Click here to load reader
Upload
pedro-almeida-custodio
View
152
Download
1
Embed Size (px)
Citation preview
A FUNÇÃO SOCIAL DA PROPRIEDADE NA DESAPROPRIAÇÃO
Maria da Glória Sá Lima1
RESUMO: O presente trabalho aborda a evolução do conceito de propriedade desde os contornos que ostentava no Império Romano até os dias atuais, concentrando-se quando ao corte temático na função social da propriedade imóvel para fins de desapropriação objetivando compreender a atuação do Estado na normatização e regulamentação dos direitos à propriedade e à desapropriação no ordenamento brasileiro.PALAVRAS-CHAVE: Propriedade, Desapropriação, Função Social, Princípio, Direito.
SUMÁRIO: 1- INTRODUÇÃO; 2- PERDA DA PROPRIEDADE/INTERVEÇÃO DO ESTADO; 3- A FUNÇÃO SOCIAL DA PROPRIEDADE; 3.1- CONCEITO E ORIGEM E CONSIDERAÇÕES PRELIMINARES; 3.2- FUNÇÃO SOCIAL NA CONSTITUIÇÃO FEDERAL BRASILEIRA; 3.3- FUNÇÃO SOCIAL DA PROPRIEDADE COMO PRINCÍPIO CONSTITUCIONAL; 3.4- FUNÇÃO SOCIAL NO CÓDIGO CIVIL BRASILEIRO; 3.5- A PROPRIEDADE URBANA E SUA FUNÇÃO SOCIAL; 3.6- FUNÇÃO SOCIAL NO ESTATUTO DA TERRA; 4- CONSIDERAÇÕES FINAIS; 5- BIBLIOGRAFIA.
1- INTRODUÇÃO
O mais importante e sólido de todos os direitos subjetivos é o direito de
real de propriedade, que congrega os poderes de usar, gozar, de dispor da coisa, de
forma absoluta, exclusiva e perpétua, como o de persegui-la nas mãos de quem
quer que injustamente a detenha e cujo desmembramento implica a constituição de
direitos reais parciais2, tem sido a base de nossa vida social.
Sendo de extrema importância não só para o direito, mas para várias
áreas do conhecimento3. Tendo sua origem, história, regime e principalmente as
ações dele decorrentes, temas de interesse muito debatido entre filósofos,
historiadores, juristas, economistas e religiosos. Uma vez que, do ponto de vista da
forma como os bens se relacionam com as pessoas, desde tempo imemoriais, o
mundo foi palco das lutas entre ideologias antagônicas, uma defendendo a
propriedade comum e outra a propriedade privada. 1 Graduando em Direito pela Universidade Regional do Cariri–URCA: 4º semestre2 Di Pietro, Maria Sylva Sanella – Direito Administrativo – 21 ed. São Paulo, Atlas, 2008. ( pag 134)3 Dentre as quais, principalmente para a filosofia, sociologia e economia política.
Sem a pretensão de nos debruçarmos sobre a parte histórica, o título
sugere que é necessário salientar esse tipo de exposição, uma vez que é relevante
identificar períodos relevantes onde a propriedade, principalmente, no aspecto
jurídico, ganhou diferentes conotações. Uma vez que o direito de propriedade sofreu
diversas modificações, sempre se adaptando às constantes alterações socio-
político-econômicas ocorridas ao longo da história.
Quanto ao momento em que surge na sociedade romana, a primeira
forma de propriedade territorial, é difícil precisar. A noção de propriedade imobiliária
individual, segundo algumas fontes, data da Lei da XII Tábuas. Nesse primeiro
período do Direito Romano, o indivíduo recebia uma porção de terra que devia
cultivar, mas, uma vez terminada a colheita, a terra voltava a ser coletiva.
Paulatinamente, fixa-se o costume de conceder sempre a mesma porção de terra às
mesmas pessoas ano após ano. Ali, o pater famílias instala-se, constrói sua moradia
e vive com sua família e escravos. Nesse sentido, arraiga-se no espírito romano a
propriedade individual e perpétua. Considerava-se o domínio sobre a terra de forma
absoluta.
Na Idade Média, com as diferentes culturas bárbaras a propriedade teve
seu conceito jurídico modificado, perdendo seu caráter unitário e exclusivista, sendo
sinônimo de poder.
O desenvolvimento da burguesia, que irá culminar na Revolução
Francesa, implicará na retomada do conceito romano de propriedade individual, de
forma puramente exarcebada, como forma de repúdio ao sistema feudal. A partir do
século XVIII, a escola do direito natural passa a reclamar leis que definam a
propriedade. Como conseqüência o código de Napoleão, traça a conhecida
concepção extremamente individualista do instituto no art. 436: "a propriedade é o
direito de gozar e dispor das coisas do modo mais absoluto, desde que não se faça
uso proibido pelas leis ou regulamentos."
Superada a Revolução Francesa, se seguiu o desenvolvimento industrial ,
bem como o surgimento de doutrinas socializantes, onde é buscado um sentido
social para a propriedade, frente aos abusos cometidos pelos grandes detentores
dos bens, móveis e imóveis. Sendo a partir daí, principalmente a partir da segunda
metade do século XX, que a propriedade foi sendo afetada por crescente número de
restrições impostas pelo estado.
