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UNIVERSIDADE TECNOLÓGICA FEDERAL DO PARANÁ DEPARTAMENTO ACADÊMICO DE QUÍMICA E BIOLOGIA CURSO SUPERIOR DE TECNOLOGIA EM PROCESSOS AMBIENTAIS LILIANE SESSI DA ROCHA AVALIAÇÃO DA PERDA DE BIODIVERSIDADE DECORRENTE DA TRANSFORMAÇÃO DO USO DA TERRA DA FLORESTA AMAZÔNICA PARA LAVOURA DE SOJA TRABALHO DE CONCLUSÃO DE CURSO CURITIBA 2012

AVALIAÇÃO DA PERDA DE BIODIVERSIDADE DECORRENTE …repositorio.roca.utfpr.edu.br/jspui/bitstream/1/762/1/CT_COPAM... · transformaÇÃo do uso da terra da floresta ... 4.5 comparaÇÃo

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UNIVERSIDADE TECNOLÓGICA FEDERAL DO PARANÁ

DEPARTAMENTO ACADÊMICO DE QUÍMICA E BIOLOGIA

CURSO SUPERIOR DE TECNOLOGIA EM PROCESSOS AMBIENTAIS

LILIANE SESSI DA ROCHA

AVALIAÇÃO DA PERDA DE BIODIVERSIDADE DECORRENTE DA

TRANSFORMAÇÃO DO USO DA TERRA DA FLORESTA

AMAZÔNICA PARA LAVOURA DE SOJA

TRABALHO DE CONCLUSÃO DE CURSO

CURITIBA

2012

LILIANE SESSI DA ROCHA

AVALIAÇÃO DA PERDA DE BIODIVERSIDADE DECORRENTE DA

TRANSFORMAÇÃO DO USO DA TERRA DA FLORESTA

AMAZÔNICA PARA LAVOURA DE SOJA

Trabalho de conclusão de curso apresentado à disciplina de Trabalho de Conclusão de Curso 2, do Curso Superior de Tecnologia em Processos Ambientais – DAQBI – da Universidade Tecnológica Federal do Paraná.Orientadora: Prof.ª Dr ª Cássia Maria Lie Ugaya

CURITIBA

2012

LILIANE SESSI DA ROCHA

AVALIAÇÃO DA PERDA DE BIODIVERSIDADE DECORRENTE DA

TRANSFORMAÇÃO DO USO DA TERRA DA FLORESTA

AMAZÔNICA PARA LAVOURA DE SOJA

Trabalho de Conclusão de Curso aprovado como requisito parcial à

obtenção do grau de TECNÓLOGO EM QUÍMICA AMBIENTAL pelo

Departamento Acadêmico de Química e Biologia (DAQBI) do Câmpus

Curitiba da Universidade Tecnológica Federal do Paraná – UTFPR, pela

seguinte banca examinadora:

Membro 1 – MARCELA VALLES LANGE Mestre em Engenharia Mecânica e de Materiais (UTFPR)

Membro 2 – PROF. RICARDO BARBOSA Departamento Acadêmico de Química e Biologia (UTFPR)

Orientadora – PROFª. DRª. CASSIA MARIA LIE UGAYA

Departamento Acadêmico de Mecânica (UTFPR)

Coordenadora de Curso – PROFª. DRª. VALMA MARTINS BARBOSA

Curitiba, 08 de novembro de 2012.

RESUMO

ROCHA, Liliane Sessi da. Avaliação da perda de biodiversidade decorrente da

transformação do uso da terra da Floresta Amazônica para lavoura de soja. 2012.

Trabalho de Conclusão de Curso, Curso Superior de Tecnologia em Processos

Ambientais, Universidade Tecnológica Federal do Paraná. Curitiba, 2012.

A transformação do uso da terra na floresta Amazônica para pasto, ou lavoura

de soja, diminui a precipitação pluvial em função da alteração do albedo e esta

diminuição na precipitação condiciona a vegetação, levando até a perda de espécies

mais sensíveis ao estresse hídrico. Por meio da Avaliação de Impacto do Ciclo de

Vida (AICV), uma das fases da Avaliação do Ciclo de Vida (ACV), os resultados da

fase anterior (Inventário do Ciclo de Vida – ICV) são convertidos em impactos,

visando ao melhor entendimento da significância ambiental. A avaliação da perda da

biodiversidade é ainda muito limitada em estudos de ACVs, mas, no caso do Brasil,

identificou-se a possibilidade de avaliar a biodiversidade em função da precipitação

pluvial, cuja alteração pode ser avaliada em função da transformação do uso da

terra na região Amazônica. O objetivo deste trabalho foi propor um modelo de

caracterização para perda de biodiversidade decorrente da transformação do uso da

terra, mais especificamente, da floresta Amazônica para lavoura de soja. Foram

calculados os fatores de caracterização e, finalmente, foram sugeridas

recomendações para melhorias futuras do modelo, bem como sua adaptação para

outros tipos de transformação do uso da terra.

Palavras-chave: AICV, transformação do uso da terra, precipitação pluvial,

biodiversidade.

ABSTRACT

ROCHA, Liliane Sessi da. Assessment of biodiversity loss due to land use

conversion from natural rainforest to soy crop in the Brazilian Amazon. 2012.

Trabalho de Conclusão de Curso, Curso Superior de Tecnologia em Processos

Ambientais, Universidade Tecnológica Federal do Paraná. Curitiba, 2012.

The land use transformation in the Amazon forest to pasture or soy crop,

decreases the rainfall due to the change of albedo and this decrease in the

precipitation conditions the vegetation, taking to the loss of species most sensitive to

water stress. Trough Life Cycle Impact Assessment (LCIA), one of the stage of the

Life Cycle Assessment (LCA), the results of the previous stage (Life Cycle Inventory -

LCI) are converted into impacts, aiming a better understanding at the environmental

significance. The biodiversity loss assessment is still very limited in LCA studies, but,

in the Brazilian case, it was identified the possibility of assessing the biodiversity

depending on rainfall, who change can be assessed based on the conversion of land

use. The goal of this study was to propose a model to characterize loss of

biodiversity resulting from changes in the land use. More specifically, from Amazon

forest to soy crop. The characterization factors were calculated, and finally,

suggestions were made for future improvements of the model and its adaptation for

other types of land use transformation.

Keywords: LCIA, land use conversion, rainfall, biodiversity.

LISTA DE SIGLAS

ABIOVE Associação Brasileira das Indústrias de Óleos Vegetais

ACV Avaliação do Ciclo de Vida

AICV Avaliação do Impacto do Ciclo de Vida

ANA Agência Nacional das Águas

ANEC Associação Nacional dos Exportadores de Cereais

GTS Grupo de Trabalho da Soja

IBGE Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística

ICV Inventário do Ciclo de Vida

ISO International Organization for Standardization

MME Ministério de Minas e Energia

PDF Potentially Disappeared Fraction

RFA Radiação Fotossinteticamente Ativa

SETAC Society of Environmental Toxicology and Chemistry

SIDRA Sistema IBGE de Recuperação Automática

LISTA DE FIGURAS

Figura 1 - Correlação entre o número de espécies em determinada área e o número máximo de dias com precipitação maior que 0,1 mm na América do Sul..............................................................................................................................25Figura 2 – Modelo de Caracterização........................................................................27Figura 3 - Correlação entre o percentual de área de floresta Amazônica transforma-da em pasto e precipitação pluvial relativa.................................................................34Figura 4 - Correlação entre o percentual de área de floresta Amazônica transforma-da em lavoura de soja e precipitação pluvial relativa.................................................34Figura 5 - Localização do município de Santarém – PA............................................39

LISTA DE TABELAS

Tabela 1. Classes de uso da terra e respectivas percentagens de redução da diversidade de espécies, após a ocupação................................................................18Tabela 2. Área potencial e riqueza de espécies por 10.000 km² para diferentes biomas........................................................................................................................18Tabela 3. Transformação do uso do solo: Floresta Amazônica para pasto...............29Tabela 4. Dados meteorológicos da Amazônia.........................................................30Tabela 5. Equações...................................................................................................31Tabela 6. Resultados dos cálculos para ambos os cenários.....................................32Tabela 7. Resultados dos cálculos para os cenários de floresta e pastagem...........32Tabela 8. Simulação de perda de espécies na conversão de Floresta Amazônica para pastagem............................................................................................................36Tabela 9. Simulação de perda de espécies de plantas vasculares na transformação de Floresta Amazônica para lavoura de soja.............................................................38Tabela 10. Área de plantio de soja no município de Santarém – PA........................40Tabela 11. Série histórica da precipitação pluvial no município de Santarém – Pará............................................................................................................................40Tabela 12. Área de plantio de soja no Estado do Pará.............................................42

LISTA DE GRÁFICOS

Gráfico 1 – Relação entre o percentual de transformação do uso da terra e o núme-ro de espécies de plantas vasculares perdidas..........................................................37Gráfico 2 – Relação entre o percentual de conversão do uso do solo e o número de espécies perdidas.......................................................................................................38

LISTA DE EQUAÇÕES

Equação 1 – Riqueza de espécies (SR)....................................................................19Equação 2 – Escassez do ecossistema....................................................................19Equação 3 – Escassez do ecossistema normalizada................................................19Equação 4 – Vulnerabilidade do ecossistema normalizada......................................19Equação 5 – Perda de biodiversidade.......................................................................19Equação 6 – Tempo de recuperação........................................................................20Equação 7 – Fator de vulnerabilidade.......................................................................21Equação 8 – Fator de caracterização para ocupação...............................................21Equação 9 – Fator de caracterização para transformação.......................................21Equação 10 – Número de espécies em 10.000 km²..................................................26Equação 11 – Balanço hídrico...................................................................................31Equação 12 – Evapotranspiração..............................................................................31Equação 13 – Coeficiente dependente da temperatura média diária do ar..............31Equação 14 – Radiação efetiva.................................................................................31Equação 15 – Radiação incidente de onda curta......................................................31Equação 16 – Tensão parcial de vapor d'água.........................................................31Equação 17 – Tensão de vapor saturado..................................................................31Equação 18 – Evaporação nas condições isotérmicas.............................................31Equação 19 – Precipitação relativa – transformação de floresta para pasto............34Equação 20 – Precipitação relativa – transformação de floresta para soja..............35Equação 21 – Perda de biodiversidade.....................................................................36

