Arranjo - victormelo

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    UNIVERSIDADE DO RIO DE JANEIRO

    CENTRO DE LETRAS E ARTES

    INSTITUTO VILLA-LOBOS

    LICENCIATURA EM MSICA

    QUESTES RELACIONADAS AO ENSINO DE ARRANJO

    Victor Di Francia Alves de Melo

    Rio de Janeiro, 2008

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    A DIDTICA NA DISCIPLINA ARRANJO

    por

    VICTOR DI FRANCIA ALVES DE MELO

    Monografia apresentada para concluso do cursode Licenciatura em Educao Artstica comHabilitao em Msica do Instituto Villa Lobos,Centro de Letras e Artes da UNIRIO, sob aorientao do Professor Doutor Caio Nelson de

    Senna Neto.

    Rio de Janeiro, 2008

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    AGRADECIMENTOS:

    Agradeo primeiramente a Deus por tudo que Ele me deu (no foi pouco!).Agradeo a minha famlia pelo apoio incondicional e a todos os professores dessagrande universidade que me moldaram como um msico. Entre eles, agradeoespecialmente ao professor Caio Senna pela pacincia e confiana em meu trabalho.

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    III

    MELO, Victor Di Francia Alves. Questes relacionadas ao ensino de arranjo.2008.Monografia (Licenciatura Plena em Educao Artstica Habilitao em msica) Instituto Villa-lobos, centro de Letras e Artes, Universidade do Rio de Janeiro.

    RESUMO

    Este trabalho prope uma anlise de pensamento sobre o ensino de arranjo nasuniversidades brasileiras. Atravs da pesquisa bibliogrfica a cerca dos mais comunssignificados de termo arranjo, a discusso do porqu dessas definies seremreferncias fundamentais no meio acadmico levam s questes didticas relacionadasao ensino dessa cadeira. A importncia do dilogo entre docente e discente estudadaatravs de autores conhecidos da pedagogia como Paulo Freire e Comenius alm deuma discusso sobre a epistemologia do termo didtica. Finalmente, constata-se quea construo do discurso histrico direcionado s definies e a importncia dopensamento crtico so agentes importantes no ensino de arranjo e na relao doprofessor com o aluno.

    Palavras-chave: Arranjo- Didtica- Histria

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    SUMRIO

    INTRODUO 01

    CAPTULO I-SOBRE AS DEFINIES DE ARRANJO 02

    1.1 Definies tradicionais 02

    1.2 Arranjo: uma variante do processo composicional? 03

    CAPTULO II-ARRANJO E DIDTICA 09

    2.1 Os Problemas das Definies 09

    2.2 Paulo Freire 12

    2.3 Criatividade 14

    2.4 Comenius 15

    2.4.1 Metodologia 16

    2.4.2 Repertrio 17

    2.4.3 Tempo 18

    2.5 Pr-Requisitos 18

    CAPTULO III- HISTRIA E DIDTICA 21

    3.1 Histria e Historicidade na Didtica e no Arranjo 21

    3.2 Passado, Presente e Futuro 22

    3.3 Oralidade e Escrita 23

    3.4 Os Diferentes Gneros Musicais e seus Contextos 25

    3.5 Oralidade e as Definies Contemporneas de Arranjo 27

    CONSIDERAES FINAIS 30

    REFERNCIAS BIBLIOGRFICAS 31

    DISCOGRAFIA 32

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    CAPTULO I - SOBRE AS DEFINIES DE ARRANJO

    1.1 Definies tradicionais

    O termo arranjo presente em msica desde que se entende arte como um

    trabalho autoral. Ou seja, no autor est a figura de quem cria uma pea musical que ser

    reproduzida independentemente desse autor representar uma pessoa, um povo ou uma

    instituio. Ao longo da Histria comum encontrar definies de arranjo comumente

    associado transcrio, harmonizao, textura, orquestrao e a traduo

    idiomtica de uma cano de uma lngua para outra. fcil o acesso a essas definies

    j que esto presentes nos grandes dicionrios de msica como os exemplos a seguir:

    1-Arranjo a adaptao de composio para um instrumento ou grupo de

    instrumentos diferente do pretendido pelo compositor. Uma transcrio um

    arranjo feito usualmente com maior cuidado. (Dicionrio de Msica da Zahar,1982:22)

    2-Arranjo a reelaborao ou adaptao de uma composio, normalmente

    para uma combinao sonora diferente da original. (Groves, Dicionrio deMsica Edio Brasileira, 1994)

    3-Arranjo a reelaborao ou recomposio de uma composio musical ou

    parte dela (por exemplo, a melodia) pra um fim diferente do original; Tambm a

    verso resultante de uma pea(...) Em senso comum, todas as performances de Jazz, por possurem carter de improvisao e de releitura, constituem uma

    forma de arranjo; Isto , Os msicos rearranjam o material bsico inicial em

    incontveis formas e variaes(...) Mais estritamente, o termo arranjo em jazz

    significa uma verso escrita, fixa, geralmente publicada de uma composio,

    normalmente feita para uma dos conjuntos standards de Jazz (Jazz

    Orchestra, big band, grupos menores etc). (The New Grove Dictionary of Jazz,1988:32)1

    1Arrangement- the reworking or recomposing of a musical composition or some part of it (such as the

    melody) for a medium or ensemble other than that of the original; also the resulting version of the piece.

    () In a sense all jazz performance, insofar as it is improvised and constantly renewed, constitutes a form of arranging; that is, the performers rearrange the basic material in ever new variations and

    forms.()

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    Contudo, essas associaes no ajudam a criar uma separao do arranjo das

    demais atividades. Mesmo nos manuais, o assunto tratado principalmente como a

    harmonizao de vozes, tanto de maneira polifnica como homofnica aps uma breve

    apresentao da tessitura dos instrumentos de orquestra. Ser que o termo arranjo no

    pode ser dissociado da harmonia de uma obra? possvel mudar o arranjo sem mexer

    em parte na construo dos acordes e na disposio de vozes contidas na obra inicial?