Surge então, o ideário do Estado Democrático Social que busca a fusão
de dois elementos: o modelo capitalista e a consecução do bem estar social geral, o
qual é recepcionado na Constituição Mexicana (1917) e na Constituição de Weimar
(1919).
No ordenamento constitucional brasileiro, a propriedade sempre foi
preservada e o direito de propriedade foi considerado com um dos direitos
fundamentais, a partir da Carta Imperial de 18244, outorgada por D Pedro I,
consagrou em seu art. 179, XXII, o caráter absoluto do direito de propriedade "em
toda a sua plenitude”.
Estava ligada a uma noção de um direito abstrato perpetuo, que seria
usufruído independentemente do exercício desse direito, sem possibilidade de perda
pelo não-uso, no entanto, condicionava o direito de propriedade, uma vez que já
apontava para a possibilidade de o Poder Público usar e empregar o bem particular
na satisfação do bem comum, desde que legalmente autorizado e depois de paga a
devida indenização. Embora se permitisse a desapropriação por bem público, não se
pode inferir que se houvesse aí contemplado qualquer homenagem à uma função
social.
Com a queda da monarquia em 1889, instalou-se um governo republicano
no País e, em 1891, foi promulgada uma nova Constituição, fiel aos modelos
Europeus e Americano, com profunda conotação liberal, prevendo, como na anterior,
o absoluto direito à propriedade e também a possibilidade de ingerência por parte do
Estado em casos de desapropriação por necessidade ou interesse público, com
prévia indenização (art. 72, § 17).
4 Primeira legislação pátria independente, até a Independência regeu-se o Brasil pela legislação portuguesa corporificada nas Ordenações Manoelinas, Afonsinas e Filipinas.
Vale ressaltar, que foi sob a égide dessa que surgiu o Código Civil de
1916, onde se consolidou num plano mais concreto de normatividade a noção
individualista do conceito de propriedade, mas também com previsão de limites de
ordem administrativa em seu Art. 572: “O proprietário pode levantar em seu terreno
as construções que lhe aprouver, salvo o direito dos vizinhos e os regulamentos
administrativos".
A partir da Constituição de 1934 prescrevia no seu art. 113, nº 175, que se
podia perceber uma significativa ampliação da intervenção do Estado na
propriedade. O direito a propriedade ficou condicionado a não poder ser exercido
contra o interesse social ou coletivo, além de subordinar à necessidade e utilidade
pública.
A Constituição de 1937 no seu art. 112, nº 146, trouxe um retrocesso em
relação a carta anterior, uma vez que suprimiu a previsão referente à possibilidade
de intervenção do Estado na propriedade em favor de interesse social, prevendo
somente a possibilidade de desapropriação por interesse ou utilidade pública.
Foi, inclusive, sob a égide dessa Constituição que foi editado o Decreto-lei
n.º 3.365/41, cujo art. 5.º enumera as taxativas hipóteses de desapropriação por
necessidade e utilidade públicas. Não havendo ambiente para tanto, não foi prevista
a possibilidade de desapropriação por interesse social.
5 "Art. 113 - A Constituição assegura a brasileiros e a estrangeiros residentes no paiz a inviolabilidade dos direitos concernentes á liberdade, á subsistência, á segurança individual e á propriedade, nos termos seguintes:
17) É garantido o direito de propriedade, que não poderá ser exercido contra o interesse social ou collectivo, na fórma que a lei determinar. A desapropriação por necessidade ou utilidade pública far-se-á nos termos da lei, mediante prévia e justa indenização. Em caso de perigo imminente, como guerra ou commoção intestina, poderão as autoridades competentes usar da propriedade particular até onde o bem público o exija, ressalvado o direito a indenização ulterior".
6 "Art. 122 - A Constituição assegura aos brasileiros e estrangeiros residentes no país o direito à liberdade, à segurança individual e à propriedade, nos termos seguintes:
14) - O direito de propriedade, salvo a desapropriação por necessidade ou utilidade pública, mediante indenização prévia. O seu conteúdo e os seus limites serão os definidos na leis".
Na Constituição de 1946 no seu Art. 141, § 167, trouxe a restauração da
função social da propriedade, estabelecendo de modo explicito, que o uso da
propriedade será condicionado ao bem-estar social, podendo promover a justa
distribuição da propriedade, com igual oportunidade para todos, incluindo-se como
princípio da ordem econômica e social a destinação do direito, além de prevê a
desapropriação por interesse social8. No Titulo destinado à disciplina da ordem
econômica e social9, disciplinava o direito de propriedade, introduzindo na história
jurídica brasileira a possibilidade de promoção da reforma agrária.
A Constituição de 196710 pela primeira vez usou a expressão "função
social da propriedade", elencada pelo art. 157, III como princípio norteador da ordem
econômica e social, cujo fim era a realização da justiça social. A partir desse
marco jurídico-constitucional, importante se tornou o significado da expressão
função social da propriedade. Em outras palavras, afigura-se indispensável saber
quando a propriedade cumpre a sua função social.
