Upload
filipe-borges-de-macedo
View
224
Download
0
Embed Size (px)
Citation preview
8/7/2019 Arquitectura e Natureza, a seduo da salvao.
1/39
Faculdade de Arquitectura
Universidade Tcnica de Lisboa
A r q u i t e c t u r a e N a t u r e z a
A s e d u o d a s a l v a o
Filipe Humberto Torres Mesquita Borges de Macedo
Artigo cientfico para a disciplina:
Arquitecturas em trnsito,
Arquitecturas efmeras e experimentais,
do 1 ano do curso de Doutoramento em Arquitectura
Docente: Professor Doutor Rui Barreiros Duarte
Lisboa, FAUTL, Fevereiro, 2011
8/7/2019 Arquitectura e Natureza, a seduo da salvao.
2/39
1
8/7/2019 Arquitectura e Natureza, a seduo da salvao.
3/39
I
Faculdade de Arquitectura
Universidade Tcnica de Lisboa
Ttulo do artigo: Arquitectura e Natureza, a seduo da salvao.
Nome do Aluno: Filipe Humberto Torres Mesquita Borges de Macedo
Professor Doutor Rui Duarte Barreiros
Curso de Doutoramento em Arquitectura
Data: Fevereiro de 2010
ResumoA relao entre homem e natureza sofreu profundas alteraes ao longo da histria.
Nos primrdios da humanidade, os caadores recolectores construam
complementando o meio, sem o marcar. Com a passagem para a poca civilizacional
e at meados do Sc. XX o homem concebeu o seu habitat por oposio natureza.
Perante a actual crise ambiental, esse paradigma comea a alterar-se. Os mortais
habitam medida que salvam a terra, tomando-se a palavra salvar em seu antigo
sentido, . Salvar no diz apenas erradicar um perigo. Significa, na verdade: deixar
alguma coisa livre em seu prprio vigor. (Heidegger, 1951).
O homem comea a conceptualizar e a construir um novo paradigma com a natureza,
onde a construo de habitats humanos regenere e complemente a natureza numa
relao simbitica.
Encontramos concretizaes exemplares do novo paradigma nas obras da Natural
Architecture onde a poesia sensria da Land Art constri esse desejo.
Encontramos, igualmente nas arquitecturas experimentais e efmeras passos na
consolidao deste novo paradigma, que j tem repercusso em aspectos legislativos
e marca a produo arquitectnica contempornea.
Palavras-chave:
Sustentabilidade, Arquitectura e natureza, Land Art, Biomimetismo, Habitar, Salvar.
8/7/2019 Arquitectura e Natureza, a seduo da salvao.
4/39
II
8/7/2019 Arquitectura e Natureza, a seduo da salvao.
5/39
III
Faculdade de Arquitectura
Universidade Tcnica de Lisboa
Ttulo do artigo: Architecture and Nature, The seduction of salvation.
Author: Filipe Humberto Torres Mesquita Borges de Macedo
Date: February de 2010
Abstract:
The relationship between mankind and nature has undergone profound changes throughout
history. In the early days of mankind, the hunter-gatherers built dwellings supplementing the
natural habitats. With the transition to the era of civilization and until the mid-twentieth century
man has designed their own habitat and dwellings, conceptualizing their essence as a
counterpart of nature.
Given the current environmental crisis, this paradigm begins to change the way weconceptualize our won dwellings.
"Mortals dwell as saving the earth, taking the word to save his old sense .... Saving does not
only eliminate a danger. It means, in effect, leave something free on their own force."
(Heidegger,1951).
The man begins to conceptualize and construct a new paradigm with nature, where the
construction of human habitats regenerate and complement nature in a symbiotic relationship.
Exemplary embodiments found in the works of the new paradigm of "Natural Architecture"
where Land Art artists builds this desire out of a sensorial poetry.
We can find also in experimental and ephemeral architectures steps in consolidating this
new paradigm, where human dwellings will regenerate and complement nature. This paradigm
is starting to impose himself in our mainstream architectures, either thru genuine will of
architects and promoters to resolve the environmental crisis, or due to laws and regulations in
which we can find this conceptual will.
Key-words:
Architecture and nature, Bio mimicry, Land Art, Living, Saving, Sustainability.
8/7/2019 Arquitectura e Natureza, a seduo da salvao.
6/39
IV
8/7/2019 Arquitectura e Natureza, a seduo da salvao.
7/39
V
ndice
ndice de ilustraes ............................................................................................. VII
Arquitectura e Natureza, a seduo da salvao. ................................................. 1
1-Civilizao e natureza, os paradigmas condio do homem no mundo. . 3
1.1-A condio primordial, o homem subjugado. ......................................... 3
1.2-A implementao do habitat humano, conquistando a natureza. .......... 3
1.3-A salvao da natureza como salvao do habitat humano. ................. 7
2-A natureza como Musa. ....................................................................................... 9
2.1-A seduo da salvao. ............................................................................ 9
2.2- O caminho da salvao. ......................................................................... 15
2.3- A institucionalizao da salvao. ........................................................ 21
3-Concluso. .......................................................................................................... 23
Bibliografia. ........................................................................................................... 23
8/7/2019 Arquitectura e Natureza, a seduo da salvao.
8/39
VI
8/7/2019 Arquitectura e Natureza, a seduo da salvao.
