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AUTO-IMUNIDADE NO ESPECTRO DA PATOLOGIA CARDÍACA ICBAS UP CHP 2011 Sara Rocha de Abreu Orientadora: Dra Maria Sofia Nogueira Ribeiro e Freitas Cabral Dissertação: Artigo de Revisão Bibliográfica Mestrado Integrado em Medicina

AUTO-IMUNIDADE NO ESPECTRO DA PATOLOGIA CARDÍACA · 2012-04-25 · Auto-imunidade e o Ritmo Cardíaco .....20 Bloqueio cardíaco congénito ... molécula de adesão celular vascular

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AUTO-IMUNIDADE NO ESPECTRO DA PATOLOGIA

CARDÍACA

ICBAS – UP CHP

2011

Sara Rocha de Abreu Orientadora: Dra Maria Sofia Nogueira Ribeiro e

Freitas Cabral

Dissertação: Artigo de Revisão Bibliográfica

Mestrado Integrado em Medicina

II

ÍNDICE

Resumo – Abstract ..................................................................................................................... 1

Palavras-chave ........................................................................................................................... 2

Abreviaturas ............................................................................................................................... 2

Introdução ................................................................................................................................... 2

Miocardite e Cardiomipatia Dilatada idiopática............................................................................ 3

Etiologia e patofisiologia .......................................................................................................... 3

Diagnóstico .............................................................................................................................. 8

Miocardite ............................................................................................................................. 8

Cardiomiopatia Dilatada ....................................................................................................... 8

Tratamento e Prevenção ......................................................................................................... 9

Aterosclerose ............................................................................................................................ 10

Base Auto-imunológica da Patofisiologia ............................................................................... 10

Tratamento ............................................................................................................................ 13

Enfarte Agudo do Miocárdio e “Remodelagem” Cardíaca ......................................................... 14

Patofisiologia ......................................................................................................................... 14

Tratamento ............................................................................................................................ 15

Valvulopatia – Febre Reumática ............................................................................................... 15

Patosisiologia ........................................................................................................................ 16

Diagnóstico e Tratamento ...................................................................................................... 17

Pericardite ................................................................................................................................ 17

Etiologia e patofisiologia ........................................................................................................ 18

Diagnóstico ............................................................................................................................ 18

Tratamento ............................................................................................................................ 19

Auto-imunidade e o Ritmo Cardíaco ......................................................................................... 20

Bloqueio cardíaco congénito .................................................................................................. 20

Tratamento ......................................................................................................................... 21

Fibrilação Auricular ................................................................................................................ 22

Insuficiência Cardíaca ............................................................................................................... 22

Auto-imunidade e Patofisiologia ............................................................................................ 22

Tratamento ............................................................................................................................ 23

Conclusão ................................................................................................................................. 24

Agradecimentos ........................................................................................................................ 24

Bibliografia ................................................................................................................................ 25

1

O sistema imune é um sistema de defesa

adaptativo que responde ao que não

reconhece e que em teoria deveria ser algo

com potencial agressor para o indivíduo

(microorganismos, células cancerígenas e

corpos estranhos); contudo, pode haver uma

resposta inadequada deste sistema contra os

componentes do próprio organismo

(antigénios próprios) processo que se

denomina por auto-imunidade. Os processos

auto-imunes podem desenvolver-se em

indivíduos com predisposição para esse

fenómeno de forma espontânea ou após

exposição a determinados estímulos

externos. Estes processos são afectados por

factores genéticos, imunes e ambientais.

Os mecanismos auto-imunes foram

observados em diversas patologias

cardíacas, como a cardiomiopatia dilatada, a

miocardite, a febre reumática, a

aterosclerose, o bloqueio cardíaco congénito

e a insuficiência cardíaca, podendo ser a

causa etiológica destas doenças (febre

reumática), assim como ter um papel

importante na sua fisiopatologia (insuficiência

cardíaca – activação do sistema imune e

estado pro-inflamatório). Estes mecanismos

são complexos e nem sempre totalmente

esclarecidos, mas é consensual que o estudo

do papel dos fenómenos auto-imunes nas

várias patologias cardíacas pode levar a

potenciais ganhos na clínica nomeadamente

pela introdução de terapêutica dirigida

(imunossupressores e imunomoduladores).

The immune system is an adaptive

defense system that reacts against

unknown stimuli witch in theory should

be foreign to the individual

(microorganisms, cancer cells and

strange bodies); however, an inadequate

response against body components (self-

antigens) can emerge, being classified as

autoimmunity. These autoimmune

processes can occur spontaneously or

after an exogenous trigger in predisposed

individuals for this phenomenon. These

processes are affected by genetic,

immune and environmental factors.

The autoimmune mechanisms were

observed in several cardiac diseases,

such as dilated cardiomyopathy,

myocarditis, rheumatic fever,

atherosclerosis, congenital heart block

and cardiac failure. Apart from being the

etiologic cause in some specific diseases

(rheumatic fever), it may also have an

important role in the pathophysiology

(cardiac failure – immune system and

proinflamatory activation). These

mechanisms are complex and not always

fully understood but it is consensually

accepted that the study of the role of

these autoimmune phenomena in

several cardiac diseases can add

potential gains in clinical management,

namely the introduction of targeted

therapy (imunossupression and

imunomodulation).

RESUMO – ABSTRACT

2

PALAVRAS-CHAVE

Auto-imunidade, Auto-Anticorpos, Auto-Antigénios, Imunossupressão, Imunomodulação,

Patologia cardíaca

ABREVIATURAS

AHA – anticorpos anti-coração; AINEs - anti-inflamatórios não-esteróides; AR – artrite

reumatóide; β2GPI - β2 glicoproteina I; CMD – cardiomiopatia dilatada; DAMPs – padrões de

moléculas associadas a lesão (Damage associated molecular pattern); EAM – Enfarte agudo

do miocárdio; FA - fibrilação auricular; HSP – heat shock protein; IC- insuficiência cardíaca; INF

– interferão; IL – interleucina; LDL – lipoproteina de baixa densidade; LES – lúpus eritematoso

sistémico; MAPKs – proteínas cinases activadas por mitogénios; MBL – lecitina de ligação à

manose; MHC – complexo de histocompatibilidade major; MCP-1 – proteína quimoactrativos

dos macrófagos; MIP-1α – proteína-1α inflamatória do macrófago; NFқB - Factor nuclear-KB;

NK – natural killers; OMS – Organização Mundial de Saúde; PAMPs - padrões moleculares

associados a patogénios (pathogen associated molecular patterns); PCR – proteína C reactiva

RANTES - regulated on activation normally T cell expressed and secreted; TGF – factor de

crescimento transformador; TLR – receptor Toll-like; TNF – factor de necrose tumoral; VCAM -

molécula de adesão celular vascular.

INTRODUÇÃO

Estima-se que as doenças cardiovasculares sejam a principal causa de morte global nos

próximos 15 anos, aumentando rapidamente de prevalência. Estas são causa de 38% das

mortes da América do Norte, são a causa de morte mais comum no homem europeu abaixo

dos 65 anos de idade e a segunda causa de morte na mulher europeia. Este facto sublinha a

importância da melhoria do conhecimento das patofisiologias envolvidas, de forma a levar à

abordagem de novas estratégias de predição, prevenção e tratamento mais eficazes.1,2

É cada vez mais consensual a ideia de que as reacções imuno-mediadas causadas por

antigénios locais fazem parte da fisiopatologia da doença cardíaca, contudo a fronteira entre

inflamação devida a uma resposta imuno-mediada simples e uma reacção auto-imune nem

sempre é clara. Existem várias características que reforçam esta última hipótese, como a

presença de auto-anticorpos ou a evidência de auto-reactividade celular, infiltrado linfocítico na

lesão patológica e demonstração que os auto-anticorpos ou células T activadas podem causar

esta patologia; este conceito é ainda fundamentado em modelos animais, com demonstração

do efeito benéfico de terapia imunossupressora e a associação a outras doenças auto-

imunes.3

3

Esta revisão bibliográfica pretende assim abordar a influência da auto-imunidade em

diferentes expressões de patologia cardíaca primária e, ainda que de forma breve, aflorar

algumas das manifestações cardíacas de doenças auto-imunes; analisando aspectos

relacionados com a etiologia, patofisiologia e o impacto e potencialidades no tratamento.

