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"Auto da Barca do Inferno" Texto adaptado Obra adapta. Profª. Gilmarina Grupo I. Cena l, II No presente auto, se imagina que, no momento em que acabamos de morrer, chegamos subitamente a um rio que, por força, devemos cruzar em uma das duas barcas que naquele porto estão. Uma delas leva ao Paraíso; a outra, ao Inferno. Cada barca tem um barqueiro na proa: a do Paraíso, um anjo; a do Inferno, um diabo e seu companheiro. O primeiro que surge é um Fidalgo, que chega com um pajem que lhe segura a longa cauda do manto e carrega uma cadeira. E começa o barqueiro do Inferno, antes que o Fidalgo chegue. DIABO – (ao companheiro) À barca, à barca! Vamos lá! Que é mui boa a maré! Puxa a vela pra cá! COMPANHEIRO - Feito! Feito! DIABO – Bem está! Vai ali e, sem demora, estica bem aquela corda e libera aquele banco para a gente que virá. À barca, à barca, uuh! Depressa! Temos que ir! Ah! Bom tempo de partir! Louvores a Belzebu! Ora, pois, que fazes tu? Desocupa esse espaço! COMPANHEIRO – É pra já! Pronto, está feito! DIABO – Abaixa logo esse rabo! Deixa preparado o cabo E ajeita a corda de içar. COMPANHEIRO- Vamos lá! Içar, Içar! DIABO – Oh! Que caravela esta! Põe bandeiras, que é festa! (vendo um Fidalgo que se aproxima) Oh! Poderoso dom Henrique! Vós aqui? Que coisa é esta? Cena ll Vem o FIDALGO acompanhado de um rapaz com uma cadeira. Chegando á barca do Inferno, diz: FIDALGO- Esta barca, que sai agora, Aonde vai tão preparada? DIABO- Vai para a ilha danada E há de partir sem demora. FIDALGO- Para lá vai a... senhora? DIABO- (corrigindo irritado) Senhor!... A vosso serviço FIDALGO- Isso parece um cortiço. DIABO- Porque olhais lá de fora. FIDALGO- A que terra passais vós? DIABO- Para o inferno, senhor. FIDALGO- (irônico) Hum! Terra bem sem sabor! FIDALGO- E achas passageiras para tal embarcação? DIABO- Oras, pois, tu és a cara dessa embarcação! FIDALGO- Parece-te mesmo assim? DIABO- Onde esperas salvação? FIDALGO- Eu deixo na outra vida. Quem reze sempre por mim. DIABO- Quem reze sempre por ti? Hi,hi,hi,hi,hi,hi,hi. Tu viveste a teu prazer; Pensando aqui ter perdão; Porque lá rezam por ti? Embarca já! FIDALGO – (apavorado) Quê?! É assim que a coisa vai?

Auto Da Barca Do Inferno Adaptado

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Adaptado para teatro escolar. Um texto mais fácil com uma linguagem atual.

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"Auto da Barca do Inferno" Texto adaptado

Obra adapta. Prof. Gilmarina

Grupo I. Cena l, II

No presente auto, se imagina que, no momento em que acabamos de morrer, chegamos subitamente a um rio que, por fora, devemos cruzar em uma das duas barcas que naquele porto esto. Uma delas leva ao Paraso; a outra, ao Inferno. Cada barca tem um barqueiro na proa: a do Paraso, um anjo; a do Inferno, um diabo e seu companheiro.O primeiro que surge um Fidalgo, que chega com um pajem que lhe segura a longa cauda do manto e carrega uma cadeira.E comea o barqueiro do Inferno, antes que o Fidalgo chegue.

DIABO (ao companheiro) barca, barca! Vamos l! Que mui boa a mar! Puxa a vela pra c!

COMPANHEIRO - Feito! Feito!DIABO Bem est! Vai ali e, sem demora, estica bem aquela corda e libera aquele banco para a gente que vir.

barca, barca, uuh!Depressa! Temos que ir!Ah! Bom tempo de partir!Louvores a Belzebu!

Ora, pois, que fazes tu?Desocupa esse espao!

COMPANHEIRO pra j! Pronto, est feito!

DIABO Abaixa logo esse rabo!Deixa preparado o caboE ajeita a corda de iar.

COMPANHEIRO- Vamos l! Iar, Iar!DIABO Oh! Que caravela esta!Pe bandeiras, que festa!(vendo um Fidalgo que se aproxima)Oh! Poderoso dom Henrique!Vs aqui? Que coisa esta?

