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CADERNO 3 SELEÇÃO DE PARECERES JURÍDICOS COVID-19: Servidores públicos e organização administra�va

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CADERNO 3

SELEÇÃO DE PARECERES JURÍDICOS

COVID-19: Servidores públicos e organização administra�va

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CADERNO 3

SELEÇÃO DE PARECERES JURÍDICOS COVID-19: Servidores públicos e organização

administrativa

Trabalho elaborado pela equipe da Consultoria Jurídica do IBAM

Supervisão: Marcus Alonso Ribeiro Neves Coordenação: Fabienne Oberlaender Gonini Novais Consultores Jurídicos: Gustavo da Costa Ferreira Moura dos Santos Jaber Lopes Mendonça Monteiro Júlia Alexim Nunes da Silva Maria Victoria Sá e Guimarães Barroso Magno Priscila Oquioni Souto Equipe de apoio: Ewerton Antunes Marcella Meireles de Andrade Maria Victória da Conceição Lobato Gustavo Neffa Gobbi

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Sumário

APRESENTAÇÃO .......................................................................................................... 10

Parecer IBAM Nº 0829/2020 ..............................................................................................

SM – Servidor Público. Projeto de lei de iniciativa do Chefe do Poder Executivo que cria gratificação temporária de 50% sobre o vencimento base do servidor público municipal que atuar em "Equipe de Fiscalização e de Prevenção à Covid-19". Considerações. 11

Parecer IBAM Nº 0835/2020 ..............................................................................................

SM – Servidor Público. Regime jurídico trabalhista. Se não há transporte público no Município neste momento. Não há como se caracterizar o fato gerador do desconto da cota-parte de custeio do empregado diante da impossibilidade fática e jurídica de se operar tal desconto. Emergência de saúde pública decorrente do Coronavírus (Covid-19). Comentários. ........................................................................................................... 18

Parecer IBAM Nº 0838/2020 ..............................................................................................

SM – Servidor Público. Dispensa temporária dos servidores integrantes dos grupos de risco. Pagamento dos adicionais de insalubridade, periculosidade e hora extraordinária. Considerações. ............................................................................................................... 21

Parecer IBAM Nº 0840/2020 ..............................................................................................

SM – Servidor Público. Empregado Público. É vedada nos termos do § 2º do art. 193 da CLT e do julgamento do IRR-239-55.2011.5.02.0319 pelo TST a possibilidade de acumulação dos adicionais por insalubridade e periculosidade. Emergência de saúde pública decorrente do Coronavírus (Covid-19). Comentários. ...................................... 26

Parecer IBAM Nº 0841/2020 ..............................................................................................

SM – Servidor Público. Grupo de risco. Afastamento. Considerações. ........................ 29

Parecer IBAM Nº 0851/2020 ..............................................................................................

SM – Servidor Público. Processo Seletivo. Contratação de Pessoal. Coronavírus. MP nº 922/2020. Considerações. ......................................................................................... 33

Parecer IBAM Nº 0859/2020 ..............................................................................................

SM – Servidor Público. Suspensão do cumprimento das obrigações financeiras referentes a empréstimos consignados contraídos por servidores públicos estaduais e municipais. Competência legislativa privativa da União. Considerações. ..................... 37

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Parecer IBAM Nº 0871/2020 ..............................................................................................

SM – Servidor Público. Medidas de contenção à expansão da pandemia do Novo Coronavírus (COVID-19). Redução da jornada de servidores sem redução da respectiva remuneração. Considerações. ....................................................................................... 41

Parecer IBAM Nº 0913/2020 ..............................................................................................

PR – Previdência. Emergência de saúde pública decorrente do Coronavírus (Covid-19). Isolamento. Quarentena. Faltas ao serviço. Abono. Grupo de Risco. Medidas. Comentários. ................................................................................................................... 45

Parecer IBAM Nº 0920/2020 ..............................................................................................

SM – Servidor Público. Grupo de risco. Afastamento. Considerações. ........................ 50

Parecer IBAM Nº 0924/2020 ..............................................................................................

SM – Servidor Público. Projeto de lei que suspende os prazos de validade dos concursos públicos durante a pandemia do Novo Coronavírus (COVID-19). Iniciativa parlamentar. Análise da validade. Considerações. ............................................................................. 55

Parecer IBAM Nº 0926/2020 ..............................................................................................

SM – Servidor Público. Servidora efetiva ocupante do cargo de enfermeira em gozo de licença sem vencimentos. Esforços para o enfrentamento da pandemia da COVID-19. Contratação temporária por excepcional interesse público até o retorno da servidora já convocada. Considerações. ........................................................................................... 60

Parecer IBAM Nº 0927/2020 ..............................................................................................

SM – Servidor Público. Novo Coronavírus (Covid-19). Trabalho remoto. Servidora gestante e servidora maior de 60 anos. Comentários. .................................................. 64

Parecer IBAM Nº 0931/2020 ..............................................................................................

PG – Processo Legislativo. Projeto de lei que dispõe sobre o reconhecimento de serviço de relevância a todo servidor público do Município que se encontre laborando na garantia da continuidade dos serviços públicos. Iniciativa parlamentar. Análise da validade. Considerações. ............................................................................................................... 70

Parecer IBAM Nº 0935/2020 ..............................................................................................

CL – Competência Legislativa Municipal. Suspensão do pagamento de empréstimos consignados contraídos por servidores públicos. Competência da União. Considerações. ............................................................................................................... 75

Parecer IBAM Nº 0980/2020 ..............................................................................................

SM – Servidor Público. Suspensão das contratações por tempo determinado para atender à necessidade temporária de excepcional interesse público durante a emergência de saúde provocada pelo novo Coronavírus. Considerações. .................. 79

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Parecer IBAM Nº 0983/2020 ..............................................................................................

SM – Servidor Público. Criação de gratificação especial para servidores lato senso que se encontrem atuando na linha de frente do combate à pandemia do Novo Coronavírus (COVID-19). Considerações. .......................................................................................... 88

Parecer IBAM Nº 0997/2020 ..............................................................................................

SM – Servidor Público. Projeto de lei. Iniciativa parlamentar. Regime dos servidores públicos. Inviabilidade. Inconstitucionalidade formal. Iniciativa privativa do Prefeito Municipal. Comentários. ................................................................................................. 94

Parecer IBAM Nº 0999/2020 ..............................................................................................

SM – Servidor Público. Servidor comissionado. Afastamento das atividades em razão da Covid-19. Ressalvado o caso de servidora gestante, que goza de estabilidade excepcional, os servidores titulares de cargos em comissão podem ser exonerados a qualquer tempo. Comentários. ....................................................................................... 98

Parecer IBAM Nº 1000/2020 ..............................................................................................

PG – Processo Legislativo, PL – Poder Legislativo, SM – Servidor Público. Redução de remuneração de cargos em comissão e do valor de gratificações pelo exercício de funções de confiança. Irredutibilidade de remuneração (art. 37, XV, da CRFB). Comentários. ................................................................................................................. 102

Parecer IBAM Nº 1009/2020 ..............................................................................................

SM – Servidor Público. Férias "Compulsórias". Emergência de saúde pública decorrente do Coronavírus (Covid-19). Medida Provisória (MP) nº. 927 de 22/03/2020. Liminar no julgamento conjunto da ADI 6346, ADI 6348, ADI 6349, ADI 6352, ADI 6354, ADI 6342 e ADI 6344 pelo STF. Comentários. ............................................................................ 109

Parecer IBAM Nº 1012/2020 ..............................................................................................

SM – Servidor Público. Enfrentamento da pandemia do Novo Coronavírus. Grupo de risco. Afastamento. Solicitação pelo próprio servidor para retorno às suas atividades. Considerações. ............................................................................................................. 115

Parecer IBAM Nº 1027/2020 ..............................................................................................

SM – Servidor Público. Medidas de enfrentamento da pandemia no novo Coronavírus (COVID-19). Férias coletivas. Situação dos servidores que não completaram o período aquisitivo. Observância do estatuto. Comentários. ........................................ 119

Parecer IBAM Nº 1042/2020 ..............................................................................................

SM – Servidor Público. Enfrentamento da pandemia do novo Coronavírus (COVID-19). Servidor que exerce atividade essencial. Afastamento. Comentários. ...................... 124

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Parecer IBAM Nº 1045/2020 ..............................................................................................

SM – Servidor Público. Enfrentamento da pandemia do Novo Coronavírus. Grupo de risco. Afastamento. Solicitação pelo próprio servidor para retorno às suas atividades. Considerações. ............................................................................................................. 130

Parecer IBAM Nº 1047/2020 ..............................................................................................

SM – Servidor Público. Sustação dos atos do Poder Executivo que exorbitem do poder regulamentar ou dos limites de delegação legislativa. Se não há como se caracterizar o fato gerador de determinada vantagem estatutária do servidor diante da impossibilidade fática e jurídica, tal parcela não é devida. Emergência de saúde pública decorrente do Coronavírus (COVID-19). Comentários. ...................................................................... 137

Parecer IBAM Nº 1055/2020 ..............................................................................................

AM – Ação Municipal, SM – Servidor Público. Enfrentamento da pandemia do novo Coronavírus (COVID-19). Servidores da área da saúde exercem atividade essencial que não pode ser interrompida, mas são também destinatários de normas que reduzam os riscos inerentes ao trabalho. Grupos de risco. Comentários. ................................. 143

Parecer IBAM Nº 1059/2020 ..............................................................................................

FM – Finanças Municipais, SM – Servidor Público. Projeto de lei complementar nº 39/2020, que estabelece o Programa Federativo de Enfrentamento ao Coronavírus e altera a Lei Complementar nº 101/2000. Revisão geral anual. Concurso público em andamento para provimento de cargos decorrentes de reestruturação administrativa. Comentários. ................................................................................................................. 148

Parecer IBAM Nº 1082/2020 ..............................................................................................

AU – Autarquia, Empresa Pública, Fundações e Sociedades de Economia Mista. Realização de concurso público. Combate à pandemia do Novo Coronavírus. Ano de eleições municipais. Considerações............................................................................157

Parecer IBAM Nº 1117/2020 ..............................................................................................

SM – Servidor Público. Medidas de enfrentamento ao novo Coronavírus (Covid-19). Vigilância sanitária. Horas extras e turnos de revezamento por escalas e plantões. Limites de gastos com pessoal e decretação de calamidade pública. Comentários. . 163

Parecer IBAM Nº 1136/2020 ..............................................................................................

PG – Processo Legislativo, PL – Poder Legislativo. Projeto de lei que dispõe sobre a redução do subsídio dos vereadores enquanto perdurarem os efeitos da situação de emergência em saúde pública em razão da pandemia do Novo Coronavírus (COVID-19). Iniciativa da Mesa da Câmara Municipal. Análise da validade. Considerações. 176

Parecer IBAM Nº 1145/2020 ..............................................................................................

EL – Eleição, SM – Servidor Público. Revisão Geral Anual. Ano eleitoral. PLP nº 39/2020. Comentários. ................................................................................................. 180

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Parecer IBAM Nº 1158/2020 ..............................................................................................

SM – Servidor Público. Emergência em saúde pública causada pelo novo Coronavírus (Covid-19). Servidores temporários. Falta justificada, suspensão, rescisão ou meios alternativos de cumprimento das obrigações contratuais. Comentários. .................... 188

Parecer IBAM Nº 1170/2020 ..............................................................................................

AP – Agente Político. Medidas de enfrentamento da pandemia do Novo Coronavírus (COVID-19). Projeto de lei que reduz os subsídios dos agentes políticos municipais na presente legislatura. Projeto de lei que fixa os subsídios dos agentes políticos para a próxima legislatura congelando seus valores. Análise da validade em tese. Considerações. ............................................................................................................. 197

Parecer IBAM Nº 1171/2020 ..............................................................................................

PG – Processo Legislativo. Projeto de lei que concede aumento a determinado cargo do quadro funcional do Executivo proposto nos idos de 2019. Votação em maio de 2020. Ano de eleições municipais. Entrada em vigor da LC nº 173/2020. Considerações. . 204

Parecer IBAM Nº 1173/2020 ..............................................................................................

SM – Servidor Público. Progressão. LC nº 173/2020. Considerações. ....................... 208

Parecer IBAM Nº 1179/2020 ..............................................................................................

PL – Poder Legislativo, SM – Servidor Público. Direitos de servidores públicos previstos em Lei Orgânica. Inconstitucionalidade. Vedação à equiparação (art. 37, XIII, da CRFB). Inviabilidade de concessão de aumento remuneratório para titulares de cargos em comissão em virtude das restrições previstas no art. 8º, da Lei Complementar nº 173/2000, até 31 de dezembro de 2021. Comentários. .............................................. 212

Parecer IBAM Nº 1181/2020 ..............................................................................................

SM – Servidor Público. Medidas de enfrentamento da pandemia do novo Coronavírus (COVID-19). LC nº 173/2020. Designação para exercício de função gratificada. Considerações. ............................................................................................................. 224

Parecer IBAM Nº 1193/2020 ..............................................................................................

FM – Finanças Municipais, SM – Servidor Público. Revisão Geral Anual. Art. 8º, I da Lei Complementar nº 173/2020. Comentários. .................................................................. 228

Parecer IBAM Nº 1199/2020 ..............................................................................................

SM – Servidor Público. LC nº 173/2020. Promoções, progressões, prêmio por qualificação e licença-prêmio. Considerações. ............................................................ 232

Parecer IBAM Nº 1205/2020 ..............................................................................................

SM – Servidor Público. Enfrentamento à pandemia do novo Coronavírus (Covid-19). Redução temporária de auxílio-alimentação. Possibilidade. Verba indenizatória não albergada pela garantia de irredutibilidade de vencimentos. Recomendações........... 237

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Parecer IBAM Nº 1209/2020 ..............................................................................................

FM – Finanças Municipais, SM – Servidor Público. Agentes comunitários de saúde. Piso salarial previsto na Lei nº 11.350/2006. Lei Complementar nº 173/2020. Adequação. Possibilidade. Comentários. ......................................................................................... 243

Parecer IBAM Nº 1210/2020 ..............................................................................................

FM – Finanças Municipais, SM – Servidor Público. Lei Complementar nº 173/2020. Questionamentos diversos. .......................................................................................... 254

Parecer IBAM Nº 1212/2020 ..............................................................................................

SM – Servidor Público. LC nº 173/2020. Mudança de classe. Concessão de adicionais por tempo de serviço. Suspensão do cômputo do lapso temporal. Considerações. . 270

Parecer IBAM Nº 1213/2020 ..............................................................................................

SM – Servidor Público. LC nº 173/2020. Concessão de vale alimentação, vale feira. Gratificações. Progressão funcional. Considerações. ................................................ 275

Parecer IBAM Nº 1215/2020 ..............................................................................................

SM – Servidor Público. Alcance do art. 8º, IX, da LC nº 173/2020. Considerações. . 280

Parecer IBAM Nº 1219/2020 ..............................................................................................

EL – Eleição, FM – Finanças Municipais, SM – Servidor Público. Candidatos aprovados em concurso homologado antes do período de vedação eleitoral. Restrições decorrentes da Lei Complementar nº 173/2020. Considerações. ................................................... 284

Parecer IBAM Nº 1236/2020 ..............................................................................................

FM – Finanças Municipais, SM – Servidor Público. LC nº 173/2020. Extinção de cargos em comissão em decorrência de ADI. Resolução já aprovada que reduziu o quantitativo de cargos em comissão. Projeto de lei enviado à sanção com fixação da remuneração. Considerações. ............................................................................................................. 293

Parecer IBAM Nº 1241/2020 ..............................................................................................

FM – Finanças Municipais, SM – Servidor Público. Programa Federativo de Enfrentamento ao Coronavírus SARS-CoV-2 (Covid-19). Art. 8º da LC nº 173/2020 e art. 21 da LRF. Parâmetros e restrições aplicáveis na concessão promoções e progressões previstas em plano de cargos e carreiras. Comentários. ....................... 303

Parecer IBAM Nº 1242/2020 ..............................................................................................

SM – Servidor Público. Conversão de 1/3 das férias em pecúnia. Previsão no Estatuto dos servidores local. LC nº 173/2020. Considerações. .............................................. 314

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Parecer IBAM Nº 1243/2020 ..............................................................................................

SM – Servidor Público. LC nº 173/2020. Concessão de vantagens que decorram de norma anterior à situação de calamidade pública. Possibilidade de previsão na LDO e LOA de dispositivos e atualizações que versem acerca da vedação do art. 8º da LC nº 173/2020. Considerações. ............................................................................................ 318

Parecer IBAM Nº 1254/2020 ..............................................................................................

SM – Servidor Público. Concessão de bônus aos servidores da área da saúde que atuam no combate à pandemia da COVID-19. Ano de eleições municipais. LC nº 173/2020. Considerações. ............................................................................................ 324

Parecer IBAM Nº 1261/2020 ..............................................................................................

FM – Finanças Municipais, SM – Servidor Público. LC nº 173/2020. Parâmetros e condições para implementação de adicional de titulação previsto em lei em vigor antes da calamidade pública. Considerações. ...................................................................... 330

Parecer IBAM Nº 1264/2020 ..............................................................................................

SM – Servidor Público. Revisão geral anual (art. 37, X, da Constituição Federal). Ano de eleições municipais. LC nº 173/2020. Considerações. ................................................ 340

Parecer IBAM Nº 1265/2020 ..............................................................................................

AO – Ato Oficial, SM – Servidor Público. Complementação ao parecer nº 1219/2020. LC nº 173/2020. Inteligência da expressão "reposição de vacâncias". ...................... 346

Parecer IBAM Nº 1266/2020 ..............................................................................................

FM – Finanças Municipais, SM – Servidor Público. LC nº 173/2020. Quinquênio cujo período aquisitivo foi completado antes da entrada em vigor das restrições previstas no art. 8º. Parâmetros para implementação da vantagem. Suspensão da contagem de tempo para fins de concessão de vantagens fundadas exclusivamente no tempo de serviço. Comentários. ................................................................................................... 350

Parecer IBAM Nº 1267/2020 ..............................................................................................

SM – Servidor Público. Contratação temporária por excepcional interesse público (art. 37, IX, da Constituição Federal). LC nº 173/2020. Considerações. ............................ 358

Parecer IBAM Nº 1274/2020 ..............................................................................................

SM – Servidor Público. Segurança e medicina do trabalho. Retorno de servidores que foram infectados por Covid-19. Redução dos riscos inerentes ao trabalho. Competência do Município. Critérios técnicos. Considerações. ........................................................ 362

Parecer IBAM Nº 1275/2020 ..............................................................................................

SM – Servidor Público. LC nº 173/2020. Aumentos salariais. Progressões. Promoções. Considerações. ............................................................................................................. 367

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Parecer IBAM Nº 1281/2020 ..............................................................................................

SM – Servidor Público. LC nº 173/2020. Adicional por tempo de serviço. Revisão geral anual. Considerações. .................................................................................................. 371

Parecer IBAM Nº 1283/2020 ..............................................................................................

SM – Servidor Público. Projeto de lei que visa reduzir a jornada laboral dos servidores municipais da área da saúde de 40 horas semanais para 30 horas semanais sem redução da remuneração. Ano de eleições municipais. LC nº 173/2020. Considerações. ...................................................................................................................................... 375

Parecer IBAM Nº 1289/2020 ..............................................................................................

FM – Finanças Municipais, SM – Servidor Público. LC nº 173/2020. Termo inicial das restrições do art. 8º. Questionamentos diversos. ........................................................ 380

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APRESENTAÇÃO

Dando sequência à coletânea de pareceres relacionados às providências para enfrentamento da pandemia do novo Coronavírus (Covid-19) pelos municípios, iniciada pelo primeiro caderno com a temática “Conceitos básicos e normas aplicáveis”, o segundo sobre a “Situação de emergência e direitos fundamentais” e este terceiro caderno, reúne pareceres que versam sobre “Servidores públicos e organização administrativa”, os demais terão a seguinte temática:

• Caderno 4 - Licitações e contratos públicos; • Caderno 5 - Serviços públicos; • Caderno 6 - Tributação e Orçamento; e • Caderno 7 - Eleições Municipais.

Mais uma vez, esclarecemos que o IBAM se coloca à disposição para

atender todos os Municípios brasileiros a fim de dirimir dúvidas dos gestores locais no enfrentamento dos problemas relacionados à Pandemia. Orientações a respeito podem ser obtidas por meio de um de nossos canais de comunicação: e-mail: [email protected] e WhatsApp: (21) 97584-7223.

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Parecer IBAM Nº 0829/2020

SM – Servidor Público. Projeto de lei de iniciativa do Chefe do Poder Executivo que cria gratificação temporária de 50% sobre o vencimento base do servidor público municipal que atuar em "Equipe de Fiscalização e de Prevenção à Covid-19". Considerações.

CONSULTA: Indaga-se sobre a constitucionalidade e legalidade de projeto de

lei de iniciativa do Chefe do Poder Executivo que cria gratificação temporária de 50% sobre o vencimento base do servidor público municipal que atuar em "Equipe de Fiscalização e de Prevenção à Covid-19". Esclarece o consulente que o projeto foi acompanhado de estimativa de impacto financeiro e orçamentário.

A consulta vem instruída com o referido projeto de lei.

RESPOSTA: Inicialmente, cabe esclarecer que compete aos Municípios, por

sua autonomia político-administrativa, garantida pelos artigos 1º, 18, 29 e 30 da Constituição da República, editar normas acerca do regime jurídico e da remuneração dos servidores públicos de seus quadros.

São, ademais, de iniciativa privativa do Chefe do Poder Executivo

Municipal, as leis que tratem do regime jurídico e remuneração dos servidores do Poder Executivo, por força do disposto no artigo 61, §1º, II, " b ", da Constituição da República que, pelo princípio da simetria das

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formas, é de reprodução obrigatória por todos os entes da Federação.

Desse modo, tendo em vista a competência municipal para

legislar sobre a matéria e sendo a proposta de iniciativa do Executivo, não vislumbramos vícios de ordem formal.

Com relação aos prazos estabelecidos pela legislação eleitoral,

ressaltamos que, por enquanto, o calendário eleitoral está mantido e os prazos legais referentes às ações dos gestores municipais em ano eleitoral não foram afastados pela emergência de saúde causada pelo novo Coronavírus.

Ocorre que a Lei nº 9.504/1997, em seu artigo 73, veda apenas

as "condutas tendentes a afetar a igualdade de oportunidades entre candidatos nos pleitos eleitorais." As ações que não influenciem a disputa eleitoral não são proibidas mesmo em datas próximas às eleições.

Nesse sentido, afirmou-se no Parecer do IBAM 0136/2020 que:

Há que se registrar que a Lei nº 9.504/1997 assevera que

são proibidas as condutas tendentes a afetar a igualdade de oportunidades entre candidatos nos pleitos eleitorais. Ou seja, não é qualquer dos atos citados na Lei que implica em descumprimento da regra eleitoral. Há que influenciar na disputa, a teor do disposto no caput do art. 73 da Lei das Eleições. Em outras palavras, a conduta vedada deve ser de tal intensidade que possa comprometer a isonomia de chances entre os candidatos.

Os atos e ações do Poder Público, incapazes de

desequilibrar a disputa eleitoral ou de influenciar no resultado das eleições, não devem sofrer limitação, pois o bem jurídico protegido encontra-se salvaguardado. O Direito Eleitoral não possui o condão de impor injustificadas barreiras às atividades normalmente desenvolvidas pela Administração Pública, salvo aquelas inseridas na própria Constituição Federal (art. 14, § 9º), sob pena de afrontar outros princípios constitucionais. O que se quer dizer é que a Lei

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Eleitoral não pretende impedir o funcionamento normal e rotineiro da Administração. Entretanto, programas novos, a concessão de favores não utilizados e quaisquer outras medidas que possam ter conotação eleitoral ou possam ser utilizadas para beneficiar candidatos, encontram-se vedados.

Dessa forma, tendo em vista que a concessão de gratificação a

poucos servidores que realizaram atividade específica temporariamente durante a emergência de saúde, não é, em princípio, capaz de influenciar as eleições municipais, a concessão da gratificação, mesmo em período próximo ao pleito eleitoral, é lícita.

Importante destacar que, tendo em vista a situação de

calamidade pública decretada pelo Congresso Nacional por meio do Decreto Legislativo nº 6/2020, ficam suspensas algumas exigências da Lei de Responsabilidade Fiscal (Lei Complementar nº 101/2000) com relação à criação de despesa pública, conforme artigo 65 da referida Lei Complementar que determina que:

Art. 65. Na ocorrência de calamidade pública reconhecida

pelo Congresso Nacional, no caso da União, ou pelas Assembléias Legislativas, na hipótese dos Estados e Municípios, enquanto perdurar a situação:

I - serão suspensas a contagem dos prazos e as

disposições estabelecidas nos arts. 23, 31 e 70;

II - serão dispensados o atingimento dos resultados

fiscais e a limitação de empenho prevista no art. 9º.

Parágrafo único. Aplica-se o disposto no caput no caso de

estado de defesa ou de sítio, decretado na forma da Constituição.

Não está suspenso, porém, o disposto no artigo 21 da Lei de

Responsabilidade Fiscal que determina que:

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Art. 21. É nulo de pleno direito o ato que provoque aumento da despesa com pessoal e não atenda:

I - as exigências dos arts. 16 e 17 desta Lei

Complementar, e o disposto no inciso XIII do art. 37 e no § 1º do art. 169 da Constituição;

II - o limite legal de comprometimento aplicado às

despesas com pessoal inativo.

Parágrafo único. Também é nulo de pleno direito o ato de

que resulte aumento da despesa com pessoal expedido nos cento e oitenta dias anteriores ao final do mandato do titular do respectivo Poder ou órgão referido no art. 20.

Dessa forma, o projeto de lei que cria gratificação de serviço só

pode ser aprovado se respeitado o disposto no artigo 16 da Lei de Responsabilidade Fiscal, in verbis:

Art. 16. A criação, expansão ou aperfeiçoamento de ação

governamental que acarrete aumento da despesa será

acompanhado de:

I - estimativa do impacto orçamentário-financeiro no

exercício em que deva entrar em vigor e nos dois subsequentes;

II - declaração do ordenador da despesa de que o

aumento tem adequação orçamentária e financeira com a lei

orçamentária anual e compatibilidade com o plano plurianual e com

a lei de diretrizes orçamentárias.

§ 1º Para os fins desta Lei Complementar, considera-se:

I - adequada com a lei orçamentária anual, a despesa

objeto de dotação específica e suficiente, ou que esteja abrangida

por crédito genérico, de forma que somadas todas as despesas da

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mesma espécie, realizadas e a realizar, previstas no programa de

trabalho, não sejam ultrapassados os limites estabelecidos para o

exercício;

II - compatível com o plano plurianual e a lei de diretrizes

orçamentárias, a despesa que se conforme com as diretrizes,

objetivos, prioridades e metas previstos nesses instrumentos e não

infrinja qualquer de suas disposições.

§ 2º A estimativa de que trata o inciso I do caput será

acompanhada das premissas e metodologia de cálculo utilizadas.

§ 3º Ressalva-se do disposto neste artigo a despesa

considerada irrelevante, nos termos em que dispuser a lei de

diretrizes orçamentárias.

§ 4º As normas do caput constituem condição prévia

para:

I - empenho e licitação de serviços, fornecimento de bens

ou execução de obras;

II - desapropriação de imóveis urbanos a que se refere o

§ 3º do art. 182 da Constituição.

Destaque-se que a consulta indica que o projeto de lei foi

acompanhado de estimativa de impacto financeiro orçamentário, mas esta estimativa não foi disponibilizada ou apreciada por esta consultoria.

O projeto de lei em análise, embora, em princípio, não viole os

prazos da legais para concessão de gratificação a servidores públicos, apresenta outros potenciais vícios de constitucionalidade que ensejam maior reflexão.

O projeto de lei, em seu artigo 2º, cria a "Equipe de Fiscalização

e Prevenção ao Coronavírus, a ser nomeada por meio de portaria,

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composta por servidores do quadro efetivo, sob direção de um fiscal municipal." Em seu artigo 5º, o projeto de lei determina que competirá à referida Equipe fiscalizar estabelecimentos comerciais do Município.

Ocorre que a atividade de fiscalização é atividade que envolve o

exercício de poder de polícia, sendo atividade típica de Estado. Ou seja, as atribuições dos fiscais não podem ser delegadas e só podem ser desempenhadas por servidores públicos aprovados em concurso público e nomeados para o cargo de fiscal, sob pena de violação aos princípios da legalidade e da obrigatoriedade do concurso público, previstos no artigo 37, caput e incisos II, da Constituição de 1988.

Sobre o tema, esclareceu-se no Parecer do IBAM nº 2654/2019 que:

(...) as funções atinentes ao cargo de fiscal devem ser desempenhadas por intermédio de servidor efetivo, isto é, aquele que ingressa aos quadros da Administração Pública por intermédio da aprovação em concurso público realizado para o provimento deste cargo específico (devidamente criado por lei). De igual forma, não se revela factível que servidor efetivo ocupante de cargo diverso seja designado para o desempenho das funções de fiscal por ocasião da criação deste cargo, sendo necessária a realização de concurso público para o seu provimento.

Destaque-se, ademais, que o desempenho de atribuições típicas

de fiscal por servidores públicos que não sejam ocupantes de cargo público de fiscal pode configurar desvio de função, o que é vedado, mesmo em situações de emergência ou de falta de servidores públicos suficientes para desempenho de determinadas atividades.

Nesse sentido, adverte José Maria Pinheiro Madeira:

Embora a movimentação de servidor esteja inserida no

âmbito do juízo de conveniência e oportunidade da Administração Pública, é certo que os direitos e deveres são aqueles inerentes ao

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cargo para o qual foi investido.

Assim, mesmo levando em conta o número insuficiente

de servidores, não é admissível que o mesmo exerça atribuições de um cargo tendo sido nomeado para outro, para o qual fora aprovado por concurso público. (In: MADEIRA, José Maria Pinheiro. Servidor público na atualidade. Rio de Janeiro: Elsevier, 2010, p. 76).

Além disso, ainda que a Equipe fosse composta por fiscais

municipais, estes servidores públicos já devem exercer, como atribuição típica de seu cargo efetivo, a fiscalização do regular funcionamento e do cumprimento de normas municipais por estabelecimentos comerciais. É, desse modo, descabida a concessão de gratificação para que o servidor exerça função própria de seu cargo e que já é remunerada com os vencimentos a estes correspondentes.

Por todo o exposto, concluímos que o projeto de lei em análise,

embora não afronte a Lei Federal nº 9.504/97, viola os princípios constitucionais da legalidade e da obrigatoriedade do concurso públicos, previstos no artigo 37, caput e inciso II, da Constituição da República e, por esses motivos, não merece prosperar.

É o parecer, s.m.j.

Júlia Alexim Nunes da Silva

Consultora Técnica

Aprovo o parecer

Marcus Alonso Ribeiro Neves

Consultor Jurídico

Rio de Janeiro, 20 de abril de 2020.

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Parecer IBAM Nº 0835/2020

SM – Servidor Público. Regime jurídico trabalhista. Se não há transporte público no Município neste momento. Não há como se caracterizar o fato gerador do desconto da cota-parte de custeio do empregado diante da impossibilidade fática e jurídica de se operar tal desconto. Emergência de saúde pública decorrente do Coronavírus (Covid-19). Comentários.

CONSULTA:

A Consulente, Câmara, expõe e indaga o seguinte, in verbis:

"A Câmara Municipal fornece passes trabalhador a

determinador servidor deste órgão. Neste período de pandemia do Coronavírus, encontra-se indisponível transporte público entre o município de residência do servidor e o município de trabalho, impossibilitando que o servidor se utilize dos passes e se locomova por meio de transporte público. Nestas condições, a Câmara Municipal está utilizando o carro da entidade para transportar o servidor entre o município de residência do servidor e o município de trabalho. Considerando este relato, a Câmara Municipal pode realizar o desconto do vale transporte do servidor na folha de pagamento?".

A Consulta não segue documentada.

RESPOSTA:

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Tendo em vista que o Ministério Público do Trabalho tem recomendado, quando possível e enquanto durar a emergência de saúde pública de importância nacional decorrente do Coronavírus (Covid-19), a concessão de transporte pelo próprio empregador, como aliás consta na Recomendação Conjunta PRT4 nº. 07/2020, e, tendo ainda, em vista que a Lei nº. 7.418/1985, que estabelece que o Vale-Transporte, autoriza o empregador a descontar, mensalmente, do beneficiário que exercer o respectivo direito, o valor da parcela equivalente a 6% (seis por cento) do seu salário básico ou vencimento, temos que o desconto não pode ser feito neste momento, porque o vale-transporte não está sendo pago.

Ora, se se considerar que a própria Consulente alega que não há

transporte público no Município neste momento e assim não há como se caracterizar o fato gerador do desconto da cota-parte de custeio do empregado diante da impossibilidade fática e jurídica de se operar tal desconto. Nesse sentido, confira-se a jurisprudência trabalhista:

"HORAS IN ITINERE. Discute-se a proporcionalidade das

vantagens concedidas como contrapartida à supressão das horas in itinere, quais sejam: a) cartão alimentação no valor diário de R$ 4,20; b) restituição do desconto de 6% do vale-transporte dos meses de outubro, novembro e dezembro de 2015. O eg. TRT manteve a r. sentença que declarou "incidentalmente inválida a contrapartida, ajustada no ACT/2015, em relação ao tempo despendido no transporte, qual seja, cartão alimentação no valor diário de R$ 4,20", por ter excedido os limites da razoabilidade. Registrou, ainda, que "não há que se falar que a ausência de desconto de 6% a título de 'vale-transporte' representaria uma contrapartida da ré. Isto porque, a se considerar o período em que a sede da empresa não era servido por transporte público, não haveria como se caracterizar o fato gerador do desconto da cota- parte de custeio do empregado. Portanto, não há nenhuma 'concessão' por parte da ré, mas simples impossibilidade fática e jurídica de se operar tal desconto". O art. 896-A, § 1º, II, da CLT prevê como indicação de transcendência jurídica "a existência de questão nova em torno da interpretação da legislação trabalhista".

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A jurisprudência do c. TST ainda não pacificou entendimento acerca da matéria, o que viabiliza que se reconheça a transcendência jurídica da causa. Reconhecida a transcendência jurídica, procede-se ao exame do agravo de instrumento. A transcrição de trecho insuficiente do v. acórdão regional não atende ao requisito descrito pelo art. 896, § 1º-A, I, da CLT, bem como impede que a recorrente faça a demonstração analítica das ofensas e contrariedades apontadas, conforme exige o art. 896, § 1º-A, III, da CLT. Agravo de instrumento de que se conhece e a que se nega provimento". (TST - 6ª Turma. AIRR nº. 0012358-29.2016.5.03.0098 Brasília, 17 de outubro de 2019. Min. RENATO DE LACERDA PAIVA)

Em suma: se não há transporte público no Município neste

momento em decorrência da emergência de saúde pública de importância nacional decorrente do Coronavírus (Covid-19), não há como se caracterizar o fato gerador do desconto da cota-parte de custeio do empregado diante da impossibilidade fática e jurídica de se operar tal desconto.

É o parecer, s.m.j.

Jaber Lopes Mendonça Monteiro

Consultor Técnico

Aprovo o parecer

Marcus Alonso Ribeiro Neves

Consultor Jurídico

Rio de Janeiro, 20 de abril de 2020.

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Parecer IBAM Nº 0838/2020

SM – Servidor Público. Dispensa temporária dos servidores integrantes dos grupos de risco. Pagamento dos adicionais de insalubridade, periculosidade e hora extraordinária. Considerações.

CONSULTA:

Relata o consulente que o Município dispensou o ponto

temporariamente, como uma faculdade de cada servidor, os servidores integrantes de grupos de risco (maiores de 60 anos, portadores de doenças crônicas e gestantes e lactantes) desde que devidamente comprovada a respectiva condição.

Em sendo assim, indaga o consulente se serão devidos a estes

empregados que optarem pelo afastamento neste período, os adicionais inerentes ao exercício da função como periculosidade, insalubridade, horas extras.

A consulta não veio documentada.

RESPOSTA:

Inicialmente, tendo em vista que o consulente utiliza o termo

"empregados" em sua consulta, não podemos deixar de mencionar que a necessidade de observância do regime jurídico único e acerca do tema recomendamos a leitura do Parecer/IBAM nº 1396/2016.

Dito isto, temos que que a rápida expansão da pandemia do

Novo Coronavírus (COVID-19) impôs sérias restrições ao nosso modo de

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vida. Como tem sido amplamente divulgado, as estratégias de distanciamento social adotadas pelos Estados e Municípios contribuem, principalmente, para evitar o colapso nos sistemas de saúde locais, salvaguardando, desta forma, vidas.

Por outro lado, a Constituição Federal assegurou, em seu art. 7º,

direitos fundamentais aos trabalhadores em geral, dentre os quais se encontram os adicionais de insalubridade e periculosidade (inciso XXIII) e a remuneração do serviço extraordinário superior, no mínimo, em cinquenta por cento à do normal (inciso XVI).

Independentemente do regime que se tenha como referência

(regime celetista ou estatutário), os adicionais de insalubridade e periculosidade se caracterizam como "salários condição". Isto é, somente são devidos quando o trabalhado é laborado efetivamente nas condições que o ensejam o pagamento destes adicionais. Vejamos:

"SALÁRIO-CONDIÇÃO. CARTEIRO MOTORIZADO.

SUPRESSÃO. SALÁRIO-CONDIÇÃO. Uma vez cessada a condição que gerou o direito ao pagamento da parcela decorrente do exercício da função de carteiro motorizado, seu pagamento não seria mais devido, o que, de pronto, não caracteriza afronta ao princípio da inalterabilidade contratual lesiva. A parcela constitui salário-condição e tem caráter transitório porque originada de circunstância específica, o que implica na ausência de amparo legal que sustente a continuidade da sua percepção. Não há, portanto, falar em violação ao princípio da irredutibilidade salarial, tampouco em alteração contratual in pejus." (TRT-3 - RO: 00108763620185030014 0010876-36.2018.5.03.0014, Relator: Oswaldo Tadeu B. Guedes, Quinta Turma).

"ADICIONAL DE INSALUBRIDADE. SALÁRIO-

CONDIÇÃO. O adicional de insalubridade possui natureza jurídica de salário-condição, não integrando o patrimônio jurídico do empregado de maneira definitiva e imutável, sendo, portanto, possível sua supressão quando há cessação da condição

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insalubre. Inteligência do art. 194 da CLT. (Recurso desprovido)." (TRT-17 - RO: 00002479420185170181, Relator: SÔNIA DAS DORES DIONÍSIO MENDES, Data de Julgamento: 13/05/2019, Data de Publicação: 16/05/2019).

Em prosseguimento, temos que a carga horária dos servidores/

empregados do Executivo é fixada na lei de criação dos cargos/empregos à luz da realidade local para a melhor prestação dos serviços públicos. Assim, cabe à lei local disciplinar a jornada a ser cumprida pelos servidores do município, em observância ao limite constitucional de 44 horas semanais e 8 horas diárias, conforme determinação do art. 7º, XIII, de aplicação obrigatória aos servidores públicos por força do art. 39, § 3º.

De toda forma, a hora extraordinária somente é devida quando o

labor ultrapasse a jornada do servidor/empregado, o que alertamos, consonante a própria nomenclatura estabelece deve se dar de forma extraordinária. Caso as horas extraordinárias passem a ser devidas de forma corriqueira, a Administração Pública precisa rever sua estrutura.

Por conseguinte, não é devido os pagamentos dos adicionais por

insalubridade, periculosidade aos servidores/empregados que estão afastados das atividades insalubres e perigosas. Assim, como não é devido o pagamento de hora extraordinária para os servidores que não extrapolam o horário de sua jornada.

Situação diferente, contudo, é a da gestante ante a salvaguarda

especial que o nosso ordenamento constitucional atribuiu à maternidade, inclusive assegurando estabilidade (art. 10, II, "b", do ADCT).

Neste diapasão, recentemente, o STF julgou procedente a Ação

Direta de Inconstitucionalidade (ADI) nº 5938 para declarar inconstitucionais trechos de dispositivos da Consolidação das Leis do Trabalho (CLT) inseridos pela Reforma Trabalhista (Lei nº 13.467/2017) que admitiam a possibilidade de trabalhadoras grávidas e lactantes desempenharem atividades insalubres em algumas hipóteses. Nesta ocasião restou assentado que a expressão "quando apresentar atestado

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de saúde, emitido por médico de confiança da mulher", contida nos incisos II e III do artigo 394-A da CLT, afronta a proteção constitucional à maternidade e à criança.

Em que pese o consulente mencione que o afastamento é uma

faculdade dos servidores/empregados, no que tange às gestantes e lactantes e o afastamento do labor prestado em condições insalubres este deve ser imposto, na medida em que não é possível o trabalho de gestantes e lactantes nestas condições.

Assim, não obstante gestantes e lactantes devam ser afastadas

do trabalho insalubre, tratando-se do regime celetista, o art. 394-A, § 2º, da CLT (amplamente discutido no julgamento da ADI nº 5938) assegura que a trabalhadora gestante/lactante que recebe o adicional de insalubridade tem o direito de permanecer a recebê-lo, mesmo quando afastada:

"Art. 394-A. Sem prejuízo de sua remuneração, nesta

incluído o valor do adicional de insalubridade, a empregada deverá ser afastada de: (Redação dada pela Lei nº 13.467, de 2017)

I - atividades consideradas insalubres em grau máximo,

enquanto durar a gestação;

II - atividades consideradas insalubres em grau médio ou

mínimo, que recomende o afastamento durante a gestação;

III - atividades consideradas insalubres em qualquer grau,

que recomende o afastamento durante a lactação."

Ademais, diante da especial proteção que o legislador

constituinte conferiu à maternidade, é assente na jurisprudência pátria que o estado gravídico da servidora não pode gerar qualquer decesso remuneratório. Desta forma, se a servidora já fazia jus ao referido adicional continuará a percebê-la ainda que afastada em razão de licença maternidade. Corroborando a presente ilação:

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"Licença gestante - Supressão de vantagem funcional denominada "adicional de condições adversas"- Descabimento - Licença gestante que deve ser concedida sem prejuízo da percepção da remuneração global da servidora, incluindo-se todas as vantagens pecuniárias (adicionais e gratificações) ... ". TJ/SP 12ª Câmara de Direito Público, Apelação 994071663570, Data do julgamento: 28/04/2010). (Grifos nossos).

Por tudo que precede, concluímos objetivamente a presente

consulta que, salvo nos casos das gestantes e das lactantes quanto ao adicional de insalubridade, não é devido os pagamentos dos adicionais por insalubridade, periculosidade e hora extraordinária aos servidores ocupante dos grupos de risco afastados de suas atividades.

É o parecer, s.m.j.

Priscila Oquioni Souto

Assessora Jurídica

Aprovo o parecer

Marcus Alonso Ribeiro Neves

Consultor Jurídico

Rio de Janeiro, 20 de abril de 2020.

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Parecer IBAM Nº 0840/2020

SM – Servidor Público. Empregado Público. É vedada nos termos do § 2º do art. 193 da CLT e do julgamento do IRR -239-55.2011.5.02.0319 pelo TST a possibilidade de acumulação dos adicionais por insalubridade e periculosidade. Emergência de saúde pública decorrente do Coronavírus (Covid-19). Comentários.

CONSULTA:

A Consulente, Prefeitura, expõe e indaga o seguinte, in verbis:

"Em razão da pandemia do Coronavírus alguns empregados públicos da Secretária Municipal de saúde estão frequentemente em contato com pacientes suspeitos e possivelmente contaminados pelo COVID-19. Tais empregados já recebem adicional de insalubridade em razão das atividades que exercem e nos percentuais indicados no PPRA em vigência. Pergunto: Por conta da alta letalidade da doença COVID-19 é também devido aos empregados públicos da saúde o adicional de periculosidade?".

A Consulta não segue documentada.

RESPOSTA:

Conquanto parte da doutrina e jurisprudência entendesse que

poderia haver acumulação dos adicionais de insalubridade com o de

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periculosidade, fato é que o § 2º do art. 193 da CLT sempre determinou que o empregado deveria escolher um dos dois adicionais, o que parece ser o mesmo que dizer que é vedada a acumulação. Confira-se:

AGRAVO DE INSTRUMENTO. ADICIONAL DE

PERICULOSIDADE. ADICIONAL DE INSALUBRIDADE. INACUMULABILIDADE DOS ADICIONAIS DE INSALUBRIDADE E DE PERICULOSIDADE. Confirmada a ordem de obstaculização do recurso de revista, na medida em que não demonstrada a satisfação dos requisitos de admissibilidade, insculpidos no artigo 896 da CLT. Agravo de instrumento não provido. (TST - Acórdão AIRR - 1500-10.2008.5.02.0077, Relator(a): Min. Augusto César Leite de Carvalho, data de julgamento: 19/02/2014, data de publicação: 21/02/2014, 6ª Turma)

Assim sendo, não parece haver respaldo legal para a

interpretação que permitia a acumulação, tanto é assim que a doutrina e jurisprudência dominantes sempre foram no sentido de que acúmulo era vedado com base na CLT, mas, de fato, havia decisões divergentes, pois a CLT não determinava que era proibido acumular, apenas dizia que era para optar e por isso alguns entendiam que o art. 193 não teria sido recepcionado pela Constituição Federal de 1988.

Para dirimir a controvérsia o TST (Tribunal Superior do Trabalho,

por meio de recurso repetitivo, no julgamento IRR- 239-55.2011.5.02.0319 em 27/09/19 vetou a possibilidade de acumulação dos adicionais por insalubridade e periculosidade.

Prevaleceu, no julgamento, o voto do ministro Alberto Bresciani,

que entende que o art. 193, § 2º, da CLT foi recepcionado pela CRFB/88 e veda a cumulação dos adicionais de insalubridade e de periculosidade, ainda que decorrentes de fatos geradores distintos e autônomos.

Vencida a corrente do relator, ministro Vieira de Mello, que

entende que o referido dispositivo da CLT estaria superado pelos incisos XXII e XXIII do art. 7º da CRFB/88, que tratam da redução dos riscos

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inerentes ao trabalho e do adicional de remuneração para as atividades penosas, insalubres ou perigosas. Ainda de acordo com o ministro, a vedação à cumulação contraria a Convenção 155 da Organização Internacional do Trabalho (OIT), relativa à segurança e à saúde dos trabalhadores.

Em suma: a acumulação dos adicionais por insalubridade e

periculosidade é vedada nos termos do § 2º do art. 193 da CLT e do julgamento do IRR-239-55.2011.5.02.0319 pelo TST.

É o parecer, s.m.j.

Jaber Lopes Mendonça Monteiro

Consultor Técnico

Aprovo o parecer

Marcus Alonso Ribeiro Neves

Consultor Jurídico

Rio de Janeiro, 20 de abril de 2020.

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Parecer IBAM Nº 0841/2020

SM – Servidor Público. Grupo de risco. Afastamento. Considerações.

CONSULTA:

Relata o consulente que determinada servidora da Câmara

Municipal, ocupante do cargo efetivo de auxiliar de serviços gerais,

encontra-se no denominado grupo de risco da COVID-19 por possuir mais

de 61 anos.

Ainda conforme os relatos do consulente, na última semana, o

Presidente da Câmara Municipal determinou duas semanas de férias

coletivas a todos os servidores que não pudessem exercer suas funções

de forma remota, como é o caso da mencionada servidora que ocupa o

cargo de Auxiliar de Serviços Gerais (atuando na limpeza do órgão).

Diante da situação relatada, indaga o consulente:

"se as recomendações de isolamento social das pessoas

que se encontram no grupo de risco da pandemia se prolongarem,

e a servidora não mais dispuser de período de férias a serem

gozadas, ela poderá retornar ao trabalho? Ou existe alguma

permissão para que o órgão simplesmente afaste a servidora de

suas funções, sem prejuízo da remuneração, por ela se encontrar

nesse grupo de risco? As pessoas hoje no grupo de risco podem

trabalhar ou existe alguma PROIBIÇÃO geral nesse sentido? Pode

o Presidente do Legislativo determinar que a servidora não retorne

ao trabalho e mantê-la afastada de suas funções sem prejuízo da

remuneração? Esse "ato" seria feito através de um documento

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unilateral (como, por exemplo, uma portaria) ou deveria passar

pelo Plenário da Casa (através de uma resolução)?"

A consulta não veio documentada.

RESPOSTA:

Inicialmente, temos que que a rápida expansão da pandemia do

Novo Coronavírus (COVID-19) impôs sérias restrições ao nosso modo de

vida. Como tem sido amplamente divulgado, as estratégias de

distanciamento social adotadas pelos Estados e Municípios contribuem,

principalmente, para evitar o colapso nos sistemas de saúde locais,

salvaguardando, desta forma, vidas.

Dentre as medidas de contenção à expansão da pandemia da

COVID-19 adotadas por Estados e Municípios está também a instituição do

home office, trabalho remoto e teletrabalhos para os ocupantes de

cargos que admitem estas modalidades de exercícios de suas atribuições,

bem como a concessão de férias coletivas, licenças e escalas para os

servidores cujas atribuições somente podem se dar de forma presencial.

Feitas estas considerações, temos que, com exceção das

gestantes e lactantes às quais não é permitido nenhuma forma de trabalho

insalubre (ADI nº 5938), não há nenhuma disposição, até o presente

momento, que obrigue o afastamento de servidores integrantes do grupo

de risco pelos entes federados, sobretudo aqueles que atuam na área da

saúde.

Não obstante, alertamos que começam a surgir no âmbito dos

Tribunais pátrios decisões determinando cautelarmente o afastamento de

servidores integrantes do chamado grupo de risco da COVID-19 de suas

atividades.

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O Tribunal Regional do Trabalho da 2ª Região concedeu liminar

no bojo de ação civil pública (ACP nº 1000353-66.2020.5.02.0058)

proposta pelo Sindicato dos trabalhadores públicos da saúde no Estado de

São Paulo para determinar, dentre outras medidas, "a liberação imediata

das atividades presenciais os empregados substituídos processualmente

que estejam enquadrados no grupo de risco, assim compreendidos os

idosos com 60 anos ou mais, as gestantes, os portadores de doenças

respiratórias crônicas, cardiopatias, diabetes, hipertensão, doenças renais,

ou de quaisquer outras afecções que deprimam o sistema imunológico,

assegurando-lhes todos os direitos e benefícios do contrato de trabalho".

No mesmo sentido o Tribunal de Justiça do Distrito Federal e

Territórios - TJDFT, através da 7ª Vara de Fazenda Pública, no bojo do

processo nº 0702293-75.2020.8.07.0018, determinou o afastamento

imediato de servidores do Sistema de Limpeza Urbana do Distrito Federal

que se enquadrem no grupo de risco do Novo Coronavírus.

Desta forma, registramos que não nos fora dado conhecer se

existe no âmbito do Município decreto declarando o estado de calamidade

pública e adotando medidas pertinentes para o combate à expansão da

pandemia. Caso o mesmo não tenha sido editado pelo Chefe do Executivo

ainda, ou caso editado não contemple afastamento de servidores, nada

impede que aos servidores integrantes do grupo de risco que laboram

necessariamente de forma presencial na Câmara Municipal sejam

concedidas férias coletivas, licença-prêmio (quando preenchidos os

requisitos) e outras vantagens neste sentido eventualmente previstas no

Estatuto dos servidores.

De igual forma, muito embora não exista, hoje, uma

determinação geral que imponha aos entes federados o afastamento dos

servidores integrantes do grupo de risco (com exceção das gestantes e

lactantes como aventado) mantidas as respectivas remunerações,

encontramos decisões judiciais impondo tal determinação, de forma que

não vislumbramos óbices à edição de uma portaria pelo Chefe da Casa

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Legislativa neste sentido, dispensando o ponto dos servidores integrantes

do grupo de risco.

Isto posto, concluímos objetivamente a presente consulta na

forma das razões exaradas.

É o parecer, s.m.j.

Priscila Oquioni Souto

Assessora Jurídica

Aprovo o parecer

Marcus Alonso Ribeiro Neves

Consultor Jurídico

Rio de Janeiro, 20 de abril de 2020.

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Parecer IBAM Nº 0851/2020

SM – Servidor Público. Processo Seletivo. Contratação de Pessoal. Coronavírus. MP nº 922/2020. Considerações.

CONSULTA:

A Prefeitura consulente indaga acerca da possibilidade de o

Município deixar de realizar processo seletivo para contratação de pessoal

em virtude do COVID-19.

RESPOSTA:

Inicialmente, temos que a regra na Administração Pública é o

ingresso no serviço público de candidatos aprovados em regular concurso

público de prova ou provas e títulos, nos termos do art. 37, inciso II, da

Constituição Federal. As principais exceções à indigitada regra da

obrigatoriedade do concurso público encontram-se no mesmo art. 37, a

saber: os cargos comissionados (inciso V) e a contratação temporária de

excepcional interesse público (inciso IX).

Desse modo, compete ao Poder Executivo a iniciativa de lei

municipal, consoante os ditames do art. 61, § 1º, inciso II, alínea "a" da Lei

Maior, definindo o regime necessariamente jurídico-administrativo em que

se dará a contratação por excepcional interesse público, bem como os

casos em que será admitida. O contrato, por sua vez, deverá ser

obrigatoriamente a termo e delimitado no tempo.

Ressaltamos, por oportuno, que, ante o princípio da legalidade,

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expresso no art. 37, caput, da Constituição Federal, e por ser o art. 37, inciso IX, norma constitucional de eficácia limitada, somente será factível a contratação temporária com a existência de lei municipal definidora do regime jurídico aplicável. Impende salientar que as situações de permissividade previstas na lei devem limitar-se às hipóteses de necessidade excepcional e temporária, de modo a não ensejar situação fraudadora da obrigatoriedade de certame isonômico e impessoal para o exercício de funções públicas permanentes.

Note-se, portanto, que as contratações temporárias são

efetuadas para enfrentar necessidades inadiáveis, provisórias (não

planejadas), por conta das quais, via de regra, não se justificaria a

admissão de servidores em caráter permanente. Representa, em verdade,

uma alternativa para atendimento emergencial e momentâneo à

necessidade de serviço.

Feitas estas considerações, temos que a contratação temporária

por excepcional interesse público deverá, a princípio, observar o teor da lei

local que disciplina o tema, o qual não nos fora oportunizado conhecer.

Tratando-se de uma exceção à regra do concurso público, a

seleção, em regra, se dá por intermédio de processo seletivo simplificado.

Entretanto, é comum que haja previsão nas leis que regulamentam o

mencionado inciso IX do art. 37 de contratação, sobretudo, na área da

saúde, por intermédio de análise curricular, nas hipóteses de surtos

endêmicos, calamidades e força maior ou nas hipóteses em que seja

flagrante o prejuízo ao interesse público em virtude do lapso temporal,

ainda que exíguo, do processo seletivo. Vejamos o teor do art. 3º da Lei nº

8.745/1993 (lei que regulamenta a contratação temporária por excepcional

interesse público no âmbito da União):

"Art. 3º O recrutamento do pessoal a ser contratado, nos

termos desta Lei, será feito mediante processo seletivo simplificado

sujeito a ampla divulgação, inclusive através do Diário Oficial da

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União, prescindindo de concurso público.

§ 1º A contratação para atender às necessidades

decorrentes de calamidade pública, de emergência ambiental e de

emergências em saúde pública prescindirá de processo seletivo.

§ 2º A contratação de pessoal, nos casos do professor

visitante referido nos incisos IV e V e nos casos das alíneas a, d, e,

g, l e m do inciso VI e do inciso VIII do caput do art. 2º desta Lei,

poderá ser efetivada em vista de notória capacidade técnica ou

científica do profissional, mediante análise do curriculum vitae.

§ 3º As contratações de pessoal no caso das alíneas h e i

do inciso VI do art. 2º desta Lei serão feitas mediante processo

seletivo simplificado, observados os critérios e condições

estabelecidos pelo Poder Executivo".

Neste ponto, vale consignar que no âmbito da União foi editada a

MP nº 922/2020, a qual altera a Lei Federal nº 8.745/1993 (lei que

disciplina a contratação temporária por excecional interesse público no

âmbito da União) para possibilitar, entre outros, a dispensa da realização

do processo seletivo para atendimento das demandas provenientes de

calamidade pública e emergências em saúde pública.

Nesta esteira, caso não haja tal previsão na lei local, factível sua

alteração em igual sentido, até mesmo por medida provisória, se houver

previsão desta espécie legislativa na Constituição do Estado correspectivo

e na LOM.

Por derradeiro, vale mencionar a recente a edição da Portaria

639 do Ministério da Saúde que instituiu a Ação Estratégica "O Brasil

Conta Comigo - Profissionais da Saúde", com objetivo de proporcionar

capacitação aos profissionais da área de saúde nos protocolos clínicos do

Ministério da Saúde para o enfrentamento da Covid-19. A referida ação

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estratégica se baseia, principalmente, pela criação de um cadastro geral

de profissionais da área da saúde habilitados para atuar em território

nacional, que poderá ser consultado pelos entes federados, em caso de

necessidade, para orientar suas ações de enfrentamento à COVID-19.

Isto posto, concluímos objetivamente a presente consulta na forma

das razões exaradas.

É o parecer, s.m.j.

Maria Victoria Sá e Guimarães Barroso

Magno

Assessora Jurídica

Aprovo o parecer

Marcus Alonso Ribeiro Neves

Consultor Jurídico

Rio de Janeiro, 22 de abril de 2020.

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Parecer IBAM Nº 0859/2020

SM – Servidor Público. Suspensão do cumprimento das obrigações financeiras referentes a empréstimos consignados contraídos por servidores públicos estaduais e municipais. Competência legislativa privativa da União. Considerações.

CONSULTA:

Relata o consulente que, ante as medidas de contenção da

expansão da pandemia do Novo Coronavírus (COVID-19) encontra-se em trâmite na Assembleia Legislativa do Estado propositura que versa sobre a suspensão do cumprimento das obrigações financeiras referentes à empréstimos consignados contraídos por servidores estaduais e municipais por noventa dias.

Diante da situação relatada, indaga o consulente:

"1 - É competência dos Estados Membros legislar sobre

suspensão do pagamento dos empréstimos consignados contraídos pelos servidores?

2 - Caso seja de competência dos estados legislar sobre

o assunto, pode o Estado determinar que os servidores das prefeituras façam acompanhamento dos servidores no diálogo com as instituições financeiras? Tal prática não infringiria a autonomia municipal para organizar seu quadro de pessoal? Não configuraria "advocacia administrativa"?"

A consulta vem acompanhada da referida propositura.

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RESPOSTA:

Inicialmente, temos que a rápida expansão da pandemia do Novo Coronavírus (COVID-19) impôs sérias restrições ao nosso modo de vida, sendo certo que as recomendações de distanciamento social e de quarentena geram uma redução substancial da circulação de pessoas, que levam, por sua vez, a impactos sensíveis na capacidade financeira dos cidadãos.

Esse grande impacto nas fontes de rendas dos munícipes,

decerto, repercutirá em suas obrigações mensais, dentre as quais está, para muitos, manutenção de empreendimento e pagamento de verbas trabalhistas, pagamento do aluguel, de tributos e a aquisição de serviços e produtos básicos à suas subsistências e de suas famílias.

Neste contexto, o consulente nos relata que encontra-se em

trâmite na Assembleia Legislativa do Estado propositura com o intuito de suspensão do cumprimento das obrigações financeiras referentes à empréstimos consignados contraídos por servidores estaduais e municipais por noventa dias.

Não obstante, como sabido, compete à União legislar sobre

direito comercial e atividade bancária, na forma do art. 22, I c/c art. 192, ambos da Constituição Federal:

"Art. 22. Compete privativamente à União legislar sobre:

I - direito civil, comercial, penal, processual, eleitoral,

agrário, marítimo, aeronáutico, espacial e do trabalho;

/.../

VI - sistema monetário e de medidas, títulos e garantias

dos metais;

VII - política de crédito, câmbio, seguros e transferência

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de valores;"

"Art. 192. O sistema financeiro nacional, estruturado de

forma a promover o desenvolvimento equilibrado do País e a servir aos interesses da coletividade, em todas as partes que o compõem, abrangendo as cooperativas de crédito, será regulado por leis complementares que disporão, inclusive, sobre a participação do capital estrangeiro nas instituições que o integram."

Dentro do rol de atividades que possa ser subsumido no conceito

de atividade de natureza mercantil, inserto no ramo do direito comercial e do sistema financeiro nacional temos como núcleo dessas atividades (empréstimo pessoal, cheque especial, taxa de juros, condições de pagamento, moeda, câmbio, inflação, créditos, etc.).

Note-se, por oportuno, que a questão em tela não envolve

disciplina da forma de desconto em folha de empréstimos consignados de servidores, o que pode ser disciplinado pelo Chefe do Executivo do ente respectivo na forma do art. 61, § 1º, II, "c", da Constituição Federal, mas sim a suspensão temporária das obrigações advindas da própria operação financeira.

Desta sorte, lei de iniciativa estadual que pretenda legislar sobre

a suspensão das obrigações financeiras referentes a empréstimos consignados contraídos por servidores viola flagrantemente competência legislativa privativa da União e, por conseguinte, o pacto federativo insculpido no art. 1º da Constituição Federal.

Ademais, vale consignar que, na forma do art. 10, VI, da Lei nº

4.595/1964, compete ao Banco Central do Brasil, autarquia federal, exercer o controle do crédito sob todas as formas. Logo, eventual suspensão temporária das parcelas em virtude dos efeitos financeiros ocasionados pela pandemia do Novo Coronavírus devem ser regulamentada por intermédio de Resolução do Banco Central, tal como foi efetivado com a edição da Resolução/BACEN nº 4782/2020 (que por tempo determinado, em função de eventuais impactos da Covid-19 na

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economia, critérios temporários para a caracterização das reestruturações de operações de crédito, para fins de gerenciamento de risco de crédito).

Por derradeiro, vale registrar que no âmbito do Tribunal Regional

Federal da 1ª Região encontramos decisão de primeiro grau, que deferiu pedido de tutela de urgência em sede de ação popular, para, dentre outras medidas, determinar "aos bancos a suspensão das parcelas de créditos consignados concedidos a aposentados, seja pelo INSS ou pelo Regime Próprio, pelo período de 4 (quatro) meses, sem a cobrança de juros ou multa." (TRF1. 9ª Vara Federal Cível da SJDF. Ação Popular nº 1022484-11.2020.4.01.3400. Decisão de 24/04/2020).

Esclarecemos que a referida decisão, na forma do microssistema

da tutela coletiva, mais precisamente do art. 16 da Lei nº 7.347/1985 - lei da ACP- aplica-se apenas à base territorial deste órgão prolator, no caso no âmbito do Distrito Federal.

Por tudo que precede, concluímos objetivamente a presente

consulta no sentido da inviabilidade jurídica de projeto de lei que tramite na Assembleia Legislativa do Estado com o intuito de suspensão do cumprimento das obrigações financeiras referentes a empréstimos consignados contraídos por servidores públicos estaduais e municipais, ante a indevida ingerência em competência privativa da União, seus órgãos e autarquias.

É o parecer, s.m.j.

Priscila Oquioni Souto

Assessora Jurídica

Aprovo o parecer

Marcus Alonso Ribeiro Neves

Consultor Jurídico

Rio de Janeiro, 24 de abril de 2020.

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Parecer IBAM Nº 0871/2020

SM – Servidor Público. Medidas de contenção à expansão da pandemia do Novo Coronavírus (COVID-19). Redução da jornada de servidores sem redução da respectiva remuneração. Considerações.

CONSULTA:

Tendo em vista as medidas adotadas para contenção da expansão da pandemia do Novo Coronavírus (COVID-19), indaga o consulente acerca da possibilidade de redução da jornada laboral de servidores sem a redução das respectivas remunerações.

A consulta não veio documentada.

RESPOSTA:

Inicialmente, temos que a rápida expansão da pandemia do Novo

Coronavírus (COVID-19) impôs sérias restrições ao nosso modo de vida, sendo certo que as recomendações de distanciamento social e de quarentena geram uma redução substancial da circulação de pessoas, que levam, por sua vez, a impactos sensíveis na capacidade financeira dos cidadãos, bem como nos serviços prestados à população.

Dentro deste contexto, muitos municípios têm questionado

acerca da possibilidade de redução dos vencimentos de servidores, o que não seria possível à luz do postulado constitucional da irredutibilidade dos vencimentos (art. 37, XV, da Constituição Federal):

"Art. 37:(...)

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XV - o subsídio e os vencimentos dos ocupantes de cargos e empregos públicos são irredutíveis, ressalvado o disposto nos incisos XI e XIV deste artigo e nos arts. 39, § 4º, 150, II, 153, III, e 153, § 2º, I;"

Ainda acerca da irredutibilidade dos vencimentos, a possibilidade

de redução de remuneração de servidores efetivos ou comissionados por excesso de despesas de pessoal prevista no art. 23, §§ 1º e 2º da LC nº 101/2000 está com aplicabilidade suspensa por conta de decisão cautelar na ADI 2238/DF do STF (mencionada pelo consulente em sua consulta):

"EMENTA: CONSTITUCIONAL. MEDIDA CAUTELAR EM

AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE. LEI COMPLEMENTAR Nº 101, DE 04 DE MAIO DE 2000 (LEI DE RESPONSABILIDADE FISCAL). MEDIDA PROVISÓRIA Nº 1.980-22/2000. Lei Complementar nº 101/2000. Não- conhecimento.

(...)

XXV - Art. 23, §§ 1º e 2º: a competência cometida à lei

complementar pelo § 3º do art. 169 da Constituição Federal está limitada às providências nele indicadas, o que não foi observado, ocorrendo, inclusive, ofensa ao princípio da irredutibilidade de vencimentos. Medida cautelar deferida para suspender, no § 1º do art. 23, a expressão "quanto pela redução dos valores a eles atribuídos", e, integralmente, a eficácia do § 2º do referido artigo. "

Não obstante, não é isso que se indaga na presente

oportunidade. Aqui, a municipalidade pretende a redução da jornada laboral, contudo, sem a redução dos respectivos vencimentos.

Neste diapasão, em razão da autonomia que lhe fora outorgada

pela Constituição Federal (art. 18 c/c art. 30, I), pode o Município dispor sobre o regime jurídico de seus servidores, o qual caracteriza conjunto de regras que regem a relação entre a Administração e seu pessoal. Vale

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registrar, por oportuno, que é entendimento assente no âmbito dos Tribunais Superiores à inexistência de direito adquirido à manutenção do regime aplicável no momento da nomeação, motivo pelo qual pode ele vir a ser alterado a qualquer tempo, desde que por intermédio de lei.

Assim, compete ao Poder Executivo definir em lei a carga horária

dos cargos que compõem a sua estrutura administrativa. Releva frisar que o sistema constitucional vigente permite a fixação da jornada laboral em até 44 horas semanais e 8 horas diárias, conforme art. 7º, XIII, tratando-se de direito extensivo ao servidor público, por força da combinação com o art. 39, § 3º, da Lei Maior.

Vale alertar, outrossim, que a alteração da carga horária, assim

como sua fixação, deve se dar em conformidade com as peculiaridades das atividades inerentes ao cargo, não poderá importar em irredutibilidade de vencimentos (o que já relatado pelo consulente que não acontecerá) e precisa sempre atender ao interesse público. A majoração da carga horária, dentro deste contexto, deve se referir ao cargo conglobando todos os servidores nele providos, sob pena de violação aos postulados da impessoalidade e da moralidade.

Por derradeiro, vale destacar que, como se trata de uma

minoração temporária extraordinária em virtude da situação de calamidade pública instaurada pelo avanço da pandemia da COVID-19, a qual somente irá perdurar enquanto esta situação adversa se mantiver (pois ultrapassada está a jornada retornará ao normal), não temos propriamente uma redução da jornada dos servidores, de forma que a mesma deve ser instrumentalizada em conjunto com as demais medidas de combate à pandemia.

Tecidas estas considerações, é possível a diminuição temporária

da carga horária de cargos efetivos sem a redução dos respectivos vencimentos, desde que: (i) a mesma seja para o cargo (ou cargos), alcançando todos os servidores nele providos; (ii) reste comprovado interesse público em razão da pandemia; (iii) reste inequívoco que após cessar as razões de interesse público que fundamentam a medida, a

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carga horária originária será reestabelecida sem alteração nos vencimentos.

Isto posto, concluímos objetivamente a presente consulta na

forma das razões exaradas.

É o parecer, s.m.j.

Priscila Oquioni Souto

Assessora Jurídica

Aprovo o parecer

Marcus Alonso Ribeiro Neves

Consultor Jurídico

Rio de Janeiro, 27 de abril de 2020.

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Parecer IBAM Nº 0913/2020

PR – Previdência. Emergência de saúde pública decorrente do Coronavírus (Covid-19). Isolamento. Quarentena. Faltas ao serviço. Abono. Grupo de Risco. Medidas. Comentários.

CONSULTA:

A Consulente, Prefeitura, questiona se é legalmente possível o

afastamento, através do INSS, dos servidores enquadrados no grupo de

risco (mais de 60 anos ou imunodeprimidos), enquanto durar a

emergência de saúde pública decorrente do Coronavírus (Covid-19).

A Consulta não segue documentada.

RESPOSTA:

Como é sabido, dentre as medidas emergenciais de combate ao

Coronavírus (COVID-19), temos o isolamento e a quarentena.

O isolamento pode ser determinado por prescrição médica ou por

recomendação do agente de vigilância epidemiológica, por um prazo

máximo de 14 dias, podendo se estender por até igual período, conforme

resultado laboratorial que comprove o risco de transmissão.

A medida de isolamento prescrita por ato médico deverá ser

efetuada, preferencialmente, em domicílio, podendo ser feito em hospitais

públicos ou privados, conforme recomendação médica, a depender do

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estado clínico do paciente.

