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SUPLEMENTO SEMANA VERDE 2010 Revista da Direcção-Geral do Ambiente Biodiversidade – a nossa fonte de vida

Biodiversidade – a nossa fonte de vida · Os recifes de coral são um exemplo de locais onde existe um risco de perda dramática e irreversível de biodiversidade, caso os ecossistemas

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SUPLEMENTO SEMANA VERDE 2010

Revista da Direcção-Geral do Ambiente

Biodiversidade – a nossa fonte de vida

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Índice03 Desafios e orientações para o futuro

04 Em que estado se encontra o planeta?

05 Poderíamos ter agido de outra forma?

06 Explorar a economia e o valor da biodiversidade

08 Proteger a biodiversidade da água doce da Europa

09 Nova legislação visa proteger oceanos europeus

10 Cuidado com o que pisa!

11 Biodiversidade: Elo de ligação entre humanidade e saúde

12 Agricultores – Guardiães do espaço rural?

13 Hábitos alimentares e perda de habitats

14 Alterações climáticas e biodiversidade

15 Desenvolver infra-estruturas ecológicas

16 Exposição e eventos paralelos

Este ano, a Semana Verde, que decorreu de 1 a 4 de Junho de 2010, incidiu na importância desempenhada pela biodiversidade nas nossas vidas e nas dramáticas consequências que enfrentamos caso não consigamos impedir a sua perda. Ao longo de quatro dias, foram várias as sessões e os eventos que exploraram a ques-tão a partir de diferentes prismas, analisando os fracassos e dando a conhecer os casos de sucesso.

Do encontro saíram mensagens claras. Uma vez perdida, a biodiversidade não poderá ser recuperada. Tal como afirmou o Presidente da Comissão Europeia, José Manuel Barroso, «é o nosso mundo que está em jogo. Se eliminarmos esta fonte de vida, não haverá outra».

Na ocasião foram deixados fortes apelos a uma maior investigação sobre o valor dos serviços proporcionados pela natureza, na linha do excelente trabalho desenvolvido no âmbito do estudo «A Economia dos Ecossistemas e da Biodiversidade».

São necessários maiores esforços para envolver o sector privado na protecção da biodiversidade – é neste sector que se concen-tram a energia, as ideias e os fundos necessários para isso. A responsabilidade não pode assentar exclusivamente nos financiamentos públicos, em especial no quadro da difícil conjuntura económica que se vive.

É também crucial aumentar a sensibilização do público, uma vez que a biodiversidade pode ser um conceito de difícil compreen-são, se comparado com as consequências visíveis das alterações climáticas. No entanto, têm sido feitos progressos. Se há três anos dois terços dos europeus afirmavam desconhecer o que era a biodiversidade, hoje esses mesmos dois terços reconhecem saber o que ela significa.

Mas apesar de tudo, ainda há trabalho a fazer para que a biodi-versidade capte o mesmo grau de atenção que as alterações climáticas junto dos responsáveis políticos e do público. Contudo, as ligações entre ambas são cada vez mais evidentes. É necessário continuar a divulgar esta mensagem e ao mesmo tempo dar maior relevo à biodiversidade na agenda política. Aguardamos com expectativa as negociações na cidade japonesa de Nagoya, em Outubro, onde será traçado um novo plano à escala mundial para a biodiversidade.

As biografias e apresentações dos oradores bem como vídeos e centenas de fotografias das sessões estão disponíveis em http://ec.europa.eu/greenweek

Editorial

MEIO AMBIENTE EM LINHAQuer saber o que é que a União Europeia está a fazer para proteger o meio ambiente, o que são políticas integradas de produtos ou como obter o «rótulo ecológico»?Descubra isto e muito mais na página Internet da DG Ambiente:http://ec.europa.eu/environment/index_pt.htm

ADVERTÊNCIAA Comissão Europeia, ou qualquer pessoa agindo em seu nome, não pode ser responsabilizada pela utilização das informações contidas nesta publicação ou por quaisquer erros que, não obstante os cuidados na sua preparação e a sua constante verificação, possam ter ocorrido.

Impresso em papel reciclado certificado com o «rótulo ecológico» para papel gráfico(ec.europa.eu/environment/ecolabel)

Luxemburgo: Serviço das Publicações da União Europeia, 2010ISSN 1831-5798© União Europeia, 2010A reprodução de texto é permitida mediante a indicação da fonte.Interdita a reprodução de imagens.Printed in Belgium

Meio Ambiente para os Europeus ec.europa.eu/environment/news/efe/index.htm

INFORMAÇÃO EDITORIAL

Meio Ambiente para os Europeus é uma revista trimestral

publicada pela Direcção-Geral do Ambiente da Comissão

Europeia. Está disponível em alemão, búlgaro, checo,

espanhol, estónio, francês, grego, inglês, italiano, lituano,

polaco, português e romeno.

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no seu interior ou faça-o em linha através do seguinte

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Chefe de redacção: Róbert Konrád

Coordenador: Jonathan Murphy

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Informação e documentos:

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Página Internet da revista Meio Ambiente

para os Europeus:

ec.europa.eu/environment/news/efe/index.htm

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«O fracasso contínuo em atingirmos as

nossas metas em termos de biodiversidade

será catastrófico. Não podemos continuar

a iludir-nos a nós próprios dizendo que

estamos a fazer o suficiente», afirmou

Janez Potočnik, comissário europeu para

o Ambiente, por ocasião do arranque da

Semana Verde, em Bruxelas.

«Temos que olhar com honestidade para os

benefícios que a biodiversidade nos oferece,

as actuais pressões que sofre e as possíveis

soluções para as actuais taxas de perda,

incluindo a necessidade de dispormos de

uma base sólida de informação, que permita

registarmos o progresso futuro», defendeu.

O comissário explicou que as políticas euro-

peias da água, ar, solo, químicos e emissões

têm, todas elas, impactos directos sobre

a biodiversidade. «Quando delineamos

estratégias e políticas para estimular as

nossas economias e criar emprego e inova-

ção, fazemo-lo tendo em mente a ideia

de que essas políticas devem ser, desde

o momento da sua concepção, compatíveis

com a biodiversidade.»

«Devemos sempre procurar fazer com que

as nossas propostas assentem numa sólida

base científica», sublinhou Potočnik, acres-

centando que «esta é a chave que garante

a nossa credibilidade e deve tornar-se no

garante do nosso sucesso».

Pavan Sukhdev, líder do estudo «A Economia

dos Ecossistemas e da Biodiversidade»

(TEEB) e conselheiro especial da Iniciativa

Economia Verde do Programa das Nações

Unidas para o Ambiente, corroborou

a necessidade de dispor de argumentos

sólidos para ganhar o debate político.

«Hoje em dia, a economia é a moeda corrente

da política. Encontramo-nos numa época em

que nos são pedidas justificações económicas

e há que chegar a compromissos em inúme-

ros casos. Não podemos ignorar o factor

económico», reconheceu o especialista.

Projectos como o TEEB têm também por

missão sublinhar os custos crescentes da

perda de biodiversidade e da degradação

dos ecossistemas.

«O valor daquilo que a natureza oferece

à humanidade não é negligenciável», obser-

vou Sukhdev. «O objectivo do projecto TEEB

passa por chamar a atenção para os benefí-

cios económicos globais da biodiversidade,

sublinhar os custos inerentes à sua perda

e conjugar conhecimentos especializados das

ciências, economia e política para possibilitar

actuações práticas que nos permitam evoluir.»

Ashok Khosla, presidente da União Interna-

cional para a Conservação da Natureza

(UICN), apoiou esta análise e declarou que

a biodiversidade subsidia tudo aquilo que

fazemos. «O valor da polinização está esti-

mado em cerca de 1,3 mil milhões de dólares

norte-americanos. Com efeito, 35 % dos

nossos alimentos têm origem em produtos

resultantes da polinização», afirmou Khosla.

