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BARREIRAS COMERCIAIS NO COMÉRCIO INTERNACIONAL: O CASO DA SOJA NO BRASIL
Bárbara Françoise Cardoso1 Valdir Antonio Galante2
Mirian Beatriz Schneider3
RESUMO O presente artigo buscou contextualizar o cenário da soja no comércio internacional e dificuldades decorrentes das barreiras comerciais. Para tal, utilizou a análise da competitividade das exportações de soja dos maiores players - Estados Unidos e no Brasil - utilizando o índice de vantagem comparativa revelada. Os resultados demonstram o crescimento da importância das exportações brasileiras, tanto em razão dos volumes totais, como na obtenção de divisas. Quanto ao destino das exportações, cresce a participação da China e outros emergentes, superando a União europeia. Outra verificação importante é a relevância da soja na pauta de exportações: enquanto para o Brasil é um dos itens mais importantes, para os EUA é apenas mais um item exportado. Contudo, o desempenho do setor se faz enfrentando o uso de procedimentos tarifários e não tarifários pelos importadores, como tarifas que desestimulam a o processamento no Brasil, exigência de licenças, barreiras sanitárias e técnicas com critérios pouco claros e definidos apenas pelos compradores. Palavras-chave: Comércio internacional; Barreiras comerciais; Soja; Vantagem comparativa revelada.
ABSTRACT This paper aims to contextualize the scenario of international trade in soybeans and difficulties arising from trade barriers. To this end, we used the analysis of the competitiveness of soybean exports of the major players - the United States and Brazil - using the index of revealed comparative advantage. The results demonstrate the growing importance of Brazilian exports, both because the total volumes, as in foreign exchange earnings. The destination of exports, growing participation of China and other emerging nations, surpassing the European Union. Another important verification is the importance of soy in the exports: while for Brazil is one of the most important items to the U.S. is just another export item. However, the performance of the sector is facing is the use of tariff and non-tariff procedures by importers, such as
1 Doutoranda em Desenvolvimento Regional e Agronegócio e Bolsista CAPES/Fundação Araucária da
Universidade Estadual do Oeste do Paraná (UNIOESTE/Toledo), Mestre em Desenvolvimento Regional pela Universidade Federal do Tocantins (UFT/Palmas) e Gestora do Agronegócio pela Universidade Federal de Viçosa (UFV/Viçosa). E–mail: <[email protected]>. 2 Doutorando em Desenvolvimento Regional e Agronegócio da Universidade Estadual do Oeste do
Paraná (UNIOESTE/Toledo), Mestre em Economia Rural pela Universidade Federal do Ceará (UFC), Economista pela Universidade Estadual do Oeste do Paraná (UNIOESTE/Toledo). E-mail: <[email protected]>. 3 Professora Adjunta do Curso de Ciências Econômicas e do Programa de Pós-Graduação em
Desenvolvimento Regional e Agronegócio da UNIOESTE-Toledo. Pesquisadora do Grupo GEPEC. Bolsista Produtividade da Fundação Araucária.
2
tariffs discouraging processing in Brazil, demand for licenses, sanitary and technical barriers to unclear criteria and defined only by the buyers.
Word-key: International trade; Trade barriers; soybeans; Revealed comparative advantage
1 INTRODUÇÃO
Ante o surto protecionista pós-Segunda Guerra Mundial, os governos de
diversos países iniciaram discussões para debater acerca da liberalização do
comércio, surgindo o GATT (General Agreement on Tariffs and Trade), substituído
pela OMC (Organização Mundial do Comércio) em 1995. Contudo, se por um lado
os países defendiam coletivamente a liberalização do comércio, por outro buscavam
individualmente desenvolver procedimentos para burlar ou contornar tais regras.
Por outro lado, a formação de blocos econômicos facilitou o comércio entre
os países membros mediante redução ou eliminação das barreiras comerciais. Estas
são impostas pelos países como forma de garantir um produto com as
especificações desejadas ou como forma de proteger o produtor interno. De forma
ampla, as barreiras comerciais podem ser entendidas como restrições ao comércio
internacional.
Algumas barreiras comerciais são permitidas, como as barreiras tarifárias,
desde que não sejam abusivas. As barreiras não-tarifárias também são permitidas
como forma de combater o abuso praticado pelos países com as barreiras tarifárias,
mas também são usadas de forma abusiva por alguns países. Outrossim, as
barreiras técnicas são especificações impostas aos produtos a fim de impedir
medidas que impeçam o comércio internacional.