Sumário1 INTRODUÇÃO.....................................................................................................................9

1.1 OBJETIVOS......................................................................................................12

1.1.1 Objetivos Gerais........................................................................................12

1.1.2 Objetivos Específicos................................................................................12

2 ASPECTOS GERAIS DA AVALIAÇÃO DO CICLO DE VIDA E DA AVALIAÇÃO DO IMPACTO DO CILO DE VIDA...............................................................................................13

2.1 AVALIAÇÃO DO CICLO DE VIDA (ACV).........................................................13

2.2 CONCEITOS UTILIZADOS NA AVALIAÇÃO DO IMPACTO DO CICLO DE

VIDA (AICV)............................................................................................................14

2.2.1 Categoria de Impacto................................................................................14

2.2.2 Indicadores de Categoria...........................................................................15

2.3 AVALIAÇÃO DO IMPACTO DO CICLO DE VIDA............................................15

2.4 INDICADORES DE QUALIDADE DO USO DA TERRA..................................17

2.5 MODELOS DE AVALIAÇÃO DE IMPACTO DO USO DA TERRA..................17

2.5.1 Modelo de Weidema e Lindeijer (2001).....................................................17

2.5.2 Modelo de Schmidt (2008).........................................................................20

2.5.3 Avaliação Crítica dos Métodos..................................................................21

3 ASPECTOS CONCEITUAIS DO MECANISMO AMBIENTAL............................................223.1 CICLOS BIOGEOQUÍMICOS...........................................................................22

3.2 MECANISMO AMBIENTAL – RELAÇÃO ENTRE CONVERSÃO DO USO DA

TERRA, PLUVIOSIDADE E BIODIVERSIDADE....................................................23

4 METODOLOGIA................................................................................................................274.1 AVALIAÇÃO DO MÉTODO DE DETERMINAÇÃO DE FATORES DE

CARACTERIZAÇÃO...............................................................................................27

4.1.1 Classificação do Uso da Terra...................................................................28

4.1.2 Transformação do Uso da Terra...............................................................29

4.1.3 Biodiversidade na Floresta Amazônica.....................................................29

4.1.4 Cálculo da Precipitação Pluvial na Região Amazônica.............................30

4.2 AVALIAÇÃO DO MÉTODO...............................................................................33

4.3 TRANSFORMAÇÃO DO USO DA TERRA DA FLORESTA AMAZÔNICA

PARA LAVOURA DE SOJA....................................................................................37

4.4 APLICAÇÃO DA METODOLOGIA EM UMA ÁREA DE ESTUDO...................39

4.5 COMPARAÇÃO COM O MODELO DE WEIDEMA E LINDEIJER...................41

5 RESULTADOS E DISCUSSÃO..........................................................................................426 CONSIDERAÇÕES FINAIS...............................................................................................447 REFERÊNCIAS..................................................................................................................45

9

CAPÍTULO I – INTRODUÇÃO GERAL

1 INTRODUÇÃO

A Amazônia é a região compreendida pela bacia do rio Amazonas, com área

equivalente a 6.900.000 km², dos quais aproximadamente 3.800.000 km² estão no

Brasil (IBGE, 2007a).

O desmatamento da Amazônia Legal se iniciou com a atividade pecuária,

desenvolvida principalmente na década de 70; entre 1995 e 2000, a maior parte do

crescimento do rebanho bovino brasileiro ocorreu na Amazônia Legal (IBGE, 2007a).

Na década de 90, a região recebeu a agricultura como um novo vetor de ocupação,

no qual a soja se destacou (IBGE, 2007a).

De acordo com Ferrari et al. (2005), a maior parte do biodiesel atualmente

produzido no mundo deriva do óleo de soja. Em 2008 houve um relevante aumento

na produção de biodiesel no Brasil (188,7% em relação ao ano de 2007), devido à

entrada em vigência da Lei nº 11.097/05, que obriga a adição de biodiesel ao Diesel

mineral (MME, 2009), tendo em vista reduzir emissões atmosféricas. A expectativa é

de crescimento da produção de biodiesel no Brasil nos próximos anos em virtude da

publicação da referida lei, que estabeleceu como 2% o percentual mínimo de

biodiesel adicionado ao diesel mineral a partir de 2008, e de 5%, a partir de 2013.

No entanto, a facilidade em atingir as metas antecipou o incremento do

percentual de biodiesel ao diesel mineral e, no segundo semestre de 2008, o

percentual passou a ser de 3%. Em seguida, no segundo semestre de 2009, o

percentual na mistura passou a ser de 4%. E, a partir de 2010, o percentual de

biodiesel adicionado compulsoriamente ao diesel mineral passou a ser de 5% (MME,

2011).

Para conter o desmatamento para plantio de soja na Amazônia, as indústrias

e exportadores associados à ABIOVE (Associação Brasileira das Indústrias de Óleos

Vegetais) e à ANEC (Associação Nacional dos Exportadores de Cereais) assumiram

o compromisso de não adquirirem soja oriunda de áreas desflorestadas no bioma

Amazônia a partir de julho de 2006, denominando tal acordo de Moratória da Soja; a

partir de imagens dos satélites do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (INPE),

10

o Grupo de Trabalho da Soja (GTS) sobrevoa polígonos previamente selecionados e

avalia se houve plantio de soja em novas áreas desmatadas (GTS, 2010).

No entanto, apesar de a moratória ter sido renovada até 31 de janeiro de

2013, foi observado um aumento no plantio de soja em áreas desmatadas na

Amazônia na safra 2010/2011, em relação à safra 2009/2010. No relatório publicado

em julho de 2010, foi identificada a presença de soja em 6295 hectares que foram

desmatados a partir de julho de 2006; já no relatório publicado em outubro de 2011,

foi identificada a presença de soja em 11698 hectares, desmatados a partir do

mesmo período (GTS, 2011).

Por outro lado, este incremento na produção de biomassa para fins

energéticos afeta tanto o próprio efeito estufa, como a produção de alimentos e a

biodiversidade. Quanto ao efeito estufa, a transformação de áreas que atualmente

são ocupadas por florestas primárias em área de cultivo implica a emissão do

carbono do solo e da floresta que, por conseguinte poderia eliminar ou reduzir os

benefícios advindos do uso de energia renovável (NOVAK e UGAYA, 2009).

Em relação à produção de alimentos, a Organização das Nações Unidas para

a Agricultura e Alimentação prevê que o preço dos produtos agrícolas continuará a

crescer na próxima década também como decorrência da expansão de

biocombustíveis (BEST, 1997).

Outro impacto ambiental significativo devido à transformação do uso do solo é

a perda da biodiversidade (KÖLLNER, 2001). No Brasil, a expansão da soja está

causando a transformação da Floresta Amazônica e do Cerrado (MILANI et al.,

2008). Como decorrência, esta expansão implica na perda de biodiversidade destes

dois biomas.

Para evitar a transferência de impactos de um produto ou de uma função

entre uma etapa do ciclo de vida e outra, ou de um impacto para outro, utiliza-se a

Avaliação do Ciclo de Vida (ACV). A ACV consiste em uma técnica em que são

considerados os impactos ambientais desde a extração dos recursos naturais ao

descarte final do produto (SETAC, 1993).

A avaliação da perda da biodiversidade é ainda muito limitada em estudos de

ACVs. Köllner (2001) propôs um modelo para incluir a biodiversidade em ACVs, que

foi testado satisfatoriamente na Suíça. É importante mencionar, contudo, que isto só

11

foi possível em virtude da existência de dados relativos às alterações do uso da terra

e da biodiversidade naquele país em um período histórico.

Além do modelo de Köllner (2001), também foram desenvolvidos outros

modelos, tais como o de Schmidt (2008), Weidema e Lindeijer (2001), Michelsen

(2008), Müller-Wenk (1998), entre outros. Os modelos de Schmidt (2008) e

Weidema e Lindeijer (2001) serão descritos resumidamente no Capítulo II.

No caso do Brasil, identificou-se que existe a possibilidade de avaliar a

biodiversidade em função da pluviosidade na América do Sul (MUTKE E

BARTHLLOTT, 2005) e a alteração da pluviosidade em função da transformação do

uso do solo (OLIVEIRA et al., 2007). Um método baseado nessas duas referências

foi escolhido devido à escassez de dados relativos à biodiversidade no Brasil,

principalmente sobre a flora e os invertebrados, que possuem um grande número de

espécies, mas em menor grau de conhecimento em relação aos vertebrados

terrestres (IBGE, 2010). Um grande esforço de pesquisa se faz necessário para que

melhor se possa avaliar a biodiversidade e as ameaças a mesma no Brasil (IBGE,

2010).

No trabalho de Rocha e Ugaya (2010), foi proposta uma metodologia por meio

da qual foram obtidos os fatores de caracterização para biodiversidade no Brasil,

permitindo uma melhor avaliação da perda da biodiversidade decorrente da

transformação do uso da Terra, mais especificamente da Floresta Amazônica para

pasto.

A referida metodologia foi desenvolvida por meio da Avaliação de Impacto do

Ciclo de Vida (AICV), uma das etapas da ACV em que os resultados do Inventário

do Ciclo de Vida – ICV (etapa anterior) são convertidos em impactos, a fim de

melhor compreender a sua significância ambiental (ISO 14044, 2006). A AICV é uma

abordagem relativa baseada em uma unidade funcional, que pode utilizar

informações coletadas por outras técnicas, tais como a avaliação de impacto

ambiental (ISO 14044, 2006).