7 "Art. 141 - A Constituição assegura a todos os brasileiros e aos estrangeiros residentes no país a inviolabilidade dos direitos concernentes à vida, à liberdade, à segurança individual e à propriedade, nos termos seguintes:
§ 16 - É garantido o direito de propriedade, salvo o caso de desapropriação por necessidade ou utilidade pública, ou por interêsse social (13), mediante prévia e justa indenização em dinheiro. Em caso de perigo iminente, como guerra ou comoção intestina, as autoridades competentes poderão usar da propriedade particular, se assim o exigir o bem público, ficando, todavia, assegurado o direito a indenização ulterior" .
8 Emenda n.º 10 de 1962, passou a prever a possibilidade dessa forma expropriatória como sanção ao proprietário rural que não adequasse a utilização de seu imóvel ao bem-estar social, assegurando-lhe, em contrapartida, indenização a ser paga em títulos da dívida pública
9 Art. 147 - O uso da propriedade será condicionado ao bem-estar social. A lei poderá, com observância do dispositivo no art. 141, § 16, promover a justa distribuição da propriedade, com igual oportunidade para todos.
10 Art. 150 - A Constituição assegura aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no país a inviolabilidade dos direitos concernentes à vida, à liberdade, à segurança e à propriedade, nos têrmos seguintes:
§ 22 - É garantido o direito de propriedade, salvo o caso de desapropriação por necessidade ou utilidade pública ou por interêsse social, mediante prévia indenização em dinheiro, ressalvado o disposto no art. 157, VI, § 1.º. Em caso de perigo público iminente, as autoridades competentes poderão usar da propriedade particular, assegurada ao proprietário indenização ulterior.
Na Constituição de 196911 a propriedade teve, mais uma vez, elencada
como um direito inviolável da pessoa humana, ao lados dos direitos, à vida, à
liberdade e a segurança, vindo expressa tanto no capitulo dos direitos e garantias
individuais quando no titulo da ordem econômica e social, o que representou uma
mudança profunda no conceito do instituto. Considerando o ambiente político em
que foram criadas, consignaram como finalidade da ordem social realizar o principia
da função social da propriedade, regulando inclusive a desapropriação rural.
A Carta Política de 198812, com inspiração social, novamente reafirma o
direito à propriedade privada, no entanto condiciona a sua destinação e defini o
conteúdo da função social da propriedade, bem como arrolando – a de modo
significativo entre os direitos fundamentais. E o fez não só quanto à propriedade
rural (art. 186), mas, também, quanto ao cumprimento da função social pela
propriedade urbana (art. 182, §2º).
11 Art. 153 - A Constituição assegura aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade dos direitos concernentes à vida, à liberdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes:
§ 22 - É assegurado o direito de propriedade, salvo o caso de desapropriação por necessidade ou utilidade pública ou por interesse social, mediante prévia e justa indenização em dinheiro, ressalvado o disposto no art. 161, facultando-se ao expropriado aceitar o pagamento em título da dívida pública, com cláusula de exata correção monetária. Em caso de perigo público iminente, as autoridades competentes poderão usar da propriedade particular, assegurada ao proprietário indenização ulterior.
§ 34 - A lei disporá sobre a aquisição da propriedade rural por brasileiro ou estrangeiro residente no País, assim como por pessoa natural ou jurídica, estabelecendo condições, restrições, limitações e demais exigências, para a defesa da integridade do território, a segurança do Estado e a justa distribuição da propriedade. Art. 160 - A ordem econômica e social tem por fim realizar o desenvolvimento nacional e a justiça social, com base nos seguintes princípios: III - função social da propriedade".
12 Art. 5.º - Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes:XXII - é garantido o direito de propriedade;XXIII - a propriedade atenderá a sua função social;XXIX - a lei estabelecerá o procedimento para desapropriação por necessidade ou utilidade pública, ou por interesse social, mediante justa e prévia indenização em dinheiro, ressalvados os casos previstos nessa Constituição;XXV - no caso de iminente perigo público, a autoridade competente poderá usar de propriedade particular, assegurada ao proprietário indenização ulterior, se houver dano;XXVI - a pequena propriedade rural, assim definida em lei, desde que trabalhada pela família, não será objeto de penhora para pagamento de débitos decorrentes de sua atividade produtiva, dispondo a lei sobre os meios de financiar o seu desenvolvimento.Art. 170 - A ordem econômica, fundada na valorização do trabalho humano e na livre iniciativa, tem por fim assegurar a todos existência digna, conforme os ditames da justiça social, observados os seguintes princípios:II - propriedade privada;III - função social da propriedade".
É de se observar que na vigente Constituição, o direito de propriedade
continua a figurar como objeto da tutela jurídica, no entanto, só se justificando diante
do pressuposto que a Constituição estabelece para que a torne suscetível de tutela:
a função social. Assim sendo, se propriedade não estiver atendendo aos inúmeros
fatores exigidos pela função social a que esta condicionada, nasce para o Estado o
poder jurídico de intervir e até de suprimi-la, se , se esta providência se afigurar para
ajustá-la aos fins constitucionalmente assegurados.
Essa introdução é necessária para chegarmos ao ponto que constitui o
objeto do presente artigo, qual seja a função social da propriedade, pois facilita
através da visualização da evolução histórica que a propriedade constitui um
instituto de caráter político, onde a ordem jurídica pode reconhecer ou não, as
características que lhe dão forma, bem facilitar a obtenção de uma idéia do sistema
de intervenção do Estado na propriedade no Direito brasileiro, o qual resulta do perfil
do Estado no mundo moderno.