    Respostas para essas perguntas se tornam claras quando a audio das prticas musicais

    de gneros que, na prtica, no esto contidas nesses manuais realizada. Se como

    exemplo pegarmos a msica The Ocean do grupo musicalLed Zeppelin 1973 que est

    no disco Houses of the Holy e compararmos com o arranjo da mesma msica feito

    pela banda brasileira Planet Hemp no Cd intitulado Os Ces ladram mas a caravana

    no pra de 1997e com o nome de Adoled. Nesse Cd possvel observar a adio de

    elementos eletrnicos que no representam uma inteno harmnica definida. Tambm

    a utilizao de rudos e a insero de uma letra declamada chamada comumente de

    rap no esto presentes em nenhuma definio tradicional acima do que normalmente

    se associa ao termo Arranjo.

    1.2 Arranjo: uma variante do processo composicional?

    A obra inicial o ponto de partida para conseguirmos entender melhor o arranjo.

    A partir dela a reproduo dessa obra poder acontecer em diversos nveis alcanando

    diversas realidades musicais diferentes da realidade do autor. Inevitavelmente,

    independente das questes associadas ao Direito Autoral , aquela composio passa a

    But in a narrower sense the term arrangement in jazz has come to mean a written-down, fixed ofrten

    printed and published version of a composition, usually arranged for one of the various standard jazzensembles(Jazz Orchestra, big band, small group, etc). ( The New Groves Dictionary of Jazz

    1988:32-33)

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    sofrer modificaes de carter voluntrio ou no dos mais diversos intrpretes. Pela

    definio do dicionrio Groves e tambm pela definio do dicionrio da Zahar, pode-

    se perceber claramente intenes do arranjador de produzir um sentido diferente num

    trabalho j existente. Para conseguir tal feito, cabe ento ao arranjador mexer num

    elemento importante de produo de sentido, a obra, para poder influenciar na recepo

    da composio e assim modificar a prpria composio. Se ento o arranjador altera o

    sentido de uma obra atravs de seu trabalho, possvel pensarmos que o processo de

    composio e de arranjo esto ligados. Uma observao sobre tal fato o trabalho de

    Carlos Almada em seu livro intitulado Arranjo:

    O estudo do Arranjo muito tem a ver com o da Composio: ambos dependem

    de matrias tericas fundamentais: a Harmonia, o Contraponto, a Morfologia e

    a Instrumentao (sem falar do permanente objetivo que todo msico deve ter

    de aprimorar seu ouvido a nveis cada vez mais avanados da Percepo). A

    principal diferena entre ambos reside no fato de que o Arranjo, sem dvida por

    causa das particularidades da Msica Popular - qual est tradicionalmente

    mais ligado - acabou conseguindo algo parecido com uma sistematizao em

    certas reas de seu ensino, como a j comentada tcnica do soli para sopros, ou

    a que trata da disposio e da combinao dos instrumentos da base rtmica de

    acordo com os diferentes estilos musicais. Outros setores - como o que aborda a

    escrita para cordas, por exemplo - ficam quase completamente dependentes de

    estudos correlatos (no caso, o da Instrumentao/Orquestrao).O aluno de

    Composio em geral orientado por um professor experiente (quase sempre

    tambm compositor), que o faz mergulhar profundamente em cada uma das

    matrias fundamentais citadas para, atravs de disciplina e de exerccios

    progressivos, domin-las em separado e interrelacion-las antes de poder

    compor livremente. J o estudante de Arranjo nem sempre (ou melhor, quase

    nunca) tem a opoturnidade de seguir tal roteiro (quando muito, estuda

    Harmonia Funcional e um pouco de Percepo, s vezes de forma irregular,com professores - e at linguagens - diferentes), o que nos leva lgica

    concluso de que, se comparada com a do aspirante a compositor, sua

    formao musical ser bem deficiente, mesmo levando-se em conta as maiores

    exigncias e complexidades estruturais da Msica Erudita em relao

    Popular.(Almada, 2000:01)

    Nesta definio, Carlos Almada cria uma linha que separa o arranjador do

    compositor baseado em conhecimentos acadmicos. Ele admite correlaes entre o

    processo de compor e o processo de arranjo e assume o curso de composio como mais

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    completo para o preparo do aluno compositor do que o curso de arranjo para o aluno

    arranjador. Como por essa definio, semelhanas entre compor e arranjar se fazem

    presente, inevitvel para este trabalho a procura do significado do termo composio.

    1- Composio significa literalmente juntar partes. Esse termo, quase comoexclusivamente , aplicado criao de uma msica- Um novelista ou um

    poeta nunca so chamados de compositores com exceo de produzir uma

    analogia, mas um produtor de msica sempre, invariavelmente, designado

    por esse ttulo. (...) Mesmo que a construo de todo um movimento original de

    idias seja atribuda ao compositor,a palavra talvez no esteja totalmente

    adaptada. Todavia, pelo uso da expresso idia, nada poderia ser mais

    inapropriado. Pelo misterioso processo de originalidade (criao), ento a

    palavra inventor parece mais cabvel, mas tambm esta palavra no definicompositor em sua totalidade.(...)Definies a parte, o ttulo de compositor,

    mesmo com seu significado pela metade, um ttulo honrado.2 (Groves,

    Dictionary of Music, 1946:690)

    2- A Criao de uma obra original em msica. Embora a maioria doscompositores afirme que uma inspirao inicial imprescindvel, antes que esse

    processo possa ocorrer, ele tambm requer um conhecimento prvio e o estudo

    das tcnicas de composio, as quais sero aplicadas depois ao processo

    criativo. Essas tcnicas incluem a harmonia, o contraponto, a instrumentao e

    a prpria composio livre. (Dicionrio de Msica Zahar, 1982:83).

    Pela definio do Dicionrio Groves compor agrupar, pela prpria essncia da

    palavra, elementos de qualquer origem. Ou seja, ainda pela definio do dicionrio, esse

    processo se distancia do ato criador de uma obra. Cabe ao compositor agrupar essas

    idias originadas de seus pensamentos num raciocnio que lhe parea conveniente.