Os produtos sujeitos às várias formas de barreiras comerciais são desde
commodities até o mais sofisticado produto industrializado. No caso das
commodities, estas frequentemente recebem subsídios no país produtor. Estes
subsídios são uma forma de barreira imposta aos demais países exportadores, pois,
com o subsídio o produto interno torna-se relativamente mais competitivo em relação
ao produto estrangeiro.
No Brasil, as commodities recebem mais subsídios do que os produtos
industrializados. De fato, o país possui grande extensão de terra agricultável e
variedades climáticas que permitem o cultivo de diversos cultivares.
3
Neste contexto, destaca-se a soja por ser uma das principais commodities
comercializadas no mundo. Sua produção é feita em grande escala nos poucos
países que a produzem. Além disso, a soja tem grande importância no cenário
internacional, dada a grande diversidade de usos que possui, tanto na alimentação
humana ou animal quanto pelos subprodutos obtidos pelo processo industrial.
Este artigo tem por objetivo contextualizar o cenário da soja, enfatizando o
comércio internacional desta commodity no Brasil, com foco nas dificuldades
representadas pelas barreiras comerciais. Para tanto, o artigo está estruturado em
cinco seções, incluindo esta breve introdução. Na segunda seção são abordados os
aspectos relacionados ao cenário comercial da soja. Na terceira seção são descritas
algumas das principais barreiras comerciais impostas ao Brasil e que envolvem o
complexo soja. Na quarta seção faz-se uma análise da competitividade das
exportações de soja nos Estados Unidos e no Brasil (maiores países exportadores
de soja), utilizando o índice de vantagem comparativa revelada nas exportações, o
qual também está explicitado nessa seção. Por fim, na quinta seção estão expostas
as considerações finais a respeito do comércio internacional de soja.
2 CONTEXTUALIZAÇÃO DO CENÁRIO COMERCIAL DA SOJA
A produção mundial de soja em 2012 foi de 241,8 milhões de toneladas,
sendo os Estados Unidos responsáveis por 34,16% da produção (82,6 milhões de
toneladas) e o Brasil por 33,70% (81,5 milhões de toneladas) (FAO, 2013).
Além de maiores produtores, os Estados Unidos e o Brasil também são os
maiores exportadores mundiais de soja. Em 2011, as exportações mundiais eram de
91 milhões de toneladas, o correspondente a US$ 45 bilhões. Os Estados Unidos se
portava como o maior exportador com 34,3 milhões de toneladas, o correspondente
a US$ 17,6 bilhões, enquanto o Brasil era o segundo maior produtor com 33 milhões
de toneladas equivalentes a US$ 16,3 bilhões (FAO, 2013).
O Gráfico 01 mostra o valor das exportações de soja dos dois países
maiores exportadores, de 1990 a 2011. Observa-se que o valor das exportações de
soja em grão tanto dos Estados Unidos quanto do Brasil mostram tendência de
crescimento. Anteriormente à crise financeira ocorrida em 2008, as exportações de
soja dos Estados Unidos apresentaram aumento significativo de 124% entre 2006 e
2008. No entanto, houve queda de 6% no valor das exportações de 2010 para 2011.
4
Mas tal queda não influencia na tendência de crescimento do valor das exportações
americanas.
Gráfico 01 – Exportações de soja dos Estados Unidos e Brasil entre 1990 e 2011 (US$ milhões)
Fonte: Elaboração própria a partir dos dados da FAO (2013).
Por outro lado, o valor das exportações brasileiras vem aumentando
gradativamente desde 1999, fato que não se alterou com a crise financeira de 2008,
embora tenha havido uma pequena queda de 3% de 2009 para 2010 no valor das
exportações.
De 2010 para 2011, enquanto as exportações americanas apresentaram
queda de 6%, as brasileiras mostraram aumento de 48%. Ou seja, o Brasil vem
ganhando espaço nas exportações mundiais de soja, podendo ultrapassar os
Estados Unidos em poucos anos.