9/39
VII
ndice de ilustraes
Ilustrao 1 A relao primordial entre o homem, ainda enquanto caador recolector, a natureza e omodo como essa relao se reflectia nas suas construes. ....................................................................... 2
Ilustrao 2 A relao entre o homem, ser sedentrio e criador de civilizao e habitats, a natureza e omodo como essa relao se reflecte nas suas construes. ................................................................ ........ 4
Ilustrao 3Conceptualizao da futura relao entre o homem, ser salvador de si prprio e de habitats,a natureza e o modo como essa relao se reflectir nas suas construes. .............................................. 6
Ilustrao 4Guiliano Mauri, La Cattedrale Vegetale, Bergamo, Itlia, 2000-2009, ................................. 8
Ilustrao 5 Sanfte Strukturen, Weidendom, Rostock, Alemanha, 2001 .................................................. 8
Ilustrao 6Nils Udo, da esquerda para a direita; Root sculpture, Mxico, 1995; Water nest, 1995 ;Nest in red clay, Clemson College,USA, 2005................................................................ ........................... 10
Ilustrao 7Gilles Bruni e Marc Babarit; The grenhouse and the shelter, Val di Sella, Itlia, 2005; Atunnel with nature, Langland, Dinamarca 1996............................................................... ........................... 10
Ilustrao 8Patrick Dougherty, Around the corner, University of South Indiana, USA, 2003 ................. 12
Ilustrao 9Chris Dury, Nos topos, Tree mountain shelter, Val di Sella, Itlia, 1994 ; ao centro CarbonSink, Joey-en-Josas, Frana, 2010 ..................................... .............................................................. ........ 12
Ilustrao 10Estrutura molecular do ADN,; corte tipo; maqueta; planta de geral. Helix City, KishoKurokawa, 1961 .................................................................................................... ...................................... 14
Ilustrao 11 As formas da natureza como inspirao formal e estrutural, Milwaukee Art Museum,
Santiago Calatrava, 2001 ........................................................................................................................... 14
Ilustrao 12Bed Zed, Londres, Reino Unido, Bill Dunster, 2001 ........................................................ ..... 16
Ilustrao 13Eden Project, Cornualha, Reino Unido, Michael Pawlin, 2001 ............................................. 16
Ilustrao 14Sahara Rainforest Project, Magreb, norte de Africa, Michael Pawlin, 2010 ......................... 18
Ilustrao 15A Wall to Build, Magreb, Norte de Africa, Magnus Larsson, 2009 ........................................ 18
Ilustrao 16Proposta de recuperao da estacaria de Veneza com protocelulas, Rachel Armstrong,2010 ........................................................ .............................................................. ...................................... 20
Ilustrao 17Fab tree House; 50% Living House, EUA, Joachim Mitchel, 2006 ....................................... 20
Ilustrao 18- Ciclo da agua, ciclo do carbono e o ciclo da floresta, (Division, 1999) ................................. 22
Ilustrao 19- Diagrama do processo de avaliao ambiental LEED (Starrs, 2010)................................... 22
Ilustrao 20- Gwanggyo, Coreia do Sul, MVRDV, 2008. ........................................................... ................ 24
Ilustrao 21- Zira city Baku, Arzebaijo, BIG, Bjarke Ingels Group, 2008 ................................................. 24
8/7/2019 Arquitectura e Natureza, a seduo da salvao.
10/39
VIII
8/7/2019 Arquitectura e Natureza, a seduo da salvao.
11/39
1
Faculdade de Arquitectura
Universidade Tcnica de Lisboa
A r q u i t e c t u r a e N a t u r e z a
A s e d u o d a s a l v a o
Filipe Humberto Torres Mesquita Borges de Macedo
Artigo cientfico para a disciplina
Arquitecturas em trnsito,
Arquitecturas efmeras e experimentais,
do 1 ano do curso de Doutoramento em Arquitectura
Docente: Professor Doutor Rui Barreiros Duarte
Lisboa, FAUTL, Fevereiro, 2011
8/7/2019 Arquitectura e Natureza, a seduo da salvao.
12/39
2
Ilustrao 1 A relao primordial entre o homem, ainda enquanto caador recolector, a natureza e o modocomo essa relao se reflectia nas suas construes.
8/7/2019 Arquitectura e Natureza, a seduo da salvao.
13/39
3
1-Civilizao e natureza, os paradigmas condio do homem no mundo.
1.1-A condio primordial, o homem subjugado.
No incio da humanidade, a populao humana era constituda por grupos de caadores
recolectores. Estes grupos tinham com o meio natural que os rodeava uma relao
umbilical. A natureza determinava os seus modos de vida e a sua prosperidade. A
relao entre homem e natureza era marcada por uma profunda reverncia, a natureza
assumia o papel de entidade sagrada suprema. Por sua vez os abrigos que os humanos
habitavam tambm reflectiam esta simbiose com o meio.
Estes abrigos ou resultavam do aproveitamento de acidentes geolgicos, como nasgrutas ou nas reentrncias em escarpas, ou ento eram construes de carcter
precrio, como no caso das tendas ou das cabanas primrias. Raramente o habitar
humano deixava vestgios significativos, quer pelo carcter nmada das populaes, quer
pelas tecnologias usadas. Quando uma construo deixava de ser til, os seus
elementos voltavam me natureza. Esta efemeridade reflectia a condio humana
perante a magnitude da natureza, o homem estava a merc dos elementos e dos
caprichos da natureza. Os temores que da resultaram iriam marcar o subconsciente
biolgico da espcie e, como resultado, tivemos durante milnios uma dialctica
civilizacional, que construiu o habitat humano com oposio ao habitat natural.
1.2-A implementao do habitat humano, conquistando a natureza.
Com a passagem do estado semi-selvagem, onde os primeiros humanos caadores
recolectores retiravam a sua subsistncia da natureza, para o inicio do estdio
civilizacional, cumpriu-se a necessidade de criar habitats artificiais onde a humanidadepudesse prosperar num meio menos agressivo. O avano civilizacional cresceu medida
da capacidade humana de artificializar o meio natural, criando habitats onde as condies
ambientais fossem as adequadas ao seu desenvolvimento.
O primeiro passo consistiu na descoberta da agricultura, o que permitiu a sedentarizao
da espcie. A nossa vida deixava de estar a merc dos elementos e das condicionantes
8/7/2019 Arquitectura e Natureza, a seduo da salvao.
14/39
4
Ilustrao 2 A relao entre o homem, ser sedentrio e criador de civilizao e habitats, a natureza e o
modo como essa relao se reflecte nas suas construes.
8/7/2019 Arquitectura e Natureza, a seduo da salvao.
15/39
5
da natureza e a constante saga de percorrer os espaos naturais seguindo os recursos
necessrios nossa subsistncia terminava.
