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Sandra Helena Terciotti • Doutora e Mestra em Letras (Literatura Portuguesa) pela Universidade de São Paulo • Professora Assistente e Coordenadora do Programa de Nivelamento em Português e Matemática do Centro Universitário FECAP • Coordenadora e Mediadora dos Encontros Literários e Assessora da Pró-Reitoria de Extensão e Desenvolvimento do Centro Universitário FECAP • Professora de Comunicação Empresarial e Português Instrumental, respectivamente, dos cursos de Administração de Empresas e Ciências Contábeis do Centro Universitário FECAP • Experiência em desenvolvimento de disciplinas em EAD (Comunicação Empresarial; Português Instrumental – FECAP-SP; Produção e Planejamento de Cursos em EAD – SENAC-DN) e tutoria (EAD na Prática – COGEAE-PUC-SP) • Experiência na área de Letras, com ênfase em Literatura Portuguesa, bem como nas áreas de Literatura Portuguesa Contemporânea, Literatura Brasileira, Teoria da Literatura, Língua Portuguesa, Português Instrumental, Técnicas de Redação e Comunicação Empresarial • Autora do livro Comunicação Empresarial na Prática (2009) [email protected] O poder, a comunicação e o diálogo no ambiente organizacional

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  • S a n d r a H e l e n a Te r c i o t t i

    DoutoraeMestraemLetras(LiteraturaPortuguesa)pelaUniversidadedeSoPauloProfessoraAssistenteeCoordenadoradoProgramadeNivelamentoemPortugus eMatemticadoCentroUniversitrioFECAP

    CoordenadoraeMediadoradosEncontrosLiterrioseAssessoradaPr-Reitoria deExtensoeDesenvolvimentodoCentroUniversitrioFECAP

    ProfessoradeComunicaoEmpresarialePortugusInstrumental, respectivamente,doscursosdeAdministraodeEmpresaseCinciasContbeis doCentroUniversitrioFECAP

    ExperinciaemdesenvolvimentodedisciplinasemEAD(ComunicaoEmpresarial;PortugusInstrumentalFECAP-SP;ProduoePlanejamentodeCursosemEADSENAC-DN)etutoria(EADnaPrticaCOGEAE-PUC-SP)

    ExperincianareadeLetras,comnfaseemLiteraturaPortuguesa,bem comonasreasdeLiteraturaPortuguesaContempornea,LiteraturaBrasileira, TeoriadaLiteratura,LnguaPortuguesa,PortugusInstrumental,Tcnicas deRedaoeComunicaoEmpresarial

    AutoradolivroComunicao Empresarial na Prtica(2009)[email protected]

    O poder, a comunicao e o dilogo no ambiente organizacional

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    Resumo

    Neste artigo, analisaremos as interfaces existentes entre o poder, a linguagem, a cultura, a comunicao e o dilogo nas organizaes. Investigaremos ainda os motivos que subjazem interdio da fala no ambiente organizacional e as vantagens de uma gesto fundada na comunicao e no dilogo e que, por consequncia, seja participativa, visando o desenvolvimento da organizao sem, todavia, deixar de lado o indivduo.PALAVRAS-CHAVE:PODERLINGUAGEMCULTURACOMUNICAODILOGOORGANIzAO

    Abstract

    In this article we will analyze the interfaces between power, language, culture, communication and dialogue in the organizations. We will also investigate the reasons underlying the ban on speaking in the organizational environment, as well as the advantages of management based on communication and dialo-gue, and that, as a consequence, is participatory, aiming at development of the organization, yet without leaving aside the individual.KEYWORDS:POWERLANGUAGECULTURECOMMUNICATIONDIALOGUEORGANIzATION

    Resumen

    Se analizan las interfaces existentes entre el poder, el lenguaje, la cultura, la comunicacin y el dilogo en las organizaciones. Se investigan tambin los motivos que subyacen a la prohibicin del habla en el ambiente organizacional y las ventajas de una gestin basada en la comunicacin y en el dilogo y que, en consecuencia, sea participativa, con el objetivo de promover el desarrollo de la organizacin sin dejar de lado al individuo.PALABRASCLAVE:PODERLENGUAjECULTURACOMUNICACINDILOGOORGANIzACIN