A quarentena pode ser determinada mediante ato administrativo

formal e devidamente motivado que deverá ser editada por Secretário de

Saúde do Município, ou pelo Prefeito e publicada no Diário Oficial e

amplamente divulgada pelos meios de comunicação.

A medida de quarentena será adotada pelo prazo de até 40 dias,

podendo se estender pelo tempo necessário para reduzir a transmissão

comunitária e garantir a manutenção dos serviços de saúde no território.

A extensão do prazo da quarentena dependerá de prévia

avaliação do Centro de Operações de Emergências em Saúde Pública

(COE-nCoV) previsto na Portaria GM/MS nº. 188/2020.

As ausências decorrentes das medidas de isolamento,

quarentena e demais medidas obrigatórias, como realização de exames,

testes, vacinação, tratamento, etc., serão consideradas faltas justificadas

ao serviço e serão abonadas pelo empregador, de acordo com o § 3º do

art. 3º da Lei nº. 13.979/2020.

Com fulcro na Lei nº. 13.982/2020, que altera a Lei nº. 8.213/91 e

a Lei nº. 13.979/2020, a Administração poderá deduzir do repasse das

contribuições à previdência social, observado o limite máximo do salário de

contribuição ao RGPS, o valor devido, nos termos do § 3º do art. 60 da

Lei nº. 8.213/91, ao segurado empregado cuja incapacidade temporária

para o trabalho seja comprovadamente decorrente de sua contaminação

pelo Coronavírus (COVID-19).

Assim, com relação aos empregados afastados por COVID-19, o

pagamento os 15 primeiros dias, pagos pela a empresa poderá ser

deduzido da contribuição previdenciária.

Quanto aos empregados do chamado grupo de risco, de acordo

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com a Nota Técnica Conjunta PGT/CODEMAT/CONAP nº. 02/2020, são

considerados integrantes de grupos populacionais mais vulneráveis os

maiores de 60 (sessenta) anos, portadores de doenças crônicas,

imunocomprometidos, gestantes e crianças.

A Occupational Safety and Health (OSHA) elaborou classificação

de graus de risco à exposição considerando as funções desempenhadas

pelos empregados públicos, assim compreendidos:

1. Risco muito alto de exposição: aqueles com alto potencial de contato

com casos confirmados ou suspeitos de COVID-19 durante

procedimentos médicos, laboratoriais ou post-mortem, tais como:

médicos, enfermeiras, dentistas, paramédicos, técnicos de

enfermagem, profissionais que realizam exames ou coletam

amostras e aqueles que realizam autopsias;

2. Risco alto de exposição: profissionais que entram em contato com

casos confirmados ou suspeitos de COVID-19, tais como:

fornecedores de insumos de saúde, e profissionais de apoio que

entrem nos quartos ou ambientes onde estejam ou estiveram

presentes pacientes confirmados ou suspeitos, profissionais que

realizam o transporte de pacientes, como ambulâncias, profissionais

que trabalham no preparo dos corpos para cremação ou enterro;

3. Risco mediano de exposição: profissionais que demandam o contato

próximo (menos de 2 metros) com pessoas que podem estar

infectadas com o novo Coronavírus (SARS-coV-2), mas que não são

considerados casos suspeitos ou confirmados; que tem contato com

viajantes que podem ter retornado de regiões de transmissão da

doença (em áreas sem transmissão comunitária); que tem contato

com o público em geral (escolas, ambientes de grande concentração

de pessoas, grandes lojas de comércio varejista) (em áreas com

transmissão comunitária);

4. Risco baixo de exposição: aqueles que não requerem contato com

casos suspeitos, reconhecidos ou que poderiam vir a contrair o vírus,

que não tem contato (a menos de 2 metros) com o público;

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profissionais com contato mínimo com o público em geral e outros

trabalhadores.

Aos empregados públicos que pertençam ao grupo de risco do

Coronavírus (Covid-19) consideradas as funções desempenhadas e o risco

de exposição devem ser priorizadas a antecipação de férias individuais ou

coletivas ou ainda o teletrabalho.

Quanto à antecipação de férias, o empregador deve informar ao

empregado sobre a antecipação de suas férias com antecedência de, no

mínimo, 48 horas, por escrito ou por meio eletrônico, com a indicação do

período a ser gozado pelo empregado, sendo que as férias não poderão

ser gozadas em períodos inferiores a cinco dias corridos; e poderão ser

concedidas por ato do empregador, ainda que o período aquisitivo a elas

relativo não tenha transcorrido.

Quanto às férias coletivas, o empregador poderá, a seu critério,

conceder férias coletivas e deverá notificar o conjunto de empregados

afetados com antecedência de, no mínimo, 48 horas, não aplicáveis o

limite máximo de períodos anuais e o limite mínimo de dias corridos

previstos na CLT.

É importante destacar que caso o empregado público já se

encontra em isolamento ou em quarentena, este não poderá gozar de férias

individuais ou coletivas, uma vez que já se encontra afastado das

atividades, sendo o respectivo período de afastamento caracterizado como

faltas legais abonadas pelo empregador.

Quanto ao teletrabalho, a Reforma Trabalhista, introduzida pela

Lei nº. 13.467/17, a qual vigora desde 11/11/2017, acrescentou, dentre

outros, o art. 75-B à CLT, que considera teletrabalho a prestação de

serviços preponderantemente fora das dependências do empregador, com

a utilização de tecnologias de informação e de comunicação que, por sua

natureza, não se constituam como trabalho externo.

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Assim sendo, considerando o exposto, somente é factível o

afastamento remunerado (auxílio-doença) aos empregados que tiverem

confirmação de contaminação pelo Coronavírus (Covid-19), mas não é

possível o afastamento preventivo pelo INSS de empregados públicos

ainda que pertençam ao grupo de risco do Coronavírus (Covid-19),

devendo ser priorizadas as medidas alternativas como concessão de

férias individuais ou coletivas ou o teletrabalho enquanto durar a

emergência de saúde pública decorrente do Coronavírus (Covid-19).

É o parecer, s.m.j.

Jaber Lopes Mendonça Monteiro

Consultor Técnico

Aprovo o parecer

Marcus Alonso Ribeiro Neves

Consultor Jurídico

Rio de Janeiro, 30 de abril de 2020.

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Parecer IBAM Nº 0920/2020

SM – Servidor Público. Grupo de risco. Afastamento. Considerações.

CONSULTA:

A Prefeitura Municipal relata que foi expedido decreto com o seguinte dispositivo:

"Art. 12. Os servidores maiores de 60 anos e gestantes

que compõem risco de aumento de mortalidade por COVID-19 ficarão dispensados do serviço por tempo indeterminado, devendo ser convocados pela chefia imediata para retorno ao serviço, com antecedência de 05 dias."

Informa que o referido dispositivo foi revogado por

decreto posterior.

Relata o consulente, no entanto, que após a sua revogação,

alguns servidores efetivos (hipertensos, maiores de 60 anos ou gestantes) estão protocolando atestado médico, pleiteando o direito de realizar suas atividades em casa. Informa que os aludidos servidores sustentam que fazem jus a este direito, haja vista que se encontram na zona de risco.

Diante deste fato, os questionamentos que surgem são os

seguintes: no caso dos hipertensos, mesmo que nunca tenham sido incluídos em momento algum nos decretos do Município, a Administração teria alguma obrigatoriedade de os deixar trabalhando em casa? Quanto aos maiores de 60 (sessenta) anos e as gestantes, mesmo que tenham sido incluídos no decreto municipal que foi posteriormente revogado, teriam direito realizar os trabalhos em casa, mesmo se Administração não autorizasse e não conferisse respaldo legal? Por derradeiro, no caso sem tela a orientação seria seguir os Decretos Municipais que não concediam os direitos requeridos, mesmo que Decreto Estadual ou Medida Provisória Federal tivesse orientação em sentido diverso?

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A consulta não vem documentada.

RESPOSTA:

Inicialmente, temos que que a rápida expansão da pandemia do novo Coronavírus (COVID-19) impôs sérias restrições ao nosso modo de vida. Como tem sido amplamente divulgado, as estratégias de distanciamento social contribuem, principalmente, para evitar o colapso nos sistemas de saúde locais, salvaguardando vidas.

Cabe observar que os Municípios, assim como os Estados e a

União, dispõem de autonomia político-administrativa nos termos do art. 18 da Constituição da República (CRFB). Nessa autonomia se insere a competência para dispor sobre o regime jurídico de seus servidores públicos (art. 39, caput, da CRFB), que deve ser exercida nos termos e nos limites da própria CRFB. Assim é que na gestão de pessoal, cabe ao Município buscar permanentemente a redução dos riscos inerentes ao trabalho, por meio de normas de saúde, higiene e segurança, nos precisos termos do art. 39, § 3º c/c art. 7º, XXII, da CRFB.

Dentre as medidas de contenção à expansão da pandemia da

COVID-19 adotadas pela União, Estados e Municípios estão a instituição do home office, trabalho remoto e teletrabalho para os ocupantes de cargos que admitem estas modalidades de exercícios de suas atribuições, bem como a concessão de férias coletivas, licenças e escalas para os servidores cujas atribuições somente podem se dar de forma presencial.

É bem verdade que, com exceção das gestantes e lactantes às

quais não é permitido nenhuma forma de trabalho insalubre (ADI nº 5938), não há disposição expressa que trate do afastamento de servidores integrantes do grupo de risco pelos entes federados. No entanto, isso não significa possa a Administração Pública ignorar a pandemia, colocando em risco a saúde dos servidores e da população. É evidente que se há restrições a atividades privadas não essenciais, e mesmo as atividades essenciais devem ser exercidas com cuidados especiais, com maior razão deve a Administração Pública tomar medidas de precaução no âmbito de suas repartições.

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Assim é que em âmbito federal foi editada a Instrução Normativa nº 19, de 12 de março de 2020, pela Secretaria de Gestão e Desempenho de Pessoal do Ministério da Economia, estabelecendo critérios e parâmetros gerais para o trabalho remoto. No âmbito do Estado do Espírito Santo, está em vigor o Decreto Nº 4629- R de 15 de abril de 2020, que autoriza o trabalho remoto para servidores em grupos de risco, além de estabelecer um regime de revezamento para os servidores de jornada presencial e remota. Do mesmo modo, deve o Município disciplinar o assunto em âmbito local, tendo em vista as peculiaridades locais e a necessidade de continuidade administrativa.

Cabe observar que mesmo em atividades essenciais e quando

não se trate necessariamente de servidores em grupos de risco, o trabalho remoto pode se mostrar não apenas viável como recomendável. Exemplo maior é a recente Lei nº 13.988/2020, que regulamenta a telemedicina. Com efeito, mesmo na área no âmbito dos serviços públicos e privados de saúde, quando for possível evitar o trânsito de pessoas nas unidades e o contato desnecessário de médicos e demais profissionais da saúde com pacientes, é medida de precaução de forte impacto positivo contra a expansão da pandemia.

É de se noticiar que há decisões no âmbito dos Tribunais que

vem determinando cautelarmente o afastamento de servidores integrantes do chamado grupo de risco da COVID-19 de suas atividades. O Tribunal Regional do Trabalho da 2ª Região concedeu liminar no bojo de ação civil pública (ACP nº 1000353-66.2020.5.02.0058) proposta pelo Sindicato dos trabalhadores públicos da saúde no Estado de São Paulo para determinar, dentre outras medidas, "a liberação imediata das atividades presenciais os

empregados substituídos processualmente que estejam enquadrados no

grupo de risco, assim compreendidos os idosos com 60 anos ou mais, as

gestantes, os portadores de doenças respiratórias crônicas, cardiopatias,

diabetes, hipertensão, doenças renais, ou de quaisquer outras afecções

que deprimam o sistema imunológico, assegurando-lhes todos os direitos

e benefícios do contrato de trabalho".

No mesmo sentido o Tribunal de Justiça do Distrito Federal e Territórios - TJDFT, através da 7ª Vara de Fazenda Pública, no bojo do processo nº 0702293-75.2020.8.07.0018, determinou o afastamento

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imediato de servidores do Sistema de Limpeza Urbana do Distrito Federal que se enquadrem no grupo de risco do novo Coronavírus.

Assim, a revogação do decreto editado pelo chefe do Executivo

não impedirá eventuais questionamentos relacionados ao regime de trabalho de servidores, em especial daqueles que portem atestado e laudos que atestem sua condição de integrantes de grupos de risco. Em vista de tudo que foi exposto, passamos a responder aos questionamentos formulados.

A) No caso dos hipertensos, mesmo que nunca tenham sido

incluídos em momento algum nos decretos do Município, a Administração teria alguma obrigatoriedade de os deixar trabalhando em casa?

A condição de grupo de risco e orientação de afastamento de

atividades ou de restrições à exposição ao risco é uma avaliação médica que não cabe em sede de parecer jurídico. No entanto, recomenda-se que, uma vez apostas em atestado médico, as orientações médicas sejam seguidas pela administração, viabilizando-se o regime de teletrabalho ou home office para redução dos riscos inerentes ao trabalho nos termos do art. 39, § 3º c/c art. 7º, XXII, da CRFB, ou quando se tratem de atividades que não possam ser realizadas remotamente, a adoção de procedimentos especiais em relação a pessoas de grupos de risco de acordo com orientações médicas, que podem tratar do deslocamento para locais ou realização de funções que não envolvam contato com público, ou com objetos e coisas potencialmente contaminantes, ou ainda o fornecimento de equipamentos de proteção individual que confiram maior grau de proteção.

B) Quanto aos maiores de 60 (sessenta) anos e as gestantes,

mesmo que tenham sido incluídos no decreto municipal que foi posteriormente revogado, teriam direito a realizar os trabalhos em casa, mesmo se Administração não autorizasse e não conferisse respaldo legal?

As gestantes devem ser afastadas de qualquer condição de

trabalho insalubre, nos termos da decisão proferida pelo STF na ADI nº 5938. Por outro lado, existe para o Município o dever de redução dos

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riscos inerentes ao trabalho por meio de normas de saúde, higiene e segurança (art. 39, § 3º c/c art. 7º, XXII, da CFFB), e, como se sabe, a todo dever corresponde um direito subjetivo, no caso, o direito do servidor de ter destinatário de normas destinadas e reduzir os riscos à sua saúde. Portanto, a completa e total omissão do Município na elaboração de normas de saúde e segurança do trabalho de servidores no âmbito do enfrentamento à pandemia do novo Coronavírus (COVID-19) pode configurar, em casos concretos, lesão a direito subjetivo do servidor. A Constituição, como se sabe, não tem expressões ou palavras inúteis.

C) Por derradeiro, no caso em tela, a orientação seria seguir os

Decretos Municipais que não concediam os direitos requeridos, mesmo que Decreto Estadual ou Medida Provisória Federal tivesse orientação em sentido diverso?

O Município dispõe de autonomia para tratar do assunto, não se

aplicando as normas estaduais e federais relativas aos servidores das respectivas esferas. Isso não significa que possa quedar-se inerte, não buscando de forma alguma reduzir os riscos inerentes ao trabalho em virtude da expansão da infecção viral do Covid-19, ignorando recomendações médicas.

É o parecer, s.m.j.

Gustavo da Costa Ferreira M. dos Santos

Consultor Técnico

Aprovo o parecer

Marcus Alonso Ribeiro Neves Consultor Jurídico

Rio de Janeiro, 30 de abril de 2020.

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Parecer IBAM Nº 0924/2020

SM – Servidor Público. Projeto de lei que suspende os prazos de validade dos concursos públicos durante a pandemia do Novo Coronavírus (COVID-19). Iniciativa parlamentar. Análise da validade. Considerações.

CONSULTA:

Indaga o consulente acerca da validade de projeto de lei, de

iniciativa parlamentar, que suspende os prazos de validade dos concursos

públicos durante a pandemia do Novo Coronavírus (COVID-19).

A consulta vem acompanhada da referida propositura.

RESPOSTA:

Inicialmente, cumpre deixar consignado que o legislador

constituinte institui, como regra, o ingresso de servidores públicos nos

quadros de pessoal da Administração Pública mediante a realização de

concurso público, nos termos do art. 37, II, da Lei Maior.

O referido dispositivo consagra o princípio constitucional da

obrigatoriedade do concurso público para provimento dos cargos e

empregos públicos, tendo por fito aferir as aptidões pessoais e selecionar

os melhores candidatos ao provimento dos cargos e funções públicas. De

outro lado, o mesmo dispositivo garante ao servidor efetivo o direito de

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ocupar o cargo e exercer a função, pela qual foi regularmente investido.

Assentada a obrigatoriedade do concurso público para o

provimento dos cargos públicos como instrumento dos postulados da

eficiência, da moralidade e da impessoalidade (art. 37, caput, da

Constituição Federal), temos que o legislador constituinte estabeleceu um

prazo máximo dentro do qual a Administração Pública deverá nomear os

aprovados no certame. Vejamos:

"Art. 37: (...)

III - o prazo de validade do concurso público será de até

dois anos, prorrogável uma vez, por igual período;"

Este prazo tem por finalidade, de um lado, a segurança jurídica,

pois, como sabido, ressalvadas situações excepcionalíssimas (onde se

verifique superveniência, imprevisibilidade, gravidade e necessidade

devidamente justificados), os aprovados dentro do número de vagas

previstas no edital possuem direito subjetivo à posse, assim como também

possuem tal direito os aprovados, ainda que fora do número de vagas

disponíveis no edital do concurso, se a Administração Pública manifesta,

por ato inequívoco, a necessidade do preenchimento de novas vagas

durante o prazo de validade do certame. De outro lado, o prazo de

validade atende ao princípio da economicidade (imagine se a Administração

Pública precisasse realizar concursos públicos para um mesmo cargo a

todo momento) e ao postulado da eficiência (pois pode ser mais vantajoso

para Administração Pública ter em seus quadros os primeiros colocados

de um novo certame).

Desta forma, o edital do certame deverá estabelecer o prazo de

validade do concurso o qual não poderá ser superior a dois anos, bem

como a possibilidade de prorrogação deste prazo, a qual deverá observar

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o lapso temporal anteriormente fixado.

Feitas estas considerações, temos que a rápida expansão da

pandemia do Novo Coronavírus (COVID-19) impôs sérias restrições ao

nosso modo de vida, sendo certo que as recomendações de

distanciamento social e de quarentena geram uma redução substancial da

circulação de pessoas, que levam, por sua vez, a impactos sensíveis nas

mais diversas áreas da sociedade.

Neste novo contexto de enfrentamento de uma ameaça em

escala mundial, muitas questões surgem todos os dias, mormente no

âmbito da Administração Pública que precisa adotar medidas para

salvaguarda dos cidadãos e do bem comum.

Com relação aos certames com fases iniciais ainda em

andamento, a solução não revela maiores dificuldades, na medida em que

as provas de concurso público podem ser adiadas mediante alteração do

edital do concurso ou edital extraordinário, desde que amplamente

divulgados e publicados em imprensa oficial. O que, diga-se de passagem,

não é raro de acontecer.

De outra feita, como deve a Administração Pública proceder com

os concursos já homologados, uma vez que o prazo de validade do

certame é deflagrado com o ato de homologação. Reiteramos que, com

relação aos candidatos aprovados dentro do número de vagas previsto no

edital, uma vez que os mesmos possuem direito subjetivo à posse (salvo

verificação de superveniência, imprevisibilidade, gravidade e necessidade

devidamente justificados), mesmo ultrapassado o prazo de validade do

certame o direito permanecerá hígido.

Nesta esteira, mencionamos que encontram-se em trâmite no

Congresso Nacional dois projetos de lei que versam acerca do tema, quais

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sejam: PL nº 1441/2020 e PL nº 1405/2020. O primeiro suspende os

prazos de validade dos concursos públicos federais durante a pandemia

causada pelo Novo Coronavírus (Covid-19). O segundo projeto de lei

suspende o prazo de validade dos concursos públicos já homologados

durante a pandemia da COVID-19 em âmbitos federal, estadual, municipal

e do Distrito Federal.

Com relação especificamente ao PL nº 1405/2020, por impor tal

determinação a todos os entes da federação, alertamos que o mesmo

viola flagrantemente a autonomia dos entes federados e, por

consequência, ao próprio Pacto Federativo insculpido sobretudo nos arts.

1º e 18 da Constituição Federal.

Em prosseguimento, registramos que o CNJ expediu a

Recomendação nº 64/2020 exortando os Tribunais a suspensão dos

prazos de validade dos concursos públicos realizados durante a vigência

do Decreto Legislativo nº 6, de 20 de março de 2020, como meio de

mitigar o impacto decorrente das medidas de combate à contaminação

causada pelo Coronavírus.

Para o CNJ, a suspensão temporária dos prazos de validade dos

concursos é ação oportuna por atender ao postulado da economicidade e

do interesse público na medida em que evitará desgastes e perdas de

recursos orçamentários usados para a realização dos certames.

Feitas estas considerações, temos que o consulente nos envia

para análise projeto de lei, de iniciativa parlamentar, que pretende a

suspensão dos prazos de validade dos concursos públicos em âmbito

municipal.

Em que pese, o STF, no julgamento da ADI nº 2672, já tenha

decidido que a matéria pertinente aos concursos públicos não se insere no

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âmbito daquelas de iniciativa privativa do Poder Executivo, por se tratar de

assunto relativo à condição para se chegar à investidura em cargo público,

que é momento anterior ao da caracterização do candidato como servidor,

como a decisão de suspender o prazo de validade dos concursos exige

uma análise acerca dos postulados da eficiência e da economicidade, à

luz da realidade local, entendemos que esta decisão, de caráter

excepcional, deve se dar no âmbito de cada poder e sequer necessita da

edição de uma lei para tanto.

A suspensão dos prazos de validade dos concursos enquanto

perdurar a situação de pandemia deve se dar por decreto, no âmbito do

Poder Executivo, e resolução ou portaria conforme disponha o Regimento

Interno, no âmbito do Poder Legislativo.

Isto posto, concluímos objetivamente a presente consulta na

forma das razões exaradas.

É o parecer, s.m.j.

Priscila Oquioni Souto

Assessora Jurídica

Aprovo o parecer

Marcus Alonso Ribeiro Neves

Consultor Jurídico

Rio de Janeiro, 30 de abril de 2020.

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Parecer IBAM Nº 0926/2020

SM – Servidor Público. Servidora efetiva ocupante do cargo de enfermeira em gozo de licença sem vencimentos. Esforços para o enfrentamento da pandemia da COVID-19. Contratação temporária por excepcional interesse público até o retorno da servidora já convocada. Considerações.

CONSULTA:

Relata o consulente que determinada servidora efetiva ocupante do cargo de enfermeira encontra-se em gozo de licença sem vencimentos.

Ante os esforços para o combate da pandemia do Novo

Coronavírus, a servidora em questão já foi devidamente convocada, entretanto, indaga o consulente acerca da possibilidade de se efetuar contratação temporária por excepcional interesse público para cobrir a falta da servidora durante um pequeno lapso temporal até o seu retorno.

A consulta não veio documentada.

RESPOSTA:

Inicialmente, cumpre deixar consignado que a regra no âmbito da

Administração Pública é o ingresso no serviço público de candidatos aprovados em regular concurso público de provas ou provas e títulos, nos termos do art. 37, inciso II, da Constituição Federal. As principais exceções à indigitada regra da obrigatoriedade do concurso público encontram-se no mesmo art. 37 a saber: os cargos comissionados (inciso V) e a

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contratação temporária de excepcional interesse público (inciso IX).

Desse modo, compete ao Poder Executivo a iniciativa de lei municipal para definir o regime necessariamente jurídico-administrativo em que se dará a contratação por excepcional interesse público, bem como os casos em que será admitida (art. 61, § 1º, II, "c", da Constituição Federal). O contrato, por sua vez, deverá ser obrigatoriamente a termo e delimitado no tempo.

Ressaltamos, por oportuno, que, ante o princípio da legalidade,

expresso no art. 37, caput, da Constituição Federal, e por ser o art. 37, inciso IX, norma constitucional de eficácia limitada, somente será factível a contratação temporária com a existência de lei municipal definidora do regime jurídico aplicável. Impende salientar que as situações de permissividade previstas na lei devem limitar-se às hipóteses de necessidade excepcional e temporária, de modo a não ensejar situação fraudadora da obrigatoriedade de certame isonômico e impessoal para o exercício de funções públicas permanentes. No que tange às hipóteses autorizadoras da contratação temporária por excepcional interesse público, destacamos, por oportuno, que o STF no julgamento do RE nº 658026/MG, julgado sob a sistemática dos recursos repetitivos e noticiado no informativo nº 742, ao analisar a constitucionalidade de lei municipal que regulamentava o art. 37, inciso IX da Lei Maior em âmbito local, estabeleceu a inconstitucionalidade das lei que tratem da contratação temporária por excepcional interesse público que instituam hipóteses abrangentes e genéricas de contratações temporárias sem concurso público e tampouco especifique a contingência fática que evidencie situação de emergência.

Segundo o Egrégio STF, o art. 37, IX, da Constituição Federal

deve ser interpretado restritivamente, de modo que a lei que excepcione a regra de obrigatoriedade do concurso público não pode ser genérica. Frisou, ainda, que a existência de meios ordinários, por parte da Administração, para atender aos ditames do interesse público, mesmo que em situação de urgência e de temporariedade, obstaria a contratação temporária. Além disso, sublinhou que a justificativa de a contratação de

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pessoal buscar suprir deficiências na área de educação, ou de apenas ser utilizada para preencher cargos vagos, não afastaria a inconstitucionalidade da norma. No ponto, o STF asseverou que a lei municipal que regular a contratação temporária de profissionais para realização de atividade essencial e permanente, sem descrever as situações excepcionais e transitórias que fundamentassem esse ato, como calamidades e exonerações em massa, por exemplo, é de igual forma inconstitucional.

Desta sorte, a contratação temporária se efetiva por intermédio

na celebração de um contrato administrativo respaldado em uma situação excepcional que se amolde às hipóteses autorizadoras devidamente descritas na lei do ente que regulamente o tema.

Feitas estas considerações de ordem geral acerca da

contratação temporária por excepcional interesse público, temos que, a princípio, observados os requisitos da lei local que versa acerca do tema (cujo teor não nos fora dado conhecer) não vislumbramos óbices para a contratação temporária.

Vale o registro de que, ante a necessidade do combate da

expansão da pandemia da COVID-19, no âmbito da União foi editada a MP nº 922/2020, a qual altera a Lei Federal nº 8745/1993 (lei que disciplina a contratação temporária por excecional interesse público no âmbito da União) para possibilitar, entre outros, a dispensa da realização do processo seletivo para atendimento das demandas provenientes de calamidade pública e emergências em saúde pública.

Ainda sobre as formas de contratação de pessoal para combate

à pandemia, recomendamos a leitura do Parecer/IBAM nº 0808/2020.

Por derradeiro, tendo em vista que não nos foram repassadas

maiores informações acerca da convocação, nem sobre como o Estatuto dos servidores local trata da licença sem vencimentos, não podemos deixar de registrar que, via de regra, a interrupção/revogação da licença por razões de interesse público exige o retorno imediato do servidor. Desta

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sorte, salvo previsão diversa no Estatuto ou motivo razoável para o não retorno imediato da servidora (p. ex: estar residindo em outro município ou mesmo no exterior), mister a instauração de procedimento para apuração de eventual penalidade e aplicação da respectiva sanção cabível.

Isto posto, concluímos objetivamente a presente consulta na

forma das razões exaradas.

É o parecer, s.m.j.

Priscila Oquioni Souto

Assessora Jurídica

Aprovo o parecer

Marcus Alonso Ribeiro Neves

Consultor Jurídico

Rio de Janeiro, 04 de maio de 2020.

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Parecer IBAM Nº 0927/2020

SM – Servidor Público. Novo Coronavírus (Covid-19). Trabalho remoto. Servidora gestante e servidora maior de 60 anos. Comentários.

CONSULTA:

A Prefeitura Municipal relata que foi expedido decreto com o

seguinte dispositivo:

"Art. 12. Os servidores maiores de 60 anos e gestantes

que compõem risco de aumento de mortalidade por COVID-19 ficarão dispensados do serviço por tempo indeterminado, devendo ser convocados pela chefia imediata para retorno ao serviço, com antecedência de 05 dias."

Informa que o referido dispositivo foi revogado por decreto

posterior. Informa, ainda, que duas servidoras que atuam em cargos comissionados, uma gestante (que atua como coordenadora da atenção primária em saúde) e uma servidora (chefe de Divisão de Finanças que tem mais de 60 anos), querem assinar um termo de responsabilidade que as autorize a trabalhar. Isto é, as servidoras em questão não querem ficar em casa.

Diante desse fato, a dúvida que surge é a seguinte: essas

servidoras, consideradas da zona de risco, podem abrir mão do direito de ficar em casa e ir trabalhar normalmente, uma vez que essa é a sua vontade? Caso o artigo que determina que elas fiquem em casa permaneça revogado, elas poderão retornar aos trabalhos, independente de assinar termo de responsabilidade?

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A consulta não vem documentada.

RESPOSTA:

Primeiramente, cabe reiterar integralmente os termos do Parecer

nº 0920/2020, que versa sobre o mesmo assunto.

Na presente consulta, indaga-se a respeito da situação de duas

servidoras que desejam abrir mão do regime de trabalho remoto para trabalhar presencialmente: uma gestante e outra maior de 60 (sessenta) anos.

Em primeiro lugar, cabe observar que o trabalho remoto é um

trabalho normal. Quem trabalha remotamente deve exercer suas funções com igual eficiência e presteza daquele que trabalha presencialmente, cumprindo integralmente os deveres do cargo, inclusive a jornada de trabalho. O trabalho remoto se viabiliza pela existência de tecnologias contemporâneas que transmitem sons, imagens, documentos e quaisquer outros dados.

Feita essa ressalva, cabe observar que a situação da gestante é

um tanto diversa da situação da pessoa com mais de 60 anos. Como já apontado no Parecer nº 0929/2020, a ADI 5398 fixou o entendimento de que é vedado qualquer trabalho insalubre por pessoas gestantes. Embora o quadro da pandemia não permita qualificar todo o ambiente de trabalho como ambiente insalubre, não há dúvida que o trabalho presencial submete a gestante a contato mais frequente com outras pessoas e, assim, a maior risco de contágio, bem como nos deslocamentos de casa para o trabalho e do trabalho para casa, e mesmo nos deslocamentos a serviço. Vale, ainda, dizer que os efeitos do novo Coronavírus (Covid-19) no organismo ainda não são totalmente conhecidos, e a infecção viral em gestantes pode vir a provocar incertas patologias no nascituro, temporárias ou até mesmo permanentes.

Assim, as regras protetivas que restringem o trabalho presencial

da gestante dizem respeito à proteção da maternidade e à infância, que são

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valores constitucionais, conforme diz o art. 6º da CRFB, que o eleva a direito social de todos os cidadãos, e verdadeiro princípio fundamental. É de se observar que, sendo direito que decorre do princípio constitucional da proteção à maternidade e à infância, o afastamento de atividades presenciais deve ser objeto de intepretação que amplie ao máximo o seu âmbito de proteção e que dê ao seu conteúdo normativo máxima eficácia. Não se olvida que, para além do direito subjetivo da servidora, o afastamento das atividades presenciais se qualifica como medida de proteção à primeira infância, precavendo possíveis anomalias na formação do feto ou patologias permanentes, e até mesmo a vida do nascituro.

Portanto, o afastamento da gestante das atividades presenciais

faz cumprir, em relação à criança, o dever da família, da sociedade e do Estado de assegurar, com absoluta prioridade, como diz a Constituição, o direito à vida, à saúde, à dignidade e ao respeito buscando assegurar a proteção do bebê contra a negligência (art. 227, da CRFB). Diz respeito, ainda, aos direitos positivados nos arts. 3º, 4º e 7º da Lei nº 8.069/1990 (Estatuto da Criança e do Adolescente), in verbis:

"Art. 3º. A criança e o adolescente gozam de todos os

direitos fundamentais inerentes à pessoa humana, sem prejuízo da proteção integral de que trata esta Lei, assegurando-se-lhes, por lei ou por outros meios, todas as oportunidades e facilidades, a fim de lhes facultar o desenvolvimento físico, mental, moral, espiritual e social, em condições de liberdade e de dignidade.

(...)

Art. 4º. É dever da família, da comunidade, da sociedade

em geral e do poder público assegurar, com absoluta prioridade, a efetivação dos direitos referentes à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao esporte, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e comunitária.

(...)

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Art. 7º. A criança e o adolescente têm direito a proteção à vida e à saúde, mediante a efetivação de políticas sociais públicas que permitam o nascimento e o desenvolvimento sadio e harmonioso, em condições dignas de existência." (grifo nosso)

É importante ressaltar ainda, que sendo um direito que decorre

de valores fundamentais e princípios fundantes, como é a proteção à maternidade e à infância (art. 6º, caput, da CRFB c/c art. 227 e arts. 3º. 4º e 7º da Lei nº 8.069/1990), o afastamento das atividades presenciais passa a ter características próprias de direitos fundamentais, conforme assevera Nathalia Masson:

"Direitos fundamentais não são passíveis de alienação,

deles não se pode dispor, tampouco prescrevem. Inaliebilidade é característica que exclui quaisquer atos de disposição, quer material — destruição física do bem —, quer jurídica — renúncia, compra e venda ou doação. (...) Ressalte-se que, como a indisponibilidade justifica-se pela proteção que se deva dar à dignidade da pessoa humana, nem todos os direitos fundamentais devem ser interpretados como indisponíveis. Indisponíveis seriam tão somente os direitos que intentam preservar a vida biológica — sem a qual não há substrato físico para o desenvolvimento da dignidade — ou que visam resguardar as condições ordinárias de saúde física e mental, assim como a liberdade de tomar decisões sem coerção externa." (MASSON, Nathalia. "Manual de Direito Constitucional". Bahia: Juspodium, 2016. p. 194)

Assim é que, no âmbito da União, por exemplo, a servidora

gestante recebe um tratamento diverso das outras hipóteses de afastamento para trabalho remoto, não havendo exceções (cf. http:// www.in.gov.br/en/web/dou/-/instrucao-normativa-n-21-de-16-de-marco-de-2020-248328867 e https:// www.servidor.gov.br/servicos/faq/corona-virus-covid-19-medidas-de-prevencao-cautela-e-reducao-de-transmissibilidade#Pergunta11). Como afirmado no Parecer nº 0920/2020, o Município não tem obrigação de seguir as normas federais, mas tem obrigação de fazer cumprir as normas e princípios constitucionais, e nesse

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caso, parece-nos que não há total segurança jurídica para que o Município aceite renúncia ao trabalho remoto requerido pela servidora gestante, uma vez que ao poder público também é direcionado, pela Constituição e pelo ECA, o dever de proteção à maternidade e à infância, além de estar o ato administrativo de aceite da renúncia sujeito a questionamentos futuros quanto à juridicidade em vista da irrenunciabilidade e indisponibilidade dos direitos fundamentais, seja por instâncias de controle, seja pela própria servidora, que pode ter se sentido coagida ou pressionada a fazê-lo.

Sem embargo, trata-se o tema trazido pelo consulente questão

de alta indagação, uma vez que constitui verdadeira colisão de princípios fundamentais, notadamente o princípio da proteção à maternidade e à infância (art. 6º, da CRFB) com o princípio da autonomia da mulher e o seu direito ao desenvolvimento pessoal e profissional, que corresponde ao núcleo essencial da liberdade individual protegida pelo princípio da dignidade humana (art. 1º, III, da CRFB).

Assim é que, no caso da servidora maior de 60 (sessenta) anos,

em que se trata de servidora ocupante de cargo de direção que pode não ser totalmente compatível com o trabalho remoto, admite-se a flexibilização da regra. No entanto, cabe reiterar que o Município deve envidar esforços para proteção da saúde de todos os servidores, dando preferência às atividades remotas quando viáveis, sendo inclusive a própria servidora em questão, que ocupa cargo de direção, destinatária dessas orientações, devendo criar mecanismos que incluam nos fluxos de trabalho o máximo possível o trabalho remoto e práticas que evitem a propagação da infecção viral.

Conclui-se, portanto, que não há total segurança jurídica para que

a gestante abra mão do exercício do trabalho remoto, sendo recomendável não aceitação de renúncia mesmo que por vontade da servidora. Quanto à servidora com mais de 60 (sessenta) anos que ocupa cargo de direção, entendemos que a regra pode ser flexibilizada. Porém, reiteramos os termos do Parecer nº 0920/2020, no sentido de que o Município deve envidar esforços para reduzir os riscos inerentes ao trabalho por meio de normas de saúde, higiene e segurança, e que o

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trabalho remoto é um trabalho normal, isto é, no trabalho remoto devem ser cumpridas as atribuições do cargo e todos os deveres a ele inerentes.

É o parecer, s.m.j.

Gustavo da Costa Ferreira M. dos Santos

Consultor Técnico

Aprovo o parecer

Marcus Alonso Ribeiro Neves

Consultor Jurídico

Rio de Janeiro, 04 de maio de 2020.

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Parecer IBAM Nº 0931/2020

PG – Processo Legislativo. Projeto de lei que dispõe sobre o reconhecimento de serviço de relevância a todo servidor público do Município que se encontre laborando na garantia da continuidade dos serviços públicos. Iniciativa parlamentar. Análise da validade. Considerações.

CONSULTA:

Indaga o consulente acerca da validade de projeto de lei, de iniciativa parlamentar, que dispõe sobre o reconhecimento de serviço de relevância a todo servidor público do Município que se encontre laborando na garantia da continuidade dos serviços públicos.

A consulta vem acompanhada da referida propositura.

RESPOSTA:

Inicialmente, temos que a propositura em tela, ao que tudo

indica, pretende a concessão de uma homenagem aos servidores municipais que continuam laborando em prol dos serviços públicos não obstante a situação de calamidade instaurada pela pandemia do Novo Coronavírus (COVID-19).

Neste diapasão, insta salientar que não existem óbices à

concessão de honrarias, condecorações, comendas, prêmios e troféus pelo Poder Legislativo. Desta maneira, importa ressaltar que a Câmara tem autonomia para deliberar sobre os seus serviços (interna corporais), por

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meio de seu Regimento Interno, em respeito ao princípio da legalidade (art. 37, caput, Constituição Federal). Sobre isso, vale destacar a lição de HELY LOPES MEIRELLES em Direito Municipal Brasileiro. 12ª ed. São Paulo: Malheiros, p. 582: "A Câmara de Vereadores, como Poder Legislativo do Município, colegiado, desfruta das prerrogativas próprias desse órgão, quais sejam: compor sua Mesa Diretiva, elaborar seu regimento interno, organizar seus serviços e deliberar livremente sobre os assuntos de interesse de sua economia interna".

A prestação de homenagens e concessão de honrarias é prática

corrente nos Municípios, justamente com o intuito de prestigiar pessoas e entidades que, por sua atividade, tenham contribuído de algum modo para o desenvolvimento local ou para o bem-estar coletivo. Assim, são homenageadas não só pessoas vivas, mas também pessoas já falecidas, estas brindadas, muitas vezes, com o nome de ruas, edifícios e praças públicas. Não restam dúvidas, portanto, de que se trata de matéria de interesse local, inserindo-se na esfera de competência típica do Município (art. 30, I, da Constituição Federal).

Compete ao Poder Legislativo proceder a homenagens diversas.

Isso geralmente é feito em sessão solene na Câmara como forma de manifestar publicamente a importância dos homenageados à comunidade, posto que os homenageados, geralmente, são pessoas que contribuíram de maneira relevante para o desenvolvimento da cidade.

Via de regra, as leis orgânicas determinam que a Câmara

Municipal tem competência exclusiva para conceder títulos e honrarias, mediante Decreto Legislativo ou Resolução do Poder Legislativo, conforme dispuser o Regimento Interno. No entanto, nada impede que, no exercício da autonomia conferida pela Constituição em seu art. 18, o Município estabeleça requisitos legais diversos como, por exemplo, necessidade de lei ordinária para regular a matéria e competência exclusiva da Câmara para conceder o título, segundo o que dispuser a referida lei.

Em suma, resta claro que a concessão de honrarias pelo

Legislativo deve se dar nos estritos limites da LOM e exigirá, ainda, a

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análise dos demais princípios reitores da atividade administrativa encartados no caput do art. 37 da Lei Maior, mormente os da moralidade e impessoalidade.

Acerca deste último, recomendamos a leitura do Parecer/IBAM nº

1048/2014. Não obstante tudo que foi até aqui apresentado, não podemos relegar o fato de que o corrente ano é de eleições municipais e o TSE, mesmo ante as medidas de contenção ao avanço da pandemia do Novo Coronavírus (COVID-19) que vem sendo adotas pelos entes federados mantém, até a presente data, o Calendário Eleitoral.

Neste ponto, há que se esclarecer que não é qualquer dos atos

citados na Lei que implica em descumprimento da regra eleitoral. Há que influenciar na disputa, a teor do disposto no caput do art. 73 da Lei das Eleições. Em outras palavras, a conduta vedada deve ser de tal intensidade que possa comprometer a isonomia de chances entre os candidatos.

Os atos e ações do Poder Público, incapazes de desequilibrar a

disputa eleitoral ou de influenciarem no resultado das eleições, não devem sofrer limitação, pois o bem jurídico protegido encontra-se salvaguardado. O Direito Eleitoral não possui o condão de impor injustificadas barreiras às atividades normalmente desenvolvidas pela Administração Pública, salvo aquelas inseridas na própria Constituição Federal (art. 14, § 9º), sob pena de afrontar outros princípios constitucionais.

Desta forma, em tese, não há impedimento para que os

parlamentares continuem a conceder, aprovar e a entregar homenagens. Frise-se, por oportuno, que a vedação legal se refere à publicidade do ato institucional e não à sua realização. Neste sentido, é possível destacar a jurisprudência do TSE:

Recurso especial. Agravo de instrumento. Seguimento

negado. Agravo regimental. Art. 73, VI, b, da Lei no 9.504/97. Autorização e veiculação de propaganda institucional. Art. 74 da Lei no 9.504/97. Desrespeito ao princípio da impessoalidade. Basta

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a veiculação de propaganda institucional nos três meses anteriores ao pleito para que se configure a conduta vedada no art. 73, VI, b, da Lei no 9.504/97, independentemente de a autorização ter sido concedida ou não nesse período. Precedentes. O desrespeito ao princípio da impessoalidade, na propaganda institucional, no período de três meses anteriores ao pleito, com reflexos na disputa, configura o abuso e a violação ao art. 74 da Lei no 9.504/97. Em recurso especial, é vedado o reexame de provas. Agravo regimental não provido. (Ac. nº 5.304, de 25.11.2004, rel. Min. Luiz Carlos Madeira.)

(...) Conduta vedada. Prefeito. Publicidade institucional.

Período proibido. Art. 73, inciso VI, alínea b, da Lei no 9.504/97. Desnecessidade. Verificação. Potencialidade. Desequilíbrio. Pleito. (...) 2. Não é preciso aferir se a publicidade institucional teria potencial para afetar a igualdade de oportunidades entre candidatos nos pleitos eleitorais, na medida em que as condutas descritas pelo legislador no art. 73 da Lei das Eleições necessariamente tendem a refletir na isonomia entre os candidatos. (Ac. nº 21.536, de 15.6.2004, rel. Min. Fernando Neves).

Assim, entendemos pela possibilidade de a Casa Legislativa

realizar homenagens em ano eleitoral, desde não afetem a igualdade de oportunidades entre candidatos nos pleitos eleitorais.

Pois bem. Tecidas estas considerações de ordem geral acerca

da concessão de honrarias, fato é que a presente propositura não concede a homenagem, mas determina que será reconhecido por ato administrativo individualizado, como "Serviço de Relevância", todo servidor público do Município que esteja laborando na garantia da continuidade dos serviços públicos.

Tal determinação não menciona como se dará o reconhecimento

por ato administrativo, a quem incumbe este reconhecimento. Caberia ao Poder Executivo local em flagrante violação ao postulado da separação dos

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poderes? Não resta claro na redação do dispositivo.

Reiteramos que a concessão das honrarias pelo Legislativo deve

se dar nos estritos limites da LOM e exigirá, ainda, a análise dos demais princípios reitores da atividade administrativa encartados no caput do art. 37 da Lei Maior, mormente os da moralidade e impessoalidade.

Ademais, a criação e regulamentação de concessão de

homenagens pelo Poder Legislativo não se dá por intermédio de lei, mas sim de resolução ou decreto legislativo, na forma do Regimento Interno, conforme explicitado anteriormente.

Por tudo que precede, concluímos objetivamente a presente

consulta no sentido de que a propositura em tela, da forma como apresentada e redigida, não merece prosperar.

É o parecer, s.m.j.

Priscila Oquioni Souto

Assessora Jurídica

Aprovo o parecer

Marcus Alonso Ribeiro Neves

Consultor Jurídico

Rio de Janeiro, 04 de maio de 2020.

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Parecer IBAM Nº 0935/2020

CL – Competência Legislativa Municipal. Suspensão do pagamento de empréstimos consignados contraídos por servidores públicos. Competência da União. Considerações.

CONSULTA:

A Câmara consulente indaga acerca da competência do

Município para propor lei suspendendo o pagamento de empréstimos

consignados em decorrência da pandemia do Covid-19.

RESPOSTA:

Inicialmente, temos que a rápida expansão da pandemia do Novo

Coronavírus (COVID-19) impôs sérias restrições ao nosso modo de vida,

sendo certo que as recomendações de distanciamento social e de

quarentena geram uma redução substancial da circulação de pessoas,

que levam, por sua vez, a impactos sensíveis na capacidade financeira

dos cidadãos.

Esse grande impacto nas fontes de rendas dos munícipes,

decerto, repercutirá em suas obrigações mensais, dentre as quais está,

para muitos, manutenção de empreendimento e pagamento de verbas

trabalhistas, pagamento do aluguel, de tributos e a aquisição de serviços e

produtos básicos à suas subsistências e de suas famílias.

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Neste contexto, o consulente questiona a competência municipal

para legislar sobre a suspensão do pagamento de empréstimos

consignados contraídos por servidores públicos municipais.

Não obstante, como sabido, compete à União legislar sobre

direito comercial e atividade bancária, na forma do art. 22, I c/c art. 192,

ambos da Constituição Federal:

"Art. 22. Compete privativamente à União legislar sobre:

I - direito civil, comercial, penal, processual, eleitoral,

agrário, marítimo, aeronáutico, espacial e do trabalho; (...)

VI - sistema monetário e de medidas, títulos e garantias

dos metais;

VII - política de crédito, câmbio, seguros e transferência

de valores;"

"Art. 192. O sistema financeiro nacional, estruturado de

forma a promover o desenvolvimento equilibrado do País e a servir

aos interesses da coletividade, em todas as partes que o

compõem, abrangendo as cooperativas de crédito, será regulado

por leis complementares que disporão, inclusive, sobre a

participação do capital estrangeiro nas instituições que o integram."

Dentro do rol de atividades que possa ser subsumido no conceito

de atividade de natureza mercantil, inserto no ramo do direito comercial e

do sistema financeiro nacional temos como núcleo dessas atividades

(empréstimo pessoal, cheque especial, taxa de juros, condições de

pagamento, moeda, câmbio, inflação, créditos, etc.).

Note-se, por oportuno, que a questão em tela não envolve

disciplina da forma de desconto em folha de empréstimos consignados de

servidores, o que pode ser disciplinado pelo Chefe do Executivo do ente

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respectivo na forma do art. 61, § 1º, II, "c", da Constituição Federal, mas

sim a suspensão temporária das obrigações advindas da própria operação

financeira.

Desta sorte, lei de iniciativa municipal que pretenda legislar sobre

a suspensão das obrigações financeiras referentes a empréstimos

consignados contraídos por servidores viola flagrantemente competência

legislativa privativa da União e, por conseguinte, o pacto federativo

insculpido no art. 1º da Constituição Federal.

Ademais, vale consignar que, na forma do art. 10, VI, da Lei nº

4.595/1964, compete ao Banco Central do Brasil, autarquia federal,

exercer o controle do crédito sob todas as formas. Logo, eventual

suspensão temporária das parcelas em virtude dos efeitos financeiros

ocasionados pela pandemia do Novo Coronavírus devem ser

regulamentada por intermédio de Resolução do Banco Central, tal como

foi efetivado com a edição da Resolução/BACEN nº 4782/2020 (que por

tempo determinado, em função de eventuais impactos da Covid-19 na

economia, critérios temporários para a caracterização das reestruturações

de operações de crédito, para fins de gerenciamento de risco de crédito).

Por derradeiro, vale registrar que no âmbito do Tribunal Regional

Federal da 1ª Região encontramos decisão de primeiro grau, que deferiu

pedido de tutela de urgência em sede de ação popular, para, dentre outras

medidas, determinar "aos bancos a suspensão das parcelas de créditos

consignados concedidos a aposentados, seja pelo INSS ou pelo Regime

Próprio, pelo período de 4 (quatro) meses, sem a cobrança de juros ou

multa". (TRF1. 9ª Vara Federal Cível da SJDF. Ação Popular nº

1022484-11.2020.4.01.3400. Decisão de 24/04/2020)

Entretanto, a referida decisão foi derrubada em segunda

instância sob o argumento de que não cabe à Justiça intervir nas

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competências atribuídas à autoridade monetária.

Por tudo que precede, concluímos objetivamente a presente

consulta no sentido da inviabilidade jurídica de projeto de lei que tramite no

âmbito do Município com o intuito de suspensão do cumprimento das

obrigações financeiras referentes a empréstimos consignados contraídos

por servidores públicos municipais, ante a indevida ingerência em

competência privativa da União, seus órgãos e autarquias.

É o parecer, s.m.j.

Maria Victoria Sá e Guimarães Barroso

Magno

Assessora Jurídica

Aprovo o parecer

Marcus Alonso Ribeiro Neves

Consultor Jurídico

Rio de Janeiro, 04 de maio de 2020.

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Parecer IBAM Nº 0980/2020

SM – Servidor Público. Suspensão das contratações por tempo determinado para atender à necessidade temporária de excepcional interesse público durante a emergência de saúde provocada pelo novo Coronavírus. Considerações.

CONSULTA:

Indaga-se sobre a possibilidade de lei de iniciativa do Chefe do Poder

Executivo Municipal alterar a legislação local que rege as contratações por

tempo determinado para atender à necessidade temporária de excepcional

interesse público, para prever a possibilidade

de suspensão dessas contratações durante a emergência de saúde

provocada pelo novo Coronavírus, estabelecendo que, durante esse

período de suspensão do contrato, será pago aos contratados apenas

30% de sua remuneração original.

RESPOSTA:

A contratação por tempo determinado para atender à

necessidade temporária de excepcional interesse público deve ser

regulamentado em lei, conforme artigo 37, IX, da Constituição Federal. Os

entes federados, por sua autonomia político administrativa, garantida pelo

sistema constitucional brasileiro, são competentes para editar normas

acerca de sua organização administrativa e do regime jurídico aplicável

aos seus agentes públicos. Assim, é a lei local que deve regulamentar as

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contratações temporárias em âmbito municipal, respeitadas as disposições

constitucionais sobre a matéria.

Em outras palavras, lei municipal pode regulamentar a matéria,

desde que não afronte as diretrizes constitucionais. Nesse sentido, já

entendeu o Supremo Tribunal Federal que:

Recurso extraordinário. Repercussão geral reconhecida.

Ação direta de inconstitucionalidade de lei municipal em face de

trecho da Constituição do Estado de Minas Gerais que repete texto

da Constituição Federal. Recurso processado pela Corte Suprema,

que dele conheceu. Contratação temporária por tempo

determinado para atendimento a necessidade temporária de

excepcional interesse público. Previsão em lei municipal de

atividades ordinárias e regulares. Definição dos conteúdos jurídicos

do art. 37, incisos II e IX, da Constituição Federal. Descumprimento

dos requisitos constitucionais. Recurso provido. Declarada a

inconstitucionalidade da norma municipal. Modulação dos efeitos.

1. O assunto corresponde ao Tema nº 612 da Gestão por Temas

da Repercussão Geral do portal do STF na internet e trata, "à luz

dos incisos II e IX do art. 37 da Constituição Federal, [d]a

constitucionalidade de lei municipal que dispõe sobre as hipóteses

de contratação temporária de servidores públicos". 2. Prevalência

da regra da obrigatoriedade do concurso público (art. 37, inciso II,

CF). As regras que restringem o cumprimento desse dispositivo

estão previstas na Constituição Federal e devem ser interpretadas

restritivamente. 3. O conteúdo jurídico do art. 37, inciso IX, da

Constituição Federal pode ser resumido, ratificando-se, dessa

forma, o entendimento da Corte Suprema de que, para que se

considere válida a contratação temporária, é preciso que: a) os

casos excepcionais estejam previstos em lei; b) o prazo de

contratação seja predeterminado; c) a necessidade seja

temporária; d) o interesse público seja excepcional; e) a

necessidade de contratação seja indispensável, sendo vedada a

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contratação para os serviços ordinários permanentes do Estado, e

que devam estar sob o espectro das contingências normais da

Administração. 4. É inconstitucional a lei municipal em comento, eis

que a norma não respeitou a Constituição Federal. A imposição

constitucional da obrigatoriedade do concurso público é

peremptória e tem como objetivo resguardar o cumprimento de

princípios constitucionais, dentre eles, os da impessoalidade, da

igualdade e da eficiência. Deve-se, como em outras hipóteses de

reconhecimento da existência do vício da inconstitucionalidade,

proceder à correção da norma, a fim de atender ao que dispõe a

Constituição Federal. 5. Há que se garantir a instituição do que os

franceses denominam de la culture de gestion, a cultura de gestão

(terminologia atualmente ampliada para ‘cultura de gestão estratégica') que consiste na interiorização de um vetor do

progresso, com uma apreensão clara do que é normal, ordinário, e

na concepção de que os atos de administração devem ter a

pretensão de ampliar as potencialidades administrativas, visando à

eficácia e à transformação positiva. 6. Dá-se provimento ao recurso

extraordinário para o fim de julgar procedente a ação e declarar a

inconstitucionalidade do art. 192, inciso III, da Lei nº 509/1999 do

Município de Bertópolis/MG, aplicando-se à espécie o efeito ex

nunc, a fim de garantir o cumprimento do princípio da segurança

jurídica e o atendimento do excepcional interesse social.(RE

658026, Relator(a): Min. DIAS TOFFOLI, Tribunal Pleno, julgado

em 09/04/2014, ACÓRDÃO ELETRÔNICO REPERCUSSÃO

GERAL - MÉRITO DJe-214 DIVULG 30-10-2014 PUBLIC

31-10-2014) (Grifos nossos.).

O tema, ressalte-se, deve ser tratado em lei de iniciativa do

Chefe do Poder Executivo, por força do artigo 61, §1º, II, alíneas "a" e "c",

da Constituição da República que, pelo princípio da simetria das formas,

deve ser reproduzido também por Estados e Municípios.

Neste caso concreto, indaga- se se projeto de lei de autoria do

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Prefeito Municipal poderia alterar a lei municipal que regulamenta as

contratações temporárias para prever a possibilidade de os contratos

temporários serem suspensos e a remuneração dos contratados

temporários reduzida para 30% do seu valor original, enquanto durar a

emergência de saúde provocada pelo novo Coronavírus, já que esses

contratados estariam, em razão da pandemia, impedidos de realizar suas

atividades.

Não tivemos acesso ao texto do projeto de lei que se pretende

aprovar. Logo, podemos fazer apenas algumas reflexões gerais sobre o

tema.

É possível a suspensão dos contratos temporários durante o

período em que, em razão da emergência de saúde, os contratados

temporários estejam impedidos de realizar suas atividades.

Antes, contudo, de determinar a suspensão dos contratos

temporários, o Poder Público deve adotar medidas menos drásticas, tais

como conceder férias aos contratados temporários durante o período de

emergência de saúde e alterar os contratos para instituir o teletrabalho,

sempre que possível.

Não há dúvida do grande impacto econômico e social provocado

pela emergência de saúde causada pelo novo Coronavírus. As dificuldades

sociais e econômicas podem e devem ser enfrentadas por meio de

medidas e programas de assistência social. Também por esses motivos,

deve o Município evitar a suspensão ou rescisão dos contratos

temporários.

Nessa linha, as orientações do Tribunal de Contas do Estado do

Paraná esclarecem que, embora seja possível suspender ou rescindir o

contrato, essas medidas não necessariamente devem ser adotadas:

A paralisação das atividades não implica,

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necessariamente, a rescisão/suspensão de contratos temporários. É necessária a adequação entre a medida adotada e os motivos que a ensejaram, razão pela qual deve ser considerado o quadro fático.

Por exemplo, a suspensão das aulas em virtude da

pandemia é transitória e existem medidas alternativas durante esse

período, tais como a utilização de recursos tecnológicos para

ministrar aulas à distância, a disponibilização de atividades

pedagógicas on-line ou para retirada na unidade educacional, a

concessão de férias aos professores com direito ao gozo e a

utilização de banco de horas. Assim, o contrato pode ser alterado

para que as atividades do servidor possam ser desenvolvidas de

outra forma, se isso for possível e se não ficarem

descaracterizadas as atividades originalmente desenvolvidas.

Caso os contratos temporários não cumpram mais

interesse público com a paralisação das atividades, contudo, não é

vedada, a rescisão e a suspensão dos contratos temporários,

ainda que tais possibilidades não estejam expressamente previstas

em cláusula contratual, pois são prerrogativas da Administração

Pública. Nesse sentido, mesmo com prévia decretação de situação

de emergência ou calamidade pública, o gestor deve consignar,

individual e formalmente, as razões de interesse público que

ensejaram a edição do ato administrativo de rescisão/suspensão.

O gestor também deve assegurar o exercício do

contraditório e da ampla defesa ao contratado, bem como a

recomposição dos prejuízos decorrentes do distrato ou da

alteração contratual. Considerando a possibilidade de que a

rescisão ou a suspensão do contrato acarretem prejuízos, que

deverão ser indenizados, cabe ao gestor verificar se tais

intervenções no contrato efetivamente estão em consonância com

o interesse público.

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Por fim, cumpre destacar que a presente orientação não

vincula futuros julgamentos em caso concreto sobre a matéria, pois

tem como premissa a excepcionalidade da situação advinda da

pandemia. (Disponível em: http://

www1.tce.pr.gov.br/conteudo/infotce-pr-coronavirus-medidas-do-

tce-orientacoes/327885/area/254) (Grifos nossos.)

Assim, lei municipal de iniciativa do Chefe do Poder Executivo

pode regulamentar a suspensão das contratações por tempo determinado

durante a emergência de saúde provocada pela pandemia de Covid-19 se

a continuidade dos contratos já não atender ao interesse público.

A lei pode também determinar o pagamento de 30% do valor

originalmente devido ao contratado temporário durante o período de

suspensão do contrato. Destaque-se que o pagamento do valor mínimo

correspondente a 30% da remuneração mesmo durante a suspensão do

contrato de trabalho é razoável e foi o parâmetro adotado pela União

Federal na Medida Provisória nº 936/2020 que instituiu Programa de

Manutenção do Emprego e da Renda para enfrentamento do estado de

calamidade pública e de emergência de saúde provocados pelo novo

Coronavírus.

Suspensos os contratos, ficam também suspensos seus prazos,

que serão retomados, sem a necessidade de realização de novas

contratações, quando a execução dos contratos puder também ser

retomada.

A edição de lei sobre a matéria, todavia, não é condição

essencial para a suspensão dos contratos que pode ser efetuada por ato

administrativo.

Ainda que exista lei que regulamente a matéria, ademais, a lei,

geral e abstrata, não tem o condão de suspender os contratos específicos.

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A análise da necessidade e pertinência da suspensão deve ser

feita em caso a caso para cada contrato específico. Os contratos deverão

ser suspensos por ato administrativo devidamente motivado com

fundamentação que demonstre a existência de interesse público na

suspensão do contrato, devendo ser garantido ao contratado o pleno

exercício dos direitos ao contraditório e à ampla defesa.

Lembremos também, como bem ressaltou o TCE-PR nas

instruções acima colacionadas, que eventuais prejuízos sofridos pelo

contratado podem ter que ser indenizados.

Ressalte-se, por oportuno, que, caso não exista a possibilidade

de realização do trabalho e não exista interesse público na continuidade

do contrato temporário, este pode até mesmo ser rescindo antes de seu

termo final, caso exista previsão legal ou contratual que autorize a rescisão

do contrato por ato do Poder Público, o que também pode fazer surgir o

dever de indenizar o contratado por eventuais prejuízos.

Sobre o tema, é e ilustrativo o seguinte julgado do Tribunal de

Justiça do Estado da Bahia:

APELAÇÃO CÍVEL. MANDADO DE SEGURANÇA.

SENTENÇA DENEGATÓRIA DA SEGURANÇA. CONTRATAÇÃO

POR NECESSIDADE TEMPORÁRIA DE EXCEPCIONAL

INTERESSE PÚBLICO. RESCISÃO PELA ADMINISTRAÇÃO

ANTES DO PRAZO FINAL DO CONTRATO. POSSIBILIDADE.

INTERESSE PÚBLICO. CONVENIÊNCIA E OPORTUNIDADE.

ATO DEVIDAMENTE MOTIVADO. AUSÊNCIA DE DIREITO À

REINTEGRAÇÃO. SENTENÇA MANTIDA. RECURSO

IMPROVIDO. 1. A contratação temporária por necessidade de

excepcional interesse público consiste em vínculo precário com a

Administração Pública, que, ao contrário daquele originário da

aprovação em concurso público, não garante estabilidade ao

servidor contratado. 2. O vínculo pode ser rescindido com o advento

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do prazo final de duração do contrato e a rescisão por

iniciativa do contratado, na esteira do art. 9º da Lei Municipal n.

644/2003, que regulamenta no âmbito do Município de Jacobina as

contratações temporárias nos termos do art. 32, IX da CRFB. 3.

Também é possível a rescisão do contrato unilateralmente pela

Administração Pública, por razões de conveniência e oportunidade,

quando não mais estiver presente o interesse público na

manutenção do vínculo, tratando-se, portanto, de ato discricionário,

que não dispensa, no entanto, a devida motivação. Precedentes do

STJ. 4. Além disso, o próprio contrato celebrado entre as partes

previu, em sua cláusula décima, § 1º, que "o Contratante poderá

rescindir administrativamente o presente Contrato, a depender de

conveniência e interesse público ou nas hipóteses previstas na

Lei". 5. No caso dos autos, o ato de rescisão unilateral antecipada

do contrato se deu de maneira motivada, com base em fundamento

apto a apontar a não subsistência do interesse público na

manutenção da contratação temporária, qual seja, a realização de

concurso público para o provimento efetivo dos cargos perante a

Administração Municipal. Diante deste quadro, não há falar em

ilegalidade da rescisão unilateral do contrato antes do fim do prazo

pré estabelecido. Precedentes do TJBA. 6. Recurso improvido.

(Classe: Apelação, Número do Processo:

0008291-34.2012.8.05.0137, Relator (a): Carmem Lucia Santos

Pinheiro, Quinta Câmara Cível, Publicado em: 20/08/2015) (TJ-BA

- APL: 00082913420128050137, Relator: Carmem Lucia Santos

Pinheiro, Quinta Câmara Cível, Data de Publicação: 20/08/2015)

(Grifos nossos.)

Por todo o exposto, concluímos que lei municipal de iniciativa do

Prefeito Municipal pode regulamentar a suspensão, com o pagamento de

30% do valor devido ao contratado, de contratos por tempo determinado

para atender a necessidade de excepcional interesse público durante a

emergência de saúde provocada pelo novo Coronavírus. A edição de lei,

porém, não é condição essencial para viabilizar a suspensão dos

contratos.

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A suspensão dos contratos, além disso, independentemente da

existência lei que regulamente a matéria, deverá ser analisada e efetuada

para cada contrato específico, por meio de ato administrativo devidamente

fundamentado que demonstre a existência de interesse público na

suspensão do contrato, garantindo-se ao contratado o direito à ampla

defesa e ao contraditório.

Ressalte-se, por fim, que a suspensão dos contratos é medida

drástica com forte impacto na vida dos contratados, bem como pode fazer

surgir o dever do Poder Público de indenizar o contratado pelos prejuízos

sofridos. Assim, medidas menos gravosas, tais como a concessão de

férias aos contratados durante a emergência de saúde e a instituição de

teletrabalho devem, se possível, ser adotadas, evitando-se, desse modo, a

suspensão do contrato.

É o parecer, s.m.j.

Júlia Alexim Nunes da Silva

Consultora Técnica

Aprovo o parecer

Marcus Alonso Ribeiro Neves

Consultor Jurídico

Rio de Janeiro, 08 de maio de 2020.

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Parecer IBAM Nº 0983/2020

SM – Servidor Público. Criação de gratificação especial para servidores lato senso que se encontrem atuando na linha de frente do combate à pandemia do Novo Coronavírus (COVID-19). Considerações.

CONSULTA:

Indaga o consulente acerca da possibilidade de criação de

gratificação especial para servidores lato senso (efetivos, comissionados e contratados temporariamente por excepcional interesse público) se encontrem atuando na linha de frente do combate à pandemia do Novo Coronavírus (COVID-19).

A consulta não veio documentada.

RESPOSTA:

Inicialmente, cumpre consignar que as normas relativas aos

servidores municipais reputam-se assunto de exclusiva competência legislativa do Município (art. 39, caput, da Constituição Federal), por força da autonomia político-administrativa que lhe foi outorgada pela Constituição de 1988, nos termos dos seus arts. 1º, 18, 29 e 30. Cabe ao Município, pois, a organização do regime funcional de seus servidores, incluindo-se, aí, as regras sobre a composição do sistema remuneratório e demais vantagens e benefícios funcionais. Para tanto, impõe-se observar os comandos constitucionais dirigidos ao servidor público, em especial nos arts. 37 a 41, bem como os preceitos das Leis de caráter complementar.

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No tocante à remuneração dos servidores municipais, impõe-se a obediência aos preceitos constitucionais atinentes à matéria, pelo que cabe destacar, em particular, os critérios para a composição do sistema remuneratório dos servidores (art. 39, § 1º), o teto dos vencimentos pagos pelo Executivo (art. 37, XII), a vedação de vinculação ou equiparação de quaisquer espécies remuneratórias (art. 37, XIII) e a existência de prévia dotação orçamentária suficiente para atender às projeções de despesa com pessoal e aos acréscimos dela decorrentes, além de autorização específica na Lei de Diretrizes Orçamentárias (art. 169, § 1º).

Em se tratando de vantagem funcional aplicável a todos os

servidores públicos municipais, é importante frisar que matéria relativa a direitos e deveres dos servidores públicos reputa-se de iniciativa reservada ao Chefe do Executivo, consoante o disposto do art. 61, § 1º, II, "c" da Constituição Federal, preceito aplicável aos Municípios por força da simetria das formas, uma vez que decorre do princípio fundamental da separação dos Poderes consagrado no art. 2º. Dentro do contexto apresentado, as vantagens são gênero do qual são espécies as gratificações de serviço, sendo assuntos intimamente ligados a direitos e deveres dos servidores, razão pela qual a matéria recai na competência privativa do Chefe do Poder Executivo, segundo Hely Lopes Meirelles, as vantagens, gênero a que pertencem os adicionais e as gratificações, podem ser pro labore facto, devidas pelo trabalho feito (no passado), ou pro labore faciendo, devidas pelo trabalho sendo feito (no presente). Podem ser, ainda, ex facto temporis, as que decorrem do tempo de serviço (ex.: adicional por tempo de serviço), ex facto officii, as devidas pelo exercício de funções especiais (ex.: gratificação por exercício de função de confiança), propter laborem, em função das condições anormais em que o serviço é prestado (ex.: periculosidade, insalubridade, produtividade), ou propter personam, em razão de condições pessoais do servidor (ex.: titulação). O renomado mestre distingue as gratificações de serviço nos seguintes termos:

"Gratificação de serviço - Gratificação de serviço (propter

laborem) é aquela que a Administração institui para recompensar riscos ou ônus decorrentes de trabalhos normais executados em

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condições anormais de perigo ou de encargos para o funcionário, tais como os serviços realizados com risco de vida e saúde, ou prestados fora do expediente, da sede ou das atribuições ordinárias do cargo. O que caracteriza essa modalidade de gratificação é a sua vinculação a um serviço comum, executado em condições excepcionais para o funcionário, ou a uma situação normal do serviço, mas que acarreta despesas extraordinárias para o servidor. Nessa categoria de gratificações entram, dentre outras, as que a Administração paga pelos trabalhos realizados com risco de vida e saúde; pelos serviços extraordinários; pelo exercício do magistério; pela representação de gabinete; pelo exercício em determinadas zonas ou locais; pela execução de trabalho técnico ou científico não decorrente do cargo; pela participação em banca examinadora ou comissão de estudo ou de concurso; pela transferência de sede (ajuda de custo); pela prestação de serviços fora da sede (diárias). Essas gratificações são devidas ao servidor somente enquanto estiver prestando o serviço que as ensejam, porque são retribuições pecuniárias pro labore faciendo ou são propter laborem. Cessado o trabalho que lhes dá causa, ou desaparecidos os motivos excepcionais e transitórios que a justificam, extingue-se a razão de seu pagamento. Daí por que não se incorporam automaticamente ao vencimento, nem são auferidas na disponibilidade e na aposentadoria". (In: MEIRELLES, Hely Lopes. Direito Administrativo. 25ª ed. São Paulo: Malheiros, 2000. p. 409). (Grifos nossos).

Feitas estas considerações, em tese, ao menos para os

servidores efetivos e para os contratados temporários por excepcional interesse público (se a lei local que regulamenta o inciso IX do art. 37 da Constituição Federal assim permitir), factível a instituição da referida gratificação especial.