A sedentarizao conduziu-nos urbanizao, e este fenmeno tornou-se no fio condutor
da histria da humanidade. As cidades, que criaram os seus modos de vida, economias,
sistemas de valores, mitos, religies, sistemas polticos, etc., enfim, foram o alicerce dos
diversos estdios civilizacionais que atravessaram a histria da humanidade e quepermitiram o seu sucesso.
Desde desta altura, o desenvolvimento humano afirmou-se como um contraponto
aparente desordem da natureza. Numerosos mitos assim o confirmam, desde a expulso
de Ado e Eva dos jardins do Paraso, supremo castigo divino, passando por incontveis
histrias infantis onde na floresta se desenrolam acontecimentos trgicos e inesperados,
como Hansel e Gretel, o Capuchinho Vermelho, entre outras. Provavelmente um dos
mais significativos livros que retratam esta angstia humana perante a natureza O
Corao das Trevas de Joseph Conrad de onde retiramos este pequeno trecho que
demonstra este temor intrnseco que o homem civilizado sentia perante natureza: Subir
aquele rio era como regressar aos primrdios do mundo, quando a vegetao tomava
conta da terra e o reinado era das rvores. Uma corrente deserta, um grande silncio,
uma floresta impenetrvel. () Era o silncio de uma fora implacvel que acalentava
propsitos inescrutveis. Olhava-nos com um ar vingativo.(Conrad, 1902).
Estas mitologias reflectiam o receio humano perante a imensido da coisa selvagem.
Consequentemente a anttese da civilizao era a coisa selvagem, a vida humana
florescia no conforto da civilizao e perecia na imensido da floresta selvagem.
Heidegger no Tempo e o Ser corrobora esta situao ao descrever o homem como uma
clareira na floresta, como uma abertura de luz no seio da escurido do matagal, que
permite o iluminar e o penetrar da luz. O homem ento, abertura no seio do ser, capaz
de ilumin-lo, e ao mesmo tempo instaurador de uma compreenso do ser, constituindo-
se em si mesmo e simultaneamente definindo-se com o tempo.
Foi atravs da construo e da sua disciplina maior, a arquitectura, que esse objectivo, a
construo de habitats humanos, que a civilizao e a humanidade se afirmaram e
consubstanciaram. Na construo desses habitats o homem afirmou de modo
permanente a sua artificialidade, e f-lo de molde a marcar os territrios que conquistava,
alterando de forma permanente os habitats e ciclos da natureza. F-lo implementando a
sua vontade de modo afirmativo. Quando, pelos mais diversos motivos,
8/7/2019 Arquitectura e Natureza, a seduo da salvao.
16/39
6
Ilustrao 3Conceptualizao da futura relao entre o homem, ser salvador de si prprio e de habitats, a
natureza e o modo como essa relao se reflectir nas suas construes.
8/7/2019 Arquitectura e Natureza, a seduo da salvao.
17/39
7
as civilizaes desapareceriam, encontramos ainda numerosas runas, que como uma
marca indelvel no territrio, deixavam memria de habitats perdidos.
A histria e a humanidade cresceram nesses habitats artificiais, laboriosamente
construdos pelos humanos, onde a ordem Humana foi sempre entendida como
contraponto desordem natural. O mito que o habitat humano poderia ser coisaindependente da ordem natural imps-se no nosso imaginrio civilizacional.
1.3-A salvao da natureza como salvao do habitat humano.
Com o progressivo desenvolvimento da populao humana, a civilizao foi alargando o
seu espao, vencendo definitivamente a batalha contra a natureza. De tal modo o homem
teve sucesso nesta sua filosofia, que a coisa natural quase desapareceu. A exiguidade da
natureza, causada pela expanso dos habitats humanos modificou as premissas iniciais.
A relao primordial entre Homem e natureza altera-se, a natureza desaparece enquanto
floresta mitolgica e reduzida a uma existncia quase residual.
Este encurtamento dos espaos da natureza, com a consequente alterao dos seus
ciclos e a exausto de recursos finitos do planeta, comearam a ser sentidos na nossa
conscincia colectiva de modo notrio nas ltimas dcadas. Esta conjuntura, das
alteraes ao ciclo do carbono e consequentes alteraes climticas, ao esgotamento
das reservas de gua potvel, diminuio de bio massa e de habitats naturais, o fim
das reservas de combustveis fosseis, entre outras, alcanaram o potencial deconstiturem uma situao irreversvel, onde para alm dos danos prpria natureza,
seriam a espcie humana e o seu estdio civilizacional umas das suas principais vtimas.
Simbolicamente as posies relativas entre o que eram habitats humanos e natureza
alteraram-se. O espao civilizacional, entendido neste caso como o espao fsico onde a
humanidade prosperava, inverte a sua posio face ao espao natural. De habitat raro e
ameaado perante a imponncia da natureza, encontramos agora o paradigma inverso:
o espao natural que tem de ser protegido e acarinhado pois a nossa receita civilizacionalquase extinguiu os espaos naturais.
Em certa medida este novo paradigma retoma as reflexes de Heidegger na sua palestra
Construir, Habitar, Pensar: Os mortais habitam medida que salvam a terra, tomando-
se a palavra salvar em seu antigo sentido, . Salvar no diz apenas erradicar um perigo.
Significa, na verdade: deixar alguma coisa livre em seu prprio vigor. (Heidegger, 1951),
imperativo no s salvar a natureza para ela ser livre, mas salv-la para nos libertarmos
e prosperarmos.
8/7/2019 Arquitectura e Natureza, a seduo da salvao.
18/39
8
Ilustrao 4 Guiliano Mauri, La Cattedrale Vegetale, Bergamo, Itlia, 2000-2009,
Ilustrao 5 Sanfte Strukturen, Weidendom, Rostock, Alemanha, 2001
8/7/2019 Arquitectura e Natureza, a seduo da salvao.
19/39
9
2-A natureza como Musa.
2.1-A seduo da salvao.
