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QUE TIPO DE MUNDO DESEJAMOS
TRANSMITIR ÀQUELES QUE VÊM
DEPOIS DE NÓS?
biCIT boletim informativo da Cáritas da Ilha Terceira
NO
VE
MB
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/DE
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MB
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20
15
ED
IÇÃ
O 3
.
SUSTENTABILIDADE & INTERVENÇÃO SOCIAL
A AÇÃO DA CIT
PROJETO TRAD(E)-IN
HORTA BIOLÓGICA DA ARCIT
ECOLOGIA INTEGRAL
DIRETOR REGIONAL DA SOLIDARIEDADE SOCIAL FALA
DOS DESAFIOS FUTUROS NOS AÇORES
IMAGEM DA CAPA: pavel ahmed (CC BY 2.0)
ENTIDADE FINANCIADORA:
08 32 60
EDIÇÃO 3 NOVEMBRO/DEZEMBRO DE 2015
02
08 SUSTENTABILIDADE & INTERVENÇÃO SOCIAL
História da agricultura Biológica nos Açores, visão da Cári-
tas sobre a sustentabilidade e intervenção social, Projeto
Trad(e)-In, horta da Arcit são alguns dos temas abordados
nesta edição especial sobre sustentabilidade e intervenção
social
32 UMA DÉCADA DE EXISTÊNCIA DO CDIJ
Ana Pimentel, a Coordenadora Pedagógica da UFCIT/CDIJ
leva-nos numa visita guiado pelos 10 anos de existência
do Centro de Desenvolvimento e inclusão Juvenil
34 PAPEL DA MEDIAÇÃO NO CDIJ
Apresentamos aqui a visão de alguns dos mediadores do
CDIJ sobre o seu Papel
60 SOLIDARIEDADE NOS AÇORES
Dr. Federico Sousa apresenta a visão da Direção Regional
da Solidariedade social sobre a solidariedade nos Açores
e quais os desafios futuros
Nuno Lopes Coordenador da Unidade de Planeamento, Qualidade e Comunicação da CIT
03
E ditorial A questão “Que tipo de mundo desejamos transmitir
àqueles que vêm depois de nós?”, proferida pelo Papa
Francisco na encíclica 'Laudato si', serve de mote a
esta edição 3 do biCIT. Apesar de este ter solicitado
para que os 150 líderes mundiais que participaram em
Paris na Cimeira do Clima (COP21) focassem os seus
esforços em "atenuar o impacto das alterações climáti-
cas, combater a pobreza e favorecer a dignidade hu-
mana", não parece ter surgido no documento final des-
ta cimeira qualquer referência à alteração na produção
agrícola atual industrializada, que causa 3 triliões de
dólares por ano em danos ambientais. Tentamos aqui
divulgar de que forma a Cáritas da Ilha Terceira
conjuga a Intervenção Social com a Sustentabilidade
ambiental, nomeadamente através da aposta na
agricultura biológica. Nesta edição evocamos a comemo-
ração dos dez anos de existência do Centro de De-
senvolvimento e Inclusão Juvenil da Cáritas da Ilha
Terceira e a visão sobre o papel da mediação na in-
tervenção realizada por esta valência. Terminamos
com o Dr. Federico Furtado Sousa, Diretor Regional da
Solidariedade Social, a apresentar a sua visão sobre a
solidariedade nos Açores e os desafios futuros.
04
Campanha 10 Milhões de Estrelas Arrancou no passado dia 28 de novembro a Campanha 10 Milhões de Estrelas - Um Gesto pela Paz, na Ilha Terceira, com uma celebra-ção eucarística, na Igreja Matriz da Praia da Vitória, seguida de um momento de convívio e animação no Lar D. Pedro V.
Esta campanha consiste em propor à comunidade que, na noite de Natal, acenda uma vela como gesto pela busca da paz, justiça e soli-dariedade. Este é um gesto rico em simbolismo, quer pela nature-za da luz, como sinal de
NOTICIAS esperança para a constru-ção de um mundo onde o bem e a felicidade sejam apanágio de todos, quer pe-la comunhão de conceitos, gerada em torno de um ide-al nobre e significativo. A venda das respetivas ve-las será feita nas diversas paróquias da Ilha, sendo que também poderão ser adquiri-das junto da Cáritas Dioce-sana, no Lar D. Pedro V, no Hospital de Santo Espírito da Ilha Terceira e num qui-osque montado para a oca-sião na Rua da Esperança em A.H. Aproveitamos para agradecer a todos os que comparece-ram neste evento, ao Lar D. Pedro V, por nos ter recebi-do, e ao Grupo de Jovens Nossa Senhora do Guadalu-pe, bem como ao Sr. Ricar-do Ávila pela bela animação proporcionada.
A ARCIT participou, no
passado dia 14 de no-
vembro, na campanha
SOS Cagarro.
Foi uma noite dedicada
a uma causa, onde o
dever cívico e o respei-
to pela natureza foram
as palavras de ordem.
Foram momentos de
aprendizagem, mas tam-
bém de convívio e par-
tilha.
Felizmente não tivemos
de intervir, uma vez
que a maioria destes
animais já seguiu o
seu rumo. Ficaram os
conhecimentos e a von-
tade de repetir!
ARCIT participa na Campanha S.O.S.
Cagarro
Cáritas recebe o novo Bispo Coadjuntor de Angra No passado dia 07 de de-zembro, a Cáritas da Ilha Terceira deu as boas-vindas ao novo Bispo Co-adjutor de Angra do Hero-ísmo, D. João Lavrador. Tendo ficado a confeção do lanche ao cuidado dos nossos alunos das turmas de Pastelaria e Doçaria Tradicional Açoriana, e Transformação Frutícola.
05
A Cáritas dos Açores está a promover as "Jornadas Pastoral Social", com o objetivo de motivar a comu-nidade cristã para a organi-zação da ação social na paróquia. O Projeto + PRÓXIMO con-tinua a ser um projeto de formação destinado a todas
Jornadas Pastoral Social são social, conduziu a que se tornasse determi-nante a construção de uma ação social mais próxima, a qual apela ao envolvimento de todas e de cada uma das comu-nidades cristãs e, conse-quentemente, ao rejuve-nescimento da Pastoral Social. “O amor ao próximo, ra-dicado no amor de Deus, é um dever, antes de mais, para cada um dos fiéis, mas é-o também para a comunidade eclesi-al inteira.” (Deus caritas est, 20)
as paróquias da Diocese dos Açores. Agora, em for-mato de jornadas, irá percorrer as cin-co zonas pastorais da Ilha Terceira. A emergência de uma reali-dade social, caraterizada por um aumento de situa-ções de pobreza e exclu-
06
MENSASAGEM DE NATAL
“Carta ao Menino Jesus”
ANABELA BORBA PRESIDENTE DA CÁRITAS DA ILHA TERCEIRA
uerido Menino
Jesus...
Neste tempo de
Natal que se aproxima,
vêem-me à memória pala-
vras da minha avó, que
me dizia muitas vezes,
sem que percebesse bem
o alcance do que dizia,
“vivemos num cantinho do
céu”. Então Menino Jesus,
o que desejo em primeiro
lugar é agradecer-te por
tantas pessoas que podem
viver assim, como “num
cantinho do céu”, livres,
amadas, em segurança,
com acesso a condições
de bem-estar, onde é fácil
fazer festa neste tempo de
Natal, em que as famílias
se reúnem, trocam presen-
tes e estão felizes.
Mas infelizmente tu sabes
que a grande maioria da
humanidade não vive as-
sim, neste mundo tão de-
sigual, onde poucos têm
muito, mas milhões não
têm nada. Neste mundo em
guerra, com tantas pessoas
irmãs nossas: sem casa,
sem teto, sem lugar, apete-
ce-me usar as palavras da
minha avó, e pedir-te “um
cantinho do céu”, onde as
pessoas vivam amadas, em
casas cheias de luz, enfei-
tadas com bonitas flores,
quentinhas e confortáveis,
em aldeias ou cidades on-
de as pessoas estão a tra-
balhar, onde existe comida,
acesso à educação, e saú-
de, onde as ruas estão
limpas, sem bombas, nem
atiradores furtuitos, sem ca-
sas destruídas, numa pala-
vra em PAZ.
Tu, que conheces bem o
que é nascer sem lugar,
sem condições, sem confor-
to, mas com todo o acon-
chego do amor de uma
Q
(…) neste mundo tão desigual, onde poucos
têm muito, mas milhões não têm nada (…)
07
mãe e de uma família, in-
funde o Teu amor no cora-
ção dos líderes mundiais, e
no de todos os homens,
para que cada um acolha
o outro, e permita que to-
do o homem possa viver
com dignidade e em segu-
rança.
É urgente que olhes para
este mundo em desagrega-
ção, onde toda a gente
suspeita do vizinho, o ódio
cresce entre irmãos, só
porque são de cor, ideolo-
gia ou fé diferente, onde
não há lugar para muitos.
Faz com que a Tua men-
sagem, que sempre foi de
amor, toque no coração de
cada Homem.
Embora não goste da pres-
sa, das correrias sempre
associadas ao que dizem
ser o Teu tempo, o tempo
do Natal, continuo fã das
luzes, dos enfeites, das can-
ções de Natal, da festa; é
que a Tua presença entre
nós é motivo de festa. De
certo, ficas triste, quando
nós não vivemos este tempo
de Natal, como Tu desejari-
as; que fiquemos pela azáfa-
ma das compras, pelos sa-
cos com embrulhos, pelas
luzes que encandeiam, mas
não iluminam.
O Teu tempo, que não é
meramente este tempo de
Natal, mas o ontem, o hoje
e o amanhã, é o tempo da
Luz que vem do Alto, que
ilumina o Mundo, que ilumi-
na cada Homem, para a
construção de um Mundo
melhor, mais justo, mais soli-
dário. O Teu tempo é tempo
de esperança, da certeza
que Contigo, o nosso tempo,
pode ser melhor, com paz,
justiça, vida e verdade.
Que o Teu tempo seja pa-
ra cada Homem, “um canti-
nho do céu”, aqui na terra.
A Cáritas da Ilha Terceira
deseja um Santo e Feliz
Natal a todos os seus
utentes, colaboradores, vo-
luntários, parceiros, financia-
dores e a quem nos acom-
panha nas nossas ações
de âmbito social. Que jun-
tos, continuemos a nossa
caminhada de estar “mais
próximo do próximo”
(…) faz com que a Tua mensagem, que foi
sempre de amor, toque no coração de cada
Homem (…)
08
SUSTENTABILIDADE & INTERVENÇÃO SOCIAL
Cimeira do Clima sem
referência à
alteração na produ-
ção Agrícola Adaptado da publicação original do
facebook da SATIVA
resolução que saiu da 21ª Cimeira do Clima em Paris, não faz qualquer referên-
cia à necessidade de alterar a produção agrícola, apesar dos apelos no movimento da agricultura biológica que apela-va ao fim das práticas agríco-las industriais de elevadas emissões de CO2. Segundo a
página do facebook da SA-TIVA, «a agricultura indus-trializada causa 3 triliões de dólares por ano em danos ambientais». «Produzir o alimento que comemos do campo à me-sa contribui para cerca de metade de todas as emis-sões de gases de efeito estufa induzidas pelo ho-mem. Quando se trata de gases de efeito estufa (GEE), o sector agrícola é o segundo contribuinte a seguir ao sector da ener-gia». Mas apesar disso, este facto não foi tido em conta no acordo final doa COP21. «O IFOAM apela a um acordo sobre o clima que reconheça a importância do setor da terra e do início de um processo de desen-volvimento de princípios claros e transparentes para garantir que a tomada de ações sobre as alterações
climáticas estão em confor-midade com as considera-ções sociais e ecológicos. "A agricultura industrial é uma das principais causas da mudança climática, e os habituais agro-negócios não são uma opção", afir-ma André Leu, presidente da IFOAM. "Apenas uma transição para a agroecolo-gia e agricultura biológica pode levar a cortes profun-dos nas emissões na pro-dução de alimentos". Estamos já a produzir o suficiente para alimentar o mundo ainda que um terço dos alimentos não chegue à mesa. Metade dos pe-quenos agricultores que cultivam a maior parte da produção agrícola mundial estão entre a população que tem fome. Como An-dre Leu, destaca "A menos que os agricultores adiram às tecnologias agroecológi-cas, os desafios colocados
A
09
locais para produzir alimen-tos são adquiridas para serem usadas em projetos de compensação de carbo-no, a consequência será colocar mais 600 milhões de pessoas em risco de fome em 2080". Não podemos perder de vista o facto de que a mudança climática está a causar danos para aqueles que cultivam os nossos alimentos. Os agricultores devem ter capacidade para se livrarem da pobreza e da fome, alimentar as crescentes populações lo-cais e globais e mitigar o aquecimento global através de baixa emissão e práti-cas e sistemas agrícolas de alto sequestro. Ao contrário de agricultura química que agrava a mu-dança climática, as práticas de cultivo biológico usam fatores de produção que levam a menos emissões de GEE e são benéficas para os solos. Os agricul-tores biológicos trabalham com técnicas como a rota-ção de culturas que fixam mais carbono no solo. É nesta base que as medi-das de mitigação deverão ser enraizadas - redução das emissões e fixação de carbono no solo, sem comprometer a segurança alimentar.»
pelas alterações climáticas e os impactos sobre a produção de alimentos se-rão devastadores, levando milhões para a pobreza." Agricultura e ações de mi-tigação relacionadas com a floresta devem, assim, con-tribuir para a segurança alimentar e combater ativi-dades com as maiores emissões, tais como o uso de fertilizantes em particu-lar nos países mais emis-sores. Medidas de mitigação ba-seadas no solo não devem ser consideradas uma solu-ção rápida para as altera-ções climáticas, porque uti-lizam a compensação de carbono em vez da elimi-nação gradual dos combus-tíveis fósseis. Gábor Fi-geczky, Gestor do IFOAM adverte que "Se, em nome da luta contra as altera-ções climáticas, as terras utilizadas pelos agricultores
(…) Estamos já a
produzir o suficiente
para alimentar o
mundo ainda que
um terço dos ali-
mentos não chegue
à mesa (…)
foto: CC BY 2.0 - US Department of Agriculture
SUSTENTABILIDADE & INTERVENÇÃO SOCIAL
Agricultura Bioló-gica Produção e consumo
CÉSAR MEDEIROS ENG.º AGRICULA
10
os Açores, tal
como em Portu-
gal continental e
na Europa, a área de pro-
dução inscrita nos operado-
res de controlo e certifica-
ção tem aumentado consi-
deravelmente. A agricultura
biológica nos Açores come-
çou a dar os primeiros
passos em 1990 e muito
trabalho teve que ser feito
por várias pessoas, entida-
des e instituições de ensi-
no- Universidade dos Aço-
res. Sendo, porém, legítimo
questionar se foi o sufici-
ente? Se foi o percurso
ideal? Bem, foi o possível.