2- PERDA DA PROPRIEDADE/INTERVEÇÃO DO ESTADO
Feitas essas considerações gerais, no entanto antes que partamos para a
análise específica de tema função social, cabe verificar embora superficialmente
dois pontos importantes, quais sejam: as formas de perda da propriedade e as
modalidades de intervenção estatal na propriedade privada, para que assim
possamos de forma gradativa e sistematizada fazermos uma delimitação do que
será abordado e ao mesmo tempo servir de pressuposto para uma melhor
compreensão.
O Direito de propriedade, sendo perpétuo, só poderá ser perdido pela
vontade do dono ou por alguma outra causa legal. O simples não-uso, sem as
características de abandono, não determina a sua perda, se não foi usucapido por
outrem, ainda que decorrido o tempo previsto. O Art. 589 do CC enumera alguns
casos de perda da propriedade imóvel: a alienação, a renúncia, o abandono e o
perecimento do imóvel; o artigo seguinte menciona também a desapropriação; os
três primeiros são modos voluntários, sendo o perecimento e a desapropriação
modos involuntários de perda da propriedade imóvel; a enumeração do art. 589 é
meramente exemplificativa, referindo-se à existência, no CC, de outras causas de
extinção, como a usucapião e a acessão.
O Estado pode limitar propriamente o direito de propriedade impondo
deveres aos titulares desse direito ou, enfim, suprimi-lo. Geralmente a atuação
impositora de limites negativos se faz em prol do interesse público, enquanto a
impositora de deveres positivos em proveito do interesse social. Nas hipóteses em
que ocorre a supressão do direito de propriedade, tanto o interesse público como o
interesse social pode funcionar como fundamento.
Tradicionalmente a doutrina enumera os seguintes meios de intervenção
do Estado na propriedade privada: a) servidão administrativa, b) requisição, c)
ocupação temporária, d) limitação administrativa, e) tombamento, f) desapropriação.
Sendo importante registrar que a Lei 10.257, de 10.06.2001, denominado Estatuto
da Cidade regulamentou os Arts. 182 e 183 da Constituição Federal tratando de
modalidade específica de intervenção do poder público municipal na propriedade
privada.
A desapropriação, que é na maioria das vezes tem como pressuposto a
função social é a modalidade mais gravosa de intervenção do Estado na
propriedade, com a efetivação da transferência do domínio do particular para o
Poder Público. É um procedimento pelo qual o Poder Público, compulsoriamente,
por ato unilateral despoja alguém de um certo bem, fundado nos pressupostos da
necessidade pública, utilidade pública ou interesse social, adquirindo-o, mediante
prévia e justa indenização, pagável em dinheiro ou se o sujeito passivo concordar,
em títulos de dívida pública, com cláusula de exata correção monetária, ressalvado à
União o direito de saldá-la por este meio nos casos de certas datas rurais, quando
objetivar a realização da justiça social por meio da reforma agrária.
O Prof. Hely Lopes Meirelles conceitua o pressuposto da utilidade pública
como sendo uma forma conveniente, embora não seja imprescindível de
transferência de bens de terceiros para a Administração Pública. Já o pressuposto
da necessidade pública: surge quando a Administração defronta situações de
emergência, que, para serem resolvidas satisfatoriamente exigem a transferência
urgente de bens de terceiros para o seu domínio e uso imediato. E o terceiro
pressuposto que será enfatizado de forma mais abrangente no presente trabalho, é
o interesse social que ocorre quando as circunstâncias impõem a distribuição ou o
condicionamento da propriedade para seu melhor aproveitamento, utilização ou
produtividade em benefício da coletividade, ou de categorias sociais merecedoras de
amparo específico do Poder Público.
3- A FUNÇÃO SOCIAL DA PROPRIEDADE
3.1- CONCEITO E ORIGEM E CONSIDERAÇÕES PRELIMINARES
A função social é um conceito complexo que não está relacionado
exclusivamente à produtividade, mas também ao trabalho e à proteção do meio
ambiente e do potencial produtivo do solo. Não se confunde com os sistemas de
limitação da propriedade, que dizem respeito ao exercício ao direito, mas com a
estrutura do direito mesmo, á propriedade13.
Estes, como bem diferenciou José Afonso da SILVA, "são externos ao
direito de propriedade, vinculando simplesmente a atividade do proprietário,
interferindo tão-só com o exercício do direito, e se explicam pela simples atuação do
poder de polícia". A função social, ao revés, diz respeito à estrutura interna do direito
mesmo, à propriedade e ao conteúdo que ela encerra
Tanto a história como o conceito de função social da propriedade se
confundem com os conceitos historicamente adotados pelo direito de propriedade,
sendo assim difícil definir claramente onde se encontram os fundamentos basilares
da função social da propriedade. Assim, a noção de função social é parte integrante
do próprio conceito de propriedade.
A função social da terra foi admiravelmente definida por Leon Duguit,14 ao
sustentar que a propriedade não é um direito, mas uma função social. O proprietário
ou possuidor da riqueza é vinculado a uma função ou dever social. Enquanto ele,
detentor da propriedade, cumpre essa missão, seus atos devem ser protegidos. Não
13 José Afonso da silva14Jjurista francês Léon Duguit (1959-1921). Duguit era especialista em Direito Público e elaborou a noção de serviço público como fundamento do Estado
o cumprindo ou cumprindo mal ou de forma imperfeita; se não a cultiva ou deixa que
sua propriedade se arruíne, torna legítima a intervenção do poder público para
compeli-lo ao cumprimento de sua função social de proprietário, consiste em
assegurar a utilização da riqueza conforme o seu destino15.