Antes de aprofundarmos mais o tema, especificamente com

relação aos servidores comissionados, os quais por determinação constitucional exercem exclusivamente funções de chefia, direção e assessoramento e se submetem a um regime de dedicação exclusiva,

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registramos que nem em tese se admite a percepção da gratificação. Isto porque, o cargo em comissão, informado pelo regime de dedicação exclusiva, não pode ser cumulado com outra gratificação ou encargo remunerado qualquer. Corroborando a presente ilação:

"APELAÇÃO CÍVEL - MANDADO DE SEGURANÇA -

SERVIDOR PÚBLICO -APOSENTADORIA - CUMULAÇÃO DE FUNÇÃO GRATIFICADA E VANTAGENS DE CARGO EM COMISSÃO- INVIABILIDADE -CORREÇÃO DO ATO PELO TRIBUNAL DE CONTAS ILEGITIMIDADE PASSIVA DA AUTORIDADE DITA COATORA - DENEGAÇÃO - DECISÃO ACERTADA- RECURSO IMPROVIDO". (TJPR - 3ª Câmara Cível. AC nº. 974163 PR 0097416-3. J. 25/02/2003. Rel. Des. Paulo Roberto Hapner).

Afastada a possibilidade de concessão da gratificação aos

comissionados, retornamos ao estudo do tema com relação aos servidores efetivos e aos contratados temporários por excepcional interesse público.

Adiante, tendo em vista que até a presente data o TSE mantém o

Calendário Eleitoral (Resolução nº 23.606/2019), vale registrar que a Lei nº 9.504/1997, em seu artigo 73, veda apenas as "condutas tendentes a afetar a igualdade de oportunidades entre candidatos nos pleitos eleitorais." As ações que não influenciem a disputa eleitoral não são proibidas mesmo em datas próximas às eleições.

Desta feita, esta Consultoria Jurídica já se posicionou no sentido

de que tendo em vista que a concessão de gratificação a poucos servidores que realizaram atividade específica temporariamente durante a emergência de saúde, não é, em princípio, capaz de influenciar as eleições municipais, a concessão da gratificação, mesmo em período próximo ao pleito eleitoral, é lícita. (Parecer/IBAM nº 0829/2020).

Não obstante todas as considerações que trouxemos até aqui há

de se observar que se encontra para sanção do Presidente da República o PLC nº 39/2020, o qual encarta o Programa Federativo de Enfrentamento

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ao Coronavírus, que prestará auxílio financeiro mediante algumas contraprestações, dentre as quais destacamos a vedação da criação de cargos, da realização de concursos e nomeação de servidores até dezembro de 2021, salvo para reposição de vacâncias e para medidas de combate à calamidade pública enquanto ela perdurar. O PLP nº 39/2020 ainda traz sensível alteração do art. 21 da LRF.

Caso o PLP nº 39/2020 venha a ser sancionado da forma como

se encontra, o seu art. 8º, I, traz a seguinte vedação:

"Art. 8º Na hipótese de que trata o art. 65 da Lei

Complementar nº 101, de 4 de maio de 2000, a União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios afetados pela calamidade pública decorrente da pandemia da Covid-19 ficam proibidos, até 31 de dezembro de 2021, de:

I - conceder, a qualquer título, vantagem, aumento,

reajuste ou adequação de remuneração a membros de Poder ou de órgão, servidores e empregados públicos e militares, exceto quando derivado de sentença judicial transitada em julgado ou de determinação legal anterior à calamidade pública;" (Grifos nossos).

A mencionada vedação, contudo, é excepcionada no § 6º do art.

8º, nos seguintes termos:

"Art. 8º:(...)

§ 6º: O disposto nos incisos I e IX do caput deste artigo

não se aplica aos servidores públicos civis e militares mencionados nos artigos 142 e 144 da Constituição Federal, inclusive servidores das carreiras periciais, aos agente socioeducativos, aos profissionais de limpeza urbana, de serviços funerários e assistência social, aos trabalhadores da educação pública e aos profissionais de saúde da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, desde que diretamente envolvidos no combate à pandemia da COVID-19, e fica proibido o uso de recursos da União

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transferidos a Estados, Distrito Federal e Municípios, nos termos desta Lei Complementar, para concessão de aumento de remuneração de pessoal a qualquer título."

Desta sorte, caso a lei complementar advinda do PLP nº 39/2020

seja sancionada nos termos mencionados a concessão (ou mesmo o pagamento) da gratificação caso a lei local já tenha sido aprovada não será possível, visto não ser anterior à instauração da situação de calamidade pública, salvo para os casos expressos no § 6º acima transcrito, sendo certo ainda que, em tais hipóteses, não poderá ser utilizado recurso eventualmente transferido pela União ao Município. De toda sorte, tais dispositivos somente terão aplicabilidade após a promulgação da lei, sendo certo que o Presidente da República tem anunciado na imprensa que irá vetar o referido §6º do art. 8º.

Isto posto, concluímos objetivamente a presente consulta na forma das razões exaradas.

É o parecer, s.m.j.

Priscila Oquioni Souto

Assessora Jurídica

Aprovo o parecer

Marcus Alonso Ribeiro Neves

Consultor Jurídico

Rio de Janeiro, 08 de maio de 2020.

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Parecer IBAM Nº 0997/2020

SM – Servidor Público. Projeto de lei. Iniciativa parlamentar. Regime dos servidores públicos. Inviabilidade. Inconstitucionalidade formal. Iniciativa privativa do Prefeito Municipal. Comentários.

CONSULTA:

A Câmara Municipal consulta este Instituto quanto à legalidade e

constitucionalidade de projeto de lei, de iniciativa parlamentar, que veda, durante o período da pandemia, a dispensa ou exoneração de servidores contratados temporariamente ou designados para o exercício de função pública.

A consulta vem documentada.

RESPOSTA:

A emergência de saúde provocada pela pandemia do novo Coronavírus (Covid-19) gerou uma série de situações e desafios inéditos para os gestores públicos. Consequência deste ineditismo é a inexistência de normas na legislação vigente que contenham soluções para questões concretas surgidas durante a emergência de saúde. Esses diplomas legais não foram formulados tendo em vista o cenário atual.

Dentre as discussões levantadas a partir da pandemia, está o

tratamento jurídico a ser conferido aos contratos temporários vigentes durante a pandemia do novo Coronavírus (COVID-19), bem como relativas à remuneração dos servidores públicos.

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De qualquer modo, embora se reconheça a emergência e a importância de medidas relacionadas ao enfrentamento da pandemia e de seus efeitos indiretos, mesmo a tomada dessas providências exige a observância das regras que regem a atividade estatal e definem as competências de cada órgão e entidade, que devem atuar em harmonia para consecução das finalidades públicas.

Cumpre lembrar, nesse compasso, que os princípios

informadores do processo legislativo ditados pela Constituição, ainda que dirigidos à União, devem ser seguidos pelos demais entes federativos, por força da aplicação do princípio hermenêutico da simetria das formas. Diga- se, inclusive, ser este o entendimento já consagrado tanto na doutrina, quanto na jurisprudência. Como ensina de Hely Lopes Meirelles:

"O processo legislativo, ou seja, a sucessão ordenada de

atos para a formação das normas enumeradas na Constituição da República (art. 59), possui contornos uniformes para todas as entidades estatais - União, Estados-membros, Municípios e Distrito Federal (arts. 60 a 69) - cabendo às Constituições Estaduais e às dos Municípios estabelecer, dentre as espécies normativas previstas, quais as adotadas pela entidade estatal." (MEIRELLES, Hely Lopes. Direito Municipal Brasileiro. São Paulo: Malheiros, 1998. p. 563)

No mesmo sentido, manifestou-se o Supremo Tribunal Federal

no célebre julgado adiante transcrito:

"DIREITO CONSTITUCIONAL - PROCESSO

LEGISLATIVO ESTADUAL - VINCULAÇÃO AO MODELO FEDERAL. Processo legislativo: consolidação da jurisprudência do STF no sentido de que - não obstante a ausência de regra explícita na Constituição de 1988 - impõe-se à observância do processo legislativo dos Estados-membros as linhas básicas do correspondente modelo federal, particularmente as de reserva de iniciativa, na medida em que configuram elas prisma relevante do perfil do regime positivo de separação e independência dos

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poderes, que é princípio fundamental ao qual se vinculam compulsoriamente os ordenamentos das unidades federadas."

Sabe-se, assim, que o Município tem autonomia político-

administrativa para disciplinar o regime jurídico de seus servidores (art. 18 e 38, caput, da CRFB), sejam eles permanentes ou temporários. No entanto, a iniciativa de leis que disponham sobre a matéria é do chefe do Poder Executivo, na forma do art. 61, § 1º, inciso II, alínea "c", da Lei Maior. Vejamos:

"Art. 61. A iniciativa das leis complementares e ordinárias

cabe a qualquer membro ou Comissão da Câmara dos Deputados, do Senado Federal ou do Congresso Nacional, ao Presidente da República, ao Supremo Tribunal Federal, aos Tribunais Superiores, ao Procurador-Geral da República e aos cidadãos, na forma e nos casos previstos nesta Constituição.

§ 1º São de iniciativa privativa do Presidente da

República as leis que:

(...)

II - disponham sobre:

(...)

c) servidores públicos da União e Territórios, seu regime

jurídico, provimento de cargos, estabilidade e aposentadoria; "

Desse modo, compete ao Poder Executivo a iniciativa de leis

municipais que disciplinem ou alterem o regime jurídico-administrativo em que se dará a contratação por excepcional interesse público (art. 37, X, da CRFB), bem como as regras a serem aplicadas na contratação, na suspensão e na interrupção dos contratos administrativos. De igual modo, é do Prefeito Municipal a competência para designar ou exonerar servidores.

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Por conseguinte, a propositura em tela, de iniciativa parlamentar, viola a regra da competência privativa do chefe do Executivo local para legislar sobre regime jurídico de servidores (sejam os contratados temporários por excepcional interesse público, seja os titulares de cargos de livre nomeação e exoneração), violando não apenas o art. 61, § 1º, II, "c", da Constituição Federal, mas também o postulado da separação dos poderes encartado no art. 2º da Lei Maior.

Por tudo que precede, concluímos objetivamente a presente

consulta no sentido da inviabilidade jurídica da propositura em tela, não reunindo ela condições para validamente prosperar.

É o parecer, s.m.j.

Gustavo da Costa Ferreira M. dos Santos

Consultor Técnico

Aprovo o parecer

Marcus Alonso Ribeiro Neves

Consultor Jurídico

Rio de Janeiro, 12 de maio de 2020.

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Parecer IBAM Nº 0999/2020

SM – Servidor Público. Servidor comissionado. Afastamento das atividades em razão da Covid-19. Ressalvado o caso de servidora gestante, que goza de estabilidade excepcional, os servidores titulares de cargos em comissão podem ser exonerados a qualquer tempo. Comentários.

CONSULTA:

A Prefeitura Municipal consulta este Instituto quanto à possibilidade de se exonerar servidor em exercício de cargo comissionado (de livre nomeação), que se encontra, neste momento de pandemia, com ausência justificada de suas atividades, amparado por Decreto Municipal, por ser do grupo de risco portador de doença imunossupressora.

A consulta não vem documentada.

RESPOSTA:

Os cargos em comissão, assim declarados em lei, são providos

por servidores, do quadro efetivo ou não, designados para o desempenho de atribuições de direção, chefia ou assessoramento. Caracterizam-se pela livre nomeação e exoneração de seus ocupantes. Logo, os nomeados em comissão são demissíveis ad nutum, ou seja, a qualquer momento e independentemente de justificativa.

Com efeito, constitui característica do vínculo dos servidores

comissionados a relação de confiança existente entre a autoridade

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nomeante e o nomeado. É em virtude disso que o cargo em comissão é de provimento transitório e precário (livre nomeação e exoneração ad nutum), razão pela qual fica o servidor, a qualquer tempo, à disposição da Administração Pública.

Assim, para o servidor que ocupa exclusivamente cargo em

comissão não há que falar, em regra, em qualquer espécie de estabilidade, ainda que provisória, podendo o servidor ser exonerado a qualquer tempo. Como é da natureza dos cargos em comissão, seu provimento caracteriza-se pela livre nomeação e exoneração, permanecendo assim durante a incapacidade temporária, conforme é a jurisprudência do STF:

"Administrativo. Funcionalismo. Grupo direção e

assessoramento superiores. Cargo em comissão, ou função de confiança. Exoneração ou dispensa por ato do Presidente da República, nos níveis previstos no art. 7, i, do Decreto n. 77.336/76. Esse ato não tem sua exeqüibilidade suspensa por se achar o interessado em gozo de auxílio-doença previdenciário." (MS 20236 RJ).

Exceção à regra da discricionariedade é a situação da servidora

gestante ocupante de cargo em comissão. Isto porque a maternidade e a infância são valores especialmente protegidos pela nossa ordem jurídico- constitucional. Assim, o art. 7º, XVIII, da CRFB, garante a licença à gestante, sem prejuízo do emprego ou do salário, durante cento e vinte dias, de modo que a trabalhadora goza de estabilidade no emprego, não podendo ser demitida, durante o período da licença. Esse direito é estendido às servidoras públicas pelo art. 39, § 3º, da CRFB, sendo que o dispositivo não faz nenhuma distinção entre as servidoras detentoras de cargos efetivos e ocupantes de cargo em comissão.

Além disso, a estabilidade da gestante está expressamente

prevista no art. 10, II, "b", do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias que estabelece que é vedada a dispensa arbitrária da gestante, do momento da confirmação da gravidez até cinco meses após o

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parto. À luz dessas disposições constitucionais, é possível entender que a servidora comissionada não pode ser afastada do cargo nem sofrer qualquer redução na sua remuneração, da mesma forma que as trabalhadoras não podem ter seus empregos ou salários prejudicados pela gravidez.

A gestação, nesse sentido, excepciona a regra geral da livre

nomeação e livre exoneração para cargos em comissão, conferindo à servidora estabilidade temporária no exercício da função comissionada. Isso porque, tendo em vista diferentes valores constitucionais em conflito, a proteção da maternidade deve prevalecer sobre a liberdade de preenchimento e vacância dos cargos em comissão.

Quanto a este aspecto, o Supremo Tribunal Federal,

confrontando a demissibilidade ad nutum, própria dos cargos em comissão, com a estabilidade provisória conferida às gestantes pela Constituição Federal (art. 10, II, ADCT), entendeu por conceder à gestante, ocupante de cargo comissionado, o direito à estabilidade provisória decorrente do estado de gravidez ou o direito à indenização. Assim, admite-se a sua exoneração, desde que seja devidamente indenizada, conforme se verificam nas elucidativas decisões abaixo:

"AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO DE

INSTRUMENTO. CONSTITUCIONAL. ADMINISTRATIVO. CARGO EM COMISSÃO. SERVIDORA GESTANTE. EXONERAÇÃO. DIREITO À INDENIZAÇÃO. 1. As servidoras públicas e empregadas gestantes, inclusive as contratadas a título precário, independentemente do regime jurídico de trabalho, têm direito à licença-maternidade de cento e vinte dias e à estabilidade provisória desde a confirmação da gravidez até cinco meses após o parto. Precedentes: RE n. 579.989-AgR, Primeira Turma, Relator o Ministro Ricardo Lewandowski, Dje de 29.03.2011, RE n. 600.057-AgR, Segunda Turma, Relator o Ministro Eros Grau, Dje de 23.10.2009 e RMS n. 24.263, Segunda Turma, Relator o Ministro Carlos Velloso, DJ de 9.5.03. 2. Agravo regimental a que se nega provimento". (STF: AI 804574 AgR / DF - DISTRITO

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FEDERAL. AG. REG. NO AGRAVO DE INSTRUMENTO. Relator(a): Min. LUIZ FUX. Julgamento: 30/08/2011. Órgão Julgador: Primeira Turma, g.n.).

De qualquer modo, cabe observar que antes da exoneração,

pode a Administração Pública buscar soluções menos drásticas, tais como conceder férias aos servidores comissionados durante o período de emergência de saúde, criar regimes de teletrabalho quando se viabilize em vista das atribuições do cargo, dentre outras. Por outro lado, não é demais rememorar que, ao fim da situação de emergência, nada impede que venha a ser novamente nomeado para o cargo, desde que, obviamente, esteja vago.

Em vista de todo o exposto, conclui-se pela viabilidade de

exoneração de servidor ocupante de cargo em comissão durante a pandemia, ressalvada a hipótese de estabilidade excepcional à gestante.

É o parecer, s.m.j.

Gustavo da Costa Ferreira M. dos Santos

Consultor Técnico

Aprovo o parecer

Marcus Alonso Ribeiro Neves

Consultor Jurídico

Rio de Janeiro, 12 de maio de 2020.

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Parecer IBAM Nº 1000/2020

PG – Processo Legislativo, PL – Poder Legislativo, SM – Servidor Público. Redução de remuneração de cargos em comissão e do valor de gratificações pelo exercício de funções de confiança. Irredutibilidade de remuneração (art. 37, XV, da CRFB). Comentários.

CONSULTA:

A Câmara Municipal consulta este Instituto quanto a legalidade de projeto de lei que dispõe sobre a redução em 20% da remuneração dos cargos de provimento em comissão e das gratificações pelo exercício de função de confiança da Câmara Municipal.

Indaga se, diante da crise econômica mundial decorrente da

pandemia do novo Coronavírus (Covid-19), seria possível a redução da remuneração e gratificação no período de maio a dezembro.

A consulta vem documentada.

RESPOSTA:

Em razão do princípio da separação e harmonia entre os poderes

(art. 2º, da CRFB), a Câmara Municipal é dotada de autonomia administrativa, razão pela qual pode dispor mediante resolução, sem submeter-se à sanção ou veto do Poder Executivo (art. 48, caput, da CRFB), sobre assuntos relacionados à sua organização, funcionamento e criação e extinção de cargos públicos (art. 51, IV e 52, VIII c/c art. 29, caput, da CRFB), devendo apenas a fixação da respectiva

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remuneração ser feita mediante lei.

No caso da consulta, trata-se de projeto de lei de iniciativa da

Mesa Diretora que busca reduzir a remuneração de servidores que ocupam cargos em comissão e o valor das gratificações devidas em razão do exercício de função de confiança. Portanto, do ponto de vista meramente formal, a proposição está em conformidade com as regras que definem a iniciativa conforme a matéria.

Nesse passo, cabe rememorar que a ideia de função pública se

liga ao conjunto de atividades a serem desempenhadas pelo servidor, destinadas a suprirem as necessidades operativas do serviço público. Os cargos em comissão são aqueles assim declarados em lei, aos quais sejam incumbidas exclusivamente funções de direção, chefia ou assessoramento. Caracterizam-se pela livre nomeação e exoneração de seus ocupantes, os quais podem ser livremente dispensados pela natureza de confiança que se impõe na relação jurídica, e porque a lei assim previu. Logo, os nomeados em comissão não detêm estabilidade e tampouco expectativa de adquiri-la e, dessa sorte, são demissíveis a qualquer momento, seja pela perda da confiança ou por simples conveniência da autoridade nomeante.

O provimento em comissão é exceção à exigência de concurso

público (art. 37, II, da CRFB), e não pode ser utilizado de forma indiscriminada. Rememore-se, ainda, que não basta que a denominação do cargo seja de "assessor", "diretor" ou "chefe" para que ele seja considerado de provimento em comissão. As funções a ele atribuídas devem, obrigatoriamente, ter, respectivamente, a natureza de assessoramento, direção ou de chefia.

Por outro lado, nos termos do art. 37, V da Constituição, as

funções de confiança, também chamadas de funções gratificadas, destinam-se apenas a funções de direção, chefia e assessoramento, mas serão exercidas, exclusivamente, por ocupantes de cargos efetivos. O servidor que exerce função de confiança é, portanto, investido primeiramente, após concurso público, em seu cargo para desempenhar

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as atribuições que lhe são próprias, podendo cumulá-las também com o exercício de determinada função de direção, chefia e assessoramento, pelo qual recebe uma gratificação.

No caso da função de confiança por um servidor efetivo,

portanto, não há investidura em outro cargo público, como é o caso dos cargos em comissão. O servidor efetivo ao qual é atribuída uma função de confiança deve permanecer no exercício do cargo de origem, acumulando as atribuições que lhes são próprias com uma função de confiança, pela qual é remunerado com uma gratificação.

Nesse passo e, adentrando na questão objeto da consulta, sabe-

se que no presente momento, o Brasil e a humanidade enfrentam a pandemia do novo Coronavírus (COVID-19), já tendo sido declarada calamidade pública pelo Decreto Legislativo nº 6/2020 em nível nacional, o que exigirá da sociedade e do poder público vultosos esforços materiais e financeiros. No entanto, os servidores titulares de cargos em comissão e que exercem funções de confiança, ainda que possam, respectivamente, ser nomeados e exonerados por ato discricionário ou terem retirada a função de confiança que lhes fora atribuída, são destinatários da garantia de irredutibilidade de vencimentos enquanto investidos nos respectivos cargos ou designados para a função de confiança (art. 37, XV, da CRFB).

Assim é que a possibilidade de redução de remuneração de

servidores efetivos ou comissionados por excesso de despesas de pessoal prevista no art. 23, §§ 1º e 2º da LC nº 101/2000 está com aplicabilidade suspensa por conta de decisão cautelar na ADI 2238/DF do STF. A propósito, o STF vem reiteradamente se posicionando no sentido de que a irredutibilidade se aplica aos servidores comissionados e aos designados para funções de confiança. Nesse sentido, destacamos a ementa do seguinte julgado:

"DIREITO ADMINISTRATIVO. AGRAVO REGIMENTAL

EM RECURSO EXTRAORDINÁRIO. SERVIDOR PÚBLICO. EXERCÍCIO DE CARGO DE DIREÇÃO. REDUÇÃO DO PERCENTUAL DE OPÇÃO. OFENSA À IRREDUTIBILIDADE DE

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VENCIMENTOS. SÚMULA 279/STF. 1. A decisão agravada alinha- se ao entendimento do Supremo Tribunal Federal no sentido de que a irredutibilidade de vencimento dos servidores, prevista no art. 37, XV, da Constituição Federal se aplica também às funções de confiança e cargos em comissão exercidos por servidores efetivos. Precedentes. 2. Para dissentir do entendimento do Tribunal de origem, acerca da ocorrência de decesso remuneratório, seria necessário o reexame dos fatos e provas constantes dos autos. Incidência da Súmula 279/STF. 3. Agravo regimental a que se nega provimento." (RE 518956 AgR, Relator (a): Min. ROBERTO BARROSO, Primeira Turma, julgado em 06/10/2015, ACÓRDÃO ELETRÔNICO DJe-216 DIVULG 27-10-2015 PUBLIC 28-10-2015 - grifos nossos).

Cabe noticiar, ainda, que o Tribunal de Justiça do Estado de São

Paulo, em decisão cautelar na Ação Direta de Constitucionalidade (Processo nº 2086856-35.2020.8.26.0000) movida pelo Sindicato dos Servidores Públicos da Assembleia Legislativa e do Tribunal de Contas do Estado de São Paulo, acabou por adotar o entendimento acima para suspender a redução de vencimentos dos servidores comissionados do Poder Legislativo estadual. Convém colacionar excerto da decisão do Desembargador Soares Levada:

"A irredutibilidade de vencimentos dos servidores públicos,

sem distinção quanto à natureza da investidura, vem prevista no artigo 37, XV, da Constituição Federal e repetida no artigo 115, XVII, da Constituição Estadual. A autorização para a redução de subsídios, prevista no artigo 23, § 1º da LRF (Lei Complementar 101/2000), está suspensa pelo STF (ADIn 2.238 MC/DF), por afronta ao princípio da irredutibilidade.

(...)

A fundamentação com base no combate à pandemia,

expressamente, tem por finalidade reduzir os gastos com o pessoal comissionado e transferir valores “visando ao enfrentamento e

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mitigação dos efeitos econômicos e sociais da pandemia da COVID-19, inclusive para o fortalecimento de programas de segurança alimentar para a população vulnerável” (artigo 7º, “caput”).

Essa redução atinge comissionados, mas não servidores

efetivos, o que aparenta violar a Constituição Federal, que não faz qualquer discriminação ao prever a garantia da irredutibilidade, seja quanto à investidura, seja quanto à ocupação de cargo ou emprego público." (TJSP: Processo nº 2086856-35.2020.8.26.0000, Des. Soares Levada, liminar julgada em 08/05/2020)

De qualquer modo, é de se observar que o que é vedado é a

redução da remuneração de um titular de um cargo em comissão enquanto estiver exercendo o cargo, ou o valor da gratificação pelo exercício de função de confiança. Em tese, no entanto, é possível que sejam extintos alguns cargos em comissão com a consequente exoneração dos seus ocupantes e criados novos cargos, ainda que com atribuições semelhantes, com remuneração inferior. Ou que o mesmo se façam com funções de confiança.

Nesse sentido, já entendeu o Tribunal de Justiça do Estado do

Paraná que a exoneração de servidor público, seguida da extinção de cargo em comissão, e a posterior nomeação do servidor em outro cargo em comissão com remuneração menor não configura violação ao princípio da irredutibilidade dos vencimentos. Vejamos a ementa do referido julgado:

"AÇÃO DE COBRANÇA. CARGO COMISSIONADO NO

MUNICÍPIO. FUNCIONÁRIO EXONERADO E NOMEADO EM OUTRO CARGO. ALEGAÇÃO DE REDUÇÃO ILEGAL DE SALÁRIO. INEXISTÊNCIA DE REDUÇÃO ILEGAL DE VENCIMENTOS. LEI MUNICIPAL QUE ALTEROU ORGANIZAÇÃO D ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA MUNICIPAL E OS FATORES MULTIPLICADORES DOS VENCIMENTOS. CARGO

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EM COMISSÃO QUE É REGULADO DE FORMA DIVERSA EM RELAÇÃO AOS CARGOS DE PROVIMENTO EFETIVO. PRINCÍPIO CONSTITUCIONAL DA IRREDUTIBILIDADE DE SALÁRIOS NÃO APLICÁVEL EM VISTA DO CARÁTER PROVISÓRIO E PRECÁRIO DO CARGO. AUSÊNCIA DE DIREITO ADQUIRIDO. SENTENÇA MANTIDA. 1) O princípio da irredutibilidade de vencimentos não alcança aqueles correspondentes aos ocupantes de cargo em comissão." (TJPR, AC 321735-4, 4ª CC, Rel. Des. MARÇO DE LUCA FANCHIN, DJ 05.06.2006).

No entanto, cabe salientar que existe algum risco em que se faça

uma "manobra" ou mesmo "rodizio" de servidores; isto é, com o fim de reduzir a remuneração dos cargos e funções de confiança, utilize-se da prerrogativa de exoneração e retirada de funções de confiança, para em seguida nomear ou designar os mesmos titulares dos cargos e funções já com remuneração reduzida. Nesse caso, pode ser constatado até mesmo um abuso de direito por parte da Câmara, não havendo total segurança jurídica na medida, uma vez que, como dizia o administrativista Geraldo Ataliba, não se construiriam fortalezas de pedra com portas de papelão. Traduzindo-se: uma garantia constitucional não pode ser contornada por um mero arranjo burocrático, sob pena de configuração de desvio de finalidade.

Portanto, há que se ter muito cuidado em tomar esse tipo de

medida. Do ponto de vista jurídico, o mais seguro seria que os exonerados não fossem novamente nomeados ou designados para funções de confiança, ou que fossem, depois, nomeados ou designados para funções totalmente diversas. Além disso, cabe alertar não apenas quanto ao aspecto jurídico, mas, também, para o cuidado que se deve ter em não comprometer a qualidade e as boas práticas na governança de pessoal. Com efeito, uma súbita e repentina mudança de todos os cargos de direção, chefia e assessoramento da Câmara pode vir a comprometer a continuidade administrativa.

Em vista de tudo que foi exposto, conclui-se que não há, diante

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da legislação e jurisprudência atuais, segurança jurídica para redução da remuneração dos cargos em comissão e do valor das gratificações pelo exercício das funções de confiança. Sem embargo, desde que a medida não se configure em mera manobra ou rodízio de servidores, é viável, em tese, a reestruturação administrativa com redução de remuneração e transformação de cargos e funções de confiança, com exoneração dos seus atuais ocupantes. Ainda assim, há que se ter cautela para que não se trate de mera manobra que viole direito subjetivo dos servidores, passível de ser questionada na Justiça.

É o parecer, s.m.j.

Gustavo da Costa Ferreira M. dos Santos

Consultor Técnico

Aprovo o parecer

Marcus Alonso Ribeiro Neves

Consultor Jurídico

Rio de Janeiro, 12 de maio de 2020.

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Parecer IBAM Nº 1009/2020

SM – Servidor Público. Férias "Compulsórias". Emergência de saúde pública decorrente do Coronavírus (Covid-19). Medida Provisória (MP) nº. 927 de 22/03/2020. Liminar no julgamento conjunto da ADI 6346, ADI 6348, ADI 6349, ADI 6352, ADI 6354, ADI 6342 e ADI 6344 pelo STF. Comentários.

CONSULTA:

A Consulente, Prefeitura, expõe e indaga o seguinte, in verbis:

"Determinado Município da Federação, com escopo de

atenuar os riscos da Covid-19, optou por conceder férias a quase todos servidores da Administração, deixando apenas aqueles servidores que atuam de frente no Combate a pandemia. Acontece que alguns servidores ficaram insatisfeitos com a medida tomada pelo Gestor e procuraram o Sindicato da categoria questionando o ato. Segundo eles, a Administração não poderia ter tomado tal decisão, uma vez que está só poderia conceder férias se o servidor público pleiteasse, isto é, na visão deles, o Gestor não poderia escolher o momento da concessão, devendo atuar apenas se o servidor viesse a fazer o requerimento". As perguntas serão transcritas adiante por questões didáticas. A Consulta não segue documentada.

RESPOSTA:

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Como é sabido, as normas relativas aos servidores municipais reputam-se assunto de exclusiva competência legislativa do Município, por força da autonomia político-administrativa que lhe foi outorgada pela Constituição de 1988, nos termos dos seus arts. 1º, 18, 29 e 30. Cabe ao Município, pois, a organização do regime funcional de seus servidores, incluindo-se aí as regras sobre a composição do sistema remuneratório e demais vantagens e benefícios funcionais. Para tanto, impõe-se observar os comandos constitucionais dirigidos ao servidor público, em especial nos arts. 37 a 41, bem como os preceitos das leis de caráter complementar.

Dentre os direitos constitucionais conferidos aos trabalhadores,

está o gozo de férias anuais remuneradas com, pelo menos, um terço a mais do que o salário normal, conforme expresso no pelo art. 7º, XVII. Esse direito foi estendido aos servidores públicos por força do disposto no art. 39, § 3º, que manda aplicar-lhes alguns dos incisos constantes do dito art. 7º. Além disso, é muito comum que os estatutos funcionais disponham, em termos semelhantes ao art. 143 da Consolidação das Leis do Trabalho, pela possibilidade de conversão de 1/3 das férias em pecúnia. Trata-se do direito a "vender 10 dias de férias", como é conhecido informalmente, previsto pelo § 1º do art. 76 do Estatuto dos Servidores do Município Consulente, que obtivemos na internet.

A Administração deve ser a primeira a zelar pela Constituição e

pelas leis. Entretanto, como é sabido, o gozo do direito às férias é bilateral, com a prevalência do interesse público, isto é, depende do servidor que deve apontar quais os períodos quer gozá-las preferencialmente, ao mesmo tempo que depende da conveniência do serviço público. Ou seja, a última palavra compete à Administração que avaliará o requerimento do servidor e decidirá qual será seu período concessivo se não estiver de acordo com o solicitado, ou referendará o mesmo, caso a solicitação do servidor seja compatível com o interesse administrativo.

No caso do art. 75 do Estatuto dos Servidores do Município

Consulente há a previsão de acumulação de no máximo dois períodos de férias. Assim, ultrapassada a possibilidade de acumulação lícita, compete à Administração Pública estabelecer as datas para gozo respectivo. Isso porque, incontestavelmente, cabe à própria Administração, visto ser ela quem estabelece, em última análise, a conveniência da data de fruição

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pelo servidor do direito adquirido, determinar o período em que tal direito deverá ser exercido, se tiver sido ele anteriormente indeferido ou não solicitado.

Em última análise o fundamento da concessão de férias

compulsórias é o próprio interesse público na preservação da saúde dos servidores e a vedação ao enriquecimento ilícito, até mesmo para evitar a prescrição do direito dos servidores. Embora haja quem entenda que não ocorre prescrição do direito de gozar férias acumuladas a prescrição é um fenômeno de ordem pública que ocorre tanto para os particulares quanto para o Poder Público. Assim sendo, entendemos que na ausência de outro prazo específico contido em lei local, cuja existência desconhecemos, aplica-se o prazo genérico de cinco anos previsto no Dec.-Lei nº. nº 20.910/32 também para a prescrição de direitos funcionais dos servidores. Nesse sentido, a jurisprudência:

"APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO COBRANÇA. MUNICÍPIO DE

NOSSA SENHORA DO SOCORRO. PRESCRIÇÃO. FAZENDA PÚBLICA. INTELIGÊNCIA DO ARTIGO 1º DO DECRETO LEI Nº 20.910/32. PRESCRIÇÃO QUINQUENAL. PARCELAS PRESCRITAS ATINENTES AO QUINQUÊNIO ANTERIOR A PROPOSITURA DA AÇÃO. CONDENAÇÃO A FÉRIAS INTEGRAIS QUE COMPREENDE O PERÍODO DA PRESCRIÇÃO. DIREITO PREJUDICADO. IMPOSSIBILIDADE DE CONCESSÃO DE FÉRIAS PROPORCIONAIS. RECONHECIMENTO DA PRESCRIÇÃO. REFORMA DA SENTENÇA. RECURSO CONHECIDO E PROVIDO". (TJSE - 2ª Câmara Cível. AC 2012208038 SE. J. 22/05/2012. Rel. Des. RICARDO MÚCIO SANTANA DE ABREU LIMA)

"AGRAVO DE PETIÇÃO. FÉRIAS. PRESCRIÇÃO. A prescrição do direito de reclamar a concessão das

férias é contada do término do prazo para sua concessão, o qual, nos termos do artigo 134 da CLT, ocorre nos doze meses subsequentes à data em que o empregado tiver adquirido o direito. Inteligência do artigo 149 da CLT. (...)". (TRT - 4ª Região. AP 913005920055040025 RS 0091300-59.2005.5.04.0025. J. 13/10/2011. Rel. Juiz Federal CLÓVIS FERNANDO SCHUCH SANTOS).

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Assim sendo, entendemos que passados cinco anos e um dia da data de fechamento do cômputo do período aquisitivo, que ocorre nos doze meses subsequentes à data em que o servidor tiver adquirido o direito, o servidor perderá o direito de gozar as férias alcançadas pela prescrição administrativa. Contudo, a autoridade responsável pelo controle da folha de ponto e consequente concessão das férias responderá pela sua omissão, devendo nesse caso ser instaurado processo administrativo contra a autoridade responsável para puni-la devidamente.

Outra possibilidade igualmente excepcional encontra respaldo no

direito provisório e decorre da rápida expansão da pandemia do Novo Coronavírus (COVID-19), que impôs sérias restrições ao nosso modo de vida. Como tem sido amplamente divulgado, as estratégias de distanciamento social adotadas pelos Estados e Municípios contribuem, principalmente, para evitar o colapso nos sistemas de saúde locais, salvaguardando, desta forma, vidas.

Dentre as medidas de contenção à expansão da pandemia da

COVID-19 adotadas por Estados e Municípios temos a instituição do home office, trabalho remoto ou teletrabalho para os ocupantes de cargos que admitem estas modalidades de exercício de suas atribuições, bem como a concessão de férias coletivas, licenças e escalas para os servidores cujas atribuições somente podem se dar de forma presencial.

Vejamos a título exemplificativo, já que inaplicável a servidores

estatutários, o que dispõe o art. 3º da Medida Provisória (MP) nº. 927 de 22/03/2020, que "Dispõe sobre as medidas trabalhistas para enfrentamento do estado de calamidade pública reconhecido pelo Decreto Legislativo nº 6, de 20 de março de 2020, e da emergência de saúde pública de importância internacional decorrente do Coronavírus (Covid-19), e dá outras providências":

"Art. 3º Para enfrentamento dos efeitos econômicos

decorrentes do estado de calamidade pública e para preservação do emprego e da renda, poderão ser adotadas pelos empregadores, dentre outras, as seguintes medidas:

I - o teletrabalho;

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II - a antecipação de férias individuais;

III - a concessão de férias coletivas;

IV - o aproveitamento e a antecipação de feriados;

V - o banco de horas;

VI - a suspensão de exigências administrativas em segurança e saúde no trabalho;

VII - o direcionamento do trabalhador para qualificação; e

VIII - o diferimento do recolhimento do Fundo de Garantia do Tempo de Serviço - FGTS."

Registre-se que o Plenário do Supremo Tribunal Federal (STF),

em sessão realizada por videoconferência em 29/04/2020 apenas suspendeu a eficácia de dois dispositivos da Medida Provisória (MP) nº. 927/2020, que autoriza empregadores a adotarem medidas excepcionais em razão do estado de calamidade pública decorrente da pandemia do novo Coronavírus. Por maioria, foram suspensos o art. 29, que não considera doença ocupacional os casos de contaminação de trabalhadores pelo Coronavírus, e o art. 31, que limitava a atuação de auditores fiscais do trabalho à atividade de orientação. A decisão foi proferida no julgamento de medida liminar em sete Ações Diretas de Inconstitucionalidade (ADIs) ajuizadas contra a MP, as ações foram ajuizadas pelo Partido Democrático Trabalhista (ADI 6342), pela Rede Sustentabilidade (ADI 6344), pela Confederação Nacional dos Trabalhadores Metalúrgicos (ADI 6346), pelo Partido Socialista Brasileiro (ADI 6348), pelo Partido Comunista do Brasil (PCdoB), pelo Partido Socialismo e Liberdade (PSOL) e pelo Partido dos Trabalhadores (PT) conjuntamente (ADI 6349), pelo partido Solidariedade (ADI 6352) e pela Confederação Nacional dos Trabalhadores da Indústria (ADI 6354), o que legitima, ao menos até o presente momento, as demais medidas de enfrentamento listadas na MP.

Respondendo objetivamente às perguntas formuladas:

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No caso em tela, o Gestor andou corretamente quando fez a concessão das férias, independente do requerimento do servidor?

Sim, pelas razões expostas.

Neste caso, a Administração poderia atuar dentro da sua

discricionariedade, usando como fundamento o princípio da supremacia do interesse público sobre o privado ou o servidor tem direito de escolher quando deve ou não sair de férias?

Como registrado, a Administração pode excepcionalmente

conceder férias compulsórias aos servidores, quer seja para evitar a acumulação por mais de 2 períodos, para evitar a prescrição de direito fundamental do servidor ou para enfrentamento do estado de calamidade pública reconhecido pelo Decreto Legislativo nº 6, de 20/03/2020, e da emergência de saúde pública de importância internacional decorrente do Coronavírus (Covid-19).

É o parecer, s.m.j.

Jaber Lopes Mendonça Monteiro

Consultor Técnico

Aprovo o parecer

Marcus Alonso Ribeiro Neves Consultor Jurídico

Rio de Janeiro, 13 de maio de 2020.

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Parecer IBAM Nº 1012/2020

SM – Servidor Público. Enfrentamento da pandemia do Novo Coronavírus. Grupo de risco. Afastamento. Solicitação pelo próprio servidor para retorno às suas atividades. Considerações.

CONSULTA:

Relata o consulente que determinado decreto municipal estabeleceu que, em virtude da pandemia da COVID-19, os servidores públicos que integram grupos de risco têm sua falta justificada, sem que seja possível qualquer desconto em sua remuneração.

Ainda conforme as informações trazidas pelo consulente,

determinado servidor à Divisão de Recursos Humanos o interesse em retornar às suas atividades, assinando declaração ou outro documento que ateste sua integral responsabilidade.

Diante da situação relatada, indaga o consulente acerca da

possibilidade de ser atendido o requerimento do servidor em questão, integrante do grupo de risco.

A consulta não veio documentada.

RESPOSTA:

Inicialmente, temos que que a rápida expansão da pandemia do Novo Coronavírus (COVID-19) impôs sérias restrições ao nosso modo de vida. Como tem sido amplamente divulgado, as estratégias de distanciamento social adotadas pelos Estados e Municípios contribuem, principalmente,

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para evitar o colapso nos sistemas de saúde locais, salvaguardando, desta forma, vidas.

Dentre as medidas de contenção à expansão da pandemia da

COVID-19 adotadas por Estados e Municípios está também a instituição do home office, trabalho remoto e teletrabalhos para os ocupantes de cargos que admitem estas modalidades de exercícios de suas atribuições, bem como a concessão de férias coletivas, licenças e escalas para os servidores cujas atribuições somente podem se dar de forma presencial.

Feitas estas considerações, temos que, com exceção das

gestantes e lactantes às quais, ante a especial proteção que o legislador constituinte conferiu à maternidade, não é permitido nenhuma forma de trabalho insalubre (ADI nº 5938), não há nenhuma disposição, até o presente momento, que obrigue o afastamento de servidores integrantes do grupo de risco pelos entes federados, sobretudo aqueles que atuam na área da saúde.

Não obstante, alertamos que começam a surgir no âmbito dos

Tribunais pátrios decisões determinando cautelarmente o afastamento de servidores integrantes do chamado grupo de risco da COVID-19 de suas atividades.

O Tribunal Regional do Trabalho da 2ª Região concedeu liminar

no bojo de ação civil pública (ACP nº 1000353-66.2020.5.02.0058) proposta pelo Sindicato dos trabalhadores públicos da saúde no Estado de São Paulo para determinar, dentre outras medidas, "a liberação imediata das atividades presenciais os empregados substituídos processualmente que estejam enquadrados no grupo de risco, assim compreendidos os idosos com 60 anos ou mais, as gestantes, os portadores de doenças respiratórias crônicas, cardiopatias, diabetes, hipertensão, doenças renais, ou de quaisquer outras afecções que deprimam o sistema imunológico, assegurando-lhes todos os direitos e benefícios do contrato de trabalho".

No mesmo sentido o Tribunal de Justiça do Distrito Federal

e Territórios - TJDFT, através da 7ª Vara de Fazenda Pública, no bojo do

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processo nº 0702293-75.2020.8.07.0018, determinou o afastamento imediato de servidores do Sistema de Limpeza Urbana do Distrito Federal que se enquadrem no grupo de risco do Novo Coronavírus.

Não obstante tais considerações, a consulta em tela guarda uma

peculiaridade, qual seja: o Município editou decreto afastando das funções in locu os servidores integrantes do grupo de risco da COVID-19 e determinado servidor deseja abrir mão deste afastamento.

Em que pese não nos tenham sido fornecidas maiores

informações acerca do caso concreto, não se tratando de servidora gestante e lactante (a qual não seria permitida a flexibilização do decreto), mister um exercício de ponderação dos valores envolvidos.

Assim, de um lado temos o direito à saúde (e, por via reflexa, o

direito à vida) e de outro lado o livre exercício do trabalho ou profissão. Neste ponto, os standarts (questões/pontos relevantes) a serem levantados pela Administração Pública municipal para o exercício da ponderação e resolução da questão devem se referir: (1) à real situação de saúde do servidor (qual categoria do grupo de risco se enquadra o servidor: alguma comorbidade grave; maior de 60 anos; idade acima de 70 anos) a fim de verificar o grau de risco à vida deste; (2) qual as atribuições exercidas pelo servidor (se a mesmas permitem sua completa realização em home office ou teletrabalho sem prejuízo da eficiência); (3) se o servidor ocupa cargo de direção ou chefia exigindo sua supervisão para a eficiência do desempenho das atribuições dos seus subordinados; (4) se o servidor atua na linha de frente do combate à COVID-19.

Na hipótese, há de se ponderar se a assunção do grau de risco

pelo servidor é muito superior ao da sociedade como um todo, risco esse que, ao menos à primeira vista, se revela incompatível com o princípio da dignidade da pessoa humana (art. 1º, III, da Constituição Federal).

Observadas estas questões, as quais devem ser dirimidas no caso

concreto, quer nos parecer que tratando-se, por exemplo, de servidor idoso com 60 anos, porém em gozo de boa saúde sem qualquer

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comorbidade grave que desempenhe cargo que não envolve atendimento ao público cujas atribuições são desempenhadas de forma mais eficiente na repartição municipal, não haveria óbices para atendimento da solicitação do servidor.

Aqui, vale registrar que, mesmo neste caso, não está o Município

desonerado dos esforços para reduzir os riscos inerentes ao trabalho por meio de normas de saúde, higiene e segurança, devendo proporcionar todas as condições e recomendações das autoridades sanitárias para prevenir os riscos de contágio da COVID-19 no ambiente de trabalho.

Isto posto, concluímos objetivamente a presente consulta na forma das razões exaradas.

É o parecer, s.m.j.

Priscila Oquioni Souto

Assessora Jurídica

Aprovo o parecer

Marcus Alonso Ribeiro Neves

Consultor Jurídico

Rio de Janeiro, 13 de maio de 2020.

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Parecer IBAM Nº 1027/2020

SM – Servidor Público. Medidas de enfrentamento da pandemia no novo Coronavírus (COVID-19). Férias coletivas. Situação dos servidores que não completaram o período aquisitivo. Observância do estatuto. Comentários.

CONSULTA:

A Prefeitura Municipal relata que há servidores que se encontram

afastados do serviço por determinação de Decreto Municipal por se

encontrarem em grupo de risco da Covid-19. Indaga se é possível antecipar

as férias desses servidores antes de completarem seus períodos

aquisitivos.

A consulta não vem documentada.

RESPOSTA:

Inicialmente, temos que que a rápida expansão da pandemia do novo

Coronavírus (COVID-19) impôs sérias restrições ao nosso modo de vida.

Como tem sido amplamente divulgado, as estratégias de distanciamento

social contribuem, principalmente, para evitar o colapso

nos sistemas de saúde locais, salvaguardando vidas.

Cabe observar que os Municípios, assim como os Estados e a

União, dispõem de autonomia político-administrativa nos termos do

art. 18 da Constituição da República (CRFB). Nessa autonomia se insere a

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competência para dispor sobre o regime jurídico de seus servidores públicos

(art. 39, caput, da CRFB), que deve ser exercida nos termos e nos limites

da própria CRFB.

Dentre as medidas de contenção à expansão da pandemia da

COVID-19 adotadas pela União, Estados e Municípios estão a instituição do

home office, trabalho remoto e teletrabalho para os ocupantes de cargos

que admitem estas modalidades de exercícios de suas atribuições, bem

como a concessão de férias coletivas, licenças e escalas para os servidores

cujas atribuições somente podem se dar de forma presencial.

Em relação ao tema objeto da consulta, determina a Constituição

que todo trabalhador tem direito a férias anuais, acrescidas de um terço da

sua remuneração (art. 7º, XVII), direito estendido expressamente aos

servidores públicos pelo art. 39, § 3º da CRFB. As férias são um direito

indisponível dos trabalhadores estendido aos servidores. Isso significa que

os servidores não podem abrir mão de usufruí-las, e tampouco a

Administração de concedê-las, de modo que os estatutos de servidores

devem disciplinar o assunto, inclusive o modo de contagem do tempo de

serviço.

Pertinente esclarecer que o direito às férias perfaz-se após o

efetivo exercício do cargo pelo período de um ano — o chamado "período

aquisitivo" —, e a partir daí o Município tem a obrigação de conceder o

descanso remunerado no prazo determinado pelo Estatuto, em geral de

1 (um) ano, prorrogável excepcionalmente geralmente por mais 1 (um) ano

— o chamado "período concessivo". A prorrogação é excepcional porque a

Constituição determina que as férias devem ser anuais. O período

aquisitivo, portanto, é um iter temporal durante o qual o servidor tem a

expectativa de gozo das férias e adquire proporcionalmente o direito a ser

fruído durante o período concessivo.

Ocorre que, ao lado das férias individuais, é comum que

se prevejam também férias coletivas, que são aquelas concedidas a um

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121

conjunto de servidores (de um setor, de uma categoria, de uma unidade

administrativa). As férias coletivas encontram previsão também na CLT,

para os trabalhadores da iniciativa privada, e a principal diferença para as

férias individuais reside justamente no fato de serem concedidas a uma

coletividade determinada, com datas de início e fim idênticas. O fundamento

das férias coletivas, geralmente, é uma generalizada desnecessidade

temporária do exercício das funções dos servidores, como é o caso dos

professores nas férias escolares, recessos parlamentares, enfim, qualquer

hipótese em que haja uma queda no ritmo de atividades de um setor, órgão

ou unidade que não justifique o emprego de toda a força de trabalho do

quadro funcional.

No entanto, outras justificativas podem haver para a concessão de

férias coletivas. No caso do enfrentamento ao Covid-19, elas têm

funcionado como um instrumento legal para propiciar o distanciamento

social, fazendo cumprir o mandamento constitucional previsto no art. 7º,

XXII, segundo o qual devem ser reduzidos os riscos inerentes ao trabalho,

estendido aos servidores pelo art. 39, § 3º, da CRFB. Em suma, é o

interesse público que determinará a oportunidade e conveniência da

concessão de férias coletivas, de modo que se afigura possível a utilização

do instrumento para fins de enfrentamento da pandemia.

Convém salientar, no entanto, que a Administração Pública é

pautada pelo princípio da legalidade. Isso significa que os atos e

procedimentos administrativos estão subordinados à lei e não podem

contrariar disposições legais. O princípio da legalidade, consagrado no art.

37, caput, da CRFB, impõe ao administrador público o dever de apenas agir

conforme a lei. Sobre o princípio da legalidade, afirma Hely Lopes Meirelles

que:

"[...] na administração pública não há liberdade nem

vontade pessoal. Enquanto na administração particular é lícito fazer

tudo o que a lei não proíbe, na Administração Pública só é

permitido fazer o que a lei autoriza. A lei para o particular significa

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'poder fazer assim'; para o administrador público significa 'deve fazer

assim". (MEIRELLES, Hely Lopes. "Direito Administrativo

Brasileiro". São Paulo: Malheiros, 2000, p. 82).

Portanto, a concessão de férias coletivas deve observar o que diz

o estatuto. Uma situação encontradiça quando da concessão de férias

coletivas é a de trabalhadores que não completaram o período aquisitivo. A

CLT, por exemplo, preocupou-se com o assunto em seu art. 140, em que

determina que "os empregados contratados há menos de 12 (doze) meses

gozarão, na oportunidade, férias proporcionais, iniciando-se, então, novo

período aquisitivo". No entanto, como já afirmado, o Município tem

competência para disciplinar o regime de seus servidores públicos, de modo

que as disposições da CLT a eles não se aplicam.

Isso significa, portanto, que deve ser observado o que diz o

estatuto dos servidores a respeito do assunto, que não foi anexado à

consulta. Caso o estatuto dos servidores não autorize a concessão de férias

coletivas antes de completado o período aquisitivo, não poderá ser

antecipado o gozo de férias desses servidores.

Em tese, não é inconstitucional que a legislação local permita a

antecipação de férias de servidor que não tenha completado o período

aquisitivo, desde que, evidentemente, haja um mecanismo de

compensação futura, de modo a não haver tratamento desigual a

servidores. Entretanto, na omissão do estatuto, a providência não parece

viável, devendo haver prévia alteração legislativa para disciplinar o tema,

em razão do princípio da legalidade.

Em vista de todo o exposto, conclui-se que o gozo de férias

apenas é viável, em regra, após completado o período aquisitivo.

Entretanto, caso haja previsão no estatuto, viabiliza-se, quando da

concessão de férias coletivas, a antecipação do gozo de férias a quem não

tenha completado o período aquisitivo, desde que haja mecanismos

de compensação que não violem o princípio da isonomia. Por fim, em

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virtude do princípio da legalidade (art. 37, caput, da CRFB) e da autonomia

do Município para disciplinar o regime jurídico dos servidores públicos (art.

18 e 39, caput, da CRFB), havendo omissão do estatuto, não é possível

antecipar férias de servidores que não tenham completado o período

aquisitivo. Portanto, remete-se o consulente à análise do estatuto dos

servidores.

É o parecer, s.m.j.

Gustavo da Costa Ferreira M. dos Santos

Consultor Técnico

Aprovo o parecer

Marcus Alonso Ribeiro Neves

Consultor Jurídico

Rio de Janeiro, 14 de maio de 2020.

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Parecer IBAM Nº 1042/2020

SM – Servidor Público. Enfrentamento da pandemia do novo Coronavírus (COVID-19). Servidor que exerce atividade essencial. Afastamento. Comentários.

CONSULTA:

A Prefeitura Municipal consulta este Instituto a respeito de

medidas relativas ao enfrentamento da pandemia do novo Coronavírus

(COVID-19). Indaga, especificamente, quanto ao afastamento de servidores

de grupos de risco.

1) Um servidor que trabalha como Guardião de Bens Públicos –

seja diurno ou noturno, e que fica o praticamente o tempo todo isolado, deve

ser afastado de suas atividades?

2) O município é obrigado a manter o afastamento remunerado

aos servidores deste grupo, ou pode conceder férias durante o período de

afastamento?

A consulta não vem documentada.

RESPOSTA:

Inicialmente, temos que a rápida expansão da pandemia do novo

Coronavírus (COVID-19) impôs sérias restrições ao nosso modo de vida.

Como tem sido amplamente divulgado, as estratégias de distanciamento

social contribuem, principalmente, para evitar o colapso nos sistemas de

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saúde locais, salvaguardando vidas.

Cabe observar que os Municípios, assim como os Estados e a

União, dispõem de autonomia político-administrativa nos termos do art. 18

da Constituição da República (CRFB). Nessa autonomia se insere a

competência para dispor sobre o regime jurídico de seus servidores públicos

(art. 39, caput, da CRFB), que deve ser exercida nos termos e nos limites

da própria CRFB. Assim é que na gestão de pessoal, cabe ao Município

buscar permanentemente a redução dos riscos inerentes ao trabalho, por

meio de normas de saúde, higiene e segurança, nos precisos termos do art.

39, § 3º c/c art. 7º, XXII, da CRFB.

Dentre as medidas de contenção à expansão da pandemia da

COVID-19 adotadas pela União, Estados e Municípios estão a instituição do

home office, trabalho remoto e teletrabalho para os ocupantes de cargos

que admitem estas modalidades de exercícios de suas atribuições, bem

como a concessão de férias coletivas, licenças, banco de horas e escalas

para os servidores cujas atribuições somente podem se dar de forma

presencial.

É bem verdade que, com exceção das gestantes e lactantes às

quais não é permitido nenhuma forma de trabalho insalubre (ADI nº 5938),

não há disposição expressa que trate do afastamento de servidores pelos

entes federados. No entanto, isso não significa possa a Administração

Pública ignorar a pandemia, colocando em risco a saúde dos servidores e

da população. É evidente que se há restrições a atividades privadas não

essenciais, e mesmo as atividades essenciais devem ser exercidas com

cuidados especiais, com maior razão deve a Administração Pública tomar

medidas de precaução no âmbito de suas repartições.

Cabe observar, entretanto, que a avaliação a respeito do quanto o

exercício de um cargo expõe o servidor ao risco de contágio não pertence

ao Direito. Trata-se, na verdade, de assunto relativo à Medicina

do Trabalho. Não cabe, portanto, em sede de parecer jurídico, dizer o

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quanto há risco de contágio no exercício de um cargo, e caso se trate de

função que não pode deixar de ser exercida, quais precauções de saúde e

modalidades de equipamentos de proteção individual devem ser utilizados.

Portanto, deve o Município buscar avaliações técnicas para tomar decisões

relativas a afastamentos ou modificações no exercício de cargos.

De qualquer modo, embora não tenha sido fornecida a descrição

exata das atribuições do cargo de Guardião de Bens Públicos, a

nomenclatura do cargo indica que ele presta serviço de segurança para fins

de proteção do patrimônio público, o que se qualifica como atividade

essencial nos termos do art. 3º, § 1º, III, do Decreto nº 10.282/2020, que

regulamenta a Lei nº 13.979/2020. O fato, por si só, indica que, conquanto

haja risco de contágio, a atividade pode ser desempenhada.

Isso não significa que não deva o Município tomar providência

alguma, porque os servidores públicos, como afirmado, são destinatários do

mandamento constitucional segundo o qual devem ser reduzidos os riscos

inerentes ao trabalho por meio de normas de saúde, higiene e segurança

(art. 7º, XXII c/c art. 39, § 3º, da CRFB). Assim, mesmo que possam

permanecer em atividade os servidores que atuam na área da segurança, o

Município deve fornecer todos os meios possíveis para proteger sua saúde,

conforme as melhores orientações técnicas.

Entretanto, é muito comum que servidores públicos que atuam na

área da segurança patrimonial exerçam suas funções em parques, praças,

museus e outros equipamentos públicos que estão fechados em razão do

enfrentamento à pandemia. Assim, embora a atividade seja essencial, é

possível que em decorrência da pandemia do novo Coronavírus não haja

justificativa para o emprego de toda a força de trabalho do quadro

funcional. Nesse caso, também deve o Município procurar afastar

servidores das atividades para promover o distanciamento social, podendo

conceder férias coletivas, licenças ou se promover escalas e utilizar da

compensação futura de horas, na forma da legislação local.

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Isso depende, como se vê, de uma análise da realidade local que

também ultrapassa as possibilidades de um parecer jurídico. Apenas

verificando a real necessidade de serviço e demanda de trabalho, com

avaliação dos casos concretos, é possível saber se houve redução da

demanda de trabalho no Município.

Situação peculiar é a dos servidores que pertencem a grupos de

risco. Os tribunais pátrios decisões determinando cautelarmente o

afastamento de servidores integrantes do chamado grupo de risco da

COVID-19 de suas atividades.

O Tribunal Regional do Trabalho da 2ª Região concedeu liminar

no bojo de ação civil pública (ACP nº 1000353-66.2020.5.02.0058) proposta

pelo Sindicato dos trabalhadores públicos da saúde no Estado de São Paulo

para determinar, dentre outras medidas, "a liberação imediata das

atividades presenciais os empregados substituídos processualmente que

estejam enquadrados no grupo de risco, assim compreendidos os idosos

com 60 anos ou mais, as gestantes, os portadores de doenças respiratórias

crônicas, cardiopatias, diabetes, hipertensão, doenças renais, ou de

quaisquer outras afecções que deprimam o sistema imunológico,

assegurando-lhes todos os direitos e benefícios do contrato de trabalho".

No mesmo sentido o Tribunal de Justiça do Distrito Federal e

Territórios - TJDFT, através da 7ª Vara de Fazenda Pública, no bojo do

processo nº 0702293-75.2020.8.07.0018, determinou o afastamento

imediato de servidores do Sistema de Limpeza Urbana do Distrito Federal

que se enquadrem no grupo de risco do Novo Coronavírus.

Portanto, recomenda-se a utilização dos instrumentos previstos na

legislação para afastamento dos servidores de grupos de risco, tais como

férias, licenças e banco de horas, e também caso exista redução da

necessidade de força de trabalho.

Em vista do que foi exposto, conclui-se objetivamente:

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1) Um servidor que trabalha como Guardião de Bens Públicos –

seja diurno ou noturno, e que fica o praticamente o tempo todo isolado, deve

ser afastado de suas atividades?

A avaliação a respeito do risco ocupacional de um trabalho e das

precauções a serem tomadas no exercício do cargo, tais como

equipamentos de proteção individual, é assunto relativo à medicina do

trabalho, sobre o qual não cabe opinar em sede de parecer jurídico.

Em todo caso, a atividade de Guardião de Bens Públicos se

qualifica como atividade essencial nos termos do art. 3º, § 1º, III do Decreto

nº 10.282/2020, porque visa à segurança e proteção do patrimônio público.

Além disso, trata-se de função que apenas pode ser exercida

presencialmente. Portanto, em regra, os servidores que ocupam cargos de

Guardião de Bens Públicos devem continuar em exercício.

De qualquer modo, caso haja redução da necessidade do serviço

e/ou se haja servidores que ocupam o cargo que pertençam a grupos de

risco, recomenda-se a utilização dos instrumentos previstos na legislação

para afastamento das atividades dos servidores, tais como licenças, férias

e compensação de horas. Exceção à servidora gestante, que deve

obrigatoriamente ser afastada.

2) O Município é obrigado a manter o afastamento remunerado

aos servidores deste grupo, ou pode conceder férias durante o período de

afastamento?

O afastamento remunerado é uma situação em que o servidor

não exerce suas atividades e permanece na percepção de sua

remuneração. As modalidades estatutárias de afastamento remunerado

mais comuns são as férias, as licenças remuneradas e as chamadas

"concessões", que são afastamentos breves previstos em lei.

A definição do momento em que serão gozadas as férias é

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orientada pelo interesse público. É bem verdade que a Administração

Pública pode organizar escalas de férias conforme pedidos dos servidores,

promovendo um entendimento mútuo. Porém, o interesse público

prevalecerá, e a Administração Pode conceder férias de acordo com sua

conveniência e oportunidade, quando completado o período aquisitivo,

independentemente da aquiescência do servidor.

Portanto, é possível a concessão de férias para promover

afastamento de servidores como medida de enfrentamento ao Covid-19,

visando ao distanciamento social.

É o parecer, s.m.j.

Gustavo da Costa Ferreira M. dos Santos

Consultor Técnico

Aprovo o parecer

Marcus Alonso Ribeiro Neves

Consultor Jurídico

Rio de Janeiro, 15 de maio de 2020.

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Parecer IBAM Nº 1045/2020

SM – Servidor Público. Enfrentamento da pandemia do Novo Coronavírus. Grupo de risco. Afastamento. Solicitação pelo próprio servidor para retorno às suas atividades. Considerações.

CONSULTA:

Com relação aos servidores integrantes do grupo de risco da COVID-19, indaga o consulente:

"Pode o servidor recursar a afastar-se de suas

atividades laborativas, mesmo sendo grupo de risco?

Quanto tempo dura a quarentena do grupo de risco,

mesmo não tendo sido contaminado e nenhum caso confirmado no município?

Qual a recomendação quanto aos servidores que

suas atividades não tem como ser exercida em home office e são do grupo de risco?"

A consulta não veio documentada.

RESPOSTA:

Inicialmente, temos que que a rápida expansão da pandemia do

Novo Coronavírus (COVID-19) impôs sérias restrições ao nosso modo de vida. Como tem sido amplamente divulgado, as estratégias de distanciamento social adotadas pelos Estados e Municípios contribuem,

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principalmente, para evitar o colapso nos sistemas de saúde locais, salvaguardando, desta forma, vidas.

Dentre as medidas de contenção à expansão da pandemia da

COVID-19 adotadas por Estados e Municípios está também a instituição do home office, trabalho remoto e teletrabalhos para os ocupantes de cargos que admitem estas modalidades de exercícios de suas atribuições, bem como a concessão de férias coletivas, licenças e escalas para os servidores cujas atribuições somente podem se dar de forma presencial.

Feitas estas considerações, temos que, com exceção das

gestantes e lactantes às quais, ante a especial proteção que o legislador constituinte conferiu à maternidade, não é permitido nenhuma forma de trabalho insalubre (ADI nº 5938), não há nenhuma disposição, até o presente momento, que obrigue o afastamento de servidores integrantes do grupo de risco pelos entes federados, sobretudo aqueles que atuam na área da saúde.

Não obstante, alertamos que começam a surgir no âmbito dos

Tribunais pátrios decisões determinando cautelarmente o afastamento de servidores integrantes do chamado grupo de risco da COVID-19 de suas atividades.

O Tribunal Regional do Trabalho da 2ª Região concedeu liminar

no bojo de ação civil pública (ACP nº 1000353-66.2020.5.02.0058) proposta pelo Sindicato dos trabalhadores públicos da saúde no Estado de São Paulo para determinar, dentre outras medidas, "a liberação imediata das atividades presenciais os empregados substituídos processualmente que estejam enquadrados no grupo de risco, assim compreendidos os idosos com 60 anos ou mais, as gestantes, os portadores de doenças respiratórias crônicas, cardiopatias, diabetes, hipertensão, doenças renais, ou de quaisquer outras afecções que deprimam o sistema imunológico, assegurando-lhes todos os direitos e benefícios do contrato de trabalho".

No mesmo sentido o Tribunal de Justiça do Distrito Federal

e Territórios - TJDFT, através da 7ª Vara de Fazenda Pública, no bojo do

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processo nº 0702293-75.2020.8.07.0018, determinou o afastamento imediato de servidores do Sistema de Limpeza Urbana do Distrito Federal que se enquadrem no grupo de risco do Novo Coronavírus.

Feitas estas considerações, passamos a enfrentar as questões

trazidas pelo consulente de forma individualizada.

1 - Pode o servidor recursar de se afastar de suas atividades

laborativas, mesmo sendo grupo de risco?

Em que pese não nos tenham sido fornecidas maiores

informações acerca do caso concreto, não se tratando de servidora gestante e lactante (a qual não seria permitida a flexibilização do decreto), mister um exercício de ponderação dos valores envolvidos.

Assim, de um lado temos o direito à saúde (e, por via reflexa, o

direito à vida) e de outro lado o livre exercício do trabalho ou profissão. Neste ponto, os standarts (questões/pontos relevantes) a serem levantados pela Administração Pública municipal para o exercício da ponderação e resolução da questão devem se referir: (1) à real situação de saúde do servidor (qual categoria do grupo de risco se enquadra o servidor: alguma comorbidade grave; maior de 60 anos; idade acima de 70 anos) a fim de verificar o grau de risco à vida deste; (2) qual as atribuições exercidas pelo servidor (se a mesmas permitem sua completa realização em home office ou teletrabalho sem prejuízo da eficiência); (3) se o servidor ocupa cargo de direção ou chefia exigindo sua supervisão para a eficiência do desempenho das atribuições dos seus subordinados; (4) se o servidor atua na linha de frente do combate à COVID-19.

Na hipótese, há de se ponderar se a assunção do grau de risco

pelo servidor é muito superior ao da sociedade como um todo, risco esse que, ao menos à primeira vista, se revela incompatível com o princípio da dignidade da pessoa humana (art. 1º, III, da Constituição Federal).

Observadas estas questões, as quais devem ser dirimidas no

caso concreto, quer nos parecer que tratando-se, por exemplo, de servidor

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idoso com 60 anos, porém em gozo de boa saúde sem qualquer comorbidade grave que desempenhe cargo que não envolve atendimento ao público e cujas atribuições são desempenhadas de forma mais eficiente na repartição municipal, não haveria óbices para atendimento da solicitação do servidor.

Aqui, vale registrar que, mesmo neste caso, não está o Município

desonerado dos esforços para reduzir os riscos inerentes ao trabalho por meio de normas de saúde, higiene e segurança, devendo proporcionar todas as condições e recomendações das autoridades sanitárias para prevenir os riscos de contágio da COVID-19 no ambiente de trabalho.

2 - Quanto tempo dura a quarentena do grupo de risco, mesmo

não tendo sido contaminado e nenhum caso confirmado no município?"

As medidas de enfrentamento da pandemia da COVID-19, à luz

do art. 3º, § 1º, a Lei nº 13.979/2020, somente poderão ser determinadas com base em evidências científicas e em análises sobre as informações estratégicas em saúde e deverão ser limitadas no tempo e no espaço ao mínimo indispensável à promoção e à preservação da saúde pública. Vejamos:

"Art. 3º: (...)

§ 1º: As medidas previstas neste artigo somente poderão

ser determinadas com base em evidências científicas e em análises sobre as informações estratégicas em saúde e deverão ser limitadas no tempo e no espaço ao mínimo indispensável à promoção e à preservação da saúde pública."

Da mesma forma, a revogação destas medidas somente pode

ocorrer com base em evidências científicas e em análises sobre as informações estratégicas em saúde. Recentemente, a Procuradoria Federal dos Direitos dos Cidadãos (PFDC) no âmbito do Ministério Público Federal editou uma Nota Pública acerca das condições para a transição do Regime de Distanciamento Social Ampliado para o Regime

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de Distanciamento Social Seletivo (Nota Pública/PFDC nº 01/2020).

Neste documento, resta estabelecido que as medidas de

distanciamento social ampliado devem ser mantidas até que o suprimento de equipamentos e equipes de saúde estejam disponíveis em quantitativo suficiente para a salvaguarda da vida da população. Ou seja, a flexibilização de tais medidas, no entender do MPF, somente poderá acontecer quando o ente estiver preparado para enfrentar o pico da demanda da pandemia. Corroborando a presente ilação nos valemos de trecho da mencionada Nota Pública:

"Os esclarecimentos reforçam, portanto, a

indispensabilidade de que qualquer flexibilização ou mitigação da estratégia de ampla quarentena social, denominada distanciamento social ampliado - DAS, pelo Ministério da Saúde, somente pode ser adotada se preenchidos cumulativamente os requisitos de existência de disponibilidade suficiente de equipamentos (respiradores e EPIs), testes laboratoriais, recursos humanos e leitos de UTI e internação, capazes de absorver eventual impacto de aumento de número de casos de contaminação por força da redução dos esforços de supressão de contato social."

Vale ainda mencionar o seguinte trecho da Nota Pública em questão:

"É importante enfatizar que a aparente inexistência de casos em larga escala em algumas localidades não deve servir de parâmetro isolado para qualquer decisão, seja em razão de se tratar de contágios que se realizam em escala exponencial (e, portanto, cenário no qual a percepção aritmética certamente induz a erro de avaliação), seja porque, diante da limitada disponibilidade de testes para diagnóstico da enfermidade, é manifesta a subnotificação de casos. Segundo alguns levantamentos, estima- se que os números reais de pessoas contaminadas e que vieram a óbito podem ser até 10 vezes superiores àqueles oficialmente

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confirmados." (Grifos nossos).

Desta sorte, as medidas adotadas pela municipalidade para o

combate ao avanço da pandemia do Novo Coronavírus (COVID-19) devem estar calcadas em evidências científicas e em análises de estratégia de saúde. De outra feita, para que a municipalidade deixe de adotar o distanciamento social proposto pelo Ministério da Saúde sem que isso venha a implicar uma possível/eventual responsabilização dos gestores, deve justificar essa ação nas orientações do Boletim Epidemiológico nº 8, do Ministério da Saúde, com demonstração de (a) superação da fase de aceleração do contágio, de acordo com os dados de contaminação, internação e óbito; e (b) quantitativo suficiente, estimado para o pico de demanda, de EPIs para os profissionais de saúde, respiradores para pacientes com insuficiência respiratória aguda grave, testes para confirmação de casos suspeitos, leitos de UTI e internação e de recursos humanos capacitados.

