Assist Suplementar

Embed Size (px)

Citation preview

Regulao Sade&Estrutura, Evoluo e Perspectivas da Assistncia Mdica Suplementar

REGULAO E SADEESTRUTURA, EVOLUO E PERSPECTIVAS DA ASSISTNCIA MDICA SUPLEMENTAR

Apresentao Prefcio Introduo

03 04 07

Parte I Nota sobre a Regulao dos Planos de Sade de Empresas no Brasil Dimenso e Estrutura Econmica da Assistncia Mdica Suplementar no Brasil A Regulao da Assistncia Suplementar Sade: Legislao e Contexto Institucional As Agncias de Regulao Independentes 66 133 35 18

Em Busca de um Sistema de Controle e Avaliao da Agncia Nacional de Sade Suplementar Defesa dos Consumidores e Regulao dos Planos de Sade 144 156

Parte II Estado e Regulao da Sade Renncia Fiscal e Assistncia Mdica Suplementar A Regulao da Ateno Sade nos EUA 195 216 237

1

2002. Agncia Nacional de Sade Suplementar. permitida a reproduo parcial ou total desta obra, desde que citada a fonte. Srie C. Projetos, Programas e Relatrios; n. 76 Tiragem: 2.000 exemplares Barjas Negri Ministro de Estado da Sade Otvio Azevedo Mercadante Secretrio Executivo Agncia Nacional de Sade Suplementar (ANS) Januario Montone Diretor-Presidente Joo Luis Barroca de Andra Diretor de Normas e Habilitao dos Produtos Luiz Arnaldo Pereira da Cunha Junior Diretor de Desenvolvimento Setorial Solange Beatriz Palheiro Mendes Diretora de Normas e Habilitao das Operadoras Maria Stella Gregori Diretora de Fiscalizao Januario Montone Diretor de Gesto Marcos F. da Silva Moreira Revisor

ELABORAO, DISTRIBUIO E INFORMAES MINISTRIO DA SADE Agncia Nacional de Sade Suplementar Avenida Augusto Severo, n. 84, Glria CEP 20021-040, Rio de Janeiro RJ Impresso no Brasil / Printed in Brazil Catalogao na fonte Editora MS FICHA CATALOGRFICA Brasil. Ministrio da Sade. Agncia Nacional de Sade Suplementar. Regulao & Sade: estrutura, evoluo e perspectivas da assistncia mdica suplementar / Ministrio da Sade, Agncia Nacional de Sade Suplementar. Rio de Janeiro: ANS, 2002. 264 p. (Srie C. Projetos, Programas e Relatrios; n. 76)) ISBN 85-334-0505-7 1. Seguro Sade Legislao. 2. Assistncia Mdica. I. Brasil. Ministrio da Sade. II. Brasil. Agncia Nacional de Sade Suplementar. III. Ttulo. IV. Srie.

NLM W 100

2

Regulao e Sade: Estrutura, Evoluo e Perspectivas de Assistncia Mdica SuplementarApresentao Agncias reguladoras como a ANS Agncia Nacional de Sade Suplementar so exemplos concretos da nova organizao do Estado brasileiro, edificado a partir da segunda metade da dcada de 90. Esse novo modelo estatal, que trouxe um nvel mais amplo de participao da sociedade ao mesmo tempo em que redesenhou o prprio papel do Governo, vem permitindo a expanso da atividade privada em diversos novos campos da economia sem abrir mo da ao governamental em promover equilbrio e justia social. Nesse sentido, a ANS um bem acabado exemplo dessa atuao do Governo. O estabelecimento de um mercado de sade suplementar vigoroso, com foco na assistncia a sade, uma meta a qual a ANS se lanou h pouco mais de dois anos, cujos primeiros resultados comeam a aparecer. Concorreu para o fortalecimento do papel da ANS e, em suma, do prprio setor de sade suplementar, a busca de acumulao de conhecimentos e o estabelecimento de canais institucionais entre a Agncia, Centros de Pesquisa e Universidades, cujo trabalho de pesquisadores e especialistas em economia e polticas pblicas de sade, vem fazendo a capacidade de entendimento do setor, bem como a capacidade de regulao, avanar com velocidade. A coletnea Regulao & Sade, fruto dessa unio de esforos entre o Governo e os Centros de Produo Acadmica a primeira publicao nacional destinada a examinar de forma abrangente o setor de planos e seguros-sade. Organizada de maneira democrtica, uma vez que alguns dos conceitos lanados no explicitam necessariamente o pensamento da ANS, guarda a especial importncia de seu pioneirismo (e aqui o leitor deve atentar que estes primeiros textos referem-se a um trabalho anterior de estruturao de um rgo regulador ainda sem a riqueza de informaes de que hoje dispomos) e do esforo coletivo em lanar luzes sobre um setor, que aflorou nos ltimos 40 anos longe da vigilncia do Estado e, portanto, da prpria sociedade. A todos os que colaboraram para essa obra, os agradecimentos da ANS. Januario Montone Diretor-Presidente

3

PREFCIO Esta publicao resultado de pesquisas desenvolvidas, no ano de 1999, no projeto Regulao do Mercado de Planos e Seguros Sade, sob os auspcios do Ministrio da Sade e da Agncia Nacional de Sade Suplementar. Seus resultados, obviamente, no expressam a posio oficial da instituio nem implicam qualquer compromisso de implementar sugestes ou idias ali contidas. Mas so um exemplo de como a interao entre uma agncia executiva pblica e um conjunto de instituies de pesquisa pode propiciar um ambiente de debate aberto e amplo em que se produzem novos conhecimentos que, em ltima instncia, proporcionaro melhores condies para a ao regulatria da ANS. A coletnea rene uma excelente amostra das primeiras pesquisas, de cunho acadmico, realizadas no Brasil, na rea da economia da sade e das polticas pblicas sobre o mercado de planos de sade e sua regulao. As investigaes at ento disponveis sobre este mercado tinham sido realizadas por empresas de consultoria e/ou por entidades de representao das operadoras, com exceo das raras teses acadmicas e dos poucos artigos, publicados em revistas especializadas. As fontes de informao predominantes eram, portanto, as do prprio mercado, que apresentavam a limitao do relato de dados agregados sobre a quantidade de clientes e o faturamento das empresas. A construo do novo regime regulador torna evidente a necessidade de se aprofundar o entendimento sobre os elementos e as relaes estruturantes da operao de planos e seguros de sade. Em especial porque a legislao amplia, substancialmente, a presena da esfera pblica no campo sanitrio, ao instituir a funo reguladora da ANS e ao submeter s disposies da Lei n. 9.656/98 as pessoas jurdicas de direito privado que operam planos de assistncia sade, sem prejuzo do cumprimento da legislao especfica que rege a sua atividade (Artigo 1.). A regulao de planos e seguros de sade uma atividade governamental destinada a corrigir as falhas de mercado e condies contratuais que afetam consumidores e empresas e repercutem negativamente na opinio pblica. Os principais problemas desse mercado so claramente identificveis,

considerando as demandas e as queixas dos consumidores sobre a natureza dos contratos e as imposies unilaterais das empresas:

4

falhas na cobertura e excluso de procedimento; cobrana ou cobertura irregular para portadores de doena preexistente;

exigncias indevidas para a admisso do paciente; erro nas condies de validade e de resciso do contrato; prazos de carncia irregulares; indefinio nas regras de relacionamento entre operadora e consumidor; descumprimento nas normas de atendimentos de urgncia e emergncia; insuficincia na abrangncia geogrfica do plano de sade; falta de cobertura para doenas crnicas e degenerativas; negao de transferncia dos contratos de uma operadora a outra, entre outros itens. A experincia reguladora ainda incipiente no setor sade, mesmo se levarmos em

conta as experincias internacionais. Nos casos estudados, a regulao se tem concentrado na definio de teto para as receitas dos provedores na prestao de servios ao setor pblico, especialmente dos hospitais. Tambm escassa a experincia reguladora de terceiros, pelo poder pblico, em um ramo to pulverizado e de pouca elasticidade da demanda, como o mercado de empresas operadoras de seguros ou planos privados de assistncia. O objetivo estratgico do regime de regulao na sade, , atravs de leis e resolues, melhorar a qualidade dos contratos, contribuir para que as empresas se sustentem e gerar incentivos que beneficiem os consumidores. E se destina a corrigir as falhas de um mercado muito singular de proviso de servios, se comparado aos servios de utilidade pblica. Os trabalhos aqui desenvolvidos indicam ser vital para o sucesso do programa de regulao, a anlise, em detalhe, do mercado de planos e seguros de sade e das suas relaes com os consumidores e com as polticas pblicas. Um dos aspectos importantes dessa coletnea a utilizao de um financiamento e regulao de servios de sade. A questo analisada sob o ngulo dos estudos sobre o Estado de bem-estar social, da reforma do Estado, da organizao da operao de planos nos EUA e em pases da Amrica Latina e da relao entre a esfera pblica e a privada. conjunto

diversificado de referenciais tericos e metodolgicos da pesquisa sobre organizao,

5

Percorreram-se fontes de informao sobre dimenses absolutamente inexploradas da operao de planos de sade. Desde o levantamento de informaes Federal para da Receita

estimar a renncia de arrecadao fiscal, na rea dos planos de sade, at as queixas contra as operadoras registradas em entidades de defesa do consumidor. Esse esforo de investigao oferece uma viso mais realista sobre possibilidades e limites de utilizao destas fontes. Em termos metodolgicos foi possvel caminhar passos largos, uma vez que a interdisciplinaridade presidiu o conjunto das pesquisas realizadas. Foi-se a campo para conhecer os planos empresariais, para entrevistar investidores, para comparar o modelo regulador da ANS com outras agncias reguladoras, para entender a mescla de pblico e privado no Brasil. Por todas estas razes, estes trabalhos constituem um marco no processo de investigao da regulao dos planos de sade no Brasil e do desenvolvimento das funes pblicas no setor. Joo Luis Barroca de Andra Diretor de Normas e Habilitao dos Produtos / ANS

6

INTRODUO Ligia Bahia*& Ana Luiza Viana**

Nos sistemas nacionais de sade a oferta, o financiamento, a operao e a regulao dos servios so, em geral, prerrogativas da associao entre as iniciativas pblica e privada. E as caractersticas e organizao destas aes variam, interna e externamente, nos diferentes pases, de acordo com o contexto histrico. Aps a segunda grande guerra, consolidou-se a tendncia de se institurem sistemas integrados pblicos. Nesses sistemas, cabia ao Estado o financiamento e a proviso de servios. Para tanto, o Estado valia-se de recursos humanos em regime de contrato com o setor pblico, ou seja, valia-se de funcionrios pblicos. O Estado concentrava, as funes de proprietrio, financiador e gestor de sistema. O momento atual evidencia mudanas nas participaes pblica e privada. E,

assim, estimula a reorganizao institucional das relaes entre essas instncias, na rea da sade, em consonncia com as transformaes das funes e do papel do Estado. A presente fase dos sistemas de sade caracteriza-se pela introduo de

mecanismos de mercado na proviso dos servios; pelas proposies de renncia do Estado responsabilidade por essas funes e pelo fortalecimento da participao da oferta e das despesas privadas em sade. Acrescente-se, ainda, a diversificao da demanda de sade em necessidades at ento inusitadas, como a busca de diferenciado segundo a qualidade dos locais de internao, etc. O aumento do gasto privado d-se tanto atravs do desembolso direto quanto da expanso dos planos e seguros privados. Segundo Lassey1, na maioria dos pases europeus o crescimento da despesa privada em sade acentuou-se, nos ltimos anos. E atingiu, em alguns casos, aproximadamente 15% do gasto total, da rea atravs da oferta de planos suplementares de sade pelas grandes empresas. Segundo o autor, tal tipos alternativos de terapias e medicamentos, de profissionais no-mdicos e de atendimento

*

** 1

Professora adjunta do Ncleo de Estudos de Sade Coletiva/UFRJ Professora adjunta do IMS/UERJ LASSEY, M. L. & LASSEY, W. R. & JINKS, M. J. Health Care Systems around the World. Caracteristics, Issues, reforms.Usa, Prentice-Hall, Inc., 1997.

