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APOSTILAS OPÇÃO A Sua Melhor Opção em Concursos Públicos Criminologia A Opção Certa Para a Sua Realização 1 4.1. Criminologia: conceito, método, objeto e finalidades. 4.2. Fatores condicionantes e desencadeantes da crimi- nalidade. 4.3. Vitimologia. 4.4. Prevenção do delito. Criminologia A criminologia é um conjunto de conhecimentos que se ocupa do crime, da criminalidade e suas causas, da vítima, do controle social do ato criminoso, bem como da personalidade do criminoso e da maneira de ressocializá-lo. Etmologicamente o termo deriva do latim crimino (crime) e do grego logos (tratado ou estudo), seria portanto o "estudo do crime". É uma ciência empírica e interdisciplinar. É empírica, pois baseia-se na experiência da observação, nos fatos e na prática, mais que em opiniões e argumentos. É interdisciplinar e portanto formada pelo diálogo de uma série de ciências e disciplinas, tais como a biologia, a psicopatologia, a sociologia, política, a antropologia, o direito, a criminalística, a filosofia e outros. Escolas Quando surgiu, a criminologia tratava de explicar a origem da delinquência (crime), utilizando o método das ciências naturais, a etiologia, ou seja, buscava a causa do delito. Pensou-se que erradicando a causa se eliminaria o efeito, como se fosse suficiente fechar as maternidades para o controle de natalidade. A criminologia é dividida em escola clássica (Beccaria, século XVIII), escola positiva (Lombroso, século XIX) e escola sociológica (final do século XIX). Academicamente a Criminologia começa com a publicação da obra de Cesare Lombroso chamada "L'Uomo Delinquente", em 1876. Sua tese principal era a do delinquente nato. Já existiram várias tendências causais na criminologia. Baseado em Rousseau, a criminologia deveria procurar a causa do delito na sociedade; baseado em Lombroso, para erradicar o delito deveríamos encontrar a eventual causa no próprio delinquente e não no meio. Enquanto um extremo que procura todas as causas de toda criminalidade na sociedade, o outro, organicista, investigava o arquétipo do criminoso nato (um delinquente com determinados traços morfológicos, influência do Darwinismo). (Veja Rousseau, Personalidade Criminosa) Isoladamente, tanto as tendências sociológicas, quanto as orgânicas fracassaram. Hoje em dia fala-se no elemento bio-psico-social. Volta a tomar força os estudos de endocrinologia, que associam a agressividade do delinquente à testosterona (hormônio masculino), os estudos de genética ao tentar identificar no genoma humano um possível conjunto de "genes da criminalidade" (fator biológico ou endógeno), e ainda há os que atribuem a criminalidade meramente ao ambiente (fator mesológico), como fruto de transtornos como a violência familiar, a falta de oportunidades, etc. Lombroso é considerado o marco da Escola Positivista, em termos filosóficos encontramos Augusto Comte. Esta escola italiana critica os da Escola Clássica, como Beccaria e Bentham, no que diz respeito à utilização de uma metodologia lógico-dedutiva, metafísica, onde não existia a observação empírica dos fatos. As caraterísicas principais desta escola mostram-se em três pontos: Empirismo (cientificidade, observação e experimentação dos fatos. Negação aos pensamentos dedutivos e abstractos); O Criminoso como objeto de estudo (importância do estudo do criminoso como autor do crime. A delinquência é vista como um mero sintoma dos instintos criminogéneos do sujeito. Deve-se procurar trabalhar com estes instintos por forma a evitar o crime); Determinismo. Ele aborda o delinquente através de um caráter plurifatorial, para ele o indivíduo é compelido a delinquir por causas externas, as quais não consegue controlar, assim, as penas teriam o objetivo de proteção da sociedade e de [reeducação] do delinquente. Como em outras ciências, também em criminologia se tem tentado eliminar o conceito de "causa", substituindo-o pela ideia de "fator". Isso implica o reconhecimento de não apenas uma causa mas, sobretudo, de fatores que possam desencadear o efeito criminoso (fatores biológicos, psíquicos, sociais...). Uma das funções principais da criminologia é estabelecer uma relação estreita entre três disciplinas consideradas fundamentais: a psicopatologia, o direito penal e a ciência político-criminal. Outra atribuição da criminologia é, por exemplo, elaborar uma série de teorias e hipóteses sobre as razões para o aumento de um determinado delito. Os criminólogos se encarregam de dar esse tipo de informação a quem elabora a política criminal, os quais, por sua vez, idealizarão soluções, proporão leis, etc. Esta última etapa se faz através do direito penal. Posteriormente, outra vez mais o criminólogo avaliará o impacto produzido por essa nova lei na criminalidade. Interessam ao criminólogo as causas e os motivos para o fato delituoso. Normalmente ele procura fazer um diagnóstico do crime e uma tipologia do criminoso, assim como uma classificação do delito cometido. Essas causas e motivos abrangem desde avaliação do entorno prévio ao crime, os antecedentes vivenciais e emocionais do delinquente, até a motivação que leva o agressor a praticar pragmática o crime. Cientificidade da Criminologia A criminologia é ciência moderna, sendo um modo específico e qualificado de conhecimento e uma sistematização do saber de várias disciplinas. A partir da experimentação desse saber multidisciplinar surgem teorias (um corpo de conceitos sistematizados que permitem conhecer um dado domínio da realidade). Enquanto ciência, a criminologia possui objeto próprio e um rigor metodológico (método) que inclui a necessidade de experimentação, a possibilidade de refutação de suas teorias e a consciência da transitoriedade de seus postulados. Ainda que interdisciplinar é também ciência autônoma, não se confundindo com nenhuma das áreas que contribuem para a sua formação e sem deixar considerar o jogo dialético da realidade social como um todo. Objeto da criminologia é o crime, o criminoso (que é o sujeito que se envolve numa situação criminógena de onde deriva o crime), os mecanismos de controle social (formais e informais) que atuam sobre o crime; e, a vítima (que às vezes pode ter inclusive certa culpa no evento). A relevância da criminologia reside no fato de que não existe sociedade sem crime. Ela contribui para o crescimento do conhecimento científico com uma abordagem adequada do fenômeno criminal. O fato de ser ciência não significa que ela esteja alheia a sua função na sociedade. Muito pelo contrário, ela filia-se ao princípio de justiça social. Os estudos em criminologia têm como finalidade, entre outros aspectos, determinar a etiologia do crime, fazer uma análise da personalidade e conduta do criminoso para que se possa puni-lo de forma justa (que é uma preocupação da criminologia e não do Direito Penal), identificar as causas determinantes do fenômeno criminógeno, auxiliar na prevenção da criminalidade; e permitir a ressocialização do delinquente. Os estudos em criminologia se dividem em dois ramos que não são independentes, mas sim interdependentes. Temos de um lado a Criminologia Clínica (bioantropológica) - esta utiliza-se do método individual, (particular, análise de casos, biológico, experimental), que envolve a indução. De outro lado vemos a Criminologia Geral (sociológica), esta utiliza-se do método estatístico (de grupo, estatístico, sociológico, histórico) que enfatiza o procedimento de dedução. Criminologia e ciências afins A interdisciplinaridade é uma perspectiva de abordagem científica envolvendo diversos continentes do saber. Ela é uma visão importante para qualquer ciência social. Em seus estudos, a criminologia se engaja em diálogo tanto com disciplinas das Ciências Sociais ou humanas quanto das Ciências Físicas ou naturais.

Apostila Criminologia

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Apostila Logica concurso Policia civil atendente necroterio

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Page 1: Apostila Criminologia

APOSTILAS OPÇÃO A Sua Melhor Opção em Concursos Públicos

Criminologia A Opção Certa Para a Sua Realização 1

4.1. Criminologia: conceito, método, objeto e finalidades. 4.2. Fatores condicionantes e desencadeantes da crimi-

nalidade. 4.3. Vitimologia. 4.4. Prevenção do delito.

Criminologia

A criminologia é um conjunto de conhecimentos que se ocupa do crime, da criminalidade e suas causas, da vítima, do controle social do ato criminoso, bem como da personalidade do criminoso e da maneira de ressocializá-lo. Etmologicamente o termo deriva do latim crimino (crime) e do grego logos (tratado ou estudo), seria portanto o "estudo do crime". É uma ciência empírica e interdisciplinar. É empírica, pois baseia-se na experiência da observação, nos fatos e na prática, mais que em opiniões e argumentos. É interdisciplinar e portanto formada pelo diálogo de uma série de ciências e disciplinas, tais como a biologia, a psicopatologia, a sociologia, política, a antropologia, o direito, a criminalística, a filosofia e outros.

Escolas

Quando surgiu, a criminologia tratava de explicar a origem da delinquência (crime), utilizando o método das ciências naturais, a etiologia, ou seja, buscava a causa do delito. Pensou-se que erradicando a causa se eliminaria o efeito, como se fosse suficiente fechar as maternidades para o controle de natalidade.

A criminologia é dividida em escola clássica (Beccaria, século XVIII), escola positiva (Lombroso, século XIX) e escola sociológica (final do século XIX).

Academicamente a Criminologia começa com a publicação da obra de Cesare Lombroso chamada "L'Uomo Delinquente", em 1876. Sua tese principal era a do delinquente nato.

Já existiram várias tendências causais na criminologia. Baseado em Rousseau, a criminologia deveria procurar a causa do delito na sociedade; baseado em Lombroso, para erradicar o delito deveríamos encontrar a eventual causa no próprio delinquente e não no meio. Enquanto um extremo que procura todas as causas de toda criminalidade na sociedade, o outro, organicista, investigava o arquétipo do criminoso nato (um delinquente com determinados traços morfológicos, influência do Darwinismo). (Veja Rousseau, Personalidade Criminosa)

Isoladamente, tanto as tendências sociológicas, quanto as orgânicas fracassaram. Hoje em dia fala-se no elemento bio-psico-social. Volta a tomar força os estudos de endocrinologia, que associam a agressividade do delinquente à testosterona (hormônio masculino), os estudos de genética ao tentar identificar no genoma humano um possível conjunto de "genes da criminalidade" (fator biológico ou endógeno), e ainda há os que atribuem a criminalidade meramente ao ambiente (fator mesológico), como fruto de transtornos como a violência familiar, a falta de oportunidades, etc.

Lombroso é considerado o marco da Escola Positivista, em termos filosóficos encontramos Augusto Comte. Esta escola italiana critica os da Escola Clássica, como Beccaria e Bentham, no que diz respeito à utilização de uma metodologia lógico-dedutiva, metafísica, onde não existia a observação empírica dos fatos. As caraterísicas principais desta escola mostram-se em três pontos: Empirismo (cientificidade, observação e experimentação dos fatos. Negação aos pensamentos dedutivos e abstractos); O Criminoso como objeto de estudo (importância do estudo do criminoso como autor do crime. A delinquência é vista como um mero sintoma dos instintos criminogéneos do sujeito. Deve-se procurar trabalhar com estes instintos por forma a evitar o crime); Determinismo.

Ele aborda o delinquente através de um caráter plurifatorial, para ele o indivíduo é compelido a delinquir por causas externas, as quais não

consegue controlar, assim, as penas teriam o objetivo de proteção da sociedade e de [reeducação] do delinquente.

Como em outras ciências, também em criminologia se tem tentado eliminar o conceito de "causa", substituindo-o pela ideia de "fator". Isso implica o reconhecimento de não apenas uma causa mas, sobretudo, de fatores que possam desencadear o efeito criminoso (fatores biológicos, psíquicos, sociais...). Uma das funções principais da criminologia é estabelecer uma relação estreita entre três disciplinas consideradas fundamentais: a psicopatologia, o direito penal e a ciência político-criminal.

Outra atribuição da criminologia é, por exemplo, elaborar uma série de teorias e hipóteses sobre as razões para o aumento de um determinado delito. Os criminólogos se encarregam de dar esse tipo de informação a quem elabora a política criminal, os quais, por sua vez, idealizarão soluções, proporão leis, etc. Esta última etapa se faz através do direito penal. Posteriormente, outra vez mais o criminólogo avaliará o impacto produzido por essa nova lei na criminalidade.

Interessam ao criminólogo as causas e os motivos para o fato delituoso. Normalmente ele procura fazer um diagnóstico do crime e uma tipologia do criminoso, assim como uma classificação do delito cometido. Essas causas e motivos abrangem desde avaliação do entorno prévio ao crime, os antecedentes vivenciais e emocionais do delinquente, até a motivação que leva o agressor a praticar pragmática o crime.

Cientificidade da Criminologia

A criminologia é ciência moderna, sendo um modo específico e qualificado de conhecimento e uma sistematização do saber de várias disciplinas. A partir da experimentação desse saber multidisciplinar surgem teorias (um corpo de conceitos sistematizados que permitem conhecer um dado domínio da realidade).

Enquanto ciência, a criminologia possui objeto próprio e um rigor metodológico (método) que inclui a necessidade de experimentação, a possibilidade de refutação de suas teorias e a consciência da transitoriedade de seus postulados. Ainda que interdisciplinar é também ciência autônoma, não se confundindo com nenhuma das áreas que contribuem para a sua formação e sem deixar considerar o jogo dialético da realidade social como um todo.

Objeto da criminologia é o crime, o criminoso (que é o sujeito que se envolve numa situação criminógena de onde deriva o crime), os mecanismos de controle social (formais e informais) que atuam sobre o crime; e, a vítima (que às vezes pode ter inclusive certa culpa no evento).

A relevância da criminologia reside no fato de que não existe sociedade sem crime. Ela contribui para o crescimento do conhecimento científico com uma abordagem adequada do fenômeno criminal. O fato de ser ciência não significa que ela esteja alheia a sua função na sociedade. Muito pelo contrário, ela filia-se ao princípio de justiça social.

Os estudos em criminologia têm como finalidade, entre outros aspectos, determinar a etiologia do crime, fazer uma análise da personalidade e conduta do criminoso para que se possa puni-lo de forma justa (que é uma preocupação da criminologia e não do Direito Penal), identificar as causas determinantes do fenômeno criminógeno, auxiliar na prevenção da criminalidade; e permitir a ressocialização do delinquente.

Os estudos em criminologia se dividem em dois ramos que não são independentes, mas sim interdependentes. Temos de um lado a Criminologia Clínica (bioantropológica) - esta utiliza-se do método individual, (particular, análise de casos, biológico, experimental), que envolve a indução. De outro lado vemos a Criminologia Geral (sociológica), esta utiliza-se do método estatístico (de grupo, estatístico, sociológico, histórico) que enfatiza o procedimento de dedução.

Criminologia e ciências afins

A interdisciplinaridade é uma perspectiva de abordagem científica envolvendo diversos continentes do saber. Ela é uma visão importante para qualquer ciência social. Em seus estudos, a criminologia se engaja em diálogo tanto com disciplinas das Ciências Sociais ou humanas quanto das Ciências Físicas ou naturais.

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Criminologia A Opção Certa Para a Sua Realização 2

Entre as áreas de estudo mais próximas da Criminologia temos:

Direito penal: o principal ponto de contato da criminologia com o Direito Penal está no fato de que este delimita o campo de estudo da criminologia, na medida em que tipifica (define juridicamente) a conduta delituosa; O direito penal é sancional por excelência; Ele caracteriza os delitos e, através de normas rígidas, prescreve penas que objetivam levar os indivíduos a evitar essas condutas.

Direito Processual Penal: a Criminologia fornece os elementos necessários para que se estipule o adequado tratamento do réu no âmbito jurisdicional. Também indica qual a personalidade e o contexto social do acusado e do crime, auxiliando os juristas para que a sentença seja mais justa. A criminologia oferece os critérios valorativos da conduta criminosa. Ela pesquisa a eficácia das normas do Direito Penal, bem como estuda e desenvolve métodos de prevenção e ressocialização do criminoso.

Direito Penitenciário: os dados criminológicos são importantes no Direito Penitenciário para permitir o correto e eficaz tratamento e ressocialização do apenado. A criminologia ajuda a tornar a pena mais humana, buscando o objetivo de punir sem castigar.

Psicologia Criminal: é ciência que demonstra a dimensão individual do ato criminoso; estuda a personalidade do criminoso, orientando a Criminologia.

Psiquiatria Criminal: é ramo do saber que identifica as diversas patologias que afetam o criminoso e envolve o estudo da sanidade mental.

Antropologia Criminal: abrange o fenômeno criminológico em sua dimensão holística, ou seja, biopsicosocial. É o Estudo do homem na sua história, em sua totalidade (homem como fator presente no todo);

Sociologia Criminal: demonstra que a personalidade criminosa é resultante de influências psicológicas e do meio social;

Ciências Biológicas: fornecem os elementos naturais e orgânicos que influenciam ou determinam a conduta do criminoso;

Vitimologia: estuda a vítima e sua relação com o crime e o criminoso (estuda a proteção e tratamento da vítima, bem como sua possível influência para a ocorrência do crime);

Criminalística: é o ramo do conhecimento que cuida da dinâmica de um crime. Estuda os fatores técnicos de como o crime aconteceu. Há um setor especializado da polícia destinado a essa área.

Ciências Econômicas: estuda o crime a partir do intrumental analítico racionalista. O crime é visto como um mercado e sua oferta é determinada por fatores como o ganho esperado da atividade criminosa, probabilidade de sucesso e intensidade da punição em caso de falha.

1. AS DIFERENTES ABORDAGENS DO CRIME

Direito Penal – Abordagem legal e normativa: crime é toda con-duta prevista na lei penal e somente aquela a que a lei penal impõe sanção.

Sociologia - Abordagem social: delito é a conduta desviada, sendo os critérios de referencia para aferir o desvio as expectativas sociais. Desviado será um comportamento concreto, na medida em que se afaste das expectativas sociais em um dado momento, enquanto contrarie os padrões e modelos da maioria.

Segurança Pública - Abordagem fática: o crime é a perturbação da ordem pública e da paz social, demandando a aplicação de coerção em algum grau.

Criminologia – Abordagem global: o crime é um problema so-cial e comunitário. Não é mera responsabilidade do sistema de justiça: ele surge na comunidade e é um problema da comunidade.

2. CONCEITO DE CRIMINOLOGIA

Ciência que estuda o fenômeno e as causas da criminalidade, a personalidade do delinquente e sua conduta delituosa, e a maneira de ressocializá-lo." (Sutherland).

Ciência empírica e interdisciplinar que se ocupa do estudo do crime, da pessoa do infrator, da vítima, do controle social e do comporta-mento delitivo, buscando informações sobre a gênese, a dinâmica e as variáveis do crime, a fim de embasar programas de prevenção criminal e técnicas de intervenção positiva no homem delinquente (Gomes).

3. OBJETOS DA CRIMINOLOGIA:

O crime, o criminoso, a vítima e o controle social. 3.1. O Crime:

Incidência massiva na população;

Capacidade de causar dor e aflição;

Persistência espaço–temporal;

Falta de consenso social sobre as causas e sobre técnicas efi-cazes de intervenção;

Consciência social generalizada a respeito de sua negatividade 3.2. O criminoso:

Não é o pecador dos clássicos, não é o animal selvagem dos positivistas, não é o “pobre coitado” dos correcionalistas, nem a vítima da filosofia marxista;

É o homem real do nosso tempo, que se submete às leis ou po-de não cumpri-las por razões que nem sempre são compreendidas por outras pessoas.

3.3. A vítima:

A vítima é entendida como um sujeito capaz de influir significativa-mente no fato delituoso, em sua estrutura, dinâmica e prevenção;

Atitudes e propensão dos indivíduos para se converterem em víti-mas dos delitos;

Variáveis que intervêm nos processos de vitimização – cor, raça, sexo, condição social;

Situação da vítima em face do autor do delito, bem como do siste-ma legal e de seus agentes.

3.4. O Controle Social:

Controle Social: Conjunto de instituições, estratégias e sanções so-ciais que pretendem promover à submissão dos indivíduos aos modelos e normas comunitárias.

o Controle social formal: polícia, Judiciário, administração penitenciá-ria, etc.

o Controle social informal: família, escola, igreja, etc; 4. MÉTODO:

Empírico – observação da realidade. 5. FUNÇÕES DA CRIMINOLOGIA:

Básica: informar a sociedade e os poderes públicos sobre o delito, o delinquente, a vítima e o controle social, reunindo um núcleo de conhe-cimentos seguros que permita compreender cientificamente o problema criminal, preveni-lo e intervir com eficácia e de modo positivo no homem delinquente.

o Não é causalista com leis universais exatas; o Não é mera fonte de dados ou estatística; o Os dados são em si mesmos neutros e devem ser interpretados por

teorias científicas; o É uma ciência prática preocupada com problemas e conflitos con-

cretos, históricos;

Papel da criminologia: luta contra a criminalidade, controle e pre-venção do delito.

o Não é de extirpação; o Considera os imperativos éticos; o Não é 100 % penal.

Tríplice alcance da criminologia: 1. explicação científica do fenômeno criminal; 2. prevenção do delito; 3. intervenção no homem delinquente

Prevenção do delito: o Ineficácia da prevenção penal – estigmatiza o infrator, acelera a

sua carreira criminal e consolida o seu status de desviado; o Maior complexidade dos mecanismos dissuasórios – certeza e ra-

pidez da aplicação da pena mais importante que gravidade desta. o Necessidade de intervenção de maior alcance: intervenções ambi-

entais, melhoria das condições de vida, reinserção dos ex-reclusos. Profes-sora Ana Clara

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Criminologia A Opção Certa Para a Sua Realização 3

CONCEITO, HISTÓRIA, MÉTODOS, OBJETO E FINALIDADES DA CRIMINOLOGIA.

A Criminologia não chegou ainda a um conceito definitivo. Há variân-

cias, as quais se adequam ao objetivo, criando uma balbúrdia terminológica e confusão conceitual. No entanto, devemos consignar que a Criminologia Científica seria o conjunto de conceitos, teorias, resultados e métodos que se referem à criminalidade como fenômeno individual e social, ao delin-quente, à vítima e à sociedade e, em certa medida, ao sistema penal.

A interdisciplinaridade da Criminologia é histórica, bastando, para de-

monstrar isso, dizer que seus fundadores foram um médico ( Lombroso), um jurista sociólogo ( Enrico Ferri ) e um magistrado ( Raffaele Garofalo).

Assim, além de outras, sempre continuam existindo as três correntes :

a clínica, a sociológica e a jurídica, que, a nosso ver, antes de buscarem soluções isoladas, devem caminhar unidas e inter-relacionadas.

Para Garcia-Pablos, a Criminologia pode ser definida como "a ciência

empírica e interdisciplinar que se ocupa do crime, do delinquente, da vítima e do controle social do comportamento desviado".

A Criminologia Radial busca "esclarecer a relação crime/formação eco-

nômico-social, tendo como conceitos fundamentais as relações de produ-ção e as questões de poder econômico e político.

A Criminologia da Reação Social é definida como "uma atividade inte-

lectual que estuda os processos de criação das normas penais e das nor-mas sociais que estão relacionados com o comportamento desviante; os processos de infração e de desvio das normas; e a reação social, formali-zada ou não, que aquelas infrações ou desvios tenham provocado; e seu processo de criação, a sua forma e conteúdo e os seus efeitos."

O campo de interesse da Criminologia Organizacional compreende os

fenômenos de formação de leis, o da infração às mesmas e os da reação às violações das leis."

A Criminologia Clínica destina-se ao estudo dos casos particulares,

com o fim de estabelecer diagnósticos e prognósticos de tratamento, numa identificação entre a delinquência e a doença. Aliás, a própria denominação já nos dá ideia de relação médico-paciente.

A Criminologia da Passagem ao Ato tem como objeto principal a análi-

se dos fatores que influenciam o indivíduo à ação criminosa, sejam eles de caráter endocrinológicos, biotipológicos, hereditários, genéticos, psiquiátri-cos, psicológicos, social, ecológicos, culturais ou funcionais, etc.

No seu sentido estrito, Criminologia é o estudo do crime, porém em seu

sentido amplo, inclui a penalogia e os problemas de prevenção do delito, por intermédio de medidas não punitivas.

Toda essa gama de posições nos leva à certeza de que a Criminologia,

seja ela qual for, será, necessariamente, multi e interdisciplinar, a partir de um estudo preliminar, descritivo, dos fenômenos da criminalidade.

O OBJETO O objeto da Criminologia é o crime, suas circunstâncias, seu autor, sua

vítima, e tudo mais que o cerca. O crime é a prática de ato nocivo a outrem, defeso por lei, cujo autor

estará sujeito à pena imposta também por lei. A criminologia deve orientar a política social e criminal. A amplitude de

seu objeto não deve limitar seus fins às indagações e cuidados consequen-tes, e nem se preocupar em repressão. Não se deve confundir que a Crimi-nologia tem fins científicos e o Direito Penal fins normativos, o que significa que a Criminologia, livre de amarras com o passado, deve opor-se às estruturas sociais determinantes da grande criminalidade ou em si mesmo criminosas.

A Criminologia, orientará a Política Criminal na prevenção especial e di-reta dos crimes socialmente relevantes, na intervenção relativa às suas manifestações e aos seus efeitos graves para determinados indivíduos e famílias.

A Criminologia orientará a Política Social na prevenção geral e indireta

das ações e omissões que, embora não previstas como crimes, merecem a reprovação máxima; na prevenção geral e indireta dos crimes socialmente relevantes, inclusive o conjunto dos fatos análogos e da respectiva pericu-losidade preparatória; na intervenção relativa às suas manifestações e aos efeitos sociais.

AMPLIAÇÃO DA CRIMINOLOGIA Um dos problemas mais sérios da Criminologia, até nossos dias, é es-

tabelecer um conceito criminológico para "crime", com o qual se possa trabalhar com segurança.

A definição legal de crime não contenta os criminologistas que buscam

ampliar os horizontes de estudo, pesquisa, entendimento dos fato-res/causas e efeitos dos atos tidos como criminosos, evitando restringir-se ao estudo e controle dos indivíduos tidos como criminosos legalmente definidos. Buscando uma definição de crime que refletisse a realidade de um sistema legal baseado no poder e no privilégio, recorrem à Sociologia e Filosofia para a redefinição do objeto.

A tentativa de se conceituar o "crime" sociologicamente proporciona a

oportunidade de se ampliar o objeto da investigação criminológica, campo da Criminologia, que cuida também da "conduta desviada", cujo conceito ainda não está totalmente estabelecido, porém, vai muito além dos estreitos limites do conceito jurídico-positivo de delito, servindo ainda para fugir às críticas que consideravam os conceitos anteriores como subjetivos e arbi-trários.

O objeto da Criminologia, com a noção da conduta desviada, alargou-

se extraordinariamente, num sentido formal e quantitativo, fazendo com que o seu estrito objeto anterior, o crime, não passe de, apenas, uma das condutas desviadas, sendo certo que o estudo destas fornecerá ao crimino-logista elementos para penetrar no conteúdo deste. No entanto, estes devaneios propiciaram o desenvolvimento de um conceito radical de "cri-me", originários dos recentes movimentos criminológicos denominados Criminologia Crítica, ou Nova Criminologia, ou Criminologia Radical.

O sentimento de que Criminologia não deve ficar reclusa, apenas em

uma de suas tendências, contribui de maneira muito intensa, para frenar, nos últimos tempos, o desenvolvimento do movimento crítico, que caminha-va para o radicalismo.

O reconhecimento do caráter interdisciplinar e multidisciplinar da Crimi-

nologia e o seu aprofundamento garantem a esta ciência o seu maior relacionamento e afinidade com a ideologia social e o modelo social. Tal fato, no entanto, não acontece com frequência nos países em desenvolvi-mento nos quais as injustiças sociais são notórias e palpáveis. Eduardo Mayr

CONCEITO DE CRIMINOLOGIA "A Criminologia é um conjunto de conhecimentos que estudam o fenô-

meno e as causas da criminalidade, a personalidade do delinquente e sua conduta delituosa e a maneira de ressocializá-lo" (Sutherland).

OBJETO, NATUREZA E DIVISÃO DA CRIMINOLOGIA Ciência que, como todas as que abordam algum aspecto da criminali-

dade, deve tratar do delito, do delinquente e da pena. Divisão da Criminologia (UNESCO):

Criminologia Geral (sociológica)

Criminologia Clínica PRINCIPAIS ESCOLAS CRIMINOLÓGICAS Na evolução da Criminologia devem ser consideradas 5 etapas:

Fase empírica e mitológica (até o século XV)

O tabu e a reação instintiva de defesa

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Criminologia A Opção Certa Para a Sua Realização 4

O delito como desvio anormal da conduta humana (Hipócrates)

Criminalidade fundamentada em causas econômicas (Platão e Aris-tóteles, retomado por Santo Tomás de Aquino)

Criminoso se assemelha a doente: reeducação ou cura, caso con-trário, expulsão

As paixões humanas mais importantes que as razões econômicas (Aristóteles)

Precursores de Lombroso (Renascimento até 1875)

Filósofos e Pensadores

Penólogos e Penitenciaristas

O Marquês de Beccaria

Os Fisiognomistas (estudando os traços do rosto)

Os Frenólogos (teoria das localizações cerebrais)

Os Psiquiatras e Médicos das Prisões

Philip Pinel (1745-1826)

Esquirol (1772-1840) monomania (loucura moral = constituição psi-copática perversa): o criminoso nato

Lucas (1805-1885) herança e atavismo Período da Antropologia Criminal (1875-1890)

Cesare Lombroso (1835-1909)

O atavismo

As taras: anatômicas, funcionais e psicológicas

Classificação Criminológica de Lombroso

Delinquentes natos

Pseudo-delinquentes (delinquentes ocasionais)

Criminalóides (fronteiriços)

Enrico Ferri (1856-1929)

Classificação de Ferri: Delinquentes natos, loucos, ocasionais, ha-bituais e passionais

Rafaele Garófalo (1852)

Sentimentos de altruístas o Piedade (assassinos) o Probidade (ladrões) o contra ambos (salteadores) Período da Sociologia Criminal (1890-1905)

A estatística

As teorias antropo-sociais (atentam para os fatores endógenos e os exógenos: fatores predisponentes e fatores determinantes)

As teorias sociais propriamente ditas (só atentam para os fatores exógenos)

As teorias socialistas (a influência do fator econômico) Período da Política Criminal ou Fase Eclética (1905 até o presente)

A Terza Scuola

O Direito Penal deve manter-se como ciência independente

O delito tem várias causas (fatores endógenos e exógenos)

Penalistas e Sociólogos devem obter reformas necessárias

A Escola Espiritualista: o livre arbítrio

A Escola da Política Criminal

a Antropologia Criminal

a Estatística Criminal

Tendências Modernas

Teoria da etiquetagem o as instituições sociais consolidam as desigualdades o criação de um verdadeiro círculo vicioso de marginalidade o hereditário, pois a sociedade recusa a possibilidade de participação o impossibilidade de o marginal ter acesso aos valores impostos o futuro de desemprego por predestinação o condenado à falta de escolha de interesses e iniciativas

Criminologia Clínica o o criminoso como doente social na sua totalidade bio-psico-

sociológica o diagnóstico, prognóstico, tratamento do criminoso

o aumento da tendência aos crimes de astúcia ("crimes de colarinho branco")

Prof. Dr. Jorge Paulete Vanrell A criminologia é uma ciência empírica que se ocupa do crime, do

delinquente, da vítima e do controle social do delitos. Baseia-se na observação, nos fatos e na prática, mais que em opiniões

e argumentos, é interdisciplinar e, por sua vez, formada por outra série de ciências e disciplinas, tais como a biologia, a psicopatologia, a sociologia, política, etc.

Quando surgiu, a criminologia tratava de explicar a origem da

delinquência, utilizando o método das ciências, o esquema causal e explicativo, ou seja, buscava a causa do efeito produzido. Pensou-se que erradicando a causa se eliminaria o efeito, como se fosse suficiente fechar as maternidades para o controle da natalidade.

Academicamente a Criminologia começa com a publicação da obra de

Cesare Lombroso chamada "L'Uomo Delinquente", em 1876. Sua tese principal era a do delinquente nato.

Já existiram várias tendências causais na criminologia. Baseado em

Rousseau, a criminologia deveria procurar a causa do delito na sociedade; baseado em Lombroso, para erradicar o delito deveríamos encontrar a eventual causa no próprio delinquente e não no meio. Enquanto um extremo que procura todas as causas de toda criminalidade na sociedade, o outro, organicista, investigava o arquétipo do criminoso nato (um delinquente com determinados traços morfológicos). (Veja Rousseau, Personalidade Criminosa)

Isoladamente, tanto as tendências sociológicas, quanto as orgânicas

fracassaram. Hoje em dia fala-se no elemento bio-psico-social. Volta a tomar força os estudos de endocrinologia, que associam a agressividade do delinquente à testosterona (hormônio masculino), os estudos de genética ao tentar identificar no genoma humano um possível conjunto de "genes da criminalidade", e ainda há os que atribuem a criminalidade meramente ao ambiente, como fruto de transtornos como a violência familiar, a falta de oportunidades, etc.

A criminologia é uma ciência empírica que se ocupa do crime, do delin-

quente, da vítima e do controle social do delitos. Baseia-se na observação, nos fatos e na prática, mais que em opiniões e argumentos, é interdiscipli-nar e, por sua vez, formada por outra série de ciências e disciplinas, tais como a biologia, a psicopatologia, a sociologia, política, etc.

Quando nasceu, a criminologia tratava de explicar a origem da delin-

quência, utilizando o método das ciências, o esquema causal e explicativo, ou seja, buscava a causa do efeito produzido. Pensou-se que erradicando a causa se eliminaria o efeito, como se fosse suficiente fechar as maternida-des para o controle da natalidade.

Academicamente a Criminologia começa com a publicação da obra de

Cesare Lombroso chamada "L'Uomo Delinquente", em 1876. Sua tese principal era a do delinquente nato.

Já existiram várias tendências causais na criminologia. Baseado em

Rousseau, a criminologia deveria procurar a causa do delito na sociedade, baseado em Lombroso, para erradicar o delito deveríamos encontrar a eventual causa no próprio delinquente e não no meio. Um extremo que procura as causas de toda criminalidade na sociedade e o outro, organicis-ta, investigava o arquétipo do criminoso nato (um delinquente com determi-nados traços morfológicos).

Isoladamente, tanto as tendências sociológicas, quanto as orgânicas

fracassaram. Hoje em dia fala-se no elemento bio-psico-social. Volta a tomar força os estudos de endocrinologia, que associam a agressividade do delinquente à testosterona (hormônio masculino), os estudos de genética ao tentar identificar no genoma humano um possível "gene da criminalida-de", juntamente com os transtornos da violência urbana, de guerra, da fome, etc.

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Objeto e Método da Criminologia Clínica A Criminologia Clínica deriva da Antropologia Criminal. Contudo, dife-

rentemente desta, a Criminologia Clínica abandona o conceito de raça, trocando-o pelo d indivíduo. Os princípios e métodos da Criminologia Clíni-ca foram definidos no Colóquio de Roma, em 1958, com as finalidades:

a) Apreciar a personalidade do delinquente e seu estado perigo-so - hoje aprecia a personalidade em seu sentido amplo e não só seu sentido estritamente psicológico. Não mais se fala em “estado perigoso” (exceto em caso de imputabilidade e semi-imputabilidade), mas em “prognóstico de reincidência” .

b) Tratamento do Criminoso - a Criminologia Clínica propõe um “programa de tratamento”, que também representa um avanço so-bre a Antropologia Criminal, que fala em “remoção de um quadro patológico”.

c) Acompanhamento da Execução dos Tratamentos - assim como o acompanhamento de seus resultados, com três linhas básicas de atuação: diagnóstico, prognóstico e tratamento propriamente dito.

BREVE RELATO SOBRE A HISTÓRIA DA CRIMINOLOGIA

Gisele Leittória

Calcada tão-somente no aspecto didático-pedagógico podemos dividir a história da criminologia em quatro períodos:primeiro período o da Antigui-dade aos precursores da Antropologia Criminal; segundo período de Antro-pologia Criminal; o terceiro período de Sociologia Criminal e o último refe-rente a Política Criminal.

O Código de Hamurabi(Babilônia) já possuía dispositivo punindo o deli-to de corrupção praticado por altos funcionários públicos.

Mesmo antes, Confúcio já demonstrava conhecer o gravame da pena o que, certamente viria ser uma das maiores preocupações da Criminolo-gia.

Entre os gregos Alcmeon, de Cretona( séc. VI a . C.) foi o primeiro a dissecar animais e a se dedicar ao estudo das qualidades biopsíquicas dos delinquentes. Pesquisou o cérebro humano buscando uma correlação com sua conduta. Constava que no homem há um pouco de animal e um pouco de Deus, e que a vida é o equilíbrio entre as forças contrárias que constitu-em o ser humano, e a doença corresponderia ao rompimento desse equilí-brio. E a morte significaria o desequilíbrio completo.

Acreditava na imortalidade da alma e que se movia eternamente tal qual os astros nos céus.

É importante salientar que Alcmeon de Cretona é anterior ao conside-rado pai da medicina, a Hipócrates.

Aliás, o pai da medicina creditava que todo o crime assim como o vício é fruto da loucura. Lançando assim(...) as bases sobre a imputabilidade ou o princípio da irresponsabilidade penal do homem insano.

O grande oráculo grego, Sócrates, disse através de seu discípulo Pla-tão, in verbis: “que se devia ensinar aos indivíduos que se tornavam crimi-nosos como não reincidirem no crime, dando a eles a instrução e a forma-ção de caráter de que precisavam”.

Platão sagaz como sempre afirmou:” o ouro do homem sempre foi o motivo de seus males” em sua obra “ A República” demonstrando que os fatores econômicos e sociais são desencadeadores de crimes.

Dizia também, “onde há gente pobre haverá patifes, vilões, etc” e o criminoso assemelha-se ao enfermo.

Endossando tal entendimento, Jimenez de Asúa ressaltou o aspecto intimidativo da pena e sua função inibidora da ação delituosa.

Aristóteles em sua obra “A Política” ressaltou que a miséria engendra rebelião e delito. O homem na visão aristotélica não é plenamente livre pois é submetido à razão que controla a sua sensibilidade. Os delitos mais graves eram os cometidos para possuir o voluptuário, o supérfluo.

Em sua obra “A retórica”, Aristóteles estudou o caráter dos delinquen-tes, observando a frequente tendência à reincidência, e analisou as circuns-tâncias que deveriam ser levadas em conta como atenuantes.

Sêneca fez uma primorosa análise sobre a ira que considerava como mola propulsora do crime, e da constante luta fratricida.

A Idade Média cuja extensão temporal é discutida sendo para alguns uma noite dos dez séculos e, para outros apenas nove séculos, foi severa-mente marcada pelo feudalismo, pela expansão do cristianismo como ideologia religiosa oficial e pela instalação da nobreza feudal sob a prote-ção do papado (que era o centro do poder na Europa Ocidental) com todas as expansões conquistadoras.

O crime era mesmo considerado um grande peccatum e, suscitava pu-nições cruéis e até mesmo o uso da tortura para obtenção da confissão.

O grande criador da Justiça Distributiva cujo adágio famoso consagra por “dar a cada um, o que é seu.”.., segundo uma certa igualdade, teve em São Tomás de Aquino seu mentor e, também firmou entendimento que a pobreza é geralmente uma incentivadora do roubo, apesar de que na sua obra Summa Theologica defendia o chamado furto famélico (o que atual-mente é previsto pela legislação brasileira como estado de necessidade sendo assim uma das excludentes de crime, é o roubar para comer).

Para Santo Agostinho chamava a pena de talião significava a justiça dos injustos, sustentando que a pena deveria ser uma medida de defesa social e contribuir para a regeneração do culpado, além de implicitamente conter uma ameaça e um exemplo.

Os escolásticos eram seguidores das doutrinas teológico-filosóficas, dominantes na Idade Média, dos séculos IX até XVIII. A Filosofia, portanto, estava intimamente ligada à religião.

No século XVIII, dentro, portanto, surge Afonso X, o sábio, que no Có-digo das Sete Partidas dá uma definição de assassino e trata dos intitula-dos crimes premeditados mediante remuneração ou paga.

No período de transição entre a Idade Média e a Moderna, do século XIV ao século XV, é observada a influência das chamadas “ciências ocul-tas”, o que bem mais tarde seria conhecida como Criminologia.

As ciências ocultas eram a Astrologia, a Oftalmoscopia, a Metoposco-pia, a Quiromancia , a Fisiognomia e Demonologia.

Pela Fisiognomia, por exemplo, tenta-se conhecer o caráter da pessoa pelo exame dos traços fisionômicos e da conformação craniana. Tal ciência segundo Drapkin nasceu na idade medieval como o físico Juan Batista Della Porta, tendo o condão de reunir todas as ciências ocultas numa só pseudo-ciência. Teve papel de destaque e propiciou o aparecimento da Frenologia no século XIX.

Por força de tal contribuição científica ou quase, recorda Drapkin que em Nápoles, o Marquês de Moscardi decidia em última instância os pro-cessos que a ele chegavam e declinava a qual sentença examinada a face e a cabeça do delinquente.

Já a Demologia que estudava os demônios e os indivíduos suposta-mente possuídos por estes, o que veio a facilitar e permitiu o florescimento de todas as Inquisições. Muito mais tarde,tal estudo propiciou o apareci-mento da Psiquiatria.

Considerava-se como possuídos pelos demônio, os loucos e os porta-dores de alienação mental que eram sistematicamente caçados e encarce-rados, quando não sacrificados por terríveis Tribunais de Inquisição espa-lhados pelo mundo europeu católico.

Com a desculpa de expulsar o demônio de tais corpos insanos, come-tia-se as mais tenebrosas torturas e, não raro eram queimados vivos na fogueira.

O mau comportamento humano era interpretado como um morbus dia-bolicus, uma enfermidade diabólica, e só o fogo poderia purificar tais almas atormentadas.

Baudelaire fez um famoso aviso: ”o mais atual ardil do Diabo consiste em fazer crer a todos que ele não existe”. Até hoje, tanto a Demologia como a Astrologia como a própria Fisiognomia tem se preocupado ainda

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nos tempos atuais, em co-relacionar a aparência externa das pessoas com sua conduta íntima.

Tal observação foi objeto de várias pesquisas entre elas a do abade Jean Gaspar Lavater(1741-1801) onde ressaltava que “homens de malda-de natural” ou de pendor cruel em muito parecidos com o tipo delineado por Lombroso e chamado de criminoso lato.

Enquanto que a fisiognomia estuda o caráter humano a partir dos tra-ços fisionômicos do rosto, os frenólogos se preocupavam com o estudo da configuração craniana, ou seja, da cabeça indo além da sua fisionomia.

O período da Antropologia Criminal, do século XV até 1875 vários fo-ram os precursores da Criminologia entre eles Thomas Morus(que descre-ve na Utopia, sua obra, uma série de crimes que assolava a Inglaterra na época , onde sistematicamente se aplicava a pena capital aos criminosos).

Dotado de espírito cristão, Morus, dizia por meio de seu personagem Rafael Hitlodeu, quando o povo é miserável, a opulência e a riqueza ficam em poder das classes superiores e essa situação economicamente antípo-da faz gerar um maior número de crimes, inclusive pelo comprometimento moral diretamente ligado ao luxo esbanjador dos ricos.

Vivia-se naquela época uma deplorável crise economia na Inglaterra. Flandres absolvia toda a produção de lã, o que forçou a destinação dos campos ingleses ao pastoreio de gado menor(o que tornou famosa a frase de Morus: “Na Inglaterra as ovelhas comem os homens”).

Além disto, a Inglaterra era submetida ao déposta Henrique VIII, en-quanto a nobreza e o clero eram latifundiários e donos da maior parte das riquezas do país, ainda existindo a péssima exploração das terras.

Aliás, por ter bramido contra a tal estado de coisas, apesar de ter sido chanceler do rei Henrique VIII, Morus acabou sendo decapitado.

Também Erasmo de Roterdã zombava e satirizava os costumes e os homens da Igreja e enxergava na pobreza o grande filão da criminalidade.

O primeiro autor a distinguir a criminalidade rural da urbana foi Marti-nho Lutero. Outros filósofos como Francis Bacon, Descartes admitiram as causas socioeconômicas como geratrizes da criminalidade.

Jean Mabilon em 1632, padre beneditino francês introduziu as primei-ras prisões monásticas e Filippo Franci(italiano em 1677) em Firense, cria a primeira prisão celular.

O Iluminismo que atingiu seu apogeu no século XVIII, por isto chamado de o século das luzes contribuiu decisivamente para inovações nos concei-tos penais, semeando terreno fértil para as escolas penais e para a siste-matização científica não só do Direito Penal mas também das demais ciências afins.

Vigorava uma péssima estrutura e condições inadequadas, os juízes eram arbitrários e parciais. E a confissão (a rainha das provas) era sistematica-mente obtida mediante a aplicação de crudelíssimas torturas.

Desta forma, os humanistas e os iluministas se rebelam e conseguem suprimir em 1780 na França, a tortura; em 1817 na Espanha, em 1840 aboliram a tortura em Hanover e em 1851 na Prússia.

Dos filósofos que foram ativos nesse movimento renovador e justo tem relevante importância Montesquieu, que na sua obra principal “L´esprit des lois”, proclamava que o bom legislador era aquele que se empenhava na prevenção de delito, não aquele que, simplesmente, se contentasse em castigá-lo.