Cena ll

Vem o FIDALGO acompanhado de umrapaz com uma cadeira. Chegando barca do Inferno, diz:

FIDALGO- Esta barca, que sai agora,Aonde vai to preparada?

DIABO- Vai para a ilha danadaE h de partir sem demora.

FIDALGO- Para l vai a... senhora?

DIABO-(corrigindo irritado)Senhor!... A vosso servio

FIDALGO- Isso parece um cortio.

DIABO- Porque olhais l de fora.

FIDALGO- A que terra passais vs?

DIABO- Para o inferno, senhor.

FIDALGO-(irnico) Hum! Terra bem sem sabor!

FIDALGO- E achas passageiras para tal embarcao?

DIABO- Oras, pois, tu s a cara dessa embarcao!

FIDALGO- Parece-te mesmo assim?

DIABO- Onde esperas salvao?

FIDALGO- Eu deixo na outra vida. Quem reze sempre por mim.

DIABO- Quem reze sempre por ti?Hi,hi,hi,hi,hi,hi,hi. Tu viveste a teu prazer; Pensando aqui ter perdo; Porque l rezam por ti? Embarca j!

FIDALGO (apavorado) Qu?! assim que a coisa vai?DIABO (impaciente) Embarcai! Embarcai logo!Segundo o que l plantastes. Agora aqui recebereis.E como a morte j passastes, passei agora este rio.

FIDALGO No h aqui outro navio?

DIABO No que o senhor tenha reservado.

FIDALGO (confuso, sem compreender nada)Como? Quando reservei?

DIABO A boa vida que levastes!

FIDALGO (dirigindo-se barca do Paraso) A esta outra barca me vou.

(gritando para o Anjo que est na barca) Ol! Pra onde partis?(o Anjo no responde) barqueiro, no me ouvis?!Respondei-me! Ol! Por Deus, mal arranjado estou...Mas isto agora pior...Que bestas!... No me entendem...

ANJO (aproximando-se)Que queres?

FIDALGO Diga se a barca do paraso esta em que navegais?

ANJO esta. Que desejais?

FIDALGO Que me deixeis embarcar.Sou de famlia nobre. E bom que me recolhas nesta tua barca.

ANJO _ No se embarca tirania nesta barca divinal.Para vossa fantasia bem pequena esta barca!

FIDALGO Para um senhor com minha marca no h aqui mais cortesia? (arrogante)Entrarei nem que seja na marra, levai-me ao paraso!

ANJO (com firmeza e autoridade)No tens carter para entrar neste navio.(apontando para a barca do Inferno)Esse outro vai mais vazio, pois a cadeira entrar (apontando para o Fidalgo) e o rabo caber...E todo o vosso senhorio. Ireis l mais espaoso, Sois um tirano. Desprezastes os pequenos, agora o que s.

DIABO barca, barca, senhores! (Arrastando o Fidalgo) Oh! Que mar to jeitosa! Uma brisa bem gostosa e valentes remadores! Viro todos s minhas mos. s minhas mos todos viro.

FIDALGO (tristemente conformado)Ao inferno! triste!Enquanto vivi no pensei que ele existia, pensei que era fantasia. Gostava de ser adorado, e no vi que me perdia. (se aproxima da barca desanimado e chorando, mas no entra)

(humildemente pede ao diabo)FIDALGO D-me licena, te peo, para ir ver minha mulher?

DIABO (rindo) Ela, pra no te ver, se jogar de cabea no fundo de um precipcio... (gargalhando)Ainda hoje ela rezou, dando graas infinitas, pois de ti se libertou. (impaciente). Entrai meu senhor, entrai! (ao companheiro do diabo)Arrume a ponte para o precioso passar!

FIDALGO (entrando na barca, demonstrando tristeza)Entrarei, pois assim que ..DIABO Ora, agora descansai, enquanto chega mais gente.

FIDALGO (gritando) barca, como s ardente, maldito quem aqui vai!

DIABO (ao rapaz, pajem do Fidalgo, com a cadeira). Tu no entras! Sai daqui! Que essa cadeira demais. Coisa que esteve na igreja no se h de embarcar aqui

(apontando o Fidalgo) Ele uma outra ter,uma outra de marfim, toda enfeitada de dores, com tantos e tais primores que estar fora de si..

Grupo II Cena III e IV

Carregando uma bolsa, vem um ONZENEIRO, isto , um agiota, algum que explora com juros abusivos aqueles que precisam de dinheiro emprestado. Aproxima-se da barca do Inferno e diz:

AGIOTA Para onde embarcais?