Atualmente o modo de
produção biológico (MPB)
está mais próximo do con-
ceito original. Revisitando,
“A Agricultura Biológica é
N
um modo de produção que
visa produzir alimentos e
fibras têxteis de elevada
qualidade, saudáveis, ao
mesmo tempo que promo-
ve práticas sustentáveis e
de impacto positivo no
ecossistema agrícola. As-
sim, através do uso ade-
quado de métodos preven-
tivos e culturais, tais como
as rotações, os adubos
verdes, a compostagem, as
consociações e a instala-
ção de sebes vivas, entre
outros, fomenta a melhoria
da fertilidade do solo e a
biodiversidade” Agrobio.
A produção em Agricultura
Biológica assume-se cada
vez mais como uma opor-
tunidade para a Agricultura
Açoriana. Pois produz pro-
dutos diferenciados, com
um valor acrescentado, que
têm registado um aumento
na procura por parte do
consumidor. Neste momen-
to, arrisco a afirmar que a
procura excede a oferta
local de produtos hortíco-
las, frutícolas e de origem
animal (ovos).
De entre as muitas enunci-
adas razões para o consu-
mo de alimentos, destacam
-se o benefício sobre a
saúde, as razões ambien-
tais, e o incentivo à pro-
11
dução regional e nacional
de qualidade.
Sabor: em solos regenera-
dos e fertilizados com ma-
téria orgânica, as plantas
crescem saudáveis e de-
senvolvem o seu verdadei-
ro aroma, a sua cor e
sabor autênticos, permitindo
-nos redescobrir o verda-
(…) em solos regenerados e fertilizados com ma-
téria orgânica, as plantas crescem saudáveis e
desenvolvem o seu verdadeiro aroma (…)
deiro gosto dos alimentos.
Solo fértil: O solo é a ba-
se de toda a cadeia ali-
mentar e a principal preo-
cupação da Agricultura Bio-
lógica. Toda a prática agrí-
cola deve ter como objetivo
conservar e melhorar a fer-
tilidade do solo, aumentan-
do o seu teor de matéria
orgânica
12
orgânica.
Certificação: Os produtores
biológicos seguem um ca-
derno de normas, verificado
por organismos de controlo
e certificação, segundo a
legislação europeia de Agri-
cultura Biológica.
Dignidade do agricultor: A
Agricultura Biológica permite
revitalizar os meios rurais e
restituir ao agricultor a dig-
nidade e reconhecimento
que lhe são merecidos,
pelo seu papel de guar-
dião da paisagem, dos
ecossistemas agrícolas e
primeiro garante da saúde
humana.
Emprego: A Agricultura bio-
lógica cria oportunidades
de emprego permanente e
gratificante devido às práti-
cas ecológicas e à dimen-
13
são das explorações agríco-
las, adaptadas à escala hu-
mana.
Futuro: Os produtores bioló-
gicos são audaciosos inova-
dores que combinam os co-
nhecimentos mais modernos
com as práticas e saberes
tradicionais, dispensando o
uso de todos os produtos
poluentes do ecossistema.
(Jean-Claude Rodet - funda-
dor da Agrobio).
É sobre os últimos dois
pontos que a Cáritas da
Ilha Terceira através do
projeto Terra Nostra – Ca-
pacitações com Raízes, cu-
jos mentores Francisco Si-
mões e Rui Drumonde er-
gueram e criaram condições,
com todo o apoio da Dire-
ção da Cáritas – Anabela
Borba, proporcionando forma-
ção a dois grupos de jo-
vens em situação de risco
em agricultura biológica. A
formação permitiu aos jo-
vens adquirir competências
técnicas, alicerçadas em
competências individuais e
sociais.
Hoje ser um operador de
agricultura biológica com
formação é fundamental e
faz a diferença na hora
de vestir a camisola e de-
sempenhar as suas fun-
ções. A sensibilidade do
operador, aliado ao conhe-
cimento, o respeito pelo
ambiente, pelos recursos
naturais e biodiversidade
são imprescindíveis para de-
sempenhar as funções de
forma adequada.
(…) A agricultura Biológica cria oportunidades
de emprego permanentemente e gratificantes
devido às práticas ecológicas e à dimensão
das explorações agrícolas, adaptadas à escala
humana (…)
SUSTENTABILIDADE & INTERVENÇÃO SOCIAL
“A Nossa Casa Comum”
LIVRAMENTO CARVALHAL DIREÇÃO DA CÁRITAS DA ILHA TERCEIRA
ntrámos no sé-
culo XXI e as
grandes transfor-
mações, quer sociais, quer
relacionadas com a conser-
vação do ambiente, toma-
ram, em algumas franjas
das comunidades, um rumo
gravoso que atinge, com
violência, uma enorme ca-
mada da população.
É então urgente tomarmos
consciência que tal consta-
tação exige de cada indivi-
duo e dos grupos, uma
postura proactiva conducen-
te a práticas cada vez
mais próximas da realida-
de, mobilizadoras de ação
e inovação, nas questões
de cidadania. É preciso
cuidar do ser humano e
da natureza que o suporta.
A Igreja, na defesa dos
princípios que perfilha,
sempre esteve atenta a
tudo o que diga respeito
a condições da dignidade
humana e sua relação
com o meio ambiente. As
chamadas de atenção nes-
E tes domínios foram uma
constante, ao longo dos
tempos. Na atualidade, a
intervenção sistemática da
Igreja continua.
E, se dúvidas houvesse,
escute-se o Papa Francisco,
que desde o início do seu
pontificado, tem abordado,
com veemência, estes te-
mas nas homílias, encontros
com jornalistas e em diver-
sos documentos. Além de
advertir quanto ao volume
desmedido que a pobreza
atingiu no mundo, tem dado
especial atenção às ques-
tões relacionadas com a
preservação do ambiente e
reforçado a ideia da res-
ponsabilidade do homem
perante a criação. É ainda
apontada pelo Santo Padre
como nefasta, a «cultura do
descarte». Na Encíclica
«LAUDATO SI», faz referên-
cia constante à necessidade
de olharmos o Mundo como
a «nossa casa comum».
Estas problemáticas, como
se sabe, são muito abran-14
gentes e só mediante um
processo educacional ence-
tado o mais cedo possível
nas crianças e jovens, po-
der-se-á ganhar alguma efi-
cácia. A Cáritas da Ilha
Terceira, desde há muito,
assumiu e optou decidida-
mente por essa via, desen-
volvendo uma larga gama
de atividades com jovens,
numa perspetiva de promo-
ver a interiorização de prin-
cípios que venham a norte-
ar procedimentos, em prol
do bem comum.
Perante a constatação dos
factos, na Cáritas da Ilha
Terceira (CIT), reflete-se,
discute-se e procura-se res-
ponder adequadamente à
situação de jovens da co-
munidade, de modo a que
estes consigam encontrar
um rumo definido, quer ao
nível académico, quer com-
portamental, rumo esse que
lhes venha a dar suporte
para a estruturação neces-
sária à construção de um
futuro, conducente a uma
realização pessoal efetiva,
com hipótese de garantias
de segurança e dignidade.
Para que isso aconteça e
sabendo que o trabalho é,
sem dúvida, uma instância
privilegiada de inserção so-
cial, que surge e interfere
de modo decisivo, nas pro-
duções da subjetividade e
na elaboração dos paradig-
mas de comportamento, pro-
cura-se que essa vertente
seja instaurada, tentando
15
criar assim condições mode-
ladoras de trajetórias de
vida consistentes.
A título de reflexão, consi-
derem-se as transformações
que vêm ocorrendo no
mundo laboral - ausência
do emprego estável, aumen-
to do desemprego, precari-
zação e novas formas de
trabalho flexível – fatores
que afetam toda a popula-
ção, marcando de forma
16
indelével os jovens. A Cá-
ritas da Ilha Terceira in-
veste então, com muito
esforço, neste domínio,
concluindo ser urgente in-
ventariar alguns modelos e
formas de ação que ve-
nham a colmatar esses
danos.
Sob esta visão, comente-se
que, tanto a vertente do
indivíduo como elemento
integrante da comunidade
em que se insere, como
as marcas da sua subjeti-
vidade, são compreendidas
e aceites como produção
histórica resultante de uma
relação dialética com a re-
alidade objetiva dos gru-
pos, dos espaços e das
épocas.
Neste esforço de adequa-
ção ao mundo atual, pro-
cura-se imprimir aos pro-
cessos, proximidade, dina-
mismo, organização e ino-
vação, tendo sempre como
referência prioritária aqueles
que mais necessitam, tanto
no âmbito da situação
económica, como no res-
peitante às vertentes de
natureza psíquica ou profis-
sional.
Então, nesta perspetiva de
promoção dos jovens, têm
sido formuladas propostas
e concebidas iniciativas
que ajudam na construção
de percursos de vida, de
acordo com modelos e
configurações assumidos
pelas novas formas de tra-
balho. Como exemplo, te-
mos a concretização de
alguns projetos onde se
aplicam técnicas inovadoras
e se fomenta a interioriza-
ção de competências e
saberes que serão fatores
decisivos no incremento de
modelos de formação inte-
gral – refira-se o «TERRA
NOSTRA» e «TRAD(E)-IN»,
entre outros.
Na implementação destes
(…) procura-se impri-
mir aos processos,
proximidade, dina-
mismo, organização
e inovação, tendo
sempre como refe-
rência prioritária
aqueles que mais
necessitam (…)
programas, enveredou-se
pela introdução de ativida-
des tradicionais – pastela-
ria, doçaria regional e hor-
ticultura. Na vertente da
produção agrícola, seguem-
se práticas da agricultura
biológica com a fuga ao
uso de produtos químicos.
Outra componente destas
atividades tem a ver com
as situações de desperdí-
cio, pelo que se processa
a introdução sistemática de
compostagem e reciclagem
de residios, embora, isto
tudo ainda a um nível
bastante elementar, apenas
e quase só, na fase de
sensibilização para futuras
realizações que permitam a
sustentabilidade.
Na vertente da formação
humana dos jovens, procu-
ra-se integrar, além de as-
petos individuais – gostos,
habilidades, preferências …
- os de natureza académi-
ca e profissional, que lhes
forneçam mecanismos e
competências para a inser-
ção futura no mundo do
trabalho. Em simultâneo,
são também cultivados os
princípios relativos à pre-
servação do ambiente e
conservação da saúde, a
que os pensadores do
nosso século tanto apelam.
Para responder a exigên-
cias da sociedade, no pre-
sente, fomenta-se também,
nos empreendimentos reali-
zados sob a alçada da
Cáritas, o espírito de coo-
peração e interajuda, quer
no respeitante aos desem-
penhos do dia a dia, quer
no formular de parcerias,
com outras forças vivas da
comunidade, respondendo
assim a outro apelo feito
por Sua Santidade o Papa
Francisco, que é a
«cultura da solidariedade e
do encontro».
Para reforçar tudo o que
atrás foi abordado e de-
17
(…) são também culti-
vados os princípios
relativos à preserva-
ção do ambiente e
conservação da saú-
de, a que os pensado-
res do nosso século
tanto apelam. (…)
18
monstrar que as tentativas
da Cáritas da Ilha Tercei-
ra, iniciam modelos ade-
quados às exigências do
momento presente, refira-se
mais uma mensagem de
Sua Santidade o Papa
Francisco:
«O urgente desafio de
proteger a nossa casa co-
mum inclui a preocupação
de unir toda a família hu-
mana na busca de um
desenvolvimento sustentável
e integral… »
Tem merecido especial
atenção, nas propostas e
atividades da Cáritas as
situações resultantes de
transformações sociais e
da crise económica que se
registou na Região e se
tem prolongado, deixando
marcas indeléveis, em toda
a população, mas especial-
mente notórias na juventu-
de.