Inaugura assim, um sentido reeducador da pena, Montesquieu. Criou distinção entre os delitos (crimes que ofendem a religião, os costumes, a tranquilidade e a segurança dos cidadãos) consagrando a preocupação em classificar os delitos conforme o bem jurídico atingido, não só quanto à sua natureza mas também as próprias características pessoais dos autores de crimes.

Jean Jacques Rousseau, no Contrato Social assevera que o Estado for bem organizado existirão poucos delinquentes e na “Enciclopédia” consta sua afirmação: “a miséria é a mãe dos grandes delitos”.

Outro filósofo Brissot de Warville enfatizou que “a propriedade era um roubo” e, neste estio Rousseau em sua obra “Discursos sobre a Origem e o Fundamento da Desigualdade entre os homens” , editada em 1753, criticou o primeiro homem que ensejou o conceito de propriedade, decre-tando “isto é meu”, tal homem foi o fundador da sociedade civil.

O pensamento rousseano enxergava na propriedade privada a razão de todos os conflitos sociais. Tal também foi o ponto fundamental da teoria marxista no século XIX.

Voltaire, também condenava a aplicação de pena de morte, os martí-rios, suplícios ou torturas aplicadas contra o delinquente. Notabilizou-se por sua luta pela reforma das prisões(ele mesmo esteve preso e recolhido à Bastilha), pela reformulação da pena de morte, propondo a substituição por trabalhos forçados.

Também combateu a prática da tortura como método de obter a verda-de ou a prova. Salientava Voltaire que o roubo e o furto são os delitos dos pobres.

César Bonesana, o Marquês de Beccaria que assim como Montes-quieu, Voltaire e Rousseau teve a ousadia de afrontar os costumes penais d época, publicando “Dos delitos e das penas”, uma obra clássica e de leitura obrigatória para todos que se interessem pelas ciências criminais.

Tal obra teve o mérito de alterar toda a penalogia sendo precursora da Escola Clássica do Direito Penal.

Beccaria geneticamente rebelde( seu próprio pai, Lancelote Beccaria por afrontar o Duque de Milão, acabou enforcado na praça de Pavia) fez estudo no Colégio dos Jesuítas de Parma(onde também foram educados Voltaire, Helvécio, Diderot etc...), rebelou-se contra as inúmeras arbitrari-edades da justiça criminal como ele mesmo escreveu quis defender a humanidade e não ser um mártir dela.

Alguns pontos principais da obra de Beccaria, a saber:

A atrocidade das penas opõe-se ao bem público;

Aos juízes não deve ser dado interpretar as leis penais;

As acusações não podem ser secretas;

As penas devem ser proporcionais aos delitos;

Não se pode admitir a tortura do acusado por ocasião do processo;

Somente os magistrados é que podem julgar os acusados.

O objetivo da pena não é atormentar o acusado e sim impedir que ele reincida e servir de exemplo para que outros não venham a delinquir.

As penas devem ser previstas em lei.

O réu jamais poderá ser considerado culpado antes da sentença con-denatória.

O roubo é ocasionado geralmente pela miséria e pelo desespero.

As penas devem ser moderadas.

Mais útil que a repressão penal é a prevenção dos delitos.

Não tem a sociedade o direito de aplicar a pena de morte nem de ba-nimento.

E ao concluir sua obra o famoso marquês: “De tudo o que acaba de ser exposto pode deduzir-se um teorema geral utilíssimo, mas pouco conforme ao uso, que é legislador ordinário das nações. É que, para não ser uma to de violência contra o cidadão, a pena deve ser essencialmente pública, pronta, necessária; a menor das penas aplicáveis nas circunstâncias dadas proporcional ao delito e determinada pela lei”.

Bentham teve, juntamente com Beccaria, Servan, Howard, uma im-portante participação no trabalho de reforma penal que se sucedeu, princi-palmente após a publicação Dos Delitos e das Penas.

Bentham é considerado o criador da Filosofia Utilitarista que alicerça seu fundamento no postulado: “O maior bem-estar para o maior número.”. Nesta doutrina estaria inserida toda uma estratégia de profilaxia ou preven-ção de criminalidade.

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John Howard, xerife de Bedford em 1789 se revelou um excelente pe-nitenciarista e se dedicou à melhoria das prisões. Foi o responsável pela abolição de se manter encarcerados os que já haviam cumprido pena, ou se, absolvidos, não pudessem pagar, a “hospedagem” pois que as prisões eram exploradas por particulares.

John Howard escreveu em 1777, a obra The State of Prisions traçan-do um sistema penitenciário que conseguia favorecer os encarcerados.

O mais importante pensador para a Frenologia foi o anatomista austrí-aco Johan Frans Gall(1758-1823) que foi precursor das chamadas “teorias das localizações cerebrais” de Broca, em meados do século XIX.

É dele também a teoria sobre vultos cranianos, que posteriormente veio a influenciar a teoria lombrosiana. Gall organizou um mapa dessas saliências a indicarem a conduta predominante no indivíduo, desde a passividade absoluta à rebeldia incontrolável, a bondade ou a maldade, a honestidade e, sua contrário senso a inteligência maior ou menor.

Lauvergne em 1859 elaborou estudo sobre os presidiários de Toulon chegando as mesmas conclusões de Gall.

O Rolandis, foi o primeiro a submeter um delinquente a uma necropsia em 1835. Também Lucas estudou a herança genética e o atavismo, em sua obra Sulla natura Morbosa Del delito, tratou dos caracteres anormais do criminoso dentro de um enfoque, que posteriormente viria fundamentar a teoria lombrosiana.

Della Porta relacionava a semelhança fisionômica dos criminosos com os animais selvagens e, fazendo muitos adeptos. Cita-se, por exemplo, a semelhança do ministro francês Talleyrand com a raposa e semelhança de outro francês, o general Kleber, com o leão.

Os psiquiatras como Felipe Pinel(1745-1826) tido como o pai da psi-quiatria Moderna, e foi o primeiro a modificar, através de sua influência, os seus pares da época, no que diz respeito à forma com que eram tratados os loucos, tidos até então como possuídos pelo Diabo, e, por isso eram surrados cruelmente e, via de regra, acorrentados.

Pinel recomendava que o louco deveria ser adequadamente tratado e não sofrer violências que só contribuem para o agravamento de sua doen-ça. É célebre o episódio ligado ao paciente Chevigné, um soldado encarce-rado na La Sante, que segundo Pinel, quando foi desacorrentado “chorava como uma criança ao se ver tratado como uma criatura humana”.

Segundo Drapkin, Esquirol foi o criador do conceito de monomania que gerou uma nova concepção psiquiátrica da loucura moral que foi defi-nida em fins do século XVII pelo médico Thomas Abercromby, como sendo característica de alguém com bom nível de inteligência, mas com graves defeitos ou transtornos morais.

A partir dessa época, a Escola Inglesa passou a calcar-se na moral in-sanity, sendo Pritchard(1786-1848) o consolidar do seu conceito que, posteriormente, viria a servir de embasamento para Lombroso na elabora-ção do perfil do criminoso nato.

Darwin(1809-1882) teve sua teoria evolucionista coordenada aos pro-gressos das ciências biológicas por Julian Huxley e James Fisher. Sua ideia básica é a evolução modificada pelos seres humanos. As ideias da seleção natural e a da evolução completam a teoria de Darwin que corres-pondem a uma generalização das mais importante no campo da biologia.

Sem dúvida, Darwin pode ser chamado de Newton da Biologia e ape-sar dos notórios progressos contemporâneos das ciências naturais, sua teoria ainda ocupa lugar relevante na ciência atual.

O homem passou pelas fases de peixe, sapo, réptil e ave mas jamais tal fato foi confirmado por Darwin e, nem possui qualquer apoio científico.

No que concerne aos princípios que regiam as variações hereditárias e não-hereditárias, as ideias eram vagas e o microscópio não revelara até aquele momento os fatos básicos relativos aos cromossomos e seu com-portamento.

A Antropologia Criminal foi fundada por Cesare Lombroso . Em de-terminado momento histórico, o direito Penal abandonou o terreno da abstração em que se colocara ao tempo da chamada Escola Clássica,

passando para o concretismo das verificações objetivas sobre o delito e, fundamentalmente, sobre o criminoso.

Surgiu no espírito alemão que cultuavam o Direito Penal a necessidade imperiosa de pesquisar profundamente o coeficiente humano que existe na ação delituosa.

Esse movimento desencadeou na criação da Antropologia Criminal por intermédio Lombroso, médico psiquiatra e professor da Universidade de Turim, que considerou delinquente sob os prismas das ciências que eram centro de suas cogitações habituais e outrossim, aplicando ao exame da criminalidade, a mesma estratégia utilizada no conhecimento da natureza humana.

Lombroso no criminoso encontrou uma variedade especial homo sapi-ens que seria caracterizada por sinais(stigmata) físicos e psíquicos. Tais estigmas físicos do criminoso nato, segundo Lombroso, constavam de particularidades de forma da calota craniana e da face, bem como detalhes quanto ao maxilar inferior, fartas sobrancelhas, molares proeminentes, orelhas grandes e deformadas, dessimetria corporal, grande envergadura de braços, mãos e pés.

Os estigmas ou sinais psíquicos caracterizavam o criminoso nato(como sensibilidade a dor diminuída (eis porque, os criminosos comumente se tatuariam) crueldade, leviandade, aversão ao trabalho, instabilidade, vaida-de, tendências a supertições e precocidade sexual. Julgou também ter encontrado a relação entre a epilepsia e a chamada moral insanity.

Porém, mais tarde, Lombroso evidenciou que nem todos os crimino-sos mostram tais características, ele distinguiu, como pseudos criminosos, os ocasionais e os passionais.

Manteve porém, a ideia de que a maior parte dos criminosos, forma-vam um tipo antropológico unitário e este seria o criminoso verdadeiro.

Na verdade, o verdadeiro criminoso é nato. Foi suas conclusões de grande relevância para a Política Criminal, a fim de conter o impulso crimi-nal, não caberiam expiações morais ou punições infamantes e a sociedade teria o direito de proteger-se do criminoso, condenando-o e isolando-o pela prisão perpétua ou de morte encarada como medida de seleção.

O atavismo( que é o aparecimento em um descendente de um caráter ausente em seus ascendentes imediatos, mas sim em remotos, como por exemplo, se um membro de determinada família). Há duas correntes: os defensores do atavismo físico e os defensores do atavismo moral( o sentido moral era o último a se adquirir na evolução natural dos seres humanos).

A respeito do criminoso epilético, Lombroso tem o aval de Ottolenghi e Rancoroni, que esclareciam não se tratar de um epilepsia verdadeira, arguindo um certo caráter epileptóide ao delinquente, a justificar a impulsi-vidade e a anestesia que nele se processam.

As taras psicológicas, segundo Ingenieros, afetavam as faculdades in-telectuais e volitivas do indivíduo, juntando-se às causas endógenas e exógenas.

Basicamente Lombroso classificava em três tipos os criminosos;

1. criminoso nato;

2. falso delinquente ou pseudo delinquente ou delinquente ocasional;

3. criminalóide( é o meio delinquente assemelhado ao meio louco ou fronteiriço).

Sem dúvida, o cientista ilustre que foi Lombroso anotou detalhados dados antropológicos , nas observações a que submeteu os criminosos, os vivos nos cárceres e os mortos através de constantes necropsias.

Porém, os traços de degenerescência não só privativos dos criminoso, é a tese lombrosiana dotada de exageros tendo conferido realce desmedi-do, explica a conservação da Antropologia Criminal, a Endocrinologia, a cuja frente há nome como o de Maranon, Vidoni, Mariano Ruiz.

A constituição delinquencial considera seu portador apenas como um predisposto à criminalidade. Di Túlio esclarece que o delito provém, na sua opinião, de um estado de desequilíbrio entre a criminalidade latente e a resistência individual.

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Criminologia A Opção Certa Para a Sua Realização 8

Portanto, o crime seria o resultado de forças crimino-incitantes que su-peram as forças crimino-repulsivas que existem em cada indivíduo.

A contemporânea Antropologia Criminal não reconhece pela conforma-ção exterior dos indivíduos, quais devam ser submetidas as medidas de-fensivas por serem perigosas.

Lombroso se depara com um número relativamente pequeno de cri-minosos sendo tal tipo correspondente a uma média aritmética, colhidos entre os delinquentes mais afamados pela gravidade de seus crimes.

Um dos mais ferrenhos críticos à teoria de Lombroso foi Charles Go-ring através de seu livro The English convict, publicada em 1913, concluin-do pela inexistência das características morfológicas determinadas dos criminosos por Lombroso.

Kretschmer procurou estabelecer uma correlação entre o físico e o ca-ráter do indivíduo, e para tanto estabelecia três categorias:

a) pícnico: indivíduo de pequeno porte vertical (baixo, gordo e bem-humorado);

b) atlético: um tipo intermediário, de comportamento normal;

c) leptossomático: de estatura alta, de corpo magro geralmente intro-vertido, porém, violento e de mau caráter.

Juntamente com Pende, Kretschmer foram considerados os fundadores da Biotipologia.

Acentua Mezger a partir da afinidade biológica a correlação com certas doenças mentais(ou psicoses) de origem humoral tais como esquizofre-nia(demência precoce) e o ciclofrenia(psicose-maníaco-depressiva, loucura circular), das quais se deriva as personalidades psicopáticas esquizóide e ciclóide e por fim aos temperamentos esquizotímico e ciclotímico.

A diferença entre frênicos, óides e tímicos. Drapkin assegura que exis-tem dois erros fundamentais na teoria de Lombroso e a perfectabilidade do perfil do tarado e o fato de não poder ser reeducado.

Outro fator que reforça à crítica à Lombroso é que o cientista italiano considerava o meio ambiente como fator secundário na criminalidade depreciando a sua influência.

Para Drapkin, Lombroso foi incompleto em suas investigações, exa-gerando o valor das cifras e dava outras sem base séria, estabelecendo, destarte, uma verdadeira pirataria científica.

A teoria lombrosiana conheceu seu apogeu mas também encontrou adversários de suas ideias, como Francesco Carrara bem como os outros integrantes da chamada Escola Clássica de Direito Penal( Filangieri, Carmignani, Romagnosi, Ortolan, Rossi, Fuerbach, Pessina etc...) trouxeram à baila todos aspectos falhos da Antropologia Criminal, o que acabou por fulminar a figura do criminoso nato.

É claro que se reconhece o grande mérito atribuído a Lombroso por ter sido o primeiro a promover um estudo sério do crime sob a acepção científica-causal; daí porque considera-lo o pai da Criminologia.

A atual criminologia não consagra a teoria do criminoso nato embora admita a tendência delituosa, reconhecendo que o homem pode nascer com a inclinação para a violência.

É importante concluir que a vida psíquica não é algo em apartado da vida orgânica; o homem é um ser sui generis que tem uma vida orgânica e uma psíquica inseparáveis entre si.

Desta forma, é curial a relevância da Psicologia Criminal se insere, as-sim na Biologia Criminal, através de um estudo morfo-psico-moral do delin-quente, absorvendo sua anatomia, psicologia e a psicopatia do criminoso.

Tal estudo não abrange os fatores endógenos do delito, como também os coeficientes sociais que condicionam e provocam o crime.

Bem salienta Marcelo Caetano “ o papel do ambiente familiar e social na gênese do delito”.

Enri Ferri (1856-1929) em sua obra Sociologia Criminal deu relevo não só aos fatores biológicos como também aos mesológicos ou sociológicos,

além dos físicos, na etiologia delinquencial. Revelou o trinômio causal do delito, composto por fatores antropológicos, sociais e físicos. Considerado o criador da Sociologia Criminal, foi quem acendeu a polêmica entre os defensores do “livre arbítrio” e os adeptos do “determinismo” no que se refere ao crime.

É de Ferri, também, a denominada “Lei de Saturação Criminal” em que dizia, ele, da mesma maneira que em um certo líquido à tal temperatura ocorrerá a diluição de uma certa quantidade, em determinadas condições sociais, serão produzidos determinados delitos.

Considerada três as causas dos delitos: a) biológicas( herança e cons-tituição); b) físicas( clima);c) sociais(referentes às condições ambientais).

A Escola Alemã de Naezcker avaliza a classificação de Ferri e estabe-lece fatores delituógenos: os endógenos e exógenos. As primeiras corres-pondendo as causas biológicas e ao segundo, as causas físicas e sociais.

Ferri não acreditava na liberdade da vontade psíquica do homem e de-fendia a teoria jurídica da responsabilidade pessoal. Recomendava que o Código Penal deveria haver apenas um código de defesa social, com base na periculosidade do infrator.

Assim para Ferri, a Sociologia Criminal era a ciência enciclopédica do delito e da qual o Direito Penal não passaria de um simples ramo ou subdi-visão.

Aliás, dentro da própria Escola positiva integrada por Ferri, Gripingni combateu a exacerbação daquela proposta, atitude em que foi acompa-nhado por Etienne de Greef, Antolisei.

Importante ressaltar que Ferri teria sido o criador da expressão “crimi-noso nato” em 1881, que é erroneamente conferida à Lombroso.

Enrico Ferri classificou os delinquentes em cinco tipos a saber: nato, louco, ocasional, habitual e passional.

O nato é o tipo instintivo de criminoso descrito por Lombroso com es-tigmas de degeneração. Tal tipo apresenta a completa atrofia do senso moral.

O louco seria não só alienado mental, como também os semi-loucos, matóides e os fronteiriços.

O ocasional é aquele que eventualmente comete crime. O habitual é o reincidente, faz do crime sua profissão. O passional é aquele que é levado à configuração típica pelo arrebatamento, pelo ímpeto.

O criminoso passional é caracterizado pela superexcitação nervosa, sofre no dizer de Ferri uma autêntica tempestade psíquica, pratica a ação delituosa; pela notoriedade e quase sempre, pelo arrependimento imediato o que o leva geralmente ao suicídio imediato.

Foi o terrível ciúme ditado por uma paixão que Otelo matou Desdêmo-na(após matá-la, se suicida). Os três famosos homicidas shakespearianos são dissecados por Ferri: Macbeth seria o criminoso nato; Hamlet seria o criminoso louco e Otelo o criminoso passional( o mais citado pela literatu-ra).

Raphael Garófalo foi o criador do termo Criminologia e construiu a tríplice preocupação pois para ele a Criminologia é a ciência da criminalida-de, do delito e da pena. Elaborou sua concepção de delito natural partindo da ideia lombrosiana do criminoso nato.

O Direito Penal não era monopólio dos juristas, mas também de inte-resses dos sociólogos, apregoava que os verdadeiros delitos ofendem a moralidade elementar e revelam anomalias nos que os praticam.

Entendia que existem duas espécies de delitos: os legais e os natu-rais, sendo que os primeiros eram variáveis de país para país e não ofendi-am o senso moral e nem revelavam anomalias(as lombrosianas) assim as penas também seriam variáveis.

Quanto ao delito natural são os que ofendem os sentimentos altruístas fundamentais de piedade e probidade. Garófalo assevera ser frequente a presença de anomalias patológicas de toda ordem nos criminosos.

Para Garófalo, o delinquente típico é um ser a quem falta qualquer al-truísmo, destituído de qualquer benevolência e piedade, são os epitetados de “assassinos”.Três categorias de criminosos: a) assassinos;b) violentos ou enérgicos; c) ladrões e neurastênicos.

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Ainda acrescentou um quatro grupo, o daqueles que cometem crimes contra os costumes, aos quais chamou de criminosos cínicos.

Garófalo era um defensor da pena de morte sem qualquer comisera-ção.

Augusto Comte é considerado, unanimente como o fundador da So-ciologia Moderna, e define tal ciência como abstrata que tem por fim a investigação das leis gerais que regem os fenômenos sociais.

É ciência relativamente nova e foi Comte e Durkheim que lhe deram um contexto científico. Apesar da contestação de Afrânio Peixoto que alega que a Sociologia fora fundada pelo Barão de Montesquieu (Charles de Secondat).

A sociologia é o estudo do ser social, e tem como método a observa-ção e a indução. Comte foi o autor de uma teoria geral da evolução filosófi-ca denominada “Lei dos Três Estados” que considera que o homem na compreensão e interpretação do mundo.O primeiro estado é teleológico, o metafísico e o positivista.

Outra figura relevante foi Adolphe Quetelet, o criador da Estatística Científica, fulcrado em três princípios estabeleceu as chamadas Leis Térmi-cas de Quetelet procurou demonstrar que no inverno se praticam mais crimes contra a propriedade, que no verão, são cometidos mais crimes contra a pessoa e, na primavera, acontecem mais crimes contra os costu-mes (devido a exacerbação da atividade sexual que se opera no início dessa estação).

Quetelet distinguiu a criminalidade feminina da masculina, tentou cor-relacionar o crime à idade cronológica do criminoso, observando que a incidência delitual é maior entre os 14 e 25 anos (no homem) e, na mulher, entre 16 e 17 anos, caindo o referido índice após os 28 anos.

O conceito de crime, e da pena e de criminoso vão variar para as inú-meras escolas, a saber:

a) Escola Clássica, Metafísica Crime é uma infração sendo a pena re-pressão. O criminoso é livre de querer ou não. A maioria dos penologistas desta Escola, entre eles Beccaria, Romagnosi, Filangieri, Pagano, Ros-si, Carmignani, Carrara, Ellerio e Pessina consideravam que o livre arbítrio é que determina a existência do crime.

b) Já para a Escola Positiva Determinista enxerga no crime uma ação anti-social que revela o criminoso temível; a pena é intimidação, correção, coação da temibilidade do criminoso de fato e dos criminosos possíveis, prevendo a defesa social.

c) A Nuova Scuola ou Escola Antropológica vê o criminoso como um ser anômalo, tachado de nascença para o crime ou para a possibilidade de delinquir, sobre o qual, além dos fatores intrínsecos(antropológicos), exer-cem também influência os extrínsecos do meio físico, a ambiência é de somenos importância.

O criminoso não é livre porque é determinado por motivos estranhos sendo a pena uma medida de defesa social, é a responsabilidade social que justifica a pena. Entre os seus partidários temos: Lombroso, Ferri, Garófalo, Marro, Sergi, Virgílio, Kurella, Corre, Zucarelli,, Nina Rodri-gues, João Vieira, Viveiros de Castro, Esmeraldino Bandeira, Cândido Motta e Moniz Sodré.

Os psicopatologistas acusam o criminoso de ser portador de uma de-generação mental mais grave seus principais defensores são Maudsley, Benedict, Kraft- Ebing, Magnam, Fere, Delbruck, Naeck, Gortner, Inter-genieros, Julio de Maros, Bombarda.

Para a chamada Escola Crítica, Eclética ou Terza Scuola o criminoso é produto de condições sociais defeituosas apregoava “ a sociedade tem os criminosos que merece”; os degenerados e suscetíveis que ela faz, mais facilmente se impressionam às causas sociais de delinquência.

O criminoso é responsável, não porque seja livre, mas porque, sendo são e bem desenvolvido tem aptidão para determinar a vontade por ideias e representações oriundas da Moral, do Direito, do senso prático que regulam a conduta de todos porque possuem responsabilidade moral.

Seus partidários: Gabriel Tarde, Lacassagne, Manouvrier, Laurent, Colajanni, Alimena, Carnevalle, Baer, Havelock Elles, Salleiles, Prins, Von Liszt, Drill, Von Hamel, José Higino, Lima Drumond, Aurelino Leal,

Clóvis Beviláqua e alguns doutrinadores socialistas como Turatti, Bata-glia, Bebel e Van Kan.

A Escola Neo-Clássica enxerga o crime como ato ilegal, é o ilícito jurí-dico, e a pena é intimidação geral a repressão ocasional; o criminoso é responsável socialmente e individualmente previne-se a maior parte dos crimes previsíveis. Seus partidários: Manzini, Rocco, Massari.

Escola Neo-Positiva já identifica o crime como uma to biossocial que revela a perigosidade do criminoso, o que deve ser tratado no sentido de proteger à sociedade, pelas mediadas de segurança. Seus partidários: Florian, Púglia, Asúa, Crispigni, Saldaña e Mendes Correa.

A posição de Afrânio Peixoto é bem diversa da dos outros autores faz transparecer a imprecisão de alguns conceitos como Política Criminal.

Lacassagne (professor de Medicina Legal de Lyon) remontando que-telismo contra a tese lombrosiana, apresentou uma doutrina sociológica do crime.

As teorias antropossociais relacionam os princípios constitucionais de Lombroso com os sociais, o meio social influi sobre o criminoso antropolo-gicamente-nato, predispondo-o para o delito. Tais teorias foram sustenta-das por Lacassagne e Manouvrier.

Lacassagne opôs-se à tese de Lombroso, era médico e via no cére-bro três zonas com funções diversas que regem as faculdades do indivíduo, a zona frontal, as intelectuais; a zona parental, as volitivas; a zona occipital, as afetivas.

Quando há perturbações na zona frontal aparece o louco; na zona pa-rietal advém a debilidade de vontade; o que permite o aparecimento do delinquente ocasional; na zona occipital, quando faculdades afetivas ficam perturbadas, aparece o verdadeiro delinquente, ou seja, o indivíduo predis-posto para o crime, que, quando as condições do meio e seu próprio ego-ísmo o impelem, virá efetivamente a delinquir.

Quanto maior for a desorganização social, maior será a criminalidade. Dizia que a sociedade é como um meio de cultivo, e afirmava que abriga em seu seio uma série de micróbios ( que são os delinquentes e que estes, não se desenvolverão, se o meio não lhes for propício).

Para Lacassagne os fatores sociais atuando sobre um indivíduo pre-disposto, é podem dar origem ao crime. Manouvrier foi um dos grande colaboradores de Lacassagne na luta empreendida contra as doutrinas de Lombroso, foi professor de antropologia na Universidade de Paris.

Aubry dizia que o crime tinha por causa principal o contágio moral que sofria o indivíduo predisposto, e citava, como por exemplo, a influência do cinema sobre as crianças e certos adolescentes.

A sua doutrina do contágio moral foi tratada no seu livro La contagion du meurtre( o contágio da morte). Dubuisson era partidário da influência da ocasionalidade sobre o indivíduo predisposto, acredita enfim que as causas sociais fortuitamente atuam sobre uma preexistente predisposição individu-al, determinando assim a sucessão delituosa.

Também o belga Vervaeck admite a existência de uma delinquência fruto da ocasionalidade, relacionada a acontecimentos eventuais, circuns-tâncias excepcionais e a fatores psicossociais.

As chamadas teorias sociais propriamente ditas legaram a etiologia do crime, aos fatores exógenos (de proeminência social) descredibilizando os fatores endógenos.

Dentre os seguidores dessas teorias que garantem que o crime tem uma origem notadamente social, destacam-se Gabriel Tarde, Vaccaro, Max Nordau e Auber.

Vaccaro declara que o crime é o resultado da falta de adaptação polí-tico-social do delinq\

ente com relação à sociedade em que vive. O delito é uma forma de rebeldia, de contestação uma vez que a lei serve para defender os interes-ses das classes sociais dominantes.

Gabriel Tarde não aceitava as ideias de Ferri sobre o trinômio crimi-nogenético(fatores físicos, sociais e biológicos) acrescenta que a influência do clima não está comprovada como fator criminal.

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Aliás sobre a influência física (que é considerável e uniforme) dentro do mesmo grupo social.

A polêmica entre Ferri e Tarde, poder-se-ia aduzir que os próprios fa-tores individuais(endógenos)pela mesma razão não poderiam subsistir isoladamente, até porque para que ocorra o crime, não basta que haja o indivíduo, necessário também que exista um grupo social, o que nos faria imergir num eterno círculo vicioso.

A autora já tve oportunidade em saliente em um artigo intitulado “Cri-me: definição e dúvida”, o quão social é o conceito e a etiologia do crime.

As causas cósmicas ou físicas do crime tais como as estações, tem-peratura, natureza do solo, produção agrícola, o clima e demais fatores naturais recebeu novas críticas do espanhol Arambusu em seu livro “La nuova ciência penal “ e atribuiu a Ferri o defeito de confundir o acessório com o principal e as causas ocasionais com as verdadeiramente determi-nantes do crime.

Ferri retrucando sempre, erigiu sua objeção como sendo puramente metafísica, porque tudo o que é necessário ou concorre para a verificação de um fenômeno é a causa determinante, explicando: “ o coração é o principal e as veias são acessórios, mas ninguém pode viver sem elas”.

A classificação de Ferri tem sido aceita por grande parte dos crimino-logistas.

O notável Tarde escreveu três obras importantíssimas para a Crimino-logia: “A Criminalidade Comparada”(1886), “As leis de Imitação” e a”Filosofia Penal”(1890).

Sepultando a doutrina do atavismo radical, Tarde aceita apenas resi-dualmente a doutrina lombrosiana ao aceitar o atavismo equivalente oriun-do de Guilherme Ferrero(que prevê certas predisposições mentais, psíqui-cas que permitem comparar o criminoso do homem primitivo).

Afirma Tarde em sua obra “Leis de imitação”, assegura que a delin-quência é um fenômeno marcadamente social e que motor propulsor de conglomerado social é a imitação.

Daí, retira-se a assertiva de que 90 % das pessoas não possuem ín-dole criminosa, submetendo-se à rotina social, na mesma esteira é o en-tendimento do notável espanhol Ortega y Gasset; dos 10% restantes; 9% possuem a iniciativa delituosa e o1 % corresponde aos indivíduos de espíri-to inovador(como Lênin).

É de Gasset autor da celebra frase símbolo internacional do altruísmo: “Eu sou eu e a minha circunstância”, afirma que os verdadeiros homens são aqueles que podem salvar ou melhorar o mundo, os que têm coragem de fincar os pés no fundo dos rios e nadar contra as correntes das águas.

A responsabilidade por um crime só pode existir se durante e após a sua prática, temos o mesmo indivíduo, portador da mesma personalidade. Tal conceito foi útil para fixar as circunstâncias eximentes e atenuantes da responsabilidade criminal.

Max Nordau alega que a causa determinante do crime é o parasitismo social(quando ocorre a marginalização do indivíduo ao grupo que como paria em nada contribuiu par a sociedade quer materialmente, quer moral-mente).

Auber sustenta que as causas do delinquir são as fobias(o temor à pobreza, por exemplo, levaria o homem à prática de crimes contra o patri-mônio e o medo o levaria a matar).

As teorias socialistas teve entre seus defensores Turatti e Colajanni, Bataglia, Laria, Lafargue, Berel, Van Kan e Hakorisky.

Turatti dizia que os motivos do delito não devem ser monopolizados apenas na necessidade ou precisão e na indigência, mas também na cobiça e pelo enorme contraste resultante entre a riqueza perante a pobre-za.

Alegava também que as precárias condições de habitação contribuem para a promiscuidade ensejando assim o aumento dos delitos contra os costumes.

Em Filosofia Penal, Gabriel Tarde trata da identidade pessoal e a se-melhança social que representam postulados basilares da responsabilidade penal.

Outro italiano, Colajanni seguidor das ideias de Turatti(que morreu na França exilado pelo fascismo) procurou analisar qual sistema econômico é ideal para a prevenção à criminalidade visando diminuir a prática delituosa na Itália.

Clamava por uma divisão de riqueza mais equitativa aliada a estabili-dade política poderia possibilitar a exclusão ou a eliminação da criminalida-de.

Também Bataglia, Lafargue e Bebel enxergam na má distribuição de riquezas a origem do crime. Vindo mesmo Beguim dizer que 60% ou mais dos crimes tem origem econômica.

Aliás, desde de Platão(a gênese do crime está relacionada pelas in-fluências econômicas) que atribuía à falta de educação dos cidadãos e má organização do Estado, como geratrizes do crime.

Aristóteles também visa na miséria a condição estimuladora da rebe-lião e do delito depois pulando para Rousseau que considerava que o homem nasce bom, a sociedade que o perverte, ou seja, o transformava em mau e criminoso;

por Durkheim que considerava o crime um fenômeno de normalidade social, porque constante e útil; no que foi rechaçado e combatido e existirá e nem por isso ela normal em biologia”.

Ainda sobre a utilidade do crime contraargumenta Ferri emite outro paradoxo: “ a dor é um aviso de órgão doente, que reage e reclama saúde assim como o crime reclama contra os defeitos sociais.”

Quando a justiça e o governo são incapazes de prover ao bem-estar e à ordem na sociedade, podem ocorrer os crimes e, o mais graves somos todos potencialmente vítimas pois não há segurança e nem paz social.

O crime mais que um grito estridente das dificuldades sócio-econômicas dos miseráveis e desvalidos também representa um índice avaliador do poder de organização, competência e diligência do estado em cumprir suas funções primaciais.

A vítima empresta voz aos gritos sufocados e não ouvidos pela indife-rença e incompetência do Poder Público em atingir e manter o bem-estar social.

De qualquer maneira, não se pode olvidar as justificativas sociais nas pesquisas criminógenas como também não podemos ser consideradas unicamente.

Manouvrier repele a Antropologia Criminal convencido da atipicidade dos criminoso, por isso mesmo inclassificáveis.

Uma das conclusões do criminalista belga é que a liberdade é indis-pensável no mundo moral, há um mundo inteligível onde reina a liberdade, o homem tem uma atividade consciente que o dirige para o bem.

No mundo real se vive a liberdade é relativa, e conseguintemente, a responsabilidade é também um conceito relativo.

Franz Von Liszt é considerado o pai Política Criminal sua obra princi-pal é intitulada pelos Princípios de Política Criminal, foi publicado em 1889.

Em seu Tratado de Direito Penal, em 1908, Manzini definia a Política Criminal como sendo “as doutrinas das possibilidades políticas com relação à finalidade da prevenção e repressão da delinquência”.

Para Manzini, a Política Criminal é o conjunto de conhecimentos que podem levar a realizar um plano real e não utópico.

Já para Fuerbach é o saber legislativo do Estado em matéria de cri-minalidade. Para Guilhermo Portella, é o conjunto de ciências que estudam o delito e a pena, com o fim de descobrir as causas da delinquência e determinar seus remédios.

Para Liszt é o conjunto sistemático de princípios segundo os quais o Estado e a sociedade devem organizar a luta contra o crime.

A denominação é anterior a Von Liszt, pois em 1793 Klinsroad a chamava de Política de Direito Criminal.

Os doutrinadores modernos afirmam que são penalistas e não médi-cos, psiquiatras, biólogos, etc. Não há antagonismo entre Política Criminal e Criminologia.

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A Política Criminal segundo Newton Fernandes e Valter Fernandes é o aproveitamento por parte do Estado, de todas aquelas normas que lhe servem para a prevenção e repressão da delinquência.

É conceito amplo(que não se baseia somente as normas abstratas de direito e, sim nas normas concretas determinadas pela Criminologia).

Já se evidenciava-se princípios da Política Criminal em Beccaria, em Manzini, Filanghier, Jeremias Bentham, Voltaire, Fuerbach, Henre, Van Habel, Klinsroad.

A Política Criminal é um ramo de Direito Penal apesar de utilizar da-dos da Antropologia Criminal, da Estatística Criminal, não se confunde com a Criminologia.

A suspensão condicional (sursis), o livramento condicional e o sistema hoje praticado no mundo todo, como por exemplo, o tratamento tutelar dos menores delinquentes também são conquistas da Escola da Política Crimi-nal.

Enfim, a Criminologia focaliza o fenômeno do crime de maneira bem diversificada, prescrutando-lhe as causas, enquanto que a Política Criminal tem como objetivo a descoberta e a utilização prática dos processos efica-zes de combater ao crime, necessita recorrer à conclusões criminológicas e à Penologia que ausculta os resultados com as sanções penais.

Por muitos autores tem-se conceituado a Política Criminal como ciên-cia e a arte dos meios preventivos e repressivos de que o Estado, no seu tríplice papel de Poder Legislativo, Executivo e Judiciário dispõe para consecução de seus objetivos na luta contra o crime.

CRIMINALÍSTICA

O aperfeiçoamento dos métodos científicos tem contribuído para a elu-cidação de muitos crimes. Um simples fio de cabelo ou uma lasca de unha permitem às vezes que se aponte com certeza um assassino.

Criminalística é a técnica que resulta da aplicação de várias ciências à

investigação criminal, colaborando na identificação de criminosos. Seu objetivo é o estudo de provas periciais referentes a pegadas, manchas, impressões digitais, projéteis e locais de crime, entre outros indícios.

Além de impressões digitais, normalmente encontram-se no local do

crime impressões de diferentes origens, capazes de levar à identificação de seu autor, como as de dentes em frutas, de pés descalços ou calçados, de instrumentos. Marcas de pneus permitem estabelecer sua marca, tipo e desgaste, possibilitando a identificação do veículo, o cálculo da velocidade e o sentido do deslocamento. As impressões de pés descalços, pelas dimensões e particularidades, são fonte segura de informação; nas de pés calçados, consideram-se a forma e disposição dos relevos, as peças metá-licas ou de borracha que os guarneçam e a intensidade do uso. Os sulcos permitem aos peritos dizer se a pessoa estava andando ou correndo.

Manchas de sangue, de esperma, de fezes, de muco, de graxa e de

tinta constituem material relevante. A análise das manchas de sangue, secas ou não, permitem determinar de que parte do corpo se originam e de quem. A identificação dos pêlos, embora difícil, é de grande importância. Nos mamíferos, há o pêlo propriamente dito e a penugem, podendo-se determinar a espécie animal, a região e o sexo do animal de que provém e sua idade provável.

O estudo dos ferimentos da vítima pode apontar o tipo de arma utiliza-

da no crime. Poeiras são recolhidas das vestes, calçados, cabelos, de sob as unhas, armas e utensílios e, uma vez determinada sua composição, podem dar indicações sobre o delito, a vítima e o suspeito, e até sobre o local de proveniência de ambos. O retrato falado, hoje feito muitas vezes com a ajuda de computador, visando à identificação dos criminosos, tem largo emprego.

Descobre-se a origem de fabricação de uma arma de fogo, quando não

evidente, através dos bancos de prova. Os registros policiais facilitam a identificação do proprietário. O raiamento das pistolas automáticas imprime aos projéteis elementos individualizadores exatos, possibilitando determinar o tipo e a própria arma de que foram disparados; igualmente reveladora é a percussão da agulha do cão na espoleta do cartucho. Essas características

somam-se nas armas automáticas às marcas do extrator e do batente do ejetor que expele a cápsula depois do disparo. Quase sempre engraxadas, as impressões nelas encontradas são colhidas por processo fotográfico.

O exame da fumaça ajuda a determinar sua causa e o da mancha do

fogo fornece o local de seu início; os traços de fuligem e de carbonização indicam o caminho seguido pelas chamas. Constituem circunstâncias suspeitas a presença indevida de materiais inflamáveis, a ocorrência injusti-ficada de vários focos e a existência de extintores fora de uso ou bloquea-dos.

A documentoscopia visa à busca das falsificações por alterações do-

cumentais subtrativas, aditivas ou cronológicas e produções imitando grafismo alheio. A cromatografia é empregada na determinação e identifi-cação das tintas de escrever. Há processos que, em determinadas circuns-tâncias, permitem estabelecer a idade correlativa entre tintas aplicadas, fixar a sucessão de traços na escrita, identificar o instrumento empregado, reproduzir textos rasurados ou lavados e reconstituir documentos incinera-dos. Pode-se identificar uma caligrafia, as escritas dos semi-analfabetos, dos cegos e dos incapacitados. Nos textos datilografados, caracteriza-se o tipo e máquina utilizada, a época de um escrito e quem foi o datilógrafo, e constata-se a utilização de processos de falsificação da tinta, da impressão e de papel-moeda, na sua estrutura e característica.

Os locais de crime devem ser meticulosamente inspecionados, dada a

pluralidade de aspectos, sendo importante resguardá-los até a chegada dos técnicos. É importante colher fotografias de situação, que detalhem os aspectos gerais e particulares dos indícios. Na ocorrência de cadáver, terá relevo informativo sua posição e relação com o meio. ©Encyclopaedia Britannica do Brasil Publicações Ltda.

A CRIMINOLOGIA E A CRIMINALIDADE Texto extraído do Jus Navigandi http://jus2.uol.com.br/doutrina/texto.asp?id=4137 Leonardo Rabelo de Matos Silva advogado, mestrando em Direito pela UNIG/RJ A criminologia define-se, em regra como sendo o estudo do crime e do

criminoso, isto é: criminalidade. A Criminologia, o estudo do crime e dos criminosos, dentro de um recorte causal — explicativo, informado de ele-mentos naturalísticos (psicofísicos), ‘‘é ciência social ou não será ciência’’

Não é uma ciência independente, mas atrelada à Sociologia, à aprecia-

ção científica da organização da sociedade humana. Ao lado da Sociologia, se mostra numa condição de contrastante de ‘‘uma das mais jovens e uma das mais velhas ciências’’.

Jovem e livre até da rotulação relativamente recente do respectivo vo-

cábulo, um termo híbrido, por Augusto Comte, do latim socius, amigo ou companheiro, e do grego logos, ciência. Velha, uma vez que a análise da vida gregária dos seres humanos já era praticada de vários modos pela Antropologia, bem antes de sua aparição no panorama cultural.

No entanto, não só do pensamento sociológico se sustenta a Crimino-

logia, que, pelo contrário, possui aparência eminentemente multidisciplinar, sempre se enriquecendo com diferentes ciências posicionadas à sua volta e áreas do conhecimento afins ou afluentes.

A maioria vai listada adiante: primus inter pares, o Direito Penal, ramo

da Dogmática Jurídica que definem quais condutas tipificam crimes ou contravenções, estabelecendo as respectivas penas; a Medicina Legal (aí compreendida a Psiquiatria Forense), aplicação específica das ciências médicas, paramédicas e biológicas ao Direito; Psicologia Criminal, cuja matriz é a Psicologia (comum), ciência ocupada com a mente humana, seus estados e processos: a Antropologia Criminal (Ferri, Lombroso e Garofalo), que assume para si a responsabilidade de pesquisar e desenhar supostos perfis dos infratores penais, a partir de disposições anatômicas e estigmas somáticos particulares, hoje um pouco desprovida do crédito que foi desfrutado antigamente; a Sociologia Criminal (subdivisão da Sociologia, filiada à Sociologia Jurídica), fundada por Enrico Ferri, que visualiza o ilícito penal como fenômeno gerado no desenvolvimento do convívio, em escala

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ampla, dos homens, analisando a importância direta ou indireta do ambien-te social na formação da personalidade de cada um; a Psicosociologia Criminal, subordinada a Psicosociologia, suma psicológica dos fatos soci-ais; a Política Criminal, que rastreia e monitora os meios educativos ou intimidativos de que dispõe ou deve dispor o Estado, inclusive no terreno da elaboração legislativa, para o melhor desempenho, em seu papel de, pre-venir e reprimir a criminalidade, procurando ela, paralelamente, fornecer fórmulas para se achar a proporção ideal entre a gravidade da conduta de um determinado criminoso ou contraventor penal e o quantum da sanção a aplicar-lhe, face a face com a situação concreta, a Lógica Jurídica, no seu segmento que se dirige para a fenomenologia e a problemática do crime, lastreada na Lógica formal, pura (ciência da razão, em si mesma).

Igualmente, conta a Criminologia com complemento de ciências auxilia-

res: a Genética, ciência da hereditariedade; a Demografia, levantamento numérico populacional (taxas de natalidade e de mortalidade, distribuição de faixas etárias, expectativa de vida, migrações etc.); a Etologia, investi-gação de natureza científica do comportamento humano, de acordo com as leis gerais da Psicologia, levando em conta às múltiplas influências e aco-modações que as circunstâncias ambientais exercem, de ordinário, sobre o comportamento da pessoa ou da sociedade; a Penalogia (ou Penologia) que Francis Lieber, o criador da palavra (1834), conceituou como ‘‘o ramo das ciências criminais que cuida do castigo do delinquente’’, a Vitimologia, estudo do comportamento da vítima, com avaliação das causas e dos efeitos da ação delitiva, esquadrinhada sob o prisma e a interação da dupla penal criminoso/vítima, a Estatística, conjunto de métodos matemáticos, centrada em dados reais, de que se serve para construir modelos de pro-babilidade relativos a indivíduos, grupos ou coisas (por exemplo, defasa-gem quantitativa ou qualitativa na oferta de empregos), quando, numa fonte especializada (Estatística Criminal) retrate fatores ou indutores de criminali-dade. "Toda ciência, proclamou Aristóteles, tem por objeto o necessário".

Não é tarefa fácil para a Criminologia lidar com a delinquência constan-

temente sofisticada, assim como com a violência, que hoje se banalizou. Para ficar mais a par do itinerário, e dos atalhos, que conduzem ao delito, sobretudo nos agregados sociais urbanos de densa população, a Crimino-logia precisa traçar uma tática eficaz. A criminologia, não trata unicamente da pessoa humana, porque o homem é o agente do ato anti- social, mas sobre este agente existem várias causas e muitas ainda desconhecidas, que modificarão o caráter essencialmente humano ou antropológico do fenômeno. A criminologia é e deve ser considerada de acordo com a maio-ria dos estudiosos do assunto, uma ciência pré-jurídica, sua matéria de estudos é o homem, o seu viver social, suas ações, toda sua evolução, como espécie e como indivíduo. Para um estudo completo de criminologia devemos estudar tanto a filosofia, sociologia, psicologia, e a ética. Esta ultima, que vai à base moral da humanidade, daí deve-se entender melhor o que é essa Moral; pois o Código Penal apóia-se sobre a moral.

