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O conteúdo dos artigos é de responsabilidade exclusiva do(s) autor(es), que cederam a Comissão de Pós-Graduação em Direito, da Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo, os respectivos direitos de reprodução e/ou publicação. Não é permitida a utilização desse conteúdo para fins comerciais.

1

1∗Professor Catedrático da Faculdade de Direito da Universidade do Porto.

EM DEFESA DO ARCO-ÍRIS

Contexto Constitucional e Ideológico de Recentes Propostas de Alteração Eleitoral em Portugal

Paulo Ferreira da Cunha∗

n. 8, 2012

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Cadernos de Pós-Graduação em Direito, Comissão de Pós-Graduação da Faculdade de Direito da USP, São Paulo, n. 8, 2012

©2011 Comissão de Pós-Graduação da Faculdade de Direito da USP

Qualquer parte desta publicação pode ser reproduzida desde que citada a fonte

UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO Reitor: João Grandino Rodas Vice-Reitor: Hélio Nogueira da Cruz Pró-Reitor de Pós-Graduação: Vahan Agopyan Faculdade de Direito Diretor: Antonio Magalhães Gomes Filho Vice-Diretor: Paulo Borba Casella Comissão de Pós-Graduação Presidente: Monica Herman Salem Caggiano Vice-Presidente: Estêvão Mallet

Ari Possidonio Beltran Elza Antônia Pereira Cunha Boiteux Francisco Satiro de Souza Júnior Giselda Maria Fernandes Novaes Hironaka Luis Eduardo Schoueri Renato de Mello Jorge Silveira Serviço Especializado de Pós-Graduação Chefe Administrativo: Maria de Fátima Silva Cortinal Serviço Técnico de Imprensa Jornalista: Antonio Augusto Machado de Campos Neto Normalização Técnica CPG – Setor CAPES: Marli de Moraes Correspondência / Correspondence A correspondência deve ser enviada ao Serviço Especializado de Pós-Graduação da Faculdade de Direito da USP / All correspondence should be sent to Serviço Especializado de Pós-Graduação da Faculdade de Direito da USP: Largo de São Francisco, 95 CEP 01005-010 Centro – São Paulo – Brasil Fone/fax: 3107-6234 e-mail: [email protected]

FICHA CATALOGRÁFICA

Elaborada pelo Serviço de Biblioteca e Documentação Faculdade de Direito da USP

Cadernos de Pós-Graduação em Direito : estudos e documentos de trabalho / Comissão de

Pós-Graduação da Faculdade de Direito da USP, São Paulo, n. 1, 2011-. Mensal ISSN: 2236-4544 Publicação da Comissão de Pós-Graduação em Direito da Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo 1. Direito 2. Interdisciplinaridade. I. Comissão de Pós-Graduação da Faculdade de

Direito da USP CDU 34

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Cadernos de Pós-Graduação em Direito, Comissão de Pós-Graduação da Faculdade de Direito da USP, São Paulo, n. 8, 2012

Os Cadernos de Pós-Graduação em Direito, da Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo, constitui uma publicação destinada a divulgar os trabalhos apresentados em eventos promovidos por este Programa de Pós-Graduação. Tem o objetivo de suscitar debates, promover e facilitar a cooperação e disseminação da informação jurídica entre docentes, discentes, profissionais do Direito e áreas afins.

Monica Herman Salem Caggiano

Presidente da Comissão de Pós-Graduação da Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo

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Cadernos de Pós-Graduação em Direito, Comissão de Pós-Graduação da Faculdade de Direito da USP, São Paulo, n. 8, 2012

SUMÁRIO

EM DEFESA DO ARCO-ÍRIS .......................................................................................................................................................... 4

Contexto Constitucional e Ideológico de Recentes Propostas de Alteração Eleitoral em Portugal Paulo Ferreira da Cunha

CADERNOS DE PÓS-GRADUAÇÃO EM DIREITO: ESTUDOS E DOCUMENTOS DE TRABALHO ........................................................ 12 Normas para Apresentação

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EM DEFESA DO ARCO-ÍRIS

Contexto Constitucional e Ideológico de Recentes Propostas de Alteração Eleitoral em Portugal

Paulo Ferreira da Cunha∗

“(...) Eh-lá-hô recomposições ministeriais

Parlamentos, políticas, relatores de orçamentos,

Orçamentos falsificados!