    Podemos ento destacar a figura do compositor por juntar idias que antes ningum

    havia concebido de determinada forma. Forma que est sujeita s influncias de um

    ambiente em torno daquela figura. A quantidade de originalidade presente num trabalho

    2 Compositions means literally putting together, and is now almost used exclusively applied to theinvention of music- a novelist or a poet being never spoken of as a composer except by way of analogy,but a producer of music being almost invariably designed by that title.(..) As far as the construction of a

    whole movement from the original ideas is concerned the word is perhaps not ill adapted, but for the idea

    themselves nothing could be more inappropriate. For the mysterious process of originating them the

    word invention seems more suitable, but even that does not at all describe it with certainly. (..) Nevertheless, the title of composer, though only half applicable, is an honourable one ( GrovesDictionary of Music, 1946:690)

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    de composio irrelevante para este trabalho. Portanto, se associarmos esta definio

    com as definies de arranjo anteriores, o que difere um compositor de um arranjador

    seria o ponto inicial de seu trabalho. Enquanto o compositor parte de uma inspirao

    primria, que d incio ao processo de encadear idias antes no encadeadas e que se

    transformaro no que chamamos de obra, msica, cabe ao arranjador desencadear

    essas idias ou encadear idias novas a essa inspirao primria inicial.

    J a definio do Dicionrio da Zahar, mais acadmica ao ressaltar elementos

    tcnicos que um compositor deve dominar. Porm, qualquer uma dessas tcnicas pode

    ser contestada argumentando-se que, ao longo da histria da msica, muitos

    compositores apareceram com talento nato e que no precisaram de nenhum estudo de

    aprendizado formal para dominar a arte de compor. Na msica popular brasileira, por

    exemplo, a maior parte de seus compositores no possui quase nenhum conhecimento

    nas reas citadas pelo dicionrio, a no ser de maneira isolada. Isso no priva a msica

    brasileira de compositores representativos. Tambm, pode-se questionar a quantidade se

    assuntos dominados e tambm a relevncia desses assuntos nos dias atuais. Sabe-se que

    esse Dicionrio escrito para a msica dita erudita mas com o advento de novas

    tcnicas e tecnologias, compreensvel que alguns assuntos tenham tomado menos

    importncia para dar lugar a outros mais relevantes a determinada poca.

    Ambas as definies de composio mencionam o ato inspirador como parte do

    processo de compor. A definio do Dicionrio de Msica Zahar refora a idia de

    Carlos Almada em relao ao contedo acadmico que um aluno de composio precisa

    absorver durante seu curso. J o Dicionrio Groves menciona como difcil entender

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    compor em sua totalidade e nos d uma definio literal do termo quando diz que

    compor juntar partes. Por essa ltima definio possvel relacionar ainda mais o

    arranjo com a composio j que juntar partes tambm faz parte do trabalho do

    arranjador. Uma curiosidade na pesquisa de significados a ausncia de definio para

    composio na edio brasileira do dicionrio Groves e na edio americana do

    Dicionrio Groves sobre Jazz. Essa ausncia parcialmente justificada pela falsa

    impresso que a palavra composio auto-explicativa, que o seu significado est

    presente no prprio significante.

    Mas a definio de arranjo do Dicionrio Groves de Jazz pode ser de grande

    valia para esse trabalho por se tratar de uma definio sobre um estilo mais recente de

    msica. Ela tambm usa a expresso recomposio que implica dizer que o processo

    de arranjo e composio esto interligados em significado. Tambm importante

    ressaltar que no universo da Msica Popular Brasileira a influncia do Jazz, e da msica

    norte americana em geral, adquire valor significativo principalmente a partir de

    Pixinguinha. Com o advento da Bossa Nova e a exaltao do estilo pelos norte

    americanos, essa influncia j no podia mais ser negada e passa a ser discutida at os

    dias atuais. Independentemente de nacionalismos e questes a cerca desse assunto, fica

    claro que as definies de arranjo que encontrvamos pelos jazzistas, comearam a

    tambm ser aplicadas pelos brasileiros. Contudo, no se pode esquecer das definies de

    arranjo que datam do incio do sculo e so mencionadas por Paulo Arago:

    A primeira incidncia que pudemos encontrar nos trazida por Tinhoro

    (1998:223) e ocorre em um disco intitulado Caf-Concerto, lanado em 1910

    pela pioneira Casa Edison e registrado no catlogo da Odeon sob o nmero

    108,172. Trata-se de um disco de intenes cmicas no qual tenta-se recriar

    o clima barulhento, acanalhado, algo triste, mas vigorosamente popular dos

    chopes-berrantes cariocas na virada do sculo. A cena em si precedida, na

    gravao, da tradicional voz responsvel pelo anncio da atrao que seriaouvida a seguir- tal como sempre ocorria nos fonogramas da poca:

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    Espetculo em um caf-concerto na rua do Lavradio, arranjo para a Casa

    Edson, Rio de Janeiro (Arago 1994:04).

    Nessa definio de arranjo, assim como tantas outras que no associam o arranjo

    notao musical nem elementos como melodia, ritmo e harmonia, so de suma

    importncia para se entender a extenso que a palavra arranjo possui nos dias atuais e

    nos remetem novamente ao exemplo da msica Adoled pela banda brasileira Planet

    Hemp.

    H claramente, nas definies anteriores uma divergncia de significados. Mas a

    definio do Dicionrio Groves que envolve o ponto de vista social, um importante

    relato da posio de status que o compositor ganhou ao longo dos sculos, posio que

    negligenciada ao arranjador. Um bom exemplo dessa negligncia o fato de no

    possuirmos o registro de arranjos at hoje, resultando numa perda incrvel de pautas

    produzidas por arranjadores. Por esse motivo, no possumos em nossos acervos um

    grande nmero de arranjos escritos desde meados do sculo XX at hoje. O material de

    arranjos perdidos na poca das Big Bands de grandes rdios brasileiras, sem dvida

    irreparvel. Entretanto, a figura do arranjador se encontra cada vez mais presente na

    ficha tcnica de CDs ao lado da figura do compositor. Um exemplo claro que se pode

    recorrer so os Acsticos produzidos pelaMTVbrasileiranos anos 90. Nesses registros,

    os arranjos so todos atribudos aos respectivos arranjadores e assim, mostrando

    claramente, como a figura do arranjador vem sendo reconhecida nos ltimos anos. Nem

    em discos famosos de compositores consagrados, como Chico Buarque de Hollanda por

    exemplo, em que a figura do arranjador j est consolidada., a figura do arranjador

    aparece em sua ficha tcnica. Embora alguns discos da mesma poca como os de Elis

    Regina e Ivan Lins apresentem menes ao arranjador.