Cabe salientar que o principal destino das exportações brasileiras totais é a
China, sendo comercializado com este país, em 2012, US$ 41,2 bilhões, seguida por
Estados Unidos (US$ 26,7 bilhões), Argentina (US$ 18 bilhões), Países Baixos (US$
15 bilhões) e Japão (US$ 8 bilhões). Estes cinco países constituem os principais
destinos da soja brasileira e correspondem a 44,89% do total das exportações
(MRE/DPR/DIC, 2013).
Em 2012, dos produtos exportados pelo Brasil, o complexo soja era o
terceiro produto na pauta de exportações, correspondendo a US$ 26,1 bilhões, atrás
somente do minério de ferro (US$ 33,2 bilhões) e do petróleo e combustíveis (US$
0
2000
4000
6000
8000
10000
12000
14000
16000
18000
20000
Brasil Estados Unidos
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30,9 bilhões). Nesse ano, a China recebeu 69,53% do total de soja exportado pelo
Brasil, seguida pela Espanha (6,55%), Tailândia (3,31%), Taiwan (3,29%) e Holanda
(3,15%). Esses cinco países respondem por 85,83% do total de soja exportado
(MDIC, 2012).
O Gráfico 02 mostra a evolução das exportações brasileiras de soja para a
China importadores brasileiros dessa commodity entre 1996 a 2012.
Gráfico 02 – Evolução das exportações de soja do Brasil para a China (US$ milhões FOB): 1997-2013
Fonte: MDIC (2013).
Observa-se que as exportações de soja do Brasil para a China vêm
crescendo exponencialmente mesmo após a crise de 2008. É interessante observar
que após a crise, o valor das exportações cresceu mais rapidamente do que antes.
Estudo de Weydmann (2010) corrobora essa assertiva, demonstrando que
os produtos do complexo soja tiveram aumento de preços e não sofreram impactos
significativos durante a crise de 2008.
Outrossim, Weydmann (2010) mostrou que nem todas as commodities
tiveram seu preço reduzido e entre elas encontra-se a soja. O autor analisou as
exportações brasileiras das dez principais commodities após a crise de 2008; entre
elas se encontram a soja em grão, o farelo de soja, o óleo de soja bruto e o óleo de
soja refinado. O autor conclui que o Brasil exportou, em 2008, 51% de todo o farelo
de soja que foi produzido no país, 41% da soja em grão produzida, e 34% de todo o
óleo de soja produzido. Entre setembro de 2008 e maio de 2009 houve firme
0
2.000.000.000
4.000.000.000
6.000.000.000
8.000.000.000
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12.000.000.000
14.000.000.000
16.000.000.000
18.000.000.000
20.000.000.000
1997 1998 1999 2000 2001 2002 2003 2004 2005 2006 2007 2008 2009 2010 2011 2012 2013
Valor das exportações
6
tendência de queda do preço de exportação da soja em grão e que, entre junho de
2008 e fevereiro de 2009 foi um período em que houve uma firme tendência de
queda de quantidade exportada de soja em grão. Para o farelo de soja, o período
em que houve firme tendência de queda do preço de exportação e de quantidade
exportada foi entre outubro de 2008 e maio de 2009 e entre junho de 2008 e
fevereiro de 2009, respectivamente.
O autor mostra que, para o óleo de soja, esses períodos mostraram-se
distintos. Enquanto para o óleo de soja bruto o período de firme tendência de queda
do preço de exportação foi de outubro de 2008 a maio de 2009, para o óleo de soja
refinado foi de agosto de 2008 a maio de 2009. Já o período de firme tendência de
queda de quantidade exportada, para o óleo de soja bruto foi de agosto de 2008 a
fevereiro de 2009, e para o óleo de soja refinado foi de junho de 2008 a fevereiro de
2009. Além disso, os preços médios desses produtos mantiveram-se mais elevados
na crise do que fora dela.
Para Weydmann (2010), a crise de 2008 pouco afetou as exportações do
agronegócio brasileiro devido à diversificação do mercado externo. De modo
semelhante, Costa et al. (2012, p. 6) sugerem “que tal resultado deve-se à
composição da pauta de exportação do Brasil, mais concentrada em produtos
menos sensíveis à renda, como alimentos e matérias primas”.
Em relação à soja, suas exportações foram pouco afetadas devido ao
consumo da China e Índia que se manteve firme durante a crise. Além disso, a
queda da produção de soja na Argentina também favoreceu as exportações
brasileiras desta oleaginosa.