(Um orçamento é tão natural como uma árvore

E um parlamento tão belo como uma borboleta) (...)”. Álvaro de Campos, Ode Triunfal

I. Introdução

Existe um profundo paradoxo constitucionalista, que talvez só possa ser dilucidado com o

recurso a psicologias profundas ou ao estudo dos géneros literários. É que mesmo regimes

antidemocráticos, antiliberais e antiparlamentares, como foi o caso do Estado Novo português (1926-

1974), apesar das suas intenções declaradas de erradicar fórmulas eletivas, o livre jogo das forças

políticas e económicas e o poder das assembleias legislativas, naturalmente eleitas e representativas,

acabam por elaborar constituições que são afinal arremedos contidos, é certo, mas ainda assim

arremedos do que poderia ser um tipo-ideal, um arquétipo, ou um enredo de base da novela normal de

uma Constituição.

Como que não conseguindo fugir aos mitos profundos da matriz demoliberal constitucionalista,

o Estado Novo não deixou de fazer eleições (ainda que viciadas e muito limitadas), permitir em tempo

eleitoral comissões eleitorais espontâneas de cidadãos (sob vigilância e perseguição, mas que faziam

as vezes de partidos), e instituiu mesmo, constitucionalmente, liberdades formais (que não cumpriu) e

uma Assembleia Nacional (secundada por um “senado económico-social”, a Câmara Corporativa) que,

embora limitada e com deputados apenas eleitos nas listas do Governo, acabaria aqui e ali

(nomeadamente quando se formou uma ala liberal, de deputados mais jovens e renovadores,

convidados pelo governo) por constituir um Ersatz de oposição, a brevíssimo trecho. A décalage entre

constituição formal e constituição real era enorme. Mas porquê este preito que o vício autoritário presta

à virtude democrática?

Serve esta recordação histórica para introduzir o nosso tema e desdramatizar – embora

apenas em alguma medida – as tentativas de revisão constitucional, em Portugal, que, no limite,

caluniam o Parlamento, e, na verdade, o gostariam de abolir. Certamente, nesta senda histórica, se

∗Professor Catedrático da Faculdade de Direito da Universidade do Porto.

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disso tivessem ensejo, os mesmos que hoje se revelam denodados antiparlamentaristas acabariam por

formar “o seu parlamento”.

Contudo, há nos ares um clima antidemocrático, antiparlamentar. E em certa medida

profundamente antiliberal no sentido político, que é o mais significativo: misturando-se com o

antidemocrático, porque antipluralista. Esse clima é veiculado pelas imprecações de anónimos na

Internet, pelas conversas dos taxistas, das cabeleireiras, das vendedoras de praça, e alguns

comentadores políticos. Não é uma opinião pública. Mas começa a ser opinião publicada, sobretudo

quando parece render sangue, mistério, escândalo.

O que está em causa? Uma verificação, com a crise europeia das Finanças (a que se junta

uma clamorosa falta de liderança esclarecida e com visão de futuro), de que países como Portugal não

resistem bem a investidas de mercados desregulados e todos-poderosos, e que, nestas décadas

(1974-2012) de reinstauração da democracia (apesar de imensos progressos face ao último período

democrático, de 1910 a 1926 – em que não houve grande sensibilidade social, e acabou por se viver

grande instabilidade política), nem tudo foram, nem são, nem serão, fragrantes rosas. Houve casos de

comportamentos menos éticos de políticos, houve despedícios e má gestão, etc. Haverá nisso

surpresa, para quem conhece os homens e as tentações do poder?

O que parece curioso, é que sempre há virgens ofendidas que se apresentam com se tivessem

as mãos limpas, atirando pedras ao primeiro, e sobretudo lapidando a democracia e o sistema político

parlamentar.