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    CAPTULO II: DIDTICA E ARRANJO

    2.1 Os Problemas das Definies

    A discusso sobre arranjo e composio pode se estender por vrios outros

    aspectos, entretanto algumas concluses a cerca das definies e anlises acima nos

    trazem elementos que so pouco debatidos na academia de msica:

    1- O Arranjo musical no precisa estar associado a alturasmeldicas, ritmo nem harmonia definidas.

    2- Compor e arranjar so processos intimamente ligados e, por isso,arranjar est associado inspirao, criatividade: movimento

    original de idias.

    Essas concluses nos remetem a algumas perguntas: Por que nas dissertaes de

    mestrado e teses de doutorado que mencionam arranjo, mesmo em quando o assunto

    Msica Popular, ainda se utilizam as definies dos dicionrios tradicionais? Hoje,

    possvel encontrar vrias outras definies muito mais prximas de nossa poca e

    escritas por msicos renomados como Antnio Adolfo, Almir Chediak e Ian Guest.

    Como visto anteriormente as definies de arranjo tradicionais no sustentam

    grande parte do repertrio musical contemporneo. Portanto pode se formular hipteses:

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    1- As definies dos dicionrios tradicionais esto erradas.

    2- As definies dos dicionrios tradicionais esto incompletas

    Como as definies tradicionais conseguem satisfazer plenamente a certo

    nmero de composies do repertrio musical, a afirmao de que elas esto

    completamente erradas descartvel. Portanto, cabe a esse trabalho discutir se no

    ensino de Arranjo leva-se em conta que essas definies so incompletas. Essa

    afirmao nos remete Didtica do ensino de arranjo.

    Como objetivo da didtica neste trabalho, mencionamos Imdeo G. Nrici em

    seu livro Didtica Geral e Dinmica:

    Todos os aspectos que envolvem o comportamento humano ho de servir de

    subsdios para que, mais eficientemente, a didtica possa alcanar seu objetivo

    mximo, que efetivar os propsitos do conceito da educao. (Nrici,1987:23).

    Para Imdeo G. Nrici a didtica deve partir de um conceito de educao como

    reflexo ampla sobre o homem, a sociedade e a natureza em geral e, em seguida,

    enuncia:

    Educao o processo que visa a levar o indivduo, concomitantemente, a

    explicar as suas virtualidades e a encontrar-se com a realidade, para na mesma

    atuar de maneira consciente, eficiente e responsvel, a fim de serem atendidas

    necessidades e aspiraes pessoais e sociais. (Nrici, 1987:23).

    Portanto, a educao do indivduo busca atender as suas necessidades. A partir

    do momento que o educando busca uma educao especfica e particular como, por

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    exemplo: Licenciatura em Msica no qual o estudo de tcnicas de arranjo est imerso,

    h uma predisposio inerente do indivduo de ser atendido em suas aspiraes sobre a

    matria. O papel do educador professor da disciplina est em fornecer as ferramentas

    necessrias para atender a estas necessidades de maneira particular para cada indivduo.

    Para isso, o discente deve se fundamentar em mtodos especficos que busquem facilitar

    a aprendizagem como perceber as dificuldades de seus alunos e procurar elimin-las,

    gradatividade dos exerccios apresentados mostrando um objetivo, etc...

    Entretanto, por outro lado, de importncia mpar para esse trabalho que fique

    claro a necessidade da pr-disposio do aluno em ter o mesmo objetivo que o

    educador: a absoro dos contedos da disciplina pelo discente. A construo de um

    discurso claro entre o aluno e o professor fundamental para o aprendizado. A relao

    de confiana que os dois indivduos devem ter. O professor confia na pr-disposio do

    aluno em aprender, realizar os exerccios propostos, efetuar os trabalhos de final de

    curso de maneira consciente de ter alcanado os objetivos do curso. O aluno confia na

    capacidade do professor em discorrer competentemente sobre os assuntos apresentados,

    em sua didtica, etc.

    Portanto, para se atender aos objetivos da educao por meio de uma didtica,

    necessrio o dilogo entre o docente e o discente. Um dilogo que seja construdo a

    cada aula baseado na confiana que um tenha pelo outro.

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    2.2 Paulo Freire

    Paulo Freire atravs de seu extenso trabalho como pedagogo e educador mostra

    a importncia do dilogo entre discente e docente. atravs dele que ser possvel ao

    professor avaliar se o aluno est absorvendo os contedos da disciplina, respeitando a

    capacidade criadora do educando e o processo de educao. A autocrtica deve ser

    efetuada pelo professor em sua avaliao de final de curso. Assim, o educador passa

    apenas do papel de portador do conhecimento para ser crtico de seu trabalho e

    pesquisador de mtodos mais eficazes de ensino. o que Paulo Freire defende quando

    diz que no h docncia sem discncia (Pedagogia da Autonomia. 2007:32). O

    processo de aprendizagem como algo dinmico, tico, altamente voltil na melhora da

    especificidade de seus mtodos e longe de um processo passivo e imutvel generalista

    da identidade cultural dos alunos.

    Como extenso das idias de Paulo Freire, atravs das idias anteriores e

    objetivando o curso de Licenciatura e na possibilidade de todo estudante de msica se

    tornar um professor, a mesma crtica que deve ser efetuada no final do perodo pelo

    professor tambm deve ser feita pelo aluno. Essa segunda crtica voltada no apenas na

    avaliao do docente e se as expectativas do discente foram atendidas, mas tambm na

    crtica ao papel de aluno desempenhado pelo estudante. Aspectos como postura em sala

    de aula, comprometimento com a disciplina, participao ativa na produo do

    conhecimento assim como o docente, so essenciais para o melhor decorrer da

    disciplina. A esses aspectos incorporamos o conceito de tica que deve nortear tanto o

    educador como o educando. Segundo Freire, somos seres ticos e, por isso, deve-se

    adotar uma postura tica de aluno e tambm de professor. Ao docente, cabe a

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    criticidade aos mtodos utilizados como dito anteriormente, respeito autonomia do

    educando, bom senso, a aceitao do novo, rejeio de qualquer forma de

    discriminao, etc. J a postura tica do aluno leva-o a se inserir como agente ativo no

    processo de sua prpria aprendizagem. Contestao, comprovao, questionamentos,

    so sintomas de uma educao ciente. Essa postura, por parte do aluno, poder ajud-lo

    a entender mais tarde, quando for professor, das dificuldades do processo de

    aprendizagem e compreender melhor as dificuldades de seus alunos.

