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FACULDADE POTIGUAR DA PARAÍBA CURSO BACHAREL EM DIREITO ATUAÇÃO DOS POLICIAIS MILITARES DA PARAÍBA FRENTE AOS DIREITOS HUMANOS RIZZARDO RODERICO PESSOA QUEIROZ DE RODRIGUES GÓIS

Atuação dos Policiais Militares da Paraíba Frente aos Direitos Humanos

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Exposição dos motivos que levam a não efetivação dos direitos humanos nas atividades policais.

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FACULDADE POTIGUAR DA PARAÍBA

CURSO BACHAREL EM DIREITO

ATUAÇÃO DOS POLICIAIS MILITARES DA PARAÍBA FRENTE AOS DIREITOS

HUMANOS

RIZZARDO RODERICO PESSOA QUEIROZ DE RODRIGUES GÓIS

JOÃO PESSOA / PB

2012

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RIZZARDO RODERICO PESSOA QUEIROZ DE RODRIGUES GOIS

ATUAÇÃO DOS POLICIAIS MILITARES DA PARAÍBA FRENTE AOS DIREITOS

HUMANOS

Monografia apresentada à Faculdade

Potiguar da Paraíba – FPB para obtenção

do Grau de Bacharel em Direito

Orientador: Profº Ms. João Peixoto

JOÃO PESSOA / PB

2012

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FACULDADE POTIGUAR DA PARAÍBA

CURSO BACHAREL EM DIREITO

ATUAÇÃO DA POLÍCIA MILITAR DA PARAÍBA FRENTE AOS DIREITOS

HUMANOS

RIZZARDO RODERICO PESSOA QUEIROZ DE RODRIGUES GOIS

________________________________________

Prof.

Professor Orientador

________________________________________

Prof.

________________________________________

Prof.

JOÃO PESSOA / PB

2012

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DEDICATÓRIA

Dedico este trabalho a minha família: papai, mamãe, meus irmãos e a todos

aqueles que sonham em ser alguém na vida de maneira digna e honesta, ignorando

os profetas do fracasso, falsos amigos e outras adversidades.

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AGRADECIMENTOS

Agradeço primordialmente a Deus por sempre ter me guiado nos momentos

mais difíceis, nas corridas malucas contra o tempo para não chegar atrasado, nas

provas de recuperação em processo civil, nas dificuldades financeiras, na superação

das chacotas.

A meus pais, Antonio Rodrigues Neto e Terezinha, por toda a dedicação que

despendem a mim, por compreenderem os momentos de stress para enfrentar a

dura vida de policial militar para me dedicar aos estudos, por me incentivarem a

buscar o conhecimento, pelo carinho e pela preocupação que sempre demonstraram

e pelo bom convívio que vige em nosso lar.

Agradeço à Maria Luiza, por me ouvir, por me ajudar, por conviver comigo

todo o tempo em que estivemos juntos, pela lealdade, pela amizade fiel, pela

confiança que depositou em mim e, principalmente, por ter influenciado

positivamente um novo Rizzardo, mais aberto à comunicação, ao relacionamento

interpessoal, à amabilidade e ao altruísmo com as pessoas.

Por fim, agradeço a todos aqueles que deram alguma graça a esta etapa de

minha seja de maneira positiva ou negativa, pois sem dificuldade não há conquista e

cada um de nós sabe a cruz que carrega.

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Resumo:

A análise do contexto atual da segurança pública da Paraíba revela questões relativas às ações policiais militares que ocupam destaque na mídia, alardeiam movimentos sociais de defesa dos direitos humanos e tornam-se objeto de pesquisa científica de diversas áreas. A polícia militar da Paraíba adotou a filosofia do policiamento comunitário como um desafio multidisciplinar no contexto de uma realidade de violência social ambígua, além de um desafio às políticas internas. A aplicação desta filosofia tem o propósito de aperfeiçoar o serviço policia com plena observância aos direitos humanos buscando sempre beneficiar o ser humano. A abordagem conceitual deste tema tem por finalidade esclarecer a respeito do contexto que envolve as ações policiais e a efetividade dos direitos humanos em suas ações discriminando as nuances que dificultam o perfeito exercício profissional dos Policiais militares do Estado da Paraíba.

Palavras-chave: polícia militar, Paraíba, segurança pública, democracia, direitos humanos, efetividade, polícia comunitária.

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Abstract

The analysis of the current context of public safety Paraíba reveals issues concerning military police actions that occupy the headlines, flaunt social movements and human rights become the object of scientific research in various fields. The military police of Paraíba adopted the philosophy of community policing as a multidisciplinary challenge in the context of a social reality of violence ambiguous, but a challenge to internal policies. Applying this philosophy aims to improve the police service with full respect for human rights always seeking to benefit humans. The conceptual approach of this theme aims to clarify about the context in which police actions and the effectiveness of human rights in their actions detailing the nuances that hamper the perfect professional practice Military police of the state of Paraíba.

Keywords: military police, Paraíba, public security, democracy, human rights, effectiveness, community police.

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SUMÁRIO

INTRODUÇÃO..........................................................................................................................9

1 DIREITOS HUMANOS.........................................................................................................12

1.1 Conceito e características 12

1.2 Nomenclatura 14

1.3 História 15

1.4 Fundamentos dos direitos humanos 18

1.5 Princípios que regem o sistema dos direitos humanos 20

1.6 Eficácia ou efetividade dos direitos humanos 21

1.6.1 Efetividade dos direitos fundamentais...............................................................22

1.7 Considerações finais parciais do capítulo........................................................................30

2 FORMAÇÃO DO POLICIAL MILITAR................................................................................32

2.1 Repressão 34

2.2 Polícia Militar da Paraíba34

2.3 Polícia Comunitária 36

2.3.1 Pressupostos básicos do policiamento comunitário.......................................38

3 DIREITOS HUMANOS X POLICIAIS..........................................................................................40

3.1 Abordagem policial 41

4. CONCLUSÃO................................................................................................................................43

REFERÊNCIAS.................................................................................................................................45

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INTRODUÇÃO

Ao longo da história a manutenção da ordem pública foi realizada por

diferentes agentes e de diferentes formas por diversas razões que eram norteadas

por regras de tratos sociais que diziam que uns teriam nascido para mandar e outros

para obedecer ou simples ordens de líderes autoritários.

Em 10 de Dezembro de 1948, a Assembleia das Nações Unidas proclamou a

Declaração Universal dos Direitos Humanos, contribuindo na dignidade e igualdade

de direitos entre homens e mulheres, promovendo o progresso social e melhorando

a condição de vida da população em geral.

Nessa época começou a se difundir idéia de que todos os seres humanos

nascem livres e iguais em dignidade e em direitos não devendo haver distinção de

raça, cor, sexo, língua, religião, opinião política ou de qualquer outra situação.

No contexto da Segurança Pública os Direitos Humanos representam o

Estado de Direito, que tem por objeto nortear as ações policiais com um conjunto de

normas jurídicas asseguradoras de direitos, que devem ser seguidas, respeitadas e

vivenciadas por todos os cidadãos e cidadãs de todas as raças, condições sociais,

políticas, econômicas e culturais. Historicamente, a segurança pública, tem sido

confundida com o combate à criminalidade, sendo que o seu dever é não dar chance

à omissão, a imprevisão e ao desconhecimento do fato ou ate mesmo da lei.

A escolha do tema surgiu da repercussão negativa que as ações policiais mal

sucedidas levam a sociedade e com isso a importância de atentar aos policiais à

ótica fraternalista dos direitos humanos.

Para os novos doutrinadores, segurança pública democrática é aquela

exercida de maneira que os cidadãos são cidadãos não apenas pelo simples direito

de votar, mas pela competência histórica em termos e decidir e efetivar a

oportunidade de desenvolvimento humano sustentado intervindo de forma crítica. A

polícia sendo uma instituição pública deve buscar constantemente se adequar aos

anseios da população demonstrando sua autonomia, competência, eficácia e

transparência, pois a ela é confiado o papel da segurança pública pela sociedade e

pelo Estado.

A polícia militar é o órgão que exerce o poder de polícia no âmbito interno

das forças armadas garantindo a segurança, a ordem e a lei. Cada Polícia Militar é

independente de Estado para Estado e não tem, além de troca de informações,

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dependência entre si. Elas são subordinadas ao Governo de cada um dos Estados,

embora a estrutura seja igual nos Estados, quanto à hierarquia e às divisões, em

seus postos e graduações. 

A hierarquia e a disciplina são a base da organização das instituições

militares, a qual compõe a cadeia de comando a ser seguida por todos os

integrantes. Culturalmente, os postos mais altos das polícias são vistos como nobres

pela população. Para “o povo” quanto mais alto o posto ou patente, mais importante

é o policial. Pensamentos desse tipo estão intrínsecos na mente das pessoas e se

perpetuam ao longo dos anos, fazendo com que jovens almejem entrar para a

corporação militar em postos mais elevados achando que serão superiores

moralmente a alguém. Isto é um erro pois muitos policiais de valor para sociedade

estão entre as praças.

Por isso, o problema que se apresenta é o seguinte: o que leva os policiais

militares a não executar suas atribuições em acordo a ótica dos direitos humanos.

O objetivo geral da presente pesquisa é Analisar de forma crítica as razões

que levam ao desrespeito dos Direitos Humanos por parte dos policiais militares da

Paraíba, visando contribuir para a melhor formação profissional destes profissionais

no cumprimento de suas atribuições com o devido norteamento dos Direitos

Humanos.

Os objetivos específicos da pesquisa são: a) analisar a concepção de direitos

humanos por parte dos policiais militares; b) identificar a que razões os policiais

militares atribuem o desrespeito aos Direitos humanos; c) identificar as contradições

que permeiam a realidade investigada; d) identificar as dificuldades de efetivação

dos direitos humanos.

O método que foi adotado para realizar esta pesquisa é o científico dedutivo,

partindo das generalidades que foram apontadas nos objetivos específicos e

focalizando-as para a persecução do objetivo geral.

A técnica de pesquisa utilizada é a bibliográfica que se executa por análise de

documentos, leis nacionais, normas e tratados internacionais e consultas a

produções doutrinárias e posicionamentos jurisprudenciais sobre o tema.

No primeiro capítulo é abordado o tema direitos humanos e são estudados

assuntos como o conceito e as características dos direitos humanos, universalização

e a efetividade dos direitos humanos.

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No segundo capítulo, serão abordados os aspectos relevantes a formação

policial militar, a repressão e os aspectos históricos que envolvem a atuação da

polícia militar.

No terceiro capítulo, será elencado a problemática deste estudo com ênfase

na atuação policial em observância aos Direitos Humanos.