Ao mesmo tempo que começa um crescendo de suspeita e ataque à classe política no seu

todo, e a certos bodes expiatórios habituais em particular, como ocorreu no passado, aumenta o

antissemitismo e a teoria da conspiração, e concentra-se no Parlamento e nos deputados a ira dos que

atacam, afinal, a democracia e o liberalismo político. E a sua expressão tradicional em Portugal é o

parlamentarismo. Tivemos apenas uma experiência malfadada de Presidencialismo (28 de abril a 14 de

dezembro de 1918), instaurado por golpe de Estado, e que terminou com o assassinato do Presidente,

Sidónio Pais – coisa única entre nós. Outros Países podem conviver com um Presidencialismo

democrático; nós nunca soubemos o que isso fosse...

Vamos de seguida referir alguns aspetos das presentes questões levantadas, que quase não

têm provocado real polémica porque os visados pouco têm vindo a terreno defender-se. Colocando

assim o cidadãos comum, observador, um tanto à mercê do lado demagógico da contenda. A questão

mais eleitoralmente recortada é a proposta de alteração da composição do parlamento, que, como se

sabe, em Portugal se chama, depois de uma interessante discussão constituinte, “Assembleia da

República”.

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II. Diminuição do número de deputados? Questões Constitucionais

Há quem pense que uma mudança constitucional fundamental seria a diminuição do número

de deputados.

Uma resposta constitucionalmente rigorosa terá que responder: depende de diminuição para

quantos... Mas essa ideia revisora leva no bojo um severo preconceito segundo o qual os

representantes parlamentares são preguiçosos, vivem nadando em mordomias, e na verdade não são

necessários. Afinal, no limite, um ditador que atua logo, não é muito mais eficiente?

Com serenidade, o constitucionalista, sem sequer se embrenhar pelas considerações

precedentes, que contudo são de raízes ideológicas óbvias e entram em clichés evidentes para quem

conheça a história do antiparlamentarismo europeu, dirá então que a diminuição do número de

deputados na Assembleia da República pode não ser conseguida por via de revisão constitucional,

mas simplesmente por lei ordinária. Aliás, ao antiparlamentarismo se alia, nos revisores “de turno”, um

arreigado ódio à Constituição em geral. Muitas vezes nem a conhecem, o que se revela por quererem

rever coisas que lá não estão. Mas ela é um símbolo da ordem democrática instituída, esse Estado de

direito democrático social e cultural que ainda mete medo a alguns.

Dizíamos que tal pode não ser um problema formalmente constitucional sequer. Ao menos na

superfície e literalismo das coisas. Com efeito, o art. 148.º da Constituição em vigor já coloca um

intervalo para o número de membros da Assembleia da República: os deputados serão entre 180 e

230. Menos de 180 implicaria, isso sim, como é óbvio, revisão constitucional.

Apesar de tudo, a diminuição do número dos deputados, pelo seu simbolismo (e a Constituição

tem inegavelmente, além das demais, uma fulcral função simbólica), mesmo por lei ordinária,

aproxima-se, “perigosamente” daquelas matérias que poderíamos considerar materialmente

constitucionais embora formalmente ordinárias. Embora as consequências práticas de tal quiçá não

sejam relevantes, porquanto, indicando a própria letra da Constituição a possibilidade de diminuição do

número de deputados, não se nos afigura possível qualquer controlo da constitucionalidade no caso de

diminuição, sendo forçada a invocação de que se trataria de norma constitucional “menos

constitucional” (ou “inconstitucional” – lembrando Otto Bachof), categoria que, como é sabido, coloca

não poucos problemas, mesmo para questões de outra natureza.

Constitucional é, pois, uma diminuição do número de deputados até 180 (o que nos colocaria

na situação de uma revisão meramente aparente: e não efetiva). Pela letra da constituição.

A questão é se tal é conveniente, útil e justo. E se porventura o espírito da Constituição, pelo

menos nos tempos que correm, atenta a constituição real de composição partidária muito plural, mas

com dois partidos largamente dominantes (assim não seria se houvesse um claro bipartidarismo: e

temos que pensar que a Constituição, se quiser durar, tem de prever, de olhar para o futuro), não

ficaria um tanto ferido com a diminuição do número de deputados. A considerarmos este último

argumentos, já a aparente revisão, acabaria por ser uma forma de revisão real, efetiva, só que não por

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via do processo de revisão normal... Embora sejam sempre muito temerárias estas vias hermenêuticas,

por poderem abrir caminho a grande subjetivismo.

