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Tcnicas de tomada de deciso e ciberntica | Gonalves, C.P. Pgina 1
As Quatro Fases da Ciberntica e a Cincia da Tomada de Deciso
Carlos Pedro Gonalves
19-10-2013
Instituto Superior de Cincias Sociais e Polticas Universidade de Lisboa
Resumo
Desde a sua origem enquanto cincia do estudo do controlo e comunicao no animal e na mquina, sua expanso enquanto matriz paradigmtica para diferentes cincias, em particular para as cincias da complexidade, a ciberntica desenvolveu-se com um enquadramento metodolgico e interdisciplinar prprio, central para a cincia da tomada de deciso. Com raiz na teoria dos jogos e na primeira fase da ciberntica, a cincia da tomada de deciso acompanhou o desenvolvimento da ciberntica nas suas quatro fases, de onde resultaram novas abordagens cientficas para a tomada de deciso e novas tcnicas aplicadas de apoio tomada de deciso. No presente artigo, procede-se a uma reviso histrica e conceptual das quatro fases de desenvolvimento da ciberntica e as implicaes das mesmas para a cincia da tomada de deciso, incluindo, as perspectivas futuras para o desenvolvimento disciplinar fundamental e aplicado da cincia da tomada de deciso decorrentes da quarta fase de desenvolvimento da ciberntica, baseada no paradigma computacional quntico.
Palavras-Chave: Ciberntica, Cincia da Tomada de Deciso, Cincias da Complexidade,
Cincia dos Sistemas Qunticos Complexos, Sistemas Adaptativos Complexos,
Ciberntica Quntica.
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1. O paradigma ciberntico e a cincia da tomada de deciso
A noo de estratgia tem raiz primitiva no grego strategos, termo composto por
stratos, com o significado de exrcito, e agein, com o significado de aquele que
conduz, que guia que orienta ou que comanda. A estratgia, na democracia
ateniense, era a arte do strategos (estratego) termo hoje conhecido por general.
A cincia da tomada de deciso simultaneamente uma cincia fundamental que
investiga os processos de tomada de deciso nos sistemas adaptativos complexos e
uma cincia aplicada de suporte estratgia.
Por deciso pode-se entender uma sntese deliberativa enactiva conectando a
inteno de agir com a aco propriamente dita. Enaco uma noo introduzida por
Francisco Varela com o sentido de fazer emergir. Varela considera a cognio sistmica
como sendo enactiva no sentido em que a partir da situao concreta que o sistema
faz emergir as suas snteses cognitivas. Assim, quando abordamos a deciso, temos de
abordar um sistema em relao com um meio ao qual se tem de adaptar.
A investigao cientfica da tomada de deciso tem razes paradigmticas na
ciberntica e na teoria matemtica da deciso, decorrente da teoria dos jogos de
estratgia, exposta e trabalhada na obra Theory of Games and Economic Behavior
(Teoria dos Jogos e Comportamento Econmico) de von Neumann e Morgenstern
([1944], (1972)).
A ciberntica, com origem no grego kibernetes (timoneiro) foi inicialmente trabalhada
no seio da Filosofia por Plato e no sculo XIX por Ampre, constituindo, a noo de
ciberntica, no seio da filosofia, uma base para o pensamento poltico, central para a
Cincia Poltica e para a Administrao Pblica, com o sentido de governo eficaz
(Heylighen e Joslyn, 2001).
Posteriormente, j no sculo XX, o matemtico Norbert Wiener (1948) recuperou a
noo e, na sua obra Cybernetics: Or Control and Communication in the Animal and the
Machine (Ciberntica: Ou Controlo e Comunicao no Animal e na Mquina), definiu
ciberntica enquanto rea cientfica que tem por objecto o estudo do controlo e
comunicao no animal e na mquina.
A proposta de Wiener constituiu uma sntese de trabalhos de diferentes cientistas no
ps-Segunda Guerra Mundial (incluindo von Neumann), confluentes para uma nova
cincia acerca da organizao, comunicao e relaes de controlo nos sistemas. A
ciberntica, tal como foi definida por Wiener, resultou de uma srie de encontros
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interdisciplinares ocorridos entre 1944 e 1953 que reuniu um conjunto de intelectuais
do ps-Segunda Guerra, incluindo: Norbert Wiener; John von Neumann; Warren
McCulloch; Claude Shannon; Heinz von Foerster; W. Ross Ashby; Gregory Bateson e
Margaret Mead. Estes encontros passaram a ser conhecidos como as Conferncias de
Macy sobre a Ciberntica (Macy Conferences on Cybernetics) (Heylighen e Joslyn, 2001;
Dupuy, [1994], 2000).
Da sua focagem original no funcionamento das mquinas e dos animais, a ciberntica
expandiu rapidamente o seu enfoque para abranger linhas de investigao prprias no
seio das cincias cognitivas e dos sistemas sociais. Durante a dcada de 1950, a
ciberntica veio a intersectar-se com a teoria geral dos sistemas de von Bertalanffy, no
sentido em que ambas abordavam sistemas abertos evolutivos.
2. A primeira fase da ciberntica e a teoria dos jogos
Durante as dcadas de 1950 e 1960, a ciberntica investigou noes como
mecanismos teleolgicos, feedback e auto-regulao. As noo de rudo associada
teoria da informao de Shannon, os contributos da teoria dos processos aleatrios de
Wiener constituram uma base importante para a primeira fase da ciberntica.
