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7/23/2019 Brasil Violacao Direitos Humanos Miolo Final http://slidepdf.com/reader/full/brasil-violacao-direitos-humanos-miolo-final 1/347 BRASIL, VIOLAÇÃO DOS DIREIOS HUMANOS ribunal Russell II REALIZAÇÃO Ministério da Justiça Comissão de Anistia Projeto Marcas da Memória Universidade Federal da Paraíba Núcleo de Cidadania e Direitos Humanos

Brasil Violacao Direitos Humanos Miolo Final

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    BRASIL, VIOLAO DOS DIREIOS HUMANOS ribunal Russell II

    REALIZAO

    Ministrio da

    Justia

    Comisso de

    AnistiaProjeto

    Marcas da Memria

    Universidade Federal

    da Paraba

    Ncleo de Cidadania e

    Direitos Humanos

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    Presidenta da RepblicaDILMA VANA ROUSSEFF

    Ministro da JustiaJOS EDUARDO CARDOZO

    Secretrio-ExecutivoMARIVALDO DE CASTRO PEREIRA

    Presidente da Comisso de AnistiaPAULO ABRO

    Vice-presidentes da Comisso de AnistiaSUELI APARECIDA BELLATO

    JOS CARLOS MOREIRA DA SILVA FILHO

    Conselheiros da Comisso de AnistiaALINE SUELI DE SALLES SANTOS

    ANA MARIA GUEDESANA MARIA LIMA DE OLIVEIRA

    CAROLINA DE CAMPOS MELOCAROL PRONER

    CRISTIANO OTVIO PAIXO ARAJO PINTO

    ENE DE STUTZ E ALMEIDAHENRIQUE DE ALMEIDA CARDOSOJUVELINO JOS STROZAKE

    LUCIANA SILVA GARCIAMANOEL SEVERINO MORAES DE ALMEIDA

    MRCIA ELAYNE BERBICH DE MORAESMARINA SILVA STEINBRUCH

    MRIO MIRANDA DE ALBUQUERQUEMARLON ALBERTO WEICHERT

    NARCISO FERNANDES BARBOSANILMRIO MIRANDA

    PRUDENTE JOS SILVEIRA MELLORITA MARIA DE MIRANDA SIPAHI

    ROBERTA CAMINEIRO BAGGIORODRIGO GONALVES DOS SANTOS

    VANDA DAVI FERNANDES DE OLIVEIRAVIRGINIUS JOS LIANZA DA FRANCA

    Diretora da Comisso de AnistiaAMARLIS BUSCH TAVARES

    Chefe de GabineteLARISSA NACIF FONSECA

    Coordenadora Geral do Memorial daAnistia Poltica do Brasil

    ROSANE CAVALHEIRO CRUZ

    Coordenador de Projetos e Polticas deReparao e Memria Histrica

    EDUARDO HENRIQUE FALCO PIRES

    Coordenador de Articulao Social,

    Aes Educativas e MuseologiaBRUNO SCALCO FRANKE

    Coordenadora do Centro deDocumentao e PesquisaELISABETE FERRAREZI

    Coordenador Geral de Gesto ProcessualMULLER LUIZ BORGES

    Coordenadora de Controle Processual,Julgamento e Finalizao

    NATLIA COSTA

    Coordenador de Pr-anliseRODRIGO LENTZ

    Coordenadora de Anlise e Informao ProcessualJOICY HONORATO DE SOUZA

    UNIVERSIDADE FEDERAL DA PARABAReitora

    MARGARETH DE FTIMA FORMIGA MELO DINIZVice-Reitor

    EDUARDO RAMALHO RABENHORST

    CENTRO DE CINCIAS HUMANAS, LETRAS E ARTESDiretora

    MNICA NBREGAVice-Diretor

    RODRIGO FREIRE

    NCLEO DE CIDADANIA E DIREITOS HUMANOSCoordenadora

    LCIA DE FTIMA GUERRA FERREIRAVice-Coordenadora

    MARIA DE NAZAR TAVARES ZENAIDE

    PROGRAMA DE PS-GRADUAO EMDIREITOS HUMANOS, CIDADANIA E POLTICAS PBLICAS

    CoordenadoraADELAIDE ALVES DIAS

    Vice-CoordenadorELIO CHAVES FLORES

    EDITORA DA UFPBDiretora

    IZABEL FRANA DE LIMASuperviso de Editorao

    ALMIR CORREIA DE VASCONCELLOS JNIOR

    Superviso de Produo JOS AUGUSTO DOS SANTOS FILHO

    Conselho Editorialdo NCDH-PPGDH

    Adelaide Alves Dias | Educaolio Chaves Flores | Histria

    Fredys Orlando Sorto | DireitoGiuseppe Tosi | Filosofia

    Lcia de Ftima Guerra Ferreira | HistriaLcia Lemos Dias | Servio Social

    Marconi Jos Pimentel Pequeno | FilosofiaMaria de Ftima Ferreira Rodrigues | GeografiaMaria Elizete Guimares Carvalho | Educao

    Maria de Nazar T. Zenaide | EducaoRosa Maria Godoy Silveira | Histria

    Rubens Pinto Lyra | Cincia PolticaSilvana de Souza Nascimento | AntropologiaSven Peterke | Direito

    Projeto de Digitalizao e Pesquisa: Tribunal Russell IICoordenao:

    Elena Paciotti (Fondazione Basso)Germana Capellini (Fondazione Basso)

    Giuseppe Tosi (UFPB)Lcia de Ftima Guerra Ferreira (UFPB)Marcelo Torelly (Comisso de Anistia)

    Paulo Abro (Comisso de Anistia)Equipe:

    Amarilis Busch Tavares (Comisso de Anistia)Rosane Cavalheiro Cruz (Comisso de Anistia)

    Jeny Kim Batista (Comisso de Anistia)Paula Regina Montenegro Generino Andrade (Comisso de Anistia)

    Arlene Xavier Santos Costa (UFPB)Fernando de Souza Barbosa Jnior (UFPB)

    Simona Luciani (Fondazione Basso)

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    BRASIL, VIOLAO DOSDIREITOS HUMANOS

    Tribunal Russell II

    Reedio do original em italiano de 1975,

    organizada por Giuseppe osi e Lcia de Ftima Guerra Ferreira

    Editora da UFPBJoo Pessoa

    2014

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    Copyright da primeira edio: Giangiacomo Feltrinelli Editore, Milano Itlia, 1975.

    Copyright: MJ-UFPB, 2014.

    Direitos autorais 2014 - MJ-UFPB.

    Efetuado o Depsito Legal na Biblioteca Nacional,conforme a Lei n 10.994, de 14 de dezembro de 2004.

    A reproduo de todo ou parte deste documento permitida somente com aautorizao prvia e oficial do MJ e da UFPB.

    Impresso no Brasil. Printed in Brazil.

    Projeto Grfico EDITORA DA UFPB

    Editorao Eletrnica Emmanuel Luna Traduo do Italiano Fernando de Souza Barbosa Jnior

    Reviso do Italiano Irene Bassanezi Tosi e Giuseppe Tosi

    Design de Capa Emmanuel Luna

    Capa Foto do Tribunal Russell II- Lelio Basso com Vladimir Dedijer, Franois Rigaux e Georges Casalis Arquivo Histrico da Fundao Lelio e Lisli Basso / Instituto para o Estudo da Sociedade Contempornea (ISSOCO).

    Disponvel em:

    Esta publicao resultado de iniciativa fomentada com verbas do projeto Marcas da Memria daComisso de Anistia. Por essa razo, as opinies e dados contidos na publicao so de responsabilidadede seus organizadores e autores, e no traduzem opinies do Governo Federal, exceto quando expresso

    em contrrio.

    Catalogao na fonte:

    Biblioteca Central da Universidade Federal da Paraba

    EDITORA DA UFPB Cidade Universitria, Campus I s/n Joo Pessoa PB

    CEP 58.051-970 editora.ufpb.br [email protected] Fone: (83) 3216.7147

    Tiragem: 3000 exemplares

    B823 Brasil, violao dos direitos humanos - ribunal Rus-sell II / Giuseppe osi, Lcia de Ftima GuerraFerreira, organizadores.- Joo Pessoa: Editora daUFPB, 2014.348p.ISBN: 978-85-237-0916-7

    1. Direitos humanos - Brasil. 2. Ditadura militar- aspectos jurdicos. 3. Presos polticos. I. osi, Giuse-ppe. II. Ferreira, Lcia de Ftima Guerra.

    CDU: 342.7(81)

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    APRESENTAO DA COMISSO DE ANISTIA

    A Comisso de Anistia um rgo do Estado brasileiro ligado ao Ministrio da Justia ecomposto por 26 conselheiros, em sua maioria, agentes da sociedade civil ou proessores uni-versitrios, sendo um deles indicado pelas vtimas e outro pelo Ministrio da Deesa. Criadaem 2001, h treze anos, com o objetivo de reparar moral e economicamente as vtimas deatos de exceo, arbtrio e violaes aos direitos humanos cometidas entre 1946 e 1988, a Co-misso hoje conta com mais de 70 mil pedidos de anistia protocolados. At o ano de 2012havia declarado mais de 35 mil pessoas anistiadas polticas, promovendo o pedido oficialde desculpas do Estado pelas violaes praticadas. Em aproximadamente 15 mil destes casos,a Comisso igualmente reconheceu o direito reparao econmica. O acervo da Comis-so de Anistia o mais completo undo documental sobre a ditadura brasileira (1964-1985),conjugando documentos oficiais com inmeros depoimentos e acervos agregados pelas vti-

    mas. Esse acervo ser disponibilizado ao pblico por meio do Memorial da Anistia Polticado Brasil, stio de memria e homenagem s vtimas, em construo na cidade de Belo Hori-zonte. Desde 2008, a Comisso passou a promover diversos projetos de educao, cidadania ememria, levando, por meio das Caravanas de Anistia, as sesses de apreciao dos pedidosaos locais onde ocorreram as violaes, que j superaram 70 edies; divulgando chamadaspblicas para financiamento a iniciativas sociais de memria, como a que presentementecontempla este projeto; e omentando a cooperao internacional para o intercmbio de pr-ticas e conhecimentos, com nase nos pases do Hemisrio Sul.

    COMISSO DE ANISTIA DOMINISTRIO DA JUSTIA

    COMPOSIO ATUAL

    PRESIDENTE:

    Paulo Abro

    Paulo Abro Secretrio Nacional de Justia do Brasil. Presidente do Comit Nacionalpara Reugiados, do Comit Nacional para o Enrentamento ao rfico de Pessoas eda Comisso de Anistia do Ministrio da Justia que promove processos de reparaoe memria para as vtimas da ditadura militar de 1964-1985. Diretor do Programa deCooperao Internacional para o desenvolvimento da Justia de ransio no Brasilcom o PNUD. Integrou o Grupo de rabalho que elaborou a Lei que institui a ComissoNacional da Verdade no Brasil. Juiz integrante do ribunal Internacional para a JustiaRestaurativa em El Salvador. Membro diretor da Coalizao Internacional de Stiode Conscincia e presidente do Grupo de Peritos contra a Lavagem de Dinheiro daOrganizao dos Estados Americanos. Atualmente coordena o comit de implantaodo Memorial da Anistia Poltica no Brasil. Possui doutorado em Direito pela PonticiaUniversidade Catlica do Rio de Janeiro e proessor do Curso de Mestrado e Doutoradoem Direito da Universidade Pablo de Olavide (Espanha). Possui publicaes publicadas

    em revistas e obras em lngua portuguesa, inglesa, alem, italiana e espanhol.