Ou seja: o intervalo de número de deputados permitido pela Constituição é constitucional, na

medida em que prevê possibilidades futuras. Mas atualmente o mais consentâneo com o espírito

pluralista da Constituição seria manter o número. Inclinamo-nos para essa perspetiva, que tem a

vantagem teórica, aliás, de suscitar a questão de eventuais desconformidades constitucionais não

absolutas no tempo, mas temporalmente localizadas...

III. Consequências Políticas da Diminuição do Número de Deputados

Analisemos um pouco o problema nos seus pressupostos políticos, sociológicos e

sóciomentais.

A retórica da diminuição dos deputados é apenas o primeiro passo para diminuí-los

radicalmente, ou seja, a zero. Há, obviamente, algumas pessoas bem intencionadas nessa campanha.

Talvez até a grande maioria dos que opinam no sentido da concentração o faça na melhor das

intenções, desde logo de contenção de custos e de elevação do nível. Mas é essa a sina dos

movimentos de timbre populista: arrastarem, com argumentos simples os incautos. Dizia o célebre

poeta popular António Aleixo: Para a mentira ser mentira / E atingir profundidade/ Tem de trazer à

mistura /Qualquer coisa de verdade.

Há algo mal no sistema político português, mas não é o próprio sistema, em si. Ora isso é difícil

de compreender e de explicar ao Povo comum, sem particular formação política, cívica, jurídica...

É sintomático o aparecimento recente, por e mail, de uma “corrente” fulminando quem a não

mandar a 20 amigos, não com uma praga das habitualmente rogadas para incumprimentos de índole

supersticiosa, mas com a desgraça nacional, e clamando pela mudança da Constituição, já.

Curiosamente, não vemos que nenhum dos pontos que reivindica (todos apontados ao

preconceito antiparlamentar: todas contra os sujeitos-deputados, sobretudo contra reeleição, sistemas

de saúde, aposentadoria, etc.) têm acolhimento fundamental na Constituição. É, pois, uma « bola

fora », apostada certamente na desestabilização. E na estigmatização dos deputados, os quais, na

verdade, em Portugal nem são quem ganha mais nem quem tem mais benesses, dentro dos círculos

do poder.

Mas o que está por detrás dessa ideia, como pano de fundo não-dito, é a mentalidade

antiparlamentar, que entre nós tem raízes. E a que o salazarismo-caetanismo que governou o País por

meio século quase (48 anos) deu grande força. Conseguindo, pelo controle da comunicação e pela

doutrinação na escola, inculcar preconceitos a muitos.

Isto não quer dizer que tudo esteja bem no mundo dos partidos que segregam no seu seio os

deputados. Pelo contrário. Há muita coisa mal, e o teste de conhecimentos de História que há anos se

fez aos deputados de então foi a nosso ver um exemplo do que se deveria fazer: mas antes de os

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meter nas listas candidatas... A imagem dos deputados, no seu todo (embora os haja excelentes e

cultos também) não ficou lá muito bem...

Já o polígrafo novecentista J. P. de Oliveira Martins (1845-1894) deplorava que para qualquer

empreguito subalterno eram precisas montanhas de diplomas e nada de habilitações literárias se

exigiria para governar (lato sensu, claro).

Uma hipótese a considerar para uma pré-seleção partidária seriam as eleições primárias

(contudo restritas aos militantes de cada partido, para evitar pressões exógenas)... Mas não nos

iludamos: ou muda a mentalidade nos partidos, ou os líderes deles se impõem a lógicas localistas,

aparelhistas e corporativas internas, e veem com olhos de ver quem mandam para o Parlamento, ou

então, com poucos ou muitos representantes, sempre teremos, atrás de vultos inegavelmente de

admirar, muitos back benchers (ou até por vezes saltando para a ribalta) que deixam muito a desejar...

Também de nada serve pensar-se que infiltrar voluntariamente as listas partidárias de

independentes resolveria a questão. Isso acaba por criar apenas mal-estar interno nos partidos (os

militantes sentem-se ultrapassados por “paraquedistas” sem currículo e fidelidade partidária) e

normalmente é vã a ilusão que um partido alarga a sua base de apoio com um ou outro nome, ainda

que mediático.