Por seu lado, a professora Jacqueline

McGlade, directora executiva da Agência

Europeia do Ambiente, apontou a necessi-

dade de se dispor de uma sólida base de

informação de referência para que se

possam avaliar os avanços neste campo.

«O Sistema de Informação sobre Biodiversi-

dade para a Europa (BISE), lançado na Semana

Verde (ver caixa), irá recolher dados, informa-

ções e conhecimentos sobre a biodiversidade

para ajudar a produzir indicadores e avaliações

que nos proporcionem uma visão mais

correcta dos ecossistemas e dos seus respec-

tivos serviços», explicou McGlade.

«Outro desafio consiste em traduzir para

uma linguagem acessível ao cidadão

comum a totalidade dos conhecimentos

e informações disponíveis sobre a biodiversi-

dade para levar as comunidades e os indiví-

duos a agir», concluiu.

A União Europeia não conseguiu atingir o seu objectivo no sentido de travar a perda de biodiversidade até 2010. Parte da batalha do futuro assenta na capacidade de comunicar com eficácia e, para isso, a UE terá de fazer chegar a mensagem sobre os perigos da perda de biodiversidade e do valor económico dos ecossistemas saudáveis aos decisores e ao público em geral.

Desafios e orientações para o futuroT

«O fracasso contí-

nuo em atingirmos

as nossas metas

em termos de bio-

diversidade será

catastrófico.Janez Potočnik,

comissário europeu

para o Ambiente

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«Apesar dos esforços para travar a perda

de biodiversidade, verifica-se que todas as

pressões previamente identificadas se man-

têm ou estão a aumentar de intensidade»,

afirmou Matt Walpole, do Centro Mundial

de Vigilância da Conservação do Programa

das Nações Unidas para o Ambiente (PNUA).

«A manterem-se as actuais trajectórias,

é de prever a continuação dos elevados

níveis de extinções e de perda de habitats

ao longo deste século. Os recifes de coral

são um exemplo de locais onde existe um

risco de perda dramática e irreversível

de biodiversidade, caso os ecossistemas

sejam empurrados para além do ponto

de não retorno», advertiu Walpole.

As estatísticas actuais são pouco encorajado-

ras: muitas espécies ameaçadas encontram-

se cada vez mais perto da extinção. Em quase

todos os pontos do globo continuam a existir

habitats naturais em declínio. As populações

de vertebrados reduziram-se, em média, quase

um terço entre 1970 e 2006.

A professora Jacqueline McGlade, directora

executiva da Agência Europeia do Ambiente

(AEA), confirmou que o estado da biodiversi-

dade na Europa continua a deteriorar-se.

«Apesar de as extinções na UE não estarem

a ocorrer a um ritmo tão elevado como

noutras regiões, a percentagem de espécies

em risco é fonte de grande preocupação»,

advertiu. Vinte e cinco por cento dos mamí-

feros marinhos, 22 % dos anfíbios, e 21 %

dos répteis estão ameaçados de extinção.

E há uma proporção igualmente alarmante

de outras espécies também em perigo,

incluindo mamíferos terrestres e aves.

Um olhar sobre as espécies e habitats

abrangidos pela Directiva Habitats da UE

revela um cenário igualmente preocupante,

segundo McGlade. Cerca de 65 % dos

habitats e 52 % das espécies possuem um

estatuto de conservação «desfavorável»,

com apenas 17 % dos habitats e espécies

de importância comunitária a gozar de

um estatuto «favorável».

«Dados de detecção remota revelam que

entre 1990 e 2006 as zonas húmidas na

Europa diminuíram em quase 3 %, enquanto

que as superfícies artificiais – tais como

zonas urbanas e infra-estruturas ligadas

aos transportes – se expandiram quase 8 %.

Trinta por cento da área da UE-27 encontra-

-se muito ou extremamente fragmentada

devido à expansão urbana. Como resultado

destas alterações, 70 % das espécies encon-

tram-se ameaçadas devido à perda dos seus

habitats, o que representa uma proporção

extremamente elevada», apontou a respon-

sável da AEA.

O ambiente marinho enfrenta problemas

particulares: 88 % das unidades populacio-

nais (stocks) estão a ser capturadas para

além dos níveis máximos sustentáveis

e 46 % estão fora dos limites biológicos

de segurança, o que significa que correm

o risco de não virem a ser repostas.

«Outro tema-chave é a poluição. Em certas

áreas têm-se verificado progressos. A con-

centração de nitratos nos rios, por exemplo,

foi 10 % menor em 2006 do que em 1998.

Ainda assim, 26 % das espécies encontram-

se ameaçadas por pesticidas e fertilizantes,

tais como nitratos e fosfatos», exemplificou

McGlade.

Por outro lado, não existem dúvidas acerca

do sucesso da designação dos sítios da Rede

Natura 2000, que agora somam uma área

total de quase 750 000 km2 – mais de

17 % da superfície total da União Europeia

(ver caixa da pág. 15).

«A Europa consome actualmente o dobro

daquilo que o seu território terrestre

e marinho consegue produzir e a sua pegada

ecológica aumentou 33 % nos últimos

40 anos. A par do enorme crescimento

na procura de recursos por parte dos países

de baixos e médios rendimentos, esta

situação é claramente insustentável», con-

cluiu Jacqueline McGlade, que deixou no

ar uma sugestão: «A mensagem é clara: para

manter e aumentar os nossos rendimentos

e bem-estar, temos que nos tornar radical-

mente mais eficientes na forma como

utilizamos os nossos recursos».

O mundo fracassou na tentativa de estabilizar ou reduzir de forma substancial o nível de perda de biodiversidade. Em certas regiões, e caso não seja travado imediatamente, este declínio pode tornar-se irreversível. Apesar disso, têm sido alcançados êxitos com sistemas como a Rede Natura 2000. Mas as pressões sobre a biodiversidade continuam a aumentar e é preciso lidar melhor com as causas que lhes estão subjacentes. Uma das soluções pode passar por integrar a biodiversidade com outras áreas, em especial a agrícola.

Em que estado se encontra o planeta?T

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«Não temos sido suficientemente estratégi-

cos no planeamento, financiamento

e implementação de políticas para abordar

a perda de biodiversidade e não temos

monitorizado convenientemente os nossos

êxitos e insucessos», reconheceu Jon Hutton,

do Centro Mundial de Vigilância da Conser-

vação do Programa das Nações Unidas para

o Ambiente (PNUA), perante os participantes

da Semana Verde.

«As áreas protegidas, por exemplo, não

cobrem suficientemente os sítios funda-

mentais para a biodiversidade nem são,

em muitos casos, geridas de forma eficaz.

Temos também muita dificuldade em

explicar o que é a biodiversidade e em

justificar por que razão é tão importante»,

continuou, ao mesmo tempo que admitiu

que «ainda não persuadimos o público nem

os decisores da importância da biodiversi-

dade nem da necessidade de tomar medi-

das urgentes».

«A agricultura será certamente a maior

ameaça à diversidade global ao longo dos

próximos 30 anos. A biodiversidade não tem

sido suficientemente integrada nas políticas

agrícolas nem noutras áreas relacionadas com

alterações ao uso dos solos», alertou Hutton.

«O fracasso em atingir as metas estabelecidas

para a biodiversidade explica-se por não

conseguirmos valorizar nem integrar os

conceitos de biodiversidade e de ecossistema

nos métodos convencionais de contabilidade

dos países – o PIB – nem atribuir-lhes um

preço de mercado», sustentou por seu lado

Andreas Baumueller, presidente do Fórum

Europeu sobre Habitats.

«Por razões sociais, económicas e ambien-

tais, precisamos de investir na natureza

e de trabalhar com ela. Necessitamos de um

sistema de contabilidade melhor que tenha

em conta o valor da natureza e da biodiver-

sidade», afirmou o responsável pelo Fórum.