7

fenmeno decorre da insuficincia da cobertura do sistema pblico - em pases como Inglaterra e Frana - ou da substituio, nas faixas de renda mais alta, do sistema pblico pelos planos privados, como na Alemanha. No Canad, por exemplo, o gasto privado cresceu, em parte, em virtude da procura de terapias e medicamentos alternativos e de profissionais no-mdicos, assim como da restrio da cobertura pblica e do aumento das tarifas cobradas pelos servios privados profissionais autnomos. Os sistemas de sade so compostos por distintos modelos de gesto de riscos, distribudos entre Estado, mercado e famlia. O antigo sistema de proteo social Welfare State pode ser definido como uma imensa rede de socializao do risco, cuja poltica de solidariedade implica mecanismos de diviso dos riscos grupos e classes sociais. A tendncia contempornea de fortalecimento da esfera do mercado, classes sociais, a diversificao da demanda em sade, alm do impacto do prprio processo de reforma no setor, induziram uma reorientao das funes e responsabilidades do Estado, do setor privado e dos usurios. O Estado passou a ter novas atribuies, como as de regulao, controle e avaliao e ampliou-se a participao do mercado e da famlia na produo, no gasto e no financiamento do sistema de sade. Essas mudanas compem uma (re) institucionalizao da relao pblico-privado. Porm, como o afirma Esping-Andersen2, a transferncia dos riscos para instituies privadas, especialmente dos riscos que envolvem a vida humana, reveste-se sempre, por sua prpria natureza, de um tecido social.3 Assim, o poder de mobilizao poltica e de ampliao da esfera pblica fundamental para afastar a carga de riscos dos mbitos do individuo e da famlia, considerando-se, ainda, que um risco individual pode transformar-se em social, e vice-versa. A RELAO PBLICO - PRIVADO NA REA DE SADE NO BRASIL No plano da oferta, o sistema de sade brasileiro composto, principalmente, por servios privados. E constitui-se num dos maiores mercados de compra e venda de servios de sade no mundo. Essa realidade forou a separao, em nosso pas do financiamento e da proviso desses servios antes mesmo que esta recomendao fosse includa na de reformas do sistema sanitrio.2 3

dos seguros entre

ESPING-ANDERSEN, G. Social Foundations of Postindustrial Economies. New York, Oxford Press,1999

Os seguros sociais, impregnados por um carter sindical, so distintos daqueles estabelecidos entre seguradoras e segurados, individualmente. Os primeiros emergem da tessitura de relaes verticais, que revelam conflitos de interesses; os seguros individuais permanecem encobertos por relaes nas quais se trocam equivalentes, relaes baseadas na livre declarao de vontades do direito privado.

8

Esse grande mercado privado, - profissionais mdicos, ambulatrios, hospitais, servios diagnstico-teraputicos, laboratrios vende servios de sade tanto para o setor pblico como para os planos e seguros privados. Aps as polticas de fortalecimento do modelo pblico, implantadas na dcada de 80,

tanto o setor pblico quanto o privado expandiram-se consideravelmente; nos anos 90, o setor pblico manteve seu ritmo de expanso, e houve uma relativa das taxas de crescimento dos planos e seguros de sade privados. O crescimento simultneo desses dois modelos fomentou um falso paradoxo, baseado numa falsa dicotomia: por um lado, a expanso dos planos privados do modelo pblico, do SUS; por outro, o avano das justificava-se pela insuficincia

polticas de tendncia neoliberal, seria a causa da substituio do sistema pblico pelo de mercado4 e assim estaria confirmada a hiptese sustentada por Lassey, de que as insuficincias do sistema pblico e o processo de concentrao de renda - inerente s polticas neoliberais -explicariam o crescimento das ofertas e despesas privadas. Esse fato, porm, pe em dvida as proposies reformistas de cunho universal e as polticas de assistncia seletiva. Pois o crescimento das alternativas particulares, desafia, por um lado, consolidado. Para determinados autores, os esquemas de assistncia privados, evidenciam os padres hbridos das polticas sociais no Brasil e no expressam, apenas, meras relaes de soma e subtrao entre partes autnomas. Contribuies como a de Santos5, - sobre a cidadania regulada -, a de Favaret6 - a respeito da universalizao excludente - a de Werneck7, - sobre uma americanizao do sistema de proteo social brasileiro - e o conceito de cidadania invertida - formulado por Fleury-Teixeira8 - desautorizam o uso de modelos de explicao muito simplificados. Contudo, hipteses a verem no antagonismo entre o SUS e os planos privados de sade o nico determinante do mosaico poltico e institucional do sistema de sade4 5 6 7 8

a

construo

de

um sistema de proteo social, universal e um segmento j

redistributivo, e, por outro, revela perspectivas para a regulao de

O avano das polticas neoliberais tambm explica a insuficincia do SUS. SANTOS, W. G dos. Cidadania e justia: a poltica social na ordem brasileira. Rio de Janeiro, Campus, 1987. FAVARET, P. F e OLIVEIRA, P. J. A Universalizao Excludente: Reflexes sobre as Tendncias do Sistema de Sade.Dados v 33 (2): 257-283, 1990. WERNECK, M. L. T. V. A Americanizao (perversa) da Seguridade Social no Brasil. Dissertao de Doutorado. Rio de Janeiro, IUPERJ, 1998. FLEURY-TEIXEIRA, S. M. Estado sem Cidados: Seguridade Social na Amrica Latina. Rio de Janeiro, Fiocruz, 1994.

9

brasileiro, ainda orientam parte dos discursos e das aes destinadas a regular as relaes entre as esferas pblica e privada. Considera-se que a coexistncia de dois sistemas distintos de sade vivel. No entanto, so habituais as expresses como s fica no SUS quem no tem recursos para comprar um plano ou quem pode pagar tem plano de sade; ento, o SUS pode cuidar melhor dos pobres, expresses que pressupe a existncia de uma barreira intransponvel entre as duas redes assistenciais. Sob esta acepo, o nico ponto de contato dessas duas realidades seria a oferta de tecnologias sofisticadas, de que, estabelecimentos pblicos por vezes tambm dispem. Nos debates ensejados pela legislao sobre a regulamentao do mercado de planos e de seguro de sade, argumentava-se que as ampliaes de cobertura isentariam o SUS do atendimento aos clientes da assistncia mdica suplementar. Todavia, ainda restam lacunas na reflexo sobre as inter-relaes entre o SUS e os planos privados de sade, sobretudo quanto natureza dos riscos sob cobertura e s redes de assistncia voltadas clientela com ou sem vnculo das empresas de assistncia mdica suplementar. BREVE HISTRICO DO MERCADO DE PLANOS DE SADE NO BRASIL Alguns dos atuais esquemas de assistncia privada sade, baseados na captao de recursos de empresas empregadoras e de seus empregados, foram criados nos anos 40 e 50. Exemplos disso so, no setor pblico, a implantao da Caixa de Assistncia aos Funcionrios do Banco do Brasil (Cassi) e a assistncia patronal para os servidores do Instituto de Aposentadorias e Penses dos Industririos (atual Geap) e, mais tarde, a incluso da assistncia mdico-hospitalar entre os benefcios oferecidos aos empregados das recm-criadas empresas estatais. E, no setor privado, os sistemas assistenciais a acompanharem a instalao da indstria automobilstica, particularmente das montadoras estrangeiras. A terceira alternativa organizao de sistemas assistenciais destinados Previdncia Social

exclusivamente aos funcionrios estaduais desprotegidos pela

surgiu a partir dos anos 50. E configurou a face dos servios de sade destinados exclusivamente aos servidores pblicos com regimes prprios de previdncia. Esses sistemas particulares possuam servios prprios e/ou adotavam o sistema de reembolso de despesas mdico-hospitalares. Os empregados eram atendidos, nos servios mdicos das fbricas, em ambulatrios das caixas de assistncia e por provedores reembolsada. privados, pagos pelo cliente; essa despesa era, posteriormente,

10

A intensidade com que se utilizavam os servios dos Institutos de Aposentadorias e Penses da Previdncia Social e das redes pblica estadual e municipal, variava de acordo com a abrangncia da cobertura oferecida pelos esquemas de assistncia das empresas empregadoras. A partir de meados da dcada de 60, as relaes entre financiadores e provedores de servios foram substancialmente modificadas. Os denominados convnios mdicos entre empresas empregadoras e empresas mdicas (cooperativas mdicas e empresas de medicina de grupo), mediados pela Previdncia Social, estimularam, decisivamente, o processo empresarial da medicina. E empresas mdicas, contando inicialmente com suas redes prprias, ganharam fora na organizao dos prestadores de servios, em detrimento da prtica mdica liberal e da autonomia de cada estabelecimento hospitalar 1. As medicinas de grupo organizaram-se em torno de proprietrios e/ou acionistas de hospitais; as Unimeds surgiram como uma alternativa, heterodoxa, para se conseguir a prtica, nos consultrios mdicos, atravs da constituio de cooperativas de trabalho. Tais empresas, especializadas servios. Essa expanso decorreu tanto da imposio relativas s coberturas mnimas que das normas da Previdncia Social atendimento ambulatorial em incluam na comercializao de planos de sade, especialmente as empresas de medicinas de grupo, logo ampliaram suas redes de

determinadas especialidades -, quanto da necessidade de competir com as Unimeds. Assim, as empresas mdicas organizaram suas redes assistenciais prprias. Mas, em virtude da presena de poderoso financiador de servios a Previdncia Social , e diante da resistncia, da parte dos mdicos, perda de autonomia, tornaram-se compradoras de servios, atravs do credenciamento de profissionais, laboratrios e hospitais. As Unimeds complementaram suas redes com o credenciamento de hospitais e laboratrios. E as medicinas de grupo, por meio da compra de consultas realizadas pelos mdicos em seus prprios consultrios. quela poca, muitas empresas empregadoras, especialmente as estatais e multinacionais de grande porte, ao invs de buscarem seus sistemas assistenciais externos, preservaram seus prprios planos2. Este subsegmento, no-comercial, de planos de sade optou pelo credenciamento de servios como principal estratgia de organizao de redes assistenciais, e passou a representar uma alternativa de remunerao aos provedores de servios.

1 2

CORDEIRO, H. As Empresas Mdicas: transformaes capitalistas da prtica mdica. Rio de Janeiro, Graal, 1984. GIFFONI, R. M. Assistncia Mdica e as Relaes de Trabalho na Empresa: o Modelo de Convnio com a Previdncia Social. So Paulo, Dissertao de Mestrado,USP, 1981.