Esta ciência social que estuda a natureza, a extensão e as causas do

crime, possui dois objetivos básicos: a determinação de causas, tanto pessoais como sociais, do comportamento criminoso e o desenvolvimento de princípios válidos para o controle social do delito. Desde o século XVIII, são formuladas várias teorias científicas para explicar as causas do delito. O médico alemão Franz Joseph Gall procurou relacionar a estrutura cere-bral com as inclinações criminosas. No final do século XIX, o criminologista Cesare Lombroso afirmava que os delitos são cometidos por aqueles que nascem com certos traços físicos hereditários reconhecíveis, teoria refutada no começo do século XX por Charles Goring, que fez um estudo comparati-vo entre delinquentes encarcerados e cidadãos respeitadores das leis, chegando à conclusão de que não existem os chamados "tipos criminais" com disposição inata para o crime. Na França, Montesquieu procurou relacionar o comportamento criminoso com o ambiente natural e físico. Por outro lado, os estudiosos ligados aos movimentos socialistas têm conside-rado o delito como um efeito derivado das necessidades da pobreza. Ou-tros teóricos relacionam a criminalidade com o estado geral da cultura, sobretudo pelo impacto desencadeado pelas crises econômicas, as guer-ras, as revoluções e o sentimento generalizado de insegurança e desprote-ção derivados de tais fenômenos. No século XX, destacam-se as teorias elaboradas por psicólogos e psiquiatras, que indicam que cerca de um quarto da população reclusa é composta por psicóticos, neuróticos ou pessoas instáveis emocionalmente, e outro quarto padece de deficiências mentais. A maioria dos especialistas, porém, está mais inclinada a assumir

as teorias do fator múltiplo, de que o delito surge como consequência de um conjunto de conflitos e influências biológicas, psicológicas, culturais, econômicas e políticas.

Ao lado do desenvolvimento das teorias sobre as causas do delito, são estudados vários modelos correcionais. Assim, a antiga teoria teológica e moral entendia o castigo como uma retribuição à sociedade pelo mal come-tido. Jeremy Bentham procurou que houvesse uma relação mais precisa entre castigo e delito e insistia na fixação de penas definidas e inflexíveis para cada classe de crime, de tal forma que a dor da pena superasse apenas um pouco o prazer do delito. No princípio do século XX, a escola neoclássica rejeitava as penas fixas e propunha que as sentenças varias-sem em função das circunstâncias concretas do delito, como a idade, o nível intelectual e o estado psicológico do delinquente. A chamada escola italiana outorgava às medidas preventivas do delito mais importância do que às destinadas a reprimi-lo. As tentativas modernas de tratamento dos delinquentes devem quase tudo à psiquiatria e aos métodos de estudo aplicados a casos concretos. A atitude dos cientistas contemporâneos é de que os delinquentes são indivíduos e sua reabilitação só poderá ser alcan-çada através de tratamentos individuais e específicos.

Entretanto, há na ciência - Criminologia - já um acervo com que se de-

ve contar, para ir em demanda das novas rotas que se nos deparam. E esse acervo já vem sendo colhido em longas décadas de estudo e de meditação, armazenando largos cabedais que constituem uma bibliografia inumerável, na qual, ao lado de muito joio, excelentes contribuições se podem contar. Todavia, alguns menos ansiosos por avançar sempre na procura da solução de múltiplas incógnitas que ainda nos enfrentam, crêem desde logo de assentar a Criminologia em bases suficientemente estáveis.

O crime apresenta uma transformação, ou ampliação, que de uma for-

ma aceitavelmente denominada "normal", se projeta hoje para configura-ções que poderiam ser consideradas "anormais". Apenas se deve ponderar que essa atual anormalidade assim se nos apresenta por não terem podido estar os gabaritos normativos acompanhando sempre as transformações psico-sociais que a época atual oferece, dada à tumultuosa evolução dos sistemas de vida e das colisões sociais. E daí desde logo se nos apresenta um dos problemas básicos da Criminologia: é que ela se desenvolveu a partir do Direito Criminal, mas, por assim dizer, disciplinada, ou jungida, às condições penais e, ainda, demarcada, em seus horizontes, por uma finali-dade que ia mais às situações pós-delituais, e avança preferentemente para os aspectos punitivos e, depois, recuperados do delinquente.

Desta sorte, há uma Criminologia ainda hoje definida como um ramo

subsidiário do Direito Penal, e que serviria mais para a correta aplicação desse mesmo Direito; visaria ela ilustrá-lo com os conhecimentos que se foram adquirindo quanto à pessoa do criminoso, às condições do crime dentro da dinâmica delituosa e da eventual motivação do ato anti-social, inclusive pela incorporação da vitimologia hoje de tanta nomeada nos círculos científicos.

Tratar-se-á de uma Criminologia que se poderá denominar de pragmá-

tica e que, na escala do conhecimento, sempre definida como sendo de posição pré-jurídica. A partir dos Códigos, e atendendo ao seu espírito, busca essa Criminologia oferecer ao aplicador da Lei os meios mais efeti-vos e esclarecidos para que o cumprimento dos dispositivos penais se torne mais cientificamente apoiado e informado.

Nessa mesma ordem de aplicação científica dos conhecimentos crimi-

nológicos se situou o nosso sábio legislador de 1940 quando, no já citado artigo 42 do Código Penal, ainda vigente, preceituou que o Juiz, para aplicar a pena, deverá atender "aos antecedentes e à personalidade do agente, à intensidade do dolo ou grau da culpa, aos motivos, às circunstân-cias e consequências do crime".

Aí estão, pois, as vias da Criminologia pragmática, auxiliar do Direito,

para assessorá-lo, em matéria de sua competência, e visando a personali-zação do tratamento penal. Como nem sempre se pode realizar este exame do delinquente antes do julgamento, momento esse que seria idealmente o ótimo pra o levar a efeito – e como é determinado pela Lei, segundo ficou registrado – quando menos deve essa análise do criminoso ser posta de triagem suficientemente capaz de apreciar a pluridimensional personalidade do agente anti-social. E dessa análise deverá surgir a orientação a seguir

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Criminologia A Opção Certa Para a Sua Realização 13

no tratamento, para melhor perspectiva de êxito do mesmo, desde que bem adequado à personalidade do delinquente e às várias opções que se ofere-çam dentro do sistema penitenciário existente.

Além desta Criminologia pragmática, ainda e sempre ao lado do Direi-

to, para servi-lo nas suas indagações sobre a criminogênese dos fatos delituosos, poder-se-á colocar a Criminologia especulativa, causal da genética, que teria uma posição para-jurídica, cuidando da grande ambição de todos os criminólogos, ou seja, de indagar e identificar as causas da criminalidade.

É a grande meta que os estudos criminogenéticos têm como alvo e que

- se acaso lá pudéssemos aportar - nos levaria, quiçá, um dia, a poder aplicar, com total sucesso, o velho preceito, que dita: "sublata causa tollitur effectus" ideal fagueiro dos estudos criminológicos, mas que tem sido ainda a miragem fugidia de todas as esperanças causal-explicativas do delito.

Recorde-se, ainda uma vez, que, inicialmente, houve a fase biológica

estricta; a Somatologia criminal, com os seus tipos lombrosianos, pretendeu fornecer a primeira chave para abrir a incógnita criminogenética, chegando-se até à abstração do criminoso nato, que não chegou a vingar. Recolhidos os contributos desta fase, prosseguiram as esperanças quando se iniciou a era endocrinológica, de que nos dá informação assaz completa a monu-mental obra de Mariano Ruiz-Funes, Mestre espanhol que, na Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo, proferiu o curso "Endocrinologia Y criminalidad", de 1929, que marcou época pela amplitude e segurança de seus conceitos. Esta fase funcional das endocrinias, por vez, deu ensejo à concepção biotipológica, já integrada do tipo humano vivente, e que logo se desenvolveu para a Biotipologia criminal. E a cada passo, novas esperan-ças, mas acompanhadas do reconhecimento de que era mister da Psiquia-tria forense, a então recente concepção freudiana, mais euforia dominou o campo da criminogênese - e a Psicanálise criminal dava a entender que tudo estava resolvido a partir de então.

O que estava a se verificar era o entusiasmo que cada "pílula científi-

ca", cada nova fresta entreaberta, parecia anunciar-se como fórmula final para a solução da incógnita criminogenética. Mas, a cada nova esperança, depois se verificava que nem tudo estava resolvido, e que só mais um ângulo, de abertura estreita, no caminho cada vez mais longo da via causal do delito. E como já foi dito, novas pílulas foram se acrescendo, até à diencefalose, criminógena, até aos conjuntos cromossômicos aberrantes (XYX, XXY etc.), até às indagações citoquímicas, enzimáticas, até... aonde puderem ser levadas as observações mais agudas de campos cada vez mais miúdos e estreitos.

Mas desde logo se percebe que a solução bio-criminogenética é um dédalo em que se tem perdido a ânsia de resolver o problema apenas por esse lado. E, ademais, desde logo se verificou que só o exame do "uomo delinquente" não bastava, visto que ele era também produto do meio. E a Sociologia se aplicou também aos estudos criminogenéticos, dando origem á Sociologia Criminal, que se arrogava, por sua vez, a pretensão de Ter em si a solução sempre tão ambicionada. Já vinha, aliás, de Platão, este pen-samento precursor, "atribuindo os crimes à falta de educação dos cidadãos e má organização do Estado", como lembrava oportunamente Afrânio Peixoto, em sua "Criminologia". Com Durkhein, Ferri, Lacassagne, Tarde, Turati, Bataglia, Lafargue, Bebel... desenvolveu-se esta escola que opunha, ao falar biológico, a gênese social dos delitos. E houve, incrivelmente, um dissídio que pretendeu, cada um do seu lado, impor a conclusão de que o fator mesológico, ou o fator biológico, é que determinava prevalentemente o crime. Só mais tarde, e agora mais lucidamente, é que veio a prevalecer o princípio de uma globalização de todos os chamados fatores criminogenéti-cos que, num caso, podem oferecer predomínio da influência mesológica, num outro caso, podem apontar a biologia como sobressalente, e, em muitos outros, se verificava certa equivalência na atuação de tais fatores. Mas sempre se reconhecendo, em todos os casos, a presença de ambos esses fatores, como desde Ferri, já se fazia patente. Daí resultou, até, uma classificação de criminosos, que tem feito sucesso, e que é absolutamente natural em sua formulação.

Mesmo quando muito se haja batendo neste caudal das possíveis cau-sas do delito, tanto no campo da biologia, quanto no da mesologia, ainda devemos confessar que a gênese delitual continua a oferecer pontos pe-numbrosos. De onde, as palavras de Roberto Lyra Filho.

É que não há fatores específicos para o crime, que o venham a ocasio-nar dentro de um determinismo irreversível - nem do ponto de vista endó-geno, nem dentro do ângulo exógeno. Essa identificação de causas especí-ficas, como se fossem sintomas patagnomônicos, era a grande ambição do lombrosianismo, para desde logo caracterizar os criminosos. Ao início de sua carreira, tinha o sábio de Turim essa visão: "um periodista francês, Laveleye, que o conheceu neste estágio de sua crítica científica, registrou a seguinte impressão sobre o emérito investigador, tocada de laivos de ironia:" Apresentaram-me esta noite um jovem sábio desconhecido, cha-mado Lombroso; fala de cenas caracteres pelos quais se poderia reconhe-cer facilmente o delinquente. Que útil e cômoda descoberta para os juizes de instrução...

Buscava-se, então, a solução de um problema de conduta humana

sem atentar holisticamente para o autor desse tal comportamento. Não só a disputa de primazias bio ou mesológicas, como também, e principalmente, a exclusão do núcleo ético da personalidade, entre os núcleos de geração do ato anti-social, levaram a decepções no campo da caracterização natu-ralística das causas do delito. E só mais moderadamente se volvem as mentes dos criminólogos para uma conceituação mais globalizadora da gênese delital, incluindo todos os elementos com que se deve contar: os chamados fatores criminogenéticos, e também os fundamentos éticos da personalidade, sobre os quais agem exatamente aqueles fatores. O "cienti-ficismo" (expressão com que se busca denominar a falsa posição de uma ciência daltônica que não sabe ver senão o seu estreito espectro de visada) deve-se curvar à evidência de que, se podemos falar, como dizia Di Túllio e, fatores crimino-impelentes, devemos também reconhecer, por parte daquele núcleo ético, a existência de fatores crimino-repelentes. O ato anti-social só resultará se, à ação dos ditos falares que impelem para o crime, se somar à ação consensual do núcleo ético da pessoa sobre a qual eles agem. Daí que é necessário não nos fixarmos somente na Biologia criminal e na Sociologia criminal, olvidando que, em cada pessoa, o que realmente a caracteriza como ser humano é a existência, ainda e sempre vigente, de um arbítrio. Não é ele livre na existência do homem, como o é era sua essência: mas é sempre, em certa medida capaz de enfrentar a ação dos fatores criminogenéticos, E porque, às vezes, cede é que se faz mister julgar o homem inteligentemente, a fim de saber até onde e como agiram os referidos fatores, e até que medida e de maneira o núcleo moral consen-tiu, ou se dobrou, à ação dos ditos fatores.

O reconhecimento de uma avaliação globalizante das condições per-

sonalíssimas de cada criminoso, em razão desse conjunto ora referido, leva a um neo-ecletismo penal. Assim, só será válida a retornada da gênese criminal se, às causas endo e exógenas, soubermos anexar o núcleo sobre o qual elas agem - ou seja, a essência ética da personalidade - sem cuja consideração a criminogênese clássica, ou ortodoxa, cairá na decepção de que nos falava Afrânio Peixoto. Como entender a ação de fatores crimino-genéticos sem os coligar à pessoa humana, e ao núcleo dessa pessoa no qual, enfim, se delibera? Atualmente, tomadas mais humildes - e sábias, por isso - as pretensões criminogenéticas naturalísticas, pode-se passar àquele neo-ecletismo penal, em que, como causas, se escalonam as ambi-entais, as bio-psíquicas e as éticas (ou volitivas, em termos de deliberação, ou de arbítrio).

Então, só se podendo caracterizar o ratio crime se, aos fatores endo e

exógenos, se associar o fato ético, esta tripeça - bio-psiquismo, mesologia e anuência ética - deverá ser considerada como o conjunto indispensável para se poder falar em delito, em seu sentido mais exato, científico e com-preensivo de um complexo pessoal que só assim se constitui completamen-te.

É desse fato fundamental, mas que se tem mantido sem a devida cono-

tação consciente de seus elementos constitutivos, que decorre o neo-ecletismo penal, o qual proclama estas verdades basilares, sem as quais a Criminologia nunca alcançará uma formulação mais inteligente a adequada das suas postulações.

Desde que integremos estas noções, de que, na gênese criminal, de-

vem ser considerados os falares bio e mesológicos, e também o falar ético leva-nos a admitir, todavia, uma separação das capacidades que podem apreciar e decidir sobre a forma de atuação e sobre a ordenação dos seus respectivos valores. É que os fatores bio-mesológicos - que procuram

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explicar a gênese criminosa - são de apreciação criminológica estrita; ao posso que o fator ético - onde se insere a condição que procura justificar a origem do delito - só pode ser apreciada pela capacidade do Juiz. Daí, surge aquela distinção do Prof. López-Rey Y Arrojo, ao recordar que se deve distinguir precisamente entre o que tende a explicar, daquilo que pode justificar uma conduta anti-social. Se escusável, ou não, só o Juiz pode decidir mas, para tanto, deverá ele atender às causas aferíveis que podem explicar porque a deliberação humana tenha sido mais ou menos compro-metida pela influência dos fatores criminogenéticos endo e exógenos; e até que o ponto ético teria sido consensual com a prática criminosa.

Por isso, e para isso mesmo, deve ser considerada também, ao lado da

Criminologia pragmática (pré-jurídica) e da Criminologia especulativa (para-jurídica), uma Criminologia crítica ou, melhor, dialética, ao estilo do que o propõe Roberto Lyra Filho, a cuja posição seria de colocação metajurídica. Esta Criminologia dialética deve propor a si mesma um estudo das muta-ções do conceito social da vida humana. Se voltarmos ao início destas considerações, e nos recordarmos de que há uma criminalidade nova, devemos consequentemente ter a decisão de rever os valores sociais, éticos e jurídicos, em face da sociedade tecnocrática em que ingressamos, para buscar as formas adequadas para uma reformulação, inclusive estru-tural, das condições anuais da vida humana.

Evidentemente, a tripartição da Criminologia em seções - pragmática

(pré-jurídica), especulativa (para-jurídica) e dialética (metajurídica) - não quererá significar, de forma alguma, que haja uma separação estanque entre esses departamentos; antes, eles se entrosam e entre si estabelecem uma linha de plena fusão. Apenas, em graus sucessivos, procura-se ampli-ar progressivamente o estudo e o conhecimento da dificílima e ampla ciência que é a Criminologia, para chegar até a formulação de princípios que solucionem os intrincados problemas da vida contemporânea e preve-jam as possíveis rotas a seguir para uma prevenção mais efetiva dos conflitos humanos, profilaxia essa que, ainda aqui, ou principalmente aqui, é o alvo supremo das nossas cogitações, e que deve pretender chegar até às próprias estruturas e valores fundamentais, a fim de advertir quanto à conveniência ou necessidade de se realizar as mudanças possíveis e indicadas para se avançar no objetivo de uma Justiça Social mais efetiva. E só a partir de uma base que considere realisticamente, mais instruidamen-te, os fatos fundamentais da vida humana hodierna, com todas as suas especificações mais compreensivas da conduta dos homens, é que pode-mos fazer prevenção criminal válida - e não ficarmos só na obsessão de saber como lutar mais efetivamente contra o delito já praticado, em termos de penitenciariarismo, supostamente ressocializante. Assim, se fará a macro-criminologia de que nos fala, sábia e oportunamente, usando ex-pressões trazidas das Ciências Econômicas, Roberto Lyra Filho, indo, então, mais além da micro-criminologia que se atém ao âmbito de estudo apenas do crime e do criminoso.

No que se refere à Criminologia especulativa, sem dúvida alguma,

necessita-se do seu estudo pormenorizado, fazendo sentir quantas infor-mações úteis se recolhem na análise pluridimensional que busca das causas do delito, não só em sentido casuístico, e em perspectiva globaliza-dora, em fluxo analítico-sintético, como também em sentido de generaliza-ção dos conceitos que daí decorreram, desse conhecimento individualiza-do, para prudentes considerações gerais. Dentro desse estudo, outrossim, é necessário deixar bem patente que cada delinquente deve ser considera-do em seu contorno situacional, de modo a permitir uma avaliação dos fatores que possam explicar a sua conduta, e daqueles que a possam justificar, ou não. Ou seja, sopesar ambos os campos em que se desenvol-ve a atuação humana - o daquele que sofre a ação dos fatores bio-psicológicos e sociais, e o daquele em que se manifesta o fator deliberativo, em razão do arbítrio, à luz da ética exigível dentro do "mínimo de moral" que se espera para a conduta humana.

Por fim, no que se projeta dentro do campo imenso e intensamente se-dutor da Criminologia dialética, há que ensejar um amplo debate em busca, ansiosa e plena de inquietude interrogativa, do quanto se possa vislumbrar dentro da avaliação epistemológica do que, em verdade, possa continuar a ser admitido e respeitado, e do quanto se deva ciente e consci-entemente entender objeto de modificação, de reformulação.

É evidente que, por sua mesma posição de ciência auxiliar do Direito, a Criminologia só poderá ir ao ponto de oferecer a sua colaboração, sem

pretender dogmatizar, o que seja uma atitude, aliás, contrária ao espírito íntimo dessa disciplina especulativa e de investigação científica. Mas, se for válida esta atitude, estudemos mais afincadamente esta Ciência Criminoló-gica, para podermos oferecer uma cooperação cada vez mais instruída e idônea, e sacar dela prestimosas conclusões.

Recorde-se que a referida definição assim soa: pena é "o tratamento

compulsório ressocializante, personalizado e indeterminado". Retira-se dessa definição um conceito acolhedor da mais atualizada

doutrina neo-eclética, iniciando-se por caracterizar a pena como tratamento. A introdução dessa expressão - hoje de livre curso para os próprios jus-penalistas - desde logo dá a demonstração de como a influência médico-psicológica foi levada avante e com plena aceitação, em certos aspectos, pelos cultores do Direito. Nos nossos dias, já não causa espécie o emprego dessa palavra, que traz em seu bojo um conteúdo de índole médica, antro-pológica, clínica.

Fala-se, pois, em tratamento como um processo a que deve ser sub-

metido o criminoso e que visa corrigir os defeitos, que possa haver apre-sentado em sua personalidade. É claro que o termo até ultrapassa, de muito, o que em si mesmo quereria traduzir, desde que esse tratamento às vezes em nada será médico, podendo ser apenas pedagógico, ou social. E sempre deverá admitir parâmetros jurídico-penais sob os quais ainda e sempre deve permanecer a aplicação da Justiça, segundo o venho defen-dendo dentro do neo-ecletismo penal.

Assim, tratamento será a pena, dentro do amplo conceito ora expendi-

do, em que entra a atividade médica propriamente dita, mas em que, ao lado dela, entra também a pedagogia, o cultivo de uma profissão e que a pessoa humana tem de considerar, como "animal gregário" que é, e que lhe impõe o estabelecimento dessa Inter-relação. E isso deve assim ocorrer para que o ser humano, no conjunto complexo da sua personalidade, seja deveras tratado lá onde o exigir a frincha que permitiu a maior influencia crímico-impelente, seja essa debilidade de ordem somático, fisiológico ou cultural, além de ética.

A prática tem demonstrado que a "prisão não cura, corrompe", segundo

a frase feita que já corre mundo. Mas se a prisão ainda assim se apresenta, é apenas porque ela não se deixou embeber do seu legítimo sentido e da sua verdadeira meta.

Para que a distorção do tratamento não venha a ocorrer na prisão, le-

vando-a para a perversão moral, é que tanto se está lutando no campo da doutrina para iluminar uma prática mais sadia. E o que aqui se vem dizen-do, quanto ao tratamento, visa exatamente uma prisão que não corrompa, que não destrua mais o que deve reconstruir. E este último alvo é, sem dúvida, possível, para os legítimos penalistas, cônscios, em verdade, da ciência a que servem.

E enfim, fale-se em tratamento, sempre como alvo que se sucede ao

conhecimento da personalidade e ao reconhecimento das suas possíveis falhas, deficiências ou defeitos.

Ainda dentro desse tratamento, deve-se considerar o seu papel disci-

plinador, ou seja, criar ou desenvolver no delinquente a necessidade basilar de integrar, em sua maneira de ser, uma estrutura disciplinatória de todas as suas vivências, tomando-as sintônicas com a convivência - obrigatória - a que somos levados pela própria natureza da nossa vida social.

Disciplina, outrossim, não quer significar despersonalização, amolga-

mento da vontade, submissão passiva a outrem, e coisas desse tipo. Com disciplina quer-se significar a conjugação daquilo que somos, em todos os nossos atributos e prerrogativas, com a necessidade da convivência, que sempre impõe necessárias limitações e normas. O que define uma socie-dade é justamente uma unidade de ordem, que põe sentido, pragmatismo e possibilidade de sobrevivência, de todo um grupo, mas que não pode abolir necessariamente a personalidade de cada um, antes até lhe dá condições de preservação e permanência. Sem essa unidade de ordem, a vida seria insuportável e o caos social só seria de esperar. E aquilo que se poderia entender como liberdade individual - sempre tão ardorosamente defendida, até além dos seus convenientes limites - desapareceria, envolvida a pessoa

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no turbilhão em que não poderia sequer sobreviver. Daí que a unidade de ordem é indispensável à própria liberdade, garantindo-a, ainda que discipli-nando-a.

Disciplinado, em que sentido? No de união, conjugação, cooperação de

esforços e de sacrifícios para o bem comum. Sem esse princípio, a liberda-de seria licenciosidade, a pessoa passando a ser uma vítima da solidão que essa própria liberdade então imporia - pois que viver em sociedade é, essencialmente, conviver (com equivale a junto, e conviver significa viver junto).

Essa disciplina social precisa ser ensinada e reestruturada em cada

criminoso. o seu crime nada mais é do que um ato, afinal, de indisciplina. É mister que o ensino do respeito e da integração dessa disciplina social seja ministrado subjetiva e objetivamente ao delinquente. E até com um cuidado muito zeloso, eis que o criminoso, ao deixar a prisão, certamente vai encon-trar uma sociedade diversa daquela que ele deixou ao iniciar o cumprimen-to da pena, e isso devido ao vertiginoso desenvolvimento da era presente. Desta forma, acompanhando esse desenvolvimento, é indispensável que o regime penitenciário coloque com o devido cuidado e com a necessária sapiência um sistema disciplinar que prepare o delinquente a compreender que, sem aquelas limitações indispensáveis para a manutenção desse regime de convivência, sem essa obrigatória disciplina, ao voltar ao conví-vio social, este lhe imporá, como resultante da sua própria essência, aque-las e até novas limitações.

Esse regime disciplinar começa por impor ao criminoso um tratamento

compulsório, isto é, um regime que não é adotado espontaneamente, mas que se é obrigado a aceitar e a seguir. Haverá aí um certo ressabio aflitivo, e até retribuitivo. Mas não há mal algum em que se mantenha, na dose adequada, esse caráter também, desde que, enfim, o criminoso é submeti-do a esse tratamento a partir de um ato anti-social que praticou, em que foram feridos interesses, valores, normas, de importância para a manuten-ção da comunidade. E até hoje existe uma corrente que tende para uma revisão do excesso de liberalidade em termos de regime penitenciário, com uma também excessiva preocupação com o welfare of the offender, como se só o bem-estar do delinquente importasse e fosse o motivo e a razão de ser dos sistemas penitenciários. Esta preocupação mereceu um justo reparo por parte do Prof.López-Rey Y Arrojo, que não deixou de criticar esse erro em colocar tanta ênfase naquilo que deve ser apenas um dos aspectos a considerar no regime prisional - mas não o principal, nem o essencial. E que não pode fazer descuidar o que é primordial, que será sempre a recomposição de uma personalidade, inclusive pela compreensão que ela deva integrar quanto ao erro cometido, pelo qual deve responder moralmente também. E então, neste neo-ecletismo penal que deve preva-lecer nas modernas perspectivas da Criminologia, não se pode descartar uma retomada de posição quanto a estas implicações éticas do tratamento penitenciário, no qual se deve menosprezar o campo moral do problema, em termos de tratamento.

Há aqui toda uma infinita problemática penitenciária, que dependerá

das possibilidades efetivas de cada país e região; mas sempre se devendo manter uma certa segurança e atenção para com o tipo especial de popula-ção com que se vai lidar, sem nos deixar seduzir por facilitações generosas, mas imprudentes, e sem deixarmos de considerar que, no início de tudo, sempre se parte de uma ação anti-social praticada, cuja responsabilidade moral cabe a - quem a efetivou, sem excusa bastante para ela, como o julgamento o deve haver definido. Nunca os regimes penitenciários devem assumir liberalidades excessivas, e até às vezes anunciadas quase com excesso, que toca as raias de uma espécie de propaganda. Recentemente, o noticiário dos canais de televisão deu conhecimento de suas penitenciá-rias que se projetam em cidades do Interior de São Paulo, com tantas vantagens para o welfare of the offender (piscinas, quadras de vários esportes, enxadrismo, cinema, TV, etc.) que o locutor de um dos canais, causticamente, comentou: o problema que está surgindo é o número ex-cessivo de telefonemas para essas cidades, de numerosos interessados em saber o que é necessário realizar para se ingressar e obter vagas nessas instituições...

A justiça, que hoje vê bem e julga melhor, deve cercar-se de serenida-

de, competência e profundo conhecimento, para saber o que deve ser feito de melhor - mas sempre com a extrema seriedade, que a superioridade da

sua posição de suprema sabedoria e equanimidade deve saber atender e impor. Não é conveniente esse caráter que, às vezes, assume uma inau-têntica ciência penitenciária, de uma pieguice falsa e quase consensual com o delito e o delinquente. O tratamento deve visar o reforço da intimida-de anímica do criminoso, robustecendo caracteres, e não alagando os autores de condutas que já foram agressivas para a sociedade - e que se necessita evitar que reincidam na cedência da vontade. E, para tanto, use-se a compreensão, o auxílio, a filantropia, o real interesse em tudo fazer para recuperar o criminoso - mas não se desvirtue a rota a seguir por falsas imagens que se afastem da realidade crua da disciplina social e de suas correspondentes responsabilidade. O tratamento deveria buscar a reeduca-ção (correção do caminho a seguir).

A personalização da pena foi uma das conquistas mais efetivas do po-

sitivismo penal e decorre diretamente da Antropologia Criminal. Foi a de-monstração, feita a partir de Lombroso, de que se deve enfocar o criminoso em seus caracteres pessoais, diversos em cada indivíduo, quer do ponto de vista biológico, quer ainda das influências mesológicas que haja recebido, o que levou a tentar um tratamento adequado a cada um desses tipos perso-nalizados de criminosos.

É bem claro que não deve ser permitido exagero nesse campo, aliás

como em nenhum outro. Não é rigorosamente necessário que se pormeno-rize um só tratamento, e exclusivo, para cada um dos criminosos. De fato - ainda como para os doentes - a terapêutica dispõe de meios que abrangem grupos humanos com caracteres afins. Há grupos que podem receber um tratamento basicamente comum a todos os seus integrantes. Daí que sempre se cogitou de estabelecer classificações penitenciadas dos crimi-nosos, para ensejar um agrupamento de delinquentes de características assimiláveis, para serem enviadas a estabelecimentos de determinado tipo.

Na prática, é admissível, porque necessário, que se façam estes gru-

pos de tipos afins. Mas não se creia que essa seja a maneira ideal de enfrentar e resolver o problema terapêutico penal, desde que, bem no âmago dos fatos, está o ser humano, único em seu perfil e na sua coloca-ção perante a circunstância ambiental.

Como, todavia, será impraticável uma distribuição dos delinquentes in-

do até uma personalização assim tão exclusiva, é admitida a divisão dos estabelecimentos penais em diversos tipos, dentro dos quais se enquadra-rão, mais ou menos de acordo com os seus perfis individuais, os diversos tipos de personalizados de criminosos.

Mas não se deixe de dizer que, feita a triagem de acordo com as várias

possibilidades que se ofereçam á administração penitenciária, e enviados os criminosos para os vários tipos de estabelecimentos mais adequados às suas características pessoais, em cada um desses estabelecimentos poder-se-á, e se deverá, ir mais longe na personalização, a partir dos grandes grupos considerados.

De um ponto de vista ético, todavia, não deve se afastar esse trata-

mento: deve ele dar ao criminoso - sem que assim ele se sinta deprimido, ou deformado, ou mesmo sensibilizado - a noção da necessidade da sua recuperação moral, desde que o ponto de partida da sua ação agressiva contra a sociedade se reconheceu sempre no animus que pôs ao serviço da mentalidade criminosa de que se deixou assenhorear o seu espírito. Tudo o mais que se possa fazer do ponto de vista médico, psicológico, pedagógico em um enfoque holístico, enfim, ressocializante, deve-se apoiar na base de uma sólida, tão sólida quanto possível, reconstrução ética da sua personalidade. Se não houver a mudança da mente (a metanoia, dos gregos), se não houver a sideração da vontade no sentido de se robustecer a âmago anímico da personalidade, tudo o mais pode entrar em falência, pode a qualquer momento ser, de novo, submetido às forças crímino-impelentes e por elas dominado - e a reincidência se manifestar.

Portanto, dê-se a ênfase maior na reeducação e no fortalecimento do

núcleo moral da personalidade; ou seja, daquele núcleo que é o que define exatamente a natureza humana de que somos participantes. A partir daí, então, dê-se ao tratamento todo o conteúdo de um processo reeducativo, recuperador, ressocializante, indo alcançar todos os ângulos da personali-dade e mirando a volta de delinquente ao convívio social, com todas as implicações que daí decorrem, inclusive, e principalmente, a atenção que

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deva ser dada aos deveres sociais e à integração de uma pessoa na co-munidade; o que importa era receber logo estímulos vários para agir de maneira agressiva, anti-social e criminosa, aos quais é dever resistir.

Ora, uma corrente de penalistas e criminologistas há muito vem recla-

mando de situação semelhante para a aplicação das penas, naquilo que se denomina de pena indeterminada. De fato, um tratamento penal deverá ser aplicado até o momento em que um mínimo de recuperação haja sido obtido, compatível com a volta do criminoso ao convívio social. Passar daí, é arriscar-se em perder o que se haja alcançado. A doutrina tem repetido, com carradas de razão, que, tanto as penas de curta duração, quanto aquelas de longa duração, são prejudiciais para a pessoa do delinquente. Ora, desde logo se deduz que essa duração deverá ser idealmente aquela que leve o indivíduo a obter aquele ótimo de recuperação, nem antes, e nem depois. E, assim, estabelecer-se-ia condições para um melhor resulta-do final.

Dois óbices têm sido levantados contra esse ideal da pena indetermi-

nada: um decorrente ainda de um remanescente espírito retributivo, que deseja para uma espécie de crimes, uma pena mais severa que para outras espécies de delitos; o outro óbice provém de uma ideia - a ser corrigida - de que a execução penal passada, das mãos do Juiz, para as mãos do técni-co.

Quanto ao primeiro desses argumentos contrários à pena indetermina-

da, deve-se informar que o tipo de delito praticado nem sempre correspon-de à deformação da personalidade ocorrida no criminoso; às vezes, sim, desde logo se tem uma noção de gravidade do comprometimento dessa personalidade, como ocorre na hediondez de certos crimes; mas pode acontecer o contrário, isto é, de um pequeno delito seja, todavia, a primeira manifestação de uma personalidade bastante agressiva.

Justifica-se plenamente que a pena indeterminada seja dotada nas

nossas leis penais, desde que atendidos os pontos fundamentais anterior-mente referidos, ou seja: que a sua indeterminação não fique fora da com-petência judicante, a qual deliberará sobre a extinção da medida punitiva, desde que proposta pelos auxiliares técnicos do Juiz.

Na realidade, a pena fixa é contrária à boa recuperação dos crimino-

sos, ao marcar limites artificiais à mesma, e apenas decorrentes da quanti-dade do delito praticado. E deixando de lado a personalidade do réu, e sua capacidade de recuperação ético-social, mesmo quando esteja em vigência o artigo 42 do Código Penal, até hoje não atendido adequadamente quanto "aos antecedentes e à personalidade do agente, à intensidade do dolo ou grau da culpa, aos motivos, às circunstâncias e consequências do crime".

Não fique sem dizer que, também na apreciação criminológico-clínica

do delinquente, deve entrar em cogitação a natureza do delito praticado; é um dos elementos centrais que informa a observação do criminoso.

Mesmo que fossem aceitos e praticados estes preceitos, sempre cabe-

rá plenamente a manutenção da liberdade condicional, para os que hajam estado segregados do convívio social. E isto porque ela representa, nos dizeres de Flamínio Fávero, a convalescença penal, isto é, aquele período de prova em que se verifica se o delinquente já se encontra efetivamente em condições de conviver em sociedade de maneira sintônica, e não agressiva.

O neo-ecletismo penal pretende dar todo o valor, que é inconstante, à

evolução da Criminologia Clínica e na investigação científica das causas da criminalidade, até onde elas possam ser rastreadas e reconhecidas. Mas quer reivindicar a necessidade de se valorizar a atenção para os aspectos morais do ente humano, que devem ser devidamente computados:

a) para a indispensável avaliação da responsabilidade moral pelo ato praticado, em termos de uma justificação, ou não, de tal ato;

b) para o reaparelhamento do núcleo moral do delinquente, a fim de

aumentar-lhe as resistências futuras aos falares crímino-impelentes que no porvir venham a agir de novo sobre o indivíduo.

Deixar de dar, entretanto, toda a ênfase que merece este núcleo Moral

do ser humano é incidir num erro fundamental, visto que a explicação

científica da gênese do delito não afasta a necessidade de se enfocar este outro aspecto da questão, que, no homem, é primordial.

A forma de atender às necessidades morais da criatura humana tem

sido apanágio do ensino religioso; e este ensino tem sido facultado nas instituições penitenciárias com ampla liberdade de crença. Ao lado dele, entretanto, complementando-o e abrindo a visão para campos mais amplos, deve-se dar toda a oportunidade à instrução moral e cívica, de largo hori-zonte, o que não exclui, como disse, a prática do culto religioso, mas que abrange inclusive os que não se declaram religiosos, ou tenham apenas parcas noções sobre as suas crenças.

Informações bibliográficas: SILVA, Leonardo Rabelo de Matos. A criminologia e a criminalidade .

Jus Navigandi, Teresina, ano 7, n. 66, jun. 2003. Disponível em: <http://jus2.uol.com.br/doutrina/texto.asp?id=4137>. Acesso em: 23 set. 2008.

-o0o- Enrique Cury, em sua "Contribuição ao Estudo da Pena", deixa bem

claro que os estudos criminológicos, pertinentemente ao fundamento e às finalidades da sanção penal, longe de terem chegado a um denominador comum, ainda estão entregues a diversas teorias conflitantes, que tentam explicar o "por que" e o "para que" da punição (ou não é punição, mas tentativa de recuperação para o convívio social?) do indivíduo que infringe as regras de conduta de cunho penal.

O autor afirma, mesmo, que nós, juristas, "carecemos de imaginação criadora, porque depois da fatigante luta

para nos desembaraçarmos das penas corporais, nosso elenco de sanções ficou reduzido, quase que exclusivamente, às penas privativas da liberdade e – mas em menor escala – às pecuniárias".

Em nosso entender, a Criminologia não se deve apegar, tão somente,

à intensidade do dano causado pelo fato delituoso; seus estudos devem ter como escopo a possibilidade da obtenção de resultados úteis para a socie-dade. E resultados úteis para a sociedade somente poderão ser considera-dos aqueles que levem à redução da criminalidade, porque todo e qualquer incremento em seus índices nada mais poderá significar do que mais um passo em direção à completa falência da utilização do sistema repressivo como instrumento de controle social.

A Criminologia dependerá portanto das contribuições das diversas ci-

ências auxiliares, tais como a Sociologia, para a compreensão e a determi-nação de seus objetivos.

Juarez Cirino dos Santos, em brilhante monografia intitulada "A Crimi-

nologia da Repressão" (Forense, 1979), identifica o crime como produto da desorganização social, cujos indicadores são:

"a) o incremento das formas de existência e de comportamento desvi-antes, como o crime, a doença mental, o alcoolismo, o uso de drogas, a delinquência juvenil, etc; b) as condições de trabalho pobres, e o paradoxo da tecnologia como fator de miséria (e não de progresso) social, gerando desemprego, ligado, por sua vez, àquelas formas de comportamento desvi-ante. Na origem dessas condições, a industrialização, a urbanização e as migrações entre os centros de produção".

Problema de crucial importância para a própria definição dos lindes da

Criminologia, e que tem seduzido os estudiosos, é o do direito de resistên-cia, em relação à própria segurança do Estado.

Com efeito, se em relação ao chamado criminoso comum, a Criminolo-

gia aconselha determinadas medidas, quais as perspectivas aconselháveis em relação aos chamados "crimes políticos", para a manutenção do contro-le social?

A justa e equilibrada "punição" do criminoso político poderá evitar que

ele se transforme em mártir, como frequentemente acontece, em virtude da arbitrariedade ou da ignorância dos julgadores, devendo-se observar, neste ponto, que o Direito Penal, no tocante aos delitos políticos, pune tão so-mente a tentativa, porque as revoluções, quando vitoriosas, deixam de ser crimes para serem apenas acontecimentos históricos. Fernando Lima

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Criminologia A Opção Certa Para a Sua Realização 17

A CRIMINOLOGIA CONTEMPORÂNEA OU A ESPERANÇA DO CONTROLE DA CRIMINALIDADE

Gisele Leite

O conceito exprime constantemente uma ideia geral da coisa, já a defi-

nição exprime uma determinação exata, de objeto e a incidência epistemo-lógica.

A Criminologia estuda a criminalidade e invocando seu significado eti-

mológico do vocábulo, originário do latim crimino(crime) e do grego logos (tratado ou estudo).

Em síntese, a Criminologia seria o tratado do crime, segundo a defini-

ção de Edwin H. Sutherland: "é o conjunto de conhecimentos que estudam o fenômeno e as causas da criminalidade, a personalidade do criminoso, sua conduta delituosa e a maneira de ressocializá-lo."

Já Nelson Hungria traduz: "é o estudo experimental do fenômeno do

crime, para pesquisar-lhe a etiologia a tentar a sua debelação por meios preventivos ou curativos."

O conceito ideal desta disciplina seria aquele capaz de abarcar todos

os elementos caracterizadores de sua forma de atuação. Segundo Newton Fernandes e Valter Fernandes, in Criminologia Integrada, Editora Revista dos Tribunais, 2 ª edição, 2002, "Criminologia é ciência que estuda o fenô-meno criminal, a vítima, as determinantes endógenas e exógenas que isolada ou cumulativamente atuam sobre a pessoa e a conduta do delin-quente, e os meios laborterapêuticos ou pedagógicos de reintegrá-lo ao grupamento social".

Tanto o Direito Penal como Criminologia estudam o crime, porém, o en-

foque dado por uma e por outra, relativo ao delito é diferente. Pois enquan-to que o Direito Penal é ciência normativa sendo a destinada a administrar a repressão social ao crime através das normas punitivas que ele mesmo elabora.

Já a Criminologia é ciência causal-explicativa, como bem enfatiza Or-

lando Soares e tem por objeto a incumbência de não só se preocupar com o crime, mas também conhecer o criminoso, montando esquemas de combate à criminalidade, agindo não só de maneira preventiva como sobre-tudo de forma terapêutica para cuidar dos criminosos e evitar-lhes a reinci-dência.

Na Criminologia traça-se uma análise do crime, pesquisando suas cau-sas geratrizes bem como estuda o perfil antropológico, social e cultural do criminoso.

Apesar do Direito Penal e a Criminologia utilizarem a mesma matéria-prima (que é o crime), o método é diverso o que o torna legítimo concluir que não corresponde ao mesmo objeto da ciência normativa penal.

Efetivamente como esclarece Israel Drapkin em sua obra Manual de

Criminologia, a Criminologia usa efetivamente métodos biológicos e socio-lógicos e exemplifica: "se a Biologia é uma ciência, não há razão para que não o seja a Criminologia que utiliza o seu método."

Utiliza-se do método experimental, naturalístico, indutivo para o estudo

do criminoso, o que não é suficiente para conhecer as causas da criminali-dade. Também recorre-se aos métodos estatísticos, históricos e sociológi-cos.

Portanto, a Criminologia utiliza dois métodos distintos (um oriundo da

Biologia e, outro da Sociologia). Estuda o crime como fato biopsicossocial e o criminoso. Não fica adstrita ao terreno científico, por este não teria por si só o poder de explicar o fenômeno delinquencial e sua vasta caudal de causas (entre elas: a natureza social, biológica, psicológica e até psiquiátri-ca). A condição de ciência da Criminologia foi abordada pelo Congresso Internacional de Criminologia realizado há menos de 20 anos em Belgrado (Iugoslávia, na época) onde chegou-se ao seguinte consenso:

A delinquência é um fenômeno social complexo que tem suas leis pró-prias e que surge num meio sócio-cultural determinado, não podendo ser tratada com regras gerais, mas sim particulares de acordo com cada região.

É oportuno citar Vitorino Prata que reconhecendo a condição de ciência da Criminologia, sublinha:

"Embora o homem seja o mesmo em qualquer parte do mundo, os cri-mes têm características diferentes em cada continente, devido à cultura, à história própria de cada um. Há, pois, um criminologia iugoslava, criminolo-gia brasileira, chinesa, enfim, uma criminologia própria de cada raça ou cada nacionalidade".

A feroz escalada da criminalidade contemporânea, nos dias em que vi-

vemos, especialmente no que concerne à prática reiterada de sequestros, latrocínios, e assassinatos cruéis (como foi o de Tim Lopes), estupro com morte, tráfico de entorpecentes, atribuídos a bandos ou horas altamente organizados e hierarquizados, fortemente armados, tem resultado num imenso temor generalizado por parte dos cidadãos.

Cogita-se até na existência de um poder paralelo da criminalidade até

para enfatizar a decrepitude e a tremenda fragilidade operacional do poder Público constituído.

Decorrendo do crime, os desajustamentos originados na sociedade re-

fletindo assim em todos os sus estamentos e segmentos, é imperioso uma cruzada que tenha por fim a formação de profissionais voltados para a pesquisa criminológica e para o real enfrentamento da criminalidade que não se restringe à forma repressiva.

Afonso Sant’anna foi coerente ao denunciar que todos nós que de al-

guma forma contribui (quer com o silêncio com a prática delituosa de uso de entorpecentes), matamos Tim Lopes.

