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AS IMAGENS JORNALÍSTICAS NA TRIBUNA DA LUTA OPERÁRIA E A
PRODUÇÃO DE SENTIDO(S)
Por Verusa Pinho de Sá1
As imagens utilizadas no periódico Tribuna da Luta Operária constituem uma rede
de sentidos que juntamente com a linguagem escrita (titulo, legenda, texto) expressam
uma unidade de interpretação. Tais imagens produzem sentidos e fomentam as práticas de
leitura da militância, por meio da popularização do discurso político do periódico para
compreensão da realidade social, no momento de transição entre o final do Regime Militar
e inicio da redemocratização brasileira.
Jornal vinculado ao Partido Comunista do Brasil (PC do B), a Tribuna da Luta
Operária oscilou entre o discurso jornalístico/polêmico e partidário/autoritário, teorizados
por Orlandi (2003), no sentido de apresentar diversidade dos acontecimentos sociais e
pluralidade de vozes/fontes, mas, em outros momentos, restringir-se à valorização de
aspectos inerentes à memória do coletivo.
Este artigo faz uma análise das imagens jornalísticas inerentes à imprensa partidária
a partir da observação de técnicas (tamanho, planos, enquadramento) e sentidos,
construídos pela seleção temática e articulação texto- imagem. Procura comprovar também
que as imagens são elemento constitutivo do discurso jornalístico, ora têm a finalidade de
ilustrar o texto em seu aspecto denotativo, ora existem numa significância construída a
partir de uma leitura interpretativa (BARTHES, 1990).
As imagens abrangem registros de acontecimentos (general news), retratos e
histórias em fotografia, com base nos estudos de Sousa (2004), bem como ilustrações de
caráter opinativo, a exemplo de caricaturas, cartoons e histórias em quadrinho (MELO,
2003). A autoria das fotografias é, em geral, de profissionais autodidatas, sendo algumas
1Graduanda de Jornalismo, UNEB, Campus III, e pesquisadora voluntária do Projeto “História da Imprensa
em Juazeiro: a Tribuna da Luta Operaria e a organização do Partido Comunista do Brasil (PC do B)”
coordenado por Andréa Santos, Ms em Historia Social e professora do curso de Comunicação Social:
Jornalismo em Multimeios, da UNEB, Campus III, Juazeiro-BA.
fotografias retiradas de jornais da grande imprensa, como o Diário de Pernambuco e O
Globo (JOFILLY, 22/09/07).
Como diretriz metodológica para este estudo, foram utilizadas as contribuições da
Análise do Discurso, História do Fotojornalismo e Gêneros, bem como leituras sobre a
História Política e Newsmaking (critérios de noticiabilidade) referentes aos critérios de
seleção e produção de notícias (WOLF, 1987). Além da análise dos periódicos dos anos de
1979 e 1980 e leituras de documentos partidários, a fim de compreender o poder de
mobilização da Tribuna na cultura partidária e vida social do país.
As imagens da Tribuna Operária e sua natureza metodológica
A historiadora Marialva Barbosa (2004) considera que para fazer análise histórica
de um periódico significa entendê-lo como um processo complexo, no qual estão
engendradas relações sociais, culturais, falas e não-ditos, silêncios que dizem mais do que
qualquer forma de expressão, tendo, muitas vezes, uma razão política. Na análise em
questão, o conhecimento do contexto histórico e social relacionado a cada imagem,
constitui-se base para interpretação das representações e dos sentidos produzidos e/ou
suscitados pela Tribuna.
Para a lingüista Eni Orlandi (2003), estudar a prática da linguagem compreende a
mediação necessária entre o homem e a realidade social, refere-se à tensão entre o dizível,
a memória, o retorno aos mesmos espaços do dizer, e o deslocamento, equívoco, ruptura
de processos de significação. “É nesse jogo entre o mesmo (paráfrase) e o diferente
(polissemia/metáfora), entre o já dito e o a se dizer, que os sujeitos e os sentidos se
movimentam, fazem seus percursos, (re) significam”.
No discurso da Tribuna, esse movimento contínuo é marcado por uma práxis social,
compreendida pelo “contrato de leitura” (VÉRON,1983) estabelecido entre o periódico e
seus leitores, o que ressalta a importância do contexto (tempo e espaço), bem como dos
produtores e receptores das mensagens, sujeitos com intenções marcadas pela narrativa
jornalística.
