6
II Seminário Anual de Pesquisas em Geodésia na UFRGS, 2007. 1 TOPOGRAFIA E GPS – CONQUISTAS E DESAFIOS José Luiz Fay de Azambuja 1 Marcelo Tomio Matsuoka 2 1 Universidade Federal do Rio Grande do Sul Acadêmico do Curso de Graduação em Engenharia Cartográfica Av. Bento Gonçalves, 9500, CEP 91501-970, Porto Alegre, RS [email protected] 2 Universidade Federal do Rio Grande do Sul Instituto de Geociências – Departamento de Geodésia [email protected] RESUMO O propósito do presente artigo é discorrer sobre a integração entre levantamentos topográficos planimétricos convencionais e informações obtidas através de tecnologia GPS, procurando orientar os profissionais do ramo para evitar a ocorrência de erros decorrentes do desconhecimento das particularidades teóricas e práticas de cada tecnologia de levantamento adotada. Palavras chaves: Topografia, GPS, Integração. 1. INTRODUÇÃO A crescente utilização da tecnologia GPS (Global Positioning System) em trabalhos de Topografia, tem colocado nossa comunidade tecnológica diante de desafios antes sublimados. O foco deste artigo é dissertar sobre os aspectos envolvidos na compatibilização entre as medições topográficas e pontos determinados com GPS. 2. BREVE RETROSPECTO Em passado recente, a realização de levantamentos cadastrais, fossem de natureza urbana ou rural, via de regra envolviam apenas conhecimentos relativos à área da topografia, sem a preocupação de se fazer seu referenciamento a sistemas de coordenadas planas retangulares utilizadas na cartografia convencional associadas a um Sistema de Referência Geodésico adotado oficialmente no país. Este comportamento se justificava por diversos motivos, dentre os quais podemos citar a dificuldade de realizar transporte de coordenadas de marcos de precisão, via de regra implantados em locais de difícil acesso situados a consideráveis distâncias da região onde os trabalhos eram realizados, bem como a pequena escala normalmente adotada nas cartas convencionais disponíveis em nosso país, o que induz a serem relevadas as correções nas coordenadas (na escala 1:50.000, um milímetro na carta corresponde a cinqüenta metros no terreno). Como alternativa a este procedimento de transporte de coordenadas, poderiam ser realizadas observações astronômicas para a determinação aproximada de coordenadas geodésicas, técnicas estas desconhecidas por parcela significativa dos profissionais da topografia convencional. Assim sendo, na grande maioria dos casos, os levantamentos cadastrais eram realizados utilizando-se coordenadas iniciais arbitradas pelo profissional, que tinha como padrão de qualidade obter uma boa precisão de vizinhança entre os pontos levantados, sem a preocupação de compatibilizar seus levantamentos com outros semelhantes realizados em áreas adjacentes. Como precisão de vizinhança entende-se que todos os pontos integrantes do levantamento possuam coerência entre si, não importando seu relacionamento com pontos obtidos através de poligonais implantadas em áreas localizadas em suas imediações. Cabe registrar que essas considerações não se aplicam em alguns levantamentos cadastrais realizados em grandes cidades, como é o caso de Porto Alegre, onde há muito se tem a preocupação da definição e materialização de uma base cartográfica, associada a

Azambuja+JLF e MatsuokaMT

Embed Size (px)

Citation preview

Page 1: Azambuja+JLF e MatsuokaMT

II Seminário Anual de Pesquisas em Geodésia na UFRGS, 2007.

1

TOPOGRAFIA E GPS – CONQUISTAS E DESAFIOS

José Luiz Fay de Azambuja1 Marcelo Tomio Matsuoka2

1Universidade Federal do Rio Grande do Sul Acadêmico do Curso de Graduação em Engenharia Cartográfica

Av. Bento Gonçalves, 9500, CEP 91501-970, Porto Alegre, RS [email protected]

2Universidade Federal do Rio Grande do Sul Instituto de Geociências – Departamento de Geodésia

[email protected]

RESUMO O propósito do presente artigo é discorrer sobre a integração entre levantamentos topográficos planimétricos convencionais e informações obtidas através de tecnologia GPS, procurando orientar os profissionais do ramo para evitar a ocorrência de erros decorrentes do desconhecimento das particularidades teóricas e práticas de cada tecnologia de levantamento adotada. Palavras chaves: Topografia, GPS, Integração.