MIOCARDITE E CARDIOMIPATIA DILATADA IDIOPÁTICA

A miocardite e a cardiomiopatia dilatada reflectem um processo inflamatório no tecido

cardíaco e foram pela primeira vez descritos em 1837 por Soberheim.4 A miocardite é a

principal causa de morte súbita em doentes com menos de 40 anos e pode corresponder a

mais de 20% das mortes de causa cardiovascular, sendo também causa importante de

cardiomiopatia na infância. A verdadeira incidência da miocardite na comunidade é

desconhecida. São escassos os valores relativos à incidência e prevalência da doença, e os

que se conhecem correspondem a estudos em autópsias. Os dados sero-epidemiológicos

também são difíceis de interpretar, contudo a observação de genoma vírico nos tecidos

cardíacos é mais frequente nos doentes com CMD do que nos tecidos dos doentes com

cardiomiopatia isquémica ou valvular. Em 30% dos casos a miocardite pode dar origem a CMD

com progressão para insuficiência cardíaca. A maior parte dos estudos indicam um ligeiro

predomínio nos homens (19-18), hipoteticamente devido a um efeito hormonal protector por

parte dos estrogénios.5,6

O termo cardiomiopatia inflamatória foi introduzido na definição e classificação das

cardiomiopatias pela OMS/World Heart Federation (antigamente a International Society and

Federation of Cardiology Task Force) em 1995. 6

A CMD é a causa não isquémica mais comum da insuficiência cardíaca. Apesar do imenso

impacto da doença, a sua etiologia é na maioria das vezes desconhecida e catalogada, ainda

que indevidamente, como (65% a 80%) de natureza idiopática.7

ETIOLOGIA E PATOFISIOLOGIA

A etiologia muitas vezes permanece desconhecida. Uma quantidade de agentes infecciosos,

toxinas e drogas têm sido associados ao desenvolvimento da doença. Apesar das miocardites

infecciosas poderem ter como etiologia agentes protozoários, fúngicos, bacterianos (Borrelia

burgdorferi ou a Chlamydia pneumoniae), os víricos (coxsackie, influenza, citomegalovirus,

echovirus e adenovírus) claramente predominam em particular nas áreas geográficas da

América do Norte e Europa, destacando-se o enterovirus, o citomegolovirus e o adenovírus.6

A CMD para além de ter uma etiologia multifactorial é uma doença geneticamente

heterogénea . Os factores genéticos têm um papel importante na sua génese, como

contribuidores para a susceptibilidade aos factores ambientais, ou como determinante de

4

mudanças funcionais e estruturais que caracterizam a expressão fenotípica da doença. Está

descrita uma ligação familiar em 20% dos casos.8

Não é claro se a susceptibilidade à lesão miocárdica imunologicamente mediada é devida à

presença de um risco genético partilhado por outras doenças auto-imunes (psoríase, artrites,

tiroidíte e asma), ou se existem factores cardioespecíficos individuais.9 Limas C et al, 20048

mostraram que a frequência de outras doenças auto-imunes era maior nos familiares de

primeiro grau dos indivíduos com CMD (p<0,001); tendo sido demonstrada a associação de

haplótipos HLA-DQB1 específicos com a susceptibilidade para a CMD.8

Apesar da designação” idiopática”, é reconhecida a natureza inflamatória da CMD idiopática,

com a hipótese de que muitas têm origem em miocardites. A maior parte da informação relativa

à patofisiologia molecular da miocardite auto-imune provem de modelos animais e sistemas

celulares isolados.6 Na CMD inflamatória a quebra da auto-tolerância pode ser iniciada por

mecanismos ainda não completamente esclarecidos, por alterações associadas à libertação

de proteínas secundária à necrose de cardiomiócitos “sequestradas imunologicamente”, ou por

infecção vírica. A infecção pode provocar uma quebra na auto-tolerância através de (1)

modificação ou libertação de proteínas sequestradas imunologicamente, (2) activação

policlonal dos linfócitos, (3) activação das células T pela libertação de citocinas, ou, (4) através

do mimetismo molecular.7

A quebra na auto-tolerância pode produzir uma resposta auto-imune com mediação celular

ou com mediação humoral. 7

Na resposta mediada pelos linfócitos TCD8+, há o reconhecimento do complexo de auto-

antigénio-complexo de histocompatibilidade major (MHC) classe I, que provoca a libertação de

agentes citotóxicos e consequentemente induz a apoptose. Adicionalmente, esta activação

celular produz a proliferação da interleucina 2 (IL-2), resultando na expansão de clones auto-

reactivos e na propagação da resposta auto-imune. Por outro lado, na resposta mediada pelos

linfócitos B, os antigénios celulares são processados e apresentados às células T CD4+, que

por sua vez activam os linfócitos B e induzem a produção de auto-anticorpos específicos ao

auto-antigénio. Estes auto-anticorpos podem ter um efeito deletério directo na célula de origem,

em que a resposta pode também ser responsável pela propagação da resposta auto-imune

(ver figura 1).7

5

T CD8

TCR

Libertação de

agentes citotóxicos

IL-2

Exposição do sistema

imune aos auto-atg

APC

Auto-atg Lesão do Miócito

MHC I

Vírus

APC

T CD4

MHCII

B

Auto-atc

específicos

para o coração

atg víricos

Miócito

Figura 1. Mecanismos auto-imunes na patofisiologia da CMD. A lesão vírica aguda leva a apoptose

dos cardiomiócitos com exposição dos auto-antigénios. A resposta das células TCD8+ vai também

provocar directamente lesão dos miócitos. Já na resposta imune adquirida as APC vão apresentar os

auto-antigénios às células TCD4+ que por sua vez activam as células B levando à produção de auto-

anticorpos. Este processo pode ter uma resolução em que o vírus é eliminado e a resposta imune é

suprimida, ou em que há uma lesão persistente mediada pela resposta imune contínua. APC –

Células apresentadoras de antigénios; Atc – Anticorpos; Atg – Antigénios; IL-2 – Interleucina-2; MHC -

Complexo de histocompatibilidade major; TCR- Receptor de células T.

6

Três hipóteses têm que ser consideradas quando é abordada a questão da iniciação da

auto-reactividade cardíaca:6

Activação por um antigénio invasor: o facto de se processar um antigénio invasor

pode resultar na apresentação de um epítopo homólogo à miosina cardíaca, como

consequência da activação de reacção cruzada de células T.

Aumento da apresentação de auto-antigénios: a infecção vírica e a necrose dos

miócitos podem levar à libertação de antigénios intracelulares (a concentração

extracelular destes é geralmente muito baixa). A libertação destas proteínas em

grandes quantidades resulta na activação células T auto-reactivas.

Apresentação de auto-péptideos intra-celulares (cryptic): pode haver uma

alteração ao processar as proteínas intracelulares, resultando na activação de células T

auto-reactivas. Este mecanismo pode propagar uma resposta imune para o antigénio

cardíaco na ausência de factores desencadeadores infecciosos adicionais.