Para uma melhor avaliação do impacto ambiental decorrente do ciclo de vida

do biodiesel de soja, é importante prover meios para permitir a análise da perda da

biodiversidade.

Este trabalho é dividido em três capítulos. O Capítulo I apresenta uma

introdução geral. O Capítulo II apresenta uma breve revisão bibliográfica com a

12

finalidade de harmonizar conceitos importantes da ferramenta Avaliação do Ciclo de

Vida, bem como dos aspectos referentes ao mecanismo ambiental em questão. No

mesmo Capítulo, encontra-se a metodologia utilizada e a discussão dos resultados.

O Capítulo III apresenta as considerações finais deste trabalho.

1.1 OBJETIVOS

1.1.1 Objetivos Gerais

O objetivo geral deste trabalho é avaliar a perda de biodiversidade decorrente

da transformação do uso da terra da Floresta Amazônica para lavoura de soja.

1.1.2 Objetivos Específicos

Os objetivos específicos deste trabalho são os seguintes:

1. Avaliar a metodologia desenvolvida no trabalho de Rocha e Ugaya (2010).

2. Determinar o fator de caracterização para avaliar a perda de biodiversidade

decorrente da transformação da Floresta Amazônica para lavoura de soja, por

meio da referida metodologia.

3. Avaliar a metodologia utilizada comparando os resultados obtidos com dados

de uma série histórica de precipitação pluvial de um município da Região

Amazônica.

13

CAPÍTULO II – REVISÃO BIBLIOGRÁFICA

2 ASPECTOS GERAIS DA AVALIAÇÃO DO CICLO DE VIDA E DA AVALIAÇÃO

DO IMPACTO DO CILO DE VIDA

2.1 AVALIAÇÃO DO CICLO DE VIDA (ACV)

A ACV é uma ferramenta que permite avaliar o impacto ambiental de um

produto ou serviço, desde a extração da matéria prima até o descarte final, bem

como permite avaliar quais etapas do ciclo de vida contribuem mais

significativamente para o impacto ambiental. A utilização da ACV permite avaliar a

implantação de melhorias ou alternativas para produtos, processos e serviços.

De acordo com Coltro (2007), muitos estudos de ACV apresentavam conclusões

diferentes, apesar de serem aparentemente iguais, devido às diferenças quanto às

considerações, idade dos dados, matéria prima, matriz energética, entre outros

fatores, tornando evidente a necessidade de padronizar a metodologia de ACV,

surgindo, assim, a série de normas ISO 14040.

Conforme a ISO 14044 (2006), um estudo de ACV é dividido em quatro fases:

1. A definição do objetivo e escopo é a definição do propósito do estudo e seus

limites, envolvendo decisões importantes sobre as fronteiras e a unidade funcional.

A unidade funcional é o desempenho quantificado de um sistema de produto, ou

seja, é a unidade de referência do estudo. A fronteira do estudo define todos os

processos elementares que serão estudados.

2. A análise de inventário é um levantamento de informações sobre o sistema do

produto, no qual são quantificadas as entradas e as saídas consideradas relevantes

para o sistema. Sistema de produto é o conjunto de processos elementares, com

fluxos elementares e de produto, desempenhando uma ou mais funções definidas e

que modela o ciclo de vida de um produto.

3. Na avaliação de impacto, os dados e as informações do inventário são

associados a impactos ambientais específicos, de modo que os significados destes

impactos potenciais possam ser avaliados de forma quantitativa.

4. Na fase de interpretação, os resultados obtidos nas fases de análise de

inventário e de avaliação de impacto são combinados e interpretados de acordo com

14

os objetivos definidos previamente no estudo.

2.2 CONCEITOS UTILIZADOS NA AVALIAÇÃO DO IMPACTO DO CICLO DE

VIDA (AICV)

Este trabalho foi desenvolvido por meio de uma das etapas da ACV, a

Avaliação de Impacto do Ciclo de Vida (AICV), em que os resultados da etapa

anterior (Inventário do Ciclo de Vida – ICV, que é o levantamento das entradas e

saídas de um sistema de produto ao longo de seu ciclo de vida) são convertidos em

impactos, com a finalidade de melhor compreender a significância ambiental do

objeto de estudo (ISO 14044, 2006).

Para uma melhor compreensão da AICV é necessário abordar com mais

detalhes os conceitos de categoria de impacto e indicador de categoria.

2.2.1 Categoria de Impacto

Categoria de impacto é a classe que representa as questões ambientais

relevantes associadas aos resultados da análise do inventário do ciclo de vida (ISO

14044,2006).

De acordo com Souza (2010), é possível adotar duas denominações para

categoria de impacto, dependendo da posição do indicador de categoria no

mecanismo ambiental: “midpoint category”, ou categoria de ponto médio, se o

indicador estiver definido próximo aos resultados do ICV; “endpoint category”, ou

categoria de ponto final, se o indicador estiver próximo aos danos causados a

determinada área de proteção.

As categorias de impacto intermediário (ou de ponto médio) podem ser

globais, regionais ou locais. Assim, “mudanças climáticas” e “redução dos recursos

abióticos” são exemplos de categoriais globais; “”eutrofização”, “toxicidade humana”

e “uso da terra” são exemplos de categoriais regionais/locais. As categoriais de

impacto de ponto final são as áreas de proteção que irão sofrer as consequências

finais de algum impacto intermediário causado ao meio ambiente (SOUZA, 2010).

15

São exemplos de categorias de impacto de ponto final a “saúde humana” e a

“biodiversidade”.

2.2.2 Indicadores de Categoria

Um indicador de categoria é a representação quantificável de uma categoria

de impacto, que estabelece a conexão entre os resultados do ICV e os fatores de

caracterização (ISO 14044, 2006). Da mesma forma que as categorias de impacto,

os indicadores também podem receber as denominações de “indicadores de impacto

intermediário ou ponto médio” e “indicadores de impacto de ponto final” (SOUZA,

2010).

2.3 AVALIAÇÃO DO IMPACTO DO CICLO DE VIDA

A AICV é uma abordagem relativa baseada em uma unidade funcional, que

pode utilizar informações coletadas por outras técnicas, tais como a avaliação de

desempenho ambiental, a avaliação de impacto ambiental e a avaliação de risco

(ISO 14044, 2006).

Esta fase também inclui a coleta de resultados dos indicadores para as

diferentes categorias de impacto, que em conjunto representam o perfil de AICV

para o sistema de produto. A AICV consiste em elementos obrigatórios e opcionais

(ISO 14044,2006).

Os elementos obrigatórios da AICV são (ISO 14044,2006):

• Seleção das categorias de impacto, indicadores de categoria e modelos de

caracterização;

• Correlação dos resultados do ICV às categorias de impacto selecionadas

(classificação);

• Cálculo dos resultados dos indicadores de categoria (caracterização).

A categoria de impacto a ser selecionada deve refletir um conjunto

abrangente de questões ambientais relacionadas ao sistema de produto em estudo.

16

É necessário descrever o mecanismo ambiental e o modelo de caracterização que

correlacionam os resultados do ICV ao indicador de categoria (que fornecem uma

base para os fatores de caracterização). O modelo de caracterização reflete o

mecanismo ambiental, descrevendo a relação entre os resultados do ICV e

indicadores de categoria, sendo também utilizado para gerar os fatores de

caracterização. O mecanismo ambiental é o somatório dos processos ambientais

relacionados à caracterização dos impactos (ISO 14044, 2006).

Na classificação, os resultados do ICV são correlacionados à categoria de

impacto; na caracterização, ocorre a conversão dos dados do ICV para unidades

comuns e agregação dos resultados convertidos dentro da mesma categoria de

impacto, a fim de se obter um resultado numérico do indicador; a conversão envolve

fatores de caracterização e os elementos obrigatórios da AICV encerram nesta

etapa (ISO 14044, 2006).

Por exemplo, para a categoria de impacto “mudanças climáticas”, o modelo

de caracterização pode ser o modelo de linha de base para 100 anos do Painel

Intergovernamental Sobre Mudanças Climáticas – IPCC; o indicador de categoria é o

forçamento radioativo infravermelho (W/m²), que representa os efeitos potenciais

sobre o clima, dependendo da adsorção cumulativa de calor pela atmosfera causada

por emissões e da distribuição da absorção de calor ao longo do tempo; o fator de

caracterização é o potencial de aquecimento global para cada gás de efeito estufa

(resultados do ICV são as kg CO2-equivalente/kg gás); os resultados do ICV são as

quantidades de gases de efeito estufa por unidade funcional; e o resultado do

indicador de categoria é dado em kg CO2-equivalente por unidade funcional (ISO

14044, 2006).

Assim, 1 kg de óxido nitroso (N2O) é equivalente a emissão de 296 kg de

dióxido de carbono (CO2) e 1 kg de metano (CH4) é equivalente a 23 kg de CO2;

então, somam-se todos os parâmetros incluídos na categoria de impacto e obtém-se

o resultado da categoria de impacto (COLTRO, 2007).

Os elementos opcionais da AICV consistem na normalização, no

agrupamento, na ponderação e na análise da qualidade dos dados.

17

2.4 INDICADORES DE QUALIDADE DO USO DA TERRA

Para avaliar a qualidade do uso da terra são definidos indicadores que

permitem avaliar os impactos causados pelos processos de ocupação e

transformação da terra (SOUZA, 2010).

Para impactos intermediários, podem-se citar como indicadores de

biodiversidade regional/local: riqueza de espécies, espécies ameaçadas de extinção;

plantas vasculares; diversidade de espécies; e dados de listas vermelhas de

espécies em extinção (SOUZA, 2010).

Para impactos de ponto final, o mais utilizado atualmente é o PDF (Potentially

Disappeared Fraction), que expressa os efeitos ocasionados em populações de

plantas vasculares em uma área. O PDF é definido pela fração de espécies com alta

probabilidade de não ocorrer em determinada região em função de condições

desfavoráveis (SOUZA, 2010).