O contexto paradigmtico da primeira fase da ciberntica caracterizado pela teoria
da informao de Shannon e pelo modelo de computador clssico de Turing e de
autmato de von Neumann. A base computacional do computador clssico
caracterizada por um tipo de computao simblica, redutvel a um clculo e
funcionamento mecnico, tal que a base cognitiva da primeira fase assumida em
termos de uma racionalidade calculatria mecnica, sintetizada na teoria dos jogos, a
partir da noo e postulados comportamentais do homo economicus.
O homo economicus constitui um modelo operativo de jogador racional, para a teoria
dos jogos desenvolvida por Von Neumann e Morgenstern ([1944], (1972)) e por Nash
(1950a,b,c,d; 1951). O homo economicus modelvel como um agente mecnico
calculador, sem qualquer substrato emocional que visa maximizar os seus ganhos
individuais tendo em ateno as estratgias alternativas dos restantes jogadores,
pressuposto que permitiu a Nash desenvolver o seu teorema de equilbrio de jogo.
A teoria dos jogos, no contexto paradigmtico da primeira fase da ciberntica, foi,
assim, desenvolvida a partir de uma base mecanicista, em torno de uma noo de
equilbrio coincidente com um comportamento calculatrio optimizador da parte dos
jogadores, clculo, este, que pressupe o conhecimento de todo o espao estratgico
do jogo, isto : todas as combinaes de estratgias alternativas para todos os
jogadores e respectivos payoffs.
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3. A segunda fase da ciberntica e as tcnicas de tomada de deciso
A segunda fase da ciberntica iniciou-se na dcada de 1970 com um movimento no
seio da prpria ciberntica de diferenciao em relao s abordagens mais
mecanicistas, resultado do desenvolvimento da prpria ciberntica em torno das
questes da autonomia, auto-organizao e cognio nos sistemas, desenvolvimento,
este, que introduziu uma divergncia em relao engenharia de controlo e ao
paradigma mecanicista da computao.
Com uma forte influncia das cincias da complexidade, ento no seu incio, com os
trabalhos de Prigogine em colaborao com o grupo de Bruxelas1 e com os trabalhos
de Haken na sinergtica2, a ciberntica orientou-se fortemente para aplicaes
biologia, ao entendimento dos organismos biolgicos e da evoluo. O movimento
conhecido por ciberntica de segunda-ordem, iniciado por von Foerster, com as noes
de ordem por rudo, auto-organizao e autopoiesis, tornou-se uma base central
paradigmtica para as prprias cincias da complexidade (Heylighen e Joslyn, 2001).
A noo de ordem por rudo de von Foerster sintetizou todo um corpo emprico
resultante da termodinmica de sistemas complexos, incorporando, simultaneamente,
o papel auto-regulao e do feedback, no sentido em que um sistema aberto evolutivo
pode conseguir sustentar a sua actividade vital, servindo-se de aleatoriedade dinmica
como fonte de organizao sistmica. O risco, ligado a uma ameaa vital actividade
sistmica, passou, assim, a ser considerado como desempenhando um papel central na
prpria actividade adaptativa do sistema: na sua aco vital, o sistema despende
energia e expe-se a ameaas associadas a uma tendncia para um fluxo desagregador
entrpico3.
1 Das colaboraes de Prigogine com o grupo de Bruxelas (da Universidade Livre de Bruxelas) e com a
Universidade do Texas, resultou uma das trs grandes escolas de pensamento sobre a complexidade: a escola de Bruxelas-Austin. 2 A sinergtica uma rea interdisciplinar de investigao sobre a complexidade, centrada nas noes
de auto-organizao, emergncia e cooperao sistmica. A sinergtica foi introduzida por Haken enquanto noo, trabalhada a partir do grego synergein () com o significado de trabalhar em conjunto, cooperar. A sinergtica est associada escola de Estugarda que juntamente com a escola de Bruxelas-Austin constituem as duas mais antigas escolas de pensamento sobre a complexidade. Para mais detalhes ver: http://www.scholarpedia.org/article/Synergetics. 3 A perda de energia por dissipao, na actividade sistmica, corresponde a uma dinmica que est
ligada noo de entropia, noo da termodinmica postulada enquanto quantidade conectada com as transformaes ocorridas no seio de um sistema. Enquanto que um sistema isolado (que no faz trocas de energia e matria com o meio) tende para uma dissoluo entrpica naquele que constitui um equilbrio termodinmico (estado de entropia mximo/morte sistmica), um sistema aberto pode sustentar uma actividade complexa longe do equilbrio termodinmico, atravs de trocas permanentes de energia e matria com o meio, assim, para sobreviver, o sistema tem de agir, perdendo com isso energia (principalmente sob a forma de radiao trmica), para compensar essa perda, o sistema tem de
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A auto-organizao dos sistemas complexos e a cognio adaptativa tornaram-se
questes centrais durante a segunda fase da ciberntica. Na sua segunda fase, a
ciberntica, de cincia transdisciplinar que investigava o controlo e a comunicao nos
sistemas vivos e mecnicos, passou a ser uma base paradigmtica de investigao
acerca dos sistemas complexos, na qual se inserem as cincias da complexidade,
enquanto cincias transdisciplinares que investigam a complexidade e os sistemas
complexos.
A teoria do caos e as principais escolas da complexidade (a escola de Bruxelas-Austin
(Prigogine), a escola de Estugarda (Haken) e a escola de Santa F4) expandiram-se
durante a segunda fase da ciberntica, definindo o principal campo problemtico da
investigao no seio do paradigma da segunda ciberntica.