11

As dcadas de 60 e 70 foram marcadas pela constituio de redes de servios privados, contratadas pelo Estado e de instituies privadas. Vigoravam, ainda, regimes diferenciados de atendimento, desde aqueles vigentes no mbito da Previdncia Social que mantinha mecanismos de contratao e financiamento de servios para os trabalhadores rurais at os esquemas de assistncia alternativos. Um mesmo hospital poderia destinar acomodaes diferenciadas para trabalhadores urbanos e rurais. E destinar quartos particulares, e acompanhamento de mdicos escolhidos pelos clientes, para os que efetuassem pagamento suplementar, ou que estivessem protegidos por esquemas assistenciais mais prdigos. O valor da Unidade de Servio (US) do INPS servia como padro para a remunerao

dos procedimentos mdico-hospitalares. A normatizao do seguro de sade - atravs da Resoluo 11 do Conselho Nacional de Seguros, em 1976 - legitimou a prtica do reembolso das despesas assistenciais; o clculo dessas despesas baseava-se no valor da unidade de servio do INPS multiplicado pelo nvel de cobertura. No incio dos anos 80, havia cerca de 15 milhes de clientes dos planos de sade excetuando-se os de planos prprios , registrado pela Associao Brasileira de Medicina de Grupo (Abramge)3 e pela Federao das Unimeds. Esses nmeros revelavam a persistncia e a consolidao das empresas de planos de sade como alternativas assistenciais para os trabalhadores especializados da regio sudeste. A visibilidade do mercado de planos de sade, porm, no correspondia sua magnitude. As razes para tal disparidade podem ser atribudas caracterizao distorcida dos planos das empresas como benefcios concedidos pelo empregador, e no como direitos assistenciais e ao menor grau de dependncia dos mdicos e hospitais particulares diante do financiamento da assistncia suplementar. No final da dcada de 80, revelou-se a existncia de vultoso mercado de planos de sade. Ao mesmo tempo, houve a intensificao da comercializao de planos individuais, a entrada decisiva de grandes seguradoras no ramo da sade, a adeso de novos grupos de trabalhadores assistncia mdica supletiva em particular, funcionrios pblicos da administrao direta, das autarquias e das fundaes e a vinculao inequvoca da assistncia privada ao financiamento da assistncia mdica suplementar. Com esse processo de expanso, acentuou-se a organizao de sub-redes, fragmentando-se cada vez mais o sistema. Assim, um hospital, conveniado,

3

Informe de Imprensa: dados e nmeros da medicina de grupo. So Paulo, ABRAMGE (mimeo), 2000.

12

simultaneamente, com o SUS e com inmeras empresas de assistncia suplementar, podia tornar-se, tambm, empresa de plano de sade. Com a adoo do plano real, em 1994, a perspectiva de aumento do poder de compra de expressivo contingente populacional e a informalidade do mercado de trabalho estimularam a comercializao de planos individuais, por intermdio de hospitais filantrpicos e empresas mdicas. Esses planos ofereciam o acesso a servios restritos, e/ou a um nico estabelecimento hospitalar, geralmente localizados em periferias das grandes cidades ou em municpios de mdio e pequeno portes. A REGULAMENTAO DA ASSISTNCIA MDICA SUPLEMENTAR Havia consenso em torno da necessidade de interveno estatal sobre a atuao das operadoras de planos de sade. As divergncias diziam respeito, apenas, aos objetivos e limites dessa interveno. Mas s a partir de 1998, com a promulgao da Lei n 9656, coibiram-se os abusos das operadoras de planos de sade contra os consumidores. Em termos gerais, a regulamentao visava corrigir e atenuar as falhas do mercado, como a assimetria de informaes entre clientes, operadoras e provedores de servios e a seleo de riscos. A seleo dava-se da parte das empresas de planos - que preferem oferecer cobertura para os riscos menores - e, por parte de clientes, - que tendem a adquirir seguros e planos em razo de j apresentarem um problema (seleo adversa) e a consumir mais servios em funo das coberturas dos planos (risco moral ou moral hazard). A regulamentao tinha como objetivos principais corrigir as distores quanto seleo de riscos, praticada pelas operadoras, e preservar a competitividade do mercado. Para tanto, deveria haver ampliao de cobertura; ressarcimento ao SUS; registro das operadoras; acompanhamento de preos pelo governo; obrigatoriedade da comprovao de solvncia; reservas tcnicas; permisso para a atuao de empresas de capital estrangeiro e proibio do monoplio de atividades por uma nica empresa. A interveno estatal para corrigir o mercado gerou polmica. Argumentava-se, por exemplo, que teria a finalidade de abrir o mercado s empresas estrangeiras, e que o capital internacional seria um instrumento de revitalizao da operao de planos de sade, e de desmonte do mercado nacional. Em contrapartida, com vistas a proteger os direitos dos consumidores e a autonomia mdica, considerava-se que as polticas governamentais deveriam garantir assistncia de boa qualidade aos clientes dos planos, e coibir as restries ao atendimento e os obstculos utilizao de determinados procedimentos. As empresas mdicas e as seguradoras, resistiam a ampliar o alcance de suas coberturas; as operadoras de pequeno porte ameaavam falir, em virtude da exigncia

13

de comprovao de solvncia. Assim discutiam-se os limites da regulao governamental e a intensidade da interveno estatal sobre o mercado. Esses conflitos foram reinterpretados pelos Ministrios da Fazenda e da Sade. Esses ministrios tornaram-se defensores, respectivamente, de uma regulao governamental de menor intensidade, institucionalizada atravs da Susep, e de uma ao mais efetiva do Estado, a caber ao Ministrio da Sade. O debate em torno da elaborao da Lei 9656 teve o mrito de revelar uma srie de abusos das operadoras contra os clientes, e de remeter esfera pblica as prerrogativas de regulao e controle da assistncia oferecida pelas empresas de medicina suplementar. Ainda no foram, contudo, reveladas, as caractersticas inconfessas da assistncia mdica suplementar como a estratificao interna, as fronteiras entre subsistemas assistenciais e os mandamentos tico-financeiros das empresas. Preservaram-se, tambm, as influentes coalizes de interesses a sustentarem as regras de auto-regulamentao e, sobretudo, um processo de deciso a se pautar pela inverso das atribuies dos poderes legislativo e executivo. avanos desse processo no lograram contribuir para o Portanto, os

aperfeioamento das privado.

polticas de gesto dos riscos sade, nos mbitos pblico e

Uma avaliao dos obstculos para o cumprimento dos preceitos legais ajuda a elucidar a relativa imunidade, interveno governamental, das regras a organizarem o mercado de assistncia suplementar. O Ministrio da Sade, por exemplo, viu-se pressionado por grandes seguradoras e por entidades de defesa do consumidor, e as isentou de adaptar os contratos antigos necessidade de ampliao das coberturas, prevista pela legislao (Medida Provisria 1908-17). Diante da determinao de ampliar a cobertura, as ameaas de elevao brutal dos preos dos prmios por parte da assistncia mdica suplementar constituda por clientes de planos individuais, do tipo executivo, legitimaram, na prtica, o direito do consumidor, de optar por manter-se vinculado a um plano mais barato, com coberturas restritas. Isso incidiu diretamente sobre outro pilar da regulamentao, o ressarcimento ao SUS, concebido para desestimular o atendimento de clientes de planos de sade em estabelecimentos da rede pblica, e da rede privada sob regime de convnio com a rede pblica. Os entraves ao cumprimento do dispositivo legal que determinara o ressarcimento ao SUS revelaram uma prtica comum a provedores de servios, pblicos e privados. A introduo de uma terceira tabela para a remunerao dos procedimentos - a Tabela nica Nacional de Equivalncia de Procedimentos (Tunep), concebida segundo 14

valores intermedirios entre os preconizados pela AMB e pelo SUS -, provocou reaes paradoxais. Alguns mdicos recusam-se a registrar o consumo de certos procedimentos, quando os mesmos so melhor remunerados pelo SUS, como despesas das operadoras; por outro lado, as operadoras argumentam que seus clientes escolhem espontaneamente o SUS, e, por isso, as empresas estariam desobrigadas a ressarcir tais despesas. Hoje, legislao. qualquer Existem previso porm, sobre da os desdobramentos de da exigncia de

ressarcimento ao SUS seria precipitada, pois estamos no estgio inicial de adequao indcios, ineficcia medidas eminentemente tecnocrticas para regular os tradicionais mecanismos de transferncia de clientes entre os setores pblico e privado. Dois outros temas a abertura do segmento ao capital estrangeiro e as regras econmico-financeiras voltadas comprovao de reservas e solvncia , dizem respeito s intenes de se estimular a reorganizao do mercado. A reconfigurao do mercado de planos de sade em face das alteraes na legislao sobre acidentes de trabalho e sobre previdncia complementar, e da quebra do monoplio estatal do resseguro inclui promessas de estruturar sistemas de seguridade integrados ao mbito privado. Inclui integrar, por exemplo, um plano de sade ao seguro de acidente de trabalho. Por enquanto, os efeitos dessas normas legais no provocaram mudanas radicais na origem do capital, ou nas naturezas jurdica e institucional das operadoras, e nem na quantidade de empresas de planos e de seguro de sade de menor porte. Observa-se, inclusive, um movimento em direo oposta, por parte de seguradoras estrangeiras - como a Cigna e a Aetna, antes associadas a empresas nacionais. O quinto ponto da agenda de debates sobre a regulamentao o seu lugar institucional , foi alvo de acirradas disputas entre o Ministrio da Sade e o Ministrio da Fazenda e resultou na criao da Agncia Nacional de Sade Suplementar (ANS) em 1999. A ANS, tal como a Agncia de Vigilncia Sanitria e suas congneres, institudas para regular monoplios estatais que passaram ao domnio foram privatizado, possui autonomia de oramento e de deciso. Todas as agncias reguladoras assemelham-se, quanto estrutura, s dos setores de telecomunicaes, de energia eltrica e de petrleo. Diferem, contudo, quanto natureza das aes reguladoras. Pois as agncias dos setores de comunicaes e de energia voltaram-se para a formao e a diversificao dos mercados. As de sade tinham a inteno de constituir mecanismos, estatais, mais afazeres de fiscalizao e controle de preos. Qualquer avaliao sobre os impactos da ANS sobre o mercado de planos e de seguro de sade deve ser precedida por estudos mais especficos e aprofundados. No entanto, so polmicos os pressupostos que orientaram a constituio dessa agncia. 15