2.5 MODELOS DE AVALIAÇÃO DE IMPACTO DO USO DA TERRA

Com a finalidade de estabelecer uma base referencial para posterior

comparação com o modelo proposto neste estudo, um breve resumo de dois

modelos de caracterização é apresentado a seguir.

2.5.1 Modelo de Weidema e Lindeijer (2001)

Weidema e Lindeijer (2001) desenvolveram um modelo propondo que a perda

de biodiversidade ocorre por meio de impactos diretos e indiretos, ou seja, o modelo

é composto de dois grupos de parâmetros, sendo um relacionado diretamente às

espécies e outro relacionado ao habitat das mesmas (SOUZA, 2010).

Em relação as classes de uso da terra, este modelo utiliza seis tipos,

conforme a Tabela 1:

18

Tabela 1. Classes de uso da terra e respectivas percentagens de redução da diversidade de espécies, após a ocupação.

Fonte: SOUZA, 2010, adaptado de Weidema e Lindeijer (2001)

Os tempos de recuperação da terra baseiam-se na recuperação da biomassa

potencial máxima, variando em função da latitude e da altitude da área

transformada, contabilizados em anos.

Em relação aos dados de espécies, estes foram obtidos do trabalho de

Barthlott et al. (1999), que fornece o número potencial de espécies de plantas

vasculares em uma área de 10.000 km², em dez zonas de diversidade. Souza

(2010), menciona que os dados são genéricos para uma grande superfície, gerando

incertezas relativamente grandes para avaliações locais/regionais. Os dados de

espécies para diversos biomas, bem como a área potencial de cada bioma, são

demonstrados na Tabela 2.

Tabela 2. Área potencial e riqueza de espécies por 10.000 km² para diferentes biomas.

Fonte: Souza (2010), adaptado de Weidema e Lindeijer (2001)

Classes de uso da terra

1. Áreas urbanas 100,00%2. Agricultura (culturas temporárias e permanentes) 33,00%

33,00%

33,00%5. Desertificação antropogênica 33,00%6. Recuperação da área desflorestada 50,00%

% de redução da biodiversidade

assumida após a ocupação

3. Pastagens em áreas de alta produtividade (florestas tropicais e temperadas)4. Pastagens em áreas de baixa produtividade (áreas de campos e florestas boreais)

Bioma

Campo/Estepe 200-1500 17,2 9

Savana 200-3000 11,5 5,4

Floresta boreal/Taiga 200-1000 25,3 20,7

Floresta de coníferas 500-1000 4,7 2,4

1000-1500 6,2 1

Floresta tropical 1500-9000 5,7 3,8

Deserto 100-200 14,2 11,6

Tundra 100-500 12,1 13,3

Áreas glaciais <100-200 6,7 6,7

Arbustos 500-4000 8,1 2,2

Riqueza de espécies do bioma

(SR)

Área potencial do bioma (Apot)

Área ocupada por atividades de uso

(Aexi)

[número de espécies/109 m²]

[1012 m²]

Floresta decídua temperada

19

O cálculo dos fatores de caracterização baseia-se na multiplicação de três

parâmetros: riqueza de espécies, escassez do ecossistema e vulnerabilidade do

ecossistema.

A riqueza de espécies (SR) significa o número de espécies por unidade de

área, normalizada (nSR) com o valor SRmin, o qual representa o número mínimo

de espécies de plantas vasculares, definido por 100 espécies por 10.000 km²,

conforme a Equação 1.

nSR=

SRSRmin Equação 1

A escassez do ecossistema (ES) significa a relação entre o bioma e a maior,

ou menor, estrutura ambiental analisada ou de características semelhantes (SOUZA,

2010), definida pelo inverso da área potencial do ecossistema (Apot), conforme a

Equação 2. Sua normalização é expressa na Equação 3.

ES=

1Apot Equação 2

nES=

Apot,maxApot Equação 3

A vulnerabilidade do ecossistema (EV) significa a parcela do ecossistema

ocupada por atividades de uso da terra (Aexi) diferentes do estado natural, em

relação a sua área potencial, cuja relação normalizada é expressa na Equação 4.

nEV=( Aexi

Apot )( z−1 )

Equação 4

Enfim, conforme mencionado anteriormente, o cálculo da perda de

biodiversidade (Qbiod) é dado pela multiplicação dos três parâmetros, conforme a

Equação 5, em que “a”, “b” e “c” são os pesos atribuídos a cada fator e os autores

atribuem o mesmo peso a todos os fatores, que é igual a 1

20

Qbiod = nSRa.nESb.nEVc Equação 5

2.5.2 Modelo de Schmidt (2008)

Schmidt (2008) desenvolveu um modelo de caracterização cujo indicador é a

diversidade de plantas vasculares, relacionando espécies e área. Os fatores de

caracterização são propostos para a Dinamarca, extrapolando os dados o norte da

Europa, Malásia e Indonésia, conforme os diferentes tipos de uso da terra.

As classes de uso da terra são: terras produtivas (terra arável para cultivo,

florestas cultivadas, agro-silviculturas); terras não produtivas (áreas naturais); e

terrenos impermeabilizados.

O tempo de recuperação (trec) utiliza os valores propostos por Köllner (2003),

trec.K, bem como o fator de relaxamento (trelax) cujo valor de referência é igual a 100

para o norte da Europa. Para os países asiáticos, o fator de relaxamento1 é corrigido

em relação ao fator europeu. O cálculo do tempo de recuperação é realizado de

acordo com a Equação 6.

trec=trec . K .

trelaxtrelaxN−Europa Equação 6

Quanto aos dados de espécies, o autor utiliza a relação espécie-área também

proposta por Köllner (2003) para cada região e tipo de uso da terra. Os dados

referentes a riqueza de espécies em diferentes tipos de uso da terra são plotados

em curvas de espécie versus área, cuja área padrão de 100 m², sendo a relação

estabelecida no ponto de inflexão da linha de regressão linear (SOUZA, 2010).

Neste modelo o indicador também é calculado multiplicando-se parâmetros,

que neste caso são os seguintes: área ocupada; número de espécies afetadas (em

100 m²); vulnerabilidade do ecossistema; e duração da ocupação e recuperação da

terra.

O fator de vulnerabilidade (b/LI) significa a derivada do número de espécies,

calculado utilizando a curva de espécies versus área (S = a . Ab), normalizado com o

1 Fator de relaxamento é a constante de tempo exponencial do retorno ao equilíbrio de um sistema após uma perturbação.

21

número de espécies da região em questão. O fator de vulnerabilidade é calculado

conforme a Equação 7, em que b é o fator de acumulação de espécies para uma

área relativa com baixa intensidade de uso da terra (LI) e c é o parâmetro de riqueza

de espécies.

(dSregion /dLI )

Sregion=

bcLI ( 1−b)

cLI b=

bLI Equação 7

Para calcular os fatores de caracterização, o autor utiliza formas de cálculo

diferentes para ocupação e transformação, conforme as Equações 8 e 9,

respectivamente, em que S100 é a diversidade de espécie em uma área de 100 m². O

fator de caracterização é calculado subtraindo-se dos valores do estado de

referência dos valores do uso da terra em questão.

CFoc=(S100 .

bLI )ref . state−(S100 .

bLI )

Equação 8

CFtrans=

12

.(S100 .bLI ) .trec

Equação 9

2.5.3 Avaliação Crítica dos Métodos

Weidema e Lindeijer (2001) incluíram no seu modelo de caracterização os

parâmetros de escassez e vulnerabilidade do ecossistema, os quais permitem uma

avaliação mais sensível da perda de de biodiversidade. Por outro lado, os dados

referentes à riqueza de espécies são muito genéricos para uma grande área, fato

que aumenta as incertezas do método.

Schmidt (2008) desenvolveu um modelo de caracterização em que os fatores

de caracterização são propostos para a Dinamarca, extrapolando os dados o norte

da Europa, Malásia e Indonésia, conforme os diferentes tipos de uso da terra. No

entanto, extrapolar dados para biomas tão diferentes pode aumentar as incertezas

do método.

22

3 ASPECTOS CONCEITUAIS DO MECANISMO AMBIENTAL

3.1 CICLOS BIOGEOQUÍMICOS

O conhecimento dos mecanismos dos ciclos biogeoquímicos é essencial para

o desenvolvimento de estratégias sustentáveis de desenvolvimento, visto que a ação

antropogênica no ambiente afeta diretamente estes ciclos, ocasionando mudanças

que podem vir a ser irreversíveis. Por meio dos estudos destes ciclos realizado ao

longo de anos, foram detectadas mudanças significativas nos ciclos do carbono e da

água que poderão afetar o futuro da humanidade (ODUM, 1988).

De acordo com Odum (1988), dos elementos químicos conhecidos na

natureza, cerca de quarenta elementos são essenciais aos seres vivos, os quais

circulam na biosfera entre os compartimentos (pools) abióticos e a biomassa animal

e vegetal. Segundo Braga et al. (2005), esse processo de reciclagem da matéria é

muito importante, uma vez que os recursos na Terra são finitos e a vida depende do

equilíbrio natural desses ciclos. As vias características de circulação dos elementos

essenciais na biosfera são chamadas ciclos biogeoquímicos.

Os ciclos da água e do carbono, além de serem considerados os mais

importantes para a humanidade, possuem pools atmosféricos pequenos, porém

muito ativos, o que os torna muito vulneráveis às perturbações antropogênicas,

podendo levar às mudanças no tempo e no clima (ODUM, 1988).

O controle e o monitoramento de poluição ou o estabelecimento de técnicas

de manejo sustentado de ecossistemas são aplicações do estudo quantitativo dos

ciclos biogeoquímicos (PINTO-COELHO, 2000).

O ciclo da água é caracterizado por um depósito atmosférico pequeno, mas

muito dinâmico, e é responsável pela caracterização dos diversos climas terrestres.