Finaliza-se o trabalho com uma análise crítica das teses que foram

estudadas, destacando as considerações mais relevantes dos capítulos anteriores,

de modo a atingir o objetivo geral da pesquisa.

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1 DIREITOS HUMANOS

O primeiro capítulo deste trabalho de conclusão de curso trata dos Direitos

Humanos que representa grande importância no mundo atual, cada vez mais

preocupado com o bem-estar do ser humano em todo lugar em que este se

encontre.

Inicia-se este capítulo com uma pesquisa conceitual e as características dos

direitos humanos e, em seguida, sobre a divergência na nomenclatura destes

direitos, contando com o pensamento de diversos autores, para que o trabalho não

fique incompleto.

Logo em sequencia, são relatados os fatos históricos e a evolução do

pensamento filosófico que levaram para a configuração atual dos direitos humanos.

Em seguida, é abordado um assunto sempre muito discutido que é o tema principal

de muitos estudos jurídicos. Trata-se da abordagem das diversas teorias sobre a

fundamentação dos direitos humanos. Logo após, trata-se dos princípios que regem

o sistema de direitos humanos, o que ajuda a entender a importância dos direitos

humanos como representação dos valores humanos supremos.

Por serem aceitos na maioria dos países os direitos humanos não

apresentam problemas graves de fundamentação. Poderia ocorrer se os países não

reconhecessem a sua importância. Só que o reconhecimento é quase universal o

grande problema está na efetivação, apesar de não ser questionado o direito do ser

humano a usufruir de seus direitos mais elementares. Disso provém a importância

do estudo sobre a implementação dos direitos humanos.

1.1 Conceito e características

Os direitos humanos são direitos e liberdades básicos que devem gozar todos

os seres humanos e pressupõe também a liberdade de pensamento, de expressão e

igualdade perante a lei. Derivam da dignidade e do valor inerente à pessoa humana,

são universais, inalienáveis e igualitários. Alem de serem inerentes a cada ser

humano, não podem ser tirados ou alienados por qualquer pessoa; independente do

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critério de raça, cor, sexo, idioma, religião, política ou outro tipo de opinião,

nacionalidade ou origem social, propriedades, nascimento ou outro status qualquer.

Segundo Silva, (2002. p. 179), “a declaração dos direitos humanos define que

todos os seres humanos nascem livres e iguais em dignidade e em direitos, dotados

de razão e de consciência, devendo agir uns para com os outros em espírito de

fraternidade.”

A ideia de direitos humanos tem origem no conceito filosófico de direitos

naturais que seriam atribuídos por Deus; sendo John Locke o mais importante

filósofo a desenvolver esta teoria.

Para Moraes (2006a, p. 21) Direitos Humanos se definem como o conjunto

institucionalizado de direitos e garantias do ser humano que visa a preservar sua

dignidade, estabelecer condições mínimas de vida e permitir o desenvolvimento da

personalidade humana, protegendo os indivíduos contra o arbítrio estatal.

O referido autor apresenta oito características dos direitos humanos, a saber:

(a) imprescritibilidade: o decurso do prazo não impede o exercício do direito; (b)

inalienabilidade: não é possível transferir os direitos humanos; (c) irrenunciabilidade:

não se pode abdicar desses direitos; (d) inviolabilidade: não se admitem violações

legislativas ou por parte de autoridades; (e) universalidade: não é excluído da

proteção nenhum grupo de pessoas; (f) efetividade: não basta o reconhecimento

formal dos direitos do homem, é preciso que o Estado assuma o compromisso de

garanti-los a todos; (g) interdependência: há íntima ligação entre diversos direitos;

(h) complementaridade: não se deve interpretar isoladamente os direitos humanos

(MORAES, 2006a, p. 23).

Já Silva (2002, p. 181), além das características da inalienabilidade, da

irrenunciabilidade e da imprescritibilidade, completa o arcabouço das características

com a historicidade como outra característica dos direitos humanos, a qual significa

que os direitos humanos surgiram, modificaram-se e evoluíram em razão de

condições históricas.

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1.2 Nomenclatura

Não é pacífica a utilização de um padrão quanto a nomenclatura dos direitos

humanos ou fundamentais. Até mesmo a Constituição da República por vezes

menciona direitos e liberdades constitucionais (art. 5º, inciso LXXI), direitos e

garantias individuais (art. 60, § 4º, inciso IV), direitos humanos (art. 4º, inciso II) e

direitos e garantias fundamentais (epígrafe do Título II, e art. 5º, § 1º), conforme

exposto por Sarlet (2007, p. 33-34).

Porém com uma análise da Constituição é possível perceber que o

constituinte, com o uso da expressão “Direitos e Garantias Fundamentais” no Título

II, englobou os direitos individuais e coletivos (Capítulo I), os direitos sociais

(Capítulo II), a nacionalidade (Capítulo III), os direitos políticos (Capítulo IV) e o

regramento dos partidos políticos (Capítulo V).

Esta opção terminológica foi inspirada na Lei Fundamental da Alemanha e na

Constituição Portuguesa. Segundo Sarlet (2007, p. 34) a nomenclatura adotada pela

Constituição de 1988, argumentando que a doutrina vem rechaçando termos como

“liberdades públicas”, “liberdades fundamentais”, “direitos individuais”, “direitos civis”,

dentre outros que, segundo ele, têm sentido restrito se comparado à expressão

“direitos fundamentais”.

O objeto da discussão, na verdade, tem como foco as expressões “direitos

humanos” e “direitos fundamentais”. Sarlet (2007, p. 36) afirma que direitos humanos

são direitos previstos em documentos internacionais, porque são direitos “[...] que se

reconhecem ao ser humano como tal, independentemente de sua vinculação com

determinada ordem constitucional, e que, portanto, aspiram à validade universal,

para todos os povos e tempos, de tal sorte que revelam um inequívoco caráter

supranacional (internacional) [...]”. Já direitos fundamentais são aqueles direitos

reconhecidos pelo direito constitucional de um Estado, ou seja, são os direitos do ser

humano positivados na Constituição.

Em suma a maioria dos autores define direitos humanos como direitos não

positivados, ou, ainda, direitos naturais. Foi a chamada pré-história dos direitos

fundamentais, pois corresponde à denominação dada no período anterior à

positivação interna e internacional dos direitos fundamentais. Galindo (2004, p. 48)

diz que todos os direitos fundamentais são direitos humanos, mas nem todos os

direitos humanos são fundamentais. Sarlet (2007, p. 37) critica está afirmação de

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Galindo, indagando que a Constituição Brasileira enuncia como fundamentais certos

direitos que não são inerentes à natureza humana (salário mínimo e terço de férias,

por exemplo).

Contudo, Sarlet diz que, embora também reconheça a relação intima entre

direitos fundamentais e direitos humanos, há uma distinção explícita entre tais

categorias e, portanto, para fins didáticos, é válida essa diferenciação. Um

argumento a favor da classificação de Sarlet é o de que não há necessariamente

uma equivalência entre os direitos positivados internamente com os direitos

consagrados no âmbito do direito internacional.

Esta distinção entre direitos humanos e direitos fundamentais não é uma

discussão sem razão de ser. A justificativa da importância dessa diferenciação se dá

pelo fato de que os direitos fundamentais, em geral, gozam de maior proteção e são

mais efetivados em razão da competência do Poder Judiciário em fazer cumprir e

respeitar os direitos positivados na ordem jurídica interna. Já os direitos humanos

não positivados dependem de recepção pela ordem jurídica interna que de fato

ainda não há efetivamente.

Portanto com base nos argumentos de Sarlet e de que a Constituição

brasileira ter buscado inspiração na doutrina alemã, citada na presente pesquisa,

quando do uso técnico dos termos, será adotada a nomenclatura “direitos humanos”

para os direitos que são internacionalmente reconhecidos e “direitos fundamentais”

para os direitos positivados na Constituição federal.

1.3 História

A história dos direitos humanos tem sua origem de acontecimentos que

ocorreram há muito tempo. Alguns fatos históricos muito remotos podem ser

considerados um prenúncio ou uma inspiração para os direitos humanos, como são

apresentados hoje. Os direitos humanos são o resultado de uma longa construção

que, muito lentamente, deram alicerce ao seu desenvolvimento.

Comparato (2001, p. 39-42) aponta como uma primeira grande etapa da

afirmação dos direitos humanos a democracia ateniense (século VI a.C.) e a

república romana (século V A.C.). Foi sob tais governos que surgiu a lei escrita, que

impedia a supremacia de uns sobre outros.

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A obediência à lei era o principal pilar da sociedade ateniense. O poder dos

governantes era limitado, tanto pelas leis, quanto pelos próprios cidadãos que

tinham muitas formas de participação política. Em Roma, não havia tantas limitações

do poder do governo por parte dos cidadãos cuja a participação não era exercida

com tanta força, mas tinha como por um controle recíproco entre os órgãos políticos

uma forma de limitação do poder governamental.

A segunda etapa dos direitos humanos ocorreu na Idade Média, mais

precisamente, na Baixa Idade Média entre os séculos XI e XV, conforme cita

Comparato (2001, p. 43-45). A Alta Idade Média foi marcada por uma crise político-

econômica, pois, o esfacelamento feudalismo estava se esfacelando, o papa e o

imperador passaram a disputar o poder da Europa. Os reis, em contrapartida

reivindicavam poderes que eram antes inerentes à nobreza e ao clero.

Diante do exposto, ocorreram manifestações como a Declaração das Cortes

de Leão, em 1188, e a Magna Carta, na Inglaterra, em 1215. Essas manifestações

iniciais de ótica aos direitos humanos visavam garantir liberdades às classes

superiores da sociedade medieval (a nobreza e o clero). Nesse período, ainda,

houve a ascensão dos comerciantes, os chamados burgueses, e as grandes

invenções, as navegações, a irrigação e outras. Tudo isso permeado pelo controle

certo do Estado e limitação do poder político.

O século XVII, segundo Comparato (2001, p. 46-47) caracterizou-se por um

período em que a Europa passou a se preocupar com o risco do poder absoluto, o

que se diferiu no avanço do contratualismo. Nesse período foram criados

instrumentos jurídicos em pro da garantia de certas liberdades com a criação do

habeas corpus e com a Declaração de Direitos (Bill of Rights) da Inglaterra. O foco

principal do Bill of Rights era a separação de poderes, dando ao Parlamento a

prerrogativa de defesa dos súditos perante o rei. Outros direitos igualmente

importantes constantes da Declaração eram o direito de petição, a proibição de

penas cruéis e o fortalecimento do tribunal do júri que se solidificou..