A segunda fase da ciberntica caracterizada por um novo paradigma
computacional/cognitivo, a saber: o paradigma da computao evolucionria. A
computao evolucionria desenvolveu-se, por um lado, na sequncia de tentativas de
incorporar os modelos evolucionrios da biologia na computao e, por outro, na
sequncia da expanso do projecto da vida artificial, com raiz na primeira ciberntica e
nos trabalhos de von Neumann na teoria dos autmatos. A vida artificial um ramo da
cincia da computao que visa simular a vida em computador.
Os algoritmos genticos de Holland, os autmatos celulares investigados por Ulam e
Wolfram, a teoria dos jogos evolucionria de Maynard Smith e Price constituram
elementos centrais convergentes para um novo paradigma computacional com
consequncias ao nvel das teorias cognitivas da segunda fase da ciberntica.
J no presa a um paradigma mecanicista de computao simblica, a ciberntica, na
sua nova fase de expanso, passou a abordar a cognio adaptativa dos sistemas
complexos quer em termos de trabalho emprico quer em termos de tentativa de
simulao informtica. A construo de modelos de simulao de sistemas adaptativos
complexos em coevoluo passou a constituir uma das principais ferramentas das
cincias da complexidade, com aplicaes directas s tcnicas de tomada de deciso,
incorporando, em termos metodolgicos, a abordagem para a investigao
fundamental e aplicada acerca da deciso em sistemas complexos adaptativos.
consumir matria e energia do meio como forma de alimentar a sua actividade. Qualquer sistema vivo um sistema complexo longe do equilbrio. 4 A escola de Santa F a mais recente das grandes escolas da complexidade, sendo desenvolvida pelo Instituto de Santa F que nasceu na dcada de 1980, fundado principalmente por investigadores do Los Alamos National Laboratory (http://www.lanl.gov/index.php). Para mais detalhes ver: http://www.santafe.edu/.
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4. A terceira fase da ciberntica e as tcnicas de tomada de deciso
A dcada de 1980 marcou a transio da segunda para a terceira fase da ciberntica. A
terceira fase resultou de uma maturao das cincias da complexidade que cresceram
na sua base conceptual, expandindo-se em particular com o desenvolvimento da
investigao da vida artificial e da inteligncia artificial, investigao, essa, que deu
origem s tcnicas de modelao baseada em agentes, tambm conhecida como
simulao multiagentes.
O propsito central da modelao baseada em agentes construir modelos em
computador de sistema complexos e investigar os padres (estatsticos) emergentes
comparando-os com os padres (estatsticos) observados nos sistemas reais concretos,
permitindo simular em computador caractersticas centrais desses mesmos sistemas
reais concretos, como base para a investigao fundamental e aplicada.
Em termos metodolgicos, as cincias da complexidade puseram em causa o
paradigma reducionista, tendo demonstrado que, para se investigar sistemas
complexos, necessrio abordar as relaes entre as partes e investigar os padres
emergentes, padres que no se encontram nas partes mas que so identificveis no
comportamento global agregado do sistema.
A investigao desse comportamento global que no redutvel s partes, implica a
necessidade de se simular em computador as relaes e dinmicas sistmicas das
partes avaliando a emergncia de padres estatsticos, de tal modo que se pode
identificar uma relao entre a dinmica coevolutiva das partes responsvel pelos
padres emergentes.
As noes de emergncia, coevoluo, adaptao e complexidade tornaram-se noes
centrais na terceira fase de desenvolvimento da ciberntica, marcada pela expanso
da modelao baseada em agentes como ferramenta de base de investigao no seio
das cincias da complexidade e como ferramenta de base de aplicao no seio das
tcnicas de tomada de deciso.
5. A quarta fase da ciberntica e as tcnicas de tomada de deciso
A quarta fase da ciberntica pode ser identificada com a transio para o sculo XXI,
embora tenha ainda razes na dcada de 1990. A quarta fase caracterizada por um
novo paradigma no seio da teoria da informao e da teoria da computao, conforme
o esquema seguinte que passamos a explicar:
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Ciberntica Paradigma informacional Paradigma computacional
Primeira Fase Teoria da informao clssica de Claude Shannon
- Computao simblica mecnica; - Teoria dos autmatos.
Segunda Fase - Computao evolutiva; - Vida artificial.
Terceira Fase - Modelao baseada em agentes (vida artificial e inteligncia artificial).
Quarta Fase Teoria da Informao quntica
- Computao quntica
A quarta fase da ciberntica caracteriza-se pelo surgimento de uma nova teoria da
informao e por um novo ramo da computao, a saber: a teoria da informao
quntica e a computao quntica.
Enquanto que, nas trs fases anteriores, a teoria da informao clssica de Claude
Shannon foi a teoria prevalecente, na quarta fase, a teoria da informao quntica
passou a caracterizar um novo ramo paradigmtico no seio da ciberntica, a saber: a
ciberntica quntica.
A ciberntica quntica lida com a dinmica quntica dos sistemas complexos, incluindo
os sistemas adaptativos complexos. Embora a ciberntica quntica seja recente, a sua
raiz pode ser localizada na dcada de 1950 nos trabalhos de Hugh Everett no contexto
da mecnica quntica.
A mecnica quntica lida com os campos fundamentais da Natureza e com as
partculas (quanta) que lhes correspondem. As interaces fundamentais dos sistemas
fsicos e as suas propriedades dependem da dinmica ondulatria dos campos.
Contudo, para se investigar os campos necessrio interagir com os mesmos, o que
tem como consequncia uma alterao do comportamento ondulatrio dos campos,
esta alterao imprevisvel, existindo sempre propriedades fsicas dos campos que
no se conseguem medir, o que implica uma incerteza fundamental humana quando
se faz medies em contextos experimentais (princpio de incerteza de Heisenberg).