Os primeiros entendimentos de que aos bens se deveria dar uma
destinação social tem por base a Antiguidade Grega, principalmente no pensamento
de Aristóteles, que foi primeiro a entender que aos bens se deveria dar uma
destinação social, ensinando que os bens possuem uma imanência social; ou seja,
embora apropriados pessoalmente fazem parte de um processo interativo.
Depois de Aristóteles, a idéia só foi impulsionada por Tomás de Aquino
que influenciou a construção dos regramentos jurídicos ( jus naturalismo), onde a
defesa da posse dos bens materiais está colada ao exercício da garantia da
mantença, sem, contudo desprezar o aspecto social imanente aos bens oriundos da
ação da natureza. Sem dúvida a presença eclesial16 na discussão sobre o uso da
terra não parou com Tomaz de Aquino.
A expressão “função social da propriedade” foi difundida por
Leon Duguit,
Seguindo os ideais positivistas de Comte, exerceu influencia aos autores
com sua obra, o que deu grande impulso à doutrina da função da social
da propriedade.
O proprietário é dizer, o possuidor de uma riqueza tem, pelo fato de possuir esta riqueza uma ''função social'' a cumprir; enquanto cumpre essa missão, seus atos de propriedade estão protegidos. Se não os cumpre, ou deixa arruinar-se sua casa, a intervenção dos governantes é legítima para obrigar-lhe a cumprir sua função social de proprietário, que consiste em assegurar o emprego das riquezas que possui conforme seu destino.
15 in "Las Transformaciones generales del Derecho Privado desde el Condigo de Napoleón", trad. Castelhana,
Edit, Francisco Beltrán, Buenos Aires.
16 Prosseguiu com as Encíclicas Rerum Novarum (Leão XIII – 1891), Quadragésimo Anno (Pio XII – 1931) e Mater et Magistra (João XXIII – 1962), todas asseverando, em algum momento, acerca da importância da inclusão social via trabalho e distribuição das riquezas. Sem dúvida que o Concílio Vaticano II e mais tarde a Teologia da Libertação deram forte impulso a discussão acerca do uso da terra e do tributo social que sobre ela repousa.
A função social, exigida para a garantia do direito outorgado
constitucionalmente, implica em uma série de ônus para o seu titular, desde as
restrições de exercício, até a proibição de uso exclusivo, passando pela exigência de
um aproveitamento racional e eficiente, com a adequada utilização dos recursos
naturais e a preservação do meio ambiente.
Leon Duguit pode ser considerado o pai da idéia de que os direitos só se
justificam pela missão para qual devem contribuir e, portanto, que o proprietário se
deve comportar e ser considerado, quanto à gestão dos seus bens, como um
funcionário. De um de seus textos abstrai-se:
A propriedade deixou de ser o direito subjetivo do indivíduo e tende a se tornar a função social do detentor da riqueza mobiliária e imobiliária; a propriedade implica para todo detentor de uma riqueza a obrigação de empregá-la para o crescimento da riqueza social e para a interdependência social. Só o proprietário pode executar certa tarefa social. Só ele pode aumentar a riqueza geral utilizando a sua própria; a propriedade não é, de modo algum, um direito intangível e sagrado, mas um direito em contínua mudança que se deve modelar sobre as necessidades sociais às quais deve responder.
Contudo, apesar de sua presença constante, a noção de propriedade não
tem conteúdo estático, imutável. Ao contrário, como bem salientado por José Carlos
de Moraes SALLES, "o direito de propriedade tem sido entendido de maneira diversa
pelos povos, no tempo e no espaço, em razão das diferenças existentes entre os
sistemas econômicos, políticos e jurídicos que adotaram”.17
O direito individual de propriedade continua protegido. Contudo, passa a
apresentar uma função social, qual seja, a de possibilitar o crescimento econômico
do Estado, diminuindo as desigualdades sociais e regionais. A função social,
portanto, delimita o direito de propriedade, condiciona-o ao interesse da sociedade e
lhe confere a definição e o conteúdo.
Por outro lado, o conteúdo desta função social das necessidades e
escolhas do próprio ordenamento jurídico. A ele assiste a faculdade de, submetendo
a propriedade aos objetivos sociais, fazer emergir certos deveres e obrigações
17 SALLES, José Carlos de Moraes. A Desapropriação à luz da doutrina e da jurisprudência. 4. ed., São Paulo: RT, 2000.
consistentes em uma atuação positiva do proprietário para utilização do bem em prol
da coletividade.
Conseguintemente, o descumprimento das imposições legais, pelo uso
nocivo ou, simplesmente, pelo não uso, confere ao Poder Público o dever de sujeitar
o proprietário a penalidades, dentre as quais a mais drástica é, sem dúvidas, a
desapropriação. Isto não significa, evidentemente, o fim do direito de propriedade,
mas tão-somente o seu exercício útil e racional. As transformações, em nenhum
momento, acusam o sentido de um movimento para a abolição do direito de
propriedade.