Sarlet destaca(2007, p. 51) que, além do Bill of Rights, a Inglaterra editou

outras normas que positivaram direitos, como o Habeas Corpus Act, de 1689, e o

Establishment Act, de 1701, este último estabelecia às leis da Inglaterra como

direitos naturais de seu povo. Ferreira Filho (2006, p. 11-13) faz referência, a

documentos surgidos anteriormente na Inglaterra, os forais e as cartas de franquia,

que foram documentos em que o senhor feudal anotava direitos concedidos aos

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vassalos, a Magna Carta e o Petition of Rights, que previam direitos como a

proibição de detenção arbitrária e julgamento pelos pares para a perda da liberdade

ou da propriedade. Segundo Ferreira Filho (2006, p. 11-13) tais documentos deram

a Inglaterra a possibilidade do desenvolvimento de um conjunto de regras que o

afastavam o poder arbitrário estatal.

Segundo Comparato (2001, p. 47) nenhum desses documentos, entretanto,

pode ser considerado o marco do surgimento dos direitos humanos, pois não eram

direitos constitucionalizados.

A Revolução Francesa e a Independência Americana, segundo Comparato

(2001, p. 47-48), constituíram a etapa seguinte da afirmação dos direitos humanos.

Pois foi datado dessa época o primeiro registro do nascimento dos direitos humanos

na História: o art. I da Declaração do Bom Povo da Virgínia, precisamente em 12 de

junho de 1776.

Obviamente que os referidos instrumentos constituía mais uma limitação do

poder dos governantes contra a burguesia rica do que ditames legais com objetivo

jurídico de amparar pessoas.

O 1º Art. da Declaração do Bom Povo da Virgínia: “Todos os seres humanos

são, pela sua natureza, igualmente livres e independentes, e possuem certos

direitos inatos, dos quais, ao entrarem no estado de sociedade, não podem, por

nenhum tipo de pacto, provar ou despojar sua posteridade; nomeadamente, a

fruição da vida e da liberdade, com os meios de adquirir e possuir a propriedade de

bens, bem como de procurar obter a felicidade e a segurança” (COMPARATO, 2001,

p. 47-48).

Contudo, pode-se afirmar que a edição destes instrumentos jurídicos foram

grandes passos na conquista dos direitos humanos e em sua evolução.

Já o reconhecimento de direitos humanos com caráter social e econômico,

apontados por Comparato (2001, p. 50-52) como a quinta etapa da afirmação

histórica dos direitos humanos,veio a ocorrer somente no século XX, com a

Constituição Mexicana em 1917 e com a Constituição de Weimar em 1919.

Antes destes fatos expostos, o capitalismo causava a opressão, a exploração

e a pobreza das classes trabalhadoras. Com a organização dessas classes, foi

possível a reivindicação dos direitos humanos de caráter econômico e social. Essa é

a cronologia dos eventos que influenciaram na configuração e na afirmação dos

direitos do homem que hoje existem.

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1.4 Fundamentos dos direitos humanos

Diversos teóricos foram mobilizados na busca pelos fundamentos dos direitos

humanos. Em conseqüência disso, foram elaboradas algumas concepções

importantes para fundamentá-los, antes de elencar as mais importantes cabe

ressaltar a importância de encontrar o fundamento dos direitos do homem.

Aparentemente, pode não parecer importante justificar porque os direitos humanos

são aceitos pela maioria dos Estados atuais, mas importa mencionar que, a qualquer

momento, a humanidade pode ser privada de tais direitos, bastando, para isso, que

se esqueça as razões pelas quais os direitos humanos atingiram tal nível de

aceitação. Além disso, o conhecimento dos fundamentos dos direitos humanos torna

possível a argumentação pela sua preservação e proteção.

A positivação de direitos humanos tem como objeto o privilégio à segurança

das relações sociais. Deixando transparecer à sociedade os valores éticos a serem

preservados. Contudo, o fato de certos direitos figurarem na legislação identificados

como direitos fundamentais não significa que o sejam. Isso porque as classes

dominantes poderiam mascarar, dentre os direitos fundamentais, direitos não

fundamentais que só a elas interessariam. De acordo com a corrente positivista,

essa questão não teria razão de ser, posto que, para os positivistas, não há direito

que não seja o estabelecido pelo Estado. Ocorre que a característica principal dos

direitos humanos é justamente valer contra o Estado. Tanto é assim que o

surgimento dos direitos humanos partiu de Revoluções.

Para tanto, a consciência quanto à importância e o respeito que os direitos

humanos devem efetivar é o fundamento de sua validade. Comparato rebate ainda a

alegação positivista de que um direito só existe se for possível exigi-lo por meio da

coerção estatal, ou seja, se for possível exigir seu cumprimento judicial. Segundo ele

(2001, p. 58), direito e pretensão não se confundem. O fato de não se exigir

judicialmente um direito subjetivo não quer dizer que ele não exista. Se não fosse

assim, os princípios gerais de direito e os costumes não teriam qualquer valor

jurídico.

Bobbio (2004, p. 22-24) tem a ótica que os direitos humanos são direitos

históricos, ou seja, não são direitos que têm um único fundamento, mas são

construídos ao longo do tempo. Os direitos humanos nascem com a concepção

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individualista da sociedade. Por essa teoria individualista, os direitos passam a ser

vistos pela ótica do cidadão, individualmente, em contraponto à anterior concepção

organicista clássica, segundo a qual o detentor supremo do poder era o soberano,

que poderia, se quisesse, conceder alguns direitos aos súditos, podendo revogá-los

a qualquer tempo.

A concepção individualista diz que o Estado é criado pelos cidadãos. O

Estado tem o dever de respeitar os direitos dos cidadãos porque o poder advem

deles. Não é o cidadão que deve servir ao Estado, mas o contrário. Esta afirmação

da concepção individualista proporcionou uma primeira gama de direitos do homem:

os direitos naturais, pois os seres humanos, cada um deles individualmente, são

portadores de liberdades inerentes à sua natureza, sendo por isso direitos

fundamentais. Mas o jusnaturalismo, adverte Bobbio (2004, p. 25), não é o

fundamento dos direitos humanos. Por terem origem histórica, tais direitos foram

surgindo de forma gradual, no decorrer do tempo, em um processo marcado por

circunstância e oportunidade.

Por isso, Bobbio (2004, p. 26) diz que “os direitos não nascem todos de uma

vez. Nascem quando devem ou quando podem nascer [...]”. As gerações, ou

dimensões, são a prova corrente disso. A primeira geração, ou dimensão, é oriunda

da ameaça à liberdade. A segunda dimensão, da exigência de uma prestação

assistencial estatal. Os direitos de terceira e quarta dimensões têm, parte deles, o

motivo da primeira geração e a outra parte o fundamento da segunda geração.

Bobbio em (2004, p. 35-44) rejeita a tese que existe fundamento único dos

direitos humanos com quatro argumentos. Primeiro, afirma ele ser impossível chegar

a um conceito de direitos humanos. O segundo argumento se norteia na

variabilidade dos direitos. Bobbio cita como exemplo o direito à propriedade, que,

inicialmente, era absoluto e atualmente foi relativizado.

Além disso, os direitos humanos são heterogêneos, sendo assim

pertencentes a classes diferentes, possuem eficácia diversa, razão pela qual não

podem ter um único fundamento. O último argumento de Bobbio é de que alguns

direitos são antinômicos entre si. Porém, alerta Bobbio (2004, p. 43) que o problema

não é a fundamentação dos direitos humanos, mas a efetividade.

O principal problema em relação aos direitos do homem, não é justificá-los,

mas protegê-los. O autor argumenta, ainda, que o fato de em certos momentos da

Page 20: Atuação dos Policiais Militares da Paraíba Frente aos Direitos Humanos

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história ter havido uma maior convicção quanto ao fundamento absoluto dos direitos

humanos não foi garantida maior efetividade desses direitos.

Para Bobbio (2004, p. 46-48), o problema do fundamento dos direitos

humanos já está resolvido. A sua solução é um consenso quase universal quanto à

sua legitimidade. Esse consenso foi obtido com o advento da Declaração Universal

de 1948 e com os demais instrumentos de direito internacional, aos quais os

Estados aderiram maciçamente.

A teoria jusnaturalista se baseia na premissa que os homens possuem

direitos inerentes à sua natureza e dos quais não podem ser alijados em hipótese

alguma. O positivismo fundamenta a existência dos direitos humanos na medida em

que estes são incorporados à ordem jurídica. A teoria moralista tem como foco

fundamentar os direitos humanos na consciência do povo quanto à importância

desses direitos. O autor se posiciona no sentido de que nenhuma teoria explica por

completo qual a fundamentação dos direitos do homem, por isso devem ser

consideradas complementares uma à outra.

1.5 Princípios que regem o sistema dos direitos humanos

Segundo Comparato (2001, p. 60-65) a ciência jurídica constitui um sistema

organizado, regido por princípios e leis que é composto por diferentes ramos, ou

subsistemas. Os direitos humanos é o mais importante desses subsistemas. Os

princípios fundamentais que o regulam são de dois tipos: princípios de valores

supremos e princípios de regência da lógica estrutural do subsistema. O autor faz

um estudo detalhado sobre tais princípios.

Os princípios axiológicos são liberdade, igualdade e fraternidade. A liberdade

não significa puramente livre arbítrio de se fazer qualquer coisa que se queira. A

liberdade também significa a autonomia da sociedade de se submeter a regras e

governos que ela própria escolheu.

Deve se observar que a liberdade tem duas dimensões: liberdade política,

que se traduz na liberdade de autogoverno, e a liberdade individual, que é a garantia

de não-interferência estatal na autonomia privada. Tais dimensões não podem se

separar, contudo, sob pena de se inviabilizar o próprio sentido de liberdade. com

efeito, a liberdade política é mera demagogia sem as liberdades individuais. E as

Page 21: Atuação dos Policiais Militares da Paraíba Frente aos Direitos Humanos

21

liberdades individuais, sem liberdade política, servem somente para mascarar a

opressão e a supremacia dos grupos sociais mais abastados.

O princípio da igualdade, embora assegure direitos iguais a todos os seres

humanos, esconde uma situação fática de desigualdade própria do sistema

capitalista. Trata-se da divisão da sociedade nas classes dos proprietários e dos

trabalhadores.

Para corrigir tal desigualdade, o socialismo baseava-se fortemente no

princípio da solidariedade. O princípio da solidariedade trouxe consigo os direitos

sociais, destinados a equilibrar a situação da sociedade por meio de uma

redistribuição de bens, direitos e vantagens. No fundo, o princípio da solidariedade

significa que todas as pessoas são responsáveis pela vida digna de todos.