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    VICE-PRESIDENTES:

    Sueli Aparecida Bellato

    Conselheira desde 06 de maro de 2003. Nascida em So Paulo/SP, em 1 de julho de 1953.Religiosa da Congregao de Nossa Senhora - Cnegas de Santo Agostinho, Advogada doCentro de Direitos Humanos de So Miguel Paulista - So Paulo, do Centro de Orientaode Direitos Humanos de Guarabira-Paraba, do Sindicato dos rabalhadores Rurais dePiles e Borborema Paraba, advogada do Movimento dos rabalhadores Rurais Semerra - MS, Rio Grande do Sul. Membro e coordenadora da Associao Nacional deAdvogados Populares ANAP. Advogada do Departamento de rabalhadores Ruraisda Central nica dos rabalhadores, da Secretaria-executiva do Frum Nacional contraViolncia no Campo. Assessora da Procuradoria Federal dos Direitos do Cidado/MPF.Assessora da Comisso de Direitos Humanos da Cmara dos Deputados e assessora

    parlamentar dos Senadores io Viana e Siba Machado. Assistente de Acusao doProcesso contra os acusados do assassinato do ambientalista e sindicalista Chico Mendes,Joo Canuto e Expedito Ribeiro. Membro da Comisso Brasileira Justia e Paz e RedeSocial de Direitos Humanos. Comps a Coordenao do Grupo de rabalho Araguaia- GA. Membro do ribunal Internacional de Justia Restaurativa de El Salvador. Mestranda do Programa de Ps-graduao de Direitos Humanos da UNB.

    Jos Carlos Moreira da Silva Filho

    Conselheiro desde 25 de maio de 2007. Nascido em So Paulo/SP, em 18 de dezembrode 1971, graduado em Direito pela Universidade de Braslia, mestre em Direito pelaUniversidade Federal de Santa Catarina e doutor em Direito pela Universidade Federal doParan. Atualmente proessor da Faculdade de Direito e do Programa de Ps-graduaoem Cincias Criminais da Ponticia Universidade Catlica do Rio Grande do Sul (PUCRS).

    CONSELHEIROS:

    Aline Sueli de Salles Santos

    Conselheira desde 26 de evereiro de 2008. Nascida em Caapava/SP, em 04 de evereirode 1975, graduada em Direito pela Universidade de So Paulo, mestre em Direito pelaUniversidade do Vale do Rio dos Sinos e doutoranda em Direito pela Universidade deBraslia. proessora da Universidade Federal do ocantins/O.

    Ana Maria Guedes

    Conselheira desde 04 de evereiro de 2009. Nascida em Recie/PE, em 19 de abril de1947, graduada em Servio Social pela Universidade Catlica de Salvador. Atualmente membro do Grupo ortura Nunca Mais da Bahia e integrante da comisso organizadorado Memorial da Resistncia Carlos Mariguella, Salvador/BA.

    Ana Maria Lima de Oliveira

    Conselheira desde 26 de abril de 2004. Nascida em Irituia/PA, em 06 de dezembro de 1955, Procuradora Federal do quadro da Advocacia-Geral da Unio desde 1987 e graduada

    em Direito pela Universidade Federal do Par.

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    Carolina de Campos Melo

    Conselheira desde 02 de evereiro de 2012. Nascida na cidade do Rio de Janeiro, em 22de janeiro de 1976, graduada e mestre em Direito pela Ponticia Universidade Catlica

    do Rio de Janeiro (PUC-Rio) e doutora em Direito pela Universidade do Estado do Rio deJaneiro (UERJ). Advogada da Unio desde setembro de 2003. tambm Proessora doDepartamento de Direito da PUC-Rio e Coordenadora Acadmica do Ncleo de DireitosHumanos. Atualmente assessora na Comisso Nacional da Verdade.

    Carol Proner

    Conselheira desde 14 de setembro de 2012, nascida em 14 de julho de 1974 em Curitiba/PR. Advogada, doutora em Direito Internacional pela Universidade Pablo de Olavide deSevilha (Espanha), Proessora de Direito Internacional da Universidade Federal do Rio deJaneiro (UFRJ), Co-Diretora do Programa Mster-Doutorado Oficial da Unio Europeia,

    Derechos Humanos, Interculturalidad y Desarrollo - Universidade Pablo de Olavide/Univesidad Internacional da Andaluzia. Concluiu estudos de Ps-Doutorado na colede Hautes Etudes de Paris (Frana). autora de artigos e livros sobre direitos humanos e

    justia de transio.

    Cristiano Paixo

    Conselheiro desde 1 de evereiro de 2012. Nascido na cidade de Braslia, em 19 denovembro de 1968, mestre em eoria e Filosofia do Direito pela Universidade Federal deSanta Catarina (UFSC), doutor em Direito Constitucional pela Universidade Federal deMinas Gerais (UFMG) e ez estgio ps-doutoral em Histria Moderna na Scuola Normale Superiore di Pisa (Itlia). Procurador Regional do rabalho em Braslia e integra a

    Comisso da Verdade Ansio eixeira da Univerisidade de Braslia, onde igualmente proessor da Faculdade de Direito. Foi Proessor visitante do Mestrado em DireitoConstitucional da Universidade de Sevilha (2010-2011). Co-lder dos Grupos de PesquisaDireito e histria: polticas de memria e justia de transio (UnB, Direito e Histria)e Percursos, Narrativas e Fragmentos: Histria do Direito e do Constitucionalismo(UFSC-UnB).

    Ene de Stutz e Almeida

    Conselheira desde 22 de outubro de 2009. Nascida no Rio de Janeiro/RJ, em 10 de junhode 1965, graduada e mestre em Direito pela Universidade do Estado do Rio de Janeiro

    e doutora em Direito pela Universidade Federal de Santa Catarina. proessora daUniversidade de Braslia, onde coordena um Grupo de Pesquisa sobreJustia de ransiono Brasil, e leciona e orienta na graduao e ps-graduao em Direito. Integra ainda aComisso Anisio eixeira da Memria e Verdade da UnB.

    Henrique de Almeida Cardoso

    Conselheiro desde 31 de maio de 2007. Nascido no Rio de Janeiro/RJ, em 23 de marode 1951, o representante do Ministrio da Deesa junto Comisso de Anistia. Oficialde artilharia do Exrcito pela Academia Militar de Agulhas Negras (AMAN), bacharelem Cincias Econmicas e em Cincias Jurdicas pela Universidade do Estado do Rio deJaneiro.

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    Juvelino Jos Strozake

    Conselheiro desde 25 de maio de 2007. Nascido em Alpestre/RS, em 18 de evereirode 1968, advogado graduado pela Faculdade de Direito de Osasco (FIEO), mestre e

    doutor em Direito pela Ponticia Universidade Catlica de So Paulo. membro da RedeNacional de Advogados Populares (RENAP).

    Luciana Silva Garcia

    Conselheira desde 25 de maio de 2007. Nascida em Salvador/BA, em 11 de maio de 1977, graduada em Direito pela Universidade Federal da Bahia, mestre em Direito Pblicopela Universidade do Estado do Rio de Janeiro, Especialista em Direitos Humanos eProcessos de Democratizao pela Universidade do Chile e Doutoranda em Direito pelaUniversidade de Braslia. Atualmente diretora do Departamento de Deesa dos DireitosHumanos da Secretaria de Direitos Humanos da Presidncia da Repblica.

    Manoel Severino Moraes de AlmeidaConselheiro desde 01 de junho de 2013. Nascido em Recie, em 22 de evereiro de 1974, Bacharel em Cincias Sociais (1999) e Mestre em Cincia Poltica (2004) pela UniversidadeFederal de Pernambuco. Membro da Comisso da Memria e Verdade Dom Helder Cmarade Pernambuco. Proessor de Direitos Humanos e Cincia Poltica da UNINASSAU.Associado do IDHEC - Instituto Dom Helder Camara; Dignitatis Assessoria cnicaPopular; Cendhec - Centro Dom Helder Cmara de Estudos e Ao Social e AssociaoNacional de Direitos Humanos, Pesquisa e Ps- Graduao - ANDHEP; IDEJUS - Grupode Estudos sobre Internacionalizao do Direito e Justia de ransio. Ex-Conselheiro doConselho Nacional de Segurana Pblica Ministrio da Justia (CONASP - 2010/2011)

    e colaborador do Conselho Nacional de Deesa dos Direitos da Pessoa Humana-CDDPH;Signatrio do PNDH-3. Colaborador da rede de deensores e deensoras de direitoshumanos das Amricas mediado pela Anistia Internacional (RED DE DEFENSORES YDEFENSORAS DE DERECHOS HUMANOS DE LAS AMRICAS).

    Mrcia Elayne Berbich de Moraes

    Conselheira desde 23 de julho de 2008. Nascida em Cianorte/PR, em 17 de novembrode 1972, advogada graduada em Direito pela Ponticia Universidade Catlica do RioGrande do Sul (PUCRS). especialista, mestre e doutora em Cincias Criminais, todospela mesma instituio. Foi integrante do Conselho Penitencirio do Estado do RioGrande do Sul entre 2002 e 2011 e ex-proessora da Faculdade de Direito de Porto Alegre(FADIPA). Atualmente proessora de Direito Penal do IBMECRJ.

    Marina da Silva Steinbruch

    Conselheira desde 25 de maio de 2007. Nascida em Guara/SP, em 12 de abril de 1954, graduada em Direito pela Faculdade de Direito de So Bernardo do Campo/SP. Atuoucomo deensora pblica da Unio por 22 anos. uncionria pblica desde 1973.

    Mrio Albuquerque

    Conselheiro desde 22 de outubro de 2009. Nascido em Fortaleza/CE, em 21 de novembrode 1948. membro da Associao Anistia 64/68. Atualmente preside a Comisso Especial

    de Anistia Wanda Sidou do Estado do Cear.

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    Marlon Alberto Weichert

    Conselheiro desde 13 de maio de 2013. Procurador Regional da Repblica, atuando hmais de dez anos com o tema da Justia de ransio, especialmente responsabilizao

    criminal e civil de perpetradores de graves violaes aos direitos humanos, acesso inormao e verdade, implantao de espaos de memria e reparaes imateriais. Peritoem justia de transio indicado pela Comisso Interamericana de Direitos Humanos daOEA. Coordenador do Grupo de rabalho Memria e Verdade da Procuradoria Federaldos Direitos do Cidado. Coordenador do projeto Brasil Nunca Mais Digital. Mestreem Direito do Estado pela PUC/SP e graduado em Direito pela Universidade FederalFluminense. Especialista em Direito Sanitrio pela Universidade de Braslia UnB.

    Narciso Patriota Fernandes Barbosa

    Conselheiro desde 25 de maio de 2007. Nascido em Macei/AL, em 15 de setembro de

    1970, graduado em Direito pela Universidade Federal de Alagoas e possui especializaoem Direitos Humanos pela Universidade Federal da Paraba. advogado militante nasreas de direitos humanos e de segurana pblica.