Contudo, cabe ressaltar que a crise não afetou somente as exportações do
agronegócio. Outros elementos afetados pela crise também repercutiram direta ou
indiretamente nas exportações do agronegócio.
De acordo com Moreira e Soares (2010, p. 64), a crise financeira ocorrida
nos Estados Unidos em 2008 atingiu o Brasil apenas no segundo semestre desse
mesmo ano, resultando em: “(i) contração do crédito doméstico e mundial; (ii)
destruição de riqueza decorrente da redução do preço dos ativos; (iii) deterioração
de expectativas; (iv) vertiginosa queda dos preços das commodities; e (v) redução
do comércio mundial.
Weydmann (2010) acrescenta que houve depreciação do Real frente ao
Dólar de 34%, o que acarretou aumento dos preços nominais nacionais das
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exportações. Além disso, houve aumento de 8% da inflação, o que fez com que os
preços reais caíssem. Outro elemento atingido pela crise foi o Índice IBOVESPA de
ações que apresentou queda e, com isso, os juros domésticos elevaram-se, o que
dificultou o financiamento das exportações pelas empresas.
3 BARREIRAS COMERCIAIS NO COMPLEXO SOJA
Mesmo com a adesão à Organização Mundial do Comércio (OMC), muitos
países ainda buscam mecanismos de barreiras comerciais para impedir as
importações de determinado produto e/ou proteger sua produção interna. Algumas
barreiras são permitidas pela OMC, desde que não sejam abusivas nem proibitivas,
tais como as barreiras tarifárias e técnicas. No entanto, existem barreiras não
tarifárias ou fitossanitárias, que também impedem ou protelam a importação de
produtos de outros países e fazem parte de um conjunto de medidas, por vezes
veladas, criadas para protelar, impedir ou desestimular determinado movimento
mercantil. Os subsídios à produção interna também podem ser vistos como uma
forma de barreira em alguns países.
As barreiras que envolvem o complexo soja nem sempre são específicas a
tal complexo. Em sua maioria, elas envolvem o agronegócio, a agricultura, as
commotidies e os grãos em geral.
Entre essas medidas encontram-se os picos tarifários e os escalonamentos
tarifários, os quais visam, implícita ou explicitamente, instabilizar os mercados e
desestimular a agregação de valor. (RODRIGUES et al., 2011). Desse modo, as
economias exportadoras são ‘forçadas’ a permanecer na produção de produtos
menos elaborados, com desestímulo à industrialização e progresso tecnológico, o
que reduz a competitividade e posterga o desenvolvimento da economia preterida.
(BAUMANN; CANUTO, 2004, p. 141).
A Lei Kandir, posta em vigor em 1996, pode ser considerada um exemplo,
uma vez que proporcionou a alavancagem nas exportações de soja, pois esta lei
desonerou os produtos in natura do Imposto Sobre Circulação de Mercadorias
(ICMS). Por outro lado, essa lei desestimulou a exportação de produtos com valor
agregado (WILDER, et al., 1999).
De acordo com a Associação Brasileira de Óleos Vegetais – ABIOVE (2011),
após a Lei Kandir, a tributação total que incide sobre a soja in natura destinada para
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o mercado chinês é de 3%, independentemente do Estado produtor. No entanto,
para o óleo e o farelo de soja, a tributação total é de 9% e 5%, respectivamente, se
os produtos exportados forem produzidos em indústrias do Estado produtor; e 21% e
17%, respectivamente, se os produtos exportados forem produzidos em indústrias
de outros Estados, que não o produtor. A grande diferença nos valores tributários é
que quando o produto exportado é produzido por outro Estado, paga-se 12% de
ICMS interestadual. Esse exemplo ilustra uma posição em que o Brasil adota uma
medida que desestimula a adição de valor às exportações, face a necessidade de
produzir divisas externas, medida essa que também é adotada por países
importadores para estimular suas economias.
No entanto, o comércio com China possui outras tarifas relacionadas à
agricultura em geral. A partir de 2005, segundo MDIC (2008), as tarifas ad valorem
sobre a importação de produtos agrícolas de qualquer país são de 15,3%. Além
desta tarifa, a China também aplica o Imposto Sobre Valor Agregado (IVA), com
tarifa de 13% sobre o farelo de soja brasileiro. Atualmente, tal imposto varia entre
13% e 17%. Brum (2002) acrescenta que a China impõe uma tarifa de 3% às
importações de soja em grão e de 13% às de óleo de soja.