A alterao da conscincia humana perante a natureza criou as bases para uma releitura
da essncia dessa relao. Em parte essa releitura foi criada por vanguardas artsticas,
que na sua conceptualizao do mundo, criaram um novo entendimento que a naturezaadquiriu na sua relao com a humanidade. Esta sacralidade, sustentada pelo
conhecimento dos metabolismos complexos que encontramos na nossa biosfera e pela
insatisfao generalizada da sociedade ps industrial, encontra-se materializada nas
suas obras.
Conceptualmente geradas por procuras intensas aliceraram-se, por um lado numa forte
investigao na rea da cincias naturais, conducente a um melhor conhecimento dos
mecanismos com que o planeta se rege e originando uma maior compreenso dos ciclosnaturais do planeta; por outro lado, auxiliadas pelo conhecimento dos efeitos e
consequncias que a humanidade exerce sobre o planeta e consubstanciadas na procura
de solues que ajudem a resolver a angstia existencial que tem marcado a sociedade
ps industrial, tal como afirmou em 2009 Gilles Lipovetsky na conferncia O Ambiente na
Encruzilhada,O trgico da nossa poca radica na dinmica da individualizao e em
novas aspiraes de vida feliz; quanto mais se afirma a exigncia de felicidade privada,
mais crescem, inevitavelmente, as insatisfaes e desiluses de todo o tipo.(Lipovetsky,
2009).
A viso contempornea de recuperar para a humanidade uma harmonia perdida,
reinterpretando uma viso edlica do passado como experiencia humana, actual e
sensria, procura, acima de tudo, relembrar-nos da importncia de recuperar uma
harmonia perdida com o meio e com os seus ciclos. A sacralizao da raridade da
natureza atinge assim premncia fulcral, logo contm as premissas geradoras da reflexo
artstica. Estas obras, que na sua essncia enaltecem a importncia perdida da natureza
na humanidade, geram trs vises distintas deste desenraizamento.
Por um lado temos autores como Guiliano Mauri, que constri em Bergamo La Cattedrale
Vegetale, recreando um espao sacro, que na sua essncia construtiva o oposto do
arqutipo da catedral gtica de trs naves, basilar para a sua formalizao, mas que
construtivamente, abraa a essncia desta nova relao entre o homem e a natureza.
Respondendo ao mesmo programa, mas adoptando o arqutipo da baslica, encontramos
a Weidendom em Rostock na Alemanha do colectivo Sanfte Strukturen, cuja obra tem
sido caracterizado por uma utilizao intensiva da bio construo e de cpulasgeodsicas como na Arena Salix de Spreewald e no Auerworld Palace em Weimar, que
constri um espao sacro onde tal como na Cattedrale Vegetale de Mauri, a
8/7/2019 Arquitectura e Natureza, a seduo da salvao.
20/39
10
Ilustrao 6 Nils Udo, da esquerda para a direita; Root sculpture, Mxico, 1995; Water nest, 1995 ; Nest
in red clay, Clemson College,USA, 2005
Ilustrao 7 Gilles Bruni e Marc Babarit; da esquerda para a direita; The grenhouse and the shelter, Val di
Sella, Itlia, 2005; A tunnel with nature, Langland, Dinamarca 1996
8/7/2019 Arquitectura e Natureza, a seduo da salvao.
21/39
11
materialidade vegetal desenha um importante papel simblico na enunciao do novo
paradigma.
Nestes casos a eternidade da construo artificial substituda pela perenidade da
rvore, ao espao imutvel de matria morta contraposta a mutabilidade de um espao
sensvel aos ciclos da natureza, e o solo onde edificado, no esventrado comcaboucos e muros, o solo alimentado. Por fim neste espao sagrado que essa
alterao de paradigma da relao entre homem e natureza sacralizada num apelo a
uma redeno que salve o homem e a natureza.
Em segundo lugar temos autores, como Nils Udo e as obras conjuntas de Gilles Bruni e
Marc Babarit que nos levam a viver metforas que desafiam a nossa artificialidade e
revelam a nossa ligao umbilical com a natureza. O ninho escala humana de Nils Udo
apresenta-nos de modo sensrio a metfora do ninho como elemento natural potenciadorde vida, que apesar de criar um habitat protegido para a vida florescer, no compromete
o habitat que o rodeia. No caso da obra Tunel with Nature de Gilles Bruni e Marc Babarit
somos levado por um caminho coberto, misto de tnel e de prgola, onde somos
confrontados com uma poesia sensria que nos revela uma natureza protectora. Ambas
as obras propem, atravs das suas metforas, uma comunho com a coisa natural que
a nossa sociedade ps industrial tinha eliminado da nossa vida quotidiana, apresentando
essa comunho com a natureza como um caminho concreto para a felicidade.
Por ltimo, temos autores como Patrick Dougherty e Chris Drury, que nas suas obras,
nos desafiam a reflectir sobre o nosso paradigma arquitectnico clssico, deixando de
construir com coisa inerte, no seu sentido literal e conceptual, adoptando o novo conceito
da coisa construda, conceptualizando-a como ser vivo inserid0 numa realidade biolgica
complexa e interdependente.
Como afirma Alessandro Rocca, no seu livro Natural Architecture: The challenge is to
represent, in contemporary terms, the ancient naturalistic idyll, pursued by filtering the
beauty and authenticity of natural elements and landscapes through the culture andsensibility of our time and by agreeing to confront the simplest of sentiments belonging,
alliance, complicity with the natural world, with the unshakeable complexity of the world as
it appears to us today. (Rocca, 2007). 1
1 "O desafio representar, em termos contemporneos, o antigo idlio naturalista, procurando a filtragem da
beleza, da autenticidade dos elementos naturais e das paisagens atravs da cultura e da sensibilidade donosso tempo, concordando em enfrentar o mais simples dos sentimentos de pertena, de comunho ecumplicidade com o mundo natural, atravs da inabalvel complexidade do mundo como hoje se nosapresenta "- Traduo livre do autor
8/7/2019 Arquitectura e Natureza, a seduo da salvao.