    Nilmrio Miranda

    Conselheiro desde 1 de evereiro de 2012. Nascido em Belo Horizonte/ MG, em 11 deagosto de 1947, Jornalista e mestre em Cincias Sociais pela Universidade Federal deMinas Gerais (UFMG). Foi deputado estadual, deputado ederal e ministro da SecretariaEspecial de Direitos Humanos da Presidncia da Repblica (SEDH 2003/2005). Quandodeputado ederal presidiu a Comisso Externa para Mortos e Desaparecidos Polticos. Foiautor do projeto que criou a Comisso de Direitos Humanos na Cmara, que presidiu

    em 1995 e 1999. Representou por 07 (sete) anos a Cmara dos Deputados na ComissoEspecial sobre Mortos e Desaparecidos Polticos. membro do Conselho Consultivo doCentro de Reerncia das Lutas Polticas no Brasil, denominado Memrias Reveladas.Foi presidente da Fundao Perseu Abramo por 05 (cinco) anos. Atualmente DeputadoFederal por Minas Gerais e, na Cmara dos Deputados, Vice-Presidente da Comissode Direitos Humanos e Minorias, titular da Comisso de Desenvolvimento Urbano esuplente da Comisso de Legislao Participativa.

    Prudente Jos Silveira Mello

    Conselheiro desde 25 de maio de 2007. Nascido em Curitiba/PR, em 13 de abril de 1959,

    graduado em Direito pela Universidade Catlica do Paran e doutorando em Direito pelaUniversidade Pablo de Olavide (Espanha). Advogado trabalhista de entidades sindicaisde trabalhadores desde 1984, atualmente leciona nos cursos de ps-graduao em DireitosHumanos e Direito do rabalho do Complexo de Ensino Superior de Santa Catarina (CESUSC).

    Rita Maria de Miranda Sipahi

    Nasceu em Fortaleza/CE, em 1938. Formada pela Faculdade de Direito da Universidadedo Recie. Servidora pblica aposentada pela Preeitura do Municpio de So Paulo. Suasprincipais atividades profissionais situam-se na rea educacional, do Direito e da gestopblica. Militante poltica a partir dos anos 1960. Participa do Ncleo de Preservao daMemria Poltica de So Paulo e do Coletivo de Mulheres de So Paulo. Conselheira da

    Comisso de Anistia do Ministrio da Justia desde outubro de 2009.

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    Roberta Camineiro Baggio

    Conselheira desde 25 de maio de 2007. Nascida em Santos/SP, em 16 de dezembro de 1977, graduada em Direito pela Universidade Federal de Uberlndia, mestre em Direito pela

    Universidade do Vale do Rio dos Sinos e doutora em Direito pela Universidade Federal deSanta Catarina. Atualmente proessora na Faculdade de Direito da Universidade Federaldo Rio Grande do Sul, em Porto Alegre/RS.

    Rodrigo Gonalves dos Santos

    Conselheiro desde 25 de maio de 2007. Nascido em Santa Maria/RS, em 11 de julho de1975, advogado, graduado e mestre em Direito Pblico pela Universidade do Vale do Riodos Sinos/UNISINOS. Proessor licenciado do Curso de Direito do Centro UniversitrioMetodista Isabela Hendrix de Belo Horizonte. Consultor da Fundao Getlio Vargas(FGV).

    Vanda Davi Fernandes de Oliveira

    Conselheira desde 26 de evereiro de 2008. Nascida em Estrela do Sul/MG, graduada emDireito pela Universidade Federal de Uberlndia e doutoranda em Direito Ambiental pelaUniversidad de Alicante (Espanha). presidente da ONG Ambiente e Educao Interativa- AMEDI, e membro do CBH Paranaba.

    Virginius Jos Lianza da Franca

    Conselheiro desde 1 de agosto de 2008. Nascido em Joo Pessoa/PB, em 15 de agosto de1975, advogado graduado em Direito pela Universidade Federal da Paraba, especialistaem Direito Empresarial pela mesma instituio. Atualmente Coordenador-Geral doConselho Nacional de Reugiados do Ministrio da Justia (CONARE) e Diretor Adjuntodo Departamento de Estrangeiros do Ministrio da Justia. Ex-diretor da Escola Superiorda Advocacia da Ordem dos Advogados Seccional Paraba. Ex-Procurador do Institutode erras e Planejamento Agrrio (INERPA) do Estado da Paraba. Igualmente, oiSecretrio-Executivo do Conselho Nacional de Combate Pirataria (CNCP).

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    MARCAS DA MEMRIA:um projeto de memria e reparaocoletiva para o Brasil

    Criada em 2001, por meio de medida provisria, a Comisso deAnistia do Ministrio da Justia passou a integrar em definitivo a estruturado Estado brasileiro no ano de 2002, com a aprovao de Lei n. 10.559, queregulamentou o artigo 8 do Ato das Disposies Constitucionais ransitrias.

    endo por objetivo promover a reparao de violaes a direitosundamentais praticadas entre 1946 e 1988, a Comisso configura-se em espaode reencontro do Brasil com seu passado, subvertendo o senso comum daanistia enquanto esquecimento. A Anistia no Brasil significa, a contrrio senso,memria. Em sua atuao, o rgo reuniu milhares de pginas de documentaooficial sobre a represso no Brasil e, ainda, centenas de depoimentos, escritos eorais, das vtimas de tal represso. E deste grande reencontro com a histriaque surgem no apenas os undamentos para a reparao s violaes como,tambm, a necessria reflexo sobre a importncia da no repetio destes atosde arbtrio.

    Se a reparao individual um meio de buscar reconciliar cidadoscujos direitos oram violados, que tm ento a oportunidade de verem o Estadoreconhecer que errou, devolvendo-lhes a cidadania e, se or o caso, reparando-os financeiramente, por sua vez, as reparaes coletivas, os projetos de memriae as aes para a no repetio tm o claro objetivo de permitir a toda asociedade conhecer, compreender e, ento, repudiar tais erros. A aronta aosdireitos undamentais de qualquer cidado singular igualmente oende a toda ahumanidade que temos em comum, e por isso que tais violaes jamais podemser esquecidas. Esquecer a barbrie equivaleria a nos desumanizarmos.

    Partindo destes pressupostos e, ainda, buscando valorizar a lutadaqueles que resistiram por todos os meios que entenderam cabveis aComisso de Anistia passou, a partir de 2008, a realizar sesses de apreciaopblica, em todo o territrio nacional, dos pedidos de anistia que recebe, demodo a tornar o passado recente acessvel a todos. So as chamadas Caravanasda Anistia. Com isso, transeriu seu trabalho cotidiano das quatro paredes demrmore do Palcio da Justia para a praa pblica, para escolas e universidades,

    associaes profissionais e sindicatos, bem como a todo e qualquer local onde

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    perseguies ocorreram. Assim, passou a ativamente conscientizar as novasgeraes, nascidas na democracia, da importncia de hoje vivermos em umregime livre, que deve e precisa ser continuamente aprimorado.

    Com a ampliao do acesso pblico aos trabalhos da Comisso,cresceram exponencialmente o nmero de relatos de arbitrariedades, prises,torturas, por outro lado, pde-se romper o silncio para ouvir centenas dedepoimentos sobre resistncia, coragem, bravura e luta. neste contexto quesurge o projeto Marcas da Memria, que expande ainda mais a reparaoindividual em um processo de reflexo e aprendizado coletivo, omentandoiniciativas locais, regionais e nacionais que permitam queles que viveram umpassado sombrio, ou que a seu estudo se dedicaram, dividir leituras de mundo

    que permitam a reflexo crtica sobre um tempo que precisa ser lembrado eabordado sob auspcios democrticos.Para atender estes amplos e inovadores propsitos, as aes do projeto

    Marcas da Memria esto divididas em quatro campos:a) Audincias Pblicas: atos e eventos para promover processos de

    escuta pblica dos perseguidos polticos sobre o passado e suasrelaes com o presente.

    b) Histria oral: entrevistas com perseguidos polticos baseadas emcritrios terico-metodolgicos prprios da Histria Oral. odos

    os produtos ficam disponveis no Memorial da Anistia e poderoser disponibilizadas nas bibliotecas e centros de pesquisa dasuniversidades participantes do projeto para acesso da juventude,sociedade e pesquisadores em geral;

    c) Chamadas Pblicas de fomento a iniciativas da Sociedade Civil:por meio de Chamadas Pblicas, a Comisso seleciona projetosde preservao, de memria, de divulgao e diuso advindos deOrganizaes da Sociedade Civil de Interesse Pblico (OSCIP) eEntidades Privadas Sem Fins Lucrativos. Os projetos desenvolvidos

    envolvem documentrios, publicaes, exposies artsticas eotogrficas, palestras, musicais, restaurao de filmes, preservao deacervos, locais de memria, produes teatrais e materiais didticos.

    d) Publicaes: colees de livros de memrias dos perseguidospolticos; dissertaes e teses de doutorado sobre o perodo daditadura e a anistia no Brasil; reimpresses ou republicaes de outrasobras e textos histricos e relevantes; registros de anais de dierenteseventos sobre anistia poltica e justia de transio. Sem fins comerciaisou lucrativos, todas as publicaes so distribudas gratuitamente,

    especialmente para escolas e universidades.

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    O projeto Marcas da Memria rene depoimentos, sistematizainormaes e omenta iniciativas culturais que permitem a toda sociedadeconhecer o passado e dele extrair lies para o uturo. Reitera, portanto, apremissa que apenas conhecendo o passado podemos evitar sua repetiono uturo, azendo da Anistia um caminho para a reflexo crtica e oaprimoramento das instituies democrticas. Mais ainda: o projeto investe emolhares plurais, selecionando iniciativas por meio de edital pblico, garantindoigual possibilidade de acesso a todos e evitando que uma nica viso de mundoimponha-se como hegemnica ante as demais.

    Espera-se, com este projeto, permitir que todos conheam umpassado que temos em comum e que os olhares histricos anteriormente

    reprimidos adquiram espao junto ao pblico para que, assim, o respeito aolivre pensamento e o direito verdade histrica disseminem-se como valoresimprescindveis para um Estado plural e respeitador dos direitos humanos.

