ações educativas, a organização e a gestão
curricular são componentes integrantes do projeto político-
pedagógico, devendo ser previstas as prioridades institucionais que a
identificam, definindo o conjunto das ações educativas próprias das
etapas da Educação Básica assumidas, de acordo com as
especificidades que lhes correspondam, preservando a sua articulação
sistêmica.
Art. 44. O projeto político-pedagógico, instância de construção
coletiva que respeita os sujeitos das aprendizagens, entendidos como
246
cidadãos com direitos à proteção e à participação social, deve
contemplar:
I - o diagnóstico da realidade concreta dos sujeitos do processo
educativo, contextualizados no espaço e no tempo;
II - a concepção sobre educação, conhecimento, avaliação da
aprendizagem e mobilidade escolar;
III - o perfil real dos sujeitos – crianças, jovens e adultos – que
justificam e instituem a vida da e na escola, do ponto de vista
intelectual, cultural, emocional, afetivo,
socioeconômico, como base da reflexão sobre as relações vida-
conhecimento-culturaprofessor- estudante e instituição escolar;
IV - as bases norteadoras da organização do trabalho pedagógico;
V - a definição de qualidade das aprendizagens e, por
consequência, da escola, no contexto das desigualdades que se
refletem na escola; VI - os fundamentos da gestão democrática,
compartilhada e participativa (órgãos colegiados e de representação
estudantil);
VII - o programa de acompanhamento de acesso, de permanência
dos estudantes e de superação da retenção escolar;
VIII - o programa de formação inicial e continuada dos
profissionais da educação, regentes e não regentes;
IX - as ações de acompanhamento sistemático dos resultados do
processo de avaliação interna e externa (Sistema de Avaliação da
247
Educação Básica – SAEB, Prova Brasil, dados estatísticos, pesquisas
sobre os sujeitos da Educação Básica), incluindo dados referentes ao
IDEB e/ou que complementem ou substituam os desenvolvidos
pelas unidades da federação e outros;
X - a concepção da organização do espaço físico da instituição
escolar de tal modo que este seja compatível com as características de
seus sujeitos, que atenda as normas de acessibilidade, além da
natureza e das finalidades da educação, deliberadas e assumidas pela
comunidade educacional.
Art. 45. O regimento escolar, discutido e aprovado pela
comunidade escolar e conhecido por todos, constitui-se em um dos
instrumentos de execução do projeto políticopedagógico, com
transparência e responsabilidade.
Parágrafo único. O regimento escolar trata da natureza e da
finalidade da instituição, da relação da gestão democrática com os
órgãos colegiados, das atribuições de seus órgãos e sujeitos, das suas
normas pedagógicas, incluindo os critérios de acesso, promoção,
mobilidade do estudante, dos direitos e deveres dos seus sujeitos:
estudantes, professores, técnicos e funcionários, gestores, famílias,
representação estudantil e função das suas instâncias colegiadas.
CAPÍTULO II
AVALIAÇÃO
Art. 46. A avaliação no ambiente educacional compreende 3 (três)
dimensões básicas:
248
I - avaliação da aprendizagem;
II - avaliação institucional interna e externa;
III - avaliação de redes de Educação Básica.
Seção I
Avaliação da aprendizagem
Art. 47. A avaliação da aprendizagem baseia-se na concepção de
educação que norteia a relação professor-estudante-conhecimento-
vida em movimento, devendo ser um ato reflexo de reconstrução da
prática pedagógica avaliativa, premissa básica e fundamental para se
questionar o educar, transformando a mudança em ato, acima de
tudo, político.
§ 1º A validade da avaliação, na sua função diagnóstica, liga-se à
aprendizagem, possibilitando o aprendiz a recriar, refazer o que
aprendeu, criar, propor e, nesse contexto, aponta para uma avaliação
global, que vai além do aspecto quantitativo, porque identifica o
desenvolvimento da autonomia do estudante, que é
indissociavelmente ético, social, intelectual.