Outro tipo de barreira imposta pela China é a Licença de Importação, que
envolve, além de outros produtos, o óleo de soja. Contudo, anteriormente à Licença
de Importação, o país exportador deve solicitar uma permissão de importação, que é
emitida por órgãos distintos de acordo com o produto. Além disso, a China também
aplica Quotas Tarifárias ao óleo de soja (MDIC, 2008).
De acordo com Waquil et al. (2004), as principais barreiras impostas à soja
brasileira pela União Europeia estão relacionadas à Política Agrícola Comum, além
dos subsídios disponibilizados ao produtor europeu e das barreiras técnicas,
sanitárias e fitossanitárias, que estabelecem critérios aos quais a soja brasileira deve
se submeter. Segundo MDIC (1999), as exportações de óleo de soja bruto são
taxadas com alíquotas que vão de 3,8% a 7,6%, enquanto as alíquotas às
exportações de óleo de soja refinado variam entre 6,1% e 11,4%.
Em relação às barreiras não tarifárias, o ano de 2004 foi atípico para a soja
brasileira. Suspeitas de pragas, doenças e uso de agroquímicos foram levantadas
por outros países. No início do ano, os Estados Unidos levantaram a suspeita de
que haveria uma possível contaminação da soja brasileira, o que levou o
Departamento de Agricultura dos Estados Unidos a modificar as regras
9
fitossanitárias para as importações de soja (BBC BRASIL, 2004b). No mesmo ano a
China embargou um carregamento de soja correspondente a, aproximadamente, 59
mil toneladas de grãos. A justificativa chinesa era a de que havia sementes tratadas
com agroquímicos misturadas aos grãos (BBC BRASIL, 2004a).
Outrossim, as diretivas europeias, aprovadas em 2011, que estabelecem
critérios para a importação de oleaginosas de outros países foram vistas como
barreiras não tarifárias pelos países exportadores de soja, pois um dos critérios
proíbe a plantação de grãos em áreas de pastagens que possuem alta
biodiversidade. Essa característica das áreas de pastagens foi demasiadamente
criticada por entidades representativas do setor no Brasil, pelo fato de que não há
definição do que sejam essas áreas e uma explicação cabível para a imposição
desse critério, apresentando caráter alusivo a de uma barreira comercial (SILVEIRA,
2011; APROSOJA, 2011).
Outro critério que pode ser identificado como barreira às exportações
brasileiras de soja é o fato de que a União Europeia estabeleceu que o
biocombustível deve ser capaz de reduzir em 35% as emissões de gases do efeito
estufa (GEE). Uma das críticas a este critério é que não há um embasamento
científico para a imposição do mesmo. No mesmo sentido, há crítica ao fato de que
a soja tem capacidade de redução de 31% das emissões de GEE, de acordo com os
cálculos da União Europeia, mas o óleo de soja não passa nos seus critérios. Por
outro lado, a canola, que é a oleaginosa mais utilizada para a produção de biodiesel
na Europa, pelos cálculos desta, tem capacidade de redução de 36% das emissões
de GEE, ou seja, a soja fica pouco aquém e a canola um pouco além dos limites de
uma regra que não tem critérios claros. (APROSOJA, 2011).
4 VANTAGEM COMPARATIVA REVELADA NAS EXPORTAÇÕES DE SOJA
Diante do cenário comercial da soja e barreiras comerciais que o envolvem,
cabe uma breve discussão sobre a competitividade das exportações de soja dos
Estados Unidos e do Brasil, uma vez que esses dois países são os maiores
exportadores mundiais da oleaginosa.
Dentre várias formas de se discutir a competitividade está o Índice de
Vantagem Revelada nas Exportações (VRE) que mostra o quanto um país possui
competitividade nas exportações de determinado produto. Dessa forma, cabe
10
analisar o desempenho do Brasil nas exportações de soja, comparativamente ao
desempenho dos Estados Unidos, uma vez que este possui a liderança das
exportações de soja.