1. INTRODUÇÃO

A crescente utilização da tecnologia GPS (Global Positioning System) em trabalhos de Topografia, tem colocado nossa comunidade tecnológica diante de desafios antes sublimados.

O foco deste artigo é dissertar sobre os aspectos envolvidos na compatibilização entre as medições topográficas e pontos determinados com GPS. 2. BREVE RETROSPECTO

Em passado recente, a realização de

levantamentos cadastrais, fossem de natureza urbana ou rural, via de regra envolviam apenas conhecimentos relativos à área da topografia, sem a preocupação de se fazer seu referenciamento a sistemas de coordenadas planas retangulares utilizadas na cartografia convencional associadas a um Sistema de Referência Geodésico adotado oficialmente no país.

Este comportamento se justificava por diversos motivos, dentre os quais podemos citar a dificuldade de realizar transporte de coordenadas de marcos de precisão, via de regra implantados em locais de difícil acesso situados a consideráveis distâncias da região onde os trabalhos eram realizados, bem como a pequena escala normalmente adotada nas cartas convencionais

disponíveis em nosso país, o que induz a serem relevadas as correções nas coordenadas (na escala 1:50.000, um milímetro na carta corresponde a cinqüenta metros no terreno).

Como alternativa a este procedimento de transporte de coordenadas, poderiam ser realizadas observações astronômicas para a determinação aproximada de coordenadas geodésicas, técnicas estas desconhecidas por parcela significativa dos profissionais da topografia convencional.

Assim sendo, na grande maioria dos casos, os levantamentos cadastrais eram realizados utilizando-se coordenadas iniciais arbitradas pelo profissional, que tinha como padrão de qualidade obter uma boa precisão de vizinhança entre os pontos levantados, sem a preocupação de compatibilizar seus levantamentos com outros semelhantes realizados em áreas adjacentes. Como precisão de vizinhança entende-se que todos os pontos integrantes do levantamento possuam coerência entre si, não importando seu relacionamento com pontos obtidos através de poligonais implantadas em áreas localizadas em suas imediações.

Cabe registrar que essas considerações não se aplicam em alguns levantamentos cadastrais realizados em grandes cidades, como é o caso de Porto Alegre, onde há muito se tem a preocupação da definição e materialização de uma base cartográfica, associada a

Page 2: Azambuja+JLF e MatsuokaMT

II Seminário Anual de Pesquisas em Geodésia na UFRGS, 2007.

2

uma projeção plana retangular (GAUSS-KRIEGER, UTM, etc.) relacionada a um Sistema de Referência Geodésico.

O advento do GPS, atualmente utilizado em larga escala pela comunidade tecnológica ligada ao georeferenciamento, trouxe consigo grandes vantagens as quais estão associadas três aspectos, quais sejam:

a) aumento de precisão dos levantamentos; b) maior facilidade nos procedimentos de

campo; c) economia de tempo na realização dos

levantamentos de campo. Numa análise bastante superficial, pode-se

encarar esta nova situação como altamente vantajosa em relação aos levantamentos clássicos de topografia.

No entanto, todas estas vantagens trazem consigo grandes desafios de ordem teórico, metodológico e prático, e que os técnicos por sua vez tem a responsabilidade de enfrentá-los e resolve-los.

Assim sendo, tendo presente a melhora da qualidade dos levantamentos, torna-se imperioso que os produtos cartográficos gerados a partir das informações colhidas em campo, possuam características compatíveis com a qualidade das observações.

Considerando que o produto cartográfico está normalmente associado a uma projeção plana retangular, torna-se necessário que se procedam as necessárias compatibilizações entre as observações ditas topográficas (ângulos e distâncias horizontais) e pontos cujas posições foram obtidas por levantamento com GPS.