22/39
12
Ilustrao 8Patrick Dougherty, Around the corner, University of South Indiana, USA, 2003
Ilustrao 9 Chris Dury, Nos topos, Tree mountain shelter, Val di Sella, Itlia, 1994 ; ao centro Carbon
Sink, Joey-en-Josas, Frana, 2010
8/7/2019 Arquitectura e Natureza, a seduo da salvao.
23/39
13
Uma das principais caractersticas destas obras sua capacidade provocatria. Esta
provocao explora a relao intrnseca entre os sentidos do espectador quando
confrontados com uma experincia sensorial. Nestas obras demonstra-se
inequivocamente que a crise ambiental no se resume a um conjunto de circunstnciasclimatricas, energticas, de recursos ou de biodiversidade. Elas demonstram que a crise
ambiental e econmica a ela adjacente, conforme referido pelo Dr. Dennis Meadows na
palestra de atribuio do Japan Prize Awards de 2009 (Meadows, 2009), acompanhada
por uma crise existencial na condio humana contempornea. Na condio de
espectadores somos confrontados por construes que revelam aos nossos sentidos
toda a carga potica e criadora do fenmeno natural, criando novas experiencias
sensoriais que nos ajudam a compreender parte das origens da nossa insatisfao.
Vivemos numa sociedade que promove valores de vida assentes numa artificialidade
imposta, e a provocao suprema com que estas obras nos confrontam, reside na
capacidade de nos demonstrarem fisicamente toda a brutalidade potica da natureza,
relembrando-nos assim da verdadeira importncia do seu legado nas nossas vidas. No
fundo estas obras constroem uma resposta significante, que encontra nas perdas
provocadas pela progressiva artificializao das nossas vidas, uma das causas objectivas
do estado de ansiedade que nos acompanha nestes dias de crise. Mais uma vez
socorremo-nos das palavras de Alessandro Rocca: Natural architecture calls for theobserver, the user of the work, to take on the status of its inhabitant, however temporary,
taking possession of the dwelling to perceive the work from inside, as a microcosm, a
domestic enclosure ready to be occupied and experienced2 (Rocca, 2007).
2"A Arquitectura Natural apela ao seu observador, o utilizador da obra, para assumir temporariamente oestatuto de seu habitante, tomando posse da habitao para a compreender de dentro, como nummicrocosmo, um recinto domstico pronto para ser ocupado e experimentado"- Traduo livre do autor
8/7/2019 Arquitectura e Natureza, a seduo da salvao.
24/39
14
Ilustrao 10 Da esquerda para a direita: Estrutura molecular do ADN,; corte tipo; maqueta; planta de geral.
Helix City, Kisho Kurokawa, 1961
Ilustrao 11 As formas da natureza como inspirao formal e estrutural, Milwaukee Art Museum, Santiago
Calatrava, 2001
8/7/2019 Arquitectura e Natureza, a seduo da salvao.
25/39
15
2.2- O caminho da salvao.
Parte da essncia do fenmeno artstico reside na sua insistente tentativa de superar o
bvio, revelando novas verdades, utilizando a seduo e a provocao como estratgiasde percepo do real para criar nova leituras que nos levam a redescobrir a realidade de
um outro modo. O fenmeno artstico per si uma reflexo profunda da condio
humana, e dada a proximidade entre os fenmenos artstico e a arquitectura,
naturalmente que a alterao do modo como a humanidade se relaciona com a natureza
produziu reflexes na arquitectura que traduzem preocupaes semelhantes. Tanto mais
que boa parte dos efeitos causadores da crise climtica advm do modo como edificamos
o artificializado habitat humano.
Assim sendo, o fenmeno artstico assume uma importncia redobrada para a criao de
novos paradigmas arquitectnicos, pois notria a inspirao que as vanguardas
arquitectnicas dele retiraram, no apenas a nvel formal, mas tambm ao nvel dos
processos, mtodos e critrios das novas vises e reflexes que dele emanam. Autores
com Montaner tm demonstrado o modo como o campo artstico tem influenciado a
produo arquitectnica. Segundo Montaner: cada proposta do campo das artes ou do
pensamento impulsionaria a arquitectura a investigar as suas prprias tradies
arquitectnicas com o objectivo de fazer emergir novas formas enriquecedoras
(Montaner, 1997).
A emergncia destas novas formas enriquecedoras, que Montaner refere, tem sido
primordialmente testada em modelos arquitectnicos experimentais. nesta arquitectura
experimental que assistimos procura do novo paradigma que ir construir a relao
entre homem e natureza. A consubstanciao desta pesquisa, ao contrrio das pesquisas
que marcaram o modernismo, tem sido marcada por sucessivas abordagens.
Podemos estabelecer que a vontade de alcanar este novo paradigma na relao entre o
homem e a natureza tem sido objecto de uma abordagem progressiva por parte da
arquitectura. Ao longo da poca recente, esta demanda foi conquistando sucessivas
etapas, sendo que em cada destas sucessivas respostas, assistimos a um progressivo
empenhamento na consolidao deste novo paradigma que a construo de habitats
humanos que salvem homem e natureza.
8/7/2019 Arquitectura e Natureza, a seduo da salvao.
26/39
16
Ilustrao 12 Da esquerda para a direita; Esquema das caractersticas de sustentabilidade; alado sul,painis fotovoltaicos e chamins solares; vista de conjunto, Bed Zed, Londres, Reino Unido, Bill Dunster,
2001
Ilustrao 13 Da esquerda para a direita; Conceitos: bolhas de sabo, molculas de carbono, e gros de
plen; Juno dos conceitos e adaptao ao terreno; vista geral; Eden Project, Cornualha, Reino Unido,
Michael Pawlin, 2001
8/7/2019 Arquitectura e Natureza, a seduo da salvao.
27/39
8/7/2019 Arquitectura e Natureza, a seduo da salvao.