Os princípios estruturais dos direitos humanos são a irrevogabilidade e a

complementaridade solidária. O princípio da irrevogabilidade impede a supressão

dos direitos humanos, inclusive com base no caráter evolutivo de que contam tal

categoria de direitos. Isso porque a história mostra uma inegável ampliação dos

direitos humanos, os quais não podem se perder pela superveniência de novas leis,

novas Constituições ou novos tratados internacionais.

Por fim, o princípio da complementaridade solidária é o princípio que preza

pela validade dos direitos humanos em qualquer situação, em qualquer Estado e

para qualquer pessoa.

1.6 Eficácia ou efetividade dos direitos humanos

Eficácia ou efetividade merecem extrema importância neste estudo,

especialmente porque, atualmente, a grande dificuldade que se impõe, não apenas

no Brasil, mas na grande maioria dos países, é garantir a efetividade que esses

direitos requerem. Com o objetivo de facilitar o estudo, este tópico será dividido em

dois subtópicos, um deles tratando da eficácia dos direitos fundamentais e o outro,

dos direitos humanos.

A abordagem dos direitos fundamentais se justifica, em face do tema ser

direitos humanos, em virtude da opção terminológica já delineada no segundo

tópico: Nomenclatura, ou seja, pelo fato de que os direitos fundamentais são direitos

Page 22: Atuação dos Policiais Militares da Paraíba Frente aos Direitos Humanos

22

humanos positivados na Constituição. E justifica-se a divisão do presente tópico, da

maneira prevista no parágrafo anterior, em razão das peculiaridades existentes na

proteção dos direitos humanos em nível nacional e internacional.

1.6.1 Efetividade dos direitos fundamentais

Antes de tratar da eficácia dos direitos fundamentais propriamente dita,

necessário se faz um estudo sobre a teoria da eficácia das normas constitucionais. A

concepção clássica sobre a eficácia das normas constitucionais foi elaborada por

Ruy Barbosa (apud SARLET, 2007, p. 252-253), com inspiração na doutrina e na

jurisprudência norte-americanas.

Por essa teoria, as normas constitucionais podem ser auto-aplicáveis ou não

auto-aplicáveis. As normas auto-aplicáveis são aptas a produzir seus efeitos

imediatamente, ou seja, independem de complementação legislativa. A eficácia das

normas não auto-aplicáveis depende da elaboração de uma lei que regule a situação

jurídica.

Silva (2002, p. 82 e ss.) formulou uma teoria em que dividiu as normas

constitucionais em normas de eficácia plena, contida e limitada. As normas de

eficácia plena são aquelas que têm condições de produzir todos os seus efeitos

jurídicos direta e imediatamente. As normas de eficácia contida têm eficácia plena,

mas são passíveis de restrição por parte do legislador.

As normas de eficácia limitada são os princípios institutivos e as normas

programáticas, que serão tratadas adiante. Diniz (2006, p. 112-119), incrementando

a classificação de José Afonso da Silva, formulou a concepção, adotada também por

Moraes (2006b, p. 7-9), de que as normas constitucionais podem ser normas de

eficácia absoluta, plena, relativa restringível, relativa complementável ou pendente

de complementação.

As normas de eficácia absoluta têm aplicabilidade imediata e não podem ser

contrariadas, nem mesmo por emenda constitucional. São as cláusulas pétreas. As

normas de eficácia plena têm incidência imediata, mas há a possibilidade de as

emendar. As normas de eficácia relativa restringível têm aplicabilidade plena e

imediata, mas podem ser restringidas por lei. As normas com eficácia relativa

complementável ou pendente de complementação consubstanciam os princípios

Page 23: Atuação dos Policiais Militares da Paraíba Frente aos Direitos Humanos

23

institutivos, que são normas que dependem de lei para regulamentar a estrutura e as

atribuições de órgãos, e as normas programáticas, que traçam fins a serem

objetivados pelo Estado.

Feitas as considerações sobre as classificações das normas constitucionais

quanto à sua eficácia, será estudado a seguir o princípio da aplicabilidade imediata

das normas definidoras de direitos e garantias fundamentais.

O princípio da aplicabilidade imediata O art. 5º, § 1º da Constituição Brasileira

dispôs que “as normas definidoras dos direitos e garantias fundamentais têm

aplicação imediata”. Entretanto, não há um consenso sobre que direitos estariam

englobados na expressão “direitos e garantias fundamentais”.

Sarlet (2007, p. 275) argumenta que se se considerasse que o parágrafo se

refere ao aput do artigo, tal interpretação conduziria à afirmação de que somente os

direitos individuais e coletivos do art. 5º da Constituição teriam aplicação

imediata.Porém, a interpretação literal aponta para os direitos previstos nos arts. 5º a

17 da Constituição, posto que o Título II, no qual estão inseridos, denomina-se

“Direitos e Garantias Fundamentais”. É o que defende Silva (2003, p. 465).

Não há de se olvidar, contudo, que “não se interpreta a Constituição em tiras,

aos pedaços”, nas palavras de Grau (2008, p. 164). Por isso, Sarlet (2007, p. 275),

tomando por base uma interpretação sistemática e teleológica do texto, concluiu que

a Constituição não faz distinção entre as categorias de direitos fundamentais. Todos

os direitos fundamentais do Título II da Constituição e, mais, todos os direitos

fundamentais previstos em outras partes da Constituição, gozam de aplicação

imediata.

Há, entretanto, outra questão divergente sobre o princípio da aplicabilidade

imediata. É que, em virtude da existência de normas constitucionais de eficácia

limitada e de normas programáticas, várias correntes doutrinárias foram se formando

a respeito da aplicabilidade desse princípio.

Parte-se do pressuposto de que existam realmente normas programáticas,

apesar de até a existência delas ser tema controverso. Sarlet (2007, p. 279-280)

argumenta que é inegável haver na Constituição normas que estabelecem

programas, finalidades e tarefas a serem implementadas pelo Estado, quer se

denominem normas programáticas, quer não.

Ferreira Filho (2006, p. 102) é adepto de uma corrente mais restritiva quanto à

aplicabilidade imediata. Ele entende que não é possível a aplicação de uma norma

Page 24: Atuação dos Policiais Militares da Paraíba Frente aos Direitos Humanos

24

incompleta, como o são as normas de eficácia limitada e as normas programáticas.

Aplicar tais normas seria contrariar a natureza das coisas.

Diniz (2006, p. 112-119) também adere a essa corrente, afirmando que as

normas programáticas apenas impedem atos contrários aos seus preceitos. Já Grau

(2008, p. 325-328) afirma que é plenamente possível a aplicabilidade imediata das

normas programáticas, devendo o interessado fazer uso do mandado de injunção

para dar efetividade material ao direito que se pretende, ainda que previsto em

norma programática.Aliás, o autor afirma também que o mandado de injunção e a

ação de inconstitucionalidade por omissão devem servir justamente para o caso de a

inércia do Poder Legislativo não possibilitar a aplicabilidade imediata.

Bastos e Martins (2001, p. 439) criticam a corrente restritiva argumentando

que se se deixasse a regulamentação do direito previsto pela norma programática à

inteira disposição do legislador, seria o mesmo que tal norma não estar na

Constituição.Da mesma forma, os autores entendem que não se admite que um

órgão possa obrigar o Poder Legislativo a legislar, sob pena de esse órgão ferir a

harmonia entre os Poderes e ocupar a posição central na organização política do

Estado.

Sarlet (2007, p. 283) oferece outras críticas à corrente expansiva. Para ele,

nem tudo é possível ao Judiciário implementar; há barreiras que impedem de se

outorgar eficácia imediata aos direitos fundamentais, como a reserva do possível, a

colisão com outros direitos fundamentais e a dificuldade de implementação de

programas econômicos.

Por isso, Martins e Bastos adotam uma posição mais central, afirmando que

a solução é conferir o direito programático, mas não obrigar o Poder Legislativo a

regulamentá-lo. Silva (2002, p. 165) segue a mesma esteira e também afirma que o

Poder Judiciário não pode deixar de conferir eficácia às normas de aplicação direta,

sejam quais forem, mas também não pode obrigar o Legislativo a cumprir a função

de legislar.

Sarlet (2007, p. 284-286) também adota uma postura mais central, porém

com certa divergência em relação a Bastos e Martins. Para ele, todos os direitos

fundamentais têm aplicabilidade imediata, senão sequer seriam fundamentais. Essa

eficácia deve, contudo, respeitar certos limites, justificáveis de acordo com as

circunstâncias do caso concreto. Todas as normas constitucionais são dotadas de

Page 25: Atuação dos Policiais Militares da Paraíba Frente aos Direitos Humanos

25

um mínimo de eficácia. Das normas de direitos humanos deve ser extraída a

máxima eficácia possível.

Silva (2003, p. 465) também adere a uma corrente moderada, alertando que

“[...] só em situação de absoluta impossibilidade se há de decidir pela necessidade

ulterior de aplicação”.

Dificuldades de implementação dos direitos fundamentais tem na efetividade

dos direitos fundamentais imensas dificuldades. Essas dificuldades derivam de

problemáticas relativas ao desenvolvimento econômico, às próprias normas jurídicas

e à atuação do Poder Judiciário. Segundo Sarlet (2007, p. 289-290), os direitos de

defesa, que são aqueles ligados à liberdade, garantias e direitos políticos, não

encontram muitas dificuldades em sua aplicabilidade. Por serem direitos que exigem

uma omissão estatal, sua eficácia prática independe de aparatos públicos, ao

contrário dos direitos sociais.

Já os direitos sociais, por exigirem uma prestação estatal, podem esbarrar em

dificuldades de implementação. Um dos problemas está ligado à estrutura normativa

das normas definidoras de direitos sociais, visto que grande parte desses direitos

está prevista em normas de eficácia limitada ou em normas programáticas.

Sarlet (2007, p. 304) explica que as principais dificuldades são a

disponibilidade fática de recursos para garantir a eficácia dos direitos fundamentais e

a possibilidade jurídica, posto que devem ser observadas as regras de distribuição

de receitas, competências tributárias, orçamentárias, legislativas e administrativas.

Bontempo (2008, p. 263-273) relata que os principais problemas apontados

na doutrina acerca da garantia de direitos sociais são: a) desqualificação dos direitos

sociais como direitos públicos subjetivos: argumenta-se que ninguém tem direito

subjetivo em face do Estado para exigir prestações sociais; b) a separação dos

poderes, pois o Poder Judiciário não pode obrigar o executivo a agir nem o

Legislativo a legislar; c) o Poder Judiciário não pode controlar o mérito dos atos

administrativos, porquanto estes estão sujeitos à análise da conveniência e

oportunidade; d) a falta de recursos orçamentários.