As criaes da ANS, e da Agncia Nacional de Vigilncia Sanitria, a despeito das dvidas sobre a adequao de seus modelos de regulao aos objetivos do governo, expressam a ampliao das atribuies das instituies a gerirem no setor da sade. A mudana no perfil de um Ministrio antes combalido, a suplicar recursos, e, agora, defensor dos direitos do consumidor de planos de sade e de medicamentos, encarna-se na criao de novas instituies, livres dos vcios da burocracia tradicional. Ao mesmo tempo, a ANS difunde conceitos, e acolhe iniciativas que entram em conflito com as diretrizes de universalizao, eqidade e descentralizao do sistema pblico de sade. A expresso sade suplementar inadequada para denominar a Instituio parece condensar as dificuldades para se formular, e por em prtica polticas pblicas de regulao do mercado de planos de sade. No entanto, a escolha da ANS como rgo regulador da assistncia mdica

suplementar vem sendo poupada de crticas radicais. Os conflitos em relao s normas legais dizem respeito intensidade e oportunidade das aes reguladoras. Deduz-se, portanto, que a regulamentao avanou mais velozmente no plano poltico-institucional do que no da implementao das regras legais. As razes de tal descompasso so atribudas, quase sempre, s resistncias das operadoras legislao. Apesar de haver consenso sobre a necessidade da regulamentao, as divergncias entre as operadoras de planos de sade e a ANS no foram suficientemente dirimidas e tm motivado acirradas disputas judiciais. As relaes entre o pblico e o debates, a fim de que a regulao do mercado venha a orientar-se para a melhoria das condies de sade. A atual legislao no reconhece a base social do financiamento da assistncia mdica suplementar e, tampouco, o mosaico pblico-privado que estrutura o setor da sade. E, assim, incapaz de dar outra direo aos recursos lanados no mercado de planos de sade. A nosso ver, a regulao pblica do setor privado deveria concentrar seus esforos no aumento da competitividade desse mercado, tanto em preos quanto em qualidade. E, simultaneamente, legitimar a ao de governo, atravs da reavaliao das atuais regras de subsidiamento atravs de dedues fiscais, do atendimento das demandas de planos de sade. As tarefas reguladoras, fundamentadas no pressuposto de um reordenamento da produo privada, segundo a lgica da gesto de bens pblicos, devem acompanhar o rumo das polticas de provimento e distribuio dos servios pblicos. A regulao pblica dos planos privados de sade requer a construo de privado, na sade, exigem a ampliao dos

novas relaes de compartilhamento de riscos sade entre Estado, empresas

16

empregadoras e famlias. necessrio rever o painel de seleo de riscos utilizado pelos provedores de servios de sade, e adequ-lo s demandas e necessidades dos clientes do SUS e dos planos de sade. Por enquanto, a diviso de responsabilidades, pelos riscos da assistncia sade entre Estado e mercado resulta num quadro de iniqidades mais grave do que haveria se a aporte sociedade no destinasse recursos aos planos de sade. A carga de riscos de despesas com sade das famlias de clientes cobertos por planos empresariais, do tipo executivo, no-contributivo, totalmente voltada para fora, enquanto so vultosas as despesas dos clientes de planos bsicos, contributivos, especialmente os que prevem o co-pagamento do consumo dos servios. Apesar disso, a diviso do sistema entre pblico e privado continua a basear-se no critrio que distingue os clientes entre pagantes e no-pagantes. O desenvolvimento de pesquisas, como as apresentadas nesta coletnea sobre a assistncia mdica suplementar, fundamental para aprofundar-se o conhecimento sobre o sistema de sade brasileiro. E poder contribuir para reformular o conceito de sade, um conceito reduzido, no mbito da assistncia suplementar, a uma relao de procedimentos mdico-hospitalares. Os artigos contidos nesse livro auxiliam as investigaes sobre as relaes de autonomia e dependncia das empresas de planos de sade diante do SUS. E, conseqentemente, revelam os problemas inerentes ao processo de regulao, pelo governo, da assistncia mdica suplementar.

17

NOTA SOBRE A REGULAO DOS PLANOS DE SADE DE EMPRESAS, NO BRASIL Aloisio Teixeira* Ligia Bahia** Maria Lucia T. Werneck Vianna***

INTRODUO Os planos de sade de empresas representam uma importante parcela do segmento de assistncia mdica suplementar. Segundo a Pesquisa Nacional por Amostra de Domiclios, realizada pelo IBGE (PNAD 98), entre os cerca de 16 milhes de titulares de planos de sade, (TABELA 1). pelo menos 60% esto diretamente vinculados a esses planos

TABELA 1 TITULARES DE PLANOS DE PLANOS DE SADE SEGUNDO FINANCIAMENTO DO PRMIO BRASIL (1998) RESPONSVEL Somente Empregador Empregador-Empregado Individual Outro Sem Declarao Total Fonte: PNAD/IBGE 1998 NMERO ABSOLUTO 2.130.459 7.441.827 4.935.750 1.642.422 12.534 16.162.992 % 13,18 46,04 30,54 10,16 0,08 100,00

Esta proporo um pouco menor do que a

encontrada pelo IBOPE em uma

pesquisa sobre assistncia sade, realizada em 1998, cujo resultado indicou um percentual de 65% para esse tipo de contrato. Os dados da pesquisa do IBOPE, sugerem, ademais, uma correlao entre forma de contratao (individual ou empresarial) e renda: existem, proporcionalmente, mais pessoas afiliadas aos planos individuais nas faixas de renda mais elevada (TABELA 2).

*

Doutor em Economia pela Unicamp; professor do Instituto de Economia da UFRJ. Doutora em Sade Pblica pela ENSP; professora da Faculdade de Medicina e do Ncleo de Estudos em Sade Coletiva da UFRJ. *** Doutora em Cincia Poltica pelo IUPERJ; professora do Instituto de Economia da UFRJ.**

18

TABELA 2 FINANCIAMENTO DO PRMIO DOS PLANOS DE SADE BRASIL FEVEREIRO DE 1998 RENDA FAMILIAR (EM SM) AT 2 2a5 5 a 10 que 10 TOTAL SM SM SM SM (%) (%) (%) (%) (%) Empresa como Titular 32 38 47 38 39 Empresa como dependente 37 38 20 23 27 Individual 34 25 34 42 35 Fonte: Pesquisa de Opinio Pblica - IBOPE, 1998 A assistncia mdica suplementar oferecida atravs de planos de empresas envolve uma complexa variedade de processos a relacionarem empresas empregadoras, operadoras de planos de sade, hospitais e provedores de servios. Esses planos representam o principal eixo em torno do qual se movem a grande maioria das empresas mdicas, seguradoras, inmeros estabelecimentos de sade e mdicos. A lgica a presidir os contratos, formais ou no, desses planos, no Brasil, muito distinta da que orienta os planos individuais. Os contratos de planos de empresa pressupem um risco homogneo para os participantes das aplices coletivas, e sobre essa base fazem-se os clculos de custos per capita dos planos (community ratio); os contratos dos planos individuais, ao contrrio, so mais detalhados e baseiam-se em uma avaliao personalizada do risco (experience ratio). Os contratos entre empresas empregadoras e operadoras de planos so formais. Mas o mesmo no ocorre na relao entre o estipulante (empregador) e o empregado; assim, os clientes de planos coletivos de sade costumam dispor de garantia efetiva, mas no contratual, de coberturas e preos. Isso no impede, entretanto, que as coberturas dos planos de empresas sejam mais amplas do que as dos planos individuais. O poder de barganha das empresas empregadoras e as demandas e presses, conjuntas, dos empregados - aliadas lgica de tornar homogneos e de diluir os riscos de grandes grupos - resulta em padres assistenciais mais prdigos e de menor custo (pelo menos 60% mais baixos) do que os dos contratos individuais. Da a nfase que vem sendo dada pela Agncia Nacional de Sade Suplementar aos instrumentos legais que regulam o subsegmento de planos individuais.

19

Ao nosso ver, contudo, a restrita formalizao dos contratos - no mbito das empresas empregadoras - e, sobretudo, a influncia desses grandes compradores de planos e servios privados de sade na determinao das tendncias do mercado, deve ser examinada pela ANS. A ANS precisa explorar as possibilidades de relao com as empresas, elementos centrais do mercado de assistncia mdica suplementar. Por outro lado, as transformaes no mercado de trabalho redues de custo operadas pelas grandes empresas e relaes de trabalho precrias e informais afetam o mercado de assistncia mdica suplementar, e pem a ANS diante de mais um desafio: o de regular, acompanhar a viabilidade assistencial e econmico-financeira dos planos de sade de empresas e o de estimular os contratos para trabalhadores de empresas de menor porte, e para autnomos. A CONSTITUIO DO MERCADO DE PLANOS SADE DE EMPRESAS Desde seu incio, o empresariamento da medicina no Brasil esteve fortemente ligado a determinadas demandas de empresas, especialmente da indstria de So Paulo, que buscavam alternativas de assistncia, para seus empregados, mais eficientes do que a da Previdncia Social. As empresas mdicas (cooperativas mdicas e empresas de medicina de grupo), incentivadas pelas polticas de privatizao que a Previdncia Social estimulou, surgiram, assim, em So Paulo em meados da dcada de 60 e se expandiram durante os anos 70, atravs dos convnios-empresa. Estes convnios eram financiados pela Previdncia Social, atravs do pagamento, per capita, dos trabalhadores e de seus dependentes a empresas que optassem pelo atendimento de seus trabalhadores por medicinas de grupo e empresas mdicas. Ou que estruturassem uma rede de provedores de servios administrada pela prpria empresa4. No final dos anos 70, os convnioempresa deixaram de ser intermediados pela Previdncia Social, e passaram a ser celebrados, diretamente, entre as empresas - empregadoras e as empresas mdicas. At meados dos anos 80, o mercado de planos de sade era, quase que exclusivamente formado pelos planos de empresa. Nesta poca, uma parte significativa das grandes operadoras de planos de sade como a Interclnicas, a Intermdica, a Medial, a Golden Cross e a Unimed e os planos prprios das grandes montadoras, empresas estatais e de associaes de categorias - como o dos bancrios - j estavam consolidados. Em 1981, segundo a ABRAMGE, as medicinas de grupo respondiam pela cobertura de 8,5 milhes de pessoas, ou seja, cerca da metade dos 18,3 milhes de clientes contabilizados em 1999. Os planos de empresa contratados junto s empresas mdicas eram, em geral, integralmente financiados pelas empresas empregadoras; algumas empresas tinham planos prprios, em especial no setor privado, e custeavam, totalmente, os planos de sade dos seus trabalhadores. J nas empresas estatais, e nas

20

categorias que, mantinham entidades jurdicas paralelas, -sob a modalidade de caixas de assistncia -, os empregados sempre contriburam para o financiamento de seus planos. Os servios oferecidos por esses planos eram variados. De acordo com o status da empresa, ou da categoria profissional, e, ainda, com o nvel hierrquico dos beneficirios, o atendimento aos empregados podia restringir-se a estabelecimentos de sade e a consultrios mdicos da empresa mdica contratada, facultar o atendimento em servios prprios da empresa empregadora, ou permitir a livre escolha de servios, atravs do reembolso de despesas. Nos ltimos anos da dcada de 80, este mercado modificou-se substancialmente, e adquiriu suas caractersticas atuais. Algumas empresas de medicina de grupo, particularmente a Golden Cross, romperam com a modalidade de convnios, e passaram a negociar planos individuais, com padres de cobertura muito diferenciados. Alguns planos comearam a garantir atendimento em qualquer lugar do pas, e outros a assegurar assistncia internacional, assim atendendo as autnomos, ou dos que dispunham demandas de trabalhadores de renda para pagar um plano de sade. E at

funcionrios pblicos, mesmo sob a cobertura de esquemas de assistncia alternativos a exemplo dos empregados em institutos de aposentadorias e penses de servidores estaduais e municipais e dos magistrados mesmos, com vistas, estruturaram planos de autogesto. ampliao dos Aqueles que j usufruam de planos privados de sade exigiram a

sobretudo, a se incluir oferta de servios especializados. Em

decorrncia , modificou-se a utilizao complementar de servios de sade pblicos e privados no cotidiano das camadas mdias da sociedade. O consumo de servios de sade passou a depender, quase exclusivamente, dos planos de sade, no que se refere s coberturas previstas pelas operadoras; e os servios pblicos passaram a ser usados apenas para atendimentos que as empresas de assistncia suplementar no ofereciam, ou para a realizao de atividades tpicas da sade pblica, como a vacinao, por exemplo. A essa ampliao das demandas correspondeu uma extenso de cobertura, a se traduzir na montagem de extensas redes credenciadas, adicionais aos servios prprios das empresas mdicas, e de algumas empresas mdicas empregadoras. As relaes entre empresas mdicas, empresas empregadoras e os provedores de servios resultaram em um padro de atendimentos, dos prestadores privados, a clientes dos mais variados convnios, de planos individuais e do SUS. Por sua vez, credenciadas praticamente eliminaram a modalidade reembolso, que estas redes se tornou

prerrogativa apenas de um nmero muito restrito de clientes, de nvel executivo. Alm disso, muitas empresas empregadoras decidiram transformar planos no-contributrios

4

Ver CORDEIRO (1984), GIFFONI (1981) e BAHIA (1999).