28/39
18
Ilustrao 14 Da esquerda para a direita; Esquema de estufa de dessalinizao; conjunto de estufas e
centrais solares,Sahara Rainforest Project, Magreb, norte de Africa, Michael Pawlin, 2010
Ilustrao 15 Da esquerda para a direita; Injeco de soluo bacteriana, Bacillus pasteurii, para
consolidao das dunas, transformando a areia em arenito; remoo da areia excedente para criao de
espao habitveis e reas agrcolas, A Wall to Build, Magreb, norte de Africa, Magnus Larsson, 2009
http://www.ted.com/talks/lang/eng/magnus_larsson_turning_dunes_into_architecture.htmlhttp://www.ted.com/talks/lang/eng/magnus_larsson_turning_dunes_into_architecture.html8/7/2019 Arquitectura e Natureza, a seduo da salvao.
29/39
19
meio de optimizar e regenerar os habitats, onde a construo replique os metabolismos
naturais do stio, optimizando-os para a vivncia humana de um modo onde ambos
encontrem uma relao simbitica. E atravs dessa relao simbitica, onde todos os
parceiros prosperam, que a Perma-arquitectura procura materializar o novo paradigma
humano, salvar-se a si e a natureza como um todo. Para o efeito s estratgias
anteriores os arquitectos juntaram lies valiosas da ecologia e da biologia. O
conhecimento das interaces que constroem os habitats, permitiu a arquitectos comoMichael Pawlin (Pawlyn, 2010), William McDonough (McDonough, 2005) e Magnus
Larsson (Larsson, 2009), propor obras que propem a regenerao completa de faixas
imensas de territrio. Destacamos as propostas de conteno do deserto do Sahara,
onde Michael Pawlin prope, numa estratgia high-tech, uma rede de estufas que
recolhem a gua do ar, aliadas a redes de painis foto voltaicos que fornecero energia
para a irrigao, que permitiro conter a expanso do deserto atravs do aparecimento
de uma barreira verde, consequncia do aumento de humidade perifrica associada ao
funcionamento das estufas. Por sua vez Magnus Larsson, com uma estratgia low-tech,utiliza injeces de soluo bacteriana, Bacillus pasteurii, para consolidao das dunas,
transformando a areia em arenito e removendo a areia excedente, o que permite a
existncia de espaos habitveis e zonas de permacultura, alimentando as populaes,
recuperando os habitats e contendo a expanso do deserto.
Encontramos ainda uma terceira tendncia arquitectnica que preconiza uma resposta
diferente, a bio construo. Os arquitectos que propem estas propostas visionrias,
apresentam um novo paradigma construtivo, empregando primordialmente elementosbiolgicos na edificao dos seus projectos, ou seja, alterando radicalmente o paradigma
do que a construo no seu sentido tradicional, abandonando as matrias inertes e
utilizando a vida como bloco construtor primordial.
A edificao, smbolo por excelncia do habitat artificializado e tradicionalmente
compreendida como a anttese da coisa natural, adquire um novo significado: ela passa a
ser compreendida como coisa natural que constri o habitat humano, construindo
simbolicamente a redeno do ser humano perante a natureza.
Esta tendncia pode ser observada atravs de duas atitudes diferentes, por um lado
temos arquitectos que fazem uma abordagem a nvel matrico, utilizando micro
organismos para construrem, controlando a sua distribuio de acordo com as
necessidades do projecto, de modo a edificarem a construo. Depois de terminarem a
sua tarefa construtiva, os elementos biolgicos morrem, deixando matria inerte
construda. Durante o processo estes micro organismos retiram nutrientes e energia do
meio envolvente, sais minerais, dixido de carbono, luz solar, etc, que processam
construindo por norma elementos que reproduzem ou arenitos ou calcrios. No final a
construo retira Co2 da atmosfera, no consome recursos e integra-se sem aparentes
http://www.ted.com/talks/lang/eng/magnus_larsson_turning_dunes_into_architecture.htmlhttp://www.ted.com/talks/lang/eng/magnus_larsson_turning_dunes_into_architecture.html8/7/2019 Arquitectura e Natureza, a seduo da salvao.
30/39
20
Ilustrao 16 Da esquerda para a direita; Protocelulas, organismos artificiais que processam Co2 e o
transformam em calcrio; proposta de recuperao da estacaria de Veneza; instalao na Bienal de Veneza
de com recipientes de protocelulas, Rachel Armstrong, 2010
Ilustrao 17 Da esquerda para a direita; Conceito Fab tree House; esquema de crescimento das arvores e
corte; projecto final 50% Living House, EUA, Joachim Mitchel, 2006
8/7/2019 Arquitectura e Natureza, a seduo da salvao.
31/39
21
distrbios, nos ciclos naturais da natureza. Contudo a edificao no deixa de ser coisa
inerte. Particularmente activa nestas matrias tem estado a arquitecta Ginger Krieg
Dosier (Dosier, 2010), que desenvolveu uma soluo que agrega areia utilizando ureia e
uma soluo bacteriana para construir tijolos, retirando Co2 da atmosfera e no
consumindo energia. Numa linha similar o arquitecto Madnus Larsson (Larsson, 2009)
pretende consolidar partes de duna com outra soluo bacteriana, mas ainda mais radical
a proposta da investigadora Rachel Armstrong (Armstrong, 2009), que desenvolveu
proto-clulas artificialmente, uma espcie de quase vida artificial, que transforma Co2 em
calcrio e desse modo pretende consolidar a estacaria da cidade de Veneza.
Proposta mais radical tm outros arquitectos que propem que a coisa construda seja
organismo vivo, organismo que cresa, que seja habitado e quando deixar de ser til,
ento que morra naturalmente, integrando o ciclo da vida na natureza. Estas propostas
assumem por vezes um carcter particularmente provocatrio: quando propem que umaedificao seja como um ser vivo do reino dos animais, com msculos, camada adiposa,
pele, onde as aberturas se comportem como um esfncter, elas esto a quebrar tabus e
lanar provocaes germinadoras de reflexes. Este reformular provocatrio do que
construo e arquitectura, no s reproduz a nova relao com a natureza, afirma de um
modo veemente a nova relao com a natureza e o seu papel na nossa vida, como por
outro lado, se aproximam da reflexo artstica, sendo nesse sentido obras tese.