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    Opodernasorganizaes

    No Dicionrio eletrnico Houaiss da lngua portuguesa, a dcima oitava acepo do verbete poder define-o como supremacia em dirigir e governar as aes de outrem pela imposio da obedincia; dominao, domnio. Desde os primrdios, o homem tem verdadeira compulso pelo poder. A histria da humanidade revela que o homem sempre esteve em busca do poder. Mesmo as sociedades tribais j possuam instrumentos de poder. A famlia, menor c-lula social, reproduz a hierarquizao do poder. Na relao marido e mulher, por exemplo, o uso do poder por um dos cnjuges sobre o outro uma forma de compensar a insegurana pessoal daquele que o exerce. A Igreja tambm no escapa do recurso ao poder. Totalmente hierarquizada, ela reproduz a prxis do capitalismo no qual o poder, centrado no capital e relacionado ao ter, a palavra de ordem. A prpria sala de aula, apesar de socializante, no deixa de reproduzir a hierarquizao do poder, e essa hierarquizao acentua-se ainda mais quando a distncia fsica entre os alunos e o professor e entre os prprios alunos for do tipo sociofugal (FREITAS, 2005), ou seja, do tipo militar, com carteiras dispostas em colunas e linhas, rejeitando ou dificultando a interatividade.

    Como vemos, a busca incessante do homem pelo poder sempre esteve pre-sente atravs dos tempos e sob as mais diversas formas. Essa onipresena do poder revela-nos que, alm de ser uma necessidade social, ele inerente ao homem. Mais do que estrutura de autoridade, o poder uma relao instru-mental entre pessoas, mais precisamente entre lderes e liderados. Para Adler e Rodman, o poder pode ser definido como a capacidade de liderar os outros (ADLER; RODMAN, 2003, p. 217). Sidinia Gomes Freitas concorda com essa proposio ao afirmar que a liderana influencia e, talvez por esta razo, vista e analisada como sinnimo de poder (FREITAS, 2006, p. 142). O exerc-cio do poder e da influncia pode dar-se de vrias maneiras, indo da liberdade de escolha coero ou coao dos liderados, ou seja, anulao do poder do outro. No entanto, por mais democrticas e sutis que nos possam parecer, as relaes de poder entre lderes e liderados so relaes de dominao que se baseiam no poder de barganha. A identificao (comprometimento provocado pelo magnetismo do lder), a internalizao (comprometimento total), a so-cializao (instruo), a coopo (ou adaptao) e a mortificao constituem exemplos de relaes de dominao e visam mudanas de atitude e no de comportamento. Relativamente mortificao, Sidinia Gomes Freitas faz a seguinte afirmao: A mortificao fortalece a identificao. Por exemplo, estagi-rios alvos de stiras de funcionrios estveis acabaro por identificar-se e aliar-se s normas vigentes (FREITAS, 2006, p. 143).

    Em seu artigo Poder, Linguagem e Ao nas Organizaes, Stewart Cle-gg (2007) afirma que falar em organizao significa necessariamente falar em poder, pois este parte essencial da realidade organizacional e jamais deixar de s-lo. No mbito organizacional, o poder e a influncia do lder advm da

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    combinao entre magnetismo pessoal e conhecimento, e a maior ou menor descentralizao de poder est ligada ao nmero de atores que desempenham as aes, ou seja: poucas mos remetem a uma baixa distribuio de poder, enquanto muitas mos remetem a uma alta distribuio de poder, o que no significa ausncia, mas descentralizao de poder.

    Alm dessa espcie de simbiose entre organizao e poder, devemos conside-rar que, no bojo de toda e qualquer organizao, existe uma dialtica entre po-der e resistncia, j que tanto o dominador quanto o dominado atuam nas re-laes de poder, embora a culpa geralmente recaia sobre o dominador. Como o poder gera o contrapoder, para impedir a ascenso deste, os lderes estabe-lecem regras ou as chamadas prticas disciplinares, abordadas por Foucault e Weber, que designam as microtcnicas de poder que estabelecem e regu-lamentam no apenas os indivduos, mas tambm a coletividade (CLEGG, 2007, p. 51). Essas prticas disciplinares podem constituir-se em mecanismos de controle do tipo pessoal, tcnico, burocrtico ou jurdico e visam exercer o poder sobre o comportamento, as disposies e a integrao dos empregados da organizao. Quando diretas e pessoais, elas podem no s invadir, mas tambm pr fim privacidade dos empregados.