DIABO Oh!agiota, meu parente!Por que demoraste tanto?

AGIOTA Mais quisera eu demorar...Mas na hora de lucrar,de o dinheiro recolher,aconteceu-me... morrer!

DIABO Ora, que muito me espantoNo trouxeste nenhum dinheiro?Cad toda aquela riqueza que acumulaste na terra? (abraa o Onzeneiro)

AGIOTA Pois nem para o barqueirono me deixaram um tanto.

DIABO Ora, entrai, entrai aqui!

AGIOTA A no hei de embarcar!

DIABO (com ironia)Oh! Que gracioso receio! (acolhedor e acariciando o agiota)AGIOTA Inda agora faleci, (humildemente)Deixa-me escolher o bote?

DIABO Mas por que Joo Pimentel! (com dvida)Por que no irs aqui?

AGIOTA E para onde a viagem?

DIABO Para onde deves ir. (impaciente)Estamos para partir, no gastes a tua linguagem.

AGIOTA Mas pra onde a passagem?

DIABO Para a infernal comarca.

AGIOTA Pois eu no vou nessa barca! (com determinao)(aponta para a barca do anjo)Essa outra tem mais vantagem.(dirige-se barca do Anjo) da barca! Ol! Est na hora de partir? (tenta entrar...)

ANJO (faz gesto decisivo para no deix-lo entrar)No d nem mais um passo!Aonde queres ir?

AGIOTA Eu vou pro paraso, claro.

ANJO No pense que eu estou a fim de te levar.(aponta para a outra barca) Essa outra te levar.Vai l com quem te enganou!

AGIOTA Por qu?

ANJO (apontando para a bolsa) Porque esse bolso tomar todo o navio.

AGIOTA Juro por Deus que vai vazio!

ANJO Mas no o teu corao.

AGIOTA (lamentando-se)Na terra deixei, com a confuso,Toda a minha riqueza... e tambm riqueza alheia.

ANJO ganncia, como s feia, e filha da maldio!

AGIOTA (voltando barca do Inferno)Ol! demo barqueiro!Ainda tenho uma esperana, quero l tornar ao mundo e trazer o meu dinheiro.

DIABO Entra e remars! (furioso)No percamos mais mar!

AGIOTA Por favor, no me leve(chorando)

DIABO (impaciente interrompe-o) O que ?(segura com fora o Onzeneiro e o conduz barca)Querendo ou no, entrars! Irs servir Satans, pois sempre ele te ajudou.

ONZENEIRO (desesperado)Oh! Triste, quem me cegou?!

DIABO Cala-te! Guarda tuas lgrimas,Teu sofrimento nem comeou. (rindo)

Cena lV

Vem Joane, um PARVO, isto , um homem tolo, sem malcia. Aproxima-se da barca do Inferno e diz ao DIABO:PARVO Hou, hou, da barca!

DIABO Quem ?

PARVO Sou eu. Esta barca nossa ?

DIABO De quem?

PARVO Dos tolos.

DIABO vossa. Entrai.

PARVO Como? De pulo ou de voo? Oh! Pesar de meu av! Enfim, eu adoeci e por azar... eu morri!

DIABO De que morreste?

PARVO De qu? Acho que de caganeira.

DIABO De qu?

PARVO De caga-merdeira!

DIABO Entra, pe o p na madeira. (aponta pra ponte)

PARVO Ah, no! A barca poder virar!

DIABO Entra, seu tolo, embarca! Ou perdemos a mar!

PARVO Espera, espera! (paciente) E onde vamos nos meter?

DIABO No porto de Lcifer.

PARVO O qu?

DIABO No inferno, entra c.

PARVO No inferno? Sai pra l!(insultando o Diabo) Hu! Hu! Barca do cornudo!O que que h seu beiudo?! Seu cara de carrapato! Hu! Hu Caga no sapato, filho de uma mentirosa!Tua mulher tinhosa e h de parir um sapo grudado no guardanapo! (gargalhando). Excomungado nas igrejas, seu burro, cornudo sejas! Toma o po que te caiu, a mulher que te fugiu, o demo que te pariu!Hu! Hu! Hu Cara amarela!

Hu! Hu! Hu! Caga na vela!

(dirige-se barca do Anjo e diz:) da barca!

ANJO O que queres?

PARVO Quereis me passar alm?

ANJO Quem s tu?

PARVO No sou ningum.