Perante a constatação des-
te resultado, a Cáritas da
Ilha Terceira tem procurado
implementar e desenvolver
atividades, de acordo com
o seu lema de ação
«Sempre mais Próximo do
Próximo», as diretrizes do
seu Plano Estratégico,
sempre tendo em conta o
que atrás foi referido –
consequências da relação
dos indivíduos com o meio
e a modalidades e exigên-
cias que daí resultam.
O Santo Papa João XXIII
apelou aos cristãos e to-
das as pessoas de boa
vontade que «…à vista da
deterioração do ambiente,
quero dirigir-me a cada
pessoa que habita neste
planeta» e ainda «… pre-
tendo especialmente entrar
em diálogo com todos
acerca da nossa casa co-
mum.»; o Beato Papa
Paulo VI referiu-se à pro-
blemática ecológica apre-
sentando-a como uma crise
que é «consequência dra-
mática» da atividade des-
controlada do ser humano
e falou da possibilidade
duma «catástrofe ecológica
sob o efeito da explosão
da civilização industrial»;
São João Paulo, debruçou-
se com interesse, sobre
este tema e advertiu que
o ser humano parece «não
dar-se conta de outros de
outros significados do seu
ambiente natural, para
além daqueles que servem
para fins de um uso ou
consumo imediatos»
19
Excertos da encíclica “LAUDATO SI’” do Papa Francisco:
“Não quero prosseguir esta encíclica sem invocar um modelo belo e motivador. Tomei o seu nome por guia e inspiração, no momento da minha eleição para Bispo de Roma. Acho que Francisco é o exem-plo por excelência do cuidado pelo que é frágil e por uma ecologia integral, vivida com alegria e au-tenticidade. É o santo padroeiro de todos os que estudam e trabalham no campo da ecologia, amado também por muitos que não são cristãos. Manifestou uma atenção particular pela criação de Deus e pelos mais pobres e abandonados. Amava e era amado pela sua alegria, a sua dedicação generosa, o seu coração universal. Era um místico e um peregrino que vivia com simplicidade e numa maravilhosa harmonia com Deus, com os outros, com a natureza e consigo mesmo. Nele se nota até que ponto são inseparáveis a preocupação pela natureza, a justiça para com os pobres, o empenhamento na soci-edade e a paz interior.” “O urgente desafio de proteger a nossa casa comum inclui a preocupação de unir toda a família hu-mana na busca de um desenvolvimento sustentável e integral, pois sabemos que as coisas podem mu-dar. O Criador não nos abandona, nunca recua no seu projeto de amor, nem Se arrepende de nos ter criado. A humanidade possui ainda a capacidade de colaborar na construção da nossa casa comum. Desejo agradecer, encorajar e manifestar apreço a quantos, nos mais variados sectores da atividade hu-mana, estão a trabalhar para garantir a proteção da casa que partilhamos. Uma especial gratidão é devida àqueles que lutam, com vigor, por resolver as dramáticas consequências da degradação ambiental na vida dos mais pobres do mundo. Os jovens exigem de nós uma mudança; interrogam-se como se pode pretender construir um futuro melhor, sem pensar na crise do meio ambi-ente e nos sofrimentos dos excluídos.” “Existem formas de poluição que afetam diariamente as pessoas. A exposição aos poluentes atmosféricos produz uma vasta gama de efeitos sobre a saúde, particularmente dos mais pobres, e provocam mi-lhões de mortes prematuras. Adoecem, por exemplo, por causa da inalação de elevadas quantidades de fumo produzido pelos combustíveis utilizados para cozinhar ou aquecer-se. A isto vem juntar-se a polui-ção que afeta a todos, causada pelo transporte, pelos fumos da indústria, pelas descargas de substân-cias que contribuem para a acidificação do solo e da água, pelos fertilizantes, inseticidas, fungicidas, pesticidas e agrotóxicos em geral. Na realidade a tecnologia, que, ligada à finança, pretende ser a única solução dos proble-mas, é incapaz de ver o mistério das múltiplas relações que existem entre as coisas e, por isso, às vezes resolve um problema criando outros.” “Entretanto não basta pensar nas diferentes espécies apenas como eventuais «recursos» exploráveis, es-quecendo que possuem um valor em si mesmas. Anualmente, desaparecem milhares de espécies vege-tais e animais, que já não poderemos conhecer, que os nossos filhos não poderão ver, perdidas para sempre. A grande maioria delas extingue-se por razões que têm a ver com alguma atividade humana. (…) Por exemplo, muitos pássaros e insetos, que desaparecem por causa dos agrotóxicos criados pela tecnolo-gia, são úteis para a própria agricultura, e o seu desaparecimento deverá ser compensado por outra intervenção tecnológica que possivelmente trará novos efeitos nocivos. São louváveis e, às vezes, admiráveis os esforços de cientistas e técnicos que procuram dar solução aos problemas criados pelo ser humano. Mas, con-templando o mundo, damo-nos conta de que este nível de intervenção humana, muitas vezes ao serviço da finança e do consumismo, faz com que esta terra onde vivemos se torne realmente menos rica e bela, cada vez mais limitada e cinzenta, enquanto ao mesmo tempo o desenvolvimento da tecnologia e das ofertas de consumo continua a avançar sem limites. Assim, parece que nos iludimos de poder substituir uma beleza insuprível e irrecuperável por outra criada por nós.
20
SUSTENTABILIDADE & INTERVENÇÃO SOCIAL
“Ecologia Inte-gral”
ROSA PIRES COORDENADORA DO PROJETO + PRÓXIMO CARITAS DOS AÇORES
ão é minha pre-
tensão escrever
um tratado teoló-
gico ou um estudo de in-
vestigação exaustivo sobre
a Encíclica do Papa, gos-
tava porém de partilhar em
simples palavras o que
consegui reter ao ler
“Laudato si”. Logo à parti-
da e de tanto ouvir falar
na mesma, pensei que o
Papa iria pedir para plan-
tarmos árvores, poupar
água e respeitar as criatu-
ras…. Fiquei surpreendida
quando deparo com um
dos documentos mais cora-
josos dos últimos tempos.
Trata do problema da eco-
logia sim, mas dando uma
nova visão, propõe uma
nova ecologia: a “Ecologia
Integral”. A Encíclica pro-
põe um grande desafio pa-
ra toda a humanidade,
crentes e não crentes, que
inclui claramente as dimen-
sões humanas e soci-
ais” (137). Este na verda-
de sempre foi e sempre
será o cerne da luta eco-
lógica da Igreja. O centro
deve ser o humano e o
meio ambiente deve ser
entendido como um contex-
to da realidade, seja ele
natural ou produzido pelas
mãos do homem.
No 1º capítulo o Papa
Francisco faz um retrato
do que está a acontecer
à “Nossa Casa comum”.
Alerta para as transforma-
ções que se sucedem a
um ritmo acelerado e mui-
tas delas contribuem para
a deterioração do mundo
em que vivemos. As cau-
sas têm a sua origem na
poluição que não param
de aumentar e se verifica
a vários níveis.
A destruição da natureza e
toda a atividade que con-
tamina as águas, o solo e
o ar é um crime contra
natura, contra nós mesmos
e um pecado contra Deus,
o Papa chama a esses
N
SUSTENTABILIDADE & INTERVENÇÃO SOCIAL
“Ecologia Inte-gral”
ROSA PIRES COORDENADORA DO PROJETO + PRÓXIMO CARITAS DOS AÇORES
pecados “pecados contra a
Criação” (8) e convida-nos
a reconhecer e a mudar
dando-nos o
exemplo de
São Francisco
de Assis “que
vivia numa
harmonia total
com Deus,
com os ou-
tros, com a natureza e
consigo mesmo” (9). Tra-
tando todas as criaturas
pelo nome de irmãs. O
Papa usa a analogia do
enamoramento entre duas
pessoas para descrever o
encantamento de Francisco
de Assis pela natureza.
(11). É esse encantamento
que nós devemos conquistar
como sendo um fio condu-
tor que nos leva ao amor
a Deus e por consequên-
cia a todas as
criaturas.
A poluição está
também a con-
tribuir para a
perda da biodiversidade
pois desaparecem anual-
“ (…) A Encíclica propõe um grande desafio para
toda a humanidade, crentes e não crentes, que
inclui claramente as dimensões humanas e soci-
ais (…) ”
21
Imagem: Korean Culture and Information Service (CC BY-SA 2.0 )
bre os princípios da Doutri-
na Social da Igreja, debru-
ça-se sobre dois destes
princípios fundamentais:
Princípio do bem comum e
o princípio do destino uni-
versal dos bens. Esta análi-
se não nos pode passar
ao lado, como crentes. Te-
mos a responsabilidade e o
dever de olharmos à nossa
volta e ver os nossos ir-
mãos que mais sofrem seja
qual for o tipo de sofrimen-
to. Este olhar acontece em
muitas pessoas individual-
mente mas também em
muitas instituição que se
dedicam aos mais fragiliza-
dos e desamparados, é o
caso da Cáritas que entre
outras tem como missão “
Mais próximo do Próximo”.
É bom sentir que todos os
apelos que o Papa nos faz
ao longo da Encíclica estão
realçados no dia a dia da
Cáritas da Ilha Terceira que
procura fazer uma simbiose
perfeita entre a Ecologia
Humana e Ambiental” da
à bondade, à fé, à hones-
tidade; chegou o momento
de reconhecer que esta
alegre superficialidade de
pouco nos serviu” (229).
Só através do amor, garan-
te o Papa Francisco, é
mesmo possível “construir
um mundo melhor”.
O Papa além de alertar
para os problemas da
“Nossa Casa” consegue dar
pistas e sugestões para
mudarmos e arrumarmos a
casa, podemos encontrar
essas diretrizes no último
capítulo. Francisco apela
para um diálogo honesto
capaz de estruturar proces-
sos de decisão transparen-
tes, e recorda que nenhum
projeto pode ser eficaz se
não for animado por uma
consciência formada e res-
ponsável, sugerindo pistas
capazes de garantir um
crescimento nesse sentido,
a nível educativo, espiritual,
eclesial, político e teológico.
A Encíclica faz uma análise
muito profunda e bela so-22
mente milhares de espé-
cies vegetais e animais.
Todos estes fenómenos
acarretam a deterioração
da qualidade da vida hu-
mana e a degradação so-
cial. Os que mais sofrem
com estas agressões ambi-
entais são as pessoas
mais pobres. Outro proble-
ma é o consumismo exa-
cerbado dos países ricos
leva ao desperdício de ali-
mentos que faltam à mesa
dos pobres. Boa parte dos
problemas do mundo, ga-
rante o Papa, seriam re-
solvidos se houvesse mais
“amor civil e políti-
co” (231). “É necessário
voltar a sentir que precisa-
mos uns dos outros, que
temos uma responsabilidade
para com os outros e pa-
ra com o mundo, que va-
le a pena sermos bons e
honestos. Vivemos já muito
tempo na degradação mo-
ral, baldando-nos à ética,
23
qual resulta a “Ecologia Inte-
gral”. É bom sentir a entre-
ga incondicionalmente às
pessoas que nos procuram
para uma ajuda, seja ela
material ou mesmo espiritual.
É bom olhar os jovens que
procuram algum sentido para
a vida nos projetos que a
Cáritas da Ilha Terceira tem
para lhes oferecer, dando-
lhes ferramentas para um
futuro mais sustentado e
mais risonho.
É bom olhar as crianças do
jardim de Infância e da
“Animação de Rua” e saber
que estamos a transmitir os
valores e princípios humanos
que os tornará em Homens
e Mulheres capazes de res-
peitar “ A Nossa Casa Co-
mum”.
Gostava de terminar deixan-
do uma frase do Papa
Francisco proferida na missa
de abertura da 20ª Assem-
bleia Geral da Cáritas Inter-
nacional: “Quem vive a mis-
são da Cáritas não é um
simples agente, mas uma
(…) olharmos à nossa
volta e ver os nossos
irmãos que mais so-
frem seja qual for o ti-
po de sofrimento (…)
testemunha de Cristo. Uma
pessoa que busca Cristo e
se deixa buscar por Ele;
uma pessoa que ama com
o espírito de Cristo, o espí-
rito da gratuidade, e do
dom.”