§ 2º Em nível operacional, a avaliação da aprendizagem tem, como
referência, o conjunto de conhecimentos, habilidades, atitudes,
valores e emoções que os sujeitos do processo educativo projetam
para si de modo integrado e articulado com aqueles princípios
definidos para a Educação Básica, redimensionados para cada uma de
suas etapas, bem assim no projeto político-pedagógico da escola.
249
§ 3º A avaliação na Educação Infantil é realizada mediante
acompanhamento e registro do desenvolvimento da criança, sem o
objetivo de promoção, mesmo em se tratando de acesso ao Ensino
Fundamental.
§ 4º A avaliação da aprendizagem no Ensino Fundamental e no
Ensino Médio, de caráter formativo predominando sobre o
quantitativo e classificatório, adota uma estratégia de progresso
individual e contínuo que favorece o crescimento do educando,
preservando a qualidade necessária para a sua formação escolar,
sendo organizada de acordo com regras comuns a essas duas etapas.
Seção II
Promoção, aceleração de estudos e classificação
Art. 48. A promoção e a classificação no Ensino Fundamental e no
Ensino Médio podem ser utilizadas em qualquer ano, série, ciclo,
módulo ou outra unidade de percurso adotada, exceto na primeira do
Ensino Fundamental, alicerçando-se na orientação de que a avaliação
do rendimento escolar observará os seguintes critérios:
I - avaliação contínua e cumulativa do desempenho do estudante,
com prevalência dos aspectos qualitativos sobre os quantitativos e dos
resultados ao longo do período sobre os de eventuais provas finais;
II - possibilidade de aceleração de estudos para estudantes com
atraso escolar;
III - possibilidade de avanço nos cursos e nas séries mediante
verificação do aprendizado;
250
IV - aproveitamento de estudos concluídos com êxito;
V - oferta obrigatória de apoio pedagógico destinado à
recuperação contínua e concomitante de aprendizagem de estudantes
com déficit de rendimento escolar, a ser previsto no regimento
escolar.
Art. 49. A aceleração de estudos destina-se a estudantes com
atraso escolar, àqueles que, por algum motivo, encontram-se em
descompasso de idade, por razões como ingresso tardio, retenção,
dificuldades no processo de ensino-aprendizagem ou outras.
Art. 50. A progressão pode ser regular ou parcial, sendo que esta
deve preservar a sequência do currículo e observar as normas do
respectivo sistema de ensino, requerendo o redesenho da organização
das ações pedagógicas, com previsão de horário de trabalho e espaço
de atuação para professor e estudante, com conjunto próprio de
recursos didáticopedagógicos.
Art. 51. As escolas que utilizam organização por série podem
adotar, no Ensino Fundamental, sem prejuízo da avaliação do
processo ensino-aprendizagem, diversas formas de progressão,
inclusive a de progressão continuada, jamais entendida como
promoção automática, o que supõe tratar o conhecimento como
processo e vivência que não se harmoniza com a ideia de interrupção,
mas sim de construção, em que o estudante, enquanto sujeito da
ação, está em processo contínuo de formação, construindo
significados.
Seção III
251
Avaliação institucional
Art. 52. A avaliação institucional interna deve ser prevista no
projeto políticopedagógico e detalhada no plano de gestão, realizada
anualmente, levando em consideração as orientações contidas na
regulamentação vigente, para rever o conjunto de objetivos e metas a
serem concretizados, mediante ação dos diversos segmentos da
comunidade educativa, o que pressupõe delimitação de indicadores
compatíveis com a missão da escola, além de clareza quanto ao que
seja qualidade social da aprendizagem e da escola.
Seção IV
Avaliação de redes de Educação Básica
Art. 53. A avaliação de redes de Educação Básica ocorre
periodicamente, é realizada por órgãos externos à escola e engloba os
resultados da avaliação institucional, sendo que os resultados dessa
avaliação sinalizam para a sociedade se a escola apresenta qualidade
suficiente para continuar funcionando como está.
