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LINCOLN SPADA DA REDAÇÃO O santista Arismar do Espírito Santo era um baterista em po- tencial aos 20 anos, um baixis- ta impecável aos 30, e um dos guitarristas mais prestigiados aos 40, a tal ponto que hoje, aos 57, já não se define como um músico: “Chega uma hora em que o instrumento sou eu”. E esse senhor instrumento da MPB compôs nas últimas quatro décadas uma trilha ver- sátil, passando pelo xote, afoxé, choro-canção, samba e valsa. Todos esses ritmos culminam no novo CD Roupa na Corda, que ele lança no 40º aniversá- rio de sua carreira neste sába- do, em sua cidade natal, no Sesc Santos. Bem, seu primeiro lar já era envolvido em música lá pelos anos 50. Seu pai, um então re- presentante comercial, que de- dilhava instrumentos de corda nas horas vagas, encantou-se pela voz de uma cantora de rá- dio da Cidade. Na emissora, re- conheceu-a pelo timbre e logo os dois se apaixonaram e forma- ram família. Daí, a herança de voz e violão de Arismar, que nasceu em 9 de julho de 1956. Nos primeiros anos de vida, já brincava com os acordes. “Mas toda criança toca um vio- lão como um contra-baixo, por- que puxa a corda”, diz em meio a risadas altas e gostosas. Ele conta animado que, antes dos 10 anos, já tinha um violão pa- ra chamar de seu, “era uma delícia viver treinando nas es- quinas do Canal 1 e da Rua Quintino Bocaiúva com a praia, no Gonzaga”. Por gostar demais do com- passo das escalas musicais, de- cidiu pesquisar as batidas da bateria como autodidata: “Ar- ranjava tempo entre a escola e o trabalho em uma livraria”. IMPROVISANDO COMO PELÉ Estava bem claro para ele que seu único rumo seria a carreira artística. Aos 17, aceitou o con- vite para ser baterista de uma banda na Baiúca, então famosa casa noturna de São Paulo. “Às 17h30, já subia a serra de ôni- bus e só voltava para Santos de manhãzinha. De segunda a se- gunda”. E essa foi sua rotina de jazz, blues e samba até meados da década de 70. Dessa prática diária agitan- do casais e rodas de amigos, passou a improvisar com os ins- trumentos. Inspirava-se tanto nos shows de samba do Wilson Simonal e de bossa nova de Dick Farney, quanto nos trei- nos do Peixe, na Vila Belmiro. “Para mim, aquele time era a orquestra sinfônica da bola. Os adversários queriam morrer com o jeito moleque do Pelé, o regente negro”, empolga-se Arismar com sua fala tão ligei- ra quanto sua memória. “Ele levantava o braço, e ao receber a bola no peito, já driblava e chutava para o gol. Fazia o fute- bol parecer fácil, por ser tão criativo dentro de campo”. ALEGRIA NOS DEDOS PELA TV Ofãsantistaétãocriativoquanto o jogador. “É porque, como di- ziam bastante em Santos, tenho ‘alegria nos dedos’”, comenta. “A música tem um lado saudável, poisoscientistasdizemqueasen- sação de escutá-la faz com que o nosso córtex (uma das camadas do cérebro) pule de felicidade. Como uma oração, um reiki, umaenergiaboaquegerapaz”. Assim, compara a música co- mo o “passaporte de sua vida”. Foi ela quem o conduziu a uma caminhada de sucesso tocando piano, guitarra e outros instru- mentos com Heraldo do Mon- te, Dory Caymmi, Lenine, Ro- berto Sion e mais de duas deze- nas de artistas e bandas pelos quatro cantos do mundo. Com o seu amigo e também multi- instrumentista Hermeto Pas- coal, já viajou em várias turnês por quase dez países da Europa. Ele é só elogios ao colega. “O ilustre Hermeto me deixava à vontade para tocar”. O santista também se mostra agradecido a Dominguinhos, que lhe ren- deu a projeção nacional. “Em meados dos anos 80, tocamos jazz juntos num festival da Glo- bo. Durante a apresentação na tevê, assobiei por uns dois mi- nutos. Foi impressionante co- mo as pessoas me reconheciam no dia seguinte”. RACIOCÍNIO CRUZADO Todos que acompanham Aris- mar já entendem seu raciocí- nio cruzado. Não apenas por- que cada instrumento que toca é influenciado por