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UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO Análise de “Desesperança” e “Consoada”, de Manuel Bandeira.

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UNIVERSIDADE DE SO PAULO

Anlise de Desesperana e Consoada, de Manuel Bandeira.

Lais DiasN USP: 8569580Literatura Brasileira I Segundo horrioEm relao ao primeiro poema, Desesperana, o tema em torno do qual o poema gira (a ausncia de esperana) j nos introduzido no primeiro contato, ou seja, no prprio ttulo.Trata-se de uma lamentao. Como se percebesse a falta de esperana em sua vida, e, com essa descoberta, sentisse de maneira mais intensa o sofrimento. Devido sua doena ouve a morte chamar, se aproximar, e sente medo e angstia. Se enxerga como um ser distinto, deixado de fora pelo mundo e pelo que este tem a oferecer.Analisando seu contedo mais completamente, o poema se inicia com a relao entre manh e crepsculo. O crepsculo traz uma certa ideia de encerramento trazido pelo fim do dia, a concluso ou no das atividades, mas o fim daquele perodo disponvel para realiz-las. o perodo que antecede um fim. A manh, que por sua vez, deveria nascer representando as expectativas, planos e propsitos, nasce com os sentimentos que so passados com o crepsculo.

Esta manh tem a tristeza de um crepsculo.

Este verso pode ser encarado igualmente como uma metfora. A noite, como no poema Consoada, pode ser uma representao da morte. Na medida em que o crepsculo o momento que se aproxima da noite, percebemos um sentimento de proximidade do poeta com a morte.Em seguida, expe seus pesares, suas dores e seu cansao, que se do tanto no mbito fsico quanto no psicolgico. A presena do silncio o assusta. No primeiro verso da segunda estrofe, ao classificar o silncio com uma pequena srie de adjetivos, cria uma espcie de ritmo contnuo, uma repetio ( to...) com aliteraes que podem apresentar um valor expressivo de alongar, demorar. D a impresso de prolongar o verso e tornar a ele mesmo mais largo, mais longo e mais lento.

O silncio to largo, to longo, to lentoQue d medo... O ar, parado, incomoda, angustia...

O prprio ar, parado, incomoda, e d a ideia de monotonia, junto com o enorme silncio. O uso das reticncias nessa estrofe um acrscimo na composio dessa ideia de lentido e monotonia. A natureza ser, um dia, desse mesmo modo tedioso, cansativo: quando no houver mais vida alguma. Compara seus sentimentos com o fim de toda existncia, de toda a vida no planeta, como um ps fim do mundo onde o que sobra apenas a Terra totalmente vazia, angustiante. At no ato de respirar, funo automtica do corpo humano, h a dor e o lamento. No compreende mais a vida, de modo que por mais que busque entend-la, se encontra perdido. Sem encontrar sentido, no se encaixa no mundo.Traz tona na sexta estrofe a questo da sua doena, que o que o faz ouvir o apelo da morte, e por causa dela se encontra frustrado e perde suas esperanas. No consegue ter uma viso de vida longa pela frente, de grandes sonhos para o futuro, diferente de muitas pessoas. Sente-se ento estrangeiro, repelido pelo mundo, que lhe causa estranheza. Seu sentimento sobre o mundo o de rejeio: o mundo lhe mostra uma feio fria, de desprezo e de desdm.

Por onde alongue o meu olhar de moribundo,Tudo a meus olhos toma um doloroso aspeto:E erro assim repelido e estrangeiro no mundo.