Na mecnica quntica, desenvolveu-se um formalismo matemtico que permite lidar
com esta incerteza presente microescala subatmica, atmica, molecular, celular e
infracelular, identificando-se que o comportamento estatstico observado nas
experincias laboratoriais tem um grau de previsibilidade calculvel em termos
estatsticos e sintetizvel em medidas de probabilidade. Os fsicos identificaram, no
padro estatstico observado, por seu turno, marcas do comportamento ondulatrio
dos campos, o que permitiu a Schrdinger (1926) a introduo de uma equao para
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esse mesmo comportamento ondulatrio (a chamada equao de Schrdinger) que
Born conectou com a teoria probabilstica (Born, [1969], 1986).
Assim, o postulado formal de uma funo matemtica (a funo de onda) passou a ser
a base para conectar, no formalismo da mecnica quntica, os padres estatsticos ao
comportamento ondulatrio dos campos, permitindo prever o comportamento dos
sistemas qunticos utilizando a funo de onda (funo matemtica), nomeadamente:
as regies em que a ondulatria tem a sua maior amplitude correspondem s regies
com maior probabilidade, de acordo com o clculo baseado na funo de onda.
A interpretao fsica da funo de onda tem sido um dos principais problemas que
tem dividido os fsicos. O facto de a teoria funcionar, isto , de as previses estatsticas
calculadas com base na funo de onda serem confirmadas em termos experimentais,
permitiu teoria expandir-se em termos do seu universo aplicado, utilizando a funo
de onda e a equao de Schrdinger como instrumento de clculo, as principais
tecnologias dos nossos dias, desde a televiso aos computadores, telemveis, internet,
no seriam possveis sem a mecnica quntica, o facto experimental testado e
confirmado da eficcia preditiva da teoria tem permitido sustentar toda a indstria
tecnolgica avanada e o desenvolvimento tecnolgico do ps-guerra, mesmo sem
que a cincia concorde acerca do modo como devemos interpretar, em termos fsicos,
a funo de onda.
Hugh Everett III, na sua tese de doutoramento, deu origem a uma linha de
interpretaes que tem vindo a ganhar cada vez mais adeptos, em particular junto dos
especialistas em computao quntica, cosmlogos e astrofsicos.
Na sua proposta, Everett incorporou a teoria da informao de Shannon e a
ciberntica como base para interpretar a medio de propriedades fsicas e para
interpretar a funo de onda.
Everett aborda a cognio em termos de uma interaco sistmica entre observador e
sistema observado, interaco atravs da qual observador e sistema observado
passam a formar uma teia sistmica qual se refere a funo de onda enquanto
quantidade estatstica, assim, somos forados a considerar a funo de onda
(introduzida na mecnica quntica como funo de estado) enquanto quantidade
estatstica luz de uma noo de estado relativo5, isto , deixamos de poder atribuir
ao sistema observado um estado fsico mas, sim, temos de considerar a teia relacional
entre observador e observado, apenas a partir dessa mesma teia relacional que
podemos considerar a funo de onda enquanto quantidade estatstica que descreve a
dinmica sistemicamente correlacionada entre observador e observado.
5 Noo introduzida por Everett.
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A proposta de Everett aproxima-se da cognio enactiva de Varela, no sentido em que
a cognio implica uma relao interactiva entre sistemas, tal que, no caso quntico,
conforme decorre do trabalho de Everett, o prprio observador tem de ser abordado
em termos qunticos enquanto totalidade sistmica tal que os ritmos ondulatrios do
observador tm de sincronizar com os ritmos ondulatrios do sistema, de onde resulta
uma forma de entrelaamento quntico relacional entre sistema observador e sistema
observado que fazem emergir uma teia sistmica entrelaada, com o seu prprio
campo ondulatrio no-local, a funo de onda tem, no formalismo de Everett, uma
interpretao estatstica em termos dessa mesma teia entrelaada, de tal modo que
uma descrio do comportamento do sistema local (em relao ao observador ou, em
alternativa, em relao ao sistema observado) uma descrio incompleta, o campo
emergente no-local.
A implicao da interpretao de Everett a de uma ligao ntima de cada sistema
com o Cosmos, enquanto parte do mesmo, ligao essa que, como decorre do trabalho
de Everett, conduz a uma abordagem universal da prpria mecnica quntica, a teoria
quntica passa a poder ser generalizada enquanto teoria sistmica acerca desta teia
relacional csmica, lidando com o entrelaamento dinmico entre as estruturas no
Cosmos. Deixamos de poder abordar a cincia em termos de uma separao entre
observador e observado, fazemos parte do Cosmos, qualquer sistema complexo
adaptativo tem de ser abordado em relao, no podemos pois abordar os jogos
considerando cada jogador em separado, cada alternativa em separado.
Com o desenvolvimento da mecnica quntica, na segunda metade do sculo XX, e
primeira dcada do sculo XXI, este entrelaamento quntico passou a ser identificado
como a fonte do comportamento clssico trabalhado na mecnica clssica. Assim, a
mecnica clssica constitui um padro dinmico emergente sustentado pelo nvel
quntico que caracterizado por uma ondulatria relacional e dinmica coevolutiva
sistmica de cariz mais prximo de uma computao orgnica coevolutiva do que de
uma computao mecnica simblica.