Outra panaceia falada é a possibilidade de candidaturas em listas, independentes de partidos,

não só, como hoje sucede, para eleições autárquicas, mas também nacionais. Outra esperaça que

cremos prometer mais do que iria dar, embora não nos opunhamos a que se faça a experiência.

Pensamos, até por indícios que estão aí já, que a eleição de independentes só favoreceria caciquismos

ou figuras mediáticas ou muito abastadas. Quem é conhecido? Quem pode pagar uma campanha

eleitoral eficazmente?

O problema é que as pessoas em geral, feridas, acossadas, contrariadas, verdadeiramente

infelizes, e cada vez mais, pela austeridade que todos os dias piora (um mal não feito todo de uma vez,

mas aos poucos, ao contrário até do recomendado por Maquiavel) arrimam-se a umas soluções

miraculosas para irem levando a vida cinzenta e maçadora, por vezes trituradora. Desilusão, uma mais:

não há soluções miraculosas, como não há salvadores.

Infelizmente, pela aragem, teme-se que o próximo passo seria aplaudir o grande líder, o

grande chefe, etc., etc. E como os grandes salvadores têm pés de barro!... A História no-lo conta

abundantemente.

Tudo sinais de menoridade. É muito fácil a um Povo demitir-se e confiar no grande chefe, e

depois, vista a fraude (e é muito curto o estado de graça real – depois é só medo de represálias), dizer

mal dele. Mesmo dizer mal dele é solução. Como Cavafis falava dos bárbaros que não vêm...

A pergunta, que não é só portuguesa, começa a ganhar acuidade: Quando assumiremos nas

mãos as nossas responsabilidades como pessoas e cidadãos? A questão da qualidade dos deputados

não se resolve com a diminuição do seu número. Diríamos quase que pelo contrário. Há quem diga

que excelentes deputados acabam por entrar (ou nem entrar) só depois dos funcionários, dos que

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dominam o aparelhos dos partidos, dos burocratas que nunca trabalharam fora da sombra da sigla

partidária, os chamados aparelhómetros... (descontando as figuras de proa, que são cabeças e

pescoços de lista).

Ou seja, os melhores tecnicamente, culturalmente, etc. têm sempre que dar o lugar aos dos

aparelhos... Que, magnanimamente, os podem eventualmente deixar entrar em lugar do final das listas.

Seria interessante verificar a hipótese, e ver se quem fala e quem trabalha no Parlamento mais não

serão os do princípio e os do fim das listas... É apenas uma hipótese de pesquisa. No caso de partidos

pequenos, a qualidade sobre sempre, porque ficam só “cabeças” e “pescoços” de lista. Mas nos

grandes, tinha que pensar-se seriamente numa regeneração partidária profunda. Não é nada fácil.

Porque depende de pessoas, das suas mentalidades, da sua moral, dos seus comportamentos. E isso

não se reforma por decreto.

De novo, a tentação é dizer que é preciso mais educação. Educação profunda, e não mera

instrução. Educação até do caráter. As tais pessoas “de um só parecer”, como diria o velho Sá de

Miranda, faltam muito, por toda a parte, prevalecendo as gentes de corte... A sem-cerimónia com que o

antigo chefe se curva, servilmente, ante o novo, e bajula quando já o bajularam, sem que cuide que tal

é falta de dignidade, a facilidade com que o empregado muda de opinião porque o patrão tem outra

ideia, uma geral moral elástica, e a convicção de que, afinal, servilismo é só servilismo e vénias não

passam de mesuras, podendo assim prodigalizar-se sem prejuízo próprio, são sinais de embotamento

da alma.

Mas voltemos ao nosso tema. A única possibilidade de diminuir o número de deputados e

manter a “beleza da borboleta” parlamentar, na variedade das suas cores, para relembrar a

comparação de Álvaro de Campos, seria encontrar uma engenharia compensatória, por via da lei

eleitoral (no respeito pela Constituição), que permitisse a que, mesmo com menos deputados, ainda

assim, os partidos mais pequenos não perdessem a sua representatividade.