Não obstante tais considerações, vale consignar que não nos fora

informado acerca da existência de determinação em âmbito municipal acerca do afastamento dos servidores integrantes do grupo de risco.

3 - Qual a recomendação quanto aos servidores que são do grupo

de risco e cujas atividades não podem ser exercidas em regime de home office?

Salvo existência de medida de afastamento determinada em

âmbito municipal, atualmente não há nenhuma norma que verse acerca dos servidores integrantes do grupo de risco. Não obstante, tem sido comum a concessão do afastamento em sede judicial como aventado alhures.

Para os servidores integrantes do grupo de risco cujas

atribuições não comportem o trabalho em sistema de home office, recomendamos à Administração Pública (salvo se houver medida de enfrentamento na municipalidade que verse acerca do afastamento),

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proceder o exercício de ponderação mencionado anteriormente para avaliar cada situação concreta.

Para aquelas em que após o exercício de ponderação concluir-se

pela impossibilidade do retorno, recomendamos a utilização dos instrumentos trazidos pelo Estatuto dos servidores cujos requisitos possam ser preenchidos pelo servidor para minorar os prejuízos da situação, tais como: concessão de férias, férias prêmio, licenças.

Isto posto, concluímos objetivamente a presente consulta na

forma das razões exaradas.

É o parecer, s.m.j.

Priscila Oquioni Souto

Assessora Jurídica

Aprovo o parecer

Marcus Alonso Ribeiro Neves

Consultor Jurídico

Rio de Janeiro, 18 de maio de 2020.

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Parecer IBAM Nº 1047/2020

SM – Servidor Público. Sustação dos atos do Poder Executivo que exorbitem do poder regulamentar ou dos limites de delegação legislativa. Se não há como se caracterizar o fato gerador de determinada vantagem estatutária do servidor diante da impossibilidade fática e jurídica, tal parcela não é devida. Emergência de saúde pública decorrente do Coronavírus (COVID-19). Comentários.

CONSULTA:

A Consulente, Câmara, indaga sobre a possibilidade de sustação

parlamentar do Decreto (M) nº. 5468/2020 do Prefeito que suprimiu a gratificação de incentivo à docência (pó de giz), previsto na Lei (M) nº. 1.204/97; da gratificação prevista no art. 123 da Lei (M) nº. 1.368/1998 (incentivo da zona rural); adicionais por hora extra e extensão da carga horária; e vale transporte para os professores da rede municipal enquanto durar a emergência de saúde pública internacional ESPIN decorrente do novo Coronavírus COVID-19.

A Consulta segue documentada.

RESPOSTA:

Como é sabido, é da competência exclusiva da Câmara, dentre outras matérias, a sustação dos atos do Poder Executivo que exorbitem do poder regulamentar ou dos limites de delegação legislativa (art. 49, V, da

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CRFB/88). Então, resta saber se houve ou não ato exorbitante do Prefeito.

Cabe ao Município dispor sobre o regime jurídico de seus

servidores (art. 39, caput, da CRFB/88), o que decorre da autonomia que lhe é conferida (art. 18 c/c art. 30, I, da CRFB/88). Contudo, a Medida Provisória nº. 927, de 22/03/2020 inovou no Direito brasileiro ao dispor sobre as medidas para enfrentamento do estado de calamidade pública reconhecido pelo Decreto Legislativo nº. 6, de 20/03/2020, e da emergência de saúde pública de importância internacional decorrente do Coronavírus (COVID-19), e dá outras providências.

Durante esse momento de exceção devem ser aplicadas regras

do direito em caráter transitório, que diminuem os custos e resguardam a economia e a vida da população em geral, inclusive dos próprios servidores.

O Ministério da Economia baixou a Instrução Normativa nº. 28, de

25/03/2020, que estabelece orientações aos órgãos e entidades do Sistema de Pessoal Civil da Administração Pública Federal - SIPEC, quanto à suspensão de serviço extraordinário, do auxílio-transporte, do adicional noturno e dos adicionais ocupacionais aos servidores e empregados públicos que executam suas atividades remotamente ou que estejam afastados de suas atividades presenciais, nos termos da Instrução Normativa nº. 19, de 12/03/2020.

O mesmo entendimento consta no item 4.3 da Nota Explicativa

"Coronavírus: orientações para enfrentamento da pandemia pelos Municípios" (disponível em http:// www.ibam.org.br/media/arquivos/2020/NE_Covid-19.pdf).

Ordinariamente a medida pode ser respaldada no entendimento

clássico sobre as gratificações de serviço e a justa causa para sua suspensão ou supressão. A respeito da natureza das gratificações de serviço, ensina Hely Lopes Meirelles:

"Vantagens pecuniárias são acréscimos ao vencimento

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do servidor, concedidas a título definitivo ou transitório, pela decorrência do tempo de serviço (ex facto temporis), ou pelo desempenho de funções especiais (ex facto officii), ou em razão das condições anormais em que se realiza o serviço (propter laborem), ou, finalmente, em razão de condições pessoais do servidor (propter personam). As duas primeiras espécies constituem os adicionais (adicionais de vencimento e adicionais de função), as duas últimas formam a categoria das gratificações (gratificações de serviço e gratificações pessoais) [...]

Certas vantagens pecuniárias incorporam-se automaticamente ao vencimento (v.g., por tempo de serviço) e o acompanham em todas as suas mutações, inclusive quando se converte em proventos da inatividade (vantagens pessoais subjetivas); outras apenas são pagas com o vencimento, mas dele se desprendem quando cessa a atividade do servidor (vantagens de função ou de serviço) [...]

O que convém fixar é que as vantagens por tempo de serviço integram-se automaticamente no padrão de vencimento, desde que consumado o tempo estabelecido em lei, ao passo que as vantagens condicionais ou modais, mesmo que auferidas por longo tempo em razão do preenchimento dos requisitos exigidos para sua percepção, não se incorporam ao vencimento, a não ser quando essa integração for determinada por lei. E a razão dessa diferença de tratamento está em que as primeiras (por tempo de serviço) são vantagens pelo trabalho já feito (pro labore facto), ao passo que as outras (condicionais ou modais) são vantagens pelo trabalho que está sendo feito (pro labore faciendo), ou, por outras palavras, são adicionais de função (ex facto officii), ou são gratificações de serviço (propter laborem), ou, finalmente, são gratificações em razão de condições pessoais do servidor (propter personam). Daí por que quando cessa o trabalho, ou quando desaparece o fato ou a situação que lhes dá causa, deve cessar o pagamento de tais vantagens, sejam elas adicionais de função, gratificações de serviço ou gratificações em razão das condições pessoais do servidor". (In: MEIRELLES, Hely Lopes. Direito Administrativo Brasileiro. 22ª ed. Malheiros: São Paulo, p. 418-419).

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Ao contrário das gratificações por tempo de serviço, que são vantagens pelo trabalho já feito (pro labore facto), as demais gratificações ou parcelas, como, p. ex., vencimentos dos cargos em comissão e função de confiança, são condicionais ou modais, ou seja, vantagens pelo trabalho que está sendo feito (pro labore faciendo), ou, por outras palavras, são adicionais de função (ex facto officii) ou são gratificações de serviço (propter laborem). Daí se conclui que, quando cessa o trabalho ou quando desaparece o fato ou a situação que lhes dá causa, deve cessar o pagamento de tais vantagens, sejam elas adicionais de função, gratificações de serviço ou gratificações em razão das condições pessoais do servidor.

O Superior Tribunal de Justiça já consolidou seu entendimento

no sentido de que as gratificações de serviço devem terminar juntamente com o término do trabalho que a ensejou ou, desaparecido o motivo excepcional e transitório que a justifique, não havendo possibilidade de incorporação, a menos que haja expressa previsão legal nesse sentido. Vejamos o seguinte julgado:

"ADMINISTRATIVO. SERVIDORAS PÚBLICAS

INATIVAS. AUXÍLIO-TRANSPORTE. INCORPORAÇÃO AOS PROVENTOS. IMPOSSIBILIDADE. NATUREZA PROPTER LABOREM.

- A gratificação denominada "Ajuda de Transporte" é uma vantagem pecuniária do tipo propter laborem, que diz respeito ao efetivo exercício das funções, destinada exclusivamente à necessidade dos servidores se locomoverem, enquanto estiverem prestando serviços ao órgão a que estão vinculados.

- Desaparecendo os motivos que justificaram a sua concessão, extingue-se a razão de seu pagamento, sendo que, somente através de expressa determinação legal é que a referida vantagem pode ser incorporada aos proventos. Ausência de direito líquido e certo à incorporação. Precedentes.

- Recurso ordinário a que se nega provimento". (STJ - 6ª Turma. ROMS nº. 11436 / PI. Publ. DJ de 17/05/2004, p. 286. Rel. Min. PAULO MEDINA).

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As vantagens pro labore faciendo só são devidas enquanto o servidor estiver em efetivo exercício, razão pela qual durante o fechamento dos estabelecimentos de ensino não há fato gerador ou justa causa para o pagamento da gratificação de incentivo à docência (pó de giz), previsto na Lei (M) nº. 1.204/97; da gratificação prevista no art. 123 da Lei (M) nº. 1.368/1998 (incentivo da zona rural); adicionais por hora extra e extensão da carga horária; e vale transporte.

Por fim, quanto ao vale transporte, se não está havendo

deslocamento de trabalho, até porque as escolas estão fechadas, não há como se caracterizar o fato gerador de tal rubrica diante da impossibilidade fática e jurídica, o que impede inclusive o desconto. Nesse sentido, confira-se a jurisprudência trabalhista:

"HORAS IN ITINERE. Discute-se a proporcionalidade das

vantagens concedidas como contrapartida à supressão das horas in itinere, quais sejam: a) cartão alimentação no valor diário de R$ 4,20; b) restituição do desconto de 6% do vale-transporte dos meses de outubro, novembro e dezembro de 2015. O eg. TRT manteve a r. sentença que declarou "incidentalmente inválida a contrapartida, ajustada no ACT/2015, em relação ao tempo despendido no transporte, qual seja, cartão alimentação no valor diário de R$ 4,20", por ter excedido os limites da razoabilidade. Registrou, ainda, que "não há que se falar que a ausência de desconto de 6% a título de 'vale-transporte' representaria uma contrapartida da ré. Isto porque, a se considerar o período em que a sede da empresa não era servido por transporte público, não haveria como se caracterizar o fato gerador do desconto da cota- parte de custeio do empregado. Portanto, não há nenhuma 'concessão' por parte da ré, mas simples impossibilidade fática e jurídica de se operar tal desconto". O art. 896-A, § 1º, II, da CLT prevê como indicação de transcendência jurídica "a existência de questão nova em torno da interpretação da legislação trabalhista". A jurisprudência do c. TST ainda não pacificou entendimento acerca da matéria, o que viabiliza que se reconheça a transcendência jurídica da causa. Reconhecida a transcendência

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jurídica, procede-se ao exame do agravo de instrumento. A transcrição de trecho insuficiente do v. acórdão regional não atende ao requisito descrito pelo art. 896, § 1º-A, I, da CLT, bem como impede que a recorrente faça a demonstração analítica das ofensas e contrariedades apontadas, conforme exige o art. 896, § 1º-A, III, da CLT. Agravo de instrumento de que se conhece e a que se nega provimento". (TST - 6ª Turma. AIRR nº. 0012358-29.2016.5.03.0098 Brasília, 17 de outubro de 2019. Min. RENATO DE LACERDA PAIVA)

Em suma: 1) o Município não só pode como deve suprimir a

gratificação de incentivo à docência (pó de giz), a gratificação de incentivo da zona rural, os adicionais por hora extra e extensão da carga horária, bem como o vale transporte para os professores da rede municipal enquanto durar a emergência de saúde pública internacional ESPIN decorrente do novo Coronavírus COVID-19; 2) não verificamos exorbitância no ato do Prefeito que justifique a sustação do Decreto pela Câmara.

É o parecer, s.m.j.

Jaber Lopes Mendonça Monteiro

Consultor Técnico

Aprovo o parecer

Marcus Alonso Ribeiro Neves

Consultor Jurídico

Rio de Janeiro, 18 de maio de 2020.

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Parecer IBAM Nº 1055/2020

AM – Ação Municipal, SM – Servidor Público. Enfrentamento da pandemia do novo Coronavírus (COVID-19). Servidores da área da saúde exercem atividade essencial que não pode ser interrompida, mas são também destinatários de normas que reduzam os riscos inerentes ao trabalho. Grupos de risco. Comentários.

CONSULTA:

O Exmo. Prefeito Municipal, considerando "o uso de EPIs" e o "princípio da

prestação de serviço público", o número reduzido de profissionais, e

também a importância da retomada de outros

atendimentos eletivos e o enfrentamento da epidemia da Dengue, informa

que o Município decretou, "conforme art. 24, inciso II", que os servidores

da área da saúde, conforme necessidades, devem manter o atendimento

mesmo que de maneira diferenciada. Em vista do exposto, indaga:

• Pode o município convocar servidores para a retomada de suas

atividades laborativas, mesmo sendo parte do grupo de risco? E na área

da saúde?

A consulta não vem documentada.

RESPOSTA:

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Inicialmente, temos que a rápida expansão da pandemia do novo

Coronavírus (COVID-19) impôs sérias restrições ao nosso modo de vida.

Como tem sido amplamente divulgado, as estratégias de distanciamento

social contribuem, principalmente, para evitar o colapso nos sistemas de

saúde locais, salvaguardando vidas.

Cabe observar que os Municípios, assim como os Estados e a

União, dispõem de autonomia político-administrativa nos termos do art. 18

da Constituição da República (CRFB). Nessa autonomia se insere a

competência para dispor sobre o regime jurídico de seus servidores

públicos (art. 39, caput, da CRFB), que deve ser exercida nos termos e

nos limites da própria CRFB. Assim é que na gestão de pessoal, cabe ao

Município buscar permanentemente a redução dos riscos inerentes ao

trabalho, por meio de normas de saúde, higiene e segurança, nos precisos

termos do art. 39, § 3º c/c art. 7º, XXII, da CRFB.

Dentre as medidas de contenção à expansão da pandemia da

COVID-19 adotadas pela União, Estados e Municípios estão a instituição

do home office, trabalho remoto e teletrabalho para os ocupantes de

cargos que admitem estas modalidades de exercícios de suas atribuições,

bem como a concessão de férias coletivas, licenças, banco de horas e

escalas para os servidores cujas atribuições somente podem se dar de

forma presencial.

É bem verdade que, com exceção das gestantes e lactantes às

quais não é permitido nenhuma forma de trabalho insalubre (ADI nº 5938),

não há disposição expressa que trate do afastamento de servidores pelos

entes federados. No entanto, isso não significa possa a Administração

Pública ignorar a pandemia, colocando em risco a saúde dos servidores e

da população. É evidente que se há restrições a atividades privadas não

essenciais, e mesmo as atividades essenciais devem ser exercidas com

cuidados especiais, com maior razão deve a Administração Pública tomar

medidas de precaução no âmbito de suas repartições.

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Dentre as atividades essenciais que não podem ser

interrompidas, encontra-se, evidentemente, as atividades na área da

saúde, tais como médicos, enfermeiros, técnicos de enfermagem,

psicólogos, fisioterapeutas, radiólogos, etc. Isso não significa, entretanto,

que em relação a esses profissionais não deva o Município tomar

providência alguma, porque os servidores públicos, como afirmado, são

destinatários do mandamento constitucional segundo o qual devem ser

reduzidos os riscos inerentes ao trabalho por meio de normas de saúde,

higiene e segurança (art. 7º, XXII c/c art. 39, § 3º, da CRFB). Assim,

mesmo que possam permanecer em atividade os servidores que atuam na

área da saúde, o Município deve fornecer todos os meios possíveis para

proteger sua saúde, conforme as melhores orientações técnicas.

Além disso, nem todas as atividades no âmbito da saúde são

obrigatoriamente presenciais. Exemplo maior é a recente Lei nº

13.988/2020, que regulamenta a telemedicina. Com efeito, mesmo na área

no âmbito dos serviços públicos e privados de saúde, quando for possível

evitar o trânsito de pessoas nas unidades e o contato desnecessário de

médicos e demais profissionais da saúde com pacientes, é medida de

precaução de forte impacto positivo contra a expansão da pandemia.

Outro exemplo é a Resolução nº 11/2018 do Conselho Federal

de Psicologia (CFP), editada em consonância com a Lei nº 5.766/1971,

que dispõe sobre o atendimento por meio de tecnologias da informação e

telecomunicação. Com base no dispositivo em comento, o próprio CFP

editou o Ofício Circular nº 40/2020/GTec/CG-CFP, o qual orientou

gestores públicos, empregadores de psicólogos e usuários de serviços

públicos, em virtude da pandemia do novo Coronavírus (COVID-19) e da

premente necessidade de sua contenção a adoção de atendimento à

distância, quando possível. Na mesma esteira, andou o Conselho Federal

de Fisioterapia ao editar a Resolução COFFITO nº 516/2020, que

autorizou a teleconsulta, teleconsultoria e telemonitoramento. Isso para

não falar nos servidores da área da saúde que atuam nas atividades-meio

de natureza burocrática, que eventualmente poderão também se dar total

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ou parcialmente à distância.

Importante notar que as ações e serviços públicos do SUS

fundam-se nos princípios da universalidade e no atendimento integral,

tendo entre seus princípios organizativos a regionalização e a

hierarquização (art. 198, da CRFB). Assim é que a Lei nº 8.080/1990

reproduz o comando constitucional ao estabelecer no art. 7º, IX, “b” a regionalização e a hierarquização dentre os princípios orientadores das

ações do SUS. Foi nesse sentido que andou o Decreto nº 7.058/2011 ao

estabelecer que o acesso universal, igualitário e ordenado dos serviços do

SUS se inicia pelas “Portas de Entrada”, e se completa, quando for o caso, pela rede regionalizada e hierarquizada de acordo com a complexidade do

agravo. Existem, assim, diversas modalidades de atenção à saúde,

especialmente, mas não exclusivamente, no campo do atendimento

secundário, que são compatíveis com regime de teletrabalho.

É de se noticiar que há decisões no âmbito dos Tribunais que

vem determinando cautelarmente o afastamento de servidores integrantes

do chamado grupo de risco da COVID-19 de suas atividades. O Tribunal

Regional do Trabalho da 2ª Região concedeu liminar no bojo de ação civil

pública (ACP nº 1000353-66.2020.5.02.0058) proposta pelo Sindicato dos

trabalhadores públicos da saúde no Estado de São Paulo para determinar,

dentre outras medidas, "a liberação imediata das atividades presenciais os

empregados substituídos processualmente que estejam enquadrados no

grupo de risco, assim compreendidos os idosos com 60 anos ou mais, as

gestantes, os portadores de doenças respiratórias crônicas, cardiopatias,

diabetes, hipertensão, doenças renais, ou de quaisquer outras afecções

que deprimam o sistema imunológico, assegurando-lhes todos os direitos

e benefícios do contrato de trabalho".

Conclui-se, portanto, que as ações e serviços de saúde são

atividades essenciais que não devem ser interrompidas no curso das

medidas de enfrentamento à pandemia do novo Coronavírus (COVID-19).

Isso não significa, entretanto, que possa o Município negligenciar a saúde

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dos servidores da área da saúde, devendo promover medidas visando à

redução dos riscos inerentes ao trabalho, nomeadamente daqueles que

pertencem ao grupo de risco, promovendo tanto quanto possível medidas

de distanciamento social. Ressalte-se, por fim, que as servidoras

gestantes devem ser afastadas de suas funções presenciais.

É o parecer, s.m.j.

Gustavo da Costa Ferreira M. dos Santos

Consultor Técnico

Aprovo o parecer

Marcus Alonso Ribeiro Neves

Consultor Jurídico

Rio de Janeiro, 18 de maio de 2020.

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Parecer IBAM Nº 1059/2020

FM – Finanças Municipais, SM – Servidor Público. Projeto de lei complementar nº 39/2020, que estabelece o Programa Federativo de Enfrentamento ao Coronavírus e altera a Lei Complementar nº 101/2000. Revisão geral anual. Concurso público em andamento para provimento de cargos decorrentes de reestruturação administrativa. Comentários.

CONSULTA:

A Câmara Municipal solicita análise e pronunciamento deste

Instituto a respeito da aprovação do Projeto de Lei Complementar n°

39/2020, que "congelou os salários dos servidores públicos até dezembro

de 2021 e suspendeu a contratação de pessoal em determinadas

hipóteses."

Relata que o art. 8º, I, da aludida proposição estabelece a

proibição de conceder, a qualquer título, vantagem, aumento, reajuste ou

adequação de remuneração.

Assim, considerando que revisão geral anual (art. 37, X, da

CRFB) e o reajuste remuneratório apresentam naturezas jurídicas

diversas, pois decorrem de institutos constitucionais distintos e iniciativas

legislativas diferenciadas, pergunta-se: i) considerando que o mês de maio

é a data base da categoria, o termo reajuste utilizado no PLP 39 tem o

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condão de impedir a aplicação do índice da inflação para atualização dos

salários?

Relata ainda, já no tocante à questão de novas contratações, que

há um concurso público em andamento para a contratação de alguns

servidores, referentes a vagas que foram criadas no mês de janeiro de

2020, com a publicação da nova lei de reestruturação.

Pergunta, ii) considerando que a criação das vagas é anterior a

situação de calamidade pública causada pela pandemia, bem como ao

Projeto de Lei Complementar nº 39/2020, se os candidatos que forem

aprovados poderão ser empossados.

Informa que a homologação do concurso está prevista para

29/06/2020.

A consulta não vem documentada.

RESPOSTA:

A rápida expansão da pandemia do novo Coronavírus

(COVID-19) impôs sérias restrições ao nosso modo de vida, sendo certo

que as recomendações de distanciamento social e de quarentena geram

uma redução substancial da circulação de pessoas, que levam, por sua

vez, a impactos sensíveis nas mais diversas áreas da sociedade e, por

conseguinte, a necessidade de organização da Administração Pública

para atendimento das demandas e manutenção do bem comum.

Diante do acelerado avanço da doença no Brasil e dos múltiplos

desdobramentos no campo da saúde e da economia, ao longo deste ano

de 2020, os poderes Executivo, Legislativo e Judiciário têm adotado,

proposto ou sugerido medidas, providências ou ordens, de conteúdos

diversos, para instrumentalizar o Poder Público e a sociedade em geral com

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os meios que se reputam oportunos e necessários para

enfrentamento da crise.

Normas e decisões recentes, tomadas já na vigência do atual e

inédito estado de calamidade, evidenciam esse cenário, no qual União,

Estados, Distrito Federal e Municípios têm anunciado medidas importantes

para assegurar o funcionamento do Estado. Trata-se de uma situação

excepcional que tem exigido de todos as soluções antes não pensadas.

Atualmente se encontra para sanção e promulgação do

Presidente da República o PLP nº 39/2020 aprovado por ambas as Casas

do Congresso Nacional, o qual encarta o Programa Federativo de

Enfrentamento ao Coronavírus, que estabelece medidas de socorro

financeiro da União para os demais entes federativos mediante algumas

contrapartidas negociadas pelo Executivo com o Senado Federal.

Aqui, cabe fazer duas observações: a emissão de parecer a

respeito de proposição ainda não sancionada deve ter em vista o fato de

que a lei só entra em vigor após a promulgação e vigência, de modo que

as disposições nela contidas não estão aptas a produzir efeitos e não têm

aplicabilidade. Como é sabido, enviado o projeto para sanção, o Poder

Executivo tem a prerrogativa de veto, e não necessariamente os

dispositivos que embasarão os entendimentos do parecer serão

sancionados. Além disso, a proposição é muito abrangente e alberga

concomitantemente regras transitórias e modificações permanentes em

normas de direito financeiro, de modo que a resposta ao presente parecer

será direcionada para os questionamentos específicos do consulente,

nomeadamente os relacionados à aplicação das restrições financeiras à

revisão geral anual e ao provimento de cargos criados no ano corrente.

Nesse passo, é de se dizer que o PLP nº 39/2020, dentre outras

medidas, promove a suspensão do prazo de vigência dos concursos

públicos homologados até o término da vigência do estado de calamidade

pública estabelecido pela União, veda a criação de cargos, da realização

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de concursos e a nomeação de servidores públicos até dezembro de

2021, bem como, no mesmo prazo, proíbe a concessão, a qualquer título,

de vantagem, aumento, reajuste ou adequação de remuneração, com

algumas exceções. Promove, ainda, permanente alteração dos art. 21 da

LRF que trata do controle da despesa total com pessoal, assim como de

seu art. 65 que mitiga os rigores da lei de responsabilidade fiscal na

ocorrência de calamidade pública reconhecida pelo Congresso Nacional,

no caso da União, ou pelas Assembleias Legislativas, na hipótese dos

Estados e Municípios, enquanto perdurar a situação de emergência.

Assim, considerando o disposto no teor da proposição, passamos

a responder objetivamente aos questionamentos formulados:

i) Considerando que o mês de maio é a data base da categoria, o

termo reajuste utilizado no PLP 39 tem o condão de impedir a aplicação do

índice da inflação para atualização dos salários?

Como bem apontado pelo consulente, a revisão geral anual não

se confunde com o aumento remuneratório concedido isoladamente às

categorias de agentes públicos. Sobre o tema, é pertinente a lição de Hely

Lopes Meirelles:

"Há duas espécies de aumento de vencimentos: uma

genérica, provocada pela alteração do poder aquisitivo da moeda, à

qual poderíamos denominar aumento impróprio, por se tratar, na

verdade, de um reajustamento destinado a manter o equilíbrio da

situação financeira dos servidores públicos; e, outra, específica,

geralmente feita à margem da lei que concede o aumento geral,

abrangendo determinados cargos ou classes funcionais e

representando realmente uma elevação de vencimentos, por se

fazer em índices não proporcionais ao decréscimo do poder

aquisitivo." (MEIRELLES, Hely Lopes. Direito Administrativo

Brasileiro. São Paulo: Malheiros Editores, 2002, p. 452).

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Não é diferente o entendimento do Supremo Tribunal Federal,

que distinguiu os institutos do reajuste e do aumento remuneratório, a

saber:

"Se de um lado é possível ao Estado conceder aumentos

setorizados, de outro conflita com a Carta a outorga de reajuste

que não alcance todo o quadro funcional. Sendo o Direito uma

ciência, os institutos, expressões e vocábulos possuem sentido

próprio, descabendo confundi-los. O aumento atrai,

necessariamente, um plus, enquanto o reajuste visa tão-somente à

reposição do poder aquisitivo." (RE nº 192.277-0. Rel.: Min. Marco

Aurélio. In: DJ, 17-04-98).

A própria LRF traz distinção entre os conceitos de revisão geral

anual e aumento de servidores públicos, trazendo no art. 22, I, exceção ao

controle quadrimestral do limite prudencial de despesas com pessoal, que

não se aplica quando o reajuste do valor nominal constituir revisão geral

de remuneração.

O art. 8º, IV do PRP 39/2020 é muito claro ao estender a

vedação "a qualquer título, vantagem, aumento, reajuste ou adequação de

remuneração a membros de Poder ou de órgão, servidores e empregados

públicos e militares" (grifo nosso). Portanto, compreende-se incluído no

dispositivo em comento a vedação à revisão geral anual, até 31 de

dezembro de 2021, uma vez que a expressão "a qualquer título" abrange

qualquer modalidade de aumento nominal de remuneração.

Cabe observar que o art. 8º, § 6º do PLP nº 39/2020 faz exceção

à vedação em comento relativa a algumas categorias profissionais. O

dispositivo tem causado muita polêmica, havendo notícias de que será

vetado, e notícias de que não será vetado. De qualquer modo, seja vetado

ou não, não ficaria alterada a conclusão do parecer, porque a revisão geral

anual, como indica o próprio nome, é geral (art. 37, X, da CRFB), isto

é, se aplica a todos os servidores. Portanto, o fato de haver exceção para

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algumas categorias não altera o entendimento pela proibição de que se

promova a revisão geral anual até 31 de dezembro de 2021, porque não

há que se falar em "revisão geral anual" que abranja apenas certas

categorias profissionais. Nesse caso, tratar-se-ia de aumento propriamente

dito.

Por derradeiro, cabe salientar que pode ser questionada a

constitucionalidade ou pedida interpretação conforme a Constituição, em

sede de ação direta de inconstitucionalidade, para questionar o dispositivo

em vista do art. 37, X, da CRFB.

Por outro lado, é de se considerar que o inciso VIII do mesmo

artigo 8º em questão veda reajuste de despesa obrigatória acima do IPCA,

do que se depreende que a variação positiva nominal da despesa abaixo

do IPCA estaria permitida mesmo no decurso das medidas restritivas

fiscais, vigentes até o dia 31 de dezembro de 2021.

De um lado, é um tanto incongruente que outras despesas

obrigatórias da administração pública possam ser corrigidas pela inflação,

e não possam ser corrigidos pela inflação, também, os valores de

remuneração dos servidores, que experimentarão uma redução no

poder real de compra ao longo do período, caso haja inflação e o valor

nominal da remuneração não seja corrigido. Por outro lado, sabe-se que na

iniciativa privada, muitos trabalhadores perderam o emprego, sofreram

redução de remuneração e, para os que permaneceram em seus

empregos, a perspectiva de terem seus salários corrigidos pela inflação é

mínima. Assim, a mens legislatoris foi bastante influenciada pela situação

dos trabalhadores da iniciativa privada em cotejo com a dos servidores

públicos.

Assim, em vista da presunção de constitucionalidade das leis e da

redação abrangente do art. 8º, I, caso venha a vigorar o dispositivo da

proposição em comento, não haverá segurança jurídica na concessão de

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revisão geral anual.

Conclui-se, assim, que após a entrada em vigor da lei

complementar que resultará da sanção do Projeto de Lei Complementar nº

39/2020, caso concretizada, não será viável a revisão geral anual dos

vencimentos dos servidores em vista do disposto no art. 8º, I, do ato

normativo, até o dia 31 de dezembro de 2021.

ii) Considerando que a criação das vagas é anterior a situação de

calamidade pública causada pela pandemia, bem como ao Projeto de Lei

Complementar nº 39/2020, se os candidatos que forem aprovados poderão

ser empossados.

Em nosso entender, a suspensão dos concursos não atinge os

concursos em andamento que já tenham edital publicado e iniciado as

inscrições, mas os órgãos de controle podem conferir interpretação mais

restritiva à vedação constante do inciso V do artigo 8º no sentido de que

estaria vedado realizar qualquer ato relacionado à execução de concursos

públicos.

No entanto, fato é que o art. 8º, IV apenas admite a admissão de

aprovados em concurso público para ocupar cargos que decorram de

vacância, senão vejamos sua redação:

"Art. 8º. Na hipótese de que trata o art. 65 da Lei

Complementar nº 101, de 4 de maio de 2000, a União, os Estados,

o Distrito Federal e os Municípios afetados pela calamidade pública

decorrente da pandemia do Covid-19 ficam proibidos, até 31 de

dezembro de 2021, de:

(...)

II - criar cargo, emprego ou função que implique aumento

de despesa;

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III - alterar estrutura de carreira que implique aumento de

despesa;

IV - admitir ou contratar pessoal, a qualquer título,

ressalvadas as reposições de cargos de chefia e de direção que não

acarretem aumento de despesa, as reposições decorrentes de

vacâncias de cargos efetivos ou vitalícios, as contratações

temporárias de que trata o inciso IX do art. 37 da Constituição

Federal, as contratações temporárias para prestação de serviço

militar e as contratações de alunos de órgãos de formação de

militares;

(...)" (grifo nosso)

Portanto, quando as vagas de cargos efetivos ou vitalícios em

disputa no concurso decorram de vacância, nosso entendimento é de que

podem ser realizadas as nomeações dos aprovados, desde que

obedecidas as demais normas e parâmetros de responsabilidade fiscal,

nomeadamente as novas vedações no art. 21 da LRF e as disposições

transitórias trazidas no art. 8º da proposição.

Por outro lado, não há segurança jurídica, conquanto haja

previsão no edital, para a nomeação de candidatos para cargos que não

decorram de vacância, até o dia 31 de dezembro de 2021. Quando não se

trate de reposição de vacâncias, apenas poderão haver nomeações a partir

de 1º de janeiro de 2022, quando deixarão de vigorar as restrições

do art. 8º, IV, do PLP nº 39/2020 que provavelmente se converterá em lei

complementar.

No caso da consulta, todas as vagas em disputa no concurso são

para investidura em cargos criados em 2020, em decorrência

de reestruturação do quadro de pessoal. Portanto, todos os cargos foram

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criados recentemente, e jamais foram ocupados, de modo que não há que

se falar em vacância. Não haverá supedâneo legal, caso passe a vigorar o

disposto no art. 8º, IV do PLP nº 39/2020, para realização das nomeações,

porque os cargos criados em 2020 não se enquadram em qualquer

hipótese de exceção.

Em vista do exposto, conclui-se que, caso passe a vigorar o art.

8º, IV, do PLP nº 39/2020, afigurar-se-á inviável, antes de 01 de janeiro de

2022, a nomeação de candidatos aprovados em concurso público para

provimento de cargos que foram criados no ano de 2020, uma vez que a

redação do dispositivo apenas alberga, em caso de cargos efetivos, a

nomeação para fins de reposição de vacâncias. Como o cargo novo

jamais foi ocupado, não há que se falar em reposição de vacâncias, de

modo que não se aplica a exceção.

É o parecer, s.m.j.

Gustavo da Costa Ferreira M. dos Santos

Consultor Técnico

Aprovo o parecer

Marcus Alonso Ribeiro Neves

Consultor Jurídico

Rio de Janeiro, 19 de maio de 2020.

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Parecer IBAM Nº 1082/2020

AU – Autarquia, Empresa Pública, Fundações e Sociedades de Economia Mista. Realização de concurso público. Combate à pandemia do Novo Coronavírus. Ano de eleições municipais. Considerações.

CONSULTA:

Relata o consulente que o Ministério Público do Estado respectivo recomendou a criação do cargo de Procurador e realização de concurso público para o seu provimento.

Ainda conforme as informações do consulente, a criação e

provimento de outros cargos efetivos se fazem necessários ante o grande crescimento de bairros na cidade e aumento da demanda dos usuários.

Diante das situações relatadas, tendo em vista que o corrente

ano é de eleições municipais, bem como a expansão da pandemia da COVID-19, indaga o consulente acerca da possibilidade de criação dos cargos e realização de concurso público para os respectivos provimentos.

A consulta não veio documentada.

RESPOSTA:

Inicialmente, tendo em vista que, não obstante a situação de calamidade pública decorrente da pandemia do Novo Coronavírus (COVID-19), até a presente data o TSE mantém o Calendário Eleitoral (Res. TSE nº 23.606/2019), há de se observar que a Lei nº 9.504/1997

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proíbe a prática de uma série de condutas tendentes a afetar a igualdade de oportunidades entre candidatos nos pleitos eleitorais.

Vale registrar que não é qualquer dos atos citados na Lei que

implica em descumprimento da regra eleitoral. Há que influenciar na disputa, a teor do disposto no caput do art. 73 da Lei das Eleições. Em outras palavras, a conduta vedada deve ser de tal intensidade que possa comprometer a isonomia de chances entre os candidatos.

Os atos e ações do Poder Público, incapazes de desequilibrar a

disputa eleitoral ou de influenciarem no resultado das eleições, não devem sofrer limitação, pois o bem jurídico protegido encontra-se salvaguardado.

As normas eleitorais buscam resguardar a igualdade da disputa

entre candidatos. Não existem, em tese, matérias que não possam ser aprovadas pelo Legislativo em ano eleitoral. Algumas, porém, podem influenciar diretamente as eleições. Por isso, a lei ou sua interpretação pelos tribunais não protege os que buscam violar os seus preceitos ou utilizar as decisões a favor de condutas contrárias à legalidade ou à moralidade.

Dentro deste contexto, o art. 73, V, da Lei nº 9.504/1997 dispõe da

seguinte forma:

"Art. 73. São proibidas aos agentes públicos, servidores ou

não, as seguintes condutas tendentes a afetar a igualdade de oportunidades entre candidatos nos pleitos eleitorais:

(...)

V - nomear, contratar ou de qualquer forma admitir,

demitir sem justa causa, suprimir ou readaptar vantagens ou por outros meios dificultar ou impedir o exercício funcional e, ainda, ex officio, remover, transferir ou exonerar servidor público, na circunscrição do pleito, nos três meses que o antecedem e até a posse dos eleitos, sob pena de nulidade de pleno direito,

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ressalvados:

a) a nomeação ou exoneração de cargos em comissão e

designação ou dispensa de funções de confiança;

b) a nomeação para cargos do Poder Judiciário, do

Ministério Público, dos Tribunais ou Conselhos de Contas e dos órgãos da Presidência da República;

c) a nomeação dos aprovados em concursos públicos

homologados até o início daquele prazo;

d) a nomeação ou contratação necessária à instalação ou

ao funcionamento inadiável de serviços públicos essenciais, com prévia e expressa autorização do Chefe do Poder Executivo;

e) a transferência ou remoção ex officio de militares,

policiais civis e de agentes penitenciários;"

Nessas eleições, os 3 meses antes do pleito do art. 73, V, da Lei

n°. 9.504/1997 ocorrem em 04/07/2020.

Em prosseguimento, temos que, em sendo este o último ano de

mandato do Chefe do Poder Legislativo, o art. 21, parágrafo único, da Lei de Responsabilidade Fiscal - LRF (LC nº 101/2000) dispõe da seguinte forma:

"Art. 21: (...)

Parágrafo único. Também é nulo de pleno direito o ato de

que resulte aumento da despesa com pessoal expedido nos cento e oitenta dias anteriores ao final do mandato do titular do respectivo Poder ou órgão referido no art. 20."

Acerca do referido dispositivo, é importante a lição de Maria

Sylvia Zanella Di Pietro:

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"A intenção do legislador com a norma do parágrafo único foi impedir que, em fim de mandato, o governante pratique atos que aumentem o total de despesa com pessoal, comprometendo o orçamento subseqüente ou até mesmo superando o limite imposto pela lei, deixando para o sucessor o ônus de adotar as medidas cabíveis para alcançar o ajuste. O dispositivo, se fosse entendido como proibição indiscriminada de qualquer ato de aumento de despesa, inclusive atos de provimento, poderia criar situações insustentáveis e impedir a consecução de fins essenciais, impostos aos entes públicos pela própria Constituição.

(...)

Será, portanto, essencial para a prática, pelo gestor

público, de atos que impliquem em aumento das despesas com pessoal, no período previsto no parágrafo único do art. 21 da LRF, que tais atos consistam em mera concretização de anterior comando legal, além de necessários ao cumprimento, pelo administrador, de seu dever de não paralisar a administração pública. Isto significa que, a partir da LRF, é fundamental a devida e ampla motivação do ato administrativo, pelo titular de Poder ou órgão responsável por sua edição, deixando clara a legitimidade e moralidade da despesa." (DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella. Comentários à Lei de Responsabilidade Fiscal. São Paulo: Saraiva, 2001, pág. 155/156).

Feitas estas considerações, atentos ao fato de que a criação de

um cargo acarreta aumento de despesa de pessoal, em tese, a criação dos cargos de procurador e outros é possível desde que até a data limite de 04/07/2020. Vale ainda observar que a nomeação para o cargo somente será viável no corrente ano caso a criação do cargo e a realização do concurso público para o respectivo provimento sejam realizados de forma que a homologação do resultado do certame também se dê até esta data limite de 04/07/2020.

Não obstante as considerações trazidas, não podemos relegar o

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fato de que se encontra para sanção do Presidente da República o PLP nº 39/2020, o qual encarta o Programa Federativo de Enfrentamento ao Coronavírus, que prestará auxílio financeiro de R$ 125 bilhões a Estados e Municípios para enfrentamento da pandemia da Covid-19 e promove alterações na LC nº 101/2000 (Lei de Responsabilidade Fiscal - LRF).O objetivo das alterações promovidas na LRF e da própria propositura é, essencialmente, socorrer Estados e Municípios da crise econômica que já se avizinha com a pandemia do Novo Coronavírus. Para tanto, tal qual acontece com todos os auxílios prestados pela União aos demais entes federados, algumas contraprestações serão exigidas e neste cenário, o art. 8º da propositura em questão dispõe da seguinte forma:

"Art. 8º: Na hipótese de que trata o art. 65 da Lei

Complementar nº 101, de 4 de maio de 2000, a União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios afetados pela calamidade pública decorrente da pandemia da Covid-19 ficam proibidos, até 31 de dezembro de 2021, de:

(...)

II - criar cargo, emprego ou função que implique aumento

de despesa;

(...)

IV - admitir ou contratar pessoal, a qualquer título,

ressalvadas as reposições de cargos de chefia e de direção que não acarretem aumento de despesa, as reposições decorrentes de vacâncias de cargos efetivos ou vitalícios, as contratações temporárias de que trata o inciso IX do art. 37 da Constituição Federal, as contratações de temporários para prestação de serviço militar e as contratações de alunos de órgão de formação de militares;

V - realizar concurso público, exceto para as reposições de

vacâncias previstas no inciso IV;" (Grifos nossos).

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Por conseguinte, em que pese as considerações anteriormente explicitadas, com a entrada em vigor do art. 8º, II, IV e V do PLP nº 39/2020, resta vedado, até 31 de dezembro de 2021, criar cargo, emprego ou função que implique aumento de despesa e realizar concurso público, exceto para as reposições de vacâncias.

Isto posto, concluímos objetivamente a presente consulta na

forma das razões exaradas.

É o parecer, s.m.j.

Priscila Oquioni Souto

Assessora Jurídica

Aprovo o parecer

Marcus Alonso Ribeiro Neves

Consultor Jurídico

Rio de Janeiro, 20 de maio de 2020.

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Parecer IBAM Nº 1117/2020

SM – Servidor Público. Medidas de enfrentamento ao novo Coronavírus (Covid-19). Vigilância sanitária. Horas extras e turnos de revezamento por escalas e plantões. Limites de gastos com pessoal e decretação de calamidade pública. Comentários.

CONSULTA:

A Prefeitura Municipal solicita análise e pronunciamento deste

Instituto a respeito do pagamento de horas extras a servidores públicos,

tendo em vista o crescimento do número de casos de dengue e febre

amarela, bem como da Situação de Emergência de Saúde Pública em

decorrência da infecção humana pelo Coronavírus (Covid-19).

Informa a Prefeitura que é necessário que os servidores que

trabalham na Vigilância Sanitária realizem trabalhos fora do horário de

expediente, inclusive aos finais de semana. Aduz o consulente, ainda, que

"não há legislação regulamentando o regime de plantão/sobreaviso para tais

servidores". Diz, ainda, que a despesa com pessoal atualmente é de 55%

da receita corrente líquida, não sendo permitido, assim, o pagamento

de horas extras.

Indaga, em vista de tudo que foi exposto, quanto à possibilidade

de regulamentação de plantão/sobreaviso para os servidores da vigilância

sanitária, e de efetuar o pagamento de tal verba mesmo com a despesa de

pessoal estando em 55% da receita corrente líquida.

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164

A consulta não vem documentada.

RESPOSTA:

A Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF — Lei Complementar nº 101/2000)

tem como finalidade primordial a ação planejada e transparente na gestão

das finanças públicas, a fim de que se previnam riscos e se corrijam desvios

que possam afetar o equilíbrio das contas.

Para tanto, estabelece a LC nº 101/2000, diversas regras

destinadas ao controle das metas de resultados entre despesas e receitas,

dentre as quais a previsão, em seu art. 23, de um prazo de dois

quadrimestres para readequação aos limites de despesa com pessoal

quando ultrapassados os percentuais previstos nos arts. 19 e 20 da LRF,

vedando-se, em caso de descumprimento, o recebimento de

transferências voluntárias de estados e da União, a realização de

operações de crédito e a obtenção de garantia de outro ente federativo (§

3º do art. 23, da LRF), senão vejamos:

"Art. 23. Se a despesa total com pessoal, do Poder ou

órgão referido no art. 20, ultrapassar os limites definidos no mesmo

artigo, sem prejuízo das medidas previstas no art. 22, o percentual

excedente terá de ser eliminado nos dois quadrimestres seguintes,

sendo pelo menos um terço no primeiro, adotando-se, entre outras,

as providências previstas nos §§ 3º e 4º do art. 169 da

Constituição.

§ 1º No caso do inciso I do § 3º do art. 169 da

Constituição, o objetivo poderá ser alcançado tanto pela extinção

de cargos e funções quanto pela redução dos valores a eles

atribuídos. (Vide ADIN 2.238-5)

§ 2º É facultada a redução temporária da jornada de

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trabalho com adequação dos vencimentos à nova carga horária.

(Vide ADIN 2.238-5)

§ 3º Não alcançada a redução no prazo estabelecido, e

enquanto perdurar o excesso, o ente não poderá:

I - receber transferências voluntárias;

II - obter garantia, direta ou indireta, de outro ente;

III - contratar operações de crédito, ressalvadas as

destinadas ao refinanciamento da dívida mobiliária e as que visem

à redução das despesas com pessoal.

§ 4º As restrições do § 3º aplicam-se imediatamente se a

despesa total com pessoal exceder o limite no primeiro quadrimestre

do último ano do mandato dos titulares de Poder ou órgão referidos

no art. 20.

§ 5º As restrições previstas no § 3º deste artigo não se

aplicam ao Município em caso de queda de receita real superior a

10% (dez por cento), em comparação ao correspondente

quadrimestre do exercício financeiro anterior, devido a: (Incluído

pela Lei Complementar nº 164, de 2018)

I – diminuição das transferências recebidas do Fundo de

Participação dos Municípios decorrente de concessão de isenções

tributárias pela União; e (Incluído pela Lei Complementar nº 164,

de 2018)

II – diminuição das receitas recebidas de royalties e

participações especiais. (Incluído pela Lei Complementar nº 164,

de 2018).

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§ 6º O disposto no § 5º deste artigo só se aplica caso a

despesa total com pessoal do quadrimestre vigente não ultrapasse

o limite percentual previsto no art. 19 desta Lei Complementar,

considerada, para este cálculo, a receita corrente líquida do

quadrimestre correspondente do ano anterior atualizada

monetariamente. (Incluído pela Lei Complementar nº 164, de 2018)".

(grifo nosso)

Ocorre que a LRF, prevendo a ocorrência de situações

excepcionais de calamidade pública ou grave comoção nacional,

estabelece em seu art. 65 o seguinte:

"Art. 65. Na ocorrência de calamidade pública reconhecida

pelo Congresso Nacional, no caso da União, ou pelas Assembléias

Legislativas, na hipótese dos Estados e Municípios, enquanto

perdurar a situação:

I - serão suspensas a contagem dos prazos e as

disposições estabelecidas nos arts. 23 , 31 e 70;

II - serão dispensados o atingimento dos resultados

fiscais e a limitação de empenho prevista no art. 9º.

Parágrafo único. Aplica-se o disposto no caput no caso de

estado de defesa ou de sítio, decretado na forma da Constituição."

(grifo nosso)

Observa-se, dessa forma, que a decretação de calamidade

pública reconhecida pelo Congresso Nacional, no âmbito da União, e pela

Assembleia Legislativa do Estado-membro, no caso dos Municípios, faz

suspender o prazo de readequação aos limites de despesa com pessoal

previsto no art. 23 da LC nº 101/2000.

É bom que se ressalte que isso não significa que o limite com

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despesa de pessoal previsto nos arts. 19 e 20 tenha sido suprimido. Ele

ainda existe, e faz bem a Prefeitura em monitorar essas despesas, porque

quando da prestação de contas todas os seus atos que geram gastos

estarão sujeitos à avaliação quanto à legalidade, economicidade e

legitimidade (art. 31 c/c art. 70 da CRFB).

No entanto, uma vez ultrapassado esse limite, caso haja

decretação de calamidade pública pelo Município reconhecida pela

Assembleia Legislativa, o prazo para readequação ficará atenuado. Ao fim

da calamidade pública, o prazo do art. 23 da LC nº 101/2000 voltará a correr,

isto é, deverá o Município voltar à normalidade no prazo definido no deferido

dispositivo, sob pena de incorrer nas sanções previstas no § 3º do mesmo

dispositivo.

Ocorre que o art. 22, V, da LC nº 101/2000 estabelece, também,

que uma medida imediata quando alcançado o limite prudencial de 95% do

teto de despesas com pessoal é a vedação à contratação de horas extras.

Excetua-se, no entanto, do dispositivo em comento a convocação

extraordinária do Poder Legislativo no recesso (inciso II do § 6º do art. 57

da CRFB), bem como nos casos previstos na Lei de Diretrizes

Orçamentárias.

Ora, atualmente o país e a humanidade passam por uma

emergência de saúde pública causada pela propagação da infecção viral do

novo Coronavírus (Covid-19), o que exige grandes esforços dos órgãos de

vigilância sanitária visando ao seu enfrentamento. Portanto, é viável que a

Lei de Diretrizes Orçamentárias contenha exceção à regra do art. 22, V, da

LC nº 101/2000, que veda o pagamento de horas extras, no caso específico

de uma calamidade pública. Caso a LDO não contenha a previsão dessa

exceção, pode ser emendada para essa finalidade.

Outra questão diz respeito à adoção de regimes de plantões para

os servidores da vigilância sanitária. Como se sabe, cabe ao próprio

Município definir a carga horária e a jornada de trabalho de seu pessoal

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para melhor atender ao horário de funcionamento de suas repartições.

Releva frisar que o art. 39, § 3º da CRFB estende aos servidores públicos

alguns direitos constitucionais próprios dos trabalhadores da iniciativa

privada relacionados à duração do trabalho, notadamente os previstos no

art. 7º, IX, XIII, XV e XVI da CRFB. A CLT e a legislação trabalhista correlata,

contudo, não se aplica aos servidores estatutários.

Nesse passo, observa-se que o sistema constitucional vigente fixa

os seguintes parâmetros básicos para a carga horária e jornada de trabalho

a serem seguidos pela Municipalidade: a duração do trabalho deve ser de

no máximo quarenta e quatro horas semanais e oito horas diárias,

possibilitada a compensação; a remuneração do trabalho noturno deve ser

fixada em patamar superior à do diurno; deve ser concedido repouso

semanal ao menos uma vez por semana, preferencialmente e não

obrigatoriamente aos domingos; e, as horas que ultrapassarem a carga

normal de trabalho devem ser pagas em adicional de no mínimo 50%.

Na esfera municipal, verifica-se que a disposição constitucional

relativa aos limites de carga horária costuma ser repisada nos estatutos

funcionais como regra geral, ou fixado em patamar inferior de 40 horas,

deixando-se a fixação da jornada em cada caso para o respectivo plano de

cargos e carreiras, que variará de um cargo para o outro, sendo ditada em

conformidade com sua natureza, complexidade, atribuições

desempenhadas, esforço despendido e outros fatores que devem,

inafastavelmente, ser levados em consideração na fixação da jornada de

cada categoria funcional.

Releva frisar que é o interesse público o pressuposto da fixação

da carga horária e da jornada de trabalho de cada cargo. Não é a

conveniência e o conforto do servidor, e sim as necessidades do serviço

público. É evidente que existem alguns servidores que apenas terão

expediente em dias úteis, no horário comercial, como por exemplo, aqueles

que exercem funções internas e administrativas, em gabinetes e escritórios.

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Por outro lado, os serviços que sejam oferecidos aos cidadãos à

noite, ou aos fins de semana, e mesmo aqueles trabalhos internos de

manutenção que devam ser oferecidos ininterruptamente, implicam em

jornadas fora de dias úteis e horários comerciais, para o que a administração

pública pode se valer da fixação de um regime de escalas. É o caso, supõe-

se, das ações de vigilância sanitária numa situação de emergência.

Ações emergenciais não podem esperar o amanhecer nem dias

úteis. Elas devem ser tomadas de imediato.

O regime de escalas decorre, portanto, da natureza e da

necessidade do serviço público. Estabelecem-se turnos de revezamento

alternados com períodos de descanso, sendo muito comum a jornada de

trabalho de 12X36 — que é apenas um exemplo, podendo haver outras —

pela qual se admite a flexibilização da limitação de jornada, ampliando-se-

a para além das 8 horas diárias e/ou 44 semanais máximas em uma

semana e/ou em um dia, contrapondo-se esse gravame a um maior

período de descanso no dia seguinte e/ou à compensação na semana

seguinte.

De qualquer modo, é importante observar que mesmo no

cumprimento de plantões de 12 horas intercalados com descansos de 36

horas, ou de qualquer outro esquema de plantão, a jornada mensal do

servidor não pode ultrapassar o divisor, que é calculado a partir da jornada

normal do cargo. As horas extraordinárias, conforme o nome indica, não

podem ser habituais. Devem ocorrer em uma situação de

excepcionalidade. Nesse sentido, pertinente colacionar de tribunais de

justiça estaduais:

"APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DE COBRANÇA. SERVIDOR

PÚBLICO MUNICIPAL. REGIME ESPECIAL DE PLANTÃO.

ESCALA DE 24 x 72 HORAS. HORAS EXTRAS. DIVISOR.

200 HORAS MENSAIS. PRECEDENTES. 1. Trata-se de ação de

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cobrança, ajuizada por servidor público municipal, visando à

condenação do réu ao pagamento de horas extras laboradas

mensalmente pelo autor. 2. Servidor que trabalha em regime

especial de plantão, com escala de 24 x 72 horas. 3. A previsão

constitucional de limitação da jornada de trabalho, com o pagamento

adicional para as horas extras, não exclui a possibilidade de a

legislação infraconstitucional estabelecer regime próprio de

cumprimento de jornada, em razão da natureza do serviço e das

peculiaridades da função desenvolvida pelo servidor. Assim como o

limite diário de 8 (oito) horas não se aplica ao servidor plantonista,

também se mostra inadequado aplicar o limite semanal de 40

(quarenta) horas a tal regime especial de serviço, que já encontra

sua compensação nas 72 (setenta e duas) horas de descanso

concedidas imediatamente após cada dia de plantão. A

jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça posiciona-se no

sentido de que o servidor federal, em situação idêntica, só tem

direito a adicional por hora extra que exceda ao limite de 200 horas

mensais, mesmo que ultrapasse as 40 horas semanais. 6. Assim,

considerando o número de horas trabalhadas por mês, verifica-se

que o autor cumpre tão somente 192 (cento e noventa e duas) horas,

portanto menos do que o divisor de 200 (duzentas) horas mensais,

motivo pelo qual não há que se falar em direito a adicional de horas

extras, merecendo ser provido o recurso para reformar a sentença

apelada, para afastar a condenação imposta a ré. PROVIMENTO

DO RECURSO." (TJ-RJ - APL: 00081808320148190042 RIO DE

JANEIRO PETRÓPOLIS 4 VARA CÍVEL, Relator: CARLOS

SANTOS DE OLIVEIRA, Data de Julgamento: 30/06/2015,

VIGÉSIMA SEGUNDA CÂMARA CÍVEL, Data de Publicação:

02/07/2015)

"HORAS EXTRAS. INDEVIDAS. APELO CONHECIDO E

IMPROVIDO. 1. O apelante se insurge contra a sentença de

mérito que julgou improcedente o pleito inicial, de condenação

do Município ao pagamento da gratificação ante a sua função de

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motorista concursado do SAMU.(...) 5. No tocante ao pedido de

horas extras, segundo entendimento jurisprudencial, o servidor em

escala de plantão de 24x72 horas, encontra-se em situação

diferenciada dos demais trabalhadores. 6. Assim como o limite diário

de 8 (oito) horas não se aplica ao servidor plantonista, também se

mostra inadequado aplicar o limite semanal de 40 (quarenta) horas

a tal regime especial de serviço, que já encontra sua compensação

nas 72 (setenta e duas) horas de descanso concedidas

imediatamente após cada dia de plantão. 7. Ademais, consoante o

art. 30 da Lei nº 342/2007, se excetuam da duração normal de

trabalho, o trabalho executado por servidor em serviço externo que,

por sua natureza, não possa ser auferido por unidade de tempo. 8.

Apelação conhecida e improvida." (TJ-PI - AC:

00000704920148180034 PI, Relator: Des. Fernando Carvalho

Mendes, Data de Julgamento: 08/02/2018, 1ª Câmara de Direito

Público)

"CONSTITUCIONAL E ADMINISTRATIVO. AGENTE

PENITENCIÁRIO. PAGAMENTO DE HORAS EXTRAS. JORNADA

DE TRABALHO DIFERENCIADA. REGRAMENTO ESPECÍFICO.

RECURSO CONHECIDO E NÃO PROVIDO. SENTENÇA

MANTIDA. 1) A previsão constitucional de limitação da jornada de

trabalho, com o pagamento adicional para as horas extras, não

exclui a possibilidade de a legislação infraconstitucional estabelecer

regime próprio de cumprimento de jornada, em razão

da natureza do serviço e das peculiaridades da função

desenvolvida pelo servidor. Precedente do STJ (RMS, 18.399/RJ,

Rel Min Laurita Vaz, DJE 30/11/2009) e TJAP (AP

0003313-56.2010.8.03.0002, Rel Des Agostino Silvério, j.

25/10/11). 2) Não se descura o mandamento constitucional

disposto no art. 7º, inc. XVI, quanto a duração da jornada de

trabalho semanal. Não obstante, assim dispõe o § 3º, art. 39, in

fine: “(...) podendo a lei estabelecer requisitos diferenciados de admissão quando a natureza do cargo o exigir.”. 3) Neste contexto,

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os agentes penitenciários que cumprem escala de plantão de 24

horas e 72 horas de descanso em que pese cumpram jornada

semanal de 48 (quarenta e oito) horas de trabalho, em razão da

natureza peculiar da função para garantia do caráter ininterrupto do

serviço prestado, auferem mensalmente, consoante se vê de suas

fichas financeiras (fs. 15-40), além do adicional de periculosidade,

gratificação de atividade penitenciária, serviço extraordinário 240, e

adicional noturno correspondentes à retribuição pecuniária pela

prestação do serviço cujas exigências determinam regime

diferenciado. 4) Recurso conhecido e não provido. 5) Sentença

mantida." (TJ-AP - RI: 00109331720138030002 AP, Relator:

CESAR AUGUSTO SCAPIN, Data de Julgamento: 26/03/2015,

TURMA RECURSAL DOS JUIZADOS ESPECIAIS)

"(...) SERVIDOR PÚBLICO FEDERAL. ADICIONAL DE

HORAS EXTRAS. AUSÊNCIA DE MATÉRIA CONSTITUCIONAL.

PRECEDENTES. ESCALA DE REVEZAMENTO. 24X72 HORAS.

DIVISOR. 200 HORAS MENSAIS. ART. 19 DA LEI N. 8.112/90.

PRECEDENTES. TOTAL DE HORAS MENSAIS INFERIOR.

RECURSO ESPECIAL PROVIDO. I - Recurso especial provido para

afastar o pagamento de horas extras aos servidores públicos. II - O

Supremo Tribunal Federal já se manifestou sobre a inexistência de

matéria constitucional em relação ao pagamento de horas extras a

servidor público submetido a regime de plantão, o que afasta a

exigência de interposição de recurso extraordinário. Precedentes:

RE 597.761 AgR, Relator (a): Min. Roberto Barroso, Primeira Turma,

julgado em 28/4/2015, Acórdão Eletrônico DJe-096 Divulg 21/5/2015

PUBLIC 22/5/2015; ARE 866847 AgR, Relator (a): Min. Dias Toffoli,

Segunda Turma, julgado em 28/4/2015, Acórdão Eletrônico DJe-108

Divulg 5/6/2015 Public 8/6/2015; e ARE 825545 AgR, Relator (a):

Min. Cármen Lúcia, Segunda Turma, julgado em 14/10/2014,

Acórdão Eletrônico DJe-209 Divulg 22/10/2014 Public 23/10/2014.

III - Nos termos do art. 19 da Lei n. 8.112/90, a jornada

máxima de trabalho dos servidores públicos federais corresponde

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a 40 horas semanais. Nesse contexto, e conforme a jurisprudência

consolidada desta Corte, o divisor adotado no cálculo do adicional

decorrente do serviço extraordinário é de 200 horas mensais.

Precedentes: AgRg no REsp 1227587/RS, Rel. Ministro Napoleão

Nunes Maia Filho, Primeira Turma, julgado em 2/8/2016, DJe

12/8/2016; AgRg no REsp 1132421/RS, Rel. Ministro Ericson

Maranho (desembargador Convocado do TJ/SP), Sexta Turma,

julgado em 13/10/2015, DJe 3/2/2016; REsp 805.437/RS, Rel.

Ministra Laurita Vaz, Quinta Turma, julgado em 24/3/2009, DJe

20/4/2009; e REsp 1019492/ RS, Rel. Ministra Maria Thereza de

Assis Moura, Sexta Turma, julgado em 3/2/2011, DJe 21/2/2011. IV

- Ocorre que escalas de trabalho em regime de revezamento de 24

horas de trabalho por 72 horas de descanso perfazem, quando

muito, 8 (oito) dias de trabalho mensal, o que multiplicado por 24

horas equivale a apenas 196 (cento e noventa e seis) horas de

trabalho ao logo do mês, ou seja, número inferior ao divisor de 200

(duzentas) horas mensais relativas aos servidores públicos federais

regidos pela Lei n. 8.112/90, o que afasta a pretensão de percepção

de horas extras. V - Agravo interno improvido." (STJ - AgInt nos EDcl

no REsp: 1553781 RS 2015/0222891-7, Relator: Ministro

FRANCISCO FALCÃO, Data de Julgamento: 01/03/2018, T2 -

SEGUNDA TURMA, Data de Publicação: DJe 06/03/2018)

Outra questão realmente nova diz respeito à modificação do

regime de trabalho normal (8 horas diárias, 44 semanais) para o regime de

turnos de revezamento. Ora, como afirmado, cabe ao Município dispor

sobre o regime jurídico de seus servidores (art. 39, caput, da CRFB). E mais,

as normas que compõem o regime jurídico funcional podem ser alteradas a

qualquer momento, já que não existe direito adquirido à manutenção do

regime aplicável no momento da nomeação.

Em outros termos, nada obsta que o Município modifique a

jornada dos cargos e carreiras, respeitados os direitos adquiridos (art. 5º,

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XXXVI, da CRFB) e os parâmetros constitucionais de observância

obrigatória, em particular os previstos nos arts. 37, 38 e 39 da CRFB,

notadamente o art. 39, § 3º c/c art. 7º, XIII, XVI e VI, da CRFB).

Também foi afirmado que é o interesse público o pressuposto da

fixação da carga horária e da jornada de trabalho de cada cargo. Não é a

conveniência e o conforto do servidor, e sim as necessidades do serviço

público. Portanto, diante de uma grave pandemia, afigura-se viável, a

nosso ver, a adoção do regime de plantões para servidores na área da

vigilância sanitária quando suas atribuições sejam imprescindíveis e

emergenciais a qualquer hora do dia ou do fim de semana, desde que

respeitado o divisor a partir da carga horária original do cargo do servidor.

Averbe-se que a Constituição estabelece para a administração

pública o princípio da legalidade (art. 37, caput, da CRFB), o que significa

que apenas se houver expressa previsão legal pode a municipalidade

modificar o regime de cumprimento da jornada dos servidores da vigilância

sanitária para um regime de escalas ou de revezamento. O princípio da

legalidade, consagrado no art. 37, caput, da CRFB, impõe ao administrador

público, pois, o dever de apenas agir conforme a lei. Sobre o

princípio da legalidade, afirma Hely Lopes Meirelles que:

"[...] na administração pública não há liberdade nem

vontade pessoal. Enquanto na administração particular é lícito

fazer tudo o que a lei não proíbe, na Administração Pública só é

permitido fazer o que a lei autoriza. A lei para o particular significa

'poder fazer assim'; para o administrador público significa 'deve

fazer assim". (MEIRELLES, Hely Lopes. "Direito Administrativo

Brasileiro". São Paulo: Malheiros, 2000, p. 82).

Nada obsta, de qualquer forma, que se trate de uma lei de vigência

temporária, conforme autoriza o art. 2º da Lei de Introdução

às Normas do Direito Brasileiro. Assim, não se afigura inviável

a adoção do regime de escalas de revezamento e plantões para servidores

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da vigilância sanitária para fins de enfrentamento da pandemia do novo

Coronavírus (Covid-19).

Em vista de tudo que foi exposto, conclui-se objetivamente: i)

caso ultrapassado o limite prudencial de 95% do teto de gastos com

pessoal previsto nos arts. 19 e 20 da LC nº 101/2000, o pagamento de

horas extras apenas será viável caso haja previsão na Lei de Diretrizes

Orçamentárias, conforme determina o art. 22, V, da LC nº 101/2000; ii)

caso haja decretação de estado de calamidade pública pelo Município

reconhecida pela Assembleia Legislativa do Estado, continuam a vigorar

os limites de gastos com pessoal previstos nos arts. 19 e 20 da LC nº

101/2000, mas o prazo para readequação aos limites previsto no art. 23

ficará suspenso no decurso da calamidade pública; iii) o servidor não tem

direito adquirido ao regime jurídico, de modo que há razoável segurança

jurídica para modificar o regime de trabalho dos servidores que atuem na

vigilância sanitária para um regime de plantões, escalas ou revezamento,

observados os parâmetros trazidos no presente parecer, nomeadamente o

respeito ao divisor de horas; iv) a modificação do regime de cumprimento

da jornada de trabalho deverá ser feita mediante lei, ainda que de vigência

temporária.

É o parecer, s.m.j.

Gustavo da Costa Ferreira M. dos Santos

Consultor Técnico

Aprovo o parecer

Marcus Alonso Ribeiro Neves

Consultor Jurídico

Rio de Janeiro, 22 de maio de 2020.

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Parecer IBAM Nº 1136/2020

PG – Processo Legislativo, PL – Poder Legislativo. Projeto de lei que dispõe sobre a redução do subsídio dos vereadores enquanto perdurarem os efeitos da situação de emergência em saúde pública em razão da pandemia do Novo Coronavírus (COVID-19). Iniciativa da Mesa da Câmara Municipal. Análise da validade. Considerações.

CONSULTA:

Indaga o consulente acerca da validade de projeto de lei, de iniciativa da Mesa da Câmara Municipal, que dispõe sobre a redução do subsídio dos vereadores enquanto perdurarem os efeitos da situação de emergência em saúde pública em razão da pandemia do Novo Coronavírus (COVID-19).

A consulta vem acompanhada da referida propositura.

RESPOSTA:

Inicialmente, temos que a rápida expansão da pandemia do Novo Coronavírus (COVID-19) impôs sérias restrições ao nosso modo de vida, sendo certo que as recomendações de distanciamento social e de quarentena geram uma redução substancial da circulação de pessoas, que levam, por sua vez, a impactos sensíveis na capacidade financeira dos cidadãos.

Esse grande impacto nas fontes de rendas dos munícipes,

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decerto, repercutirá em suas obrigações mensais, dentre as quais está, para muitos, manutenção de empreendimento e pagamento de verbas trabalhistas, pagamento do aluguel, de tributos e a aquisição de serviços e produtos básicos à suas subsistências e de suas famílias.

Neste contexto, a arrecadação municipal também passa por

brusca queda. Como sabido, o legislador constituinte conferiu aos agentes políticos disciplina específica e diferenciada quanto ao seu sistema remuneratório, que será fixado por subsídio, em parcela única, nos termos do art. 39, § 4º, da Constituição Federal.

Registre-se que cabe ao Poder Legislativo dar início ao processo

legislativo para fixação dos subsídios dos Secretários, Prefeito, Vice- Prefeito Municipal e Vereadores, devendo ser observado o princípio da anterioridade quanto ao momento de sua fixação, conforme determinam os arts. 29, V e VI, da Constituição Federal, cujo teor transcrevemos a seguir:

"Art. 29. O Município reger-se-á por lei orgânica, votada

em dois turnos, com o interstício mínimo de dez dias, e aprovada por dois terços dos membros da Câmara Municipal, que a promulgará, atendidos os princípios estabelecidos nesta Constituição, na Constituição do respectivo Estado e os seguintes preceitos:(...)

VI - o subsídio dos Vereadores será fixado pelas

respectivas Câmaras Municipais em cada legislatura para a subseqüente, observado o que dispõe esta Constituição, observados os critérios estabelecidos na respectiva Lei Orgânica e os seguintes limites máximos:(...)

V - subsídios do Prefeito, do Vice-Prefeito e dos

Secretários Municipais fixados por lei de iniciativa da Câmara Municipal, observado o que dispõem os arts. 37, XI, 39, § 4º, 150, II, 153, III, e 153, § 2º, I;"

No que tange ao momento de fixação dos subsídios dos agentes

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políticos, o art. 29, VI, da Constituição Federal, endereçado aos Vereadores, consagra o princípio da anterioridade. No entanto, de acordo com Hely Lopes Meirelles, não basta que a fixação ocorra na legislatura anterior, ela deve ocorrer antes de serem conhecidos os novos eleitos, ou seja, antes da eleição que ocorre no primeiro domingo de outubro do ano anterior ao da legislatura subsequente (In MEIRELLES, Hely Lopes. Direito Municipal Brasileiro. 8ª ed. São Paulo: Malheiros Editores, 1996, p. 443). Nesse sentido, aliás, posiciona-se o Egrégio STF:

"SUBSÍDIOS - VEREADORES. Longe fica de conflitar

com a Carta da República acórdão em que assentada a insubsistência de ato da Câmara Municipal, formalizado após a divulgação dos resultados da eleição, no sentido de redução substancial dos subsídios dos vereadores, afastando o patamar de vinte e cinco por cento do que percebido por deputado estadual e instituindo quantia igual a quinze vezes o valor do salário mínimo."(STF - 2ª Turma. RE nº. 213524. DJ 11/02/2000. Rel. Min. MARCO AURÉLIO).