Provavelmente as respostas e as questes mais complexas so apresentadas pelo
Arquitecto Joachim Mitchel, onde a construo coisa viva levada ao limite do conceito:
cultivar florestas ao longo de anos, formatando as rvores para depois as adaptar a
construes humanas; conceber casa de protenas, feitas de msculos, pele e gordura.
So propostas utpicas, mas no fundo, reflectem essa vontade de transformar o inerte
construdo em coisa viva.
2.3- A institucionalizao da salvao.
A mudana de paradigma na relao entre o homem e a natureza tem reflexos
institucionais. Governos e organismos internacionais tm procurado implementar modelos
que repliquem o funcionamento dos ciclos da natureza, pois os ciclos da natureza, do
ciclo da gua ao ciclo do carbono, assentam em sistemas fechados onde, em ltima
analise, o desperdcio no existe.
Esta estratgia de incorporao dos processos, ciclos e metabolismos da natureza tem
proporcionado vrias respostas. Estes conhecimentos tm conduzido a sistemas de
Anlise de Ciclo de Vida (ACV), mtodo Viiki na Noruega, Breeam no Reino
8/7/2019 Arquitectura e Natureza, a seduo da salvao.
32/39
22
Ilustrao 18- Ciclo da agua, ciclo do carbono e o ciclo da floresta, a maior parte dos naturais assentam em sistemafechados, onde a energia, os nutrientes, a agua e os demais intervenientes participam num equilbrio frgil.(Division, 1999)
Ilustrao 19- Diagrama do processo de avaliao ambiental, Leed e Cradle to Cradle, processos de certificao ambientalpara edifcios, bairros e cidades. De notar a semelhana entre os diagramas e os ciclos naturais (Starrs, 2010).
8/7/2019 Arquitectura e Natureza, a seduo da salvao.
33/39
23
Unido, o LiderA desenvolvido pelo Instituto Superior Tcnico, o sistema Cradle to Cradle
desenvolvido pelo Hamburger Umweltinstitut (Instituto do Ambiente de Hamburgo), LEED
(U.S. Green Building Council), a norma ISO 14000 entre outros.
Estes procedimentos procuram analisar todas as consequncias dos nossos processos
construtivos, da extraco das matrias-primas energia consumida na sua
transformao, emisses de CO2, grau de resduos, gastos de manuteno, capacidade
de regenerao de habitats, quer fsica, quer socialmente, terminando na sua capacidade
de voltarem a incorporar ciclos produtivos quando terminar a sua vida til. A sua
finalidade uma cada vez maior eficincia das nossas necessidades construtivas de
modo a atingir num futuro prximo a virtudes dos ciclos naturais, onde, conforme j
vimos, imperam os processos circulares, onde os ciclos no terminam, onde o eterno
retorno tem uma consubstanciao filosfica, econmica, social e poltica que procura
mimetizar a grandiloquncia da natureza.
Por outro lado, na prpria produo arquitectnica actual, a implementao dessesmodelos, quer seja por vida regulamentar, quer seja por via conceptual, comea
serenamente a modificar o paradigma da arquitectura contempornea. Autores como
Bjarke Ingels ou MRVD entre muitos outros comeam a produzir projectos em que a
compreenso do objecto arquitectnico realizada complementando e regenerando o
meio natural.
3-Concluso.
O actual cenrio econmico, ambiental e psicolgico da humanidade reflexo de uma
grave crise que atravessa a humanidade transversalmente. No se trata apenas de uma
crise de ambiental, mas todo um modo vida civilizacional que se encontra perante uma
encruzilhada. Desde o final dos anos sessenta que assistimos uma procura intensa de
um novo equilbrio civilizacional. A nossa relao com o planeta finito em que habitamos,
e a plena compreenso desse facto tem-nos progressivamente aproximado de um novoparadigma nessa relao.
A arte com a sua capacidade de reflectir o presente e project-lo para o futuro,
desempenha um papel crucial, pois nas suas obras que podemos encontrar conceitos
sensrios que nos apontam caminhos. A Natural Architecture provoca no espectador um
intensa relao entre o construdo e a natureza, pois a harmonia assenta na possibilidade
simbitica de salvar, no sentido heideggeriano, o homem e a natureza.
Na arquitectura a alterao do paradigma secular, que opunha homem a natureza,
comeou timidamente: ao incio era apenas a replicao formal da natureza, numa
http://www.usgbc.org/Abouthttp://www.usgbc.org/About8/7/2019 Arquitectura e Natureza, a seduo da salvao.
34/39
24
Ilustrao 20- Da esquerda para a direita; A inspirao biomimticas, o ninho de trmitas exterior e com os sistemasinterno de comunicao e ventilao; centro urbano auto-suficiente para 77 000 habitantes Gwanggyo, Coreia do Sul,MVRDV, 2008.
Ilustrao 21-Da esquerda para a direita; Diagrama de sustentabilidade; Vistas do projecto urbano da cidade de Zira,inspirado na forma das montanhas do Azerbaijo, quer em termos formais, quer na recreao de ecossistemas e microclimas. Baku, Arzebaijo, BIG, Bjarke Ingels Group, 2008
8/7/2019 Arquitectura e Natureza, a seduo da salvao.
35/39
25
segunda fase passou a ser a replicao funcional da natureza, criando sistemas artificiais
que mimetizassem os metabolismos naturais na artificialidade do edificado.
Contudo, de pequenas experimentaes foram nascendo concepes que nos permitem
descobrir conceitos arquitectnicos, que para alm da cpia da natureza, se empenham
em criar arquitecturas e urbanismos regeneradores de habitats. Conceitos esses, que j
evoluram de tal modo que em arquitecturas efmeras e experimentais, a coisa
construda se torna ela prpria organismos vivo.
No fundo, encontramo-nos perante uma redefinio do que a vanguarda arquitectnica.