    Toda organizao que se pretende eficaz necessita implantar algumas prticas disciplinares globais. Essa implementao ocorre porque, alm de constitu-rem mecanismos de controle, tais prticas reforam e possibilitam o desejo de obedincia e submisso e so formas reconhecidas de produtividade graas s estratgias de controle explcitas (regras) e implcitas (aceitao por parte do grupo). Para Clegg, a resistncia a controles formais est presente em todo processo fundamentado em prticas disciplinares num contexto hierrquico (2007, p. 53), pois os elos dos nveis hierrquicos raramente so passivos. Ou seja, se por um lado as organizaes facultam aos que esto em posio de autoridade um poder facilitador, por outro lado, so minadas pela criatividade dos empregados que acabam por encontrar uma maneira de se beneficiarem das relaes simblicas. Alm disso, por demandarem interpretao, as regras ou prticas disciplinares paradoxalmente levam inovao e negociao por parte dos liderados. Isso significa que, por mais prticas disciplinares que pos-sa haver numa organizao, o poder nunca garantido, pois sempre est su-bordinado ao dos sujeitos que constituem os objetos desse poder. Da a importncia da ao estratgica, que constitui uma tentativa de determinar a interpretao e de estabelecer aes que defendam os interesses organiza-cionais em jogo. Da tambm a preferncia, cada vez mais acentuada nos dias atuais, pela contratao de gestores jovens que, pela prpria inexperincia, no questionam nem desafiam a hierarquia da estrutura organizacional. Alis, a prtica de contratar profissionais mais jovens, alm de assegurar a obedincia autoridade, constitui uma das situaes que, segundo Maria Ester de Freitas, geram fortes vulnerabilidades entre indivduos e grupos, institucionalizam a guerra interna, reforam as ambiguidades e inseguranas sobre o empregado e adubam o terreno para a ao de predadores organizacionais (2007, p. 74).

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    Outro impeditivo para a garantia de poder o fato de o poder implicar neces-sariamente delegao de responsabilidades. Essa delegao torna o podero-so (o lder), dependente da obedincia do delegado (o liderado), pois no h como garantir ou controlar a ao daquele a quem o poder da ao delega-do, seno por meio da sua lealdade.

    Stewart Clegg (2007) afirma ainda que o indivduo visto pelas organizaes de duas formas: na teoria e na ao social, como ator simblico, e na teoria radical, como produtor. Como o indivduo , ao mesmo tempo, mo-de-obra e identidade social definida pela etnia, idade, cultura e pelo gnero, a subjetivi-dade resultante dessa identidade social limita a ao da organizao. Por isso, a questo das relaes de poder dentro de uma organizao deve considerar no s as relaes de produo, mas tambm as relaes simblicas, j que o poder interfere na hierarquia, na linguagem, na dominao (poder) e no simblico (discurso/saber). Para Clegg, essas relaes simblicas so to resistentes ao poder como as relaes de produo (2007, p. 54). O simblico e o corpo, ligados aos indivduos, so formas de resistncia ao poder organizacional que pode ser exercido simultaneamente sobre os discursos dos indivduos e sobre suas capacidades de trabalho (CLEGG, 2007, p. 54). E a nica forma de os empregadores conseguirem controlar as capacidades discursivas (simblicas) e fsicas (ao) de seus funcionrios por meio da disciplina e da relao con-tratual formal, relao que tambm constitui uma tentativa de conciliar as relaes simblicas com as relaes de produo.