    Comisso de Anistia do Ministrio da Justia

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    SUMRIO

    NOA PRIMEIRA EDIO .................................................................................17Linda Bimbi

    NOA EDIO BRASILEIRA ..............................................................................19Giuseppe osiLcia de Ftima Guerra Ferreira

    PREFCIO ....................................................................................................................23Salvatore Senese

    DISCURSO INAUGURAL DO PRESIDENE LELIO BASSO ...........................37

    ACUSAO CONRA O GOVERNO BRASILEIRO .........................................45Miguel Arraes

    RELARIO JURDICO INRODURIO GERAL .........................................49Leo MatarassoIntroduo .....................................................................................................................49

    I. Definio e histria dos Direitos Humanos ..........................................................49II. Contedo dos Direitos Humanos..........................................................................56III. Os textos internacionais sobre os Direitos Humanos .......................................63IV. Carter obrigatrio dos princpios sobre os Direitos Humanos ......................67

    ASPECOS JURDICOS DA DIADURA MILIAR INSAURADA NOBRASIL EM 31 DE MARO DE 1964. ....................................................................71Salvatore SeneseI. A Conquista e o exerccio do poder por parte dos militares brasileiros ...........72

    II. Caractersticas do ordenamento jurdico atualmente operante no Brasil .......88

    ORURA E ESRAGIA DO ERROR NO BRASIL. ................................. 119Ettore BioccaPremissa .......................................................................................................................119I. A Doutrina brasileira da Segurana Nacional.....................................................121II. Os novos patres ...................................................................................................151III. Esquadres da morte ...........................................................................................172IV. A tortura dos presos polticos .............................................................................189V. Alguns testemunhos sobre a tortura ...................................................................198

    VI. A tortura como doena .......................................................................................222

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    ESEMUNHOS REFERENES AO RELARIO ORURA EESRAGIA DO ERROR NO BRASIL DE EORE BIOCCA EPERGUNAS DO JRI A ESAS ESEMUNHAS ......................................... 237

    AS RELAES ENRE A IGREJA E O PODER MILIAR NO BRASIL....... 277Jan Rutgers

    PRIMEIRA PAREI. A importncia da Igreja, como instituio, no quadro do poder poltico noBrasil. ............................................................................................................................279II. A Igreja antes do golpe de Estado militar de 1964. ...........................................283III. rs tipos de reao da Igreja oficial diante da evoluo dos grupos de

    base ...............................................................................................................................285IV. O golpe de Estado de 1964 e a represso ...........................................................286V. O cerne da crise Igreja-Estado .............................................................................290

    SEGUNDA PAREI. Documentao de casos de represso ..................................................................301

    A SENENA ........................................................................................................... 323

    POSFCIO ..................................................................................................................335ullo VigevaniMaria do Socorro de Carvalho Vigevani

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    NOTA PRIMEIRA EDIO

    Este volume rene uma escolha ampla de depoimentos e testemunhossobre o Brasil,1apresentados em Roma, de 30 de maro a 06 de abril de 1974,durante a primeira sesso do ribunal Russell II, constitudo com o objetivode denunciar a represso na Amrica Latina. Dierentemente do precedenteribunal Russell para o Vietn, a iniciativa encontrou grande eco na imprensaitaliana, dos jornais s revistas especializadas e, inclusive, nos programastelevisivos. Este ato diz muito sobre a natureza do ribunal, sobre a histria dasua constituio, seus objetivos, as dificuldades que encontrou e que superou.

    Seria til, no entanto, dar alguns esclarecimentos acerca dos textosaqui reunidos. O volume contm algumas intervenes preliminares:O discurso inaugural do presidente Lelio Basso sugere os undamentos

    jurdicos que podem dar legitimidade a esse ribunal, mas, sobretudo, destacaa importncia das iniciativas privadas para promover a evoluo do direitointernacional. No existe tutela institucionalizada dos direitos humanos, dessemodo, apela-se conscincia dos povos para confiar tais direitos, ao mesmotempo proclamados e negligenciados pelos rgos competentes.

    A acusao, ormulada por Miguel Arraes, ex-governador do Estado

    de Pernambuco e exilado na Arglia, reflete as concepes polticas do autor: aditadura brasileira denunciada porque no permite ao povo existir como povo.

    A interveno do advogado Leo Matarasso, da Corte de Paris, se movena mesma direo, procurando enquadrar juridicamente os seus argumentos,descreve a histria da evoluo da doutrina dos direitos humanos, indicandolacunas e perspectivas.

    Entra-se, pois, no cerne da questo com os trs relatriosundamentais, acompanhados dos relativos testemunhos. O magistradoSalvatore Senese ilustra a destruio do Estado de Direito; o proessor Ettore

    Biocca, da Universidade de Roma, apresenta o relatrio central sobre o Brasil,sobre a estratgia do terror, que merece destaque pela seriedade, riqueza eproundidade da pesquisa. O telogo holands Jan Rutgers, com uma longa erica experincia de ministrio no Brasil, preparou o texto sobre os conflitos entreEstado e Igreja. A interveno final, eita pelo proessor Franois Rigaux, daUniversidade de Lovaina, alm da sentena do jri, so anlogas s coletneasrelativas aos outros trs governos indiciados.

    1 Os textos relativos ao Chile, Bolvia e Uruguai oram publicados numa outra edio.

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    odos os testemunhos oram rigorosamente transcritos e, por essetimo trabalho a secretaria geral agradece equipe de redatores (AGENZIA 2R).odos os textos so o resultado de paciente e rigorosa elaborao e baseiam-seem documentos oficias do establishmentbrasileiro e em materiais recolhidos noprprio pas. A secretaria geral agradece os annimos colaboradores brasileiros eos relatores europeus pelo seu generoso esoro, que permitiram esta publicao.Mas, o agradecimento mais caloroso vai s testemunhas que vieram de cadaum dos pases, a seu prprio risco e perigo, convictos de cumprir um dever de

    justia.

    Linda Bimbi

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    NOTA EDIO BRASILEIRA

    Esta coleo composta por quatro livros, originalmente publicadosna Itlia na dcada de 1970, cujos ttulos na edio brasileira so: 1) Brasil,violao dos direitos humanos; 2) Chile, Bolvia, Uruguai: violaes dosdireitos humanos. Atas da primeira sesso do Tribunal Russell; 3) Asmultinacionais na Amrica Latina; e 4) Contrarrevoluo na Amrica Latina.Subverso militar e instrumentalizao dos sindicatos, da cultura, das igrejas.O livro reerente s multinacionais teve tambm uma edio na Espanha.

    Estas publicaes apresentam grande relevncia no contexto da Justiade ransio na Amrica Latina e, em especial, no Brasil, trazendo inormaessobre as perseguies polticas, a partir de depoimentos prestados nas sessespblicas do ribunal Russell II, realizadas em trs momentos: em Roma, de 30de maro a 5 de abril de 1974; em Bruxelas, de 11 a 18 de janeiro de 1975, e denovo em Roma, de 10 a 17 de janeiro de 1976.

    Os livros trazem uma parte, talvez a mais relevante, dos documentosque oram recolhidos e produzidos pelo tribunal. Um primeiro conjunto composto pelas narrativas impactantes e chocantes dos que soreram na prpriapele e presenciaram os sequestros, as prises, os maltratos sicos e psicolgicos,as torturas e os assassinatos; e dos amiliares e companheiros de luta e de prisodos que vivenciaram a experincia terrvel e devastadora do desaparecimento,talvez o suplcio mais cruel e desumano que a ditadura infligiu aos inimigosinternos.

    Alm desses depoimentos, se encontra registrada tambm uma sriede anlises e de reflexes sobre o contexto jurdico, poltico, eclesial, social,econmico e cultural elaboradas por estudiosos e militantes europeus e latino-americanos. So testemunhos e anlises impressionantes pela sua qualidadee atualidade; mostram como a esquerda latino-americana e europeia daquela

    poca possua uma compreenso clara e lcida dos acontecimentos e daconjuntura internacional naquele que oi o perodo mais obscuro, sombrio etrgico da Guerra Fria.

    Este volume, Brasil, violao dos direitos humanos contm alguns dosdocumentos da primeira sesso do ribunal Russell II realizada em Roma, de 30de maro a 6 de abril de 1974, na qual este tribunal de opinio, na ausncia deum ribunal Penal Internacional e em nome da conscincia dos povos, debateue julgou a ditadura militar brasileira, que inaugurou o ciclo dos regimes deexceo no continente, nos seus vrios aspectos jurdicos, polticos, econmicos

    e religiosos, com ateno especial para as enormes arontas aos direitos

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    humanos, praticados atravs do uso sistemtico da tortura e da estratgia doterror como base de sustentao do regime.

    O volume traz uma nota edio italiana de Linda Bimbi, que oi agrande auxiliar de Lelio Basso na realizao do ribunal Russell II, que escla-rece a origem e finalidade dos textos deste livro. Para a edio brasileira conta-se tambm com duas outras contribuies: um precio do eminente jurista ita-liano Salvatore Senese, tambm presente ao ribunal, que atualmente continuaprestando sua colaborao Fundao Basso; e um poscio de ullo Vigevanie sua esposa Maria do Socorro de Carvalho Vigevani. Ele, proessor da UNESP,estudioso de Cincias Polticas e Relaes Internacionais; e ambos oram teste-munhas na sesso sobre as violaes aos direitos humanos no Brasil do ribunal

    Russell II.A traduo dessas obras e publicao no Brasil s oi possvel pormeio do projeto Marcas da Memria, a partir de ermos de Cooperao daComisso de Anistia do Ministrio da Justia com a Fundao Lelio e Lisli Basso- ISSOCO, com sede em Roma-Itlia, e com a Universidade Federal da Paraba(UFPB), atravs do Ncleo de Cidadania e Direitos Humanos, com o projeto deDigitalizao e Pesquisa: ribunal Russell II, realizado entre 11 de outubro de2012 e 11 de outubro de 2013, com algumas metas prorrogadas at dezembro de2014 (termo aditivo).

    No mbito dessa cooperao multilateral, vale destacar outrosprodutos obtidos, como a digitalizao da documentao do Arquivo Histricoda Fundao Lelio e Lisli Basso reerente ao ribunal Russell II, que representaum acervo de inestimvel valor antes praticamente inacessvel aos pesquisadores,mas agora disponvel no Memorial da Anistia, em Belo Horizonte-MG; arealizao de estudos com base nessa documentao por pesquisadores daFundao e da UFPB, bem como a publicao desses estudos na obra Memoriedi repressione resistenza e solidariet in Brasile e in America Latina, sob aorganizao de Giancarlo Monina (Roma: Ediesse, 2013).

    Registra-se tambm o agradecimento e reconhecimento ao trabalhoda Comisso de Anistia do Ministrio da Justia, com destaque para o seupresidente Paulo Abro, que no mediu esoros para oerecer as condiesnecessrias realizao de um projeto de to relevante envergadura,contribuindo eetivamente com a promoo do Direito Memria e Verdade,no que tange s graves violaes de direitos humanos praticadas durante asditaduras militares na Amrica Latina.

    Agradecemos ainda aos vice-presidentes da Comisso de Anistia,Sueli Aparecida Bellato e Jos Carlos Moreira da Silva Filho que contriburam

    em misses de trabalho em Roma, bem como ao Sr. Marcelo orelly, poca

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    Coordenador Geral de Memria Histrica, que empreendeu todos os esorospara que o projeto se concretizasse.

    Vale ressaltar que a realizao do projeto no teria sido possvel sema determinante colaborao da Embaixada do Brasil em Roma, registrando-se especial gratido ao Embaixador Jos Viegas, e da Conselheira Gilda MottaSantos Neves.

    Um agradecimento especial vai a Alberto Filippi, este talo-latino-americano, grande conhecedor e, em muitos casos, protagonista da histria, dacultura e da poltica latino-americana que, durante o VI Seminrio Internacionalde Direitos Humanos da UFPB em Joo Pessoa, em 2010, teve a ideia deaproximar o Brasil da Fundao Basso, pela importncia do acervo do ribunal

    Russell II; proposta que encontrou o apoio do Dr. Paulo Abro, da Comisso deAnistia do Ministrio da Justia, e no Seminrio seguinte, em 2012, oi selada aparceria tripartite j mencionada.