21

em contributrios e introduziram mecanismos de co-pagamento para a utilizao de servios. Este padro de empresariamento mais extenso e integrado completou-se com a atuao mais sistemtica das seguradoras no ramo sade, a partir de 1989. Nesse ano, a Superintendncia de Seguros Privados (Susep) autorizou as seguradoras a se vincularem a servios de sade5. As seguradoras disputaram clientes individuais e empresas com as empresas mdicas e expandiram suas atividades administrao de planos de autogesto. Adquiriram, tambm, atravs da terceirizao de funes de gerncia, clientes de planos prprios de empresas empregadoras. Mais recentemente, apesar da incluso de novos segmentos ao mercado de planos e seguros de sade, surgiram indcios de que o baixo dinamismo da economia brasileira, nesses ltimos anos, e o elevado ndice de desemprego no mercado formal de trabalho, esto provocando retrao no volume de clientes de planos de sade. Os prprios7

dirigentes

das

operadoras

de

planos

e

seguros6 ,

ou

consultores , admitem no haver um crescimento contnuo do nmero de clientes de planos e seguros. Por outro lado, as mudanas no mercado de trabalho estimulam mecanismos de incluso de desempregados9

agregados8 de

(dependentes algumas

no diretos ) e ampliam a

e

aos

planos prprios

empresas

Os instrumentos legais relacionados com o seguro sade (Decreto-Lei 73/66 e sua regulamentao) impediam a vinculao de provedores de servios s seguradoras 6 O ano de 1997 foi o ano de menor crescimento na histria da Amil, as seguradoras tiveram resultados operacionais negativos (Antonio Jorge Kropf, Diretor Tcnico da Amil, durante conferncia no seminrio O Impacto da Regulamentao nas Operaes de Seguros, realizado pela Fundao Nacional Escola de Seguros, no Rio de Janeiro, em 20 de maio de 1998, segundo anotaes pessoais da pesquisadora Ligia Bahia). 7 A recesso j existe entre ns e vamos viver um processo econmico de propores alarmantes. Essa histria que o setor [de empresas de planos e seguros sade] cresce balela. Se existe uma reduo do nmero de trabalhadores das grandes e mdias empresas, o setor decresce. A indstria, que era a grande contratante de empresas [de planos de sade], est diminuindo. comum que uma indstria, com 5.000 trabalhadores antigamente, agora tenha 2.000. H uma mudana no perfil de empregos em direo prestao de servios, que no contratante de planos de sade. Essa mudana pode no impactar a proporo entre empregados e desempregados, mas impacta a quantidade de contratantes das operadoras de planos. Os nmeros que existem por a so de 40 milhes [de pessoas cobertas por planos de sade]. Eu no acredito nesses nmeros. Acredito que existam no mximo 30 a 35 milhes com planos de sade (Cludio da Rocha Miranda, consultor, durante palestra na I Jornada de Sade, realizada pela Fundao Getlio Vargas, no Rio de Janeiro, em 20 de novembro de 1997, segundo anotaes pessoais da pesquisadora Ligia Bahia). 8 O plano de agregados da Caixa de Assistncia do Banco do Brasil iniciou a incluso de novos clientes a partir de fevereiro de 1997, e possui, atualmente, cerca de 200.000 clientes; ao plano de associados, que se refere aos empregados ativos do Banco, aposentados, pensionistas e seus dependentes, vinculam-se 300.000 pessoas. 9 A Caberj, mantida mesmo aps a privatizao do Banerj, criou um plano de agregados em 1996, para prestar cobertura aos ex-funcionrios.

5

22

massa

de

clientes das mesmas. O QUADRO 1 mostra um processo acelerado de

constituio de um importante segmento econmico, a ultrapassar, em muito, a motivao inicial de prestao de assistncia mdico-hospitalar, diferenciada, para os trabalhadores de algumas empresas. QUADRO 1 MUDANAS NO MERCADO DE PLANOS E SEGUROS SADE NA DCADA DE 90 ELEGIBILIDADE DEMANDAS Trabalhadores assalariados do setor privado Trabalhadores autnomos; Trabalhadores de pequenas empresas com altos rendimentos Funcionrios pblicos de instituies federais PADRO ASSISTENCIAL FINANCIAMENTO Ampliao da rede credenciada de provedores de servios. Planos individuais; Atendimento atravs de redes credenciadas de servios. REORGANIZAO CRIAO DE EMPRESAS DE PLANOS E SEGUROS DE SADE Entrada das seguradoras no mercado; Consolidao de empresas com atuao nacional ( como Amil, Golden Cross etc.); Criao de empresas (associaes, entidades de previdncia fechada); Diversificao da atuao das grandes empresas e da Unimed, inclusive no que tange a aquisio e distribuio de medicamentos (como a Farmalife, do grupo Amil, e as Usimeds); Associaes entre empresas de assistncia mdica suplementar, de distintas naturezas jurdico-institucionais; Formao de grupos empresariais; Criao de empresas de medicina de grupo de pequeno porte, e comercializao de planos por hospitais filantrpicos de cidades interioranas.

Ampliao da rede credenciada de provedores de servios: Adeso aos planos de outras instituies pblicas (GEAP): Contratao de planos de sade de empresas mdicas ou de seguradoras: Estruturao de planos para absorver funcionrios demitidos e dependentes agregados; Introduo de mecanismos de co-pagamento. Funcionrios pblicos de Ampliao da rede instituies estaduais e credenciada de provedores de municipais servios; Contratao de planos de sade de empresas mdicas ou seguradoras. Trabalhadores Planos individuais; autnomos; Atendimento atravs de redes Trabalhadores de prprias de servios de pequenas empresas empresas mdicas com baixos regionalizadas rendimentos

23

PERFIL DO MERCADO DE PLANOS DE EMPRESAS As pesquisas sobre planos de benefcios das empresas brasileiras, realizadas

pela Towers Perrin, de 1988 a 1999, sobre algumas das empresas de maior porte, mostram que praticamente todas as grandes empresas possuem planos privados de sade. E que um percentual elevado das mesmas tambm oferece seguros de vida e planos de previdncia complementar para seus empregados (TABELA 3). TABELA 3 PROPORO DE EMPRESAS QUE CONCEDEM BENEFCIOS SELECIONADOS DO INQURITO DA TOWERS PERRIN BRASIL 1988-1996 1999 1988 1990 1991 1992 1993 1994 1995 1996 1999 Planos Sade 98.51 97.80 99.38 97.09 97.05 94.48 Seguro de Vida 89.55 92.04 90.74 91.26 94.22 88.31 Previdncia Privada 34.83 34.96 37.65 42.07 48.08 48.05 Fonte: Planos de Benefcios no Brasil - Towers Perrin 97.70 92.74 100.00 91.57 87.13 94.00 52.49 52.15 68.00

Para aproximadamente 49% das empresas pesquisadas pela Towers Perrin, em 1999, o custo dos planos de sade representou entre 5% a 9% das folhas nominais de salrios (GRFICO 1). Informaes da ABRASPE confirmam estes resultados: durante 1999, as empresas privadas, com planos prprios, comprometeram, em mdia, 5,12% de sua folha nominal com assistncia mdico-hospitalar, privada.

Grfico 1 Proporo de Empresas do Inqurito da Towers Perrin segundo Faixas de Custo Total (empresa+empregado) de Planos/Seguros Sade como % da Folha de Salrios Brasil -199650,0 40,0 30,0 20,0 10,0 0,0 9%

24

Alm dos planos assistncia

e seguros de sade, que restringem suas coberturas muitas empresas propiciam a seus empregados

mdico-hospitalar,

medicamentos, culos, lentes e assistncia odontolgica - atravs de reembolso e de planos adicionais aos denominados convnios mdicos. As despesas das empresas com benefcios relacionados diretamente sade ultrapassam, portanto, as que realizam com o pagamento de planos de sade, ou com a utilizao de servios mdicohospitalares. A composio dos benefcios, inclusive os de sade, varia muito segundo as empresas, embora seja possvel associar algumas caractersticas do conjunto de benefcios ao tipo de empresas. Assim, empresas de maior porte, pertencentes aos setores mais dinmicos da economia e/ou sob regime de monoplio, bem como as que possuem trabalhadores mais organizados, tendem a ser mais prdigas nos benefcios10. Disparidades entre os benefcios oferecidos pelas pequenas e pelas grandes empresas so sobejamente conhecidas, e exploradas na literatura. Nos Estados Unidos, parte dos trabalhadores de pequenas empresas compe uma das parcelas da populao desvinculada de alguma alternativa formal de proteo social; essa realidade estimulou a adoo de incentivos tributrios, a fim de se incluir estes trabalhadores em planos de sade, bem como de se garantir aos que viessem a mudar de emprego; o direito de conservar o plano. No Brasil, a associao entre cobertura de planos de sade e vnculo empregatcio a empresas de maior porte muito ntida, como o mostram os resultados da Pesquisa sobre Qualidade de Vida, feita pelo IBGE (GRFICO 2). O poder de organizao dos trabalhadores de determinadas categorias profissionais, ou de empresas a reunir um contingente reduzido de pessoas , contudo, digno de nota; exemplos podem ser encontrados em associaes e sindicatos de servidores pblicos, como os fiscais da receita federal, magistrados de determinados Estados da federao, que mantm planos prprios - e empregados de fundaes pblicas. Isso sugere a necessidade de se incorporar anlise das coberturas dos planos de sade de empresas o estudo da maior capacidade de articulao de categorias, ou de trabalhadores de determinadas empresas, para lograr benefcios diferenciados. E, tambm da influncia e do poder de negociao de mdicos, de empresas mdicas e de seguradoras, junto s empresas empregadoras.

10

Ver CANTOR et alli, 1995.

25

Grfico 2 Proporo de Pessoas Cobertas por Planos e Seguros Sade segundo Porte da Empresa em que Trabalha - Regies Nordeste e Sudeste, 1996/1997 70,0 60,0 50,0 40,0 30,0 20,0 10,0 0,0 >1 e < 19 >20 e < 99 > 100 e < 199 > 200 Fonte: PPV/IBGE Bahia, L Dados recalculados por Viacava, F. Nordeste Sudeste Total

O ramo de atividade tambm influi sobre o perfil de cobertura por planos privados de sade. O GRFICO 3 mostra estar a cobertura dos planos de empresas dirigida, principalmente, para os trabalhadores da indstria da transformao (23,5%), para aqueles empregados em atividades sociais (20,8%) e para integrantes da administrao pblica (15,3%); os planos individuais voltam-se, em primeiro lugar, para o comrcio (21,4%), e, a seguir, para as atividades sociais (17,9%) e para a prestao de servios auxiliares atividade econmica (15,3%).