A ideia de que a informao deve ser trabalhada a partir de uma dinmica cognitiva
sistmica j presente ao nvel fundamental constitui uma das consequncias do
desenvolvimento matemtico da prpria computao quntica.
A computao quntica difere da computao clssica em mltiplos pontos que vieram
a integrar a proposta central da teoria quntica dos jogos que difere da teoria clssica
dos jogos de Von Neumann, Morgenstern e Nash em vrios pontos centrais, a saber:
O sistema avalia a totalidade decisional, ou seja, o sistema avalia todos os
caminhos alternativos em simultneo, pesando-os no seu clculo estratgico;
A deciso relacional, ou seja, o clculo decisional tem uma natureza enactiva.
A teoria quntica dos jogos tem dois nveis de aplicao, a saber:
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Enquanto generalizao matemtica para efeitos de aplicao a sistemas
sociais e biolgicos: aqui falamos de comportamentos tipo qunticos, no caso
dos sistemas sociais, permite abordar jogos dinmicos coevolutivos em que no
existe uma estabilidade probabilstica, as probabilidades mudam com o jogo e
com a prpria dinmica de aprendizagem dos jogadores;
Enquanto teoria fundamental integrada na investigao acerca da cognio
adaptativa dos sistemas adaptativos complexos.
Estes dois nveis de aplicao decorrem do desenvolvimento das cincias da
complexidade qunticas que se desenvolveram na quarta fase da ciberntica.
Nomeadamente, na cincia dos sistemas qunticos complexos, encontramos a
aplicao da teoria quntica dos jogos modelao econmica (econofsica quntica),
com generalizaes para outras aplicaes s cincias sociais, para a modelao do
risco financeiro (finanas qunticas) e para a modelao das dinmicas de risco
interconectadas, no contexto da matemtica do risco. Estas aplicaes, em particular,
modelao do risco financeiro, apresentam uma maior eficcia do que a dos modelos
de jogos evolucionrios clssicos (Gonalves, 2011; 2013).
No esquema seguinte, encontramos uma estrutura geral de algumas das principais
reas de investigao da cincia dos sistemas qunticos complexos:
Cincia dos Sistemas Qunticos
Complexos
Computao
Quntica
Vida Artificial Quntica
Inteligncia Artificial Quntica
Caos Quntico
Sistemas Qunticos Abertos
Estruturas Dissipativas Qunticas
Econofsica Quntica
Teoria Quntica dos Jogos
Finanas Qunticas
Modelao de Risco
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Enquanto que o ramo inferior, decorrente da econofsica quntica, e que inclui a teoria
quntica dos jogos, constitui uma rea de aplicaes do formalismo matemtico da
teoria quntica, generalizadas interdisciplinarmente para investigao no seio da
economia e de outras cincias sociais, no ramo superior da computao quntica
(inteligncia artificial quntica e vida artificial quntica) que encontramos a base para
uma nova cincia dos sistemas adaptativos complexos que incorpora a teoria quntica
enquanto teoria fundamental integrada na investigao interdisciplinar acerca da
cognio adaptativa em sistemas adaptativos complexos, investigao, essa, que
poder vir a ter implicaes fundamentais futuras, no somente em termos
tecnolgicos, como tambm em termos do conhecimento acerca das dinmicas
decisionais, com consequncias ao nvel da cincia dos processos de tomada de
deciso.
Esta ltima rea de investigao insere-se no seio da ciberntica quntica, que se
desenvolveu enquanto nova base paradigmtica transdisciplinar da quarta fase da
ciberntica e em que se insere a cincia dos sistemas complexos qunticos.
Existem trs grandes reas de investigao que decorrem da base paradigmtica da
ciberntica quntica e que so relevantes para a cincia da tomada de deciso, a
saber:
A computao adaptativa quntica, com aplicaes interdisciplinares biologia
quntica, vida artificial quntica e modelao baseada em agentes
(generalizvel para aplicaes aos sistemas sociais);
A cognio quntica, enquanto novo ramo das cincias cognitivas, que suporta,
em particular, a neurocincia quntica;
Uma nova cincia geral dos sistemas, em que se destaca a importncia da
dinmica quntica dos campos.
O esquema seguinte sintetiza estas novas linhas de investigao, desenvolvidas a partir
da base paradigmtica da ciberntica quntica e que se prendem com a cincia dos
sistemas complexos qunticos.
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Relativamente computao adaptativa quntica, esta rea cientfica suporta, por um
lado, a investigao em biologia quntica e, por outro, a investigao em vida artificial
quntica e inteligncia artificial quntica, bases de um novo paradigma computacional
em desenvolvimento e que tem implicaes em cada um dos ramos acima.
A biologia quntica constitui uma rea central para a investigao emprica acerca do
papel das dinmicas qunticas na auto-organizao e adaptao dos organismos, com
implicaes directas na cincia de tomada de deciso e, em particular, na teoria
quntica dos jogos que adquire, neste ponto, um suporte emprico, deslocando o ramo
matemtico da teoria dos jogos do seu cariz eminentemente normativo para uma nova
rea de cincia aplicada enquanto teoria biolgica.
De facto, a teoria dos jogos clssica de Von Neumann, Morgenstern e Nash
eminentemente normativa, procura fornecer ferramentas matemticas para suportar
a deciso, dizendo como devemos jogar para obter melhores resultados. A teoria dos
jogos evolucionria, por seu turno, ainda no seio do paradigma clssico, visa a
investigao em torno dos sistemas adaptativos complexos e, assim, visa avaliar de
que modo os padres emergentes das dinmicas coevolutivas destes sistemas podem
ser abordados matematicamente e simulacionalmente por modelos de jogos
evolucionrios.