A autora contra-argumenta dizendo que a separação dos poderes também

está baseada na teoria dos freios e contrapesos. Por isso, o Poder Judiciário tem o

dever de intervir casos os demais poderes não estejam agindo em prol da defesa

dos direitos sociais. Além disso, alega que o mérito administrativo não pode servir

Page 26: Atuação dos Policiais Militares da Paraíba Frente aos Direitos Humanos

26

como escudo contra a intervenção do Poder Judiciário nos desmandos

administrativos.

Por fim, considerando a prioridade e a urgência dos direitos sociais, não se

sustenta o argumento de que não há recursos orçamentários disponíveis para a

implementação de direitos humanos (BONTEMPO, 2008, p. 287). Relevante abordar

novamente, de forma mais específica, a problemática da eficácia dos direitos

subjetivos a prestações estatais. Como se sabe, os direitos sociais requerem

prestações do Estado. A falta de regulamentação, no caso de normas de eficácia

limitada, ou de políticas públicas, no caso de normas programáticas, impede a plena

eficácia desses direitos.

Caberia ao detentor do direito subjetivo à prestação recorrer ao Poder

Judiciário para vê-la satisfeita. Nesse ponto aparece a grande dificuldade, que diz

respeito aos limites que o Poder Judiciário deve respeitar ao enfrentar uma questão

dessa natureza.

Sarlet (207, p. 375-376) invoca o princípio da dignidade humana, o direito à

vida e o princípio do mínimo existencial para afirmar que o Poder Judiciário deve

apenas prover as necessidades mínimas existenciais, sopesando os bens

constitucionais incompatíveis (princípio da separação dos poderes, por exemplo) e o

direito social objeto da ação.

As limitações às emendas constitucionais têm um sentido muito maior do que

dar rigidez à Constituição. Esses limites impedem a retirada de direitos fundamentais

do rol constitucional. Os limites que devem ser observados pelo poder constituinte

reformador são classificados por Sarlet (2007, p. 415 e ss.) como limites temporais,

formais e materiais.

Os limites temporais são poucos. Na Constituição de 1988, existe a limitação

de não poder reapresentar um projeto de emenda não aprovado no mesmo ano

legislativo. Também ficaram vedadas as emendas durante intervenção federal,

estado de sítio ou de defesa.

Os limites formais dizem respeito ao processo de emenda, tanto quanto à

iniciativa, prevista no art. 60, incisos I a III, da Carta Magna, quanto ao processo

legislativo, disposto no § 2º do mesmo artigo.

Page 27: Atuação dos Policiais Militares da Paraíba Frente aos Direitos Humanos

27

Art. 60. “A Constituição poderá ser emendada mediante proposta: I - de um terço, no mínimo, dos membros da Câmara dos Deputados ou do Senado Federal; II - do Presidente da República; III - de mais da metade das Assembléias Legislativas das unidades da Federação, manifestando-se, cada uma delas, pela maioria relativa de seus membros”.8 Art. 60 “[...] - § 2º - A proposta será discutida e votada em cada Casa do Congresso Nacional, em dois turnos, considerando-se aprovada se obtiver, em ambos, três quintos dos votos dos respectivos membros”.

Os limites materiais são limites relativos a uma matéria constitucional. O

Poder Constituinte de 1988 criou no art. 60, § 4º 9, verdadeiros limites materiais à

atuação do poder reformador. As referidas matérias passaram a ser denominadas

cláusulas pétreas. Cabe ressaltar que os direitos humanos, objeto do presente

estudo, também estão protegidos contra a alteração constitucional que pretenda os

abolir (art. 60, § 4º, inciso IV, da Constituição).

Sarlet (2007, p. 419 e ss.) explica que os limites materiais, embora possam

criar um descompasso entre a Constituição e a realidade social, são importantes na

medida em que impedem uma reforma desenfreada da Constituição, mantém certa

estabilidade e protegem a sociedade contra alterações que desvirtuem o caráter

protetivo da Carta Magna.

Se as dificuldades de assegurar a eficácia dos direitos humanos no plano

interno são grandes, não é diferente no plano internacional. Sarlet (2007, p. 64)

lembra que a implementação e efetivação dos direitos humanos de segunda e

terceira dimensões revela grandes dificuldades. Somente seria possível efetivar

alguns direitos com a colaboração internacional de todos os Estados. Por esse

motivo, há uma tendência de universalização dos direitos humanos.

Mas o problema da efetividade não ocorre somente com os direitos de

segunda e terceira dimensões, conforme aponta Sarlet (2007, p. 65). A violação de

direitos de primeira dimensão é uma constante, inclusive no Brasil. Até por isso, o

autor refuta o reconhecimento de direitos de quarta dimensão se sequer as outras

dimensões foram implementadas de forma satisfatória.

Bobbio (2004, p. 78-79) relata a ocorrência de um processo de especificação

de direitos. Além dos direitos gerais atribuídos a qualquer ser humano, foram sendo

identificadas categorias de pessoas que necessitavam de direitos específicos a elas.

Essa especificação ocorreu por gênero (direitos específicos das mulheres), por fase

da vida (direitos da criança, do adolescente e dos idosos) ou por estados

Page 28: Atuação dos Policiais Militares da Paraíba Frente aos Direitos Humanos

28

excepcionais da vida humana. Mas a questão é saber o que podem fazer os

organismos internacionais para coibir a violação de direitos humanos.

A proteção internacional dos direitos humanos segundo Bobbio (2004, p. 50-

51) relembra que a única defesa contra a violação de direitos naturais era o direito

de resistência, que também era direito natural. Depois da positivação na

Constituição, a defesa era pelo ajuizamento de ação judicial. Mas e quando o

problema é crônico e quando o Estado chega ao ponto de não respeitar a maioria

dos direitos, ou, ainda, quando sequer foram positivados os direitos.Nesses casos, a

proteção deve ser garantida pela comunidade internacional.

Quando um Estado descumpre a proteção aos direitos humanos, o cidadão

prejudicado não é apenas cidadão daquele Estado, é cidadão do mundo e, como tal,

merece proteção internacional. Isso demonstra o caráter transnacional dos direitos

humanos, na visão de Bobbio.

Segundo Bobbio (2004, p. 57), a efetividade dos direitos do homem, do ponto

de vista jurídico-político, esbarra no fato de os organismos internacionais ou a

comunidade internacional não possuir uma vis coactiva. O que significa que a

comunidade internacional não possui poder de coerção capaz de obrigar um Estado

a respeitar os direitos humanos. Bobbio (2004, p. 96) aponta duas soluções

possíveis para tal problema: primeiro, a comunidade internacional deveria exigir o

respeito aos direitos humanos, sob pena de exclusão do Estado; segundo, a

comunidade internacional deveria ter um poder suficientemente forte para intervir no

Estado que viola os direitos humanos.

De acordo com Bobbio (2004, p. 58-59), há algum tempo, os mecanismos

utilizados pelos organismos internacionais para a tutela dos direitos humanos são de

três tipos: promoção, controle e garantia. A promoção se faz pela indução ou pela

recomendação de implementação ou de aperfeiçoamento dos direitos humanos. Já

o controle é realizado através a entrega de relatórios pelos Estados-membros do

órgão internacional e pelas denúncias de descumprimento ou violação de direitos. A

garantia significa a existência de uma jurisdição internacional. O problema é que

falta a essa jurisdição capacidade de se sobrepor à jurisdição interna.

Além da dificuldade jurídico-política da efetivação dos direitos humanos,

existem também problemas que residem no conteúdo desses direitos, conforme

explica Bobbio (2004, p. 60-61). Em primeiro lugar, os direitos do homem, ao

contrário do que normalmente se pensa, não têm valor absoluto. Em segundo lugar,

Page 29: Atuação dos Policiais Militares da Paraíba Frente aos Direitos Humanos

29

eles não são homogêneos. Ter um valor absoluto significa valer em qualquer

situação e a heterogeneidade faz com alguns direitos entrem em conflito, o que gera

a impossibilidade da vigência total e simultânea de todos eles.

Também afirma Moraes (2006, p. 28-30a) que os direitos humanos não são

absolutos, mencionando inclusive uma decisão do Supremo Tribunal Federal,

segundo a qual os direitos individuais não podem servir como escudo para a prática

de ilicitudes. Além disso, não é incomum ocorrer conflito entre direitos humanos, o

qual deve ser resolver pela harmonização, evitando o sacrifício de um deles em

favor de outro.

Um outro ponto que pode ser mencionado é que os Estados devem respeito

às normas internacionais de proteção dos direitos humanos. Cançado Trindade

(2003a, p. 277-298) fala que, na II Conferência Mundial de Direitos Humanos,

apesar dos intensos debates, houve um quase consenso sobre a universalidade dos

direitos do homem, independentemente dos particularismos culturais, sobre a

indivisibilidade desses direitos, em razão de que a não-observância de alguma

categoria de direitos esvazia o sentido da proteção das outras categorias, e sobre a

necessidade de os Estados incorporarem ao direito interno as normas internacionais

de proteção aos direitos humanos.

Afirma ainda Cançado Trindade (2003a, p. 521-522) que os órgãos internos

devem conformar a legislação às normas internacionais. Aos órgãos internacionais

cabe a supervisão e a fiscalização quanto ao cumprimento das normas

internacionais. “[...] os tratados de direitos humanos impõem deveres que implicam a

interação entre suas normas e as de direito interno [...]” (CANÇADO TRINDADE,

2003a, p. 524). Não fosse assim, não haveria razão para a assinatura de tratados,

pois eles perderiam grande parte de sua função. Cançado Trindade (2003a, p. 545-

546) alerta que “[...] O formalismo do requisito do conhecimento da norma jurídica,

por exemplo, tem sido levado a extremos inaceitáveis, em detrimento dos direitos

individuais”.

É importante lembrar que todos os Estados são interessados na proteção dos

direitos humanos, podendo quaisquer deles exigir a responsabilização do Estado

violador, ainda que não tenha atingido pessoas estrangeiras, posto que a violação

de direitos humanos é uma afronta não só ao indivíduo, mas à toda a coletividade,

inclusive à comunidade internacional. Na prática, porém, são raras as denúncias por

parte de outros Estados, pois os países procuram não intervir nos Estados

Page 30: Atuação dos Policiais Militares da Paraíba Frente aos Direitos Humanos

30

estrangeiros. Por isso, em geral, as denúncias partem do indivíduo lesado (ANNONI,

2001, p. 55).

A responsabilidade internacional do Estado pode ocorrer por omissão ou

comissão, busca a reparação do dano, a volta ao estado anterior (status quo ante), a

cessação da violação ou a satisfação. A satisfação é o modo de reparar uma

conduta ilícita que não causou danos materiais e é realizada mediante pedido de

desculpas, admissão da responsabilidade, garantia da não-repetição e pagamento

de indenização ao lesado (ANNONI, 2001, p. 41 e 60-61).