26

Grfico 3 Cobertura de Planos segundo Ramo de Atividade e Forma de Contratao Pnad/ Ibge Brasil 1998

Outas Atividades Administrao Pblica Social Transporte e Comunicao Servios Auxiliares Prestao de Servios Comrcio de Mercadorias Outras Atividades Industriais Indstria da Cosntruo Indstria da Tranf ormao A gricola 0% 20% 40% 60% 80% 100%

Plano Empresarial Plano Individual Outra Forma de Contratao

plausvel admitir uma relao entre empresas empregadoras de maior porte e grandes operadoras de planos de sade. Essa relao seria decorrncia da necessidade de se propiciar coberturas que atendam diversificao das atividades das empresas pelo territrio nacional e necessidade de deslocamento de funcionrios pelo pas e pelo mundo. E, tambm, de outras transaes comerciais e financeiras entre as operadoras e as firmas. No possvel, todavia, estabelecer uma regra nica para explicar a aproximao entre empresas empregadoras e operadoras. Existem grandes operadoras que possuem uma parcela significativa de clientes de planos individuais, e operadoras de menor porte a atuarem apenas no mercado de planos de empresas. Tampouco a realidade admite uma associao imediata entre os tipos de operadoras, - segundo sua natureza jridico-institucional - e as modalidades de empresas empregadoras; medicinas de grupo, cooperativas mdicas e seguradoras tm forte presena no mercado de planos de empresas. A variao do nmero de empresas empregadoras vinculadas a cada uma das quatro modalidades do mercado de assistncia mdica suplementar sugere, porm, uma clara ligao entre as grandes empresas e os planos de autogesto e entre as medicinas de grupo, e as Unimed's, e empresas de menor porte, como possvel deduzir-se do QUADRO 2. 27

QUADRO 2 NMEROS DE EMPRESAS E DE CLIENTES DE MEDICINAS DE GRUPO E DE COOPERATIVAS, E NMERO DE EMPRESAS, E DE CLIENTES,COM PLANOS DE AUTOGESTO BRASIL MODALIDADE EMPRESARIAL NMERO DE EMPRESAS EMPREGADORAS NMERO TOTAL DE CLIENTES

Medicinas de Grupo 48.500 18.300.000 (1998)* Unimed's (1999) ** 70.000 11.000.000 Autogestes (2000) *** 364 11.000.000 Fontes: * Abramge, 1999. ** Unimed, 1999 apud Bahia, L. (1999). *** Dados sobre autogestes extrados do Informe de Imprensa Abramge 2000. Mesmo considerando-se a lacuna de informaes sobre o nmero de firmas a contratar seguradoras para operarem seus planos de sade, imenso o nmero de empresas empregadoras ausentes do mercado de assistncia suplementar; as empresas empregadoras e os planos de sade, somados, representam menos de 10% do total dos 1.968.276 empresas constantes da Relao Anual de Informaes Sociais (RAIS), em 1997. TIPOS DE PLANOS DE EMPRESAS Sabe-se que uma mesma empresa empregadora pode estabelecer contratos com uma ou mais operadoras, bem como oferecer alternativas quanto ao padro dos planos. Nos Estados Unidos, as empresas empregadoras, especialmente as de maior porte, costumam oferecer mais de um plano, costumam oferecer produtos de mais de uma operadora para seus empregados (QUADRO 3). Essas alternativas tm sido incentivadas pelas polticas governamentais, com o intuito de proteger os consumidores da seleo de riscos das operadoras e de se reduzirem os preos. Tais polticas pressupem que as firmas, na qualidade de importantes financiadores do sistema de sade, sejam capazes de equilibrar a crescente espiral de gastos com assistncia mdico-hospitalar.

28

QUADRO 3 MERCADO DE PLANOS DE SADE SEGUNDO PROPORO DE OPES E SEGUNDO PORTE DA EMPRESA EMPREGADORA EUA (1996) PEQUENA EMPRESA GRANDE EMPRESA N DE PLANOS (%) (%) 1 plano 80 47 2 planos 14 23 3 ou mais planos 6 30 Fontes: Health Insurance Association of America, 1998, e KPMG Peat Marwick, 1996. Adaptado de Ginsburg e Hunt, 1997: 106. Extrado de Bahia, L. (1999) No Brasil, as firmas realizam, quase sempre, contratos com uma nica operadora; as excees so encontradas nas empresas que atuam em vrias localidades, em algumas das quais a operadora selecionada no dispe de rede assistencial. Em conseqncia, assim , torna-se possvel uma negociao mais adequada de coberturas e preos, mas se reduz a possibilidade de escolha dos empregados. A variao entre os padres de planos oferecidos por uma mesma operadora, ou ainda organizados pelas prprias empresas empregadoras, tem, no entanto, conseguido ampliar-se. A padronizao dos planos est associada a uma hierarquia das demandas, estabelecida de acordo com o nvel scio-econmico. A Towers Perrin identifica quatro padres de planos, segundo os nveis hierrquicos das empresas. E registra que em 83% das empresas pesquisadas os quadros de diretoria dispunham de planos executivos e 73% das firmas ofereciam o plano bsico para o grupo operacional (QUADRO 4). E que algumas grandes empresas estatais e multinacionais mantinham um nico padro assistencial para todos os empregados.

QUADRO 4 PROPORO DE EMPRESAS SEGUNDO TIPOS DE PLANOS POR NVEL HIERRQUICO DOS EMPREGADOS BRASIL (1999) NVEL PLANO PLANO PLANO PLANO HIERRQUICO BSICO INTERMEDIRIO SUPERIOR EXECUTIVO Diretoria 12% 14% 23% 86% Gerncia 14% 41% 68% 58% Administrao 80% 56% 38% 7% Operacional 73% 36% 25% 3% Fonte: Towers Perrin - Pesquisa de Benefcios, 2000

29

Os planos das empresas podem ser operados por empresas comerciais (medicinas de grupo, cooperativas mdicas ou seguradoras) ou organizados pelas prprias empresas empregadoras (autogesto). Ambos os subsegmentos o comercial e o no-lucrativo ocupam importantes posies no mercado de planos empresariais, e se diferenciam pela forma de gesto do risco: as autogestes so formas de reteno do risco pelas empresas empregadoras, enquanto as empresas comerciais configuram alternativas de transferncia dos riscos das despesas assistenciais para as operadoras. Nos ltimos anos, intensificou-se a interpenetrao dos segmentos comercial e nolucrativo, atravs da ampliao dos planos de autogesto administrados por empresas de medicina de grupo, cooperativas mdicas e seguradoras. Paralelamente a isso, observaramse movimentos de expanso de algumas autogestes, por meio da administrao de planos de outras firmas. Em outras palavras, cresceram os denominados planos de custo operacional (ps-pagamento), que j correspondem a mais de 50% dos planos de grandes empresas empregadoras11. Tais produtos so hbridos, pois,se admitem uma administrao terceirizada, preservam uma caracterstica mutualista, uma vez que no h transferncia do risco da empresa empregadora para a operadora a administrar o plano.

DESAFIOS REGULAO, E SUGESTES PARA ENFRENT-LOS Os planos de empresas apresentam importantes desafios para a regulao por parte do governo. E o governo deve, inicialmente, responder s seguintes perguntas: Como preservar as coberturas para os trabalhadores temporariamente afastados do mercado de trabalho (desempregados) e para os aposentados, que deixam de pertencer ao grupo de trabalhadores ativos? Ser que os preceitos legais que determinam a manuteno das coberturas condicionada ao tempo anterior de contribuio e demisso sem justa causa so suficientes para resguardar os direitos desses segmentos populacionais? A legislao no faz referncia a dois importantes aspectos dos planos de empresas: a elegibilidade de dependentes (arbitrada diretamente pela empresa empregadora) e os subsdios tributrios envolvidos com o financiamento desses planos. A existncia de subsdios cruzados neste segmento, isto , de pessoas com mais de um plano de sade (titular de um plano empresarial e dependente, como cnjuge, de outro, ou dependente de mais um plano, na condio de filho, de pai e de me, vinculados a planos de empresas), tem que ser considerada no processo de aperfeioamento das normas legais.

30

Uma outra dimenso, muito complexa, tambm no pode ser esquecida. E, diz respeito aos modelos de assistncia constitudos pelos planos empresas. A especializao, a possibilidade de escolha dos provedores de servios, a ausncia de

responsabilidade pelo acompanhamento dos clientes e a baixssima ocorrncia de aes voltadas para a preveno e a promoo da sade configuram-se como as principais caractersticas dos esquemas de assistncia privados, voltados para o pronto atendimento curativo dos trabalhadores especializados e de seus dependentes. Por fim, fundamental refletir sobre a manuteno, e mesmo a ampliao, do mercado de planos empresas, num contexto de desestruturao do mercado de trabalho. Como estimular a associao entre potenciais clientes de planos de sade em empresas de menor porte ou no mercado informal? Como incentivar a oferta de planos capazes de atender s necessidades dessas pessoas? Como conferir viabilidade econmico-financeira a esses produtos e operadores? As ltimas indagaes merecem uma reflexo, pois, se devidamente

respondidas, podem permitir no s uma expanso do mercado, como uma melhoria da assistncia aos trabalhadores do pas. As informaes at aqui apresentadas mostram estar o mercado de planos coletivos de sade restrito, quase por completo, s empresas de grande porte, sejam pblicas ou privadas, sejam de capital nacional ou estrangeiro. E se algumas empresas de mdio porte conseguem contratar planos de sade, mas no segmento das micro e pequenas empresas praticamente inexiste esse tipo de benefcio. Em nossa hiptese, essa situao se deve maior vulnerabilidade, das empresas de menor porte s vicissitudes do ciclo de negcios; assim, seus planos, quando contratados, padecem de vigor, tm vida curta. Alm disso, os trabalhadores do mercado informal, que recebem baixas remuneraes, esto, por princpio, excludos do mercado dos planos de sade. Uma hiptese subsidiria consiste no fato de que, pelo lado das operadoras, o risco de contratar planos coletivos com empresas pequenas, e mesmo de mdio porte, no seria um negcio atraente, em virtude da ameaa de cancelamento dos contratos. Alm disso, como a populao, nessas empresas, reduzida, os preos desses planos so sempre mais elevados. Se essas hipteses se confirmarem, devemos que tornem os planos mais atraentes, dos lados de da sade para trabalhadores de buscar e mecanismos da oferta , Com

demanda

empresas de porte informal.

reduzido e, at mesmo, para trabalhadores do mercado

11

Ver Towers Perrin (2000).