Daí, porque seja salutar a corrente que defende a unificação de todas

as ramificações da Criminologia principalmente unindo a Clínica com a Sociológica formando o que chamaríamos de Criminalidade Integrada, ou seja, biopsicossociológica. Muito útil seria a referida Criminologia Integrada colaborando realmente para que o Poder Público arquitetasse uma Política Criminal hábil a conseguir a prevenção e eficaz repressão ao crime.

O Direito Penal é pautado pelos legisladores para defender a socieda-

de dos comportamentos típicos e desviantes. O objeto de estudo do Direito Penal é a culpabilidade em lato sensu. O objeto da Criminologia é o estudo da periculosidade, visando a pesquisa teórica da etiologia do crime.

Embora que alguns doutrinadores detratores do Direito Penal expres-

sem que o Direito Penal é carecedor de objeto próprio de estudo, que vive oscilante entre o crime, o criminoso, a pena ou até a segurança social.

Por ser ciência normativa, valorativa e finalista, o Direito Penal é basi-

camente abstrato e se preocupa em coibir o delito enquanto fenômeno individual ou coletivo, não se preocupando com a prevenção criminal.

A natureza do Direito Penal é repressiva e se finda com a aplicação e

execução da pena.Daí a necessidade de outras ciências que visam auxiliar o Direito Penal além de lhe assegurar a própria existência.

É uma utopia desejar a solução da equação crime-criminoso apenas

através do Direito Penal, sem a valorosa colaboração da Criminologia, da Psicologia e da Sociologia (isto sem exaurir o rol de ciências capazes também de efetivamente de elucidar o resultado da referida equação).

Há quem enxergue na Criminologia com a matização de verdadeira fi-

losofia do crime e do criminoso, mas tendo como valores primaciais a criminalidade e a sociedade.

A pesquisa científica do crime inclui a perquirição de suas causas e ca-

racterísticas, de sua prevenção e do controle de sua incidência. Kinberg aponta a Criminologia como a ciência que tem por objeto não somente o fenômeno natural da prática do crime, como também o fenômeno da luta contra o crime.

Já Edwin Frey posiciona a Criminologia como a "teoria dos fatos do

criminoso" e Roland Grassberger como "sistema das ciências auxiliares do Direito Penal sobre as causas, provas e prevenção do crime."Enrique Cury, penalista chileno, conceitua como "ciência causal-explicativa do delito".

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Criminologia A Opção Certa Para a Sua Realização 18

Não é mera ciência, mas também, como ciência aplicada, daí resultan-do a Criminologia Geral e a Clínica. A primeira compara, analisa e classifica os resultados obtidos no âmbito de cada uma das ciências criminológicas. E a Criminologia Clínica consiste na aplicação dos métodos e princípios das matérias criminológicas fundamentais e na observação e tratamento dos delinquentes.

Contrapondo a posição unitária da Criminologia, a Escola Austríaca

adota a concepção enciclopédica e considera a Criminologia como um compacto de diversas disciplinas particulares que pesquisam a realidade criminal, os fatos do processo e luta contra o crime.

A Criminologia igualmente se relaciona com as ciências criminais pois

o Direito Penal lhe delimita o objeto; o Direito Processual Penal inquire a ocorrência do ato criminal e se interessa pelo exame da personalidade do delinquente; o Direito Penitenciário, através de seus laboratórios de Biotipo-logia, regula o programa de ressocialização; a Medicina Legal, a Polícia Judiciária e a Policiologia colaboram efetivamente na investigação científica da materialidade do crime.

As ciências penais em seu todo orbitam envolta dos elementos: crime,

delinquente e a pena. A criminologia é a ciência autônoma porque possui um objeto perfeitamente delimitado: os fatos objetivos da prática do crime e da luta contra a criminalidade.

A Criminologia Científica compreende conceitos, teorias, métodos so-

bre a criminalidade como fenômeno individual e social, a par, de atentar para o delinquente, para a vítima e para o sistema penal.

A Criminologia Clínica consiste na aplicação pragmática do conheci-

mento teórico da Criminologia Geral, sem que tal fato desvirtue o caráter autônomo daquela, conquanto intimamente ligadas a ambas as Criminolo-gias.

A observação científica é um dos poderosos métodos da Criminologia

Clínica, seguida de interpretação no caso de diagnóstico criminológico, ainda na fase do tratamento reeducativo, antes, portanto, da classificação penitenciária ou início do programa de reeducação do delinquente.

Destinada à profilaxia criminal indireta, não se pode esquecer o papel

reservado à Medicina, principalmente para alcançar a plenitude do adágio" mens sana in corpore sano".

Quanto à profilaxia direta ao crime em particular na estrutura mental da

cogitatio criminosa, sobrevém também as normas de ordem coibitiva: a inexorabilidade da Justiça Penal, apenamentos compatíveis, processo terapêutico e tratamento médico adequado para restabelecer ou melhorar a saúde do doente-criminoso.

A transmutação do mundo num grande aldeia global com o fim das rí-

gidas fronteiras, onde todos possam compartilhar interesses pessoais, inovações tecnológicas e científicas num desenvolvimento equilibrado de todas as nações, são algumas das propostas pretendidas pela globaliza-ção.

Todavia a própria ONU reconhece que a globalização está concentran-do renda tornando os países ricos, mais ricos e os pobres, mais miseráveis. Daí o crescente terrorismo e a expansão de seitas político-religiosas radi-cais e ortodoxas. Com a globalização se avulta novas formas de violência e de criminalidade, como a pirataria, o neofascismo, o neonazismo, os hac-kers, crackers, hooligans, serial killer, crimes ambientais, cibernéticos e o avantajado crescimento do tráfico de entorpecentes (incluindo aí a popula-rização das chamadas drogas sintéticas).

Sem fronteiras, a criminalidade adquire contornos sofisticados e dotado

de aparato tecnológico, e, os crimes são cometidos em um país e os crimi-nosos se escondem em outro, transferem dinheiro sujo de um país para outro; praticam o tráfico de mulheres, crianças, armas e drogas.

Discute-se assim a criação de uma legislação penal internacional que

uniforme o tratamento jurídico dado a tais crimes, inerente a sua geografia onde foram cometidos, colaborando efetivamente para a redução das dificuldades existentes no combate ao crime sem fronteiras ou globais.

No Brasil mais particularmente em São Paulo(SP), já existe a Delega-cia de Polícia Especializada para investigar crimes cometidos através da internet.

Parafraseando Alison Smale, jornalista do The New York Times, nos

dez anos que se seguiram ao fim das URSS houve uma explosão dos crimes internacionais e personagens sombrios do Leste e do Oeste euro-peu não perderam tempo em estabelecer ligações, num quadro que só agora os governos começam a combater.

Os russos fazem as famosas lavagens de dinheiro passando por mi-

núsculos ilhas do Pacífico, nas quais há uma centena de bancos. Os chefões dos cartéis do tráfico de drogas da Colômbia acumulam recursos tão vastos que podem adquiri um submarino soviético só para transportar cocaína até aos EUA.

O capitalismo e o comunismo que outrora serviam de camisa ideológi-

ca e intelectual para americanos e soviéticos e permitiam que ambos os lados se sentissem justificados quando utilizavam representantes condená-veis para combater na sua guerra fria. Que não foi de modo algum uma guerra particular pois afetava ao mundo inteiro.

A transformação dos aparatchiks em gangsteres ou em lavadores de

dinheiro nas ex-repúblicas soviéticas e nos Bálcãs é apenas um dos exem-plos mais notório.

O crime internacional recebeu relevante estímulo até dos próprios paí-

ses onde os representantes lutavam. O fim da guerra fria trouxe paradoxalmente uma explosão de cresci-

mento financeiro internacional. As nações ricas que apostaram na economia global nova e mais aberta

por meio do crescimento das comunicações e da redução de barreiras comerciais e financeiras também produziram um cassino global onde é possível se movimentar dinheiro de um lado para o outro de forma fácil e instantânea.

É óbvio que o poder dos ricos criminosos tendem a prejudicar muitís-

simo os Estados fracos e a criminalidade ganha feição de um dos desafios reais pela administração.

Aliás, em recente relatório do Conselho Nacional de Inteligência dos

EUA evidencia que tal poder dos criminosos representa uma grave ameaça à segurança americana.

Evidencia-se que o crime organizado internacional se tornou cada vez

maior e segundo Handelman, os grupos criminoso se infiltraram no governo local, no regional e, por fim até mesmo, no governo central.

O Ocidente distribuía ajuda em grande quantidade na esperança de

que as falidas sociedade comunistas renascessem como democracias de mercado livre e os novos ricos investissem no setor interno.

Ao revés, a antiga inteligência empobreceu e se tornou altamente cor-ruptível e venal.Tal relatório contendo sérias advertências sobre o poder dos criminosos ricos intitulado: "Tendências Globais 2015" dá uma noção das dimensões da economia ilegal, sublinhando que o tráfico de drogas continua a ser, de longe, o principal fator, com receita anual estimada entre US$ 100 bilhões e US$ 300 bilhões.

A importância da teoria contemporânea da personalidade está em de-

monstrar o indivíduo como um ser que procura alvos e propósitos, inobstan-te se reconheça que o seu comportamento possa ter determinantes consci-entes e inconscientes. Freud, Mirray e Jung dão maior ênfase aos fatores inconscientes na conduta, ao passo que Lewein, Alport, Goldstein e Roger, não só valorizam as motivações inconscientes e só são consideradas importantes no indivíduo anormal.

Mas, afinal, qual seria a motivação do crime? Os partidários extremados das duas correntes (clínicas e sociológicas)

estão absorvidos com os mecanismos motivacionais que dizem respeito unicamente as suas respectivas correntes, quando se partissem para uma

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Criminologia A Opção Certa Para a Sua Realização 19

simples associação desses elementos, sem maiores preocupações com a obrigatoriedade de considerar este ou aquele motivo, estariam mais con-cordes com a realidade e contribuindo de forma positiva para o aprimora-mento da ciência criminológica.

Na verdade, a posição holista está enriquecendo as abordagens princi-

pais criminológicas e procuram explicam o crime. Por derradeiro, cumpre assinalar que só uma teoria bem desenvolvida e madura bem acompanha-das por extensas investigações e pesquisas empíricas poderá vicejar todas as variáveis possíveis para que finalmente se possa oferecer maior espe-rança na segurança e progresso autossustentável (principalmente no combate à criminalidade) e, sobretudo com natural vocação social.

HISTÓRIA DO PENSAMENTO CRIMINOLÓGICO.

A GÊNESE DO SABER CRIMINOLÓGICO OITOCENTISTA

1 – INTRODUÇÃO

Esboçar um relato da gênese do pensamento criminológico do século XIX não é uma tarefa simples. A história da Criminologia não revela a sua progressiva racionalidade, a partir de uma perspectiva onde a sua “evolu-ção” seja passível de apreciação e valoração. Pelo contrário, é uma história caracterizada por rupturas e descontinuidades, por uma trajetória que demonstra que os próprios conceitos também têm uma gênese, que revela seus usos e abusos.

Partindo de tais pressupostos, para que seja possível estabelecer em alguma medida a biografia de um saber como o criminológico, exige-se uma determinada disposição analítica por parte do observador: a Crimino-logia não aparece de forma repentina no mundo. Simplesmente atribuir a Lombroso o crédito pelo nascimento deste saber constitui uma análise que peca pelo reducionismo. A Criminologia oitocentista resulta de uma proble-mática convergência de fatores e saberes aparentemente conflitantes, mas que efetivamente possibilitaram a sua invenção como um campo de saber. Além disso, seu surgimento se relaciona a uma série de elementos conjun-turais e estruturais da sociedade oitocentista europeia que favoreceram a gênese deste saber e delimitaram suas características e seu campo de atuação inicial. Neste sentido, compreender propriamente o surgimento deste tipo peculiar de saber implica uma investigação que somente uma perspectiva genealógica pode oferecer.

A partir de uma análise como a de Foucault, percebe-se que uma ori-gem única e monocausal não é explicação suficiente para um fenômeno complexo e entrecortado por diferentes instâncias de poder como é o caso do surgimento do saber criminológico. Diferentemente da simplicidade característica da ideia de origem, a gênese é dotada de grande força expli-cativa e, logo, deve ser levada em consideração dentro da análise de um fenômeno que exige o enfoque de uma multiplicidade de aspectos, como é o caso em questão.

A gênese da Criminologia oitocentista vincula-se, de um lado, à perse-guição religiosa da Inquisição, e de outro lado, ao paradigma científico estabelecido gradualmente nos séculos XVII, XVIII e XIX, o qual passou a conceber a ciência como mecanismo privilegiado para a obtenção de verdades objetivas sobre o real. Além disso, a constituição de um saber criminológico não pode ser pensada fora do âmbito da sociedade disciplinar moderna, na medida em que os saberes que se desenvolvem dentro do aparelho carcerário são fundadores do pensamento criminológico: estabe-lecem boa parte de suas premissas iniciais. São três fatores que aparente-mente não guardam relação direta entre si, mas que de forma convergente estabelecem as condições para pensar o que seria de outro modo, impen-sável.

2 – O SABER INQUISITÓRIO

A associação entre a Inquisição e a constituição de um saber crimino-lógico pode aparentemente parecer inapropriada. Afinal, a Inquisição não tinha relação direta com a criminalidade – portanto, com a defesa ou retri-buição perante o dano ao patrimônio ou à vida –, mas sim ao desvio em relação aos dogmas estabelecidos pela Igreja – considerados como verda-des eternas – e que se viam ameaçados pela proliferação das novas cren-ças heréticas, no contexto da Reforma religiosa do século XVI.

Entretanto, apesar da diferença aparente de foco, um objetivo comum aproxima os dois saberes: a tentativa deliberada de erradicar a diferença e anular o outro. A pretensão de homogeneização do corpo social efetiva-mente permite a percepção de continuidade entre uma prática dogmático-religiosa e a constituição de um campo de saber científico. De fato, a pró-pria elaboração de uma Criminologia oitocentista que tinha – por excelência – o homem como objeto, se vale dos pressupostos inquisitórios em alguma medida, ainda que de forma velada. O que muda, essencialmente, é o padrão desejável de indivíduo e o que é considerado uma ameaça para a funcionalidade do sistema e da estrutura de poder dominante.

O sistema inquisitório de persecução orientava-se de acordo com os fins propostos para o Tribunal da Inquisição, encarregado de corrigir os desvios verificados nos dogmas da Santa Igreja. Esse aparato de repres-são era encarregado de purificar a sociedade e evitar a disseminação da contaminação herética. Apresentava características muito específicas e tinha como fundamentação uma série de verdades absolutas, que giravam em torno do arcabouço ideológico oferecido pelo dogmatismo religioso da época. Dentro desse contexto, a extração de “verdades” a partir de confis-sões obtidas através de quaisquer mecanismos, como a própria tortura, era considerada autorizada pela chancela divina e pelo conjunto de procedi-mentos que os inquisidores tinham à sua disposição.

Sem dúvida, tratava-se de um campo de saber de envergadura consi-derável, o que pode ser percebido pela existência de um conjunto de pro-cedimentos, de técnicas e de meios para atingir os fins que se propunha, materializada na forma do Manual dos Inquisidores, de Eymerich. Um saber que, como Carvalho afirma, “não é ingênuo nem aparente, mas real e coeso, fundado em pressupostos lógicos e coerentes, nos quais grande parte dos modelos jurídicos autoritários contemporâneos, alguns ainda em vigor, busca(ra)m inspiração”.

Sob o império de tal modelo, o juiz inquisidor atuava como parte, inves-tigava, dirigia, acusava e julgava. Convidava o acusado a declarar a verda-de, sob pena de coação. Tamanha era a característica persecutória do sistema, que sequer havia constatação de inocência na sentença que eximia o réu, mas um mero reconhecimento de insuficiência de provas para sua condenação. A confissão era entendida como a prova máxima e não havia qualquer limitação quanto aos meios utilizados para extraí-la, visto que eram justificados pela sagrada missão de obtenção da verdade.

O modelo processual da Inquisição dispensava a cognição e critérios objetivos, gerando uma subjetivação do processo que, de fato, o afastava da comprovação de fatos históricos, supostamente o objetivo por trás da ambição de verdade que o movia. Franco Cordero percebeu que tal modelo – que surpreendentemente permanece tendo adeptos – acaba resultando no primado das hipóteses sobre os fatos.

É nesse sentido que Carvalho constata que as regras do direito canô-nico impunham instrumentos de gerenciamento, produção e valoração da prova que apenas ratificavam as hipóteses acordadas. É por isso que o autor diz que “o processo inquisitivo é infalível, visto ser o resultado previa-mente determinado pelo próprio juiz”. Constituía-se assim uma “verdade” que reproduzia as convicções pessoais do inquisidor, o qual extraía através da força a confirmação pelo réu da hipótese que ele, o juiz, havia fabricado.

Bastava um mero rumor para dar início à investigação, sendo que a prisão era regra, pois assim o inquisidor tinha o acusado a seu dispor, para torturá-lo e obter a confissão. As características do sistema conformavam uma objetificação dos corpos. Era necessário, sobretudo, dispor do corpo do herege. Este corpo era esquadrinhado, decomposto analiticamente e recomposto como objeto de um saber possível, de acordo com a conforma-ção dogmática de um conjunto de verdades e procedimentos preestabele-cidos. Trata-se de um modelo que efetiva e concretamente convertia o acusado em mero objeto de investigação.

Para Carvalho, a legitimidade oferecida pela Igreja ao Estado, que por sua vez proporcionava a utilização dos quadros burocráticos e administrati-vos, consolidou um modelo jurídico caracterizado pela intolerância e busca de eliminação da alteridade. Dessa aliança nasceu uma espécie de con-cepção de delito duplamente censurável: profano e sagrado, contra o Príncipe e contra Deus, como era característico do período absolutista. A heresia era dupla: contra o dogmatismo religioso e contra o sistema político por ele legitimado. O infrator não era punido pelo resultado danoso produ-zido, mas sim, pela ameaça que a sua existência representava para o sistema como um todo.

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Criminologia A Opção Certa Para a Sua Realização 20

3 – O GARANTISMO ILUSTRADO

Com a progressiva delimitação de um campo de saber científico em oposição ao dogmatismo religioso, aos poucos a modernidade foi se im-pondo e, com ela, surgiu um novo modelo penal e processual penal. A partir de Locke e Voltaire constitui-se a ideia de tolerância, que seria depois transposta para o direito penal iluminista por Beccaria e Verri.

Beccaria sistematizou um conjunto de ideias dispersas em autores co-mo Montesquieu e Rousseau, atacando, principalmente a irregularidade dos processos e a barbárie das penas até então em vigor. Do repúdio às arbitrariedades do período absolutista, foram colocados os fundamentos do direito penal moderno, cuja característica era de uma intervenção limitada e restrita, bem como de tutela de liberdades individuais diante de um Estado propenso a violar os direitos fundamentais da pessoa humana. Havia, portanto, um significado humanitário no paradigma, em que estavam previs-tos limites ao poder de punir face à liberdade individual e em que era em-preendida uma racionalização do poder punitivo, buscando garantir o indivíduo contra qualquer intervenção autoritária.

Não é por acaso que o termo “garantismo” é o que melhor demonstra o seu projeto racionalizador. Sua natureza indica a busca de utilização da razão como instrumento de resistência à barbárie e ao irracionalismo inqui-sitorial. A insensatez e desumanidade do modelo inquisitório foram, de fato, denunciadas pelos pensadores da Ilustração, que apontaram o que devia ser feito para superar os modelos inquisitórios. Carvalho relaciona as características do modelo proposto pelos pensadores iluministas:

O projeto de racionalização da justiça penal advém, portanto, da enun-ciação do princípio da legalidade (nullum crimen, nulla poena, sine lege praevia, scricta et scripta), do estabelecimento de critérios de razoabilidade e proporcionalidade às penas e, sobretudo, da visualização de aparelho processual baseado em estrutura acusatória na qual as figuras de juiz e acusador sejam distanciadas, ao réu seja garantida ampla defesa, e meca-nismos de controle e valoração da prova e do raciocínio do juiz sejam ativados para resguardar as partes.

Houve, de fato, uma verdadeira reelaboração teórica da lei penal, pro-movida por Beccaria, Bentham e Brissot, entre outros. Com o estabeleci-mento do Estado Moderno em oposição ao Estado Absolutista, ocorreu a secularização do direito penal. Como afirma Carvalho, “com a laicização do Estado e do direito, o crime não corresponde mais à violação do divino, mas à livre e consciente transgressão da norma jurídica promulgada pelo Estado, submetendo o infrator à penalidade retributiva decorrente do ina-dimplemento [...]”.

Portanto, a infração não deveria mais ter qualquer relação com a falta moral ou religiosa. O crime passava a ser entendido como a ruptura da lei, da lei civil explicitamente estabelecida no interior de uma sociedade pelo lado legislativo do poder político. A superação de uma definição de crime como pecado se mostrava essencial para o desenvolvimento de um direito penal do fato, em oposição ao modelo anterior, que era dirigido ao autor.

A presunção de inocência e o princípio da jurisdicionalidade foram, in-clusive, consagrados na Declaração dos Direitos do Homem, de 1789. O avanço representado por tais noções no plano teórico é absolutamente incontestável. Especialmente significativa é a superação de um modelo voltado para a objetificação do sujeito em prol de um novo modelo, no qual o que interessa é uma determinada conduta sobre a qual se exerce um juízo de censura. É o que define Beccaria, quando refere que o dever do juiz “consiste exclusivamente em examinar se tal homem cometeu ou não um ato ofensivo às leis”.

A partir dessa concepção estruturava-se um sistema que, orientado pe-los critérios de prevenção geral, pretendia intimidar o “homem racional”, que faria um cálculo a respeito dos inconvenientes de uma ação reprovável. Com base nesse princípio, o conhecimento das leis e a certeza da punição constituíram uma garantia de menos delitos.

Ainda que esse “homem racional” fosse apenas uma invenção moder-na, a crença na razão importava em um avanço face ao sistema inquisitório e estabelecia um direito penal centrado no fato e propondo a superação da objetificação da pessoa do acusado, que era a característica mais marcante dos modelos inquisitórios.

O problema é que a própria crença na razão se tornou justificativa para a não-realização do modelo e para sua desfiguração, a partir do surgimento de um novo tipo de dogmatismo: a cientificidade oitocentista.

Além disso, deve ser destacado que, apesar de ter sido utilizado para impulsionar a ascensão da elite burguesa ao topo da hierarquia social, esse corpo de saber ilustrado logo perdeu boa parte de seu caráter humanista, já que esgotada sua utilidade para o novo grupo dirigente.

Neste ponto, cumpre lembrar que não basta observar apenas a coe-rência interna de um discurso, mas sim os efeitos por ele produzidos no campo das práticas. Houve decididamente uma desfiguração do modelo na transposição da teoria para uma prática, comprometendo em boa parte os ideais do garantismo ilustrado.

4 – O SABER PENITENCIÁRIO DISCIPLINAR

Foucault aponta que o “surgimento da sociedade disciplinar se relacio-na ao surgimento de um fato que teve dois lados aparentemente contraditó-rios: a reforma, a reorganização do sistema judiciário e penal nos diferentes países da Europa e do mundo”. O autor refere que “o sistema de penalida-des adotado pelas sociedades industriais em vias de formação, em vias de desenvolvimento, foi inteiramente diferente do que tinha sido projetado alguns anos antes”. A prática se desviou rapidamente dos princípios teóri-cos desenvolvidos por Beccaria e Bentham. Como afirma Foucault, “A prisão não pertence ao projeto teórico da reforma da penalidade do século XVIII. Surge no início do século XIX, como uma instituição de fato, quase sem justificativa teórica”. E, no entanto, “ela surgiu tão ligada, e em profun-didade, com o próprio funcionamento da sociedade, que relegou ao esque-cimento todas as outras punições que os reformadores do século XVIII haviam imaginado”.

Foucault assinala que a prisão se constituiu fora do aparelho judiciário e inclusive se sobrepõe a ele em vários sentidos. Trata-se de uma apare-lhagem que reparte, fixa e distribui os corpos, visando a treinálos e codificar seus comportamentos, bem como mantê-los sob visibilidade e vigilância contínua. Na prisão foi estabelecida uma verdadeira empresa de correção dos indivíduos, que é onidisciplinar na sua essência, pois toma a seu cargo “todos os aspectos do indivíduo, seu treinamento físico, sua aptidão para o trabalho, seu comportamento cotidiano, sua atitude moral, suas disposi-ções”. Um aparelho que desde os seus primórdios – como o sistema pen-silvânico demonstra – atribuiu à pena uma função de expiação e a impreg-nou de categorias religiosas que comprometiam a secularização operada no âmbito jurídico.

O aparelho carcerário-penitenciário assim instituído é uma verdadeira máquina de observação constituída por registros e anotações, por um saber que se acumula e se centraliza. Esse saber criou a instituição prisão antes que a lei a definisse como sanção por excelência e logo reclamou para si a tarefa primordial de modulação da pena. Como afirma Foucault, desde muito cedo essa tarefa foi reclamada “pelos responsáveis pela administração penitenciária, como a própria condição de um bom funcio-namento da prisão, e de sua eficácia nessa tarefa de regeneração que a própria justiça lhe confia”. A regeneração assume, dessa forma, um caráter de transformação e correção útil do detento a partir de uma perspectiva administrativa que constitui o corpo como objeto de análise por parte de um saber.

Foucault assinala com propriedade o deslocamento que essa prática representa em relação ao desenvolvimento teórico humanitário do século XVIII:

A justa duração da pena deve variar não só com o ato e suas circuns-tâncias, mas com a própria pena tal como ela se desenrola concretamente. O que equivale a dizer que, se a pena deve ser individualizada, não é a partir do indivíduo-infrator, sujeito jurídico de seu ato, autor responsável do delito, mas a partir do indivíduo punido, objeto de uma matéria controlada de transformação, o indivíduo em detenção inserido no aparelho carcerário, modificado por este ou a ele reagindo.

A partir desse deslocamento, o rigor punitivo deixa de estar em relação direta com a importância penal do ato condenado, não sendo mais por ele determinado, mas sim por um mecanismo autônomo que controla os efeitos da punição no próprio interior do aparelho que os produz. Configura-se assim um julgamento penitenciário (entendido como constatação, diagnós-tico, caracterização, precisão, classificação diferencial) que se sobrepõe ao veredicto a partir de uma determinação de culpa. Para Foucault, isso efeti-vamente faz com que Todo aquele “arbitrário” que, no antigo regime penal, permitia aos juízes modular a pena e aos príncipes eventualmente dar fim a

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ela, todo aquele arbitrário que os códigos modernos retiraram do poder judiciário, vemo-lo se reconstituir progressivamente do lado do poder que gere e controla a prisão.

Além do restabelecimento da arbitrariedade nas margens de um apara-to legal que foi concebido para limitar o poder punitivo, ocorre um refluxo em direção à personalização da responsabilização penal, sendo retomados os pressupostos inquisitórios. O sujeito torna-se novamente objeto a co-nhecer, objeto de um saber, colocando-se em questão uma nova figura, que o aparelho penitenciário cria e põe no lugar da definição legal de infra-tor: o delinquente. Foucault afirma que “essa ideia de uma penalidade que procura corrigir aprisionando é uma ideia policial, nascida paralelamente à justiça, fora da justiça, em uma prática dos controles sociais ou em um sistema de trocas entre a demanda do grupo e o exercício do poder”. Como reflete o autor, Correlatamente, o delinquente torna-se indivíduo a conhe-cer. Esta exigência de saber não se insere, em primeira instância, no pró-prio ato jurídico, para melhor fundamentar a sentença e determinar na verdade a medida da culpa. É como condenado, e a título de ponto de aplicação de mecanismos punitivos, que o infrator se constitui como objeto de um saber possível.

Essa distorção não foi fruto do acaso: sua ocorrência se deu de acordo com o que era ou não conveniente para a nova configuração de poder que se estabelecia. O século XIX é um século de grandes tensões sociais, em que o sistema capitalista ainda se encontrava em momento de afirmação. É nesse sentido que a modernidade é decididamente ambígua. O mundo moderno é um mundo de paradoxos. Ou seja, em termos de processo penal e de direito penal, a ruptura entre Absolutismo e Estado de Direito Liberal não foi tão significativa como deveria ter sido.

O estabelecimento de um modelo de mera legalidade (em que o critério de validade da norma tinha como único fundamento a autoridade legítima) e a constituição de um aparato carcerário nas margens dessa legalidade são exemplos manifestos dessa ambiguidade. Em termos práticos, a objeti-ficação inquisitória apenas se deslocou de posição, não tendo sido funda-mentalmente colocada em questão. Foi operada uma continuidade no campo das práticas punitivas, de algo que havia sido afastado no plano teórico. O que de fato mudou é o parâmetro de exclusão e seleção, que se dava a partir de uma outra lógica de conformação social.

Portanto, o que surgiu como um autêntico direito de resistência ao au-toritarismo estatal acabou por ser desfigurado em função de uma lógica de conformação da nascente ordem burguesa, descaracterizando em grande margem o chamado garantismo ilustrado, em prol do nascimento da socie-dade disciplinar. Como refere Foucault, é possível afirmar que

A prisão não é filha das leis nem dos códigos, nem do aparelho judiciá-rio; que não está subordinada ao tribunal como instrumento dócil e inade-quado das sentenças que aquele exara e dos efeitos que queria obter; que é o tribunal que, em relação a ela, é externo e subordinado.

Que na posição central que ocupa, ela não está sozinha, mas ligada a toda uma série de outros dispositivos “carcerários”, aparentemente bem diversos – pois de destinam a aliviar, a curar, a socorrer – mas que tendem todos como ela a exercer um poder de normalização.

Em última análise, a prisão é a face mais aguda de uma sociedade que é em si mesma disciplinar e constituída por múltiplos e pulverizados meca-nismos de controle. O aparelho carcerário, nesta lógica, é um verdadeiro sobrepoder em relação ao aparelho judicial. É um aparelho que realmente constitui o delinquente: o produz (como objeto de um saber) e o associa com a noção de indivíduo perigoso.

Define um conjunto de procedimentos que classificam e qualificam os indivíduos de acordo com seus próprios critérios. É um saber que se dife-rencia da qualificação jurídica do delito, que se diferencia do conhecimento médico que detecta a loucura, e que estabelece um novo campo e, logo, constitui autoridades aptas a formular enunciados “verdadeiros” sobre a criminalidade. Para Foucault, onde desapareceu o corpo marcado, recorta-do, queimado, aniquilado do supliciado, apareceu o corpo do prisioneiro, acompanhado pela individualidade do “delinquente”, pela pequena alma do criminoso que o próprio aparelho do castigo fabricou como ponto de aplica-ção do poder de punir e como objeto do que ainda se chama a ciência penitenciária.

Foi a partir da continuidade da objetificação inquisitória, cumulada com o saber carcerário e a sua posterior elevação à condição de conhecimento científico – de acordo com os critérios da cientificidade – que nasceu a Criminologia positivista dos oitocentos, uma disciplina perpassada pelo poder desde a sua concepção.

5 – A CIENTIFICIDADE MODERNA COMO INSTRUMENTO DE PO-DER

É importante destacar propriamente o sentido atribuído à constituição desta ciência penitenciária (que posteriormente viria a ser fundadora da Criminologia) e à sua cristalização enquanto um conjunto de verdades. Foucault afirma que “a verdade não existe fora do poder ou sem poder”. Ou seja, a verdade nasce a partir de esquemas e relações de dominação, de forma que as relações de força conferem poder a determinados discursos – no caso, a ciência – fazendo com que a verdade corresponda a um deter-minado “conjunto das regras segundo as quais se distingue o verdadeiro do falso e se atribui ao ‘verdadeiro’ efeitos específicos de poder”. Há, portanto, uma relação entre o poder e a constituição do saber – relação esta que merece ser investigada, pois coloca em questão um discurso que por definição, propõe-se ser científico e, logo, neutro, imparcial e objetivo.

É importante destacar desde já o sentido dessa relação tão estreita en-tre o poder e a ciência. O vínculo entre a ciência e o poder não é de exterio-ridade. A criminologia, enquanto ciência, enquanto área do saber em cons-tituição, não foi simplesmente apropriada ou usada, no sentido de servir aos interesses de dominação e controle social. Pelo contrário, seu surgi-mento e desenvolvimento ocorreu de forma próxima a estratégias de poder que instrumentalizavam, que potencializavam e que viabilizavam a sua ação, a sua própria escrita, seu desenvolvimento como um corpo de saber. Havia uma profunda articulação entre a elaboração de um pensamento criminológico e o poder, em que a ciência acabou por assumir uma função eminentemente pragmática, orientada pelas necessidades agudas de maior controle social.

Foucault, ciente dessa espécie de relação, afirma que “só pode haver certos tipos de sujeito de conhecimento, certas ordens de verdade, certos domínios de saber, a partir de condições políticas que são o solo em que se formam o sujeito, os domínios de saber e as relações de verdade”. No que se refere ao pensamento criminológico, essa relação é mais do que eviden-te: certas condições políticas foram fundamentais para a formação desse tipo específico de saber.

É um saber que se forma, que gradualmente toma corpo e se articula com o poder, dialeticamente se alimentando dele e lhe fornecendo subsí-dios que garantem a sua continuidade, bem como o desenvolvimento do próprio saber. Essa formação heterogênea onde poder e ciência se retroa-limentam é constitutiva do saber criminológico e do conjunto de verdades que ele estabelece. Por isso Foucault aponta que, de fato, existem vários lugares na sociedade onde a verdade se forma, onde uma série de regras do jogo são definidas, a partir de domínios do saber, como é o caso, em especial, das práticas judiciárias.

A forma com que se deu o desenvolvimento da ciência moderna a aproximou do poder, justamente devido à sua pretensão de estabelecer um novo conjunto de verdades, ditadas por critérios de autoridade científica. Nietzsche mostrou que “por trás de todo saber, de todo conhecimento, o que está em jogo é uma luta de poder. O poder político não está ausente do saber, ele é tramado com o saber”. Essa presença do poder nos domí-nios do saber e da verdade é difícil de ser refutada, pois, como refere Foucault, “até na ciência encontramos modelos de verdade cuja formação revela das estruturas políticas que não se impõem do exterior ao sujeito de conhecimento mas que são, elas próprias, constitutivas do sujeito de co-nhecimento”.

Nesse sentido, é importante referir que a preocupação obsessiva com a verdade é uma das características mais marcantes da civilização ociden-tal e fruto de um de seus fundamentos modernos, o paradigma científico oitocentista. Esse paradigma caracteriza-se pela transposição da força explicativa outrora atribuída às instâncias religiosas para a mais nova crença, a cientificidade. Em essência, o dogmatismo religioso foi afastado e substituído por um novo tipo de dogmatismo, sustentado pelo saber científi-co. Mais do que isso: a própria ciência assumiu condição quase religiosa. O que havia iniciado como delimitação de um campo de saber científico em oposição ao saber teológico acabou concretizando-se como uma verdadei-

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ra assunção, pelo primeiro, de um papel que até então era tradicionalmente reservado ao segundo: a revelação da verdade.

Como refere Gauer, “Na modernidade, a vinculação do conhecimento ao modelo galilaico-newtoniano e a consideração da ciência como campo privilegiado para a revelação da verdade fundam a matriz de conhecimento mais relevante da tradição ocidental moderna”.

Para a ciência do século XIX, a verdade era mais do que um objetivo a ser alcançado. Era uma verdadeira profissão de fé, daí o seu sentido de dogma inquestionável. Segundo Ricoeur, “o cientificismo é a intenção metodológica da ciência (do ato científico), mas reassumido por uma pre-tensão. Essa pretensão é a de assumir para a ciência a função religiosa de salvação”.

A vocação para a verdade científica se dava a partir da adequação en-tre coisa e juízo do sujeito racional, proposta por Descartes. Surgia dessa forma uma ambição de “comprovação de uma nova verdade, precisamente a que é ditada pela ciência”. Gauer define como uma “vontade de verdade” a característica evidente desse paradigma: a associação entre “realidade” e verdade, verdade e busca do visível, do unívoco, do universal e do imutá-vel. Segundo a autora,

“A ciência moderna criou premissas e métodos vinculados a uma ver-dade totalizante. O conhecimento foi tido como absoluto, cabal, universal e eterno. As premissas que embasaram essa concepção de ciência e que serviram como pressupostos para o direito estão estruturadas na experi-mentação, objetividade, neutralidade e generalização. Essas premissas se complementam e demarcam o conhecimento científico. A experimentação trouxe a primazia da técnica, a objetividade sustentou o discurso da neutra-lidade do cientista assim como a do juiz.”

Não é por acaso que Gauer afirma que a busca pela compreensão dos fenômenos por parte dos cientistas da época acabou por sacralizar uma nova crença, a do cientificismo como caminho que conduziria à verdade, através da utilização de metodologia apropriada.

Esse paradigma científico – amparado no modelo das ciências naturais – oferecia uma doce ilusão: através da aplicação de um método bem defi-nido a um objeto devidamente delimitado e circunscrito, a ciência garantiria o acesso a uma nova espécie de verdade, a verdade cientificamente verifi-cável, a qual invariavelmente conduziria – em um sentido teleológico – ao modelo perfeito de sociedade elaborado pelo sujeito racional.

Construía-se um tempo projetivo, em que o futuro seria melhor do que o presente, como a noção de progresso – que passou a ser utilizada no final do século XVIII – tão bem assinala. Assim, razão e ciência eram as chaves para a construção do paraíso na Terra. A nova visão de história, agora laicizada, narrava que a “a evolução não levaria agora à cidade de Deus, mas à cidade ideal criada pelo homem racional. A cidade projetada e estruturada no progresso criaria o paraíso terreno real”.

O problema que essa pretensão imediatamente suscita se refere aos critérios para o estabelecimento de tal utopia. É evidente que esse espaço paradisíaco seria organizado e estruturado de acordo com os interesses dos detentores do poder. A ciência não era apenas vista como discurso teórico, mas como verdadeiro mecanismo de intervenção direta na realida-de, visando aos fins que interessavam aos grupos dirigentes. Essa transi-ção da contemplação para a intervenção é, inclusive, a base de como se pensa o mundo moderno em oposição ao mundo antigo.

Não custa ressaltar que esse paradigma tornou-se quase incontestável, graças em parte ao cientificismo da época, mas também, devido a sua vocação enquanto instrumento de dominação e conformação da ordem burguesa que se estabelecia, pois uma vez que o poder político foi conquis-tado por essa nova elite, tratava-se de construir os seus mecanismos de justificação e legitimidade, e isso passava pelo estabelecimento de verda-des, bem como pelo controle dos meios de estabelecer tais verdades. Segundo Ricoeur, Todas as pesquisas, todas as hipóteses, mesmo científi-cas, situam-se doravante em perspectivas orientadas e expurgadas por esse Estado; não mais existem verdades autônomas, “objetividade” científi-ca desvinculada; encerrou-se a era liberal que se abrira com o Renasci-mento. Compreende-se então que um debate de biologia ou linguística possa resolver-se segundo um critério político.

Portanto, esta nova crença, a cientificidade, se prestou com grande fa-cilidade ao papel de instrumento de legitimação do poder. Mais do que uma

decorrência ou desvio, passou a ser propriamente uma função, que inclusi-ve impulsionava o próprio desenvolvimento desse saber. Ou seja, houve uma superação da antiga articulação entre Igreja e Estado Absolutista, entre clero e nobreza, para uma nova aliança, entre o campo científico e o Estado Liberal laico, favorecendo os interesses da burguesia.

Dentro desse contexto, o século XIX foi o momento de constituição dos campos de saber, das disciplinas, das áreas de atuação de cada ciência, bem como da sua autonomia face às demais.

Esse processo de compartimentalização acabou constituindo especia-listas que se estabeleciam lenta e gradualmente como autoridades em suas respectivas áreas. Morin afirma que uma das ideias-chave da ciência da modernidade era a de separabilidade, pois, como dizia Descartes, diante de um problema complicado é preciso separá-lo em pequenos fragmentos. As disciplinas científicas nasceram com base nessa ideia de separação, em que se estabeleciam campos de saber independentes entre si e foi realiza-da uma progressiva separação entre a ciência e a filosofia, que inclusive se estendeu até o século XX, como uma necessidade legítima. Esse processo de especialização dos saberes esteve intimamente relacionado à concep-ção cartesiana de ciência e sua irrefreável tendência a assumir caráter de mecanismo privilegiado para a revelação da verdade.

É a partir dessas bases que surge a Criminologia científica na segunda metade do século XIX. De acordo com esse paradigma científico, a Crimi-nologia pode ser ciência: tem um objeto circunscrito e delimitado e um conjunto de métodos que lhe são próprios. E o mais importante: tem uma aptidão inegável para exercer o papel de instrumento de correção do corpo social desviado.

6 – O SURGIMENTO DA CRIMINOLOGIA POSITIVISTA

A partir da segunda metade do século XIX, houve um novo distancia-mento em relação à secularização penal: as práticas judiciárias passaram a orientar-se nitidamente para uma postura mais ativa de controle social. Percebe-se um deslocamento gradual, no decorrer do século, entre a postura inicial de absenteísmo, marca garantista dos pensadores da Ilus-tração, para uma nova lógica intervencionista de controle social, buscando combater ao máximo a criminalidade, pois a ordem precisava ser mantida. Como refere Carvalho, Se no projeto da ilustração foi possível visualizar uma circunscrição do terreno de incidência do controle penal, estabelecen-do, pois, importantes limites formais às violências dos aparelhos repressi-vos do Estado, a construção criminológico-positivista fomentaria a expan-são ilimitada destes mecanismos punitivos, pulverizando o controle com o objetivo de reforçá-lo.

Foi a partir de tais pressupostos que se organizou o paradigma etioló-gico, cujo mais notório exemplo é a obra O homem delinquente, de Lom-broso. É nesse sentido que Carvalho indica que “o desenvolvimento da epistemologia positivista, a partir de meados do século XIX, determina profunda crise no pensamento penal”. Em essência, o status quo hegemô-nico burguês precisava explicar a existência de seu poder de forma natural, e para isso recorria aos saberes antropológicos e sociológicos positivistas, por meio de argumentos organicistas. Carvalho afirma que os cientistas burgueses (re)legitimam os postulados do inquisitorialismo, porém em um discurso chancelado agora pela nascente ciência, a física social. Com isso, ficava inteiramente de lado um direito penal do fato e assumia preponde-rância novamente um direito penal do autor.

Deslocava-se, portanto, a dimensão penal para a ideia de periculosida-de: não interessava mais apenas a violação da lei efetiva, mas sim o con-trole do comportamento no momento em que ele se esboçava. A função não devia ser mais a de punir as infrações dos indivíduos, mas de corrigir as suas virtualidades, missão que não caberia mais somente ao judiciário: surgia a era da defesa social.

Percebe-se claramente que o saber inquisitório que havia se deslocado para o aparelho penitenciário procedia rumo à recolonização do aparelho judiciário, agora fundamentado por um conjunto de verdades científicas que conferiam ao saber criminológico o estatuto de uma ciência, portanto com formulações revestidas de critérios científicos que lhe garantiam a condição de verdade.

Dessa forma, a cientificidade, voltada para a consecução dos objetivos do poder, superava os ideais humanistas do projeto penal ilustrado, que, como já observado, nem sequer havia se realizado na prática. Nesse

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sentido, “a criminologia positivista aparece como continuidade e reforço daquele projeto científico da modernidade que, a partir do domínio da natureza, levaria a sociedade ao cume civilizatório”. Poder e ciência se retroalimentavam.

Orientada por essa nova perspectiva, a cientificidade criminológica prescindia dos princípios da culpabilidade, legalidade e juridisdicionalidade, pois o crime passou a ser, sob essa ótica, um fator natural, perceptível no mundo dos fatos pela experiência da investigação científica, e não uma realidade artificial sancionada pela lei.

O advento da Criminologia positivista fez com que ocorresse um deslo-camento de um modelo cognoscitivista jurisdicional, que, mesmo limitado, ainda mantinha algumas virtudes, para o decisionismo valorativo substanci-alista que passou a vigorar. Surgia um novo tipo de saber, que não tinha mais a função de determinar se algo aconteceu ou não, mas se o indivíduo se conduzia como devia. Não interessava a tal saber a presença ou ausên-cia, a existência ou não-existência, no sentido de atribuição de responsabi-lidade por uma conduta. Como afirma Foucault, “tal saber respondia a uma nova situação política: as revoltas camponesas dos séculos XVI e XVII agora se tornavam revoltas urbanas populares e, em seguida, proletárias”. Era o tempo da Primavera dos povos, que havia sacudido a Europa em 1848.

Os ideais da nascente ciência são facilmente perceptíveis: uma obses-são desmedida pela verdade de acordo com o cientificismo; um ideal esté-tico, expressando uma noção de feiúra, típica do mal; um ideal de limpeza, que se expressa na concepção de crime como algo passível de higieniza-ção, de busca de restauração da ordem; e finalmente, um ideal de pureza, que se expressa na perseguição constante ao perigoso, ao perverso. O deslocamento de sentido e propósito em relação ao garantismo ilustrado era completo.