Baumueller criticou programas anteriores,

tais como o Plano de Acção para a Biodiversi-

dade da União Europeia adoptado em 2006

por não estar alicerçado em sólidas bases

legislativas. «Necessitamos de um suporte

legislativo muito mais forte para a nossa

futura estratégia sobre a biodiversidade.

Os êxitos do passado deveram-se, em muitos

casos, à existência de legislação europeia tal

como a Directiva Aves, a Directiva Habitats

e a Directiva-Quadro da Água», apontou.

O especialista chamou também a atenção

para a necessidade de financiamento

adequado. «Do orçamento total da UE,

apenas 0,2 % é atribuído directamente

à biodiversidade. Apesar de existirem

financiamentos indirectos provenientes

de fundos não-ambientais, o valor global

atribuído à natureza e à biodiversidade nos

orçamentos nacionais e da UE é irrisório»,

afirmou Baumueller, concluindo que «inves-

tir na natureza compensa».

«Um dos grandes êxitos das políticas recen-

tes tem sido a rede de áreas protegidas

Natura 2000 da UE», observou Alexander

Schink, secretário de Estado do Ministério

do Ambiente e Conservação, Agricultura

e Protecção ao Consumidor do estado

alemão da Renânia do Norte-Vestefália.

De olhos postos no futuro, Alexander

Schink sublinhou a importância de lidar

com o potencial conflito entre agricultura

e agricultores e vê na próxima reforma da

Política Agrícola Comum (PAC) uma oportu-

nidade para fortalecer os interesses comuns

da agricultura e da biodiversidade.

Peter Kendall, vice-presidente do Copa-

-Cogeca, órgão que representa os interesses

A futura política da UE em matéria de biodiversidade e os esforços para travar a sua perda terão por base as lições aprendidas com o fracasso em atingir os objectivos que estavam traçados para 2010 nesta área.

Poderíamos ter agido de outra forma?T

«É o nosso mundo

que está em jogo.

Se eliminarmos esta

fonte de vida, não

haverá outra.

José Manuel Barroso,

Presidente da Comissão Europeia

dos agricultores europeus, lançou também

um apelo a favor de uma maior cooperação

entre os ambientalistas e os responsáveis

pela gestão das áreas rurais. «Os agricultores

têm tudo a ganhar se adaptarem as suas

práticas e tiverem em conta a biodiversi-

dade. Temos que aprender a trabalhar

em parceria no futuro», afirmou Kendall.

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Uma das mensagens mais fortes transmiti-

das na Semana Verde foi a de que o actual

sistema económico, com a sua ênfase no

crescimento contínuo, deixou de ser susten-

tável e é necessário substituí-lo por uma

alternativa adequada.

A questão já tinha sido abordada quando

Pavan Sukhdev, líder do estudo «A Economia

dos Ecossistemas e da Biodiversidade» (TEEB),

alertou para o perigo de confundir os concei-

tos de preço e de valor.

A natureza proporciona serviços que pos-

suem valor. Precisamos de analisar diversos

indicadores de desempenho para além do

PIB. Trata-se de corrigir o nosso método de

análise e de ajustar o vocabulário que utiliza-

mos, defendeu o especialista.

O autor do relatório «Prosperidade sem

Crescimento?» (Prosperity without Growth?),

professor Tim Jackson, argumentou na

sessão de encerramento que existe uma

alternativa e que o conceito de «decresci-

mento [económico], ou décroissance», como

é conhecido em francês, deverá guiar deci-

sões futuras. Jackson apelou à sociedade

para pôr termo à sua dependência de novos

produtos, ao defender que «temos sido

encorajados a gastar dinheiro que não temos

em coisas de que não necessitamos para criar

impressões não duradouras em pessoas que

não são importantes para nós». O apelo

arrancou um sonoro aplauso da audiência.

Numa tentativa de estimular o interesse pela

biodiversidade por parte dos líderes políticos

e empresariais, Simon Upton, director respon-

sável pelo Ambiente na OCDE, referiu-se

ao adágio dos profissionais da contabilidade

segundo o qual «o que pode ser medido,

pode ser gerido».

Upton sublinhou a necessidade de mais

investigação para obter informação de

qualidade sobre o valor da biodiversidade

para garantir que os decisores compreen-

dem, com recurso a dados palpáveis,

os perigos de perdas adicionais.

Pagamentos pelos ecossistemas

O Pagamento por Serviços Ambientais (PSA)

é um instrumento financeiro utilizado para

proteger a biodiversidade. Trata-se de

um acordo voluntário condicional entre

um vendedor e um comprador, o qual

prevê a prestação de um serviço ambiental.

Existem hoje cerca de 300 programas PSA

em todo o mundo.

Alguns são programas nacionais, como

os do Canadá, China, Costa Rica, Estónia,

Estados Unidos e Reino Unido, mas na

maioria dos casos são desenvolvidos

e aplicados a nível local. No total, canali-

zam anualmente cerca de 8,2 mil milhões

de dólares para serviços ecossistémicos –

um valor que tem vindo a aumentar entre 10 %

e 20 % por ano, de acordo com Katia Karou-

sakis, da Direcção do Ambiente da OCDE.

Para que o conceito seja eficaz, Karousakis

acentuou que é necessário identificar metas

e objectivos claros, eliminar incentivos que

estejam na base de resultados menos positi-

vos, garantir linhas de financiamento suficien-

tes a longo prazo e diferenciar pagamentos,

os quais se deverão basear no desempenho

e não no esforço. Uma monitorização cuida-

dosa é outro dos requisitos essenciais.

O financiamento pode ser fornecido pelo

utilizador directo dos serviços ou por tercei-

ros, tal como o Estado ou instituições.

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«Temos sido

encorajados a gastar

dinheiro que não

temos em coisas

de que não

necessitamos para

criar impressões

não duradouras

em pessoas que

não são importantes

para nós.Professor Tim Jackson

Hoje, os responsáveis políticos conseguem estimar e apresentar dados concretos sobre os custos dos impactos das alterações climáticas mas semelhante exercício para a perda de biodiversidade é mais difícil. Contudo, conseguir fazê-lo tem um valor inestimável para a humanidade e estão a ser desenvolvidas diferentes estratégias para demonstrar os benefícios económicos que a biodiversidade e os ecossistemas podem proporcionar.

Explorar a economia e o valor da biodiversidade

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Como exemplo do primeiro caso, Karousakis

mencionou a empresa de águas minerais

francesa Vittel, que paga aos agricultores

locais para que estes utilizem menos fertili-

zantes, reduzindo desta forma a contamina-

ção da água e, em consequência, os custos

associados à sua purificação.

Carlos Muñoz Piña, do Instituto Nacional de

Ecologia do México, descreveu os pagamen-

tos que o Estado faz pelos serviços ambientais

hidrológicos das florestas. Entre eles, contam-

-se a recarga dos aquíferos, a melhoria da

qualidade das águas superficiais e a redução

dos prejuízos causados pelas cheias.

O México, que já havia criado uma taxa

à utilização da água, optou também por

implementar um mecanismo para impedir

a crescente desflorestação. O programa

é um êxito e tem vindo a crescer conside-

ravelmente desde que foi lançado em 2003,

cobrindo hoje cerca de 2,4 milhões de

hectares.

O objectivo da medida foi o de canalizar

fundos para as áreas florestais que se encon-

travam em maior perigo, tanto através da ava-

liação da sua importância económica e social

como da sua exposição ao risco de desflores-

tação. Esta abordagem funcionou bem mas

acabou por ser menos bem sucedida quando

se introduziram critérios adicionais.

«Os responsáveis políticos devem evitar

sobrecarregar as estratégias com objectivos

diferentes das metas originais», aconselhou

Muñoz Piña.