Desde a década de 20, as publicações ilustradas ganham um novo perfil, marcando a
estreita relação entre palavra e imagem, bem como entre a construção da narrativa dos
acontecimentos e o posicionamento do fotógrafo como testemunha “desapercebida” dos
2
fatos, o que caracterizaria as imagens como documento histórico (KOSSOY,1989) .
Ocorre, então, a construção de uma comunidade de imagens em torno de determinados
temas, pessoas, lugares que corrobora o processo de construção de identidades sociais,
políticas e econômicas ao longo do século XX (MAUAD, 2007).
No final do século XX, a experiência da imprensa partidária ressurge no contexto da
luta pela redemocratização do país, influenciada pela disseminação da imprensa alternativa
e pelos novos movimentos sociais, entre os anos 1970 e 1980, que contribuíram para
constituição da “sociedade civil” como espaço de conflitos e mobilização (BOBBIO,
1999). O jornal caracteriza-se, pois, como lugar de transição entre a teoria “pura” e o apelo
à ação, indispensável ao êxito da agitação e propaganda, com base na teoria marxista-
leninista (LENIN, 1979).
O recurso das imagens aparece como uma prática de leitura e educação política do
militante, com o objetivo de influenciar a opinião pública em torno da formação de
alianças, a exemplo da operário-camponesa, vista como necessária ao desenvolvimento de
um Estado que haja em prol dos trabalhadores.
Nesse sentido, o jornal estabelece uma identificação com os leitores e militantes, por
meio da constante presença de lideranças renomadas, mas também personagens
esquecidos pela grande imprensa. São os representantes do povo, bem como os “inimigos”
do partido que aparecem por meio de uma comunidade de imagens responsáveis pela
construção de identidades sociais.
Devido ao partido ser visto nas sociedades contemporâneas como lugar de mediação,
entre as necessidades sociais e as relações político-afetivas (BERSTEIN, 1996), a
identificação de elementos de uma “cultura política”, tradição, símbolos e heróis comuns,
reivindicados pelos seus porta-vozes, palavras e expressões-padrão são fontes de análise
que contribuíram para o desenvolvimento deste estudo.
Na unidade texto-imagem da Tribuna, a essência informativa da notícia traz um
sentido denotativo, mas há uma interpretação obtusa, segundo concepção do semiologista
Roland Barthes, que deixa para o campo da significância, das indagações e dúvidas, a
interpretação do discurso do periódico. Algumas das imagens vinculadas aos textos dos
leitores eram produzidas por colaboradores da Tribuna, e na unidade texto-imagem, cada
ilustração carrega uma rede de significados e anseios de natureza da imprensa partidária.
3
Nos dois primeiros anos de circulação, a Tribuna pautou diferentes temáticas
articuladas em torno das manifestações sociais que podem ser categorizadas como greves,
manifestações camponesas e a luta contra a carestia. Nesse contexto, aparecem novos
“atores sociais” (SADER, 1988), a exemplo de personagens que fazem parte da história
política partidária do país, como Miguel Arraes, José Inácio Lula da Silva, e trabalhadores
que se destacam nos encontros e manifestações ao discursar sobre as lutas populares. Tais
temáticas foram determinantes para a concretização das metas partidárias do PC do B,
defendidas pelo jornal, como a conquista da Anistia Irrestrita e formação de uma
“Assembléia Nacional Constituinte sem João Batista Figueiredo”, por meio da articulação
de uma frente democrática em parceria com organizações sociais e partidos, como a
Tendência Popular do PMDB.
As greves: da Denotação à Interpretação
Desde a edição zero, a Tribuna apresentou imagens que em seu discurso reforçam a
necessidade de desenvolver uma consciência política no trabalhador urbano e do campo,
na luta contra a ditadura militar e a favor do socialismo. Para tanto, é utilizada uma
estética inerente à linguagem partidária evidenciada pelo enquadramento de populares,
líderes políticos e expressões-padrão. Na manchete de capa Trabalhadores unem-se para
enfrentar a política salarial e a repressão, a fotografia mostra populares gritando em
primeiro plano, e uma multidão em segundo plano, no enquadramento aberto, com braços
levantados que indicam movimento, ação.