    Como vimos at aqui, o poder exprime-se nas e pelas prticas disciplinares e pelas lutas que se opem ou resistem a tais prticas (CLEGG, 2007, p. 65). As organizaes funcionam, portanto, como uma espcie de teatro em que so exercidos poderes multiformes, tangveis (recursos humanos, financeiros, tecnolgicos etc.) e intangveis (conhecimento, informao etc.), e no um poder nico e absoluto. O poder uma forma de comunicao, e esta, por sua vez, tambm se constitui numa fonte e num instrumento de poder, j que o poder, a organizao e a ao exprimem-se invariavelmente nas polticas sim-blicas e em sua interpretao (CLEGG, 2007, p. 66). No , portanto, toa que a imprensa frequentemente chamada de quarto poder. Nas organiza-es, a comunicao eficaz facilita as relaes de poder, ao passo que a ineficaz dificulta-as. Alm disso, justamente por constituir-se em fonte e instrumento de poder, a comunicao tem indubitveis correspondncias com a cultura organizacional, pois a comunicao que veicula e consolida o conjunto de valores e pressupostos que constituem a cultura da organizao. Diante dessa interface entre poder, comunicao e cultura, e diante do fato de o poder, por meio das estruturas hierrquicas formais, interferir no s na hierarquia, mas tambm na linguagem, podendo levar tanto ao silenciamento quanto ao dilogo entre os atores organizacionais, faz-se necessrio analisar os motivos que subjazem interdio da fala e as vantagens de uma gesto fundada na comunicao e no dilogo.

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    Alinguagem,acultura,acomunicaoeodilogonasorganizaes

    necessrio que os executivos reconheam o poder da linguagem, j que dois teros de sua atividade profissional ocupada por ela. Relativamente impor-tncia da fala uma das faculdades da linguagem expressa por palavras nas organizaes, Sidinia Gomes Freitas afirma:

    Apesar de certa obviedade decorrente da inegvel importncia do uso da pa-lavra falada e seu peso nas relaes interpessoais, pouco os executivos sabem a respeito do uso da palavra e do lugar que a fala ocupa na vida dos homens (FREITAS, 2006, p. 145).

    Alm disso, por meio da linguagem, falada ou escrita, que se constroem as representaes da realidade e as vises de mundo de uma poca, de uma sociedade ou de uma organizao (GUERRA, 2006, p. 158). Por essa razo, a palavra e, em especial, a fala, torna-se o instrumento por excelncia da ao do executivo, o meio essencial para entrar em contato com os outros, e para obter resultados (CHANLAT; BDARD, 2007, p. 126). No entanto, no mundo do trabalho e no acadmico, a interdio da fala uma constante e ocorre supostamente em prol da eficincia e eficcia, nas organizaes, e da cientificidade, na academia, e tem como principal consequncia a inter-dio do dilogo do outro. Alm disso, a interdio da fala nas organizaes desmascara o discurso de incentivo mudana e participao. Outra con-sequncia desse silenciamento compulsrio o fortalecimento dos canais informais de comunicao, onipresentes em toda e qualquer organizao, como, por exemplo, a rdio peo ou rdio corredor. Alis, o surgimento dos grupos informais um indcio mais do que evidente da profunda violncia que representa a interdio fala. Para Chanlat e Bdard (2007), esses gru-pos, caracterizados pela metacomunicao, constituem um exemplo a ser seguido pelas estruturas formais da organizao, j que cada um de seus in-tegrantes busca sentir-se um indivduo e ver no olhar de seu interlocutor a confirmao de sua importncia, ou seja, busca o prazer de poder falar e de poder ser ouvido.

    Muitos so os empecilhos ao dilogo nas organizaes. Dentre eles, podemos citar: a inveja, o individualismo, a hierarquizao, as disputas de poder, a rapi-dez, fruto da obsesso pela eficincia/eficcia etc. O imediatismo, alis, um poderoso impedimento ao dilogo que requer conversao e, portanto, conso-me tempo. Relativamente primazia da administrao do tempo no Ocidente, Chanlat e Bdard fazem a seguinte afirmao:

    quando se entra em contato comercial com outras pessoas, de outras cul-turas, ainda respeitadoras dos rituais bsicos das conversas, que se descobre a grosseria de muitos contatos profissionais no Ocidente, e que se coloca em ques-to o valor da eficcia associada rapidez. Talvez seja uma das lies mais in-teressantes que o Japo nos tenha ensinado; o segredo do sucesso de um dirigente reside na arte de saber perder o tempo, para ganh-lo (CHANLAT; BDARD, 2007, p. 138).