Desta feita temos que a fixação dos subsídios dos agentes

políticos de ambos os poderes municipais exige lei de iniciativa privativa da Mesa da Câmara Municipal e deve se dar de uma legislatura para outra antes da realização das eleições, salvo se a LOM estabelecer um prazo mais exíguo.

Dito isto, temos que a rápida expansão da pandemia do Novo

Coronavírus (COVID-19) impôs sérias restrições ao nosso modo de vida trazendo consequências de várias ordens como explicitado anteriormente.

Assim, à luz do postulado da razoabilidade, o qual tem sido

invocado nas decisões judiciais que têm apreciado as medidas aplicadas pelos entes da Federação para o combate à pandemia do Novo Coronavírus (COVID-19), mormente no âmbito do STF, não vislumbramos óbices para que se proceda à redução dos subsídios dos agentes políticos neste momento de excepcionalidade em que todos os esforços se concentram para diminuir os impactos da pandemia, contudo, imperioso

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que seja observada a liturgia do escorreito processo legislativo, mormente no que se refere a iniciativa legislativa conferida privativamente à Mesa da Câmara Municipal, tanto para os agentes políticos do Executivo local quanto do Legislativo.

Assentado que a redução dos subsídios de ambos os poderes

municipais para a presente legislatura, ante a situação excepcional e inusitada instaurada pela pandemia da COVID-19, é possível, desde que respeitada a competência legislativa privativa da Câmara Municipal, mister a edição de uma lei, de iniciativa da Mesa do Legislativo, para redução dos subsídios dos agentes políticos do Poder Executivo e de resolução para a redução dos subsídios dos Vereadores.

Pois bem, a propositura em tela, embora de iniciativa da Mesa da

Câmara Municipal é um projeto de lei e não uma resolução, devendo ser adequada.

Por tudo que precede, concluímos objetivamente a presente

consulta no sentido da possibilidade da redução dos subsídios dos vereadores para a presente legislatura enquanto perdurar a situação de calamidade pública instaurada pela pandemia da COVID-19, desde que a mesma se dê por resolução proposta pela Mesa da Câmara Municipal.

É o parecer, s.m.j.

Priscila Oquioni Souto

Assessora Jurídica

Aprovo o parecer

Marcus Alonso Ribeiro Neves

Consultor Jurídico

Rio de Janeiro, 26 de maio de 2020.

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Parecer IBAM Nº 1145/2020

EL – Eleição, SM – Servidor Público. Revisão Geral Anual. Ano eleitoral. PLP nº 39/2020. Comentários.

CONSULTA:

A Câmara Municipal solicita análise e pronunciamento deste Instituto a respeito da reposição de inflação de servidores, tendo em vista o ano eleitoral e "decreto da presidência que diz não realizar auxílio

financeiro para prefeituras que derem aumento salarial", indagando se é possível realizar a revisão geral anual e qual período deve ser considerado.

A consulta não vem documentada.

RESPOSTA:

Na consulta, a Câmara Municipal consulente faz referência a

suposto "decreto da presidência que diz não realizar auxílio financeiro para

prefeituras que derem aumento salarial". No entanto, a normativa que prevê auxílio financeiro, ao passo que traz restrições a reposições salariais de servidores, na verdade é projeto de lei complementar que se encontra para sanção e promulgação do Presidente da República: o PLP nº 39/2020, aprovado por ambas as Casas do Congresso Nacional, o qual encarta o Programa Federativo de Enfrentamento ao Coronavírus, que estabelece medidas de socorro financeiro da União para os demais entes federativos mediante algumas contrapartidas negociadas pelo Executivo com o Senado Federal.

Cabe observar que o texto ainda não foi sancionado, mas o

prazo limite é nessa semana. Portanto, a qualquer momento pode ocorrer

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a sanção e promulgação da lei.

De qualquer modo, a emissão de parecer a respeito de

proposição ainda não sancionada deve ter em vista o fato de que a lei só entra em vigor após a promulgação e vigência, de modo que as disposições nela contidas não estão aptas a produzir efeitos e não têm aplicabilidade. Como é sabido, enviado o projeto para sanção, o Poder Executivo tem a prerrogativa de veto, e não necessariamente os dispositivos que embasarão os entendimentos do parecer serão sancionados.

Nesse passo, é de se dizer que o PLP nº 39/2020, dentre outras

medidas, proíbe, até dezembro de 2021 a concessão, a qualquer título, de vantagem, aumento, reajuste ou adequação de remuneração dos servidores, com algumas exceções. Promove, ainda, permanente alteração dos art. 21 da LRF que trata do controle da despesa total com pessoal, assim como de seu art. 65 que mitiga os rigores da lei de responsabilidade fiscal na ocorrência de calamidade pública reconhecida pelo Congresso Nacional, no caso da União, ou pelas Assembleias Legislativas, na hipótese dos Estados e Municípios, enquanto perdurar a situação de emergência.

Pois bem. Adentrando no objeto da consulta, é de se ressaltar

que a revisão geral anual não se confunde com o aumento remuneratório concedido isoladamente às categorias de agentes públicos. Sobre o tema, é pertinente a lição de Hely Lopes Meirelles:

"Há duas espécies de aumento de vencimentos: uma

genérica, provocada pela alteração do poder aquisitivo da moeda, à qual poderíamos denominar aumento impróprio, por se tratar, na verdade, de um reajustamento destinado a manter o equilíbrio da situação financeira dos servidores públicos; e, outra, específica, geralmente feita à margem da lei que concede o aumento geral, abrangendo determinados cargos ou classes funcionais e representando realmente uma elevação de vencimentos, por se fazer em índices não proporcionais ao decréscimo do poder

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aquisitivo." (MEIRELLES, Hely Lopes. Direito Administrativo Brasileiro. São Paulo: Malheiros Editores, 2002, p. 452).

Não é diferente o entendimento do Supremo Tribunal Federal,

que distinguiu os institutos do reajuste e do aumento remuneratório, a saber:

"Se de um lado é possível ao Estado conceder aumentos

setorizados, de outro conflita com a Carta a outorga de reajuste que não alcance todo o quadro funcional. Sendo o Direito uma ciência, os institutos, expressões e vocábulos possuem sentido próprio, descabendo confundi-los. O aumento atrai, necessariamente, um plus, enquanto o reajuste visa tão-somente à reposição do poder aquisitivo." (RE nº 192.277-0. Rel.: Min. Marco Aurélio. In: DJ, 17-04-98).

Diferenciando, também, a revisão geral anual do aumento, a Lei

nº 9.504/1997, que disciplina as eleições, estabelece em seu art. 73 que são proibidas aos agentes políticos condutas tendentes a afetar a igualdade de oportunidades dos candidatos nos pleitos eleitorais, entre as quais fazer, na circunscrição do pleito, revisão geral da remuneração dos servidores públicos que exceda a recomposição da perda de seu poder aquisitivo ao longo do ano da eleição (inciso VIII), a partir dos seis meses anteriores da data do pleito, segundo prazo estabelecido no art. 7º da mesma norma.

No ano eleitoral em curso o prazo em questão se iniciou em 07

de abril (Lei nº 9.504/1997, art. 73, inciso VIII, e Resolução TSE nº 23.606). Portanto, a legislação eleitoral atualmente vigente não proíbe a revisão geral anual, desde que se preste estritamente à recomposição da perda do valor real da moeda no ano de eleição, conforme se pode observar no precedente do TSE:

“Consulta. Eleição 2004. Revisão geral da remuneração

servidor público. Possibilidade desde que não exceda a recomposição da perda do poder aquisitivo (inciso VIII do art. 73 da

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Lei no 9.504/97)”. NE: Consulta sobre a possibilidade de recomposição das perdas remuneratórias relativas aos últimos dois anos anteriores ao ano da eleição e sobre a possibilidade de recomposição salarial retroativa à data-base mesmo quando já ultrapassado o prazo limite previsto na legislação eleitoral. (TSE: Res. no 21.812, de 8.6.2004, rel. Min. Luiz Carlos Madeira.)

“Consulta. Servidores. Vencimentos. Recomposição.

Limites. Conhecimento”. NE: “[...] o art. 73, VIII, Lei no 9.504/97, impõe limites claros à vedação nele expressa: a revisão remuneratória só transpõe a seara da licitude, se exceder ‘a recomposição da perda de seu poder aquisitivo ao longo do ano da eleição’, a partir da escolha dos candidatos até a posse dos eleitos”. (TSE: Res. no 21.811, de 8.6.2004, rel. Min. Humberto Gomes de Barros.)

Outra questão a ser analisada é a aplicabilidade do art. 21 da LC

nº 101/2000 ao acréscimo nominal de vencimentos decorrente de revisão geral anual. Diz o referido dispositivo:

"Art. 21. É nulo de pleno direito o ato que provoque

aumento da despesa com pessoal e não atenda:

I- as exigências dos arts. 16 e 17 desta Lei Complementar,

e o disposto no inciso XIII do art. 37 e no § 1º do art. 169 da Constituição;

II - o limite legal de comprometimento aplicado às

despesas com pessoal inativo.

Parágrafo único. Também é nulo de pleno direito o ato de

que resulte aumento da despesa com pessoal expedido nos cento e oitenta dias anteriores ao final do mandato do titular do respectivo Poder ou órgão referido no art. 20."

Tendo em vista a já apontada diferença entre o aumento de

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remuneração e a mera revisão para reposição das perdas inflacionárias, é bastante sedimentada a tese segundo a qual a revisão geral anual não estaria albergada nas vedações previstas no art. 21 da LRF. Acresça-se ao argumento o fato de que § 6º do art. 17, da LRF, ao que remete o art. 21, I, da LRF, prevê que para promover a revisão geral anual é dispensada a estimativa de impacto orçamentário-financeiro prevista no art. 16 e no art. 17, § 1º, do referido diploma legal, ao passo que o art. 22, I da LRF retira expressamente a revisão geral anual das vedações aplicáveis quando ultrapassado o limite prudencial de 95% do teto com despesas de pessoal. Veja-se, nesse sentido, a seguinte decisão do TJRS:

"DE INSTRUMENTO. AÇÃO POPULAR. REAJUSTE

GERAL ANUAL. (...) 2. Caso em que o Projeto de Lei nº 062/2016 impugnado na ação popular objetiva a reposição das perdas salariais dos servidores públicos do Poder Legislativo do Município de Gravataí, frente à inflação, reproduzindo o mesmo teor do ato normativo que, sem distinção de datas e índices, foi concedido aos servidores do Poder Executivo Municipal, e não é impugnado pelos autores populares. 3. A revisão geral anual prevista no art. 37, inciso X da Constituição Federal constitui-se em mandamento constitucional inafastável, ressalvado pela própria Lei de Responsabilidade Fiscal em seu artigo 22, parágrafo único, inciso I, e não vedado pela Lei Eleitoral, desde que a recomposição não exceda a perda do poder aquisitivo ao longo do ano da eleição, o que confere aparente legalidade ao Projeto de Lei nº 062/2016 e ao procedimento realizado para sua votação. 4. Tutela de urgência concedida na origem. AGRAVO DE INSTRUMENTO CONHECIDO EM PARTE E, NA PARTE CONHECIDA, PROVIDO." (TJ-RS - AI: 70071348809 RS, Relator: Eduardo Uhlein, Data de Julgamento: 28/06/2017, Quarta Câmara Cível, Data de Publicação: Diário da Justiça do dia 04/07/2017 - grifo nosso)

No entanto, cabe noticiar que o STF firmou entendimento de que

o aumento de remuneração sem prévia dotação orçamentária suficiente, ou sem previsão na Lei de Diretrizes Orçamentárias, viola o art. 169, § 1º, da CF. A consequência é que o reajuste é nulo de pleno direito (art. 21, da

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LRF) caso não tenha prévia dotação orçamentária. O Supremo Tribunal Federal, dessa forma, negou a existência de direito subjetivo ao reajuste e fixou a tese de que a revisão geral anual da remuneração dos servidores públicos depende, cumulativamente, de dotação na Lei Orçamentária Anual e de previsão na Lei de Diretrizes Orçamentárias (RE 905357, Relator (a): Min. ALEXANDRE DE MORAES, Tribunal Pleno, julgado em 29/11/2019, PROCESSO ELETRÔNICO REPERCUSSÃO GERAL - MÉRITO DJe-282 DIVULG 17-12-2019 PUBLIC 18-12-2019).

Pertinente noticiar que, também no STF, RE 565.089 do STF, foi

discutida a viabilidade de indenizar servidores pela mora do Poder Executivo no encaminhamento do projeto de lei que fixa o índice de revisão, tendo sido assentada a tese de repercussão geral segundo a qual pode o Prefeito Municipal deixar de propor a revisão geral anual, desde que justificadamente:

"O não encaminhamento de projeto de lei de revisão anual

dos vencimentos dos servidores públicos, previsto no inciso X do art. 37 da CF/1988, não gera direito subjetivo a indenização. Deve o Poder Executivo, no entanto, se pronunciar, de forma fundamentada, acerca das razões pelas quais não propôs a revisão" (STF: Tese de repercussão geral nº 19, Plenário, 25.9.2019).

O quadro legal, no entanto, mudará substancialmente caso seja

sancionado o texto do PRP 39/2020, o que provavelmente ocorrerá nos próximos dias.

Isso porque o 8º, IV do PRP 39/2020, que é norma de vigência

temporária, é muito claro ao estender a vedação "a qualquer título,

vantagem, aumento, reajuste ou adequação de remuneração a membros de

Poder ou de órgão, servidores e empregados públicos e militares" (grifo nosso). Portanto, compreende-se incluído no dispositivo em comento a vedação à revisão geral anual, até 31 de dezembro de 2021, uma vez que a expressão "a qualquer título" abrange qualquer modalidade de aumento nominal de remuneração.

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Cabe observar que o art. 8º, § 6º do PLP nº 39/2020 faz exceção à vedação em comento relativa a algumas categorias profissionais. O dispositivo tem causado muita polêmica, havendo notícias de que será vetado, e notícias de que não será vetado. De qualquer modo, seja vetado ou não, não ficaria alterada a conclusão do parecer quanto à inviabilidade da revisão geral anual até 31 de dezembro de 2021 se sancionado o dispositivo, porque a revisão geral anual, como indica o próprio nome, é geral (art. 37, X, da CRFB), isto é, se aplica a todos os servidores. Portanto, o fato de haver exceção para algumas categorias não altera o entendimento pela proibição de que se promova a revisão geral anual até 31 de dezembro de 2021, porque não há que se falar em "revisão geral anual" que abranja apenas certas categorias profissionais. Nesse caso, tratar-se-ia de aumento propriamente dito.

Por derradeiro, cabe salientar que pode ser questionada a

constitucionalidade ou pedida interpretação conforme a Constituição, em sede de ação direta de inconstitucionalidade, em face do art. 8, IV do PRP nº 39/2020, considerando do art. 37, X, da CRFB.

Por outro lado, é de se considerar que o inciso VIII do mesmo

artigo 8º em questão veda reajuste de despesa obrigatória acima do IPCA, do que se depreende que a variação positiva nominal da despesa abaixo do IPCA estaria permitida mesmo no decurso das medidas restritivas fiscais, vigentes até o dia 31 de dezembro de 2021.

De um lado, é um tanto incongruente que outras despesas

obrigatórias da administração pública possam ser corrigidas pela inflação, e não possam ser corrigidos pela inflação, também, os valores de remuneração dos servidores, que experimentarão uma redução no poder real de compra ao longo do período, caso haja inflação e o valor nominal da remuneração não seja corrigido. Por outro lado, sabe-se que na iniciativa privada, muitos trabalhadores perderam o emprego, sofreram redução de remuneração e, para os que permaneceram em seus empregos, a perspectiva de terem seus salários corrigidos pela inflação é mínima. Assim, a mens legislatoris foi bastante influenciada pela situação dos trabalhadores da iniciativa privada em cotejo com a dos servidores públicos.

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Assim, em vista da presunção de constitucionalidade das leis e da

redação abrangente do art. 8º, I, caso venha a vigorar o dispositivo da proposição em comento, não haverá segurança jurídica na concessão de revisão geral anual. Corrobora o entendimento as decisões mencionadas do STF, que vem tendendo à compreensão de que não há um direito subjetivo à revisão geral anual dos servidores, de aplicabilidade direta e imediata, que decorre diretamente da Constituição. O direito do art. 37, X, da CRFB existe, portanto, como norma constitucional de eficácia limitada, que depende do atendimento de diversas exigências infralegais para que se aperfeiçoe.

Conclui-se, assim, que após a entrada em vigor da lei

complementar que resultará da sanção do Projeto de Lei Complementar nº 39/2020, caso concretizada, não será viável a revisão geral anual dos vencimentos dos servidores em vista do disposto no art. 8º, I, do ato normativo, até o dia 31 de dezembro de 2021. No presente momento, entretanto, a revisão é viável, devendo, no entanto, se prestar somente à recomposição das perdas inflacionárias no ano de eleição, sob pena de incorrerem os responsáveis pela aprovação em infração eleitoral prevista no art. 73, inciso VIII, da Lei nº 9.604/1997.

É o parecer, s.m.j.

Gustavo da Costa Ferreira M. dos Santos

Consultor Técnico

Aprovo o parecer

Marcus Alonso Ribeiro Neves

Consultor Jurídico

Rio de Janeiro, 26 de maio de 2020.

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Parecer IBAM Nº 1158/2020

SM – Servidor Público. Emergência em saúde pública causada pelo novo Coronavírus (Covid-19). Servidores temporários. Falta justificada, suspensão, rescisão ou meios alternativos de cumprimento das obrigações contratuais. Comentários.

CONSULTA:

A Câmara Municipal consulta este Instituto a respeito da situação de servidor contratado por tempo determinado. Relata que foram editados e publicados atos oficiais visando à proteção de segurança dos servidores e da comunidade em geral, estabelecendo, por exemplo, o trabalho em forma de escala, bem como a redução no horário de expediente, com o fito de evitar aglomeração de pessoas no recinto da Câmara Municipal.

Informa, também, que o ato de nº 08/2020, "prorroga por tempo

indeterminado o horário de expediente, bem como o trabalho a ser

realizado em regime de escala e o trabalho remoto". No entanto, uma das servidoras apresentou laudo médico em que se recomenda o afastamento de sua função. Diz, ainda, o consulente que a referida servidora é contratada por meio de contrato temporário, e que sua função não tem como ser exercida remotamente.

Diante dessa situação, indaga-se:

1) Qual o procedimento legal a ser adotado pela contratante

Câmara Municipal em relação à servidora contratada?

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2) No caso de manutenção do contrato, e estando a servidora afastada de sua função, fará jus ao recebimento do auxilio alimentação previsto na Lei 2.459, de 16 outubro 2019?

A consulta vem documentada.

RESPOSTA:

A emergência de saúde provocada pela pandemia do novo Coronavírus (Covid-19) gerou uma série de situações e desafios inéditos para os gestores públicos. Consequência deste ineditismo é a inexistência de normas na legislação vigente, ou de precedentes judiciais ou administrativos, que apontem soluções para questões concretas surgidas durante a emergência de saúde.

Para atender às situações excepcionais criadas pela emergência

de saúde, foi editada a Lei 13.979/2020. Na referida lei e nos atos de regulamentação e execução editados pelas diversas entidades da federação, estão previstas diversas medidas que podem vir a restringir ou limitar a circulação de pessoas.

Cabe observar que os Municípios, assim como os Estados e a

União, dispõem de autonomia político-administrativa nos termos do art. 18 da Constituição da República (CRFB). Nessa autonomia se insere a competência para dispor sobre o regime jurídico de seus servidores públicos (art. 39, caput, da CRFB), que deve ser exercida nos termos e nos limites da própria CRFB. Assim é que na gestão de pessoal, cabe ao Município buscar permanentemente a redução dos riscos inerentes ao trabalho, por meio de normas de saúde, higiene e segurança, nos precisos termos do art. 39, § 3º c/c art. 7º, XXII, da CRFB.

Dentre as medidas de contenção à expansão da pandemia da

COVID-19 adotadas pela União, Estados e Municípios, estão a instituição do home office, trabalho remoto e teletrabalho para os ocupantes de cargos ou contratados temporariamente cujas atribuições admitam estas modalidades de exercício, bem como a concessão de férias coletivas,

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licenças, banco de horas e criação de escalas de trabalho para os servidores cujas funções somente podem ser exercidas de forma presencial. Foi nesse espírito que a Câmara Municipal adotou medidas de distanciamento social, promovendo alterações no expediente, nas escalas de trabalho, dentre outras, de modo a evitar aglomerações que pudessem constituir foco de propagação da infecção viral.

Nesse compasso, convém observar que o servidor temporário,

embora não goze de estabilidade nem esteja submetido ao estatuto funcional do servidor permanente, também é destinatário das normas de saúde, higiene e segurança. Entendimento contrário desacataria o princípio da dignidade da pessoa humana (art. 1º, III, da CRFB) e o princípio da isonomia (art. 5º, caput, da CRFB). Portanto, todos os cuidados e precauções destinados a evitar a propagação das infecções pelo Covid-19 devem ser também estendidos aos servidores temporários.

Como se sabe, a contratação por tempo determinado para

atender à necessidade temporária de excepcional interesse público deve ser regulamentada em lei, conforme artigo 37, IX, da Constituição Federal. Os entes federados, por sua autonomia político administrativa, garantida pelo sistema constitucional brasileiro, são competentes para editar normas acerca de sua organização administrativa e do regime jurídico aplicável aos seus agentes públicos. Assim, é a lei local que deve regulamentar as contratações temporárias em âmbito municipal, prevendo os casos e o prazo para cada modalidade, respeitadas as disposições constitucionais sobre a matéria.

É pertinente observar que os contratados por tempo determinado

não têm direito à permanência na Administração Pública. Em regra, seus contratos podem ser suspensos ou mesmo rescindidos em caso de conveniência e oportunidade da Administração Pública, e, em uma situação de normalidade, a impossibilidade de prestação dos serviços que são objeto do contrato seria a medida adequada, uma vez que a despesa pública segue o rito da Lei nº 4.320/1964, que em seus arts. 62 e 63, §2º, III, prevêem que o pagamento apenas pode se dar após a liquidação da despesa, que no caso de um serviço, exige sua prévia prestação.

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Com efeito, sabe-se que toda a atividade administrativa deve ser conduzida e informada pelo postulado da tutela do interesse público. Assim, o atendimento ao interesse público, ao lado da observância dos demais princípios que regem a Administração Pública, é o requisito de validade de toda medida, negócio ou ato administrativo. Ocorre a ponderação de princípios que deve ser verificada em vista da realidade concreta, indubitavelmente alterada drasticamente com a pandemia que se enfrenta. A respeito do assunto, pertinente o trecho do Parecer em Consulta nº 0004/2020-4, do Plenário do TCE/ES:

"Dado o momento atípico que estamos vivenciando, a

aplicação do Direito deve se amoldar às exigências das circunstâncias. Por exemplo, se antes da pandemia, uma ponderação de princípios faria prevalecer um determinado princípio sobre outro, neste momento, o peso pode se inverter. Isso não significa abandonar a legislação e os preceitos jurídicos, subvertendo a ordem jurídica posta, mas interpretá-los à luz desses eventos peculiares." (disponível em https:// www.tce.es.gov.br/wp-content/uploads/formidable/108/PC-004-2020.pdf, julgamento em 30/04/2020)

Ora, sabe-se que a cessação repentina de pagamentos a

servidores temporários pode provocar efeitos sociais deletérios que acabarão por repercutir imensamente na vida local, como o desemprego e problemas sociais que decorrem da falta de rendimentos para as necessidades básicas. Existe interesse público na manutenção de empregos e da renda pela população, uma vez que são direitos sociais garantidos pela Constituição a alimentação, o trabalho, a moradia, o lazer e a assistência aos desamparados (art. 6º, da CRFB). Além disso, o arcabouço principiológico da Constituição, fundado que é na dignidade da pessoa humana (art. 1º, III, da CRFB) e que tem por objetivos a construção de uma sociedade livre, justa e solidária e a erradicação da pobreza e da marginalização (art. 3º, I e III, da CRFB). Outro trecho da resposta à consulta do Plenário do TCE/ES é bastante elucidativa quanto a esse ponto:

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"A manutenção dos contratos temporários dos servidores, com o pagamento de salários, mas sem a respectiva contraprestação configura uma colisão de princípios no contexto específico do Coronavírus – uma vez que seria inadmissível em outras circunstâncias. Por um lado, a ausência de contraprestação fere a lógica elementar de qualquer contrato, e, no caso da Administração, mais ainda, fere o art. 63, §2º, III, da Lei 4.320/6412 e o princípio da indisponibilidade do interesse público. Por outro, a manutenção dos pagamentos mesmo sem a contraprestação efetiva os princípios e objetivos fundamentais da dignidade da pessoa humana, da solidariedade, da proteção e valorização social do trabalho humano, da busca do pleno emprego, do desenvolvimento nacional, da promoção do bem de todos, não aprofundando a crise econômica e mantendo a economia local funcionando. Em qualquer circunstância um princípio fundamental é vulnerado." (disponível em https:// www.tce.es.gov.br/wp-content/uploads/formidable/108/PC-004-2020.pdf, julg. em 30/04/2020)

Sem dúvida, deve-se ter em vista que os recursos públicos são

limitados e que o poder público não é um segurador universal contra todas as intempéries e contingências que podem vir a ocorrer. Devem a sociedade e o estado colaborar e agir em espírito de parceria e colaboração para o enfrentamento dos desastres, como o que agora enfrenta o país.

No entanto, há que se reconhecer que a própria Constituição

prevê que a ordem social se baseia no primado do trabalho (art. 193, da CRFB). Ainda cabe verificar que o art. 22 da LINDB prevê que na interpretação de normas sobre gestão pública, serão considerados os obstáculos e as dificuldades reais do gestor e as exigências das políticas públicas a seu cargo, sem prejuízo dos direitos dos administrados, ao passo que seu § 1º determina que em decisão sobre regularidade de conduta ou validade de ato, contrato, ajuste, processo ou norma administrativa, serão consideradas as circunstâncias práticas que houverem imposto, limitado ou condicionado a ação do agente.

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Mister ressaltar, ainda, que a própria Lei nº 13.979/2020 prevê, em seu art. 3º, § 3º, o seguinte:

"Art. 3º Para enfrentamento da emergência de saúde

pública de importância internacional decorrente do Coronavírus, as autoridades poderão adotar, no âmbito de suas competências, dentre outras, as seguintes medidas:

I - isolamento;

II - quarentena;

(...)

§ 3º Será considerado falta justificada ao serviço público ou à atividade laboral privada o período de ausência decorrente das medidas previstas neste artigo."

Observa-se, portanto, que se encontra autorizada a falta

justificada ao serviço em virtude das medidas de enfrentamento ao Coronavírus prevista no art. 3º, da Lei nº 13.979/2020.

Assim é que, antes da adoção de medidas mais drásticas, como

a suspensão de contratos ou a rescisão, em que pese ser de sua competência fazê-lo, o Executivo deve adotar ações menos gravosas, tais como conceder férias aos contratados temporários durante o período de emergência de saúde e alterar os contratos para instituir o teletrabalho, sempre que possível, ou, havendo disponibilidade financeira, promover a manutenção do pagamento mediante aposição de faltas justificadas.

No mesmo sentido, aponta a seguinte orientação do Tribunal de

Contas do Estado do Paraná, a qual diz que, embora seja possível suspender ou rescindir o contrato, essas medidas não necessariamente devem ser adotadas:

A paralisação das atividades não implica,

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necessariamente, a rescisão/suspensão de contratos temporários. É necessária a adequação entre a medida adotada e os motivos que a ensejaram, razão pela qual deve ser considerado o quadro fático.

Por exemplo, a suspensão das aulas em virtude da

pandemia é transitória e existem medidas alternativas durante esse período, tais como a utilização de recursos tecnológicos para ministrar aulas à distância, a disponibilização de atividades pedagógicas on-line ou para retirada na unidade educacional, a concessão de férias aos professores com direito ao gozo e a utilização de banco de horas. Assim, o contrato pode ser alterado para que as atividades do servidor possam ser desenvolvidas de outra forma, se isso for possível e se não ficarem descaracterizadas as atividades originalmente desenvolvidas.

Caso os contratos temporários não cumpram mais

interesse público com a paralisação das atividades, contudo, não é vedada, a rescisão e a suspensão dos contratos temporários, ainda que tais possibilidades não estejam expressamente previstas em cláusula contratual, pois são prerrogativas da Administração Pública. Nesse sentido, mesmo com prévia decretação de situação de emergência ou calamidade pública, o gestor deve consignar, individual e formalmente, as razões de interesse público que ensejaram a edição do ato administrativo de rescisão/suspensão.

O gestor também deve assegurar o exercício do

contraditório e da ampla defesa ao contratado, bem como a recomposição dos prejuízos decorrentes do distrato ou da alteração contratual. Considerando a possibilidade de que a rescisão ou a suspensão do contrato acarretem prejuízos, que deverão ser indenizados, cabe ao gestor verificar se tais intervenções no contrato efetivamente estão em consonância com o interesse público.

Por fim, cumpre destacar que a presente orientação não

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vincula futuros julgamentos em caso concreto sobre a matéria, pois tem como premissa a excepcionalidade da situação advinda da pandemia. Disponível em: http:// www1.tce.pr.gov.br/conteudo/infotce-pr:-coronavirus-medidas-do-tce-orientacoes/327885/area/254) (Grifos nossos.)

No mesmo sentido, o TCE/ES, na consulta já mencionada

anteriormente:

"1.2.2. É possível a manutenção dos contratos e,

consequentemente, dos salários dos servidores contratados temporariamente, mesmo não havendo efetiva prestação de serviço, considerando-se os dias de serviço não prestado como faltas justificadas, na forma do art. 3º, §3º, Lei 13.979/2020, e em homenagem aos princípios constitucionais econômicos e sociais, mas preferencialmente deverão imbuir-se na tentativa de exercerem função remota." (grifo nosso

Em relação ao auxílio-alimentação, é importante verificar que tem

natureza indenizatória, conforme já se manifestou inclusive o STF na Súmula Vinculante nº 55. Portanto, apenas é devido enquanto houver efetivo exercício das funções do servidor. Não havendo exercício, deve ser cessado o seu pagamento, que poderá ser retomado quando o servidor retornar às atividades que são objeto do contrato.

Por todo o exposto, concluímos respondendo objetivamente aos questionamentos formulados:

1) Qual o procedimento legal a ser adotado pela contratante

Câmara Municipal em relação à servidora contratada?

A Câmara Municipal deverá analisar o caso e as circunstâncias

concretas para adotar a medida mais adequada conforme a realidade local. Com efeito, deverá ponderar os valores sociais do trabalho com as possibilidades orçamentárias e as demandas por serviço, inclusive verificando depois da pandemia. A suspensão ou a rescisão do contrato temporário deverá ser a última medida adotada, assegurando-se a ampla

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defesa e o contraditório do contratado. Deve a Câmara, preferencialmente, conceder férias, promover trabalho remoto tanto quanto possível, deslocar a servidora para tarefas previstas no contrato que possam ser realizadas remotamente. Alternativamente, poderá ainda reputar a ausência ao serviço como falta justificada, nos termos do art. 3º, § 3º da Lei nº 13.979/2020.

2) No caso de manutenção do contrato, e estando a servidora

afastada de sua função, fará jus ao recebimento do auxilio alimentação previsto na Lei 2.459, de 16 outubro 2019?

Não, porque o auxílio-alimentação é verba de natureza

indenizatória para o servidor em atividade. Com o afastamento do serviço, cessa o motivo da indenização, de modo que deve ser também cessado o pagamento, enquanto perdurar o afastamento.

É o parecer, s.m.j.

Gustavo da Costa Ferreira M. dos Santos

Consultor Técnico

Aprovo o parecer

Marcus Alonso Ribeiro Neves

Consultor Jurídico

Rio de Janeiro, 28 de maio de 2020.

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Parecer IBAM Nº 1170/2020

AP – Agente Político. Medidas de enfrentamento da pandemia do Novo Coronavírus (COVID-19). Projeto de lei que reduz os subsídios dos agentes políticos municipais na presente legislatura. Projeto de lei que fixa os subsídios dos agentes políticos para a próxima legislatura congelando seus valores. Análise da validade em tese. Considerações.

CONSULTA:

Ante a necessidade de adoção de medidas de enfrentamento da pandemia do Novo Coronavírus (COVID-19), indaga o consulente acerca da validade, em tese, de duas proposituras, quais sejam:

- Projeto de lei que reduz os subsídios dos agentes

políticos municipais na presente legislatura.

- Projeto de lei que fixa os subsídios dos agentes políticos

para a próxima legislatura congelando seus valores.

A consulta não vem documentada.

RESPOSTA:

Inicialmente, temos que a rápida expansão da pandemia do Novo Coronavírus (COVID-19) impôs sérias restrições ao nosso modo de vida, sendo certo que as recomendações de distanciamento social e de quarentena geram uma redução substancial da circulação de pessoas,

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que levam, por sua vez, a impactos sensíveis na capacidade financeira dos cidadãos.

Esse grande impacto nas fontes de rendas dos munícipes,

decerto, repercutirá em suas obrigações mensais, dentre as quais está, para muitos, manutenção de empreendimento e pagamento de verbas trabalhistas, pagamento do aluguel, de tributos e a aquisição de serviços e produtos básicos à suas subsistências e de suas famílias. Neste contexto, a arrecadação municipal também passa por brusca queda.

Em prosseguimento, o legislador constituinte conferiu aos agentes

políticos disciplina específica e diferenciada quanto ao seu sistema remuneratório, que será fixado por subsídio, em parcela única, nos termos do art. 39, § 4º, da Constituição Federal.

Registre-se que cabe ao Poder Legislativo dar início ao processo

legislativo para fixação dos subsídios dos Secretários, Prefeito, Vice- Prefeito Municipal e Vereadores, devendo ser observado o princípio da anterioridade quanto ao momento de sua fixação, conforme determinam os arts. 29, V e VI, da Constituição Federal, cujo teor transcrevemos a seguir:

"Art. 29. O Município reger-se-á por lei orgânica, votada

em dois turnos, com o interstício mínimo de dez dias, e aprovada por dois terços dos membros da Câmara Municipal, que a promulgará, atendidos os princípios estabelecidos nesta Constituição, na Constituição do respectivo Estado e os seguintes preceitos:(...)

VI - o subsídio dos Vereadores será fixado pelas

respectivas Câmaras Municipais em cada legislatura para a subseqüente, observado o que dispõe esta Constituição, observados os critérios estabelecidos na respectiva Lei Orgânica e os seguintes limites máximos:(...)

V - subsídios do Prefeito, do Vice-Prefeito e dos

Secretários Municipais fixados por lei de iniciativa da Câmara

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Municipal, observado o que dispõem os arts. 37, XI, 39, § 4º, 150, II, 153, III, e 153, § 2º, I;"

No que tange ao momento de fixação dos subsídios dos agentes

políticos, o art. 29, VI, da Constituição Federal, endereçado aos Vereadores, consagra o princípio da anterioridade. No entanto, de acordo com Hely Lopes Meirelles, não basta que a fixação ocorra na legislatura anterior, ela deve ocorrer antes de serem conhecidos os novos eleitos, ou seja, antes da eleição que ocorre no primeiro domingo de outubro do ano anterior ao da legislatura subsequente (In MEIRELLES, Hely Lopes. Direito Municipal Brasileiro. 8ª ed. São Paulo: Malheiros Editores, 1996, p. 443). Nesse sentido, aliás, posiciona-se o Egrégio STF:

"SUBSÍDIOS - VEREADORES. Longe fica de conflitar

com a Carta da República acórdão em que assentada a insubsistência de ato da Câmara Municipal, formalizado após a divulgação dos resultados da eleição, no sentido de redução substancial dos subsídios dos vereadores, afastando o patamar de vinte e cinco por cento do que percebido por deputado estadual e instituindo quantia igual a quinze vezes o valor do salário mínimo."(STF - 2ª Turma. RE nº. 213524. DJ 11/02/2000. Rel. Min. MARCO AURÉLIO).

Desta feita temos que a fixação dos subsídios dos agentes

políticos de ambos os poderes municipais exige lei de iniciativa privativa da Mesa da Câmara Municipal e deve se dar de uma legislatura para outra antes da realização das eleições, salvo se a LOM estabelecer um prazo mais exíguo.

Dito isto, temos que a rápida expansão da pandemia do Novo

Coronavírus (COVID-19) impôs sérias restrições ao nosso modo de vida trazendo consequências de várias ordens como explicitado anteriormente.

Assim, à luz do postulado da razoabilidade, o qual tem sido

invocado nas decisões judiciais que têm apreciado as medidas aplicadas pelos entes da Federação para o combate à pandemia do Novo Coronavírus

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(COVID-19), mormente no âmbito do STF, não vislumbramos óbices para que se proceda à redução dos subsídios dos agentes políticos neste momento de excepcionalidade em que todos os esforços se concentram para diminuir os impactos da pandemia, contudo, imperioso que seja observada a liturgia do escorreito processo legislativo, mormente no que se refere a iniciativa legislativa conferida privativamente à Mesa da Câmara Municipal, tanto para os agentes políticos do Executivo local quanto do Legislativo.

Assentado que a redução dos subsídios de ambos os poderes

municipais para a presente legislatura, ante a situação excepcional e inusitada instaurada pela pandemia da COVID-19, é possível, desde que respeitada a competência legislativa privativa da Câmara Municipal, mister a edição de uma lei, de iniciativa da Mesa do Legislativo, para redução dos subsídios dos agentes políticos do Poder Executivo e de resolução para a redução dos subsídios dos Vereadores.

De igual forma, possível a fixação dos subsídios dos agentes

políticos municipais para a próxima legislatura nos mesmos patamares, observadas as regras de competência constitucional.

Mais especificamente com relação ao congelamento, isto é, não

concessão de revisão geral anual é direito subjetivo dos servidores públicos e agentes políticos constitucionalmente assegurado no art. 37, inciso X, da Constituição Federal.

O objetivo do texto constitucional é o de assegurar a observância

do princípio da isonomia (art. 5°, caput, da Constituição Federal), uma vez que a inflação é fenômeno que se caracteriza pela corrosão do valor real da remuneração, o que atinge todos os agentes públicos indistintamente. Trata-se, em realidade, de recomposição de perdas inflacionárias e não de aumento de remuneração. Para ambos os casos (aumento de remuneração e reposição de perdas inflacionárias) o legislador constituinte exigiu lei. Importante destacar, outrossim, que a revisão geral anual não se confunde com o aumento remuneratório concedido isoladamente às categorias de agentes públicos. Sobre o tema, é pertinente a lição de Hely

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Lopes Meirelles:

"Há duas espécies de aumento de vencimentos: uma

genérica, provocada pela alteração do poder aquisitivo da moeda, à qual poderíamos denominar aumento impróprio, por se tratar, na verdade, de um reajustamento destinado a manter o equilíbrio da situação financeira dos servidores públicos; e, outra, específica, geralmente feita à margem da lei que concede o aumento geral, abrangendo determinados cargos ou classes funcionais e representando realmente uma elevação de vencimentos, por se fazer em índices não proporcionais ao decréscimo do poder aquisitivo." (MEIRELLES, Hely Lopes. Direito Administrativo Brasileiro. São Paulo: Malheiros Editores, 2002, p. 452).

Não é diferente o entendimento do Supremo Tribunal Federal,

que distinguiu os institutos do reajuste e do aumento remuneratório, a saber:

"Se de um lado é possível ao Estado conceder aumentos

setorizados, de outro conflita com a Carta a outorga de reajuste que não alcance todo o quadro funcional. Sendo o Direito uma ciência, os institutos, expressões e vocábulos possuem sentido próprio, descabendo confundi-los. O aumento atrai, necessariamente, um plus, enquanto o reajuste visa tão-somente à reposição do poder aquisitivo." (RE nº 192.277-0. Rel.: Min. Marco Aurélio. In: DJ, 17-04-98).

No que tange à revisão geral anual dos agentes políticos, como

explicitado anteriormente, a fixação dos subsídios destes agentes deve ocorrer de uma legislatura para outra, antes mesmo do conhecimento do resultado das novas eleições, em atendimento aos princípios constitucionais da moralidade e da impessoalidade. O legislador constituinte conferiu, ainda, disciplina específica e diferenciada quanto ao seu sistema remuneratório, que será fixado por subsídio, em parcela única, nos termos do art. 39, § 4º, da Constituição Federal. Segundo entendimento assentado por esta Consultoria Jurídica, a Revisão Geral

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Anual dos agentes políticos reclama interpretação sistemática dos arts. 29, VI e 37, X, da Constituição Federal. No caso dos referidos agentes não se admite a revisão do valor dos subsídios fixados no primeiro ano de mandato, ainda que por meio de lei e ainda que de forma fracionada, tendo em vista que no primeiro ano de mandato não há o que se rever por tratar-se, em verdade, da vigência de um novo subsídio fixado ao final da legislatura anterior (princípio da anterioridade).

Ademais, a lei nº. 9.069/1995 (Plano Real), em seu art. 28, § 1º,

expressamente proíbe periodicidade de reajuste inferior a 12 meses, razão pela qual a revisão aos agentes políticos no primeiro ano de mandato pode ser objeto de glosa pelos órgãos de controle.

Feitas estas considerações, vale registrar no que tange à

iniciativa do projeto de lei, conquanto subsista alguma divergência no âmbito de determinados Tribunais de Contas, o entendimento atual deste Instituto é o de que reputa-se de iniciativa privativa do chefe do Poder Executivo Lei que proceda à revisão geral anual em cada esfera da federação, com a aplicação de um único índice para os servidores do Executivo e do Legislativo, em uma data única, alcançando ainda os agentes políticos municipais de ambos os poderes, garantindo desta forma o princípio constitucional da isonomia conforme aventado alhures.

Neste ponto, vale informar que no âmbito do STF encontram-se

em trâmite, pendentes de julgamento, duas ADIs que versam acerca da competência para iniciativa do projeto de lei que concede a revisão geral anual, quais sejam: a ADI nº 3543 proposta em face da Lei nº 12.301/2005 do Estado do Rio Grande do Sul que concedeu revisão geral anual aos servidores do Legislativo deste Estado membro e a ADI nº 3538 proposta em face da Lei nº 12.299/2005 do mesmo Estado, que concedeu revisão geral anual aos servidores públicos do Poder Judiciário. Em ambas se alega ofensa aos arts. 2º, 5º, caput e 61, § 1º, II, "a" todos da Lei Maior, e, de acordo com os Ministros do STF que já proferiram o seu voto, cabe razão ao requerente tanto pela violação da competência do Chefe do Executivo quanto pela afronta ao princípio da isonomia, vez que excluídos da revisão geral anual concedida os servidores do Executivo.

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Em assim sendo, entendemos que a revisão geral anual prevista no inciso X do art. 37 da Lei Maior deve ser implementada por lei específica de iniciativa do Chefe do Executivo local, conglobando os servidores públicos e agentes políticos de ambos os poderes - Prefeito, Vice-Prefeito, Secretários Municipais e Vereadores (quanto aos agentes políticos vedada a concessão no primeiro ano dos mandatos). Deve ainda ser concedida sempre em determinada data base e deve eleger índice que reflita a efetiva perda do poder aquisitivo no período.

Ainda acerca da revisão geral anual, não podemos deixar de

registrar que, recentemente, o STF, no julgamento do RE nº 565.089, firmou a tese de que o não encaminhamento do projeto de lei de revisão geral anual dos vencimentos dos servidores públicos previsto no inciso X do art. 37 da Constituição não gera direito à indenização, devendo o Poder Executivo, no entanto, se pronunciar de forma fundamentada sobre as razões pelas quais não propôs a revisão.

Desta forma, o Chefe do Poder Executivo pode até deixar de

conceder a revisão geral anual desde que motivadamente, porém não se revela factível que a lei que fixe os subsídios dos agentes políticos para a próxima legislatura venha a impedir a revisão geral anual destes agentes.

Isto posto, concluímos objetivamente a presente consulta na

forma das razões exaradas.

É o parecer, s.m.j.

Priscila Oquioni Souto

Assessora Jurídica

Aprovo o parecer

Marcus Alonso Ribeiro Neves

Consultor Jurídico

Rio de Janeiro, 29 de maio de 2020.

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Parecer IBAM Nº 1171/2020

PG – Processo Legislativo. Projeto de lei que concede aumento a determinado cargo do quadro funcional do Executivo proposto nos idos de 2019. Votação em maio de 2020. Ano de eleições municipais. Entrada em vigor da LC nº 173/2020. Considerações.

CONSULTA:

Relata o consulente que foi encaminhado à Casa Legislativa Municipal nos idos de 2019 propositura que pretende a concessão de aumento ao cargo efetivo de calceteiro.

Tendo em vista que a votação acorreu recentemente, no final de

maio de 2020 indaga o consulente como proceder com relação ao ano eleitoral.

A consulta não veio documentada.

RESPOSTA:

Inicialmente, do ponto de vista eleitoral, diz a Lei nº. 9.504/1997 que são proibidas condutas tendentes a afetar a igualdade de oportunidades entre candidatos nos pleitos eleitorais.

Nesse toar, registramos que não é qualquer dos atos citados na

Lei que implica em descumprimento da regra eleitoral, há que influenciar na disputa. Em outras palavras, a conduta vedada deve ser de tal intensidade que possa comprometer a isonomia de chances entre os candidatos.

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Os atos e ações do Poder Público, incapazes de desequilibrar a disputa eleitoral ou de influenciarem no resultado das eleições, não devem sofrer limitação, pois o bem jurídico protegido encontra-se salvaguardado. O Direito Eleitoral não possui o condão de impor injustificadas barreiras às atividades normalmente desenvolvidas pela Administração Pública, salvo aquelas inseridas na própria Constituição da República (art. 14, § 9º), sob pena de afrontar outros princípios constitucionais.

O que se quer dizer é que a Lei eleitoral não pretende impedir o

funcionamento normal e rotineiro da Administração. Entretanto, programas novos, a concessão de favores não utilizados e quaisquer outras medidas que possam ter conotação eleitoral ou possam ser utilizadas para beneficiar candidatos, encontram-se vedados.

Em resumo, as normas eleitorais buscam resguardar a igualdade

da disputa entre candidatos. Não existem, em tese, matérias que não possam ser aprovadas pelo Legislativo em ano eleitoral. Algumas, porém, podem influenciar diretamente as eleições. Por isso, a lei ou sua interpretação pelos tribunais não protege os que buscam violar os seus preceitos ou utilizar as decisões a favor de condutas contrárias à legalidade ou à moralidade.

Dentro do contexto apresentado, o art. 73 da Lei nº 9.504/1997

dispõe da seguinte forma:

"Art. 73. São proibidas aos agentes públicos, servidores ou não, as seguintes condutas tendentes a afetar a igualdade de oportunidades entre candidatos nos pleitos eleitorais:

(...)

VIII - fazer, na circunscrição do pleito, revisão geral da

remuneração dos servidores públicos que exceda a recomposição da perda de seu poder aquisitivo ao longo do ano da eleição, a partir do início do prazo estabelecido no art. 7º desta Lei e até a posse dos eleitos. " (Grifos nossos).

Desta forma, desde 07/04/2020 não é mais possível a concessão

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de aumento aos servidores no corrente ano.

Em cotejo, vale registrar que foi publicada hoje, 28 de maio de 2020, a LC nº 173/2020, a qual encarta o Programa Federativo de Enfrentamento ao Coronavírus, que prestará auxílio financeiro mediante algumas contraprestações, dentre as quais destacamos a vedação da criação de cargos, da realização de concursos e nomeação de servidores até dezembro de 2021, salvo para reposição de vacâncias e promoveu sensíveis alterações na LRF.

Pois bem, a nova redação do art. 21 da LRF, mais precisamente

em seu inciso IV, dispõe da seguinte forma:

"Art. 21. É nulo de pleno direito:

(...)

IV - a aprovação, a edição ou a sanção, por Chefe do Poder Executivo, por Presidente e demais membros da Mesa ou órgão decisório equivalente do Poder Legislativo, por Presidente de Tribunal do Poder Judiciário e pelo Chefe do Ministério Público, da União e dos Estados, de norma legal contendo plano de alteração, reajuste e reestruturação de carreiras do setor público, ou a edição de ato, por esses agentes, para nomeação de aprovados em concurso público, quando:

a) resultar em aumento da despesa com pessoal nos 180

(cento e oitenta) dias anteriores ao final do mandato do titular do Poder Executivo; ou

b) resultar em aumento da despesa com pessoal que

preveja parcelas a serem implementadas em períodos posteriores ao final do mandato do titular do Poder Executivo."

Assim, do cotejo dos dispositivos acima colacionados, a

concessão do aumento pretendido não é possível desde 07/04/2020. Alertamos, ainda, que a mesma LC nº 173/2020 traz medida transitória em seu art. 8º, vedando até dezembro de 2021 a concessão de aumento ou

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reajuste a servidores, salvo por determinação judicial ou em virtude de determinação legal anterior ao reconhecimento da calamidade pública pelo Decreto Lei nº 06/2020. Vejamos:

"Art. 8º Na hipótese de que trata o art. 65 da Lei

Complementar nº 101, de 4 de maio de 2000, a União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios afetados pela calamidade pública decorrente da pandemia da Covid-19 ficam proibidos, até 31 de dezembro de 2021, de:

(...)

I - conceder, a qualquer título, vantagem, aumento,

reajuste ou adequação de remuneração a membros de Poder ou de órgão, servidores e empregados públicos e militares, exceto quando derivado de sentença judicial transitada em julgado ou de determinação legal anterior à calamidade pública;

Desta sorte, ante as considerações exaradas, já tendo a Casa

Legislativa votado o projeto de lei, resta ao Chefe do Executivo vetar a lei, sob pena de o referido aumento ser objeto de glosa pelos órgãos de controle, tais como Tribunal de Contas e Ministério Público e sem prejuízo das sanções previstas na lei eleitoral.

Isto posto, concluímos objetivamente a presente consulta na

forma das razões exaradas.

É o parecer, s.m.j.

Priscila Oquioni Souto Assessora Jurídica

Aprovo o parecer

Marcus Alonso Ribeiro Neves

Consultor Jurídico

Rio de Janeiro, 29 de maio de 2020.

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Parecer IBAM Nº 1173/2020

SM – Servidor Público. Progressão. LC nº 173/2020. Considerações.

CONSULTA:

Relata o consulente que o Plano de Cargos e Carreiras permite a progressão do servidor de ano em ano com um adicional de 2% no valor, mediante a avaliação de desempenho do servidor, sendo que se este conseguir a pontuação de 7, sendo avaliada sua disciplina, assiduidade e avaliação do chefe o servidor está apto ao benefício.

Tendo em vista a entrada em vigor da LC nº 173/2020, indaga o

consulente se a progressão de carreira pode continuar a ser realizada nesse período até 31 de dezembro de 2021.

A consulta não veio documentada.

RESPOSTA:

Inicialmente, como sabido, a rápida expansão da pandemia do Novo Coronavírus (COVID-19) impôs sérias restrições ao nosso modo de vida, sendo certo que as recomendações de distanciamento social e de quarentena geram uma redução substancial da circulação de pessoas, que levam, por sua vez, a impactos sensíveis nas mais diversas áreas da sociedade e, por conseguinte, a necessidade de organização da Administração Pública para atendimento das demandas e manutenção do bem comum.

Diante do acelerado avanço da doença no Brasil e dos múltiplos

desdobramentos no campo da saúde e da economia, ao longo deste ano de 2020, os poderes Executivo, Legislativo e Judiciário têm adotado,

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proposto ou sugerido medidas, providências ou ordens, de conteúdos diversos, para instrumentalizar o Poder Público e a sociedade em geral com os meios que se reputam oportunos e necessários para enfrentamento da crise.

Neste contexto, em 28 de maio de 2020, entrou em vigor a LC nº

173/2020 que encarta o Programa Federativo de Enfrentamento ao Coronavírus, que estabelece medidas de socorro financeiro da União para os demais entes federativos mediante algumas contrapartidas negociadas pelo Executivo com o Senado Federal. A referida lei complementar também trouxe sensíveis modificações na LRF (LC nº 101/2000).

Dentre suas disposições transitórias, a LC nº 173/2020, mais

precisamente em seu art. 8º, I, veda até 31 de dezembro de 2021 a concessão de qualquer vantagem, aumento, reajuste ou adequação aos servidores, excepcionando em sua parte final aquelas decorrentes de decisões judiciais que assim venham a determinar, bem como aquelas provenientes de determinação legal anterior à calamidade pública. Já o inciso IX deste mesmo dispositivo veda a utilização do lapso temporal mencionado no caput para fins de cômputo de período aquisitivo de determinadas vantagens. Vejamos:

"Art. 8º Na hipótese de que trata o art. 65 da Lei

Complementar nº 101, de 4 de maio de 2000, a União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios afetados pela calamidade pública decorrente da pandemia da Covid-19 ficam proibidos, até 31 de dezembro de 2021, de:

I - conceder, a qualquer título, vantagem, aumento,

reajuste ou adequação de remuneração a membros de Poder ou de órgão, servidores e empregados públicos e militares, exceto quando derivado de sentença judicial transitada em julgado ou de determinação legal anterior à calamidade pública;

(...)

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IX - contar esse tempo como de período aquisitivo necessário exclusivamente para a concessão de anuênios, triênios, quinquênios, licenças-prêmio e demais mecanismos equivalentes que aumentem a despesa com pessoal em decorrência da aquisição de determinado tempo de serviço, sem qualquer prejuízo para o tempo de efetivo exercício, aposentadoria, e quaisquer outros fins." (Grifos nossos).

Analisando primeiramente o teor do inciso I do art. 8º acima transcrito, temos que com relação as vantagens decorrentes de decisões judiciais, o trecho é autoexplicativo e não enseja maiores dúvidas. Por outro lado, no que tange àquelas provenientes de determinação legal anterior à calamidade pública, vale registrar que aqueles direitos, vantagens que o servidor já fazia jus por ocasião do reconhecimento da situação de calamidade pública em âmbito nacional pelo Decreto Legislativo nº 06/2020 (em 20/03/2020) devem ser pagos/concedidos.

De outra feita, à luz do inciso IX do art. 8º, o período de 20 de

março de 2020 até dezembro de 2021 encontra-se suspenso para fins de concessão de vantagens que dependam exclusivamente do decurso do tempo, a exemplo dos anuênios ou licenças prêmio. Isto quer significar que este lapso temporal somente poderá ser computado para concessão de tais vantagens após janeiro de 2022.

Pois bem. O consulente menciona que o Plano de Cargos e

Carreiras da Câmara Municipal permite a progressão do servidor de ano em ano com um adicional de 2% no valor, mediante a avaliação de desempenho do servidor, sendo que se este conseguir a pontuação de 7, sendo avaliada sua disciplina, assiduidade e avaliação do chefe o servidor está apto ao benefício.

Para fins da vedação do art. 8º, I, da LC nº 173/2020, não

vislumbramos óbices com relação à concessão da progressão estrito senso na carreira, visto que ela não se enquadra no conceito de vantagem, aumento, reajuste ou adequação de remuneração.

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No que tange ao inciso IX do art. 8º da LC nº 173/2020, como aventado acima, a vedação de contagem do tempo se aplica para concessão de vantagens que decorram exclusivamente do decurso do tempo, tal como aponta a primeira parte do dispositivo. As progressões, em atendimento ao postulado constitucional da eficiência, não decorrem exclusivamente do mero decurso do tempo, devendo este fator ser conjugado com outros, a exemplo da avaliação de desempenho, titulação, entre outros.

No caso em tela, o consulente menciona que a progressão do

servidor ocorre a cada ano (lapso temporal de um ano) mediante avaliação de desempenho sobre disciplina, assiduidade, a qual exige uma pontuação mínima. Desta forma, não se tratando a progressão de vantagem que exige para sua implementação exclusivamente o decurso do tempo, não se vislumbram óbices para sua concessão enquanto vigorarem as vedações do art. 8º da LC nº 173/2020.

Isto posto, concluímos objetivamente a presente consulta na forma das razões exaradas.

É o parecer, s.m.j.

Priscila Oquioni Souto

Assessora Jurídica

Aprovo o parecer

Marcus Alonso Ribeiro Neves

Consultor Jurídico

Rio de Janeiro, 29 de maio de 2020.

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Parecer IBAM Nº 1179/2020

PL – Poder Legislativo, SM – Servidor Público. Direitos de servidores públicos previstos em Lei Orgânica. Inconstitucionalidade. Vedação à equiparação (art. 37, XIII, da CRFB). Inviabilidade de concessão de aumento remuneratório para titulares de cargos em comissão em virtude das restrições previstas no art. 8º, da Lei Complementar nº 173/2000, até 31 de dezembro de 2021. Comentários.

CONSULTA:

A Câmara Municipal relata que a Lei Orgânica do Município, em seu art. 106, garante aos servidores dos Poderes Executivo e Legislativo isonomia de vencimentos quando se tratar de cargos e atribuições iguais ou assemelhadas, nos seguintes termos:

Art. 106. A lei assegurará aos servidores da

administração direta isonomia de vencimentos para cargos de atribuições iguais ou assemelhados do mesmo Poder, ou entre servidores dos Poderes Executivo e Legislativo, ressalvadas as vantagens de caráter individual e as relativas à natureza ou ao local do trabalho.

Ocorre que, segundo o consulente, no Poder Executivo os

vencimentos dos cargos comissionados iguais ou assemelhados são maiores do que os do Poder Legislativo. Diz, ainda, que na época da edição da Lei Municipal nº 1.339/2019, que criou os vencimentos dos

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cargos comissionados do Poder Legislativo, não se observou o artigo 106 da Lei Orgânica do Município quanto à isonomia de vencimentos dos cargos.

Relata que o Presidente da Câmara pretende corrigir e acertar a

legislação através de um novo projeto de lei, com efeitos retroativos à data de sanção da lei anterior, qual seja, 07 de agosto de 2019. Em vista do relatado, pergunta-se:

- É possível, ao editar a nova legislação, retroagir os efeitos

financeiros a data de 07 de agosto de 2019 e pagar os servidores a diferença dos valores?

A consulta não vem documentada.

RESPOSTA:

Inicialmente, cumpre deixar consignado que o princípio da isonomia remuneratória, anteriormente previsto no art. 39, § 1º, da Constituição Federal, determinava que os servidores que ocupassem cargos de atribuições iguais ou assemelhados faziam jus à igualdade de vencimentos, ressalvadas as vantagens de caráter individual e aquelas concernentes à natureza ou ao local de trabalho.

O referido princípio tinha por desiderato maior evitar disparidades

remuneratórias entre cargos idênticos, situados em estruturas funcionais diversas.

Com o advento da EC nº 19/98, o princípio da isonomia

remuneratória foi retirado do texto constitucional, passando o § 1º do art. 39 da Lei Maior a dispor da seguinte forma:

"Art. 39: A União, os Estados, o Distrito Federal e os

Municípios instituirão conselho de política de administração e remuneração de pessoal, integrado por servidores designados pelos respectivos Poderes.

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§ 1º: A fixação dos padrões de vencimento e dos demais componentes do sistema remuneratório observará:

I - a natureza, o grau de responsabilidade e a

complexidade dos cargos componentes de cada carreira;

II - os requisitos para a investidura;

III - as peculiaridades dos cargos."

Dentro deste contexto, cabe salientar que a equiparação salarial foi expressamente vedada pelo legislador constituinte:

"Art. 37: (...)

XIII - é vedada a vinculação ou equiparação de quaisquer

espécies remuneratórias para o efeito de remuneração de pessoal do serviço público;"

Acerca deste dispositivo há que se registrar que a equiparação

estabelece elo horizontal de igualação remuneratória entre cargos ontologicamente desiguais, para o efeito de lhes darem vencimentos idênticos, de tal sorte que, ao aumentar-se o padrão do cargo paradigma automaticamente o do outro será majorado na mesma proporção.

Note-se que o dispositivo aqui analisado direciona-se ao

legislador de cada entidade da Federação, que fica impedido de editar leis que tragam em seu bojo as figuras constitucionalmente vedadas. Isso porque, ressalvam-se da vedação as hipóteses expressamente autorizadas em sede constitucional.

Atualmente, é de se considerar que o legislador constituinte

deixou expresso que os cargos preenchidos por servidores efetivos de Poder Legislativo não poderão ter vencimentos fixados em patamar superior ao firmado no âmbito do Poder Executivo, quando se trate de cargos iguais ou assemelhados (art. 37, inciso XII, da Constituição

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Federal). O que existe é um teto vencimental para os servidores do Legislativo. Vejamos:

"Art. 37: (...)

XII - os vencimentos dos cargos do Poder Legislativo e do

Poder Judiciário não poderão ser superiores aos pagos pelo Poder Executivo;"

Tecidas estas considerações, resta claro que os vencimentos dos

cargos deve ser fixado sob a perspectiva do § 1º art. 39 da Lei Maior. Dentro desta perspectiva, em cotejo, na forma do inciso XII do art. 37 também da Lei Maior, não se revela factível ao Poder Legislativo buscar equiparar automaticamente os vencimentos de cargos em comissão com o de servidores que tem atribuições de direção, chefia e assessoramento no Poder Executivo.

Ademais, há de se considerar que há, de fato, grande diferença

entre as funções a serem desempenhadas por servidores que ocupam cargos de direção, chefia e assessoramento no Executivo e no Legislativo, mormente se considerarmos que as competências do Poder Legislativo são muito diversas daquelas desempenhadas pelo Executivo. Não basta a nomenclatura do cargo para que se considere que desempenham atribuições semelhantes ou idênticas. O dia-a-dia, as atribuições concretas cotidianas, essas sim devem ser idênticas.

E não é só: não é a Lei Orgânica Municipal o diploma legal

apropriado para dispor sobre regime e direitos de servidores públicos. A inviabilidade de dispor sobre direitos dos servidores públicos na Lei Orgânica do Município, por se tratar de assunto muito discutido nos tribunais, foi objeto da Tese de Repercussão Geral nº 223 de 07/04/2015 do Supremo Tribunal Federal, tendo como acórdão paradigma o RE 590829, com o seguinte verbete:

"É inconstitucional, por afrontar a iniciativa privativa

do Chefe do Poder Executivo, a normatização de direitos dos

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servidores públicos em lei orgânica do Município." (grifo nosso)

Especificamente quanto à pretensão de isonomia apoiada em

dispositivo da Lei Orgânica, mostra-se pertinente colacionar a seguinte decisão do TJSC:

"APELAÇÃO CÍVEL. ADMINISTRATIVO. SERVIDOR

PÚBLICO MUNICIPAL. PROCURADOR JURÍDICO DO PODER EXECUTIVO DO MUNICÍPIO DE SÃO MIGUEL DO OESTE. PRETENSÃO DE EQUIPARAÇÃO SALARIAL COM CARGO DE PROCURADOR DO PODER LEGISLATIVO. LEI ORGÂNICA MUNICIPAL QUE PREVÊ A EQUIPARAÇÃO ENTRE CARGOS SEMELHANTES. PRETENSA EQUIPARAÇÃO DE VENCIMENTOS POR ISONOMIA. IMPOSSIBILIDADE. EXPRESSA PREVISÃO CONSTITUCIONAL (ART. 37, XIII, CF). NECESSIDADE DE LEI ESPECÍFICA. SÚMULA VINCULANTE N. 37/STF. SENTENÇA DE IMPROCEDÊNCIA MANTIDA. RECURSO DESPROVIDO. Não cabe ao Poder Judiciário, que não tem função legislativa, aumentar vencimentos de servidores públicos sob fundamento de isonomia." (Súmula Vinculante n. 37). (TJ-SC - AC: 03006599520148240067 São Miguel do Oeste 0300659-95.2014.8.24.0067, Relator: Pedro Manoel Abreu, Data de Julgamento: 14/08/2018, Primeira Câmara de Direito Público).

No mesmo sentido, reformando decisão contrária ao seu

entendimento, editou o STF a seguinte decisão:

"RECURSO EXTRAORDINÁRIO. ADMINISTRATIVO.

SERVIDOR PÚBLICO. EQUIPARAÇÃO SALARIAL. LEI 1.042/1971 DO MUNICÍPIO DE POUSO ALEGRE – MG. PARIDADE DE VENCIMENTOS E VANTAGENS ENTRE CARGOS DA PREFEITURA E DA CÂMARA MUNICIPAL. ARTIGO 37, INCISO XIII, DA CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA. IMPOSSIBILIDADE. PRECEDENTES. (...) O Tribunal a quo divergiu da jurisprudência do Supremo Tribunal Federal no sentido de “ser incontroverso que leis de equiparação ou vinculação

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automática de vencimentos, quando não originariamente inconstitucionais, terão sido revogadas por inconstitucionalidade superveniente desde pelo menos a Carta de 1967” e que “a Constituição mantém a proibição, vinda de 1967, de vinculações ou equiparações de vencimentos (CF 88, art. 37, XIII), o que basta para elidir qualquer ensaio - a partir do princípio geral da isonomia - de extrair, de uma lei ou resolução atributiva de vencimento ou vantagens determinadas a um cargo, força bastante para estende- los a outro cargo, por maior que seja a similitude de sua posição e de suas funções” (ADI 1.776-MC, Rel. Min. Sepúlveda Pertence, Plenário, DJ de 26/5/2000). No mesmo sentido foi a decisão monocrática proferida pelo Ministro Gilmar Mendes no RE 1.165.121-AgR, DJe de 2/9/2019, caso idêntico ao presente, in litteris: “Percebe-se que a controvérsia recursal não reside na interpretação da norma local, mas na possibilidade jurídica de lei municipal determinar a paridade de vencimentos entre funcionários da Prefeitura e da Câmara Municipal, ocupantes de cargos equivalentes. O feito foi ajuizado em 3.7.2015 (eDOC 1, p. 3), posteriormente à Emenda Constitucional 19, de 4.6.1998, que deu a atual redação ao art. 37, XIII, da CF: é vedada a vinculação ou equiparação de quaisquer espécies remuneratórias para o efeito de remuneração de pessoal do serviço público. O Tribunal a que não considerou tal norma na apreciação da lide, mesmo após provocado por embargos de declaração do Município. É evidente, porém, sua incompatibilidade com o acórdão proferido. Não é possível ao legislador, no atual regime constitucional, conferir unidade de regime a carreiras diversas, de modo que a alteração que sofra uma delas repercuta, automaticamente, sobre a outra. É o que se extrai da norma do art. 37, XIII, da CF, que a EC 19/1998 buscou tornar mais explícita em relação ao seu texto anterior, que remetia à norma, atualmente revogada, do art. 39, § 1º (A lei assegurará, aos servidores da administração direta, isonomia de vencimentos para cargos de atribuições iguais ou assemelhados do mesmo Poder ou entre servidores dos Poderes Executivo, Legislativo e Judiciário, ressalvadas as vantagens de caráter individual e as relativas à natureza ou ao local de trabalho). Não

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resta dúvida de que ao condenar o recorrente a pagar aos recorridos, detentores de cargos no Executivo Municipal, os mesmos vencimentos de cargos equivalentes do Legislativo Municipal, o ato impugnado realizou equiparação de espécie remuneratória, não menos inválida por existir lei local que a previsse.(...)" (STF - RE: 1238067 MG - MINAS GERAIS 0108922-56.2015.8.13.0525, Relator: Min. LUIZ FUX, Data de Julgamento: 30/10/2019, Data de Publicação: DJe-241 05/11/2019)

Por fim, cabe observar que, em uma situação normal, atendidos

os requisitos de direito financeiro previstos no art. 169 da CRFB e no art. 16 e 17 da LC nº 101/2000, bem como os limites com despesa de pessoal previstos no art. 18 e ss. da LC nº 101/2000, poderia, a Câmara Municipal editar lei para promover aumento setorial aos servidores de seus quadros.

Ocorre que não estamos em uma situação de normalidade, em

razão do enfrentamento da pandemia do novo Coronavírus (Covid-19). Assim é que foi editada e promulgada nessa semana, no dia 28/05/2020, a Lei Complementar nº 173/2020, que assim prevê em seu art. 8º:

"Art. 8º Na hipótese de que trata o art. 65 da Lei

Complementar nº 101, de 4 de maio de 2000, a União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios afetados pela calamidade pública decorrente da pandemia da Covid-19 ficam proibidos, até 31 de dezembro de 2021, de:

I - conceder, a qualquer título, vantagem, aumento,

reajuste ou adequação de remuneração a membros de Poder ou de órgão, servidores e empregados públicos e militares, exceto quando derivado de sentença judicial transitada em julgado ou de determinação legal anterior à calamidade pública;

II - criar cargo, emprego ou função que implique aumento

de despesa;

III - alterar estrutura de carreira que implique aumento de

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despesa;

IV - admitir ou contratar pessoal, a qualquer título,

ressalvadas as reposições de cargos de chefia, de direção e de assessoramento que não acarretem aumento de despesa, as reposições decorrentes de vacâncias de cargos efetivos ou vitalícios, as contratações temporárias de que trata o inciso IX do caput do art. 37 da Constituição Federal, as contratações de temporários para prestação de serviço militar e as contratações de alunos de órgãos de formação de militares;

V - realizar concurso público, exceto para as reposições

de vacâncias previstas no inciso IV;

VI - criar ou majorar auxílios, vantagens, bônus, abonos,

verbas de representação ou benefícios de qualquer natureza, inclusive os de cunho indenizatório, em favor de membros de Poder, do Ministério Público ou da Defensoria Pública e de servidores e empregados públicos e militares, ou ainda de seus dependentes, exceto quando derivado de sentença judicial transitada em julgado ou de determinação legal anterior à calamidade;

VII - criar despesa obrigatória de caráter continuado,

ressalvado o disposto nos §§ 1º e 2º;

VIII - adotar medida que implique reajuste de despesa

obrigatória acima da variação da inflação medida pelo Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA), observada a preservação do poder aquisitivo referida no inciso IV do caput do art. 7º da Constituição Federal;

IX - contar esse tempo como de período aquisitivo

necessário exclusivamente para a concessão de anuênios, triênios, quinquênios, licenças-prêmio e demais mecanismos equivalentes que aumentem a despesa com pessoal em decorrência da

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aquisição de determinado tempo de serviço, sem qualquer prejuízo para o tempo de efetivo exercício, aposentadoria, e quaisquer outros fins.