Correr-se-ia o risco, em Portugal, de um cinzento bipartidarismo de facto se o número de

deputados viesse a ser reduzido. Nas últimas legislaturas têm tido presença no Parlamento

(enunciando do que se convencionou ser a “direita”, para o que se convencionou ser a “esquerda”,

embora o partido mais à direita se chame do “Centro”) fundamentalmente os seguintes partidos: o CDS

– Centro Democrático Social / PP – Partido Popular, o PPD – Partido Popular Democrático / PSD –

Partido Social Democrata, o PS – Partido Socialista, Os Verdes, o PCP- Partido Comunista Português,

e BE – Bloco de Esquerda.

Com a compressão dos mandatos, apenas o PSD e o PS acabariam por ter representação, ou

então os outros, muito mais pequenos, seriam relegados para uma representação puramente

decorativa, sem expressão. É um empobrecimento do pluralismo, da democracia, e também um risco

para o sistema, que nesse rotativismo perderia élan, e correria o risco de uma eternização no poder de

um ou dos partidos (alternados ou em conjunto) do chamado “bloco central”, situação que, essa sim,

poderia certamente potenciar o que alguns já chamam, com caráter pejorativo, e de suspeita, “bloco

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central de interesses”. Evidentemente que esta é outra fórmula estigmatizadora, que necessitaria de

prova.

Efetivamente, tem havido muitas críticas a esses dois partidos, que têm estado no governo

durante muito tempo, neste novo período democrático. Desde logo, de se terem tornado como que as

faces da mesma moeda. Pessoalmente, não estamos de acordo. Por mil razões vemos diferenças

entre eles: na sua história, na sua ideologia, na sua composição social, no perfil dos seus

protagonistas, e na sua prática governativa, o que, aliás, acontecimentos da governação recente nos

parecem corroborar. Contudo, a aproximação entre ambos seria maior, confluindo quiçá numa

navegação de cabotagem, se não contassem com o olhar crítico parlamentar de partidos mais à direita

e mais à esquerda.

E não esqueçamos nunca que o Parlamento abunda em comissões especializadas, não sendo

raro que o mesmo deputado pertença a várias. Com o exponencial crescimento da burocracia e dos

dossiers para estudar, uma diminuição do número dos parlamentares iria ainda tornar menos assídua a

presença a todas as comissões, obrigar a mais acumulações (ou reduzir o número das comissões, o

que talvez não seja fácil, dada a profusão temática que a complexidade hodierna gera naturalmente),

tornar o tempo dos representantes do Povo mais escasso ainda.

Por tudo isto, não será que usar a possibilidade do art. 148.º diminuindo o número de

deputados, agora, é uma falta de atenção à realidade constitucional presente? Sem prejuízo de se

louvar a Constituição por prever a hipótese para o futuro, não manietando o legislador e nem sequer o

obrigando a uma revisão constitucional para se adaptar a novas circunstâncias, que podem ser de

muito diverso tipo.

IV. Conclusão

É muito complicado defender intransigentemente a ética republicana e apontar com

desenvoltura e sem medo o dedo a quem a despreze, e, ao mesmo tempo, deixar intocado o prestígio

das instituições sempre mais ou menos atingidas por eventuais titulares de cargos menos retos.

E contudo é isso que deve fazer-se : porque nunca a hipocrisia resolveu qualquer problema.

Contudo, é preciso ver o que é real corrupção e o que é o enlamear sistemático do conjunto da classe

política, ou destes e daqueles, com o fito de criar um clima propício a aventuras autoritárias. Ou apenas

pelo negativismo sistemático e inconsequente, pela inveja, pelo puro mal-dizer.

Uma das grandes virtualidades de um regime democrático é que podem vir à luz do dia os

erros e os crimes dos políticos. Por isso até, é absurda a campanha ou pelo menos um clima (que

parece tentacular, embora possa só ser polifónico) contra a democracia e contra o Parlamento que

invoca mordomias e corrupções, além de rumores e preconceitos.

Porque a alternativa à democracia e ao parlamento, pelo menos no atual cenário e nas

presentes condições, é a ditadura e a concentração dos poderes : que são muito piores. Desde logo,

nessa situação, não se poderia sequer descobrir nem falar de escândalos. E as fraquezas das

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pessoas, se a coberto do silêncio politicamente imposto numa ditadura (ou num interregno da

democracia) seria presumivelmente muito maiores, com crimes muito mais graves. Assim foi já no

passado. Porque haveria agora de um regime antiparlamentar e antipolítico de ser diferente ?