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    As disputas de poder tambm constituem um forte obstculo ao dilogo, pois os que tentam buscar o poder na maioria das vezes assumem uma atitude de avareza em relao palavra, sobretudo quando se encontram nos grupos informais, e, com esse comportamento, reforam o discurso oficial que cria obstculos ao dilogo (FREITAS, 2006, p. 146). A avareza em relao palavra tambm indica obedincia e submisso, j que os dogmas administrativos da autoridade, da racionalidade e da disciplina levam institucionalizao do mo-nlogo e autocensura dos empregados. Chanlat e Bdard ressaltam o anti-intelectualismo do silenciamento compulsrio:

    espantoso notar, no contexto da administrao, quanto os executivos vivem num universo de certeza, com a impresso de detentores da verdade. Isso lhes confere um baixo nvel de tolerncia contestao e ao esprito crtico, e explica por que se fascinam pela miragem das explicaes simplistas e reducionistas (CHANLAT; BDARD, 2007, p. 138).

    Mas o maior dos empecilhos o relacionamento interpessoal. H pessoas que no desejam o dilogo, somente a discusso e o debate que pressupem a dis-puta, a competitividade, a racionalidade, a defesa de pressuposies e as justi-ficativas. O debate e a discusso, to frequentes nas organizaes, valem-se da persuaso, ao passo que os elementos centrais do dilogo so os significados compartilhados e as lideranas participativas.

    Ao comparar o dilogo e o debate, na obra Comunicao humana, Adler e Ro-dman (2003) estabelecem as seguintes diferenas entre ambos: a) o dilogo colaborativo; o debate, oposicional; b) no dilogo, a meta buscar uma base comum; no debate, a meta ganhar; c) o dilogo amplia a viso dos participan-tes e possibilita mudanas de seus pontos de vista; o debate rofora os pontos de vista do debatedor; d) o dilogo possibilita a reavaliao das suposies; o debate defende obstinadamente as suposies do debatedor; e) o dilogo faz com que os participantes pensem sobre os pontos de vista de seus interlocutores; o de-bate faz com que os participantes critiquem as posies de seus interlocutores; f ) o dilogo favorece o encontro de novas e originais solues; o debate exclui outras abordagens, privilegiando as posies do debatedor; g) no dilogo, existe a preocupao de no ofender o(s) interlocutor(es); no debate, o interlocutor retaliado, diminudo ou depreciado e no h qualquer preocupao por parte do debatedor com os sentimentos do outro ou com os relacionamentos existentes.

    Ellionor e Gerard (1998) afirmam que o dilogo uma poderosa prtica de comunicao e liderana, capaz de transformar os atores que nela se deixam envolver e, por consequncia, a cultura organizacional na qual se encontram inseridos. Segundo as autoras, o dilogo um poderoso agente de transfor-mao, porque envolve trs importantes aspectos da vida organizacional: a) a comunicao em geral; b) o desenvolvimento de lderes; c) a modificao da estrutura organizacional. Se isso j no bastasse, o dilogo ainda d outra dimenso ao trabalho, substituindo as prticas tradicionais de gerncia compe-titiva pela cultura de colaborao e parceria entre os atores organizacionais.

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    O dilogo faz-se presente nos locais onde se valoriza a construo de rela-cionamentos, a criatividade e a recusa de conflitos. sabido que lderes com habilidades tcnicas, mas sem habilidades para perceber, entender e influen-ciar as emoes de seus subordinados, tm maiores dificuldades de encontrar quem queira trabalhar com eles. Para o lder tecnicamente hbil, mas com pouca inteligncia emocional, h trs sadas possveis: a) mudar de emprego, o que significa transferir o mesmo padro de comportamento para outro lo-cal de trabalho; b) modificar suas tarefas de tal forma que dependam mais de suas habilidades tcnicas; c) desenvolver as habilidades que lhe faltam, ou seja, aprender a relacionar-se bem com seus subordinados e seus pares, exercendo a prtica do dilogo.