O Brasil está sujeito a dois importantes mecanismos de responsabilização: a

Comissão de Direitos Humanos da ONU e a Corte Interamericana de Direitos. A

Comissão de Direitos Humanos da ONU, conforme Annoni (2001, p. 73), pode agir

verticalmente, comunicando o Estado violador, estabelecendo regras e prazos para

cessar a violação ou para reparar os danos e monitorando o cumprimento; ou pode

lançar mão do sistema horizontal de proteção, por meio do qual um Estado pode

aplicar sanções, como boicotes e embargos, ao Estado violador. Além disso, em

casos extremos, pode ser autorizada, pela Assembleia Geral da ONU, a intervenção

militar de um Estado a outro.

A Corte Interamericana, encarregada de aplicar a Convenção Americana de

Direitos Humanos e outros tratados, pode exigir a efetivação do direito violado ou a

cessação da violação e ainda, impor a reparação do dano, com pagamento de

indenização pecuniária (ANNONI, 2001, p. 106).

1.7 Considerações finais parciais do capítulo

Diante do exposto, observa-se que o conceito de direitos humanos esta ligado

à ideia de que são inerentes à natureza humana. Já os direitos fundamentais são

direitos do ser humanos positivados na Constituição.

Com relação a história dos direitos humanos se observa que é longa e

gradual. E também que sua origem e o fundamento dos direitos humanos são

históricos, pois os fatos históricos criaram as condições para a afirmação e para o

desenvolvimento desses direitos.

No tocante a proteção internacional dos direitos humanos, apesar de contar

com a participação de importantes órgãos como as Nações Unidas e a Corte

Page 31: Atuação dos Policiais Militares da Paraíba Frente aos Direitos Humanos

31

Interamericana de Direitos Humanos, é pouco efetiva, principalmente pela

dificuldade de intervir nos Estados violadores e exigir deles o cumprimento das

normas de direitos humanos.

Por fim, outro problema encontrado na proteção dos direitos humanos é o

relativismo cultural. As peculiaridades culturais de alguns países são um obstáculo à

universalização dos direitos da pessoa humana e, apesar do esforço de inúmeros

países, pouco avanço se verifica no processo de internacionalização. No entanto, é

importante que se tomem iniciativas para, gradualmente, incorporar direitos

humanos nessas sociedades.

Page 32: Atuação dos Policiais Militares da Paraíba Frente aos Direitos Humanos

32

2 FORMAÇÃO DO POLICIAL MILITAR

Ricardo Brizola Balestreri em seu artigo: Direitos Humanos: Coisa de Polícia

(BALESTRERI, 1998), enfatiza a importância da Inclusão do Estudo do Direito para

as instituições policiais. Ao abordar questões como antagonismo moral entre polícia

e bandido, ética corporativa versus ética cidadã, lógica policial e lógica militar, esta

obra, do representante da Anistia Internacional no Brasil, Ricardo Balestreri, estará,

certamente, sendo incluída na coleção de obras referenciais sobre o assunto

espinhoso que é a segurança pública. O autor demonstra estar ciente dos graves

problemas que o Brasil enfrenta nesse campo e, o que é mais importante, aponta

alguns dos caminhos que se pode trilhar para atingir o perfil do policial protagonista,

educador em direitos humanos, promotor da cidadania.

Como bem define o autor "há que haver, por parte do agente estatal, uma

oposição radical, do ponto de vista moral e metodológico, entre a sua própria prática

e a prática do bandido... o agente do Estado precisa ser parte exemplar dessa

história". Daí a necessidade de que o policial protagonista internalize um campo

definido de regras de conduta para que seu comportamento seja, ao mesmo tempo,

eficiente e educativo, capaz de alimentar o imaginário social de forma positiva.

O Programa Nacional de Direitos Humanos, lançado em maio de 1996,

contemplou medidas específicas para a área da segurança pública, especialmente

no que tange ao aperfeiçoamento da formação do policial, através da inclusão, nos

currículos das academias, de temas relacionados aos direitos humanos e à

cidadania. Além disso, outras medidas estão sendo implementadas por meio de

cooperação com organizações não-governamentais como a própria Anistia

Internacional e o Comitê Internacional da Cruz Vermelha.

O importante é que tenhamos a convicção de que os desafios na área da

segurança pública não são exclusivos do Governo. Apesar da certeza de que é

necessário promover alterações, ainda há, nesse campo, uma forte resistência a

mudanças. A tarefa não é fácil e, por isso mesmo, requer o engajamento e o

compromisso de todos com a instituição policial, que é, como aponta o autor, "setor

estratégico para a mudança da sociedade e o desenvolvimento do país".

Nas sociedades democráticas contemporâneas, a polícia se apresenta como

o principal braço do Estado nas questões relativas à segurança pública. No Brasil, a

situação não é diferente, concentrando a maior atenção ao seguimento

Page 33: Atuação dos Policiais Militares da Paraíba Frente aos Direitos Humanos

33

uniformizado, versão mais visível do aparato policial, constituída pelas Polícias

Militares Estaduais.

Formadas inicialmente por integrantes oriundos das forças regulares do

Exército Brasileiro, as Polícias Militares, até 1969, não se dedicavam ao

policiamento ostensivo, mas tão somente à segurança interna e manutenção da

ordem pública, com prioridade para a primeira missão, consideradas, por esse

motivo, Forças Auxiliares e Reserva do Exército. Tal situação impelia que os corpos

militares estaduais buscassem a “ser a imagem e semelhança da força principal” a

que estavam ligados.

Os elementos da Força Policial recebiam a mesma instrução, segundo a

Ordenança adotada para os corpos de infantaria do Exército, limitando-se a

instrução, que era dada pelo Comandante do Corpo, às evoluções ensinadas na

Escola de Pelotão, manejo de arma, exercício de tiro, etc.

Com o advento do Decreto-Lei 317/67, as polícias militares passaram a ter a

atribuição do policiamento ostensivo fardado, bem como o ensino para essas

instituições começou a ser padronizado em todo o Brasil, orientado e fiscalizado pelo

Ministério da Guerra, por intermédio da recém-criada Inspetoria-Geral das Polícias

Militares (IGPM).

A partir da edição do Decreto-Lei nº 667/69, “todas as atividades das Polícias

Militares do Brasil passaram a ter o crivo do Estado-Maior do Exército, através da

Inspetoria Geral das Polícias Militares”. Também, no mesmo ato, são reorganizadas

as corporações militares estaduais, as quais detinham a exclusividade no

policiamento ostensivo.

Com a Carta Magna de 1988, em que pese seu conteúdo intensamente

democrático, a Segurança Pública passou a ser tratada no título referente à Defesa

do Estado e das Instituições Democráticas, juntamente com as Forças Armadas. No

referido título, as diversas polícias foram elencadas no art. 144 da Constituição

Federal, posicionando-se formalmente como tutoras da democracia brasileira, numa

concepção equivocada, mas verdadeira para seus integrantes, pois, numa

democracia moderna, sua verdadeira tutela está na sociedade, que a exerce através

da participação, seja direta ou representativa.

O texto constitucional de 1988 passou a ter em seu bojo todas as polícias

públicas existentes e manteve a destinação das Polícias Militares como força auxiliar

e reserva do Exército, situação desta última existente desde a Constituição de 1934.

Page 34: Atuação dos Policiais Militares da Paraíba Frente aos Direitos Humanos

34

2.1 Repressão

Traduz-se no ato de restringir o verdadeiro sentimento, através de uma

atitude, ou idéia. A repressão não é mais organizada por subterfúgios do Governo,

mas para a manutenção do "status" das classes alta e média brasileiras. Estas

classes são comandadas por homens brancos que têm arraigado o preconceito

contra os não brancos, pobres em geral, grupos de orientação sexual minoritários,

ativistas sindicais, crianças de rua, etc. O Governo atual, embora democrático, faliu

no que concerne ao controle da violência ilegal, gerando a impunidade, assegurada

pela ineficiência e omissão governamentais (MIRANDA, 2007).

As estratégias repressivas devem estar subordinadas a uma política centrada

na prevenção do crime e da violência. O combate à impunidade é muito importante,

mas não se reduzirá a taxa de impunidade no Brasil aumentando as penas ou

tornando a execução penal ainda mais desumana. A impunidade, pouco tem a ver

com as leis penais, ela está profundamente vinculada, às deficiências de

investigação e, por consequência, à fragilidade da prova. Impunidade é um problema

de polícia despreparada, incapaz e sem recursos de inteligência. (fonte: entrevista

publicada na edição nº 377, junho de 2007).

A violência endêmica que sofre o Brasil se concentra nas grandes cidades,

habitadas por mais de um milhão de pessoas, onde as diferenças sociais e

econômicas são mais acentuadas. Quanto maior for a diferença entre ricos e pobres,

maiores serão as atrocidades contra os Direitos Humanos. Por causa desta

violência, a impunidade dos crimes demonstra um descompasso estrondoso entre o

texto constitucional, as políticas de defesa dos direitos humanos da polícia militar

(CASAGRANDE, artigo jornal do Brasil 2007aacesso em 15 de junho).

2.2 Polícia Militar da Paraíba

Criada ainda no tempo do Império, a Polícia Militar é, atualmente, o mais

antigo órgão público em atividade no estado da Paraíba.

Mesmo com a criação das Guardas Municipais Permanentes, a Paraíba não

teve condições ou interesse de criar sua Guarda de imediato. No ano seguinte à

criação, assumiu a Presidência da Paraíba o Padre Galdino da Costa Vilar, que

Page 35: Atuação dos Policiais Militares da Paraíba Frente aos Direitos Humanos

35

sentindo a premente necessidade de manutenção da ordem pública, de imediato

tratou de criar um órgão com esse fim. Como nessa época as Províncias não tinham

autonomia, por não terem Assembleia Legislativa, a criação da Guarda Municipal foi

discutida no Conselho Provincial, que tinha suas decisões formalizadas através da

Consignação de Resoluções nos livros de atas. Dessa forma, o Corpo de Guardas

Municipais Permanentes da Paraíba foi criada no dia 3 de fevereiro de 1832.