A resposta imune inata é essencial para a defesa inicial do hospedeiro durante o processo

da infecção. Os vírus, a proteína M estreptocócica e algumas proteínas do hospedeiro podem

desencadear esta resposta através de vários mecanismos, que envolvem receptores Toll-like

nos doentes com lesão tecidular. O desenvolvimento da miocardite requer uma proteína chave

nos receptores Toll-like (TLR) de sinalização das células dendríticas – a MyD88*.5,10 Esta tem

um papel crucial na apresentação de antigénios sendo capaz de activar células T auto-

reactivas específicas para o coração. Os estudos sugerem que a utilização da MyD88 como

alvo pode contribuir para o desenvolvimento de novas estratégias preventivas.11 Ambas as

células T CD4+ e CD8+ são importantes na miocardite por vírus coxsackie B, as T CD4+

circulantes influenciam o curso da miocardite auto-imune e são reguladores importantes da

inflamação.5 O coxsackievirus B3 e a proteína M estreptocócica foram identificados na reacção

cruzada com a ligação dos linfócitos T CD4+ à miosina de cadeia pesada.6

As citocinas têm um papel fundamental no desenvolvimento da imunidade celular, na

imunorregulação e nas funções efectoras imunes. A produção e/ou acção descontroladas de

citocinas parecem ser importantes no desenvolvimento de auto-imunidade, podendo induzir

disfunção contráctil, disfunção endotelial, sendo também importantes no controlo na resposta

das células T aos auto-antigénios. Dados recentes indicam que o balanço entre as funções pro-

inflamatórias e imunossupressoras as diferentes citocinas têm efeitos variáveis em diferentes

tempos durante o desenvolvimento da doença auto-imune. Em resposta à lesão cardíaca pode

haver a formação de um ambiente pro-inflamatório através da produção de IL-1, IL-2, IL-6,

* O MyD88 é um adaptador molecular que medeia as vias pro-inflamatórias que envolvem a cascata das cinases, integrando ambos os TLR4 e receptor de activação de IL-1.11

7

factor de necrose tumoral α (TNF-α) e interferão γ (INF-γ), que não é balanceado por

mediadores anti-inflamatórios (factor de crescimento transformador (TGF-β), IL-10, receptor

antagonista da IL-1) (ver figura 2). A activação de mediadores pró-inflamatórios pode dar uma

protecção a curto prazo da infecção ou de períodos breves de isquemia, contudo, a sua

activação contínua leva a CMD e a insuficiência cardíaca crónica. 6,12,13

A activação do NF-қB pelo sistema imune é importante para a regulação dos processos

inflamatórios e destrutivos nas doenças auto-imunes. Este é necessário para a expressão das

metaloproteinas de matriz, enzimas que têm um papel no processo destrutivo da matriz extra-

celular. O mecanismo molecular para a activação destas é efectuado pela mieloperoxidase

(libertada pelos neutrófilos e monócitos) e inicia-se com lesão tecidular levando à inflamação e

actividade das citocinas juntamente com os linfócitos na invasão dos tecidos, acabando por

levar à dilatação do ventrículo esquerdo do coração, como observado nos doentes com CMD.12

APC

Apoptose

do miócito

TNF-α INF-γ IL-1 IL-6 IL-12

Recrutamento de células

Propagação da inflamação

Disfunção contráctil

Maior resposta das células T

aos auto-antigénios

TLR

Antigénios

víricos e

cardíacos

NFқB

Figura 2: Papel das citocinas na resposta imune da miocardite. Durante a miocardite vírica os antigénios são

reconhecidos pelos receptores Toll-like na superfície das células apresentadoras de antigénios. Por sua vez,

estes vão despoletar uma produção de várias citocinas pró-inflamatórias através da activação do NFқB. Estas

têm um papel importante na propagação da lesão no miocárdio. APC - Células apresentadoras de antigénios;

IL- Interleucina; INF – Interferão; NFқB – Factor de transcrição nuclear қB; TLR – Receptor Toll-like; TNF –

Factor de necrose tumoral

8

Vários estudos têm mostrado que subgrupos de doentes com miocardite/CMD e os seus

familiares assintomáticos têm auto-anticorpos circulantes “coração-reactivos”.14 Estes auto-

anticorpos são direccionados contra múltiplos antigénios, alguns dos quais são exclusivamente

expressos no miocárdio (órgão-específicos para o coração), outros são expressos no coração e

no músculo esquelético (músculo-específicos). Auto-anticorpos IgG órgão-específicos foram

detectados nos miócitos (e não no músculo esquelético) de um terço dos doentes com

miocardite/CMD e nos seus familiares assintomáticos, em 1% dos doentes com outras

patologias cardíacas, em 3% dos indivíduos normais, e em 17% dos doentes sem doença

cardíaca mas com poliendocrinopatia auto-imune.14,15 Entre os auto-anticorpos encontrados

destacam-se as anti-α e β miosinas de cadeia pesada, anti-troponina I, anti-heat shock protein-

60 (HSP-60), tropomiosina, actina, anti-Na-K-ATPase, anticorpos para os receptores β-

adrenérgicos e muscarínicos (papel importante na fisiopatologia), estando também nestes

doentes aumentados os anticorpos anti-mitocondriais e da matriz extra-celular. Estes últimos

são contudo menos específicos para o coração.15-18 Para além do papel funcional dos auto-

anticorpos, estes também parecem importantes predictores na evolução da doença e no seu

desenvolvimento em familiares assintomáticos.15,19-21

DIAGNÓSTICO

MIOCARDITE

O diagnóstico de miocardite com base auto-imune é estabelecido quando são cumpridos

dois dos seguintes critérios : (1) apresentação anormal de HLA no tecido do miocárdio

acompanhado de infiltração mononuclear, (2) anticorpos “anti-coração” (como o anti-α e -β de

cadeia pesada, antigénios mitocondriais, translocador nucleotídeo da adenina, receptor

cardíaco β1 adrenérgico e receptor M2 muscarínico, cadeia anti-ramo de transciclase di-

hidrolipoil α-cetoácido desidrogenase ou linfócitos auto-reactivos isolados no soro ou em

familiares saudáveis, (3) linfócitos auto-reactivos e/ou anticorpos presentes no tecido cardíaco,

(4) auto-antigénio está envolvido na patofisiologia, (5) a transfusão do soro, anticorpos ou

linfócitos induz doença em animais, e (6) terapia imunossupressora traz benefícios no

outcome.22

CARDIOMIOPATIA DILATADA

A CMD é definida pela presença de dilatação ventricular esquerda e por disfunção sistólica

esquerda, na ausência de HTA e doença valvular, assim como de doença coronária suficientes

para causar disfunção ventricular.23 Foi proposto um novo sistema de diagnóstico para a CMD

9

com mediação auto-imune em que é necessário preencher os dois critérios major e pelo menos

um minor (ver Tabela 1).22 A definição do diagnóstico da CMD auto-imune tem implicações

terapêuticas consideráveis, ressalvando-se contudo que os critérios minor são difíceis de

aplicar na prática clínica.22

Tabela 1 – Critérios de diagnóstico para CMD com mediação auto-imune (Adaptado de

Nussinovitch et al, 200922)

Critérios major

Preenchimento dos critérios ecográficos para CMDa

Excluir causas secundárias para lesão cardíaca (infecções, álcool, toxinas fármacos, alterações metabólicas, défices nutricionais, doença neuromuscular ou doenças do colagénio)

Critérios minor

Infiltrado mononuclear com HLA anormal

Auto-anticorpos “anti-coração” circulantes ou linfócitos auto-reactivos em doentes ou em familiares saudáveis

Evidência de linfócitos auto-reactivos ou auto-anticorpos no tecido cardíaco

Indução de doença em animais após a transfusão de soro, anticorpos ou linfócitos do soro do doente

Melhoria ecocardiográfica após tratamento com imunossupressores ou com imunoadsorção aFracção de ejecção <45% e/ou fracção de encurtamento <25%, e o diâmetro do ventrículo esquerdo no final da diástole (LVEDD

– Left ventricular end diastolic diameter) >112% do que o esperado para idade e a superfície corporal(>117% na apresentação familiar). Os critérios de exclusão contemplam: TA>160/100mmHg, obstrução do lúmen de artéria coronária principal maior que 50%, ingestão de álcool >80g/dia para homens e >40g/dia para mulheres, taquiarritmia supraventricular persistente, doença sistémica, doença pericárdica, doença cardíaca congénita e cor pulmonale.