Envolver a comunidade

empresarial

Uma vez que as necessidades de financia-

mento para a biodiversidade são muito

maiores do que os recursos existentes,

Joshua Bishop, economista-chefe da União

Internacional para a Conservação da Natu-

reza (UICN), apelou para que haja maiores

esforços no sentido de mobilizar financia-

mentos por parte do sector privado – um

tema-chave do relatório «TEEB para o Sector

de Negócios» (TEEB for Business), publicado

em meados de Julho.

Bishop apontou também a necessidade de

veicular preocupações ambientais de forma

a fazer com que a mensagem chegue às

empresas, ilustrando de que forma comporta-

mentos específicos podem conduzir à redu-

ção de perdas financeiras e evitar que a boa

reputação de uma empresa seja afectada.

Actualmente, são poucas as empresas que

produzem relatórios de sustentabilidade

e, se o fazem, a biodiversidade raramente

é mencionada. «Isto contrasta com as

emissões de gases com efeito de estufa,

relativamente às quais as empresas têm

metas. Não existe nada comparável com

a biodiversidade. Precisamos de ajudar

o sector empresarial a fazer mais», disse Bishop.

«Nós somos o

preço a pagar pela

poluição. Não exigi-

mos um regresso à

Idade de Ouro. Para

nós, uma nova era

mais verde e ecoló-

gica seria o suficiente.

Não é tarde para

mudar. Estamos

todos no mesmo

barco.Abelha, Alta Representante

da Comunidade de Ecossistemas

e Biodiversidade

O economista-chefe da UICN forneceu

argumentos claros a favor das oportunidades

de negócio que resultam em se dar mais

atenção à biodiversidade. Entre elas inclui-se

o aparecimento de novas actividades tais

como o eco-turismo e as pescas sustentáveis,

satisfazendo desta forma as preferências dos

consumidores por produtos certificados

de qualidade, assegurando os factores de

produção e cumprindo as responsabilidades

ambientais exigidas por lei.

Para conseguir tudo isto, as empresas necessi-

tam de avaliar os seus riscos e oportunidades,

delinear estratégias e educar funcionários

e clientes. Simultaneamente, precisam de

estabelecer objectivos quantitativos e moni-

torizar o seu desempenho em termos de

biodiversidade para determinar os progressos

feitos ano após ano.

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«A biodiversidade da água doce está em

crise», denunciou Joachim Maes, do Centro

Comum de Investigação da Comissão

Europeia, numa sessão dedicada à água

e à biodiversidade. As consequências,

advertiu, poderão ser dramáticas.

«Muitas espécies de água doce são endé-

micas, habitam exclusivamente num local

particular. O problema é que, uma vez

perdida uma espécie, não é possível recu-

perá-la», sustentou.

As espécies exóticas são uma das ameaças

com maior potencial destrutivo. Apesar de

90 % das 11 mil espécies exóticas existentes

na Europa serem terrestres, 28 % das mais

nocivas encontram-se em águas doces.

A fragmentação do habitat é outra ameaça,

uma vez que os rios são seccionados em

pequenos troços e o contínuo fluvial, do

qual a biodiversidade depende, é interrom-

pido. Outra das ameaças que os cursos de

água europeus enfrentam tem origem na

utilização de produtos químicos em terra,

que escorrem e inquinam o meio aquático.

Apesar de tudo, existem notícias encoraja-

doras. Espécies migratórias, como o salmão,

estão a regressar aos rios europeus. O mesmo

fenómeno pode ser observado em Nova

Iorque, onde a população de esturjões do

rio Hudson se encontra em crescimento.

Maes lembrou que a perseverança é essen-

cial. «Os rios não podem ser recuperados em

quatro anos, que é a duração normal de um

projecto. Necessitam de 10 anos. É por essa

razão que a estratégia da UE para 2020 é tão

importante», assinalou.

Os efeitos benéficos da legislação europeia

já são visíveis. O mais importante, segundo

Heide Jekel, do Departamento da Água do

Ministério Federal Alemão do Ambiente,

é a Directiva-Quadro da Água (DQA), inte-

grada na estratégia nacional de biodiversi-

dade do país. A implementação da DQA está

intimamente ligada à protecção da natureza

e da biodiversidade.

«Melhorar o estatuto de conservação das

massas de água significa melhores habitats

para os organismos aquáticos e para outras

espécies dependentes da água», explicou Jekel.

Outras directivas comunitárias, relativas

à gestão do risco de cheias e às estratégias

marinhas, estão também a contribuir para

proteger a biodiversidade aquática.

Alterações climáticas,

água e biodiversidade

O professor Peter Bridgewater, director do

Global Garden Consulting (GGC), debruçou-se

sobre a questão da relação entre as altera-

ções climáticas, a água e a biodiversidade.

Na sua perspectiva, o desafio ambiental mais

sério que o mundo enfrenta é a disponibili-

dade e qualidade da água.

Bridgewater fez referência à importância das

zonas húmidas, muitas das quais absorvem

mais dióxido de carbono do que as florestas,

e ao papel-chave das zonas húmidas costei-

ras na gestão de cheias, marés ciclónicas

e secas – fenómenos que as alterações climá-

ticas provavelmente tornarão mais frequen-

tes. O responsável pelo GGC sublinhou ainda

a necessidade de reconstruir a capacidade

de resistência dos ecossistemas, focando

a atenção na gestão dos processos ecossisté-

micos e deixando margem para a evolução

natural, ao invés de tentar recriar o passado.

Bridgewater concluiu que a biodiversidade

tem um papel importante na regulação do

abastecimento de água a nível planetário.

«O ciclo hidrológico pode ajudar a modificar

as alterações climáticas e um clima menos

errático permitirá desenvolver uma capaci-

dade de resistência ecológica e social capazes

de suportarem a biodiversidade, afirmou.

A biodiversidade da água doce está ameaçada devido a diversas pressões – desde espécies exóticas até à poluição – mas existem sinais que apontam para uma melhoria da situação. A Directiva-Quadro da Água da UE deverá permitir enquadrar escolhas e seguir no rumo certo.

Proteger a biodiversidade da água doce da Europa

T

«O desafio

ambiental mais

sério que o mundo

enfrenta é a disponi-

bilidade e qualidade

da água.Professor Peter Bridgewater,

«Global Garden Consulting»

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R E V I S T A D A D I R E C Ç Ã O - G E R A L D O A M B I E N T E ● S U P L E M E N T O

9 OOOO CCCCC EEE AAA NNNN OOOOO SS

O ano de 2020 é a meta para garantir que

o ambiente marinho da União Europeia goza

de «boa saúde», de acordo com a Directiva-

-Quadro «Estratégia Marinha» (DQEM), adop-

tada em Julho de 2008.

A legislação estabelece 11 pontos, que vão

desde a eutrofização e a integridade dos

fundos dos mares até ao lixo marinho, pontos

esses a ter em conta no progresso rumo

a um estado ambiental considerado bom.

O trabalho para alcançar este objectivo já

começou. A Comissão termina este Verão

a finalização dos critérios específicos, tais

como a biodiversidade ao nível de espécies,

dos habitats e dos ecossistemas, cuja função

será determinar se o objectivo definido para

2020 foi alcançado.

A directiva estabelece obrigações claras

a cumprir pelos Estados-Membros. Até

meados de Julho de 2012, estes terão

que apresentar uma avaliação do estado

ambiental das suas águas marinhas, deter-

minar os casos em que são necessários

melhoramentos e estabelecer um conjunto

de metas ambientais e indicadores associa-

dos que lhes permitam atingir os seus

compromissos.

Dois anos mais tarde, todos os Estados-

-Membros deverão ter implementado

programas de monitorização e os dados

por eles fornecidos serão usados para

delinear programas nacionais no sentido

de atingir a meta proposta de ter um estado

ambiental considerado bom.