    Por fim, no poderamos deixar de agradecer Fundao Lelio e LisliBasso, que aceitou com entusiasmo esta proposta. O azemos homenageando,em nome de todos e todas que nela trabalham, as pessoas de Linda Bimbi,Elena Paciotti e Salvatore Senese que participaram ativamente das sesses doribunal nos anos setenta e que, durante todos esses anos, souberam manter

    viva a herana do seu undador, dando um exemplo eetivo de solidariedade

    internacional na perspectiva do socialismo democrtico.Com estes livros e documentos, colocamos disposio de todos,sobretudo das novas geraes que no viveram esse perodo, um riqussimo materialdocumental que ala muito alto e claro e interdita qualquer tentativa de revisionismohistrico. Acreditamos que, assim como ns, todos os que lero estas pginasimpregnadas de sangue, vero esse perodo com outros olhares: os dos protagonistasdessa trgica histria, militantes e mrtires, em sua grande maioria jovens.

    Atravs do resgate da memria histrica dessa poca sombria, espera-mos contribuir para que ela se torne finalmente uma pgina virada na histria da

    Amrica Latina, um alerta para que no se repita nunca mais, e um incentivo paravalorizar e ortalecer a democracia to preciosa e to rgil na qual temos o privil-gio de viver, tambm graas ao sacricio dos que lutaram contra a ditadura.

    Joo Pessoa, UFPB, 2014

    50 anos do golpe civil-militar no Brasil

    Giuseppe osi e Lcia de Ftima Guerra Ferreira

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    PREFCIO

    1. Premissa

    Esta coleo rene as atas das trs sesses do ribunal Russell II sobrea Amrica Latina, realizadas ao longo de cerca dois anos em Roma (30 demaro a 5 de abril de 1974), em Bruxelas (11 a 18 de janeiro de 1975) e, enfim,de novo em Roma (10 a 17 de janeiro de 1976).

    De tais sesses, que tiveram um grande eco na imprensa internacionale entre os estudiosos de direito e poltica internacional, alm dos historiadores,dirigentes e militantes polticos, oram publicadas as sentenas e os relatriosprincipais, em vrios pases e idiomas. Mas, esta a primeira vez que, graasao compromisso conjunto do Ministrio de Justia brasileiro e da FundaoBasso so digitalizadas todas as atas das trs sesses, conservadas nos arquivosda Fundao, em sua integralidade; dando assim de novo voz s vtimas e stestemunhas da violncia institucionalizada praticada a partir de 1964, no Brasile, sucessivamente, nos dez anos que se seguiram, sobre todos os outros povos docontinente latino-americano.

    Dessa violncia, o ribunal Russell IIindagou as ormas institucionaiscomuns aos vrios pases, a doutrina subjacente a tais ormas institucionais, otipo de Estado a que esta deu lugar, suas origens e suas causas proundas, sua re-lao com as dinmicas econmicas e a conjuntura mundial. Mas, este relevanteesoro de investigao e compreenso da realidade no oi exercido no olimpoda academia ou das grandes instituies culturais mesmo sendo o resultado doempenho conjunto de muitos ilustres acadmicos e prmios Nobel de vrias dis-ciplinas mas, recolhendo o grito de dor das vtimas e de todos os que lutavamcontra quela violncia; e alimentando-se dela. Deste modo, o tribunal contri-buiu para inaugurar uma orma, at aquele momento, indita (ressalva eita peloprecedente do primeiro ribunal Russell, do qual alaremos em breve) de estra-tgia para a emancipao humana e de mobilizao poltica e cultural. Uma es-tratgia que, nas dcadas sucessivas, demonstrou suas potencialidades e ganhourapidamente terreno ultrapassando os esquemas clssicos e consolidados da aopoltica, at ento hegemnicos; a tal ponto que em ocasio das grandes mobi-lizaes contra as novas guerras de alguns anos atrs algum alou da opinio

    pblica como de uma segunda potncia mundial.

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    Por essa razo, o ribunal Russell II constitui um evento poltico,cultural e idealmente undamental da segunda metade do sculo passado.

    2. O tribunal de opinio como instrumento de luta pela emancipao humanaem um mundo globalizado.

    Esta afirmao exige um esclarecimento que remete s grandesalteraes introduzidas, no estado do mundo e no correspondente universo de

    valores tico-polticos, a partir do final do segundo conflito mundial. Paul Valryescrevia, em 1945, que o mundo a que ns, homens e naes, comeamos apertencer, no seno a imagem, s aparentemente semelhante ao mundo que

    nos era amiliar. O sistema de causas que determina o destino de cada um de nstende a estender-se totalidade do globo, sacudindo-o no seu conjunto a cadalacerao; no existem mais problemas circunscritos pelo ato deles aconteceremnuma rea limitada. Apenas alguns anos depois, em 1947, uma eminentepersonalidade poltica italiana, Vittorio Emanuele Orlando, colocando-se doponto de vista do jurista rente s novidades introduzidas na ordem planetriae nas relativas regras , no hesitava em alar de revoluo mundial. Hoje,depois de mais de meio sculo, a intuio contida nesta rmula se confirma,incontestavelmente, exata no seu ncleo essencial: as mudanas institucionais

    e culturais trazidas com o fim do segundo conflito mundial incidiramproundamente no apenas no paradigma do direito, mas, tambm, sobre asestruturas de poder e o imaginrio coletivo.

    Hoje, com eeito, afirmao largamente diundida e prestigiada (porexemplo, por Luigi Ferrajoli) que, com a Carta das Naes Unidas, se verificouuma revoluo copernicana no ordenamento internacional, uma vez que deste

    vieram a azer parte, como ius cogens, trs valores, entre eles proundamenteligados: a paz, os direitos humanos e a autodeterminao dos povos. Graas aesta revoluo, o paradigma do direito internacional (e do direito interno de

    muitos Estados hoje, praticamente todos que subscreveram aquele pactumassociationis) mudou: a soberana igualdade dos Estados no plano internacional,embora reafirmada pela Carta da ONU, (art. 2, 1), no permite mais aoEstado de se comportar, como acontecia no passado, sem qualquer outro limitea no ser aqueles derivados dos pactos que o prprio Estado houvesse assinado.Este j no mais livre de recorrer ameaa, ou pior, ao uso da ora em relaoaos outros Estados; de submeter outros povos dominao colonial; de instituirum regime racista ou de apartheid; de violar os direitos undamentais da pessoahumana, seja esta um cidado ou um estrangeiro. Esta revoluo teve uma

    primeira dramtica confirmao nos processos de Nuremberg e de quio. Em

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    particular, os princpios de Nuremberg oram reafirmados pela AssembleiaGeral das Naes Unidas atravs da Resoluo 95-I, de 11 de dezembro de 1946,quase como a confirmar que as regras afirmadas e aplicadas pelo ribunal deNuremberg constituam uma parte integrante da nova ordem internacional.Seguiram-se outros instrumentos internacionais, de desigual estatuto jurdico,em um crescendocada vez mais articulado: da Declarao Universal dos DireitosHumanos, aprovada pela Assembleia Geral das Naes Unidas, em 10 dedezembro de 1948, Resoluo da Assembleia Geral da ONU, n. 1514-XV, de14 de dezembro de 1960, sobre os povos coloniais, aos Pactos sobre os direitoscivis e polticos e sobre os direitos econmicos, culturais e sociais de 1966, at aConveno contra a tortura, assinada em 10 de dezembro de 1984 e a Conveno

    que aprova o Estatuto que cria a Corte Penal Internacional, assinado em Romaem 17 de julho de 1998. Alm disso, preciso relembrar que alguns dos maissignificativos instrumentos citados, todos inspirados nos valores da Carta daONU, reafirmam seu carter de pacto constitucional de convivncia queunda a nova ordem internacional, aproundando, especificando, articulando etornando at mais incisiva graas introduo de garantias secundrias alacerao da velha ordem produzida pela introduo da Carta da ONU e pelosribunais de Nuremberg e de quio.

    Cabe aqui uma digresso que pode ajudar a entender como, durante

    algumas dcadas, as culturas jurdica e poltica no acolheram as novidades queiam se acumulando, a partir da undamental ruptura de 1945.De ato, ao olhar o estado do mundo e ao sentir a opinio pblica

    internacional, alm das elaboraes culturais lato sensu (inclusive aquelasjurdicas e as ideias que os juristas tm do direito) dos primeiros anos dops-guerra, ser necessrio concluir que os trs valores que a Carta da ONUintroduziu no ordenamento jurdico internacional ficaram, durante cerca de15-20 anos, por assim dizer, ocultos; e, sobretudo, como ficou completamenteoculto o nexo que os une.

    alvez, o nico valor realmente sentido nos primeiros anos aps 1945era o da paz, porque muito viva era, ainda, a dura experincia da guerra, dassuas devastaes, dos seus horrores; lancinante demais o choque provocadopelos terrveis eeitos da arma atmica e das suas no incio, inimaginveis consequncias. Forte demais havia sido o temor (que esta arma tornaraextremamente concreto) que a guerra pudesse significar a destruio total doscontendentes e o fim da civilizao. Mas, exatamente porque baseado nestesundamentos, o valor da paz era sentido e interpretado numa orma negativa epobre, sem ligaes com outros valores: como terror da guerra e, em particular,

    da guerra atmica. O rpido desenvolvimento da arma nuclear pela Unio

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    Sovitica e a Guerra Fria oereceram ao valor da paz a dimenso estreita e,todavia, nos seus limites, eficaz do equilbrio do terror. Isto oi suficiente paraque as grandes potncias chancelassem oficialmente o princpio que veta o usoda ora nas relaes internacionais e evitassem proclamar o direito de azerguerra; direito que, hoje, ao contrrio, se escuta proclamar com requncia,ainda que as guerras tenham ocorrido ora do Ocidente e dos pases do Bloco doLeste.

    No que diz respeito ao princpio de autodeterminao e de igualdignidade dos povos, inegvel que os imprios coloniais no desapareceramimediatamente aps 1945 (a prpria Declarao de 1948, como j oi observado,de alguma orma os pressupem) e que, para a eliminao de alguns deles, oram

    necessrias guerras sangrentas (Indochina, Arglia etc.). Somente em 1960, coma Resoluo n. 1514, j citada, o direito dos povos a no serem submetidos aregimes coloniais, ocupao estrangeira ou mesmo a um regime de apartheidoi solenemente proclamado e considerado parte integrante do chamado iuscogensde direito internacional.

    No que se reere, enfim, Declarao Universal, que deveriarepresentar a explicitao e a sistematizao do valor de ius cogensdos direitoshumanos, em seu Prembulo afirma-se que esta representa o ideal que todosos povos devem visar. Isso no significa, como oi longamente afirmado, que

    a Declarao no possua valor jurdico; uma vez que tal rmula contida noPrembulo que, para os documentos internacionais, o lugar onde se misturamproposies jurdicas e opinies polticas expressa o auspcio que as normascogentes colocadas a seguir pudessem alcanar um tal grau de eetividadea ponto de concretizar o ideal ao qual tende a Carta da ONU e a prpriaDeclarao.

    Somente a partir de meados dos anos 80, tambm graas s sentenasjudiciais, seja da Corte Internacional de Justia (com a importante sentenasobre o problema dos rens americanos no Ir, onde se afirmava a tese de

    que exista, como parte do direito internacional cogente a todos, uma srie deprincpios derivantes da Declarao Universal de 1948), seja de Cortes SupremasOcidentais (com a histrica sentena da Corte de Cassao rancesa, em meadosdos anos 80, no caso Klaus Barbie), pode-se dizer que ora aceita a opiniode que, pelo menos no que diz respeito a uma srie de disposies relativasaos direitos undamentais, as normas da Declarao azem parte do direitointernacional geral como direito consuetudinrio em que todos os pases sereconhecem.

