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 Berger (1980): “Nos primeiros estágios da revolução industrial os animais eram usados como máquinas (...). Mais tarde, nas chamadas sociedades pós-industriais, são tratados como matria !ruta. "nimais consumidos como alimento são processados como mercadorias manu#aturadas$. Dualismo entre representação e engajamento com espécies animais, que são “su%eitados e adorados& criados e sacri#icados$. “'o%e os vestgios desse dualismo permanecem entre aqueles que vivem intimamente com, e dependem dos animais. m campon*s gosta do seu porco e #ica contente ao  salgar sua carne. + que signi#icativo, e tão di#cil para o estranho ur!ano entender , que as duas a#irmaçes são ligadas por um e, e não por um mas$. elação tra!icional com o "oi. #ni$erso rural que se contrap%e ao uni$erso ur"ano a  partir !e uma relação !i&erente com o sacri&'cio e com a culpa. arra interpreta!a como ritual parece se inscre$er tam"ém nesse mesmo tipo !e !ualismo, apesar esta"elecer uma relação em que o "oi surge como algo e*traor!in+rio, que não &a parte !o coti!iano. -a cultura tra!icional !o "oi, ele é su"jeti$a!o e sacri&ica!o. al$e por isso a mani&estação popular se torne tão inaceit+$el/ o que est+ em jogo nela não é tanto a con!enação estrutural !a $iolncia, mas o rompimento com o c!igo esta"eleci!o em que a $iolncia po!e se !ar. arra !o Boi rompe, !e alguma &orma, com os trs aspectos !e !escontaminação sim"lica aponta!os acima: !esapego, ocultamento e trans&erncia !a culpa. i!éia !e !esapego, apesar !e não estar ausente, é su"$erti!a a partir !a &ormulação !o "rincar, como um engajamento que se re&ere 2 imitar e en&rentar a &3ria !o "oi. 4uanto ao ocultamento, o"$iamente é !escarta!o quan!o se tra o "oi para a praça p3"lica. noção !e trans&erncia !a culpa po!e ser !es!o"ra!a em !ois aspectos, a partir !o momento que quem mata o "oi é tam"ém quem $ai com5lo. 6sso se inscre$e no tipo !e am"ig7i!a!e a que Berger se re&ere/ o sacri&'cio &a parte !a relação esta"eleci!a com o "oi, e a carne que $ai ser comi!a tra a memria !essa relação e !aquele "oi in!i$i!ualia!o. 6ngol!: n+lise istrica !as relaç%es pro!uti$as entre umanos e animais. conomia !e caça: relação social entre umanos e animais on!e as presas são reconeci!as como pessoas. Domesticação tra!icional: animais !omestica!os &aen!o parte !o grupo social como escra$os cati$os/ &orça !e tra"alo e alimento.  -as &aen!as in!ustriais mo!ernas, as relaç%es entre os omens e o ga!o se mo$em !e&initi$amente !o pessoal para o impessoal: “o animal se move de uma pessoa estranha para uma coisa #amiliar, atravs de vários estágios$. oetee (1999): (;<) “estamos cercados por uma empresa de degradação, crueldade e morte que rivalia com qualquer coisa que o e rceiro re ich tenha sido capa de #aer (...), trata-se de uma empresa interminável, que se auto-repr odu, traendo incessantemente ao mundo coelhos, ratos, aves e gado com o propósito de matá-los$. “" simpatia tem tudo a ver com o o!%eto e pouco a ver com o su%eito$.

Berger Coetzee Singer

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Berger (1980):

Berger (1980):

Nos primeiros estgios da revoluo industrial os animais eram usados como mquinas (...). Mais tarde, nas chamadas sociedades ps-industriais, so tratados como matria bruta. Animais consumidos como alimento so processados como mercadorias manufaturadas.

Dualismo entre representao e engajamento com espcies animais, que so sujeitados e adorados; criados e sacrificados.