A teoria quntica dos jogos, nascida da econofsica, encontra uma nova rea de
aplicao e de empiria, passvel de suportar o desenvolvimento de teoria com poder
explicativo acerca dos sistemas biolgicos.
Em 17 e 18 de Dezembro de 2012, realizou-se, no Institute of Advanced Studies (IAS),
da Universidade de Surrey, uma conferncia sobre biologia quntica, organizada pelo
Ciberntica Quntica
Computao adaptativa quntica
Biologia quntica
Cognio quntica Neurocincia
quntica
Nova cincia geral dos sistemas
Importncia da dinmica quntica
dos campos
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IAS em conjunto com o Biotechnology and Biological Sciences Research Council
(BBSRC) e a MILES (Models and Mathematics in Life and Social Sciences ). A
conferncia visou abordar os seguintes pontos centrais :
A necessidade da teoria quntica para a investigao dos sistemas biolgicos;
Novas abordagens para o estudo de sistemas qunticos abertos;
Dinmica quntica na fotossntese (teoria e experimentao);
Dinmica quntica em enzimas (teoria e experimentao);
Efeitos qunticos no ADN e mutaes (teoria e experimentao);
Outros sistemas experimentais (como por exemplo: sensoriais, neurais);
A conservao da coerncia quntica em ambientes celulares quentes e hmidos.
Os pontos escolhidos para a conferncia justificam-se face nova evidncia do papel
da mecnica quntica nos organismos biolgicos, destacando-se, em particular, os
seguintes pontos relevados pelos organizadores da conferncia:
A evidncia de que plantas utilizam uma forma de computao quntica para
calcularem como melhor dirigir energia atravs do seu aparato fotossinttico;
A descoberta de que os pssaros, insectos e outros animais podero utilizar o
entrelaamento quntico para detectar o campo magntico da terra;
Evidncia de que as enzimas utilizam dinmicas qunticas para acelerar as reaces
qumicas;
Evidncia acerca do possvel papel da mecnica quntica no sentido de olfacto;
Evidncia de que comportamentos qunticos que se pensava, previamente, apenas
possveis em sistemas laboratoriais altamente rarefeitos, a temperaturas prximas do
zero absoluto, poderem tomar lugar no mundo biolgico quente e hmido.
Estas descobertas recentes, sublinhadas pelos organizadores da conferncia,
constituem uma primeira evidncia, reconhecida pela comunidade cientfica da
biologia e da fsica, de como a vida, nas suas estratgias de sobrevivncia, tira partido
dos comportamentos qunticos.
A hiptese de que a teoria quntica poder ser til para a biologia no nova, em
1963, Ldwin publicou um artigo no jornal cientfico Reviews of Modern Physics acerca
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de possveis dinmicas qunticas associadas s mutaes genticas. Mais
recentemente, McFadden e Al-Khalili (1999), por seu turno, apresentaram, numa linha
semelhante, um modelo quntico acerca da possibilidade de organismos conseguirem
dirigir as suas prprias mutaes, tirando partido dos comportamentos qunticos da
matria, hiptese que argumentada com base em evidncia da bactria E. coli.
Este argumento, consistente com as cincias da complexidade, , contudo,
incompatvel com a hiptese darwiniana de mutaes no-dirigidas, que o organismo
possa ter respostas adaptativas com expresso em mutaes dirigidas do seu ADN,
tendo como efeito mutaes adaptativas, escapa ao (neo)darwinismo, introduzindo a
questo de uma evoluo estrategicamente (auto)dirigida por via de uma dinmica
(quntica) de gerao selectiva de mutaes (McFadden, 2000).
Em Junho de 2011, no jornal Nature, foi publicado um artigo por Philip Ball com o
ttulo O Dealbar da Biologia Quntica (The Dawn of Quantum Biology), acerca de trs
das descobertas acima referidas: a dinmica quntica na fotossntese, a questo do
olfacto e a orientao das aves.
Todos os casos constituem exemplos do papel das dinmicas qunticas nos processos
adaptativos, e os primeiros exemplos biolgicos de jogos qunticos evolucionrios. De
facto, no que respeita fotossntese, descobriu-se que quando a luz atinge pigmentos
fotossintticos, que se aglomeram dentro das clulas de cada folha de uma planta e
em cada bactria fotossinttica, geram-se vibraes de electres, energizados pela luz,
cujos padres de vibrao, com comportamento quntico (designados por excites),
propagam-se exibindo um comportamento ondulatrio sincronizado que permite ao
organismo fotossinttico avaliar, ao nvel molecular, os caminhos alternativos at ao
centro de reaco e escolher o caminho mais curto, assim o organismo fotossinttico
maximiza a sua eficincia alimentar minimizando o desperdcio (Ball, 2011). Trata-se
de uma dinmica de optimizao quntica, observada num organismo vivo.
Embora exista evidncia favorvel hiptese de que os organismos biolgicos se
sirvam de estratgias qunticas para agilizarem as suas respostas adaptativas, estas
estratgias no so matematicamente abordveis num paradigma conceptual da
computao clssica (paradigma mecnico e algortmico) exportado para o contexto
biolgico quntico.
A partir da evidncia de optimizao quntica associada fotossntese, Gonalves
(2011; 2013) props novos modelos de optimizao quntica aplicada modelao do
risco nos mercados financeiros, tratando-se dos primeiros modelos a combinarem
abordagens de optimizao, vindas da investigao operacional, com a equao de
Schrdinger e capazes de replicarem os padres de turbulncia multifractal nos
mercados financeiros. Assim, a prpria rea da econofsica pode beneficiar da
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investigao no seio da biologia quntica, de tal modo que a influncia biolgica, na
quarta fase da ciberntica, continua a aprofundar-se.