Há uma relação intrínseca com a legenda:
Votando pela greve, a única linguagem
que os patrões entendem, e o subtítulo em
caixa alta: “Novo arrocho não passará”.
A matéria discorre sobre a greve
dos 4.500 metalúrgicos da Bellgo
Mineira, de Monlevade (MG), contra o
projeto em tramitação no Congresso que
impede a reposição de perdas salariais ocorridas nos últimos quinze anos. O texto
4
demonstra a união entre as lutas sociais pelo país, e oscila entre gênero informativo e
opinativo ao citar dados, mas evidenciar o discurso partidário/autoritário diante dos fatos
sociais: “E como diz o Ministro do Trabalho ‘greve prejudica a democracia (que
democracia é esta que não reconhece o direito de greve?)’” (T.L.O: 0, 18/10/79).
Analisando o discurso contido na unidade texto-imagem, pode-se afirmar que há um
aspecto conotativo na sua leitura para além da mera elucidação dos fatos. A conotação
seria o segundo sentido, que depende da ação do criador (fotógrafo/editor), do significado
estético, ideológico e do contexto da época (BARTHES, 1990).
Se, de acordo com o discurso partidário, “o povo se une contra a repressão salarial”,
subentende-se mobilização, movimento. Por isso, a multidão é representada com braços
levantados, o que também remete à força coletiva como “única linguagem entendida pelos
patrões”. O subtítulo em caixa alta tem uma relação direta com a fotografia para chamar a
atenção ao arrocho salarial e a disposição dos metalúrgicos de lutarem contra sua
permanência. A fotografia poderia ser considerada general news, já que representa a
essência do acontecimento, uma manifestação coletiva, com caráter de retrato coletivo,
explorando traços dos sujeitos (SOUSA, 2004).
O sentimento de coletividade e interdependência é reforçado na última página (nº 4),
na qual a Tribuna apresenta um quadro do pintor Elifas Andreato, em que se acentuam
traços alusivos à vida do trabalhador, identificado pelos capacetes e roupas características.
Por sua vez, a labuta extenuante é retratada por rugas, olhar perdido e cansado. O texto
“UMA TRIBUNA A SERVIÇO DA CLASSE OPERÁRIA, DE SEU PRESENTE E DE
SEU FUTURO” tem relação direta com a imagem, na qual o presente pode ser entendido
pelos traços da velhice dos dois personagens (à esquerda), e o futuro nos traços de
jovialidade do personagem à direita. Tal caracterização demonstra a esperança de um
futuro mais digno ao trabalhador e ressalta a participação dos jovens na luta popular.
5
.
Nos demais exemplares, a Tribuna dá continuidade à pauta de reivindicações dos
movimentos sociais insurgentes, relacionando a carestia, repressão policial e greves dos
metalúrgicos à necessidade de luta organizada no intuito de fornecer um conjunto de
informação que mobilize e seja instrumento de formação política do leitor. As imagens,
por sua vez, costumam apresentar-se em plano aberto, retratando multidão de pessoas,
com instrumentos como faixas e piquetes.
No exemplar nº 10 (TLO: 22/03/1980 a 04/04/1980) a matéria São Bernardo começa
a parar traz retratos individuais de líderes como Lula e retratos-ambiente em que o
público é o elemento principal na
composição da imagem. Em uma das
fotos, revela-se a alegria (através do
sorriso) de quem vê a força de sua classe.
Em outra, o mar de mãos levantadas
para votar pela luta até a vitória final
dos metalúrgicos. O texto de Bernardo
Jofilly, com colaboração de Carlos
Oliveira e Iara Santos, sincronizado às imagens, autoria de Marisa Uchiyama, constrói
uma história em fotografia que dá idéia da dimensão do acontecimento e a mobilização da
classe trabalhadora, reforçados na matéria Máquinas paradas, nº 11 (TLO: 05-
19/04/1980) na qual a unidade da greve é ressaltada como fonte de disposição já que
“nem foi preciso fazer piquetes”. Os trabalhadores e lideranças políticas aparecem nas
fotografias como forma de aproximar o leitor do acontecimento, pois a simbologia da
6
imagem refere-se à luta dos metalúrgicos como a da unidade popular, à época, uma das
bandeiras do PC do B.