31

isso, uma parcela maior de trabalhadores ter de sade.

possibilidade de dispor de um plano

Para a construo desses mecanismos, primeiro preciso resolver alguns problemas. O primeiro diz respeito ao produto a ser oferecido, que dever ser um produto bsico, ou seja, uma cobertura de servios limitada (assistncia ambulatorial bsica e assistncia hospitalar bsica) e atendimento restrito (sem livre escolha), oferecer plena cobertura a acidentes de trabalho e doenas profissionais, alm de outros agravos no indiretamente ligados atividade laborativa. O plano dever, tambm, ser gratuito para o trabalhador (ainda que extensivo a seus dependentes diretos, como o cnjuge ou companheiro/a sem renda e filhos menores), mediante pagamento pelo beneficirio; a cobertura tambm poder ser ampliada, mediante pagamento da diferena, pelo beneficirio. Finalmente, o custo do plano, para a empresa, dever ser suficientemente baixo para torn-lo atraente 12. Essa definio importante para podermos delimitar o segmento de mercado que se quer atingir, pois, com essa configurao, o produto poderia competir com os planos individuais de sade, atualmente oferecidos pelas seguradoras. A segunda questo diz respeito ao contratante: No caso de pequenas e mdias empresas, nossa sugesto a de se estimular a formao de consrcios de empresas de porte reduzido, por segmento ou natureza de atividade. E, no caso de trabalhadores informais, sugerimos a formao de algum tipo de consrcio, ou de associao mutualista, capaz de congregar trabalhadores de atividades assemelhadas. A terceira questo, talvez a mais decisiva de todas, diz respeito necessidade de um sistema de incentivos que estimule o mercado. Do ponto de vista da demanda, no h, atualmente, nenhum mecanismo de incentivo capaz de ampliar as dimenses do mercado. As empresas lucrativas (em geral as grandes empresas) j oferecem planos de sade para seus empregados, e se beneficiam do desconto do Imposto de Renda; as que no o fazem so as empresas no-lucrativas. Quanto s empresas de porte reduzido, j dispem de mecanismos legais que reduzem ao mnimo sua contribuio ao fisco. No caso dessas empresas, o melhor estmulo a diminuio do custo dos planos de sade. Finalmente, para os trabalhadores do mercado informal, mais importante definir as normas a presidirem a unio trabalhadores de modo a se reduzirem riscos e custos - do que definir incentivos. Do ponto de vista da oferta, impossvel imaginar um mecanismo de estmulo poderoso. O risco em que incorrem as operadoras no segmento de empresas de porte12 No caso dos trabalhadores do mercado informal, o produto a ser oferecido dever ter caractersticas semelhantes, porm sem cobertura profissional.

32

reduzido, pode ser reduzido ao mnimo se o Estado, atravs de alguma agncia financeira oficial, assumir o papel de ressegurador da operao. Esse resseguramento poderia dar-se atravs da constituio de um fundo de assistncia financeira, voltado exclusivamente para os casos de inadimplncia ou de elevado ndice de cancelamento de planos, devidos oscilao do ciclo de negcios. A adoo de sugestes como as apresentadas aqui ir definir o papel que a ANS desempenhar na regulao do mercado de planos de empresas e na melhoria dos nveis de sade dos brasileiros. REFERNCIAS BIBLIOGRFICAS: 1. ABRAMGE (Associao Brasileira de Servios Assistenciais de Sade Prprios das (Empresas) (2000): Informe de Imprensa. So Paulo: Abramge. 2. BAHIA, L. (1999): Mudanas e padres das relaes pblico-privado: seguros e planos de sade no Brasil. Tese de Doutorado. Rio de Janeiro: Escola Nacional de Sade Pblica. Fundao Oswaldo Cruz. 3. BNDES (1996): Qualidade e produtividade na indstria brasileira. Rio de janeiro: BNDES, CNI, Sebrae. 4. CANTOR, J.C., LONG, S. H. e MARQUIS, S.: Private employment-based health insurance in ten states. Health Affairs 14 (2): 199--211, 1995. 5. CORDEIRO, H. (1984): As empresas mdicas: as transformaes capitalistas da prtica mdica. Rio de Janeiro: Edies Graal. 6. GIFFONI, R.M. (1981): Assistncia mdica e as relaes de trabalho na empresa: o modelo de convnio com a Previdncia Social. Dissertao de Mestrado. So Paulo Universidade de So Paulo. 7. IBGE (1998): Pesquisa sobre padres de vida 1997 (micro-dados). Rio de Janeiro: Fundao Instituto Brasileiro de Estatstica; Departamento de Populao e Indicadores Sociais. 8. _______ PNAD (2000): Pesquisa nacional por amostra de domiclios: acesso e utilizao de servios 1998. Rio de Janeiro: Fundao Instituto Brasileiro de Estatstica; Departamento de Populao e Indicadores Sociais. 9. IBOPE (1998) (Instituto Brasileiro de Pesquisa de Opinio): Utilizao de servios de sade.

33

10. NICHOLS, L. M. e BLUMBERG, L. J. (1998): A different kind of new federalism? The Health Insurance Portability and Accountability Act of 1996. Health Affairs v 17(3): 25-40. 11. TOWERS PERRIN (2000): Pesquisa de Planos de Benefcios no Brasil.

34

Dimenso e Estrutura Econmica da Assistncia Mdica Suplementar no Brasil George Edward Kornis* Rosngela Caetano** Introduo A atividade de sade um setor produtivo responsvel pela gerao e pela circulao de valores to expressivos quanto limitadamente conhecidos. A produo de informaes detalhadas sobre a estrutura, a distribuio e a evoluo destes valores fundamental para a tomada de decises, a formulao e o acompanhamento de polticas pblicas no setor. Estas informaes assumem um carter ainda mais relevante em situaes de restrio de recursos como nos pases menos desenvolvidos e, em particular, do Brasil , quando as mesmas podem ser importantes para a melhoria da gesto e da regulao estatal do setor sade. A expanso e o impacto das recentes iniciativas do governo, no sentido de regulamentar o segmento de assistncia mdica suplementar desencadeadas a partir da entrada em vigor da Lei n 9.656/98, e das vrias medidas provisrias e resolues subseqentes tornam imperiosa a necessidade de se ampliarem os conhecimentos sobre a estrutura produtiva e sobre a dinmica desse segmento. Assim ser possvel subsidiar as iniciativas, do Ministrio da Sade, de acompanhamento e regulao das instituies a atuarem nesse campo da assistncia. Essa preocupao com o desenvolvimento de sistemas de acompanhamento e regulao do funcionamento das entidades de assistncia mdica privada no Brasil, alm de atender a uma determinao legal, disposta na Lei Orgnica da Sade (Lei 8080 de 19 de setembro de 1990), est diretamente relacionada com o peso dos gastos relativos aos cuidados de sade no oramento das famlias brasileiras. Segundo a ltima Pesquisa de Oramentos Familiares (POF) realizada no Brasil (IBGE, 1999), o gasto mdio mensal das famlias, com "assistncia sade" exposto na Tabela 1, abaixo. Os itens classificados como gastos com "assistncia sade" incluem tanto as despesas com pagamento de planos de sade (1,89%) quanto aquelas com medicamentos*- Economista. Professor Adjunto do Instituto de Medicina Social da UERJ ** - Mdica. Pesquisadora Associada do Instituto de Medicina Social da UERJ13 Nos grandes grupos de despesa de consumo, publicados pela POF, para o conjunto da populao, os gastos com sade s foram suplantados pelos gastos das famlias com "alimentao" (16,61%), "habitao" (20,51%), "transporte" (9,81%) e "outras despesas correntes" (10,12%). Assim, os gastos das famlias brasileiras com cuidados de sade superam as despesas com vesturio (4,7%), higiene e cuidados pessoais (1,35%), educao (3,46%), recreao e cultura (2,51%), fumo (1%), servios pessoais de beleza (1,16%) e despesas diversas (3,51%).

13

representou,

no perodo de outubro de 1995 a setembro de 1996, 6,5% do total dos gastos, conforme

35

(1,89%), tratamento dentrio (0,97%), consulta mdica (0,26%), hospitalizao (0,16%), culos e lentes (0,17%) e outras (1,18%). Tabela 1Gasto Mdio Mensal das Famlias Brasileiras (%) Outubro de 1995 a Setembro de 1996 Classes de rendimento mensal (salrio mnimo) Mais de Mais de Mais de Mais de Mais de Mais de 2a3 3a5 5a6 6a8 8 a 10 10 a 15 100,00 100,00 100,00 100,00 100,00 100,00 100,01 100,00 81,26 95,05 92,90 91,56 91,25 88,32 86,67 85,17 71,14 93,07 89,95 87,58 85,45 82,29 80,18 78,09 16,61 32,29 33,39 29,48 26,07 24,34 21,86 18,9 20,51 25,64 23,73 24,19 24,78 22,96 22,58 22,69 4,7 5,27 5,48 5,73 5,84 5,66 5,72 5,7 9,81 8,85 9,29 10,65 10,15 10,73 10,41 10,53 Higiene e cuidados pessoais 1,35 1,94 1,88 2,04 2,2 1,91 1,77 1,58 Assistncia a sade 6,5 9,59 7,29 6,65 6,54 6,57 7,04 6,84 Educao 3,46 1,38 1,51 1,75 2,25 2,05 2,25 3,19 Recreao e cultura 2,51 1,49 1,21 1,64 2,13 2,34 2,36 2,72 Fumo 1 2,81 2,53 2,1 1,72 1,84 1,79 1,2 Servios pessoais 1,16 1,06 1,27 1,12 1,11 1,22 1,25 1,28 Despesas diversas 3,51 2,24 2,37 2,24 2,66 2,66 3,14 3,46 Outras despesas correntes 10,12 1,98 2,95 3,98 5,8 6,03 6,49 7,08 Aumento do ativo 16,92 4,47 6,15 7,6 8,22 10,63 12,31 12,87 Diminuio do passivo 1,82 0,48 0,95 0,84 0,53 1,05 1,03 1,96 Fonte: IBGE. Diretoria de Pesquisa, Departamento de ndice de Preos. Pesquisa de Oramentos Familiares: 1995-1996. Total At 2

Tipos de despesas Desembolso global Despesas correntes Despesas de consumo Alimentao Habitao Vesturio Transporte

Mais de 15 a 20 100,00 84,28 76,60 16,2 20,2 5,29 11,19 1,35 7,55 4,06 2,89 1,16 1,39 3,32 7,68 14,1 1,62

Mais de Mais de 20 a 30 30 99,99 99,99 80,19 74,58 71,40 59,59 16,23 10,26 19,92 17,8 4,25 3,83 10,25 8,85 1,48 0,89 6,76 5,8 4,56 3,95 2,54 2,66 0,68 0,41 1,13 1,07 3,6 4,07 8,79 15 17,89 23,05 1,91 2,36

Um conhecimento minucioso, e uma mensurao criteriosa das relaes e dos fluxos monetrios afeitos ao segmento da assistncia mdica suplementar so necessrios para o governo poder melhor acompanhar e regular as atividades e o funcionamento desse subsetor. Este artigo tem por objetivo ampliar o conhecimento acerca da estrutura produtiva e da dimenso econmica do subsetor de assistncia mdica suplementar. Partindo de uma metodologia fundada no Sistema de Contas Nacionais, os autores propem um modelo de representao desse subsetor e realizam um conjunto de estimativas sobre o peso econmico das diversas modalidades de assistncia, no PIB, para o ano de 1997. A Opo pelo Sistema de Contas Nacionais A elaborao de Contas Nacionais para a rea de Sade uma forma privilegiada de obteno de informaes sobre esse subsetor. Isto porque as Contas Nacionais permitem conhecer as dimenses macroeconmicas do sistema de sade bem como a de seus vrios subcomponentes, como o caso da assistncia mdica suplementar. E fornecem uma viso geral tanto sobre a origem e o volume dos fluxos financeiros relacionados com as atividades de sade, quanto sobre o destino e o uso detalhado dos recursos. Alm disso, informam sobre os fluxos dos recursos financeiros no setor. As contas setoriais so uma extenso metodologicamente assentada sobre a verso 93 do Sistema de Contas Nacionais (SCN), desenvolvido pela Organizao das Naes Unidas h mais de 40 anos. O SCN permite a integrao de dados estatsticos com conceitos macroeconmicos, e compreende um conjunto de contas que retratam as diversas etapas e transaes realizadas pelos agentes econmicos. Estas contas tambm fornecem