Teme a monotonia, o tdio, o antes j citado largo silncio, e a falta de perspectiva, ou seja, tem desejos, mas no espera nem acredita em de fato alcan-los. Sente que sua vida no tem um objetivo, como se vivesse de modo vazio, sem uma determinada razo.No ltimo verso, retorna ao tema apresentado logo inicialmente, e que origina toda a poesia, demonstrando que isso o que traz a ele essa vivncia sofrida, cansativa: a falta de esperana.Em Consoada, tambm temos como tema a falta de esperana. Porm, o sentimento transmitido nesse caso bem diferente. como se, num momento posterior ao do primeiro poema e como uma forma de amadurecimento, o poeta se sentisse conformado com essa falta de esperana. Durante o poema todo apresenta uma srie de antteses (dura/carovel, sentir medo/sorrir, dia/noite). Os contrapontos representam bem sua incerteza de no saber realmente como se daro os acontecimentos futuros: como a morte , como ir reagir, ou at mesmo quando ela vir. Apesar disso, no vive triste, dolorosamente, desprezado pelo prprio mundo. No sente angstias pela vida inteira que podia ter sido e que no foi, mas sente uma valorizao dos momentos simples em que viveu. Tomando conhecimento dos registros de sua vida, levamos em conta que grande parte dessa valorizao se d possivelmente acerca de sua infncia, como relata o prprio Bandeira, ao mencionar sua residncia no Recife dos seis aos dez anos: Quando comparo sses quatro anos de minha meninice a quaisquer outros quatro anos de minha vida de adulto, fico espantado do vazio dstes ltimos em cotejo com a densidade daquela quadra distante. [footnoteRef:1] [1: MORAES, Emanuel de (Org.) Manuel Bandeira Seleta em prosa e verso. RJ: Jos Olympio, 1971. p.25]

Desse modo, aceita a morte, porque apesar dessa valorizao, no encontra ainda expectativas de uma vida longa e de realizaes. Encontra-se to conformado que se organiza previamente para a chegada da morte:

(...)Encontrar lavrado o campo, a casa limpa,A mesa posta,Com cada coisa em seu lugar.

Quando se possui anseios, planos, e enfim, esperanas, certamente no se prepara para morrer. Pode-se at haver a aceitao de que um dia a morte chegar, como chega a qualquer um, porm, dispensando essa preparao de quem j reconhece a proximidade do encontro com a morte. O sentimento de que ainda tem muito o que completar, a realizar, impossibilitaria o indivduo de aceitar deixar o mundo to facilmente. De fato Bandeira viveu durante algum tempo de sua vida dessa forma, sem grandes esperanas, graas aos problemas de sade. Temos como exemplificao um trecho do poema Testamento:

Criou-me desde eu meninoPara arquiteto meu pai.Foi-se-me um dia a sade...Fiz-me arquiteto? No pude!Sou poeta menor, perdoai!

Tendo a dvida de poder vir a falecer a qualquer momento, em suas prprias palavras afirma ter a impresso de viver provisoriamente: (...) Continuei esperando a morte para qualquer momento, vivendo sempre como que provisoriamente... [footnoteRef:2]. [2: CARA, Salete de Almeida (Org.) Manuel Bandeira Literatura comentada. SP: Abril Educao, 1981. p. 5.]

A aceitao da morte em Consoada feita de modo sereno. O poeta apresenta diversos eufemismos para representar a morte, como a Indesejada das gentes, a iniludvel, e a noite, ao invs de utilizar a palavra morte, que tem uma carga mais direta e pesada. Numa forma de abrandar o sentido da palavra, torna tambm mais suave o sentido da prpria morte, que traz essencialmente uma carga negativa, demonstrando ter com ela uma relao distinta, de proximidade.Com a leitura e anlise dos dois poemas, podemos notar uma progresso no amadurecimento do poeta quanto ao modo de encarar a morte, que, devido sua doena, acredita ser iminente. De maneiras distintas, aborda um elemento em comum, que a perda da esperana, indo da frustrao e angstia aceitao e conformidade.

BIBLIOGRAFIA

MORAES, Emanuel de (Org.) Manuel Bandeira Seleta em prosa e verso. RJ: Jos Olympio, 1971.

CARA, Salete de Almeida (Org.) Manuel Bandeira Literatura comentada. SP: Abril Educao, 1981.

BANDEIRA, Manuel Estrela da vida inteira. RJ: Jos Olympio, 1980.

CANDIDO, Antnio O estudo analtico do poema. SP: Associao Editorial Humanitas, 2006.