Com o fim da greve do ABC Paulista, a Tribuna preocupa-se em divulgar estratégias
desenvolvidas pelos metalúrgicos como forma de continuação da luta, a exemplo da
“marcha lenta”. O objetivo é lutar pela libertação de presos, contra a Lei de Segurança
Nacional (LSN), pela recuperação dos sindicatos sob intervenção e negociações em torno
da melhoria das condições de trabalho e de salários.
Desse modo, a Tribuna registra parte de uma história que tem profunda afirmação na
atualidade, levando-se em conta a mudança de foco dos movimentos sociais que, de
manifestações nas ruas, passam a enfatizar políticas públicas aliadas ao conhecimento dos
deveres e direitos dos cidadãos (GOHN, 2005).
Personagens e bandeiras: elogios e criticas na Tribuna
A necessidade de alianças entre partidos e movimentos populares diante da proposta
de reforma partidária idealizada pelo governo de João Batista Figueiredo é evidenciada
pelo discurso do jornal a partir do exemplar nº 2. No editorial Por uma unidade mais
avançada, propostas como as do PT, de Luis Inácio Lula da Silva, de Aurélio Peres, da
“frente social” sugerida por Miguel Arraes e da “tendência popular” dentro do Partido do
Movimento Democrático Brasileiro (PMDB) são apresentadas estrategicamente unidas e
coincidentes na oposição firme ao regime militar, pela convocação de uma Assembléia
Constituinte livre e soberana.
Nesse momento, percebe-se a medição praticada pelo jornal no cenário político
brasileiro. Ilegal, o partido não podia atuar livremente, e então, ensaiava alianças para
publicizar suas propostas, por meio de representações como a frente popular do PMDB.
Reivindicando-se como partido da classe operária, o PC do B passou a disputar espaço
com outros grupos, e, por meio dos jornais, declarava criticamente oposição a
determinadas organizações partidárias.
Na matéria A Classe Operária e os Partidos, nº 8
(TLO: 23/02/1980 a 07/03/1980) assinada por Rogério
Lustosa, há imagem que representa quadros com letras
7
aludindo aos partidos PT, Partido Trabalhista Brasileiro (PTB), PMDB. No texto, defende-
se o fortalecimento da Tendência Popular do PMDB em detrimento do PT.
No exemplar nº 11, já citado anteriormente, o quadro OS PARTIDOS DE
OPOSIÇÃO I traz matéria intitulada Qual é a
proposta do PT, autoria de Carlos Azevedo, ironizada
por um cartoon2. Na imagem, trabalhadores e patrões
discutem propostas na mesa, como pertencentes a
mesma classe, o que iria de encontro à luta de classes
teorizada pelo marxismo-leninismo pregado no
partido comunista, e evidenciaria uma política
conciliatória. O conteúdo do texto tem referência
direta com a imagem, criticando a concepção do PT de negar a “classe operária e o
socialismo”, no intuito de promover a legalização do partido.
No discurso da Tribuna, personagens populares incomuns à grande imprensa
aparecem como participantes das lutas sociais, bem como lideranças políticas, como o
líder do PCB, Luis Carlos Prestes, e do PT, Luis Inácio Lula da Silva, freqüentemente
apresentados pela Tribuna para reforçar uma memória em disputa na interpretação da
realidade (SANTOS: 2007). No exemplar nº 6 (TLO: 17/01/08 a 09/02/1980) a matéria
Líderes operários condenam agressão soviética ao
Afeganistão “Estados Unidos e Rússia: dois
imperialismos com duas facetas diferentes” há afirmação
de Lula condenando a invasão do Afeganistão por tropas
soviéticas. As fotos são perfis/retratos de quatro
personagens da luta operária, autoria de Cristina Villares
e João Bittar, e formam uma história em fotografia ou
picture story, segundo Sousa (2004), já que se debruçam
sobre um problema social, um acontecimento. Na mesma
página, existe a matéria vinculada E Prestes é a favor, ilustrada por um caricatura em que
Prestes está com uma faixa “é a última que morre” sobre um cavalo cadavérico, o que
2 segundo José Marques de Melo (2003), representação de expressão criativa que pertence ao domínio da fantasia, mantendo-se vinculado ao espírito do momento, incorporando eventualmente fatos e personagens.
8
alude ao conteúdo da legenda: “o ‘cavaleiro da esperança’ gosta de ser chamado de
‘agente de Moscou’”.