ANJO Tu passars, se quiseres, porque em todos teus fazeres por malcia no erraste. Tua simplicidade bastapara gozar dos prazeres. Mas espera por a, veremos se vem algum, merecedor de tal bem, que deva entrar aqui tambm.

Grupo III Cena V, VI

Vem ento Joo Anto, um SAPATEIRO, carregando o avental, as forminhas e os instrumentos de trabalho. Aproxima-se da barca do Inferno e diz:

SAPATEIRO da barca!

DIABO Quem est a? Santo sapateiro honrado! Como vens to carregado!

SAPATEIRO Mandaram-se vir assim... Mas para onde a viagem?

DIABO Para o lago dos danados.

SAPATEIRO E os que se confessaram antes de morrer? Onde tm a sua entrada?

DIABO Qu?! Sem conversa fiada, que esta tua barca, esta!

SAPATEIRO No quero saber da festa, nem da barca nem do embarque! Como pode isso ser? Morri como se deve morrer, Confessado e comungado!

DIABO Tu morreste amaldioado, e no quiseste dizer. Roubaste bem trinta anos o povo com teu ofcio.(Impaciente). Embarca j, infeliz! Que h muito que te espero!

SAPATEIRO Pois eu no quero, no quero!

DIABO E eu digo que sim, que sim!

SAPATEIRO Quantas missas eu ouvi! Elas no vo me ajudar?

DIABO Ouvir missa, mas... roubar? caminho para aqui.

SAPATEIRO E as esmolas e as ofertas? As preces pelos finados? Tudo isso no vale, no?

DIABO Mas do dinheiro roubado. No deste satisfao!...

SAPATEIRO Mas que grande confuso!No quero saber de nada! uma puta trapalhada em que se v aqui Joo Anto!(vai barca do Anjo e diz:)Oh, da santa caravela. Podereis levar-me nela?

ANJO (apontando para as coisas que ele carrega)Tua carga te embaraa.

SAPATEIRO Mas no h favor de Deus?(tentando de desfazer das coisas que traz, diz)Isto em qualquer canto ir.

ANJO (apontando a barca do Inferno) a barca que l est que leva ladro descarado! almas embaraadas!

SAPATEIRO (irritado) Ora, pra que tanta histria com essas forminhas cagadas, que podem ir amontoadas num canto, de qualquer jeito!

ANJO Tivesses vivido direito, j estariam embarcadas.

SAPATEIRO (angustiado)Pois ento determinais que eu v cozinhar no inferno?!

ANJO (severo) Teu nome est no caderno dos registros infernais..

SAPATEIRO (voltando resignado barca dos condenados) barqueiros! Que aguardais?Vamos, venha a prancha logo e levai-me quele fogo!No nos detenhamos mais!

Cena Vl

Vem um FRADE trazendo pela mo uma Moa chamada Florena. Na outra mo, carrega um pequeno escudo e uma espada. Por baixo do capuz, tem um capacete de combate. Vem todo alegre, fazendo passos dedanaecantarolando.

FRADE Tai-rai-rai-r! Tai-ra-r!Tai-rai-rai-r! Tai-ra-r!Tai-ra-ra-rim-rim-ta-r!

DIABO (aproximando-se) Que isso, padre? Que vai l?

FRADE Deo gratias! Sou corteso!

DIABO E sabeis tambm cantar e danar l no salo?

FRADE Por que no? Claro que sei!

DIABO Pois, entrai! Eu tocarei. E faremos um festo.

(olhando para a Moa que acompanha o Frade)Essa dama, ela vossa?

FRADE Por minha a tenho eu e sempre a tive de meu.

DIABO Fizestes bem, que um encanto! E ningum vos censurava no vosso convento santo?

FRADE Pois se eles fazem outro tanto...

DIABO Que coisa to preciosa! (fazendo uma reverncia irnica). Entrai, padre reverendo!

FRADE Para onde levais a gente?

DIABO Para aquele fogo ardente. Que no temeste vivendo.

FRADE Juro a Deus que no te entendo!(apontando para a roupa). E este hbito, no me vale?

DIABO gentil padre mundano, a Belzebu vos encomendo!

FRADE (surpreso) Que eu no posso entender isto!Eu hei de ser condenado? Um padre apaixonado e tanto dado virtude! Que Deus me d em sade!

DIABO Mas chega de fazer hora!Embarcai e partiremos. Tomareis um par de remos...

FRADE No ficou isso acertado...