outro, mas porque “já teve uma vez, em uma gravação, que errei, tocan- do baixo pensando que era gui- tarra. Mas não é que até assim a banda gostou do som?” Para ele, os 40 anos de carrei- ra nos ombros só melhoraram sua arte. “Ensaio quatro horas por dia. Essa experiência faz com que minhas mãos sejam mais leves, ágeis. Como se me cansasse menos nos arranjos”. Aliás, arranjos feitos em inspi- rações quase intuitivas. “De repente, como uma brin- cadeira o ritmo vem na cabeça, e começo a causar um ‘pera aí, dá pra criar uma música daí’, e vou buscando harmonizá-la, in- dependente do gênero. A cada dia, aprendo mais”, anima-se o artista, que relaciona o seu tra- balho com o de um cozinheiro, que vive testando temperos pa- ra novos pratos. É com essa dedicação que ele produziu as 16 faixas de seu mais recente disco, Roupa na Corda. Uma obra-prima grava- da em apenas três dias, numa fazenda em Itapetininga (SP) – rendendo a segunda indicação consecutiva para o célebre Prê- mio Governador do Estado pa- ra a Cultura. Para tocar as melodias em seu show na Cidade, Arismar estará com Lea Freire (flau- tas e flautão) Fábio Peron (bandolim 10 cordas e bandolão), e os filhos Bia Goes e Thiago Espírito Santo. O show será apresentado sábado, às 21 horas, no Teatro do Sesc, com ingressos que vão de R$ 2,00 a R$ 10,00. Podem ser comprados na bi- lheteria do teatro, Rua Conse- lheiro Ribas, 136, Aparecida, Santos. Mais informações pe- lo telefone 3278-9800. Galeria “A música tem um lado saudável, pois os cientistas dizem que a sensação de escutá-la faz com que o nosso córtex pule de felicidade. Como uma oração, um reiki”. ARISMAR DO ESPÍRITO SANTO INSTRUMENTISTA Para marcar sua história como instrumentista, Arismar do Espírito Santo acaba de lançar o CD Roupa na Corda, que mostra sábado no Sesc DA REDAÇÃO Folk, MPB, baladas, standards e jazz estão entre as novidades que chegam ao mercado, entre elas, um CD de Frank Sinatra. MORNING PHASE, BECK Após inovações estéticas o can- tor e compositor norte-ameri- cano Beck retorna ao folk em seu 12 o álbum, Morning Phase. São 13 canções cheias de cli- mas melancólicos, com arran- jos melódicos à base de violi- nos, violão e gaita, e letras que enfatizam momentos de despe- dida e solidão, como em Say Goodbye e Blue Moon. Univer- sal Music (R$ 28,90). PAISAGEM INVISÍVEL, ANDREIA MOTA A carioca Andreia Mota é mais uma revelação da MPB. Neste primeiro CD, ela faz homenagem a Manoel de Bar- ros, com três canções inéditas e letras inspiradas no univer- so do poeta amazonense, e mais dez composições de Mil- ton Nascimento, Dorival Caymmi e Guinga. Os ritmos passeiam pelo jazz e MPB. (Independente, está no ITu- nes e em www.andreiamota. com.br, R$ 20,00). FRANK SINATRA WITH LOVE O álbum é uma compilação de 16 canções de amor do cantor americano, selecionadas do ca- tálogo da Capitol Discos e da Reprise Records. Trata-se do segundo lançamento da Uni- versal com clássicos do eterno blue eyes. A coletânea traz bala- das e standards como From This Moment On, I Love You e Just One Of Those Things, de Cole Porter, e Wave, escrita com Antonio Carlos Jobim,e outras. (R$ 21,90) Nine Inch Nails cancela show A banda não vai se apresentar no Rio de Janeiro, dia 6 de abril, por complicações logísticas, e o dinheiro do ingresso será devolvido. O show em SP, no Lollapalooza, um dia antes, está confirmado Arismar faz da música seu passaporte e paixão de vida Santista comemora 40 anos de carreira O instrumentista se orgulha de ter trabalhado com grandes nomes da MPB, entre eles, Hermeto Pascoal, Dori Caymmi, Roberto Sion, Lenine, Heraldo do Monte e o sanfoneiro Dominguinhos Para matar saudade de Sinatra [email protected] Oração Mestres Som para todos os gostos musicais PEDRO PRATA/DIVULGAÇÃO Beck retorna ao folk neste CD MPB, base do disco de Andreia FOTOS REPRODUÇÃO Quarta-feira 19 D-1 março de 2014 www.atribuna.com.br