CAPÍTULO III
GESTÃO DEMOCRÁTICA E ORGANIZAÇÃO DA ESCOLA
Art. 54. É pressuposto da organização do trabalho pedagógico e da
gestão da escola conceber a organização e a gestão das pessoas, do
espaço, dos processos e procedimentos que viabilizam o trabalho
expresso no projeto político-pedagógico e em planos da escola, em
que se conformam as condições de trabalho definidas pelas instâncias
colegiadas.
252
§ 1º As instituições, respeitadas as normas legais e as do seu
sistema de ensino, têm incumbências complexas e abrangentes, que
exigem outra concepção de organização do trabalho pedagógico,
como distribuição da carga horária, remuneração, estratégias
claramente definidas para a ação didático-pedagógica coletiva que
inclua a pesquisa, a criação de novas abordagens e práticas
metodológicas, incluindo a produção de recursos didáticos adequados
às condições da escola e da comunidade em que esteja ela inserida.
§ 2º É obrigatória a gestão democrática no ensino público e
prevista, em geral, para todas as instituições de ensino, o que implica
decisões coletivas que pressupõem a participação da comunidade
escolar na gestão da escola e a observância dos princípios e
finalidades da educação.
§ 3º No exercício da gestão democrática, a escola deve se
empenhar para constituir-se em espaço das diferenças e da
pluralidade, inscrita na diversidade do processo tornado possível por
meio de relações intersubjetivas, cuja meta é a de se fundamentar em
princípio educativo emancipador, expresso na liberdade de aprender,
ensinar, pesquisar e divulgar a cultura, o pensamento, a arte e o saber.
Art. 55. A gestão democrática constitui-se em instrumento de
horizontalização das relações, de vivência e convivência colegiada,
superando o autoritarismo no planejamento e na concepção e
organização curricular, educando para a conquista da cidadania plena
e fortalecendo a ação conjunta que busca criar e recriar o trabalho da
e na escola mediante:
253
I - a compreensão da globalidade da pessoa, enquanto ser que
aprende, que sonha e ousa, em busca de uma convivência social
libertadora fundamentada na ética cidadã;
II - a superação dos processos e procedimentos burocráticos,
assumindo com pertinência e relevância: os planos pedagógicos, os
objetivos institucionais e educacionais, e as atividades de avaliação
contínua;
III - a prática em que os sujeitos constitutivos da comunidade
educacional discutam a própria práxis pedagógica impregnando-a de
entusiasmo e de compromisso com a sua própria comunidade,
valorizando-a, situando-a no contexto das relações sociais e buscando
soluções conjuntas;
IV - a construção de relações interpessoais solidárias, geridas de
tal modo que os professores se sintam estimulados a conhecer melhor
os seus pares (colegas de trabalho, estudantes, famílias), a expor as
suas ideias, a traduzir as suas dificuldades e expectativas pessoais e
profissionais;
V - a instauração de relações entre os estudantes,
proporcionando-lhes espaços de convivência e situações de
aprendizagem, por meio dos quais aprendam a se compreender e se
organizar em equipes de estudos e de práticas esportivas, artísticas e
políticas;
VI - a presença articuladora e mobilizadora do gestor no cotidiano
da escola e nos espaços com os quais a escola interage, em busca da
254
qualidade social das aprendizagens que lhe caiba desenvolver, com
transparência e responsabilidade.
CAPÍTULO IV
O PROFESSOR E A FORMAÇÃO INICIAL E CONTINUADA
Art. 56. A tarefa de cuidar e educar, que a fundamentação da ação
docente e os programas de formação inicial e continuada dos
profissionais da educação instauram, reflete-se na eleição de um ou
outro método de aprendizagem, a partir do qual é determinado o
perfil de docente para a Educação Básica, em atendimento às
dimensões técnicas, políticas, éticas e estéticas.
§ 1º Para a formação inicial e continuada, as escolas de formação
dos profissionais da educação, sejam gestores, professores ou
especialistas, deverão incluir em seus currículos e programas:
a) o conhecimento da escola como organização complexa que tem
a função de promover a educação para e na cidadania;
b) a pesquisa, a análise e a aplicação dos resultados de
investigações de interesse da área educacional;
c) a participação na gestão de processos educativos e na
organização e funcionamento de sistemas e instituições de ensino;
d) a temática da gestão democrática, dando ênfase à construção
do projeto políticopedagógico, mediante trabalho coletivo de que
todos os que compõem a comunidade escolar são responsáveis.