3. MEDIÇÕES TOPOGRÁFICAS

Embora as técnicas de obtenção de dados em

topografia tenham evoluído de forma significativa ao longo das últimas décadas, com a gradual substituição das antigas trenas, teodolitos convencionais e níveis de bolha por distanciômetros, estações totais e níveis eletrônicos, os resultados dessas observações traduzem-se, resumidamente, assim como antigamente, na obtenção ao final do processo de distâncias e ângulos horizontais e diferenças de nível.

As medições topográficas de ângulo e distância horizontais, se referem à um plano topográfico local. Quando se realizam levantamentos topográficos convencionais normalmente o produto final resulta na representação gráfica da área levantada em um sistema de coordenadas plano local, definido pelo executor, ou seja, um sistema local arbitrário.

Com o advento do GPS surgiu a possibilidade de vinculação das medições topográficas com pontos obtidos por GPS, podendo obter ao final do processo pontos georeferenciados, normalmente em coordenadas UTM vinculadas ao Sistema Geodésico Brasileiro (atualmente, SIRGAS2000 e SAD-69).

O fato que preocupa é como tem sido feito esta compatibilização pela comunidade técnica em geral. O

desconhecimento pode levar à interpretações equivocadas dos resultados, como por exemplo, encontrar erros de fechamento maior do que o esperado, quando na verdade boa parcela desse erro pode ser resultado de má aplicação dos procedimentos metodológicos de cálculo. 4. POSICIONAMENTO GPS E A TOPOGRAFIA

Atualmente o uso do GPS em aplicações

topográficas é algo que está se tornando cada vez mais comum. Normalmente, o que está ocorrendo na realidade é que os usuários ao realizar um levantamento de uma área, tentam ocupar o máximo de pontos com GPS.

Porém, em alguns casos pode ocorrer que alguns pontos não podem ser ocupados por GPS. Nestes casos, usualmente se sugere realizar uma poligonal topográfica do tipo “aberta apoiada”. Neste tipo de poligonal, normalmente se inicia e termina em pontos conhecidos levantados pelo uso do posicionamento com GPS, e os pontos intermediários são levantados topograficamente a partir de medições de ângulos e distâncias horizontais, normalmente utilizando Estação Total.

Daí decorre um problema: como compatibilizar os pontos levantados com GPS com as medições de ângulos e distâncias?

Pontos levantados com GPS são determinados em principio em um Sistema de Coordenadas Cartesiano Geocêntrico vinculados a um Sistema de Referência Geodésico. Os ângulos e distâncias medidos em campo se referem a um plano topográfico local. Normalmente, muitos usuários simplesmente transformam as coordenadas cartesianas (X,Y,Z) dos pontos levantados por GPS para coordenadas no sistema de Projeção UTM (E,N) (na realidade os softwares já fazem isso automaticamente), e realizam os cálculos da poligonal topográfica sem aplicar nenhum tipo de redução nos ângulos e distâncias, ficando, desta forma, a mercê das deformações UTM. Dependendo da extensão da poligonal e, principalmente da precisão desejada e da aplicação a que se destina, este tipo de metodologia pode ser utilizada. Em muitos casos não. O mais adequado seria adotar metodologias que compatibilizassem as coordenadas de pontos GPS e as medições terrestres topográficas de ângulos e distâncias, assunto este a ser tratado no decorrer do texto.

Citando um exemplo, à guiza de curiosidade, nas proximidades do MC (Meridiano Central) nas projeções UTM (caso de Porto Alegre), a discrepância existente numa medição de distância horizontal realizada a trena ou com uma estação total em relação a uma distância calculada através de simples utilização das coordenadas UTM originárias do GPS, é de cerca de 5 cm numa distância de 100 m, discrepância esta que nos parece significativa tratando-se de levantamentos cadastrais ou verificação de poligonais. Isto tudo é claro, não levando em conta as imprecisões existentes

Page 3: Azambuja+JLF e MatsuokaMT

II Seminário Anual de Pesquisas em Geodésia na UFRGS, 2007.