22

TRATAMENTO E PREVENÇÃO

Com o reconhecimento do processo inflamatório na CMD idiopática, tem havido uma

tentativa de introdução de terapias imunomodulatórias. Estas vão desde uma imunossupressão

generalizada a terapias com citocinas anti-inflamatórias específicas. Contudo, ainda não há

uma terapia verdadeiramente eficaz para a CMD idiopática e poucas são específicas para os

processos auto-imunes.7

A prednisona, a talidomida e a azatioprina, apesar de terem algum sucesso em alguns

estudos, têm sobretudo efeitos adversos. Nas terapias com anti-TNF-α não se obtém sucesso,

contudo, a pentoxifilina, mostrou algum potencial terapêutico. A terapia imunomodulatória com

Celecade também falhou nos estudos efectuados apresentando vantagens só em pequenos

grupos. Apesar de alguns estudos verificarem que as estatinas não traziam benefícios, Azuma

et al, 200424, num estudo em ratos, mostrou que a fluvastatina melhora a miocardite auto-imune

através da inibição da resposta das células T e da supressão das células Th1 e das citocinas

inflamatórias, através da inibição do factor nuclear-KB (NFқB), não estando esta actividade

dependente da redução de colesterol.7,24

Ainda que estas propostas terapêuticas actuem na resposta imune, nenhuma delas é

específica para a expressão dos anticorpos (especialmente nos auto-anticorpos); ao contrário,

10

na imunoadsorção e na terapia com imunoglobulinas IV há uma maior especificidade. Na

imunoadsorção há a eliminação de auto-anticorpos cardíacos-específicos. Tem sido mostrado

sucesso com esta terapia, com efeitos benéficos no índice cardíaco, na resistência vascular

sistémica, na fracção de ejecção ventricular esquerda, assim como uma normalização da

expressão do gene da desmina encontrado nos doentes com CMD idiopática.7,12,25,26 As

imunoglobulinas IV têm uma eficácia terapêutica semelhante à imunoadsorção mas com

menos efeitos adversos, sendo utilizadas de forma a reduzir o risco de infecção em doentes

que foram submetidos a imunoadsorção.7,12,26

Os inibidores do eixo da renina-angiotensina para além do efeito da alteração do perfil

tensional também modulam a inflamação, a expressão da adesão molecular e a fibrose. Os

estudos mostram que a modulação deste eixo é importante no tratamento da miocardite,

havendo uma inibição da auto-imunidade sem causar supressão imune. Nos estudos o losartan

e o captopril reduzem significativamente a inflamação, a necrose e a fibrose e consequente

hipertrofia. Os níveis de anticorpos miosino-específicos encontravam-se reduzidos nos dois

grupos.27,28

Os mecanismos de indução de tolerância imune reduziram significativamente a incidência e

a severidade da miocardite, com a prevenção de necrose dos miócitos, a infiltração

mononuclear e a fibrose.29,30

ATEROSCLEROSE

A aterosclerose é uma doença crónica em que as artérias sofrem espessamento gradual da

íntima , o que causa uma perda da sua elasticidade, estreitamento e consequente redução do

fluxo sanguíneo aos órgãos alvo. Nos doentes com LES e síndrome anti-fosfolipídeo verificou-

se um aumento da morbilidade e mortalidade devido ao rápido e prematuro desenvolvimento

de aterosclerose. A incidência global de enfarte agudo do miocárdio (EAM) nos doentes com

LES é cinco vezes superior do que na população em geral. Esta associação das doenças auto-

imunes à patologia aterosclerótica levou a que se procurasse uma base auto-imune para a

mesma.31,32

BASE AUTO-IMUNOLÓGICA DA PATOFISIOLOGIA

Os três conceitos clássicos da aterogénese não colocam o processo inflamatório-

imunológico como um factor patogénico primário, sendo estes:

A hipótese de resposta à lesão, que originalmente propunha que a alteração do

endotélio e da íntima seria o mecanismo desencadeador da disfunção endotelial;

11

A hipótese de lipoproteinas alteradas, postula que o papel desencadeador é o das

lipoproteinas quimicamente alteradas – lipoproteinas de baixa densidade oxidadas

(ox-LDL), que levam à formação de células espumosas na íntima, tendo sido esta

modificada para a hipótese de retenção de LDL modificadas;

A hipótese de proliferação monoclonal das células do músculo liso, sugere que a

proliferação destas células é o principal evento desencadeador da doença.32

Os principais auto-antigénios que são responsáveis pela reacção auto-imune na origem da

aterosclerose são a HSP e as lipoproteinas de baixa densidade oxidadas (oxLDL); os auto-

antigénios que secundariamente estão envolvidos são a β2 glicoproteina I (β2GPI) e alguns

componentes estruturais de microrganismos.3 A inflamação vascular (e o stress oxidativo) na

doença auto-imune pode causar modificação oxidativa das LDL e interacção das LDL oxidadas

(ox LDL) com várias proteínas plasmáticas, incluindo a β2GPI (maior alvo antigénico para os

anticorpos antifosfolipídeos). Os anticorpos anti-β2GPI parecem ser mais específicos para a

trombose e para as doenças cardiovasculares dos que os anticorpos anti-cardiolipina. Estudos

prospectivos recentes têm mostrado que os anticorpos anti-β2GPI são predictores importantes

de enfarte (miocárdico ou cerebral) no homem. A β2GPI tem sido encontrada nas lesões de

aterosclerose nos linfócitos CD4+/CD8+ e nas imunoglobulinas, suportando a hipótese de que

tem um papel importante na patofisiologia da aterosclerose, particularmente nos doentes com

LES e SAF.33

Vários estudos epidemiológicos têm mostrado que as respostas imunes a infecções

persistentes (Chlamydia pneumoniae, Porphyromonas gingivalis e Citomegalovirus) podem ser

causa ou pelo menos contribuidores importantes na aterosclerose. A heat shock protein 60/65

(HSP60/65) e proteínas relacionadas estruturalmente às produzidas por infecções crónicas (C.

pneumoniae, P. gingivalis, Mycobacterium tuberculosis, e citomegalovirus) têm sido indicadas

como factores responsáveis na aterogénese. Estas proteínas têm como funções intracelulares,

as de chaperon na síntese de proteínas e como funções extracelulares as de sinalização do

sistema imune perante situações de stress. Quando o endotélio é lesado as HSP que se

encontram intra-celularmente são libertadas desencadeando uma reacção auto-imune ao

tornarem-se auto-epítopos para os linfócitos T, estando os anticorpos anti-HSP associados a

patologia cardiovascular mais grave. A HSP60 expressa no endotélio torna-se o alvo de um

sistema imune que já se encontra sensibilizado à mesma proteína devido a outras causas

(sobretudo infecciosas – H. pylori) (ver figura 3). Tem sido demonstrado que esta e o respectivo

epítopo têm um papel importante em outras doenças auto-imunes, como a doença de Crohn,

DM tipo 1, esclerose múltipla, artrite reumatóide (AR) e psoríase. Em adolescentes do sexo

masculino, o risco de desenvolver lesões ateroscleróticas precoces aumenta com o aumento

dos níveis de reactividade de linfócitos T para a HSP60 humana, um risco quase idêntico e

12

ox LDL

Células

Espumosas

Lúmen Endotélio

T

TH1

TH2

Macrófagos

IL-10

Citocinas

(INF-γ, IL-2)

Endotoxinas

HSP Monócitos

Inflamação e

lesão tecidular

LDL

Estômago

T

H. pylori

Linfócitos T específicos

para Hp-HSP60

Artéria

Figura 3: Patofisiologia da aterosclerose. A infecção por Helicobacter pylori vai provocar uma

resposta sistémica Th1 específica para a Hp – HSP. Estes vão infiltrar a parede do vaso através da

resposta ao HSP endógeno. Nos doentes com hipercolesterolemia o excesso de LDL infiltra a artéria

e é retido na íntima, estas partículas sofrem modificações oxidativas e enzimáticas que por sua vez

activam o endotélio (expressão de moléculas de adesão leucocitária – triângulos azuis) e são

fagocitadas por macrófagos levando à formação das células espumosas. O endotélio activo facilita a

infiltração celular, os monócitos são activados e levam à diferenciação em macrófagos. Todos estes

processos culminam na lesão da artéria. HSP - Heat shock protein 60; IL – Interleucina; INF –

Interferão; LDL – Lipoproteinas de baixa densidade; oxLDL – Lipoproteinas de baixa densidade

oxidadas; TLR – Receptor Toll-like.