No presente contexto, o Parlamento continua a ser, apesar de todas as suas debilidades – com

cura no seio do sistema, assim os partidos consigam superar a sua tendência oligárquica e

internamente menos democrática – a Casa da Democracia, e o regime parlamentarista, pelo pluralismo

acrescido que propicia, pela virtualidade em convocar mais e mais efetivamente freios e contrapesos,

pela efetivação mais coerente da separação dos poderes, e pela virtualidade maior em ser

contramajoritário, logo, a melhor defender os direitos humanos, aí está como matriz de um quadrante

democrático, a ser renovada e melhorada. Um repto à inteligência e à imaginação constitucionais.

No terreno do Direito eleitoral, naturalmente com aperfeiçoamentos sempre possíveis, cremos

que é necessário estar muito vigilante relativamente a propostas de alterações. Umas, aparentemente

técnicas e inócuas. Outras, pretensamente regeneradoras do corpo social e político, mas que trazem

no bojo alterações qualitativas de regime. O que só pode ser feito por uma Revolução, ou uma

profunda revisão constitucional, em devido tempo, e por uma maioria qualificada esmagadora.

Paulo Ferreira da Cunha

Catedrático da Faculdadede Direito da Universidade do Porto

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ESTUDOS E DOCUMENTOS DE TRABALHO

Normas para Apresentação

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Cadernos de Pós-Graduação em Direito, Comissão de Pós-Graduação da Faculdade de Direito da USP, São Paulo, n. 8, 2012

CADERNOS DE PÓS-GRADUAÇÃO EM DIREITO

ESTUDOS E DOCUMENTOS DE TRABALHO

Normas para Apresentação

A apresentação do artigo para publicação nos Cadernos de Pós-Graduação em Direito deverá obedecer as normas da Associação Brasileira de Normas Técnicas (ABNT)

● Titulo: Centralizado, em caixa alta. Deverá ser elaborado de maneira clara, juntamente com a versão em inglês. Se tratar de trabalho apresentado em evento, indicar o local e data de realização.

● Identificação dos Autores: Indicar o nome completo do(s) autor(res) alinhado a direita. A titulação acadêmica, Instituição a que pertence deverá ser colocado no rodapé.

● Resumo e Abstract: Elemento obrigatório, constituído de uma seqüência de frases concisas e objetivas e não de uma simples enumeração de tópicos, não ultrapassando 250 palavras. Deve ser apresentado em português e em inglês. Para redação dos resumos devem ser observadas as recomendações da ABNT - NBR 6028/maio 1990.

● Palavras-chave: Devem ser apresentados logo abaixo do resumo, sendo no máximo 5 (cinco), no idioma do artigo apresentado e em inglês. As palavras-chave devem ser constituídas de palavras representativas do conteúdo do trabalho. (ABNT - NBR 6022/maio 2003).

As palavras-chave e key words, enviados pelos autores deverão ser redigidos em linguagem natural, tendo posteriormente sua terminologia adaptada para a linguagem estruturada de um thesaurus, sem, contudo, sofrer alterações no conteúdo dos artigos.

● Texto: a estrutura formal deverá obedecer a uma seqüência: Introdução, Desenvolvimento e Conclusão.

● Referências Bibliográficas - ABNT – NBR 6023/ago. 2000.

Todas as obras citadas no texto devem obrigatoriamente figurar nas referências bibliográficas. São considerados elementos essenciais à identificação de um documento: autor, título, local, editora e data de publicação. Indicar a paginação inicial e final, quando se tratar de artigo de periódicos, capítulos de livros ou partes de um documento. Deverão ser apresentadas ao final do texto, em ordem alfabética pelo sobrenome do autor.

● Citações: devem ser indicadas no texto por sistema numérico, obedecendo a ABNT - NBR 10520/ago. 2002.

As citações diretas, no texto, de até 3 linhas, devem estar contidas entre aspas duplas.

As citações diretas, no texto, com mais de três linhas devem ser destacadas com recuo de 4 cm da margem esquerda, com letra menor que a do texto utilizado e sem aspas.

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