O VRE é calculado da seguinte forma (RUBIN, ILHA, 2008)4:
[ ⁄
⁄] (01)
Em que: representa o valor das exportações de soja de um
determinado país, neste caso, ; representa o
valor das exportações mundiais de soja, exceto o valor correspondente às
exportações do país ; representa o valor das exportações totais do país ,
exceto o valor correspondente às exportações de soja; e representa o
valor das exportações mundiais totais, exceto o valor correspondente às do país .
Este índice mostra que a vantagem revelada nas exportações será alta se o
VRE for acima de dois; será média se o VRE estiver entre um e dois; será baixa se o
VRE estiver abaixo de um; e o país possuirá desvantagem relativa nas exportações
se o VRE estiver abaixo de zero.
Para uma análise mais dinâmica, calculou-se a VRE para os Estados Unidos
e o Brasil ao longo do tempo, a fim de analisar o comportamento desse índice.
Dessa forma, Rubin e Ilha (2008) explicitam que, quando a evolução da vantagem
revelada nas exportações mostrar-se crescente, significa que o país possui
capacidade de expansão da competitividade ao longo do tempo; se o
comportamento da VRE for estável, significa que o país mantém estável sua
competitividade nas exportações do produto estudado; e se o comportamento da
VRE mostrar-se decrescente significa que o país perde capacidade competitiva.
O Gráfico 03 mostra a evolução da vantagem revelada nas exportações de
soja do Brasil e dos Estados Unidos, entre 1990 e 2011. A linha tracejada no valor
2,00 e a no valor 1,00 mostram os limites que determinam se a VRE é alta, média ou
baixa, visto que para nenhum ano foi encontrado VRE menor do que zero, o que
determinaria desvantagem relativa nas exportações.
Para todos os anos, o Brasil apresentou bom desempenho nas exportações
de soja, uma vez que a vantagem relativa nas exportações mostrou-se alta para
4 Os dados para o cálculo do índice VRE foram obtidos da FAO (2013) e UNCTAD (2013).
11
todos os anos, enquanto os Estados Unidos apresentou desempenho satisfatório, já
que sua vantagem relativa nas exportações de soja mostrou-se média em alguns
anos.
Gráfico 03 – Índice de vantagem revelada nas exportações de soja do Brasil e dos Estados Unidos: 1990-2010
Fonte: Elaboração própria.
A vantagem revelada nas exportações brasileiras de soja mostrou-se mais
intensa do que nas exportações estadunidenses dentro do período analisado. Até
1996, ano em que entrou em vigor a Lei Kandir no Brasil e em que este intensificou
a exportação de soja para a China, havia uma instabilidade na VRE brasileira,
apresentando tendência de aumento até 2004 e, posteriormente, uma leve tendência
de queda.
Ainda não se pode afirmar se a VRE brasileira foi afetada pela crise de 2008,
pois houve um leve aumento na VRE de 2008 para 2009, uma pequena queda de
2009 para 2010, e um aumento de 2010 para 2011. Somente com uma análise com
mais anos posteriores à crise é que permitirá afirmar se houve ou não impacto da
crise na vantagem revelada nas exportações brasileiras de soja.
No caso dos Estados Unidos, o que se observa é que a vantagem revelada
nas exportações de soja mostrou-se instável até 1996, apresentando queda até
1998 e mantendo certa estabilidade até 2011. Após 2008, a VRE estadunidense
apresentou-se em queda, mas não se pode afirmar que tal queda é fruto da crise,
pois em anos anteriores à crise a VRE já havia apresentado tendência de queda.
1990 1991 1992 1993 1994 1995 1996 1997 1998 1999 2000 2001 2002 2003 2004 2005 2006 2007 2008 2009 2010 2011
Brasil 3.10 2.30 2.84 2.88 3.18 2.63 2.67 3.47 3.60 3.51 3.64 3.69 3.80 3.74 4.00 3.89 3.92 3.65 3.66 3.83 3.43 3.76
EUA 2.40 2.55 2.70 2.66 2.30 2.96 3.02 2.53 2.01 2.23 2.17 1.99 2.06 2.13 1.89 1.80 1.93 1.99 2.05 2.20 2.10 1.82
0.00
0.50
1.00
1.50
2.00
2.50
3.00
3.50
4.00
4.50
12
Salienta-se que a vantagem revelada nas exportações estadunidenses de
soja somente foi maior do que a Brasil nos anos 1991, 1995 e 1996. Nos demais
anos, o Brasil possui vantagem maior do que os Estados Unidos.