Excertos da encíclica “LAUDATO SI’” do Papa Francisco: “Embora não disponhamos de provas definitivas acerca do dano que poderiam causar os cereais transgénicos aos seres humanos e apesar de, nalgumas regiões, a sua utilização ter produzido um crescimento económico que contribuiu para resolver determinados problemas, há dificuldades importantes que não devem ser minimizadas. Em muitos lugares, na sequência da introdução destas culturas, constata-se uma concentração de terras produtivas nas mãos de poucos, de-vido ao «progressivo desaparecimento de pequenos produtores, que, em consequência da perda das terras cultivadas, se viram obrigados a retirar-se da produção direta». Os mais frágeis deles tornam-se trabalhadores precários, e muitos assalariados agrícolas acabam por emigrar para miseráveis aglomerados das cidades. A expansão destas culturas destrói a complexa trama dos ecossiste-mas, diminui a diversidade na produção e afeta o presente ou o futuro das economias regionais. Em vários países, nota-se uma tendência para o desenvolvimento de oligopólios na produção de sementes e outros produtos necessários para o cultivo, e a de-pendência agrava-se quando se pensa na produção de sementes estéreis que acabam por obrigar os agricultores a comprá-las às empresas produtoras” “Nas condições atuais da sociedade mundial, onde há tantas de-sigualdades e são cada vez mais numerosas as pessoas descar-tadas, privadas dos direitos humanos fundamentais, o princípio do bem comum torna-se imediatamente, como consequência lógica e inevitável, um apelo à solidariedade e uma opção preferencial pelos mais pobres. ...”
SUSTENTABILIDADE & INTERVENÇÃO SOCIAL
Projeto
TRAD(E)-In
os últimos anos, a
Cáritas da Ilha Ter-
ceira através do
Centro de Desenvolvimento e
Inclusão Juvenil, evidenciou
uma maior preocupação com a
formação e a inclusão no
mercado de trabalho de jovens
em situação de maior vulnera-
bilidade social. O acesso ao
mercado de trabalho não é
um processo simples e fácil,
e requer uma capacidade
de persistência, mas tam-
bém incita ao desenvolvi-
mento de competências pa-
ra a empregabilidade.
Nesta perspetiva, a Cáritas
da Ilha Terceira submeteu
uma candidatura ao Progra-
ma Cidadania Ativa da
Fundação Calouste Gulben-
kian, na modalidade D
Apoio à Empregabilidade e
Inclusão de Jovens. O pro-
jeto está centrado no con-24
N celho de Angra do Heroís-
mo e tem como fio condu-
tor a revitalização/
transformação de atividades
tradicionais identificadas em
diagnóstico como áreas
com potencial económico.
Desta linha central deriva-
ram 3 componentes organi-
zadas por faixas etárias/
necessidades dos jovens.
No que se refere à com-
ponente um, pretende-se o
desenvolvimento de itinerá-
rios vocacionais para jovens
entre os 14 e os 18 anos.
A intervenção está centrada
em grupo/turma através da
conceção/ implementação/
avaliação/disseminação de
um itinerário formativo voca-
cional centrado em ativida-
des tradicionais. Conta com
acompanhamento individual
dos alunos por parte de
mentores, com uma periodi-
cidade quinzenal, sendo
adequado a cada jovem e
às suas necessidades, bem
como uma articulação próxi-
ma com os diretores de tur-
ma e os restantes professo-
res, e não esquece a impor-
tância que a família possui
no processo formativo dos
25
(…) tem como fio condutor a
revitalização/ transformação
de atividades tradicionais (…)
filhos. São aplicadas sessões
de orientação vocacional e
de competências pessoais e
sociais que permitirão a in-
clusão dos alunos em 2 ex-
periências profissionais em
26
contexto de trabalho.
Na execução dos objetivos
desta componente contamos
com a colaboração da Es-
cola Básica e Secundária
Tomás de Borba e a Esco-
la Secundária Jerónimo e
Emiliano de Andrade, com
intervenção com uma turma
(…) formação (...) em Pastelaria e Do-
çaria Tradicional Açoriana, embala-
mento de produtos hortícolas e produ-
ção de Compotas (…)
27
Oportunidade Profissionalizan-
te em cada escola, e com
o trabalho essencial e fulcral
de 3 mediadores do Centro
de Desenvolvimento e Inclu-
são Juvenil da Cáritas da
Ilha Terceira, que são a
Dra. Ana Pimentel, a Dra.
Joana Esteves e o Dr. Mi-
guel Capote.
Na componente dois, preten-
de-se apoiar jovens dos 18
aos 25 anos de idade na
formação/reconversão de
competências nas atividades
tradicionais de interesse por
via de ações de acompa-
nhamento individual numa
lógica de reorientação voca-
cional, numa perspetiva de
carreira, através da mentoria
e formação em unidades de
curta duração, nomeadamente
em Pastelaria e Doçaria Tra-
dicional Açoriana, embala-
mento de produtos hortícolas
e produção de compotas.
Atualmente estão em forma-
ção cerca de 45 jovens que
desenvolvem a formação
com formadores experientes
e conceituados na ilha Ter-
ceira para estas áreas e
que contam com um exce-
lente trabalho de mentoria
e acompanhamento individual
de uma técnica afeta ao
projeto, a Dra. Ana Margari-
da Meneses.
Esta componente tem o
apoio essencial do parceiro
(…) 45 jovens que
desenvolvem for-
mação (…)
do projeto, a Fundação de
Ensino Profissional da Praia
da Vitória com os seus for-
madores na aplicação teóri-
ca e prática das unidades
de formação de curta dura-
ção.
Na componente três do
28
projeto prende-se com o
apoio ao empreendedorismo
nas atividades tradicionais
através do autoemprego
(com ações de sensibiliza-
ção/formação/consultadoria/
acompanhamento para a
criação do próprio empre-
go), mas também no apoio
à auto-organização de pro-
dutores através da criação
(…) tem o apoio es-sencial do parceiro do projeto, a Fun-dação de Ensino Profissional da Praia da Vitória (…)
(…) financiado pela Noruega, Islândia e Liechtenstein (…)
de uma estrutura de supor-
te à atividade económica
de jovens com maior grau
de vulnerabilidade social nu-
ma perspetiva de negócio
social ou empresa social
de inserção .
Este projeto assenta numa
metodologia que engloba
inovação na formação na
perspetiva de reconversão e
formação de competências
nas áreas económicas de
interesse na abordagem in-
dividualizada que potencie a
empregabilidade do jovem.
A componente de mentoria,
é essencial neste projeto,
face às vulnerabilidades do
público-alvo ao nível da
motivação e da definição
de metas e objetivos a
curto e médio prazo. A cri-
ação do autoemprego e do
empreendedorismo são privi-
legiados em detrimento do
negócio social de emprego
e para isto, o empodera-
mento dos jovens é uma
estratégia fulcral.
O desenvolvimento das ativi-
dades deste projeto só tem
sido possível, devido ao em-
penho, entrega e dedicação
dos seus técnicos nas suas
diferentes componentes, mas
também dos beneficiários,
que de um modo global, es-
tão envolvidos na dinâmica e
nos objetivos aqui apresenta-
dos, o que nos faz acreditar
que os indicadores e as me-
tas propostas serão alcança-
das .
TRAD(E)-IN é um Projeto de
intervenção social, financiado
pela Noruega, Islândia e Lie-
chtenstein através das EEA
Grants do Programa Cidada-
nia Ativa da Fundação Ca-
louste Gulbenkian, promovido
pela Cáritas da Ilha Terceira
em parceria com a Fundação
de Ensino Profissional da
Praia da Vitória e com uma
unidade de facilitadores onde
se incluem a Câmara Munici-
pal de Angra do Heroísmo,
Direção Regional do Emprego
e Qualificação Profissional,
Direção Regional da Solidari-
edade e Segurança Social,
Escola Básica e Secundária
Tomás de Borba e Escola
Secundária Jerónimo e Emi-
liano de Andrade .
29
30
SUSTENTABILIDADE & INTERVENÇÃO SOCIAL
Horta
Biológica da ARCIT
FÁVIO BETENCOURT ANIMADOR DE RUA & COORDENADOR DA ARCIT
m outubro de
2011, uma visita
à empresa Bio-
Fontinhas configurou-se co-
mo o pontapé de saída
para a criação de uma
horta na Animação de Rua.
Direcionado aos utentes
desta valência da Cáritas
da Ilha Terceira, o projeto
previu, numa fase inicial, a
aquisição de conhecimentos
em agricultura biológica,
através da deslocação dos
jovens a uma exploração
desta natureza e de pes-
quisas efetuadas pelos pró-
prios, com a orientação
dos técnicos da valência.
Todo processo foi acompa-
nhado por um técnico agrí-
cola que auxiliou na insta-
lação da horta e que deu
as diretrizes para o desen-
volvimento do projeto. Sen-
tiu-se, desde logo, um
grande interesse e motiva-
ção por parte das crianças
e jovens. O poder conhe-
cer, acompanhar e ter par-
E ticipação ativa no ciclo da
alimentação, desde a se-
mente até ao prato, fez
passar à prática uma teoria
difusa, frágil e pouco fun-
damentada que traziam an-
tes deste projeto, e que no
seu decurso foi ganhando
força e raízes.
A terra é preparada, as
sementeiras criteriosamente
escolhidas.
Dividida a horta em parce-
las, cada grupo compete
saudavelmente por uma co-
lheita melhor.
Cada planta que desponta
é alvo de medição e regis-
to, escrito e fotográfico, pe-
riódico no chamado Diário
de Campo. Consultando es-
te registo poder-se-á perce-
ber a evolução das plantas,
quem as plantou, regou,
tratou e colheu. Para estes
jovens é uma nova visão
sobre a agricultura, e sobre
as suas próprias capacida-
des e competências .
A compostagem é um dos
31
pilares onde assenta a
agricultura biológica. Por
isso foi utilizado um Guia
de Compostagem que ori-
entou a construção e boa
utilização de um compostor,
que viria a “alimentar” toda
a horta .
As pesquisas recorrentes
levam à consolidação de
conhecimentos e à constru-
ção de mais ferramentas.
No que diz respeito às
plantas aromáticas foi cria-
do um guia próprio, onde
constam algumas plantas, os
seus benefícios, a sua fun-
ção no âmbito da agricultu-
ra biológica e cuidados que
necessitam.
Em 2014, firmou-se uma
parceria com outro projeto
da Cáritas da Ilha Terceira,
o “(En)formar Aprender”, tor-
nando-se esta horta biológi-
ca no palco para uma das
oficinas ministradas por esta
iniciativa, promovendo a in-
teração com outras pessoas,
outras realidades e outros
saberes.
As plantas foram crescendo,
os jovens também.
Cada vez que se colhem,
cozinham-se os legumes e
conhecimentos adquiridos na
nossa horta. E serve-se à
mesa experiências que leva-
rão, com certeza, a hábitos
de vida mais saudáveis e
sustentáveis.
há que reconhecer as mu-
danças que o tempo trouxe
(além de algumas rugas e
os primeiros cabelos bran-
cos). A equipa aumentou,
em tamanho, diversidade e
qualidade. As instalações
foram sempre melhorando,
em prol do bem-estar dos
nossos jovens, mas também
da própria equipa. Os com-
putadores são de ponta.
Quanto ao público-alvo, para
além da intervenção que
temos vindo a desenvolver
desde a génese do CDIJ,
com jovens fora do contex-
to escolar, nos últimos 3
anos arriscámos mais um
pouco e fomos nós técnicos
a sair da nossa zona de
conforto e a voltar para a
escola (admito que desde o
meu 12º ano que não tinha
voltado a cruzar os portões
do Liceu…). Em 2012-2013,
a parceria já estabelecida
com a Escola Tomás de
Borba assume novos contor-
nos e começa a ser a es-
oi precisamente
há 10 anos
que teve início,
para mim (e para a Cári-
tas, na verdade) esta ca-
minhada no trabalho com
jovens. Nessa altura, em
2005, erámos nós uma
pequena equipa, numa pe-
quena sala, com escassos
recursos, mas com enorme
empenho, dedicação e for-
te convicção de que esta
era uma área de enorme
importância em ser traba-
lhada. Refiro-me ao traba-
lho com jovens em aban-
dono escolar, sem escola-
ridade obrigatória e sem
qualificações para acesso
ao mercado de trabalho.
O trabalho era feito sobre-
tudo numa sala na Rua
do Barcelos, os computa-
dores (doados) mal funcio-
navam, salas de atendi-
mento não havia, desloca-
ções, se necessárias, fei-
tas no meu saudoso Mi-
cra… Chegados a 2015, 32
F
CDIJ—CENTRO DE DESENVOL-
VIMENTO E INCLUSÃO JUVENIL
Uma Década de Existência
ANA PIIMENTEL COORD. PEDAGÓGICA & MEDIADORA
cola a receber-nos. Em 2014-2015,
partimos também para a Escola
Jerónimo Emiliano de Andrade.
Neste tempo, em conjunto com
toda a comunidade escolar destas
nossas entidades parceiras
(conselhos executivos, professores,
pessoal não docente), temos vindo
então a trilhar um novo rumo no
trabalho com jovens em situação
de absentismo e/ou insucesso es-
colares. Este investimento passa
(…) nos últimos 3 anos arriscámos
mais um pouco e fomos nós técnicos
a sair da nossa zona de conforto e a
voltar para a escola (…)
33
piercings são os mes-
mos… a motivação para a
escola já não é bem a
mesma, pois vem agrava-
da por um grande desâ-
nimo face ao futuro. A
enorme falta de perspeti-
vas de emprego agrava a
desmotivação quanto ao
percurso académico, exa-
cerbando a visão deste
enquanto “desperdício de
tempo”.