[ATRIBUNA - olincoln.files.wordpress.com · já brincava com os acordes. “Mastodacriançatocaumvio-lãocomoumcontra-baixo,por-quepuxaacorda”,dizemmeio arisadasaltasegostosas.Ele

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LINCOLNSPADA

DAREDAÇÃO

Osantista Arismar doEspíritoSanto era um baterista em po-tencial aos 20 anos, umbaixis-ta impecável aos 30, e um dosguitarristas mais prestigiadosaos40,atalpontoquehoje,aos57, já não se define como ummúsico: “Chega uma hora emqueoinstrumentosoueu”.E esse senhor instrumento

da MPB compôs nas últimasquatrodécadasuma trilha ver-sátil,passandopeloxote,afoxé,choro-canção, samba e valsa.Todos esses ritmos culminamno novo CD Roupa na Corda,que ele lança no 40º aniversá-rio de sua carreira neste sába-do, em sua cidade natal, noSescSantos.Bem, seu primeiro lar já era

envolvido em música lá pelosanos 50. Seu pai, um então re-presentante comercial, que de-dilhava instrumentos de cordanas horas vagas, encantou-sepela voz de uma cantora de rá-diodaCidade.Na emissora, re-conheceu-a pelo timbre e logoosdoisseapaixonarameforma-ram família. Daí, a herança devoz e violão de Arismar, quenasceuem9dejulhode1956.Nos primeiros anos de vida,

já brincava com os acordes.“Mas toda criança toca umvio-lãocomoumcontra-baixo,por-quepuxa a corda”, diz emmeioa risadas altas e gostosas. Eleconta animado que, antes dos10 anos, já tinha um violão pa-ra chamar de seu, “era umadelícia viver treinando nas es-quinas do Canal 1 e da RuaQuintino Bocaiúva com apraia,noGonzaga”.Por gostar demais do com-

passo das escalasmusicais, de-cidiu pesquisar as batidas da

bateria como autodidata: “Ar-ranjava tempo entre a escola eotrabalhoemumalivraria”.

IMPROVISANDOCOMOPELÉ

Estava bem claro para ele queseuúnico rumo seria a carreiraartística. Aos 17, aceitou o con-vite para ser baterista de umabandanaBaiúca,então famosacasa noturna de São Paulo. “Às17h30, já subia a serra de ôni-bus e só voltava para Santos demanhãzinha. De segunda a se-gunda”.E essa foi sua rotinadejazz, blues e samba atémeadosdadécadade70.Dessa prática diária agitan-

do casais e rodas de amigos,passouaimprovisarcomosins-trumentos. Inspirava-se tantonos showsde sambadoWilsonSimonal e de bossa nova deDick Farney, quanto nos trei-nosdoPeixe,naVilaBelmiro.“Paramim, aquele timeera a

orquestra sinfônicadabola.Os

adversários queriam morrercom o jeito moleque do Pelé, oregente negro”, empolga-seArismar com sua fala tão ligei-ra quanto sua memória. “Elelevantava o braço, e ao recebera bola no peito, já driblava echutavaparaogol.Faziaofute-bol parecer fácil, por ser tãocriativodentrodecampo”.

ALEGRIANOSDEDOSPELATV

Ofãsantistaétãocriativoquantoo jogador. “É porque, como di-ziambastante em Santos, tenho‘alegrianosdedos’”, comenta. “Amúsica tem um lado saudável,poisoscientistasdizemqueasen-saçãode escutá-la faz comqueonosso córtex (uma das camadasdo cérebro) pule de felicidade.Como uma oração, um reiki,umaenergiaboaquegerapaz”.Assim, compara amúsica co-

mo o “passaporte de sua vida”.Foi ela quemo conduziu a umacaminhada de sucesso tocandopiano, guitarra e outros instru-mentos com Heraldo do Mon-te, Dory Caymmi, Lenine, Ro-berto Sion emais deduas deze-nas de artistas e bandas pelosquatro cantos do mundo. Como seu amigo e também multi-instrumentista Hermeto Pas-coal, já viajou em várias turnês

porquasedezpaísesdaEuropa.Ele é só elogios ao colega. “O

ilustre Hermeto me deixava àvontadepara tocar”.O santistatambém se mostra agradecidoa Dominguinhos, que lhe ren-deu a projeção nacional. “Emmeados dos anos 80, tocamosjazz juntosnumfestivaldaGlo-bo. Durante a apresentação natevê, assobiei por uns dois mi-nutos. Foi impressionante co-moaspessoasmereconheciamnodiaseguinte”.