Para Carvalho, a concepção criminológica positivista inaugurou a pri-meira reação anti-ilustrada (inquisitiva) ao garantismo penal, e ainda que a contribuição lombrosiana – como aporte teórico – possa ter sido ingênua devido a sua estrutura científica insustentável, estava longe de ser inofensi-va, pois forneceu ampla justificativa para isentar as classes industriais de grande parte dos delitos patrimoniais cometidos.

Em suma, a característica maior do “novo” paradigma é que a verdade passava a ser novamente extraída/constatada do sujeito/objeto do proces-so e não do fato-crime. Era o retorno da Inquisição, agora revestida de legitimidade científica. O foco apenas havia sido deslocado em relação ao que determinava a periculosidade, como afirma Carvalho: “agora não mais o herege, mas o perverso; não mais o satânico, mas o selvagem (hedion-do), cuja periculosidade rompe com os naturais laços de convivência soci-al”.

Os modelos em estado puro, no plano teórico, se contrapõem nos se-guintes termos: de um lado, um direito penal do fato, em que o autor age em função de livre-arbítrio, em que o modelo de investigação é dedutivo-hipotético, a pena é retributiva, o processo é acusatório e o Estado tem perfil liberal, absenteísta. De outro lado, um direito penal do autor, determi-nista, em que o modelo de investigação é indutivo-causal, a pena é regene-radora e o processo é inquisitório, e o Estado assume uma postura mais ativa de intervenção direta objetivando a prevenção.

O deslocamento das premissas constituídas no aparelho penitenciário e do exame que realizavam da delinquência para dentro do aparelho judici-al a partir de um saber “científico” acabou resultando no abandono dos ideais do garantismo ilustrado em prol da constituição de mecanismos mais eficazes de repressão. O pragmatismo ditava a dinâmica de um poder punitivo preocupado, sobretudo, em manter e garantir a nova ordem social, ameaçada pelos desviados.

Ocorreu uma verdadeira sociologização das práticas judiciárias, que só começou a ser revertida posteriormente, com a retomada de pressupostos de responsabilização jurídica. Entretanto, quando os juristas se insurgiram contra essa ingerência dos saberes antropológicos, médicos e sociológicos, essa atitude se deveu muito mais a corporativismo do que propriamente a um desejo de estabelecer um sistema em conformidade com os parâmetros teorizados pelos reformadores do século XVIII.

7 – EPÍLOGO

Como vários críticos da modernidade – e em especial Foucault – apon-taram, a ciência acabou por servir à constituição da disciplina e do domínio mais eficaz do homem pelo próprio homem. O surgimento da Criminologia, no contexto oitocentista, fez parte desse processo. De fato, por trás da pretensa vocação para a verdade, a modernidade gerou uma sociedade disciplinar, cuja característica maior é a busca de estabelecimento de uma relação de sujeição sobre os indivíduos.

A configuração de uma relação de docilidade-utilidade pretendia anular toda individualidade, erradicando a diferença e estabelecendo o controle por meio de uma constante vigilância. Além disso, a tecnologia foi colocada a serviço da destruição, potencializando o surgimento de formas mais eficazes e rápidas de promoção do extermínio do homem sobre o seu semelhante. É nesse sentido que Gauer afirma que “um conhecimento que se pretendia utilitário e funcional acabou por ser reconhecido menos pela capacidade de compreender profundamente o ‘real’ do que pela capacida-de de o transformar e dominar”.

São comentários ácidos, que podem ser facilmente articulados ao pro-cesso de desfiguração a que foi submetido o garantismo ilustrado nos oitocentos. Além disso, não pode ser esquecido que por trás da pretensa separação entre sujeito e objeto tão cara a Descartes, o sujeito acabou por preponderar, o que acarretou o emudecimento do mundo face a esse monólogo, como assinala Octavio Paz. Foucault considera que “Descartes estabeleceu uma prioridade um tanto quanto sagrada do sujeito no pensa-mento ocidental”. Em concordância, Gauer refere que “desde Descartes, esse diálogo tensional como que derivou a favor de um peso excessivo do pólo do sujeito”. Não havia, na realidade, separação entre sujeito e objeto, mas sim, determinação do sentido do objeto de forma exterior e não relaci-onal, por um sujeito que impunha sua vontade. O parâmetro moderno de conhecimento expressa uma vontade de poder e uma vontade de domínio. Isso é inegável. Se isso já é grave e pode ser considerado uma violência enquanto forma de construção do conhecimento, o que dizer então de um conhecimento que faz da pessoa objeto, dentro de tais parâmetros? Esse é um limite que a Criminologia, enquanto saber, encontra grandes dificulda-des em superar até hoje, apesar de algumas aberturas, como a Criminolo-gia Crítica de Baratta.

Portanto, ainda que os referenciais originais da inquisição fossem apa-rentemente incompatíveis com a nova realidade social, política – e até mesmo científica – de então, a objetificação humana que ela propunha permaneceu sendo defendida de forma arraigada e convicta.

Tudo em função da “segurança” que proporcionava, amparada por um novo dogma, de ordem científica, pois justificava o poder. Da “verdade” extraída pelo inquisidor do corpo do herege, para uma nova verdade con-trolada e descoberta pela ciência, pelo contraditório e pelos limites ao poder do Estado, deveria ter ocorrido uma transposição clara de um modelo de direito penal do autor para um modelo de direito penal do fato, o que não se verificou, em função dos desígnios do poder, no contexto oitocentista.

O mais assustador é que essa vocação inquisitória, penitenciária e etio-lógica não é apenas um resto do passado, um cadáver enterrado e putrefa-to, que é exumado pela curiosidade de pesquisadores. O Direito Penal do Inimigo de Gunther Jakobs está aí para comprovar a permanência (ainda que com nova roupagem) e o perigo de tais ideias, por mais sistemáticas e científicas que se proponham ser.

O mesmo pode ser dito de certas “inovações” da política criminal brasi-leira nos últimos anos (como o famigerado RDD, por exemplo) e da febre de prisões “cautelares” que evidenciam a preocupação obsessiva em ter o corpo do “herege” à disposição do poder punitivo. A objetificação da pessoa não é apenas um resto de um tempo já superado; é algo tão experimentado e vivido como o suplício imposto à carne pela dogmática inquisitória no passado. O mais grave é que isso se dá nas margens de um Estado De-mocrático de Direito em que o critério de validade é (ou devia ser) o da estrita legalidade: conformidade com um núcleo principiológico estabelecido constitucionalmente, em que a dignidade da pessoa humana é central. Decididamente, ainda temos muito a avançar. A Inquisição permanece viva, ainda que de forma velada. Salah H. Khaled Jr.

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VIOLÊNCIA NO BRASIL E FATORES CONDICIONANTES

Dr. Geraldo Costa de Vasconcelos Filho

A questão da violência no Brasil nos leva, rapidamente, a refletir nos fa-tores mais óbvios que realmente também são condicionantes para a violên-cia, contudo, não expressam, por si só, o contexto mais fiel para o proble-ma; como por exemplo: a falta de policiais ou baixo número destes, a ausência de uma legislação mais severa, desarmamento da população idônea, etc.

Túlio Kahn assevera:”

Uma combinação explosiva de modernização e urbanização acelera-dos, desigualdade social, padrões de consumo de primeiro mundo, liberda-de política e ausência de freios morais e religiosas parecem ser os maiores responsáveis pelo fenômeno da violência crescente na América Latina, ao lado da produção de drogas e da economia estagnada em vários países.”.

A afirmação de um dos mais importantes criminologistas que o Brasil possui, encaixa-se perfeitamente à nossa realidade. De fato, devemos analisar todo um contexto, e não somente este ou aquele motivo que pode levar à violência a qual já estamos até acostumados a convier no país.

Antes de chegarmos aos fatores que levam à violência ou interferem de forma significativa, como o baixo número de policiais nas ruas, o mau- preparo dos mesmos, salários baixos, etc, devemos nos lançar a fatos e situações anteriores; ou seja, o começo da violência, onde ela nasce, por que ela se perpetua e tende a aumentar, quem são os responsáveis por essa violência e o que fazer para combatê-la.

Vemos então aí, que o assunto não é tão pontual e simples; que en-volve realmente uma combinação explosiva de modernização e urbaniza-ção aceleradas, desigualdade social e tudo aquilo dito por Túlio Kahn,

Vamos analisar então, a violência em um de seus nascedouros, aque-la contra as crianças.

A violência contra as crianças e adolescentes acompanha a história humana, distinguindo-se expressamente em cada cultura.

Sabe-se que há dezenas de conflitos étnicos ou políticos violentos atualmente em andamento no mundo, onde milhões de crianças que por conta desses conflitos resultam seriamente feridas e/ou traumatizadas psicologicamente.

No Brasil, é fato que a violência que tira a vida de milhares de crianças e adolescentes, em muitas vezes, resultam de ações ou omissões huma-nas, facilitadas por condicionantes técnicos e sociais inadequados. Muitos acidentes com crianças e adolescentes são passíveis de prevenção e são fruto da negligencia dos responsáveis, da falta de investimento público e da ausência de controle eficaz do Estado, como por exemplo nos acidentes de transito.

Estudos realizados, com apoio do Conselho Nacional de Desenvolvi-mento Científico e Tecnológico (CNPq) e da Fundação de Amparo à Pes-quisa do Rio de Janeiro (FAPERJ), nos mostra que no triênio de 1997 a 1999, a taxa de mortalidade por causas externas, (fora do ambiente famili-ar), na faixa etária até 9 anos, foi de 17,2 por 100.000 habitantes, predomi-nando os acidentes causados por efeitos adversos de drogas, medicamen-tos e substancias biológicas, seguidos pelos decorrentes de fogo ou cha-mas, quedas e envenenamentos.

Na faixa de 0 aos 19 anos, observou-se taxa de 45,94 por 100.000 ha-bitantes, com destaque para o crescimento dos homicídios. Desses óbitos, 67% foram provocados por armas de fogo.

Em 1999 e 2000, ocorreu a maior onde demográfica da população jo-vem na historia do Brasil, contudo o país mantinha a desigualdade social, a baixa escolaridade e a extrema concentração de rende, que atingiam as famílias e faziam sofrer uma multidão de adolescentes que enfrentavam a concorrência e as restrições do mercado de trabalho simultaneamente à elevada pressão da sociedade de consumo. As pessoas tinham renda média mensal familiar de até meio salário mínimo, a situação era de pobre-za extrema.

“TER” É O IMPORTANTE

E os jovens vivem em uma sociedade que valoriza, de forma extrema, o consumo de bens: As pessoas são avaliadas pelo que possuem e con-somem e não pelo que elas são.

Nessa sociedade, é fácil imaginar que os jovens, por não conseguirem se enquadrar nos padrões impostos pelo consumismo e não vislumbrarem futuro algum, procurem formas criminosas para não se sentirem discrimina-dos e fora da sociedade, que impõe de forma tão materialista “ que para ser, tem que ter”.

A violência que atinge crianças e adolescentes, no plano interpessoal, especialmente no ambiente familiar e escolar também merece especial atenção.

Crianças que recebem tratamento doentio físico ou emocional, abuso sexual, negligencia ou outro tipo de exploração que resulte em danos reais ou potenciais para a saúde, sobrevivência, desenvolvimento ou dignidade, no contexto de uma relação de responsabilidade, confiança ou poder, podem ter problemas psicológicos, se tornando violenta, e podem cometer atos impróprios ou criminosos.

Um estudo domiciliar constatou que um em quatro jovens residentes no Rio de Janeiro, independentemente do estrato social a que pertençam, sofrem violência física na família, desde tapas, socos, empurrões até for-mas mais lesivas de violência, como agressão com armas. Um total de 1,1% dos jovens dos estratos populares vivenciou ameaça ou foi efetiva-mente agredido com arma de fogo, em suas famílias.

Outro estudo que investigou a violência física familiar entre escolares de Duque de Caxias, no Estado do Rio de janeiro, detectou a existência do problema em 49,4% dos adolescentes na escola pública, e 45% na escola privada.

Situações sociais frequentemente associadas à violência familiar são o abuso de drogas, gravidez precoce, fracasso escolar, delinquência, suicí-dio, agressões escolares e entre pares, depressão e prostituição. Um fator complicador para a compreensão da violência e de suas consequências é o fato de que ela não se reduz a um conjunto de práticas objetivas, mas também engloba representações pessoais. As percepções individuais e sociais da violência são elos cruciais na compreensão da gênese do pro-blema. Uma vez que a violência se constitui no âmbito das relações huma-nas, passa, muitas vezes, a ser encarada como parte da natureza do ser humano.

A forma como um adolescente se vê, seus valores, sua competência e o mundo que o cerca pode ser afetada pelo grau de violência a que é submetido ao longo da vida.

Acredita-se que a experiência de violência tenha um importante papel no julgamento que o adolescente faz de si e dos outros.

Nesse sentido, o impacto da convivência familiar sobre o crescimento e desenvolvimento infanto-juvenil é o elo fundamental para a formação do indivíduo. A comunicação entre pais e filhos e a vitimização física, sexual e psicológica ocorrida na família ou cometida por pessoas que são significati-vas para a criança ou adolescente são fatores que interferem na construção da autoconfiança e da confiança nos outros.

A violência cometida por pessoas de quem à criança ou adolescente espera amor, respeito e compreensão é um importante fator de risco que afeta o desenvolvimento da auto-estima, da competência social e da capa-cidade de estabelecer relações interpessoais, potencializando a fixação de um autoconceito negativo e uma visão pessimista do mundo. Pode-se afirmar que a representação social que o individuo tem de si próprio na adolescência está associada à experiência de violência no universo relaci-onal. Por este motivo, incentivar os jovens a terem uma “auto visão” positi-va, mesmo tendo que superar todas as dificuldades e barreiras existentes, é de vital importância.

POTENCIAL RECONHECIDO

O adolescente deve perceber que está sendo reconhecido o seu po-tencial, devendo ser fortalecida sua auto-estima e deve-se estimulá-lo a compreender seus próprios limites, assim como os das pessoas que o cercam e da sociedade mais ampliada.

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Constitui-se num desafio o trabalho contra a violência, já tão inscrita nas relações sociais, sobretudo nas familiares.

Os adolescentes almejam carinho, afeto e atenção.

Cabe aos profissionais que se deparam cotidianamente com essas cri-anças e adolescentes sensibilizar-se com suas amargas histórias e acredi-tar no poder de superação desses seres que sofrem, oferecendo-lhes proteção e um atendimento eficiente, demonstrando apreço e compreensão pela sua pessoa e oficializando a denúncia.

Só assim a violência poderá ser atenuada e poderão ser subtraídos os fatores de risco que deterioram gravemente a vida.

A segurança pública não depende tão somente da ação da Polícia, da Justiça ou do sistema penitenciário, e a redução da criminalidade e da violência é, cada vez mais, objeto de atuação da sociedade civil organizada como um todo, através de diversas entidades ou até mesmo atitudes indivi-duais.

A violência não é um fenômeno novo na sociedade brasileira e os cri-mes, na medida em que não são resolvidos, vão se acumulando nos poros da história, comprometendo o Estado de Direito, em sua dimensão pública e privada. Os horrores se sucedem no dia-a-dia ,e a violência não é somen-te aquela que produz cadáveres, que mutila corpos e destrói a materialida-de; ela é também aterradora, quando se reveste de desrespeito à dignidade humana.

Nesse universo, inúmeras violações aos direitos dos seres humanos mais fundamentais são cometidas no cumprimento das penas, maculando o entorno cultural da sociedade contemporânea, sobretudo em razão de suas desigualdades, uma vez que, dentre outros indicadores, o grau de civiliza-ção de um país é medido pelo respeito dispensado aos seres humanos, livres ou presos.

Vivemos um dos piores momentos da nossa história, com a deflagra-ção das mais variadas crises, seja de mercado ou de mercadoria humana, onde impera uma totalidade de problemas que passam pelo desemprego, decadência das instituições responsáveis pela educação, saúde e moradia, corrupção generalizada, descrédito nas ideologias, desrespeito ao meio ambiente e crime organizado, apenas para citar alguns. Isto tudo gera o aumento da criminalidade que, se não for tratada de maneira adequada, volta-se contra a própria sociedade, que passa a viver sob o signo do medo e da insegurança.

Na busca desesperada de uma suposta tranquilidade social, advoga-se por medidas repressivas de extrema severidade, e a sanção penal passou a ser considerada como indispensável para a solução dos conflitos sociais.

Em 17 de agosto de 2000, o general Alberto Cardoso, então ministro-chefe do Gabinete de Segurança Institucional da Presidência da República, afirmava que a situação de violência no Brasil era tão grave que seria muito difícil revertê-la, ou mantê-la sob controle.

Na opinião do general Cardoso, os sindicatos, as igrejas de diferentes religiões, as escolas, as organizações não-governamentais e as famílias, deveriam se engajar nesse movimento contra a violência. “A família deve ser, ao mesmo tempo, instrumento e vetor dessa cruzada. As igrejas têm que se envolver em uma campanha de recuperação de valores espirituais”, afirmava ele, e prosseguia: “ O povo tem que se conscientizar da necessi-dade de lutar pela volta de alguns valores perdidos.”

A posição do general valoriza a família, a igreja e a comunidade, na formação do caráter da pessoa, e mostra que a melhoria das relações comunitárias e a educação para a cidadania são essenciais na prevenção da violência.

A prevenção da violência é que vai gerar, mesmo que em longo prazo, resultados sólidos e duradouros. Deve-se ter em mente que a criança e o adolescente merecem maior atenção, não só dos organismos oficiais, mas principalmente das famílias, ONG’s, e da sociedade, de forma geral. Identi-ficando o problema dos jovens e minimizando sua exposição aos proble-mas que os conduzem à violência, reduzirá, de forma eficaz, o número de cidadãos violentos e/ou criminosos.

NOTA: Este artigo foi veiculado na edição nº 58, (dezembro/janeiro 2008), da revista Proteger, da Sicurezza Editora Ltda.

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Dentre os principais fatores psicológicos que levam a prever violência juvenil estão hiperatividade, impulsividade, controle comportamental defici-ente e problemas de atenção...

As teorias podem ajudar a explicar como e por que fatores psicológi-cos, tais como impulsividade ou baixa inteligência, fatores familiares como supervisão parental deficiente, e fatores socioeconômicos, de vizinhança e os relativos aos grupos de pares podem influenciar no desenvolvimento do potencial de violência de um indivíduo. Por exemplo, morar num bairro ruim e sofrer privações socioeconômicas, podem, de algum modo, ser a causa da deficiência dos cuidados parentais, que, de alguma forma pode causar impulsividade e fracasso na escola que, de alguma maneira, podem levar a um alto potencial de violência.

As teorias podem ser úteis também para a especificação dos conceitos mais gerais subjacentes ao potencial de violência, tais como baixo autocon-trole ou vínculos frágeis com a sociedade. Elas também podem ajudar na determinação das maneiras pelas quais uma pessoa potencialmente violen-ta interage com os fatores circunstanciais, gerando atos violentos...

Diante de uma ocasião para a violência, o fato de uma pessoa vir ou não a praticá-la dependerá dos processos cognitivos (de pensamento), que incluem o exame dos custos e benefícios da violência e das probabilidades e riscos a ela associados, tais como percebidos pela pessoa, e também os repertórios comportamentais acumulados. Supõe-se também que as con-sequências da violência (vantagens, castigo, rótulos etc.) possam ter efei-tos retro-alimentadores num processo de conhecimento sobre o potencial de violência a longo prazo e sobre os processos decisórios (por exemplo, influenciando as percepções subjetivas de custos, benefícios e probabilida-des)...

A ideia básica da prevenção centrada nos riscos é muito simples: iden-tificar os principais fatores de risco da criminalidade e implementar métodos preventivos visando combatê-los. Muitas vezes, há também a tentativa correlata de identificar os principais fatores de proteção contra o crime e implementar métodos preventivos destinados a fortalecê-lo ... “: Violência nas Escolas e Políticas Públicas.: Eric Debarbieux e Catherine Blaya (Orgs.)

Aspectos genéticos e bioquímicos da criminalidade

Realizando pesquisas nos Argonne National Laboratories, decidi com meus colegas fazer algo mais do que escrever artigos que ficariam juntan-do pó em bibliotecas e seriam lidos apenas por cientistas. Resolvemos participar de um trabalho comunitário na área de crime e violência. Come-çamos na Penitenciária de Statesville — uma das três prisões mais severas dos EUA, onde estão indivíduos considerados extremamente violentos e incorrigíveis.

Acreditando que o criminoso é produto da sua vida passada e educa-ção, organizamos um programa de assistência nos moldes dos Alcoólicos Anônimos. Já na saída da prisão, cada um recebe roupa e a indicação de um emprego.

Depois de trabalhar durante dois anos com dúzias de indivíduos violen-tos, descobrimos que nossos conceitos estavam completamente errados. Percebemos que essas pessoas eram diferentes do resto da população — e que a diferença era fisiológica. Duas colheres de sopa (30 ml) de cerveja causam deterioração dramática em sua personalidade e muitos apresentam graves reações a açúcar, trigo e leite. Constatamos também uma incidência muito elevada de eczema, acne e psoríase.

Iniciamos, então, com a ajuda dos computadores, uma busca de todas as pesquisas publicadas no mundo sobre anomalias psicológicas, crimino-logia, violência, psiquiatria avançada, hiperatividade, esquizofrenia etc. Descobrimos uma revolução na saúde mental.

Criminologistas e sociólogos famosos falam sobre fatores psicológicos (falta de amor, maus tratos, falta de disciplina) e fatores sociológicos (po-breza, ensino fraco, superpopulação) que levam ao crime. Recentemente, no entanto, eles têm dado mais atenção a fatores genéticos e biológicos. O interesse maior é voltado aos desequilíbrios químicos. Estudos feitos no Canadá mostram que chumbo, cádmio e outros tóxicos estão mais presen-tes em pessoas violentas do que em pessoas normais. Também foi desco-berto que cromossomos anormais têm uma influência muito grande, sobre-tudo o cromossomo XYY. Pessoas com esse cromossomo têm incidência 40% superior de criminalidade.

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Comportamento criminoso com irmãos gêmeos

Enquanto 15 anos antes todos atribuíam violência e crimes a lares dis-solutos, ocorrências traumáticas ou maus tratos na infância, os estudos científicos — principalmente os estudos de adoções — mostravam que isso estava absolutamente errado.

Existe um banco de dados valioso na Escandinávia, com informação desde 1905, sobre crianças adotadas. O registro compreende mais de 100 mil indivíduos com dados detalhados sobre os pais verdadeiros, a família de adoção e a história dessas pessoas do berço até a morte.

Na Universidade da Califórnia reuniram informação sobre filhos mascu-linos com irmãos que tiveram a mesma mãe e o mesmo pai, e também com irmãos de pai desconhecido ou irmãos apenas por parte de mãe. As crian-ças eram adotadas, viviam em lares diferentes e nunca conheceram seus irmãos ou pais naturais. Os resultados foram impressionantes e mostraram que a criminalidade não é apenas questão de experiência de vida. Tem algo a ver com predisposição transmitida geneticamente.

O estudo de gêmeos fraternos e idênticos mostrou que a probabilidade da pessoa ser condenada por algum crime durante sua vida estava nor-malmente ao redor de 2,5% (uma pessoa em 40).

Entretanto, onde um gêmeo era delinquente a probabilidade do gêmeo fraterno também ser criminoso era de 33%.

No caso de gêmeos idênticos (univitelinos) a probabilidade subia para 69%.

Desequilíbrio bioquímico

Uma palestra do Dr. Carl Pfeiffer, que durante 20 anos havia realizado estudos de esquizofrenia, mudou tudo o que estávamos fazendo. Sugeriu que focalizássemos o metabolismo dos metais — principalmente do cobre, zinco, lítio e cobalto. De pesquisas com oligoelementos ele obteve muitas informações sobre as causas da doença mental.

Fizemos um estudo de irmãos escolhendo pares em que um irmão era delinquente e o outro, vivendo na mesma casa, perfeitamente normal e bom aluno. Nas crianças violentas encontramos, invariavelmente, taxas anormais de oligoelementos, como o Dr. Pfeiffer havia previsto.

Repetimos a experiência com um grupo bem maior de adultos e crian-ças. O resultado foi o mesmo. A maioria dos indivíduos violentos apresen-tava um desequilíbrio químico dos tipos A ou B.

Pessoas do tipo A apresentavam acessos de violência, mas após a ex-plosão sentiam remorso. Indivíduos do tipo B eram sempre desagradáveis e perversos, segundo pais e professores. Não sentiam remorso, eram anti-sociais — desde a primeira infância.

Indivíduos com personalidade do tipo A

Em termos de oligoelementos, o indivíduo do tipo A (infrator ocasional) tem níveis extremamente baixos de zinco e níveis elevados de cobre. Cálcio e magnésio são ou muito altos ou muito baixos, nunca normais. Se tiveram contato com produtos tóxicos, frequentemente têm níveis muito altos de chumbo e cádmio. O cádmio é um forte tóxico para o sistema nervoso e o chumbo também afeta a função cerebral.

Os sintomas típicos são uma personalidade maravilhosa, comporta-mento maravilhoso e, de repente, um episódio de comportamento terrível, pouco controle do "stress", violência. Depois que o episódio de violência acaba, ficam com muito remorso da sua falta de controle. Alergia, acne e queimaduras de sol são constantes. Rendimento escolar baixo, problemas de aprendizagem, dificuldade de atenção são muito comuns neste grupo.

Como exemplo tivemos um garoto de nove anos de Tacoma, EUA. Ele vivia perto da fundição de minérios Asarco Smelter, fonte de muitos tóxicos. Seu nível de cobre estava muito elevado, seu nível de zinco muito baixo e a relação zinco/cobre era de 1 para 1, quando o ideal é 8 a 12 por 1. A defi-ciência de zinco torna o cobre muito tóxico. O cobre, um elemento altamente irritante quando atinge níveis altos, provoca hiperexcitação e comportamento irracional.

O menino foi acusado de tentativa de assassinato aos 9 anos. Já tinha tomado 8 tipos diferentes de medicamentos e, no momento, tomava Ritalin. Após um tratamento de quatro meses, o nível de cobre ainda estava eleva-

do, mas o nível de zinco começou a subir. Um ano mais tarde, seu exame de cabelo mostrou níveis normais. Desde então, este garoto — que todo mundo previa passar o resto dos dias numa instituição — terminou o colé-gio com notas excelentes, participou de vários esportes e ganhou uma bolsa para a universidade, onde se formou. Seu tratamento custou uns 20 dólares em nutrientes durante um mês e meio. Depois, houve apenas ênfase na melhoria da alimentação. Se esse resultado pudesse ser multipli-cado aos milhares...

Na Universidade McGill, analisaram crianças com e sem problemas de aprendizagem. Observaram que as crianças com problemas tinham níveis muito mais altos de cádmio e taxas mais baixas de zinco do que as crianças sem problemas. Muitas crianças delinquentes e adultos transgres-sores têm um histórico de problemas de aprendizagem na escola.

É possível identificar estes padrões já na criança pequena. Às vezes, o laboratório que realiza a análise do cabelo chama os médicos para pergun-tar se a criança apresenta problemas de comportamento. Os médicos ficam admirados que os problemas possam ser determinados dessa forma.

Examinamos e tratamos centenas de crianças com problemas de com-portamento e percebemos que muitas também tinham dificuldades de aprender e eram hiperativas. Muitas crianças do tipo A melhoraram de forma notável. Houve diversos casos de crianças em classes especiais devido a baixo desempenho ou hiperatividade, que, após alguns meses de tratamento, eram transferidas, já normais, para as classes comuns — e um a dois anos mais tarde passavam para classes de superdotados.

Alto teor de cádmio e chumbo

Após a publicação do nosso trabalho, fomos convidados a participar de autópsias e perícias. O chefe de medicina legal de Oklahoma nos chamou para realizar uma análise de oligoelementos no assassino P. Sherril após a chacina no correio. Sua personalidade era do tipo A extremo. Seu desequi-líbrio cobre / zinco era muito grave e seu nível de sódio estava abaixo do normal. O fator mais importante era o nível elevado de cádmio e, princi-palmente, o nível muito alto de chumbo. A Universidade de Oklahoma apontou o manuseio de munição como principal fonte de chumbo. Como campeão de tiro da Guarda Nacional, P. Sherril se envenenou inalando o vapor de chumbo saído da espingarda. Um desequilíbrio metabólico o tornara mais suscetível a tóxicos.

Indivíduos com personalidade do tipo B

O tipo B costuma ser agressivo; briga constantemente, não tem cons-ciência alguma e sente absoluta falta de remorso. É um mentiroso patológi-co. Desde a infância, muitas pessoas do tipo B sentem uma fascinação pelo fogo. Frequentemente são cruéis com animais e pessoas. Dormem apenas 3 ou 4 horas por noite.

Indivíduos com personalidade sociopática do tipo B (infrator permanen-te) são os mais assustadores, desde pequenos. São exatamente o contrá-rio quanto ao nível de cobre. Em vez de ser extremamente alto como no tipo A, o nível de cobre é extremamente baixo e os níveis de sódio e potássio são elevados. Também tendem a ser sensíveis a tóxicos e os níveis de chumbo e cádmio, cálcio e magnésio costumam ser altos, en-quanto os níveis de zinco e manganês são baixos.

Charles Manson, o famoso assassino, nos convidou para fazer um tes-te. Seu nível de cobre é um dos mais baixos que constatamos em 150.000 pessoas examinadas.

Nível altíssimo de cádmio

James Huberty, que atirou em 24 pessoas no McDonalds, em Ysidro, Califórnia, era um tipo B clássico. Seu nível de cádmio era o mais alto que encontramos num ser humano.

Esta informação, de certa forma, confortou a família — ele não era lou-co, mas estava sendo afetado pelo nível anormal desse neurotóxico, adqui-rido trabalhando durante 19 anos soldando ligas muito ricas em cádmio. Era um bom pai até dois anos antes do massacre. Foi encaminhado para tratamento psiquiátrico mas, como de costume, começou a receber medi-camentos fortes e sua bioquímica não foi levada em consideração, apesar do seu histórico médico e uma cirurgia renal indicarem envenenamento por cádmio. O médico legista chamou a atenção para o fato de que o cádmio é uma substância letal que provoca morte por falha renal. Quando examina-

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ram o histórico de J. Hubert, verificaram que havia estado no pronto-socorro duas vezes nos meses antes da chacina no McDonald’s devido a falha renal. Escreveu n o pedido de demissão do trabalho que os vapores da solda o estavam enlouquecendo.

Isso também vale para agrotóxicos e produtos químicos — tudo o que é tóxico para o organismo humano se torna muito mais tóxico ainda na presença do cádmio.

Nos cigarros há cádmio — na realidade, são a maior fonte de cádmio na nossa sociedade. Nos anos 20 e 30, as mulheres começaram a fumar e o cádmio começou a passar para o tecido da placenta, onde ocorre o primeiro contato do feto com essa substância. O cádmio interfere na absor-ção e utilização do zinco pelo feto, o que pode continuar e aumentar após o nascimento, quando o bebê é exposto aos níveis de cádmio do ar ambien-te. Portanto, existe uma relação entre cádmio e fumaça de cigarro e os problemas de comportamento e aprendizagem.

O café é a segunda maior fonte de cádmio. Farinha branca refinada é outra fonte importante, porque o zinco protetor é removido dos grãos, enquanto o cádmio, no centro, permanece.

Nível alto de manganês

O manganês pode ser outro fator de violência, segundo um estudo da Escola de Medicina Irvine, da Universidade da Califórnia. Descobriram que infratores que apresentam mais que 7 ppm de manganês no cabelo tinham um histórico de violência. Querendo comprovar os resultados, fizerem uma pesquisa comparando a população normal com uma grande população de presos. Descobriram que havia muito mais manganês entre a população criminosa que entre a população normal.

Médicos homeopatas conseguem bons resultados na remoção de me-tais tóxicos do organismo. Normalmente, após um ano de tratamento, seus pacientes apresentam níveis muito baixos de elementos tóxicos no exame dos cabelos e significativa mudança de comportamento.

Nível de lítio na água

Outra fascinante correlação existe entre o nível de lítio da água potável e o crime, o suicídio e a dependência de heroína (mas não a dependência de maconha e o consumo de álcool).

A taxa de suicídios, homicídios e estupros é significativamente mais al-ta em municípios com água potável contendo pouca quantidade ou nenhu-ma de lítio. Em outro estudo, nenhum prisioneiro testado apresentava mais que 0,12 ppm de lítio, mas a maioria dos habitantes tinha níveis mais altos. O lítio parece contrabalançar os efeitos do manganês e prevenir o compor-tamento violento que ele provoca.

Albuquerque, no Novo México, apresentava os índices mais elevados de criminalidade nos Estados Unidos no início da década de 70, quando Alexander Schauss era encarregado da vigilância dos indivíduos após sua libertação da prisão. Ao ler estudos mostrando que as taxas de assassinato e os níveis de lítio na água potável são inversamente proporcionais, ele sugeriu a adição de lítio à água de Albuquerque para reduzir a taxa de criminalidade. Sua sugestão foi inicialmente recebida com descrença. Entretanto, a Universidade da Califórnia confirmou a correlação entre baixo teor de lítio e crime e também indicou a sugestão de Schauss como solu-ção possível onde á água contém pouco lítio.

"Pegamos pessoas que o sistema judiciário considerou impossíveis de reabilitar e tratamos alguns, enquanto demos placebo para outros. Os resultados foram inacreditáveis, em termos de diminuição considerável da taxa de reincidência daqueles que tratamos." É preciso lembrar que, na Califórnia, cerca de 90% de todos os egressos do sistema penitenciário voltam à prisão no prazo de cinco anos, devido a nova infração.

O programa para réus primários da Universidade do Novo México, ini-ciado por Schauss e outros, recebeu em 1989 um prêmio especial de uma associação nacional de psiquiatria e foi nomeado "o programa de reabilita-ção mais bem-sucedido dos EUA". Após quase 20 anos, apresentava uma taxa de reincidência abaixo de 5%, fazendo jus ao prêmio recebido. Wil-liam Walsh

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A violência doméstica é um fenômeno complexo, suas causas são múl-tiplas e de difícil definição. No entanto suas consequências são devastado-ras para as crianças e adolescentes, vítimas diretas de seus agressores. Ao contrário do que se pensa, as desigualdades sociais não são fatores determinantes da violência doméstica, pois esta se encontra democratica-mente dividida em todas as classes sociais.

A dificuldade em definir este fenômeno está embasada em suas múlti-plas conceituações nas diversas áreas científicas. Na área médica por exemplo, o primeiro estudo realizado foi pelo professor Ambriose Tardieu (1860), que tentou trazer a tona o fenômeno da violência doméstica, o qual na época não teve repercussão científica, em função do momento sócio-político vigente. Esta se deu somente em 1962, nos EUA, através dos Drs. Kempe e Silvermann, os quais conceitualizaram o fenômeno como sendo "Síndrome da Criança Espancada", baseados em evidencias radiológicas. Nessa época, segundo Gordon (1988), "os movimentos feministas, dos estudantes dos direitos civis, antibelicistas fomentaram questões críticas sobre a santidade da privacidade familiar, a posição privilegiada do homem enquanto chefe de família e a importância da família permanecer unida a qualquer preço", contribuindo assim para a aceitação dos estudos.

Vários teóricos, ofereceram definições sobre o tema, no entanto ne-nhuma dessas teorias conseguiu refletir a conceituação global do fenôme-no. Porém estes estudos possibilitaram uma ampla discussão, havendo uma adesão de outras ciências, como a Psicanálise, a Pediatria e a Psico-logia.

As professoras Dra. Maria Amélia Azevedo e Viviane Guerra (USP/SP - 1989) através de estudos e pesquisas, foram as que melhor conceituaram o fenômeno da violência doméstica contra crianças e adolescentes, quando definem a mesma como sendo "todo ato ou omissão praticado por pais, parentes ou responsáveis contra crianças e/ou adolescentes que - sendo capaz de causar dano físico, sexual e/ou psicológico a vítima - implica de um lado, numa transgressão do direito que crianças e adolescentes têm de ser tratados como sujeitos e pessoas em condição peculiar de desenvolvi-mento". A respeito da definição acima citada, referem ainda as autoras:

. Todo ato ou omissão significa que o fenômeno pode assumir forma ativa (ato) ou passiva (omissão), podendo ser praticado por pais (biológico ou de afinidade), responsáveis legais (tutores, que podem ser inclusive padrinhos, etc.) ou parentes (irmãos, avós, tios, primos, etc.). Demonstra-se assim a gama ampla de possíveis agressores. Circunscreve também a especificidade do fenômeno: violência doméstica, praticada no lar, um dos tipos de violência familiar (já que esta última expressão pode abranger também a violência contra mulheres e idosos), diferente, portanto, da violência extra familiar.

. Contra crianças e adolescentes... significa que, em nossa sociedade são vítimas potenciais, todos os menores de 18 anos (idade legal da maio-ridade), sejam eles crianças (até mais ou menos 12 anos) ou adolescentes (de 12 até 18 anos). Rejeita-se assim a ideia - ainda vigente entre certos profissionais, por exemplo, da área da Saúde - de que as vítimas seriam apenas crianças menores de 1 ano (graças a Síndrome da Criança Espan-cada, conforme citação anterior).

. Que sendo capaz de causar dano físico, sexual e/ou psicológico a ví-tima... significa que por violência doméstica contra crianças e/ou adolescen-tes entendemos VIOLÊNCIA SEXUAL, FÍSICA E PSICOLÓGICA; significa, também, o reconhecimento de que o dano pode ser efetivo ou potencial (capaz de) e que, enquanto possibilidade de imposição de dano configura necessariamente um processo de vitimização, isto é, de transformação de crianças e/ou adolescentes em vítimas ou em "crianças/adolescentes em estado de sítio".

. Implica de um lado numa transgressão do poder/dever de proteção do adulto... significa que o fenômeno é uma clara exacerbação do poder de autoridade e do dever de proteção parental que se inscreve na estrutura mesma da FAMÍLIA enquanto instituição de socialização primal (e primordi-al em nossa sociedade) das novas gerações. Neste sentido, as diferentes formas de VIOLÊNCIA contra crianças e adolescentes configuram um claro ABUSO do poder/dever de proteção familiar de que infância e adolescência necessitam para desenvolver-se.

. E, de outro, numa coisificação da infância, isto é, numa negação do direito que crianças e adolescentes TÊM de ser tratados como SUJEITOS e

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PESSOAS em condição peculiar de desenvolvimento... significa o reconhe-cimento de que o fenômeno é uma violência, tal como definiu Chaui e as referidas autoras: uma relação interpessoal assimétrica, hierárquica de PODER, implicando num pólo DOMINAÇÃO (pólo adulto) e, no outro obje-talização, coisificação, submissão dos desígnios e desejos do outro (pólo criança/adolescente)". (Azevedo e Guerra, 1995).

A ocorrência de abuso, vitimização física, sexual, psicológica e a negli-gência, praticada contra crianças e adolescentes, depende de fatores psicológicos, sócio-econômicos, culturais e características patológicas do pai-mãe e filho. Além disso, deve-se levar em consideração o histórico familiar dos pais, articulado com o contexto situacional de sua realidade. A história desta família é composta pelas vivências acumuladas dos pais, que antes de gerarem os filhos, estiveram envolvidos nas relações de sua própria família, onde adquiriram suas experiências de socialização, que poderão transmitir aos seus filhos, existindo assim a possibilidade da repro-dução de valores. Tudo isso mostra, que conforme a abordagem sócio-psico-interacionista, o psicológico é condicionado pelo social, produzindo-se historicamente.

Outros fatores também podem facilitar a situação de violência, como "stress" (desajuste, violência, desemprego, isolamento, excesso de filhos, ameaças à autoridade, valores, criança indesejada ou problemática) e situações precipitantes (ausência de mãe, rebeldia da criança).

Tipos de Violência

VIOLÊNCIA FÍSICA: "Qualquer ação, única ou repetida, não acidental (ou intencional), cometida por um agente agressor adulto (ou mais velho que a criança ou o adolescente), que lhes provoque consequências leves ou extremas como a morte". (Claves - Centro Latino-Americano de Estudos de Violência e Saúde)

VIOLÊNCIA PSICOLÓGICA: "É o conjunto de atitudes, palavras ou ações para envergonhar, censurar e pressionar a criança de forma perma-nente, como: ameaças, humilhações, gritos, rejeição e isolamento". (Claves - Centro Latino-Americano de Estudos de Violência e Saúde)

NEGLIGÊNCIA: "Privar a criança de algo de que ela necessita, quando isso é essencial ao seu desenvolvimento sadio. Pode significar omissão em termos de cuidados básicos como: privação de medicamentos, alimentos, ausência de proteção contra inclemência do meio (frio / calor)". (Claves - Centro Latino-Americano de Estudos de Violência e Saúde)

ABANDONO: "Caracteriza-se como abandono a ausência do respon-sável pela criança ou adolescente. Considera-se abandono parcial a au-sência temporária dos pais expondo-a a situações de risco. Entende-se por abandono total o afastamento do grupo familiar, ficando as crianças sem habitação, desamparadas, expostas a várias formas de perigo". (Claves - Centro Latino-Americano de Estudos de Violência e Saúde)

ABUSO SEXUAL: "Todo ato ou jogo sexual que tem por finalidade es-timular ou usar a criança ou adolescente para obter prazer sexual, como: falar palavras obscenas, expor órgãos genitais (exibicionismo), olhar a criança em sua intimidade (voyerismo), pornografia, carícias nos órgãos genitais e estupro". (CRAMI-ABCD, 2003).

Raízes Sociais da Violência

Concentração populacional e violência

Em 1962, John Calhoun publicou na revista Scientific American um es-tudo que ganhou os jornais diários e teve repercussão no meio científico. No artigo "Densidade Populacional e Patologia Social", o autor relatava um experimento sobre as consequências do aumento da população de ratos, numa gaiola com um comedor na parte central e outros distribuídos pelos cantos.

O aumento do número de animais na gaiola provocava sua aglomera-ção em volta do comedor central, embora houvesse espaço à vontade ao redor dos comedores laterais. Como cada rato queria para si a posição mais privilegiada no centro, começavam as disputas. Quanto maior a con-centração de ratos, maior a violência das brigas: mordidas, ataques sexu-ais, mortes e canibalismo.

Naqueles anos 1960, o experimento foi um prato cheio para os compor-tamentalistas (behavioristas) e o público em geral. Oferecia uma explicação simples para a epidemia de violência que a TV começava a mostrar nas

grandes cidades: turbas enfurecidas, polícia, bombas de gás lacrimogêneo, saques e as gangues urbanas. Assim como os ratos se matavam por uma posição no meio da gaiola, os homens se agrediam no centro das cidades, concluíram todos.

Durante décadas, a imagem da "gaiola comportamental" de Calhoun contaminou o entendimento das causas da violência urbana: quanto maior a concentração de gente nos centros urbanos mais violência, tornou-se crença geral. Ninguém lembrou que, no centro de Tóquio apinhado de gente, uma senhora pode andar tranquila à meia-noite, e que São Paulo ou Los Angeles, cidades de grande extensão e densidade populacional muito menor, estão entre as cidades mais violentas do mundo. É o que dá extra-polar diretamente para o homem dados obtidos com animais. Apesar de mamíferos, os roedores não são primatas.

Principais causas sociais da violência

A revista Science, já citada muitas vezes, traz uma revisão que resume a produção científica americana no campo da violência nas cidades. Vamos usar alguns desses estudos na discussão das causas sociais mais relevan-tes da violência urbana:

1) Desigualdade econômica - Há muito se admite que a má distribui-ção de renda crie ambiente favorável à disseminação da violência urbana. De fato, a desigualdade parece funcionar como caldo de cultura para a disseminação do comportamento agressivo. Sociedades que vivem em estado de pobreza generalizada tendem a ser menos violentas do que aquelas em que há pequeno número de ricos e uma grande massa de pobres.

A diferença de poder aquisitivo, no entanto, não é causa única. A vio-lência urbana é uma doença multifatorial. As diferenças sociais existentes em nosso país podem explicar por que ocorrem mais crimes no Brasil do que na Suécia, por exemplo. Não explica, porém, por que os índices de criminalidade suecos começaram a aumentar na mesma época que nas cidades brasileiras ou americanas. Não explica, também, as razões pelas quais a criminalidade dos grandes centros americanos vem caindo consis-tentemente de 1992 para cá, período em que a concentração de renda se agravou naquele país. Além disso, a desigualdade não explica por que num bairro pobre, e até numa mesma família, somente alguns se desviam para o crime, enquanto os demais respeitam as regras de convivência social.

2) Uso de armas - A alta concentração de armamento em certas áreas da cidade cria, segundo J. Fagan, da Universidade de Colúmbia, uma "ecologia do perigo". Depois de entrevistar 400 jovens nos bairros mais perigosos de Nova York, o pesquisador constatou que a violência é real-mente contagiosa. No período de 1985 a 1995, o uso de revólveres nessas comunidades se disseminou como doença transmissível. Jovens desarma-dos sentiam-se inseguros e acreditavam que, se carregassem uma arma, imporiam mais respeito aos adversários. No mundo do crime, as armas são o poder.