No ciclo hidrológico propriamente dito, os fenômenos básicos são a evaporação e a

transpiração (PINTO-COELHO, 2000).

O ciclo da água tem início com a incidência da radiação solar sobre a terra

que provoca a evaporação nos corpos d’água e em parte da água presente no solo.

Por meio da transpiração de plantas e animais, bem como da sublimação das

geleiras, a água é transferida da superfície terrestre para a atmosfera. A partir dessa

fase, a água se encontra no estado gasoso e é transportada pelas massas de ar

23

para as regiões mais altas da atmosfera; quando este vapor é submetido a baixas

temperaturas ele se condensa e se liquefaz, originando as nuvens e,

consequentemente, ocorre a precipitação; assim, a água retorna à superfície

terrestre (ODUM, 1988). Neste contexto, os estudos referentes ao ciclo da água das

bacias hidrográficas podem fornecer uma base para comparação entre bacias

hidrográficas ocupadas e transformadas pelo homem, o que pode apontar meios de

se restaurar o comportamento cíclico dos nutrientes vitais (ODUM, 1988).

Conforme Odum (1988), as florestas tropicais possuem mecanismos de

reciclagem conservadores de nutrientes conforme a geologia e a fertilidade básica

do local. Grandes áreas de florestas tropicais, como ocorrem na maior parte da

Bacia Amazônica oriental e central, situam-se em solos antigos pré-cambrianos

altamente lixiviados ou sobre depósitos arenosos oligotróficos e, mesmo assim,

sustentam florestas viçosas e produtivas. Ou seja, o ecossistema tropical oligotrófico

é capaz de manter uma alta produtividade através de vários mecanismos

conservadores de nutrientes que produzem uma “ciclagem direta” de planta em

planta, mais ou menos sem passar pelo solo. Quando a floresta é removida estes

mecanismos são interrompidos, afetando os ciclos biogeoquímicos

consideravelmente.

3.2 MECANISMO AMBIENTAL – RELAÇÃO ENTRE CONVERSÃO DO USO

DA TERRA, PLUVIOSIDADE E BIODIVERSIDADE

De acordo com a ISO 14044 (2006), um indicador de categoria deve atender

aos seguintes requisitos:

1. deve ser ambientalmente relevante;

2. deve ser capaz de refletir as consequências dos resultados do ICV sobre os

pontos finais de categoria;

3. o modelo de caracterização para o indicador de categoria deve ser científica e

tecnicamente válido, bem como deve estar baseado em um mecanismo

ambiental específico e identificável e/ou em observação empírica reprodutível.

Diversos autores defendem o fato de que algumas condições meteorológicas

são alteradas quando ocorre conversão de uso da terra. Um dos parâmetros mais

24

citados é o albedo (ou coeficiente de reflexão) que é a medida da quantidade de

radiação solar refletida por uma superfície, calculado como a razão entre a radiação

solar refletida e a radiação solar incidente.

Berbet (2002) afirma que a conversão de áreas de floresta para pastagem

causa, principalmente, uma elevação no albedo da superfície, devido ao fato das

folhas das gramíneas apresentarem uma maior refletância do que as folhas das

árvores.

Lima et al. (2007), comparou o albedo de pastagem ao albedo da caatinga

visando avaliar a mudança quando a vegetação nativa é substituída e verificou que o

albedo da pastagem durante o período seco foi bem maior do que o da caatinga.

Afirma ainda que o albedo foi influenciado por características da superfície do

dossel, estado da cobertura vegetal e umidade do solo, os quais demonstraram

sofrer influência da precipitação pluviométrica. Ou seja, neste caso também foi

verificado que a precipitação pluviométrica influencia na cobertura vegetal.

Cardozo et al. (2009), afirmou que o Pantanal apresenta uma variação

significativa dos valores de albedo que ocasionam mudanças nas interações do

balanço de energia da superfície.

Oliveira et al. (2007), observou que na transformação de floresta Amazônica

para pastagem e cultivo de soja, o albedo de superfície se torna mais elevado, a

rugosidade da superfície se torna inferior a da aerodinâmica, a área foliar diminui e a

profundidade de enraizamento é mais rasa, em comparação com a floresta; estes

fatores contribuem para a redução da evapotranspiração.

Couto (2009), ao propor evidenciar padrões de reação da vegetação através

do albedo RFA (radiação fotossinteticamente ativa) e do albedo solar frente às

imposições do clima do Cerrado, observou que o clima apresentou influência

marcante sobre a vegetação. O albedo RFA apresentou valores máximos no final da

estação seca (período de maior estresse hídrico da vegetação) e valores mínimos

no final da estação chuvosa. Além disso, o autor considerou que a precipitação

(associada à umidade do solo e à umidade atmosférica) seja o principal fator

condicionante da vegetação.

Desta forma, observa-se que a transformação dos biomas brasileiros referidos

acima, para outro uso da terra, diminui a precipitação pluvial em função da alteração

do albedo e, que esta diminuição na precipitação condiciona a vegetação, levando

25

até a perda de espécies mais sensíveis ao estresse hídrico. Portanto, pode-se

considerar que o albedo também pode ser estudado como um indicador (de ponto

médio) da categoria perda de biodiversidade, visto que, de acordo com a ISO 14044

(2006), o indicador de categoria pode ser escolhido em qualquer ponto do

mecanismo ambiental, entre os resultados do ICV e o ponto final de categoria.

Nobre et al. (2007) afirmam que se houver redução de precipitações na

Amazônia, induzidas pelas mudanças climáticas globais, somada às reduções

previstas como resposta ao desmatamento, aumentaria muito a suscetibilidade dos

ecossistemas amazônicos ao fogo, causando a redução das espécies menos

tolerantes à seca, podendo até induzir uma “savanização” de partes da Amazônia,

com previsão de que, para o período 2020-2029, cerca de 3,1% da floresta tropical

seria substituída por savana.

Conforme Mutke e Barthllott (2005) é possível correlacionar padrões de

diversidade de plantas vasculares com diferentes medidas de geodiversidade

(diversidade de parâmetros abióticos, como topografia, clima ou terras). Uma

correlação mais forte de parâmetros climáticos e diversidade de espécies pode ser

encontrada onde há pelo menos um importante fator limitante, tal como energia ou

água. Os autores apresentaram uma correlação entre o número de espécies em

determinada área e o número máximo de dias com precipitação maior que 0,1 mm

na América do Sul (Figura 1).

Figura 1 - Correlação entre o número de espécies em determinada área e o número máximo de dias com precipitação maior que 0,1 mm na América do Sul. Fonte: Mutke e Barthlott (2005)

26

A Equação 10 fornecida por esta correlação é utilizada nos cálculos dos

fatores de caracterização do presente trabalho.

y = 8,648.x1,1094 Equação 10

Sendo “y” o número de espécies em uma área de 10.000 km² (106 ha) e “x” o

número máximo de dias com precipitação maior que 0,1 mm.

27

4 METODOLOGIA

4.1 AVALIAÇÃO DO MÉTODO DE DETERMINAÇÃO DE FATORES DE

CARACTERIZAÇÃO

Para facilitar a compreensão do método de determinação dos fatores de

caracterização proposto por Rocha e Ugaya (2010), primeiramente foram realizados

os cálculos referentes a transformação da floresta Amazônica para pasto, os quais

foram avaliados e discutidos, a fim de testar a metodologia. Finalmente, foram

determinados os fatores de caracterização para avaliar a perda de biodiversidade

decorrente da transformação da floresta Amazônica para lavoura de soja,

cumprindo, assim, o objetivo geral deste estudo.

A Figura 2 apresenta um resumo do Modelo de Caracterização, que parte da

intervenção aos danos, passando pelos impactos intermediários.

Ponto Médio Ponto Final

Intervenção Impactos Intermediários Diretos

Impactos Intermediários Conceituais

Danos

Uso da Terra(transformação e ocupação)

Perda de espécies locaisOcupação da terraAlteração do albedo

Redução da precipitação pluvial Perda de espécies de plantas vasculares menos resistentes ao estresse hídrico

Figura 2. Modelo de Caracterização

Como intervenção para a perda de biodiversidade resultante da

transformação do uso da terra, tem-se como entrada informações de transformação

e ocupação da terra. Estas intervenções causam como impactos intermediários

diretos a perda de espécies locais e a alteração do albedo, o qual varia de acordo

com o tipo de ocupação da terra. Como impacto intermediário conceitual, o modelo

propõe que a alteração do albedo é um dos principais fatores que pode provocar

redução da precipitação pluvial, conforme é evidenciado nos cálculos adiante.

Assim, as espécies de plantas vasculares mais sensíveis ao estresse hídrico tendem

a desaparecer, como impacto final do mecanismo apresentado.

28

É importante destacar que este método baseia o cálculo dos fatores de

caracterização apenas no parâmetro riqueza de espécies e não considera o tempo

de recuperação da terra.

A metodologia utilizada envolve coleta, análise e processamento de dados

para a determinação dos fatores de caracterização. De acordo com a ISO 14044

(2006), a caracterização envolve a conversão dos dados do ICV para unidades

comuns e agregação dos resultados convertidos dentro da mesma categoria de

impacto, a fim de se obter um resultado numérico do indicador. A conversão

envolve: fatores de caracterização; o método de cálculo documentado e justificado.

Portanto, para desenvolver o cálculo dos fatores de caracterização, foi

necessário coletar dados referentes à transformação do uso da terra, ao número de

espécies de plantas vasculares, bem como consultar a literatura sobre a precipitação

pluvial média anual e o número de dias do ano com precipitação pluvial nas regiões

de estudo. Na sequência, o mecanismo ambiental juntamente com os cálculo

utilizados para determinação dos fatores de caracterização são descritos.

4.1.1 Classificação do Uso da Terra

Com a finalidade de determinar a classificação do uso da terra, houve a

necessidade de selecionar uma das formas existentes de classificação, sendo que

uma das mais utilizadas é a base europeia Corine.