13

proporcional ao número de cigarros fumados diariamente. Em adultos, um alto nível de anti-

HSP60/65 está frequentemente associado com aterosclerose difusa, envolvendo um alto risco

de eventos cardiovasculares e pode ser usado como um indicador de mau prognóstico. Kiechl

S et al,199934 demonstrou que epidemiologicamente as células T reactivas contra a HSP60

podem ser um factor de risco major para o espessamento da íntima-média nos humanos.3,33,34

TRATAMENTO

Esta nova interpretação relativa à patofisiologia da aterosclerose, associada ao

reconhecimento de que o mecanismo de acção de alguns fármacos já utilizados (ex.estatinas)

iria além do que era antes pensado levou a que novas propostas terapêuticas tenham

emergido.

As estatinas, originalmente utilizadas para diminuírem os níveis de colesterol, parecem

também ter um papel no processo inflamatório: na migração e adesão dos leucócitos, activação

das células T, biodisponibilidade do óxido nítrico, na formação de radicais livres e na

angiogénese. Têm efeito na imunomodulação: ao afectar as vias de sinalização (chamada de

células para a íntima), a diferenciação, proliferação e a actividade das células T e na

apresentação de antigénios. Mostrou-se também que a atorvastatina tem efeitos benéficos nos

doentes com AR, possivelmente pela inibição das vias de apresentação de antigénios às

células T.1,35

Uma outra frente engloba a terapia imunossupressora, nomeadamente com a utilização da

ciclosporina e do sirolímus que bloqueiam a activação das células T, e a proliferação do

músculo liso e inibem a lesão na íntima. Os stents revestidos por sirolímus são um exemplo

ilustrativo, já que a incorporação deste fármaco nas malhas do dispositivo demonstrou prevenir

a re-estenose depois de angioplastia percutânea.1

Os AINEs, parecem estar associados a um aumento do risco cardiovascular, Olsen A et al,

201136, observou que não existe uma janela de segurança para a utilização destes fármacos

em doentes com EAM prévio, estando associados a morte e a novo EAM independentemente

da duração do tratamento. Num outro estudo de Bresalier R et al, 200537, foi observado um

maior risco cardiovascular com a utilização dos inibidores da COX-2, possivelmente por

provocar um desequilíbrio dos eicosanóides vasoactivos o que leva a trombose e aterogénese.

A vacinação tem sido utilizada na investigação com animais, com redução da aterosclerose

com a vacinação com oxLDL, bactérias que continham certos fosfolípidos, e HSP-60. Esta

pode dever-se à indução de anticorpos protectores ou células T. A imunização com o auto-

antigénio HSP provou ser efectiva em doentes com AR e DM tipo 1. Actualmente os ensaios

clínicos encontram-se na fase 2 para a imunização com anti-oxLDL. Os riscos desta terapia

14

passam pela imunossupressão provocada que não é restrita aos tecidos afectados e pela

deposição de imunocomplexos nos tecidos.1,38,39

ENFARTE AGUDO DO MIOCÁRDIO E “REMODELAGEM”

CARDÍACA

A diminuição da capacidade funcional do coração após o EAM ultrapassa o evento

isquémico. Este processo, que é mediado em parte pela activação das vias imunes e

neurohormonais, culmina em mudanças adaptativas no tamanho, forma e função ventricular,

sendo conhecido por “remodelagem” ventricular.40

PATOFISIOLOGIA

Após o EAM a necrose tecidular liberta ou expõe constituintes antigénicos que podem

desencadear respostas auto-imunes. Entre estes, a miosina cardíaca parece ser o antigénio

com maior relevância neste tipo de resposta. Os auto-anticorpos contra a miosina e actina

estão aumentados nos doentes após EAM41,42, e estes podem levar à inflamação cardíaca e

consequentemente estarem relacionados com a “remodelagem”. Os auto-anticorpos parecem

assim estar relacionados com a lesão no tecido miocárdico, e consequentemente na sua

função, reforçando assim a importância da resposta humoral.42

Os estudos sugerem que há um desequilíbrio funcional das células Th1/Th2 após o EAM. As

células Th1 estão activadas, promovendo doença auto-imune órgão-específica, podendo levar

a insuficiência cardíaca pós-enfarte. Existe também uma elevação significativa das três

principais CC quimiocinas (MCP-1 – proteína quimioactrativa dos macrófagos, MIP-1α –

proteína-1α inflamatória do macrófago e RANTES - regulated on activation normally T cell

expressed and secreted), atingindo os níveis mais elevados nos doentes com disfunção

ventricular esquerda grave. Estas citocinas são quimoactrativos das células Th1, e induzem

uma transmigração dose-dependente. Após o EAM na área isquémica e não isquémica há

infiltração pelas células CD4+ e CD8+, havendo uma predominância das primeiras. Esta

infiltração celular vai além do necessário para a remoção do tecido necrótico e a actividade

citotóxica vai abranger também os cardiomiócitos saudáveis.42

Os marcadores auto-imunes podem ser utilizados como factores de prognóstico. Entre eles

encontram-se a proteína C Reactiva (PCR), o TNF-α, as CC quimiocinas e os auto-anticorpos

anti-miosina e anti-tropomiosina. A PCR parece ser um forte preditor independente da

progressão para insuficiência cardíaca, diminuição da fracção de ejecção do ventrículo

esquerdo, e mortalidade a um ano.42

15

TRATAMENTO

Com a descoberta da patofisiologia auto-imune na progressão do EAM, seria previsível que

as imunoterapias pudessem ter lugar no tratamento e prevenção da “remodelagem” cardíaca.