Como os que vivem do crime precisam dispor de armas competitivas em relação às da polícia e de quadrilhas rivais, instala-se nas cidades uma corrida por armamentos sem fim, responsável pelos ferimentos mais letais que os plantonistas de hoje enfrentam nos hospitais da periferia de São Paulo, em Washington ou Nova York.

3) Crack - O crack entrou em Los Angeles em 1984 e espalhou-se pe-las cidades americanas. Em diversas delas, o número de crimes começou a aumentar já no primeiro ano depois da entrada da droga. A. Blumstein, diretor do National Consortium on Violence Research, atribui esse aumento a um fenômeno aparentemente paradoxal: a guerra às drogas. Segundo o criminologista, a prisão dos líderes mais velhos do tráfico provocou a che-gada dos mais jovens ao comando, e "os jovens não estão entre os melho-res solucionadores de conflito - sempre brigam".

Em 1992, tive a oportunidade de presenciar a entrada do crack na Ca-sa de Detenção. Até então, cocaína só era comercializada em pó para injeção endovenosa ou aspiração nasal. O crack, preparação impura obtida a partir da pasta de cocaína, apresentava a vantagem de ser fumado em cachimbo (o que, em tempos de AIDS e hepatite, não era pouco) e de custar muito menos, varreu a cocaína injetável do mapa.

Como consequência, a cocaína que era distribuída por um pequeno grupo de traficantes mais velhos, com poder aquisitivo suficiente para

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comprá-la, teve o consumo bastante reduzido. Enquanto isso, crescia assustadoramente o número de jovens inexperientes que se engajavam no comércio barato do crack. A democratização do uso aumentou a demanda de traficantes, pulverizou o comando, quebrou a ordem interna da cadeia e resultou em aumento de agressões graves e assassinatos. Para ilustrar a complexidade desse tema, há muitos autores que estão de acordo com o ponto de vista acima: a prisão dos traficantes mais velhos, experientes solucionadores de conflitos, não tem impacto significante na redução da violência e pode até aumentá-la. Os jovens levados a ocupar as posições vagas tendem a resolver disputas com mais agressividade.

4) Quebra dos laços familiares - No mundo todo cresce o número de filhos criados sem apoio paterno. São crianças concebidas por mães soltei-ras ou mulheres abandonadas por seus companheiros. No Brasil, o proble-ma da gravidez na adolescência é especialmente grave nas áreas mais pobres: nas regiões norte e nordeste, de cada três partos uma das mães está entre 10 e 19 anos. Mesmo no sul e no sudeste, o número de parturi-entes nessa faixa etária é muito alto: cerca de 25%. Os estudos mostram que os filhos dessas jovens apresentam maior probabilidade de serem abandonados, mal cuidados e sofrer espancamento doméstico. O nasci-mento dessas crianças sobrecarrega a mãe, provoca abandono dos estu-dos, dificuldade de conseguir emprego e reduz o poder aquisitivo da família materna, obrigada a manter a criança.

Além disso, é bem provável que aquelas crianças nascidas com maior vulnerabilidade a desenvolver comportamentos agressivos, criadas por mães despreparadas para educá-las com coerência, possam tornar-se emocionalmente reativas e impulsivas, condições de alto risco para a violência.

5) Encarceramento - Muitos dos programas adotados no mundo todo e em nossas Febems para controlar a agressividade juvenil, podem ser piores do que simplesmente inúteis. O agrupamento de jovens de periculo-sidade variável não acalma os mais agressivos: serve de escola para os ingênuos. Todos parecem estar de acordo com o fato de que nossas cadei-as funcionam como universidades do crime, mas é importante saber que diversos estudos confirmam essa impressão. T. Dishion, do Oregon Social Learning Center, acompanhou um grupo de 200 adolescentes por um período de 5 anos. Os meninos que não fumavam cigarro, maconha e não bebiam álcool antes dos 14 anos, mas ficaram amigos de outros que con-sumiam essas drogas, tornaram-se usuários dois anos mais tarde, de forma estatisticamente previsível. O autor concluiu: "é um erro terrível alojar jovens delinquentes no mesmo lugar". Uma fruta estragada parece mesmo contaminar o cesto inteiro, como diziam nossos avós.

Em 1990, P. Chamberlain e seu grupo, do mesmo centro de Oregon, conduziram um estudo com jovens delinquentes de 13 a 14 anos. Ao aca-so, os meninos foram distribuídos para cumprir pena em dois locais: alber-gados em instituições ou colocados individualmente em casas de família que recebiam ajuda financeira para mantê-los. Enquanto 57,8% dos meni-nos institucionalizados fugiram, apenas 30,5% dos que ficaram com as famílias o fizeram. Um ano depois de serem postos em liberdade, os que ficaram em casas de família tinham passado 60% a menos de dias na cadeia. O custo de manutenção dos jovens em prisões foi cerca de dez vezes maior.

6) Índices de encarceramento - No calor da emoção que esse tema provoca, a sociedade chega a defender posições antagônicas: muitos acham que se todos os delinquentes fossem para a prisão (ou fuzilados, como preferem alguns) a paz voltaria às ruas. Ao contrário, há quem diga que nossas cadeias são centros de pós-graduação e que a sociedade ganharia mais construindo escolas do que novos presídios.

A verdade é que os índices de encarceramento guardam relação com o número de crimes. R. Rosenfeld, da Universidade de Missouri, estudou os índices de homicídios nas áreas mais perigosas de Saint Louis e Chicago. Para cada aumento de 10% na população carcerária, concluiu que havia queda de 15% a 20% nos homicídios.

Outros pesquisadores obtiveram resultados bem mais discretos. O economista S. Levitt, da Universidade de Chicago, estudou as consequên-cias da pressão que um movimento de defesa dos direitos civis exerceu sobre o judiciário americano, nos anos 1980. Por causa desse movimento, em alguns estados americanos os juízes decidiram cortar o número de prisioneiros, enquanto em outros a população de presos continuou a cres-

cer. Levitt concluiu que uma queda relativa a 10% da massa carcerária, provocava aumento de 4% na criminalidade.

Para ilustrar novamente a complexidade de temas como esse, o crimi-nologista R. Rosenfeld, citado há pouco, recomenda cuidado ao considerar esses dados. O encarceramento não deve ser visto como panaceia para o crime violento, diz ele na Science. E, continua, a curto-prazo a prisão tem um "efeito incapacitador", impedindo momentaneamente o prisioneiro de praticar novos crimes nas ruas. A longo-prazo, entretanto, índices altos de encarceramento podem aumentar os índices de homicídios. Apesar da grande dificuldade em encontrar alternativas ao modelo prisional clássico, é preciso ter claro que o encarceramento em massa é um experimento de consequências mal conhecidas, com potencialidade para fortalecer o crime: empobrece e desorganiza famílias, desagrega vínculos sociais, expõe o presidiário ao contágio com a violência das cadeias e dificulta sua inclusão posterior no mercado de trabalho.

7) O caso americano - Comparativamente, as cidades americanas eram seguras nos anos 1950. A partir de 1960, porém, o gráfico da violên-cia urbana entrou em ascendência contínua: em 1960, ocorriam 5 homicí-dios em cada 100 mil habitantes; em 1990, esse número havia dobrado.

Graças à profunda reorganização que as polícias das grandes cidades americanas sofreram nos últimos anos, com ênfase especial no combate à corrupção e em programas do tipo "tolerância zero", o número de prisões quintuplicou nos últimos 30 anos: em 1960, havia cerca de 100 americanos presos em cada 100 mil habitantes; em 1990, quase 500.

Curiosamente, os crimes violentos que aumentaram sem parar desde a década de 1960, em 1992 e 1993, começaram a diminuir de forma signifi-cante no país inteiro, e permanecem em queda até hoje. Muitos interpretam essa queda como resultado da maior eficiência policial, outros atribuem-na às menores taxas de desemprego resultantes do desempenho favorável da economia americana nos últimos anos.

Hipótese surpreendente

Apesar das especulações, ninguém consegue explicar o acontecido. Se os aprisionamentos justificassem a queda nas taxas de violência crimi-nosa, por que apenas em 1992 elas começaram a cair, se os índices de encarceramento aumentaram sem parar desde 1960, enquanto a violência seguiu sua escalada contínua?

Da mesma forma, se a redução do desemprego fosse a justificativa, por que só a partir de 1992 esse efeito seria detectável, se os Estados Unidos viveram diversas fases de prosperidade nos últimos 30 anos, en-quanto a criminalidade crescia sem parar?

Para ilustrar, pela terceira vez, a complexidade desses temas, vamos citar a conclusão a que chegaram dois pesquisadores da Universidade de Stanford, He e John Donohue, depois de análise criteriosa dos dados referentes à progressão da violência americana, a partir de 1970. Segundo eles, a principal explicação para a queda da criminalidade ocorrida depois de 1992 a esta data, não foi a prosperidade econômica ou o trabalho polici-al: foi consequência da liberação do aborto nos anos 1970.

Os dados demográficos mostraram aos pesquisadores que as mulhe-res que praticam abortos são em sua maioria jovens e pobres, subpopula-ções cujos filhos enfrentarão condições sociais de alto risco para a violên-cia. Sem a emenda que liberou o aborto em 1973, maior a probabilidade de mais adolescentes violentos completarem 18 anos em 1991. Sem eles, teria sido possível a redução da criminalidade descrita a partir de 1992.

O trabalho de He e John Donohue despertou fortes reações emocio-nais na comunidade acadêmica. O citado diretor do National Consortium on Violence Research, A. Blumstein, resumiu essas reações da seguinte maneira, para a revista Science: "É preciso grande habilidade para escrever um trabalho que enfureça ao mesmo tempo a direita e a esquerda. Os autores conseguiram fazê-lo de forma brilhante". Pelo exposto, fica claro que nem todos os fatores que afetam a criminalidade podem ser alterados a curto prazo. Não é fácil construir uma sociedade rica e igual, que eduque de forma adequada todas as crianças, diga não às drogas de uso compul-sivo, encontre alternativas às cadeias, acabe com as armas e aplique justiça com isenção. Como ainda conviveremos por muito tempo com a violência urbana, é preciso interpretá-la de forma menos emocional. Não há soluções mágicas para bloquear os fatores biológicos e sociais que aumen-

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tam a probabilidade de um indivíduo resolver seus conflitos pessoais por meio de métodos violentos. A violência urbana deve ser entendida como doença de causa multifatorial, contagiosa, com aspectos biológicos e sociais que precisam ser estudados cientificamente para podermos desen-volver estratégias seguras de prevenção e tratamento. Drauzio Varella

São várias as causas que levam pessoas de todas as classes sociais a seguirem o caminho da criminalidade. No entanto as mais apontadas são:

• A situação de pobreza- devido à crise que se abateu sobre Portugal as pessoas têm necessidade de entrar no mundo da criminalidade para arranjar dinheiro para pagar as suas dívidas e para conseguir sobreviver.

• O elevado nível de desemprego- famílias que têm mais do que um elemento desempregado recorrem por vezes a atos criminosos para conse-guirem superar as dificuldades que a vida lhes traz.

• Diferenças étnicas e culturais- a cor da pele, as diferentes opiniões, os diferentes valores, as diferentes culturas, entre muitas outras coisas muitas vezes servem de pretexto para uma atitude violenta ou para atos criminosos.

• Relações familiares conflituosas e crise de valores- o ambiente em que a pessoa está inserida e os valores que lhe são transmitidos influenci-am por vezes o modo como ela age. Uma pessoa habituada a assistir e por vezes a ser envolvida em situações de conflito torna-se mais receptível á violência.

• Relações com os amigos e colegas pouco saudáveis- as “más in-fluências” que alguns jovens exercem sobre outros e o “bulling” são as principais causas das atitudes criminosas praticadas pelos jovens.

• Fatores de personalidade e motivacionais- Cada pessoa é diferente, tem personalidades diferentes e, por isso, reage de forma diferente a uma mesma situação. Por esta razão, há pessoas mais ou menos agressivas do que outras, umas que superam as dificuldades melhor ou pior do que outras e umas que são mais ou menos influenciáveis que outras.

As causas que levam à criminalidade são variadas mas todas elas es-tão diretamente relacionadas com o indivíduo e a sua formação. http://criminalidade00.blogspot.com.br/2009/03/causas-da-criminalidade. html

VITIMOLOGIA.

Vitimologia é o estudo da vítima em seus diversos planos. Estuda-se a vítima sob um aspecto amplo e integral: psicológico, social, econômico, jurídico.

Apesar de várias obras anteriores que faziam referência ao comportamento da vítima nos crimes Fritz R. Paasch opina no sentido de que o verdadeiro fundador da doutrina da vítima, ou vitimologia, é B. Mendelsohn, advogado em Jerusalém. Através de seus trabalhos de Sociologia Jurídica (Etudes Internacionales de Psycho-Sociologie Criminelle (1956), La Victimologie, Science Actuaelle (1957)) colocaram em destaque a conveniência de estudo da vítima sob diversos ângulos, quais sejam, Direito Penal, Psicologia e Psiquiatria.

Eduardo Mayr assim conceitua: "Vitimologia é o estudo da vítima no que se refere à sua personalidade, quer do ponto de vista biológico, psicológico e social, quer o de sua proteção social e jurídica, bem como dos meios de vitimização, sua inter-relação com o vitimizador e aspectos interdisciplinares e comparativos" (MAYR, Eduardo; PIEDADE, Heitor et al. Vitimologia em debate. São Paulo: RT, 1990, p. 18).

A professora Lola Anyar de Castro, renomada criminóloga venezuelana, em sua obra Vitimologia - tese de doutorado publicada em 1969, citando Beniamim Mendelsohn, sintetiza o objeto da Vitimologia nos seguintes itens:

1. Estudo da personalidade da vítima, tanto vítima de delinquente, ou vítima de outros fatores, como consequência de suas inclinações subconscientes

2. Descobrimento dos elementos psíquicos do "complexo criminógeno" existente na "dupla penal", que determina a aproximação entre a vítima e o criminoso, quer dizer: "o potencial de receptividade vitimal"

3. Análise da personalidade das vítimas sem intervenção de um terceiro - estudo que tem mais alcance do que o feito pela Criminologia,

pois abrange assuntos tão diferentes como os suicídios e os acidentes de trabalho

4. Estudo dos meios de identificação dos indivíduos com tendência a se tornarem vítimas. Seria possível a investigação estatística de tabelas de previsão, como as que foram feitas com os delinquentes pelo casal Glueck, o que permitiria incluir os métodos psicoeducativos necessários para organizar a sua própria defesa

5. Importancia busca dos meios de tratamento curativo, a fim de prevenir a recidiva da vítima.

VÍTIMA, DIREITO PENAL E CIDADANIA

Texto extraído do Jus Navigandi http://jus2.uol.com.br/doutrina/texto.asp?id=1124

Lélio Braga Calhau promotor de Justiça em Minas Gerais, pós-graduado em Direito Penal pela Universidade de Salamanca (Espanha), mestre em Direito pela Universidade Gama Filho (RJ), conselheiro do Instituto de Ciências Penais do Estado de Minas Gerais (ICP)

Um ponto que chama a atenção no sistema criminal brasileiro, de for-ma negativa, é o desamparo que as vítimas recebem da máquina estatal e da sociedade civil quando da ocorrência de fatos delituosos. Uma vítima criminal é um indivíduo, família ou amigo que sofre ou foi agredida de alguma forma por uma infração criminal praticada por um agente.

Ao contrário do racional, que seria o fim do sofrimento ou amenização da situação em face da ação do sistema repressivo estatal, a vítima sofre danos psíquicos, físicos, sociais e econômicos adicionais, em consequên-cia da reação formal e informal derivada do fato. Não são poucos os auto-res que afirmam que essa reação traz mais danos efetivos à vítima do que o prejuízo derivado do crime praticado anteriormente.

Raúl Cervini, in "Os Processos de Descriminalização", Editora RT, São Paulo, 1995, p. 232, chama esse fenômeno de "sobrevitimização do pro-cesso penal" ou "vitimização secundária", quer dizer o dano adicional que causa a própria mecânica da justiça penal formal em seu funcionamento.

Se de um lado a vítima não recebe atenção nenhuma do sistema penal ora vigente, com a única exceção do Juizado Especial Criminal, por outro, a própria sociedade não se preocupa em ampará-la, chegando muitas vezes a incentivá-la a manter-se no anonimato, contribuindo dessa forma para o aparecimento da malsinada "cifra negra", o grupo formado pela quantidade considerável de crimes que não chegam ao conhecimento do sistema penal.

Luiz Flávio Gomes, in "Criminologia – Introdução a seus Fundamentos Teóricos", 2ª Edição, São Paulo, RT, 1997, p. 468, dá a lição cristalina: "No modelo clássico de Justiça Criminal a vítima foi neutralizada; seu marco de expectativas é muito pobre; a reparação dos danos não é prioridade, senão a imposição do "castigo"".

Agravando essa situação, o nosso sistema penal não traz ainda ne-nhuma forma de amenizar o seu transtorno durante qualquer fase do pro-cesso punitivo. A situação desumana das vítimas é uma verdadeira "via crucis" criminal que a aflige.

Ela sofre com o crime, é destratada com o atendimento, muitas vezes em péssimas condições realizado nas Delegacias de Polícia. Submete-se ao constrangedor comparecimento ao Poder Judiciário na fase processual, na quase totalidade das vezes, desacompanhada de um advogado ou de qualquer pessoa. Encontra, ainda, pelos corredores do fórum, o acusado, temerosa de uma futura represália que possa lhe acontecer, caso preste corretamente o seu depoimento.

Somamos a essa situação a aflição e as dúvidas por não ter conheci-mento do andamento do processo criminal em que está envolvida, se existe uma possibilidade efetiva ou não de ter seu dano reparado algum dia.

Iniciativa de grande importância foi o "Ato Vítimas de Crime" (VOCA), de 1984 que instituiu um Fundo para as vítimas de crimes, no Departamen-to do Tesouro dos Estados Unidos, além da criação, pelo Departamento de Justiça dos Estados Unidos da América, da agência OVC (Office for Victms of Crime) para supervisionar diversos programas que beneficiam as vítimas de crimes.

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A OVC fornece fundos para a assistência da vitima, programas de compensação e também dá suporte no treinamentos para educação na justiça criminal à outros profissionais. Todo ano, milhões de dólares são depositados no Fundo de Assistência das Vítimas (VOCA), oriundos de diversas rendas ligadas, inclusive, aos diversos programas da justiça crimi-nal

Ainda existem programas de compensação às vítimas dos crimes ad-ministrados por todos os Estados da Federação norte americana. Esses programas proporcionam assistência financeira às vítimas de crimes de ordem federal e estadual. O típico programa de compensação estadual requer que as vítimas se reportem dos crimes em 3 dias e reivindiquem indenização dentro de um período fixo de tempo, normalmente dois anos. A maior parte dos estados da Federação pode estender esses limites para casos necessários.

A assistência às vítimas inclui, mas não de forma limitada, os seguintes serviços: intervenção nas situações de crises, consultas, abrigos de emer-gência, advocacia na justiça criminal, transporte de emergência. Por toda a nação existem aproximadamente 10.000 organizações que proporcionam auxílios desses e de outros tipos para as vítimas de crimes. Cerca de 2.800 dessas instituições recebem alguma contribuição dos fundos VOCA.

Esse tipo de iniciativa demonstra, claramente, que os Estados Unidos se conscientizaram que a vítima, como cidadã, deve ser, da mesma forma, assistida pelo Estado que possui o seu aparato para a defesa do Direito (Ministério Público, Polícia etc ) quando da ocorrência de um crime.

Iniciativas de menor tamanho, mas em número razoável, existem ainda em outros países, demonstrando uma crescente conscientização global a favor da vítima dos crimes. Vale lembrar que a proteção da vítima encontra raízes no Código de Hammurabi (2000-1750 AC).

Infelizmente, no Brasil, não existe uma cultura própria de estudo da jus-tiça criminal e tampouco da vítima criminal. O problema é deixado sempre para o Estado. Não existe uma discussão séria pela sociedade civil. As medidas criminais, muitas vezes, vão de encontro aos reais interesses da sociedade. Medidas de necessidade social não são sequer estudadas. Existe um certo sentimento de fuga da população quanto a isso. Não se discuti o problema. Supõe-se que o mesmo não exista.

Dentro desses acontecimentos fica uma advertência de extrema impor-tância: em termos de Direito Brasileiro, temos de equacionar nossos pro-blemas respeitando sempre a dignidade da pessoa humana, fundamento da República Brasileira, na forma do artigo 1º, III, da Constituição Federal.

Podemos comprovar a situação de desprestígio da vítima, como cida-dã, numa interpretação sistemática da Constituição Federal, pois se sobre o acusado temos várias referências à direitos e garantias fundamentais ( art. 5o, CF ), por outro lado, não encontramos proteções à vítima nesse terreno.

Muito, uma referência à uma hipotética lei no Ato de Disposições Cons-titucionais Transitórias, art. 245, que disporá sobre as hipóteses e condi-ções em que o Poder Público dará assistência aos herdeiros e dependen-tes carentes de pessoas vitimadas por crime doloso, sem prejuízo da responsabilidade civil do autor do ilícito.

A norma programática acima ( de aplicação futura duvidosa ) traz séria injustiça por não proteger as vítimas de crimes culposos, deixando-as desamparadas pelo Poder Público. A fim de se coibir tal injustiça material deve ser incluída a proteção das vítimas de crimes culposos nas mesmas condições acima referidas.

Não existe cidadania se não é proporcionada à vítima o mesmo "trata-mento assistencial" que o Estado recebe quando da prática de um crime, pois a vítima, como cidadã, é o elemento estrutural do Estado Democrático de Direito.

Informações bibliográficas:

CALHAU, Lélio Braga. Vítima, Direito Penal e cidadania. Jus Navigandi, Tere-

sina, ano 3, n. 31, maio 1999. Disponível em: <http://jus2.uol.com.br/doutrina/texto.asp?id=1124>. Acesso em: 23 set. 2008.

VITIMOLOGIA: lineamentos à luz do art. 59, caput, do Código Penal brasileiro

Texto extraído do Jus Navigandi http://jus2.uol.com.br/doutrina/texto.asp?id=5061

Sandro D'Amato Nogueira conciliador do Juizado Especial Cível de Gua-rulhos, membro Colaborador do Instituto Paulista de Magistrados (IPAM), pós-graduando pela Escola Superior de Direito Constitucional

1.CONSIDERAÇÕES PRELIMINARES.

Trataremos, pois, no presente trabalho, de discorrer sobre o Instituto da Vitimologia, uma ciência que tem como objetivo principal o estudo da vítima de uma forma global. Ademais, nesse estudo aprofundado do com-portamento da vítima é possível analisar sua personalidade, seu compor-tamento na gênese do crime, seu consentimento para a consumação de delito, suas relações com o delinquente(vitimizador) e também a possível reparação de danos sofridos.

Somos sabedores que o Direito Penal desde a escola clássica sempre concentrou seus estudos no trinômio delinquente-pena-crime, mas após o Holocausto a preocupação com a vítima então começaria a mudar. Deste modo, o direito penal evoluiu muito nos últimos anos, e os estudos sobre o delito, o autor do delito e principalmente da vítima foi tendo importância crescente em todo o mundo.

Estudos realizados demonstram que a Vitimologia é uma ciência mul-tidisciplinar e que nasceu a principio incorporada a Criminologia. Mas esse estudo não se limita somente ao campo do Direito Penal, passando tam-bém por vários outros ramos das ciências sociais como a Sociologia Crimi-nal e a Psicologia Criminal.

Sobre a evolução dos estudos vitimológicos explana Oswaldo Henri-que Duek Marques(A perspectiva da Vitimologia, 2001, p. 380) "A grande redescoberta da vítima, veio com o sofrimento, perseguição e discriminação das vítimas de o Holocausto, e, foi com os crimes perpetrados pelo nazis-mo, que começou a surgir na metade do século passado com mais serie-dade os estudos ligados à vítima. Deste modo, então somente após a Segunda Guerra Mundial os criminólogos do mundo todo passaram a se interessar mais sobre os estudos ligados às vítimas. Diante de tanto sofri-mento, o mundo começou a se preocupar de como viveriam essas vítimas e o que estava sendo feito por elas".

Desde então, muitos estudos sobre a vítima e o delito, foram sendo realizados em todo o mundo. Henry Ellemberg, em 1954, deu uma conside-rável contribuição através de um artigo denominado "Relaciones pscicológi-cas entre el criminal y su víctima’’. Outro artigo importante foi escrito por Paul Cornil em (1958/59) com o nome de "Contribuição da Vitimologia para as ciências criminológicas’’. (Paul Cornil. Contribution de la Victimologie aux sciences criminologiques, em ´´Revue de Droit Pénal et de Criminologie´´, Brusela, 1958/9, p.587, apud Elias Neumam. Victimologia, El rol de la víctima em los delitos convencionales y no convencionales, 1984, p.32).

Na América Latina, o venezuelano José Rafael Mendoza, tratou o te-ma em um trabalho chamado "La importancia de la víctima em relacion con los delitos por imprudencia o culposos del automovilismo", em 1953, e, sobre tudo Luis Jiménez de Asúa, que no Instituto de Direito Penal e Crimi-nologia da Faculdade de Direito da Universidade de Buenos Aires, realizou em 1958 em um seminário de doutorado que dirigia, um grande trabalho de investigação junto a vários discípulos (Elias Neumam. Victimologia, El rol de la víctima em los delitos convencionales y no convencionales, 1984, p.32-33).

Assim, Jiménez de Asúa foi o primeiro jurista a falar sobre o assunto na América Latina. Desta maneira, foi se desenvolvendo no mundo um grande estudo e preocupação sobre o tema, em países europeus, em Israel e sobre tudo nos Estados Unidos e Japão.

No nosso entendimento, o resultado mais importante com os estudos vitimológicos é que foi sendo constatado que nem sempre o autor do crime e a vítima estavam de lados opostos.

Nesse sentido salienta o vitimólogo argentino Elías Neu-man(Victimología – El rol de la víctima em los delitos convencionales y no convencionales, 1984, p. 22): "Vale dizer que a vítima pode constituir-se em fator desencadeante na etiologia do crime e assumir em certos casos e circunstâncias uma postura que integre o delito. É preciso visualizar dei-xando de lado o preconceito de sua inocência. O sujeito passivo: morto humilhado, física ou moralmente, não é sempre sinônimo de inocência, completa ".

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Criminologia A Opção Certa Para a Sua Realização 32

Muito se tem discutido por criminólogos do mundo todo que estudam a Vitimologia se ela já pode ser considerada uma ciência autônoma. Alguns penalistas a consideram uma ciência auxiliar da criminologia, alguns so-mente um ramo da criminologia. A questão norteadora é podermos saber se Vitimologia pode ser considerada uma ciência autônoma ou não.

Existem atualmente três grandes grupos internacionais bem definidos acerca da discussão sobre a natureza científica da Vitimologia.(Tipologias, Centro de Difusion da la Victimologia, 2002).

a ) Os tratadistas, que consideram a Vitimologia uma ciência autônoma.

b ) Uma corrente que é formada por aqueles que consideram que a Vitimo-logia é uma parte da Criminologia.

c ) Aqueles que negam a autonomia e a existência da Vitimologia.

d ) Consideram a Vitimologia como uma ciência autônoma, com objeto, método e fim próprios.

e) Negam não só a autonomia, mas a existência da Vitimologia.

Concordamos com Orlando Soares quando nos diz(Curso de Crimino-logia, 2003, p. 320): "A Discussão do tema evoluiu de tal forma que a matéria ultrapassou os limites da apreciação no âmbito da Criminologia, como entendíamos anteriormente, passando assim a se incorporar a cate-goria de disciplina autônoma, fazendo parte da Enciclopédia das Ciências Penais".

2. TIPOLOGIA DAS VÍTIMAS.

Classificações de Benjamín Mendelsohn(Tiplogias, Centro de Difusion de la Victímologia, 2002).

O vitimólogo israelita fundamenta sua classificação na correlação da culpabilidade entre a vítima e o infrator. É o único que chega a relacionar a pena com a atitude vitimal. Sustenta que há uma relação inversa entre a culpabilidade do agressor e a do ofendido, a maior culpabilidade de uma é menor que a culpabilidade do outro.

1 – Vítima completamente inocente ou vítima ideal: é a vítima inconsciente que se colocaria em 0% absoluto da escala de Mendelsohn. É a que nada fez ou nada provocou para desencadear a situação criminal, pela qual se vê danificada. Ex. incêndio

2 – Vítima de culpabilidade menor ou vítima por ignorância : neste caso se dá um certo impulso involuntário ao delito. O sujeito por certo grau de culpa ou por meio de uma ato pouco reflexivo causa sua própria vitimi-zação. Ex. Mulher que provoca um aborto por meios impróprios pagan-do com sua vida, sua ignorância.

3 – Vítima tão culpável como o infrator ou vítima voluntária: aquelas que cometem suicídio jogando com a sorte. Ex. roleta russa, suicídio por adesão vítima que sofre de enfermidade incurável e que pede que a matem, não podendo mais suportar a dor (eutanásia) a companheira(o) que pactua um suicídio; os amantes desesperados; o esposo que mata a mulher doente e se suicida.

4 – Vítima mais culpável que o infrator.

Vítima provocadora: aquela que por sua própria conduta incita o infrator a cometer a infração. Tal incitação cria e favorece a explosão prévia à descarga que significa o crime.

Vítima por imprudência: é a que determina o acidente por falta de cuidados. Ex. quem deixa o automóvel mal fechado ou com as chaves no contato.

5 – Vítima mais culpável ou unicamente culpável.

Vítima infratora: cometendo uma infração o agressor cai vítima exclusi-vamente culpável ou ideal, se trata do caso de legitima defesa, em que o acusado deve ser absolvido.

Vítima simuladora: o acusador que premedita e irresponsavelmente joga a culpa ao acusado, recorrendo a qualquer manobra com a inten-ção de fazer justiça num erro.

Meldelsohn conclui que as vítimas podem ser classificadas em 3 gran-des grupos para efeitos de aplicação da pena ao infrator:

1 – Primeiro grupo: vítima inocente: não há provocação nem outra forma de participação no delito, mas sim puramente vitimal.

2 – Segundo grupo: estas vítimas colaboraram na ação nociva e existe uma culpabilidade recíproca, pela qual a pena deve ser menor para o agente do delito (vítima provocadora)

3 – Terceiro grupo: nestes casos são as vítimas as que cometem por si a ação nociva e o não culpado deve ser excluído de toda pena.

3. VITIMOLOGIA, A CIÊNCIA PENAL E O ITER VICTIMAE - PRO-CESSO DE VITIMIZAÇÃO.

Como aponta Edmundo de Oliveira, "Iter Victimae é o caminho, interno e externo, que segue um indivíduo para se converter em vítima, o conjunto de etapas que se operam cronologicamente no desenvolvimento de vitimi-zação(Vitimologia e direito penal, p.103-4)".

Fases do Iter Victimae, segundo a esquematização elaborada pelo próprio Edmundo de Oliveira em sua obra Vitimologia e o Direito Penal – O crime precipitado pela vítima, 2001, p. 101, in verbis:

Intuição (intuito)A primeira fase do Iter Victimae é a intuição, quando se planta na mente da vítima a ideia de ser prejudicado, hostilizada ou imolada por um ofensor.

Atos preparatórios (conatus remotus) - Depois de projetar mentalmente a expectativa de ser vítima, passa o indivíduo à fase dos atos preparatórios (conatus remotus), momento em que desvela a preocupação de tornar as medidas preliminares para defender-se ou ajustar o seu comportamento, de modo consensual ou com resignação, às deliberações de dano ou perigo articulados pelo ofensor.

Início da execução(conatus proximus) - Posteriormente, vem a fase do início da execução (conatus proximus), oportunidade em que a vítima começa a operacionalização de sua defesa, aproveitando a chance que dispõe para exercitá-la, ou direcionar seu comportamento para cooperar, apoiar ou facilitar a ação ou omissão aspirada pelo ofensor.

Execução(executio) - Em seguida, ocorre a autêntica execução distin-guido-se pela definitiva resistência da vítima para então evitar, a todo custo, que seja atingida pelo resultado pretendido por seu agressor, ou então se deixar por ele vitimizar.

Consumação(consummatio) ou tentativa (crime falho ou conatus pro-ximus) - Finalmente, após a execução, aparece a consumação mediante o advento do efeito perseguido pelo autor, com ou sem a adesão da vítima. Contatando-se a repulsa da vítima durante a execução, aí pode se dar a tentativa de crime, quando a prática do fato demonstrar que o autor não alcançou seu propósito (finis operantis) em virtude de algum impedimento alheio à sua vontade.(Edmundo de Oliveira. Vitimologia e dreito penal. 2001, p. 105)

4. PERIGOSIDADE VITIMAL

No importante estudo sobre o comportamento da vítima, é relevante discorrermos brevemente sobre a perigosidade vitimal, que é a etapa inicial da vitimização. Perigosidade vitimal é um estado psíquico e comportamen-tal em que a vítima se coloca estimulando a sua vitimização, ex., a mulher que usa roupas provocantes, estimulando a libido do estuprador no crime de estupro (Lúcio Ronaldo Pereira Ribeiro. Vitimologia, 2000, p. 36.)

A compreensão do conceito de "Perigosidade Vitimal’’é de suma im-portância para o entendimento dos próximos textos, pois estaremos discor-rendo dentre outras, da vítima provocadora e de casos de vitimização com o consentimento da vítima.

5. O ARTIGO 59, CAPUT DO CÓDIGO PENAL BRASILEIRO.

No nosso ordenamento jurídico temos alguns dispositivos constitucio-nais e infraconstitucionais que falam sobre a vítima, como o Art. 59, 61, II, c, in fine; 65, III, c, do Código Penal e art. 245 da Constituição Federal de 1988. Mas, o nosso estudo se concentra na principal mudança e preocupa-ção concernente à vítima no Brasil, que ocorreu no ano de 1984 com a reforma do Código Penal, o artigo 59, caput.

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Tal mudança ocorreu com o advento da Lei 7.209, DE 11 DE JULHO DE 1984, da Nova Parte Geral do Código Penal, assim passando a vigorar no Capítulo III – DA APLICAÇÃO DA PENA, o artigo 59, caput com a seguinte redação:

Art. 59."O juiz, atendendo à culpabilidade, aos antecedentes, à conduta social, à personalidade do agente, aos motivos, às circunstâncias e conse-quências do crime, bem como o comportamento da vítima, estabelecerá, conforme seja necessário e suficiente para reprovação e prevenção do crime".

A Exposição de Motivos da Nova Parte Geral do Código Penal, justifica assim, a preocupação com a vítima: ‘’Fez-se referência expressa ao com-portamento da vítima, erigido, muitas vezes, em fator criminógeno, por constituir-se em provocação ou estímulo à conduta criminosa, como, em outras modalidades, o pouco recato da vítima nos crimes contra os costu-mes’’

6. O ART. 59, CAPUT DO CP E A APLICAÇÃO DA PENA.

Diante do que discoree o artigo 59, caput, então passou a ser dever do magistrado na dosimetria da pena, analisar o comportamento da víti-ma(antes e depois do delito)como circunstância judicial na individualização da pena imposta ao acusado.

As circunstâncias judiciais são muito importantes, pois é através delas que o juiz fixa a (pena base), obedecido o disposto no art. 59; considera-se em seguida as circunstâncias atenuantes e agravantes(pena provisória); incorpora-se ao cálculo, e finalmente as causas de diminuição e aumento( pena definitiva).

Nesse sentido, Celso Delmanto, explana: "O comportamento do ofen-dido deve ser apreciado de modo amplo no contexto da censurabilidade do autor do crime, não só diminuindo, mas também a aumentando, eventual-mente. Não deve ser igual a censura que recai sobre quem rouba as fulgu-rantes jóias que uma senhora ostenta e a responsabilidade de quem subtrai donativos, por exemplo, do Exército da Salvação’’(Código Penal Comenta-do, 2000, p. 104).

7. O CONSENTIMENTO DA VÍTIMA(OFENDIDO).

Um fato importantíssimo que deve ser investigado, é no tocante ao consentimento do ofendido(vítima). Dependendo do comportamento do ofendido, a conduta do sujeito ativo pode resultar em atípica e antijurídica Uma situação importante de consentimento da vítima, e que deve ser analisada pelo magistrado é v.g., nos delitos sexuais, não é raro a contri-buição, consciente ou inconsciente da vítima nesses tipos de delitos (aten-tado violento ao pudor e estupro).

José Eulálio Figueiredo de Almeida, comenta: "O consentimento ou aquiescência da ofendida, insista-se, obtém nota de relevo nos crimes sexuais, desde que não tenha sido viciado, porque permite ao Juiz, diante da confirmação de tal circunstância, declarar a atipicidade da conduta do acusado ou a sua antijuridicidade. (...) Se, por outro lado, esse consenti-mento é evidente exclui-se não apenas a ilicitude, mas a tipicidade da conduta, isto é, não há delito a punir - nullum crimen sine culpa" (José Eulálio Figueiredo de Almeida. Sedução - Instituto lendário do código penal, 2002)

8. E A "VÍTIMA’’, DEVE SER PUNIDA?

Como já apontado anteriormente, seja através das tipologias, seja atra-vés dos casos estudados com consentimento da vítima, pudemos constatar que existem vítimas provocadoras, que atraem para si uma determinada situação ou desencadeiam algum processo para que se torne vítima de algo ou alguém, o chamado processo de vitimização.

Oportuno que sejam transcritas algumas ementas, para assim, de-monstrar como a jurisprudência vem se pronunciando a respeito de um tem tão relevante.

EMENTA - Nº 17876 - ESTUPRO – Não caracterização – Nos crimes sexuais, a palavra da vítima, para gozar da presunção de veracidade ne-cessita ser verossímil, coerente e escudada no bom comportamento anteri-or – No caso o comportamento da vítima deixa muita a desejar – Absolvição decretada. (Relator: Celso Limongi – Apelação Criminal 100.223-3 – Candi-do Mota – 23.01.91)

EMENTA - Nº 28859 - ATENTADO VIOLENTO AO PUDOR – Não ca-racterização – Ausência de violência física – Atos praticados com consen-timento da vítima – Versões apresentadas por esta, que se mostram em contradições – Réu de porte físico menor que o da ofendida, e que não se apresentava armado – Comportamentos dos quais não se extrai violência reação – Absolvição decretada – Recurso provido. Para que se configure o delito do artigo 224 do CP a oposição ao ato libidinoso deve ser sincera e positiva, manifestando-se por inequívoca resistência, não bastando recusa meramente verbal ou oposição passiva e inerte, apenas simbólica. (Ap. Criminal n. 182.101-3 – São Paulo – 2º Câmara Criminal Férias Julho/95 – Relator: Prado de Toledo – 12.07.95 – V.U.).

EMENTA – Nº 71022 - ESTUPRO – Presunção de violência – Vítima de mau comportamento menos de 14 anos – Relações sexuais mantidas anteriormente com outros homens – Circunstâncias que elide presunção, de caráter relativo – Absolvição - Inteligência dos arts. 213 e 224, "a", do CP ( Ement.) RT 557/322.

No tocante aos crimes sexuais, a participação ou consentimento da ví-tima, é algo muito mais sério do que imaginamos, pois mostramos anteri-ormente com algumas ementas que há casos de absolvição em processos que envolvam conjunção carnal, sedução, atentado violento ao pudor, estupro, etc.

9. CONSIDERAÇÕES CONCLUSIVAS E PROPOSIÇÕES.

Diante dos estudos aqui apresentados, podemos concluir que:

1. É incontestável a importância hoje da Vitimologia para o Direito Penal

2. Vitimologia é uma ciência autônoma e que pode trabalhar também como uma ciência auxiliar a Moderna Criminologia, a Sociologia Crimi-nal e a Psicologia Criminal.

3. Está claro que ainda há muito a se explorar desta ciência tão fascinan-te.

4. Vimos que após analisado o comportamento da vítima no julgamento e aplicação da pena, esta análise vitimológica poderá até mudar o conte-údo da sentença prolatada, o que é comum nos crimes sexuais que envolvam o consentimento do ofendido(vítima), a facilitação, instigação e a sua provocação.

PROPOSIÇÃO: Diante desta incontestável realidade encontrada nos nossos tribunais da vítima coadjuvante na gênese do crime, vislumbramos que os operadores do Direito atentem para esse conflito estabelecido a partir da dupla penal vítima provocadora-acusado, e que a Vitimologia contribua para o cuidadoso trabalho de investigação dos fatos apurados pelo magistrado, para assim não incorrer em um erro judicial, que talvez possa ser incorrigível.

Informações bibliográficas: NOGUEIRA, Sandro D'Amato. Vitimolo-gia: lineamentos à luz do art. 59, caput, do Código Penal brasileiro. Jus Navigandi, Teresina, ano 8, n. 275, 8 abr. 2004. Disponível em:

http://jus2.uol.com.br/doutrina/texto.asp?id=5061>. Acesso em: 23 set. 2008.

A origem da criminalidade

Sem contar as vidas perdidas, o crime custa ao Brasil mais de 100 bilhões de reais. Para curar essa chega, é preciso primeiro entender como ela é fabricada.

por Rodrigo Vergara

A sensação de insegurança no Brasil não é sem fundamento. Somos, de fato, um dos países mais violentos da América Latina, que por sua vez é a região mais violenta do globo. Em uma pesquisa da Organização das Nações Unidas, realizada com dados de 1997, o Brasil ficou com o preocu-pante terceiro lugar entre os países com as maiores taxas de assassinato por habitante. Na quantidade de roubos, somos o quinto colocado. A situa-ção seria ainda pior se fossem comparados os números isolados de algu-mas cidades e regiões metropolitanas, onde há o dobro de crimes da média nacional. São Paulo, por exemplo, já ultrapassou alguns notórios campeões da desordem, como a capital da Colômbia, Bogotá.

O país perde muito com isso. Só por causa dos assassinatos, o homem brasileiro vive um ano e poucos meses a menos, em média. Se esse ho-

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mem vive no Rio de Janeiro, o prejuízo é ainda maior: quase três anos a menos. As mulheres também não passam incólumes. Na cidade de São Paulo, em 2001, o assassinato foi, pela primeira vez, a principal causa de mortes de mulheres, ultrapassando os números de mortes por doenças cerebrovasculares e Aids.

O total das perdas causadas pela criminalidade é incalculável – como medir o valor de uma vida para os familiares de uma vítima de assassinato? –, mas, de um ponto de vista puramente monetário, um cálculo feito pelo Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID) dá uma ideia do impacto financeiro do crime no Brasil. Segundo essa estimativa, que leva em conta prejuízos materiais, tratamentos médicos e horas de trabalho perdidas, o crime rouba cerca de 10% do PIB nacional, o que dá mais de 100 bilhões de reais por ano. Nos Estados Unidos, que está longe de ser um país pacífico e ordeiro, a porção da riqueza que escoa pelo ralo do crime é bem menor: 4%.

Embora tão grave e nociva, a chaga do crime é pouco entendida no Brasil. Prova disso é a reação de políticos e autoridades diante de um crime grave como o sequestro e a morte do prefeito de Santo André, Celso Dani-el. O presidente Fernando Henrique Cardoso, por exemplo, convocou a nação a empreender uma “guerra” contra o crime, como se os criminosos fossem inimigos externos, e não parte da sociedade. E não faltou quem classificasse os criminosos simplesmente de “vagabundos”, querendo dizer que com isso encerravam o assunto.

Mas, afinal, qual é a origem do crime? Por que alguns lugares, como o Brasil, reúnem mais pessoas dedicadas a infringir a lei? Por que, em uma mesma população, algumas pessoas resolvem romper as regras enquanto outras as obedecem?

Existem muitas teorias para explicar o que gera a criminalidade. Cada uma delas se aplica perfeitamente a pelo menos uma situação criminosa, mas nenhuma consegue explicar o nascedouro de todos os crimes. Para o antropólogo e cientista político Luiz Eduardo Soares, que foi coordenador de Segurança, Justiça e Cidadania no governo de Anthony Garotinho (PSB) no Rio de Janeiro, isso acontece porque “crime” é um conceito muito amplo. “Não há uma teoria geral sobre criminalidade porque não há uma criminali-dade ‘em geral’. Quando falamos em crime, estamos nos referindo à trans-gressão de uma lei, e isso engloba uma infinidade de situações diferentes, cada uma favorecida por determinadas condições”, diz ele. Em outras palavras: crimes diferentes têm causas diferentes. “Um menino de rua que rouba para cheirar cola tem uma motivação completamente diferente da que move o operador financeiro que lava dinheiro para traficantes. No entanto, ambos estão cometendo crimes.”

Ênfase no indivíduo

Há quem procure as causas do crime no indivíduo que o comete. Nes-se caso, há duas linhas de pesquisa. A primeira explica o comportamento criminoso de um ponto de vista biológico. Uma das mais famosas dessas teorias – hoje completamente descartada – é a frenologia, criada no século XVIII, segundo a qual o criminoso possui características físicas, como saliências no crânio, que o diferenciam das demais pessoas. Outros pes-quisadores encontraram indícios de que o crime é algo transmitido geneti-camente comparando famílias de condenados. Segundo esses, está nos genes a explicação para o fato de que entre a população carcerária é mais comum encontrar pessoas com parentes também envolvidos no crime. E há ainda as linhas de pesquisa que culpam a má nutrição pelo comportamento criminoso.

