7/23/2019 Cabelo Sem Cabeça

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Cabelo sem cabeça

 À Wendy, pela conversa

Cotia. Cresceu a pintassilga cerceada de olhos pretos. Guardava-a a

 jabuticabeira. Corria desmesuradamente pelo plano quintal cercado. Adolescente ainda

ouvia da janela o anasalado som do marreco. Pintou o cabelo. Queria mudar o estilo.

cortou agora porque representa uma nova fase em sua vida. Cansou das longas madeixas

que a lembram desse interior à oeste de São Paulo. Pedaço de verde impossível em meio

ao deserto de vidro. Concreto. Ferro. Murão. Favela em Carapicuíba. Cresceu no

desnível da laje ainda não terminada. Adolescente auscultava a pólvora. Conheceu José

Pedro. Zézão. Amigou-se aos quatorze. Teve o primeiro filho aos quinze. Morreu

Zezão. Comércio sob nova direção. Rasparam seus fios da cabeça. Cortaram a

feminilidade pela raiz. Todos conhecem Bruna na comunidade. Belos cabelos. Brilha

agora sua cabeça sem escolha. Ex-mulher de Zézão.