A Fundação Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) desenvolveu

um mapeamento de uso da terra para o Brasil, com referência à base europeia

Corine (SOUZA, 2010). No entanto, ambas não foram escolhidas por apresentarem

nomenclaturas genéricas para os tipos de uso da terra, ao contrário do ecoinvent,

que apresenta nomenclaturas mais específicas para os tipos de uso da terra

abordados no presente estudo.

Portanto, conforme a classificação do ecoinvent, as classes de uso da terra

aqui estudadas são: floresta tropical; terra arável, não-irrigada, intensiva; pecuária

extensiva.

Conforme o ecoinvent, o uso do solo provoca impacto principalmente nas

seguintes áreas de proteção: recursos naturais, ambiente natural e ambiente

29

antrópico. Esses impactos são classificados em quatro grupos: aumento da

concorrência da terra; degradação da biodiversidade; degradação das funções de

suporte de vida; a degradação dos valores culturais. A metodologia utilizada no

banco de dados ecoinvent concentra-se no impacto “degradação da biodiversidade”.

4.1.2 Transformação do Uso da Terra

Foram utilizados os dados do Censo Agropecuário 2006 do Instituto Brasileiro

de Geografia e Estatística (IBGE) para obtenção da variação anual da transformação

da terra, de floresta para pasto, dentro de uma série histórica de 36 anos. Foram

considerados os Estados brasileiros que possuem parcela significativa do bioma em

questão. A Tabela 3 mostra o percentual de transformação do solo em cada série de

5 anos; a taxa percentual de variação de transformação entre cada série de 5 anos;

a média da taxa percentual de transformação sofrida a cada ano.

Tabela 3 – Transformação do uso da terra: Floresta Amazônica para pastoTransformação ∆% ∆%/ano

1975-1980 -14,58 -0,029161980-1985 18,73 0,037461985-1995 31,06 0,031061995-2006 43,67 0,03970

Taxa de transformação média anual: 0,01977 Fonte: IBGE (2007b).

4.1.3 Biodiversidade na Floresta Amazônica

Em relação ao número de espécies de plantas vasculares, Silva (2005) afirma

que a Floresta Amazônica abriga 5.000 espécies de árvores e pode ter até 300 tipos

de árvores por hectare.

É importante mencionar que esses números são apenas estimativas, pois

ainda não há um levantamento do número exato de espécies presentes no referido

bioma. Portanto, esses números podem ser diferentes, maiores ou menores que os

valores citados.

30

4.1.4 Cálculo da Precipitação Pluvial na Região Amazônica

Quanto à precipitação pluvial, a região Amazônica apresenta precipitação

média de 2300 mm anuais. No entanto, esse valor não é uniforme e apresenta

variações entre as porções oriental, central e ocidental da região (NASCIMENTO e

MASCARENHAS JÚNIOR,2010). Conforme Mendes (1998), a região costeira da

Bacia Amazônica possui precipitação média anual superior a 2600 mm/ano, com

frequência média de dias com precipitação superior a 200 dias/ano; a região central

da Bacia Amazônica possui média anual de 160 dias/ano de chuva; a região oeste

da Amazônia possui precipitação média anual de 3000 mm/ano, com a média de

dias com chuva superior a 200 dias/ano. Portanto, estima-se que média de dias com

precipitação na Amazônia é em torno de 200 dias por ano.

Para descrever o mecanismo ambiental bem como apresentar o cálculo dos

fatores de caracterização, de acordo com Tucci e Beltrame (2009), as variáveis

meteorológicas que interferem na evaporação são a radiação solar, a temperatura

do ar, o vento e a pressão de vapor. Existem vários métodos para determinar a

evaporação, como transferência de massa, balanço de energia, equações empíricas,

balanços hídricos e evaporímetros.

Para realizar os cálculos referentes à variação da precipitação pluvial, foi

realizada uma coleta de dados climáticos que representam as condições médias dos

biomas em questão, conforme a Tabela 4.

Tabela 4 – Dados meteorológicos da Amazônia

Parâmetro Meteorológico Símbolo Unidade Floresta Pasto Fonte

Radiação efetiva qef mm/dia 5,69 5,21654 calculado*Calor latente de vaporização por unidade de massa L cal/(cm².mm) 59 59

Tucci e Beltrame (2009)

Radiação no topo da atmosfera Rt cal/cm².dia 841,16 841,16Tucci e Beltrame

(2009)**

Radiação incidente de onda curta G cal/cm².dia 465,33 465,33 calculado*

Parcela de albedo a 0,13 0,19 Oliveira et al. (2007)

Temperatura média anual T ºC 28,14 28,14Banco de dados do

INPETemperatura absoluta da superfície de radiação T K 301,14 301,14 calculado*

Umidade relativa do ar U % 83,44 83,44Banco de dados do

INPE*Número efetivo de horas de brilho solar n h 6,49 6,49

Pachêco e Bastos (2007)

31

Número máximo de horas de brilho solar N h 12,12 12,12 Montalvão (2005)Número real de horas de incidência solar dividido pelo número de horas possíveis p 0,54 0,54 calculado*

Velocidade do vento W2 m/s 1,14 3,05 Fisch et al. (1997)

Constante de Stefan-Boltzmanσ

cal/cm².dia 1,19 x 10-7 1,19 x 10-7 Tucci e Beltrame

(2009)

Tensão parcial de vapor de água ea mmHg 23,84 23,84 calculado*

Tensão de vapor saturado es mmHg 28,57 28,57 calculado*

Evapotranspiração E mm/dia 4,78 4,42 calculado*Evapotranspiração nas condições isotérmicas Ei mm/dia 1,67 1,69 calculado*Volume total escoado pelo curso de água principal da bacia Q mm/ano 1250 1250 Ferreira et al. (1998)Coeficiente dependente da temperatura média diária do ar

∆/γ 3,42 3,42 calculado*

*Cálculos demonstrados na sequência.**Valor médio da Latitude -4º, conforme a tabela de SHAW e NAPIER in TUCCI e BELTRAME (2009).

Conforme Tucci e Beltrame (2009), evapotranspiração é considerada como

perda de água por evaporação do solo e transpiração da planta, sendo importante

para o balanço hídrico de uma bacia. O balanço hídrico em uma bacia envolve

quantificar as macrovariáveis e seu comportamento ao longo do tempo. Dentro de

uma macroanálise, podem-se estudar os seguintes fatores de uma bacia:

precipitação, umidade do solo, evaporação e vazão.

Para calcular o índice pluviométrico (P) anual (mm/ano) sobre uma bacia

hidrográfica, bem como a redução do número de espécies de plantas vasculares em

função da redução da precipitação pluvial, foram utilizadas as equações mostradas

na Tabela 5.

Tabela 5. EquaçõesEquação Fonte

Equação 10 y = 8,648.x1,1094 Mutke e Barthllott (2005)Equação 11 E = P - Q Garcez e Alvarez (1998)Equação 12 E0 (mm/dia) = (∆/γ.qef/L + Ei) / (∆/γ + 1) Tucci e Beltrame (2009)Equação 13 ∆/γ = 38640 . 10 7,5T/(237,3+T)/(237,3 + T)2 Tucci e Beltrame (2009)Equação 14 qef/L = [G(1-a) – σT4 (0,56-0,09ea

1/2) (0,1 + 0,9p)] / L Tucci e Beltrame (2009)Equação 15 G = Rt (0,24 + 0,58p) Tucci e Beltrame (2009)Equação 16 ea = U. es /100 Tucci e Beltrame (2009)Equação 17 es = 4,58.107,5T/(237,3+T) Tucci e Beltrame (2009)Equação 18 Ei = 0,35 (1 + w2/160) (es - ea) Tucci e Beltrame (2009

32

A partir dos dados meteorológicos da Tabela 4, foi possível estimar a

precipitação da Bacia Amazônica para o cenário de floresta (albedo = 0,13) e para o

cenário de pastagem (albedo = 0,19). Tanto para o cenário de floresta quando para

o cenário de pastagem, foram calculados: es, ea, G e ∆/γ, utilizando as equações 17,

16, 15 e 13 da Tabela 5, respectivamente. Os resultados dos cálculos realizados são

apresentados na Tabela 6. Estes parâmetros meteorológicos coincidem para ambos

os cenários.

Tabela 6 – Resultados dos cálculos para ambos os cenárioses (mmHg) ea (mmHg) G (cal/cm².dia) ∆/γ

28,57 23,84 465,33 3,42

Utilizando os dados da tabela 4 específicos para cada classe de uso da terra,

foram calculados qef/L, Ei e E0 e P, utilizando as equações 14, 18, 12 e 11,

respectivamente para a) cenário de floresta e b) cenário de pastagem. Os resultados

dos cálculos são apresentados a seguir na Tabela 7.

Tabela 7 – Resultados dos cálculos para os cenários de floresta e pastagem.qef/L

(mm/dia)Ei

(mm/dia)E0

(mm/dia)E*

(mm/ano)P

(mm/ano)a) Cenário de Floresta 5,68976 1,66729 4,77969 955,94 2205,94b) Cenário de Pastagem 5,21654 1,68705 4,41801 883,60 2133,60

*Considerando 200 dias de precipitação.

A partir dos valores de precipitação obtidos, é possível estimar a perda de

biodiversidade de plantas vasculares quando há transformação de uso do solo de

floresta para pasto. Se a precipitação é de 2205,94 mm em 200 dias, substituindo

este valor em “x” na equação 10, têm-se y = 3088 espécies de plantas vasculares,

para o cenário de floresta. Se a precipitação é de 2133,60 mm em 193 dias,

substituindo este valor em “x” na equação 1, têm-se y = 2968 espécies de plantas

vasculares, para o cenário de pastagem.