Os estudos com terapias imunossupressoras (metilprednisolona) em doentes com EAM, não

tiveram resultados favoráveis, e resultaram num aumento da incidência das arritmias

ventriculares e da extensão da área de enfarte. 42,43 Os estudos com terapia com anti-citocinas

também não tiveram resultados satisfatórios. A imunorregulação pode ser um método útil para

atenuar a “remodelagem” cardíaca após o EAM. Vários fármacos (ex.: estatinas)

cardiovasculares parecem melhorar a “remodelagem” e função cardíaca após o EAM por este

mecanismo. A sinvastatina atenua a produção de TNF-α, IL-1β, IL-6 e aumenta os níveis de IL-

10 em ambas as regiões (isquémicas e não-isquémicas), reduz a deposição de colagénio no

tecido que não sofreu enfarte e melhora a função ventricular esquerda.42,44 A atorvastatina pode

diminuir as respostas das células Th1, não tendo efeito nas células Th2 em doente com EAM,

sugerindo que este fármaco pode melhorar a função cardíaca em parte através da modulação

do desequilíbrio da função das células Th1/Th2 após o EAM.45 Os betabloqueadores podem

diminuir a expressão de citocinas pro-inflamatórias através do bloqueio do sistema β-

adrenérgico. O enalapril e a amlodipina também mostraram inibir a produção de citocinas pro-

inflamatórias.42

VALVULOPATIA – FEBRE REUMÁTICA

No espectro patológico das valvulopatias, a febre reumática tem relevância clínica e

epidemiológica como a etiologia auto-imune de algumas valvulopatias. A febre reumática é

uma doença auto-imune despoletada pelo Streptococcus pyogenes e inicia-se após uma

faringite não tratada em crianças e adolescentes susceptíveis (3 aos 19 anos), com alguma

influência de factores ambientais (baixo nível económico e acesso limitado aos cuidados de

saúde). A incidência da febre reumática aguda em alguns países em desenvolvimento excede

as 50 por 100000 crianças. A incidência global da doença cardíaca reumática é pelo menos de

15,6 milhões de casos e é responsável por cerca de 233.000 mortes por ano, não reflectindo

estes números a incidência real nas crianças da maior parte dos países em desenvolvimento.16

Esta doença manifesta-se por poliartrite, cardite (que se pode apresentar com pancardite),

coreia, eritema marginatum e/ou nódulos subcutâneos. A cardite é a complicação mais grave e

ocorre poucas semanas depois da infecção em 30 a 45% dos doentes, podendo levar a uma

cardiopatia reumática crónica, que é caracterizada por lesões valvulares progressivas e

permanentes. A insuficiência mitral e aórtica são as complicações mais comuns causadas por

valvulites repetidas.46

16

PATOSISIOLOGIA

Os alelos de susceptibilidade MHC classe II (DR e DQ), que estão localizados no

cromossoma 6 facilitam a apresentação de alguns péptidos estreptocócicos que mais tarde vão

desencadear reacções auto-imunes. Os alelos de TNF-α, também estão localizados no

cromossoma 6 e têm um papel na resposta inflamatória, podendo estar ligada a um

desequilíbrio das moléculas de MHC classe II e/ou responsável pela exacerbação da resposta

inflamatória por altos níveis de TNF-α. Variantes do gene MBL2, que codifica a produção da

lecitina de ligação á manose (MBL), têm sido encontrados nos doentes com febre reumática e

cardiopatia reumática.46,47

Os tipos de mimetismo molecular mediado por anticorpos contra o S. pyogenes, incluem a

partilha de sequência de aminoácidos idênticas ou homólogas, e epítopos de diferentes

moléculas, como carbohidratos, DNA, e ganglicosídios. O mimetismo mediado por células T

implica um “epitope spreading – propagação dos epítopos”, em que uma resposta imune inicial

contra determinado patogénio leva a um reconhecimento generalizado de auto-antigénios que

se traduzem posteriormente por uma amplificação e diversificação de respostas auto-imunes,

resultando na lesão reumática no coração. A célula T reconhece os auto-antigénios (que têm

algum grau de similaridade com os antigénios estreptocócicos) e fornece ajuda às células B

auto-reactivas.46,47

Desde Calveti e tal, 194548 que se tem vindo a demonstrar que existe uma reacção cruzada

dos anticorpos com os antigénios estreptocócicos e os auto-antigénios cardíacos, formando-se

a ideia de uma origem auto-imune desta patologia. Entre as proteínas humanas, a miosina e a

vimentina parecem ser as que têm maior reactividade cruzada, existindo mimetismo entre a

proteína estreptocócica M e a miosina cardíaca (maioritariamente a M5).46,47 Estes anticorpos

ligam-se à superfície endotelial, levando à inflamação, infiltração celular e cicatrização/ou

fibrose da válvula, sendo este processo facilitado pela VCAM-1 (molécula de adesão celular

vascular).46,47

A cardiomiopatia reumática é mediada por células T, que participam numa reacção de

hipersensibilidade retardada levando à inflamação local. As células T auto-reactivas podem

também activar as células B que vão produzir anticorpos específicos para o auto-antigénio e

para o patogénio. A cardiomiopatia reumática é inicialmente mediada por uma resposta

humoral que facilita a infiltração celular no endotélio e na membrana basal. O sinal

patagnomónico desta patologia é o corpo de Aschoff, uma lesão granulomatosa que se

desenvolve no endocárdio e no miocárdio provavelmente como resultado da infiltração

celular.46,47

A reacção auto-inflamatória também envolve a IL-1, IL-6 e o TNF-α no sangue periférico. A

produção de IL-2 está também aumentada nos doentes com cardiomiopatia reumática. No

17

tecido cardíaco (miocárdio e válvulas) nos doentes com cardiopatia reumática aguda e crónica

as células mononucleares produzem citocinas inflamatórias (TNF- α e IFN-γ) e citocinas

reguladoras (IL-10). Nas lesões cardíacas de fase aguda a produção de IL-1, IL-2 e TNF- α

relacionam-se com a progressão dos nódulos de Aschoff. A diminuição do número de células

produtoras de IL-4 no tecido valvular pode contribuir para a progressão das lesões.46,47,49

DIAGNÓSTICO E TRATAMENTO

O diagnóstico da febre reumática é efectuado pelos critérios de Jone (ver tabela 2), este

requer a presença de dois critérios major ou um major e dois minor mais a evidência de uma

infecção recente por estreptococos β-hemolítico.22

Tabela 2. Critérios de Jone22

Major Minor

Cardite Artralgia

Poliartrite Febre

Coreia de Sydenham Elevação da velocidade de

hemossedimentação ou da PCR Eritema marginatum

Nódulos subcutâneos Prolongamento do intervalo P-R

A penicilina é considerada o principal meio preventivo para a febre reumática, sendo

também utilizada como profilaxia secundária após a mesma, mas não se provou que esta

estratégia altere o outcome cardíaco. A identificação dos epítopos estreptocócicos e humanos

são fundamentais para o desenvolvimento de novas imunoterapias, por exemplo, a estimulação

das células periféricas com antigénios major, como a miosina, pode ser encarado como uma

forma de terapia de células T baseada na indução de respostas anti-idiotípicas e na troca de

perfis de citocinas. A utilização de imunoglobulinas, salicilatos e corticoides não mostrou

benefício na cardiopatia reumática, não sendo por isso recomendados.22,46,50,51

PERICARDITE

A pericardite é uma doença comum representando cerca de 5% dos casos de apresentação

no serviço e urgência por dor torácica não isquémica. A sua etiologia é múltipla e extensa. A

pericardite recorrente representa uma complicação da pericardite e acorre em cerca de 15% a

32% dos casos de pericardite aguda associando-se geralmente a um processo auto-

imune.52,53

18

ETIOLOGIA E PATOFISIOLOGIA

A pericardite pode estar associada à fase aguda do Lúpus Eritematoso Sistémico (LES), AR,

esclerose sistémica, poliartrite, artrite de células gigantes, ou outras vasculites sistémicas. Em

outros casos também pode haver um envolvimento sub-clínico (em particular quando

associada a derrame pericárdico). Pensa-se que 40% dos casos de pericardite aguda

idiopática recorrente têm uma origem auto-imune (43,4% dos doentes são ANA positivos).54

Num estudo com 40 doentes com pericardite aguda recorrente idiopática foram detectados

uma maior frequência de AHA (50%) e anti-disco intercalado (25%), do que nos doentes com

doença cardíaca não inflamatória (4%, 4%), isquémica (1%, 2%), ou nos indivíduos normais

(3%, 0%), (p=0,0001). Os anticorpos anti-disco intercalado e AHA estão também associados a

um maior número de recorrências (p=0,01) e hospitalizações (p=0,0001).53

A patofisiologia da base auto-imune da pericardite aguda recorrente idiopática, passa pela

interacção das PAMPs (padrões moleculares associados a patogénios) que derivam de

produtos virais, com os TLRs das células dendríticas. Estas podem promover as respostas

primárias das células T e B, representando uma ligação entre o sistema imune inato e

adaptativo. Seguidamente as células T CD4+ podem ser diferenciadas em diferentes

subgrupos de células Th com perfis citocínicos e funções efectoras diferentes: as células Th1 e