3.2- FUNÇÃO SOCIAL NA CONSTITUIÇÃO FEDERAL BRASILEIRA
A Constituição de 1891 acrescentou como causas para a desapropriação
a necessidade ou a utilidade pública, mas, ainda, estava dominada pelo mesmo
fervor individualista na concepção do direito de propriedade. A emenda
constitucional de 1926 consistiu a primeira limitação ao direito de propriedade. A
esta limitação, que se referia às minas e jazidas minerais, a Constituição de 1934
somou a concernente às quedas d’água e ainda ressalvou, em seu artigo 113, que o
exercício do direito de propriedade não se poderia fazer contra o interesse social ou
coletivo.
Os mesmos princípios foram mantidos no texto de 1937, art. 122, n. 14, e
143, e na Lei Constitucional n. 5, de 1942. [12] A rigor, foi a Constituição de 1946 que
expressou, pela primeira vez, a preocupação com a função social da propriedade, na
esteira de copiosa legislação intervencionista que caracterizou os primeiros passos
do Estado assistencialista e da socialização do direito civil. [13]
As Constituições de 1967 e 1969 também revelavam a preocupação do
ordenamento brasileiro com a função social da propriedade. Disciplinada no art. 157,
III, da CF/67 e no art. 160, III, da CF/69 a função social da propriedade foi concebida
como princípio de ordem econômica e social.
A fim de nortear todos aqueles que estão sob a égide desta norma
constitucional, define, nos artigos 182, § 2º e 186 da CF/88, os requisitos
necessários ao cumprimento da função social da propriedade urbana e rural,
respectivamente.
Art. 182, § 2º: "A propriedade urbana cumpre sua função social quando atende às exigências fundamentais de ordenação da cidade expressa no plano diretor."Art. 186: "A função social é cumprida quando a propriedade rural atende, simultaneamente, segundo critérios e graus de exigência estabelecidos em lei, aos seguintes requisitos:I – aproveitamento racional e adequado;II – utilização adequada dos recursos naturais disponíveis e preservação do meio ambiente;III – observância das disposições que regulam as relações de trabalho;IV – exploração que favoreça o bem-estar dos proprietários e dos trabalhadores."
Portanto, somente a propriedade que a atenda a todos os requisitos dos
arts. 182, § 2º e 186 da CF/88 é que terá atendido a sua função social. Assim, ainda
que produtiva, a propriedade rural não atenderá a sua função social se a sua
produção estiver baseada em violação das normas trabalhistas, por exemplo. [16]
Os preceitos, contidos nos arts. 182, § 2º e 184, como se vê acima,
condicionam a fruição individual do proprietário ao atendimento dos múltiplos
interesses não proprietários, demonstrando a preocupação do legislador constituinte
com os dramáticos conflitos sociais. A proteção ambiental, a utilização racional das
reservas naturais, as relações de trabalho derivadas da situação proprietária, o bem-
estar desses mesmos trabalhadores são interesses tutelados constitucionalmente e
que passaram a integrar o conteúdo funcional da situação proprietária.
O art. 182 e seus §§, da Constituição, disciplinam a utilização da
propriedade urbana no âmbito bem mais amplo da política territorial urbana, tendo
por objetivo ordenar o pleno desenvolvimento das funções sociais da cidade e
garantir o bem-estar de seus habitantes. Nesta mesma linha, o artigo 184 e seus
parágrafos regulam a propriedade rural no capítulo dedicado à Política Agrícola e
Fundiária e à Reforma Agrária. Pode-se notar a previsão de diversas disciplinas de
acordo com a potencialidade econômica da propriedade, levando-se em conta a sua
destinação.
3.3- FUNÇÃO SOCIAL DA PROPRIEDADE COMO PRINCÍPIO CONSTITUCIONAL
A norma que contém o principio da função social da propriedade incide
imediatamente, é de aplicabilidade imediata, como os ao todos os princípios
constitucionais. A verificação do cumprimento da função social pode exigir juízos de
ponderação em face de outros princípios, sendo necessária a "concretização" de seu
alto grau de abstração. A própria jurisprudência o reconhece18. Realmente, afirma-se
a tese de que aquela norma “tem plena eficácia, porque interfere com a estrutura e o
conceito da propriedade, valendo como regra que fundamento um regime jurídico
desta, transformado-a numa instituição de Direito Público, especialmente, ainda que
nem a doutrina nem a jurisprudência tenham percebido o seu alcance, nem lhe dado
aplicação adquada como se nada tivesse mudado”.19
O principio vai além do ensinamento da Igreja, segundo o qual “sobre
toda propriedade particular pesa uma hipoteca social”, mas tendente a uma simples
vinculação obrigacional.20Ele transforma a propriedade capitalista sem socializá-la.