A outra linha de pesquisa com foco no indivíduo procura as causas do crime na psique do criminoso. Segundo Sigmund Freud, o pai da Psicanáli-se, o comportamento anti-social e a delinquência são decorrentes de um desequilíbrio entre o ego, o superego e o id, as três partes que constituem a personalidade individual. Se o superego – que representa a internalização do código moral da sociedade – é muito fraco, o indivíduo não consegue reprimir seu id – seus instintos e desejos naturais. Resultado: ele força as regras sociais e comete um crime. A equação psicológica também resulta criminosa se o superego é forte demais. Nesse caso, a pessoa, por seus traços psicológicos, sente-se culpada e envergonhada e procura o crime esperando ser punida, para satisfazer seu desejo de culpa.

No começo do século XX, a popularização dos testes de QI (quociente de inteligência) possibilitou o surgimento de uma nova teoria criminológica,

segundo a qual os criminosos têm intelecto abaixo da média. Nos anos 70, um estudo mais sofisticado na mesma linha, feito por dois pesquisadores americanos, revelou que os delinquentes tinham em média oito pontos menos nos testes de QI, se comparados ao resto da população. A explica-ção dos pesquisadores, que focaram especialmente adolescentes infrato-res, foi de que os jovens menos inteligentes se envolvem mais facilmente com crimes porque têm pior desempenho escolar, menos capacidade de entender e de se engajar na moral da sociedade e, por fim, são menos capazes de avaliar as consequências de seus atos, além de serem mais influenciáveis por outros jovens delinquentes. O problema dessa aborda-gem é que ela está no limiar do racismo e pode justificar preconceitos perigosos.

O papel da personalidade no comportamento criminoso foi reforçado por pesquisas posteriores, como um estudo publicado há cinco anos sobre adolescentes neozelandeses. Descobriu-se que os jovens com maior índice de delinquência eram os que mais frequentemente tinham reações nervo-sas e sentimentos de terem sido traídos. Eram também os que mais facil-mente recorriam a agressões ou a posturas impositivas. Em uma outra pesquisa, esta de longo prazo, iniciada na década de 80 naquele país, os cientistas detectaram que as crianças neozelandesas mais irritáveis, impul-sivas e impacientes desenvolveram na adolescência maior propensão ao crime. Outro fator detectado foram os problemas neuropsicológicos, como dificuldade de comunicação e memória fraca, entre outros. Os garotos que aos 13 anos tinham as maiores dificuldades neuropsicológicas eram os adolescentes com maior nível de delinquência, cinco anos mais tarde.

Ênfase na sociedade

Para quem vê na sociedade a causa das mazelas do mundo, como os sociólogos, as explicações biológicas e psicológicas para o crime são importantes e podem ajudar muito na recuperação de delinquentes e crimi-nosos. Mas teriam pouca utilidade para prevenir a criminalidade. Seria a mesma coisa que tentar atacar as doenças cardiovasculares com cirurgias, sem atacar a alimentação gordurosa, o tabagismo e o sedentarismo da população. Para os sociólogos, o crime é a resposta do indivíduo ao meio em que vive. E depende do cruzamento de vários fatores sociais. Há muitas teorias diferentes sobre o assunto, cada uma com fórmula própria, realçan-do este ou aquele aspecto da vida em sociedade para explicar por que, de repente, um monte de gente resolve roubar, matar ou estuprar. Muitas dessas teorias – em geral as mais simplórias – tornaram-se populares, como as que culpam só a pobreza pelos crimes.

Se isso fosse verdade, o Brasil, com 50 milhões de indigentes – que ganham menos de 80 reais por mês –, já teria sucumbido. Fossem todos criminosos, não haveria espaço para vida honesta no país. Fosse a pobre-za a causa maior e única da criminalidade, o Piauí teria os maiores índices de ocorrência de roubos, furtos e homicídios do país. Mas os maiores índices, como se sabe, estão nos Estados mais ricos – em São Paulo, no Distrito Federal e no Rio Grande do Sul. Alguns dos mais pobres países africanos têm baixas taxas de crime, enquanto a nação mais rica do globo, os Estados Unidos, tem uma alta taxa de criminalidade.

Há explicações melhores e mais sofisticadas para o fenômeno do cri-me. Uma das mais modernas destaca-se por ter invertido a questão básica da criminologia. Assim, em vez de tentar responder “por que algumas pessoas cometem crimes?”, os criminologistas passaram a se perguntar “por que algumas pessoas não cometem crimes?”. Faz sentido. Se os meios para viver bem estão aí, à disposição, muitas vezes sem ameaças a quem se dispuser a tomá-los, por que o roubo e o furto não são a via nor-mal de obtenção de riquezas? Por que a maioria de nós discute e argumen-ta após um acidente de trânsito, em vez de resolver tudo no muque ou na bala?

Basicamente, porque a humanidade prosperou vivendo em sociedade, há centenas de milhares de anos, e só é possível viver em sociedade se forem respeitadas algumas regras. Esses laços sociais são o alicerce da sociologia, e o primeiro a apontá-los foi justamente o pai dessa disciplina, Emile Durkheim, que viveu há um século. Segundo ele, os laços sociais são as normas que todos aprendem a respeitar, que mantêm a sociedade unida. Sem eles, tudo seria um caos.

Às vezes a História nos fornece uma oportunidade de observar o que ocorre quando essas regras sociais são subitamente rompidas. A queda do regime comunista nas repúblicas da antiga União Soviética, a partir de

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1989, foi um desses momentos. O resultado foi um aumento significativo dos índices de criminalidade. Entre 1990 e 1994, o número de crimes em Moscou dobrou. Em 1994, houve 2 830 assassinatos lá, 240 mais que em Nova York. O mesmo ocorreu na República Checa, em 1989, onde os crimes aumentaram 30,5% de 1990 a 1991.

Teoria dos controles

Segundo uma das principais correntes da criminologia, há três meca-nismos que mantêm o comportamento dos indivíduos sob controle. Não por acaso, essa tese é chamada de “teoria dos controles”. O primeiro deles é o autocontrole, um processo interno que estabelece o compromisso de cada um com as regras sociais. “O autocontrole resulta da socialização, pela qual as crianças, que são naturalmente agressivas e possessivas, aprendem a não ser assim”, diz o sociólogo e pesquisador da Universidade de Chicago Robert J. Sampson. Segundo Steven Barkan, professor da Universidade do Maine, Estados Unidos, esse controle pessoal é determinado pela consci-ência individual, o compromisso com a lei e a auto-avaliação positiva.

Para o antropólogo Luiz Eduardo Soares, o autocontrole é a força mai-or que evita a barbárie. “O solo mais firme e fundo da mediação que evita o crime é o reconhecimento de seu valor que a criança recebe na família e no seu grupo social. Por outro lado, se a criança só experimenta rejeição, ressentimento, insegurança e ódio de si mesma, ela tende a não se identifi-car com esses valores da sociedade”, diz Soares. É claro que isso depende dos valores que importam para os pais e amigos: faz diferença se ela cresce entre pessoas que acham bacana ser “esperto” e “levar vantagem” ou se o comportamento ideal é ser “trabalhador” e “honesto”.

O segundo fator que desvia as pessoas do cometimento de crimes é o medo da punição, ou seja, o controle formal que a sociedade exerce sobre cada indivíduo. Quanto mais forte for a mensagem de que a punição está ali, à espreita, menor será o cometimento de crimes. É a essência do recado do jurista italiano Cesare Becaria, que no século XVIII proferiu a célebre frase: “O que inibe o crime não é o tamanho da pena, mas a certe-za da punição”. Há, no entanto, quem defenda que só uma pena rigorosa pode desencorajar um potencial criminoso, porque as chances de uma pessoa ser punida por um crime é ínfima, mesmo nos países com sistemas legais exemplares. É aqui que entra em cena a qualidade dos trabalhos da polícia, da Justiça e do sistema prisional. Quanto mais eficiente for o siste-ma criminal, mais forte será o sentimento de punição e justiça.

A força da cultura

O terceiro fator, e considerado por muitos o mais importante, é o con-trole social informal. Como dito acima, mesmo em países com sistemas penais altamente punitivos e céleres, como o americano, a porcentagem de criminosos punidos é muito pequena. Nos Estados Unidos, segundo dados de 1992, o número de pessoas sentenciadas a penas de prisão equivale a 4,2% do total de crimes ocorridos. É importante notar, porém, que a compa-ração entre os dois dados não é perfeita, já que a maioria dos crimes é cometida por um pequeno número de criminosos. Na Filadélfia, cientistas acompanham há décadas um grupo de 10 000 garotos nascidos em 1945. Descobriram que 6% da amostra era responsável por mais da metade dos crimes que os 10 000 cometeram na adolescência. Mas, ainda assim, a desproporção entre o volume de crimes e o de condenados supera essa ressalva.

Ou seja, há pouquíssima chance de um criminoso ser punido. Sendo assim, o que resta para nos desviar do caminho do crime seriam a vergo-nha, a moral e outras normas sociais que não estão escritas em lei alguma, mas nos foram ensinadas por pessoas próximas e emocionalmente impor-tantes – a mãe, a avó, o irmão mais velho, o grupo de amigos. Entre alguns torcedores de futebol, por exemplo, agredir – e às vezes até matar – torce-dores de outros times faz parte das normas sociais do grupo. Em algumas sociedades, seguir a lei é “careta”, é “burrice”. O certo é levar vantagem em tudo. Reconheceu o discurso? Pois é. A Lei de Gérson tem tudo a ver com a aparente falta de regras que cerca a sociedade brasileira.

Ela funciona assim: imagine um sujeito ordeiro e honesto parado em um congestionamento na estrada. Ele está lá há quase uma hora, quando, de repente, alguns carros começam a ultrapassá-lo pelo acostamento (o que é ilegal). Mais à frente, pensa ele, esses carros piorarão a lentidão do tráfego quando tentarem voltar à pista. Mas nenhum policial aparece para multá-los. Depois de 15 minutos vendo os carros passar, ele pensa que

respeitar a lei só vai prejudicá-lo e vai para o acostamento. O cinismo em relação às regras sociais formais é uma característica do controle social informal brasileiro.

O grau de coincidência entre as normas legais e as regras informais de conduta é diretamente proporcional à legitimidade que a população enxerga no governo, nas autoridades e na lei. Em outras palavras: quanto mais legítimos os governantes e as autoridades, maior será o respeito da popu-lação às regras daquela comunidade. Nesse momento é que pesa na balança a enorme desigualdade social brasileira, uma das maiores do mundo. Em uma sociedade desigual, os menos favorecidos tendem a achar que regras tão injustas não se aplicam a eles, e a delinquência aumenta.

Ainda assim, há muita gente que acha o Brasil injusto, gente que não vê perspectiva de melhorar na vida, mas nem por isso pega um revólver e sai por aí roubando e matando inocentes. O que mantém essas pessoas na linha são, justamente, as regras informais, em geral herdadas da família, da escola ou da religião. Pesquisas realizadas na periferia de grandes cidades americanas entre jovens pertencentes às classes menos favorecidas mos-tram que os mais propensos à criminalidade e à delinquência são aqueles com menor envolvimento com as instituições sociais tradicionais.

“É por meio da religião, da profissionalização, da educação e da família que são transmitidos os valores sociais. Sem eles, os jovens crescem sem o legado da civilização”, diz Claudio Beato, coordenador do Crisp (Centro de Estudos de Criminalidade e Segurança Pública), ligado à UFMG (Uni-versidade Federal de Minas Gerais), de Belo Horizonte. A religião tem papel importante. “É como disse o escritor francês Albert Camus: ‘Se Deus não existe, então vale tudo’”, diz Beato. Não por acaso, os países islâmicos, nos quais a religião ocupa um espaço na vida das pessoas muito maior que no Ocidente, têm as mais baixas taxas de roubos do mundo, apesar de serem nações em geral muito pobres e desiguais. “O grupo de amigos e os famili-ares também cumprem essa tarefa.”

Enfim, a pobreza

É aqui que a pobreza começa a fazer diferença, porque diminui o con-tato entre pais e filhos e enfraquece a transmissão do legado familiar sobre como viver em sociedade. Primeiro, porque pai e mãe passam o dia fora, trabalhando, e deixam os filhos para serem criados na rua, à mercê da influência de outros jovens, muitos deles já delinquentes. Isso quando há pai e mãe. “O grau de delinquência de uma comunidade é diretamente proporcional ao número de famílias monoparentais, ou seja, em que os filhos são criados só pelo pai ou pela mãe”, afirma o sociólogo Tulio Kahn, do Instituto Latino-Americano das Nações Unidas para a Prevenção do Delito e o Tratamento do Delinquente (Ilanud). Não bastasse isso, em vizinhanças mais pobres, cujas casas geralmente são compartilhadas por várias famílias e vivem abarrotadas, os jovens preferem passar seu tempo fora de casa, longe dos olhos dos pais. Conforme estudos feitos por Robert J. Sampson, a supervisão das atividades dos filhos é um grande inibidor de delinquência.

É bom lembrar que a maior parte da criminalidade gerada em meio à pobreza tem como vítimas os próprios pobres, que ainda vivem o drama de não ter a quem recorrer, visto que, em muitos bairros de baixa renda, a presença da polícia e de serviços de saúde é muito menor. Isso é verdadeiro especialmente em relação aos crimes violentos, enquanto os crimes contra o patrimônio, guiados muito mais pela oportunidade, ocorrem nas regiões mais ricas das cidades, onde há patrimônio para ser subtraído.

Entre tantas causas da criminalidade, há pelo menos duas que inde-pendem de outras e, sozinhas, em sociedades ricas ou igualitárias, geram criminalidade, que são o sexo e a idade da população. É simples assim: quanto maior for o percentual de homens jovens na população, maior será a taxa de criminalidade. “Sexo e idade são os dois únicos fatores inequivo-camente relacionados à criminalidade. O censo mais recente mostra que houve um crescimento da população de 15 a 24 anos. Se esse grupo diminuir, o crime diminui naturalmente. Na Califórnia isso ocorreu”, diz Claudio Beato, da UFMG.

Segundo Steven Barkan, da Universidade do Maine, isso dá uma certa previsibilidade ao crime. “Uma grande taxa de natalidade irá, em 15 a 20 anos, gerar uma onda de criminalidade, conforme essa população entra na adolescência. Uma das razões para o aumento da criminalidade nos EUA nos anos 60 foi a entrada da geração baby boom – nascida após a Segun-

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da Guerra – na adolescência”, diz ele. Steven Lewitt, do Departamento de Economia da Universidade de Chicago, e John Donohue III, da Escola de Direito da Universidade Stanford, foram mais longe. Para eles, a queda nos índices de criminalidade ocorrida no início dos anos 90 deve-se à legaliza-ção do aborto, ocorrida 18 anos antes. Com menos filhos indesejados, concluíram, o número de delinquentes caiu.

Há muita divergência sobre a causa dessa correlação. Argumenta-se que a adolescência é uma idade em que: 1) as influências de amigos e o desejo de amizade são especialmente fortes; 2) há necessidade crescente de dinheiro, mas só existem subempregos à disposição; 3) há necessidade de afirmação de valores individuais, em contraposição aos aceitos pela sociedade. Ao sair da adolescência, os jovens param de delinquir porque estreitam seus laços com a sociedade, por meio do emprego, do casamen-to. Quanto ao sexo, as melhores explicações, além daquelas hormonais, são as que dizem que os meninos, diferentemente das meninas, são incen-tivados a serem agressivos, impositivos, machões.

Antes de aprovar leis mais rigorosas, inundar as favelas de policiais, construir mais cadeias ou comprar mais carros de polícia, é preciso enten-der a origem dos crimes no Brasil. E admitir que cada um de nós é parte de suas causas.

Políticas Públicas - Prevenção do Delito

PREVENÇÃO DO DELITO

Síntese do trabalho original de autoria de:

Antonio Garcia e Pablos de Molina

I . A PREVENÇÃO DO DELITO NO ESTADO “SOCIAL” E “DEMOCRÁTICO”

DE DIREITO.

O crime deve ser compreendido como um fenômeno social, de nature-za inter pessoal e comunitária. Em linhas gerais o fenômeno criminal está associado ao conjunto de fatores intervenientes na constituição de uma determinada sociedade. Assim é que cada sociedade possui uma espécie ou modalidade própria de delito que caracteriza e sustenta o aspecto de universalidade com que é observado tal fenômeno. Torna-se fácil verificar que raízes empíricas atuais do fenômeno criminal, herdados de uma tradi-ção sócio - cultural, constituem a base científica para a análise e a interpre-tação dos mecanismos de organização social que engendraram o compor-tamento delituoso numa dada e referenciada sociedade.

À primeira vista, a solução veementemente reclamada pela sociedade para a completa extirpação desse “mal”, passa, necessariamente pela intervenção do Estado, através de seu aparato policial. Contudo, tal per-cepção falseia o conteúdo real de uma evidência universal ao mesmo tempo em que mascara as forças e os movimentos, histórico e material-mente constituído num ambiente culturalmente contextualizado. Imputar à miséria, à má distribuição de renda, a impunidade institucionalizada e a tantas outras razões as causas do fenômeno criminal, por si só não contri-bui efetivamente para o enfrentamento racional que a questão exige. En-tender as variáveis e os fenômenos subjacentes que ajudaram a construir o pensamento político, social e econômico brasileiro talvez seja o primeiro passo na tentativa de compreender a complexidade do fenômeno criminal que assola, em particular, nosso país. Não obstante, outros fenômenos sociais merecem destacada importância para a compreensão do assunto em tela, como por exemplo a Religião, as Instituições, a Tecnologia, dentre outros. Entretanto, melhor seria considerá-los como apropriações adaptati-vas de uma realidade material de dominação do homem pelo homem, onde o Estado constitui o principal mecanismo de opressão face o projeto previ-amente concebido de organização social. É portanto, na perspectiva do Estado Social e Democrático de Direito, sob a égide e o império da Lei, que os mecanismos de controle social devem ser empregados como única forma de garantir os direitos fundamentais e sociais do cidadão. A pergunta que se faz é a seguinte: Como garantir tais direitos numa sociedade mar-cada pela desigualdade social ? A resposta não é simples, porém pode-se arriscar uma intervenção consubstanciada na ideia de construção de cida-dania. Nos dias de hoje, o modelo clássico de repressão estatal já não corresponde à realidade extremamente conflituosa reproduzida pelo ritmo de vida urbano. Os conflitos, cada vez mais, encontram-se revestidos de características peculiares que não podem sequer sofrer o rigor axiológico da classificação, objetivando assim concentrar os esforços de repressão. Sem dúvida que, no momento atual, a instituição policial representa muito menos do que representou em tempos idos, no tocante ao controle das

forças sociais oprimidas e marginalizadas. O efeito repressivo não funciona mais como resposta às diversificadas demandas conflituosas. Não significa contudo, execrar o aspecto funcional da ação repressiva do Estado e sim redimensioná-la a um plano de efetividade e pronta resposta, primando-se sempre pelo conjunto de ações preventivas, as quais deverão ser balizadas pela concepção de parceria comunitária, visto que sem ela a evidência delituosa estará sempre em destaque e o cidadão permanecerá inerte, fomentando constantemente a síndrome do medo.

II . CONSIDERAÇÕES SOBRE A CRIMINOLOGIA “CLÁSSICA”, “NEOCLÁS-SICA” E A MODERNA CRIMINOLOGIA.

A Criminologia “clássica” contemplou o delito como enfrentamento for-mal, simbólico e direto entre o Estado e o infrator. Nesse contexto, a pre-tensão punitiva do Estado polariza e esgota a resposta ao fato delituoso prevalecendo à face patológica. A reparação do dano causado á vítima não se apresenta como exigência social. Tampouco preocupa a efetiva “reinte-gração” do infrator. A dimensão comunitária do conflito criminal e da res-posta solidária que ele reclama permanecem, portanto, camufladas no nível de abstração. Em suma, não se pode sequer, dentro deste modelo de análise criminal e político criminal, falar de “prevenção” do delito (“estricto sensu”), senão de dissuasão penal. Os modelos de prevenção do delito clássico e neoclássico consideram que o meio adequado para prevenir o delito deve ter natureza “penal” (a ameaça do castigo), ou seja, o mecanis-mo dissuasório, mediante o efeito inibitório da pena, expressa fielmente a essência da prevenção. A diferença básica entre o modelo “clássico” e “neoclássico” de prevenção do delito encontra-se no fato de no modelo “clássico” a questão da prevenção é polarizada em torno da pena, do seu rigor ou severidade enquanto que, no modelo neoclássico, a efetividade do impacto dissuasório depende mais do funcionamento do sistema legal, tal como ele é percebido pelo infrator potencial, que na severidade abstrata das penas.

Já a moderna Criminologia é partidária de uma imagem mais complexa do acontecimento delituoso de acordo com o papel ativo e dinâmico que atribui aos seus protagonistas (delinquente, vítima, comunidade) e com a relevância acentuada dos muitos fatores que convergem e interagem no “cenário criminal”. Destaca o lado conflituoso e humano do delito, sua aflição, os elevados “custos” pessoais e sociais deste doloroso fenômeno, cuja aparência patológica, de modo algum nos conduz a uma serena análi-se de sua origem, nem o imprescindível debate político criminal sobre as técnicas de intervenção e de seu controle. Neste modelo teórico, o castigo do infrator não esgota as expectativas que o fato delitivo desencadeia. Nesse sentido, reparar o dano, reintegrar o delinquente e prevenir o crime são objetivos de primeira magnitude.

III . O CONCEITO DE “PREVENÇÃO” E SEUS DIVERSOS CONTEÚDOS.

Existe um setor doutrinário que identifica a prevenção com o mero efei-to dissuasório da pena. Prevenir equivale a dissuadir o infrator potencial com a ameaça do castigo. A prevenção é concebida com prevenção crimi-nal e opera no processo da motivação do infrator.

Outros autores ampliam o conceito de prevenção, salientando que ele compreende o efeito dissuasório mediato, ou seja indireto, que pode ser conseguido por meio de instrumentos não penais que alteram o “cenário” criminal, modificando alguns dos fatores ou elementos do mesmo (espaço físico, desenho arquitetônico e urbanístico, atitudes das vítimas, efetividade e rendimento do sistema legal etc.).

Para muitos estudiosos do sistema penitenciário, finalmente, a preven-ção do delito não é um objetivo autônomo da sociedade ou dos poderes públicos, senão o efeito último perseguido pelos programas de reintegração e inserção do condenado. Trata-se, pois, não tanto de evitar o delito, senão evitar a reincidência do infrator. Tal conceito de prevenção equipara-se ao de prevenção especial. Evitar a reincidência do condenado implica em uma intervenção tardia no problema criminal (déficit etiológico). Por outro lado, revela um acentuado traço individualista e ideológico na seleção dos seus destinatários e no desenho dos correspondentes programas (déficit social). Por fim, concede um papel protagonista desmedido às instâncias oficiais do sistema legal (déficit comunitário).

Contudo, em sentido estrito, prevenir o delito é algo mais. O conceito de prevenção do delito não pode desvincular-se da gênese do fenômeno criminal, isto é, reclama uma intervenção dinâmica e positiva que neutralize suas raízes, suas “causas”. A prevenção deve ser contemplada como

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prevenção “social”, ou seja, como mobilização de todos os setores comuni-tários para enfrentar solidariamente um problema “social”. Nesse contexto, há de se destacar a concepção doutrinária decorrente da classificação dos níveis de prevenção em primária, secundária e terciária. A distinção baseia-se em diversos critérios : na maior ou menor relevância etiológica dos respectivos programas, nos destinatários aos quais se dirigem, nos instru-mentos e mecanismos que utilizam, nos seus âmbitos e fins perseguidos.

Conforme tal classificação, os programas de prevenção primária orien-tam-se à raiz do conflito criminal, para neutralizá-los antes que o problema se manifeste. Busca atingir um nível de socialização proveitosa de acordo com os objetivos sociais. Educação, habitação, trabalho, bem estar social e qualidade de vida são os âmbitos essenciais para uma prevenção primária, que opera sempre a longo e médio prazo e se dirige a todos os cidadãos.

A chamada prevenção secundária, por sua parte, atua mais tarde em termos etiológicos, ou seja, no momento onde se manifesta ou se exteriori-za o conflito criminal. Opera a curto e médio prazo e se orienta seletivamen-te a concretos (particulares) setores da sociedade, àqueles grupos e sub-grupos que ostentam maior risco de padecer ou protagonizar o problema criminal. A prevenção secundária conecta-se com a política legislativa penal, assim como com a ação policial.

Programas de prevenção policial, de controle dos meios de comunica-ção, de ordenação urbana e utilização do desenho arquitetônico como instrumento de autoproteção, desenvolvidos em bairros de classes menos favorecidas, são exemplos de prevenção secundária.

IV . BREVE REFERÊNCIA AOS PRINCIPAIS PROGRAMAS DE PRE-VENÇÃO DO DELITO.

Podemos destacar a existência de dois fatores básicos que contribuí-ram para a definitiva consolidação de um novo paradigma político - criminal: o da prevenção. Em primeiro lugar, o fracasso indiscutível do modelo repressivo clássico, baseado em uma política penal dissuasória, como única resposta ao problema do delito. Em segundo lugar, o próprio progres-so científico e a utilíssima informação que diversas disciplinas reúnem sobre a realidade da delinquência. Se o crime não é um fenômeno casual, fortuito, aleatório, isto é se não é um produto do azar ou da fatalidade, senão um acontecimento altamente seletivo, como revelam tais disciplinas (o crime tem seu momento oportuno, seu espaço físico adequado, sua vítima propícia etc.), uma informação empírica confiável sobre as principais variáveis do delito abre imensas possibilidades para a sua prevenção eficaz.

Dentre os inumeráveis programas de prevenção conhecidos, vejamos uma breve informação sobre os pressupostos teóricos, principais diretrizes e conteúdos de alguns deles:

1) PROGRAMAS DE PREVENÇÃO SOBRE DETERMINADAS “ÁREAS GEOGRÁFICAS”.

Seu pressuposto doutrinário consiste na existência de um determinado espaço, geográfica e socialmente delimitado, em todos os núcleos urbanos industrializados, que concentra os mais elevados índices de criminalidade: são áreas muito deterioradas, com péssimas condições de vida, pobre infra-estrutura, significativos níveis de desorganização social e residência compulsória dos grupos mais conflituosos e necessitados. O espírito refor-mista desse programa prevê medidas de reordenação e equipamento urbano, melhorias infra - estruturais, dotação de serviços públicos básicos etc.

2) PROGRAMAS DE PREVENÇÃO DO DELITO POR MEIO DO DE-SENHO ARQUITETÔNICO E URBANÍSTICO.

Tais programas de prevenção orientam-se à reestruturação urbana e utilizam o desenho arquitetônico para incidir positivamente no “habitat” físico e ambiental, procurando neutralizar o elevado risco de influências que favorecem o comportamento delituoso ou de se tornar vítima desse com-portamento que ostentam certos espaços, assim como modificar, também de forma satisfatória, a estrutura “comportamental” do vizinho ou habitante destes lugares. Assim como o programa de prevenção sobre determinadas “áreas geográficas”, o programa de prevenção por meio do desenho arqui-

tetônico e urbanístico não previne o delito, somente o desloca para outras áreas menos protegidas, deixando intactas as raízes profundas do proble-ma criminal e tem uma inspiração policial e defensiva, é dizer, não etiológi-ca.

3) PROGRAMAS DE PREVENÇÃO “VITIMÁRIA”.

A prevenção orientada para vítimas parte de uma comprovação empíri-ca não questionada por ninguém, isto é, o risco de se tornar vítima não se reparte de forma igual e uniforme na população nem é produto do azar ou da fatalidade: trata-se de um risco diferenciado, calculável, cuja maior ou menor probabilidade depende de diversas variáveis pessoais, situacionais, sociais (relacionadas, em princípio, com a própria vítima).

Os programas de prevenção de orientado para vítimas, potenciais ou não, pretendem informar - e conscientizar - as vítimas potenciais dos riscos que assumem, com a finalidade de fomentar atitudes maduras de respon-sabilidade, autocontrole, em defesa dos seus próprios interesses. Perse-guem também, uma mudança de mentalidade da sociedade em relação à vítima do delito: maior sensibilidade, solidariedade com quem padece as consequências dele.

4) PROGRAMAS DE PREVENÇÃO DO DELITO DE INSPIRAÇÃO PO-LÍTICO-SOCIAL.

Uma Política Social progressiva, se converte, então, no melhor instru-mento preventivo da criminalidade, já que desde o ponto de vista “etiológi-co” - pode intervir positivamente nas causas últimas do problema, do qual o crime é um mero sintoma ou indicador. Os programas com esta orientação político - social são, na verdade, programas de prevenção “primária”: genu-ína e autêntica prevenção. Pois se cada sociedade tem o crime que mere-ce, uma sociedade mais justa que assegura a todos os seus membros um acesso efetivo às cotas satisfatórias de bem - estar e qualidade de vida - em seus diversos âmbitos (saúde, educação e cultura, casa etc.) - reduz correlativamente sua intensidade conflituosa assim como as taxas de delinquência. E os reduz, ademais, de modo mais justo e racional, combi-nando a máxima efetividade com o menor custo social.

5) PROGRAMAS DE PREVENÇÃO DA CRIMINALIDADE DE ORIEN-TAÇÃO “COGNITIVA”.

Se a aquisição de habilidades cognitivas tem demonstrado ser uma efi-caz técnica de intervenção reintegradora, porque isola o delinquente de influências perversas, parece lógico supor que uma tempestiva aquisi-ção pelo jovem de tais habilidades evitaria que este tivesse participação em comportamentos delitivos. Sua eficácia, pois, alcança não só o âmbi-to da intervenção (“tratamento”), senão também o da “prevenção”.

6) PROGRAMAS DE PREVENÇÃO DA REINCIDÊNCIA.

Embora este tipo de programa não contemple a prevenção como obje-tivo específico imediato, haja vista dirigir-se, antes de tudo, ao condenado - ou ao infrator - com a pretensão de evitar que o mesmo volte a delinquir. São, pois, programas de prevenção terciária, que tratam de evitar a reinci-dência do infrator, não de prevenir o “desvio primário”. Muito destes pro-gramas, como se verá, pertencem mais à problemática da “intervenção” (ou “tratamento”) que à prevenção, entendida em sentido estrito. Outros cor-respondem ao conhecido modelo dos “substitutivos” penais: baseia-se em fórmulas alternativas à intervenção drástica do sistema legal (quando se trata de conflitos pouco graves) para liberar o infrator do seu inevitável impacto gerado por estigmas. V . BASES DE UMA MODERNA POLÍTICA CRIMINAL DE PREVENÇÃO DE DELITOS.

Uma moderna política criminal de prevenção do delito deve levar em conta as seguintes bases:

1) O objetivo último de uma eficaz política de prevenção não consiste em erradicar o crime, senão em controlá-lo razoavelmente. 2) No marco de um Estado social e democrático de Direito, a prevenção do

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delito suscita inevitavelmente o problema dos “meios” ou “instrumentos” utilizados, assim como dos “custos” sociais da prevenção.

3) Prevenir significa intervir na etiologia do problema criminal, neutrali-zando suas “causas”.

4) A efetividade dos programas de prevenção deve ser programada a médio e longo prazo.

5) A prevenção deve ser contemplada, antes de tudo, como prevenção “social” e “comunitária”, precisamente porque o crime é um problema social e comunitário.

6) A prevenção do delito implica em prestações positivas, contribuições e esforços solidários que neutralizem situações de carência, conflitos, desequilíbrios, necessidades básicas.

7) A prevenção científica e eficaz do delito, pressupõe uma definição mais complexa e aprofundada do “cenário criminal“, assim como nos fato-res que nele interagem.

8) Pode-se também evitar o delito mediante a prevenção da reincidên-cia. Mas, desde logo, melhor que prevenir “mais” delitos, seria “produzir” ou “gerar”menos criminalidade.

FATORES CONDICIONANTES DA CRIMINALIDADE: AS ESCOLAS E AS CONTRIBUIÇÕES TEÓRICAS AO ESTUDO

DA BIOLOGIA, PSICOLOGIA E SOCIOLOGIA CRIMINAIS. Um breve comentário sobre a contribuição das Escolas Crimino-

lógicas Para que seja possível se compreender o alcance das contribuições

das Escolas Criminológicas para o Direito Penal, necessitaremos inter-relacionar essas contribuições com os critérios para aferição da imputabili-dade e a integridade da cognição do agente criminoso.

Em uma primeira análise, faz-se necessário que se identifique quais as

principais contribuições das Escolas Criminológicas para o Direito Penal e a Criminologia.

E iniciaremos esta abordagem justamente na primeira das Escolas a

serem tratadas, a Clássica, onde Cesare Beccaria fincou os fundamentos ideológicos que fizeram vingar, até os dias modernos, as bases do Direito Penal, inclusive fazendo constar na Declaração dos Direitos do Homem os princípios da humanidade e solidariedade com que ele entendia que as penas deveriam ser ministradas.

Ainda na Escola Clássica, o próprio Beccaria defendia que o juiz deve-

ria se ater à aplicação da pena prevista na lei, o que antecede aos concei-tos de Francisco Carrara, que via o delito como um ente jurídico.

O mesmo Estado Humanista que aplicava penas como fator de retri-

buição e na mesma intensidade do delito, era curiosamente contrário às penas cruéis. E é nesse contexto histórico que o iluminismo da Escola Clássica, nascido enfronhado nas bases jusnaturalistas do século XVIII, vê surgir uma nova Escola, a Positivista, entre o final do século XVIII e XIX, quando a medida de segurança visava punir ao doente patológico, ao criminoso endêmico dessa época, objeto de estudos da Escola Penal Italiana.

Dentro dessa Escola Penal Italiana sobressaem-se Lombroso, Ferri e

Garófalo. Seus estudos, respectivamente, defendiam a existência de um determinismo biológico, um determinismo sociológico e um determinismo psicológico, todos dizendo respeito ao “criminoso nato” definido inicialmente por Lombroso.

Ou seja, o indivíduo nasceria predeterminado ao crime, em função de

determinadas características biológicas, físicas (segundo Lombroso), mas somente teria essa pré-disposição ativada pelo meio social (de acordo com os entendimentos de Ferri), ou por uma patologia psíquica (assim Garófalo defendia seus conceitos).

A doutrina aponta que o único ponto de discordância, de forma enfáti-

ca, entre esses três defensores do predeterminismo criminal da Escola

Penal Italiana estaria na ressocialização do indivíduo criminoso, que é fator de discordância entre Ferri (que defendia que o mesmo meio social que teria a capacidade de influenciar negativamente o indivíduo, poderia reinte-grá-lo à sociedade) e seu companheiro Garófalo (que defendia a irrecupe-rabilidade do criminoso patológico).

Sob o efeito desses estudos da Escola Penal Italiana, amparados pelos

conceitos filosóficos da Escola Positivista, surge a Escola Eclética, já entre o final do século XIX e início do XX, erguida tendo como lastro conceitual as ideias finalistas e cientificistas, entendendo ter a pena uma finalidade preventiva.

Então, é somente durante a Escola Eclética que o Direito Penal se vê

sendo dissociado da Criminologia, quando passa a se estudar o crime, suas circunstâncias, causas, consequências, elementos e indivíduos parti-cipantes, sob a ótica de outras ciências.

A pena passa a ter seu caráter geral (quando atinge toda a sociedade,

coibindo e intimidando) e específico (quando visa “aquele” indivíduo, em especial, buscando reeducá-lo, reintegrá-lo ao convívio social).

Então, graças às Escolas Criminológicas, consegue-se inter-relacionar

aspectos comuns, lançados nos idos do século XIX, quando os determinis-mos biológico, sociológico e psicológico da Escola Positivista servem de base conceitual para o estabelecimento dos fatores bio-psicológicos para determinação da imputabilidade, os quais se desmembram em fatores biológicos (não o determinismo biológico de Lombroso, mas os fatores mentais que determinariam a capacidade intelectiva do indivíduo) e fatores psicológicos (não o determinismo psicológico de Garófalo, mas os fatores que definiriam o nível de QI-Quoeficiente Intelectual do indivíduo, que poderia chegar até mesmo ao nível oligofrênico profundo).

A cognição íntegra, ou a integridade da cognição, está diretamente li-

gada à consciência (juízo da realidade), ao conhecimento da ilicitude e a volição (autonomia da vontade).

O indivíduo que tenha o comprometimento da consciência, terá o seu

senso da realidade prejudicado. É o esquizofrênico, por exemplo. Ele tem noção do que faz, sabe o que faz, quer fazer, mas tem comprometido o motivo pelo qual comete o ilícito, uma vez que no momento do fato ele terá sido acometido por um surto psicótico que lhe retira completamente a plena noção da realidade, o que o torna absolutamente inimputável.

Enquanto isso, temos o oligofrênico, um bom exemplo de um indivíduo

que tem comprometida a sua capacidade de conhecimento da ilicitude do seu ato. O oligofrênico profundo e o grave (agudo) não têm qualquer noção de lícito ou ilícito, de certo ou errado, bom ou ruim, de nada; ele é o que mais popularmente se habituou a chamar de “retardado”, consistindo em um indivíduo que teve a sua formação mental incompleta ou mal desenvol-vida, o que o torna inimputável.

Por sua vez, temos o indivíduo que, em função de uma embriagues pa-

tológica, não possui nenhuma capacidade de decidir pelo sim ou pelo não, pelo fazer ou não fazer, quando em surto patológico da sua embriagues, daí sua inimputabilidade.

Tanto a esquizofrenia, como a oligofrenia e a embriagues patológica são doenças que asseguram a inimputabilidade dos indivíduos por ela acometidos, quando juntas médicas diagnosticam as respectivas doenças. E será a Psiquiatria Forense e a Psicopatologia Forense quem irão cuidar de diagnosticar essas doenças, certificando-se de que as mesmas se manifestam no momento do cometimento do ilícito.

Contudo, saliente-se, será sempre o juiz quem irá definir pela inimputa-bilidade do criminoso, baseando sua decisão jurídica nos laudos médicos periciais. Nesse caso, poderá o juiz adotar a medida de segurança, ao invés da pena, se entender necessário ser submetido o indivíduo aos cuidados especiais da medida de segurança, que poderá ser ambulatorial (para os casos menos graves) ou de internação (para os casos de maior gravidade patológica).

Assim, mais uma vez, vemos os conceitos das Escolas Criminológicas coadunando com os critérios de inimputabilidade, quando, em primeiro

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lugar, vemos novamente os determinismos biológico e psicológico fazendo um paralelo com (respectivamente) a embriagues patológica, de um lado e, de outro, a oligofrenia e a esquizofrenia.

E, em segundo lugar, vemos o momento em que a criminologia procura

auxílio de outras ciências, para fundamentar situações investigadas pelo Direito Penal. E é isso que a Psicopatologia e a Psiquiatria Forense fazem, tal e qual a Sociologia, a Filosofia, a Biologia, a História, e outras tantas Ciências fizeram durante a Escola Eclética, quando a Criminologia se dissociou do Direito Penal.

Enfim, como benefício dos conceitos preconizados e defendidos pelas

Escolas Criminológicas, o agente criminoso inimputável não será criminal-mente responsabilizado pelos seus atos, na esfera jurídica, justamente porque hoje já se consegue saber, com precisão, que ele ou terá compro-metida a sua capacidade de formação de um juízo de valor, ou não terá autonomia sobre a sua volição, ou, ainda, não terá noção da ilicitude dos seus atos. Mas isto será dito pelas Psiquiatria Forense e a Psicopatologia Forense, ciências que auxiliam a Criminologia a estudar o crime, o crimino-so, a vítima e todos os aspectos que se inter-relacionem, gerando subsídios para que o Direito Penal possa ser corretamente aplicado. Sandra Reis da Silva

ALGUMAS CONSIDERAÇÕES BÁSICAS ACERCA DA MODER-

NA "ANÁLISE CRIMINAL" George Felipe de Lima Dantas INTRODUÇÃO A tentativa de identificar "modelos estáveis de causalidade" nas ex-

pressões fáticas do fenômeno da violência e da criminalidade (em suas "ocorrências") tem sido objeto de estudo de várias disciplinas ao longo da história das ciências sociais, entre outras, a criminologia e a chamada "antropologia da violência". Desde muito tempo, ainda nos pródromos da formulação das bases teórico-conceituais que culminaram com o estabele-cimento da disciplina da moderna "Sociologia Criminal", no Século XX, estudiosos já se ocupavam de tentar explicar as origens da violência e da criminalidade, caso de Becaria (1738-1794) e Bentham (1748-1832), sob a égide da chamada "Teoria da Natureza Humana".

Dos primórdios da "Escola Clássica" e da "Teoria da Natureza Huma-

na", aos dias de hoje, passando pelas chamadas "Teorias Sociológicas" primeiro articuladas na primeira metade do Século XX pela "Escola de Chicago", persiste a busca de modelos explicativos de expressões anti-sociais do comportamento humano. Essa busca, na modernidade, continua, na expressão das formulações das teorias Marxista, da Distensão, Feminis-ta e Pós-Modernista da Criminologia.

O que existe, algo de novo, é a incorporação dos conhecimentos da

Criminologia a uma área acadêmica relativamente recente, a chamada "Justiça Criminal". Tal disciplina é hoje um continente de convergência das teorias clássicas acadêmicas e formulações da "Ciência Policial", disciplina gestada sob as experiências práticas, principalmente nos Estados Unidos da América (EUA), na administração da segurança pública nos últimos dois séculos.

A moderna Justiça criminal vem buscando, em seu viés do ambiente

conceitual da "Administração Pública", identificar novas "tecnologias do conhecimento" capazes de instrumentar uma gestão da segurança pública motivada por políticas, métodos e processos científicos de produção de conhecimento, cuja influência prática e objetiva estaria refletida na própria operação do sistema de segurança pública, aí incluídos os órgãos policiais, caso das polícia civis e militares do Brasil. Um exemplo atual seria o "Projeto Mapa", atualmente em uso na gestão do policiamento ostensivo realizada pela Polícia Militar de Minas Gerais (PMMG).

A análise criminal é parte essencial de tudo isso... E é oportuno enfati-

zar que não se deve confundi-la com as atividades tradicionalmente reali-zadas pela chamada "análise de inteligência", de cunho militar ou político (a segunda acepção com forte conotação negativa na atualidade...). Enquanto a primeira é predominantemente, científica, acadêmica e metodológica, com aplicação direta na "gestão científica da segurança pública", a segunda caracteriza-se, entre outros fatores, pela busca do chamado "dado negado".

Ao contrário, a análise criminal é realizada com base em registros públicos, ou "quase públicos" (em função da proteção dos nomes de vítimas de delitos) de ocorrências policiais, ou por intermédio dos dados produzidos por pesquisas amostrais, por isso mesmo desvinculados do secretismo que caracteriza a análise e inteligência em seu viés militar.

Remontando à história da "inteligência policial", foi no final de década

de 1920, através da Associação Internacional de Chefes de Polícia [Interna-tional Association of Chiefs of Police (IACP)], que os chefes de polícia e xerifes de instituições policiais norte-americanas propuseram a criação do que veio a tornar-se o verdadeiro "pilar" para a formulação da moderna doutrina de análise criminal: grandes bases administrativas de da-dos agregados nacionalmente acerca da criminalidade. Tais bases de dados teriam grande abrangência, não só territorial, mas também "históri-ca", cobrindo vários anos, no que veio a chamar-se, nos EUA, de "Uniform Crime Report System" [Sistema de Relatórios Padronizados da Criminali-dade (UCRS)].

O UCRS, administrado pelo Governo Federal dos EUA, por força de lei,

passou a ficar sob a responsabilidade direta do "Federal Bureau of Investi-gation" (FBI), órgão subordinado ao que equivaleria, no Brasil, ao Ministério da Justiça. A metodologia de produção de conhecimento criminológico, através desse instrumento, implica na coleta e análise de dados acerca de dois grandes grupos de ocorrências criminais notificadas aos órgãos polici-ais: (i) envolvendo delitos contra a pessoa e (ii) incluindo delitos contra o patrimônio. Tal "padronização nacional" permite hoje a existência de uma "linguagem universal" na gestão do conhecimento criminológico (tendências e padrões da criminalidade) com impacto nas pequenas unidades federati-vas norte-americanas (condados e municípios), o que vem a estender-se também a cada um dos entes federativos estaduais para, finalmente, mate-rializar-se num relatório nacional chamado "Crime in America" (Crime na América).

A atual "tecnologia do conhecimento criminológico", elaborada a partir de dados produzidos pelo UCRS nos EUA, está hoje incorporada ao acervo formal do conhecimento acadêmico, com os produtos/relatórios do sistema UCR sendo custodiados pela renomada Universidade de Michigan, institui-ção que os disponibiliza, abertamente, aos mais diversos tipos de estudos e pesquisas de organizações públicas e não-governamentais. Tal situação tem implicações, também, na "modelagem" de formulações globais acerca do crime e da violência, na medida em que tal "tecnologia do conhecimen-to", por sua padronização, abrangência e continuidade histórica, assegura um mínimo aceitável de validade e confiabilidade em relação às conclusões de estudos epidemiológicas da criminalidade global e da cada um dos países da comunidade internacional que adotam tal tecnologia. Assim, a "tecnologia UCR" não somente "informa" os sistemas de produção nacional de conhecimento sobre o crime em diversos países individualmente, mas também dá corpo à metodologia dos Relatórios Globais sobre Crime e Justiça atualmente elaborados pela Organização das Nações Unidas (ONU).