Numa linha paralela, mas tambm prxima da biologia quntica, encontramos a
neurocincia quntica. At ao momento, a neurocincia quntica tem-se focado
principalmente no funcionamento do crebro.
Destaca-se, a este propsito, o trabalho de Roger Penrose e Stuart Hameroff baseado
na computao quntica em microtbulos citoesqueletais dentro dos neurnios, de tal
modo que o crebro seria capaz de tirar partido da computao quntica tal que a
computao quntica se tornaria necessria para explicar os actos de conscincia e
dinmicas decisionais.
O neurofisiologista John Eccles, por seu turno, em 1985, num congresso sobre sistemas
complexos, neurobiologia, fsica e informtica organizado por Herman Haken (escola
de Estugarda para a complexidade), props um modelo acerca do papel das dinmicas
qunticas na neurobiologia, posteriormente publicado num volume do congresso
editado pela Springer.
Eccles, na sua proposta, situa a mente ao nvel da ondulatria quntica no-local,
trabalhando uma dinmica relacional mente-crebro que defende ser central no
processamento neural (Eccles, 1994).
Paralelamente a estas linhas da biologia quntica e da neurocincia quntica, a quarta
fase da ciberntica, caracterizada pela ascenso do paradigma quntico, est a
conduzir a uma nova cincia geral dos sistemas, com diferentes propostas por
diferentes autores.
Assim, por exemplo, recentemente, Saptsin e Soloviev (2009) defenderam que a
econofsica quntica constitui uma base para uma nova linguagem paradigmtica para
a cincia dos sistemas.
Por seu turno, Ervin Laszlo, que investigou na rea da filosofia dos sistemas, tem
avanado uma proposta para uma nova abordagem para uma cincia geral dos
sistemas, baseada na teoria quntica dos campos.
O percurso de Laszlo relevante, pois trata-se de um investigador que acompanhou o
desenvolvimento dos trabalhos na rea da cincia dos sistemas e cujo percurso pela
cincia dos sistemas o conduziu abordagem quntica.
O trabalho de Laszlo, no seio da filosofia dos sistemas e da cincia dos sistemas,
desenvolveu-se principalmente na dcada de 1970, tendo a influncia de Laszlo, nesta
rea de investigao, expandido na sequncia do seu encontro com Erich Jantsch, por
altura de uma conferncia realizada em Tquio em 1974, em que ambos discutiram
acerca das suas concepes sobre a auto-organizao.
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Do encontro com Jantsch resultou, em Laszlo, o sentimento de que seria possvel uma
sntese para a cincia dos sistemas entre uma concepo mais quantitativa, seguida
por Jantsch e uma perspectiva mais qualitativa que correspondia de Laszlo e que
tinha como principais influncias Bergson, Whitehead e a teoria geral dos sistemas de
Bertalanffy. Aps um perodo de partilha de perspectivas entre Laszlo e Jantsch, este
ltimo apresentou Laszlo a Prigogine e ao grupo de Bruxelas. Lazslo (1987) refere que
aps a sua colaborao com Bertalanffy, Prigogine foi quem maior influncia teve
sobre os seus trabalhos.
Em 1986, Laszlo fundou o Grupo de Investigao sobre a Evoluo Geral (General
Evolution Research Group) juntamente com: Ralph Abraham (matemtico da
Universidade da Califrnia, Santa Cruz); Robert Artigiani (historiador da Academia
Naval dos EUA, Annapolis, Maryland); Gianluca Bocchi e Mauro Ceruti (da
Universidade de Gnova); Eric Chaisson (astrofsico do Harvard-Smithsonian Center for
Astrophysics); Vilmos Csnyi (bilogo da Universidade Etvs Lornd em Budapest);
Riane Eisler e David Loye (ento no Instituto de Futurologia de Carmel, Califrnia,
presentemente do Center for Partnership Studies); Jonathan Schull (especialista em
psicologia biolgica da Universidade de Haverford, Pensilvnia).
Da investigao de Laszlo, durante a dcada de 1980 e comeo da dcada de 1990,
resultou um entendimento do autor de que uma unidade interdisciplinar em torno dos
sistemas, enquanto tais, seria possvel, investigando as fracturas que ocorrem nas
diferentes cincias. Laszlo, na sua obra Nas Razes do Universo, identifica problemas
centrais na fsica, biologia, cincias cognitivas e cosmologia que apontam para lacunas
que se prendem com questes directamente conectadas com os sistemas, tomados
enquanto objecto e problema cientfico central, tal que, para solucionar essas lacunas
torna-se necessrio o desenvolvimento de uma cincia geral dos sistemas capaz de
identificar os elementos comuns 6 s diferentes cincias e de desenvolver uma
abordagem unificada para os sistemas que simultaneamente solucione as principais
lacunas decorrentes da especializao cientfica e das perspectivas parcelares acerca
dos sistemas, desenvolvidas por cada uma das cincias supra referidas.
Desde a dcada de 1990 que Laszlo visa encontrar uma abordagem integral para os
sistemas, introduzindo a questo quntica como base necessria para se pensar os
sistemas e para solucionar as diferentes lacunas. Efectivamente, conforme argumenta
Laszlo na sua obra As Razes do Universo, cada uma das lacunas apontam para uma
mesma base quntica existencial, necessria para compreender os sistemas e para
encontrar uma unidade na cincia, na forma de uma nova cincia geral dos sistemas.