Calculando-se a diferença entre os números de espécies, estima-se que a

diferença de um cenário para o outro é de 120 espécies de plantas vasculares em

uma área de 10.000 km² (106 ha), ou 1,2.10-4 espécies por hectare. Considerando-se

que a taxa de transformação da terra anual é de 0,01977% e que a área total da

Amazônia brasileira é de 3.800.000 km² (3,8.108 ha), estima-se que

aproximadamente 9 espécies de plantas vasculares são perdidas por hectare, por

33

ano, quando ocorre a transformação do uso da terra da floresta Amazônica para

pasto.

Desta mesma forma, é possível determinar o fator de caracterização para

avaliar a perda de biodiversidade decorrente da transformação da floresta

Amazônica para lavoura de soja.

4.2 AVALIAÇÃO DO MÉTODO

Conforme mencionado anteriormente, primeiramente foi realizada uma

avaliação do modelo de caracterização proposto para transformação da floresta

Amazônica para pasto e, em seguida, foram finalmente calculados os fatores de

caracterização para avaliar a perda de biodiversidade decorrente da transformação

da floresta Amazônica para lavoura de soja.

Desta forma, o resultado dos cálculos fornecido pelo modelo de

caracterização proposto para transformação da floresta Amazônica em pasto é

apresentado como um valor fixo de perda de espécies, o qual é multiplicado pela

área transformada anualmente, sugerindo que o comportamento deste mecanismo é

linear.

No entanto, o trabalho de Oliveira et al. (2007) demonstra que a alteração da

precipitação relativa em função da transformação do uso da terra ocorre de forma

exponencial. Foram feitas simulações para transformação de floresta Amazônica

para pasto e para lavoura de soja no Leste da Amazônia, relacionando o percentual

de área transformada e a precipitação pluvial, conforme as Figuras 3 e 4.

Observa-se que em ambos os casos, quanto maior a área convertida, maior a

redução da precipitação pluvial.

34

Figura 3 - Correlação entre o percentual de área de floresta Amazônica transformada em pasto e precipitação pluvial relativa. Fonte: Oliveira et al. (2007).

Figura 4 - Correlação entre o percentual de área de floresta Amazônica transformada em lavoura de soja e precipitação pluvial relativa. Fonte: Oliveira et al. (2007).

Das Figuras 3 e 4, temos as Equações 19 e 20, respectivamente:

P/P0 = - 0,15.A² – 0,06.A + 1,01 (R² = 0,97) Equação 19

35

P/P0 = - 0,16.A² – 0,01.A + 1,00 (R² = 0,98) Equação 20

Sendo “P/P0” a precipitação relativa e “A” o percentual de área convertida. A

Equação 19 é referente à transformação da floresta Amazônica para pasto e a

Equação 20 é referente à transformação da floresta Amazônica para lavoura de soja.

Assim, foi identificada uma forma de calcular a perda de biodiversidade

relacionando a Equação 19 ou 20 (OLIVEIRA et al.,2007) com a Equação 10

(MUTKE e BARTHLOTT, 2005). Para demonstrar esta nova proposta de cálculo de

fatores de caracterização, será utilizado o cenário de conversão de floresta

Amazônica para pasto.

Conforme os resultados obtidos anteriormente a partir das equações

empíricas e do balanço hídrico, a precipitação pluvial média anual (P0) do bioma

intacto é de 2205,94 mm/ano e o número de dias com precipitação é de 200 dias. A

precipitação (P) na área convertida para pasto é de 2133,60 mm/ano e o número de

dias com precipitação é de 193 dias.

Sendo que nas Equações 19 e 20 P/P0 é a precipitação pluvial relativa e na

Equação 10 “x” é o número de dias (d) com precipitação maior que 0,1 mm, são

feitas as seguintes relações:

dd0

=193200

=0,96

PP0

=2133,602205,94

=0,96

A partir desses valores, pode-se afirmar que é possível obter o número de

dias com precipitação para utilizar na Equação 10 a partir da Equação 19 ou 20, sem

realizar os balanços de energia e hídrico.

Mas até que ponto pode-se utilizar esta metodologia? Para uma situação

inicial de bioma intacto, a metodologia utilizada fornece o número de 3088 espécies

de plantas vasculares. Como mencionado anteriormente, Silva (2005) afirma que a

Floresta Amazônica abriga 5.000 espécies de árvores e pode ter até 300 tipos de

árvores por hectare, lembrando que estes números são apenas estimativas. No

entanto, para haver coerência nos resultados, deve-se utilizar o resultado dos

cálculos para a situação inicial (3088 espécies), bem como para prever o número de

36

espécies perdidas ao longo do aumento da área transformada, desde que não

exceda o número de 3088 espécies.

Além disso, observa-se que a redução da pluviosidade ocorre

aproximadamente a partir de 15% de transformação do uso da terra da floresta para

pasto e a partir de, aproximadamente, 22% de transformação do uso da terra para

lavoura de soja. Com áreas transformadas menores que as referidas, observa-se um

ligeiro aumento na pluviosidade. Uma simulação utilizando as Equações 10 e 19 é

apresentada na Tabela 8.

Tabela 8 – Simulação de perda de espécies na transformação de Floresta Amazônica para pasto.

Nesta simulação, para obter P/P0 foi utilizada a Equação 19 e, a partir de P/P0,

obteve-se d. A área total transformada foi obtida multiplicando-se o percentual de

conversão pela área total da Amazônia brasileira (3,8.108 ha).

Para obter o número de espécies perdidas, foi necessário calcular o número

de espécies obtida pela Equação 10 para o número inicial de dias com chuva, d1, e

para o número de dias com chuva após a transformação, d2, calculando-se a

diferença entre os dois resultados, conforme a Equação 21.

y = [(8,648.d11,1094) – (8,648.d21,1094)] Equação 21

Sendo “y” o número de espécies. Como neste caso o resultado desta

subtração é o número de espécies perdidas para 106 hectares (10.000 km²),

multiplica-se o resultado por 10-6, para obter-se o número de espécies perdidas por

hectare. A seguir, multiplica-se pela diferença de área transformada, obtendo-se um

número de espécies perdidas, somando-se, enfim, ao valor de número de espécies

perdidos na primeira situação de transformação e assim por diante.

Bioma Uso da terra d

Pasto

15 0,9976

200

199,53 5,70E+007 46420 0,9920 198,40 7,60E+007 83025 0,9856 197,13 9,50E+007 1244

30 0,9785 195,70 1,14E+008 170735 0,9706 194,13 1,33E+008 2218

40 0,9620 192,40 1,52E+008 2777

% Conversão P/P

0d

0

Área total transformada

(hectares)

Nº total de espécies perdidas

Floresta Amazônica

37

Os resultados da Tabela 8 permitem estabelecer uma relação entre o

percentual de transformação do uso da terra e o número de espécies perdidas,

como mostra o Gráfico 1, elaborado por meio do programa Qti Plot.

Gráfico 1 – Relação entre o percentual de transformação do uso da terra e o número de espécies de plantas vasculares perdidas.

A partir do Gráfico 1, pode-se observar que quanto maior a área de floresta

transformada em pasto, maior o número de espécies perdidas. É importante

destacar que a simulação para 40% de área transformada fornece o valor de 2777

espécies perdidas, valor que representa quase 90% do número total de espécies

(3088), de acordo com esta metodologia. Cabe ressaltar que esta metodologia ainda

não considera o tempo de recuperação da terra.

Utilizando esta metodologia de cálculo, pode-se estimar o número de

espécies de plantas vasculares perdidas para o cenário de transformação do uso da

terra da floresta Amazônica para lavoura de soja.

4.3 TRANSFORMAÇÃO DO USO DA TERRA DA FLORESTA AMAZÔNICA

PARA LAVOURA DE SOJA

A partir da Equação 20 e da mesma metodologia de cálculo empregada na

transformação da floresta em pasto, é possível estimar o número de espécies

38

perdidas quando a floresta Amazônica é transformada em lavoura de soja, em

função da redução da precipitação pluvial. Os resultados são demonstrados na

Tabela 9.

Tabela 9 – Simulação de perda de espécies de plantas vasculares na transformação de Floresta Amazônica para lavoura de soja.

Os resultados da Tabela 9 permitem estabelecer uma relação entre o

percentual de transformação do uso da terra e o número de espécies perdidas,

como mostra o Gráfico 2, elaborado utilizando o programa Qti Plot.

Gráfico 2 – Relação entre o percentual de conversão do uso do solo e o número de espécies perdidas.

Da mesma forma que o Gráfico 1, o Gráfico 2 demonstra que quanto maior a

área de floresta transformada para lavoura de soja, maior o número de espécies

perdidas. No entanto, pode-se observar que, para o mesmo valor percentual, a

Bioma Uso da terra d

Soja

15 0,9949

200

198,98 5,70E+007 99620 0,9916 198,32 7,60E+007 1210

25 0,9875 197,50 9,50E+007 147730 0,9826 196,52 1,14E+008 1795

35 0,9769 195,38 1,33E+008 216540 0,9704 194,08 1,52E+008 2587

% Conversão P/P

0d

0

Área total transformada

(hectares)

Nº total de espécies perdidas

Floresta Amazônica

39

transformação da floresta para lavoura de soja implica em uma perda muito maior

em relação à transformação para pasto, em uma situação inicial. Já para a

simulação para 40% de área transformada, tem-se o valor de 2587 espécies

perdidas, valor que representa aproximadamente 84% do número total de espécies

de plantas vasculares.

4.4 APLICAÇÃO DA METODOLOGIA EM UMA ÁREA DE ESTUDO

Para verificar se a metodologia é condizente com a realidade é necessário

comparar os dados obtidos por meio de cálculos com os dados medidos. Devem ser

relacionados os dados de pluviosidade com os dados de transformação do uso da

terra para lavoura de soja, bem como comparar os dados de pluviosidade medidos

com os dados calculados por meio da Equação 20.

Para isso, foram coletados dados referentes à área de plantio de soja, bem

como de pluviosidade de um determinado período do município de Santarém, que

pertence ao .Bioma Amazônia.