Mas a DQEM pretende chegar mais longe

e nela está incluída a reforma da Política

Comum das Pescas, de forma a assegurar

a qualidade futura das águas oceânicas

europeias. A directiva é também o pilar

ambiental da política marítima integrada

da UE.

Desafios aos mares europeus

Como os participantes na sessão sobre

Biodiversidade nos Oceanos tiveram oportu-

nidade de ouvir, são inúmeras as ameaças

que os mares europeus enfrentam. Mark

Tasker, do Comité Conjunto de Conservação

da Natureza do Reino Unido, enumerou

a «poluição, os níveis de CO2, as espécies

introduzidas, a extracção e a exploração»

como alguns dos vários fenómenos que

debilitam a sustentabilidade e a biodiversi-

dade dos mares europeus.

Monica Verbeek, directora executiva da

«Mares em Perigo» (Seas at Risk), uma associa-

ção que representa diversas ONG do sector,

salientou que a UE possui muitos compromis-

-sos relativos à biodiversidade, «mas esquece-

-se muitas vezes de que a biodiversidade

marinha deve estar incluída neles».

Este sentimento já tinha sido expresso pela

professora Jacqueline McGlade, directora

executiva da Agência Europeia do Ambiente,

ao sugerir que o ambiente marinho era

o «parente pobre» de muito do que hoje

é debatido para proteger os habitats

naturais.

A implementação da Directiva-Quadro

«Estratégia Marinha» deverá permitir

ultrapassar estas críticas e torná-las coisa

do passado.

Os oceanos que banham a Europa encontram-se, em grande parte, excluídos do âmbito da legislação ambiental da UE. A Directiva-Quadro «Estratégia Marinha» deverá ultrapassar este problema, garantindo, pela primeira vez, protecção a todas as massas de água marinha sob jurisdição da União Europeia. O diploma está em fase de implementação e deverá ajudar a solucionar muitos dos problemas enfrentados pelos mares europeus.

Nova legislação visa proteger oceanos europeus

T

Mark Tasker, coordenador

do programa de Gestão

Marinha do Comité Conjunto

de Conservação da Natureza

do Reino Unido e vice-presidente

do Comité Consultivo

do Conselho Internacional

para o Estudo do Mar

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10 SSSSS OOOOOOOO LLLL OOOOOOOO

Claude Bourguignon, do Laboratório de

Análises Microbiológicas do Solo, deixou

uma mensagem importante aos participan-

tes da Semana Verde: «Temos que mudar

a nossa forma de pensar acerca do solo.

O solo não é uma coisa suja. Ele é vivo,

contém milhões de organismos que afectam

as vidas diárias dos seres humanos», explicou.

Bourguignon, que aconselha agricultores

em matéria de adaptação de culturas a cada

tipo de terreno, defendeu que um mau solo

é coisa que não existe, o que existe é apenas

má agricultura. Para exemplificar, apontou os

danos que o sector agrícola tem provocado

à terra.

Durante o último século, a actividade agrí-

cola destruiu 1 000 milhões de hectares

de terra arável. Em conjunto, a erosão do

solo e a irrigação foram responsáveis pela

desertificação de 12 milhões de hectares

por ano. Só em França, a erosão anual do

solo aumentou, desde 1980, de 10 toneladas

para 40 toneladas por hectare e a actividade

biológica do solo francês diminuiu 90 %

ao longo dos últimos 30 anos.

Segundo Bourguignon, o actual modelo

agrícola não é sustentável. Para compensar

a perda de terra arável, todos os anos são

abatidos 10 a 12 milhões de hectares

de floresta. A agricultura intensiva, com

o consequente uso de fertilizantes, tem

destruído matéria orgânica, o que por sua

vez leva ao desaparecimento da fauna que

dela se alimenta.

Charlotte Hollins, da quinta biológica

«Fordhall», no Reino Unido, partilhou com

os conferencistas da Semana Verde a lição

que o seu pai aprendeu. Ao insistir na

fertilização da terra com produtos quími-

cos – o solo era leve e arenoso –, as plantas

absorviam tudo o que conseguiam e o resto

acabava por se perder. Como resultado,

a fertilidade natural do solo diminuiu,

produzindo culturas cada vez mais fracas

e doentes. No final, o pai de Hollins viu-se

forçado a converter a quinta em campo

de pastagem.

Proteger a terra arável

Bourguignon sugeriu formas práticas de

impedir a terra agrícola de se tornar ainda

mais pobre. Entre elas contam-se o uso de

técnicas agrícolas alternativas que protejam

o solo, a sua fauna e a flora e uma maior

rotatividade e variedade de culturas.

O especialista questionou também o saber

tradicional da comunidade agrícola, segundo

o qual a terra deve ser lavrada em profundi-

dade. «Ao protegermos a terra do sol, a sua

temperatura baixa. Se a temperatura aumen-

tar devido à lavra, por exemplo, estamos

a destruir a actividade biológica», advertiu.

Além da agricultura intensiva, o professor

Wim Van der Putten, do Instituto do Ambiente

neerlandês, chamou a atenção para outras

ameaças enfrentadas pelos solos europeus.

Entre elas, contam-se a expansão das cidades

e zonas urbanas na Europa e a remoção da

camada superficial do solo para a criação

de minas a céu aberto.

As inúmeras características do solo podem

não ser imediatamente visíveis, mas afectam

o mundo que nos rodeia. «Todas as interac-

ções que observamos à superfície do solo

são, até certo ponto, determinadas pelo que

acontece no subsolo. É por essa razão que

a biodiversidade do solo é tão essencial à vida

na terra», concluiu Van der Putten.

Durante as últimas décadas, tem-se verificado uma lenta mas progressiva diminuição da biodiversidade e da actividade biológica do solo. A agricultura intensiva é a principal responsável, embora existam outras causas. Apesar disso, a sensibilização sobre as muitas formas como o solo contribui para a saúde do planeta está a aumentar.

T Cuidado com o que pisa!

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R E V I S T A D A D I R E C Ç Ã O - G E R A L D O A M B I E N T E ● S U P L E M E N T O

11 SSSSS AAAAAAAA ÚÚÚÚÚÚ DDDDDDD EEE

O Tamiflu, o fármaco antiviral usado para

combater a gripe, é concebido em laborató-

rio mas não pode ser produzido sem ácido

xiquímico, um ingrediente extraído da

estrela-de-anis, uma planta originária da

China. Apesar de toda a fé depositada na

ciência, as plantas, animais, fungos e micror-

ganismos continuam a ser uma fonte

insubstituível de fármacos. Dos 1 100 novos

medicamentos aprovados pela Food and

Drug Administration (FDA) dos Estados

Unidos – a entidade responsável pela

supervisão do sector no país – entre 1981

e 2006, dois terços deles têm origem na

natureza. A natureza evolui ao longo de

milhões e milhões de anos, num processo

casual e que escapa à lógica. Esta caracterís-

tica permite-lhe criar e fornecer compostos

activos contra patologias que de outra

forma poderiam nunca vir a ser descobertos

em laboratório.

Ao apresentar estes factos à audiência,

Aaron Bernstein, da Faculdade de Medicina

de Harvard, salientou que o valor dos

produtos naturais para a saúde humana vai

muito para além da descoberta ou produ-

ção de novos fármacos e ilustrou a sua tese

com os benefícios proporcionados pelas

árvores na purificação do ar em zonas urba-

nas. «Quanto mais conseguirmos reduzir

a quantidade de partículas no ar, menor

será o número de mortes por ataque cardí-

aco», defendeu.

Bernstein chamou também a atenção para

as muitas formas como a saúde humana

depende do bom funcionamento dos

ecossistemas naturais, recordando as ori-

gens do vírus VIH/SIDA nos humanos. Tudo

começou quando os habitantes da África

Ocidental, tradicionais consumidores de

peixe, se viram forçados a alimentar-se de

caça selvagem quando as unidades popula-

cionais (stocks) piscícolas se esgotaram. Neste

processo, ficaram expostos a um vírus que

posteriormente haveria de alastrar por todo

o mundo. «Quem poderia imaginar que

a sobrepesca no Atlântico levaria ao apare-

cimento de novas doenças infecciosas?»,

questionou Bernstein.