Integrando a investigao mais recente na fsica fundamental, Laszlo colocou como
hiptese a existncia de um campo quntico, distinto dos restantes campos fsicos, e
6 Laszlo introduz, a este respeito, a noo de factor ausente (Laszlo, 1993).
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que seria capaz de suportar as conexes instantneas observadas em experincias
laboratoriais e que apontam para uma no-localidade sistmica dos sistemas qunticos,
observvel em termos de efeitos.
A proposta de Laszlo, neste ponto, aproxima-se da interpretao da mecnica quntica
avanada pelo fsico David Bohm que considerava uma dinmica subquntica de um
campo no-local holodinmico 7 , responsvel pelas conexes instantneas entre
sistemas espacialmente separados mas que interagiram no passado ou partilharam
uma origem comum permanecendo conectados (entrelaamento quntico).
Laszlo, baseando-se em Bohm, assume que este campo quntico ter caractersticas
hologrficas sendo capaz de registar informao (memria quntica) e de transmitir
essa mesma informao a velocidades supraluminais (superiores velocidade da luz).
A caracterstica dinmica do campo, em torno do registo vivo de memria dos sistemas,
conduziu Laszlo (2004) a introduzir o nome de campo akshico para esse campo,
noo que o autor trabalha a partir do Snscrito akasha () com o significado de espao no sentido originante: substncia subjacente a tudo e que devm cada coisa
(Laszlo, 2007).
Quer Laszlo, quer Bohm identificam um campo com este tipo de natureza, naquilo que
sabemos serem flutuaes energticas no vcuo quntico, que se trata na realidade de
um plenum: um ter quntico. De referir que existe uma base no pensamento
filosfico de Espinosa no referida explicitamente nem por Laszlo nem por Bohm que
preferem recorrer ao pensamento filosfico asitico, evitando de algum modo, na sua
reinterpretao do vcuo quntico, uma conexo explcita com o pensamento
filosfico de Espinosa.
O ter quntico um facto reconhecido pela fsica (Davies, 2005). As propriedades
propostas por Laszlo e por Bohm, contudo, permanecem como hipteses de trabalho
entre outras.
Um ponto central que comea a ser aberto pela investigao mais recente no seio da
fsica fundamental, em particular da investigao no seio da gravidade quntica e das
aplicaes da teoria quntica dos jogos, abre uma questo nova que poder constituir
uma outra direco distinta da de Laszlo e com raiz em Everett.
7 Na sua interpretao, Bohm introduziu a noo de holomovimento trabalhada a partir da noo de que num holograma, em cada regio do espao, a ordem da estrutura total iluminada est dobrada e transportada no movimento da luz, tal que, generalizando, a dinmica de transporte de uma ordem implicada designada por Bohm de holomovimento (Bohm, 1980, pp.201, 202). Bohm assume uma ordem implicada subjacente a todas as coisas, tal que, segundo Bohm, a ordem em cada aspecto imediatamente perceptvel do mundo deve ser considerada como originria de uma ordem implicada mais abrangente (Bohm, 1980, p.208).
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Everett que, conforme argumentado anteriormente, pode ser considerado entre os
primeiros ciberneticistas qunticos, permite-nos reinterpretar a funo de onda da
teoria quntica enquanto quantidade estatstica acerca das relaes entre sistemas,
assim, ao contrrio da formulao de Bohm, a no-localidade no advm de uma
dinmica subquntica, mas, sim, prprio dos sistemas e das suas relaes.
Conforme demonstrado por Everett, no existe um estado quntico absoluto, o
entrelaamento, que sabemos ser inevitvel 8 , permite reinterpretar a funo
matemtica de Schrdinger enquanto quantidade que se refere a entrelaamentos
passveis de ocorrerem e que permitem extrair informao estatstica acerca do
sistema. A partir do momento em que temos dois sistemas entrelaados, deixamos de
poder falar de um estado quntico de um dos sistemas em separado do outro.
Enquanto Bohm considerava a funo de onda como uma aproximao estatstica do
estado de um campo, Everett introduziu o problema da relao o que, face aos
modelos recentes das principais linhas de abordagens para a gravidade quntica9,
podemos ter de considerar uma dinmica hipertextual ao nvel fundamental,
trabalhando as dinmicas qunticas em termos das dinmicas relacionais entre
sistemas, o que aprofunda a ligao entre a teoria quntica e a ciberntica em termos
de modelos de computao quntica em rede.
Embora ainda em aberto, as evidncias para a computao quntica biolgica, e o
papel relevante da teoria quntica na neurocognio, assim como os avanos na
computao quntica e a crescente eficcia da teoria quntica dos jogos permitem
antecipar a expanso rpida da ciberntica quntica, enquanto base paradigmtica
com consequncias fundamentais para a cincia da tomada de deciso, quer ao nvel
de novas ferramentas decisionais quer ao nvel da investigao fundamental em torno
dos processos de tomada de deciso nos sistemas adaptativos complexos.
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8 O que constitui hoje um quebra-cabeas para os tecnlogos qunticos, pois tm dificuldade em manter o sistema computacional, construdo em laboratrio, separado o suficiente do meio para evitar o entrelaamento sistmico que conduz inevitavelmente perda de controlo sobre a computao quntica, pois deixa de ser possvel aplicar operaes qunticas sobre um sistema circunscrito e localmente controlado. 9 Referimo-nos, em particular, gravidade quntica por laos (loop quantum gravity) e teoria das
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