Em 2001, no momento em que várias secretarias de segurança pública

se lançam à tarefa de buscar construir as bases de sua modernidade, através da gestão científica da segurança pública, talvez seja oportuno enumerar alguns conceitos básicos da hodierna análise criminal, tudo isso com base em métodos, técnicas e processos direta ou indiretamente relaci-onados à tecnologia UCR desenvolvida pelos norte-americanos.

É parte do acervo histórico de conhecimentos criminológicos acumula-

dos e advindos de diferentes disciplinas o entendimento de que alguns fatores pareceriam afetar, "tipicamente", o volume e o tipo de crime que ocorre num determinado lugar: seriam eles os chamados "fatores condicio-nantes do crime e da criminalidade". Com base em informações produzidas a partir de dados contidos no sistema "UCR", é possível identificar fatores condicionantes do crime e da criminalidade.

FATORES CONDICIONANTES DO CRIME E DA CRIMINALIDADE 1. Densidade populacional e grau de urbanização local, bem como o

tamanho da comunidade e de suas áreas adjacentes; 2. Variação na composição do contingente populacional local, particu-

larmente quanto à prevalência de estratos populacionais jovens e de indivíduos do sexo masculino;

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Criminologia A Opção Certa Para a Sua Realização 40

3. Estabilidade da população no que concerne a mobilidade de residentes locais da comunidade, seus padrões diários de des-locamento e presença de população transitória ou de não-residentes.

4. Meios de transporte localmente disponíveis e sistema viário local; 5. Condições econômicas, incluindo renda média, nível de pobreza e

disponibilidade de postos de trabalho; 6. Aspectos culturais, educacionais, religiosos e oportunidades de la-

zer e entretenimento; 7. Condições da matriz social nuclear, no que concerne o divórcio e

coesão do grupo familiar; 8. Clima local; 9. Efetividade das instituições policiais locais; 10. Ênfase diferenciada das polícias locais nas funções operacionais e

administrativas da instituição; 11. Políticas, métodos e processos de funcionamento das outras insti-

tuições que dão corpo ao sistema de local de justiça criminal, inclu-indo o Ministério Público, Poder Judiciário e Autoridade Prisional;

12. Atitudes da cidadania em relação ao crime; 13. Práticas prevalentes de notificação de delitos ocorridos às autori-

dades policiais. Conhecidos os fatores condicionantes do crime e da criminalidade,

produzidos e/ou confirmados a partir da "tecnologia UCR", é hora de saltar para os aspectos específicos da chamada "Análise Criminal".

ANÁLISE CRIMINAL É um processo analítico e sistemático de produção de conhecimento,

orientado segundo os princípios da pertinência e da oportunidade, sendo realizado a partir do estabelecimento de correlações entre conjuntos de fatos delituosos ocorridos ("ocorrências policiais") e os padrões e tendên-cias da "história" da criminalidade de um determinado local ou região. Sempre que possível, as atividades de análise devem buscar englobar, territorialmente, locais ou regiões dos quais estejam disponíveis, também, indicadores demográficos e sócio-econômicos, de tal sorte que a criminali-dade possa ser contextualizada. No caso brasileiro, é importante ter em conta a produção de dados locais disponibilizada pelo "Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística" (IBGE).

A análise criminal serve o propósito de apoiar as áreas operacional e

da gestão administrativa das organizações policiais, orientando o planeja-mento e emprego de recursos humanos e materiais no sentido da preven-ção e repressão do fenômeno da criminalidade e da violência.

A análise criminal contribui de maneira objetiva para as atividades de

investigação, prisão de delinquentes, esclarecimento de crimes e, obvia-mente, prevenção criminal.

No contexto acima descrito, a análise criminal orienta várias funções

gerais das organizações policiais, incluindo a gestão dos recursos tático-operacionais (sua distribuição espaço-temporal, entre outros aspectos...), realização de operações especiais, atividades de investigação, bem como planejamento e orçamento.

TIPOS DE ANÁLISE CRIMINAL Análise Criminal Tática É um processo analítico de produção de conhecimento em suporte às

atividades policiais operacionais (policiamento ostensivo e investigação), visando subsidiar pronta resposta das autoridades policiais às ocorrências criminais surgidas num determinado momento e lugar.

As informações assim produzidas são instrumentais no apoio aos ele-

mentos operacionais quanto à identificação de tendências criminais naque-le locus espaço-temporal específico, devendo favorecer uma consequente e imediata prevenção e repressão ao crime.

O objetivo instrumental da análise criminal tática, portanto, é a identifi-

cação imediata de tendências (evolução quantitativa e distribuição espaço-temporal) e "padrões" da criminalidade (modus operandi), aí incluídas sequências de baixa, média e alta frequência de ocorrências, bem como pontos geográfico-espaciais de rápida acumulação de fatos delituosos ("pontos quentes"). A propósito, o "Projeto Mapa", da PMMG, está funda-

do na gestão policial tático-operacional a partir da identificação de "pontos quentes".

Esse tipo de análise inclui a associação de dados relativos a ocorrên-

cias específicas com dados de grandes bases históricas das de-mais ocorrências policiais, visando a identificação de relações en-tre variáveis como, método, data-hora, local e instrumento(s) utilizado(s), entre outras possibilidades, no sentido da identificação e prisão de autores de delitos.

Visto de outra forma, através da identificação de aspectos específicos

de ocorrências do fenômeno da criminalidade a análise táti-ca produz indicações que podem levar a um rápido esclarecimento de casos/ocorrências, através da vinculação de um determinado indivíduo e respectivo modus operandi à autoria de um delito sendo investigado num dado momento.

Análise Criminal Estratégica Está voltada para a resolução de problemas de longo alcance na ges-

tão da segurança pública, partindo de "projeções de cenários" em que as premissas básicas indicam diferenciação qualitativa e/ou aumento ou diminuição da criminalidade futura (padrões e tendências).

A análise criminal estratégica inclui a preparação de sumários de esta-

tística criminal, bem como a realização de estudos e elaboração de planos para a identificação e aquisição de recursos futuros para a gestão.

Também pode ser colocado que esse tipo análise está voltada para a

formulação de estratégias operacionais na busca de soluções para proble-mas gerais de natureza corrente. Assim, produzirá informações para a alocação de recursos institucionais, incluindo a configuração das áreas físicas de atividade policial e dias e horários do emprego da força policial. Busca também identificar atividades criminais fora do padrão comum de ocorrências, e/ou com frequência inferior ou superior ao valores usuais, e/ou consumadas em tempos diversos da sua distribuição sazonal regular.

Assim, a análise estratégica pode identificar condições anômalas na

segurança pública, possibilitando um redimensionamento da prestação de serviços policiais, otimizando sua efetividade e eficiência. Tais atributos ficam manifestos na redução ou supressão de problemas crônicos, contri-buindo para o estabelecimento de políticas comunitárias e de resolução de problemas da gestão da segurança pública.

Análise Criminal Administrativa Está focada nas atividades de produção de vários tipos de conheci-

mento, incluindo o econômico, geográfico, social e organizacional (policial), com a finalidade de instrumentar a gestão policial, a do executivo local e dos conselhos comunitários e grupos da sociedade organizada. Envolve projetos de longo alcance nas áreas financeira, política e legislativa. Sua produção é crucial para a gestão orçamentária, de pessoal e de relações públicas, sem esquecer questões relativas à vinculação da segurança pública local com o funcionamento do Poder Judiciário.

POR QUEM E COMO É REALIZADA A ANÁLISE CRIMINAL Ao analista criminal cabem difíceis e intrincadas tarefas analíticas e es-

tatísticas, incluindo: (i) a utilização de aplicativos de computação, (ii) a realização de amostragens estatísticas aleatórias, (iii) elaboração de análi-ses e estudos de correlação e regressão e (iv) estudos probabilísticos.

Parte do trabalho do analista inclui as seguintes tarefas ocupacio-

nais Coleta e análise de dados para detecção de padrões de criminalida-

de; estabelecimento de correlações de dados acerca de suspeitos do cometimento de delitos; elaboração de perfis de suspeitos e projeção da ocorrência futura de determinados delitos; preparação de relatórios sobre dados e tendências criminais; realização de apresentações para membros da instituição policial, da comunidade e de organizações exter-nas; monitoramento da criminalidade e estabelecimento de programas preventivos, inclusive em parceria com outros órgãos do Poder Executivo local;

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Criminologia A Opção Certa Para a Sua Realização 41

Condições gerais de realização das atividades de análise criminal O analista deverá poder exercer suas atividades técnicas da maneira

mais independente possível, formulando conclusões basea-das exclusivamente em convicção de caráter técnico-profissional; deverá exercer elevado grau de independência técnica na identificação e seleção de seus processos, métodos e técnicas de pesquisa; estabelecerá e mante-rá canais de comunicação direta com o público externo, outros servidores de órgãos do Poder Executivo local e membros de organizações policiais coirmãs, tudo no sentido de poder coletar informações criminais em provei-to das atividades de análise; deverá ser capaz de redigir de maneira clara, organizada e correta quanto ao uso da lingua; deverá ser capaz de desen-volver programas específicos de computação para utilização em projetos singulares de análise criminal.

Produtos resultantes do exercício das atividades de análise Apresentações verbais sobre estatística criminal e tendências da crimi-

nalidade; produção de documentos (relatórios e boletins) sobre estatística criminal, incluindo em sua temática os suspeitos do cometimento de deli-tos e respectivo "modus operandi".

Atividades Específicas Pesquisar, dar entrada e extrair informações utilizando um terminal de

computador, ou micro-computador, de maneira a poder agregar e analisar estatísticas criminais, manter séries históricas de informação criminal e compilar boletins de criminalidade; selecionar, separar, arrumar e arquivar relatórios policiais, estatísticas criminais, boletins e artigos sobre o tema, de maneira pré-estabelecida, de modo a manter uma história da estatística criminal de eventos delituosos, podendo assim desenvolver as respectivas análises; produzir desenhos, gráficos, tabelas e mapas para ilustrar docu-mentos representando padrões e tendências da criminalidade e respectivas conclusões estatísticas, tudo isso através de aplicativos de computa-ção; observar, comparar e monitorar dados, incluindo relatórios departa-mentais e estatísticas geradas por computador, de maneira a poder checar a obediência aos métodos de produção de tais elementos aos padrões de análise criminal estabelecidos pela instituição; inspecionar e monitorar os software dos microcomputadores utilizados assegurando-se de que estejam funcionando corretamente.

CONHECIMENTOS E TÉCNICAS DO ANALISTA (por disciplina) Análise e Inteligência da Segurança Pública Metodologias básicas de análise e inteligência e sua função no metiê

da segurança pública. Análise de inteligência: tipos, processos, ciclos e mapeamento analítico de inteligência. Análise de fenômenos da segurança pública: tipos de análise; realização da análise; coleta e integridade de dados; metodologia de pesquisa; estatística; análise espacial e análise tática. Apresentação de relatórios de análise.

Análise de vínculos, análise investigativa visual e mapeamento de

eventos temporais A utilização da análise de vínculos, análise investigativa visual e mapas

e tabelas de eventos temporais como instrumentos analíticos do metiê da segurança pública. Inclui técnicas de análise, desenvolvimento de mapas e tabelas de eventos temporais e uma visão geral dos software comumente utilizados para tal finalidade.

Análise e fluxograma de registros de chamadas telefônicas A utilização de registros e fluxograma telefônico como instrumentos

analíticos do metiê da segurança pública. Inclui técnicas de análise, mapas e tabelas e uma visão geral dos software comumente utilizados para tal finalidade.

Análise de fenômenos da segurança pública Os elementos básicos de análise e técnicas para o estabelecimento de

cenários prospectivos de ocorrências futuras e criação de boletins de ocorrências através da utilização de informações que correspondem às variáveis da análise de delitos e respectivas tendências. Inclui os tipos de análise e como elas são utilizadas no metiê da segurança pública. O pro-cesso de análise, o mapeamento de fenômenos e os aplicativos (software) utilizados para tal finalidade

Estatística aplicada ao estudo dos fenômenos da segurança pú-blica

Introdução ao uso da estatística para realização de análises de fenô-menos da segurança pública. Inclui uma visão geral das funções da estatís-tica descritiva e inferencial, cálculo das funções mais comumente utilizadas nos trabalhos de análise e utilização de instrumentos computacionais (software) para sua realização.

Análise de fenômenos da segurança pública através dos chama-

dos "Sistemas Geográficos de Informação" (GIS) A utilização do aplicativo ArcView de GIS na realização de análise de

inteligência da segurança pública em suas três fases: administrativa, estra-tégica e tática. Os vários tipos de mapas, identificação de "pontos quentes", padrões de ocorrências de fenômenos, relatórios de ocorrências e análise espacial. Instrumentos de apoio à implementação das três fases de análise.

A biologia na violência Ainda que a contribuição de um grande contingente de estudos genéti-

cos, neurológicos e paleontológicos sobre a natureza da violência humana seja de conhecimento público, continuam sendo frequentes as críticas exaltadas à contribuição da biologia aos estudos das formas de violência que ocorrem nas sociedades humanas. A dicotomia natureza versuscultura persiste muito viva no discurso das áreas da ciência que estudam fenôme-nos humanos complexos, como a vida em sociedade.

O raciocínio básico, nessas críticas, foi expresso, enfaticamente, por

Rose (1997), quando apresentou o determinismo neurogenético que, se-gundo ele, advoga a relação causal entre gene e comportamento: Se os motivos de nossas aflições são exteriores a nós, cabe às ciências sociais e à política resolvê-los. Mas, se as causas de nossos prazeres e sofrimentos, de nossa virtude e de nossos vícios estiverem, sobretudo, na biologia, então devemos buscar sua explicação na neurociência e devemos recorrer à farmacologia e à engenharia molecular para encontrar soluções...

Quando as diferenças entre ricos e pobres são tão grandes, quando os

lucros potenciais da violência podem ser tão altos e especialmente quando, nos Estados Unidos, diz-se que há mais de 280 milhões de revólveres de propriedade privada, é tolo e dispendioso procurar na biologia explicação determinante para a violência.

Nenhum cientista conhecido defende um determinismo como exposto

acima. Além disso, genes não são a matéria bruta da evolução; comporta-mentos, por serem fenótipos, o são.

Comportamentos selecionam genes e não o contrário. É um equívoco

assumir que a teoria evolutiva enfatiza o controle biológico do comporta-mento. Ao contrário, ela explica como os fatores ambientais e culturais moldam não só a evolução do cérebro, mas, também, o seu desenvolvi-mento em cada indivíduo (Hans et al., 2000). Por isso, é pertinente se perguntar se os milhares de revólveres, mencionados acima, também seriam um perigo diante de outros cérebros que não aqueles existentes nos seres humanos.

Entretanto, a visão científica atual é, essencialmente, determinista. Em

relação à conduta humana, determinismo é a tese de que tudo que aconte-ce – incluindo-se ações, decisões, emoções e sentimentos humanos – é consequência de condições tais que levaram a um determinado desfecho e não a outros e, se repetidas as mesmas condições, um dado evento se repetiria (Walter, 2001). Em termos mentais, o determinismo psíquico é a teoria, proposta por Sigmund Freud, de que os atos mentais têm causas e não há, como regra, lugar para fenômenos aleatórios.

Não se trata de discutir se todas as causas de um fenômeno mental es-

tão, ou estarão algum dia, acessíveis à ciência; e o mais provável é que não, ou seja, determinismo não é sinônimo de previsibilidade. Igualmente, porém, não sabemos explicar de onde poderia surgir a indeterminação, ou seja, como, no tipo de universo em que vivemos, poderia haver algo que não fosse consequência de eventos anteriores? Mas seria tolice procurar-mos a contribuição da biologia dentre os entes causais da violência?

Desde o início do século 20, dezenas de estudos com gêmeos têm

identificado um componente genético no comportamento criminal, ainda

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que variando no tempo e no espaço (Vogel & Motulsky, 1996), sugerindo que a influência dos genes não é invariante. Genes influenciam o compor-tamento de uma maneira probabilística, contribuindo para condições psico-lógicas que facilitam ao indivíduo agir de maneira violenta (Lyons, 1994). Note-se, ainda, que o fato de se apontar o efeito de genes em um determi-nado fenótipo, comportamento violento neste caso, não traz qualquer presunção sobre o efeito do ambiente neste fenótipo nem sobre eventuais interações entre ambos, genes e ambiente.

A relação entre genética e criminalidade violenta e sistemática parece ser mediada pelo conceito do transtorno de personalidade antisocial, um problema crônico, de início na segunda década de vida, caracterizado, em sua versão mais profunda, por ausência de culpa, vergonha ou remorso, pobreza de relações afetivas, incapacidade de aprender com a experiência e insensibilidade social (Hart et al., 1995).

Flores e Hackmann (2001) ao estudarem 560 adolescentes gaúchos com mais de 14 anos, em regime de privação de liberdade por haverem apresentado comportamento criminalizável, estimam que cerca de 40% dos diagnósticos psiquiátricos pertenciam a esta categoria. Entre aqueles com idade entre 18 e 21 anos, internos em uma unidade para indivíduos de maior risco, este valor chegava a mais de 90%.

Raine et al. (1996) e Raine e Liu (1998) mostraram outra maneira de a biologia contribuir para o fenômeno da violência. Identificaram uma combi-nação explosiva para gerar comportamentos violentos: fragilidades biológi-cas, estimadas pela presença de problemas neurológicos, atraso no desen-volvimento neuropsicomotor e complicações de parto, combinadas com um ambiente familiar inadequado, especialmente no primeiro ano de vida. Nas amostras estudadas, holandesas e norte-americanas, o risco de se envol-ver em comportamentos criminais era de mais do que o dobro do represen-tado pela presença de apenas um deles – fragilidade biológica ou ambiente inadequado isoladamente – correspondendo a mais de 2/3 do total de crimes cometidos pelos cortes estudados.

Estudos preliminares de uma amostra de 21 jovens violentos, mas sem condenações criminais, de Porto Alegre, identificaram três variáveis cuja presença aumenta significativamente o escore de violência utilizado: pro-blemas obstétricos, maus-tratos na infância e história familiar positiva de criminalidade.

Estes resultados de pesquisas nos ajudam a entender por que, em ambientes culturais e familiares semelhantes, algumas pessoas se tornam violentas e outras, não. Talvez, estes sejam os que apresentam uma fragili-dade maior para lidar com a pressão estressante do ambiente.

Equívocos, biologia e ciências sociais Minayo e Souza (1998), em uma ampla análise causal da violência,

identificam dois grupos de teorias equivocadas, relacionando violência à biologia. O primeiro deles, evolucionista-adaptacionista, interpreta a violên-cia como fenômeno “extraclassista e a-histórico”, de caráter universal.

Este modelo vê a sociedade como um campo de luta competitiva entre indivíduos, grupos, nações, etc. Para os autores, essas teorias fundamen-tam-se na ideia errônea de que a agressividade é uma qualidade inata da natureza humana e, portanto, os conflitos da vida social, seja qual for a etapa do desenvolvimento histórico, são de caráter eterno e natural.

Entretanto, não é bem isto que a antropologia nos mostra. Walker (2001), revisando os estudos sobre lesões traumáticas na pré-história, afirma que as raízes da violência interpessoal penetram profundamente em nossa história evolutiva. As marcas de agressões nos ossos são surpreen-dentemente comuns, considerando-se a escassez de restos de hominí-deos. Os estudos não apontam diferenças relevantes entre populações do velho e do novo mundo.

As diferenças entre os sexos, quanto à seriedade, qualidade e quanti-dade dos atos violentos, também parecem ser uma constante na história humana e compartilhada com outros grandes primatas, quer vistas por uma ótica evolutiva dos machos, quer das fêmeas (Campbell et al., 2001).

O papel primordial de jovens do sexo masculino entre agressores e ví-timas, que ocorre em nossa sociedade, é partilhado com outras espécies de animais sociais – lobos, elefantes, chimpanzés, etc. – que apresentam

um estágio extra de desenvolvimento, denominado adolescência, no qual os indivíduos já não desfrutam dos privilégios dos filhotes, mas ainda não adquiriram todas as habilidades dos adultos (Bogin, 1999).

A principal lição dos estudos bioarqueológicos é de que a violência in-

terpessoal é uma rara igualdade na história humana. Não há nenhuma forma de organização social, de modo de produção ou de condições ambi-entais que tenha permanecido livre de violência por muito tempo (Walker, 2001).

O segundo grupo de teorias, identificado por Minayo e Souza (1998),

está também errado, pois é igualmente fundamentado na premissa de que a violência é natural: “substituem a ideia de processo social e histórico pelo conceito de agressão, que provém da biologia, etologia, genética e medici-na”. Este grupo de teoria se considerado ainda pior do que o primeiro, pois seus defensores pretendem subordinar, a priori, os componentes da ativi-dade humana aos instintos biológicos. É semelhante ao critério de determi-nismo neurogenético, porém, mais amplo, pois parece negar a participação das doenças mentais na violência, fenômeno observado em diversos paí-ses.

Em contraste, Flores e Hackmann (2001), no estudo mencionado, en-

contraram que 42% dos adolescentes do sexo masculino, em regime de privação de liberdade, apresentavam diagnóstico de doença mental. Entre os fatores etiológicos mais relevantes para estas patologias estava o fato de o jovem ter sido maltratado na infância, que aumenta em 1,7 vezes o risco de que ele desenvolvesse doenças mentais, e o fato de haver históri-co de doença mental na família, que aumenta o mesmo risco em 5,7 vezes.

Comparativamente, 30% dos adolescentes ingleses condenados e 50% daqueles em internação provisória tinham diagnóstico psiquiátrico (HM Chief Inspector of Prisons for England and Wales, 1997). Em uma amostra canadense, 64% dos internos haviam recebido tratamento para doenças mentais (Jack & Ogloff, 1997). Já em um grupo de adolescentes homicidas norte-americanos, 96% tinham diagnóstico psiquiátrico (Myers et al., 1995). O maior índice, 100% dos jovens infratores com diagnóstico psiquiátrico, foi encontrado em uma amostra da Finlândia (Haapasalo & Hamalainen, 1996).

No Rio Grande do Sul, entre indivíduos adultos cumprindo medida de segurança devido à conduta criminal, a doença mental mais prevalente (60%) é a esquizofrenia (Telles et al., 2000), cujas causas são diversas, mas todas de base orgânica. Para estes pacientes, falta de tratamento é o principal fator associado ao homicídio, aumentando seu risco em 2, 56 vezes, mesmo quando as variáveis sociodemográficas e clínicas foram controladas (Menezes e Busnello, 2002).

Em um estudo numa comunidade de baixa renda, Flores et al. (2002) mostraram que, devido às dificuldades para obter atendimento para pro-blemas de saúde, especialmente mental, as famílias em situação de indi-gência social ficavam presas em um círculo no qual a violência familiar aumentava o risco de doença mental na família, que por sua vez levava a vários comportamentos desadaptativos, predispondo a nova geração a maior risco de envolvimento em violência e maior risco de desenvolver doenças mentais.

Causas nas ciências sociais Conforme El-Hani e Videira (1999), uma das questões contemporâneas

mais importantes é a clara formulação científica das noções de causalidade a ser adotada pelos diversos domínios relacionados à mente humana. Entre as dificuldades existentes, há uma excessiva frouxidão nos modos de definir causalidade, implicados na relação entre o simples e o complexo.

Para eles, ainda que os fenômenos sociais estejam em um nível de complexidade maior do que fenômenos biológicos, as propriedades emer-gentes dos primeiros não aniquilam as dos últimos, ao contrário, as propri-edades de nível superior devem ser dependentes das propriedades de nível inferior. A manutenção destas propriedades leva a problemas praticamente insuperáveis quando se admite apenas ummodo causal ou quando, no caso das críticas mencionadas, se deseja excluir os aspectos biológicos da violência humana.

Nestas críticas existe uma vinculação da biologia a um destino imutá-vel, prejudicando o estudo do fenômeno e, pior, o tratamento adequado que

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poderia ser prestado, pelos serviços de saúde, a indivíduos patologicamen-te violentos (Raine e Liu, 1998). Para Hans et al. (2000), esta visão biológi-ca antiquada, com mais de um século de atraso, adotada pelas ciências sociais, se mantém por uma negação dos conhecimentos de outras áreas e, até, por um certo orgulho em ignorar o que ocorre nas outras ciências correlatas. Esta fragmentação do conhecimento leva a teorias sobre o funcionamento do cérebro que são ou muito inatistas ou excessivamente baseadas na cultura e no aprendizado.

O que Minayo e Souza (1998) entendem por instintos biológicos ou por

seu termo correlato, as qualidades inatas da natureza humana, são os genes reproduzidos de geração em geração, nos seres humanos, [que] transmitem uma informação de sentido e conteúdo determinados, levando os indivíduos a reagir em condições concretas do ambiente de forma a garantir a sua sobrevivência.

Trata-se de um conceito bastante ambíguo. Genes portam informações

bem determinadas, mas não levam, diretamente e sem mediações nos níveis de maior complexidade organizacional, os indivíduos a reagirem de maneira predeterminada, como ocorre em organismos de sistema nervoso mais simples, como insetos.

Equívoco semelhante foi cometido, no início do século 20, pelo psicó-

logo alemão Carl G. Jung (1875-1961), que propôs a existência de grandes temas culturais/mitológicos universais, já que seus pacientes utilizavam-se, no nível pessoal, de símbolos adotados por várias culturas e tradições religiosas do mundo inteiro.

Estas similaridades levaram à reificação de um “inconsciente coletivo”

composto de figuras, símbolos e conteúdos arquetípicos de caráter trans-cultural, comum a toda a humanidade.

O mesmo erro ocorreu, também, com S. Freud, quando desenvolveu o

conceito de complexo de Édipo, que atribuía a todos os seres humanos um mesmo mecanismo de lidar, durante a infância, com as relações de afeto na família nuclear (Flores, 1996). Em ambos os casos o engano foi devido a um desconhecimento de como a informação genética é transmitida e de como surgem suas variações.

O número de propostas de mudanças cientificamente embasadas, res-

saltando a importância da biologia nas ciências sociais, tem aumentado muito, inclusive, em áreas mais restritas como nas denominadas ciências sociais normativas, nas quais se incluem as ciências jurídicas.

Fernandez (2002) rotula estas concepções, que excluem a biologia

evolucionária e a psicologia cognitiva do estudo do direito, de construtivis-mo social, que teria chegado ao ápice com alguns filósofos pós-modernos, para os quais a realidade, a natureza, as emoções, o funcionamento do cérebro e até a gravidade seriam socialmente construídos.

O conhecimento biológico trará profundasmudanças ao pensamento ju-

rídico, quando puder alcançá-lo. Por exemplo: como os instintos sociais humanos não foram desenvolvidos para uma sociedade como a nossa e sim, para a convivência em pequenos bandos, o direito deve levar em conta que a estrutura mental humana predispõe os indivíduos a certas regras epigenéticas de pensamento. Por exemplo: a grande maioria das agres-sões humanas ocorre em um contexto mental no qual o indivíduo que agride sentiu-se previamente agredido. Das diferentes formas de agressão interespecífica que ocorrem entre animais, a mais relevante para o enten-dimento da violência é a agressão defensiva, modulada positivamente pela amígdala e, negativamente, por regiões do hipotálamo (Albert et al., 1993). Anomalias no processamento de informações recebidas fazem com que muitas respostas violentas sejam o resultado de uma percepção exagerada de uma agressão sofrida.

As ciências jurídicas fundamentaram suas noções de relações de po-

der, justiça, interpretação jurídica e estrutura jurídica e social, baseadas nos pressupostos implícitos de que os seres humanos são dotados de uma capacidade geral de processar igualmente qualquer informação, adaptan-do-se igualmente bem a qualquer estrutura social, o que não corresponde aos resultados da psicologia cognitiva (Fernandez, 2002).

Ao contrário, as habilidades cognitivas humanas estão especializadas para lidar com informações relativas às pressões da seleção natural ocorri-das no pleistoceno. Um exemplo dramático destas tendências mentais é o de dividir o conjunto social em “nós”, composto pelos que merecem apoio, solidariedade e o melhor de nossas virtudes, e “eles”, para os quais reser-vamos todo o repertório de condutas mesquinhas e cruéis de que somos capazes (Hartung, 1995). Antropólogos encontram, com frequência, cultu-ras nas quais o termo “humano” não é aplicável a outros povos vizinhos, que estariam em nível de humanidade inferior, como os animais. Esta tendência naturalmente humana é bastante utilizada pelas religiões e ajuda a entender por que, de modo geral, pessoas religiosas são mais rígidas moralmente e menos benevolentes, do que indivíduos sem religião (Rubin & Peplau, 1973).

A associação entre ciências da computação e psicologia evolucionista

tem mostrado que muitos aspectos importantes da cognição humana, como regras de escolha de alimentos, parceiros ou alianças sociais são baseadas em processos computacionais, heurísticas e algoritmos, comuns a toda a humanidade, pois dizem respeito a como o cérebro humano processa informação (Gigerenzer & Todd, 2000).

Conclusões A principal dificuldade para a compreensão do papel da biologia na vio-

lência pode ser entendida como uma incapacidade de perceber-se uma hierarquia, nas suas causas, que não é um atributo externo ao fenômeno e, sim, depende do nível em que se deseja examiná-lo. Não parece possível que existam fenômenos sociais que não sejam mediados pelas mentes dos indivíduos que compõem o grupo social. Não existem mentes que ocorram fora de cérebros. Por isso, é perfeitamente válido, do ponto de vista científi-co, analisar o fenômeno nestes níveis, tanto como em níveis de maior complexidade – estes, os preferidos por Rose (1997) e por Minayo e Souza (1998).

Mesmo que a causa inicial de um processo de violência seja eminen-

temente social, como uma guerra, por exemplo, o entendimento dos pro-cessos que se seguirão, no desenrolar do conflito, deve levar em conta os modelos de funcionamento da mente. A raiva, o medo e os demais recur-sos de processamento que o cérebro dispõem determinarão as respostas dos indivíduos neste ambiente.

É incorreta a presunção culturalista de que todos os tipos de pensa-

mentos são possíveis. Por exemplo, é viável calcular-se um sistema de quatro eixos ortogo-

nais entre si, mas não é possível visualizá-los mentalmente. Também é incorreta a presunção de que todos os pensamentos possíveis têm a mes-ma chance de ocorrer.

É bastante mais fácil odiar os inimigos do que amá-los ou perdoá-los e

isto, independentemente da opção moral de cada um, é uma realidade decorrente da seleção natural.

Os resultados dos estudos apresentados acima sugerem que níveis de

menor complexidade, como o mental e o biológico, são fundamentais para o entendimento da violência em nossa cultura. Mais do que isso, sugerem que as análises sociais devem levar em conta os processos evolutivos da mente humana.

Em um artigo clássico de 1973, o importante evolucionista e geneticista

Theodosius Dobzhansky afirmou que “Nada, na biologia, faz sentido exceto à luz da evolução”. Parafraseando-o, Rose (2000) afirmou: “Nada, na biologia, faz sentido exceto à luz da história”, o que é bastante correto, considerando-se as semelhanças dos métodos e dos discursos históricos e evolutivos e também que a ciência, como processo sequencial, é muito dependente de eventos anteriores.

Entretanto, poderíamos acrescentar ainda: “nada faz sentido, na socio-

logia, senão a luz da evolução”. Os já mencionados revólveres são perigo-sos apenas na presença de organismos que, além de certo tipo de cérebro, possuem também certo tipo de membros. Renato Zamora Flores

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Psicologia Criminal: é ciência que demonstra a dimensão individual do ato criminoso; estuda a personalidade do criminoso, orientando a Criminologia.

Psiquiatria Criminal: é ramo do saber que identifica as diversas patolo-gias que afetam o criminoso e envolve o estudo da sanidade mental.

Antropologia Criminal: abrange o fenômeno criminológico em sua dimensão holística, ou seja, biopsicosocial. É o Estudo do homem na sua história, em sua totalidade (homem como fator presente no todo);

Sociologia Criminal: demonstra que a personalidade criminosa é resultante de influências psicológicas e do meio social;

Ciências Biológicas: fornecem os elementos naturais e orgânicos que influenciam ou determinam a conduta do criminoso.

A Sociologia da Violência e da Criminalidade, como o próprio nome

indica, trata das questões referentes aos fenômenos sociais da violência e da criminalidade. Violência difere-se da criminalidade por que existem crimes que não são cometidos com violência física. No sentido contrário existem atos violentos que não constituem crime. Por exemplo, uma luta de boxe ou de caratê olímpicos. Esses esportes pressupõem golpes violentos que muitas vezes fraturam ou provocam cortes nos praticantes, nem por isso constitui-se crime. Já uma briga de rua, onde os oponentes saem feridos, não só se trata de um crime (vandalismo, lesão corporal) como possui caráter violento. A Sociologia da Violência e da Criminalidade também estuda as principais teorias criminológicas da criminologia e as diversas escolas formadas a partir do século XX.

PROVA SIMULADA

01. Sobre a definição de Criminalística considere as seguintes afirmações. I – É a ciência que estuda o crime e o criminoso em tudo que for aplicável

à elucidação de um crime ou de uma infração penal. II – É a ciência que estuda as lesões corporais, visando a diagnosticar se

ocorreu homicídio, suicídio ou acidente. III – É um sistema de conhecimentos técnico-científicos que estuda os

locais de crimes e os vestígios materiais, localizados superficialmente ou fora do corpo humano, visando a identificar as circunstâncias e a autoria da infração penal.

IV – É o sistema de conhecimentos científicos que estuda os vestígios materiais extrínsecos à pessoa física, visando a esclarecer e identificar as circunstâncias do crime e determinar a identidade do criminoso.

Quais estão corretas? a) Apenas a I. b) Apenas a II. c) Apenas a II e a IV. d) Apenas a III e a IV. e) AI, a II, a III e a IV. 02. Julgue os itens a seguir: 1. A criminologia é uma ciência empírica que se ocupa do crime, do

delinquente, da vítima e do controle social do delitos. Baseia-se na ob-servação, nos fatos e na prática, mais que em opiniões e argumentos, é interdisciplinar e, por sua vez, formada por outra série de ciências e disciplinas, tais como a biologia, a psicopatologia, a sociologia, política, etc.

2. Quando nasceu, a criminologia tratava de explicar a origem da delin-

quência, utilizando o método das ciências, o esquema causal e explica-tivo, ou seja, buscava a causa do efeito produzido. Pensou-se que er-radicando a causa se eliminaria o efeito, como se fosse suficiente fe-char as maternidades para o controle da natalidade.

3. Academicamente a Criminologia começa com a publicação da obra de

Cesare Lombroso chamad "L'Uomo Delinquente", em 1876. Sua tese principal era a do delinquente nato.

4. Já existiram várias tendências causais na criminologia. Baseado em

Rousseau, a criminologia deveria procurar a causa do delito na socie-dade, baseado em Lombroso, para erradicar o delito deveríamos en-contrar a eventual causa no próprio delinquente e não no meio. Um ex-tremo que procura as causas de toda criminalidade na sociedade e o outro, organicista, investigava o arquétipo do criminoso nato (um delin-quente com determinados traços morfológicos)...

5. Isoladamente, tanto as tendências sociológicas, quanto as orgânicas fracassaram. Hoje em dia fala-se no elemento bio-psico-social. Volta a tomar força os estudos de endocrinologia, que associam a agressivida-de do delinquente à testosterona (hormônio masculino), os estudos de genética ao tentar identificar no genoma humano um possível "gene da criminalidade", juntamente com os transtornos da violência urbana, de guerra, da fome, etc.

Quais estão corretos? a) todos eles

b) somente três deles c) quatro estão corretos d) somente dois estão Nas questões que se seguem, assinale: C – se a proposição estiver correta E – se a mesma estiver incorreta 03. A criminologia é um conjunto de conhecimentos que se ocupa do

crime, da criminaliadade e suas causas, da vítima, do controle social do ato criminoso, bem como da personalidade do criminoso e da maneira de ressocializá-lo. Etmologicamente o termo deriva do latim crimino (crime) e do grego logos (tratado ou estudo), seria portanto o "estudo do crime". É uma ciência empírica e interdisciplinar. É empírica, pois baseia-se na experiência da observação, nos fatos e na prática, mais que em opiniões e argumentos. É interdisciplinar e portanto formada pelo diálogo de uma série de ciências e disciplinas, tais como a biologia, a psicopatologia, a sociologia, política, a antropologia, o direito, a filosofia e outros.

04. A criminologia é dividida em escola clássica (Beccaria, séc XVIII),

escola positiva (Lombroso, séc, XIX) e escola sociológica (final do séc XIX).

05. A criminologia é ciência moderna, sendo um modo específico e

qualificado de conhecimento e uma sistematização do saber de várias disciplinas. As partir da experimentação desse saber multidisciplinar surgem teorias (um corpo de conceitos sistematizados que permite conhecer um dado domínio da realidade).

06. Enquanto ciência, a criminologia possui objeto próprio e um rigor

metodológico (método) que inclui a necessidade de experimentação, a possibilidade de refutação de suas teorias e a consciência da transitoriedade de seus postulados. Ainda que interdisciplinar é também ciência autônoma, não se confundindo com nenhuma das áreas que contribuem para a sua formação e sem deixar considerar o jogo dialético da realidade social como um todo.

07. Objeto da criminologia é o crime, o criminoso (que é o sujeito que se

envolve numa situação criminógena de onde deriva o crime), os mecanismos de controle social (formais e informais) que atuam sobre o crime; e, a vítima (que às vezes pode ter inclusive certa culpa no evento).

08. A relevância da criminologia reside no fato de que não existe sociedade

sem crime. Ela contribui para o crescimento do conhecimento científico com uma abordagem adequada do fenômeno criminal. O fato de ser ciência não significa que ela esteja alheia a sua função na sociedade. Muito pelo contrário, ela filia-se ao princípio de justiça social.

09. Os estudos em criminologia têm como finalidade, entre outros aspectos,

determinar a etiologia do crime, fazer uma análise da personalidade e conduta do criminoso para que se possa puni-lo de forma justa (que é uma preocupação da criminologia e não do Direito Penal), identificar as causas determinantes do fenômeno criminógeno, auxiliar na prevenção da criminalidade; e permitir a ressocialização do delinquente.

10. Os estudos em criminologia se dividem em dois ramos que não são

independentes, mas sim interdependentes. Temos de um lado a Criminologia Clínica (bioantropológica) - esta utiliza-se do método individual, (particular, análise de casos, biológico, experimental), que envolve a indução. De outro lado vemos a Criminologia Geral (sociológica), esta utiliza-se do método estatístico (de grupo,

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estatístico, sociológico, histórico) que enfatiza o procedimento de dedução.

A interdisciplinaridade é uma perspectiva de abordagem científica envolvendo diversos continentes do saber. Ela é uma visão importante para qualquer ciência social. Em seus estudos, a criminologia se engaja em diálogo tanto com disciplinas das Ciências Sociais ou humanas quanto das Ciências Físicas ou naturais. Entre as áreas de estudo mais próximas da Criminologia temos:

11. Direito penal: o principal ponto de contato da criminologia com o Direito

Penal está no fato de que este delimita o campo de estudo da criminologia, na medida em que tipifica (define juridicamente) a conduta delituosa; O direito penal é sancional por excelência; Ele caracteriza os delitos e, através de normas rígidas, prescreve penas que objetivam levar os indivíduos a evitar essas condutas.

12. Direito Processual Penal: a Criminologia fornece os elementos

necessários para que se estipule o adequado tratamento do réu no âmbito jurisdicional. Também indica qual a personalidade e o contexto social do acusado e do crime, auxiliando os juristas para que a sentença seja mais justa. A criminologia oferece os critérios valorativos da conduta criminosa. Ela pesquisa a eficácia das normas do Direito Penal, bem como estuda e desenvolve métodos de prevenção e ressocialização do criminoso.

13. Direito Penitenciário: os dados criminológicos são importantes no Direito

Penitenciário para permitir o correto e eficaz tratamento e ressocialização do apenado. A criminologia ajuda a tornar a pena mais humana, buscando o objetivo de punir sem castigar.

14. Psicologia Criminal: é ciência que demonstra a dimensão individual do

ato criminoso; estuda a personalidade do criminoso, orientando a Criminologia.

15. Psiquiatria Criminal: é ramo do saber que identifica as diversas patologias que afetam o criminoso e envolve o estudo da sanidade mental.

16. Antropologia Criminal: abrange o fenômeno criminológico em sua

dimensão holística, ou seja, biopsicosocial. É o Estudo do homem na sua história, em sua totalidade (homem como fator presente no todo);

17. Sociologia Criminal: demonstra que a personalidade criminosa é

resultante de influências psicológicas e do meio social; 18. Ciências Biológicas: fornecem os elementos naturais e orgânicos que

influenciam ou determinam a conduta do criminoso; 19. Vitimologia: estuda a vítima e sua relação com o crime e o criminoso

(estuda a proteção e tratamento da vítima, bem como sua possível influência para a ocorrência do crime);

20. Criminalística: é o ramo do conhecimento que cuida da dinâmica de um

crime. Estuda os fatores técnicos de como o crime aconteceu. Há um setor especializado da polícia destinado a essa área.

21. Quanto às diferentes abordagens do crime, podemos citar: a) Direito Penal – Abordagem legal e normativa: crime é toda conduta

prevista na lei penal e somente aquela a que a lei penal impõe sanção. b) Sociologia - Abordagem social: delito é a conduta desviada, sendo os

critérios de referencia para aferir o desvio as expectativas sociais. Des-viado será um comportamento concreto, na medida em que se afaste das expectativas sociais em um dado momento, enquanto contrarie os padrões e modelos da maioria.

c) Segurança Pública - Abordagem fática: o crime é a perturbação da ordem pública e da paz social, demandando a aplicação de coerção em algum grau.

d) Criminologia – Abordagem global: o crime é um problema social e comunitário. Não é mera responsabilidade do sistema de justiça: ele surge na comunidade e é um problema da comunidade.

e) todas as alternativas estão corretas

22. São objetos da criminologia: a) o crime b) o criminoso c) a vítima d) o controle social e) todas as alternativas estão corretas 23. São funções da criminologia: a) Básica: informar a sociedade e os poderes públicos sobre o delito, o

delinquente, a vítima e o controle social, reunindo um núcleo de co-nhecimentos seguros que permita compreender cientificamente o pro-blema criminal, preveni-lo e intervir com eficácia e de modo positivo no homem delinquente.

o Não é causalista com leis universais exatas; o Não é mera fonte de dados ou estatística; o Os dados são em si mesmos neutros e devem ser interpretados por

teorias científicas; o É uma ciência prática preocupada com problemas e conflitos concre-

tos, históricos; b) Papel da criminologia: luta contra a criminalidade, controle e prevenção

do delito. o Não é de extirpação; o Considera os imperativos éticos; o Não é 100 % penal. c) Tríplice alcance da criminologia: 1. explicação científica do fenômeno criminal; 2. prevenção do delito; 3. intervenção no homem delinquente d) Prevenção do delito: o Ineficácia da prevenção penal – estigmatiza o infrator, acelera a sua

carreira criminal e consolida o seu status de desviado; o Maior complexidade dos mecanismos dissuasórios – certeza e rapidez

da aplicação da pena mais importante que gravidade desta.

o Necessidade de intervenção de maior alcance: intervenções ambien-tais, melhoria das condições de vida, reinserção dos ex-reclusos.

e) todas as alternativas estão corretas

24. Quanto ao conceito e objeto da criminologia, podemos afirmar: a) “Uma ciência empírica e interdisciplinar, que se ocupa do estudo do

crime, da pessoa do infrator, da vítima e do controle social do compor-tamento delitivo, e que trata de subministrar uma informação válida, contrastada, sobre a gênese, dinâmica e variáveis principais do crime – contemplado este como problema individual e social -, assim como so-bre os programas de prevenção eficaz do mesmo e técnicas de inter-venção positiva no homem delinquente” (Antonio Garcia Pablos de Mo-lina).

b) “É um nome genérico designado a um grupo de temas estreitamente ligados: o estudo e a explicação da infração legal; os meios formais e informais de que a sociedade se utiliza para lidar com o crime e com atos desviantes; a natureza das posturas com que as vítimas desses crimes serão atendidas pela sociedade; e, por derradeiro, o enfoque sobre o autor desses fatos desviantes”. (Shecaira).

c) O primeiro a usar o nome foi o antropólogo francês Paul Topinard (1879), mas ele só foi aceito a partir da obra de Rafael Garofalo em 1885.

d) Enquanto Ciência, é a procura de um conhecimento diverso do senso comum, mas não é ciência exata e sim ciência do mundo do ser. O ob-servador se insere na realidade pesquisada.

e) todas estão corretas RESPOSTAS

01. D 02. A 03. C 04. C 05. C 06. C 07. C 08. C 09. C 10. C

11. C 12. C 13. C 14. C 15. C 16. C 17. C 18. C 19. C 20. C

21. E 22. E 23. E 24. E

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