Enquanto profissional, te-
mos nós o dever de
olhar para este negativis-
mo e encará-lo como
34
por dois grandes focos: ori-
entação vocacional, com vis-
ta à descoberta de áreas
de interesse para inserção
em experiências de formação
em contexto de trabalho; e
trabalho individual, com espe-
cial enfoque no domínio mo-
tivacional. Pensando numa
comparação entre estes jo-
vens de agora com os pri-
meiros grupos do extinto
programa Itineris… as idades
são as mesmas, as reten-
ções são as mesmas, os
mais um desafio a trilhar
na senda de novos su-
cessos. Se é certo que,
para eles e para nós, o
caminho por vezes se
afigura como tortuoso,
também é verdade que
não podemos, nem deve-
mos, deixar de lembrar
todos aqueles casos e
aqueles momentos surpre-
endentes, verdadeiros mi-
lagres, olhando à origem
e às dificuldades ultra-
passadas. Venham mais
dez anos!
35
ou mediadora nu-
ma turma do
programa Oportu-
nidades, com equivalência
ao 9º ano, na escola EBS
Tomás de Borba. Enquanto
mediadora o meu papel
consiste em ajudar os alu-
nos a atingir o seu objetivo
de terminar o 9º ano, mas
também que adquiram com-
petências e estratégias, quer
pessoais, quer profissionais,
que os permitam encarar o
futuro com mais sucesso
escolar.
Para isso tenho diferentes
momentos de trabalho com
os jovens. Num primeiro
momento, tenho oportunidade
de trabalhar com os jovens
em grupo, em contexto de
sala de aula, onde é apli-
cado um programa de Ori-
entação Vocacional. Este
programa tem como objetivo
promover a autodescoberta
dos jovens, explorar os
seus interesses, as suas
S aptidões e valores profissio-
nais. Na minha perspetiva
esta é uma intervenção de
grande relevância para es-
tes jovens, uma vez que a
temática da orientação vo-
cacional é pouco explorada
no 9º ano, especialmente
junto destes jovens. Com
este programa os jovens
trabalham competências pes-
soais e sociais como a co-
municação e o relaciona-
mento interpessoal, tendo
oportunidade de refletir so-
bre as suas características
pessoais e a sua aplicabili-
dade e adequabilidade ao
contexto de trabalho. Tudo
isto é completado com du-
as pequenas experiências
de formação em contexto
real de trabalho, em áreas
definidas pelos próprios jo-
vens. Desta forma, estes
têm oportunidade de experi-
enciar as suas áreas de
eleição, vivendo situações
próprias do dia a dia do
O PAPEL DA MEDIAÇÃO NO CDIJ
Escola
Tomás de Bor-ba
JOANA ESTEVES MEDIADORA
comportamentos negativos.
Esta estratégia poderá criar
situações de ativação emo-
cional que após enquadra-
das e exploradas em con-
texto seguro permitem ge-
rar a mudança. Esta inter-
venção diverge da tradicio-
nal intervenção escolar, à
trabalho, desconstruindo mi-
tos profissionais e adquirin-
do estratégias fundamentais
ao sucesso profissional.
Acredito que esta oportuni-
dade, sendo pouco usual
junto de alunos que fre-
quentam o 9º ano, é fun-
damental para jovens com
um percurso de insucesso
escolar que através destas
experiências podem não só
ganhar novas competências
como aumentar as suas
crenças de autoeficácia e
melhorar a sua autoestima
ao descobrirem as suas
competências e capacidades.
A comunicação e o relacio-
namento interpessoal é algo
tão intrínseco ao ser huma-
no que nos pode levar a
questionar a necessidade de
explorar tais competências
em sala de aula. No entan-
to, na minha perspetiva,
tem tanto de intuitivo como
36
Outra componente desta
intervenção consiste em
atendimentos individuais,
onde a estratégia é mais
focada e adaptada às sin-
gularidades de cada jovem.
Este pretende ser um es-
paço seguro, onde através
da abordagem da entrevis-
de desafiante e de inova-
dor. A metodologia de tra-
balho utilizada assenta es-
sencialmente em dinâmicas
de grupo em que são re-
plicadas situações do quoti-
diano potencialmente desen-
cadeadoras de emoções/
qual os jovens se encon-
tram formatados. Na se-
quência disto encontro um
desafio… Como motivar os
jovens a sair da sua zona
de conforto e diminuir a
sua resistência a novas
experiências ?
37
ar a relação com os jo-
vens e as suas expectati-
vas e necessidades com
as exigências e característi-
cas do meio escolar, ge-
rindo simultaneamente a
relação com os restantes
professores e encarregados
de educação.
É uma intervenção que
vejo como muito completa,
com a qual me identifico
e acredito ser fundamental
aos jovens.
(…) nova dimensão
que trazemos à es-
cola, que normal-
mente aplica uma
estratégia mais
pensada em grupo
e pouco individuali-
zadas (…)
ta motivacional trabalha-se
a motivação escolar e es-
tratégias que ajudem estes
jovens a ultrapassar os
seus obstáculos à conclu-
são do 9º ano. Esta foi
também uma estratégia no-
va para mim onde novos
desafios surgiram. Percebi
que a relação com os jo-
vens é uma das principais
ferramentas e que merece
grande investimento da mi-
nha parte. Esta é também
uma nova dimensão que
trazemos à escola, que
normalmente aplica uma
estratégia mais pensada
em grupo e pouco indivi-
dualizada.
Tendo a oportunidade de
trabalhar em contexto esco-
lar o objetivo é prevenir
casos graves de abandono
escolar ou de experiências
extremamente negativas as-
sociadas à escola. No en-
tanto aqui surge a impor-
tância de conseguir concili-
38
Vocacional; por outro, e
também muito importante, o
conceito de “mentoring”,
sendo traduzido para portu-
guês, como sendo a
“mentoria”, em que é feito
um acompanhamento indivi-
dual de cada aluno, como
uma estratégia de promoção
do desenvolvimento juvenil.
Os jovens alvos de inter-
venção têm em média entre
os 16-18 anos de idade,
sendo que estes estão inte-
grados num programa intitu-
lado como “Oportunidade”,
neste caso, “Oportunidade
Profissionalizante”, tendo ca-
da um deles já um número
significativo de retenções
escolares.
Numa primeira fase, na mi-
nha opinião, o principal fo-
co da minha intervenção e
dos restantes intervenientes,
prendeu-se/prende-se na
busca de soluções e no
foco das potencialidades.
Pois, analisando o histórico
minha “aventura”
na Cáritas inici-
ou-se a 16 de
Dezembro de 2014. Já
tinha conhecimento que
iria iniciar a minha primei-
ra experiência de trabalho
em contexto escolar, sen-
do na Escola Secundária
Jerónimo Emiliano de An-
drade. Fiquei feliz. Lembro-
me da troca de correio
eletrónico e da minha en-
trevista. Tal como no es-
tágio curricular integrado
na matriz do curso, esta-
ria novamente no contexto
escolar, apesar de ser
uma intervenção diferente.
No ano letivo anterior, e
no presente ano letivo, a
minha intervenção baseia-
se em duas linhas meto-
dológicas orientadoras: se
por um lado, foi/é traba-
lhado na componente leti-
va um programa de Com-
petências Sociais e Pesso-
ais, alinhado à Orientação
A
O PAPEL DA MEDIAÇÃO NO CDIJ
Escola
Jerónimo
Emiliano de Andrade
MIGUEL CAPOTE MEDIADOR
39
(…) o principal foco da minha interven-
ção (…) prende-se na busca de solu-
ções e no foco das potencialidades (…)
destes alunos, vemos as mais
diversas vulnerabilidades identifi-
cadas. Entre elas é de desta-
car o absentismo escolar; insu-
cesso e abandono escolar;
comportamentos desviantes; vio-
lência em meio escolar; famí-
lias com problemas; entre mui-
tos outros. Assim sendo, coube-
me questionar: o que posso
fazer para melhorar o contexto
de vida destes jovens? O que
significa a escola para eles?
Serão tais as vulnerabilidades,
40
que os impossibilitam de
alcançar o sucesso esco-
lar? Obviamente que, sen-
do o meu primeiro ano de
trabalho, os resultados nun-
ca poderiam ser no imedi-
ato. Nunca poderiam ser
visíveis num espaço de
tempo tão curto. Não po-
deria pedir a cada um
destes jovens que incutis-
sem os meus conselhos.
Comprovei e aprendi que,
(…) aprendi que,
muitas vezes, o
“nosso tempo”,
não é o “tempo
deles” (…)
muitas vezes, o “nosso
tempo”, não é o “tempo
deles”. Que o ritmo difere
de jovem para jovem, que
são eles que têm o poder
de decisão, seja a escolha
saudável ou não.
A conquista dos jovens
requer tempo. É mais um
elemento desconhecido que
entra no seu “meio”, e por
vezes essa aceitação tem
o seu espaço de tempo.
Nessa perspetiva, penso
que a disponibilidade em
vez mais a intervenção de-
ve passar pela escola.
Uma vez que esta deixou
se ser apenas um palco
de socialização escolar,
mas que entra todo um
conjunto de atores em que
tornam este contexto cada
vez mais complexo.
Apesar dos tempos de cri-
se de valores que vivemos
na sociedade hodierna, en-
contrando os jovens cada
vez mais desanimados e
sem perspetiva de futuro,
não tenho dúvidas que so-
mos capazes de deixar as
coisas um pouco melhores
do que quando exploradas
pela primeira vez.
41
se também noutros eixos
presentes na vida diária
de cada um deles. Para
que esta equipa tivesse/
tenha sucesso, e da minha
primeira experiência ao lon-
go do ano letivo
2014/2015, foi necessário
um conjunto de conceitos
bem patentes em toda a
relação. Sendo de salien-
tar: escuta ativa; empatia;
e, por fim, a assertividade.
Foi e é assim, que muitas
vezes se quebra a resis-
tência do jovem. Foi/É
com estes três eixos, que
em largo espetro, os jo-
vens promovem ações con-
cretas rumo à mudança,
fazendo com que estas
ações se tornem repetitivas
ao longo do tempo. Algo
que muitas das vezes não
acontece, pois notam-se
algumas recaídas ao longo
de toda a intervenção.
Neste momento, e após
término do primeiro ano de
trabalho, penso que cada
realizar as aulas de Edu-
cação Física com os jo-
vens foi uma forma de
eles visualizarem, que tal
como eles, os técnicos
não são perfeitos, e que
sobretudo, também erram .
Encarei também a mentoria
como sendo um “campo
de futebol.” Neste caso,
não uma equipa contra a
outra, mas uma equipa
conjunta. Nesta equipa (eu
com o jovem), havia/há
uma conquista de pontos
em direção a algumas me-
tas definidas (término do
nono ano letivo com su-
cesso) e outras que se
vão definindo. Não esque-
cendo também, que por
vezes, haviam mutações.
Neste “jogo”, houve/há
sempre uma transmissão
de experiências, conheci-
mentos e de medos. Estes
três conceitos, melhoraram/
melhoram a cooperação e
a motivação, quer fosse
no eixo escolar, quer fos-
42
á cerca de 6
meses atrás
iniciei um novo
desafio profissional, media-
ção com jovens inseridos
em contexto formativo. A
experiência era pouca,
mas a vontade de agar-
rar novos conhecimentos
e de me adaptar a no-
vos contextos profissionais
era muita.
Ao ser-me apresentado o
projeto TRAD(E)–IN
(Tradição e Inovação para
a Empregabilidade), desde
logo me cativou pelo fio
condutor, bem como a
sua forma de atuação
junto dos jovens que se
encontravam numa situa-
ção de desocupação e
de desemprego.
No desenvolvimento do
contacto com os jovens
sinalizados pelos diversos
facilitadores do projeto
TRAD(E)-IN, fiquei bastan-
te surpreendida pela
quantidade de jovens que
H nas idades compreendidas
entre os 18 e os 25
anos se encontravam nu-
ma situação de desocupa-
ção, de desemprego e
principalmente de descren-
ça num futuro. Importa
referir que muitos deles
sem nenhum projeto, quer
a nível formativo, quer no
âmbito profissional.
Ao levar a cabo as en-
trevistas individuais aos
jovens interessados em
ser admitidos na compo-
nente formativa, foi fácil
constatar que cada jovem
entrevistado conseguiu
enumerar os diversos fra-
cassos, episódios negati-
vos, experiências e expec-
tativas falhadas, jovens
que vivem alguns deles
sem um projeto individual
e sem ter consciência de
qualquer tipo de potencia-
lidade enquanto ser Hu-
mano.
Foi nesse momento que
tive consciência da dimen-
O PAPEL DA MEDIAÇÃO NO CDIJ
Projeto
TRAD(E)-IN
MARGARIDA MENESES MEDIADORA
43
são do desafio da mediação: ad-
mitir jovens para formação, acom-
panhá-los, motivá-los, trabalhar indi-
vidualmente potencialidades, desen-
volver estratégias e ferramentas
para resolução de problemas, quer
emocionais, quer pessoais. O pro-
cesso de mediação de jovens é
complexo, mas não deixa de ser
muito recompensador quando verifi-
camos que a nossa intervenção
pode, e muitas das vezes faz a
diferença.