Nesse caso, a invasão ao Afeganistão é mais uma demonstração de que o
imperialismo se espalha até mesmo pela antiga União Soviética, e, para a Tribuna, há
necessidade urgente das classes trabalhadoras se conscientizarem dessa exploração e
promoverem transformações no sistema. Como líder do PCB, Prestes é constantemente
alvo de críticas, resquícios da cisão de 1962. No exemplar nº 11, Prestes diz que PCB não
é vanguarda. Caricaturado, o líder afirma ser o principal responsável pelos ‘erros e
deformações’ do partido.
Paulo Maluf, então governador de São Paulo, é outro personagem criticado pela
Tribuna. Nas fotografias, é representado
apenas por retratos ambientes, mas no texto,
percebe-se o tom combativo das palavras. Na
seção Fala O Povo, exemplar nº 10, há uma
ilustração fotográfica com um balão, como nas
revistas em quadrinho. A matéria é uma
espécie de explicação sobre a recepção popular
dada a Maluf no bairro Parque Boa Esperança, SP, na qual “puxas”, “maluk’s”, “Maluf &
Cia” estiveram presentes: “quando o povo grita, a canalhada apita (na curva)” T.L.O: 10,
22/03/1980 a 04/04/1980.
Mulheres e camponeses como sujeitos ativos nas lutas sociais
No final dos anos 70, surgem “novos atores sociais” (SADER,1988) dando mais
visibilidade e força às manifestações populares. As mulheres e os camponeses passam a
ser referenciadas pela unidade texto-imagem da Tribuna como símbolo de organização.
As mulheres ganham importância cada vez maior passando a se organizar em
congressos para discutir seus direitos como cidadãs. No exemplar nº 6 (TLO: 17/01/08 a
09/02/1980) a matéria Mulheres preparam vários congressos reforça essa idéia. Com
subtítulo elas são metade da população e cada vez mais participam das lutas populares, a
matéria traz uma fotografia ambiente em que mulher e filhos estão em primeiro plano, e a
9
favela ao fundo. A legenda: a mulher suporta em dobro os
problemas do povo brasileiro tem relação direta com
imagem, que demonstra a dupla jornada do trabalho
feminina, da fábrica ao lar. Discriminação sexual, prazer e
virgindade são temas constantemente discutidos nos
encontros, o que leva à inclusão da mulher no cenário
político.
É o caso da história em quadrinhos, comics,
segundo Melo, do caderno Fala o Povo, nº 14 (TLO: 17/05/1980 a 31/051980). A idéia
principal é facilitar o entendimento das irregularidades
praticadas por multinacionais que empregam, em geral,
mulheres. Enviada por uma leitora paulista, a história em
quadrinhos denuncia a exploração praticada pela
multinacional Toko, apresentando como solução a
organização de assembléias com todos os setores, a fim de
dignificar o exercício da profissão e o cumprimento dos
direitos dos cidadãos, registrados, mais tarde, na
Constituição de 88.
Em 1980, os conflitos no campo ganham
destaque no periódico, o jornal destaca a morte de
Raimundo Ferreira, líder sindical em Conceição do
Araguaia. O fato torna-se acontecimento jornalístico
pelo protesto
que reuniu 4
mil pessoas.
As fotografias
reforçam a essência de protesto, já que uma
multidão com faixas “companheiro gringo; teu
martírio reforça mossa luta e esperança!” e a
imagem de Raimundo Ferreira, no lado direito, identifica de quem se fala e com que
intenção se realizou a manifestação.
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No exemplar nº 08, a capa traz um desenho que ocupa praticamente a metade da
página (34 x 20,5 cm). A manchete: A guerra pela terra, constituinte da própria imagem,
tem relação com o editorial, que reforça a luta e a resistência camponesa contra os
latifundiários e grileiros, a necessidade de se firmar uma aliança operário-camponesa para
instituir um governo democrático e popular, incentivando a integração entre o campo e a
cidade.
Com seleção temática da crise financeira, que
atinge principalmente a classe trabalhadora do país, as
fotos IMAGENS DA SECA, da sucursal de Fortaleza,
nº 16 (TLO: 14 a 28/06/1980), discorrem sobre a
situação de fome, forçando os camponeses a invadirem
cidades para conseguir mantimentos nos armazéns
locais. Autoria de José Feitosa, as imagens
apresentam: No alto, à esquerda, boi morto pela seca;
ao lado, longa caminhada em busca de água; em baixo, a cacimba que começa a secar.