Hoje ela procura ultrapassar e complementar os aspectos formais e polticos do
modernismo com uma viso ecolgica do homem e da natureza, entendidos como um
todo a que a arquitectura deve responder, um pouco como Montaner escreve, A ecologia
tambm nos fala da busca de uma nova modernidade onde os paradigmas se
transformem, uma modernidade superada onde a arquitectura e o urbanismo tenham
uma das maiores responsabilidades para superar os elementos mais destrutores e de
domnio do racionalismo e da prpria modernidade (Montaner, 1997).
Podemos ainda lembrar Heidegger, Ouvindo, porm, o que a linguagem diz na palavra
Bauen (construir), podemos perceber trs coisas: 1. Bauen, construir propriamente
habitar; 2. Wohnen, habitar o modo como os mortais so e esto sobre a terra; 3. Nosentido de habitar, construir desdobra-se em duas acepes: construir, entendido como
cultivo e o crescimento e construir no sentido de edificar construes. (Heidegger, 1951),
e um pouco esse entendimento do que habitar, que estas arquitecturas efmeras e
experimentais apontaram e apontam o caminho do novo paradigma, o paradigma onde
humanidade e natureza floresam em conjunto.
Mais, toda esta reflexo comea paulatinamente a entrar na conceptualizao da
produo arquitectnica mais corrente, quer seja por via da disseminao destes
conceitos, onde humanidade e natureza so coisa una, quer seja por via regulamentar e
poltica, pois os prprios poderes institudos, a encaram como elemento fundamental na
sua prpria sobrevivncia.
Tal proliferao e institucionalizao desta viso, deve-se em boa parte ao carcter
reflectivo e provocatrio da arte e das arquitecturas experimentais, pois est na sua
essncia ser inicio germinal das coisas que ho-de vir.
8/7/2019 Arquitectura e Natureza, a seduo da salvao.
36/39
26
8/7/2019 Arquitectura e Natureza, a seduo da salvao.
37/39
27
Bibliografia
ARMSTRONG, R. 2009. Architecture that repairs itself? In:SPREADING, T.-I. W. (ed.) Ted talks.Oxford, England.
BRUNDTLAND, G. H. 1987. O nosso futuro comum. Comisso Mundial sobre Meio Ambiente eDesenvolvimento.
CONRAD, J. 1902. O corao das trevas, Pblico, comunicao social S.A.
DIVISION, U. N. P. 1999. The World at Six Billion.
DOSIER, G. K. 2010. The better brick. metropolismag [Online]. Available:http://www.metropolismag.com/story/20100512/the-better-brick-2010-next-generation-winner [Accessed 12-01-2010].
EOIN O COFAIGH, E. F., ANN MCNICHOLL, ROBERT ALCOCK, J. OWEN LEWIS, VELSAPELTONEN, ANTONELLA MARUCCO 1999. A Green Vitruvius. 1999 ed.: Ordem dos
Arquitectos.FOSTER, N. 2007. Green Agenda. In:TALKS, T. (ed.) Digital Life Design. Munich.
HEIDEGGER, M. Year. Construir, Habitar, Pensar. In: Vortge und Aufstze, 1951 Pfullingen,. G.Neske, conferncia pronunciada por ocasio da "Segunda Reunio de Darmastad".
JOACHIM, M. 2010. Don't build your home, grow it! In:MINUTES, T. T. I. L. T. (ed.) TED- IdeiasWorth Spreading. Long Beach, california, USA: TED, ideas worth sreading.
LARSSON, M. 2009. Cities past and future. TED Global 2009. 24-06-2009 ed.
LIPOVETSKY, G. 2009. A felicidade na sociedade de hiperconsumo. In:GULBENKIAN, F. C. (ed.)O Ambiente na Encruzilhada, Por um futuro sustentvel. Lisboa.
MCDONOUGH, W. 2005. cradle to cradle design. TED talks. TED, ideas worth Spreading.
MEADOWS, D. L. 2009. Japan Pize Commemorative Lecture by Dr. Dennis L. Meadows: Learningto Live Within Limits.
MEATTLE, K. 2009. how to grow fresh air. TED talks in less than 6 Minutes [Online]. Available:http://www.ted.com/talks/kamal_meattle_on_how_to_grow_your_own_fresh_air.html[Accessed 20-03-2010].
MITCHELL, J. 2006. FAB TREE HAB. In:TERRAFORM (ed.).
MOHR, C. 2010. Catherine Mohr builds green. In:TED TALKS, I. L. T. M. (ed.) TED, Ideas worthspreading.
MONTANER, J. M. 1997. A Modernidade Revisitada, arquitectura e pensamento do sec. XX,Barcelona, Editorial Gustavo Gili.
PAWLYN, M. 2010. Using nature's genius in architecture. In:TALKS, T. (ed.).
ROCCA, A. 2007. Natural Architecture, Princeton Architectural Press.
SAUER, B. 2008. Materializar la ecologia. Eco productos, en la arquitectura e el diseo. Barcelona:Ed Ignasi Prez Arnal.
STARRS, M. 2010. LEED study map. London.
Examined Life, Year. Directed by ZIZEK, S.
(Meattle, 2009, Joachim, 2010, Larsson, 2009) (Brundtland, 1987) (Sauer, 2008)
http://www.metropolismag.com/story/20100512/the-better-brick-2010-next-generation-winnerhttp://www.metropolismag.com/story/20100512/the-better-brick-2010-next-generation-winnerhttp://www.ted.com/talks/kamal_meattle_on_how_to_grow_your_own_fresh_air.htmlhttp://www.ted.com/talks/kamal_meattle_on_how_to_grow_your_own_fresh_air.htmlhttp://www.metropolismag.com/story/20100512/the-better-brick-2010-next-generation-winnerhttp://www.metropolismag.com/story/20100512/the-better-brick-2010-next-generation-winner8/7/2019 Arquitectura e Natureza, a seduo da salvao.
38/39
28
(Zizek, 2009, Mohr, 2010) (Dosier, 2010) (Mitchell, 2006) (Eoin O Cofaigh, 1999)
8/7/2019 Arquitectura e Natureza, a seduo da salvao.
39/39