RACIOCÍNIOCRUZADO

Todos que acompanhamAris-mar já entendem seu raciocí-nio cruzado. Não apenas por-que cada instrumentoque tocaé influenciado por outro, masporque “já teve uma vez, em

umagravação,queerrei, tocan-dobaixopensandoqueeragui-tarra. Mas não é que até assimabandagostoudosom?”Paraele,os40anosdecarrei-

ra nos ombros só melhoraramsua arte. “Ensaio quatro horaspor dia. Essa experiência fazcom que minhas mãos sejammais leves, ágeis. Como se mecansasse menos nos arranjos”.Aliás, arranjos feitos em inspi-raçõesquaseintuitivas.“Derepente,comoumabrin-

cadeira o ritmo vemna cabeça,e começo a causar um ‘pera aí,dá pra criar umamúsica daí’, evoubuscandoharmonizá-la, in-dependente do gênero. A cadadia, aprendomais”, anima-se oartista, que relaciona o seu tra-balho com o de um cozinheiro,quevivetestandotemperospa-ranovospratos.Écomessadedicaçãoqueele

produziu as 16 faixas de seumais recente disco, Roupa naCorda.Umaobra-primagrava-da em apenas três dias, numafazendaemItapetininga(SP)–rendendo a segunda indicaçãoconsecutivaparaocélebrePrê-mioGovernadordoEstadopa-raaCultura.Para tocar as melodias em

seu show na Cidade, Arismar

estará com Lea Freire (flau-tas e flautão) Fábio Peron(bandolim 10 cordas ebandolão), e os filhos BiaGoeseThiagoEspíritoSanto.O show será apresentado

sábado,às21horas,noTeatrodo Sesc, com ingressos quevão de R$ 2,00 a R$ 10,00.Podem ser comprados na bi-lheteriadoteatro,RuaConse-lheiro Ribas, 136, Aparecida,Santos.Mais informaçõespe-lotelefone3278-9800.

Galeria

“Amúsicatemumladosaudável,poisoscientistasdizemqueasensaçãodeescutá-lafazcomqueonossocórtexpuledefelicidade.Comoumaoração,umreiki”.

ARISMARDOESPÍRITOSANTO

INSTRUMENTISTA

Para marcar sua história como instrumentista, Arismar do Espírito Santo acaba de lançar o CD Roupa na Corda, que mostra sábado no Sesc

DAREDAÇÃO

Folk,MPB,baladas, standardse jazz estão entre as novidadesque chegamaomercado, entreelas,umCDdeFrankSinatra.

MORNINGPHASE,BECK

Após inovaçõesestéticasocan-tor e compositor norte-ameri-cano Beck retorna ao folk emseu 12o álbum,MorningPhase.São 13 canções cheias de cli-mas melancólicos, com arran-jos melódicos à base de violi-nos, violão e gaita, e letras queenfatizammomentosdedespe-dida e solidão, como em SayGoodbye e BlueMoon. Univer-salMusic (R$28,90).

PAISAGEMINVISÍVEL,ANDREIAMOTA

A carioca Andreia Mota émais uma revelação da MPB.Neste primeiro CD, ela fazhomenagemaManoel deBar-ros, com três canções inéditase letras inspiradas no univer-so do poeta amazonense, emais dez composições deMil-ton Nascimento, DorivalCaymmi e Guinga. Os ritmos

passeiam pelo jazz e MPB.(Independente, está no ITu-nes e em www.andreiamota.com.br, R$20,00).

FRANKSINATRAWITHLOVE

O álbum é uma compilação de16 canções de amor do cantoramericano,selecionadasdoca-tálogo da Capitol Discos e daReprise Records. Trata-se dosegundo lançamento da Uni-versal com clássicos do eternoblueeyes.Acoletâneatrazbala-das e standards como FromThis Moment On, I Love You eJust One Of Those Things, de

Cole Porter, e Wave, escritacom Antonio Carlos Jobim,eoutras. (R$21,90)

Nine InchNails cancela showAbandanãovai seapresentarnoRiode Janeiro, dia6deabril, porcomplicações logísticas, eodinheirodo ingresso serádevolvido.OshowemSP, noLollapalooza, umdiaantes, está confirmado

Arismar fazdamúsica seupassaporte epaixãodevidaSantista comemora 40 anos de carreira

Oinstrumentista seorgulhadeter trabalhadocomgrandesnomesdaMPB, entreeles,HermetoPascoal,Dori Caymmi,RobertoSion, Lenine,HeraldodoMonteeosanfoneiroDominguinhos

Para matar saudade de Sinatra

[email protected]

Oração

Mestres

Sompara todosos gostosmusicais

PEDROPRATA/DIVULGAÇÃO

Beck retorna ao folk neste CD MPB, base do disco de Andreia

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Quarta-feira 19 D-1março de2014 www.atribuna.com.br