    Levando-se em conta que, como qualquer outra arte, a msica envolve o

    processo criativo, possvel afirmar ento que o ensino da msica e em particular o

    arranjo, tambm envolvem criatividade. tambm papel do docente, estimular esse

    processo como afirmou Paulo Freire:

    Pensar certo, do ponto de vista do professor, tanto implica o respeito ao senso

    comum no processo de sua necessidade de superao quanto o respeito e o

    estmulo capacidade criadora do educando(Freire. 2007:29).

    Como tambm papel do aluno lidar com a varivel criatividade nas palavras

    ainda de Paulo Freire: No haveria criatividade sem a curiosidade que nos move e que

    nos pe pacientemente impacientes diante do mundo que no fizemos, acrescentando a

    ele algo que fazemos. (Pedagogia da Autonomia. 2007:32). Portanto uma harmoniaentre mtodos aplicveis e a didtica de ensino ser mais facilmente atingida com a

    insero da varivel criatividade em nossos trabalhos de Arranjo. Conseqentemente,

    uma avaliao da disciplina deve dispor dessa varivel.

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    2.3 Criatividade

    1-Criatividade a qualidade do criador (Novo Dicionrio Aurlio,

    1975:400).

    2-Criar: dar existncia a; tirar do nada; gerar; formar; dar princpio a; produzir, inventar; imaginar; desenvolver-se, educar-se (Novo DicionrioAurlio, 1975:400).

    As definies anteriores do ato de criar so usadas freqentemente pela

    sociedade. Algumas delas, embora estejam corretas, so prejudiciais para se

    relacionarem com o aprendizado de disciplinas como Harmonia e o Arranjo. Definies

    como tirar do nada, dar princpio a nos remetem a um ideal romntico de

    divindades associadas a um indivduo e tambm a um discurso metafsico de dons e pr-

    disposies que mais servem para desestimular o aprendizado do que consolid-lo.

    Estimular a criatividade como um processo de formao, produo,

    desenvolvimento, educao observando-se as particularidades do indivduo de lidar

    com sua realidade, suas particularidades e sua prpria pessoa. Essa criatividade a

    que possibilita um aprendizado ativo, do buscar a aprendizagem e, como dito

    anteriormente, atendendo as aspiraes pessoais e sociais do indivduo. As

    particularidades do indivduo se refletem na sua produo de material (exerccios,trabalhos em geral) para a disciplina. Na maneira em que o estudante encontra para

    solucionar um problema num exerccio e lida com ele, que se embasa a sua

    criatividade. Pensar em criatividade com a viso romntica anterior pensar em

    educao como processo passivo.

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    Podemos ilustrar essa afirmao com a seguinte frase de Paulo Freire: Saber

    que ensinar no transferir conhecimento, mas criar as possibilidades para sua

    produo ou sua construo (Freire, 2007:47).

    A nfase no processo criativo se deve a importncia deste para a criao e

    desenvolvimento de novas concepes de arranjo em msica. As tcnicas de

    orquestrao, harmonizao de naipes, arranjo linear, Chord Melodies, entre outros,

    esto intimamente ligados s preferncias composicionais de determinado compositor

    e/ou arranjador em determinadas pocas e a maneira que ele encontra para solucionar

    problemas e situaes. O que determina a difuso de determinado mtodo de arranjo a

    reproduo deste por arranjadores posteriores que encontram naquele mtodo um bom

    referencial de esttica para um determinado estilo. A partir desse ponto, possvel a

    teorizao dessas tcnicas e conseqentemente, transform-las em material didtico. Ou

    seja, a teorizao didtica sempre subordinada s prticas de composio de arranjo e

    no o contrrio.

    2.4 Comenius

    A aplicao de idias decorridas sobre a aprendizagem anteriormente deve ser

    feita de maneira cautelosa e consciente. Atravs dos pensamentos de Comenius sobre

    educao e sua utopia em seu livro intitulado Didtica Magna possvel o

    delineamento de uma teoria educativa. Como princpios bsicos enunciados por

    Comenius no sculo XVI, a didtica deve abranger pelo menos trs aspectos:

    Metodologia, Tempo, Repertrio (saber). No objetivo desse trabalho enunciar e

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    discorrer especificamente sobre os diversos aspectos e a melhor forma de aplic-los,

    mas sim criar um panorama e salientar as suas dependncias entre si.

    2.4.1 Metodologia:

    Por metodologia entende-se o estudo de mtodos orientados a levar o educando

    a participar ativamente nos trabalhos de classe, retirando-o da posio clssica de ouvir,

    anotar e repetir. No livro: Didtica Geral e Dinmica, o autor menciona dois mtodos

    de atividades aos educandos: Os mtodos de ensino ativos e os mtodos de ensino

    passivos.

    1- Mtodos e tcnicas de ensino passivos so aqueles que levam o educando a

    apreender, fixar e,se possvel, compreender conhecimentos apresentados, em que a

    memorizao solicitada constantemente.

    2- Os mtodos e tcnicas de ensino ativos so aqueles que colocam o educando

    em posio de elaborar por si os conhecimentos ou as formas de comportamento

    desejadas, em que a busca, a realizao e a reflexo so solicitaes constantes.

    A priorizao pelos mtodos de ensino ativo so salientados por Imdeo G.

    Nrici em seu livro como sendo os mais eficazes na busca de uma didtica que busca

    um aprendizado efetivo. Colocar o professor e o aluno como iguais, buscando um

    discurso entre as partes, discorrendo sobre os assuntos com ambas as partes objetivando

    objetivos comuns assim como foi dito anteriormente nesse trabalho. A memorizao de

    tcnicas pela memorizao deve ser evitada por se tratar de um processo que no

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    consolida um conhecimento longo prazo. A reflexo, por outro lado, leva a uma

    incessante busca pelas origens dos conceitos da disciplina e possibilita a aproximao

    da realidade do discente com a realidade da disciplina.

    2.4.2 Repertrio:

    Tambm enunciado como contedo, o repertrio deve seguir uma atualidade

    informativa, ou seja, os contedos devem atender atualizaes constantes.O critrio de

    escolha para os contedos, tanto curriculares como programticos, deve ser a

    pragmaticidade e atualidade informativa e formativa dos mesmo, bem como seu valor

    social, para melhor conhecimento, aproveitamento e adaptao do meio.