DIABO Pois j est data a sentena! (conduz o Frade barca)

FRADE Por Deus! No vai nessa caravela minha senhora Florena...Como?! Por ser namorado e folgar com uma mulher, um frade h de se perder, com tanto salmo rezado?!

DIABO Ora, ests bem arranhado!

(O FRADE descobre a cabea e, tirando o capuz, aparece o capacete para pratica de esgrima. Diz eleFRADE Mantenha Deus esta coroa!

DIABO Oh, padre, Frei Capacete,D lio de esgrima, que coisa boa.

Comea o FRADE a dar lio de esgrima com a espada e o escudo, mostrando golpes e dizendo:

FRADE (entusiasmado). Esgrimar! Isso me agrada!

Levante bem a espada! (Diabo e Frade lutam por alguns instantes)

Metei o diabo na cruz

DIABO Que valentes estocadas!

FRADE Isto ainda no nada. (Para com a esgrima e toma a Moa Florena pela mo, dizendo:) Vamos barca da Glria!

O FRADE e a Moa vo at a barca do Anjo.

FRADE (ao Anjo). Deo gratias! H lugarPara minha reverncia? E a senhora Florena, por ser minha, pode entrar?

PARVO -(aproximando-se). Chegastes em hora m!Roubou este faco, frade?FRADE (desesperanado, pois o Anjo nem responde)Acho, senhora, em verdade, que o caso perdido est.Vamos aonde temos de ir. No quer Deus esta ribeira!No vejo outra maneira seno enfim... desistir!

DIABO (de longe, chamando)Padre, venha logo?

FRADE Sim, passai-me l Florenae cumpramos a sentena. a hora de partir.

Grupo IV Cena Vll e Cena lX

Depois que o FRADE embarcou, vem BRSIDA VAZ, uma Alcoviteira, isto , uma mulher que vivia da prostituio de moas. Chegando barca do Inferno, diz:

BRSIDA - Ol da barca, ol.

DIABO Quem chama?

BRSIDA Brsida Vaz.

DIABO (dirigindo-se a Brsida). Entrai vs e remareis.

BRSIDA No quero eu entrar l!

DIABO (irnico) Que medinho saboroso!...

BRSIDA No nesta barca que embarco.

DIABO E trazeis vs muito fardo?

BRSIDA O que me convm levar.

DIABO O que que haveis de embarcar?

BRSIDA Muitas falsas virgindades e trs arcas de feitio, arcas to carregadinhas! Trs armrios de mentir alguns furtos alheios, joias de vestir e guarda roupa de encobrir.Enfim um estrado de cortia, com almofadas de iludir. Mas a maior carga so essas moas que vendia.

DIABO (mostrando a barca) Ora, ponde aqui o p!

BRSIDA Que?! Vou para o paraso!

DIABO E quem te disse isso?

BRSIDA L hei de embarcar, pois uma herona sou eu. Aoites tenho levado, e tormentos suportados. Fosse eu ao fogo infernal, ento iria todo o mundo!

Chegando barca da Glria, diz ao ANJO:

BRSIDA Barqueiro, mano, meu velho. Leve a Brsida Vaz.

ANJO No sei quem que te traz.

BRSIDA Eu vos peo! (ajoelhando-se) Pensais que trago piolhos, Anjo de Deus, minha rosa? Sou Brsida, a preciosa, que dava moas aos montes, a que criava as meninas para os cnegos da S.. Passai-me, por vossa f, meu amor, minha florzinha, olhos de perolazinha!Pois eu fiz obras bem divinas. Santa rsula no converteu tantas donzelas como eu, e todas salvas por mim, que nenhuma se perdeu. E quis Aquele do Cu que todas achassem dono. Pensais que eu dormia sono? Nada, nada se perdeu!

ANJO (apontando a outra barca)Ora vai l embarcar! No fiques me importunando.

BRSIDA Pois eu estou explicando por que me haveis de levar.

ANJO (com firmeza) Pare de me importunar, que no podes ir aqui.

BRSIDA (desesperanada) Em que m hora eu servi! Pois no me h de aproveitar!

Volta BRSIDA VAZ barca do Inferno, dizendo:

BRSIDA - barqueiros de m hora, ponde a prancha que eu me vou. O destino me marcou e mal me sinto aqui fora.

DIABO Ora, entrai, minha senhora, e sereis bem recebida... Se vivestes santa vida, vs o sentireis agora.

Cena lX

Vem um CORREGEDOR, isto , um juiz, carregado de autos e processos e com uma vara na mo. Chegando barca do Inferno diz:

CORREGEDOR da barca!

DIABO Que quereis?