    Este acidentado percurso teve, entre seus motores principais, a

    mobilizao crescente de grupos de mulheres e homens em todo o mundo e, em

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    particular, a conscincia que tais massas tiveram que suas reivindicaes de paz,liberdade e dignidade possuam uma legitimidade muito superior quela dospoderes constitudos que procuravam neg-las. Os tribunais de opinio podiamser um instrumento undamental para adquirir esta conscincia, a condio deconseguir ligar-se a processos objetivos que estremecem a sociedade. O ribunalRussell II realizou, de maneira inigualvel, tal condio, graas capacidadede Lelio Basso de ler em tais processos e de se inserir nestes as lutas para aemancipao humana. No apressado dizer que, nesta empreitada, ele deuuma demonstrao concreta do que considerava a tarea do revolucionrio:somente alguns anos antes do incio do ribunal, ele escreveu: ... o que distingueo autntico revolucionrio do reormista no , como muitas vezes repete um

    marxismo deormado por aquilo que chamamos de tradio revolucionriapopular, a luta pela conquista violenta do poder, mas, a capacidade deinterveno subjetiva nos processos objetivos de desenvolvimento da sociedade.

    3. O encontro de Lelio Basso com os tribunais de opinio

    A ocasio para Lelio como gostava de ser chamado por aquelesque colaboravam com ele de experimentar as potencialidades de umribunal de opinio e as condies de sua eficcia, oi oerecida pelo ribunalque, em meados dos anos 60, Bertrand Russell instituiu para condenar oscrimes internacionais dos Estados Unidos no Vietn. Desde 1955, de ato, ofilsoo e matemtico ingls havia dado vida, junto com Albert Einstein, aum movimento pacifista. Diante da crescente mobilizao contra a guerra noVietn, Lorde Russell teve a ideia de criar um ribunal de opinio, compostopor eminentes personalidades do mundo cientfico e cultural, dotadas degrande prestgio internacional e provenientes de vrios horizontes ideais, para

    julgar o comportamento dos Estados Unidos naquela rea do mundo. Entreas personalidades convidadas em Londres, em novembro de 1966, para dar

    vida ao ribunal, figurava Lelio, conhecido por seu compromisso antiascistae de resistncia ao nazi-ascismo durante a guerra, pela contribuio dada Constituio italiana como membro da Assembleia Constituinte, peloseu prestgio de estudioso marxista. No dia 15 de novembro de 1966, estaspersonalidades constituem um ribunal internacional contra os crimes deguerra cometidos no Vietn e publicam um texto sobre os objetivos da iniciativaem que se l, entre outras coisas: Consideramo-nos como um tribunal que,mesmo desprovido do poder de aplicar as sanes, haver de responder a um

    dado nmero de questes com a imparcialidade e o rigor que se espera de um

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    tribunal. A primeira sesso do ribunal deveria ter acontecido em Paris, entre25 de abril e 5 de maio de 1967, mas, no dia 19 de abril, o general De Gaulle, napoca presidente da Repblica, veta a concesso do visto de entrada na Franaa Vladimir Dedijer, ilustre personalidade da resistncia iugoslava ao nazismoe componente do jri, motivando tal ato, em uma carta enviada ao filsooJean Paul Sartre, presidente do jri , com o carter subversivo da iniciativapromovida pelas ilustres personalidades que constituam o ribunal sob o mantode simples cidados, uma vez que o exerccio da jurisdio pertence somenteao Estado. A sesso oi deslocada para Estocolmo, onde aconteceu regularmenteentre os dias 02 e 10 de maio de 1967. Abrindo a sesso inaugural, J. P. Sartrereivindicou a legitimidade da iniciativa:

    O ribunal Russell no substitui nenhum poder legtimo:ele nasceu, ao contrrio, de uma lacuna e de um apelo... anossa impotncia a garantia da nossa independnciaNo representando nem governos, nem partidos, nopodemos receber ordens de ningum: examinaremos osatos segundo a nossa conscincia e em plena liberdade deesprito E, todavia, qualquer que seja a nossa vontadede imparcialidade e de universalidade, somos conscientesque esta no suficiente a legitimar a nossa empreitada.

    O que queremos, na verdade, que sua legitimao seja...a posteriori. De ato, no trabalhamos para ns mesmos,nem to somente para nossa edificao moral, e nopretendemos impor as concluses que chegaremos comouma ulgurao. Na verdade, ns desejamos, graas colaborao dos meios de inormao, manter um contatoconstante com as massas que, em qualquer parte do mundo,

    vivem a dor da tragdia do Vietn. Ns desejamos que estasmassas aprendam como ns aprendemos, que descubramconosco os relatrios, os documentos, os testemunhos, que

    estas possam apreci-los e possam construir, como ns, asua prpria opinio, dia aps dia. As concluses, quaisquerque sejam, queremos que nasam por si mesmas, paratodos, ao mesmo tempo que para ns; talvez at antes.Esta sesso uma empreitada comum, cujo resultadofinal deve ser, segundo a expresso de um filsoo: uma

    verdade que se torna tal. Sim, se as massas ratificaro onosso julgamento, ento ele se tornar verdade e ns, noinstante mesmo em que desaparecermos, elas ar-se-osentinelas e poderoso apoio daquela verdade, saberemos

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    que omos legitimados e que o povo, maniestando-nos oseu consentimento, revela uma exigncia prounda: aquelaque um verdadeiro tribunal contra os crimes de guerra,

    seja criado como rgo permanente, ou seja, que tais crimespossam ser, em qualquer lugar e em qualquer momento,denunciados e punidos.

    A mais de trinta anos de distncia, a instituio da Corte PenalInternacional interveio para realizar, ainda que de orma muito impereita,o voto e a proecia expressos por Sartre, graas tambm continuidade e aoenriquecimento que sua inspirao encontrou no compromisso levado adiantepor Lelio Basso na dcada seguinte.

    4. Do Tribunal Russell ao Tribunal Russell II sobre a Amrica Latina e aoTribunal Permanente dos Povos.

    A sesso de Estocolmo oi seguida de uma segunda sesso emRoskilde, Dinamarca, de 20 de novembro a 1 de dezembro de 1967. Ambasoram um sucesso e contriburam sensivelmente para alimentar e ortalecer omovimento contra a guerra no Vietn.

    Lelio, que oi relator geral de ambas, contribuiu de orma decisivapara a organizao dos trabalhos e o rigor e clareza das concluses, verificandotambm as grandes possibilidades de mobilizao de massa que tal empreitadapermitia.

    Foi assim que, alguns anos depois, em ocasio de um seminrio sobreo tema Estado e direito em uma poca de transormao, que aconteceu noChile de Allende, entre 4 e 14 de janeiro de 1973 e organizado pelo Institutopara o Estudo da Sociedade Contempornea ISSOCO, que ele undou edirigiu, em colaborao com o Ministrio da Justia chileno e com o Centrode Estudios de la Realidad Nacional de la Universidad Catlica de Chile

    (CEREN), desenvolveu atravs uma intensa troca de reflexes e anlises,inclusive com exilados brasileiros o projeto, que os exilados brasileiroshaviam solicitado desde 1971, de um segundo ribunal Russell contra oprocesso de militarizao em curso na Amrica Latina. al processo, iniciadoem 1964 com a instaurao da ditadura militar no Brasil, revelava um desenhoalternativo ao projeto kennediano de resolver os problemas de reestruturaodo capital no subcontinente associando as burguesias nacionais a um projetode desenvolvimento baseado no aumento do consumo de massa e na extenso

    de um mercado popular, segundo o esquema delineado nos programas da

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    Aliana para o Progresso. O desenho alternativo quele kennediano, apoiadopor muitas multinacionais e por poderosos crculos estadunidenses, visava,ao contrrio, uma explorao intensiva da ora de trabalho, a represso dequalquer possibilidade de organizao da classe trabalhadora, um mercadorestrito reservado s aixas mdio-altas da estrutura social, mas, integrado emum amplo circuito supranacional de mercados similares, e postulava uma erozrepresso interna realizvel atravs de uma ditadura militar. Estes dois projetosconviveram por um certo tempo, tanto que o ano de 1964 , ao mesmo tempo, oano do golpe militar no Brasil e o ano em que aDemocraciaCrist,de EduardoFrei, maciamente apoiado pelos Estados Unidos, ganhou a eleio no Chile como slogan revoluo na liberdade. Mas, em 1973, as iluses kennedianashaviam

    sido abandonadas h algum tempo: o racasso de Frei, cuja presidncia encerra-se com um balano desastroso nos planos econmico e poltico, evidenciou aimpraticabilidade do projeto kennedianosem incisivas reormas estruturais e areapropriao dos recursos por parte dos pases em desenvolvimento; reormasque os crculos polticos e econmicos dos Estados Unidos no estavamabsolutamente dispostos a permitir. Por outro lado, o caminho da instauraodas ditaduras militares na Amrica Latina, de uma base ideolgica orte quese expressava na chamada Doutrina da Segurana Nacional, parecia ter sidoempreendido de orma irrevogvel como, inelizmente pouco tempo depois, os

    atos se encarregariam de confirmar tambm no Chile.No comeo de 1973, este trgico eplogo no parecia inevitvel.odavia, Lelio sentia, j h algum tempo, a necessidade de denunciar estaestratgia de brutal suocamento da democracia e seus resultados.

    O golpe de Estado no Chile, por um lado, confirmou as anlises queestavam na base do projeto; por outro lado, determinou a incluso da situaochilena entre aquelas objeto do ribunal, de acordo com o costume bassianodenunca perder de vista as especificidades, mas, numa viso geral dos enmenos.

    Neste meio tempo, Lelio havia encontrado Linda Bimbi e sua

    comunidade de missionrias leigas que, de acordo com as palavras da prpriaLinda: haviam percorrido sozinhas um dicil caminho de libertao docatolicismo cercado pelo clericalismo, at uma ecumnica e inter-religiosa,atravs da experincia da secularizao. Foradas, no final dos anos 60, aabandonar a conortvel proteo do convento pela ajuda evanglica oerecidas vtimas da ditadura militar brasileira e a todos os que a combatiam, Lindae suas irms abraaram, sem hesitao, a causa do ribunal, ornecendo suapreparao, antes, e s suas vrias sesses, depois, uma contribuio to decisivae insubstituvel quanto discreta. Desde ento, Linda e sua comunidade ligaram

    inextricavelmente seu desempenho e sua vocao quele de Lelio e s suas

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    realizaes, at a sua morte e mais alm, at hoje, na Fundao que carrega onome dele e que se esora para continuar sua atividade.

    A deciso de realizar o ribunal oi publicamente anunciada emBruxelas, no dia 6 de novembro de 1973, em ocasio de uma grandiosaexposio que o governo militar brasileiro tinha organizado no corao daComunidade Econmica Europeia (CEE), para ilustrar o milagre brasileiro dezanos aps o golpe de Estado e atrair os investidores e a opinio pblica europeia.

