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7/30/2019 Autismo infantil: questes fundamentais sobre o diagnstico e um tratamentopossvel
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Autismo infantil: questes fundamentais sobre o diagnstico e um tratamento
possvel
Rosane Braga de Melo (Professora do UNI-IBMR, FCCL-RJ)
Bianca Machado Quinto (Graduanda de Psicologia pelo UNI-IBMR)
Daniele Borges de Mello (Graduanda de Psicologia pelo UNI-IBMR)
Flvia Louise Neves Gonalves (Graduanda de Psicologia pelo UNI-IBMR)
Lilian Ribeiro Froes (Graduanda de Psicologia pelo UNI-IBMR)
Shana Allevato Wajntraub(Graduanda de Psicologia pelo UNI-IBMR)
Sobre o diagnstico: um breve histrico
Considerando a etimologia da palavra, auts em grego, autismo significa de
si mesmo. Eugen Bleuler (apudBercherie, 1989) foi o psiquiatra austraco que
primeiro conceituou a esquizofrenia como uma doena mental diferente das demais
demncias, incluindo o autismo dentro dos quatro critrios principais para a
identificao desta afeco mental, que ficaram conhecidos como os quatro A de
Bleuler: alucinaes, afeto incongruente, ambivalncia, autismo. Desta forma, autismo
durante as primeiras dcadas do sculo passado referia-se, em psiquiatria, tendncia
do esquizofrnico de ensimesmar-se, alhear-se do mundo social, colocar-se em um
mundo parte. O autismo bleuleriano coincidia com a teoria freudiana sobre o auto-
erotismo, desde que ficasse excludo o eros, acentuando a perda da realidade e mais
particularmente o aspecto da vivncia de uma outra realidade. luz da importante obrade Bleuler, de 1911 (ver Kaufmann[1]), sobre as Esquizofrenias,
Potter (apudAbramovitch, 2001), em1933, descreveu um novo quadro psicopatolgico,
a Esquizofrenia infantil. Segundo Potter, as crianas, assim como os adultos, rompem
repentinamente o contato com a realidade, depois de um perodo de desenvolvimento
normal, e preservam uma vida interior fantasiosa e criativa, porm privada e isolada.
Em 1943, Leo Kanner, cunhou o termo Distrbio Autstico do Contato Afetivo (Rocha,
1997[2]). Nessa poca, Kanner formula duas hipteses para a investigao etiolgica do
autismo - inatista e psicognica - influenciando a psiquiatria no tratamento precoce das
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crianas. O diagnstico de debilidade mental e deficincia auditiva eram comuns para
tais crianas. Os testes psicomtricos registravam coeficientes de inteligncia muito
baixos, mas em todos os casos foi constatado que no havia deficincia auditiva. A
impossibilidade de estabelecer conexes com pessoas e situaes, alm de uma relao
particular com as palavras - quando estas so tomadas com um significado inflexvel e
no podem ser usadas alm da acepo original em que foi aprendida - foram outras
caractersticas apontadas por Kanner. Qualquer mudana introduzida na rotina, na
disposio dos mveis, nas normas, na ordem que rege a atividade cotidiana os
desespera. As crianas se relacionam muito bem com os objetos, que lhes do uma
satisfao inquebrantvel de poder e domnio. Ainda que sejam tomados por dbeis
mentais, todos possuem uma indubitvel capacidade cognitiva. Kanner estabeleceu uma
distino importante entre a esquizofrenia infantil e o autismo infantil precoce,considerando que no autismo infantil os sinais de isolamento extremo e desapego ao
ambiente surgem desde o incio de vida de um beb.