(…) Foi nesse momento que
tive consciência da dimensão
do desafio da mediação (…)
44
onde são trabalhadas
questões como: a motiva-
ção; potencialidades indivi-
duais; resolução de proble-
mas, quer emocionais, quer
profissionais; e principal-
mente ser um espaço/
tempo onde o jovem se
sinta acompanhado e ori-
entado.
No entanto, quando exis-
tem situações com maior
complexidade é solicitado,
com autorização e vontade
do jovem, apoio psicológico
por parte da equipa técni-
ca da Cáritas, o que aca-
ba por ser um aliado no
acompanhamento do jovem.
Até ao momento, e após
No âmbito do TRAD(E)-IN, a
mediação desenvolvida com os
jovens é compreendida em
dois níveis: Grupo (turma) e
Individual.
No contexto Grupo (turma) é
realizado um acompanhamento
próximo das Unidades de For-
mação de Curta Duração
(UFCD), trabalhando aspetos
como: a entreajuda; resolução
de conflitos; coesão de grupo;
e trabalho de equipa; desen-
volvendo pequenos projetos no
âmbito da formação ao longo
do processo formativo. A nível
individual é centrado no con-
texto de atendimento individual
alguns meses em que a
componente formativa do
TRAD(E)-IN se encontra em
funcionamento, com 48 jovens
admitidos em formação nas
UFCD´S de Pastelaria e Do-
çaria Tradicional Açoriana;
Transformação Frutícola e Pre-
paração de Produtos em mo-
do de Agricultura Biológica
para Embalamento, o balanço
é positivo.
Sem margem de dúvida que
é um trabalho complexo e
desafiador, atendendo que aju-
damos a crescer jovens emo-
cional e formativamente.
No entanto, chegar ao final
do dia e constatar nas dife-
rentes áreas de formação jo-
vens motivados, ocupados, in-
seridos, participativos, produzin-
do algo e com iniciativas fu-
turas é sem margem de dúvi-
da o melhor resultado que
poderíamos ter. É melhor que
qualquer número estatístico ou
percentagem.
45
Entrevistador: Andreia, o que
é que te levou a integrar o
projeto “Trad(e)-In”?
Entrevistado: Eu estava ins-
crita no Centro de Emprego.
Estava a ser subsidiada e fui
chamada para ter esta forma-
ção de ocupação. Eu já esta-
va desempregada há seis me-
ses, sim, há seis meses que
eu estava desempregada
quando fui chamada. Tive
uma licença… estive grávida…
estive de licença de materni-
dade e depois fui chamada
ao Centro de Emprego para
me inscrever. Estava… portan-
to… Maio, Junho… estava de-
sempregada há três meses.
Estava inscrita no Centro de
Emprego. Fui chamada para
este projeto… Fomos a uma
entrevista. E depois tivemos
uma entrevista individual… de-
pois fomos selecionados. À
partida, eu não tinha escolhi-
do a transformação frutícola.
Tinha escolhido o embalamen-
TESTEMUNHO DE FORMANDOS
ANDREIA BORBA TRANSFORMAÇÃO
FRUTÍCULA
46
própria formação, que pas-
saste para a transformação
frutícola, mas depois perce-
beste que realmente vimos
que tinhas algum potencial
nessa área. Tens algum
especto negativo que tu
queiras referir?
Entrevistado: Não…
Entrevistador: Tens gos-
bom… Comecei a trabalhar
com ele…
Entrevistador: Está a ser
então uma experiência po-
sitiva?
Entrevistado: Sim, está a
ser uma experiência muito
positiva! E… vai ser, acho,
muito relevante para o
nosso futuro, vai ser muito
to, porque achava que ti-
nha mais potencial para
arranjar um trabalho. Por-
que aqui há mais fábricas
onde a gente possa traba-
lhar… e transformação frutí-
cola, só abrindo uma em-
presa, ou coisa que se
calhar tem mais saída…
Mas depois fui chamada
para vir para esse curso…
Entrevistador: E tens
gostado?
Entrevistado: E tenho
adorado a formação. Supe-
rou as minhas expectati-
vas… Por completo! Gostei
da parte teórica, e come-
çamos na parte prática.
Estou a gostar muito. Co-
meçou há pouco tempo,
mas estou a gostar muito
da parte prática. Os forma-
dores foram, principalmente
o formador da parte práti-
ca, muito bons e agora
estou a conhecer o Chefe
Paulo… está a ser muito
(…) tenho adorado a formação.
Superou as minhas espectativas (…)
bom, porque para o nosso
currículo nada é de mais
para os meios que a gen-
te está agora. Tudo conta
para um futuro melhor…
Ah… E no futuro espero
que conte bastante essa
formação e penso que vai
ser muito positivo.
Entrevistador: Ok! Conse-
gues indicar algum especto
negativo? O positivo… Os
positivos já enumeraste um
bocadinho, não é?! A
do de estar cá então, não
é?
Entrevistado: Tenho gos-
tado muito de estar cá…
tenho.
Entrevistador: (risos) Ok.
O que é que tu pretendes
fazer a nível profissional?
Portanto, o que é que
perspetivas?
Entrevistado: Perspetivas
que eu tenha em termos
profissionais… gostava de
arranjar um trabalho… Anh…
47
Gostava de aplicar a minha
formação que estou a de-
senvolver aqui…
Entrevistador: Portanto,
gostas do contexto de cozi-
nha…
Entrevistado: Gosto… Gos-
to bastante do contexto de
cozinha. Gostava de no fu-
turo poder aplicar a forma-
ção que a gente está a
tirar.
Entrevistador: O que é
tu achas que este projeto
pode ajudar? Este projeto,
portanto… Achas que tem
potencial para te acompa-
nhar no futuro, vermos aqui
várias possibilidades para ti,
depois sentes isso?
Entrevistado: Sim, sinto.
Sinto que é um bom poten-
cial para a gente ter um
futuro melhor!
Entrevistador: Ok…
Entrevistado: Sem dúvida…
Entrevistador: Sentes-te as-
sim acompanhada com pro-
ximidade…
Entrevistado: Sim, sim…
Entrevistador: Diz-me ou-
tra coisa, quais são as tuas
expectativas para o futuro?
O que é que tu desejavas?
Entrevistado: … Desejava
muito arranjar um trabalho,
mas um trabalho fixo!
Entrevistador: Ok… (risos)
Entrevistado: Gostava muito…
não andar naquela coisa…
Entrevistador: E qual
eram as áreas que tu gos-
tavas?
Entrevistado: Eu gosto da
parte de cozinha! Gosto. E
também gostava de arran-
jar um trabalho na área
da minha experiência.
Entrevistador: Atendimento
ao público, não é?
Entrevistado: Eu gosto
muito de conhecer pessoas
e de lidar com elas. Gos-
to muito. Eu gostava de
arranjar um trabalho nestas
áreas…
Entrevistador: Nestas
áreas, não é?
Entrevistado: É…
Entrevistador: Jocelino, o
que é que te levou a inte-
grar o projeto “Trad(e)-In”?
Entrevistado: Bom, na altu-
ra eu estava… e estou de-
sempregado. Inscrevi-me no
Centro de Emprego à espera
que aparecesse alguma coisa
que pudesse fazer, algum tra-
balho, algum emprego, e na
altura… já estava lá inscrito
há três meses mais ou me-
nos, e nunca me apareceu
nada. Houve um dia em que
fomos chamados para ir ao
Centro de Emprego, e tive
uma entrevista sobre três cur-
sos que iam abrir, de um
projeto da Unidade de Forma-
ção de Curta Duração, e
apareceu lá três projetos: Do-
çaria e Pastelaria Tradicional,
um de embalamento, e apare-
ceu outro que eu agora já
não me lembro qual é…
Entrevistador: Transformação
frutícola… as compotas!
Entrevistado: Compotas e
licores! Exatamente! E eu co-
48
TESTEMUNHO DE FORMANDOS
JOCELINO SOUSA
PASTELARIA E DOÇARIA TRADICIONAL AÇORIANA
mecei a ver nos três cursos
qual era aquele que pudesse
servir para mim, e eu fui pa-
ra Pastelaria e Doçaria… não
sei… Por acaso gosto de co-
zinha, e é mais ou menos
parecido… está bem que é
doces em vez de comida, é
comida da mesma maneira,
mas é doces (risos). E eu
gostei da ideia, e dei o meu
nome. Vim fazer a entrevista
com a esperança de ficar, e
por acaso tive essa sorte e
fiquei aqui no curso.
Entrevistador: Ok! Como é
que está a correr a tua ex-
periência? Para já, quais são
os aspetos positivos que enu-
meras, e também os aspetos
negativos? Como é que tem
sido estar aqui? Já cá estás
há dois meses… Como é que
fazes esse balanço? Como é
que tem sido?
Entrevistado: Bom, para já
a experiência… eu guardo pa-
ra mim uma experiência posi-
tiva. Aquilo que já aprende-
mos até hoje. Primeiro, tive-
ces.
Entrevistador: E tens
gostado da forma como
nós trabalhamos aqui com
os jovens? Pois é diferente
da escola…
Entrevistado: Começando
pela professora… que foi a
que começou com a gente
e a que teve sempre dis-
mos vários módulos… Já
passámos, já fizemos três
módulos, e os dois primei-
ros foram sobre higiene e
segurança na cozinha, na
restauração. E já começá-
mos nas aulas práticas. A
minha experiência até ago-
ra, acho que é muito po-
sitiva, tenho um balanço
(…) fui para Pastelaria e Doçaria… não
sei… Por acaso gosto de cozinha (…)
muito positivo… Gostei de
aprender as normas de
higiene e segurança que
não sabia até hoje… Sabia
algumas coisas, mas outras
não, e agora vejo as coi-
sas na cozinha, tanto em
casa como na escola de
uma forma diferente. Já
levo alguns aspetos, já
uso algumas coisas. E as-
petos positivos e negati-
vos… Bom, aspetos positi-
vos eu queria dizer todos,
o que já aprendi a fazer,
várias receitas, vários do-
ponível para arranjar as
coisas, e para a gente vir
e não faltar, e deu
apoio... A seguir, os pro-
fessores que tivemos, tam-
bém gostei dos três até
agora. Gostei de qualquer
um deles… cada um à sua
maneira. Mas os três bons
professores. Os funcionários
também… fazem parte, e
todos muito bem. Gosto
de todos também. Aspetos
positivos são estes… e é o
49
50
que aprendi, e as coisas. As-
petos negativos que possa ti-
rar, talvez os outros colegas
que tiveram na minha turma,
que não quiseram… que não
sei, por motivos pessoais, ou
não pessoais, não sei… Que
faltaram, e que já perderam
um módulo, e que já perde-
ram o curso, acho que são
os aspetos negativos que tiro
disso!
Entrevistador: O que é que
pretendes fazer a nível profis-
sional? No que é que achas
que o projeto “Trad(e)-In” te
pode ajudar no futuro?
Entrevistado: Bom, se eu
dissesse que a nível profissio-
nal, antes pensava poder se-
guir uma carreira, talvez na
pastelaria, eu estava a mentir.
Pois não estava. A nível pro-
fissional, talvez pudesse virar
para outra coisa! Mas agora,
com esse projeto… pode mu-
dar completamente! Não sei…
por acaso não pensava que
fosse gostar tanto e estou
a gostar… e acho que a
nível profissional, de repen-
te com alguma ajuda, ou
depois dando nomes, e a
pessoa ter que ir procu-
rar… trabalho não vem até
à pessoa, a pessoa é que
tem que procurar. Posso a
nível profissional vir a tra-
balhar numa padaria, numa
(…) saio daqui com um curso. Tenho um
curso e vou sair… acho que com boa nota (…)
cadinho desde que chegaste
aqui?
Entrevistado: Bom, para já,
vou sair daqui com um cur-
so, o que antes não tinha,
nem sequer acabei a escola-
ridade obrigatória que era o
nono ano, só tirei o oitavo,
e não tinha curso nenhum.
Agora já saio daqui com um
pastelaria, para um lugar
que trabalhe mais assim
com pão e massas, e do-
ces, não sei… Acho que
esse projeto me pode aju-
dar muito.
Entrevistador: Ok! E
quais são as tuas expecta-
tivas para o teu futuro?
Tu tens 20 anos, o que é
que perspetivas agora para
quando terminares a
UFCD? Portanto, o curso
de Pastelaria e Doçaria
Tradicional Açoriana, o que
é que perspetivas para o
teu futuro? Mudou um bo-
curso. Tenho um curso e
vou sair… acho que com
boa nota. E não sei, ex-
pectativas… acho que posso
esperar. Posso ter mais
probabilidades de arranjar
um emprego, ou mesmo
numa outra área que não
seja a minha. Mesmo…
não sei. Acho que agora
é muito melhor para mim
ter um curso, que antes
não tinha e já tendo algu-
ma experiência. Acho que
para o futuro, devido a
esse curso que está aqui,
posso melhorar.
51
Entrevistador: Carlos, o que é
que te levou a integrar no pro-
jeto “Trad(e)-In”?
Entrevistado: Foi porque eu
não tinha trabalho e inscrevi-me
no fundo de desemprego. E eles
deram-me oportunidade de estar
aqui na Cáritas. E estou a gos-
tar disto… e é isso.
Entrevistador: Ok. Como é que
está a ser a tua experiência?