Hoje os vestgios desse dualismo permanecem entre aqueles que vivem intimamente com, e dependem dos animais. Um campons gosta do seu porco e fica contente ao salgar sua carne. O que significativo, e to difcil para o estranho urbano entender, que as duas afirmaes so ligadas por um e, e no por um mas.

Relao tradicional com o boi. Universo rural que se contrape ao universo urbano a partir de uma relao diferente com o sacrifcio e com a culpa.

A Farra interpretada como ritual parece se inscrever tambm nesse mesmo tipo de dualismo, apesar estabelecer uma relao em que o boi surge como algo extraordinrio, que no faz parte do cotidiano. Na cultura tradicional do boi, ele subjetivado e sacrificado. Talvez por isso a manifestao popular se torne to inaceitvel; o que est em jogo nela no tanto a condenao estrutural da violncia, mas o rompimento com o cdigo estabelecido em que a violncia pode se dar. A Farra do Boi rompe, de alguma forma, com os trs aspectos de descontaminao simblica apontados acima: desapego, ocultamento e transferncia da culpa. A idia de desapego, apesar de no estar ausente, subvertida a partir da formulao do brincar, como um engajamento que se refere imitar e enfrentar a fria do boi. Quanto ao ocultamento, obviamente descartado quando se traz o boi para a praa pblica. A noo de transferncia da culpa pode ser desdobrada em dois aspectos, a partir do momento que quem mata o boi tambm quem vai com-lo. Isso se inscreve no tipo de ambigidade a que Berger se refere; o sacrifcio faz parte da relao estabelecida com o boi, e a carne que vai ser comida traz a memria dessa relao e daquele boi individualizado.Ingold:

Anlise histrica das relaes produtivas entre humanos e animais.

Economia de caa: relao social entre humanos e animais onde as presas so reconhecidas como pessoas.

Domesticao tradicional: animais domesticados fazendo parte do grupo social como escravos cativos; fora de trabalho e alimento. Nas fazendas industriais modernas, as relaes entre os homens e o gado se movem definitivamente do pessoal para o impessoal: o animal se move de uma pessoa estranha para uma coisa familiar, atravs de vrios estgios.

Coetzee (1999):(27) estamos cercados por uma empresa de degradao, crueldade e morte que rivaliza com qualquer coisa que o Terceiro reich tenha sido capaz de fazer (...), trata-se de uma empresa interminvel, que se auto-reproduz, trazendo incessantemente ao mundo coelhos, ratos, aves e gado com o propsito de mat-los.

A simpatia tem tudo a ver com o objeto e pouco a ver com o sujeito.

Idia de simpatia ou compaixo como base para as campanhas de proteo dos animais. Reao mecanizao violenta produzida pelas fazendas industriais.

(62) A tourada, me parece, nos d uma pista (de uma relao primitivista). Matar a fera sempre, dizem eles, mas transformar isso em competio, um ritual, e homenagear a fora e a valentia de seu antagonista. Come-lo tambm, depois de t-lo vencido (...).Ns nos tornamos muito numerosos. No h tempo para respeitar e honrar os animais de que precisamos para nos alimentar. Precisamos de indstrias de morte; precisamos de animais industriais.

(107-108) Peter Singer. Argumento da morte indolor, no antecipada. Idia de que o animal pode viver uma vida feliz e ser morto sem dor, substitudo por outro de sua espcie.

Hierarquia entre os animais:Imagine que eu diga que porcos e cachorros tm conscincia de si prprios at certo ponto, e realmente tm pensamentos sobre coisas futuras. Isso forneceria uma razo para se considerar intrinsecamente errado mat-los. (E quanto aos bois?) Ele segue: Mesmo assim, existem outros animais galinhas talvez, ou peixes que so capazes de sentir dor, mas no tm nenhuma autoconscincia ou capacidade de pensar sobre o futuro. Para esses animais, voc no me deu nenhuma razo de por que a morte sem dor seria errada, se outros animais tomarem seus lugares e levarem uma vida igualmente boa.