3

no posicionamento GPS e na medição da distância topográfica, somente a deformação linear UTM.

As discrepâncias verificadas em decorrência da deformação linear possuem comportamento diferenciado quando se utiliza projeções UTM (projeção cilíndrica secante) e GAUSS (projeção cilíndrica tangente), sendo que na primeira as distorções diminuem para leste e oeste a partir do MC até se anularem, passando a crescer a partir do meridiano de secância, enquanto que em GAUSS estas distorções aumentam em ambas as direções a partir do MC.

Um técnico que desconhece a extensão deste problema muitas vezes se confunde diante desta aparente discrepância, sendo induzido a levantar a possibilidade do equipamento (distanciômetro ou receptor GPS) estar descalibrado; assim sendo, poderá desnecessariamente encaminhá-lo para uma assistência técnica ou, muitas vezes, equivocadamente manipular os dados para forçar a compatibilização entre os dois resultados. 4.1 Um Breve Comentário sobre Posicionamento GPS e SIRGAS2000

Antes de apresentar os detalhes metodológicos de compatibilização entre GPS e Topografia, gostaríamos de discorrer um pouco sobre um assunto que julgamos também gerar grande confusão atualmente: Como obter coordenadas em SIRGAS2000 realizando o posicionamento relativo com GPS? Não é intuito aqui, apresentar técnicas de posicionamento com GPS, e nem ajustamento de redes GPS. Aos interessados podem consultar, por exemplo, Monico (2000).

Se no processamento forem utilizadas as efemérides transmitidas, implica que as coordenadas dos satélites estão associadas ao sistema de referência WGS84. No caso do uso de efemérides precisas ao ITRF. Outro detalhe, é que os softwares de processamento não terão como opção escolher o sistema de referência SIRGAS2000, muito embora a maioria possibilite a inclusão de novos elipsóides, que no caso do SIRGAS2000 é o GRS-80, que, aliás, difere muito pouco do elipsóide do WGS84. Detalhes sobre o SIRGAS2000 podem ser obtidos, por exemplo, em IBGE (2006) e sobre o WGS84 em Monico (2000)

Um detalhe muito importante, e que muitos ainda desconhecem, é de que para fins práticos, atualmente, o SIRGAS2000 pode ser considerado como compatível ao WGS84 e ao ITRF (ver IBGE, 2006).

Uma sugestão para fazer um processamento de posicionamento relativo referenciado ao SIRGAS2000, seja em qualquer software, seria primeiramente deixar como opção o WGS84. Quando tiver que informar as coordenadas dos pontos bases (pontos de coordenadas conhecidas) coloque as coordenadas cartesianas em SIRGAS2000. Após o processamento, retirar do relatório de resultado fornecido pelo software as coordenadas cartesianas (X,Y,Z) dos pontos determinados que estarão em SIRGAS2000. Para não

correr riscos, se caso desejar obter as coordenadas em UTM e/ou coordenadas geodésicas sugere-se realizar a transformação no programa TCGEO, disponível gratuitamente no site do IBGE (Instituto Brasileiro de Estatística e Geografia). Ainda se por acaso desejar transformar de SIRGAS2000 para SAD69 pode-se utilizar o mesmo programa. Os parâmetros oficiais de transformação entre SIRGAS2000 e SAD69 e, vice-versa, podem ser obtidos em IBGE (2006). 5. INTEGRAÇÃO GPS E TOPOGRAFIA

Como dito anteriormente os pontos levantados

por GPS são obtidos primariamente em um “sistema cartesiano global geocêntrico” (X,Y,Z). Normalmente, estas coordenadas posteriormente são transformadas para coordenadas geodésicas e/ou UTM, cujas fórmulas de transformação são bastante conhecidas entre os profissionais da área da cartografia nacional, e não serão detalhados neste texto.

Por outro lado, as medidas topográficas de ângulos e distâncias horizontais são referidas a um plano topográfico local, que deveria se vincular à coordenadas de pontos em um plano topográfico local arbitrado para o cálculo da poligonal.