36

uma viso sistemtica das relaes entre os agentes, as transaes entre os mesmos sendo apresentadas sob a forma de um conjunto detalhado e coerente de contas, balanos e quadros, baseados em conceitos, definies, classificaes e regras de contabilidade. Em funo da disponibilidade dos dados, tambm possvel definir, atravs da elaborao de Contas Satlites, classificaes e mtodos alternativos de avaliao de um setor cujas caractersticas no correspondam ao modelo geral das contas nacionais. As Contas Satlites surgiram em resposta necessidade de se expandir a capacidade de anlise das Contas Nacionais sobre determinadas reas de interesse social, de uma maneira flexvel e sem se sobrecarregar, ou desorganizar, a estrutura integrada do SCN. Enquanto o corpo central desse Sistema consiste em um conjunto de contas e tabelas que procura registrar, de forma integrada, as operaes (no-financeiras e financeiras) realizadas pelos agentes econmicos classificados segundo setores institucionais e ramo de atividade econmica , as Contas Satlites compreendem informaes scio-econmicas relacionadas com o SCN. E essas informaes tm a particularidade de no precisarem ser expressas em valores monetrios, ou de fornecerem dados especficos para a construo de subsistemas, tais como Conta Satlite da Sade, da Educao, do Turismo, do Meio Ambiente, etc. As Contas Satlites de Sade ao integrar dados monetrios e fsicos ao conjunto das estatsticas econmicas em geral so capazes de desempenhar o duplo papel de instrumento de anlise e de meio de coordenao estatstica (United Nations, 1993). Ao quantificar os recursos envolvidos, e sua proporo no Produto Interno Bruto de um pas, o uso das Contas Satlites auxilia na resposta a perguntas como: Quanto gasta a sociedade em servios de sade? Em que proporo as famlias, as empresas, o governo contribuem para o financiamento da sade? Qual a importncia relativa dos agentes de intermediao financeira, que captam os recursos das fontes e os repassam aos diferentes provedores, programas e elementos de gasto? Quais os tipos de servios de sade em que os recursos esto sendo gastos? A resposta a estas questes possvel porque as Contas Satlites de Sade: (1) oferecem a informao tradicional do setor sade em um marco mais geral, integrado s Contas Nacionais; (2) proporcionam informaes adicionais, especificamente relativas ao setor sade; (3) utilizam conceitos, classificaes e quadros mais detalhados, complementares ou alternativos, relacionados a esse setor; (4) estendem e detalham a cobertura de produo, custos e benefcios das atividades setoriais; (5) estendem a anlise de dados, mediante o uso de dados agregados e indicadores especficos; (6) enriquecem a anlise dos dados monetrios com dados fsicos; (7) facilitam a anlise do setor sade no contexto global da economia.

37

A representao econmica exposta nas Contas Satlite de Sade de um pas pode ser particularmente til para a definio de polticas de sade e para a avaliao da poltica econmica do setor. Isso se d porque essa representao permite: (1) determinar a produo dos servios de sade pelos diferentes agentes envolvidos; (2) identificar os produtos de sade oferecidos (que se denominam produtos caractersticos) e os custos incorridos na obteno dos mesmos; (3) avaliar a utilizao dos servios de sade pelas famlias, consideradas o ncleo de consumo; (4) avaliar as formas como as famlias obtm estes servios qual seja: (a) atravs de pagamentos diretos; (b) por intermdio de seguro social ou privado; (c) como transferncias dos governos ou de instituies no-lucrativas; e (d) como pagamento, em espcie, feito pelos empregadores e, finalmente, (5) mensurar a contribuio do setor sade para o produto interno bruto do pas. A opo por uma metodologia fundada no SCN para caracterizar e dimensionar o subsetor de assistncia mdica suplementar no Brasil se apia, basicamente, em duas justificativas: (1) O SNC um instrumento de ampla e longa utilizao internacional, e oferece reais possibilidades de comparao entre as naes; e (2) As sucessivas modificaes nesse sistema, nos ltimos quarenta e sete anos, produziram vrios desenvolvimentos metodolgicos, como o caso da incorporao das Contas Satlites. Ademais, essa metodologia permite agrupar transaes realizadas por distintos setores produtivos e institucionais em um sistema integrado. E contempla informaes tanto sobre aspectos de natureza institucional e produtiva da assistncia mdica quanto sobre as formas de atuao das empresas financeiras e no-financeiras do ramo. Dessa maneira, permite compreender a participao relativa do subsetor de assistncia suplementar no produto nacional e, tambm, avaliar a importncia desse segmento como consumidor de insumos oriundos de outros setores da economia. Ou seja, permite revelar a rede de relaes entre setores na qual o subsetor de assistncia mdica suplementar atua. Essa metodologia possibilita, ainda, a identificao de um conjunto de lacunas de informaes necessrias ao acompanhamento da evoluo econmica do subsetor, ao longo dos anos. E a superao dessas lacunas poder contribuir para o aperfeioamento e a harmonizao do sistema estatstico do pas e para a produo regular das informaes essenciais ao acompanhamento e regulao da assistncia mdica suplementar, no Brasil. As anlises expostas nesse artigo baseiam-se, assim, em um modelo de representao do funcionamento do subsetor de assistncia suplementar apoiado na proposta de utilizao de dados da contabilidade das empresas financeiras seguradoras e das empresas no-financeiras a atuarem na rea de assistncia mdica; na construo da Conta de Produo desse subsetor sero utilizados, ainda, indicadores da evoluo de volume e preo de produo das empresas do setor.

38

O Modelo de Representao da Assistncia Mdica Suplementar Uma das formas de classificao dos agentes econmicos, nas SCN, baseia-se na classificao por setor institucional, a qual distingue os agentes de acordo com a sua funo principal (papel institucional) no sistema econmico. Nesse caso, os agentes econmicos so decompostos em empresas, famlias e governo, cada qual com uma funo institucional, especfica. Com base em um conceito de produo, o SCN decompe aquelas instituies em entidades produtoras e consumidoras de bens e servios. Cabe s empresas a funo de produzir os produtos para vend-los no mercado; s famlias, a funo de consumi-los; e ao governo, a de produzir servios, a serem fornecidos, gratuitamente, coletividade. Uma vez feita a distino entre as funes de consumo (famlias) e de produo (empresas), o SCN define a Conta de Produo como a conta que permite avaliar a dimenso do PIB, a compreender as vendas dos bens e servios produzidos pelas empresas e as compras dos insumos utilizados ao longo do processo produtivo. O SCN tambm considera como produtiva a atividade, do Governo, de prestao de servios coletividade. Embora tais servios sejam considerados no-mercantis (por serem gratuitos), sua produo utiliza-se de fatores comprados e /ou contratados no mercado (servidores civis e militares, medicamentos e vacinas, etc). Dessa forma, fica estabelecida a distino entre atividade mercantil e nomercantil. A atividade realizada pelas empresas considerada mercantil porque o conceito de produto (ou Valor Adicionado) depende da diferena entre o valor do produto (preo de venda) e o valor dos insumos. Vale dizer: como a receita das empresas depende da venda do produto no mercado, a atividade desempenhada pelas mesmas considerada uma atividade mercantil. J a atividade do governo considerada no-mercantil, porque a administrao pblica no se financia atravs do mercado pois sua produo prestada gratuitamente coletividade mas por meio de transferncias, de impostos, da parte das empresas e das famlias. O setor institucional empresa abrange todas as unidades produtivas dedicadas produo de bens e servios para posterior venda no mercado, por um preo capaz de cobrir, ao menos, os custos de produo. Esse setor inclui a atividade de empresas privadas (sociedades annimas ou limitadas; empresas individuais ou familiares); empresas pblicas, que financiam seus custos de produo atravs da venda de produtos; produtores independentes (isto , trabalhadores por conta prpria, autnomos e profissionais liberais); e, ainda, as famlias de produtores rurais (proprietrios, ou no, de terras). Esta classificao tambm discrimina o setor em empresas financeiras e nofinanceiras. As empresas financeiras so as que realizam funes de intermediao, ou seja,

39

captam recursos de agentes econmicos superavitrios (cujas receitas superam as despesas) para emprest-los aos deficitrios (cujas receitas so menores que as despesas). A remunerao das instituies financeiras reside no diferencial entre os juros cobrados em suas operaes ativas (emprstimos a terceiros) e os pagos em suas operaes passivas (remunerao dos poupadores). O setor institucional famlia inclui os indivduos residentes no pas que utilizam suas rendas (oriundas do trabalho e do capital, sejam financeiras ou de transferncias) para consumir produtos que satisfaam suas necessidades individuais. O setor institucional governo compreende todas as instncias da administrao pblica (federal, estadual e municipal) que prestam servios coletividade, tais como educao e sade pblicas, segurana, justia, administrao e outros servios pblicos no-mercantis. Um outro passo necessrio para a construo do modelo a caracterizao do subsetor de medicina suplementar. Em nosso entendimento, esse subsetor compreende as modalidades de assistncia mdica que vinculam o acesso do usurio ao sistema ao pagamento de um plano ou seguro de sade, independentemente da contribuio compulsria desse usurio seguridade social. As vrias modalidades de assistncia mdica suplementar combinam a funo de seguro com a de prestao de servios de ateno mdica. E incluem, como principais formas institucionais, a medicina de grupo, as cooperativas mdicas, os planos prprios das empresas (autogesto e planos administrados) e os seguros de sade. O mbito desse subsetor compreende empresas financeiras e no-financeiras a atuarem, direta ou indiretamente, na rea de prestao de servios mdicos, servios hospitalares, e servios auxiliares de diagnstico e teraputica, populao; os servios prestados por estas entidades so unicamente de natureza mercantil, isto , a prestao dos servios gera, necessariamente, uma receita. J as despesas com esses servios de assistncia mdica envolvem diversos tipos de gastos. Em primeiro lugar, os pagamentos efetuados pela populao aos planos e seguros de sade, que podem compreender planos de pr-pagamento e ps-pagamento. Em segundo lugar, os pagamentos realizados pelas empresas (financeiras e no-financeiras) gestoras de planos e seguros de sade s empresas contratadas (ou conveniadas) para a prestao de servios de natureza mdica, hospitalar e de servios diagnstico-teraputicos populao usuria do sistema. Em terceiro, as despesas efetuadas pelas empresas (nofinanceiras) da rea mdica com a compra do material (insumos e equipamentos hospitalares) necessrio ao exerccio da assistncia aos seus usurios.

40

No Brasil, o segmento da assistncia mdica suplementar compreende um conjunto de receitas e despesas de agentes pblicos e privados , cuja natureza complexa e heterognea. O setor envolve interesses contraditrios e alcana valores monetrios cuja magnitude difcil avaliar, principalmente porque as informaes existentes so, em geral, incompletas. Uma melhor compreenso da complexidade e da heterogeneidade desses interesses pode resultar do detalhamento das vrias modalidades assistenciais a constiturem esse segmento de sade. A medicina de grupo14 foi a modalidade pioneira desse segmento, no cenrio brasileiro. E se apresentou, desde os anos 60, como uma modalidade de ateno s necessidades mdico-hospitalares constituda por empresas mdicas. Essas empresas, em sua maioria, no dispem de servios prprios e, predominantemente, co