Th17 produzem citocinas pro-inflamatórias – IFN-γ e IL-17, respectivamente. As células Natural

Killer (NK) interagem e fornecem sinais estimulatórios para as células dendríticas e T (ver figura

4).52

A auto-imunidade pode estar associada à integração do DNA de microorganismos no

hospedeiro o que leva a mutação e às reacções cruzadas, devido às similaridades das

moléculas do mesmo grupo. Também pode haver apresentação de (DAMPs – padrões de

moléculas associadas a lesão) ao sistema imune após a lesão do pericárdio e miocárdio

levando a uma possível interacção com os TLR e à estimulação das células T, B e células

apresentadoras de antigénios.52

DIAGNÓSTICO

Por definição a pericardite recorrente deve incluir o diagnóstico de pericardite aguda anterior

e evidência de pericardite recorrente ou em actividade contínua.54 O diagnóstico de pericardite

aguda recorrente idiopática pode ser feito quando pelo menos dois dos seguintes critérios

estão presentes: dor no peito, atrito pericárdico, alterações no ECG (tipicamente elevação do

segmento ST e depressão do PR generalizada), derrame pericárdico de novo ou agravamento,

diagnóstico clínico de pericardite aguda. A PCR elevada serve como um achado de

19

confirmação do diagnóstico. As recorrências não são previsíveis variando no intervalo de

tempo que as separa.52,54

TRATAMENTO

Os objectivos principais do tratamento passam pelo controlo do episódio agudo e pela

prevenção das recorrências. A hospitalização na maioria dos casos não é necessária (limitada

a doentes com factores de alto risco). A restrição ao exercício físico é recomendada apesar de

não haver evidência do seu benefício.54

Os anti-inflamatórios não-esteróides (AINEs), são o fármaco de primeira linha para a

pericardite aguda e recorrente (recomendação classe I pelos guidelines da ESC, 2004),

recomendando-se a utilização de ibuprofeno.55

Os corticoides podem ser usados só nos doentes com crises frequentes que não respondem

aos AINEs (Classe IIa pelas guidelines da Sociedade Europeia de Cardiologia São eficazes no

controlo da dor e do derrame pericárdico, contudo podem levar a recorrências quando a dose

é diminuída, sendo por isso importante não utilizar doses baixas e não diminuir rapidamente a

PAMPs

DAMPs

T CD4

APC

NFқB

TLR

TH1

TH17

Citocinas pro-

inflamatórias

Figura 4: Activação das células CD4. A estimulação das APC pelas PAMPs e DAMPs levam à

activação do NFқB que induz a expressão de citocinas. As células T CD4 são activadas pela

apresentação do antigénio por parte das APC e pelas citocinas pró-inflamatórias. APC – Células

apresentadoras de antigénios; DAMP - Padrões de moléculas associadas a lesão; MHC – Complexo de

histocompatibilidade major; NFқB - Factor de transcrição nuclear қB; PAMP - Padrões moleculares

associados a patogénios; TLR – Receptores Toll-like.

TCR

MHCII

20

dose. A administração intrapericárdica de corticoides não absorvíveis (recomendação IIa pelas

guidelines da ESC) é um meio de minimizar os efeitos laterais induzidos por esteróides, sendo

a sua utilização praticamente restrita à investigação, dado tratar-se de um método invasivo.54,55

A colchicina tem também sido utilizada com sucesso para tratar a pericardite recorrente e

em caso de falência dos tratamentos convencionais (recomendação Classe I nas guidelines

da ESC), (repetição do que está atrás). Os estudos mostram que a sua utilização traz

benefícios pela diminuição das hospitalizações, pela minimização das sequelas, pelo acelerar

da melhoria clínica e pelo impacto na qualidade de vida.54,56

Para além deste também podem ser utilizados outros fármacos imunossupressores em

doentes que não respondem a altas doses de prednisona ou que tenham complicações graves

relacionadas com a corticoterapia . São agentes alternativos a azatioprina ou a ciclofosfamida,

no entanto e os estudos nesta área são limitados. A utilização de imunoglobulinas também está

limitada pelos poucos estudos existentes apesar de parecer ser um tratamento seguro e eficaz

para os casos refractários.54,57

AUTO-IMUNIDADE E O RITMO CARDÍACO

BLOQUEIO CARDÍACO CONGÉNITO

O bloqueio cardíaco congénito detectado antes ou no nascimento, na ausência de

alterações estruturais, está fortemente associado aos anticorpos maternos para SSA/Ro e/ou

SSB/La ribonucleoproteinas, independentemente do facto da mãe ter LES, síndrome de

Sjögren ou ser assintomática. A lesão cardíaca ocorre num feto previamente normal e parece

ter origem na passagem transplacentar de anticorpos maternos IgG. Esta patologia não ocorre

aleatoriamente durante o desenvolvimento fetal, sendo detectada com maior frequência entre a

16ª e a 24ª semana de gestação. Em 10 a 20% dos casos pode estar associada uma

miocardite/endocardite. A mortalidade associada é aproximadamente 30%, havendo também

uma morbilidade significativa, com 60% das crianças que sobrevivem a necessitar de pace-

maker para toda a vida.58

A patofisiologia pode ser constituída por vários componentes, encontrando-se entre eles o

componente materno, que constitui o anticorpo que ao ligar-se ao antigénio respectivo inicia a

lesão. A localização provável do antigénio parece ser intracelular e provavelmente é

translocado para a superfície durante o desenvolvimento cardíaco, havendo posteriormente

uma reacção cruzada com o epítopo localizado na superfície do tecido cardíaco com os auto-

anticorpos anti-SSA/Ro/La. Apesar deste componente materno ser essencial para a iniciação,

21

ele não é o suficiente para o seu desenvolvimento. Um componente fetal e/ou ambiental

também parecem ter um papel na expressão da doença.58,59

Foi demonstrado o efeito arritmogénico dos anticorpos anti SSA/Ro/La na sua indução do

bloqueio cardíaco, ao serem isolados no coração destas crianças e ao inibirem o influxo de

cálcio através dos canais tipo L.58

A apoptose parece ser o factor iniciador da ligação do tecido cardíaco saudável ao anticorpo

materno e a fibrose subsequente. Em circunstâncias fisiológicas, a apoptose leva a uma rápida

eliminação das células sem inflamação. Em áreas de grande remodelagem como o sistema de

condução cardíaco esta pode ter vantagens, na mediada em que há uma maior selecção,

comportando-se as células saudáveis adjacentes como fagócitos “amadores”. O facto de não

se encontrarem macrófagos na zona septal do coração de fetos saudáveis reforça esta ideia.

Os anticorpos monoclonais e as fracções de anticorpos IgG para a SSA/Ro_SSB/La inibem

significativamente a absorção de células apoptóticas pelos cardiócitos saudáveis, havendo uma

maior facilidade de acesso aos antigénios intracelulares e a opsonização das células

apoptóticas alterando os processos normais da renovação das células. A activação dos

macrófagos e a desregulação subsequente dos fibroblastos culminam numa cicatriz

permanente.58

TRATAMENTO

Baseado no processo fisiopatológico o tratamento deve focar a redução da inflamação

generalizada e prevenir a fibrose. O tratamento da mãe com dexametasona oral tem sido

utilizado por vários grupos, mas os benefícios e os riscos são questionáveis. A dexametasona

não deve ser utilizada para reverter o bloqueio completo estabelecido, mas pode ter algum

efeito para bloqueios menos avançados e associados a cardiomiopatia. Como o feto que tem

um bloqueio de terceiro grau pode não beneficiar deste tratamento, os tempos críticos para

intervir serão: 59,60

Quando o intervalo PR está prolongado mas os estímulos auriculares continuam a

alcançar os ventrículos ainda que de forma intermitente (bloqueio de primeiro e

segundo grau),

Quando na presença de sinais de disfunção miocárdica .