Ou seja, vocês também começa-
ram há pouco tempo as aulas.
Mas o que é que tu tens acha-
do de diferente? O que é que
te tem motivado para vires para
as aulas? Quais os aspetos posi-
tivos e os negativos?
Entrevistado: Eu estou… a mi-
nha experiência tem sido boa…
os ambientes aqui são diferentes
das escolas, os professores aqui
ajudam mais os alunos, e… estou
a gostar disso. E tenho aprendi-
do coisas novas… Gosto desta
área.
Entrevistador: Quais os aspetos
que achas negativos? Sobressaiu
algum?
TESTEMUNHO DE FORMANDOS
CARLOS PEDRO
PREPARAÇÃO DE PRODUTOS EM MODO DE AGRICULTURA BIOLÓGICA –
EMBALAMENTO
52
da escola?
Entrevistado: Há oitos
anos. Mas tem sido posi-
tivo. Tenho um professor
que é muito simpático e
“porreiro”… e é isso.
Entrevistador: Ok. Diz-
me uma coisa, o que é
que tu pretendes fazer a
nível profissional? Esco-
lheste esta área. A tua
escolha foi também a
ver para o teu futuro?
Entrevistado: Não, não…
Entrevistador: Não?
Entrevistado: Eu só acho
um bocadinho estranho por-
que há muito tempo que
não estou na escola.
Entrevistador: Ok!
Entrevistado: Mas está a
ser positivo…
Entrevistador: Como é
que tem sido voltar? Há
quanto tempo estavas fora
Entrevistado: Sim, sim…
Entrevistador: Já tinhas tra-
balhado? Se não…
Entrevistado: Eu gostava
de ser Guarda Prisional.
Mas eu já tenho experiência
nesse curso dos embalamen-
tos, porque eu já trabalhei
numa floricultura e eles lá
fazem isso. Portanto, se eu
não conseguir…
Entrevistador: Gostavas?
Entrevistado: Sim, gostava.
53
não é?
Entrevistado: Pois, o pro-
fessor também fala daque-
les projetos, que vai criar
um projeto. Se der… Se
der bom resultado…
Entrevistador: Ok!
Entrevistado: Mas que
nós temos de trabalhar,
temos de nos esforçar, ha-
tuas expectativas para o
teu futuro?
Entrevistado: É seguir…
Entrevistador: O que é
que desejas para o teu
futuro?
Entrevistado: O que é
que eu desejo para o meu
futuro? É ter um futuro
bom…
Se eu não conseguir ir
para Guarda Prisional… vou
seguir este caminho.
Entrevistador: Em que é
que tu achas que este
projeto, a formação que
estás a receber, pode-te
ajudar para o teu futuro?
Entrevistado: Pode ajudar
em muita coisa… prepara-
(…) Se eu não conseguir ir para Guarda Prisional…
vou seguir este caminho (..)
Entrevistador: Ok. Mas
queres concluir essa forma-
ção?
Entrevistado: Claro, claro…
Entrevistador: E depois?
Entrevistado: Depois, que-
ria ver se arranjava um
trabalho. Nem que fosse
aqui nas Cáritas. Se eles…
se eles tivessem. Se eles
não tivessem… havia de se
ver.
Entrevistador: O Professor
também fala de projetos,
ver disciplina… e é só isso
que eu tenho a dizer!
Entrevistador: Então tens
gostado de estar por aqui?
Entrevistado: Tenho, te-
nho…
Entrevistador: Ok, Carlos.
ração, não é? Faço coisas
que se calhar nunca fiz
no trabalho… Higiene e se-
gurança… lá na floricultura
nós não fazíamos isso.
Entrevistador: Vocês es-
tão a dar esse módulo,
não é?
Entrevistado: É, é…
Entrevistador: Ok…
Entrevistado: E acho que
é só isso…
Entrevistador: Ok! Diz-me
uma coisa, qual são as
Doutor Carlos Farinha Ro-
drigues iniciou os trabalhos
com uma apresentação as-
sente no tema “Erradicar a
Pobreza, Reduzir Desigual-
dades e Promover a Coe-
são Social: o caminho pa-
ra uma sociedade mais
humanizada e justa”, com
a moderação do Dr. Antó-
nio Bento Fraga Barcelos,
Provedor da Santa Casa
da Misericórdia de Angra
do Heroísmo.
De seguida, o Diretor Re-
gional da Solidariedade So-
cial, Frederico Furtado Sou-
sa, expôs sobre o tema
“A Solidariedade na Região
Autónoma dos Açores e
os Desafios Futuros”, tendo
ficado a moderação ao
cuidado do Cónego Doutor
Hélder Manuel S. Mendes,
Vigário Geral da Diocese.
Após o almoço, foram re-
tomados os trabalhos com
uma apresentação realizada
pelo Professor Doutor Car-
los Laranjo Medeiros que
Cáritas dos
Açores promo-
veu, nos dias
15 e 16 de outubro, o
Seminário Humanizar a So-
ciedade: O papel das
IPSS no processo de hu-
manização da sociedade,
no Pequeno Auditório do
Centro Cultural e de Con-
gressos de Angra do Hero-
ísmo, na Ilha Terceira, o
qual se inseriu na Semana
Pelo Combate à Pobreza e
à Exclusão Social.
Neste evento estiveram
presentes alguns dos maio-
res especialistas a nível
nacional, a par de confe-
rencistas da região que
abordaram o tema de dife-
rentes perspetivas, e que,
certamente, enriqueceram
os objetivos, métodos e
estratégias concertadas de
intervenção social.
No dia 15, após a Sessão
de Abertura, o Professor
A
54
abordou o tema “As Instituições
de Solidariedade Social, o De-
senvolvimento Local e a Inclu-
são Social”. A moderação foi
entregue ao Dr. Paulo Dias
Almeida, Presidente da Direção
da União Regional das IPSS.
ências mencionadas pela
plateia. Este foi um momen-
to de grande dinamismo,
pois foi possível assistir a
uma consistente troca de
ideias e experiências com o
objetivo de perceber as
causas e as soluções para
o insucesso escolar. Desta
Mesa fizeram parte o Dr.
Leandro Viriato, Presidente
do executivo da E.S. To-
más de Borba, o Dr. Mário
Rodrigues, Presidente do
executivo da E.S. Jerónimo
Emiliano de Andrade, a
Dra. Andreia Jaqueta, Re-
presentante dos Empresários
para a Inclusão Social, o
Dr. Marcelo Formosinho, Co-
ordenador processual e me-
todológico do Projeto EPIS
nos Açores, e, por último,
o Doutor Francisco Simões,
Investigador do Centro de
Investigação e Intervenção
Social – ISCTE-IUL. Tendo
ficado o precioso trabalho
de moderação a cargo do
do Seminário, houve espaço
à apresentação do livro
“Humanizar a Sociedade”,
pelo Cónego Doutor Hélder
Miranda Alexandre, Reitor
do Seminário Episcopal de
Angra.
O dia 16 iniciou-se com o
tema “Empreendedorismo e
Desenvolvimento Local”,
apresentado pelo Doutor Rui
Duarte Gonçalves Luís, com
a moderação da Dra. Isabel
Berbereia, atual Responsável
pela Agência para a Qualifi-
cação, Emprego e Trabalho
de Angra do Heroísmo.
Seguidamente, houve lugar
a uma Mesa Redonda, on-
de se discutiu sobre o te-
ma “As escolas e as IPSS:
que relação no combate ao
insucesso e abandono esco-
lar?”. Aqui, para além de
termos ficado a conhecer o
ponto de vista de especia-
listas experientes no terreno,
tivemos a possibilidade de
ouvi-los quando confrontados
com as opiniões e experi-
55
A tarde prosseguiu com a
introdução e apresentação do
editorial Cáritas, através das
palavras do Prof. Eugénio da
Fonseca, Presidente da Dire-
ção da Cáritas Portuguesa.
Para terminar o primeiro dia
ções ficou a cargo do Pro-
fessor Doutor Alfredo Silvei-
ra de Borba, Diretor do
Departamento de Ciências
Agrárias da Universidade
dos Açores.
Para terminar o Seminário,
e antecedendo à Sessão de
Encerramento, a Dra. Ana
Dr. Nuno Costa Neves, Jor-
nalista da RTP Açores.
Após pausa para almoço, o
trabalho retomou com a
apresentação de um caso
prático, pela Dra.
Diana Sebastião Costa, inti-
tulado “Intervenção Social
em Contexto Escolar”. De
seguida, a Professora Douto-
ra Teresa Seabra de Almei-
da proferiu sobre o tema
“Desigualdades Sociais em
Contexto Escolar”. A modera-
ção destas duas apresenta-56
Combate à Pobreza e à Ex-
clusão Social, decorreu o
Seminário Humanizar a Soci-
edade, um espaço de gran-
de importância para o deba-
te das questões sociais, ten-
do como um dos objetivos o
reforço da rede entre as
Instituições, o Governo, as
Escolas e a Sociedade, com
vista a encontrar soluções
para os problemas da po-
breza e exclusão social que
existem na Região.
Cristina Macedo Pereira, da
Santa Casa da Misericórdia
de Angra do Heroísmo,
apresentou o livro
“Gerontologia, Gerontagogia”.
Assim, em vésperas do
Dia Internacional para a
Erradicação da Pobreza, e
inserido na Semana pelo 57
CARAS DA CARITAS
Cátia Araújo & Ana Ponte Técnicas Administrativas
Diana Mendes Animadora Sociocultural
58
Manuela Rocha (Micas) Técnica Administrativa
Melanie Petiz & Filipa Carvalhinho Mediadoras & Psicólogas
59
Renata Borges & Marcelo Gusmão Operadores Agrícolas
Rui Drumonde Coordenador do CDIJ-CIT
Gestor da Formação
60
VOZES DE INCLUSÃO
A SOLIDARIEDADE NA REGIÃO AUTÓNOMA DOS AÇORES E OS DESAFIOS
FREDERICO FURTADO SOUSA
Diretor Regional da Solidariedade Social
capacidade de interpelar a sociedade, de questionar paradigmas, de inquietar sistemas estabelecidos é, paralelamente à competência na intervenção, um fator relevante no processo de construção de
uma sociedade mais justa, mais coesa e mais hu-manizada.
A
RESUMO
A desumanização da sociedade já tem contornos, embora mais ténues, na nossa sociedade. O antídoto para este mal encontra-se no exercício ativo de cidadania de cada um de nós. Da sol idariedade. Das Organizações. Das Inst i tuições. Passa igualmente pela ação determinada do poder pol í t ico, nas causas públ icas. No dia a dia das dif iculdades humanas encontramos, invaria-velmente, as Inst i tu ições Part iculares de Solidariedade Socia l e as Organizações Não-Governamentais, dando respostas no terreno, junto de quem delas precisa. Paralelamente, impõem-se outras respostas. As do poder pú-bl ico; dos departamentos do governo que tutelam a área so-cial ; dos serviços da Administração Públ ica Regional que ge-rem os dinheiros públ icos com vista a garantir as respostas necessárias. A preocupação na criação de soluções adequadas a cada si-tuação, específ icas para cada real idade, não massif icadas, tem de ser uma constante no trabalho a desenvolver nas áreas da infância e juventude, da deficiência, da tercei ra idade e famíl ia e comunidade. Refi ra-se, que a consecução de todas estas iniciat ivas só é possível devido ao trabalho das Inst i tuições Part iculares de Solidariedade Social envolvidas e da boa art iculação estabele-cida entre os seus técnicos e os colaboradores da Secretar ia Regional da Solidariedade Social . A Direção Regional da Solidariedade Social contará assim, como sempre tem contado, com a colaboração da Cári tas en-quanto parceiro priv i legiado nesta matér ia.