    No meio musical possvel se encontrar diversos universos musicais

    diferentes. Esses universos podem ser classificados atravs de diversos critrios

    diferentes: estilos musicais, instrumentos, condies sociais, entre outros. Talvez a

    maior questo que norteia a disciplina de Arranjo assim como outras disciplinas

    Como atender as mais diversas necessidades de alunos to diferentes?. Nesse

    contexto, a alternativa de fornecer disciplinas temticas como Percepo e Processos de

    Musicalizao temticos, esteja mais prxima da resposta. Essa alternativa, se estendida

    para o curso de arranjo, pode vir a suprir as necessidades de alunos que lidem com os

    mais diversos gneros musicais. A existncia de uma disciplina arranjo bsico que

    leve em conta os aspectos gerais e que seja pr-requisito para os mais diversos arranjos

    temticos pode ser uma alternativa aplicvel. O aluno poderia ento ter um nmero

    mnimo de crditos dessa disciplina e escolher entre os arranjos com os temas divididos

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    em gneros musicais de sua preferncia. Estimulando assim ainda mais o processo de

    aprendizagem do aluno.

    2.4.3 Tempo:

    de conhecimento, tanto do aluno quanto do professor, que o tempo para

    determinadas disciplinas curto para uma abordagem completa e total do assunto. Mas

    o tempo est ligado diretamente com a metodologia na medida que esta ltima ser

    aplicada com o fim de ensinar determinado contedo em um determinado espao de

    tempo. Portanto, a eficcia da metodologia est ligada durao do curso. Na disciplina

    de arranjo impossvel, mesmo com a disposio de mais semestres dedicados a

    matria, a abordagem de todas as tcnicas possveis de construo de arranjo existentes.

    Na utopia de Comenius em seu Ideal Pansfico, ele enuncia que todos tm que saber

    tudo e aos educadores cabe ensinar tudo a todos. Entretanto essas palavras devem ser

    interpretadas como um saber geral sobre todas as disciplinas e no completo em todas

    as especificidades de cada saber.

    Ser criatura racional ser observador, denominador e classificador de todas

    as coisas; isso significa conhecer e poder nomear e entender tudo aquilo que o

    mundo inteiro encerra (...) No se deve entender que com isso julguemos

    necessrio que todos tenham conhecimentos (especialmente acabados e difceis)de todas as cincias e artes. (Comenius. 2006:29).

    2.5 Pr-Requisitos

    Especificando para o ensino de arranjo, em favor das 15 aulas por semestre,

    ainda assim se torna rduo essa viso panormica sobre todas as tcnicas. Mas, como

    sugesto de implementao na grade de contedos da disciplina, uma discusso sobre o

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    vasto universo que a palavra arranjo abrange nas mais diversas pocas e gneros

    musicais pode ser esclarecedor para os alunos. Um exemplo da carncia desse tipo de

    discusso dado em livros sobre arranjo como o de Ian Guest onde no h na

    introduo, nenhuma discusso desse tipo. Tambm comum encontramos em manuais

    sobre arranjo de Ian Guest, a discusso de conceitos musicais elementares para ento

    entrar no assunto de maneira especfica. Nesse aspecto, as universidades acertam ao

    colocarem uma srie de pr-requisitos para que o aluno possa cursar disciplina arranjo.

    Por pr-requisito, entende-se por finalidade: Os pr-requisitos tem como finalidade o

    saber se o discente est em condies de iniciar determinado estudo ou como o mesmo

    deve ser levado a efeito. (Nrici, 1987:85).

    A confuso entre teoria musical e arranjo exemplo de como uma patologia

    pode influenciar na composio de material didtico e, conseqentemente, na didtica

    de uma disciplina. A questo do pr-requisito est ligada com a questo do repertrio,

    do saber, que a disciplina arranjo deve ser interpretada pois para adquirir os

    conhecimentos dessa disciplina so necessrios conhecimentos de teoria musical.

    Entretanto a essa exigncia de uma disciplina com outra no o suficiente para a

    unificao total do campo em que elas se inserem. Para o professor, o reconhecimento

    dos pr-requisitos de sua disciplina influem diretamente na escolha do repertrio para o

    curso proposto.

    Podemos associar a esses argumentos a frase de Paulo Freire: Ensinar exige

    respeito aos saberes dos educandos. (Pedagogia da Autonomia. 2007:30), ou seja,

    cabe ao professor da disciplina a conscientizao sobre os conhecimentos dos alunos.

    Particularmente para o tema arranjo, isso envolve uma ampliao da frase de Paulo

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    Freire: os criadores dos livros relacionados ao arranjo devem respeitar os tericos

    musicais e seus manuais de iniciao musical e objetivar na abordagem de seus temas.

    A no ser que uma abordagem terica especfica seja necessria para a compreenso de

    determinado assunto. A defesa da distino de significados entre teoria musical

    elementar e arranjo no tem como inteno a autonomia total das partes. Entendemos

    que o universo musical abrange essas e todas outras partes que no podem ser

    desassociadas e/ou refutadas.

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    CAPTULO III: HISTRIA E DIDTICA

    3.1 Histria e Historicidade na Didtica e no Arranjo

    Quando na primeira parte investigamos os mais diversos significados de arranjo

    procura nas prticas musicais populares atuais, recorremos aos mais diversos manuais

    consagrados e tambm a definies baseadas na oralidade. Essas definies esto

    ligadas didtica da disciplina arranjo abordada na segunda parte, ou seja, elas tm

    como objetivo o ensino do significado do termo arranjo. Alm disso, fcil perceber

    que essas mesmas definies esto relacionadas s prticas musicais especficas dos

    mais diferentes gneros musicais em que elas se inserem e tambm aos provveis

    leitores daquele manual. Todas essas afirmaes no podem ser levadas em conta sem a

    anlise histrica em que essas definies e, mais abrangentemente, o ensino de arranjo

    se encontra.

    No decorrer deste trabalho, em vrios momentos foram utilizadas palavras como

    realidade, presente, meio social e seus respectivos sinnimos. O que mostra claramente

    a possibilidade de historicidade da didtica, do ensino de arranjo e suas definies.