A morbi-mortalidade do bloqueio cardíaco de terceiro grau e os dados histológicos (que

sugerem uma fibrose no nó AV) mostram a necessidade de desenvolvimento de uma nova

abordagem profilática.59,60

A terapia com imunoglobulinas é promissora mas ainda com pouca evidência, os seus

efeitos não são totalmente específicos, bloqueando o FcRn, que é o receptor que medeia o

22

transporte placentar da IgG materna para o feto. Há uma diminuição dos anticorpos na

circulação fetal, e aumento do catabolismo dos anticorpos maternos.59

FIBRILAÇÃO AURICULAR

A fibrilação auricular (FA) é um dos tipos mais comuns de disritmias, que pode ocorrer

isoladamente ou em associação a outras patologias. Há uma evidência crescente de que a

auto-imunidade tem um papel importante nesta entidade . Pelo menos três tipos de anticorpos

foram encontrados nestes doentes: auto-anticorpos anti-receptor muscarínico-M2, auto-

anticorpos anti-HSP e auto-anticorpo anti-miosina.61,62

A CMD associa-se frequentemente a FA permanente e como foi visto anteriormente os

auto-anticorpos anti-M2 também estão presentes nestes doentes. O estudo efectuado por

Baba, A et al (2008)61 demonstrou que os auto-anticorpos anti-M2 são um factor predictor

independente da FA em doentes com CMD e na FA idiopática na ausência de disfunção

ventricular esquerda subjacente. Estes auto-anticorpos têm efeitos cronotrópicos negativos e

pró-arrítmicos, sugerindo que podem causar mudanças electrofisiológicas auriculares e

promover a indução e perpetuação da FA. O provável mecanismo subjacente consiste na

fibrose auricular e na sobre-expressão dos receptores M2.61-63

INSUFICIÊNCIA CARDÍACA

A insuficiência cardíaca resulta de um grupo heterogéneo de alterações que incluem a

patologia isquémica, valvular, infecções do miocárdio, lesões tóxicas e químicas e alterações

imunes. O conhecimento da patofisiologia da insuficiência cardíaca evoluiu de uma “simples”

falência da bomba para uma doença com envolvimento sistémico, caracterizada por uma

sobre-activação de vários sistemas hormonais compensatórios e do sistema inflamatório. Cada

vez mais é claro que a manipulação das respostas sistémicas (moduladores do sistema renina-

angiotensina-aldosterona como os IECAS, os ARAII e a espironolactona assim como os β-

bloqueadores) levam a um melhor outcome da insuficiência cardíaca do que as intervenções

dirigidas directamente à função de “bomba” (inotrópicos).64

AUTO-IMUNIDADE E PATOFISIOLOGIA

Os processos fisiopatológicos já foram abordados nas patologias anteriores que podem

culminar numa insuficiência cardíaca de origem isquémica (EAM e aterosclerose), ou não

isquémica (CMD) e que independentemente deste processo etiológico, a lesão cardíaca leva a

uma activação auto-imune. Existe de facto evidência de que a presença de auto-anticorpos

culmina num aumento da expressão das citocinas cardíacas em doentes com IC avançada.64,65

23

As alterações hemodinâmicas subjacentes à IC levam a uma produção de citocinas pró-

inflamatórias pelas células cardíacas e a uma diminuição das citocinas anti-inflamatórias,

produzindo inflamação cardíaca. Foi também observado que as citocinas pró-inflamatórias para

além de estarem elevadas em doentes com insuficiência cardíaca, estão também associadas à

redução da capacidade funcional. No estudo de Lidberg E et al, 200366 foi observado que as

mesmas estão associados à deterioração hemodinâmica, incluindo a elevação da pressão de

enchimento e ao aumento da frequência cardíaca.65,66

TRATAMENTO

Os estudos com os anti-TNF-α não mostraram benefícios, havendo aumento da incidência

de efeitos adversos, nomeadamente agravamento da IC, colocando-se a questão da segurança

da utilização destes fármacos em doentes com IC que tenham outras patologias que

necessitem deste tratamento (ex: doença de Crohn). 42,64-68

Os estudos randomizados dedicados à avaliação da utilização das imunoglobulinas neste

contexto têm alguns resultados contraditórios, havendo um estudo em que os resultados não

mostraram benefícios em relação ao placebo69, enquanto outro demonstrou um aumento da

fracção de ejecção do ventrículo esquerdo e uma melhoria da classe funcional da NYHA.70

Parece também haver evidência do aumento dos mediadores anti-inflamatórios. Contudo são

necessários mais estudos para comprovar a sua eficácia e para avaliar os seus riscos,

nomeadamente, os efeitos com uma administração a longo-prazo que parecem contrariar os

benefícios a curto prazo. 64,65,71

A terapia com imunoadsorção pode eliminar da circulação factores patogénicos e melhorar a

função cardíaca, nomeadamente melhorar a função sistólica e o volume diastólico final.65,71

A imunomodulação parece induzir efeitos favoráveis no tratamento da IC, incluindo o

aumento das citocinas anti-inflamatórias e diminuição das citocinas pro-inflamatórias. Um

ensaio clínico randomizado duplamente cego em que foi usada esta terapêutica, não mostrou

uma diminuição estatisticamente significativa da sobrevida ou do primeiro internamento

cardiovascular. Contudo, uma sub-análise combinada de dois sub-grupos – doentes em classe

III/IV NYHA de causa isquémica e doentes da classe II do NYHA72 demonstrou uma redução

do risco de morte de 31% (p=0,0003)

O metotrexato num estudo em doentes com IC diminui componentes pró-inflamatórios e

simultaneamente melhora a qualidade de vida, a distância percorrida em 6-min e a classe

funcional da NYHA. Contudo não foi demonstrada influência na remodelagem ventricular, na

função sistólica e na incidência de eventos cardiovasculares adversos, parecendo ser por isso

uma boa terapia adjuvante.71

24

Para além das acima mencionadas, outras terapias promissoras têm sido utilizadas em

estudos com alguns efeitos anti-inflamatórios, como a administração de IL-10, hormona de

crescimento, androgéneos, endotoxemia e receptores activados por proliferadores do

peroxissoma gama.71

CONCLUSÃO

Existem pelo menos três vias para a activação auto-imune na patologia cardíaca: por

estimulação antigénica directa, como no caso de um vírus que infecta o miocárdio; secundária

a lesão cardíaca em que há exposição de “novos antigénios” capazes de desencadear uma

resposta imune contra o coração; e por fim, a libertação de citocinas pelas células cardíacas

(miócitos e não-miócitos), em resposta ao stress hemodinâmico.65

Apesar Medicina ser cada vez mais sub-especializada, a tendência crescente de uma

análise sistémica da patologia cardíaca leva a que a abordagem aos doentes seja

multidisciplinar, havendo um benefício claro no investimento do estudo de novas terapias que

interfiram directamente no mecanismo fisiopatológico em vez de se limitarem ao simples

controlo sintomático.

AGRADECIMENTOS

Agradeço à Dra Sofia Cabral, pela orientação prestada com dedicação a todos os

pormenores. À minha família (especialmente aos meus pais e à minha irmã) e amigos, pela

paciência inesgotável que revelaram ter mesmo quando não era merecida e pela

aprendizagem e força que me dão no dia-a-dia que permite que eu realize tudo aquilo a que

me proponho. Ao Hugo, para além do apoio constante, agradeço sobretudo a inspiração.

25

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