(PMPB)

Sob o Comando de Francisco Xavier de Albuquerque, que foi nomeado

Capitão pelo Presidente da Província, e com um efetivo de 50 homens, sendo 15 a

cavalo e 35 a pé, a nova organização foi efetivamente posta em funcionamento no

dia 23 de outubro de 1832. O primeiro Quartel ocupado foi o prédio onde antes

funcionava um convento e hoje está instalado o Palácio do Arcebispado, na Praça

Dom Adauto, no centro da capital paraibana. Suas primeiras missões foram a

Guarda da Cadeia e a execução de Rondas no centro da cidade. (PMPB)

Em 1834, com o advento de uma emenda à Constituição do Império, as

Províncias ganharam autonomia, sendo criado o Poder Legislativo Provincial. Na

primeira reunião da Assembleia Legislativa da Província o Coronel PM Elísio

Sobreira, patrono da PMPB, no dia 2 de junho de 1835, através da Lei nº 09, o

Corpo de Guardas Municipais Permanentes recebeu a denominação de Força

Policial. Essa mesma lei ampliava o efetivo da Corporação e destinava fração de

tropa para compor os primeiros destacamentos do interior da Província, que

foram Areia e Pombal. (PMPB)

Assim denominada, a Corporação permaneceu até 1892, quando passou a

denominar-se de Corpo Policial. Ao longo da sua história a Corporação foi

denominada ainda de Corpo de Segurança, Batalhão de Segurança, Batalhão

Policial, Regimento Policial, Força Policial, por três vezes, e Força Pública duas

vezes. Finalmente, em 1947, por força de dispositivo Constitucional, a Corporação

recebeu a denominação de Polícia Militar do Estado da Paraíba. (PMPB)

A Lei 3009/77 da Polícia Militar da Paraíba traz as seguintes mensurações a

respeito das funções e deveres do Policial Militar.

Cargo policiaI-militar é um conjunto de deveres e responsabilidades

cometidos ao policial-militar em serviço ativo. Já a função policial-militar é o

exercício das obrigações inerentes do cargo policial-militar. As atribuições e

obrigações inerentes ao cargo policial-militar devem ser compatíveis com o

Page 36: Atuação dos Policiais Militares da Paraíba Frente aos Direitos Humanos

36

correspondente grau hierárquico e, no caso da policial-militar, com as restrições

fisiológicas próprias, tudo definido em legislação ou regulamentação específica.

Dentro de uma mesma Organização Policial-Militar, a seqüência de

substituição para assumir cargo ou responder por funções, bem como as normas,

atribuições e responsabilidades relativas, são estabelecias na legislação específica,

respeitadas a precedência e a qualificação exigida para o cargo ou para o exercício

da função.

As atribuições que, pela generalidade, peculiaridade, duração, vulto ou

natureza, não são catalogadas como posições tituladas em Quadros de Organização

ou dispositivo legal, são cumpridas como encargos, comissão, incumbência, serviço

ou exercício de função policial-militar ou como tal considerada.

Os policiais militares têm as seguintes obrigações:

        I - o patriotismo, traduzido pela vontade inabalável de cumprir o dever policial-

militar e pelo solene juramento de fidelidade à Pátria, até com o sacrifício da própria

vida;

        II - o civismo e o culto das tradições históricas;

        III - a fé na missão elevada da Polícia Militar;

        IV - o amor à profissão e o entusiasmo com que a exerce;

        V - o aprimoramento técnico-profissional;

        VI - o espírito de corpo e o orgulho pela Corporação; e

        VII - a dedicação na defesa da sociedade.

O conhecimento de fato destas obrigações inerentes são de fundamental

importância para um exercício profissional correto, mais eficiente e satisfatório para

a sociedade.

2.3 Polícia Comunitária

Se define como uma filosofia e uma estratégia organizacional executada pela

polícia militar que surgiu no Estado do Rio de Janeiro nos anos 80, seu objetivo é

interagir junto a sociedade e seus agente devem ser formados para atuações de

cunho interativo e negociativo, pois este policiamento não tem qualquer

característica de cunho repressivo devendo se perfazer com parceria entre polícia

demais órgão de segurança e população.

Page 37: Atuação dos Policiais Militares da Paraíba Frente aos Direitos Humanos

37

Esta filosofia Baseia-se na premissa de que tanto as instituições estatais,

quanto à população local, devem trabalhar juntas para identificar, priorizar e resolver

problemas que afetam a segurança pública, tais como o crime, o medo do crime, a

exclusão e a desigualdade social que acentuam os problemas relativos à

criminalidade e dificultam o propósito de melhorar a qualidade de vida dos cidadãos.

Dessa forma, a polícia comunitária associa e valoriza dois fatores, que

freqüentemente são dissociados e desvalorizados pelas instituições de segurança

pública e defesa social tradicionais: i) a identificação e resolução de problemas de

defesa social com a participação da comunidade e ii) a prevenção criminal. Esses

pilares gravitam em torno de um elemento central, que é a parceria com a

comunidade, retroalimentando todo o processo, para melhorar a qualidade de vida

da própria comunidade. Na referida parceria, a comunidade tem o direito de não

apenas ser consultada, ou de atuar simplesmente como delatora, mas também

participar das decisões sobre as prioridades das instituições de defesa social, e as

estratégias de gestão, como contrapartida da sua obrigação de colaborar com o

trabalho da polícia no controle da criminalidade e na preservação da ordem pública e

defesa civil.

As estratégias da filosofia de polícia comunitária têm um caráter

preferencialmente preventivo. Mas, além disso, estas estratégias visam não apenas

reduzir o número de crimes, mas também reduzir o dano da vítima e da comunidade

e modificar os fatores ambientais e comportamentais. Tendo em vista que a

proposta da polícia comunitária implica numa mudança de paradigma no modo de

ser e estar a serviço da comunidade e, conseqüentemente, numa mudança de

postura profissional perante o cidadão, este tema também é trabalhado dentro de

uma abordagem transversal, estando presente em todas as práticas pedagógicas.

Sendo assim, torna-se imprescindível à formação de multiplicadores nesta

temática. Diante deste contexto, tornou-se imprescindível a formação de policiais

nessa filosofia, os tornando aptos a multiplicarem estes conhecimentos em seus

Estados. A partir da elaboração e desenvolvimento pela Senasp, em parceria com

todos os Estados membros, bem como a participação direta de integrantes do Grupo

de Trabalho denominado “Matriz Curricular Nacional para Polícia Comunitária”,

nomeado pela Portaria Senasp nº 14, de 26/04/06, publicado no D.O.U. de 08/05/06

o Curso Nacional de Multiplicador de Polícia Comunitária foi formatado e se justificou

pela sua proposta inovadora de propiciar aos participantes um elenco de

Page 38: Atuação dos Policiais Militares da Paraíba Frente aos Direitos Humanos

38

conhecimentos multidisciplinares capazes de desenvolver aptidões cognitivas e

comportamentais na adoção da temática específica de Polícia Comunitária.

Nos meses de outubro, novembro e dezembro de 2006 foram realizados

cursos de Multiplicador de Polícia Comunitária nos estados difusores da doutrina,

quais sejam: Mato Grosso para a região centro-oeste, Ceará para a região nordeste,

Rio de Janeiro para a região sul e sudeste (com vistas ao Pan Americano) e Pará

para a região norte.

Realizados em três turmas, em cada centro difusor de doutrina de polícia

comunitária, os cursos formaram 460 profissionais aptos a difundirem a doutrina em

seus estados de origem. Apesar de já trazer resultados profícuos em vários pontos

do país, a doutrina de polícia comunitária ainda carece de mais profissionais

convertidos a essa filosofia de integração e interação comunitária.

Para 2007 já se iniciaram os trabalhos para a elaboração da matriz curricular

para promotor de polícia comunitária. Mais enxuta e prática a carga horária desses

cursos poderão ser ministradas em 40 horas-aula, capacitando o policial a atuar

como promotor da polícia comunitária.

Concomitante a este trabalho, estamos elaborando a conversão desses

conteúdos para o ensino a distância da Senasp.  O curso de polícia comunitária será

voltado para todas as instituições de segurança pública e defesa social do país,

desta forma encurtando a distância entre a capacitação e os profissionais, utilizando-

se do meio virtual, cada vez mais integrado a vida cotidiana dos servidores dos

estados.

2.3.1 Pressupostos básicos do policiamento comunitário

Ação pró-ativa, o policiamento pró-ativo é preventivo e age para evitar que os

delitos aconteçam. Para alcançar este objetivo isso é essencial que sejam

identificados os locais, horários, pessoas ou circunstâncias propícias à ocorrência

delituosa.

Ação preventiva que nada mais é que a presença ostensiva, correta e

vigilante do policial de maneira que este agente estabelece um clima de confiança

no seio da comunidade, e inibe a ação dos bandidos.

Page 39: Atuação dos Policiais Militares da Paraíba Frente aos Direitos Humanos

39

Integração dos sistemas de defesa pública e defesa social se traduz na

parceria e cooperação entre a polícia e a comunidade potencializando os efeitos

positivos. A busca compartilhada de soluções conjuntas pode evitar a dispersão dos

esforços, e auxilia a identificação dos problemas que afetam a todos.

Transparência ocorre com a promoção de reuniões para a expor as atividades

desempenhadas pela polícia, e a troca de informações com a comunidade visando a

análise dos seus efeitos; estimulando a participação e o envolvimento do cidadão na

busca conjunta da melhoria da qualidade do serviço prestado pela polícia.

Cidadania o pacificador social deve ser propagador da noção de cidadania;

solicitando a participação de todos nos problemas que atingem a comunidade.

Por fim, ação Educativa que nada mais é que uma padronização do método

de agir dos policiais sempre: orientando, aconselhando e advertindo antes das

ações repressivas. As ações educativas não podem ocorrer apenas no momento

das infrações, mas através dos organismos comunitários encarregados de

promoverem a defesa social da comunidade, principalmente junto às escolas e

associações; promovendo-se palestras, campanhas e outras formas de divulgação e

orientação.

Page 40: Atuação dos Policiais Militares da Paraíba Frente aos Direitos Humanos

40

3 DIREITOS HUMANOS X POLICIAIS

A relação entre polícia e direitos humanos está centrada nas noções de

proteção e respeito, mantendo a ordem social, de modo que todos os direitos

humanos, de todas as categorias sejam respeitados. Quando há uma quebra na

ordem social, a capacidade da policia em promover e proteger os direitos humanos

são consideravelmente diminuídos ou destruídos, sendo os policiais vistos como

delinquentes, quando esses mesmos direitos não são respeitados, prejudicando o

trabalho. O policial precisa deixar de ser visto, sem exceções, como o malvado

perseguidor dos pobres e explorados que se revoltam e revidam contra a sociedade

má.

Quando a população teme ou desconfia da polícia, ocorre uma ruptura no

fluxo de informações e consequentemente uma redução da eficácia policial.

A polícia é vista como uma instituição ontológica, entretanto ela é composta

por pessoas, que antes de tudo são cidadãos, e na cidadania devem nutrir sua razão

de ser, tornando-se iguais a todos os membros da comunidade, com o objetivo de

prevenir e detectar o crime, manter a ordem social e proteger os direitos humanos

(BALESTRERI, 1998).