Constituindo o fundamento do regimento jurídico da propriedade, não de limitações,
obrigações e ônus que podem apoiar-se, se sempre se apoiaram, em outros títulos
de intervenção. A função social como, assinala Pedro Escribano Collado, “introduziu
na esfera interna do direito de propriedade, um interesse que pode não coincidir
como o do proprietário e que, em todo caso, é estranho ao mesmo”, constitui um
principio ordenador da propriedade privada e fundamento da atribuição desse direito,
de seu reconhecimento e da sua garantia mesma, incidindo sobre seu próprio
conteúdo.21
18 Cf. acórdão, por maioria, proferido pela 3º Câmara do 1º TAC-SP, na apelação 291.722, relator Juiz José Ozório, sob a Constituição anterior, muito menos enfática no estabelecer o principio do que a atual, o que não deixa margem a dúvida sobre a sua caracterização e operatividade imediata.19 Cf. nosso Aplicabilidade das normas constitucionais, 2ª Ed., pg. 13420 Cf. CCBB, Solo urbano e ação pastoral, p.28, n 84.21 Cf. Pedro Escribano Collado, pp. 118, 122 e 123. Nosso Direito urbanístico brasileiro
Com essa concepção é que o intérprete tem que compreender as normas
constitucionais, que fundamentam o regime jurídico da propriedade: sua garantia
enquanto atende sua função social, “ implicando uma transformação destinada a
incidir, seja sobre o fundamento mesmo da atribuição dos poderes ao proprietário,
seja mais concretamente, sobre o modo em que o conteúdo do direito vem
positivamente determinado; assim é que a função social mesma acaba por
posicionar-se como elemento qualificante da situação jurídica considerada,
manifestando-se conforme as hipóteses, seja como condição de exercício de
faculdades atribuídas, seja como obrigação de exercitar determinadas faculdades de
acordo com modalidades preestabelecidas”22. Enfim, a função social se manisfesta
na própria configuração estrutural do direito de propriedade, pondo-se
concretamente como elemento qualificante na predeterminação dos modos de
aquisição, gozo e utilização dos bens.23
Mas é certo que o princípio da função social não autoriza a suprimir, por
via legislativa, a instituição da propriedade privada. Contudo, segundo José Afonso
da Silva que pode fundamentar até mesmo a socialização de algum tipo de
propriedade, onde precisamente isso se torne necessário a realização do princípio,
que se põe acima do interesse individual. Concluindo-se portanto que o direito de
propriedade não pode mais ser tido com um direito individual.
3.4- FUNÇÃO SOCIAL NO CÓDIGO CIVIL BRASILEIRO
Como se sabe, o Código Civil Brasileiro de 1916 não definia o direito de
propriedade e se limitava a indicar, no caput do art. 524, os poderes do proprietário.
O Novo Código Civil Brasileiro de 2002, em conformidade como a disciplina
Constitucional, repetiu a norma que confere ao proprietário a faculdade de usar,
22 Cf. Fiorella D’Angelo, ob, cit. P 135; nosso Direito Urbanístico brasileiro, cit . p. 96.23 Fiorella D’Angelo, ob cit, p. 156.
gozar e dispor da coisa (Art 1.228)24, e para consolidar o caráter social da
propriedade, para reforçar o sentido social da propriedade, fez a seguinte ressalva:
O direito a propriedade deve ser exercido em consonância com as suas finalidades econômicas e sociais e de modo que sejam preservados, de conformidade com o estabelecido em lei especial, a fauna, as belezas naturais, o equilíbrio ecológico e o patrimônio histórico e artístico, bem como evitada a poluição do ar e das águas” (Art. 1.228 parágrafo 1º)
Por outro lado, o § 1º, ao vincular o exercício do direito de propriedade às
suas finalidades econômicas e sociais, visa a perseguir a tutela constitucional da
função social, reclamando uma interpretação que, para além da mera admissão de
eventuais e contingentes restrições legais ao domínio, possa efetivamente dar um
conteúdo jurídico ao aspecto funcional das situações proprietárias.
3.5- A PROPRIEDADE URBANA E SUA FUNÇÃO SOCIAL
A elevação da concentração populacional típico de grande cidade, fez
emergir problemas típicos como escassez de espaços habitáveis, precariedade do
saneamento e do transporte e elevação dos índices de poluição. A necessidade de
organizar o desenvolvimento e o crescimento urbano e de diminuir o déficit
habitacional deu ensejo à criação de políticas públicas, realizadas por meio do
planejamento urbanístico e de normas quanto ao uso e à ocupação do solo,
direcionadas às áreas consideradas prioritárias e à solução dos problemas
derivados da urbanização moderna.
Como partes da política implantada são atribuídas aos proprietários de
imóveis situados nessas áreas, certas obrigações, que passam a imprimir à
propriedade urbana significação pública específica. Não mais se admite o não uso
24 Art. 1228 – "O proprietário tem a faculdade de usar, gozar e dispor da coisa, e o direito de reavê-la do poder de quem quer que injustamente a possua ou detenha.
1º. O direito de propriedade deve ser exercido em consonância com as suas finalidades econômicas e sociais de modo que sejam preservados, de conformidade com o estabelecido em lei especial, a flora, a fauna, as belezas naturais, o equilíbrio ecológico e o patrimônio histórico e artístico, bem como evitada a poluição do ar e das águas".
do imóvel com fins meramente especulativos ou sua utilização para satisfação de
interesses exclusivamente privados. Desta forma, a função social da propriedade
urbana está vinculada ao conteúdo dessas políticas de planejamento e ordenação
urbana, que são delimitadas e especificadas no denominado plano diretor do
Município.