§ 1º O disposto nos incisos II, IV, VII e VIII do caput deste

artigo não se aplica a medidas de combate à calamidade pública referida no caput cuja vigência e efeitos não ultrapassem a sua duração.

(...)

§ 5º O disposto no inciso VI do caput deste artigo não se

aplica aos profissionais de saúde e de assistência social, desde que relacionado a medidas de combate à calamidade pública referida no caput cuja vigência e efeitos não ultrapassem a sua duração.

§ 6º (VETADO)." (grifo nosso)

Cabe salientar que o artigo 8º da Lei Complementar nº 173/2020,

diversamente da modificação permanente realizada pelo art. 7º do mesmo diploma legal, é dirigido especificamente à situação de calamidade pública decorrente da atual pandemia da Covid-19, e ao fazer referência à hipótese de que trata o art. 65 da LRF, atrai para o seu campo de incidência todos os demais entes federativos afetados, independentemente destes terem decretado ou não estado de calamidade pública. Com efeito, é de se considerar que no mesmo dia 20/03/2020 em que foi editado o Decreto Legislativo nº 06/2020, pela Portaria nº 454 do Ministério da Saúde, foi declarado, em todo o território nacional, o estado de transmissão comunitária do novo Coronavírus (Covid-19)

Assim sendo, para fins de percepção do auxílio financeiro advindo

do Programa Federativo de Enfretamento ao Coronavírus SARS- CoV-2 (Covid-19) instituído pela Lei Complementar nº 173/2020 e da incidência das restrições estabelecidas no artigo 8º do aludido diploma legal não há necessidade de decretação do estado de calamidade pela municipalidade.

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As restrições, portanto, se aplicam de imediato em todo território

nacional. Isso porque se a finalidade das proibições encartadas no artigo 8º é estabelecer uma contrapartida dos demais entes federativos em face dos recursos financeiros que receberão da União, não faz sentido algum que este ou aquele Estado ou Município receba o socorro financeiro da União e esteja fora do âmbito de aplicação das proibições do artigo 8º somente porque não editou decreto de calamidade pública.

Desse modo, encontra-se vedado até 31 de dezembro de 2021,

nos termos do art. 8º, IV da Lei Complementar nº 173/2000 "conceder a

qualquer título, vantagem, aumento, reajuste ou adequação de

remuneração a membros de Poder ou de órgão, servidores e empregados

públicos e militares". Também não é possível extinguir os cargos em comissão e criar outros com remuneração maior, porque o inciso VII do art. 8º veda, também, a reestruturação de carreira que implique aumento de despesa. Os cargos em comissão do Poder Legislativo não se enquadram, por outro lado, na exceção do § 5º, porque não se tratam de profissionais de saúde ou assistência social envolvidos em medidas de combate à calamidade pública.

Também não se viabiliza, quanto mais para escapar das

vedações previstas no art. 8º da Lei Complementar nº 173/2020, a atribuição de efeitos retroativos a eventual ato legislativo que aumente a remuneração dos cargos em comissão. Primeiro, porque a lei não criaria uma barreira tão facilmente ultrapassável, bastando um dispositivo legal que faça seus efeitos retroagirem para antes da promulgação do dispositivo restritivo.

Além disso, em regra, as normas legais são expedidas para

disciplinar as situações futuras. O passado escapa ao seu império e sua eficácia se restringe aos atos praticados durante o período da sua vigência. A retroatividade é admitida, apenas, em casos excepcionais, para atender aos fins sociais e às exigências do bem comum, tal como dispõe a Lei de Introdução às Normas de Direito Brasileiro (DL nº

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4.657/42, art. 5º). Vale a pena citar também o comentário do Prof. Caio Mário da Silva Pereira acerca do tema da retroatividade das leis:

"Fazendo-se abstração de qualquer motivo de política

legislativa, e independentemente de encarar o assunto no terreno do direito positivo, o efeito retroativo da lei encontra repulsa na consciência jurídica, além de traduzir, como diz bem Ferrara, uma contradição do Estado consigo mesmo, pois que as relações e direitos que se fundam sob a garantia e proteção de suas leis não podem ser arbitrariamente destituídos de eficácia." (PEREIRA, Caio Mário da Silva. Instituições de Direito Civil, vol. I. São Paulo: Forense, 1994, p. 92)

Destaquemos ainda que dentre as várias funções cometidas à

lei, uma delas é a promoção da segurança jurídica, segundo a qual as pessoas devem saber quais as consequências de seus atos antes de os praticarem porque fixadas de forma expressa na lei. Essa regra ganha maior repercussão quando estamos diante de situações que implicam gastos públicos. Isso porque todas as ações da Administração devem ser voltadas para o interesse público, guardiã e gestora do patrimônio pertencente à toda a população que, por meio do pagamento de tributos, arca com os gastos públicos. Por isso, o administrador público, seja de que esfera de poder for e seja a que ente federativo pertencer, estará inafastavelmente submetido aos princípios constitucionais, em especial os dispostos no caput do art. 37, em especial o da legalidade, do qual decorre que somente lhes é possível fazer o que a lei expressamente autorizar.

Assim, consideramos que não se justifica a retroatividade de uma

norma que disponha sobre aumento da remuneração de cargos em comissão do Legislativo, uma vez que não há qualquer razão de interesse público destinada a atender às aos fins sociais e exigências do bem comum. Muito ao contrário: o dispositivo em que se apoia a pretensão é inconstitucional, por tratar de norma que prevê equiparação de vencimentos vedada pela Constituição, e, como se não bastasse, prevista na Lei Orgânica, que não é instrumento adequado para tratar de direitos dos servidores públicos.

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Por todo o exposto, conclui-se que a disposição prevista na Lei Orgânica do Município é inconstitucional formal e materialmente, porque apenas lei de iniciativa do Poder Executivo pode tratar de direitos de servidores públicos, além de que a equiparação de vencimentos é vedada pelo Art. 37, XIII, da CRFB. Além disso, não se afigura factível que haja real identidade de atribuições, para além da nomenclatura dos cargos, entre titulares de cargos de direção, chefia e assessoramento no Legislativo e no Executivo, considerando-se a enorme diferença de competências constitucionais entre os órgãos. Por fim, resta, também, inviabilizada a edição de lei para aumentar vencimentos dos cargos do Legislativo até o dia 31 de dezembro de 2021, por conta do art. 8º da Lei Complementar nº 173/2020, sendo inconstitucional, evidentemente, a atribuição de efeitos retroativos para que não se apliquem suas disposições.

É o parecer, s.m.j.

Gustavo da Costa Ferreira M. dos Santos

Consultor Técnico

Aprovo o parecer

Marcus Alonso Ribeiro Neves

Consultor Jurídico

Rio de Janeiro, 29 de maio de 2020.

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Parecer IBAM Nº 1181/2020

SM – Servidor Público. Medidas de enfrentamento da pandemia do novo Coronavírus (COVID-19). LC nº 173/2020. Designação para exercício de função gratificada. Considerações.

CONSULTA:

Tendo em vista o teor do art. 8º, I, da LC nº 173/2020, indaga o consulente acerca da possibilidade de designação de servidor para o desempenho de função gratificada cuja lei de instituição é anterior à instauração da situação de calamidade pública decorrente da pandemia da COVID-19.

A consulta não veio documentada.

RESPOSTA:

Inicialmente, como sabido, a rápida expansão da pandemia do

Novo Coronavírus (COVID-19) impôs sérias restrições ao nosso modo de vida, sendo certo que as recomendações de distanciamento social e de quarentena geram uma redução substancial da circulação de pessoas, que levam, por sua vez, a impactos sensíveis nas mais diversas áreas da sociedade e, por conseguinte, a necessidade de organização da Administração Pública para atendimento das demandas e manutenção do bem comum.

Diante do acelerado avanço da doença no Brasil e dos múltiplos

desdobramentos no campo da saúde e da economia, ao longo deste ano de 2020, os poderes Executivo, Legislativo e Judiciário têm adotado, proposto ou sugerido medidas, providências ou ordens, de conteúdos diversos, para instrumentalizar o Poder Público e a sociedade em geral

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com os meios que se reputam oportunos e necessários para enfrentamento da crise.

Neste contexto, em 28 de maio de 2020, entrou em vigor a LC nº

173/2020 que encarta o Programa Federativo de Enfrentamento ao Coronavírus, que estabelece medidas de socorro financeiro da União para os demais entes federativos mediante algumas contrapartidas negociadas pelo Executivo com o Senado Federal. A referida lei complementar também trouxe sensíveis modificações na LRF (LC nº 101/2000).

Dentre suas disposições transitórias, a LC nº 173/2020, mais

precisamente em seu art. 8º, I, veda até 31 de dezembro de 2021 a concessão de qualquer vantagem, aumento, reajuste ou adequação aos servidores, excepcionando em sua parte final aquelas decorrentes de decisões judiciais que assim venham a determinar, bem como aquelas provenientes de determinação legal anterior à calamidade pública. Vejamos:

"Art. 8º Na hipótese de que trata o art. 65 da Lei

Complementar nº 101, de 4 de maio de 2000, a União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios afetados pela calamidade pública decorrente da pandemia da Covid-19 ficam proibidos, até 31 de dezembro de 2021, de:

I - conceder, a qualquer título, vantagem, aumento,

reajuste ou adequação de remuneração a membros de Poder ou de órgão, servidores e empregados públicos e militares, exceto quando derivado de sentença judicial transitada em julgado ou de determinação legal anterior à calamidade pública;" (Grifos nossos).

Dito isto, há de se considerar que que a função de confiança ou

gratificada, prevista no inciso V do art. 37 da Lei Maior, não constitui cargo público, sendo unicamente designado servidor efetivo que, então, a exerce em acréscimo às funções de seu vínculo efetivo, percebendo um plus remuneratório na forma de gratificação que incide sobre o vencimento do seu cargo efetivo.

A função gratificada é designada a servidor efetivo que esteja em

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exercício do seu cargo efetivo. Assim, deve cumprir os deveres e o horário de seu cargo efetivo, além das atribuições da função gratificada. E é exatamente por esse trabalho extra que o servidor recebe uma remuneração extra, a gratificação de função.

Pelo desempenho de função gratificada o servidor faz jus a uma

gratificação de função, que visa a o recompensar, temporariamente, pelo desempenho das atribuições que não se inserem dentre as típicas de seu cargo, o que pode acarretar a necessidade de permanência além de seu horário normal de expediente, não sendo cabível o pagamento de qualquer outra espécie de adicional com a mesma finalidade como hora extra ou adicional noturno. Compreende, de certo, parcela estipendiária de natureza propter laborem, isto é, concedida por conta do exercício dos serviços que a ensejam.

Desta sorte, o servidor efetivo que é designado para o exercício

de função gratificada está recebendo um acréscimo em sua remuneração pelo trabalho extraordinário executado e enquanto este trabalho estiver sendo executado, evitando o enriquecimento ilícito da Administração Pública. A designação para o desempenho de função gratificada cuja a lei de criação é anterior a situação de calamidade pública instaurada pela pandemia da COVID-19 l não configura concessão de vantagem, aumento ou revisão.

Aliás, procedendo uma interpretação sistemática da LC nº

173/2020, temos que, à luz do inciso II do seu art. 8º, temos que a criação de função gratificada que venha a implicar aumento de despesa neste período encontra-se vedada. Porém, a nomeação de servidor para o desempenho de função gratificada já existente por ocasião da instauração da calamidade pública, a qual não ensejará aumento de despesa com pessoal, é perfeitamente factível.

Em que pese não tenha sido objeto de questionamento pelo

consulente, vale esclarecer que a designação para função gratificada, de igual forma, também não encontra óbice no inciso IV do art. 8º da LC nº 173/2020, segundo o qual restam vedadas até 31/12/2021 a admissão ou contratação de pessoal, a qualquer título, ressalvadas as reposições de cargos de chefia, de direção e de assessoramento que não acarretem

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aumento de despesa, as reposições decorrentes de vacâncias de cargos efetivos ou vitalícios, as contratações temporárias.

Isto porque, a designação para função gratificada, diferentemente

do que acontece com a nomeação para cargo comissionado, não implica em provimento. Logo, não é hipótese de admissão ou contratação. Reiteramos que o servidor designado para o exercício de função gratificada permanece no exercício das atribuições do seu cargo efetivo, desempenhando em acréscimo as atribuições da função gratificada, pelo que faz jus a um plus remuneratório.

Neste panorama, pode-se afirmar que a LC 173/2020 não veda a

designação de servidor efetivo para o exercício de função gratificada. O único óbice existente na referida Lei Complementar em relação à função gratificada é aquele que consta do inciso II de seu artigo 8º que impede não a designação, mas sim a criação de função que implique em aumento de despesa, o que, segundo informado na consulta, não é o caso.

Isto posto, concluímos objetivamente a presente consulta na forma das razões exaradas.

É o parecer, s.m.j.

Priscila Oquioni Souto

Assessora Jurídica

Aprovo o parecer

Marcus Alonso Ribeiro Neves Consultor Jurídico

Rio de Janeiro, 29 de maio de 2020.

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Parecer IBAM Nº 1193/2020

FM – Finanças Municipais, SM – Servidor Público. Revisão Geral Anual. Art. 8º, I da Lei Complementar nº 173/2020. Comentários.

CONSULTA:

A Prefeitura Municipal consulta este Instituto se, à luz da Lei Complementar nº 173/2020, o Município fica impedido de promover a recomposição de seus servidores que tenha seus vencimentos maiores que o salário mínimo.

A consulta não vem documentada.

RESPOSTA:

Considerando a forma como foi redigida a consulta, tudo leva a

crer que a dúvida do consulente diz respeito à recomposição do valor nominal da remuneração dos servidores por meio da revisão geral anual, que não se confunde com o aumento remuneratório concedido isoladamente às categorias de agentes públicos. Sobre o tema, é pertinente a lição de Hely Lopes Meirelles:

"Há duas espécies de aumento de vencimentos: uma

genérica, provocada pela alteração do poder aquisitivo da moeda, à qual poderíamos denominar aumento impróprio, por se tratar, na verdade, de um reajustamento destinado a manter o equilíbrio da situação financeira dos servidores públicos; e, outra, específica, geralmente feita à margem da lei que concede o aumento geral, abrangendo determinados cargos ou classes funcionais e representando realmente uma elevação de vencimentos, por se

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fazer em índices não proporcionais ao decréscimo do poder aquisitivo." (MEIRELLES, Hely Lopes. Direito Administrativo Brasileiro. São Paulo: Malheiros Editores, 2002, p. 452).

Não é diferente o entendimento do Supremo Tribunal Federal,

que distinguiu os institutos do reajuste e do aumento remuneratório, a saber:

"Se de um lado é possível ao Estado conceder aumentos

setorizados, de outro conflita com a Carta a outorga de reajuste que não alcance todo o quadro funcional. Sendo o Direito uma ciência, os institutos, expressões e vocábulos possuem sentido próprio, descabendo confundi-los. O aumento atrai, necessariamente, um plus, enquanto o reajuste visa tão-somente à reposição do poder aquisitivo." (RE nº 192.277-0. Rel.: Min. Marco Aurélio. In: DJ, 17-04-98).

A própria LRF traz distinção entre os conceitos de revisão geral

anual e aumento de servidores públicos, trazendo no art. 22, I, exceção ao controle quadrimestral do limite prudencial de despesas com pessoal, que não se aplica quando o reajuste do valor nominal constituir revisão geral de remuneração.

Ocorre que o art. 8º, I da Lei Complementar nº 173/2020, que

entrou em vigor no dia 28 de maio de 2020, é muito claro ao estender a vedação "a qualquer título, vantagem, aumento, reajuste ou adequação de

remuneração a membros de Poder ou de órgão, servidores e empregados

públicos e militares" (grifo nosso). Portanto, compreende-se incluído no dispositivo em comento a vedação à revisão geral anual, até 31 de dezembro de 2021, uma vez que a expressão "a qualquer título" abrange qualquer modalidade de aumento nominal de remuneração.

Por derradeiro, cabe salientar que pode ser arguida a

constitucionalidade ou pedida interpretação conforme a Constituição, em sede de ação direta de inconstitucionalidade, para questionar o dispositivo em vista do art. 37, X, da CRFB. Por outro lado, é de se considerar que o

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inciso VIII do mesmo artigo 8º em questão veda reajuste de despesa obrigatória acima do IPCA, do que se depreende que a variação positiva nominal da despesa abaixo do IPCA estaria permitida mesmo no decurso das medidas restritivas fiscais, vigentes até o dia 31 de dezembro de 2021.

De um lado, é um tanto incongruente que outras despesas

obrigatórias da administração pública possam ser corrigidas pela inflação, e não possam ser corrigidos pela inflação, também, os valores de remuneração dos servidores, que experimentarão uma redução no poder real de compra ao longo do período, caso haja inflação e o valor nominal da remuneração não seja corrigido. Por outro lado, sabe-se que na iniciativa privada, muitos trabalhadores perderam o emprego, sofreram redução de remuneração e, para os que permaneceram em seus empregos, a perspectiva de terem seus salários corrigidos pela inflação é mínima. Assim, a mens legislatoris foi bastante influenciada pela situação dos trabalhadores da iniciativa privada em cotejo com a dos servidores públicos.

Por outro lado, o STF firmou entendimento de que o aumento de

remuneração sem prévia dotação orçamentária suficiente, ou sem previsão na Lei de Diretrizes Orçamentárias, viola o art. 169, § 1º, da CF. A consequência é que o reajuste é nulo de pleno direito (art. 21, da LRF) caso não tenha prévia dotação orçamentária. O Supremo Tribunal Federal, dessa forma, negou a existência de direito subjetivo à recomposição decorrente diretamente do texto constitucional, e fixou a tese de que a revisão geral anual da remuneração dos servidores públicos depende, cumulativamente, de dotação na Lei Orçamentária Anual e de previsão na Lei de Diretrizes Orçamentárias (RE 905357, Relator (a): Min. ALEXANDRE DE MORAES, Tribunal Pleno, julgado em 29/11/2019, PROCESSO ELETRÔNICO REPERCUSSÃO GERAL - MÉRITO DJe-282 DIVULG 17-12-2019 PUBLIC 18-12-2019).

Pertinente noticiar que, também no STF, RE 565.089 do STF, foi

discutida a viabilidade de indenizar servidores pela mora do Poder Executivo no encaminhamento do projeto de lei que fixa o índice de revisão, tendo sido assentada a tese de repercussão geral segundo a qual

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pode o Prefeito Municipal deixar de propor a revisão geral anual, desde que justificadamente:

"O não encaminhamento de projeto de lei de revisão

anual dos vencimentos dos servidores públicos, previsto no inciso X do art. 37 da CF/1988, não gera direito subjetivo a indenização. Deve o Poder Executivo, no entanto, se pronunciar, de forma fundamentada, acerca das razões pelas quais não propôs a revisão" (STF: Tese de repercussão geral nº 19, Plenário, 25.9.2019).

Assim, em vista da presunção de constitucionalidade das leis e da

redação abrangente do art. 8º, I, caso venha a vigorar o dispositivo da proposição em comento, não haverá segurança jurídica na concessão de revisão geral anual.

Conclui-se, assim, que após a entrada em vigor da Lei

Complementar nº 173/2020, em 28 de maio de 2020, não há segurança jurídica para promover a revisão geral anual dos vencimentos dos servidores em vista do disposto no art. 8º, I, do ato normativo, até o dia 31 de dezembro de 2021. De qualquer modo, é importante acompanhar o desenrolar dos acontecimentos, uma vez que, como afirmado, a revisão geral anual não implica em aumento real, podendo haver futuramente alguma flexibilização do entendimento.

É o parecer, s.m.j.

Gustavo da Costa Ferreira M. dos Santos

Consultor Técnico

Aprovo o parecer

Marcus Alonso Ribeiro Neves

Consultor Jurídico

Rio de Janeiro, 01 de junho de 2020.

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Parecer IBAM Nº 1199/2020

SM – Servidor Público. LC nº 173/2020. Promoções, progressões, prêmio por qualificação e licença-prêmio. Considerações.

CONSULTA:

Tendo em vista a entrada em vigor da LC nº 173/2020, mormente com relação às vedações do seu art. 8º, o consulente indaga acerca da possibilidade de concessão de progressão por nível, promoção por classe, licença-prêmio no período indicado no dispositivo.

A consulta vem acompanhada do Plano de Cargos e Carreiras da

Câmara Municipal.

RESPOSTA:

Inicialmente, como sabido, a rápida expansão da pandemia do Novo Coronavírus (COVID-19) impôs sérias restrições ao nosso modo de vida, sendo certo que as recomendações de distanciamento social e de quarentena geram uma redução substancial da circulação de pessoas, que levam, por sua vez, a impactos sensíveis nas mais diversas áreas da sociedade e, por conseguinte, a necessidade de organização da Administração Pública para atendimento das demandas e manutenção do bem comum.

Diante do acelerado avanço da doença no Brasil e dos múltiplos

desdobramentos no campo da saúde e da economia, ao longo deste ano de 2020, os poderes Executivo, Legislativo e Judiciário têm adotado, proposto ou sugerido medidas, providências ou ordens, de conteúdos diversos, para instrumentalizar o Poder Público e a sociedade em geral com os meios que se reputam oportunos e necessários para enfrentamento da crise.

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Neste contexto, em 28 de maio de 2020, entrou em vigor a LC nº 173/2020 que encarta o Programa Federativo de Enfrentamento ao Coronavírus, que estabelece medidas de socorro financeiro da União para os demais entes federativos mediante algumas contrapartidas negociadas pelo Executivo com o Senado Federal. A referida lei complementar também trouxe sensíveis modificações na LRF (LC nº 101/2000).

Dentre suas disposições transitórias, a LC nº 173/2020, mais

precisamente em seu art. 8º, I, veda até 31 de dezembro de 2021 a concessão de qualquer vantagem, aumento, reajuste ou adequação aos servidores, excepcionando em sua parte final aquelas decorrentes de decisões judiciais que assim venham a determinar, bem como aquelas provenientes de determinação legal anterior à calamidade pública. Já o inciso IX deste mesmo dispositivo veda a utilização do lapso temporal mencionado no caput para fins de cômputo de período aquisitivo de determinadas vantagens. Vejamos:

"Art. 8º Na hipótese de que trata o art. 65 da Lei

Complementar nº 101, de 4 de maio de 2000, a União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios afetados pela calamidade pública decorrente da pandemia da Covid-19 ficam proibidos, até 31 de dezembro de 2021, de:

I - conceder, a qualquer título, vantagem, aumento,

reajuste ou adequação de remuneração a membros de Poder ou de órgão, servidores e empregados públicos e militares, exceto quando derivado de sentença judicial transitada em julgado ou de determinação legal anterior à calamidade pública;

(...)

IX - contar esse tempo como de período aquisitivo

necessário exclusivamente para a concessão de anuênios, triênios, quinquênios, licenças-prêmio e demais mecanismos equivalentes que aumentem a despesa com pessoal em decorrência da aquisição de determinado tempo de serviço, sem qualquer prejuízo para o tempo de efetivo exercício, aposentadoria, e quaisquer outros fins." (Grifos nossos).

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Analisando primeiramente o teor do inciso I do art. 8º acima transcrito, temos que com relação as vantagens decorrentes de decisões judiciais, o trecho é autoexplicativo e não enseja maiores dúvidas. Por outro lado, no que tange àquelas provenientes de determinação legal anterior à calamidade pública, vale registrar que aqueles direitos, vantagens que o servidor já fazia jus por ocasião do reconhecimento da situação de calamidade pública em âmbito nacional pelo Decreto Legislativo nº 06/2020 (em 20/03/2020) devem ser pagos/concedidos.

De outra feita, à luz do inciso IX do art. 8º, o período de 20 de

março de 2020 até dezembro de 2021 encontra-se suspenso para fins de concessão de vantagens que dependam exclusivamente do decurso do tempo, a exemplo dos anuênios ou licenças prêmio. Isto quer significar que este lapso temporal somente poderá ser computado para concessão de tais vantagens após janeiro de 2022.

Pois bem. O consulente menciona que o Plano de Cargos e

Carreiras da Câmara Municipal possui previsão para concessão de progressão por nível, promoção por classe, prêmio por classificação e licença-prêmio.

Antes de adentramos à aplicação dos incisos I e IX do art. 8º da

LC nº 173/2020, cumpre registrar que vantagens como a licença-prêmio e o prêmio/adicional por qualificação são vantagens de cunho genérico que dizem respeito a todos os servidores por não guardarem nenhuma peculiaridade com o exercício da função legislativa. Em assim sendo, são matérias pertinente ao regime jurídico dos servidores e não à organização funcional do Poder Legislativo.

Como sabido, as matérias pertinentes ao regime jurídico dos

servidores pertencem à competência legislativa privativa do Chefe do Executivo local na forma do art. 61, § 1º, II, "c", da Constituição Federal. Em assim sendo, as previsões de concessão de licença-prêmio e prêmio por qualificação contidas no Plano de cargos e carreiras da Câmara Municipal são inconstitucionais, sendo necessário a retirada de tais normas do ordenamento jurídico local o quanto antes.

Ademais, especificamente com relação ao prêmio por

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qualificação o mesmo parece configurar um bis in idem como a promoção por classe que exige conclusão de curso e titulação.

Em prosseguimento, temos que o Plano de Cargos e Carreiras

da Câmara Municipal estabelece a progressão por nível e a promoção por classe, respectivamente, nos seguintes termos:

"Progressão por nível.

Art. 24 Para ser elevado a outro nível na progressão

vertical, deverá o servidor:

I - contar 01 (um) ano de efetivo exercício no atual nível em que se encontra;

II - obter, no mínimo, 40 (quarenta) pontos na Ficha de

Avaliação, conforme Anexo VIII.

Promoção por Classe.

Art. 14: Dar-se-á a promoção de uma Classe para outra dentro da mesma Referência, aos servidores efetivos ocupantes dos diversos Cargos por Conclusão de Curso e Titulação.

Parágrafo único - A concessão das promoções de classe

terá como um dos requisitos o interstício mínimo, para cada nível, de 03 (três) anos completos de tempo de efetivo exercício no cargo para qual o servidor foi provido e/ou reclassificado no Serviço Público Municipal." (Grifos nossos).

Para fins da vedação do art. 8º, I, da LC nº 173/2020, não

vislumbramos óbices com relação à concessão da progressão estrito senso ou promoção na carreira, visto que elas não se enquadram no conceito de vantagem, aumento, reajuste ou adequação de remuneração.

No que tange ao inciso IX do art. 8º da LC nº 173/2020, como

aventado acima, a vedação de contagem do tempo se aplica para concessão de vantagens que decorram exclusivamente do decurso do

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tempo, tal como aponta a primeira parte do dispositivo. As progressões, tal como posto no Plano de Cargos e Carreiras em tela, em atendimento ao postulado constitucional da eficiência, não decorrem exclusivamente do mero decurso do tempo, devendo este fator ser conjugado com outros, a exemplo da avaliação de desempenho, titulação, entre outros.

Igual entendimento segue a promoção por classe prevista no

Plano de Cargos e Carreiras da Câmara Municipal, na medida que também não se baseia exclusivamente no decurso exclusivo do tempo, exigindo conclusão de curso e titulação.

Por derradeiro, em que pese a previsão de licença-prêmio no

Plano de Cargos e Carreiras seja inconstitucional, caso haja igual previsão no Estatuto dos servidores local, esta não poderá ser concedida antes de janeiro de 2022 nem ter computado como tempo para sua concessão o período entre a edição do Decreto Legislativo nº 6/2020 e dezembro de 2021, visto tratar-se de vantagem que se baseia exclusivamente no decurso do tempo.

Isto posto, concluímos objetivamente a presente consulta na

forma das razões exaradas.

É o parecer, s.m.j.

Priscila Oquioni Souto Assessora Jurídica

Aprovo o parecer

Marcus Alonso Ribeiro Neves

Consultor Jurídico

Rio de Janeiro, 01 de junho de 2020.

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Parecer IBAM Nº 1205/2020

SM – Servidor Público. Enfrentamento à pandemia do novo Coronavírus (Covid-19). Redução temporária de auxílio-alimentação. Possibilidade. Verba indenizatória não albergada pela garantia de irredutibilidade de vencimentos. Recomendações.

CONSULTA:

A Câmara Municipal consulta este Instituto quanto à possibilidade

de redução do auxílio-alimentação dos servidores em razão da queda de arrecadação causada pela pandemia. Informa que há projeto de lei visa a reduzir de 600 para 200 reais por mês, no período de junho a dezembro, e indaga se a providência é constitucional.

A consulta não vem documentada.

RESPOSTA:

Cabe ao Município dispor sobre o regime jurídico de seus servidores (art. 39, caput, da CRFB), o que decorre da autonomia político- administrativa que lhe é conferida (art. 18 c/c art. 30, I da CRFB). O regime jurídico é o conjunto de regras que regem a relação entre a Administração e seu pessoal, que podem ser alteradas a qualquer momento, já que não existe direito adquirido à manutenção do regime aplicável no momento da nomeação.

Não é ilimitada, contudo, a prerrogativa de a Administração

alterar as regras que regem o vínculo com os servidores públicos. Dentre

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essas limitações, destaca-se a irredutibilidade de vencimentos prevista no art. 37, XV, da CRFB. Cabe observar, nesse passo, que os vencimentos têm caráter remuneratório, isto é, tratam-se de contraprestações devidas ao servidor em razão do exercício de suas funções.

Por outro lado, a remuneração devida aos servidores não se

confunde com as verbas de caráter indenizatório pagas para lhes ressarcir de despesas que tenham em razão do exercício do cargo e no interesse do serviço público. Desse modo, as verbas indenizatórias não podem conferir acréscimo patrimonial aos servidores, porque apenas restituem gastos relacionados às suas funções públicas.

Nesse passo, o auxílio-alimentação, também conhecido como

"vale alimentação" ou "ticket alimentação" é reconhecido pela jurisprudência e pela doutrina como parcela indenizatória destinada a restituir os gastos com alimentação do servidor em atividade. Nesse sentido, aponta a jurisprudência do STJ:

"(...) 2. A jurisprudência STJ é firme no sentido de que o

auxílio-alimentação, destinado a cobrir as despesas alusivas à alimentação do servidor em atividade, não possui natureza remuneratória, mas tão somente transitória e indenizatória. Dessa forma, o benefício em questão não pode ser estendido e tampouco incorporado aos proventos dos servidores inativos. (...)"(STJ: RMS 53.244/SC, Rel. Ministro HERMAN BENJAMIN, SEGUNDA TURMA, julgado em 25/04/2017, DJe 10/05/2017)

"(...)1. Os servidores aposentados não têm direito

ao auxílio-alimentação ou vale-alimentação, na medida em que se destina a cobrir os custos de refeição devida exclusivamente ao servidor que se encontrar no exercício de suas funções, não se incorporando à remuneração nem aos proventos de aposentadoria, por se tratar de verba indenizatória (AgRg no REsp. 639.289/PR, Rel. Min. LAURITA VAZ, DJU 12.11.2007). 2. Agravo Regimental desprovido." (STJ: AgRg no Ag 1076490/PR, Rel. Ministro NAPOLEÃO NUNES MAIA FILHO, QUINTA TURMA,

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julgado em 19/03/2009, DJe 27/04/2009. Grifo nosso)

É por esse motivo que se entende que a diminuição ou mesmo a

supressão do auxílio-alimentação não ofende a garantia de irredutibilidade de vencimentos prevista no art. 37, XV, da CRFB, como se pode observar na jurisprudência abaixo selecionada:

"DIREITO ADMINISTRATIVO. SERVIDOR PÚBLICO.

AUXÍLIO-ALIMENTAÇÃO. CONCESSÃO POR NORMA INFRALEGAL. POSSIBILIDADE DE SUPRESSÃO. PRINCÍPIOS DO DIREITO ADQUIRIDO E DA IRREDUTIBILIDADE DE VENCIMENTOS INAPLICÁVEIS. 1. Apelação cível interposta contra sentença originária do Juízo da 22ª Vara Federal da Seção Judiciária do Rio de Janeiro, que julgou improcedente o pedido dos autores. Estes, servidores públicos do INCRA, pretendiam o restabelecimento da concessão do auxílio-alimentação, a partir de janeiro de 1988, à base de 80% do salário mínimo vigente, com a incidência do mesmo em férias, 13º, licença-prêmio e FGTS, assim como o pagamento das parcelas vencidas e vincendas, acrescidas de juros de mora e correção monetária. 2. Não há que se falar em reconhecimento da procedência do pedido por parte da Administração. Veja-se quo o auxílio-alimentação foi implantado pelo INCRA, por meio de Resolução, em janeiro de 1986, sendo pago até dezembro de 1987, quando foi suprimido. Em outubro de 1991 o benefício voltou a ser concedido, através de Portaria. Verifica-se, desta forma, que o fundamento da concessão do benefício, nos dois períodos assinalados, é distinto. Não se trata de reconhecimento de que o mesmo era devido, mas sim de nova política da Administração em relação ao Plano de Cargos e Salários de seus servidores, mesmo porque o restabelecimento não teve efeito retroativo. 3. Igualmente, não há que se falar em direito adquirido ao pagamento do auxílio-alimentação, pois o mesmo, conforme exposto, não tinha previsão em lei, mas em mera resolução. Veja-se que somente com a edição da Lei nº 8.460/92 houve previsão legal de concessão do benefício aos servidores públicos civis do Poder Executivo. Tratava-se, até o

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advento da lei, de mera liberalidade, passível de supressão por outro ato administrativo, como ocorreu no caso concreto. 4. Impende ressaltar que a jurisprudência pacífica dos Tribunais Superiores é no sentido de que o auxílio-alimentação tem natureza de verba indenizatória, destinada a cobrir os custos de refeição, sendo devido exclusivamente ao servidor que se encontrar no exercício de suas funções, não se incorporando à remuneração. Conseqüentemente, não há que se invocar o princípio da irredutibilidade de vencimentos, pois é verba transitória, não sendo passível de incorporação. 5. Apelação improvida." (TRF-2 - AC: 200002010701444 RJ 2000.02.01.070144-4, Relator: Desembargador Federal GUILHERME CALMON NOGUEIRA DA GAMA, Data de Julgamento: 14/09/2009, SEXTA TURMA ESPECIALIZADA, Data de Publicação: DJU – Data: 29/09/2009 - Página: 148 -grifo nosso)

"ADMINISTRATIVO/CONSTITUCIONAL MANDADO DE

SEGURANÇA - AUXÍLIO-ALIMENTAÇÃO - SERVIDORES MILITARES - NOVA SISTEMÁTICA - LEI ESTADUAL Nº 5.856/99 - RUBRICA DEVIDA SOMENTE AOS SERVIDORES QUE RECEBEM VENCIMENTO MENOR DO QUE R$ 1.000,00 (UM MIL REAIS) - INEXISTÊNCIA DE AFRONTA AO PRINCÍPIO DA IRREDUTIBILIDADE DE VENCIMENTOS - VERBA DE NATUREZA INDENIZATÓRIA - PRECEDENTES DO TJES E DO STJ - SEGURANÇA DENEGADA. 1 - Independente do fato de o servidor ser civil ou militar, tem entendido esse E. Tribunal, assim como o STJ, no que se refere à alteração trazida pela Lei nº 5.856/99, que o auxílio-alimentação possui apenas caráter indenizatório e provisório, não se incorporando à remuneração do servidor, de sorte que a supressão do benefício, nos termos do art. 2º da mencionada Lei Estadual (para aqueles servidores cuja remuneração ultrapassa R$ 1.000,00) não viola o princípio constitucional da irredutibilidade, nem infringe o princípio da isonomia, a o estabelecer que somente façam jus à vantagem os servidores com remuneração inferior a R$ 1.000,00 (um mil reais). 2 - Segurança denegada." (TJ-ES - MS: 100050004678 ES

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100050004678, Relator: ÁLVARO MANOEL ROSINDO BOURGUIGNON, Data de Julgamento: 06/04/2006, TRIBUNAL PLENO, Data de Publicação: 02/05/2006)

"DIREITO ADMINISTRATIVO. MANDADO DE

SEGURANÇA. SERVIDOR PÚBLICO ESTADUAL. POLICIAL CIVIL. SUPRESSÃO DO AUXÍLIO ALIMENTAÇÃO (LEI ESTADUAL Nº 5859/99, ART. 2º). SUPRESSÃO. DIREITO ADQUIRIDO. INOCORRÊNCIA. NÃO INCORPORAÇÃO (CARÁTER INDENIZATÓRIO E PROVISÓRIO). INFRINGÊNCIA AO PRINCÍPIO DA IRREDUTIBILIDADE SALARIAL E PRINCÍPIO DA IGUALDADE. INOCORRÊNCIA. INEXISTÊNCIA DE DIREITO LÍQUIDO E CERTO. DENEGAÇÃO DA SEGURANÇA. 1. A suspensão do auxílio-alimentação da remuneração do percebida pelo servidor público não fere o princípio constitucional da irredutibilidade de salário em razão do seu caráter indenizatório e transitório, não se incorporando a remuneração do servidor público" (MS nº 100020001051, Pleno no TJES, j. 20/06/2002). 2. Não há que se falar em infringência ao princípio da irredutibilidade salarial, visto que, não houve redução ao vencimento base e, sim, a supressão, por via legal, do auxílio financeiro. 3 Não há inconstitucionalidade da lei nº 5.859/99, posto que, há compatibilidade da lei referida com a Constituição Federal. 4. Segurança denegada." (TJ-ES - MS: 00032706320058080000, Relator: ÁLVARO MANOEL ROSINDO BOURGUIGNON, Data de Julgamento: 01/02/2007, TRIBUNAL PLENO, Data de Publicação: 14/02/2007)

Sabe-se que no presente momento, o Brasil e a humanidade

enfrentam a pandemia do novo Coronavírus (COVID-19), já tendo sido declarada calamidade pública pelo Decreto Legislativo nº 6/2020 em nível nacional, o que exigirá da sociedade e do poder público vultosos esforços materiais e financeiros. Existem muitas despesas obrigatórias que a lei não permite suprimir, de modo que é natural que cortes recaiam sobre verbas indenizatórias, tais como alimentação e viagens.

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Embora não tenha sido trazido o teor da lei que se pretende aprovar, diz o consulente que a redução será temporária, até o fim do ano. Porém, recomenda-se que, além disso, haja uma diferenciação na redução do auxílio-alimentação entre os servidores que têm vencimentos maiores e os que têm vencimentos menores, porque a redução repentina para aqueles de menor poder aquisitivo terá um impacto maior.

Em vista de todo o exposto, concluímos que não ofende a

garantia de irredutibilidade de vencimento a redução temporária do valor do auxílio-alimentação. Todavia, recomenda-se que a redução da verba indenizatória seja tomada por faixas de vencimento, sendo maior para os servidores mais bem remunerados, e menor ou mesmo inexistente para os que tem vencimentos menores, haja vista o diferente impacto que causará na vida dos servidores.

É o parecer, s.m.j.

Gustavo da Costa Ferreira M. dos Santos

Consultor Técnico

Aprovo o parecer

Marcus Alonso Ribeiro Neves

Consultor Jurídico

Rio de Janeiro, 01 de junho de 2020.

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Parecer IBAM Nº 1209/2020

FM – Finanças Municipais, SM – Servidor Público. Agentes comunitários de saúde. Piso salarial previsto na Lei nº 11.350/2006. Lei Complementar nº 173/2020. Adequação. Possibilidade. Comentários.

CONSULTA:

A Prefeitura Municipal solicita deste Instituto análise e pronunciamento a respeito da Lei Complementar nº 173/2020, que cria o programa federativo de enfrentamento ao Coronavírus. Aduz o consulente que uma das condições para que municípios recebam ajuda financeira é a proibição de conceder vantagem, aumento, reajuste ou adequação de remuneração a servidores. A dúvida é se essa vedação também se aplica a pisos salariais como agente comunitário de saúde. Indaga, assim, se o Município estiver pagando abaixo do piso, se pode aumentar a remuneração ao piso, ou essa ação também está vedada pela lei.

A consulta não vem documentada.

RESPOSTA:

A Lei nº 12.994/2014 alterou a Lei nº 11.350/2006 para instituir piso salarial profissional nacional e diretrizes para o plano de carreira dos agentes comunitários de saúde e de combate a endemias. O novel art. 9º- A da lei, em atendimento ao art. 198, § 5º da Constituição Federal, fixa piso salarial para os agentes comunitários de saúde e combate a endemias, o qual deverá obrigatoriamente ser observado pelos demais entes da federação.

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Em razão do princípio da legalidade encartado no caput do art. 37 da CRFB, e da autonomia municipal para dispor sobre o regime de seus servidores (art. 18 c/c art. 30, I e 39, caput, da CRFB), a fixação ou majoração de vencimentos exige lei neste sentido. Assim, a implementação do piso salarial nacional dos agentes comunitários de saúde exige edição de lei pelo Chefe do Executivo. Ademais, o aumento remuneratório de agentes públicos implica aumento das despesas com pessoal, somente podendo ser realizado se: (i) houver prévia dotação orçamentária suficiente para atender às projeções de despesa com pessoal e aos acréscimos dela decorrentes; e (ii) se houver autorização específica na lei de diretrizes orçamentárias (art. 169, § 1º, I e II, da CRFB).

Importante para o deslinde da consulta é avaliar o que ocorre

caso decretado estado de calamidade pública pelo Município reconhecido pela Assembleia Legislativa, nos termos do art. 65 da LC nº 101/2000. Vejamos o que diz o dispositivo.

"Art. 65. Na ocorrência de calamidade pública

reconhecida pelo Congresso Nacional, no caso da União, ou pelas Assembléias Legislativas, na hipótese dos Estados e Municípios, enquanto perdurar a situação:

I - serão suspensas a contagem dos prazos e as

disposições estabelecidas nos arts. 23, 31 e 70;

II - serão dispensados o atingimento dos resultados

fiscais e a limitação de empenho prevista no art. 9º."

Também pertinente notar o acréscimo feito pela Lei

Complementar nº 173/2020 ao dispositivo:

"§ 1º Na ocorrência de calamidade pública reconhecida

pelo Congresso Nacional, nos termos de decreto legislativo, em parte ou na integralidade do território nacional e enquanto perdurar a situação, além do previsto nos incisos I e II do caput:

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I - serão dispensados os limites, condições e demais restrições aplicáveis à União, aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios, bem como sua verificação, para:

a) contratação e aditamento de operações de crédito;

b) concessão de garantias;

c) contratação entre entes da Federação; e

d) recebimento de transferências voluntárias;

II - serão dispensados os limites e afastadas as vedações

e sanções previstas e decorrentes dos arts. 35, 37 e 42, bem como será dispensado o cumprimento do disposto no parágrafo único do art. 8º desta Lei Complementar, desde que os recursos arrecadados sejam destinados ao combate à calamidade pública;

III - serão afastadas as condições e as vedações

previstas nos arts. 14, 16 e 17 desta Lei Complementar, desde que o incentivo ou benefício e a criação ou o aumento da despesa sejam destinados ao combate à calamidade pública.

§ 2º O disposto no § 1º deste artigo, observados os

termos estabelecidos no decreto legislativo que reconhecer o estado de calamidade pública:

I - aplicar-se-á exclusivamente:

a) às unidades da Federação atingidas e localizadas no

território em que for reconhecido o estado de calamidade pública pelo Congresso Nacional e enquanto perdurar o referido estado de calamidade;

b) aos atos de gestão orçamentária e

financeira necessários ao atendimento de despesas relacionadas ao

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cumprimento do decreto legislativo;

II - não afasta as disposições relativas a transparência,

controle e fiscalização.

§ 3º No caso de aditamento de operações de crédito

garantidas pela União com amparo no disposto no § 1º deste artigo, a garantia será mantida, não sendo necessária a alteração dos contratos de garantia e de contragarantia vigentes.” (NR)" (grifo nosso)

Observa-se, dessa forma, que a decretação de calamidade

pública reconhecida pelo Congresso Nacional, no âmbito da União, e pela Assembleia Legislativa do Estado-membro, no caso dos decretos emitidos pelos Municípios, dispensa o atingimento dos resultados fiscais e a limitação de empenho previstos no art. 9º, bem como para readequação aos limites da dívida (art. 31).

Quanto aos arts. 14, 16 e 17, da LC nº 101/2000, é de se

observar que em sede de Ação Direta de Inconstitucionalidade, o STF já tinha conferido interpretação conforme a Constituição para suspender, também os arts. 14, 16, 17 e 24 da LRF durante a emergência de saúde pública internacional provocada pelo Covid-19 (STF: ADI 6357 MC, Relator (a): Min. ALEXANDRE DE MORAES, julgado em 29/03/2020, publicado em PROCESSO ELETRÔNICO DJe-078 DIVULG 30/03/2020 PUBLIC 31/03/2020), de modo que a LC nº 173/2020 apenas fez sedimentar em lei o que já valia por decisão do STF. Importa especialmente colacionar o art. 16 da LRF:

"Art. 16. A criação, expansão ou aperfeiçoamento de

ação governamental que acarrete aumento da despesa será acompanhado de:

I - estimativa do impacto orçamentário-financeiro no

exercício em que deva entrar em vigor e nos dois subsequentes;

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II - declaração do ordenador da despesa de que o aumento tem adequação orçamentária e financeira com a lei orçamentária anual e compatibilidade com o plano plurianual e com a lei de diretrizes orçamentárias.

§ 1º. Para os fins desta Lei Complementar, considera-se:

I - adequada com a lei orçamentária anual, a despesa

objeto de dotação específica e suficiente, ou que esteja abrangida por crédito genérico, de forma que somadas todas as despesas da mesma espécie, realizadas e a realizar, previstas no programa de trabalho, não sejam ultrapassados os limites estabelecidos para o exercício;

II - compatível com o plano plurianual e a lei de diretrizes

orçamentárias, a despesa que se conforme com as diretrizes, objetivos, prioridades e metas previstos nesses instrumentos e não infrinja qualquer de suas disposições."

É bem verdade que o § 2º, I, "a" do Art. 65 diz que as

flexibilizações relacionadas ao art. 14, 16 e 17 da LC nº 101/2000 se aplicam às unidades da Federação atingidas e localizadas no território em que for reconhecido o estado de calamidade pública pelo Congresso Nacional e enquanto perdurar o referido estado de calamidade. Entretanto, o art. 11 da LC nº 95, que trata elaboração e redação das leis, diz em seu inciso III, "c" que os parágrafos enunciam aspectos complementares às normas enunciados no caput ou exceções à regra geral, de modo que, para fins de aplicação do art. 65, não se pode fazer da exigência de reconhecimento pela Assembleia Legislativa estadual da calamidade letra morta, como se não houvesse a disposição legal.

De qualquer modo, os agentes comunitários de saúde, via de

regra, atuam na linha de frente do enfrentamento à pandemia. Portanto, caso seus serviços sejam empregados em ações e serviços relacionados a esse tema, ficará eventual adequação ao piso remuneratório albergada pela exceção prevista no art. 65, § 1º, II, III, que se aplica à criação ou o

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aumento da despesa sejam destinados ao combate à calamidade pública.

Pois bem. Ultrapassado esse ponto, que pelas circunstâncias era

importante não deixar de comentar, cabe verificar, ainda, que o art. 8º, I, da LC nº 173/2020, como bem observado pelo consulente, veda a concessão, a qualquer título, de vantagem, aumento, reajuste ou adequação de remuneração a servidores e empregados públicos, exceto quando derivado de sentença judicial transitada em julgado ou de determinação legal anterior à calamidade pública.

É importante notar uma diferença entre o art. 65 e as restrições

do art. 8º da LC nº 173/2020, aplicáveis até 31 de dezembro de 2021. O art. 8º atrai para o seu campo de incidência todos os demais entes federativos afetados, independentemente destes terem decretado ou não estado de calamidade pública. Com efeito, é de se considerar que no mesmo dia 20/03/2020 em que foi editado o Decreto Legislativo nº 06/2020 que decretou calamidade pública em todo o território nacional, pela Portaria nº 454 do Ministério da Saúde foi declarado o estado de transmissão comunitária do novo Coronavírus (Covid-19).

Assim sendo, para fins de percepção do auxílio financeiro

advindo do Programa Federativo de Enfretamento ao Coronavírus SARS- CoV-2 (Covid-19) instituído pela LC nº 173/2020 e da incidência das restrições estabelecidas no artigo 8º do aludido diploma legal não há necessidade de decretação do estado de calamidade pela municipalidade.

As restrições do art. 8º da LC nº 173/2020, portanto, se aplicam

de imediato em todo território nacional. Isso porque se a finalidade das proibições encartadas no artigo 8º é estabelecer uma contrapartida dos demais entes federativos em face dos recursos financeiros que receberão da União, não faz sentido algum que este ou aquele Estado ou Município receba o socorro financeiro da União e esteja fora do âmbito de aplicação das proibições do artigo 8º. Pode-se afirmar que a LC nº 173/2020 encontra suporte na constituição não apenas no art. 165, § 9º, II, mas também no mencionado art. 24, parágrafo único, da CRFB, posto que é, antes de tudo, um diploma que traz regras de cooperação no espírito do

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federalismo fiscal, que envolve auxílios e contrapartidas.

Entretanto, a situação dos agentes comunitários de saúde, como

dito, é peculiar. Tratam-se de agentes públicos que atuam na linha de frente do enfrentamento da infecção viral. Veja-se a definição prevista em lei para as atribuições do agente comunitário de saúde:

"Art. 3º O Agente Comunitário de Saúde tem como

atribuição o exercício de atividades de prevenção de doenças e de promoção da saúde, a partir dos referenciais da Educação Popular em Saúde, mediante ações domiciliares ou comunitárias, individuais ou coletivas, desenvolvidas em conformidade com as diretrizes do SUS que normatizam a saúde preventiva e a atenção básica em saúde, com objetivo de ampliar o acesso da comunidade assistida às ações e aos serviços de informação, de saúde, de promoção social e de proteção da cidadania, sob supervisão do gestor municipal, distrital, estadual ou federal."

Assim é que o art. 8º, §§ 1º e 5º da LC nº 173/2020 estabelecem

o seguinte:

"Art. 8º. Na hipótese de que trata o art. 65 da Lei

Complementar nº 101, de 4 de maio de 2000, a União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios afetados pela calamidade pública decorrente da pandemia da Covid-19 ficam proibidos, até 31 de dezembro de 2021, de:

I - conceder, a qualquer título, vantagem, aumento,

reajuste ou adequação de remuneração a membros de Poder ou de órgão, servidores e empregados públicos e militares, exceto quando derivado de sentença judicial transitada em julgado ou de determinação legal anterior à calamidade pública;

II - criar cargo, emprego ou função que implique aumento

de despesa;

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(...)

IV - admitir ou contratar pessoal, a qualquer título,

ressalvadas as reposições de cargos de chefia, de direção e de assessoramento que não acarretem aumento de despesa, as reposições decorrentes de vacâncias de cargos efetivos ou vitalícios, as contratações temporárias de que trata o inciso IX do caput do art. 37 da Constituição Federal, as contratações de temporários para prestação de serviço militar e as contratações de alunos de órgãos de formação de militares;

V - realizar concurso público, exceto para as reposições

de vacâncias previstas no inciso IV;

VI - criar ou majorar auxílios, vantagens, bônus, abonos,

verbas de representação ou benefícios de qualquer natureza, inclusive os de cunho indenizatório, em favor de membros de Poder, do Ministério Público ou da Defensoria Pública e de servidores e empregados públicos e militares, ou ainda de seus dependentes, exceto quando derivado de sentença judicial transitada em julgado ou de determinação legal anterior à calamidade;

VII - criar despesa obrigatória de caráter continuado,

ressalvado o disposto nos §§ 1º e 2º;

VIII - adotar medida que implique reajuste de despesa

obrigatória acima da variação da inflação medida pelo Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA), observada a preservação do poder aquisitivo referida no inciso IV do caput do art. 7º da Constituição Federal;

(...)

§ 1º O disposto nos incisos II, IV, VII e VIII do caput deste

artigo não se aplica a medidas de combate à calamidade pública

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referida no caput cuja vigência e efeitos não ultrapassem a sua duração. (grifo nosso)

(...)

§ 5º O disposto no inciso VI do caput deste artigo não se

aplica aos profissionais de saúde e de assistência social, desde que relacionado a medidas de combate à calamidade pública referida no caput cuja vigência e efeitos não ultrapassem a sua duração."

É bem verdade que não se excepcionou a vedação ao aumento

de remuneração de pessoal da saúde previsto no inciso I do art. 8º. No entanto, para os profissionais de saúde está excepcionado o inciso VI, que permite "criar ou majorar auxílios, vantagens, bônus, abonos, verbas de

representação ou benefícios de qualquer natureza, inclusive os de cunho

indenizatório".

É cediço que, para se aplicar a lei, o intérprete ou mais

precisamente o administrador não pode ficar adstrito ao sentido literal de apenas um dos dispositivos que pretende interpretar. A tarefa de interpretar adequadamente, além de esforço intelectual, exige que se faça uma interpretação teleológica e sistemática do conteúdo e propósito das normas.

O método teleológico ou finalístico refere-se à interpretação pela

busca da finalidade ou do espírito da lei, procura revelar o valor ou bem jurídico visado pelo ordenamento com a edição de dado preceito, conforme leciona Luís Roberto Barroso (In: Barroso, Luís Roberto. Interpretação e aplicação da Constituição: fundamentos de uma dogmática constitucional transformadora. 5ª. Edição. São Paulo: Saraiva, p. 138).

Já Paulo Nader, ao discorrer acerca do método sistemático aduz que "(...) o ordenamento jurídico compõe-se de todos os atos legislativos

vigentes, bem como das normas costumeiras válidas, que mantêm entre si

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perfeita conexão. Entre as diferentes fontes normativas, não pode haver

contradições. De igual modo, deve haver completa harmonia entre os

dispositivos de uma lei, a fim de que haja unicidade no sistema jurídico, ou

seja, uma única voz de comando (...)". Por fim, arremata: "(...) se as

diferentes fontes formais do Direito possuem conexão entre si, a

interpretação não pode ter por objeto dispositivos ou textos isolados. O

trabalho de exegese tem de ser feito considerando-se todo o acervo

normativo ligado a um assunto." (NADER, Paulo. Introdução ao estudo do direito. Rio de Janeiro: Forense, 2002. Pag. 270)

Ora, como já afirmado, as restrições previstas no art. 8º têm como

finalidade impor contrapartidas aos entes da federação a fim de prevenir riscos que possam afetar o equilíbrio das contas num momento de excepcional depressão econômica, aliados à concessão de auxílio- financeiro a esses mesmos entes federativos — auxílio-financeiro este a cargo da União. Em qual contexto? Num contexto de uma crise sanitária cujos protagonistas são os servidores que atuam na área da saúde e da assistência social.

O piso salarial é fixado por meio de lei de competência da União

(Lei nº 11.350/2006). Ora, é absurdo supor que a União, caso venha a aumentar o piso salarial dos agentes comunitários de saúde no decurso da pandemia, repute inválida a adequação a esse piso por meio de um aumento, posto que é ela própria o ente que concede o auxílio-financeiro, tendo sido a LC nº 173/2020 baixada pelo Congresso Nacional, com sanção do Poder Executivo. Por outro lado, caso o Município já venha pagando um valor abaixo do piso salarial dos agentes comunitários de saúde, a adequação ao piso encontrará supedâneo no próprio art. 8º, inciso I, que admite o aumento do valor da remuneração derivado de "determinação legal anterior à calamidade pública".

Ademais, já se encontra excepcionada a concessão de "auxílios,

vantagens, bônus, abonos, verbas de representação ou benefícios de

qualquer natureza, inclusive os de cunho indenizatório" para profissionais de saúde. Por que não haveria de estar excepcionado, também, um aumento de remuneração com a único e exclusivo fim de adequação ao

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piso remuneratório fixado pela própria União? Data maxima venia, não haver referência a essa possibilidade parece apenas um pequeno deslize do legislador.

Em vista de todo o exposto, concluímos que é viável a

adequação da remuneração dos agentes comunitários de saúde ao piso remuneratório previsto na Lei nº 11.350/2006 na vigência da Lei Complementar nº 173/2020, seja em razão de determinação legal anterior à calamidade pública, caso a remuneração se encontre defasada, seja em razão de possível aumento do piso por iniciativa da própria União no decurso da pandemia.

É o parecer, s.m.j.

Gustavo da Costa Ferreira M. dos Santos

Consultor Técnico

Aprovo o parecer

Marcus Alonso Ribeiro Neves

Consultor Jurídico

Rio de Janeiro, 02 de junho de 2020.

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Parecer IBAM Nº 1210/2020

FM – Finanças Municipais, SM – Servidor Público. Lei Complementar nº 173/2020. Questionamentos diversos.

CONSULTA:

A Câmara Municipal solicita análise e pronunciamento deste

Instituto a respeito da Lei Complementar 173, de 27 de maio de 2020. Aduz o consulente que, embora seja extremamente recente, a lei em comento já suscita dúvidas quanto à sua aplicabilidade, razão pela qual se fazem os questionamentos que abaixo seguem.

1) O art. 8º, I veda a concessão, a qualquer título, de vantagem,

aumento, reajustes ou adequação de remuneração a membros de Poder ou de órgão, servidores e empregados públicos e militares, exceto quando derivado de sentença judicial transitada em julgado ou de determinação legal anterior à calamidade pública. Por sua vez o art. 8º, VI veda a criação ou majorar auxílios, vantagens, bônus, abonos, verbas de representação ou benefícios de qualquer natureza, inclusive os de cunho indenizatório, em favor de membros de Poder, do Ministério Público ou da Defensoria Pública e de servidores e empregados públicos e militares, ou ainda de seus dependentes, exceto quando derivado de sentença judicial transitada em julgado ou de determinação legal anterior à calamidade.

A respeito do dispositivo, questiona-se:

i) É vedada a promoção de servidores em razão de plano de

carreira em que são analisados desempenho, titulação e tempo? ii) É vedada a concessão de gratificação propter laborem prevista

em atos legislativos anteriores a servidores que até então não recebiam?

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2) O art. 8º, IV veda a admissão ou contratação de pessoal a qualquer título, ressalvadas as reposições de cargos de chefia, de direção e de assessoramento que não acarretem aumento de despesa, as reposições decorrentes de vacâncias de cargos efetivos ou vitalícios, as contratações temporárias de que trata o inciso IX do caput do art. 37 da Constituição Federal, as contratações de temporários para prestação de serviço militar e as contratações de alunos de órgãos de formação de militares.

A respeito do dispositivo, questiona-se:

i) É vedado o preenchimento de cargos de assessoramento que

estejam vagos no momento da publicação da Lei Complementar 173/2020, uma vez que se pressupõe um aumento da despesa se considerado que o cargo já existente estava vago no momento da publicação da norma?

ii) É vedado o preenchimento de cargos efetivos que estejam vagos no momento da publicação da Lei Complementar 173/2020, uma vez que se pressupõe um aumento da despesa se considerado que o cargo já existente estava vago no momento da publicação da norma?

3) O art. 8º, IV e V vedam a realização de concurso público,

exceto para as reposições de vacâncias previstas no inciso IV, e a admissão ou contratação de pessoal a qualquer título, ressalvadas as reposições de cargos de chefia, de direção e de assessoramento que não acarretem aumento de despesa, as reposições decorrentes de vacâncias de cargos efetivos ou vitalícios, as contratações temporárias de que trata o inciso IX do caput do art. 37 da Constituição Federal, as contratações de temporários para prestação de serviço militar e as contratações de alunos de órgãos de formação de militares.

A respeito dos dispositivos, questiona-se:

i) Está vedada a realização de concurso público para o

preenchimento de vagas de estagiários? ii) Estão vedadas as reposições de estagiários?

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4) O art. 10 suspendeu os prazos de validade dos concursos públicos já homologados na data da publicação do Decreto Legislativo nº 6, de 20 de março de 2020, em todo o território nacional, até o término da vigência do estado de calamidade pública estabelecido pela União. Por outro lado, foi vetado o § 1º - cuja redação tratava da suspensão dos concursos públicos federais, estaduais, municipais e distritais já homologados.

A respeito do dispositivo, questiona-se:

i) Estão suspensos os prazos dos concursos já realizados em

âmbito municipal? A dúvida é derivada do fato de que o "caput" determina a suspensão dos concursos, mas o parágrafo vetado versava sobre os concursos dos 3 entes da federação.

A consulta não vem documentada.

RESPOSTA:

A rápida expansão da pandemia do novo Coronavírus

(COVID-19) impôs sérias restrições ao nosso modo de vida, sendo certo que as recomendações de distanciamento social e de quarentena geram uma redução substancial da circulação de pessoas, que levam, por sua vez, a impactos sensíveis nas mais diversas áreas da sociedade e, por conseguinte, à necessidade de organização da Administração Pública para atendimento das demandas e manutenção do bem comum.

Diante do acelerado avanço da doença no Brasil e dos múltiplos

desdobramentos no campo da saúde e da economia, ao longo deste ano de 2020, os poderes Executivo, Legislativo e Judiciário têm adotado, proposto ou sugerido medidas, providências ou ordens, de conteúdos diversos, para instrumentalizar o Poder Público e a sociedade em geral com os meios que se reputam oportunos e necessários para enfrentamento da crise.

Normas e decisões recentes, tais como a Lei nº 13.979/2020,

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tomadas já na vigência do atual e inédito estado de calamidade, evidenciam esse cenário, no qual União, Estados, Distrito Federal e Municípios têm anunciado medidas importantes para assegurar o funcionamento do Estado e eficiência no enfrentamento do Coronavírus.

Sabe-se, ainda, que não é apenas sobre a saúde da população

que a propagação da infecção viral causa graves consequências. Também a desaceleração da economia repercute negativamente sobre a renda das famílias e provoca a retração da produção de bens e serviços, ao passo que a queda da arrecadação impõe um desafio na gestão fiscal, haja vista, principalmente, as despesas obrigatórias cuja diminuição encontra obstáculos.

Nesse passo, cabe observar que o Município é entidade da

federação com autonomia política nos termos do art. 18 da Constituição da República. Assim é que, conforme o art. 30, inciso III, cabe-lhe instituir e arrecadar os tributos de sua competência, bem como aplicar suas rendas. No entanto, é sempre pertinente a lição de Hely Lopes Meirelles:

“A autonomia não é poder originário. É prerrogativa

política concedida e limitada pela Constituição Federal. Tanto os Estados-membros como os Municípios têm a sua autonomia garantida constitucionalmente, não como um poder de autogoverno decorrente da Soberania Nacional, mas como um direito público subjetivo de organizar o seu governo e prover a sua administração, nos limites que a Lei Maior lhes traça” (MEIRELLES, Hely Lopes. Direito Municipal Brasileiro, São Paulo: Malheiros, 2008, p. 91)

É nesse espírito que a Constituição estabelece diversas

competências materiais e legislativas comuns e concorrentes da União, Estados e Municípios que não se superpõem, mas que devem ser exercidas em harmonia, sem que uma entidade da federação exorbite de suas atribuições para se imiscuir em assuntos próprios de outras.

No sistema federativo, as leis complementares têm entre

suas funções organizar e estatuir parâmetros e critérios para a atuação

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interfederativa, a teor do que diz o art. 24, parágrafo único da CRFB, com redação dada pela Emenda Constitucional nº 53/2006, cabendo-lhes fixar normas de cooperação, tendo em vista o equilíbrio do desenvolvimento e do bem-estar em âmbito nacional.

Especificamente no âmbito do direito financeiro, a Constituição

da República estabelece no art. 165, § 9º, I, que cabe a lei complementar dispor sobre o exercício financeiro, a vigência, os prazos, a elaboração e a organização do Plano Plurianual, da Lei de Diretrizes Orçamentárias e da LOA. A Lei Complementar de que trata o aludido dispositivo constitucional ainda não foi editada, sendo atualmente o diploma legal que trata do assunto a Lei nº 4.320/1964, ainda que de forma incompleta, recepcionada na ordem constitucional pós-1988 como se lei complementar fosse.

Por outro lado, o inciso II do mesmo art. 165, § 9, II, estabelece

que cabe a lei complementar estabelecer normas de gestão, financeira e patrimonial da administração direta e indireta bem como condições para a instituição e funcionamento de fundos. Nesse espírito foi editada a Lei Complementar nº 101/2000 (Lei de Responsabilidade Fiscal - LRF), que tem como finalidade primordial a ação planejada e transparente na gestão das finanças públicas, a fim de que se previnam riscos e se corrijam desvios que possam afetar o equilíbrio das contas. As normas ali elencadas, que se aplicam a todos os entes da federação e encontram supedâneo nos dispositivos constitucionais mencionados, encartam o fenômeno cognominado Federalismo Fiscal.

Desde a sua edição, houve grandes discussões quanto aos

parâmetros e limites do pacto federativo, arguindo-se que a LRF o violaria ao impor restrições na aplicação de rendas dos demais entes federativos, havendo inúmeras ações diretas de inconstitucionalidade e uma arguição de descumprimento de preceito fundamental com esse objeto (ADI 2241, ADI 2238, ADI 2250, ADI 2256, ADI 2261, ADI 2324, ADI 2365, ADPF 24). O argumento de violação ao pacto federativo foi descontruído, convindo trazer excerto da decisão no julgamento conjunto das referidas ações, noticiado no Informativo nº 948 do STF:

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"O Federalismo Fiscal se dedicou a produzir modelos explicativos das interações estratégicas ocorridas na relação entre os entes federados, analisando os incentivos que determinariam as condutas dos diferentes níveis de governo. Ao lidar com essa plataforma de análise, pautados na lógica da ação coletiva, esses trabalhos lograram identificar diversos efeitos negativos (externalidades) que o comportamento individualista dos entes governamentais poderia produzir para o conjunto da federação.

Um dos tipos de interação mais destrutiva ocorre quando

decisões a respeito dos gastos públicos de um ente local são tomadas na esperança de que as suas consequências econômico financeiras sejam posteriormente absorvidas por um nível central de governo, geralmente por meio de ações de resgate. Esse tipo de comportamento é visto como fonte de sérios riscos para o equilíbrio federativo, pois compromete a autonomia financeira recíproca.

As decisões a respeito de gastos públicos, quando

percebidas numa visão agregada, não são isentas de consequências para o conjunto do Estado. Muito pelo contrário, elas podem produzir efeitos sistêmicos bastante prejudiciais ao equilíbrio federativo, exercendo pressões negativas sobre a condução de políticas intituladas por entes federativos distintos, além de potencializar assimetrias já existentes e prejudicar o sistema econômico nacional.

Foi exatamente o que foi observado no Brasil pouco

tempo depois da promulgação da CF/1988, quando a federação brasileira havia sido recentemente capitalizada por preceitos de descentralização. Isso porque, no início da década de 90, em que a inflação era exponencial, os entes federativos trabalhavam com uma dinâmica de ilusão monetária, em que os impactos fiscais das suas decisões eram artificialmente suavizados pela deterioração de valor que a inflação exercia na moeda até o momento da efetiva realização dos gastos. Com a estabilização econômica, lograda

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pelos êxitos do Plano Real, sucedeu fenômeno que eliminou o hiato antes existente entre os termos nominais e reais das decisões orçamentárias.

No decorrer dos anos 80 e no início dos anos 90, a

ausência de governança na gestão fiscal de vários entes da Federação consubstanciava uma das vertentes do desequilíbrio fiscal brasileiro. Nesse período, as receitas advindas da realidade inflacionária constituíam fonte adicional de recursos para o financiamento de despesas e, consequentemente, ocultavam a verdadeira situação fiscal dos entes federativos.

Depois de 1994, em decorrência da estabilização de

preços obtida por meio do Plano Real, ocorreu um esgotamento das receitas com imposto inflacionário e, por conseguinte, a situação fiscal dos entes subnacionais passou a se deteriorar rapidamente.

Nesse contexto, os desequilíbrios fiscais estruturais dos

entes federativos não podiam mais ser escondidos ou negligenciados. Os déficits estruturais ocultos foram explicitados e as dívidas dos entes subnacionais ganharam contornos explosivos. Tornou-se então premente a necessidade de equacionar os passivos dos entes subnacionais, com imposição simultânea de uma nova forma de governança para a gestão financeira e orçamentária desses entes e a edição legislativa de medidas de macroeconomia destinadas à manutenção do equilíbrio fiscal e monetário do País, logicamente de competência da União. Isso porque patente o interesse geral dessa fórmula legislativa de gestão responsável das finanças públicas.

A LRF foi elaborada exatamente nessa conjuntura, como

parte de um esforço de harmonização fiscal idealizado pelo governo central. Instituiu um inovador modelo regulatório das finanças públicas, baseado em medidas gerais de transparência, de programação orçamentária, de controle e de acompanhamento

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da execução de despesas e de avaliação de resultados, destinadas, entre outras coisas, a incrementar a prudência na gestão fiscal e a sincronizar as decisões tomadas pelos Estados e pelos Municípios com os objetivos macroeconômicos estabelecidos nacionalmente." (cf. http:// www.stf.jus.br/arquivo/informativo/documento/informativo948.htm#Lei de Responsabilidade Fiscal: Federalismo e separação de poderes )

Mais que nunca, diante das relevantes repercussões da

calamidade que vivenciamos, urge a harmonização fiscal e cooperação interfederativa para que se amenizem os efeitos da crise econômica. Foi nesse contexto que foi editada a Lei Complementar nº 173/2020, diante da premente necessidade de contenção dos gastos para promoção de um esforço conjunto para superação dos efeitos deletérios sobre a economia, nomeadamente sobre a arrecadação.