    O milagre era aquele de um pas grande quase como a Europainteira, cujo PIB havia crescido no ritmo de 10% ao ano; um pas rico dematrias primas, recursos de todo o tipo, massas de trabalhadores, onde h dezanos no ocorriam greves nem tenses sociais e o chamado risco pas para os

    investidores estrangeiros podia ser considerado inexistente. Os maiores jornaisda Europa diundiam esta imagem. O anncio do ribunal era um convite aolhar para a ace oculta do iceberg, a barbrie e a desumanizao que eram seupressuposto; um convite a se perguntar se o crescimento econmico podia serconsiderado um valor absoluto ao ponto de sacrificar o valor da pessoa, presentenos milhes de seres humanos degradados e embrutecidos, que representavam oaspecto trgico deste milagre.

    O eco suscitado pelas trs sesses do ribunal Russell IIe a mobilizaoque elas produziram constituem um ato histrico sobre o qual no preciso

    voltar a alar. importante evidenciar, todavia, que a partir dos trabalhosdaquelas sesses, Lelio se convenceu que osse chegada a hora de comeara escrever um texto que juntasse os princpios e as regras que inspiravam oribunal, para oerecer uma perspectiva coerente e sistemtica a todos aquelesque se batiam para a realizao da revoluo mundial comeada com a Cartada ONU e o processo de Nuremberg.

    No que se reere, particularmente, dimenso do direito aplicadopelo ribunal, o campo das relaes internacionais oerecia a Lelio um terrenode escolhas para realizar as suas anlises tericas sobre o carter dicotmico

    do direito em conexo com a lgica contraditria que percorre a sociedadecapitalista (neste caso, na poca de internacionalizao do capitalismo, dasociedade internacional) e o desenvolvimento dialtico das oras produtivas queoperam em seu seio. A liquidao do colonialismo, o aparecimento, no cenriointernacional, de novos atores, cujos povos, nos sculos precedentes ao segundoconflito mundial, eram somente objeto de direito; o banimento, como crimeinternacional, da guerra que, nos sculos passados, era tida como instrumentolcito de resoluo das controvrsias internacionais; a afirmao, como regracogente do direito internacional, daparidignidade entre todos os povos e todos

    os seres humanos; a proclamao como ius cogensdo direito autodeterminao,

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    eram apontadas por Lelio persuasivamente como possveis brechas abertasno edicio da velha sociedade internacional, portadoras de um novo direitointernacional cuja progressiva afirmao sobre os elementos do velho direito,ainda ortemente presentes na cultura dos especialistas e/ou na prtica dasrelaes internacionais, era tarea das oras progressistas e amantes da paz.

    Uma tarea eminentemente poltico-cultural destinada a desmistificaras prxis e os lugares comuns que as chancelarias utilizam para encobrir osprprios comportamentos inspirados na lgica do domnio e do abuso ouda mesquinha viso do chamado interesse nacional. De tal tarea, as trssesses do ribunal representam uma realizao, tanto mais eficaz enquantoos reeridos trabalhos, no contaminados por slogans ou posicionamentos

    claramente propagandsticos, alm do j lembrado rigor na reconstruo dosatos e das respectivas causas, undavam-se sobre o valor do direito, valor, que poca, constitua um dos undamentos da ideologia ocidental em contraposiocom o campo socialista. Empunhar os valores que, mesmo nascidos deuma lgica alternativa, as oras dominantes usam para legitimar o prpriodomnio, objetivamente apoiadas pelo extremismo revolucionrio que a elesnega qualquer capacidade libertadora ora uma constante do ensinamentobassiano que encontrava agora modo de se desdobrar indutivamente atravsda extraordinria atuao (o ribunal) de um imponente trabalho, paciente,

    meticuloso, at o limite do pedantismo.Por outro lado, nesta obra de ormulao e ilustrao do novo direitointernacional que a poltica dos Estados Unidos e dos governos ditatoriais porestes mantidos violavam, adquirem uma particular importncia as resolues,que os vrios rgos das Naes Unidas (principalmente a Assembleia Geral) e arelativas agncias ormulavam naqueles anos, ou seja, as vrias Cartas de direitos,as Convenes internacionais aprovadas ou em curso de elaborao. extos,muitas vezes, carentes de eficcia obrigatria e, desse modo, de valor jurdicomuito desigual (como Lelio no cansava de advertir) e, todavia, relevantes

    aos fins da atribuio de sentido s disposies de ius cogens, cujo significadopreceptivo vinha, de tal modo, a ser plausivelmente dilatado e enriquecido emuno de uma reconstruo sistemtica do novo direito internacional. Nestaateno e valorizao de textos Lelio, por exemplo, insistiu, em vrias ocasies,no significado e na importncia da Resoluo de 6 de dezembro de 1974 queaprovava, com 115 votos a avor, 6 contrrios e 10 abstenes, a Carta dosDireitos e Deveres Econmicos dos Estados a sua postura oi muito dierentedaquela de outros prestigiosos expoentes da cultura de esquerda, que viamnestas Cartas e Declaraes, e em seu tumultuoso multiplicar-se, o sinal de um

    substancial vazio de tais instrumentos diante do poder econmico e poltico das

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    oras dominantes; sem compreender as visveis fissuras que este universo depapel estava introduzindo na totalidade articulada do domnio.

    E exatamente para tornar mais incisivas tais rachaduras que, jdurante os trabalhos da ltima sesso do ribunal, Lelio concebeu o projetode sistematizar, num breve documento redigido em artigos e precedido porum prembulo, o novo direito internacional que estava emergindo e, como decostume, chamando a colaborar com o empreendimento juristas de vrios pasese homens polticos que, sempre mais numerosos, estavam atentos s elaboraesbassianas.

    A abordagem metodolgica era anloga quela que o havia guiado emsua obra de constituinte, antes, e de intrprete da Constituio italiana, depois.

    Individuar alguns preceitos-guias que servissem para iluminar todas as outrasdisposies, organizando-as em um contexto de sentido coerente e unvoco. Atais preceitos-guia, ele designava um papel que segundo o seu ensinamento desenvolvia, na Constituio italiana, o art. 3 e o art. 49. Estes preceitos eramindividuados na proteo da paz, nos direitos humanos e nos direitos dos povos.rs regras, entre elas intimamente conexas e interdependentes, que podiam,

    j naquela poca, considerar-se parte do ius cogens internacional, ainda que aconexo e articulao entre eles no ossem incontrovertidas. E, todavia, o fioque as une ora por Lelio lucidamente enunciado no discurso de abertura da

    segunda sesso do ribunal, cuja clarividncia pode ser plenamente apreciadasomente se se compara com a posio da mais prestigiosa doutrina hoje emvigor, h quase 50 anos de distncia:

    Creio que, baseado no que disse, alguns princpios resultam,at agora, aceitos como normas de direito. Em primeirolugar, com base na prpria Carta da ONU, o banimentoda guerra, do recurso ora e de qualquer outra orma deagresso e a obrigao para todos os governos de perseguiro objetivo da paz e das relaes amigveis entre os povos,

    exatamente para aastar todas as possveis causas daguerra. Mas, todas as mais altas tribunas da humanidade,tanto religiosas como polticas afirmam, repetida eunanimemente, que no pode existir paz sem justia e,exatamente com esta afirmao se abre o Prembulo doato constitutivo da Organizao Internacional do rabalho. igualmente reconhecido que no pode haver justia semigualdade ou, pelo menos, sem desigualdades excessivas,porque como indica o mesmo ato a misria e a injustiaameaam a paz.

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    Nesta operao de reconstruo, a novidade suscetvel de ecundosaproundamentos coloca-se, alm da j assinalada conexo entre os trspreceitos, no vnculo que se institui entre direitos do homem e direitos dospovos. Lelio, que dos direitos humanos oi sempre um inabalvel deensor,tinha, no entanto, clarssimo que o homem, cujos direitos inalienveis se tratade assegurar, no uma abstrao, mas, um sujeito historicamente determinado,pessoa inserida em uma trama de relaes econmicas, sociais, culturais, queormam a sua especfica identidade, cuja tutela no pode ocorrer atravs daaplicao de mdulos abstratos, que no considerem as especficas conotaesdo contexto coletivo no qual a pessoa ormada. al postura az emergirem primeiro plano tal contexto coletivo, que Lelio indicou como o povo. A

    humanidade eita de povos, cada um com a prpria identidade, assim comoos indivduos que compem cada um dos povos e a prpria humanidade. Adoutrina clssica do direito internacional considerava sujeitos de tais direitossomente os Estados. Ao lado destes emergem, laboriosamente, atravs dadoutrina dos direitos humanos, as pessoas, os seres humanos; trata-se, agora, deassumir que um novo sujeito entra na cena internacional, o povo, e de promovero reconhecimento de tal novo sujeito, ao qual azem, atualmente, reerncianumerosos textos do prprio direito internacional, do prembulo da Carta dasNaes Unidas Declarao pela Independncia dos Povos Coloniais, de 1960,

    at s numerosas resolues da Assembleia Geral das Naes Unidas.A Declarao Universal dos Direitos dos Povos, que exprime esteesoro de sistematizao em proposies normativas entre elas coerentes,oi proclamada em Argel, em 4 de julho de 1976. Lelio, que tinha um ortesenso de continuidade histrica no extenuante caminho da humanidade,mesmo na diversidade das situaes e das culturas, quis que a proclamaoda Declarao acontecesse, simbolicamente, no dia do aniversrio da Declaraode Independncia norte-americana, quase a significar que, como esta Declaraohavia assinalado o incio da idade da democracia e dos direitos humanos no

    mundo ocidental, da mesma maneira a Declarao de Argel poderia assinalaro incio da poca da igual dignidade entre todos os povos e todos os sereshumanos do planeta.

    No escapava, alm disso, a Lelio, atento observador da realidadeinternacional, como o estado do mundo apresentasse (e, podemos acrescentar,ainda hoje apresenta) sempre novas e mais agudas crises dos direitosundamentais dos homens e dos povos. Mas, tal constatao, longe de induzi-lo a capitular ou a um desesperado realismo, motivava-o ainda mais aoe iniciativa, convencido como ele era de que o caminho da emancipao

    da humanidade mede-se nos tempos longos, que vo bem alm da vida do

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    indivduo e se alimenta da luta diria e, mesmo, dos parciais sucessos de tal luta,ainda que obscurecidos e submersos pelas injustias desenreadas. A Declaraode Argel era um grito e uma denncia permanente de tais injustias. Era preciso,a partir dos ensinamentos obtidos pela sua experincia com os tribunais deopinies, criar um instrumento, igualmente permanente, que fizesse ressoaraquela denncia cada vez que um mnimo de mobilizao, num dado contexto, oconsentisse.

    Na onda destas reflexes, Lelio concebeu a ideia de dar vida a umTribunal Permanente dos Povos que pudesse constituir esse instrumentoconstante. Em tal ideia trabalhou intensamente at o dia de sua morte, ocorridaabruptamente, em 16 de dezembro de 1978, no mesmo dia em que ora

    organizada, em Roma, a apresentao de um volume escrito em sua homenagem.Na viglia escreve Leo Matarasso ora acometido, no Senado, por umligeiro mal-estar. Internado no hospital e colocado em observao, adormeceusegurando entre as mos o grosso volume dos escritos em sua homenagem.Nunca mais acordou. Alguns dias mais tarde, no Natal, teria ocorrido o seu 75aniversrio.