Uma outra concepo que inclui o autismo dentro das psicoses a de Tustin
(1984). Segundo Tustin (1984) o autismo patolgico impede a percepo de realidades
divididas de modo que a criana passa a apresentar o quadro clnico que denominado
psictico. A criana psictica tem uma conscincia agonizante do no - eu (not self)
antes que tenha um eu (self) suficientemente integrado para lidar com a tenso. Um eu
encontrou com um no-eu (not self) experimentado de forma traumtica, o que para
Tustin sugere que uma criana nessa ocasio no tenha desenvolvido a necessria
integrao neuromental para lidar com a tenso. Tustin considera, ento, que exista um
autismo primrio normal que catastroficamente perturbado, onde a criana reage
atravs do desenvolvimento de um autismo patolgico. Nesses casos temos os
autistasencapsulados ou presos em uma concha (Tustin, 1984). Para Bettelheim (1987),
o afastamento da realidade e o alheamento autstico so caractersticas ressaltadas na
descrio dessas crianas que se tornam inacessveis em sua fortaleza vazia.
O diagnstico hoje
Na atualidade, o autismo passa a ser classificado como um dficit
neurobiolgico inato, inscrito, inclusive, na classificao das doenas mentais (DSM-
III-R, 1989; DSM-IV, 1994; OMS, 1975; CID-10, 1990). Embora na publicao do
DSM II, em 1968, o autismo tenha sido inserido no quadro esquizofrenia de incio na
infncia, a partir da dcada de 70, passa a ser reconhecido como uma deficincia
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cognitiva. Em 1980, no DSM III, o termo utilizado o de distrbios pervasivos do
desenvolvimento, que se distingue da esquizofrenia infantil. No DSM IV, o autismo se
caracteriza por prejuzo severo e invasivo em diversas reas do desenvolvimento:
habilidades de interao social recproca, habilidades de comunicao, ou presena de
comportamento, interesses e atividades estereotipados. Os prejuzos qualitativos
correspondem a um desvio acentuado em relao ao nvel de desenvolvimento ou idade
mental do indivduo. No CID-10, o autismo tambm deixa de ser diagnosticado como
uma psicose e torna-se um distrbio global do desenvolvimento. No DSM IV, o
diagnstico feito a partir da deteco de um total de seis ou mais itens dentro do
quadro apresentado pelo Manual, a partir dos prejuzos qualitativos nas reas de
interao social, na comunicao, e nos padres restritos e repetitivos de
comportamento, interesses e atividades. Embora no CID-10 no encontremos o critriodiagnstico estabelecido por uma determinada quantidade de itens so citados, tambm
em um quadro de critrios diagnsticos, comprometimentos qualitativos na interao
social recproca, comprometimento em brincadeiras de faz - de - conta e jogos de
imitao, padres de comportamento, interesses e atividades restritos, repetitivos e
estereotipados, e falta de uso social de quaisquer habilidades de linguagem. Tais
anormalidades do desenvolvimento devem estar presentes nos primeiros trs anos para
que o diagnstico seja feito, mas a sndrome pode ser diagnosticada em todos os grupos
etrios.
O debate aberto pela psicanlise sobre o autismo atribui relevncia estrutura e
no s manifestaes sintomticas (Rocha Miranda, 1999). Como afirma Lacan (1967)
trata-se de uma forma mais grave de assujeitamento linguagem, o que nos remete ao
campo das psicoses. Embora encontremos posies tericas diferentes sobre o autismo,
as contribuies da psicanlise vislumbram algumas sadas, que no sejam sadas de
estrutura, na anlise dessas crianas (Pollo, 2001). Nos extremos das posies em
relao estrutura, existem tericos que no consideram o autismo uma estrutura(Rosine e Robert Lefort, por exemplo), e os que consideram o autismo uma quarta
estrutura, a ser acrescentada s j conhecidas neurose, psicose e perverso. No interior
da posio que inclui o autismo no campo das psicoses, ao menos duas podem ser
ressaltadas: a de uma esquizofrenia precocemente desencadeada (Bruno, 1999, 2001;
Soler, 1999, 2001), e a de uma psicose precocemente desencadeada (Abramovitch,
2001a, 2001b).