    Sobre a didtica, foi visto que ela permeia uma metodologia de ensino ativo que procura

    uma superao da metodologia de ensino passivo, um ensino ultrapassado, pela maior

    eficincia da primeira em nosso presente para a formao de um futuro cidado melhor

    qualificado. Portanto, necessrio discorrer sobre essas trs entidades: presente,

    passado e futuro.

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    3.2 Passado, Presente e Futuro

    de nosso conhecimento que a Histria no se limita apenas a atitude

    tradicional de compreender o presente atravs do passado. Jacques Le Goff mostra

    atravs das palavras de Marc Bloch uma atitude de compreender o passado atravs do

    presente. Organizar e agrupar os fatos do passado em funo das necessidades atuais,

    assim se define a funo social do passado ou da Histria (Febvre, Lucien.1949:438).

    Um passado que no se encontra imutvel, esgotado em anlises, e est totalmente

    subordinado ao presente do historiador que o analisa. Assim, a formulao do passado

    feita constantemente atravs de novas leituras, falhas de memria, reviso etc. Portanto,

    no h anlise histrica que seja imparcial de esttica, de conceitos, da realidade do

    historiador. Quando definies sobre arranjo de perodos cronolgicos diferentes so

    colocadas, deve-se levar em conta o contexto histrico em que se apresentam e foram

    formuladas.

    Levando-se em conta que as definies dos dicionrios de Msica Groves e da

    Zahar apresentadas no primeiro captulo deste trabalho foram expostas em 1982 e 1994

    respectivamente , no possvel a utilizao dessas definies em sua totalidade para se

    explicar estticas posteriores a essas datas. Portanto, definir arranjo em gneros

    musicais como o DrumnBass e o Emocore somente a partir dos dicionrios citados

    estar, ao menos, parcialmente errado. A correlao das definies anteriores com a

    nova realidade musical traz uma nova leitura da representatividade e da validade dos

    dicionrios sobre o termo arranjo. A partir da, pode-se chegar a concluses a cerca do

    que arranjo no contexto histrico vivido pelo pesquisador.

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    Esse tipo de dilogo no usualmente incentivado pelo docente na sala de aula.

    Um dilogo que envolve a criticidade ressaltada por Paulo Freire. Essa discusso deve

    levar a participao ativa do aluno na formao da disciplina, no caso arranjo, atravs

    do tempo. Torn-lo consciente de um processo de amadurecimento de idias

    relacionadas aos conceitos da disciplina, num contexto histrico que privilegia uma

    esttica especfica da poca em que ele vive. Um processo que vive em constante

    mutao e o torna participante ativo na formao do futuro. Futuro em que suas

    reflexes sero utilizadas como parmetro para a explicao de um novo presente.

    Assim, o docente contribui para uma didtica e um conceito de educao e reflexo

    sobre o homem como explicitado por Imdeo G. Nrici no captulo anterior.

    3.3 Oralidade e Escrita

    importante ressaltar a importncia da oralidade ao se construir a Histria do

    ensino de arranjo. Jacques Le Goff nos mostra em seu trabalho como a oralidade e a

    escrita coexistem em uma sociedade e esses dois aspectos so objetos de estudo da

    Histria. Enquanto a cultura oral possui carter mutvel pela prpria construo de seu

    discurso, a cultura escrita admite certa intocabilidade na medida em que o escrito no

    pode ser modificado e sempre utilizado como referncia para futuras dvidas a cerca do

    seu significado. Porm, a prpria cultura escrita se torna malevel quando se inserem as

    interpretaes daqueles que adquirem seus conhecimentos. O contexto social, poltico-

    econmico, entre outros nos remetem a diversas interpretaes de uma mesma

    definio. Assim, mesmo o que considervel esttico dentro da concepo de ensino

    tradicional, ou seja: os livros, adquirem maleabilidade e historicidade de suas

    aplicabilidades dentro de uma sociedade.

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    No se pode deixar de mencionar o processo de transformao do discurso oral

    no discurso escrito. Por se tratar de um processo que envolve evoluo das sociedades

    humanas, ele se desenvolve de maneiras diferentes em sociedades diferentes e em

    velocidades variadas. Quando um manual sobre msica escrito, levam-se em conta

    vrias espcies de referncia. A referncia bibliogrfica muitas vezes nos possibilita a

    identificao do material didtico mais apreciado pelo autor e at a sua prpria

    formao acadmica junto a sua didtica predileta, mtodos utilizados na sua formao,

    gneros musicais mais apreciados, etc.

    Entretanto, uma bibliografia no apenas o nico material utilizado pelo autor.

    Vrios fatores contribuem mesmo de maneira inconsciente para a formao de manuais,

    so eles: gosto pessoal e principalmente, a experincia profissional. Como exemplo,

    dentro do ensino de msica, temos o manual de Harmonia de Arnold Schenberg. No

    seu tratado possvel observar a influncia que sua experincia como professor. A

    utilizao de exemplos musicais de seus alunos um reflexo desse pensamento. Suas

    concluses de uma melhor didtica para lidar com seus alunos contriburam na

    construo de seu famoso manual. Quando se trata dos livros de arranjo, muitas vezes

    esses tambm so elaborados por professores como Antnio Adolfo e Ian Guest e segue

    se o mesmo princpio cima. A conscincia dessas variveis torna as definies de

    arranjo atreladas oralidade com que professores e alunos discutem sobre conceitos e as

    tornam participantes de um processo histrico. Uma particularidade interessante o

    exemplo de Esther Scliar e seu livro de Teoria Musical. Esse livro foi editado aps o

    falecimento de Esther e baseado no contedo programtico de suas aulas e nos

    cadernos de seus alunos. Nesse caso, no h inteno inicial do autor de fazer um

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    manual, ou seja, uma preocupao formal em definir conceitos para alm da sala de

    aula. Deve se levar em conta esse tipo de informao quando um trabalho a cerca desse

    livro e suas definies forem discutidas.

    A pesquisa bibliogrfica feita no primeiro captulo deste trabalho alm de

    remeter textos com definies de arranjo, tambm aborda a oralidade ao mencionar o

    disco caf-concerto. Levar para a sala de aula definies de arranjo a partir da

    oralidade assumir a importncia do discurso oral. Um outro estudo que pode ser

    realizado a pesquisa de definies por msicos que no possuem nenhuma formao

    acadmica musical. Embora muitas vezes essas definies estejam incompletas e at

    incorretas e confusas, entender os motivos que levam a essas inconsistncias e discuti-

    los, pertinente ao se definir arranjo. Pode-se propor uma didtica diferente: no a

    partir do significado do termo arranjo, mas a partir do que no arranjo, nem do que se

    pode associar palavra. Essa discusso poder surpreender os alunos e o professor do

    quo difcil e tnue a excluso de elementos que a princpio no se correlacionam, mas

    que se interligam de maneira indireta ao contedo discutido.