    O Tribunal Permanente dos Povos veio luz apenas alguns mesesdepois, graas ao compromisso e a determinao de tantas pessoas que comLelio tinham colaborado e, em particular, de Linda Bimbi, de Gianni ognoni,

    que oi secretrio geral do Tribunal Russell II e de Franois Rigaux que, domesmo ribunal, havia sido relator geral e que do novo organismo oi, por muitotempo, presidente, guiando com mos seguras o incio e, por longos anos, assucessivas atividades.

    Muitas personalidades ilustres, que haviam eito parte do jri doTribunal Russell II, aceitaram azer parte do jri do novo ribunal. Entre elas,o escritor Julio Cortazar que, em ocasio da audincia pblica que anunciava,oficialmente, o nascimento (Bolonha, 24 de junho de 1979), pronunciou estaspalavras

    ...No uma leviandade dizer que em numerosas ocasies,um poema ou as palavras de uma cano, um filme ouum romance, um quadro ou um conto, uma obra teatralou uma escultura transmitiram ou transmitem ao povoa noo e o sentimento de numerosos direitos que osespecialistas exprimem e articulam na orma jurdica.No uma leviandade se algum como eu, simplesmenteinventor de histrias de antasia, tenha, uma vez mais,decidido participar deste tipo de iniciativa e de dizer o

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    que digo neste momento... um trabalho longo e dicil; precisamente esta a razo pela qual ocorre intensific-lodia aps dia; este ribunal dos Povos que se constitui hoje,

    em Bolonha, d-nos novo impulso, uma nova razo deperseverana. Inventemos pontes, inventemos estradas emdireo daqueles, de muito longe, que ouviro a nossa voz earo, um dia, tanto clamor que abater as barreiras que lhesseparam, hoje, da justia, da soberania e da dignidade.

    Estas palavras do grande romancista so, talvez, o melhor guia leituradas atas aqui publicados.

    Roma, Junho 2014.Salvatore Senese

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    DISCURSO INAUGURAL DO PRESIDENTELELIO BASSO

    30 de maro de 1974 Manh

    1. Quando, em novembro de 1966, Bertrand Russell reuniu, emLondres, 15 pessoas de vrios pases, dentre elas este que tem o orgulho de vosalar neste momento, para constituir um organismo que examinasse e julgasse oscrimes americanos no Vietn, imediatamente provocou, inclusive na imprensa,uma discusso sobre o direito que estas pessoas teriam de proclamarem-se

    juzes. E a discusso oi to mais animada na medida em que ao organismoundado por Bertrand Russell se deu o nome de ribunal Internacional para oscrimes de guerra, posteriormente denominado simplesmente ribunal Russell.

    Ns tnhamos conscincia dos nossos limites e tambm nos pusemoso problema da nossa legitimidade. Na declarao constitutiva, aprovada emLondres, no dia 15 de novembro de 1966, escrevemos:

    Ainda que esta tarea no tenha sido confiada por qualquerautoridade constituda, ns assumimos a responsabilidade nointeresse da humanidade e para a deesa da civilizao. A nos-sa ao baseia-se em um entendimento pessoal. Somos abso-lutamente independentes de qualquer governo e de qualquerorganizao oficial ou semioficial e acreditamos firmementede expressar o proundo anseio e a dor, de todos aqueles que,em muitas naes, so irmos. Acreditamos firmemente quea nossa ao contribuir a despertar a conscincia do mundo.

    No discurso introdutrio Primeira Sesso, aberta em Estocolmo, em

    12 de maio de 1967, o presidente do ribunal, Jean-Paul Sartre, a esse propsito,declarou:

    emos plena conscincia de no ter recebido um mandatode ningum, mas, se tomamos a iniciativa de nos reunir,o fizemos porque sabamos que ningum poderia dar-nos este mandato. Certamente o nosso ribunal no uma instituio. Mas, ele no substitui nenhum poderconstitudo: ao contrrio, ele, na realidade, nasceu de umvazioe de um apelo.

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    O vazio ao qual Sartre se reeria era a alta de organismosinternacionais oficialmente constitudos e capazes de julgar os crimes deguerra. Os ribunais de Nuremberg e de quio o fizeram em virtude dodireito do vencedor e, exatamente por isso, pde-se contestar a legitimidade.O apelo do qual alava era aquele que vinha da conscincia moral dos povos,oendida pelo que estava acontecendo no Vietn. O apelo, sobretudo, vinhado povo vietnamita, agredido pela potncia mais orte do mundo. Ns nosautonomeamos ento intrpretes desta conscincia moral e a nossa legitimidadederiva, por isso, da nossa capacidade de interpretar esta conscincia. Dessemodo, Sartre conclui a sua argumentao dizendo: O que ns queremos, na

    verdade, que a legitimidade do ribunal seja retrospectiva, ou se se preere, a

    posteriori..No me compete explicar, neste momento, se e em que modo aquelePrimeiro ribunal obteve a sua legitimidade aposteriori. Pessoalmente, acreditoque sim, e o confirma o ato de que, em um recente ratado de Direito PenalInternacional, do proessor Claude Lombois - diretor da Faculdade de Direito eEconomia de Limonges, - publicado em 1971 pela editora Dallez, dedicado umcaptulo a Les solutions nouvelles dordre politique: Le ribunal de Stokholm, e emoutros pases oram escritas dissertaes acadmica sobre o significado jurdicodesta iniciativa. Ainda que nestes textos possam ser encontradas crticas,

    sobretudo de ordem jurdico-ormal, o simples ato que, para alm da opiniopblica ao qual ele principalmente se dirigia, o ribunal Russell tenha entradonos bancos universitrios, significa que as objees ormais no tm ora pararear a marcha dos novos princpios jurdicos.

    2. Este segundo ribunal tambm se ps, no ato de sua constituio, oproblema da sua legitimidade. Ele oi pensado, inicialmente, para julgar somentea represso no Brasil, mas, aps o golpe chileno, oi a prpria viva do presidenteAllende que nos procurou para solicitar a instituio de um ribunal que se

    ocupasse tambm do Chile. No se tratava somente de acrescentar um Estado aoutro Estado: notrio que entre os generais brasileiros e os generais chilenos emesmo entre as duas polcias, existiram acordos que contriburam preparaodo golpe de Estado. Mas o mesmo tinha acontecido no Uruguai e na Bolvia; oBrasil no era apenas um caso de ditadura militar, mas parecia ser um modeloque tendia a se estender por toda a Amrica Latina. Foi por isso que, na reunioconstitutiva, realizada em Bruxelas em 6 de novembro de 1973, decidiu-se adotaro nome de ribunal Russell II pela Represso no Brasil, no Chile e AmricaLatina.

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    Na declarao constitutiva afirma-se:

    No momento da constituio, o ribunal Russell II deveexpressar-se sobre a prpria investidura. Isto no rejeitaa ideia que um tribunal necessariamente uma emanaode um poder. Uma sociedade, to pouco organizadacomo a internacional, regida por um poder diuso, noexercido pela pessoas jurdicas, os Estados, nem pelosseus governantes responsveis diante do povo, mas pelosprprios povos. O nico undamento racional e real daordem internacional a vontade de paz dos homens emulheres convictos da sua solidariedade.

    Este chamamento direto aos povos, este chamamento vontade doshomens e mulheres talvez seja arbitrrio? alvez seja esta uma afirmao polticasem qualquer undamento jurdico, a ponto de no poder justificar a pretensode exercer em seu nome a uno jurisdicional atravs de um ribunal que sejaa emanao da vontade popular, ao invs do poder constitudo? O prembulo daConveno de Haia n. 4, de 18 de outubro de 1907, contm a amosa ClusulaMartens, segundo a qual o Direito das naes resultante dos costumesestabelecidos pelos povos civilizados, dos princpios da humanidade e dos

    ditames da conscincia pblica.Atravs desta clusula, inserida em uma Conveno aprovada ouratificada pela grande maioria dos Estados daquela poca, os ditames daconscincia pblica tornam-se uma onte reconhecida de direito. Passaram-se quase 70 anos desde ento e se poderia pensar que aquela tenha sido umarmula genrica sem consequncias. Mas, exatamente oito dias atrs, no dia 22de maro, em Genebra, a Conerncia diplomtica sobre direito humanitrio,aprovou, pela grande maioria, o artigo 10 do Primeiro Protocolo Adicional Conveno de Genebra de 1949, no qual o artigo primeiro da Clusula Martens

    textualmente repetido. Estamos, portanto, diante de um princpio de direitoincontestvel, reconhecido pela maioria dos Estados, ainda vigente, e no qual osditames da conscincia pblica tornam-se onte de direito.

    Mas esse no o nico caso de um chamado conscincia dospovos. Ao contrrio, pode-se dizer que a prpria ONU tem nesse princpio oseu undamento. L-se, de ato, no Prembulo de sua Carta, que os povos dasNaes Unidas ( explcito o reerimento aos povos) esto: determinados emreafirmar a nos direitos undamentais do homem, na dignidade e no valor doser humano, na igualdade de direito dos homens e das mulheres, assim como das

    naes grandes e pequenas.

  • 7/23/2019 Brasil Violacao Direitos Humanos Miolo Final

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    Brasil, violao dos direitos humanos - Tribunal Russell II40

    E a afirmao de que so os povos das Naes Unidas queproclamaram a sua a nos direitos humanos undamentais retomada pelaDeclarao Universal dos Direitos Humanos, de 1948.

    Em uma direo anloga est o art. 38 do Estatuto da CorteInternacional de Justia, que o art. 92 da Carta das Naes Unidas define comoparte integrante da mesma Corte. O art. 38, ao elencar as vrias ontes de direito,enumera os princpios gerais de direito reconhecidos pelas naes civilizadase, ainda que esta distino entre naes civilizadas e brbaras esteja ultrapassadahoje e seja inaceitvel, permanece inalterado o sentido da disposio segundoa qual os princpios aceitos pela comunidade internacional so, de ato,normas jurdicas, independentemente da existncia ou no de um instrumento

    internacional ou nacional que as tenha proclamado tais.

    3. No h qualquer dvida de que os direitos humanos so reconhecidoscomo tais por todas as naes, inclusive por aquelas que no os respeitam. Os di-reitos humanos esto presentes no direito interno, porque se encontram estabele-cidos em quase todas as constituies modernas e esto presentes no direito inter-nacional, no qual uma srie de instrumentos de natureza diversa os proclamarame, inclusive, os codificaram. Os relatrios jurdicos que ouviremos nos alaro dissomais detalhadamente; eu preciso apenas lembrar aqui a Declarao Universal dos

    Direitos Humanos de 1948 e os dois Pactos aprovados em 1966; a Carta Europeiados Direitos Humanos e, no que se reere Amrica Latina, a Carta de Bogot de1948 e a Conveno de S. Jos da Costa Rica de 1969, que um dos documen-tos mais avanados neste campo. Mesmo desconsiderando outros instrumentos,tambm estes com a sua importncia, no h qualquer dvida de que a constantereafirmao destes mesmos princpios, tanto em um mbito universal como naONU, quanto naquele regional como para a Europa e Amrica Latina ou, ainda,em mbito nacional como em muitas constituies, indica claramente que estesprincpios respondem conscincia popular e aqueles que exercem o poder no

    devem s