Na segunda, há profundidade de campo que sugere a “longa caminhada”.Juntas, formam a
história em fotografia sugerida pela legenda, citada anteriormente.
Carestia: informação e opinião pela ótica da Tribuna
A inflação é pauta recorrente no discurso da Tribuna, no qual se ressaltam
conseqüências da crise financeira, como demissões em
massa, o crescimento da influência norte-americana na
economia do país, e o aumento da dívida externa. O
conjunto de imagens que representa essa situação
permite ao leitor a formação do seu ponto de vista a
partir do entendimento e do uso que faz das
mensagens difundidas pelo jornal, já que o discurso é
inacabado, estando sempre em processo de produção
(ORLANDI, 2003).
11
A matéria A carestia de mal a pior (nº 16) apresenta
diversos recursos infográficos: gráficos explicativos,
quadros comparativos, numa linguagem clara e
contextualizada aos leitores, por meio de desenhos de
alimentos básicos, e uma charge em que o ministro do
Planejamento, Delfim Netto, parece esmagar o povo,
instigando a interpretação dos leitores por meio da
capacidade de criação do sujeito (KOSSOY, 1989).
No mesmo exemplar, o tema é apresentado de forma aprofundada, dinamizando a
leitura. A matéria principal 94,7%. E agora Delfim? traz
um panorama da crise econômica e da passividade
governamental para resolver a situação. Nas charges, FMI,
Figueiredo e Delfim se deliciam em um banquete, enquanto
sacos de dólares estão aos pés do representante
internacional. Na placa, um lembrete: “pobre não entra”, o
que reforça a desigualdade social. Os subtítulos formam
uma história, narrativa fragmentada que facilita a
compreensão do texto, por meio do humor opinativo e
contextualizado.
A dívida externa aparece no discurso jornalístico como uma das conseqüências da
carestia e fator determinante da submissão do país aos norte-americanos. Dizer NÃO ao
pagamento da dívida é quase uma obrigação proferida pelo periódico, reforçada pelo lema
nacionalista do petróleo e o crescimento de favelas nas grandes cidades.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
As imagens jornalísticas da Tribuna são parte integrante do seu discurso, pois é na
unidade texto-imagem que o periódico populariza sua mensagem para o público-leitor,
instigando-o na luta pela militância política contra a ditadura militar. As manifestações
organizadas pela sociedade civil e o surgimento de novos sujeitos históricos são temas
recorrentes no discurso da Tribuna, que em seu ideal de formação política do militante,
constrói a noção de resistência e desperta nos cidadãos o valor dos direitos humanos,
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sociais, culturais, do sentimento de justiça e igualdade social, qualidade de vida e
liberdade.
Como um documento histórico (KOSSOY, 1989) as fotografias da Tribuna revelam
uma sociedade organizada em torno da luta contra o regime militar. Sindicatos,
associações de bairro, camponeses, estudantes, diversos grupos aparecem no jornal como
construtores das mudanças, que, mais tarde, desembocam nas Diretas Já e na
Constituição de 1988. As charges e caricaturas demonstram o perfil partidário do jornal
ao ridicularizar lideres políticos, e, outras vezes, elogiar os que eram adeptos à luta
popular e democrática contra o regime militar.
Uma parte da história brasileira é narrada aos olhos do jornal, um recorte das massas
é exibido diante das páginas da Tribuna, por vezes, chocante, cruel, despertando a revolta
dos trabalhadores. Em outras, irônico, divertido, levando ao riso, à graça em meio à
reflexão proposta pelos próprios desenhos, pelas imagens. A produção de sentidos se
pretende unívoca: unir, mobilizar e resistir aos resquícios da ditadura militar, preparando
a consolidação da proposta partidária defendida pelo PC do B.
Assim, esta pesquisa em desenvolvimento tem por meta desvendar os sujeitos
produtores das mensagens, o modo como o discurso era difundido aos leitores, as
estratégias, apelos e valores que essa imprensa invocava, a partir do pressuposto de que
“fazer história é construir a nossa própria história” (BARBOSA, 2004, pág. 8).
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