Violar os direitos humanos, com o propósito de aplicar a lei não é

considerado uma prática policial eficiente. Quando a polícia viola a lei com o intuito

de aplicá-la, não está reduzindo a criminalidade, está somando a ela.

Não devemos esperar da polícia apenas “respeito” aos Direitos Humanos,

uma vez que essa parece uma perspectiva muito pobre diante de uma missão tão

rica. Essa consciência de importância está crescendo cada vez mais nas

corporações policiais e também nas organizações não governamentais

(BALESTRERI,1998,p.4).

O policial, pela natural autoridade moral que porta, tem o potencial de ser o

mais marcante promotor dos Direitos Humanos, revertendo o quadro de descrédito

social e qualificando-se como um personagem central da democracia.

Afinal se queremos diferenciar-nos, ser coerentes, impressionar e mover pelo

exemplo, não podemos adaptar a verdade a nossos desejos, só porque cremos que

estamos do lado certo.

A investigação tem que ser mais criteriosa, as provas colhidas

cuidadosamente, as prisões só devem ser feitas com ordem judicial ou em flagrante

Page 41: Atuação dos Policiais Militares da Paraíba Frente aos Direitos Humanos

41

delito, ao réu deve ser garantida a ampla defesa, tendo como limite às diversas

liberdades dos cidadãos.

Entretanto o único poder que temos sobre a realidade é o poder que temos

sobre nós mesmos. Quando começamos a mudar, a qualificar-nos, a fazer melhor

nosso trabalho, a viver melhor nossas relações com nossos semelhantes, a

cultivarmos mais respeito por nós e pelas missões que temos a desempenhar,

quando assumimos esse poder, passamos a contaminar positivamente a realidade à

nossa volta e o mundo começa a mudar. Deixamos de ser vítimas impotentes à

espera da boa vontade alheia, das mudanças alheias, da melhoria alheia, e

passamos a trabalhar com o que temos, com o que podemos controlar, com o que

efetivamente podemos melhorar.

3.1 Abordagens policiais

De um modo geral, as pessoas ou já passaram por essa experiência, ou

conhecem o relato de outras que foram abordadas, ou ainda tiveram contato com

esse assunto pela mídia. Em um aspecto geral, as notícias e comentários sobre a

abordagem policial costumam dar maior ênfase ao excesso da ação policial. O

resultado disso tende a ser a construção de um censo comum em torno do fato de

que esse procedimento policial é, via de regra, violento e vai contra os direitos

humanos. Diante da possibilidade de a abordagem policial causar um efeito tão

negativo, porque as instituições policiais a mantém no rol das ações de seus

agentes?

A resposta é clara: porque a abordagem policial é uma ferramenta necessária

para manter a ordem pública e controlar o crime, pois é dela que derivam a retirada

de grande parte das drogas que são comercializadas ilegalmente e as armas

utilizadas em delitos de todas as naturezas. .

É óbvio que nem todos os remédios são amargos, nem todas as abordagens

policiais são abusivas. Se investigássemos o exercício profissional de qualquer

classe e fizéssemos a comparação dos extremos de cada uma iríamos encontrar

diferenças de fato destoantes.

Page 42: Atuação dos Policiais Militares da Paraíba Frente aos Direitos Humanos

42

O objetivo aqui é desconstruir alguns mitos sobre a abordagem policial;

mostrar caminhos que possam aprimorar o preparo profissional do policial durante

Abordagem policial.

O que é isso? A definição geral para a abordagem policial é: um encontro

entre a polícia e o público cujos procedimentos adotados variam de acordo com as

circunstâncias e com a avaliação feita pelo policial sobre a pessoa com que interage,

podendo estar relacionada ao crime ou não (PINC, 2006 P. 2). Na relação que

ocorre no dia a dia entre a polícia e o público, a abordagem policial é um dos

momentos mais comuns da interface entre policial e cidadão.

Portanto, qualquer pessoa, durante suas atividades de rotina, estará sujeita a

ser abordada por um policial militar na rua. Indicadores confirmam a alta freqüência

com que o policial decide pela abordagem. Dados da Polícia Militar demonstram

que, no Estado de São Paulo, 7.141.818 pessoas foram revistadas, durante 2006, o

que representa 18% da população paulista, estimada em 40 milhões pela Fundação

Sistema Estadual de Análise de Dados – Seade.

Nessa mesma direção aponta uma análise feita com dados da pesquisa de

vitimização,1 no município de São Paulo (2003): selecionada a população de

homens jovens, na faixa de 16 a 29 anos, equiva Ano 1 Edição 2 2007 Revista

Brasileira de Segurança Pública.

Abordagem policial: um encontro desconcertante entre a polícia e o público?

Pode até ser, para alguns a abordagem é uma ação policial que desagrada, se não

todas, a grande parte das pessoas que passam por essa experiência. É quase

impossível se imaginar alguém agradecendo a um policial após o término de uma

abordagem. Essa é uma atitude de fato compreensível, porque ninguém gosta de ter

seus direitos cerceados e sua privacidade invadida, mesmo que seja por alguns

instantes.

Por fim encerro o capítulo com a conclusão de que todo somos cidadãos e

para tanto temos direitos e deveres e o dever do cidadão durante a abordagem é

seguir as orientações emanadas pela polícia e do policial é respeitar o seu o limite

que existe entre um exercício profissional efetivo e o que a doutrina chama de

excesso. Para tanto existe a legislação penal militar e o código penal que tratam de

elencar diversos delitos que aderem à conduta policial ilícita e cabe ao cidadão levar

a termo os excessos sofridos para que os autores sejam punidos a rigor pelos fatos

ocorridos quando comprovado culpa ou dolo.

Page 43: Atuação dos Policiais Militares da Paraíba Frente aos Direitos Humanos

43

4. CONCLUSÃO

Esta pesquisa mostrou a importância dos Direitos Humanos no tocante à

atuação dos Policiais militares da Paraíba demonstrando uma gradual evolução dos

direitos humanos, representada pelas quatro dimensões de direitos, as quais, longe

de serem completamente asseguradas, continuam em fase de efetivação, alem dos

problemas que permeiam a não efetividade dos Direitos Humanos nas ações

policiais.

Os policiais Militares da Paraíba ainda têm muitos direitos violados, não só

salariais. Soldados da Polícia Militar tem seus direitos desrespeitados dentro dos

quartéis, o mesmo acontece com os alunos, tudo por regras estúpidas. Há pouco fui

a uma academia de polícia civil que tinha um duplo lance de escadas. Na hora do

intervalo, os policiais ficavam todos se acotovelando porque tinham algo como dez

ou quinze minutos para lancharem.

Por um lance de escada podiam descer e pelo outro não, fazendo com que

se atrasassem. Fui perguntar ao diretor da Academia: Por que não se pode descer

por aquele lance de escada? Sabe qual foi a resposta dele? É porque sempre foi

assim. Eu disse: Mas os alunos não conseguem descer e comprar o lanche a tempo.

Ah, mas isso é uma questão de regra hierárquica, sempre foi assim e não vai mudar.

Eu disse: Tem uma razão para isso? Ele disse: Não, quando cheguei aqui já

acontecia isso, já era assim. Eu disse: isso é a lógica do absurdo, isso é violação

dos direitos humanos.

Aí você quer que o sujeito vá para rua, coloca uma arma na mão dele, dá

poder a ele e não quer que ele desconte na população. É muito difícil, se o homem

por traz da farda não tiver um grande equilíbrio. Essa é aquela ideologia a lógica do

inimigo, de um certo tipo de Forças Armadas, e que foi contrabandeada não só para

a polícia militar mas também para a polícia civil estadual e Federal em grande parte:

você tem que incomodar o sujeito, atormentá-lo a tal ponto que ele dali saia

neurótico e vá atacar o outro na rua, como inimigo. Eu pergunto é isso que o povo

quer?

Exercício profissional correto e digno é possível? Assim mesmo, nessas

condições, com esses salários, com carência de recursos, com eventuais

humilhações internas?

Page 44: Atuação dos Policiais Militares da Paraíba Frente aos Direitos Humanos

44

É possível sim e é um dever necessário, porque não podemos esperar por

melhores salários e melhores condições de trabalho para ter dignidade, assim como

não é correto dizer que os criminosos são criminosos porque são pobres, coisa que

enxovalha os pobres. A maioria dos cidadãos brasileiros fazem parte da classe

social que esta dentro da chamada linha de pobreza e, no entanto, é digna e

honesta.

Alguns colegas meus de trabalho às vezes cometem essa garfe de dizer, de

forma bem intencionada, mas simples: “A causa da criminalidade é a miséria que

assola nossa sociedade”. Não é verdade total. É parcial. É claro que a miséria

agrava, mas a grande maioria das pessoas que vivem em situação de miséria são

cidadãos dignos, honestos, trabalhadores, acordam as da manha e encaram a dura

labuta de suas vidas.

Nesta ótica, não é possível desculpar comportamentos indignos da polícia

militar por causa dos salários e das condições de vida. Temos o direito de lutar para

melhorar os salários e as condições de vida, mas isso não é pretexto para agir de

forma indigna e de forma brutal como não é pretexto para o professor, numa

analogia, entrar numa sala de aula e dizer: “Dou uma aula de péssima qualidade

porque ganho mal”. Não é pretexto! O seu cliente, que é o aluno, não tem culpa se

você ganha mal. Vá brigar com o governo para ganhar melhor, mas não sacrifique o

seu aluno.

O cidadão é o cliente da polícia. Se você tem problemas com o Estado, vá a

luta e tente resolver com o Estado os seus problemas. Não sacrificando o cidadão,

pois ele não tem culpa direta sobre isso, logo todos somos culpados indiretamente.

O dever de qualquer profissional que atua com o público é ser digno e tratar bem.

A minha reflexão final é esta: que, ao chegar em casa, ao deitar sua cabeça

no travesseiro, o sujeito se obrigue à frustração de admitir: ganho mal, não me dão

condições de trabalho, tive que comprar munições para o minha própria arma o que

é um absurdo e, além de tudo, fiz um trabalho de péssima qualidade. Mas que pelo

menos que ele possa ter o orgulho de pensar: apesar de não receber um salário

digno, apesar de não ter munições para a arma própria, apesar do carro está cheio

de problemas, apesar de todas as incompreensões e dificuldades, consegui ser

superior, executei minhas atribuições com dignidade e respeito, não me re-baixei à

práticas criminosas e respeitei as leis que guiam meu dever de cidadão policial.

Page 45: Atuação dos Policiais Militares da Paraíba Frente aos Direitos Humanos

45

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