CORREGEDOR Est aqui o senhor juiz.

DIABO amigo, que bela carga trazeis! Como vai l o Direito?

CORREGEDOR Nestes autos o vereis.

DIABO Ora, pois, entrai. Veremos o que diz esse papel...

CORREGEDOR E aonde vai esse batel?

DIABO No inferno vos poremos.

CORREGEDOR (indignado) Como?! terra dos demos h de ir um corregedor?!

DIABO (com ironia) Santo descorregedor, embarcai e remaremos! Ora, entrai, j que viestes.

CORREGEDOR Isto no justo, no! No deregulae jris, no!

DIABO Sim, sim,ita, ita! Da c a mo! (segura a mo do Corregedor) Remareis um remo destes.Faz de conta que nascestes para nosso companheiro.

CORREGEDOR Oh! Recuso essa viagem e quem me h de levar! H c um oficial do mar?

DIABO No tenho esse costume.

CORREGEDOR No entendo o que est acontecendo, nem isso no pode ser,

DIABO (ri) E agora vos parece que no sei falar outra lngua?! Entrai, entrai, corregedor!

CORREGEDOR Oh!Videtis qui petatis!

DIABO Quando reis ouvidor (com nfase no latim) non accepistispropina? Pois agora vossa sina, seguir-me aonde eu for.

(olhando para os processos do Corregedor)Oh! Que isca esse papel para um fogo que eu conheo!...

CORREGEDOR Meu Deus, lembra-te de mim!Domine, memento mei!

DIABO Tempo no h, bacharel! Poisjulgastescom malcia.

CORREGEDOR Sempre agi com justia,

DIABO E o dinheiro dos judeus que vossa mulher pegava?

CORREGEDOR Com isso no me ocupava, no eram problemas meus.No so, pois, meus pecados, esses pecados so dela.

DIABO E vs pecastes com ela, no temestes nem a Deus, e muito enriquecestes com o sangue dos lavradores, ignorantes pecadores. Por que no os atendestes?

CORREGEDOR (irnico) Vs nunca lestes, barqueiro, que move pedras o dinheiro?O direito ento se cala e a justia nada fala...

DIABO (raivoso) Pois juntai-vos aos condenados!Ireis ao lago dos ces e vereis os escrives como esto to prosperados...

CORREGEDOR Pois eu no vou para l.Outro navio aqui est muito melhor preparado.

DIABO Ora estais bem arranjado!... Entrai agora, entrai j!

CORREGEDOR (dirigi-se ao anjo). Barqueiro dos gloriosos passai-me nesse batel.

ANJO (olhando os processos e os livros que ele traz)Oh! homem odioso! No honrou seu cargo. Condenou inocentes, E livrou criminosos! Com seus atos ilcitos!

CORREGEDOR Oh,misericrdia,clemncia!Passai-nos como vossos.

CORREGEDOR Oh, no nos sejais contrrios,Pois no temos outra ponte!

ANJO A justia divinal vos manda vir carregados porque sereis embarcados naquela barca infernal.

CORREGEDOR Oh! Livrai-nos So Maral de tal ribeira e tal rio!

DIABO (interrompendo-o bruscamente)Entrai, sem mais delongas!...

Cena final - Msica para a entrada dos cavaleiros

Chegam quatro cavaleiros que morreram fazendo o bem, em nome de Jesus Cristo. (com objetos escolha do grupo):

CAVALEIRO 1 - Vamos, vamos barca segura!Fugir da barca perdida! Vamos, vamos barca da vida! Todos que por Deus trabalharam Na vida passageira Entrem na barca divina!

CAVALEIRO 2- Para a barca, vamos barca, mortais! Mas se a vida foi perdida. Tambm a barca da Vida! Mas cuidado pecadores Depois da vida h prazeres ou dores!

CAVALEIROS3 - Vamos para a barca!Barca nobrssima! barca! barca da vida!

Passam pela barca do infernoDIABO - Para onde vo?

CAVALEIROS 4 - Voc no faz ideia? Nem sequer nos conhece bem!

DIABO - Deixa disso, entrem aqui!

CAVALEIROS 4 - Quem morre fazendo o bem como Jesus Cristo, nunca merecer isto!

Vo barca celeste, assim que chegam o Anjo diz:

ANJO - Santos cavaleiros! Estava esperando por vocs! Morreram fazendo o bem em nome de Deus,Por isso so livres do mal! Quem morre em tal batalha contra o mal Merece paz eternal!E assim embarcaram .Fim