Uma forma de realizar a integração GPS e Topografia seria transformar as coordenadas dos pontos da poligonal levantados por GPS para um Sistema Topográfico Local (plano local) para que fiquem compatíveis com as medições terrestres de ângulos e distâncias horizontais.

Uma forma de transformar as coordenadas dos pontos GPS para um Sistema Topográfico Local seria utilizando as fórmulas apresentadas na NBR-14.166 (transformação que envolve um número grande de equações). Outra alternativa mais simples, e praticamente com resultados similares à citada acima, é transformar para um Sistema Geodésico Topocêntrico, também conhecido como Sistema Geodésico Local.

Outra metodologia que poderia ser citada é utilizar as coordenadas dos pontos levantados com GPS transformadas em coordenadas UTM, e reduzir as distâncias e ângulos horizontais para as equivalentes na projeção UTM, ou seja, aplicar as devidas reduções lineares e angulares nas observações terrestres topográficas e realizar Transporte de Coordenadas UTM. 5.1. Integração a partir de Transformação das Coordenadas dos pontos GPS 5.1.1. Transformação de Coordenadas Geocêntricas (X,Y,Z) para um Sistema Topográfico Local e vice-versa (segundo NBR-14.166)

A NBR-14.166 apresenta a transformação entre um sistema de coordenadas geodésico (latitude geodésica - ϕ, longitude geodésica -λ) para um sistema de coordenadas topográfico local (x,y). Desta forma,

Page 4: Azambuja+JLF e MatsuokaMT

II Seminário Anual de Pesquisas em Geodésia na UFRGS, 2007.

4

antes de realizar a transformação proposta, deve-se transformar as coordenadas geodésicas cartesianas geocêntricas (X,Y,Z) dos pontos levantados por GPS para coordenadas geodésicas (ϕ, λ), fazendo uso das conhecidas fórmulas de transformação entre estes sistemas (para verificar as fórmulas pode-se consultar, por exemplo, Monico (2000)). Na prática, normalmente os softwares de processamento de dados GPS fornecem os resultados do processamento dos pontos levantados em coordenadas cartesianas, bem como, em coordenadas geodésicas.

Toda a formulação segundo a NBR 14.166, envolvida na transformação de geodésicas para local, e vice versa, pode ser verificada, por exemplo, em Silva et al. (2003), Garnés et al. (2005) e, é claro, na própria NBR14.166.

5.1.2. Transformação de Coordenadas Geodésicas Cartesianas Geocêntricas (X,Y,Z) para um Sistema Geodésico Topocêntrico (x,y,z) e vice-versa

O Sistema Geodésico Topocêntrico consiste de um sistema cartesiano com orientação do eixo z coincidindo com a direção normal ao elipsóide de referência no ponto origem escolhido (ϕo, λo), sendo o sentido positivo o “zenital”; o eixo y tem orientação positiva para o norte e a direção coincidente com a direção da reta tangente ao meridiano elipsóidico na origem do sistema; o eixo x forma com os demais eixos um terno cartesiano ortogonal destrógiro (orientação positiva para leste) (GARNÉS et al., 2005). A figura 1 ilustra o Sistema Cartesiano Geocêntrico (X,Y,Z) e o Sistema Geodésico Topocêntrico (x,y,z).

Fig. 1 - Sistema Cartesiano Geocêntrico e Sistema Geodésico Topocêntrico

Fonte: Garnés (2005)

As coordenadas cartesianas geocêntricas de

pontos levantados por GPS podem ser transformadas para o Sistema Geodésico Topocêntrico por meio de rotações e translações.