    Ao longo do tempo, a prtica do dilogo favorece o surgimento de nveis mais elevados de autenticidade, a melhoria das decises, do moral e do ali-nhamento em torno do trabalho compartilhado. No entanto, ainda h uma total falta de conscientizao e uma grande confuso por parte dos gestores em relao s finalidades do trabalho e, consequentemente, importncia do dilogo nas organizaes. Os gestores ainda se encontram muito presos a sis-temas de valores, normas e crenas baseados na cultura da racionalidade, da produtividade e do lucro, cultura que os desviam de relacionamentos satisfa-trios e de um trabalho mais significativo. Esse apego cultura do resultado e do lucro leva a uma crise de significados que somente ser superada com a implantao de outro tipo de cultura: a cultura do compartilhamento e do dilogo.

    Segundo Ellionor e Gerard (1998), faz-se necessrio mesclar os antigos (viso newtoniana) e os novos modos (viso quntica) de organizar e gerenciar as organizaes. O modelo mecnico de organizao partia dos seguintes pres-supostos:

    a) as organizaes tm uma estrutura hierrquica e funcionam como mqui-nas cujas peas so removveis e facilmente substituveis (os empregados);

    b) os lderes so capites que se encontram no leme de lentos navios.

    O novo modelo de organizao no qual a informao e a comunicao intra e interdepartamental, bem como o dilogo, passaram a ser essenciais requer uma nova orientao. Para as autoras, a constituio desse novo direciona-mento deve basear-se nos seguintes princpios:

    a) foco em relacionamento e processo e no em estruturas e tarefas; b) substituio do poder e do controle pela liderana compartilhada; c) substituio da fragmentao pela viso holstica; d) conscientizao de que h muitas respostas certas em vez de uma nica

    resposta certa; e) busca do significado compartilhado e do consenso em vez de decises de

    cima para baixo;

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    f ) substituio da competio pela colaborao; g) valorizao do domnio coletivo em detrimento do autodomnio; h) alavancagem da diversidade; i) valorizao do pensamento sistmico em lugar do pensamento linear;j) suspenso dos julgamentos; k) suspenso das suposies; l) prtica do questionamento e da reflexo.

    Para essas autoras, a suspenso dos julgamentos e das suposies, ou seja, o silenciamento do eu, condio sine qua non para que o dilogo possa se esta-belecer.

    Ainda segundo Ellionor e Gerard (1998), a urgncia da mudana de orientao organizacional com base na comunicao e no dilogo deve-se, sobretudo, aos desafios do mundo contemporneo, caracterizado, entre outras coisas, pela ra-pidez das mudanas, pela complexidade da realidade, pela alienao da fora de trabalho, fruto da ausncia de significado e motivao, pela integrao da diver-sidade e por um ininterrupto gerenciamento de crises. As autoras ressaltam, no entanto, que o novo modelo organizacional, orientado para a comunicao e o dilogo, deve mesclar-se ao modelo newtoniano, uma vez que no se podem abandonar por completo elementos como hierarquia e tomada de decises.

    Consideraesfinais

    Como vimos ao longo deste artigo, desde a poca das sociedades tribais, o homem busca o poder, luta pela dominao e, ao mesmo tempo, submete-se s mais diversas formas de poder. No mundo organizacional, no qual os po-deres financeiro, normativo e coercitivo esto presentes desde sempre, o exer-ccio e a sujeio do indivduo ao poder tornam-se ainda mais evidentes. No entanto, o poder gera o contrapoder e, por essa razo, no pode ser nico e absoluto, tampouco assegurado ao lder, sobretudo num mundo globalizado e tecnolgico no qual a precipitao das mudanas e a complexidade da realida-de demandam novas formas de relaes de poder, fundadas especialmente na comunicao, no dilogo e na gesto participativa, compatvel com os novos paradigmas.

    O dilogo , portanto, o meio de se chegar ao novo modelo organizacional marcado pelo significado compartilhado e pela liderana participativa. Vimos aqui que, alm de constituir um poderoso fator de transformao, o dilogo remete busca por novos significados e est em consonncia com os novos tempos que, por sua vez, demandam novas relaes de poder. Portanto, seria mais proveitoso que os lderes, detentores do poder nas organizaes, dessem mais importncia tanto ao aprimoramento da linguagem quanto a sua rele-vncia no mundo organizacional e que transformassem o dilogo numa estra-tgia para criar um mundo mais humano e sustentvel.

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