«A biodiversidade é muito mais do que

proteger espécies, é mais do que uma

questão ética, é mais do que uma questão

económica. Ela é, acima de tudo, uma

questão de saúde pública», afirmou.

O efeito de diluição

da biodiversidade

Oliviero Spinelli, director da Comunità

Ambiente, em Itália, e coordenador de

um estudo sobre o impacto das alterações

da biodiversidade nas doenças infecciosas,

abordou a questão do «efeito de diluição».

A pesquisa revela que quanto maior for

a diversidade de elementos portadores

de agentes patogénicos, maior é a possibili-

dade de esses agentes não suportarem

a proliferação da patologia, diminuindo

assim o risco de contágio em seres humanos.

Spinelli exemplificou com a febre do Nilo

Ocidental, uma doença que reapareceu na

Europa e nos EUA nos últimos 10 anos e que

está a alastrar-se rapidamente. A investigação

estabeleceu um paralelo entre o número de

aves em certos estados norte-americanos

e o número de casos verificados da doença.

Nos estados com mais aves, há menos casos

de febre, enquanto que nos estados onde

a diversidade de aves é menor, o número

de casos registados é superior. «Necessita-

mos de uma abordagem mais interdiscipli-

nar que integre a saúde, a biodiversidade

e a economia, de forma a conseguirmos

compreender melhor o papel da biodiver-

sidade no aparecimento, propagação

e transmissão das doenças infecciosas»,

recomendou Spinelli.

A saúde humana é influenciada por múltiplos factores. Entre eles contam-se o ambiente, genes, estilos de vida ou avanços científicos mas, de entre todos, um dos mais importantes e menos reconhecidos é a biodiversidade.

T Biodiversidade: Elo de ligação entre humanidade e saúde

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tock

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12 AAA GGG RRR II CCC UUUU LLL TTT UUU RR AAA

«A biodiversidade é o nosso seguro de vida

colectivo. As políticas agrícolas esqueceram-

-se disto», disse Corrado Pirzio-Biroli, ex-chefe

de gabinete do antigo comissário europeu

da Agricultura Franz Fischler.

«O modelo agrícola na UE padece dos mes-

mos males que o mercado. É um modelo que

compensa a produção de bens alimentares

lucrativos em vez de apoiar o ambiente,

que não cria receitas. As políticas agrícolas

não conseguiram permitir que os agriculto-

res produzissem bens públicos, em paralelo

com os bens alimentares e as fibras»,

afirmou Pirzio-Biroli.

Na opinião de Christian Hey, do Conselho

Consultivo sobre o Ambiente alemão,

a agricultura é simultaneamente parte

do problema e parte da solução. Para Hey,

é necessário reformar a Política Agrícola

Comum, uma vez que muitos dos proble-

mas estão relacionados com os sistemas

de compensação para os agricultores.

«A biodiversidade é um bem público e deve-

riam existir pagamentos base para o forneci-

mento, por parte dos agricultores, de áreas

de compensação ecológica tais como sebes

ou orlas herbáceas», argumentou.

«O princípio do poluidor-pagador também

se aplica à agricultura. Os custos inerentes

ao cumprimento das regulamentações

ambientais devem ser suportados por este

sector. E o financiamento público deve ser

direccionado para o fornecimento de bens

públicos», defendeu Hey.

A «revolução tranquila»

na gestão agrícola

O papel da agricultura intensiva na perda

de biodiversidade foi também realçado por

Mark Redman, consultor na área do desen-

volvimento rural, que apontou os potenciais

benefícios dos Sistemas Agrícolas de Elevado

Valor Natural no apoio à biodiversidade e às

comunidades rurais.

«Vim aqui para sublinhar a importância da

‘revolução tranquila’ na nossa forma de encarar

a agricultura e a biodiversidade», declarou

Redman à audiência da Semana Verde.

«Os Sistemas Agrícolas de Elevado Valor

Natural baseiam-se numa agricultura

de baixa intensidade, menos competitiva

do que os sistemas tradicionais, e geral-

mente correspondem a uma agricultura

em pequena escala e de subsistência.

Esta abordagem reconhece o valor destas

áreas na manutenção da biodiversidade

e apoia-as através de financiamentos agro-

-ambientais.»

«Cerca de 25 % – o equivalente a 27 milhões

de hectares – dos terrenos agrícolas na UE

são potencialmente adequados a Sistemas

Agrícolas de Elevado Valor Natural, incluindo

vastas áreas nos novos Estados-Membros,

tais como a Eslováquia e a Bulgária, que

possuem grandes extensões de pequenas

explorações agrícolas», garantiu Redman.

«Se não actuarmos, corremos o risco de esta

agricultura em pequena escala acabar por

ser abandonada, o que será prejudicial para

a biodiversidade», advertiu.

O professor Allan Buckwell, da Associação

Empresarial do Mundo Rural (Country Land

and Business Association) do Reino Unido,

realçou a necessidade de ajudar os guardi-

ães do espaço rural – agricultores e proprie-

tários – a gerir as suas explorações numa

perspectiva mais ecológica.

«Setenta por cento do solo europeu

é agricultado ou florestado. O tipo de

agricultura e florestação que fazemos

tem impactos enormes no meio ambiente.

Cabe aos proprietários fazer a mudança»,

salientou Buckwell.

«Temos que mudar radicalmente as mentali-

dades. Os agricultores devem ser financiados

através de contratos voluntários para que

passem a ser pagos pelo fornecimento de

serviços públicos, tais como a protecção

do ambiente», disse.

As actuais políticas agrícolas tendem a favorecer a agricultura intensiva em detrimento de práticas que garantam a manutenção de «bens públicos ambientais», tais como a biodiversidade. Os participantes da Semana Verde defenderam a alteração dos sistemas de apoio de forma a compensar os agricultores que actuam como guardiães do espaço rural.

T Agricultores – Guardiães do espaço rural?

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Professor Allan Buckwell, director

de políticas da Associação

Empresarial do Mundo Rural

(Country Land and Business

Association) do Reino Unido

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13 AAA GGG RRR II CCCC UUUU LLLL TTTT UUUU RRRR AA

Na base da expansão da indústria pecuária

– que hoje representa 80 % da utilização

global do território – está um apetite insaciá-

vel do Homem por carne. Um terço de toda

a terra arável é utilizado para a produção de

rações para gado.

De acordo com Henk Westhoek, da Agência

de Avaliação Ambiental neerlandesa, a criação

de gado é responsável por 30 % das perdas

globais de biodiversidade.

«Os impactos ambientais da produção animal

são, regra geral, subestimados e conduzem

à perda de biodiversidade tanto dentro como

fora da Europa», advertiu.

Tendências de consumo

«O consumo de carne mais do que triplicou

na Europa desde os anos 80 do século pas-

sado, enquanto que o consumo de leite

duplicou. Os cidadãos da UE comem, em

média, 73 kg de carne per capita por ano, por

comparação a uma média anual de 124 kg

por pessoa nos Estados Unidos e a 15 kg por

pessoa em África. Uma mudança dos nossos

hábitos alimentares poderia reduzir o impacto

maciço do sector da pecuária sobre a biodi-

versidade», disse Westhoek.

Os padrões de consumo também se têm

vindo a modificar nos países em desenvolvi-

mento e a carne, em particular a de aves

de capoeira, transformou-se numa fonte

de proteínas cada vez mais popular.

Estima-se que até 2050 a população mundial

atinja os nove mil milhões de pessoas e que,

a par deste aumento, o consumo de carne

– que actualmente se cifra nas 280 milhões

de toneladas por ano – duplique até lá.