Para tanto, deve-se primeiramente definir na área do levantamento um ponto que será a origem do Sistema Geodésico Topocêntrico, e conhecer as coordenadas geodésicas (ϕo, λo) e cartesianas geocêntricas (Xo,Yo,Zo) desse ponto. Em seguida, arbitram-se as coordenadas no sistema topocêntrico

para o ponto origem (xo, yo, zo) (é claro que intuitivamente se pensa em origem como tendo coordenadas iguais à zero; porém, para evitar valores negativos nos demais pontos transformados, adotam-se valores positivos maiores para as coordenadas topocêntricas do ponto origem) Então, as coordenadas de um ponto “P” no Sistema Geodésico Topocêntrico podem ser obtidas pelas seguintes expressões (desenvolvidas das fórmulas apresentadas em SOLER e HOTHEM, 1988):

p o 0 P 0 0 P 0x x [ sen (X X ) cos (Y Y )]= + − λ − + λ − (1)

p o 0 0 p 0 0 0 p 0 0 p 0y y [ cos sen (X X ) sen sen (Y Y ) cos (Z Z )]= + − λ ϕ − − λ ϕ − + ϕ − (2)

p 0 0 0 p 0 0 0 p 0 0 p 0z z [cos cos (X X ) sen cos (Y Y ) sen (Z Z )]= + λ ϕ − + λ ϕ − + ϕ − (3)

Onde: (ϕo, λo) – Coordenadas geodésicas do ponto origem local; (Xo,Yo,Zo) – Coordenadas cartesianas geocêntricas do ponto origem; (Xp,Yp,Zp) – Coordenadas cartesianas geocêntricas do ponto “P”; (xo,yo,zo) – Coordenadas geodésicas topocêntricas arbitradas para o ponto origem local (normalmente

adota-se na literatura: xo=150000 m; yo=250000; e zo= altitude geométrica do ponto origem); (xp,yp,zp) – Coordenadas geodésicas topocêntricas calculadas para o ponto “P”;

A transformação inversa, ou seja, a partir de um ponto “P” com coordenadas no Sistema Geodésico Topocêntrico, as coordenadas cartesianas geocêntricas desse ponto serão:

Page 5: Azambuja+JLF e MatsuokaMT

Revista Brasileira de Cartografia No XX, Mês, p. xxx-xxx, 2005. (ISSN 1808-0936) 2

p 0 p o 0 0 p o 0 0 p 0 0X [ sen .(x x ) cos sen .(y y ) cos cos (z z )] X= − λ − − λ ϕ − + λ ϕ − + (4)

p 0 p o 0 0 p o 0 0 p o 0Y [cos .(x x ) sen sen (y x ) sen cos (z z )] Y= λ − − λ ϕ − + λ ϕ − + (5)

p 0 p o 0 p 0 0Z [cos .(y y ) sen (z z )] Z= ϕ − + ϕ − + . (6)

Imaginando, por exemplo, uma poligonal

aberta apoiada com pontos iniciais e finais levantados por GPS, transformam-se esses pontos para o Sistema de Geodésico Topocêntrico utilizando as equações 1, 2 e 3. Depois, resolve-se a poligonal, obtendo os demais pontos no sistema topocêntrico. Se caso desejar obter a poligonal em coordenadas UTM, realiza-se a transformação inversa, ou seja, transformam-se as coordenadas do sistema topocêntrico para o Sistema Cartesiano Geocêntrico Global (X,Y,Z) utilizando as equações 4, 5 e 6. Em seguida, transforma-se para coordenadas geodésicas e posteriormente para as coordenadas UTM, utilizando equações bastante conhecidas na área da geodésia/cartografia, podendo fazer uso, por exemplo, do programa TCGEO do IBGE.

Algo interessante a se destacar é que, analisando as equações 4, 5 e 6, pode-se notar que a transformação inversa, ou seja, de coordenadas topocêntricas (x,y,z) para coordenadas geocêntricas (X,Y,Z) implica que a rigor o levantamento topográfico tenha que ter sido feito, além da planimetria, também a altimetria, para se obter a componente z dos pontos. Na realidade o que se deve obter é a diferença de nível entre os pontos levantados e o ponto origem do sistema topocêntrico (note que nas equações aparece o termo zp-zo). Porém, estudos preliminares que estão sendo realizados pelo grupo em uma poligonal teste mostram que se tivermos interessados somente em levantamento planimétrico, pode-se negligenciar o termo relativo a altimetria, ou seja, considerar nas equações zp-zo igual a zero. 5.2. Integração a partir de Transformações das Medições Topográficas - Transporte de Coordenadas UTM

Um outro caminho que pode ser seguido para a integração entre Topografia e GPS seria realizar o Transporte de Coordenadas UTM.