A analítica Carta Magna foi enfática, sem margem a interpretações, pois
explicitou que a propriedade urbana deve atender ao plano diretor da cidade para
merecer a garantia constitucional. É interessante observar que, pela primeira vez,
preocupou-se a Constituição com a natureza jurídico-ambiental da cidade e sua
expansão. Assim, a cidade não é mais disciplinada com vista à aglutinação de bens
privados ou públicos, pois adquirem outra dimensão, por força das determinações
constitucionais que formam a ordem urbanística, também chamado de meio
ambiente artificial.
3.6- FUNÇÃO SOCIAL NO ESTATUTO DA TERRA
A Emenda Constitucional n. 10, de 1964, alterando o art. 5, inc. XV, da
Constituição Federal de 1946, concedeu à União competência para legislar sobre o
Direito Agrário. Estava aberta a porta para o Estatuto da Terra, Lei 4504 de 30 de
Novembro de 1964, que recebeu a regulamentação pelo Decreto 59566, de 14 de
Novembro de 1966. Apesar de produzidos sob um regime de exceção, a novel
legislação de então, configurou-se um conjunto de normas de vanguarda, tendo, na
maioria dos dispositivos, adotado posições das mais adiantadas e consonantes ao
espírito do direito contemporâneo.
Art. 186 – A Função Social é cumprida quando a propriedade rural atende, simultaneamente, segundo critérios e graus de exigência estabelecidos em lei, aos seguintes requisitos: Aproveitamento racional adequado; Utilização adequada dos recursos naturais disponíveis e preservação do meio ambiente, Observância das disposições que regulam as relações de trabalho; Exploração que favoreça o bem estar dos proprietários e dos trabalhadores.
4- CONSIDERAÇÕES FINAIS
O conceito e a compreensão de propriedade, evoluiu do sentido individual
para o social, até atingir essa concepção moderna, sofreu inúmeras influências,
desde a antiguidade. Se observa que o conjunto de princípios que regem a ordem
jurídica de um Estado em dado momento estão fundamentalmente ligados à
concepção do modelo do próprio Estado, à divisão da sociedade em classes e à
detenção do poder político e social.
Superando velhas concepções absolutistas, a idéia da função social
alterou a estrutura do direito de propriedade, convertendo-o em poder-dever voltado
à destinação do bem a objetivos que, transcendendo o simples interesse do
proprietário, venham a satisfazer indiretamente as necessidades dos demais
membros da comunidade.
Nas Constituições anteriores a de 1988, que expressamente consignaram
a função social da propriedade, percebe-se, em todas elas, que a inclusão do
princípio se deu no capítulo destinado à ordem econômica. Se reconhece portanto a
propriedade como fator econômico, mas a condiciona ao atendimento da função
social, tornado este elemento superior aquele.
Verificamos que a função social da propriedade é um princípio
solidamente assentado sobre uma base doutrinária e legislativa, tendo sido erigido
em princípio constitucional como se pode atestar em várias passagens de nossa
constituição. Sendo evidente que a noção de função social traduz conceito jurídico
aberto (ou indeterminado). No entanto, a Constituição consignou certos parâmetros
específicos para dar alguma objetividade a citada noção, como se pode observar no
exposto nos parâmetros fixados para distinguir a função social urbana da
propriedade urbana da rural.
Por fim, constata-se que a função social é outro fundamento político
jurídico da intervenção do Estado na propriedade.
5- BIBLIOGRAFIA
ALEXANDRINO, Marcelo, Vicente Paulo – DIREITO ADMINISTRATIVO DESCOMPLICADO – 17. Ed. Ver. Atual. e ampl. – Rio de Janeiro: Forense; São Paulo: Metodo, 2009.
DI PIETRO, Maria Sylva Zanella – DIREITO ADMINISTRATIVO – 21 ed. – São Paulo, 2008 – Editora Atlas S/A.
FILHO, José dos Santos Carvalho – Manual de Direito Administrativo- 21º edição. Revis e ampl e atualizada até 31.12.2008 – Rio de Janeiro: Editora Lumen Juris 2009
SILVA, José Afonso da- CURSO DE DIREITO CONSTITUCIONAL POSITIVO – 30º edição, revista e atualizada – Editora Malheiros
OLIVEIRA, Simone Flores de. A função social da propriedade imóvel e o MST . Jus Navigandi, Teresina, ano 10, n. 880, 30 nov. 2005. Disponível em: <http://jus2.uol.com.br/doutrina/texto.asp?id=7646>. Acesso em: 24 maio 2010.
COLARES, Marcos. Breves notas sobre a função social da propriedade . Jus Navigandi, Teresina, ano 5, n. 51, out. 2001. Disponível em: <http://jus2.uol.com.br/doutrina/texto.asp?id=2254>. Acesso em: 24 maio 2010.
NEVES, Maria Carolina Scheidgger. Desapropriação para fins de reforma urbana e o Estatuto da Cidade (Lei nº 10.257/2001) . Jus Navigandi, Teresina, ano 8, n. 284, 17 abr. 2004. Disponível em: <http://jus2.uol.com.br/doutrina/texto.asp?id=5084>. Acesso em: 25 maio 2010.
Ferreira, Simone Nunes. Direito de propriedade: nas Constituições brasileiras e do MercosulSimone Nunes. Disponível em: http://www.buscalegis.ufsc.br/revistas/index.php/buscalegis/article/viewFile/32614/31823. Acesso em: 25 de maio de 2010.