    3.4 Os Diferentes Gneros Musicais e seus Contextos

    Estudar e ensinar definies sem o contexto em que elas se inserem seja ele

    social, histrico, entre outros, deixar uma lacuna significativa no estudo e uma falha

    metodolgica de pesquisa. Quando se analisa as definies da palavra arranjo, deve-se

    atentar para o contexto daquela definio. Por contexto, entende-se: Contexto o

    encadeamento de idias num escrito (...) Aquilo que constitui o texto no seu todo;

    composio; Conjunto, todo, totalidade. (Novo Dicionrio Aurlio, 1975:373).

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    Quando associamos as definies de arranjo ao contexto em que elas se inserem,

    imediatamente nos remetemos ao gnero musical que engloba aquela definio. Por

    definio de gnero, tm-se:Gnero qualquer agrupamento de indivduos, objetos,

    fatos, idias, que tenham caracteres comuns, espcie, variedade, ordem. (Novo

    Dicionrio Aurlio, 1975:373).

    Transpondo essa idia para gnero musical, esse trata de um agrupamento de

    idias musicais comuns a determinado estilo musical, onde esto inseridos padres de

    formas, fraseado, dinmicas e outros elementos musicais e que abrangem um certo

    nmero de msicas. Pressupondo pela definio de contexto que o encadeamento de

    idias musicais formam um contexto musical e que um conjunto de msicas que

    abrangem um certo nmero de idias musicais comuns formam um gnero musical,

    ento a idia de contexto musical e gnero musical esto relacionadas.

    Portanto, ao se buscar a definio de arranjo pelo dicionrio de msica Groves

    de Jazz, deve-se observar o contexto musical em que essa definio est inserida, que

    gnero musical ela abrange. No possvel a utilizao dessa definio em sua

    totalidade para se explicar arranjo no RocknRoll ou no Reggae, por exemplo. J a

    definio tradicional de Arranjo contida no Dicionrio de Msica da Zahar e no

    Dicionrio Groves, esto associadas msica instrumental, clssica, barroca,

    romntica. Associ-las integralmente ao estudo da Bossa Nova ser ignorar todo o

    conjunto de caractersticas que fazem a Bossa Nova um gnero de msica diferente

    daqueles citados pelas definies dos dicionrios. Todavia, essa anlise no busca

    desencorajar um estudo que procure gneses comuns em definies de arranjo e que

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    incorporados. Assim uma constante reviso de definies que debatida, no possvel

    de se acompanhar com manuais e tratados sobre arranjo. Ser que as definies de

    arranjo contidas nos manuais recentes de msica popular ainda so suficientes para

    defini-la? Um exemplo desse carter mutvel das definies a variabilidade de

    tamanhos que se encontram um mesmo verbete no Dicionrio Groves de msica em

    edies diferentes. Certos verbetes so ampliados devido importncia que eles

    adquiriram nos ltimos anos enquanto outros so diminudos e at excludos. papel

    fundamental do professor buscar na oralidade uma ferramenta para a troca de

    experincias e de definies.

    O carter sempre mutvel que as disciplinas encontram em suas definies no

    traz invalidade para seus contedos. Ao contrrio, situa essa disciplina num contexto

    histrico com preferncias, mtodos e particularidades prprias do seu tempo. Longe da

    viso esttica dos contedos e conceitos, possvel a aproximao do aluno como

    formador da histria daquela disciplina, agente ativo dessa histria junto ao professor.

    Aqui vale ressaltar que a incessante reavaliao de conceitos no tem como objetivo o

    subjetivismo gratuito em que perdemos todos os parmetros para justificar uma

    disciplina que no final engloba toda espcie de conceitos e, se tudo nela consta, a

    disciplina no justifica absolutamente nada. Na verdade, essa reavaliao de conceitos

    tem como fim a objetividade que se constri atravs de revises constantes e incessante

    dos manuais, sua verificao sucessiva e a acumulao de verdades parciais efetuada

    por eles. Assim, o professor deve proceder diante da disciplina sem perder o foco de

    seus contedos. Jacques Le Goff cita Paul Ricoeur em seu livro quando este ltimo

    afirma:

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    Esperamos da histria uma certa objetividade, a objetividade que lhe compete;

    a maneira como a histria nasce e renasce no-lo demonstra; ela procede sempre

    pela retificao das sistematizaes oficiais e pragmticas do seu passado,

    operadas pelas sociedades tradicionais (Goff,2003:33).

    Da mesma forma espera-se que a reviso dos conceitos fundadores de uma

    disciplina seja executada. Retificando seus sistemas e incluindo-os em seu tempo e em

    sua sociedade formadora.

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    CONSIDERAES FINAIS:

    O estudo de uma disciplina como o arranjo deve lidar com vrios aspectos como

    a produo atual de arranjos em suas diversas temticas. Assim como, a discusso de

    conceitos de um assunto to amplo deve ser constantemente atualizada em nossos

    trabalhos como pesquisadores e nas salas de aula. dever do docente incentivar o

    discente a contextualizar o ensino com suas prticas musicais e seus respectivos

    instrumentos. Alunos hoje e futuros professores, devemos levar em conta aspectos

    histricos ao estudo dos diversos gneros e suas tcnicas relacionadas na construo das

    definies alm do carter mutvel e inexorvel que o tempo presente impe s

    representaes e definies do passado.

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    31

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    DISCOGRAFIA:

    - HOLLANDA, Chico Buarque de. Chico Buarque. So Paulo. Universal,1978.

    - LED ZEPPELIN. Houses of the Holy. Londres. Atlntica, 1973.- PLANET HEMP. Os Ces ladram mas a caravana no pra. Rio de

    Janeiro. Sony, 1997.

    - LEE, Rita. Acstico MTV Rita Lee. So Paulo.Universal, 1998.

    ________. Babilnia. So Paulo. Som Livre, 1978.