255
Art. 57. Entre os princípios definidos para a educação nacional
está a valorização do profissional da educação, com a compreensão de
que valorizá-lo é valorizar a escola, com qualidade gestorial,
educativa, social, cultural, ética, estética, ambiental.
§ 1º A valorização do profissional da educação escolar vincula-se à
obrigatoriedade da garantia de qualidade e ambas se associam à
exigência de programas de formação inicial e continuada de docentes
e não docentes, no contexto do conjunto de múltiplas atribuições
definidas para os sistemas educativos, em que se inscrevem as funções
do professor.
§ 2º Os programas de formação inicial e continuada dos
profissionais da educação, vinculados às orientações destas Diretrizes,
devem prepará-los para o desempenho de suas atribuições,
considerando necessário:
a) além de um conjunto de habilidades cognitivas, saber
pesquisar, orientar, avaliar e elaborar propostas, isto é, interpretar e
reconstruir o conhecimento coletivamente;
b) trabalhar cooperativamente em equipe;
c) compreender, interpretar e aplicar a linguagem e os
instrumentos produzidos ao longo da evolução tecnológica,
econômica e organizativa;
d) desenvolver competências para integração com a comunidade e
para relacionamento com as famílias.
256
Art. 58. A formação inicial, nos cursos de licenciatura, não esgota
o desenvolvimento dos conhecimentos, saberes e habilidades
referidas, razão pela qual um programa de formação continuada dos
profissionais da educação será contemplado no projeto político-
pedagógico.
Art. 59. Os sistemas educativos devem instituir orientações para
que o projeto de formação dos profissionais preveja:
a) a consolidação da identidade dos profissionais da educação, nas
suas relações com a escola e com o estudante;
b) a criação de incentivos para o resgate da imagem social do
professor, assim como da autonomia docente tanto individual como
coletiva;
c) a definição de indicadores de qualidade social da educação
escolar, a fim de que as agências formadoras de profissionais da
educação revejam os projetos dos cursos de formação inicial e
continuada de docentes, de modo que correspondam às exigências de
um projeto de Nação.
Art. 60. Esta Resolução entrará em vigor na data de sua
publicação.
FRANCISCO APARECIDO CORDÃO
257
MINISTÉRIO DA EDUCAÇÃO
CONSELHO NACIONAL DE EDUCAÇÃO
CÂMARA DE EDUCAÇÃO BÁSICA
RESOLUÇÃO Nº 4, DE 2 DE OUTUBRO DE 2009 (*)
Institui Diretrizes Operacionais para o
Atendimento Educacional Especializado na
Educação Básica, modalidade Educação
Especial.
O Presidente da Câmara de Educação Básica do Conselho
Nacional de Educação, no uso de suas atribuições legais, de
conformidade com o disposto na alínea “c” do artigo 9º da Lei nº
4.024/1961, com a redação dada pela Lei nº 9.131/1995, bem como no
artigo 90, no § 1º do artigo 8º e no § 1º do artigo 9º da Lei nº
9.394/1996, considerando a Constituição Federal de 1988; a Lei nº
10.098/2000; a Lei nº 10.436/2002; a Lei nº 11.494/2007; o Decreto nº
3.956/2001; o Decreto nº 5.296/2004; o Decreto nº 5.626/2005; o
Decreto nº 6.253/2007; o Decreto nº 6.571/2008; e o Decreto
Legislativo nº 186/2008, e com fundamento no ParecerCNE/CEB nº
13/2009, homologado por Despacho do Senhor Ministro de Estado da
Educação, publicado no DOU de 24 de setembro de 2009, resolve:
Art. 1º Para a implementação do Decreto nº 6.571/2008, os
sistemas de ensino devem matricular os alunos com deficiência,
258
transtornos globais do desenvolvimento e altas
habilidades/superdotação nas classes comuns do ensino regular e no
Atendimento Educacional Especializado (AEE), ofertado em salas de
recursos multifuncionais ou em centros de Atendimento Educacional
Especializado da rede pública ou de instituições comunitárias,
confessionais ou filantrópicas sem fins lucrativos.