Não se trata, apenas, de uma lei que visou a impor restrições na

execução orçamentária, na realização de gastos públicos e aumentos a servidores. Ela se trata, como já aponta sua ementa, de um Programa Federativo de Enfrentamento ao Coronavírus, que envolve auxílio financeiro da União aos Estados e Municípios acompanhados de contrapartidas. A LC nº 173/2020 tem supedâneo, assim, na competência da União prevista no art. 24, parágrafo único e no art. 169, § 9º, da CRFB, visando à gestão responsável das finanças públicas de aplicabilidade a todas as esferas da federação, bem como a situação de excepcional limitação causada pela crise econômica em curso.

A partir dessas considerações gerais, passamos a responder

objetivamente aos questionamentos formulados:

1) O art. 8º, I veda a concessão, a qualquer título, de vantagem,

aumento, reajustes ou adequação de remuneração a membros de Poder ou de órgão, servidores e empregados públicos e militares, exceto quando derivado de sentença judicial transitada em julgado ou de determinação legal anterior à calamidade pública. Por sua vez o art. 8º, VI veda a criação

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ou majorar auxílios, vantagens, bônus, abonos, verbas de representação ou benefícios de qualquer natureza, inclusive os de cunho indenizatório, em favor de membros de Poder, do Ministério Público ou da Defensoria Pública e de servidores e empregados públicos e militares, ou ainda de seus dependentes, exceto quando derivado de sentença judicial transitada em julgado ou de determinação legal anterior à calamidade.

A respeito do dispositivo, questiona-se:

i) É vedada a promoção de servidores em razão de plano de

carreira em que são analisados desempenho, titulação e tempo?

RESPOSTA: O art. 8º, I, da LC nº 173/2020, ao vedar a

concessão, a qualquer título, de vantagem, aumento, reajustes ou adequação de remuneração dos servidores, excepciona aquelas que decorram de determinação legal anterior à calamidade pública.

Quando se fala em promoção, refere-se a disposições

relacionadas à evolução funcional previstas no plano de cargos e carreiras. Supõe-se, portanto, que se tratam justamente de determinações legais anteriores à calamidade pública, uma vez que a lei que cria os critérios e parâmetros de promoção e progressão funcional já estava em vigor antes da pandemia.

Importa notar, também, que o próprio art. 8º, no inciso III, veda a

alteração da estrutura de carreira que implique aumento de despesa. A

contrário sensu, a estrutura de carreiras já prevista em lei anterior à calamidade continua em vigor e tem aplicabilidade, estando albergada pela exceção expressa prevista no dispositivo.

No entanto, cabe salientar que não se tratando a promoção

funcional de medida destinada especificamente ao combate à calamidade pública, mas fato funcional relacionado à organização dos cargos e carreiras, deve sua concretização condicionar-se ao atendimento do disposto nos arts. 16 e 17 da LC nº 101/2001, por não se enquadrar no permissivo do art. 65, § 1º III da LC nº 101/2000, com redação dada pela

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LC nº 173/2020.

Outra limitação importante é que o gasto global com a folha de

pagamento não pode ser majorado acima do IPCA, conforme determina o art. 8º, VIII, da LC nº 173/2020, até o dia 31 de dezembro de 2021. Na prática, o dispositivo acabará por restringir bastante as promoções, que apenas se viabilização caso haja, concomitantemente, redução na despesa de pessoal que permitam o cumprimento do disposto no art. 8º, VIII, da LC nº 173/2020.

ii) É vedada a concessão de gratificação propter laborem prevista

em atos legislativos anteriores a servidores que até então não recebiam?

RESPOSTA: Tendo em vista a autonomia do Município para

disciplinar o regime jurídico dos seus servidores (art. 39, caput, da CRFB), a nomenclatura dos acréscimos pecuniários varia de um ente federativo para o outro. De modo geral, quando se fala em "gratificação propter

laborem", refere-se a gratificações atribuídas a servidores que desempenham atribuições as quais, ainda que relacionadas às funções do cargo, são atípicas. Tratam-se, por exemplo, de gratificações pela função de pregoeiro, da participação em comissões disciplinares e de licitação, da participação em bancas de concurso ou em grupos de trabalho, etc.

Nessas hipóteses, caso estejam as gratificações previstas em lei

editadas antes da calamidade pública, compreendem-se enquadradas no permissivo do art. 8º, I, da LC nº 173/2020. No entanto, não basta que estejam previstas em lei. Seu pagamento deve encontrar previsão na Lei Orçamentária Anual e compatibilidade com a Lei de Diretrizes Orçamentárias, e sua concessão não pode acarretar aumento de despesas.

2) O art. 8º, IV veda a admissão ou contratação de pessoal a

qualquer título, ressalvadas as reposições de cargos de chefia, de direção e de assessoramento que não acarretem aumento de despesa, as reposições decorrentes de vacâncias de cargos efetivos ou vitalícios, as contratações temporárias de que trata o inciso IX do caput do art. 37 da

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Constituição Federal, as contratações de temporários para prestação de serviço militar e as contratações de alunos de órgãos de formação de militares.

A respeito do dispositivo, questiona-se:

i) É vedado o preenchimento de cargos de assessoramento que

estejam vagos no momento da publicação da Lei Complementar 173/2020, uma vez que se pressupõe um aumento da despesa se considerado que o cargo já existente estava vago no momento da publicação da norma?

RESPOSTA: O art. 8º, IV, da LC nº 173/2020 reputa válida a

reposição de cargos de direção, chefia e assessoramento que não acarretem aumento de despesa. Isso significa que, vagando um cargo em comissão durante a vigência das restrições previstas no art. 8º, outra pessoa poderá ser nele investido desde que aufira iguais ou menores vencimentos.

Logo em seguida, o mesmo dispositivo fala que é viável a

reposição decorrente de vacâncias de cargos efetivos ou vitalícios. Porém, quando menciona os cargos de direção, chefia ou assessoramento, fala apenas em "reposição", sem mencionar vacâncias. Assim, o cargo de direção, chefia ou assessoramento que estava vago antes da promulgação e entrada em vigor da LC nº 173/2020 não pode ser preenchido.

A lei, como se sabe, não tem palavras inúteis. Se a lei buscasse

conferir o mesmo tratamento aos cargos em comissão e aos cargos efetivos e vitalícios, mencionaria reposição de vacâncias em ambos os casos. Porém não o fez. Assim, consideramos que não há segurança jurídica em se preencher cargos em comissão que se encontravam vagos no momento da entrada em vigor da LC nº 173/2020.

ii) É vedado o preenchimento de cargos efetivos que estejam

vagos no momento da publicação da Lei Complementar 173/2020, uma vez que se pressupõe um aumento da despesa se considerado que o cargo já existente estava vago no momento da publicação da norma?

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RESPOSTA: A resposta a esse questionamento já foi um tanto adiantada no item anterior. Ora, diz o dispositivo que, como exceção, é admitida a reposição de vacâncias de cargos efetivos e vitalícios. Vale registrar que existe previsão similar no art. 22, IV do parágrafo único do art. 22 da LRF, a qual, assim como nos incisos IV e V do art. 8º da LC nº 173/2020, materializam o resultado de uma prévia ponderação realizada pelo legislador (também conhecida como ponderação preventiva ou abstrata) entre, o princípio do equilíbrio fiscal, de um lado, e direitos fundamentais, do princípio da eficiência e da necessária continuidade dos serviços públicos.

Acrescentamos que, independentemente destas considerações,

há sempre de se observar o princípio da razoabilidade e da proporcionalidade, cabendo ao administrador público justificar motivadamente a necessidade de preenchimento das vagas à luz do princípio da eficiência e do interesse público envolvido, mormente nas hipóteses em que a vacância subsiste por longo lapso de tempo.

Isto porque, não é dado ao Administrador, sob pena de burla as

restrições impostas pela lei, desenterrar vacâncias ocorridas há anos, sob o argumento de que somente agora vislumbrou-se a necessidade de reposição da vacância. Certamente, práticas como essas hão de ser alvo dos órgãos de controle e para conferir maior segurança jurídica deve o intérprete lançar mão das balizas fornecidas na Lei de Introdução as normas do Direito Brasileiro, mormente aquela constante do seu artigo 22, que orienta que "na interpretação de normas sobre gestão pública, serão

considerados os obstáculos e as dificuldades reais do gestor e as exigências

das políticas públicas a seu cargo, sem prejuízo dos direitos dos

administrados".

Nesse sentido quer nos parecer que a interpretação mais segura

e ponderada aponta no sentido de que não existem óbices para nomeações de servidores para cargos efetivos ou vitalícios: (i) para repor vacâncias ocorridas após a entrada em vigor da LC nº 173/2020; (ii) para repor vacâncias ocorridas antes da entrada em vigor da LC nº 173/2020, desde que os respectivos concursos públicos já tenham sido

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homologados, antes ou após 06 de março de 2020 e (iii) para repor vacâncias ocorridas antes da entrada em vigor da LC nº 173/2020, desde que já tenha sido dado início à fase externa do certame com a publicação do respectivo edital de concurso público.

Isso porque é de se considerar que tanto na situação descrita nos

pontos (ii) e (iii) referidos no parágrafo anterior, houve, previamente à edição da norma restritiva, reconhecimento expresso e inequívoco da Administração Pública acerca da necessidade de reposição da vacância. Milita, nesses casos, presunção relativa - até prova em contrário - que tais reposições são necessárias à luz do princípio da eficiência e do interesse público envolvido.

Quanto aos demais casos, quais sejam, de vacâncias ocorridas

antes da entrada em vigor da LC nº 173/2020, e que até então as respectivas vagas não foram colocadas em disputa, milita presunção relativa em sentido contrário, ou seja, até prova em contrário, a presunção é de desnecessidade do preenchimento das respectivas vagas, razão pela qual caberá ao administrador fundamentar de forma motivada e inequívoca, sempre havendo o risco de glosa pelos órgãos de controle.

3) O art. 8º, IV e V vedam a realização de concurso público, exceto

para as reposições de vacâncias previstas no inciso IV, e a admissão ou contratação de pessoal a qualquer título, ressalvadas as reposições de cargos de chefia, de direção e de assessoramento que não acarretem aumento de despesa, as reposições decorrentes de vacâncias de cargos efetivos ou vitalícios, as contratações temporárias de que trata o inciso IX do caput do art. 37 da Constituição Federal, as contratações de temporários para prestação de serviço militar e as contratações de alunos de órgãos de formação de militares.

A respeito dos dispositivos, questiona-se:

i) Está vedada a realização de concurso público para o

preenchimento de vagas de estagiários?

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RESPOSTA: Em primeiro lugar, cabe observar que o estagiário não preenche "vaga" e tampouco participa de concurso público. O estágio de estudantes encontra previsão na Lei Federal nº 11.788, de 25 de setembro de 2008, que define o estágio como "ato educativo escolar

supervisionado, desenvolvido no ambiente de trabalho, que visa à

preparação para o trabalho produtivo de educandos que estejam

frequentando o ensino regular em instituições de educação superior, de

educação profissional, de ensino médio, da educação especial e dos anos

finais do ensino fundamental, na modalidade profissional da educação de

jovens e adultos".

O estágio faz parte de projeto pedagógico do curso, a fim de

permitir ao educando tomar contato com as competências próprias da atividade profissional e com a aplicação prática do conteúdo curricular. Poderá ser obrigatório ou não, a depender das diretrizes curriculares da etapa, modalidade e área de ensino e do projeto pedagógico do curso.

A formalização da oferta e admissão de estagiários, tanto no

setor público, quanto na iniciativa privada, deve obedecer aos procedimentos da Lei nº 11.788, de 2008, que prevê, entre outros requisitos arrolados no art. 3º, a "celebração de termo de compromisso

entre o educando, a parte concedente do estágio e a instituição de ensino" (inc. II). Ainda segundo o art. 8º, é facultada a celebração de convênio entre as instituições de ensino e entes públicos ou privados para o oferecimento de estágio, instrumento que, no entanto, não substitui o termo de compromisso.

Cabe evidenciar que o estágio curricular não cria vínculo

empregatício de qualquer natureza entre o estudante e o Poder Público (art. 3° da Lei Federal n° 11.788/2008). Sendo assim, verifica-se que os estagiários não estão submetidos à legislação trabalhista federal, e tampouco ocupam cargos públicos, de modo que o Plano de Carreiras do Magistério não se aplica a eles. Nos estágios existe a relação de trabalho, mas não de emprego, uma vez que o seu fim principal não é a prestação laboral para o empregador e a remuneração para o estagiário, mas sim o aprendizado de competências próprias da atividade profissional e a

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contextualização curricular, objetivando o desenvolvimento do educando para a vida cidadã e para o trabalho. Portanto, a realização de estágio não se confunde com o exercício de cargo ou emprego público.

É recomendável, em nome do princípio da moralidade e da

impessoalidade (art. 37, caput, da CRFB), que os estagiários submetam- se a processo de seleção, o qual, no entanto, não se confunde com um concurso público. De qualquer forma, a contratação de estagiários é despesa obrigatória de caráter continuado que não pode ser majorada acima do IPCA, conforme determina o art. 8º, VIII, da LC nº 173/2020. Com efeito, o pagamento dos estagiários é obrigação de trato sucessivo que se prolonga por até 2 (dois) anos, nos termos da Lei nº 11.788/2008.

ii) Estão vedadas as reposições de estagiários?

RESPOSTA: Não. O que é impedido é que o gasto global com

contratações de estagiários tenha variação acima do IPCA. Pode-se, até mesmo, aumentar o número de estagiários, caso haja redução na bolsa individual.

4) O art. 10 suspendeu os prazos de validade dos concursos

públicos já homologados na data da publicação do Decreto Legislativo nº 6, de 20 de março de 2020, em todo o território nacional, até o término da vigência do estado de calamidade pública estabelecido pela União. Por outro lado, foi vetado o § 1º - cuja redação tratava da suspensão dos concursos públicos federais, estaduais, municipais e distritais já homologados.

A respeito do dispositivo, questiona-se:

i) Estão suspensos os prazos dos concursos já realizados em

âmbito municipal? A dúvida é derivada do fato de que o "caput" determina a suspensão dos concursos, mas o parágrafo vetado versava sobre os concursos dos 3 entes da federação.

RESPOSTA: O veto ao dispositivo causou alguma perplexidade,

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em vista da amplitude do caput. No entanto, considerando as motivações do veto ao dispositivo, que estendia a suspensão dos concursos aos Estados e Municípios, a melhor interpretação é que o art. 10, caput, é uma norma federal, e não nacional, aplicando-se apenas na esfera da União. De qualquer modo, considerando as grandes restrições que haverá para admissões de pessoal até o dia 31 de dezembro de 2021, fora de dúvida que poderão os Estados e os Municípios, editar lei para suspender o prazo de validade dos concursos nas respectivas esferas.

É o parecer, s.m.j.

Gustavo da Costa Ferreira M. dos Santos

Consultor Técnico

Aprovo o parecer

Marcus Alonso Ribeiro Neves

Consultor Jurídico

Rio de Janeiro, 02 de junho de 2020.

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Parecer IBAM Nº 1212/2020

SM – Servidor Público. LC nº 173/2020. Mudança de classe. Concessão de adicionais por tempo de serviço. Suspensão do cômputo do lapso temporal. Considerações.

CONSULTA:

Tendo em vista o advento da LC nº 173/2020, indaga o consulente:

"a) A concessão de mudança de classe, em um caso

hipotético, teria direito a partir de 18/06/2020, mudaria para a classe C, está suspensa com base nesse inciso?

b) A contagem de tempo de serviço para triênio e

mudança de classe fica suspensa até 31/12/2021, recomeçando do zero em 01/01/2022, ou o tempo continua sendo contado normalmente para fins dessas mudanças, sendo suspenso apenas o pagamento? "

A consulta vem acompanhada do Plano de Cargos e Carreiras da

Câmara Municipal.

RESPOSTA:

Inicialmente, como sabido, a rápida expansão da pandemia do Novo Coronavírus (COVID-19) impôs sérias restrições ao nosso modo de vida, sendo certo que as recomendações de distanciamento social e de quarentena geram uma redução substancial da circulação de pessoas, que levam, por sua vez, a impactos sensíveis nas mais diversas áreas da

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sociedade e, por conseguinte, a necessidade de organização da Administração Pública para atendimento das demandas e manutenção do bem comum.

Diante do acelerado avanço da doença no Brasil e dos múltiplos

desdobramentos no campo da saúde e da economia, ao longo deste ano de 2020, os poderes Executivo, Legislativo e Judiciário têm adotado, proposto ou sugerido medidas, providências ou ordens, de conteúdos diversos, para instrumentalizar o Poder Público e a sociedade em geral com os meios que se reputam oportunos e necessários para enfrentamento da crise.

Neste contexto, em 28 de maio de 2020, entrou em vigor a LC nº

173/2020 que encarta o Programa Federativo de Enfrentamento ao Coronavírus, que estabelece medidas de socorro financeiro da União para os demais entes federativos mediante algumas contrapartidas negociadas pelo Executivo com o Senado Federal. A referida lei complementar também trouxe sensíveis modificações na LRF (LC nº 101/2000).

Dentre suas disposições transitórias, a LC nº 173/2020, mais

precisamente em seu art. 8º, I, veda até 31 de dezembro de 2021 a concessão de qualquer vantagem, aumento, reajuste ou adequação aos servidores, excepcionando em sua parte final aquelas decorrentes de decisões judiciais que assim venham a determinar, bem como aquelas provenientes de determinação legal anterior à calamidade pública. Já o inciso IX deste mesmo dispositivo veda a utilização do lapso temporal mencionado no caput para fins de cômputo de período aquisitivo de determinadas vantagens. Vejamos:

"Art. 8º Na hipótese de que trata o art. 65 da Lei

Complementar nº 101, de 4 de maio de 2000, a União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios afetados pela calamidade pública decorrente da pandemia da Covid-19 ficam proibidos, até 31 de dezembro de 2021, de:

I - conceder, a qualquer título, vantagem, aumento,

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reajuste ou adequação de remuneração a membros de Poder ou de órgão, servidores e empregados públicos e militares, exceto quando derivado de sentença judicial transitada em julgado ou de determinação legal anterior à calamidade pública;

(...)

IX - contar esse tempo como de período aquisitivo

necessário exclusivamente para a concessão de anuênios, triênios, quinquênios, licenças-prêmio e demais mecanismos equivalentes que aumentem a despesa com pessoal em decorrência da aquisição de determinado tempo de serviço, sem qualquer prejuízo para o tempo de efetivo exercício, aposentadoria, e quaisquer outros fins." (Grifos nossos).

Analisando primeiramente o teor do inciso I do art. 8º acima

transcrito, temos que com relação as vantagens decorrentes de decisões judiciais, o trecho é autoexplicativo e não enseja maiores dúvidas. Por outro lado, no que tange àquelas provenientes de determinação legal anterior à calamidade pública, vale registrar que aqueles direitos, vantagens que o servidor já fazia jus por ocasião do reconhecimento da situação de calamidade pública em âmbito nacional pelo Decreto Legislativo nº 06/2020 (em 20/03/2020) devem ser pagos/concedidos.

De outra feita, à luz do inciso IX do art. 8º, o período de 20 de

março de 2020 até dezembro de 2021 encontra-se suspenso para fins de concessão de vantagens que dependam exclusivamente do decurso do tempo, a exemplo dos anuênios ou licenças prêmio. Isto quer significar que este lapso temporal somente poderá ser computado para concessão de tais vantagens após janeiro de 2022.

No que tange à mudança de classe no período indicado no caput

do art. 8º da LC nº 173/2020, temos que na forma dos arts. 3º, V e 8º, ambos do Plano de Cargos e Carreiras da Câmara Municipal se dão por intermédio da promoção, a qual não exige para seu implemento exclusivamente o decurso do tempo. Vejamos o teor dos arts. 10 e 12 do

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Plano de Cargos e Carreiras da Câmara Municipal:

"Art. 10. As promoções obedecerão ao critério conjunto

de tempo de exercício em cada classe e ao merecimento.

(...)

Art. 12. Merecimento é a demonstração positiva do serviço

no exercício de seu cargo e se evidencia pelo desempenho de forma eficiente, das atribuições que lhe são cometidas, verificado nos prazos do artigo 11.

I - o merecimento será apurado, considerando-se:

a) assiduidade e pontualidade, de acordo com os

registros de controle de ponto do servidor;

b) disciplina e eficiência, de acordo lei específica que

deverá dispor sobre a forma das avaliações periódicas a que será submetido o servidor. (...)" (Grifos nossos).

Desta forma, não vislumbramos óbices à concessão de

promoções no período estabelecido no art. 8º da LC nº 173/2020, uma vez que a mesma não se enquadra no conceito de vantagem, aumento, reajuste ou adequação de remuneração, bem como pelo fato de que a mesma não exige para o seu implemento o mero decurso do tempo.

Já com relação à concessão de anuênios, triênios e demais

adicionais por tempo de serviço, em que pese não nos tenha sido dado conhecer o teor do Estatuto dos servidores local (norma constitucionalmente adequada a tratar do tema), via de regra, para a implementação deste direito exige-se o mero decurso do tempo. Em assim sendo, resta obstada sua concessão entre a edição do Decreto Legislativo nº 06/2020 até 31 de dezembro de 2021, sendo certo que este lapso temporal (da edição do Decreto Legislativo nº 06/2020 até 31 de dezembro de 2021) não poderá ser utilizado para concessão de adicional por tempo

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de serviço após 31 de dezembro de 2021.

Destacamos, por oportuno, que o art. 8º, IX, da LC nº 173/2020

não interrompe o prazo aquisitivo das vantagens, de forma a zerar o seu cômputo, mas tão somente o suspende, não havendo a contagem até 31 de dezembro de 2021. A partir de janeiro de 2022, o lapso temporal para aquisição de adicional por tempo de serviço volta a contar de onde parou. Por exemplo, se em 20/03/2020 (data da publicação do Decreto Legislativo 06/2020) determinado servidor contava com três meses para aquisição de anuênio, em janeiro de 2022, ele retomará a contagem do lapso temporal a partir desses três meses.

Isto posto, concluímos objetivamente a presente consulta

na forma das razões exaradas.

É o parecer, s.m.j.

Priscila Oquioni Souto

Assessora Jurídica

Aprovo o parecer

Marcus Alonso Ribeiro Neves

Consultor Jurídico

Rio de Janeiro, 02 de junho de 2020.

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Parecer IBAM Nº 1213/2020

SM – Servidor Público. LC nº 173/2020. Concessão de vale alimentação, vale feira. Gratificações. Progressão funcional. Considerações.

CONSULTA:

Tendo em vista o advento da LC nº 173/2020, mais precisamente

do seu art. 8º, I, indaga o consulente:

"Neste caso as vantagens já existem estão inclusas? No

caso de vale alimentação, vale feira, gratificação. A progressão dos servidores conforme a Lei complementar 173 também estão suspensas?"

A consulta não veio documentada.

RESPOSTA:

Inicialmente, como sabido, a rápida expansão da pandemia do Novo Coronavírus (COVID-19) impôs sérias restrições ao nosso modo de vida, sendo certo que as recomendações de distanciamento social e de quarentena geram uma redução substancial da circulação de pessoas, que levam, por sua vez, a impactos sensíveis nas mais diversas áreas da sociedade e, por conseguinte, a necessidade de organização da Administração Pública para atendimento das demandas e manutenção do bem comum.

Diante do acelerado avanço da doença no Brasil e dos múltiplos

desdobramentos no campo da saúde e da economia, ao longo deste ano

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de 2020, os poderes Executivo, Legislativo e Judiciário têm adotado, proposto ou sugerido medidas, providências ou ordens, de conteúdos diversos, para instrumentalizar o Poder Público e a sociedade em geral com os meios que se reputam oportunos e necessários para enfrentamento da crise.

Neste contexto, em 28 de maio de 2020, entrou em vigor a LC nº

173/2020 que encarta o Programa Federativo de Enfrentamento ao Coronavírus, que estabelece medidas de socorro financeiro da União para os demais entes federativos mediante algumas contrapartidas negociadas pelo Executivo com o Senado Federal. A referida lei complementar também trouxe sensíveis modificações na LRF (LC nº 101/2000).

Dentre suas disposições transitórias, a LC nº 173/2020, mais

precisamente em seu art. 8º, I, veda até 31 de dezembro de 2021 a concessão de qualquer vantagem, aumento, reajuste ou adequação aos servidores, excepcionando em sua parte final aquelas decorrentes de decisões judiciais que assim venham a determinar, bem como aquelas provenientes de determinação legal anterior à calamidade pública. Já o inciso IX deste mesmo dispositivo veda a utilização do lapso temporal mencionado no caput para fins de cômputo de período aquisitivo de determinadas vantagens. Vejamos:

"Art. 8º Na hipótese de que trata o art. 65 da Lei

Complementar nº 101, de 4 de maio de 2000, a União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios afetados pela calamidade pública decorrente da pandemia da Covid-19 ficam proibidos, até 31 de dezembro de 2021, de:

I - conceder, a qualquer título, vantagem, aumento,

reajuste ou adequação de remuneração a membros de Poder ou de órgão, servidores e empregados públicos e militares, exceto quando derivado de sentença judicial transitada em julgado ou de determinação legal anterior à calamidade pública;

(...)

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VI - criar ou majorar auxílios, vantagens, bônus, abonos, verbas de representação ou benefícios de qualquer natureza, inclusive os de cunho indenizatório, em favor de membros de Poder, do Ministério Público ou da Defensoria Pública e de servidores e empregados públicos e militares, ou ainda de seus dependentes, exceto quando derivado de sentença judicial transitada em julgado ou de determinação legal anterior à calamidade;

IX - contar esse tempo como de período aquisitivo

necessário exclusivamente para a concessão de anuênios, triênios, quinquênios, licenças-prêmio e demais mecanismos equivalentes que aumentem a despesa com pessoal em decorrência da aquisição de determinado tempo de serviço, sem qualquer prejuízo para o tempo de efetivo exercício, aposentadoria, e quaisquer outros fins." (Grifos nossos).

Analisando primeiramente o teor do inciso I do art. 8º acima

transcrito, temos que com relação as vantagens decorrentes de decisões judiciais, o trecho é autoexplicativo e não enseja maiores dúvidas. Por outro lado, no que tange àquelas provenientes de determinação legal anterior à calamidade pública, vale registrar que aqueles direitos, vantagens que o servidor já fazia jus por ocasião do reconhecimento da situação de calamidade pública em âmbito nacional pelo Decreto Legislativo nº 06/2020 (em 20/03/2020) devem ser pagos/concedidos.

De outra feita, à luz do inciso IX do art. 8º, o período de 20 de

março de 2020 até dezembro de 2021 encontra-se suspenso para fins de concessão de vantagens que dependam exclusivamente do decurso do tempo, a exemplo dos anuênios ou licenças prêmio. Isto quer significar que este lapso temporal somente poderá ser computado para concessão de tais vantagens após janeiro de 2022.

Pois bem, mais especificamente com relação à concessão de

vale alimentação e vale-feira, se os servidores já fazem jus a estas vantagens em virtude de as mesmas terem sido instituídas por lei anterior

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ao Decreto Legislativo nº 06, de 20 de março de 2020, que reconheceu a situação de calamidade pública decorrente da pandemia da COVID-19, não existem óbices aos respectivos pagamentos. Não obstante, resta de todo vedado neste momento editar lei para criar, aumentar ou corrigir o valor de face destes vales em virtude da proibição encartada no inciso VI do art. 8º da LC 173/2020.

De outra feita, com relação às progressões, temos que, em que

pese não nos tenha sido dado conhecer o Plano de Cargos e Carreiras respectivo, para fins da vedação do art. 8º, I, da LC nº 173/2020, não vislumbramos óbices com relação à concessão da progressão estrito senso na carreira, visto que ela não se enquadra no conceito de vantagem, aumento, reajuste ou adequação de remuneração.

No que tange ao inciso IX do art. 8º da LC nº 173/2020, como

aventado acima, a vedação de contagem do tempo se aplica para concessão de vantagens que decorram exclusivamente do decurso do tempo, tal como aponta a primeira parte do dispositivo. As progressões, em atendimento ao postulado constitucional da eficiência, não decorrem exclusivamente do mero decurso do tempo, devendo este fator ser conjugado com outros, a exemplo da avaliação de desempenho, titulação, entre outros.

Assim, se a progressão funcional, além do decurso do tempo,

exigir avaliação de desempenho, dentre outros critérios, não há óbices à sua concessão no período estabelecido no caput do art. 8º da LC nº 173/2020.

Por derradeiro, com relação à concessão de gratificações, o

consulente não especifica acerca de quais gratificações está se referindo. Não obstante, tratando-se de gratificações pro labore faciendum, como a designação para o desempenho de uma função de confiança ou para atuação em comissão de licitação (se remunerada), por exemplo, as quais já existam por ocasião do advento do Decreto Legislativo nº 06/2020, de igual forma, não vislumbramos óbices.

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Isto porque, a designação para função gratificada, diferentemente do que acontece com a nomeação para cargo comissionado, não implica em provimento. Logo, não é hipótese de admissão ou contratação. Reiteramos que o servidor designado para o exercício de função gratificada permanece no exercício das atribuições do seu cargo efetivo, desempenhando em acréscimo as atribuições da função gratificada, pelo que faz jus a um plus remuneratório.

Neste panorama, pode-se afirmar que a LC 173/2020 não veda a

designação de servidor efetivo para o exercício de função gratificada. O único óbice existente na referida Lei Complementar em relação à função gratificada é aquele que consta do inciso II de seu artigo 8º que impede não a designação, mas sim a criação de função que implique em aumento de despesa, o que, segundo informado na consulta, não é o caso.

Isto posto, concluímos objetivamente a presente consulta na

forma das razões exaradas.

É o parecer, s.m.j.

Priscila Oquioni Souto

Assessora Jurídica

Aprovo o parecer

Marcus Alonso Ribeiro Neves

Consultor Jurídico

Rio de Janeiro, 02 de junho de 2020.

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Parecer IBAM Nº 1215/2020

SM – Servidor Público. Alcance do art. 8º, IX, da LC nº 173/2020. Considerações.

CONSULTA:

Tendo em vista o advento da LC nº 173/2020, indaga o consulente:

"Em razão do contido no artigo 8º, IX da Lei

Complementar 173/2020, pedimos posição, no sentido de que se efetivamente o tempo entre esta Lei e o final da vigência do estado de calamidade pública fica suspenso para todos os efeitos constantes em referido inciso, mesmo existindo legislação anterior que concede tais benefícios?"

A consulta não veio documentada.

RESPOSTA:

Inicialmente, como sabido, a rápida expansão da pandemia do

Novo Coronavírus (COVID-19) impôs sérias restrições ao nosso modo de vida, sendo certo que as recomendações de distanciamento social e de quarentena geram uma redução substancial da circulação de pessoas, que levam, por sua vez, a impactos sensíveis nas mais diversas áreas da sociedade e, por conseguinte, a necessidade de organização da Administração Pública para atendimento das demandas e manutenção do bem comum.

Diante do acelerado avanço da doença no Brasil e dos múltiplos

desdobramentos no campo da saúde e da economia, ao longo deste ano

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de 2020, os poderes Executivo, Legislativo e Judiciário têm adotado, proposto ou sugerido medidas, providências ou ordens, de conteúdos diversos, para instrumentalizar o Poder Público e a sociedade em geral com os meios que se reputam oportunos e necessários para enfrentamento da crise.

Neste contexto, em 28 de maio de 2020, entrou em vigor a LC nº

173/2020 que encarta o Programa Federativo de Enfrentamento ao Coronavírus, que estabelece medidas de socorro financeiro da União para os demais entes federativos mediante algumas contrapartidas negociadas pelo Executivo com o Senado Federal. A referida lei complementar também trouxe sensíveis modificações na LRF (LC nº 101/2000).

Dentre suas disposições transitórias, a LC nº 173/2020, mais

precisamente em seu art. 8º, I, veda até 31 de dezembro de 2021 a concessão de qualquer vantagem, aumento, reajuste ou adequação aos servidores, excepcionando em sua parte final aquelas decorrentes de decisões judiciais que assim venham a determinar, bem como aquelas provenientes de determinação legal anterior à calamidade pública. Já o inciso IX deste mesmo dispositivo veda a utilização do lapso temporal mencionado no caput para fins de cômputo de período aquisitivo de determinadas vantagens. Vejamos:

"Art. 8º Na hipótese de que trata o art. 65 da Lei

Complementar nº 101, de 4 de maio de 2000, a União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios afetados pela calamidade pública decorrente da pandemia da Covid-19 ficam proibidos, até 31 de dezembro de 2021, de:

I - conceder, a qualquer título, vantagem, aumento,

reajuste ou adequação de remuneração a membros de Poder ou de órgão, servidores e empregados públicos e militares, exceto quando derivado de sentença judicial transitada em julgado ou de determinação legal anterior à calamidade pública;

(...)

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282

VI - criar ou majorar auxílios, vantagens, bônus, abonos, verbas de representação ou benefícios de qualquer natureza, inclusive os de cunho indenizatório, em favor de membros de Poder, do Ministério Público ou da Defensoria Pública e de servidores e empregados públicos e militares, ou ainda de seus dependentes, exceto quando derivado de sentença judicial transitada em julgado ou de determinação legal anterior à calamidade;

(...)

IX - contar esse tempo como de período aquisitivo

necessário exclusivamente para a concessão de anuênios, triênios, quinquênios, licenças-prêmio e demais mecanismos equivalentes que aumentem a despesa com pessoal em decorrência da aquisição de determinado tempo de serviço, sem qualquer prejuízo para o tempo de efetivo exercício, aposentadoria, e quaisquer outros fins." (Grifos nossos).

Analisando primeiramente o teor do inciso I do art. 8º acima

transcrito, temos que com relação as vantagens decorrentes de decisões judiciais, o trecho é autoexplicativo e não enseja maiores dúvidas. Por outro lado, no que tange àquelas provenientes de determinação legal anterior à calamidade pública, vale registrar que aqueles direitos, vantagens que o servidor já fazia jus por ocasião do reconhecimento da situação de calamidade pública em âmbito nacional pelo Decreto Legislativo nº 06/2020 (em 20/03/2020) devem ser pagos/concedidos.

No que tange ao teor do inciso VI do art. 8º da LC nº 173/2020,

de igual forma, o texto é autoexplicativo, sendo vedada a majoração de auxílios, vantagens, bônus, abonos, verbas de representação, ainda que de cunho indenizatório (como é o caso do vale-refeição), salvo se determinado em sentença judicial ou se a lei que determinou a majoração ou criação for anterior ao advento do Decreto Legislativo nº 06/2020.

De outra feita, à luz do inciso IX do art. 8º, o período de 20 de

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março de 2020 até dezembro de 2021 encontra-se suspenso para fins de concessão de vantagens que dependam exclusivamente do decurso do tempo, a exemplo dos anuênios ou licenças prêmio. Isto quer significar que este lapso temporal somente poderá ser computado para concessão de tais vantagens após janeiro de 2022, pouco importando se a lei que criou a vantagem foi editada antes da decretação do estado de calamidade.

Assim, especificamente com relação ao inciso IX do art. 8º da LC

nº 173/2020, objeto direto da indagação do consulente, como aventado acima, a vedação de contagem do tempo se aplica para concessão de vantagens que decorram exclusivamente do decurso do tempo, tal como aponta a primeira parte do dispositivo (a exemplo dos adicionais por tempo de serviço). Ainda exemplificando, as progressões na carreira, as quais não constituem propriamente vantagem, aumento, reajuste ou adequação de remuneração, que não decorram exclusivamente do mero decurso do tempo, exigindo que este fator seja conjugado com outros (avaliação de desempenho, titulação) não encontra óbice neste dispositivo.

Isto posto, concluímos objetivamente a presente consulta na

forma das razões exaradas.

É o parecer, s.m.j.

Priscila Oquioni Souto

Assessora Jurídica

Aprovo o parecer

Marcus Alonso Ribeiro Neves

Consultor Jurídico

Rio de Janeiro, 03 de junho de 2020.

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Parecer IBAM Nº 1219/2020

EL – Eleição, FM – Finanças Municipais, SM – Servidor Público. Candidatos aprovados em concurso homologado antes do período de vedação eleitoral. Restrições decorrentes da Lei Complementar nº 173/2020. Considerações.

CONSULTA:

A Prefeitura Municipal solicita análise e pronunciamento deste

Instituto a respeito da Lei Complementar nº 173/2020, indagando se o Município está proibido, hoje, de nomear os aprovados em concurso público já homologado.

Indaga, também, em se tratando de ano eleitoral, qual a data

limite exata para que possam ser feitas as nomeações.

A consulta não vem documentada.

RESPOSTA:

A presente consulta exige uma análise conjunta da legislação

eleitoral e financeira, que impõem restrições temporais à realização de concursos e nomeação de aprovados. Isso porque, como se sabe, um mesmo procedimento, ato ou fato jurídico provoca repercussões em diversas esferas do direito.

De um lado, a legislação eleitoral tem por finalidade conformar

a conduta dos agentes públicos e de candidatos de modo a assegurar a isonomia do pleito. Assim é que o art. 73, V, da Le i nº 9.504/1997

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estabelece restrições à nomeação, contratação ou admissão de servidores públicos nos três meses que antecedem as eleições até a posse dos eleitos, a fim de evitar o uso eleitoreiro do expediente. No entanto, o dispositivo excepciona expressamente a nomeação de servidores aprovados em concursos homologados até o início desse prazo, senão vejamos:

"Art. 73. São proibidas aos agentes públicos, servidores

ou não, as seguintes condutas tendentes a afetar a igualdade de oportunidades entre candidatos nos pleitos eleitorais:

(...)

V - nomear, contratar ou de qualquer forma admitir,

demitir sem justa causa, suprimir ou readaptar vantagens ou por outros meios dificultar ou impedir o exercício funcional e, ainda, ex officio, remover, transferir ou exonerar servidor público, na circunscrição do pleito, nos três meses que o antecedem e até a posse dos eleitos, sob pena de nulidade de pleno direito, ressalvados:

a) a nomeação ou exoneração de cargos em comissão e

designação ou dispensa de funções de confiança;

b) a nomeação para cargos do Poder Judiciário, do

Ministério Público, dos Tribunais ou Conselhos de Contas e dos órgãos da Presidência da República;

c) a nomeação dos aprovados em concursos públicos

homologados até o início daquele prazo;

d) a nomeação ou contratação necessária à instalação ou

ao funcionamento inadiável de serviços públicos essenciais, com prévia e expressa autorização do Chefe do Poder Executivo;

e) a transferência ou remoção ex officio de militares,

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policiais civis e de agentes penitenciários;" (grifo nosso)

Portanto, considerando que, de acordo com o calendário eleitoral

de 2020, divulgado pela Resolução nº 23.606/2019 do TSE, o prazo acima referido começará a correr em 4 de julho de 2020, não se verifica, estritamente do ponto de vista da legislação eleitoral, vedação à nomeação dos aprovados em concurso já homologado antes dessa data.

Todavia, do ponto de vista da legislação financeira, as

nomeações encontrarão restrições. Nesse ponto, é importante observar que diante do acelerado avanço da pandemia do novo Coronavírus (Covid-19) e das relevantes repercussões econômicas da calamidade que vivenciamos, foi editada a Lei Complementar nº 173/2020, diante da premente necessidade de contenção dos gastos para promoção de um esforço conjunto para superação dos efeitos deletérios sobre a economia, nomeadamente sobre a arrecadação. A referida LC nº 173/2020 promoveu sensíveis e relevantes alterações na Lei Complementar nº 101/2000 (Lei de Responsabilidade Fiscal — LRF), que dizem respeito a despesas de pessoal realizadas no fim do mandato.

Antes, é bom dizer que não se trata a LC nº 173/2020 apenas de

uma lei que visou a impor restrições na execução orçamentária, na realização de gastos públicos e aumentos a servidores. Ela se trata, como já aponta sua ementa, de um Programa Federativo de Enfrentamento ao Coronavírus, que envolve auxílio financeiro da União aos Estados e Municípios acompanhados de contrapartidas. A LC nº 173/2020 tem supedâneo, assim, na competência da União prevista no art. 24, parágrafo único e no art. 169, § 9º, da CRFB, visando à gestão responsável das finanças públicas de aplicabilidade a todas as esferas da federação, bem como a situação de excepcional limitação causada pela crise econômica em curso.

Assim, além das alterações permanentes no art. 21 da LRF, cabe

nesse momento muita atenção ao o art. 8º da própria LC nº 173/2020, que contêm disposições temporárias que se aplicarão até o dia 31 de dezembro de 2021 e que dizem respeito diretamente à presente consulta.

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Pertinente, nesse passo, trazer à colação o disposto no art. 21 da LRF, já com redação conferida pelo art. 7º da LC nº 173/2020:

“Art. 21. É nulo de pleno direito:

I - o ato que provoque aumento da despesa com pessoal

e não atenda:

a) às exigências dos arts. 16 e 17 desta Lei

Complementar e o disposto no inciso XIII do caput do art. 37 e no § 1º do art. 169 da Constituição Federal;

b) ao limite legal de comprometimento aplicado às

despesas com pessoal inativo;

II - o ato de que resulte aumento da despesa com pessoal

nos 180 (cento e oitenta) dias anteriores ao final do mandato do titular de Poder ou órgão referido no art. 20;

III - o ato de que resulte aumento da despesa com

pessoal que preveja parcelas a serem implementadas em períodos posteriores ao final do mandato do titular de Poder ou órgão referido no art. 20;

IV - a aprovação, a edição ou a sanção, por Chefe do

Poder Executivo, por Presidente e demais membros da Mesa ou órgão decisório equivalente do Poder Legislativo, por Presidente de Tribunal do Poder Judiciário e pelo Chefe do Ministério Público, da União e dos Estados, de norma legal contendo plano de alteração, reajuste e reestruturação de carreiras do setor público, ou a edição de ato, por esses agentes, para nomeação de aprovados em concurso público, quando:

a) resultar em aumento da despesa com pessoal nos 180

(cento e oitenta) dias anteriores ao final do mandato do titular do Poder Executivo; ou

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b) resultar em aumento da despesa com pessoal que preveja parcelas a serem implementadas em períodos posteriores ao final do mandato do titular do Poder Executivo.

§ 1º As restrições de que tratam os incisos II, III e IV:

I - devem ser aplicadas inclusive durante o período de

recondução ou reeleição para o cargo de titular do Poder ou órgão autônomo; e

II - aplicam-se somente aos titulares ocupantes de cargo

eletivo dos Poderes referidos no art. 20.

§ 2º Para fins do disposto neste artigo, serão

considerados atos de nomeação ou de provimento de cargo público aqueles referidos no § 1º do art. 169 da Constituição Federal ou aqueles que, de qualquer modo, acarretem a criação ou o aumento de despesa obrigatória.” (grifo nosso)

Quanto as alterações no art. 21 da LRF, é de se esclarecer que o

legislador encampou entendimento no sentido de que o ato que provoca aumento de despesa de pessoal abrange tanto a lei que cria a obrigação de despesa, como também o ato administrativo concreto que materializa a obrigação de despesa, isto é, a execução orçamentária.

Com efeito, o novel inciso IV do art. 21 da LRF estabelece

expressamente ser nulo de pleno direito não só as normas legais que resultem em aumento da despesa com pessoal nos cento e oitenta dias anteriores ao final do mandato do titular do Poder Executivo ou que preveja parcelas a serem implementadas em períodos posteriores ao final do mandato do titular do Poder Executivo, como também a edição de ato para nomeação em concurso público que se enquadre nas mesmas situações.

Portanto, a partir do dia 5 de julho de qualquer derradeiro ano

de mandato (180 dias do fim do ano), é nula de pleno direito, em regra, a

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nomeação de candidatos aprovados em concursos públicos, ainda que homologados antes do prazo em referência. A nomeação apenas se viabiliza nos 180 dias que antecedem o fim do mandato caso não acarrete aumento de despesa de pessoal, e por conta disso não se enquadre na vedação do art. 21, IV, "a" da LRF.

De qualquer modo, estão em vigor desde o dia 28 de maio de

2020, as excepcionais restrições previstas no art. 8º da LC nº 173/2020, mais severas que as do art. 21 da LRF, as quais transcrevemos:

"Art. 8º Na hipótese de que trata o art. 65 da Lei

Complementar nº 101, de 4 de maio de 2000, a União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios afetados pela calamidade pública decorrente da pandemia da Covid-19 ficam proibidos, até 31 de dezembro de 2021, de:

(...)

IV - admitir ou contratar pessoal, a qualquer título,

ressalvadas as reposições de cargos de chefia, de direção e de assessoramento que não acarretem aumento de despesa, as reposições decorrentes de vacâncias de cargos efetivos ou vitalícios, as contratações temporárias de que trata o inciso IX do caput do art. 37 da Constituição Federal, as contratações de temporários para prestação de serviço militar e as contratações de alunos de órgãos de formação de militares;

V - realizar concurso público, exceto para as reposições

de vacâncias previstas no inciso IV;

(...)

VII - criar despesa obrigatória de caráter continuado,

ressalvado o disposto nos §§ 1º e 2º;

VIII - adotar medida que implique reajuste de despesa

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obrigatória acima da variação da inflação medida pelo Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA), observada a preservação do poder aquisitivo referida no inciso IV do caput do art. 7º da Constituição Federal;

(...)

§ 1º O disposto nos incisos II, IV, VII e VIII do caput deste

artigo não se aplica a medidas de combate à calamidade pública referida no caput cuja vigência e efeitos não ultrapassem a sua duração.

§ 2º O disposto no inciso VII do caput não se aplica em

caso de prévia compensação mediante aumento de receita ou redução de despesa, observado que:

I - em se tratando de despesa obrigatória de caráter

continuado, assim compreendida aquela que fixe para o ente a obrigação legal de sua execução por período superior a 2 (dois) exercícios, as medidas de compensação deverão ser permanentes; e

II - não implementada a prévia compensação, a lei ou o ato

será ineficaz enquanto não regularizado o vício, sem prejuízo de eventual ação direta de inconstitucionalidade." (grifo nosso)

Observa-se, portanto, que o art. 8º do art. 173/2020 impõe ainda

mais restrições que o art. 21 da LRF acima colacionado. Assim, pertinente é compreender a amplitude e os parâmetros para aplicação do aludido dispositivo de vigência temporária, que deve ser observado, como dito, desde o dia 28 de maio de 2020 até o dia 31 de dezembro de 2021.

Ora, diz o dispositivo em comento diz que, como exceção, é

admitida a nomeação de servidores para reposição de vacâncias de cargos efetivos ou vitalícios. Portanto, quando as vagas de cargos efetivos ou vitalícios em disputa no concurso decorram de vacância, nosso

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entendimento é de que podem ser realizadas as nomeações dos aprovados, desde que obedecidas as demais normas e parâmetros de responsabilidade fiscal, nomeadamente as novas vedações no art. 21 da LRF e as disposições transitórias trazidas no art. 8º da proposição.

Por outro lado, não há segurança jurídica, conquanto haja

previsão no edital, para a nomeação de candidatos para cargos que não decorram de vacância, até o dia 31 de dezembro de 2021, ainda que o concurso tenha sido homologado antes de 28 de maio de 2020. Quando não se trate de reposição de vacâncias, apenas poderá haver nomeações a partir de 1º de janeiro de 2022, quando deixarão de vigorar as restrições do art. 8º, IV, da LC nº 173/2020, podendo ser utilizada a lista de aprovados do concurso caso ainda esteja em vigor.

Além disso, como já dito anteriormente, a redação conferida ao art. 21 da LRF, especificamente seu inciso IV, reputa expressamente que o ato criador da despesa não é apenas a lei que cria o cargo, mas também o ato de provimento do cargo, isto é, a nomeação. Portanto, a nomeação dos aprovados em concurso público desde o dia 28 de maio de 2020 ao dia 31 de dezembro de 2021, ainda que para reposição de vacância, deve, também, observar o art. 8º, inciso VII e seu § 2º da LC nº 173/2020, isto é, apenas pode ocorrer caso haja prévia compensação mediante aumento da receita ou redução de despesa, bem como atendimento aos requisitos do art. 169, § 1º, da CRFB.

Acrescentamos que, independentemente destas considerações, há sempre de se observar o princípio da razoabilidade e da proporcionalidade, cabendo ao administrador público justificar motivadamente a necessidade de preenchimento das vagas à luz do princípio da eficiência e do interesse público envolvido, mormente nas hipóteses em que a vacância subsiste por longo lapso de tempo.

Isso porque não é dado ao Administrador, sob pena de burla as

restrições impostas pela lei, desenterrar vacâncias ocorridas há anos, sob

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o argumento de que somente agora vislumbrou-se a necessidade de reposição da vacância. Certamente, práticas como essas hão de ser alvo dos órgãos de controle e para conferir maior segurança jurídica deve o intérprete lançar mão das balizas fornecidas na Lei de Introdução as normas do Direito Brasileiro, mormente aquela constante do seu artigo 22, que orienta que "na interpretação de normas sobre gestão pública, serão

considerados os obstáculos e as dificuldades reais do gestor e as

exigências das políticas públicas a seu cargo, sem prejuízo dos direitos

dos administrados".

Em vista de tudo que foi exposto, conclui-se que desde o dia 28

de maio de 2020, data em que entrou em vigor a LC nº 173/2020, até o dia 31 de dezembro de 2021, apenas poderá haver nomeações de candidatos aprovados em concurso já homologado para reposição de vacâncias, conforme determina o art. 8º, IV da LC nº 173/2020, devendo, ainda, ser observado o art. 8º, VII e § 2º do referido diploma legal. De outra feita, tendo sido o concurso homologado antes de 4 de julho de 2020, atendidos todos os demais requisitos de direito financeiro, não há vedação de ordem eleitoral à nomeação de aprovados, nos termos do art. 73, III, "c", da Lei nº 9.504/1993.

É o parecer, s.m.j.

Gustavo da Costa Ferreira M. dos Santos

Consultor Técnico

Aprovo o parecer

Marcus Alonso Ribeiro Neves

Consultor Jurídico

Rio de Janeiro, 03 de junho de 2020.

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Parecer IBAM Nº 1236/2020

FM – Finanças Municipais, SM – Servidor Público. LC nº 173/2020. Extinção de cargos em comissão em decorrência de ADI. Resolução já aprovada que reduziu o quantitativo de cargos em comissão. Projeto de lei enviado à sanção com fixação da remuneração. Considerações.

CONSULTA:

A Câmara Municipal solicita complementação ao parecer nº 1021/2020.

Informa a consulente que a resolução criando os cargos

mencionados na consulta anterior foi promulgada e publicada no dia 27 de maio do corrente ano, ao passo que a lei que fixa os vencimentos desses cargos foi encaminhada para sanção do poder executivo no dia 27 de maio.

Em caso se sanção, poderá haver nomeação para esses cargos

normalmente?

Reforça o consulente a informação já anteriormente prestada de

que os projetos de resolução e de lei foram propostos para dar cumprimento a ADIN, cuja modulação terminou em 17 de maio de 2020. Ressalta, ainda, que houve considerável redução de número de cargos comissionados e, consequentemente, redução de despesas.

A consulta não vem documentada.

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RESPOSTA:

Diante do acelerado avanço da pandemia do novo Coronavírus (Covid-19) e das relevantes repercussões econômicas da calamidade que vivenciamos, foi editada a Lei Complementar nº 173/2020 para fazer frente à premente necessidade de contenção dos gastos púbicos, visando à promoção de um esforço conjunto de todos os entes da federação, em espírito de cooperação, para superação dos efeitos deletérios da propagação da infecção viral sobre a economia. Assim é que a referida LC nº 173/2020 promoveu sensíveis e relevantes alterações na Lei Complementar nº 101/2000 (Lei de Responsabilidade Fiscal — LRF), que dizem respeito a despesas de pessoal realizadas no fim do mandato.

Antes, é bom dizer que não se trata a LC nº 173/2020 apenas de

uma lei que visou a impor restrições na execução orçamentária, na realização de gastos públicos e aumentos a servidores. Ela se trata, como já aponta sua ementa, de um Programa Federativo de Enfrentamento ao Coronavírus, que envolve auxílio financeiro da União aos Estados e Municípios, acompanhado de contrapartidas, conduzido sob o espírito do federalismo fiscal.

A LC nº 173/2020 tem supedâneo, assim, na competência da

União prevista no art. 24, parágrafo único, tendo em vista o equilíbrio do desenvolvimento e do bem-estar em âmbito nacional, e também no art. 169, § 9º, da CRFB, visando à gestão responsável das finanças públicas de aplicabilidade a todas as esferas da federação, bem como a situação de excepcional limitação causada pela crise econômica em curso.

Assim, além das alterações permanentes no art. 21 da LRF, cabe

nesse momento muita atenção ao o art. 8º da própria LC nº 173/2020, que contêm disposições temporárias que se aplicarão até o dia 31 de dezembro de 2021 e que são em muitos aspectos mais restritivos e severos que o aludido dispositivo da LRF.

De qualquer modo é pertinente trazer à colação o disposto no art.

21 da LRF, já com redação conferida pelo art. 7º da LC nº 173/2020, posto

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que no que se refere ao aumento de despesas com pessoal, passa a incidir a partir dos 180 dias finais do mandato, isto é, 5 de julho de 2020:

“Art. 21. É nulo de pleno direito:

I - o ato que provoque aumento da despesa com pessoal

e não atenda:

a) às exigências dos arts. 16 e 17 desta Lei

Complementar e o disposto no inciso XIII do caput do art. 37 e no § 1º do art. 169 da Constituição Federal;

b) ao limite legal de comprometimento aplicado às

despesas com pessoal inativo;

II - o ato de que resulte aumento da despesa com pessoal

nos 180 (cento e oitenta) dias anteriores ao final do mandato do titular de Poder ou órgão referido no art. 20;

III - o ato de que resulte aumento da despesa com

pessoal que preveja parcelas a serem implementadas em períodos posteriores ao final do mandato do titular de Poder ou órgão referido no art. 20;

IV - a aprovação, a edição ou a sanção, por Chefe do

Poder Executivo, por Presidente e demais membros da Mesa ou órgão decisório equivalente do Poder Legislativo, por Presidente de Tribunal do Poder Judiciário e pelo Chefe do Ministério Público, da União e dos Estados, de norma legal contendo plano de alteração, reajuste e reestruturação de carreiras do setor público, ou a edição de ato, por esses agentes, para nomeação de aprovados em concurso público, quando:

a) resultar em aumento da despesa com pessoal nos 180

(cento e oitenta) dias anteriores ao final do mandato do titular do Poder Executivo; ou

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b) resultar em aumento da despesa com pessoal que preveja parcelas a serem implementadas em períodos posteriores ao final do mandato do titular do Poder Executivo.

§ 1º As restrições de que tratam os incisos II, III e IV:

I - devem ser aplicadas inclusive durante o período de

recondução ou reeleição para o cargo de titular do Poder ou órgão autônomo; e

II - aplicam-se somente aos titulares ocupantes de cargo

eletivo dos Poderes referidos no art. 20."

§ 2º Para fins do disposto neste artigo, serão

considerados atos de nomeação ou de provimento de cargo público aqueles referidos no § 1º do art. 169 da Constituição Federal ou aqueles que, de qualquer modo, acarretem a criação ou o aumento de despesa obrigatória.” (grifo nosso)

Antes da alteração promovida pelo art. 7º da LC nº 173/2020 à

LC nº 101/2000, havia balizado entendimento, encampado pelo IBAM e pelo Tribunal de Contas da União (cf. Acórdão TCU nº 1106/2008, publicado em 06/11/2008) de que o ato de que resultava o aumento da despesa de pessoal consistia na lei ou norma criadora da despesa, e não propriamente no ato administrativo ou de gestão que executa a despesa. Assim, o provimento de cargo criado antes do período de vedação, quando devidamente atendidas as exigências do art. 169, § 1º da CRFB, bem como observados os princípios da razoabilidade, da proporcionalidade e da continuidade administrativa, se encontrava imune à vedação do art. 21, parágrafo único, em sua redação original.

No entanto, as novíssimas alterações no art. 21 da LRF apontam

expressamente no sentido de que o legislador encampou entendimento, já adotado em alguns tribunais de contas estaduais, no sentido de que o ato que provoca aumento de despesa de pessoal abrange tanto a lei que cria a obrigação de despesa, como também o ato administrativo concreto que

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materializa a obrigação de despesa, isto é, a execução orçamentária, como é o caso do ato de provimento, a partir do qual surge a obrigação de pagamento de remuneração. Isso está com todas as letras no inciso IV e no § 2º do dispositivo.

De qualquer modo, em à nomeação de servidores, observa-se no

inciso IV, alíneas "a" e "b" do mesmo art. 21 da LRF, que o texto legal faz clara referência à proibição da edição de "edição de ato (...) para

nomeação de aprovados em concurso público" que "resultar em aumento

de despesa com pessoal nos 180 dias anteriores ao final do mandato" , e que o § 2º do art. 21 da LRF diz que "serão considerados atos de nomeação ou provimento de cargo público (...) quaisquer atos que

acarretem a criação ou o aumento de despesa obrigatória". Portanto, a nomeação de servidor para cargo em comissão também se enquadra na vedação quando acarrete aumento de despesa. Sempre que fala da vedação, porém, a lei menciona a expressão "aumento de despesa"

Observa-se, assim, que a clara finalidade da lei não é evitar a

edição de toda e qualquer nomeação de servidores efetivos ou comissionados, ou qualquer ato que gere despesas com pessoal nos 180 dias que antecedem o fim do mandato. O que almeja a lei é evitar atos de pessoal que acarretem aumento de despesa. Seria um contrassenso que fossem vedadas a edição de normas ou atos que acarretassem redução de despesas com pessoal, uma vez que a finalidade da lei é justamente conter os gastos públicos.

Na verdade, pode-se dizer que medidas que visem à redução de

gastos com servidores comissionados, que consistam na extinção de cargos ou redução da remuneração atribuída aos cargos é medida até mesmo desejável e incentivada pela lei. A propósito, isso ficará mais claro ainda quando da análise do art. 8º da LC Nº 173, que começou a vigorar em 28 de maio de 2020 e produzirá efeitos até o dia 31 de dezembro de 2021, que convém colacionar:

"Art. 8º Na hipótese de que trata o art. 65 da Lei

Complementar nº 101, de 4 de maio de 2000, a União, os Estados,

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o Distrito Federal e os Municípios afetados pela calamidade pública decorrente da pandemia da Covid-19 ficam proibidos, até 31 de dezembro de 2021, de:

(...)

II - criar cargo, emprego ou função que implique aumento

de despesa;

III - alterar estrutura de carreira que implique aumento de despesa;

IV - admitir ou contratar pessoal, a qualquer título, ressalvadas as reposições de cargos de chefia, de direção e de assessoramento que não acarretem aumento de despesa, as reposições decorrentes de vacâncias de cargos efetivos ou vitalícios, as contratações temporárias de que trata o inciso IX do caput do art. 37 da Constituição Federal, as contratações de temporários para prestação de serviço militar e as contratações de alunos de órgãos de formação de militares;

(...)

VII - criar despesa obrigatória de caráter continuado,

ressalvado o disposto nos §§ 1º e 2º;

VIII - adotar medida que implique reajuste de despesa

obrigatória acima da variação da inflação medida pelo Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA), observada a preservação do poder aquisitivo referida no inciso IV do caput do art. 7º da Constituição Federal;

(...)

§ 2º O disposto no inciso VII do caput não se aplica

em caso de prévia compensação mediante aumento de receita ou

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redução de despesa, observado que:

I - em se tratando de despesa obrigatória de caráter

continuado, assim compreendida aquela que fixe para o ente a obrigação legal de sua execução por período superior a 2 (dois) exercícios, as medidas de compensação deverão ser permanentes; e

II - não implementada a prévia compensação, a lei ou o

ato será ineficaz enquanto não regularizado o vício, sem prejuízo de eventual ação direta de inconstitucionalidade.

§ 3º A lei de diretrizes orçamentárias e a lei orçamentária

anual poderão conter dispositivos e autorizações que versem sobre as vedações previstas neste artigo, desde que seus efeitos somente sejam implementados após o fim do prazo fixado, sendo vedada qualquer cláusula de retroatividade." (grifo nosso)

Observa-se, assim, que a vedação aplicável em decorrência do

art. 8º da LC nº 173/2020, no seu inciso II, veda a criação de cargo que implique aumento de despesa. Ora, se conforme afirmado pelo consulente, a resolução diminuiu o quantitativo de cargos comissionados em cotejo com aquela que estava anteriormente vigente, e a lei em comento diz respeito apenas à fixação da respectiva remuneração, cujo montante será menor que o anteriormente previsto, autorizada estará a sua sanção e aplicação porque não haveria aumento de despesa. Quanto mais se a decisão decorreu de determinação judicial em sede de ADIN.

Uma vez em vigor a resolução de criação dos cargos em

comissão que reduziu o quantitativo a lei que lhes fixou os vencimentos esteja em vigor, cabe enfrentar também o disposto no art. 8º IV da LC nº 173/2020 que veda admitir ou contratar pessoal, a qualquer título, ressalvadas as reposições de cargos de chefia, de direção e de assessoramento que não acarretem aumento de despesa. De acordo com a literalidade da norma, a nomeação para os cargos em comissão criados pela resolução com vencimentos fixados na lei não se trata precisamente

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de "reposição", porque se tratam de cargos novos. Para que haja reposição, o cargo deveria estar ocupado antes. Mas como poderia estar ocupado, se é cargo novo?

No entanto, sabe-se que, na aplicação da lei, o intérprete, ou

mais precisamente o administrador, não pode ficar adstrito ao sentido literal de apenas um dos dispositivos que pretende interpretar. Importante, ainda, notar que o art. 22 do Decreto-lei nº 4.657/1942 (Lei de Introdução às Normas do Direito Brasileiro) prevê que, na interpretação de normas sobre gestão pública, serão considerados os obstáculos e as dificuldades reais do gestor e as exigências das políticas públicas a seu cargo, sem prejuízo dos direitos dos administrados, ao passo que seu § 1º determina que em decisão sobre regularidade de conduta ou validade de ato, contrato, ajuste, processo ou norma administrativa, serão consideradas as circunstâncias práticas que houverem imposto, limitado ou condicionado a ação do agente.

Pois bem. Houve uma ADIN que invalidou a estrutura de cargos

em comissão da Câmara Municipal. O órgão legislativo, acertadamente, providenciou no mês de maio a adequação das suas normas, reduzindo o número de cargos comissionados e reduzindo despesas de pessoal, por meio de resolução. Seguindo a sistemática constitucional que exige lei para a fixação da remuneração, enviou à sanção do Prefeito o projeto com esse objetivo, e nesse interim, entrou em vigor o art. 8º da LC nº 173/2020, que autoriza literalmente apenas em "reposição de cargos em comissão". Estaria o gestor impedido de nomear esses cargos novos em razão da LC nº 173/2020, mesmo após ter agido no estrito cumprimento de seu dever legal, quanto mais reduzindo despesas, que é justamente a finalidade maior do aludido diploma normativo? Não há como, nesse momento, deixar de relembrar a clássica lição de Carlos Maximiliano:

"Deve o direito ser interpretado inteligentemente: não de

modo que a ordem legal envolva um absurdo, prescreva inconveniências, vá ter a conclusões inconsistentes ou impossíveis. Também se prefere a exegese de que resulte eficiente a providência legal ou válido o ato, à que torne aquela sem efeito,

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inócua, ou este, juridicamente nulo." (MAXIMILIANO, Carlos. Hermenêutica e aplicação do direito. Rio de Janeiro: Forense, 1979, p. 166)

A lição do mestre da hermenêutica jurídica cai como uma luva ao

caso concreto. Os cargos novos que foram criados em decorrência da extinção de outros, em cumprimento de determinação judicial, reduzindo despesas, são cargos de direção e chefia. Não se lhes poder prover acarretaria que diversos setores da Câmara ficariam acéfalos, sem ter quem conduzi-los, ou, pior, que se pusessem servidores em desvio de função para poder dirigir e coordenar os trabalhos. Ou seja, a pretexto de evitar uma ilegalidade, cometer-se-ia outra ilegalidade, porém oficiosamente, porque o desvio de função não é documentado, é uma situação de fato.

Desse modo, caso efetivamente tenha havido redução de

despesas com a extinção dos cargos em comissão, e os novos cargos em comissão criados sejam necessários para condução dos setores e trabalhos da Câmara Municipal, reputamos viável a sanção da lei que fixa a sua remuneração e o provimento dos cargos comissionados, podendo- se até afirmar que embora se tratem formalmente de cargos novos, o provimento pode ser reputado reposição de facto que atende ao critério de reduzir ou manter despesas de pessoal.

Aliás, corrobora para esse entendimento o que diz o mesmo art.

8º, inciso VII, da LC nº 173/2020 que veda a criação de despesa obrigatória de caráter continuado, salvo quando, nos termos do § 1º, haja prévia e permanente compensação mediante redução de despesa.

Ora, a extinção dos cargos em comissão pela revogação da

resolução anteriormente vigente, em decorrência da ADIN, configura uma redução de despesa prévia — porque ocorrerá antes da nomeação —, e permanente — porque os cargos foram efetivamente extintos. Daí que falamos anteriormente: a redução de despesas como compensação é desejável, e imposta pela lei quando há criação de despesa obrigatória, e não proibida.

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Ousamos dizer que, ao longo do período de enfrentamento da crise econômica, assim entendido oficialmente o período entre 28 de maio de 2020 e 31 de dezembro de 2021, a redução do quantitativo de cargos comissionados ou mesmo a reestruturação de cargos e carreiras que acarrete permanente diminuição de despesas com pessoal é providência louvável e que deve incentivada aos gestores públicos. Muito melhor que permanecer de braços cruzados, mantendo vetustas e dispendiosas estruturas de cargos, esperando a crise passar, apenas fazendo o mínimo possível para evitar ultrapassar limites de gastos no período.

De qualquer modo, nunca demais lembrar que deve tanto a

sanção da lei fixadora de vencimentos, quanto a nomeação dos cargos em comissão seguir o procedimento de estilo do direito financeiro, isto é, cumprir os requisitos do art. 169, § 1º, da CRFB e dos arts. 16 e 16 da LRF. Ademais, cumpre atentar para a exigência do art. 8º, VIII, da LC nº 173/2020 de que o total de despesas obrigatórias da Câmara não poderá variar positivamente acima do IPCA desde o dia 28 de maio de 2020 até o dia 31 de dezembro de 2021.

Em vista de todo o exposto, desde que atendidos todos os

requisitos aventados ao longo do parecer, afigura-se viável a sanção e a nomeação dos cargos em comissão criados em decorrência da extinção de outros, uma vez que, segundo informa o consulente, houve redução do quantitativo e do montante de despesas de pessoal.

É o parecer, s.m.j.

Gustavo da Costa Ferreira M. dos Santos

Consultor Técnico

Aprovo o parecer

Marcus Alonso Ribeiro Neves

Consultor Jurídico

Rio de Janeiro, 04 de junho de 2020.

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Parecer IBAM Nº 1241/2020

FM – Finanças Municipais, SM – Servidor Público. Programa Federativo de Enfrentamento ao Coronavírus SARS-CoV-2 (Covid-19). Art. 8º da LC nº 173/2020 e art. 21 da LRF. Parâmetros e restrições aplicáveis na concessão promoções e progressões previstas em plano de cargos e carreiras. Comentários.

CONSULTA:

A Câmara Municipal consulta este Instituto a respeito do disposto no inciso I do artigo 8º da Lei Complementar nº 173, de 27 de maio de 2020, que assim dispõe:

"Art. 8º Na hipótese de que trata o art. 65 da Lei

Complementar nº 101, de 4 de maio de 2000, a União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios afetados pela calamidade pública decorrente da pandemia da Covid-19 ficam proibidos, até 31 de dezembro de 2021, de:

I - conceder, a qualquer título, vantagem, aumento,

reajuste ou adequação de remuneração a membros de Poder ou de órgão, servidores e empregados públicos e militares, exceto quando derivado de sentença judicial transitada em julgado ou de determinação legal anterior à calamidade pública;"

Aduz o consulente que há dúvida a respeito da implementação

aos servidores dos direitos previstos na Resolução nº 08 e na Lei Municipal nº 5.147, que tratam da progressão horizontal por antiguidade e por merecimento, e que avalia entre outros, a disciplina, assiduidade, urbanidade dos servidores. Como a avaliação por merecimento não está

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ligada à questão apenas da contagem de tempo de serviço, e a legislação que a garante ao servidor é anterior ao ano de 2020, perguntamos a progressão poderá continuar a ser realizada durante o período previsto pela Lei Complementar nº 173/2020.

Outra dúvida acerca das vedações trazidas para a Administração

Pública pela Lei Complementar nº 173, de 27 de maio de 2020, diz respeito à possibilidade de concessão de vantagens a servidores caso o órgão público comprove que não houve aumento das despesas com pessoal, sendo mantidos todos os limites constitucionais apurados no exercício anterior.

A consulta vem documentada.

RESPOSTA:

Diante do acelerado avanço da pandemia do novo Coronavírus

(Covid-19) e das relevantes repercussões econômicas da calamidade que vivenciamos, foi editada a Lei Complementar nº 173/2020 para fazer frente à premente necessidade de contenção dos gastos púbicos, visando à promoção de um esforço conjunto de todos os entes da federação, em espírito de cooperação, para superação dos efeitos deletérios da propagação da infecção viral sobre a economia. Assim é que a referida LC nº 173/2020 promoveu sensíveis e relevantes alterações na Lei Complementar nº 101/2000 (Lei de Responsabilidade Fiscal — LRF), que dizem respeito a despesas de pessoal realizadas no fim do mandato.

Antes, é bom dizer que não se trata a LC nº 173/2020 apenas de

uma lei que visou a impor restrições na execução orçamentária, na realização de gastos públicos e aumentos a servidores. Ela se trata, como já aponta sua ementa, de um Programa Federativo de Enfrentamento ao Coronavírus, que envolve auxílio financeiro da União aos Estados e Municípios, acompanhado de contrapartidas, conduzido sob o espírito do federalismo fiscal.