O município de Santarém, no Estado do Pará, situa-se na região do oeste do

Estado, na meso região do Baixo Amazonas, microrregião de Santarém; está na

margem direita do rio Tapajós, na sua confluência com o rio Amazonas. A

localização do município no mapa do Brasil é mostrada na Figura 5.

Figura 5 - Localização do município de Santarém – PA. Fonte: Site do Município de Santarém.

Os dados referentes à área de plantio de soja são dados de produção

agrícola municipal que compõem o acervo de uma série histórica do Censo

40

Agropecuário do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), disponíveis

Sistema IBGE de Recuperação Automática (SIDRA). Os dados referentes à área de

plantio de soja em Santarém, de 1999 à 2010 estão demonstrados na Tabela 10.

Tabela 10 – Área de plantio de soja no município de Santarém – PA.

Fonte: IBGE (2012)

Os dados referentes à precipitação pluvial no município de Santarém foram

coletados no Banco de dados da ANA (Agência Nacional de Águas), demonstrados

na Tabela 11. Do site oficial do município de Santarém, obteve-se o valor de

referência de precipitação pluvial média de 1920 mm/ano, assim como a área total

do município, que é de 2.288.700 hectares.

Tabela 11. Série histórica da precipitação pluvial no município de Santarém – Pará.

Fonte: Agência Nacional das Águas – ANA

Observando os valores percentuais de transformação do uso da terra, é

possível concluir que a área transformada do município é muito pequena, visto que o

plantio de soja na região ainda é muito recente em relação a outros tipos de cultivo.

Da mesma forma, observa-se que a precipitação relativa apresenta pouca variação

de um ano para o outro, o que não permite estabelecer uma comparação com os

resultados obtidos pela metodologia proposta.

Ano 1999 2000 2001 2002 2003 2004 2005 2006 2007 2008 2009 2010

620 50 25 200 4600 11000 22000 19500 15000 17250 18000 17100Área plantada

(hectares)

Ano P/P0

Referência 0 1920 1

2001 0,00109 2747,6 1,43

2002 0,00874 2349 1,22

2003 0,2 2395,4 1,25

2004 0,48 2537,3 1,32

2005 0,96 2543 1,33

2006 0,85 2896,4 1,51

2007 0,65 2075,5 1,08

2008 0,75 3054,8 1,59

2009 0,78 2826,1 1,47

2010 0,75 1822,8 0,95

Área transformada

(%.ano)Chuvas (mm/ano)

41

4.5 COMPARAÇÃO COM O MODELO DE WEIDEMA E LINDEIJER

Com a finalidade de comparar o modelo proposto com o modelo de Weidema

e Lindeijer (2001), que é um modelo internacionalmente aceito, a perda de

biodiversidade foi calculada por meio das Equações 1, 3, 4 e 5, sendo que na

Equação 4 z é igual a 0,15, conforme orientação dos autores, da mesma forma que

a = b = c = 1, na Equação 5.

A Tabela 2 apresenta os números para riqueza de espécies (SR) da floresta

tropical entre 1500 e 9000 espécies em 10.000 km². No entanto, foi necessário

escolher um valor dentro desta faixa e, portanto, nesta simulação foi escolhido o

valor de 3088 espécies, conforme o valor obtido no modelo proposto neste estudo

para melhor comparar os modelos. Os valores de Apot e Aexi também foram

retirados da Tabela 2.

Desta forma, o valor de perda de de biodiversidade (Qbiod) foi de 193 espécies

em 10.000 km², ou 1,9.10-4 espécies por hectare. A partir dos cálculos em que foram

utilizadas as equações empíricas e o balanço hídrico, o valor de perda de de

biodiversidade foi de 1,2. 10-4 espécies por hectare. Utilizando o valor obtido pelo

modelo de Weidema e Lindeijer (2001) como referencial teórico, obteve-se o erro de

36,8% do modelo proposto neste trabalho.

É importante ressaltar que para esta comparação não foi considerada a área

transformada, mas apenas o valor de perda de biodiversidade quando ocorre uma

transformação do uso da terra do bioma em questão.

42

5 RESULTADOS E DISCUSSÃO

A partir dos dados coletados para o município de Santarém, observa-se que

não é possível realizar um estudo comparativo com os resultados obtidos pela

metodologia proposta, devido aos seguintes fatores: (i) o cultivo do soja ainda é

recente na região Amazônica; (ii) a precipitação pluvial relativa possui pouca

variação no período estudado; (iii) os impactos relacionados a redução da

precipitação pluvial tem início a partir de cerca de 22% de área transformada.

Uma alternativa seria avaliar uma região maior, pois uma área maior

transformada pode fornecer informações mais precisas neste contexto. Desta forma,

seria possível avaliar o Estado do Pará, que possui 124.804.200 hectares

aproximadamente. Porém, os dados do IBGE indicam que o plantio de soja também

teve início recente, como demonstrado na Tabela 12, e o percentual de área

transformada para lavoura de soja é de 0,07% da área total, no máximo.

Tabela 12 – Área de plantio de soja no Estado do Pará.

Fonte: IBGE (2012)

Além disso, também há dificuldades na obtenção da precipitação pluvial

média anual, principalmente ao avaliar a sua variação regional, visto que o Pará

apresenta uma grande discrepância de precipitação pluvial nas suas diferentes

regiões. De acordo com Moraes et al. (2005), cerca de 50% da área do Estado do

Pará apresenta precipitação anual entre 1900 e 2400 mm e, 40% da área restante

apresenta precipitação entre 1350 e 1900 mm. Portanto, mesmo obtendo uma média

das chuvas para este Estado, os resultados ainda apresentariam uma grande

incerteza.

Diante das dificuldades, a melhor alternativa para avaliar o impacto sobre a

biodiversidade, causado pela expansão da lavoura de soja na Amazônia, seria

realizar uma estimativa a partir dos dados disponíveis e de um modelo de

caracterização, apesar da atual impossibilidade de verificação dos resultados com a

real situação.

Ano 1997 1998 1999 2000 2001 2002 2003 2004 2005 2006 2007 2008 2009 2010

575 1843 1915 2225 1005 2648 15310 35219 68410 72335 53553 71060 71410 85450Área plantada

(hectares)

43

Em relação ao modelo de caracterização proposto, ao observar que o número

de espécies perdidas resultante dos cálculos é relativamente grande, cabe ressaltar

que os valores são proporcionais a grandes áreas transformadas. Porém, a taxa

anual de transformação é baixa, conforme demonstram os dados disponíveis. Este

fato confirma que um método de estimativa de impactos ambientais ainda é a melhor

alternativa para promover tomadas de decisões e garantir proteção à biodiversidade,

antes mesmo que estes números possam vir a ser confirmados.

Em relação às incertezas, a Equação 10 fornecida pelo trabalho de Mutke e

Barthllott (2005), confere uma incerteza dos dados de número de espécies

relativamente grande em função da sua baixa correlação (R² = 0,4246). Da mesma

forma, o método de Weidema e Lindeijer (2001) utiliza os dados acerca de espécies

de Barthllott et al. (1999), que são genéricos para uma grande área. No entanto,

para ambos os casos, são os melhores dados disponíveis até o momento de suas

publicações, dentro dos contextos das propostas.

Portanto, avaliar o impacto causado sobre a biodiversidade da Floresta

Amazônica decorrente do ciclo de vida do biodiesel de soja, requer um modelo de

caracterização que permita realizar estimativas com segurança, a fim de preservar a

biodiversidade de maiores danos.

Comparando-se o modelo proposto com o modelo de Weidema e Lindeijer

(2001), foi possível observar que os valores obtidos são coerentes e que, portanto, o

modelo sugerido neste trabalho pode ser utilizado para avaliação de perda de

biodiversidade decorrente da transformação do uso da terra. No entanto, é

importante ressaltar que o modelo apresenta limitações, visto que o indicador é

baseado apenas em plantas vasculares. Além disso, são necessárias melhorias

como a inclusão de outros parâmetros, tais como a escassez e a vulnerabilidade do

ecossistema, permitindo, assim, a aproximação dos resultados com a realidade.

44

CAPÍTULO III – CONCLUSÃO

6 CONSIDERAÇÕES FINAIS

Em relação ao problema proposto, pode-se concluir que é evidente que a

expansão do biodiesel de soja no Brasil, que está estimulando a abertura de de

novas áreas para lavoura de soja na Amazônia, dentre outros fatores que estão

contribuindo para o desmatamento da região, causa um impacto significativo na

biodiversidade da floresta Amazônica.

Quanto ao modelo de caracterização proposto, observa-se que o resultado do

fator de caracterização para perda de de biodiversidade é coerente quando

comparado ao modelo de Weidema e Lindeijer (2001), apesar da atual

impossibilidade de comparação com a situação real.

Além disso, a comparação com os modelos de Weidema e Lindeijer (2001) e

Schmidt (2008), considerando que os trabalhos apresentam escopos diferentes,

nota-se que a presente proposta necessita acrescentar outros fatores que possam

melhorar a sensibilidade do método, como por exemplo, avaliar a escassez e a

vulnerabilidade do sistema, bem como incluir o tempo de recuperação da terra nos

cálculos.

Recomenda-se realizar uma comparação mais detalhada com o modelo de

Weidema e Lindeijer (2001), bem como realizar aprimoramentos no modelo para que

o mesmo possa ser utilizado para outros tipos de transformação do uso da terra. Por

exemplo, a avaliação do cultivo de palma na região Amazônica, a fim de considerar

a substituição do óleo de soja pelo óleo de palma para a obtenção de biodiesel.

Desta forma, este modelo pode ser considerado uma opção para avaliação de

impactos do uso da terra no Brasil com indicadores de biodiversidade, visto que a

avaliação da perda da biodiversidade é ainda muito limitada em estudos de

avaliação do ciclo de vida, principalmente no Brasil.

45

7 REFERÊNCIAS

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