Consequências da produção

pecuária

Na União Europeia, a importação de rações

concentradas para animais, como é o caso

da farinha de soja, está a aumentar a uma

taxa de 14 % ao ano. Este aumento tem

implicações nos padrões agrícolas fora da UE,

onde as alterações dos habitats e a perda

de biodiversidade são evidentes. A área

de terrenos nos países em desenvolvimento

dedicada à produção de soja para consumo

animal duplicou entre 1994 e 2004.

Carolyn Imede Opio, da Organização das

Nações Unidas para a Alimentação e a Agricul-

tura (FAO), diz que apesar de ser difícil isolar

o impacto da criação de animais – o qual se

caracteriza pela sua complexidade e conse-

quências indirectas –, os seus efeitos são

evidentes. A expansão do sector pecuário está

a causar alterações de habitats e é também

um dos motores das alterações climáticas,

através da emissão de gases com efeito de

estufa. Calcula-se que a produção de gado

seja responsável por cerca de 7,1 mil milhões

de toneladas de emissões de CO2.

Acções para o futuro

«Ainda assim, as práticas sustentáveis podem

mitigar alguns destes efeitos», afirmou Opio.

Uma produção mais eficiente, o recurso

à utilização de técnicas de criação biológicas

e de pastoreio adequadas e a preservação

das raças tradicionais, melhor adaptadas

às condições locais, podem também reduzir

significativamente a pressão sobre os habi-

tats naturais e outros recursos.

No entanto, «algumas das causas subjacen-

tes, tais como a falta de uma correcta atribui-

ção de preços e a compreensão do impacto

dessas causas sobre o meio ambiente, têm

que ser resolvidas de forma a contrariar

a ineficácia na utilização dos recursos. São

necessários mais incentivos para os produto-

res manterem a biodiversidade, por exemplo,

através de subsídios, benefícios fiscais,

rotulagem ambiental e certificação dos

produtos», acrescentou Opio.

Outra das soluções pode passar pela altera-

ção de hábitos alimentares. Tal como os

participantes da Semana Verde tiveram

oportunidade de ouvir, campanhas como

o «Dia Sem Carne» podem ajudar a reduzir

o consumo deste alimento, melhorar a saúde

pública e travar o aumento da produção

animal, diminuindo desta forma o seu

impacto na perda de biodiversidade.

O crescimento das populações humanas e a procura crescente de carne e de outros produtos de origem animal, como o leite e os ovos, estão a conduzir à expansão da indústria pecuária, que é hoje uma das principais causas do decréscimo global da biodiversidade. As potenciais soluções para resolver o problema podem passar por uma maior eficiência na produção, maior diversidade genética das raças de gado e pela redução do consumo de carne.

T Hábitos alimentares e perda de habitats

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Carolyn Opio, Divisão

de Produção e Saúde Animal,

Organização das Nações

Unidas para a Alimentação

e a Agricultura (FAO)

14 AA LL TT EE RR AA ÇÇ ÕÕÕÕ EEE S CCC LLL I MMM ÁÁ TT II CC AA S

Embora não existam provas irrefutáveis que

relacionem a deterioração da biodiversidade

com as alterações climáticas, Wolfgang

Cramer, do Instituto para a Investigação

sobre o Impacto do Clima de Potsdam,

referiu que os efeitos do aquecimento

do clima podem ser notados em qualquer

lado, desde as alterações nas populações

de borboletas até ao teor em álcool dos

vinhos da região francesa da Alsácia.

«Apesar das muitas incertezas científicas,

as ‘pequenas histórias’ relacionadas com as

alterações climáticas são tantas e tão evi-

dentes que os políticos têm de reconhecer

a urgência do problema. A única forma

de resolver a questão das alterações climáti-

cas passa por reduzir as emissões e garantir

a preservação e recuperação dos sumidou-

ros naturais de carbono», afirmou Cramer.

Há provas evidentes de que os ecossistemas

se encontram em mudança e que esta

mudança se reflecte no bem-estar humano

através da deterioração dos serviços ecossis-

témicos. Esta deterioração tem, natural-

mente, um preço. A desertificação está

a destruir o sustento de milhões de pessoas

e o declínio das pescas de água doce reduz

o fornecimento de uma fonte de proteínas

baratas em países em desenvolvimento.

Para além disso, a deterioração da qualidade

e sanidade da água já afecta metade da

população urbana na África, Ásia, América

Latina e Caraíbas.

Risco de extinções

Chris Thomas, da Universidade de Iorque, não

tem dúvidas de que as alterações climáticas

são uma realidade. «Mataram muitos france-

ses em 2003 durante a vaga de calor»,

declarou à audiência da Semana Verde.

«Existem evidências credíveis de que mais

de 10 % das espécies se encontram em risco

de extinção e este número poderá eventual-

mente rondar os 25 %», afirmou Thomas.

Para muitas espécies, a adaptação às altera-

ções climáticas não vai ser fácil. Algumas são

capazes de se deslocarem para outras áreas,

mas outras não conseguem sobreviver

a aumentos de temperatura. Quatro por cento

das populações de lagartos, por exemplo, já

se extinguiram, e estima-se que este número

atinja os 20 % das espécies até 2080. No

Reino Unido, a investigação mostrou que

muitas espécies se estão a deslocar para

Norte. Algumas deslocaram-se mais de

120 quilómetros durante os últimos 25 anos.

Outra questão é o aparecimento de espécies

invasoras. No continente americano há rãs

e sapos afectados por fungos patogénicos

da pele, em resultado dos quais já desapare-

ceram cerca de 70 espécies.

O professor Carlo Heip, do Instituto Real

para a Investigação Marinha dos Países

Baixos, confirmou que o ambiente mari-

nho se encontra em mudança, tanto

devido ao aquecimento do clima como

à sobreexploração.

«Estamos claramente a observar alterações

à biodiversidade no ambiente marinho,

apesar de poucas espécies marinhas se

estarem propriamente a extinguir», disse.

«Os aumentos de temperatura apenas

afectam as camadas superficiais dos ocea-

nos e as espécies marinhas conseguem

mudar os seus habitats com facilidade.»

Heip sublinhou a crescente penetração

de espécies de plâncton oriundos do Sul

em águas do Norte. O número de espécies

do mar do Norte tem vindo a aumentar ao

longo dos últimos 20 anos, apesar de a sua

composição ser agora diferente. Tais mudan-

ças podem ter consequências na cadeia

alimentar dos oceanos e podem vir a afectar

as unidades populacionais (stocks) de peixes.

* Painel Intergovernamental sobre as Alterações

Climáticas.

O Quarto Relatório de Avaliação do PIAC*, publicado em 2007, revelou um aumento significativo dos riscos que os serviços prestados pela biodiversidade e pelos ecossistemas enfrentam. A biodiversidade dos oceanos está também a alterar-se – o que poderá ter impacto nas fontes de alimento – apesar de o volume de espécies poder estar a aumentar.

T Alterações climáticas e biodiversidade

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15 I NN FF R AAA -- EEE SS TTTT RRR UUUU TT UUU RR AAA VVV E RRR DDD EEE

A Comissão Europeia levou a cabo intercâm-

bios de boas práticas como base para o de -

senvolvimento de uma estratégia europeia

de infra-estruturas ambientais a desenvolver

ao longo do próximo ano. Através desta troca

de experiências, os participantes da Semana

Verde ficaram a conhecer de que forma

projectos nacionais, regionais e locais contri-

buem para travar a perda de biodiversidade.

A Hungria está a recorrer a fundos europeus

e nacionais para financiar a conservação da

natureza. Com o auxílio de programas regio-

nais e agrícolas da UE e de fundos do pro-

grama LIFE +, o país está a reabilitar áreas

protegidas ou pertencentes à Rede Natura

2000, recuperando e estabelecendo corredo-

res de ligação entre zonas húmidas e florestas.