No geral, a vantagem revelada nas exportações de soja do Brasil
apresentou-se alta para todos os anos, já que a VRE foi maior do que dois,
enquanto a vantagem revelada nas exportações de soja dos Estados Unidos
apresentou-se média em alguns anos, a saber: 2001, 2004, 2005, 2006, 2007 e
2008. Cabe ressaltar que a média da VRE brasileira foi de 3,42, enquanto a média
da VRE estadunidense foi de 2,25.
Como os Estados Unidos são o país que mais produz e exporta soja, era de
se esperar que sua vantagem relativa nas exportações dessa commodity fosse
maior de que a do Brasil. Contudo, não foi o observado. Uma explicação para tal fato
é que a soja é um dos principais produtos na pauta de exportação brasileira,
enquanto na pauta estadunidense a soja não faz parte dos dez principais produtos
exportados.
Outrossim, o comportamento da vantagem relativa nas exportações
brasileiras de soja ao longo do tempo mostrou-se crescente, o que significa que o
Brasil possui capacidade de expandir sua competitividade nas exportações de soja
(fato que pode ser observado pela linha de tendência). No caso dos Estados Unidos,
a evolução da VRE mostrou comportamento decrescente, o que significa que o país
está perdendo capacidade competitiva nas exportações de soja, o que condiz com a
posição da soja na pauta de exportações estadunidenses.
5 CONSIDERAÇÕES FINAIS
Na última década a soja ganhou especial destaque nas exportações
brasileiras, com forte participação nos volumes totais, bem como na obtenção de
divisas para o país. Simultaneamente, cresce a participação da China como principal
destino, superando a União europeia, mesmo durante o período de crise mundial
que atinge a economia global após 2008.
Salienta-se que o destino das exportações de soja vem mudando desde a
década de 1990, sendo que em 1997 o principal destino era a Holanda, seguido da
China, Alemanha, Espanha e Portugal. No início da década de 2000, a China
passou a ser o principal destino da soja brasileira, permanecendo até 2013 e
13
mostrando tendência de permanecerá como o principal destino por muitos anos.
Ainda neste período, depois da China, os principais destinos eram Holanda,
Espanha, Itália e Tailândia. No final da década de 2000, os destinos mudam
novamente, permanecendo a China como principal destino, seguido pela Espanha,
Holanda, Tailândia e Taiwan.
Em suma, os cinco maiores importadores da soja brasileira diversificaram-se
ao longo dos anos, porém sempre permanecendo a China, Holanda e Espanha
como fiéis compradores.
Enquanto o Brasil eleva a produção e produtividade no setor do complexo
soja, alguns procedimentos tarifários e não tarifários são adotados pelos
importadores para melhorar suas posições, quer seja via argumentos ambientais,
burocráticos ou qualquer outro.
Dentre as medidas tarifárias encontra-se o uso e tarifas que estimulam a
compra da matéria prima em detrimento de subprodutos e derivados com maior valor
agregado. Como exemplo de medidas não tarifárias, temos as licenças de
importação, barreiras técnicas, sanitárias e fitossanitárias, suspeição de pragas,
doenças e uso de agroquímicos, uso de critérios pouco claros e definidos
unilateralmente.
As exportações brasileiras de soja tem apresentado competitividade maior
do que as exportações dos Estados Unidos desde 1990. Este país possui vantagem
revelada comparativa nas exportações de soja decrescente, o que implica perda de
competitividade nas exportações de soja. Em situação oposta está o Brasil, que
apresenta vantagem crescente, isto é, ampliação da competitividade.
Cabe ressaltar que apesar de os Estados Unidos serem um dos maiores
exportadores mundiais de soja, esta não faz parte dos dez principais produtos da
pauta de exportação deste país. Ao contrário, na pauta de exportação brasileira a
soja encontra-se entre os três principais produtos. Este fato explicita a diferença
entre a vantagem revelada nas exportações de soja dos Estados Unidos e do Brasil.
Assim, apesar das pressões impostas ao setor via medidas protecionistas e
o ambiente de crise após 2008, o cenário da soja para o Brasil tem se mantido bom
em função da manutenção da demanda, sobretudo do apetite chinês, e dos preços
internacionais, bem como pelo avanço da produtividade do setor.
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