Para realizar este procedimento devem-se aplicar as devidas reduções lineares e angulares nas medidas de distâncias e ângulos medidos em campo, para determinar o valor das mesmas referente à Projeção UTM. De mãos dos pontos GPS (em UTM) pode-se realizar o Transporte de Coordenadas UTM.

O conjunto de equações para realizar o procedimento de redução das distâncias e ângulos pode ser obtido, por exemplo, em Silveira (2006). 6. COMENTÁRIOS FINAIS

Medições topográficas se referem à um plano topográfico local. Pontos levantados por GPS se

referem à um sistema de coordenadas cartesiano geocêntrico, que podem, obviamente, ser convertidos para coordenadas geodésicas ou UTM. Como visto no artigo, integrar as duas coisas significa ou “trazer” os pontos GPS para um Sistema local, ou as medições topográficas para o plano UTM (cabe ainda ressaltar que existe a opção de se realizar transporte de coordenadas geodésicas, assunto não abordado neste texto).

Ao se optar por transformar as coordenadas de pontos GPS pode-se utilizar as fórmulas da NBR-14166, ou como opção transformar para um Sistema Geodésico Topocêntrico.

Em um estudo de caso que está sendo realizado pelo grupo a partir de uma poligonal teste apoiada com GPS levantada no Campus do Vale da UFRGS, está sendo resolvida das três formas apresentadas (no Sistema Topográfico Local, no Sistema Geodésico Topocêntrico e por Transporte de Coordenadas UTM). Comparando os resultados finais das três estratégias, todos já no sistema UTM, tem-se verificado resultados similares. Os detalhes e resultados desse estudo serão apresentados em uma outra oportunidade, após a conclusão de todo o trabalho.

Para finalizar, algo importante a se comentar é a respeito da importância de um Sistema Local. Mesmo que deseje obter seu levantamento cadastral em coordenadas UTM, como é o caso da exigência do INCRA (Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária) para o cumprimento da conhecida lei de georeferenciamento de imóveis rurais, seria também interessante obter uma carta da área levantada em coordenadas local, para a medição direta da área e de qualquer outra medida linear e angular que se deseje realizar na carta, sem se preocupar com as deformações UTM.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE NORMAS TÉCNICAS. NBR 14.166 – Rede de referência cadastral municipal – Procedimento. Rio de Janeiro, 23p., 1998 GARNÉS, S.J.A.; SIQUEIRA, V.P.; CACHO, J.P.. Definição para implantação do sistema topográfico local de Campo Grande-MS e análise das fórmulas da NBR-14.166. In: Anais do IV Colóquio Brasileiro de Ciências Geodésicas – CD-ROM, Curitiba, UFPR, 2005. MONICO, J.F.G.. Posicionamento pelo NAVSTAR - GPS: descrição, fundamentos e aplicações. São

Page 6: Azambuja+JLF e MatsuokaMT

II Seminário Anual de Pesquisas em Geodésia na UFRGS, 2007.

3

Paulo: Ed. da Unesp, 2000. 287p. SOLER, T.; HOTHEM, L.D.. Coordinate systems used in Geodesy: Basic definitions and concepts. Journal of Surveying Engineering, Vol. 114, No. 2, pp. 84-97 May 1988. SILVEIRA, L.C.. Transporte de coordenadas planas – UTM. A Mira, ano XVI, n.135, p.51, setembro-outubro, 2006. IBGE. Revista Ponto de Referência, ano 1, n.1, 21 de agosto de 2006. Disponível em: < ftp://geoftp.ibge.gov.br/documentos/geodesia/pmrg/revista_ponto_de_referencia.pdf >. SILVA, M.M.S.; et al.. Implantação de um sistema topográfico local no centro politécnico de acordo com a NBR-14.166 – Rede de Referência Cadastral Municipal – Procedimento. In: Anais do III Colóquio Brasileiro de Ciências Geodésicas – CD-ROM, Curitiba, UFPR, 2003.