Art. 2º O AEE tem como função complementar ou suplementar a
formação do aluno por meio da disponibilização de serviços, recursos
de acessibilidade e estratégias que eliminem as barreiras para sua
plena participação na sociedade e desenvolvimento de sua
aprendizagem.
Parágrafo único. Para fins destas Diretrizes, consideram-se
recursos de acessibilidade na educação aqueles que asseguram
condições de acesso ao currículo dos alunos com deficiência ou
mobilidade reduzida, promovendo a utilização dos materiais
didáticos e pedagógicos, dos espaços, dos mobiliários e
equipamentos, dos sistemas de comunicação e informação, dos
transportes e dos demais serviços.
Art. 3º A Educação Especial se realiza em todos os níveis, etapas e
modalidades de ensino, tendo o AEE como parte integrante do
processo educacional.
Art. 4º Para fins destas Diretrizes, considera-se público-alvo do
AEE:
I – Alunos com deficiência: aqueles que têm impedimentos de
longo prazo de natureza física, intelectual, mental ou sensorial.
259
II – Alunos com transtornos globais do desenvolvimento: aqueles
que apresentam um quadro de alterações no desenvolvimento
neuropsicomotor, comprometimento nas relações sociais, na
comunicação ou estereotipias motoras. Incluem-se nessa definição
alunos com autismo clássico, síndrome de Asperger, síndrome de
Rett, transtorno desintegrativo da infância (psicoses) e transtornos
invasivos sem outra especificação.
III – Alunos com altas habilidades/superdotação: aqueles que
apresentam um potencial elevado e grande envolvimento com as
áreas do conhecimento humano, isoladas ou combinadas: intelectual,
liderança, psicomotora, artes e criatividade.
(*) Resolução CNE/CEB 4/2009. Diário Oficial da União, Brasília,
5 de outubro de 2009, Seção 1, p. 17.
Art. 5º O AEE é realizado, prioritariamente, na sala de recursos
multifuncionais da própria escola ou em outra escola de ensino
regular, no turno inverso da escolarização, não sendo substitutivo às
classes comuns, podendo ser realizado, também, em centro de
Atendimento Educacional Especializado da rede pública ou de
instituições comunitárias, confessionais ou filantrópicas sem fins
lucrativos, conveniadas com a Secretaria de Educação ou órgão
equivalente dos Estados, Distrito Federal ou dos Municípios.
Art. 6º Em casos de Atendimento Educacional Especializado em
ambiente hospitalar ou domiciliar, será ofertada aos alunos, pelo
respectivo sistema de ensino, a Educação Especial de forma
complementar ou suplementar.
260
Art. 7º Os alunos com altas habilidades/superdotação terão suas
atividades de enriquecimento curricular desenvolvidas no âmbito de
escolas públicas de ensino regular em interface com os núcleos de
atividades para altas habilidades/superdotação e com as instituições
de ensino superior e institutos voltados ao desenvolvimento e
promoção da pesquisa, das artes e dos esportes.
Art. 8º Serão contabilizados duplamente, no âmbito do FUNDEB,
de acordo com o Decreto nº 6.571/2008, os alunos matriculados em
classe comum de ensino regular público que tiverem matrícula
concomitante no AEE.
Parágrafo único. O financiamento da matrícula no AEE é
condicionado à matrícula no ensino regular da rede pública,
conforme registro no Censo Escolar/MEC/INEP do ano anterior,
sendo contemplada:
a) matrícula em classe comum e em sala de recursos
multifuncionais da mesma escola pública;
b) matrícula em classe comum e em sala de recursos
multifuncionais de outra escola pública;
c) matrícula em classe comum e em centro de Atendimento
Educacional Especializado de instituição de Educação Especial
pública;
d) matrícula em classe comum e em centro de Atendimento
Educacional Especializado de instituições de Educação Especial
comunitárias, confessionais ou filantrópicas sem fins lucrativos.