O programa envolve igualmente a constru-

ção de canais que permitam a passagem

de peixes entre zonas diferentes, a criação

de corredores ecológicos, a modificação

de linhas eléctricas no sentido de reduzir

a ameaça que representam para as aves

e a criação de túneis sob vias rodoviárias

para permitir a passagem segura de espé-

cies protegidas para outros habitats.

Eszter Kovács, professora associada na Univer-

sidade Szent István, explicou que o programa

vai mais longe do que os típicos projectos de

conservação da natureza. Para Kovács, essa

característica resulta da combinação de

metodologias, as quais pressupõem a partici-

pação e trocas constantes entre todos os acto-

res envolvidos e de ajustamentos contínuos

para adequar as especificidades dos concur-

sos às necessidades dos potenciais benefi-

ciários. O facto de existir normalmente um

elevado nível de co-financiamento disponível

torna o programa atractivo para os potenciais

candidatos.

A região francesa do Ródano-Alpes é um

exemplo em matéria de desenvolvimento

de corredores naturais, os quais formam

uma rede regional de áreas interligadas,

a chamada «rede verde e azul» (trame verte

et bleue, no original francês). A região inovou

ao optar por implementar a infra-estrutura

recorrendo ao ordenamento integrado do

território. Esta ferramenta garante a eficaz

utilização de determinada superfície limitada,

enquanto assegura que todas as partes

interessadas contribuem para o projecto.

Alain Chabrolle, vice-presidente para a Saúde

e Ambiente do Ródano-Alpes, explicou que

a primeira prioridade foi cartografar as mais-

-valias ambientais da região e assegurar

a aplicação de uma abordagem consistente

à sua paisagem altamente diversificada.

«A questão global da administração foi

essencial no estabelecimento da infra-estru-

tura da rede verde e azul e perto de 100 asso-

ciações locais foram envolvidas no seu

planeamento. Procurámos assegurar que

ninguém seria deixado de fora», explicou.

Foram desenvolvidos esforços especiais no

sentido de garantir que os urbanistas respon-

sáveis pelo planeamento a nível municipal

e nacional estavam bem informados tanto

sobre o projecto como sobre as respectivas

implicações do seu trabalho.

Financiar a infra-estrutura verde

Peter Carter, director associado do Banco

Europeu de Investimento (BEI), afirmou que

o erário público, por si só, não pode financiar

todos os projectos de infra-estruturas verdes

e defendeu que o sector privado tem de ser

persuadido a envolver-se, uma vez que dispõe

de boas ideias e de fundos. Para que tal

aconteça, «é essencial que haja uma melhor

comunicação entre o sector empresarial e os

ambientalistas», disse.

Carter realçou ainda que o BEI encomendou

um estudo com o objectivo de determinar

e de atribuir um valor à natureza. «O banco

As infra-estruturas ambientais visam proteger e recuperar o património natural europeu, conectando habitats fragmentados pelo uso intensivo do território, por vias de transportes ou pela expansão urbana. O desenvolvimento de infra-estruturas ecológicas é uma das principais contribuições europeias para travar a perda de biodiversidade.

T Desenvolver infra-estruturas ecológicas

Rede Natura 2000 História europeia de sucesso

Criada em 1992 ao abrigo da Directiva

Habitats, a Rede Natura 2000 constitui,

a par da Directiva Aves, a pedra angular

da política europeia de conservação da

natureza e da biodiversidade.

O objectivo da Rede Natura 2000

passa por proteger e gerir as espécies

e os habitats mais vulneráveis da

Europa sem olhar a fronteiras nacio-

nais ou políticas. Não se trata de um

sistema estrito de reservas naturais

que exclua sistematicamente qual-

quer actividade humana. Se bem que

na Rede Natura 2000 estejam incluí-

das reservas naturais, a maior parte

da sua área vai muito provavelmente

manter-se privada. A meta é garantir

que a futura gestão da rede é ecoló-

gica e economicamente sustentável.

Com mais de 25 000 sítios, abran-

gendo perto de 750 000 km2, a Rede

Natura 2000 é um aliado poderoso

para ajudar a assegurar a sobrevi-

vência a longo prazo de muitas das

mais valiosas e ameaçadas espécies

da Europa.

está a trabalhar com intermediários financei-

ros para apoiar pequenas e médias empresas

(PME) com ligações fortes ao sector dos

serviços ecossistémicos e está a considerar

investir num fundo para a América Latina

relacionado com este género de serviços»,

revelou.

Comissão e Agência revelam novos instrumentos para combater a perda de biodiversidade

A Semana Verde foi a ocasião escolhida

para revelar dois novos instrumentos que

têm por objectivo combater a perda

de biodiversidade.

O Sistema de Informação sobre Biodiver-

sidade para a Europa (BISE) é um novo

portal na Internet que dá acesso a infor-

mação relacionada com as políticas

europeias para a área da biodiversidade,

agrupando todas as informações numa

única página. No portal, e para além da

informação sobre políticas e legislação

europeias dedicadas à temática da

natureza, é possível encontrar dados

sobre o estado do ambiente e dos ecos-

sistemas da UE e dos riscos por eles

enfrentados. Para além disso, o BISE

canaliza informação a respeito da investi-

gação sobre a biodiversidade e permite

consultar a situação actual dos relatórios

sobre biodiversidade fornecidos pelos

Estados-Membros.

http://www.biodiversity.europa.eu

A Agência Europeia do Ambiente desen-

volveu o «nível de referência da biodiver-

sidade da UE», um instrumento destinado

a ser utilizado por responsáveis políticos.

O nível de referência permite conhecer

instantaneamente o estado actual da

biodiversidade. Esta ferramenta será

utilizada para monitorizar os progressos

dos esforços no sentido de travar a perda

de biodiversidade e permitirá definir

e medir com transparência quaisquer

tendências para além de 2010. A informa-

ção sobre espécies e habitats será

organizada segundo os principais tipos

de ecossistemas (costeiros, zonas húmi-

das, pastagens, florestas, etc.) e, nos casos

em que se justifique, os dados serão

regularmente actualizados para fornecer

um registo histórico dos progressos

alcançados e permitir monitorizar as

tendências de forma dinâmica.

http://www.eea.europa.eu/

themes/biodiversity/bise-2013-

the-biodiversity-information

Exposição e eventos paralelos

A par dos workshops e seminários, foram

mais de 50 os pavilhões que marcaram

presença na área de exposições da Semana

Verde. A conferência atraiu grande variedade

de expositores e foi palco para a apresenta-

ção de várias iniciativas, desde soluções

empresariais sustentáveis a projectos LIFE,

passando por ONG, autoridades locais

e regionais e instituições europeias

e internacionais.

Fotografar para preservar a natureza

Uma das principais atracções foi a exposição

«Maravilhas do Mundo Selvagem da Europa»,

numa antevisão daquilo que será a mostra

fotográfica sobre a biodiversidade como

património que vai percorrer o continente

europeu.

Nesta exposição foi possível observar

os melhores trabalhos de 69 dos mais

destacados fotógrafos europeus na matéria.

As imagens foram obtidas ao longo de um

total de 125 sessões fotográficas nas quais

se retratam a natureza e a biodiversidade

em 48 países europeus.

O fundador da mostra «Maravilhas do Mundo

Selvagem da Europa», o reconhecido fotó-

grafo Staffan Widstrand, pretende utilizar

o poder da fotografia para agitar consciên-

cias sobre a temática da natureza e da

biodiversidade.

O projecto consiste num esforço para revelar

o património natural do continente europeu

tanto aos seus 700 milhões de habitantes

como ao resto do mundo.

O objectivo passa por consciencializar

os cidadãos da importância da biodiversi-

dade e encorajá-los a envolverem-se na

sua conservação.

«É a maior iniciativa do género a nível mun-

dial dedicada à conservação da natureza»,

afirmou Widstrand.

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