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Sobre um tratamento possvel
Hoje, as pesquisas mdicas dominantes procuram causas neurolgicas,
bioqumicas e genticas, descartando as que foram consideradas psicodinmicas ourelacionadas aos pais, definindo o autismo como um transtorno cognitivo, privilegiando
o tratamento comportamental como teraputica. Muitas vezes, o objetivo desse tipo de
tratamento restringe-se ao treinamento de habilidades para o ajustamento e adaptao da
criana. Desde Tustin (1984), o autismo considerado um dos quadros mais difceis de
serem tratados em psicoterapia. As intervenes adotadas e sugeridas por Tustin
indicam que algo, como o terror, necessita ser posto em palavras pelo terapeuta,
auxiliando a criana a experiment-lo, destacando a importncia do uso da palavra no
processo teraputico. Neste sentido, para Tustin, o tratamento de procedimentosinterpretativos possvel medida que essas crianas possuem uma linguagem interna e
entendem, mas no falam. O que no quer dizer que a catarse desenfreada a ordem do
dia (Tustin, 1984, p.149). Por outro lado, Tustin adverte que tcnicas que buscam
estimular a criana psictica pela ccega, carcia ou abrao so cruis... (Tustin,1984,
p.191). Laznik (2004) prope uma interveno precoce para o autismo, atravs da
deteco de dois sinais primordiais que permitem pensar na hiptese de um autismo nos
primeiros meses de vida, pois as estereotipias e auto-mutilaes s aparecem aos dois
anos de vida. O primeiro seria o no-olhar entre a me e a criana, incluindo o fato da
primeira no se dar conta disso. O segundo estaria relacionado a uma falha no terceiro
tempo do circuito pulsional, no qual a criana vai se fazer objeto de um novo sujeito na
tentativa de fisgar o gozo deste Outro materno.
As particularidades de um atendimento com crianas autistas vem sendo alvo de
muitas pesquisas a partir das contribuies da psicanlise. O tempo todo, afirma
Carneiro Ribeiro (2001), essa a clnica em ato, de tal modo que o menor movimento -
um desvio de olhar, um comentrio qualquer - pode desencadear desde uma crise de
fria at o incio do contato possvel. Assim sendo, neste atendimento a clnica surge do
inesperado, da surpresa, do real que emerge a cada instante em seu poder de impossvel
e avassalador. Embora difcil de suportar, importante apostar em um tratamento
possvel e no deixar essas crianas ao abandono, deriva de qualquer lao social,
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presas no poro, tal como na matria publicada recentemente (O Globo, 16/07/2006, p.
18 e 19). Designado como escravo da linguagem (Nomin, 2001), ou como algum que
no faz uso da funo da fala (Elia, 2004), mas ainda assim inserido no campo da
linguagem (Lacan, 1975), a criana autista pode ser abordada por um tratamento
possvel pela palavra. A gravidade do adoecer psquico em crianas to pequenas
causada pela falta de tempo hbil para que elas possam construir bengalas imaginrias
ou pontos de sustentao para a existncia, o que as deixa vulnerveis a sua prpria
estrutura (Abramovitch, 2001, p. 84).
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[1]BLEULER, Eugen.Dementia Praecox oder die Gruppe der Schizophrenien. In:KAUFMANN, Pierre.Dicionrio enciclopdico de psicanlise. Rio de Janeiro: Jorge Zahar Editor, 1996.[2]Esta uma verso em portugus baseada na verso francesa publicada em 1999, no Neuropsychiatriede lenfance et de ladolescence. A traduo em portugus foi de Monica Seineman.
http://www.fundamentalpsychopathology.org/anais2006/6.16.1.htm#_ftnref1http://www.fundamentalpsychopathology.org/anais2006/6.16.1.htm#_ftnref1http://www.fundamentalpsychopathology.org/anais2006/6.16.1.htm#_ftnref2http://www.fundamentalpsychopathology.org/anais2006/6.16.1.htm#_ftnref2http://www.fundamentalpsychopathology.org/anais2006/6.16.1.htm#_ftnref2http://www.fundamentalpsychopathology.org/anais2006/6.16.1.htm#_ftnref1