261
Art. 9º A elaboração e a execução do plano de AEE são de
competência dos professores que atuam na sala de recursos
multifuncionais ou centros de AEE, em articulação com os demais
professores do ensino regular, com a participação das famílias e em
interface com os demais serviços setoriais da saúde, da assistência
social, entre outros necessários ao atendimento.
Art. 10. O projeto pedagógico da escola de ensino regular deve
institucionalizar a oferta do AEE prevendo na sua organização:
I – sala de recursos multifuncionais: espaço físico, mobiliário,
materiais didáticos, recursos pedagógicos e de acessibilidade e
equipamentos específicos;
II – matrícula no AEE de alunos matriculados no ensino regular da
própria escola ou de outra escola;
III – cronograma de atendimento aos alunos; IV – plano do AEE:
identificação das necessidades educacionais específicas dos alunos,
definição dos recursos necessários e das atividades a serem
desenvolvidas;
V – professores para o exercício da docência do AEE;
VI – outros profissionais da educação: tradutor e intérprete de
Língua Brasileira de Sinais, guia-intérprete e outros que atuem no
apoio, principalmente às atividades de alimentação, higiene e
locomoção;
262
VII – redes de apoio no âmbito da atuação profissional, da
formação, do desenvolvimento da pesquisa, do acesso a recursos,
serviços e equipamentos, entre outros que maximizem o AEE.
Parágrafo único. Os profissionais referidos no inciso VI atuam
com os alunos público alvo da Educação Especial em todas as
atividades escolares nas quais se fizerem necessários.
Art. 11. A proposta de AEE, prevista no projeto pedagógico do
centro de Atendimento Educacional Especializado público ou privado
sem fins lucrativos, conveniado para essa finalidade, deve ser
aprovada pela respectiva Secretaria de Educação ou órgão
equivalente, contemplando a organização disposta no artigo 10 desta
Resolução.
Parágrafo único. Os centros de Atendimento Educacional
Especializado devem cumprir as exigências legais estabelecidas pelo
Conselho de Educação do respectivo sistema de ensino, quanto ao seu
credenciamento, autorização de funcionamento e organização, em
consonância com as orientações preconizadas nestas Diretrizes
Operacionais.
Art. 12. Para atuação no AEE, o professor deve ter formação inicial
que o habilite para o exercício da docência e formação específica para
a Educação Especial.
Art. 13. São atribuições do professor do Atendimento Educacional
Especializado:
263
I – identificar, elaborar, produzir e organizar serviços, recursos
pedagógicos, de acessibilidade e estratégias considerando as
necessidades específicas dos alunos público-alvo da Educação
Especial;
II – elaborar e executar plano de Atendimento Educacional
Especializado, avaliando a funcionalidade e a aplicabilidade dos
recursos pedagógicos e de acessibilidade;
III – organizar o tipo e o número de atendimentos aos alunos na
sala de recursos multifuncionais;
IV – acompanhar a funcionalidade e a aplicabilidade dos recursos
pedagógicos e de acessibilidade na sala de aula comum do ensino
regular, bem como em outros ambientes da escola;
V – estabelecer parcerias com as áreas intersetoriais na elaboração
de estratégias e na disponibilização de recursos de acessibilidade;
VI – orientar professores e famílias sobre os recursos pedagógicos
e de acessibilidade utilizados pelo aluno;
VII – ensinar e usar a tecnologia assistiva de forma a ampliar
habilidades funcionais dos alunos, promovendo autonomia e
participação;
VIII – estabelecer articulação com os professores da sala de aula
comum, visando à disponibilização dos serviços, dos recursos
pedagógicos e de acessibilidade e das estratégias que promovem a
participação dos alunos nas atividades escolares.
264
Art. 14. Esta Resolução entrará em vigor na data de sua
publicação, revogadas as disposições em contrário.
CESAR CALLEGARI