61
O tema que subjaz aos trabalhos do Seminário é cada vez mais oportuno e urgente. A humanização da socie-dade é uma prioridade. Tem de ser a prioridade. Como já tem sido referido, temos assistido ao ruir dos ismos. E depois da derrocada colossal do socialismo soviético, materializada na derrocada do muro de Ber-lim, assistimos ao colapso do capitalismo já designado de selvagem, à construção de novos muros - agora de arame farpado – cimentando fronteiras com preconcei-tos, com medos, com desinformação. O êxodo de África e do Médio Oriente para a Europa, os novos contornos da velha realidade da imigração aliados ao envelhecimento, à pobreza e desemprego crescentes numa velha Europa muitas vezes desunida, forçarão a criação de novos desenhos sociais, de no-vas respostas a velhos problemas ciclicamente recicla-dos. A visão poética do conceito de aldeia global desvane-ceu-se rapidamente perante o óbvio aproveitamento dos recursos humanos e matérias prima dos países subde-senvolvidos e em desenvolvimento, por parte do mundo dito desenvolvido. O velho axioma que assegura que riqueza gera rique-za nem sempre se sustenta perante os casos flagran-tes em que a riqueza gera pobreza, por conta dos princípios da tal economia capitalista selvagem. O de-senvolvimento sustentável é posto em causa. O egoís-mo ecológico é recompensado. O fomento do consumis-mo é chocante. O consumerismo é combatido com to-das as armas do marketing e da publicidade. Em su-ma, o consumo responsável que promova escolhas mais racionais promotoras de maior qualidade de vida antagoniza-se com a necessidade de produção em lar-ga escala e de lucros avantajados. Por causa do cres-cimento económico. Por causa das balanças comerciais. Por causa dos défices. Assim se tem descurado a humanidade. Assim se tem descurado a “nossa casa comum” como chamou o Pa-pa Francisco ao nosso grande habitat que é o plane-ta. O Pontífice, na Encíclica Laudate Si, quando se refere à desigualdade planetária, diz: “O ambiente hu-mano e o ambiente natural degradam-se em conjunto; e não podemos enfrentar adequadamente a degradação ambiental, se não prestarmos atenção às causas que têm a ver com a degradação humana e social. De facto, a deterioração do meio ambiente e da sociedade
(…) o consumo
responsável que
promova esco-
lhas mais racio-
nais promotoras
de maior quali-
dade de vida an-
tagoniza-se com
a necessidade
de produção em
larga escala e de
lucros avantaja-
dos (…)
62
afetam de modo especial os mais frágeis do planeta: «Tanto a experiência comum da vida quotidiana como a investigação científica demonstram que os efeitos mais graves de todas as agressões ambientais recaem sobre as pessoas mais pobres”. Continua o Papa naquela Encíclica: “Nos tempos mo-dernos, verificou-se um notável excesso antropocêntrico, que hoje, com outra roupagem, continua a minar toda a referência a algo de comum e qualquer tentativa de reforçar os laços sociais. Por isso, chegou a hora de prestar novamente atenção à realidade com os limites que a mesma impõe e que, por sua vez, constituem a possibil idade dum desenvolvimento humano e social mais saudável e fecundo. (…) Além disso, o crescimen-to económico tende a gerar automatismos e a homoge-neizar, a fim de simplificar os processos e reduzir os custos. Por isso, é necessária uma ecologia económi-ca, capaz de induzir a considerar a realidade de for-ma mais ampla”. Fim de citação. A Região Autónoma dos Açores, por força do seu dis-tanciamento geográfico e da pequenez do seu territó-rio, parecem salvaguardados de algumas nuances deste cenário. Mas não tenhamos ilusões. Há sempre a ou-tra face duma mesma realidade. E as vicissitudes dos sistemas macro extravasam para os contextos micro. A desumanização da sociedade já tem contornos, em-bora mais ténues, na nossa sociedade. O antídoto pa-ra este mal encontra-se no exercício ativo de cidada-nia de cada um de nós. Da solidariedade. Das Orga-nizações. Das Instituições. Passa igualmente pela ação determinada do poder político, nas causas públicas. A palavra Cáritas que esta Instituição tão bem adotou, tem origem no latim significando caridade, amor. Sendo a caridade o dom de fazer o bem, de ajudar o próxi-mo desinteressadamente, é esta a génese desta insti-tuição. Solidariedade, conceito adotado para o nome do depar-tamento da Administração Pública que aqui represento, traduz um ato de bondade para com os outros ou um sentimento de união e de parti lha de objetivos, de co-operação mútua entre pessoas. Já a Solidariedade So-cial pressupõe a ideia de que os indivíduos se sintam
VOZES DE INCLUSÃO
A SOLIDARIEDADE NA REGIÃO AUTÓNOMA DOS AÇORES E OS
DESAFIOS FUTUROS - Frederico Furtado Sousa
(…) é necessária
uma ecologia
económica, ca-
paz de induzir a
considerar a rea-
lidade de forma
mais ampla (…)
VOZES DE INCLUSÃO
A SOLIDARIEDADE NA REGIÃO AUTÓNOMA DOS AÇORES E OS
DESAFIOS FUTUROS - Frederico Furtado Sousa
63
elementos integrantes de uma mesma comunidade, logo interdependentes. Tem origem no termo obliga-tio in solidum, que no direito romano expressava a obrigação comunitária, ou seja, as responsabilidades que o indivíduo tinha em relação a uma coletivida-de à qual pertencia e de cuja manutenção se be-neficiava. Podemos assim concluir que, no âmbito das nossas causas e dos nossos objetivos, temos as questões mais relevantes em comum. A importância do outro, leia-se, da comunidade, o propósito de participar no processo de valorização e de maior dignificação de todos os seus indivíduos. Como articular, então, os valores comuns de duas faces opostas – a pública e a privada – convergin-do numa ação conjunta de promoção da qualidade de vida dos açorianos e das açorianas? “Vemos, ouvimos e lemos” e, efetivamente, nunca poderemos ignorar que na linha da frente das emergências sociais encontramos sempre o voluntari-ado e as instituições. O voluntariado pontual, movi-do pelos valores da solidariedade, que acorre de forma individual, disponibil izando a sua ajuda; o vo-luntariado organizado, canalizado através das institui-ções de solidariedade social e organizações não-governamentais; mas todos movidos, sempre, pela capacidade máxima da dádiva. No dia a dia das dificuldades humanas também en-contramos, invariavelmente, as Instituições Particula-res de Solidariedade Social e as Organizações Não-Governamentais, dando respostas no terreno, junto de quem delas precisa. São estas as respostas mais rápidas, genuínas e nobres da sociedade. Paralelamente, impõem-se outras respostas. As do poder público; dos departamentos do governo que tutelam a área social; dos serviços da Administra-ção Pública Regional que gerem os dinheiros públi-cos com vista a garantir as respostas necessárias. Cabe assim ao Estado definir prioridades assentes em estudos, diagnósticos e análises da realidade social. Cabe igualmente assegurar a consecução dessas respostas financiando a sua concretização com verbas públicas afetas ao setor. Cabe-lhe, tam-bém, definir mecanismos de regularização e fiscali-zação da ação nesta área por outras entidades, no
(…) nunca podere-
mos ignorar que
na linha da fren-
te das emergên-
cias sociais en-
contramos sem-
pre o voluntaria-
do e as institui-
ções (…)
64
sentido de garantir a qualidade das respostas presta-das e de salvaguardar os interesses das pessoas abrangidas pelas mesmas. Por fim, embora com igual importância, cabe-lhe promover, apoiar e valorizar as múltiplas respostas asseguradas pelas Instituições Parti-culares de Solidariedade Social e pelas Organizações não-governamentais que vão de encontro às prioridades estabelecidas. A Direção Regional de Solidariedade Social tem pois competência nestas matérias, abrangendo as áreas da solidariedade social, da igualdade de oportunidades e do voluntariado. O trabalho que tem sido desenvolvido, no âmbito das prioridades definidas e das estratégias delineadas, pas-sa por uma avaliação das respostas existentes, dando prioridade máxima às respostas direcionadas para as pessoas idosas; pela consolidação e criação de res-postas para cada um dos setores. A preocupação na criação de soluções adequadas a cada situação, específicas para cada realidade, não massificadas, tem de ser uma constante no trabalho a desenvolver nas áreas da Infância e juventude, defici-ência, terceira idade e família e comunidade. Temos portanto as instituições de acolhimento para cri-anças e jovens. Temos as creches, os jardins -de-infância, os centros de atividade de tempo livres. Te-mos os centros de atividade ocupacionais, os lares re-sidências para pessoas com deficiência. Temos as ca-sas abrigo e os centros de acolhimento para vítimas de violência doméstica. Temos os centros de dia, de noite, de convívio, serviços de apoio domicil iário e os designados lares para a terceira idade. Tudo isso é necessário, infelizmente, vezes demais. Mas vão-se criando respostas mais específicas que lhes são complementares. Como o Programa Impacto, que assegura acompanhamento individualizado a crian-ças vítimas de contexto familiar de violência doméstica. Ou o Programa Conecta, que faz acompanhamento a adolescentes em situação de conflito familiar. Ou o Programa Contigo, quer na vertente de apoio à vítima, quer no percurso reeducacional do agressor. Ou no re-equacionamento das respostas do Serviço de Apoio Domicil iário prestado a pessoas idosas ou dependentes.
(…) criação de so-
luções adequa-
das a cada situa-
ção, específicas
para cada reali-
dade, não massi-
ficadas (…)
VOZES DE INCLUSÃO
A SOLIDARIEDADE NA REGIÃO AUTÓNOMA DOS AÇORES E OS
DESAFIOS FUTUROS - Frederico Furtado Sousa
65
E na planificação de apoio e formação para os cui-dadores formais desta população, assim como o apoio aos cuidadores informais, através de informa-ção e acompanhamento. Há também um forte investimento na área da igual-dade de oportunidades, com especial enfoque na problemática da violência doméstica. Esta prioridade consubstancia-se no II Plano Regional de Prevenção e Combate à Violência Doméstica e de Género com um período de vigência – 2014-2018. Este Plano engloba quatro áreas estratégicas, abar-cando a informação e sensibil ização da comunidade; a formação e qualificação de profissionais; a prote-ção às vítimas e a intervenção junto dos agresso-res e ainda o conhecimento e a monitorização da realidade. No âmbito do mesmo pretende-se traba-lhar a violência doméstica de uma forma abrangen-te, direcionada para todos os grupos particularmente vulneráveis, a saber: pessoas idosas, pessoas com deficiência, pessoas imigrantes, comunidade LGBT. A problemática dos abusos sexuais sobre crianças e jovens é uma matéria que tem merecido reflexão por parte de uma equipa técnica específica e que irá desenvolver o trabalho planificado, a breve tre-cho. Há cada vez mais necessidade de se criar estraté-gias que contribuam para o fomento de políticas e atitudes sociais comuns e de fácil acesso a todos, para que haja uma efetiva integração na sociedade de todos os cidadãos. As estratégias que aqui se fala nunca são suficien-tes, por isso, estamos hoje aqui presentes para tentar também encontrar ainda mais medidas que sejam promissoras e capazes de irem cumprindo com aquilo que é a igualdade entre todos no aces-so e nas escolhas. Reforço que o papel desempenhado pela Secretaria Regional da Solidariedade Social em conjunto com as Instituições Particulares de Solidariedade Social tem sido fundamental na criação dessas estratégias e medidas nas mais variadas áreas de atuação, co-mo sejam: - A Solidariedade Social; - A Emergência Social; - A Habitação; - A Segurança Social; - As Políticas de igualdade de género, igualdade
(…) áreas estraté-
gicas, abarcando
a informação e
sensibilização da
comunidade; a
formação e qua-
lificação de pro-
fissionais; a pro-
teção às vítimas
e a intervenção
junto dos agres-
sores e ainda o
conhecimento e
a monitorização
da realidade. (…)
66
perante o trabalho e combate às discriminações; - O Voluntariado; Entre outras. O desafio também passa por criar atividades económi-cas sustentáveis, geridas na base da cooperação entre os trabalhadores e trabalhadoras, numa perspetiva de desenvolvimento local e de construção de outras rela-ções sociais, emancipadoras e equitativas. Tem assim, a economia social, uma visão mais multidimensional, que vai para além do económico, e integra fortemente a educação, a cultura, a ação política para a transfor-mação social. Não é de mais relembrar que a economia social vem se apresentando, nos últimos anos, como uma inovado-ra forma de resposta a favor da inclusão social. Com-preende uma diversidade de práticas económicas e so-ciais organizadas sob a forma de cooperativas, associ-ações e instituições, que realizam atividades de produ-ção de bens, prestação de serviços e consumo solidá-rio. O que interessa acima de tudo é trabalharmos em conjunto, de forma concertada, para que se criem tra-jetos cada vez mais capazes de responder às necessi-dades que vem sendo diagnosticadas na nossa Região, numa lógica de potenciar a igualdade entre todos e para todos. É esta relação estreita entre os diversos atores soci-ais, entre as diferentes entidades com capacidade de intervenção, que assegurará um futuro solidário para a nossa sociedade; privilegiando as políticas de proximi-dade, o trabalho no terreno, as respostas específicas a cada contexto, o desenvolvimento local e sustentável com vista a uma coesão social mais efetiva e a um desenvolvimento mais harmonioso. A Direção Regional da Solidariedade Social contará as-sim, como sempre tem contado, com a colaboração da Cáritas enquanto parceiro privilegiado nesta matéria. A capacidade de visão dos seus dirigentes, o caráter inovador do seu trabalho, a dinâmica que imprime às
VOZES DE INCLUSÃO
A SOLIDARIEDADE NA REGIÃO AUTÓNOMA DOS AÇORES E OS
DESAFIOS FUTUROS - Frederico Furtado Sousa
(…) criar ativida-
des económicas
sustentáveis, ge-
ridas na base da
cooperação en-
tre os trabalha-
dores e trabalha-
doras (…)
67
suas iniciativas, o empenho na mobilização de re-cursos diversificados, a competência do seu quadro técnico, são fatores que garantem a qualidade da sua intervenção. Contribui pois, à sua escala, para um desenvolvimento mais justo e para uma comuni-dade mais humanizada.
(…) A Direção Re-
gional da Solida-
riedade Social
contará assim,
como sempre tem
contado, com a
colaboração da
Cáritas enquanto
parceiro privilegi-
ado (…)
Apresentação realizada no âmbito do Seminário “Humanizar a Sociedade“
Página da
Cáritas da Ilha Terceira
no Facebook
Ajude-nos a chegar aos
2000 Gostos! https://www.facebook.com/Cáritas-da-Ilha-Terceira-324583264239246/