A LC nº 173/2020 tem supedâneo, assim, na competência da

União prevista no art. 24, parágrafo único, tendo em vista o equilíbrio do desenvolvimento e do bem- estar em âmbito nacional, e também no art.

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169, § 9º, da CRFB, visando à gestão responsável das finanças públicas de aplicabilidade a todas as esferas da federação, bem como a situação de excepcional limitação causada pela crise econômica em curso.

Assim, além das alterações permanentes no art. 21 da LRF, cabe

nesse momento muita atenção ao art. 8º da própria LC nº 173/2020, que contêm disposições temporárias que se aplicarão até o dia 31 de dezembro de 2021 e que dizem respeito diretamente à presente consulta.

Pertinente, nesse passo, trazer à colação o disposto no art. 21 da

LRF, já com redação conferida pelo art. 7º da LC nº 173/2020:

“Art. 21. É nulo de pleno direito:

I - o ato que provoque aumento da despesa com pessoal e

não atenda:

a) às exigências dos arts. 16 e 17 desta Lei Complementar e o disposto no inciso XIII do caput do art. 37 e no § 1º do art. 169 da Constituição Federal;

b) ao limite legal de comprometimento aplicado às

despesas com pessoal inativo;

II - o ato de que resulte aumento da despesa com pessoal nos 180 (cento e oitenta) dias anteriores ao final do mandato do titular de Poder ou órgão referido no art. 20;

III - o ato de que resulte aumento da despesa com

pessoal que preveja parcelas a serem implementadas em períodos posteriores ao final do mandato do titular de Poder ou órgão referido no art. 20;

IV - a aprovação, a edição ou a sanção, por Chefe

do Poder Executivo, por Presidente e demais membros da Mesa ou órgão decisório equivalente do Poder Legislativo, por Presidente de Tribunal do Poder Judiciário e pelo Chefe do Ministério Público, da União e dos Estados, de norma legal contendo plano de

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alteração, reajuste e reestruturação de carreiras do setor público, ou a edição de ato, por esses agentes, para nomeação de aprovados em concurso público, quando:

a) resultar em aumento da despesa com pessoal nos 180

(cento e oitenta) dias anteriores ao final do mandato do titular do Poder Executivo; ou

b) resultar em aumento da despesa com pessoal que

preveja parcelas a serem implementadas em períodos posteriores ao final do mandato do titular do Poder Executivo.

§ 1º As restrições de que tratam os incisos II, III e IV:

I - devem ser aplicadas inclusive durante o período de

recondução ou reeleição para o cargo de titular do Poder ou órgão autônomo; e

II - aplicam-se somente aos titulares ocupantes de cargo

eletivo dos Poderes referidos no art. 20.

§ 2º Para fins do disposto neste artigo, serão considerados atos de nomeação ou de provimento de cargo público aqueles referidos no § 1º do art. 169 da Constituição Federal ou aqueles que, de qualquer modo, acarretem a criação ou o aumento de despesa obrigatória.” (grifo nosso)

Antes da alteração promovida pelo art. 7º da LC nº 173/2020 à

LC nº 101/2000, havia balizado entendimento, encampado pelo IBAM e pelo Tribunal de Contas da União (cf. Acórdão TCU nº 1106/2008, publicado em 06/11/2008) de que o ato de que resultava o aumento da despesa de pessoal consistia na lei ou norma criadora da despesa, e não propriamente no ato administrativo ou de gestão que materializa a despesa. Assim, a implementação de despesa que decorria automática e diretamente da lei, quando devidamente atendidas as exigências do art. 169, § 1º da CRFB, bem como observados os princípios da razoabilidade, da proporcionalidade e da continuidade administrativa, se encontrava imune à vedação do art. 21, parágrafo único, em sua redação original,

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como era o caso de progressões, promoções e anuênios.

No entanto, as novíssimas alterações no art. 21 da LRF acenam no sentido de que o legislador encampou entendimento, já adotado em alguns tribunais de contas estaduais, no sentido de que o ato que provoca aumento de despesa de pessoal abrange tanto a lei que cria a obrigação de despesa, como também o ato administrativo concreto que materializa a obrigação de despesa, isto é, a execução orçamentária.

De qualquer modo, em relação às normas de progressão e

promoção funcional, observa-se no inciso IV, alíneas "a" e "b" do mesmo art. 21 da LRF, que o texto legal faz clara referência à proibição da edição de "norma legal contendo plano de alteração (...) e reestruturação de

carreiras do setor público" que "resultar em aumento de despesa com

pessoal" ou "preveja parcelas a serem implementadas" após o fim do mandato. A LRF e a LC nº 173/2020, evidentemente, não retroagem para tornar totalmente ineficazes os planos de carreiras já existentes e em plena vigência, apenas impondo restrições e parâmetros financeiros para que possam ser aplicados com responsabilidade fiscal.

Desse modo, a interpretação mais segura do dispositivo é que a

implementação da progressão ou promoção nos últimos 180 dias de mandato, enquanto vedados atos de que resultem aumento de despesa de pessoal (art. 21 da LRF) apenas se viabiliza caso: i) exista previsão da progressão ou promoção no plano de cargos e carreiras existente e em vigor antes do período de vedação (180 dias antes do fim do mandato); ii) exista prévia dotação na Lei Orçamentária Anual, e autorização específica na Lei de Diretrizes Orçamentárias (art. 169, § 1º, da CRFB) e compatibilidade com o Plano Plurianual, bem como sejam atendidas as demais exigências da LRF, nomeadamente as do art. 16 e 17; e iii) que os percentuais com despesa de pessoal em face da receita corrente líquida não aumentem no decorrer dos 180 dias que antecedem o fim do mandato, de modo a não restar configurado aumento de despesa de pessoal vedado pelo texto da LRF.

De qualquer modo, é importante rememorar que estão em vigor

desde o dia 28 de maio de 2020, as excepcionais restrições previstas no art. 8º da LC nº 173/2020, mais severas que as do art. 21 da LRF. Assim,

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a verdade é que no presente momento, até o dia 31 de dezembro de 2021, cabe atentar para essas disposições excepcionais, as quais transcrevemos:

"Art. 8º Na hipótese de que trata o art. 65 da Lei

Complementar nº 101, de 4 de maio de 2000, a União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios afetados pela calamidade pública decorrente da pandemia da Covid-19 ficam proibidos, até 31 de dezembro de 2021, de:

I - conceder, a qualquer título, vantagem, aumento,

reajuste ou adequação de remuneração a membros de Poder ou de órgão, servidores e empregados públicos e militares, exceto quando derivado de sentença judicial transitada em julgado ou de determinação legal anterior à calamidade pública;

(...)

III - alterar estrutura de carreira que implique aumento de despesa;

(...)

VI - criar ou majorar auxílios, vantagens, bônus, abonos, verbas de representação ou benefícios de qualquer natureza, inclusive os de cunho indenizatório, em favor de membros de Poder, do Ministério Público ou da Defensoria Pública e de servidores e empregados públicos e militares, ou ainda de seus dependentes, exceto quando derivado de sentença judicial transitada em julgado ou de determinação legal anterior à calamidade;

VII - criar despesa obrigatória de caráter continuado,

ressalvado o disposto nos §§ 1º e 2º;

VIII - adotar medida que implique reajuste de despesa obrigatória acima da variação da inflação medida pelo Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA), observada a

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preservação do poder aquisitivo referida no inciso IV do caput do art. 7º da Constituição Federal;

IX - contar esse tempo como de período aquisitivo

necessário exclusivamente para a concessão de anuênios, triênios, quinquênios, licenças-prêmio e demais mecanismos equivalentes que aumentem a despesa com pessoal em decorrência da aquisição de determinado tempo de serviço, sem qualquer prejuízo para o tempo de efetivo exercício, aposentadoria, e quaisquer outros fins.

§ 1º O disposto nos incisos II, IV, VII e VIII do caput deste

artigo não se aplica a medidas de combate à calamidade pública referida no caput cuja vigência e efeitos não ultrapassem a sua duração.

§ 2º O disposto no inciso VII do caput não se aplica em

caso de prévia compensação mediante aumento de receita ou redução de despesa, observado que:

I - em se tratando de despesa obrigatória de caráter

continuado, assim compreendida aquela que fixe para o ente a obrigação legal de sua execução por período superior a 2 (dois) exercícios, as medidas de compensação deverão ser permanentes; e

II - não implementada a prévia compensação, a lei ou o

ato será ineficaz enquanto não regularizado o vício, sem prejuízo de eventual ação direta de inconstitucionalidade.

§ 3º A lei de diretrizes orçamentárias e a lei orçamentária

anual poderão conter dispositivos e autorizações que versem sobre as vedações previstas neste artigo, desde que seus efeitos somente sejam implementados após o fim do prazo fixado, sendo vedada qualquer cláusula de retroatividade.

(...)

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5º O disposto no inciso VI do caput deste artigo não se aplica aos profissionais de saúde e de assistência social, desde que relacionado a medidas de combate à calamidade pública referida no caput cuja vigência e efeitos não ultrapassem a sua duração.

§ 6º (VETADO)." (grifo nosso)

Observa-se, portanto, que o art. 8º do art. 173/2020 impõe ainda

mais restrições que o art. 21 da LRF acima colacionado. Assim, pertinente é compreender a amplitude e os parâmetros para aplicação do aludido dispositivo de vigência temporária, que deve ser observado, como dito, desde o dia 28 de maio de 2020 até o dia 31 de dezembro de 2021.

Ora, o art. 8º, I, da LC nº 173/2020, ao vedar a concessão, a

qualquer título, de vantagem, aumento, reajustes ou adequação de remuneração dos servidores, excepciona aquelas que decorram de determinação legal anterior à calamidade pública.

Quando se fala em promoção ou progressão horizontal, refere-se

a disposições relacionadas à evolução funcional previstas no plano de cargos e carreiras. Supõe-se, portanto, que se tratam justamente de determinações legais anteriores à calamidade pública, uma vez que a lei que cria os critérios e parâmetros de promoção e progressão funcional já estava em vigor antes da pandemia.

Importa notar, também, que o próprio art. 8º, no inciso III, veda a

alteração da estrutura de carreira que implique aumento de despesa. A contrário sensu, a estrutura de carreiras já prevista em lei anterior à calamidade continua em vigor e tem aplicabilidade, estando albergada pela exceção expressa prevista no dispositivo.

No entanto, cabe salientar que não se tratando a promoção

funcional de medida destinada especificamente ao combate à calamidade pública, mas fato funcional relacionado à organização dos cargos e carreiras da Câmara, deve sua concretização condicionar- se ao atendimento do disposto nos arts. 16 e 17 da LC nº 101/2001, por não se enquadrar no permissivo do art. 65, § 1º III da LC nº 101/2000, com

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redação dada pela LC nº 173/2020. Com efeito, os servidores da Câmara não estão envolvidos diretamente em medidas de combate à calamidade púbica, exceção prevista no § 1º do art. 8º da LC nº 173/2020.

Outra limitação importante é que o gasto global com a folha de

pagamento, que se enquadra no conceito de despesa obrigatória, não pode ser majorado acima do IPCA, conforme determina o art. 8º, VIII, da LC nº 173/2020, até o dia 31 de dezembro de 2021. Na prática, o dispositivo acabará por restringir bastante as promoções, que apenas se viabilização caso a dispêndio nominal com folha de pagamento não varie acima do IPCA, em cumprimento do disposto no art. 8º, VIII, da LC nº 173/2020.

Convém observar, ainda, que, como já dito anteriormente, a

redação conferida ao art. 21 da LRF encampa entendimento de que o ato criador da despesa não é apenas a lei que cria o cargo ou os mecanismos de promoção, mas também o ato de execução orçamentária que provoca o aumento de despesa, isto é, a concessão da progressão horizontal. Portanto, o aumento remuneratório decorrente de promoção deve observar o art. 8º, inciso VII e seu § 2º da LC nº 173/2020, isto é, apenas pode ocorrer caso haja prévia compensação mediante aumento da receita ou redução de despesa, bem como atendimento aos requisitos do art. 169, § 1º, da CRFB.

Quando tratávamos do art. 21, II, III e IV da LRF, já com redação

conferida pelo art. 7º da LC nº 173/2020, foi dito que para atender ao comando de que não se aumentem despesas com pessoal nos últimos 180 dias de mandato, a interpretação mais segura é que se mantenham os percentuais com despesa de pessoal em face da receita corrente líquida, para que não sejam majorados no período de 180 dias que antecedem o mandato. Aqui, é importante apontar a diferença para o que dispõe o art. 8º, §2º, I e II, que é mais restritivo e se aplica desde o dia 28 de maio de 2020 até 31 de dezembro de 2021.

Enquanto a aferição do percentual da receita corrente líquida

para fins de observância da restrição ao aumento de despesa de pessoal nos últimos 180 dias de mandato (art. 21, da LRF) é verificada no decorrer daquele período, o art. 8º, § 2º, I e II vai além, ao dizer que caso o

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incremento da despesa de pessoal perdure por mais de dois exercícios — critério objetivo adotado para ser considerada a despesa de caráter continuado—, deve haver medida de compensação consistente em redução de despesa ou incremento da receita permanente. O inciso II do § 2º do art. 8º diz que, caso não seja implementada prévia medida compensatória de caráter permanente, o ato que aumenta despesa de pessoal ficará ineficaz. Portanto, essa é outra condição objetiva para que seja viável a promoção ou progressão horizontal no período que começou em 28 de maio de 2020 e vai até 31 de dezembro de 2021. Nesse período de excepcional contenção de gastos, enquanto não for atendida a exigência de compensação prevista no art. 8º, § 2º, inciso II, resta ineficaz a disposição legal que prevê a promoção ou progressão horizontal.

Por fim, é de se observar que durante a vigência do art. 8º, de 28

de maio de 2020 a 31 de dezembro de 2021, é absolutamente proibido o cômputo de tempo para fins de qualquer incremento remuneratório que decorra exclusivamente de determinado tempo de serviço (inciso IX). Assim, encontra-se vedada a progressão por antiguidade "automática" prevista no art. 5º, § 2º da Lei Municipal nº 5.147/2009, bem como qualquer outro mecanismo de aumento remuneratório baseado no tempo de serviço computado entre 28 de maio de 2020 e 31 de dezembro de 2021.

Em vista de tudo que foi exposto, conclui-se que a progressão ou

promoção no período de vigência do art. 8º da Lei Complementar nº 173/2020, de 28 de maio de 2020 a 31 de dezembro de 2021, apenas será possível se atendidos os seguintes requisitos: i) exista previsão da progressão ou promoção no plano de cargos e carreiras existente e em vigor antes do período de vedação; ii) que exista prévia dotação na Lei Orçamentária Anual, e autorização específica na Lei de Diretrizes Orçamentárias (art. 169, § 1º, da CRFB) e compatibilidade com o Plano Plurianual, bem como sejam atendidos os requisitos dos arts. 16 e 17 da LRF; iii) que os percentuais com despesa de pessoal em face da receita corrente líquida não aumentem no decorrer dos 180 dias que antecedem o fim do mandato; iv) que haja prévia compensação permanente mediante aumento da receita ou diminuição da despesa de caráter continuado, considerada esta aquela que perdure por mais de 2 exercícios, sob pena de restar o ato de promoção ou progressão ineficaz até a implementação

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da compensação; v) que o dispêndio nominal global não varie positivamente acima da variação do IPCA; e vi) que não consista em progressão ou promoção automática com base no tempo de serviço computado de 28 de maio de 2020 a 31 de dezembro de 2021, devendo obrigatoriamente haver outros critérios relacionados ao merecimento para que possa ocorrer.

É o parecer, s.m.j.

Gustavo da Costa Ferreira M. dos Santos

Consultor Técnico

Aprovo o parecer

Marcus Alonso Ribeiro Neves Consultor Jurídico

Rio de Janeiro, 05 de junho de 2020.

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Parecer IBAM Nº 1242/2020

SM – Servidor Público. Conversão de 1/3 das férias em pecúnia. Previsão no Estatuto dos servidores local. LC nº 173/2020. Considerações.

CONSULTA:

Tendo em vista o advento da LC nº 173/2020, indaga o

consulente acerca da possibilidade de conversão de 1/3 de férias de servidor em pecúnia.

A consulta não veio documentada.

RESPOSTA:

Inicialmente, para o escorreito deslinde da questão em tela, vale

registrar que é da competência do Município dispor sobre o regime jurídico de seus servidores públicos (art. 39, caput, da Constituição Federal). Assim, caberá à legislação local estabelecer requisitos de acesso, bem como direitos, deveres e vantagens dos ocupantes de cargos públicos. Vale mencionar, no que tange à concessão de vantagens aos servidores, que a atuação da Administração encontra-se jungida à observância do princípio constitucional da legalidade, encartado no art. 37, caput, da Constituição.

Dentre os direitos constitucionais conferidos aos trabalhadores,

está o gozo de férias anuais remuneradas com, pelo menos, um terço a mais do que o salário normal, conforme expresso no pelo art. 7º, XVII. Esse direito foi estendido aos servidores públicos por força do disposto no art. 39, § 3º, que manda aplicar-lhes alguns dos incisos constantes do dito art. 7º.

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Além disso, é muito comum que os estatutos funcionais disponham, em termos semelhantes ao art. 143 da Consolidação das Leis do Trabalho, pela possibilidade de conversão de 1/3 das férias em pecúnia. Neste ponto, reiteramos a aplicação do princípio constitucional da legalidade para registrar que a conversão de 1/3 das férias em pecúnia somente será possível com expressa previsão no estatuto dos Servidores.

Pois bem, feitas estas considerações introdutórias, o consulente

nos informa que o art. 116, § 5º do Estatuto dos servidores local, dispõe da seguinte forma:

"Art. 116: (...)

§ 5º Será permitida a conversão de 1/3 (um terço) das

férias em dinheiro, mediante requerimento do servidor, apresentado 30 (trinta) dias antes do seu início, vedada qualquer outra hipótese de conversão em dinheiro. "

Em cotejo, temos que a rápida expansão da pandemia do Novo

Coronavírus (COVID-19) impôs sérias restrições ao nosso modo de vida, sendo certo que as recomendações de distanciamento social e de quarentena geram uma redução substancial da circulação de pessoas, que levam, por sua vez, a impactos sensíveis nas mais diversas áreas da sociedade e, por conseguinte, a necessidade de organização da Administração Pública para atendimento das demandas e manutenção do bem comum.

Diante do acelerado avanço da doença no Brasil e dos múltiplos

desdobramentos no campo da saúde e da economia, ao longo deste ano de 2020, os poderes Executivo, Legislativo e Judiciário têm adotado, proposto ou sugerido medidas, providências ou ordens, de conteúdos diversos, para instrumentalizar o Poder Público e a sociedade em geral com os meios que se reputam oportunos e necessários para enfrentamento da crise.

Neste contexto, em 28 de maio de 2020, entrou em vigor a LC nº

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173/2020 que encarta o Programa Federativo de Enfrentamento ao Coronavírus, que estabelece medidas de socorro financeiro da União para os demais entes federativos mediante algumas contrapartidas negociadas pelo Executivo com o Senado Federal. A referida lei complementar também trouxe sensíveis modificações na LRF (LC nº 101/2000).Dentre suas disposições transitórias, a LC nº 173/2020, mais precisamente em seu art. 8º, I, veda até 31 de dezembro de 2021 a concessão de qualquer vantagem, aumento, reajuste ou adequação aos servidores, excepcionando em sua parte final aquelas decorrentes de decisões judiciais que assim venham a determinar, bem como aquelas provenientes de determinação legal anterior à calamidade pública.

"Art. 8º Na hipótese de que trata o art. 65 da Lei

Complementar nº 101, de 4 de maio de 2000, a União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios afetados pela calamidade pública decorrente da pandemia da Covid-19 ficam proibidos, até 31 de dezembro de 2021, de:

I - conceder, a qualquer título, vantagem, aumento,

reajuste ou adequação de remuneração a membros de Poder ou de órgão, servidores e empregados públicos e militares, exceto quando derivado de sentença judicial transitada em julgado ou de determinação legal anterior à calamidade pública;

Analisando o teor do inciso I do art. 8º acima transcrito, temos

que com relação as vantagens decorrentes de decisões judiciais, o trecho é autoexplicativo e não enseja maiores dúvidas. Por outro lado, no que tange àquelas provenientes de determinação legal anterior à calamidade pública, vale registrar que aqueles direitos, vantagens que o servidor já fazia jus por ocasião do reconhecimento da situação de calamidade pública em âmbito nacional pelo Decreto Legislativo nº 06/2020 (em 20/03/2020) devem ser pagos/concedidos.

Pois bem. Tendo em vista que a conversão em pecúnia de 1/3

das férias não caracteriza, ao nosso sentir, vantagem, aumento, reajuste ou adequação de remuneração, mas uma verba de natureza indenizatória,

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não vislumbramos óbices à conversão desde que observados os ditames do Estatuto do servidor. Neste ponto, há de se considerar que a conversão em pecúnia de 1/3 das férias para que o servidor prossiga no exercício de suas atividades pode, inclusive, atender ao interesse público ante a situação de calamidade pública vivenciada.

De outro lado, alertamos que, à luz do postulado da moralidade

(art. 37, caput, da Constituição Federal) caso tenham sido adotadas medidas de distanciamento social, para aqueles servidores cujas atividades não permitem o home office ou o teletrabalho, estando eles afastados do exercício de suas funções, não há que se cogitar "venda" de 1/3 das férias.

Isto posto, concluímos objetivamente a presente consulta na

forma das razões exaradas.

É o parecer, s.m.j.

Priscila Oquioni Souto

Assessora Jurídica

Aprovo o parecer

Marcus Alonso Ribeiro Neves

Consultor Jurídico

Rio de Janeiro, 05 de junho de 2020.

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Parecer IBAM Nº 1243/2020

SM – Servidor Público. LC nº 173/2020. Concessão de vantagens que decorram de norma anterior à situação de calamidade pública. Possibilidade de previsão na LDO e LOA de dispositivos e atualizações que versem acerca da vedação do art. 8º da LC nº 173/2020. Considerações.

CONSULTA:

Com relação à aplicação do art. 8º da LC nº 173/2020, indaga o

consulente:

"Pelo presente, solicitamos analise das disposições da LC

173/20, que institui o programa federativo para o enfrentamento do

Covid-19, especialmente no que toca à previsão do inciso I do art.

8, que excepcionalmente autoriza a concessão de vantagens,

quando estas decorrentes de normas anteriores.

Por fim, solicitamos orientação quanto a aplicabilidade do

disposto no parágrafo terceiro, do art. 8, da mencionada norma. "

A consulta não veio documentada.

RESPOSTA:

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Inicialmente, como sabido, a rápida expansão da pandemia do

Novo Coronavírus (COVID-19) impôs sérias restrições ao nosso modo de

vida, sendo certo que as recomendações de distanciamento social e de

quarentena geram uma redução substancial da circulação de pessoas,

que levam, por sua vez, a impactos sensíveis nas mais diversas áreas da

sociedade e, por conseguinte, a necessidade de organização da

Administração Pública para atendimento das demandas e manutenção do

bem comum.

Diante do acelerado avanço da doença no Brasil e dos múltiplos

desdobramentos no campo da saúde e da economia, ao longo deste ano

de 2020, os poderes Executivo, Legislativo e Judiciário têm adotado,

proposto ou sugerido medidas, providências ou ordens, de conteúdos

diversos, para instrumentalizar o Poder Público e a sociedade em geral

com os meios que se reputam oportunos e necessários para

enfrentamento da crise.

Neste contexto, em 28 de maio de 2020, entrou em vigor a LC nº

173/2020 que encarta o Programa Federativo de Enfrentamento ao

Coronavírus, que estabelece medidas de socorro financeiro da União para

os demais entes federativos mediante algumas contrapartidas negociadas

pelo Executivo com o Senado Federal. A referida lei complementar

também trouxe sensíveis modificações na LRF (LC nº 101/2000).

Dentre suas disposições transitórias, a LC nº 173/2020, mais

precisamente em seu art. 8º, I, veda até 31 de dezembro de 2021 a

concessão de qualquer vantagem, aumento, reajuste ou adequação aos

servidores, excepcionando em sua parte final aquelas decorrentes de

decisões judiciais que assim venham a determinar, bem como aquelas

provenientes de determinação legal anterior à calamidade pública. Em que

pese não tenha sido indagado pelo consulente não podemos deixar de

mencionar para melhor compreensão o inciso IX deste mesmo dispositivo

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veda a utilização do lapso temporal mencionado no caput para fins de

cômputo de período aquisitivo de determinadas vantagens. Vejamos:

"Art. 8º Na hipótese de que trata o art. 65 da Lei

Complementar nº 101, de 4 de maio de 2000, a União, os Estados,

o Distrito Federal e os Municípios afetados pela calamidade pública

decorrente da pandemia da Covid-19 ficam proibidos, até 31 de

dezembro de 2021, de:

I - conceder, a qualquer título, vantagem, aumento,

reajuste ou adequação de remuneração a membros de Poder ou de

órgão, servidores e empregados públicos e militares, exceto quando

derivado de sentença judicial transitada em julgado ou de

determinação legal anterior à calamidade pública;

(...)

IX - contar esse tempo como de período aquisitivo

necessário exclusivamente para a concessão de anuênios, triênios,

quinquênios, licenças-prêmio e demais mecanismos equivalentes

que aumentem a despesa com pessoal em decorrência da

aquisição de determinado tempo de serviço, sem qualquer prejuízo

para o tempo de efetivo exercício, aposentadoria, e quaisquer

outros fins." (Grifos nossos).

Analisando primeiramente o teor do inciso I do art. 8º acima

transcrito, temos que com relação as vantagens decorrentes de decisões

judiciais, o trecho é autoexplicativo e não enseja maiores dúvidas. Por

outro lado, no que tange àquelas provenientes de determinação legal

anterior à calamidade pública, vale registrar que aqueles direitos,

vantagens que o servidor já fazia jus por ocasião do reconhecimento da

situação de calamidade pública em âmbito nacional pelo Decreto Legislativo

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nº 06/2020 (em 20/03/2020) devem ser pagos/concedidos.

De outra feita, à luz do inciso IX do art. 8º, o período de 20 de

março de 2020 até dezembro de 2021 encontra-se suspenso para fins de

concessão de vantagens que dependam exclusivamente do decurso do

tempo, a exemplo dos anuênios ou licenças prêmio. Isto quer significar

que este lapso temporal somente poderá ser computado para concessão

de tais vantagens após janeiro de 2022, pouco importando se a lei que

criou a vantagem foi editada antes da decretação do estado de calamidade.

Especificamente com relação ao inciso IX do art. 8º da LC nº

173/2020, como aventado acima, a vedação de contagem do tempo se

aplica para concessão de vantagens que decorram exclusivamente do

decurso do tempo, tal como aponta a primeira parte do dispositivo (a

exemplo dos adicionais por tempo de serviço). Ainda exemplificando, as

progressões na carreira, as quais não constituem propriamente vantagem,

aumento, reajuste ou adequação de remuneração, que não decorram

exclusivamente do mero decurso do tempo, exigindo que este fator seja

conjugado com outros (avaliação de desempenho, titulação) não encontra

óbice neste dispositivo.

Assim, no período de 20/03/2020 até 31/12/2021 somente

poderão ser concedidas aquelas vantagens e direitos as quais o servidor

já fazia jus, por lei, antes da situação de calamidade e desde que não se

trate de vantagens que exijam exclusivamente para sua implementação o

decurso do tempo, à luz do inciso IX do art. 8º.

Em prosseguimento, com relação ao § 3º do art. 8º, pedimos

vênia para transcrição do seu teor:

"§ 3º A lei de diretrizes orçamentárias e a lei orçamentária

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anual poderão conter dispositivos e autorizações que versem sobre

as vedações previstas neste artigo, desde que seus efeitos

somente sejam implementados após o fim do prazo fixado, sendo

vedada qualquer cláusula de retroatividade."

Como sabido, a LDO é um instrumento de planejamento de curto

prazo e estabelece metas e prioridades da Administração para o exercício

subsequente. Qualquer concessão de vantagem, aumento de

remuneração, criação de cargos, admissão de pessoal deve estar previsto

na LDO.

Na forma do art. 4º da LRF, necessariamente devem integrar a

LDO o anexo de metas fiscais e o anexo de riscos fiscais. O anexo de

metas fiscais, transforma, em parte, a LDO em um instrumento de

planejamento trienal, na medida que contém, entre outros, metas para

receitas despesas, resultados e montante da dívida para o exercício que

se refere e para os dois seguintes.

Já a LOA é instrumento de planejamento de curto prazo que

contém o orçamento fiscal de toda a Administração Pública Municipal para

um exercício financeiro. A LOA também contém orçamento de

investimento das empresas que o Poder Público detenha maioria do

capital social, o orçamento da seguridade social e demonstrativo de

compatibilidade da programação do orçamento com as metas da LDO

previstas no anexo de metas fiscais.

Deste modo, o referido §3º do art. 8º da LC 173/2020 admite que

a LDO e a LOA, neste último caso a de 2022 que será elaborada em 2021,

contenham dispositivos e autorizações que excepcionem as vedações do

art. 8º, desde que seus efeitos somente sejam implementados após 2022,

não sendo admitida qualquer cláusula de retroatividade.

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Isso possibilita, por exemplo, que a LDO contemple autorização

para realização de concursos públicos neste período, ainda que não seja

para reposição de vacâncias, tal como consta do inciso V do artigo 8º, com

expressa disposição de que as nomeações somente poderão ocorrer após

31/12/2021 e de que a LOA de 2022 deverá contemplar previsão

orçamentária a respeito.

Neste exemplo, contudo, há de ser observado, pelos Municípios,

as restrições do art. 21 da LRF para com a edição de ato que implique em

aumento de despesa nos 180 dias que antecedem o final do mandato do

titular do Poder Executivo, razão pela qual, neste período, resta de todo

vedada qualquer alteração da LDO nesse sentido.

Isto posto, concluímos objetivamente a presente consulta na

forma das razões aduzidas.

É o parecer, s.m.j.

Priscila Oquioni Souto

Assessora Jurídica

Aprovo o parecer

Marcus Alonso Ribeiro Neves

Consultor Jurídico

Rio de Janeiro, 05 de junho de 2020.

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Parecer IBAM Nº 1254/2020

SM – Servidor Público. Concessão de bônus aos servidores da área da saúde que atuam no combate à pandemia da COVID-19. Ano de eleições municipais. LC nº 173/2020. Considerações.

CONSULTA:

Tendo em vista as eleições municipais do corrente ano, bem

como o advento da LC nº 173/2020, indaga o consulente:

"1) Seria possível a concessão de bônus aos prestadores

de serviços da saúde que atuarem no combate à calamidade

pública no período de duração da pandemia?

2) Referido bônus se enquadraria no impedimento a que

alude o inciso V (readaptação de vantagens - cujo impedimento se

restringe a 3 meses antes do pleito) ou inciso VIII (revisão geral -

cujo impedimento se restringe a 6 meses anteriores ao pleito)?

3) A concessão do bônus estaria permitida pelo inciso VI

do artigo 8º da LC 173/20. Todavia, existe algum impedimento em

razão da restrição contida no inciso I da mesma lei complementar?"

A consulta não veio documentada.

RESPOSTA:

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Inicialmente, cumpre consignar que as normas relativas aos

servidores municipais reputam-se assunto de exclusiva competência

legislativa do Município (art. 39, caput, da Constituição Federal), por força

da autonomia político-administrativa que lhe foi outorgada pela

Constituição de 1988, nos termos dos seus arts. 1º, 18, 29 e 30. Cabe ao

Município, pois, a organização do regime funcional de seus servidores,

incluindo-se, aí, as regras sobre a composição do sistema remuneratório e

demais vantagens e benefícios funcionais. Para tanto, impõe-se observar

os comandos constitucionais dirigidos ao servidor público, em especial nos

arts. 37 a 41, bem como os preceitos das Leis de caráter complementar.

No tocante à remuneração dos servidores municipais, impõe-se a

obediência aos preceitos constitucionais atinentes à matéria, pelo que

cabe destacar, em particular, os critérios para a composição do sistema

remuneratório dos servidores (art. 39, § 1º), o teto dos vencimentos pagos

pelo Executivo (art. 37, XII), a vedação de vinculação ou equiparação de

quaisquer espécies remuneratórias (art. 37, XIII) e a existência de prévia

dotação orçamentária suficiente para atender às projeções de despesa

com pessoal e aos acréscimos dela decorrentes, além de autorização

específica na Lei de Diretrizes Orçamentárias (art. 169, § 1º).

Em se tratando de vantagem funcional aplicável a todos os

servidores públicos municipais, é importante frisar que matéria relativa a

direitos e deveres dos servidores públicos reputa-se de iniciativa

reservada ao Chefe do Executivo, consoante o disposto do art. 61, § 1º, II,

"c" da Constituição Federal, preceito aplicável aos Municípios por força da

simetria das formas, uma vez que decorre do princípio fundamental da

separação dos Poderes consagrado no art. 2º.

Dentro do contexto apresentado, as vantagens são gênero do

qual são espécies as gratificações de serviço, sendo assuntos intimamente

ligados a direitos e deveres dos servidores, razão pela qual a matéria recai

na competência privativa do Chefe do Poder Executivo, segundo Hely

Lopes Meirelles, as vantagens, gênero a que pertencem os adicionais e as

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gratificações, podem ser pro labore facto, devidas pelo trabalho feito (no

passado), ou pro labore faciendo, devidas pelo trabalho sendo feito (no

presente). Podem ser, ainda, ex facto temporis, as que decorrem do tempo

de serviço (ex.: adicional por tempo de serviço), ex facto officii, as devidas

pelo exercício de funções especiais (ex.: gratificação por exercício de

função de confiança), propter laborem, em função das condições anormais

em que o serviço é prestado (ex.: periculosidade, insalubridade,

produtividade), ou propter personam, em razão de condições pessoais do

servidor (ex.: titulação). O renomado mestre distingue as gratificações de

serviço nos seguintes termos:

"Gratificação de serviço - Gratificação de serviço (propter

laborem) é aquela que a Administração institui para recompensar

riscos ou ônus decorrentes de trabalhos normais executados em

condições anormais de perigo ou de encargos para o funcionário,

tais como os serviços realizados com risco de vida e saúde, ou

prestados fora do expediente, da sede ou das atribuições ordinárias

do cargo. O que caracteriza essa modalidade de gratificação é a sua

vinculação a um serviço comum, executado em condições

excepcionais para o funcionário, ou a uma situação normal do

serviço, mas que acarreta despesas extraordinárias para o

servidor. Nessa categoria de gratificações entram, dentre outras, as

que a Administração paga pelos trabalhos realizados com risco de

vida e saúde; pelos serviços extraordinários; pelo exercício do

magistério; pela representação de gabinete; pelo exercício

em determinadas zonas ou locais; pela execução de trabalho técnico

ou científico não decorrente do cargo; pela participação em banca

examinadora ou comissão de estudo ou de concurso;

pela transferência de sede (ajuda de custo); pela prestação

de serviços fora da sede (diárias). Essas gratificações são devidas

ao servidor somente enquanto estiver prestando o serviço que

as ensejam, porque são retribuições pecuniárias pro labore faciendo

ou são propter laborem. Cessado o trabalho que lhes dá causa,

ou desaparecidos os motivos excepcionais e transitórios que a

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justificam, extingue-se a razão de seu pagamento. Daí por que não

se incorporam automaticamente ao vencimento, nem são auferidas

na disponibilidade e na aposentadoria". (In: MEIRELLES, Hely

Lopes. Direito Administrativo. 25ª ed. São Paulo: Malheiros, 2000.

p. 409). (Grifos nossos).

Em cotejo, tendo em vista que até a presente data o TSE

mantém o Calendário Eleitoral (Resolução nº 23.606/2019), vale registrar

que a Lei nº 9.504/1997, em seu artigo 73, veda apenas as "condutas

tendentes a afetar a igualdade de oportunidades entre candidatos nos

pleitos eleitorais." As ações que não influenciem a disputa eleitoral não

são proibidas mesmo em datas próximas às eleições.

Desta feita, esta Consultoria Jurídica já se posicionou no sentido

de que tendo em vista que a concessão de gratificação a poucos

servidores que realizaram atividade específica temporariamente durante a

emergência de saúde, não é, em princípio, capaz de influenciar as

eleições municipais, a concessão da gratificação, mesmo em período

próximo ao pleito eleitoral, é lícita. (Parecer/IBAM nº 0829/2020).

Não obstante todas as considerações que trouxemos até aqui, há

de se observar as disposições da LC nº 173/2020, a qual encarta o

Programa Federativo de Enfrentamento ao Coronavírus, que prestará

auxílio financeiro mediante algumas contraprestações.

Pois bem, o art. 8º, I e VI, da LC nº 173/2020 dispõe da seguinte

forma:

"Art. 8º Na hipótese de que trata o art. 65 da Lei

Complementar nº 101, de 4 de maio de 2000, a União, os Estados,

o Distrito Federal e os Municípios afetados pela calamidade pública

decorrente da pandemia da Covid-19 ficam proibidos, até 31 de

dezembro de 2021, de:

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I - conceder, a qualquer título, vantagem, aumento,

reajuste ou adequação de remuneração a membros de Poder ou

de órgão, servidores e empregados públicos e militares, exceto

quando derivado de sentença judicial transitada em julgado ou de

determinação legal anterior à calamidade pública;

(...)

VI - criar ou majorar auxílios, vantagens, bônus, abonos,

verbas de representação ou benefícios de qualquer natureza,

inclusive os de cunho indenizatório, em favor de membros de

Poder, do Ministério Público ou da Defensoria Pública e de

servidores e empregados públicos e militares, ou ainda de seus

dependentes, exceto quando derivado de sentença judicial

transitada em julgado ou de determinação legal anterior à

calamidade;

§ 1º O disposto nos incisos II, IV, VII e VIII do caput deste

artigo não se aplica a medidas de combate à calamidade pública

referida no caput cuja vigência e efeitos não ultrapassem a sua

duração." (Grifos nossos).

Vale lembrar que o PLP nº 39/2020 do qual se originou a LC nº

173/2020 continha previsão de um § 6º neste artigo 8, o qual

excepcionava o inciso I com relação aos servidores diretamente

envolvidos no combate à pandemia da COVID-19. Todavia, tal dispositivo

foi vetado pelo Presidente da República sob a justificativa de que ao

excepcionar das restrições do art. 8º parte significativa das carreiras do

serviço público, viola o interesse público por acarretar em alteração da

Economia Potencial Estimada.

Desta sorte, em que pese não existam óbices na legislação

eleitoral, não se revela factível a instituição de bônus, vantagem ou

gratificação aos servidores municipais da área da saúde que estejam

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atuando na linha de frente do combate à pandemia da COVID-19, à luz

dos incisos I e VI do art. 8º da LC nº 173/2020.

Neste ponto, vale frisar que a afirmação que o consulente faz

sobre o inciso VI do art. 8º no sentido de que a concessão de bônus é

possível não é verídica, tal exceção não se encontra no texto do inciso VI

ou mesmo do § 1º, como se pode depreender da leitura dos referidos

dispositivos.

Isto posto, concluímos objetivamente a presente consulta na

forma das razões exaradas.

É o parecer, s.m.j.

Priscila Oquioni Souto

Assessora Jurídica

Aprovo o parecer

Marcus Alonso Ribeiro Neves

Consultor Jurídico

Rio de Janeiro, 05 de junho de 2020.

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Parecer IBAM Nº 1261/2020

FM – Finanças Municipais, SM – Servidor Público. LC nº 173/2020. Parâmetros e condições para implementação de adicional de titulação previsto em lei em vigor antes da calamidade pública. Considerações.

CONSULTA:

A Câmara Municipal solicita deste Instituto parecer a

respeito da aplicabilidade da recente Lei Complementar nº 173/2020 no âmbito desta Câmara.

Informa que a Lei Municipal nº 4.454/2019, que dispõe sobre o

plano de carreira dos servidores públicos da Câmara Municipal, disciplina a concessão de progressão por merecimento, em seu art. 11, trata da concessão de incentivo à qualificação por nova titulação.

A dúvida consiste na possibilidade de concessão de do "Incentivo

à Qualificação por Nova Titulação", de que trata o art. 14 e seguintes, tendo em conta que o art. 8º da LC nº 173 traz a ressalva de que pode ser concedida a vantagem em caso de "determinação legal anterior à pandemia".

Aduz o consulente, que a Lei Municipal nº 4.454 foi editada em 3

de dezembro de 2019, antes, portanto, da pandemia.

Indaga, portanto, se pode a Câmara conceder o incentivo à

qualificação por nova titulação para o servidor que apresentar certificado de pós-graduação no ano em curso.

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A consulta vem documentada.

RESPOSTA:

Diante do acelerado avanço da pandemia do novo Coronavírus (Covid-19) e das relevantes repercussões econômicas da calamidade que vivenciamos, foi editada a Lei Complementar nº 173/2020 para fazer frente à premente necessidade de contenção dos gastos púbicos, visando à promoção de um esforço conjunto de todos os entes da federação, em espírito de cooperação, para superação dos efeitos deletérios da propagação da infecção viral sobre a economia. Assim é que a referida LC nº 173/2020 promoveu sensíveis e relevantes alterações na Lei Complementar nº 101/2000 (Lei de Responsabilidade Fiscal — LRF), que dizem respeito a despesas de pessoal realizadas no fim do mandato.

Antes, é bom dizer que não se trata a LC nº 173/2020 apenas de

uma lei que visou a impor restrições na execução orçamentária, na realização de gastos públicos e aumentos a servidores. Ela se trata, como já aponta sua ementa, de um Programa Federativo de Enfrentamento ao Coronavírus, que envolve auxílio financeiro da União aos Estados e Municípios acompanhados de contrapartidas, conduzido sob o espírito do federalismo fiscal.

A LC nº 173/2020 tem supedâneo, assim, na competência da

União prevista no art. 24, parágrafo único, tendo em vista o equilíbrio do desenvolvimento e do bem-estar em âmbito nacional, e também no art. 169, § 9º, da CRFB, visando à gestão responsável das finanças públicas de aplicabilidade a todas as esferas da federação, bem como a situação de excepcional limitação causada pela crise econômica em curso.

Assim, além das alterações permanentes no art. 21 da LRF, cabe

nesse momento muita atenção ao o art. 8º da própria LC nº 173/2020, que contêm disposições temporárias que se aplicarão até o dia 31 de dezembro de 2021 e que dizem respeito diretamente à presente consulta.

Pertinente, nesse passo, trazer à colação o disposto no art. 21 da

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LRF, já com redação conferida pelo art. 7º da LC nº 173/2020:

“Art. 21. É nulo de pleno direito:

I - o ato que provoque aumento da despesa com

pessoal e não atenda:

a) às exigências dos arts. 16 e 17 desta Lei

Complementar e o disposto no inciso XIII do caput do art. 37 e no § 1º do art. 169 da Constituição Federal;

b) ao limite legal de comprometimento aplicado às

despesas com pessoal inativo;

II - o ato de que resulte aumento da despesa com

pessoal nos 180 (cento e oitenta) dias anteriores ao final do mandato do titular de Poder ou órgão referido no art. 20;

(...) § 1º As restrições de que tratam os incisos II, III e

IV:

I - devem ser aplicadas inclusive durante o período de recondução ou reeleição para o cargo de titular do Poder ou órgão autônomo; e

II - aplicam-se somente aos titulares ocupantes de

cargo eletivo dos Poderes referidos no art. 20.

§ 2º Para fins do disposto neste artigo, serão

considerados atos de nomeação ou de provimento de cargo público aqueles referidos no § 1º do art. 169 da Constituição Federal ou aqueles que, de qualquer modo, acarretem a

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criação ou o aumento de despesa obrigatória.” (grifo nosso)

Antes da alteração promovida pelo art. 7º da LC nº 173/2020 à LC nº 101/2000, havia balizado entendimento, encampado pelo IBAM e pelo Tribunal de Contas da União (cf. Acórdão TCU nº 1106/2008, publicado em 06/11/2008) de que o ato de que resultava o aumento da despesa de pessoal consistia na lei ou norma criadora da despesa, e não propriamente no ato administrativo ou de gestão que executa a despesa. Assim, a implementação de despesa que decorria automática e diretamente da lei, quando devidamente atendidas as exigências do art. 169, § 1º da CRFB, bem como observados os princípios da razoabilidade, da proporcionalidade e da continuidade administrativa, se encontrava imune à vedação do art. 21, parágrafo único, em sua redação original, como é o caso da vantagem intitulada adicional por titulação.

No entanto, as novíssimas alterações no art. 21 da LRF acenam

no sentido de que o legislador encampou entendimento, já adotado em alguns tribunais de contas estaduais, no sentido de que o ato que provoca aumento de despesa de pessoal abrange tanto a lei que cria a obrigação de despesa, como também o ato administrativo concreto que materializa a obrigação de despesa, isto é, a execução orçamentária. Assim, quando da efetiva implementação do adicional por titulação, deverão ser observadas as restrições aplicáveis em fim de mandato.

Assim, a partir de 5 de julho de 2020 (180 dias finais do

mandato), passa a haver restrições à implementação dos adicionais. A LRF e a LC nº 173/2020, evidentemente, não retroagem para tornar totalmente ineficazes os planos de carreiras já existentes e em plena vigência. Apenas impõe restrições e parâmetros financeiros para que possam ser aplicados com responsabilidade fiscal.

Desse modo, a interpretação mais segura do dispositivo é que a

implementação do adicional de titulação nos últimos 180 dias de mandato, enquanto vedados atos de que resultem aumento de despesa de pessoal (art. 21 da LRF) apenas se viabiliza caso: i) exista previsão do adicional de titulação em vigor antes do período de vedação (180 dias antes do fim do

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mandato); ii) exista prévia dotação na Lei Orçamentária Anual, e autorização específica na Lei de Diretrizes Orçamentárias (art. 169, § 1º, da CRFB) e compatibilidade com o Plano Plurianual, bem como sejam atendidas as demais exigências da LRF, nomeadamente as do art. 16 e 17; e iii) que os percentuais com despesa de pessoal em face da receita corrente líquida não aumentem no decorrer dos 180 dias que antecedem o fim do mandato, de modo a não restar configurado aumento de despesa de pessoal vedado pelo texto da LRF.

De qualquer modo, como bem apontado pelo consulente, o mais

importante é observar que estão em vigor desde o dia 28 de maio de 2020, as excepcionais restrições previstas no art. 8º da LC nº 173/2020, mais severas que as do art. 21 da LRF. Assim, a verdade é que no presente momento, até o dia 31 de dezembro de 2021, cabe atentar para essas disposições excepcionais, que acabam, por serem mais restritivas, se impondo sobre aquelas acima expostas, as quais transcrevemos:

"Art. 8º Na hipótese de que trata o art. 65 da Lei

Complementar nº 101, de 4 de maio de 2000, a União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios afetados pela calamidade pública decorrente da pandemia da Covid-19 ficam proibidos, até 31 de dezembro de 2021, de:

I - conceder, a qualquer título, vantagem, aumento,

reajuste ou adequação de remuneração a membros de Poder ou de órgão, servidores e empregados públicos e militares, exceto quando derivado de sentença judicial transitada em julgado ou de determinação legal anterior à calamidade pública;

(...)

VI - criar ou majorar auxílios, vantagens, bônus,

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abonos, verbas de representação ou benefícios de qualquer natureza, inclusive os de cunho indenizatório, em favor de membros de Poder, do Ministério Público ou da Defensoria Pública e de servidores e empregados públicos e militares, ou ainda de seus dependentes, exceto quando derivado de sentença judicial transitada em julgado ou de determinação legal anterior à calamidade;

VII - criar despesa obrigatória de caráter

continuado, ressalvado o disposto nos §§ 1º e 2º;

VIII - adotar medida que implique reajuste de

despesa obrigatória acima da variação da inflação medida pelo Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA), observada a preservação do poder aquisitivo referida no inciso IV do caput do art. 7º da Constituição Federal;

IX - contar esse tempo como de período aquisitivo

necessário exclusivamente para a concessão de anuênios, triênios, quinquênios, licenças-prêmio e demais mecanismos equivalentes que aumentem a despesa com pessoal em decorrência da aquisição de determinado tempo de serviço, sem qualquer prejuízo para o tempo de efetivo exercício, aposentadoria, e quaisquer outros fins.

§ 1º O disposto nos incisos II, IV, VII e VIII do caput

deste artigo não se aplica a medidas de combate à calamidade pública referida no caput cuja vigência e efeitos não ultrapassem a sua duração.

§ 2º O disposto no inciso VII do caput não se aplica

em caso de prévia compensação mediante aumento de receita ou redução de despesa, observado que:

I - em se tratando de despesa obrigatória de caráter

continuado, assim compreendida aquela que fixe para o ente

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a obrigação legal de sua execução por período superior a 2 (dois) exercícios, as medidas de compensação deverão ser permanentes; e

II - não implementada a prévia compensação, a lei

ou o ato será ineficaz enquanto não regularizado o vício, sem prejuízo de eventual ação direta de inconstitucionalidade.

§ 3º A lei de diretrizes orçamentárias e a lei

orçamentária anual poderão conter dispositivos e autorizações que versem sobre as vedações previstas neste artigo, desde que seus efeitos somente sejam implementados após o fim do prazo fixado, sendo vedada qualquer cláusula de retroatividade.

(...)

§ 5º O disposto no inciso VI do caput deste artigo não

se aplica aos profissionais de saúde e de assistência social, desde que relacionado a medidas de combate à calamidade pública referida no caput cuja vigência e efeitos não ultrapassem a sua duração.

§ 6º (VETADO)." (grifo nosso)

Observa-se, portanto, que o art. 8º do art. 173/2020 impõe ainda

mais restrições que o art. 21 da LRF acima colacionado. Assim, pertinente é compreender a amplitude e os parâmetros para aplicação do aludido dispositivo de vigência temporária, que deve ser observado, desde o dia 28 de maio de 2020 até o dia 31 de dezembro de 2021.

Ora, o art. 8º, I, da LC nº 173/2020, ao vedar a concessão, a

qualquer título, de vantagem, aumento, reajustes ou adequação de remuneração dos servidores, excepciona aquelas que decorram de determinação legal anterior à calamidade pública, como bem apontado pelo consulente.

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Quando se fala em adicional por titulação, refere-se a disposições relacionadas ao incentivo à qualificação previsto no plano de cargos e carreiras. Trata-se de adicional previsto em determinações legais anteriores à calamidade pública, uma vez que a lei que criou os critérios e parâmetros para o adicional por titulação já estava em vigor antes da pandemia.

Importa notar, também, que o próprio art. 8º, no inciso III, veda a

alteração da estrutura de carreira que implique aumento de despesa. A contrário sensu, a estrutura de carreiras já prevista em lei anterior à calamidade continua em vigor e tem aplicabilidade, estando albergada pela exceção expressa prevista no dispositivo.

No entanto, cabe salientar que não se tratando o adicional de

titulação de medida destinada especificamente ao combate à calamidade pública, mas fato funcional relacionado à organização dos cargos e carreiras da Câmara com fins de incentivar a qualificação profissional, deve sua concretização condicionar-se ao atendimento do disposto nos arts. 16 e 17 da LC nº 101/2001, por não se enquadrar no permissivo do art. 65, § 1º III da LC nº 101/2000, com redação dada pela LC nº 173/2020. Com efeito, os servidores da Câmara não estão envolvidos diretamente em medidas de combate à calamidade púbica, exceção prevista no § 1º do art. 8º da LC nº 173/2020.

Outra limitação importante é que o aumento da despesa com a

folha de pagamento, que se enquadra no conceito de despesa obrigatória, não pode fazer com que o valor global das despesas obrigatórias variem positivamente em percentual maior que o do IPCA, conforme determina o art. 8º, VIII, da LC nº 173/2020, até o dia 31 de dezembro de 2021. Na prática, o dispositivo acabará por restringir a implementação do adicional, que apenas se viabilizará caso a dispêndio nominal com despesas obrigatórias da Câmara não varie acima do IPCA, em cumprimento do disposto no art. 8º, VIII, da LC nº 173/2020.

Convém observar, ainda, que, como já dito anteriormente, a

redação conferida ao art. 21 da LRF encampa entendimento de que o ato

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criador da despesa não é apenas a lei que cria o cargo ou os mecanismos de promoção, mas também o ato de execução orçamentária que provoca o aumento de despesa, isto é, a implementação do adicional de titulação. Portanto, o aumento remuneratório decorrente da concessão do adicional de titulação deve observar o art. 8º, inciso VII e seu § 2º da LC nº 173/2020, isto é, apenas pode ocorrer caso haja prévia compensação mediante aumento da receita ou redução de despesa, bem como atendimento aos requisitos do art. 169, § 1º, da CRFB.

Quando tratávamos do art. 21, II, III e IV da LRF, já com redação

conferida pelo art. 7º da LC nº 173/2020, foi dito que para atender ao comando de que não se aumentem despesas com pessoal nos últimos 180 dias de mandato, a interpretação mais segura é que se mantenham os percentuais com despesa de pessoal em face da receita corrente líquida, para que não sejam majorados no período de 180 dias que antecedem o mandato. Aqui, é importante apontar a diferença para o que dispõe o art. 8º, §2º, I e II, que é mais restritivo e se aplica desde o dia 28 de maio de 2020 até 31 de dezembro de 2021.

Enquanto a aferição do percentual da receita corrente líquida

para fins de observância da restrição ao aumento de despesa de pessoal nos últimos 180 dias de mandato (art. 21, da LRF) é verificada no decorrer daquele período, o art. 8º, § 2º, I e II vai além, ao dizer que caso o incremento da despesa de pessoal perdure por mais de dois exercícios — critério objetivo adotado para ser considerada a despesa de caráter continuado—, deve haver medida de compensação prévia e permanente consistente em redução de despesa ou incremento da receita. O inciso II do § 2º do art. 8º diz que, caso não seja implementada prévia medida compensatória de caráter permanente, o ato que aumenta despesa de pessoal ficará ineficaz.

Portanto, essa é outra condição objetiva para que seja viável

implementação do adicional de incentivo à titulação no período que começou em 28 de maio de 2020 e vai até 31 de dezembro de 2021. Nesse período de excepcional contenção de gastos, enquanto não for atendida a exigência de compensação prévia e permanente prevista no

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art. 8º, § 2º, inciso II, resta ineficaz a disposição legal que prevê a implementação do adicional por titulação.

Em vista de tudo que foi exposto, conclui-se que a

implementação do adicional de titulação no período de vigência do art. 8º da Lei Complementar nº 173/2020, de 28 de maio de 2020 a 31 de dezembro de 2021, apenas será possível se atendidos os seguintes requisitos: i) exista previsão da concessão do adicional de titulação em lei que já se encontre em vigor antes do período de vedação; ii) que exista prévia dotação na Lei Orçamentária Anual, e autorização específica na Lei de Diretrizes Orçamentárias (art. 169, § 1º, da CRFB) e compatibilidade com o Plano Plurianual, bem como sejam atendidos os requisitos dos arts. 16 e 17 da LRF; iii) que os percentuais com despesa de pessoal em face da receita corrente líquida não aumentem no decorrer dos 180 dias que antecedem o fim do mandato; iv) que haja prévia compensação permanente mediante aumento da receita ou diminuição da despesa de caráter continuado, considerada esta aquela que perdure por mais de 2 exercícios, sob pena de restar ineficaz o dispositivo legal que trata do adicional de titulação até a implementação da compensação; v) que o dispêndio nominal global com despesas obrigatórias da Câmara não varie positivamente acima da variação do IPCA.

É o parecer, s.m.j.

Gustavo da Costa Ferreira M. dos Santos

Consultor Técnico

Aprovo o parecer

Marcus Alonso Ribeiro Neves

Consultor Jurídico

Rio de Janeiro, 05 de junho de 2020.

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Parecer IBAM Nº 1264/2020

SM – Servidor Público. Revisão geral anual (art. 37, X, da Constituição Federal). Ano de eleições municipais. LC nº 173/2020. Considerações.

CONSULTA:

Tendo em vista o advindo da LC nº 173/2020, indaga o

consulente acerca da possibilidade de concessão de revisão geral anual

no corrente ano.

A consulta não veio documentada.

RESPOSTA:

Inicialmente, assentamos que a revisão geral anual é direito

subjetivo dos servidores públicos e agentes políticos, sejam eles efetivos

ou não, constitucionalmente assegurado no art. 37, inciso X, cujo teor

entendemos por bem reproduzir:

"Art. 37:(...)

X - a remuneração dos servidores públicos e o subsídio

de que trata o § 4º do art. 39 somente poderão ser fixados ou

alterados por lei específica, observada a iniciativa privativa em

cada caso, assegurada revisão geral anual, sempre na mesma

data e sem distinção de índices."

Nesse diapasão, verifica-se que o objetivo do texto constitucional

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é o de assegurar a observância do princípio da isonomia (art. 5°, caput, da

Constituição Federal), uma vez que a inflação é fenômeno que se

caracteriza pela corrosão do valor real da remuneração, o que atinge

todos os agentes públicos indistintamente. Trata-se, em realidade, de

recomposição de perdas inflacionárias e não de aumento de remuneração.

Para ambos os casos (aumento de remuneração e reposição de perdas

inflacionárias) o legislador constituinte exigiu lei. Importante destacar,

outrossim, que a revisão geral anual não se confunde com o aumento

remuneratório concedido isoladamente às categorias de agentes públicos.

Sobre o tema, é pertinente a lição de Hely Lopes Meirelles:

"Há duas espécies de aumento de vencimentos: uma

genérica, provocada pela alteração do poder aquisitivo da moeda,

à qual poderíamos denominar aumento impróprio, por se tratar, na

verdade, de um reajustamento destinado a manter o equilíbrio da

situação financeira dos servidores públicos; e, outra, específica,

geralmente feita à margem da lei que concede o aumento geral,

abrangendo determinados cargos ou classes funcionais e

representando realmente uma elevação de vencimentos, por se

fazer em índices não proporcionais ao decréscimo do poder

aquisitivo." (MEIRELLES, Hely Lopes. Direito Administrativo

Brasileiro. São Paulo: Malheiros Editores, 2002, p. 452).

Não é diferente o entendimento do Supremo Tribunal Federal,

que distinguiu os institutos do reajuste e do aumento remuneratório, a

saber:

"Se de um lado é possível ao Estado conceder aumentos

setorizados, de outro conflita com a Carta a outorga de reajuste

que não alcance todo o quadro funcional. Sendo o Direito uma

ciência, os institutos, expressões e vocábulos possuem sentido

próprio, descabendo confundi-los. O aumento atrai,

necessariamente, um plus, enquanto o reajuste visa tão-somente à

reposição do poder aquisitivo." (RE nº 192.277-0. Rel.: Min. Marco

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Aurélio. In: DJ, 17-04-98).

Em prosseguimento, mais especificamente no que tange aos

agentes políticos municipais (Prefeito, Vice-Prefeito, Secretários

Municipais, Vereadores), o legislador constituinte conferiu disciplina

específica e diferenciada quanto ao seu sistema remuneratório, que será

fixado por subsídio, em parcela única, nos termos do art. 39, § 4º, da

Constituição Federal. Ademais, a fixação dos seus subsídios deve ocorrer

de uma legislatura para outra, antes mesmo do conhecimento do resultado

das novas eleições, em atendimento aos princípios constitucionais da

moralidade e da impessoalidade:

"Art. 29. O Município reger-se-á por lei orgânica, votada

em dois turnos, com o interstício mínimo de dez dias, e aprovada

por dois terços dos membros da Câmara Municipal, que a

promulgará, atendidos os princípios estabelecidos nesta

Constituição, na Constituição do respectivo Estado e os seguintes

preceitos: (...)

V - subsídios do Prefeito, do Vice-Prefeito e dos

Secretários Municipais fixados por lei de iniciativa da Câmara

Municipal, observado o que dispõem os arts. 37, XI, 39, § 4º, 150,

II, 153, III, e 153, § 2º, I;

VI - o subsídio dos Vereadores será fixado pelas

respectivas Câmaras Municipais em cada legislatura para a

subseqüente, observado o que dispõe esta Constituição,

observados os critérios estabelecidos na respectiva Lei Orgânica e

os seguintes limites máximos."

Segundo entendimento assentado por esta Consultoria Jurídica,

a Revisão Geral Anual dos agentes políticos reclama interpretação

sistemática dos arts. 29, VI e 37, X, da Constituição Federal. No caso dos

referidos agentes não se admite a revisão do valor dos subsídios fixados

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no primeiro ano de mandato, ainda que por meio de lei e ainda que de

forma fracionada, tendo em vista que no primeiro ano de mandato não há

o que se rever por tratar-se, em verdade, da vigência de um novo subsídio

fixado ao final da legislatura anterior (princípio da anterioridade).

Ademais, a lei nº. 9.069/1995 (Plano Real), em seu art. 28, § 1º,

expressamente proíbe periodicidade de reajuste inferior a 12 meses, razão

pela qual a revisão aos agentes políticos no primeiro ano de mandato

pode ser objeto de glosa pelos órgãos de controle.

Feitas estas considerações, vale registrar no que tange à

iniciativa do projeto de lei, conquanto subsista alguma divergência no

âmbito de determinados Tribunais de Contas, o entendimento atual deste

Instituto é o de que reputa-se de iniciativa privativa do chefe do Poder

Executivo Lei que proceda à revisão geral anual em cada esfera da

federação, com a aplicação de um único índice para os servidores do

Executivo e do Legislativo, em uma data única, alcançando ainda os

agentes políticos municipais de ambos os poderes, garantindo desta forma

o princípio constitucional da isonomia conforme aventado alhures.

Neste ponto, vale informar que no âmbito do STF encontram-se

em trâmite, pendentes de julgamento, duas ADIs que versam acerca da

competência para iniciativa do projeto de lei que concede a revisão geral

anual, quais sejam: a ADI nº 3543 proposta em face da Lei nº 12.301/2005

do Estado do Rio Grande do Sul que concedeu revisão geral anual aos

servidores do Legislativo deste Estado membro e a ADI nº 3538 proposta

em face da Lei nº 12.299/2005 do mesmo Estado, que concedeu revisão

geral anual aos servidores públicos do Poder Judiciário. Em ambas se

alega ofensa aos arts. 2º, 5º, caput e 61, § 1º, II, "a" todos da Lei Maior, e,

de acordo com os Ministros do STF que já proferiram o seu voto, cabe

razão ao requerente tanto pela violação da competência do Chefe do

Executivo quanto pela afronta ao princípio da isonomia, vez que excluídos

da revisão geral anual concedida os servidores do Executivo.

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Em assim sendo, entendemos que a revisão geral anual prevista

no inciso X do art. 37 da Lei Maior deve ser implementada por lei

específica de iniciativa do Chefe do Executivo local, conglobando os

servidores públicos e agentes políticos de ambos os poderes - Prefeito,

Vice-Prefeito, Secretários Municipais e Vereadores (quanto aos agentes

políticos vedada a concessão no primeiro ano dos mandatos). Deve ainda

ser concedida sempre em determinada data base e deve eleger índice que

reflita a efetiva perda do poder aquisitivo no período.

Ainda acerca da revisão geral anual, não podemos deixar de

registrar que, recentemente, o STF, no julgamento do RE nº 565.089,

firmou a tese de que o não encaminhamento do projeto de lei de revisão

geral anual dos vencimentos dos servidores públicos previsto no inciso X

do art. 37 da Constituição não gera direito à indenização, devendo o Poder

Executivo, no entanto, se pronunciar de forma fundamentada sobre as

razões pelas quais não propôs a revisão.

Logo, temos que a revisão geral anual é direito dos servidores e

agentes políticos (para estes últimos, exceto no primeiro ano de seus

mandatos) a ser concedido por lei de iniciativa do Chefe do Executivo local

que conglobe servidores e agentes políticos de ambos os poderes

municipais, respeitada sempre a data base. Não obstante, tal direito pode

deixar de ser concedido desde que motivadamente pelo Chefe do

Executivo.

À guisa de informação, com relação à eventual concessão no

corrente ano de revisão geral anual, tendo em vista que até a presente

data, apesar da situação de calamidade pública instaurada pela pandemia

da COVID-19, o TSE mantém o calendário eleitoral, de certo deverá

observar as limitações da Lei nº 9.504/1997, mais especificamente aquele

prevista em seu art. 73, VIII. Acerca do tema, recomendamos a leitura do

Parecer/IBAM nº 0431/2020.

Por derradeiro, temos que a LC nº 173/2020 (estabelece o

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Programa Federativo de Enfrentamento ao Coronavírus, que prestará

auxílio financeiro a Estados e Municípios e promove alterações na LC nº

101/2000), mais precisamente em seu art. 8º, I, veda a concessão até

dezembro de 2021 de reajuste a membros de poder, servidores ou

empregados públicos, salvo aquelas determinadas em decisão judicial ou

previstas em lei anterior ao estado de calamidade reconhecido pelo

Decreto Legislativo nº 06/2020.

Por conseguinte, a partir de 20/03/2020 até 31/12/2021 não se

revela factível a concessão da revisão geral anual.

Isto posto, concluímos objetivamente a presente consulta na

forma das razões exaradas.

É o parecer, s.m.j.

Priscila Oquioni Souto

Assessora Jurídica

Aprovo o parecer

Marcus Alonso Ribeiro Neves

Consultor Jurídico

Rio de Janeiro, 05 de junho de 2020.

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Parecer IBAM Nº 1265/2020

AO – Ato Oficial, SM – Servidor Público. Complementação ao parecer nº 1219/2020. LC nº 173/2020. Inteligência da expressão "reposição de vacâncias".

CONSULTA:

A Prefeitura Municipal requer complementação ao parecer

1219/2020, indagando o seguinte:

1) Pode-se considerar que o cargo vago não preenchido como

sendo "vacante"?

2) Pode ser realizada nomeação dos aprovados com a

argumentação de que os cargos vagos não preenchidos estariam em vacância?

3) A nomeação para os cargos vagos poderia ser interpretada

como reposição da vacância?

A consulta não vem documentada.

RESPOSTA:

Antes de mais nada, cumpre reiterar o afirmado no Parecer nº 1219/2020, e esclarecer aqui com mais precisão o conceito de vacância e de reposição de vacâncias.

A vacância é fato jurídico mediante o qual um cargo que estava

ocupado passa a estar vago. Assim, cumpre perquirir o exato sentido das

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expressões "reposições de vacâncias" constantes no art. 8º, seus incisos e parágrafos da LC nº 173/2020.

Segundo o artigo 33 da Lei nº 8.112/1990 que dispõe sobre o

regime jurídico dos servidores públicos civis da União, das autarquias e das fundações públicas federais a vacância do cargo público pode decorrer de exoneração; demissão; promoção; readaptação; aposentadoria; posse em outro cargo inacumulável e falecimento.

Temos, portanto, que uma das condições para ocorrer a vacância

é que a vaga posta em disputa tenha sido aberta em função de exoneração, demissão, promoção, readaptação, aposentadoria, posse em outro cargo inacumulável e falecimento. A exceção, portanto, não se aplica a vagas que nunca foram ocupadas, como é o caso de cargos ou vagas em que nenhum servidor jamais foi investido.

Ademais, a expressão "reposição" é suficientemente clara para

demonstrar que um cargo que jamais foi provido ou que ficou vago em decorrência de promoção de seu antigo ocupante não está albergado pelas exceções previstas no art. 8º da LC nº 173/2020. Com efeito a definição de "reposição", conforme se pode observar em seu registro do Dicionário Houaiss, consiste em "colocação de alguém em cargo ou

função que antes ocupava ou em substituição a outrem" (https:// houaiss.uol.com.br)

Aqui, é importante ressaltar que a vacância no caso de promoção

deve decorrer de promoção strictu sensu, isto é, de progressão vertical. Deve se tratar, portanto, de vacância ocorrida após a promoção de titular de cargo organizado em carreira, para outro cargo de classe mais elevada da mesma carreira. Em caso de progressão horizontal, não há que se falar em vacância, porque o servidor investido no cargo permanece em sua titularidade, e apenas é alterado o padrão de vencimento. A ressalva é importante porque a nomenclatura das progressões e promoções nos planos de cargos varia bastante de um Município para outro e pode gerar mal entendidos.

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Como já dito no Parecer nº 1219/2020, o dispositivo do art. 8º peca por não estabelecer critério para identificar qual seria o limite temporal para ocorrência da vacância. Reafirmamos que há sempre de se observar o princípio da razoabilidade e da proporcionalidade, cabendo ao administrador público justificar motivadamente a necessidade de reposição de vacâncias à luz do princípio da eficiência e do interesse público envolvido, mormente nas hipóteses em que a vacância subsiste por longo lapso de tempo.

Isso porque não é dado ao Administrador, sob pena de burla as

restrições impostas pela lei, desenterrar vacâncias ocorridas há anos, sob o argumento de que somente agora vislumbrou-se a necessidade de reposição da vacância. Certamente, práticas como essas hão de ser alvo dos órgãos de controle e para conferir maior segurança jurídica deve o intérprete lançar mão das balizas fornecidas na Lei de Introdução as normas do Direito Brasileiro, mormente aquela constante do seu artigo 22, que orienta que "na interpretação de normas sobre gestão pública, serão considerados os obstáculos e as dificuldades reais do gestor e as exigências das políticas públicas a seu cargo, sem prejuízo dos direitos dos administrados".

Em vista de todo o exposto, responde-se objetivamente os

questionamentos formulados:

1) Pode-se considerar que o cargo vago não preenchido como

sendo "vacante"?

RESPOSTA: Nem todo cargo não preenchido decorre de

vacância. Os cargos novos em que nenhum servidor jamais foi investido não passaram pelo fato da vacância.

2) Pode ser realizada nomeação dos aprovados com a

argumentação de que os cargos vagos não preenchidos estariam em vacância?

RESPOSTA: Não basta o cargo estar vago. Deve ter havido o

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fato jurídico da vacância, isto é, o cargo deve ter sido preenchido anteriormente e a nomeação consistir em reposição.

3) A nomeação para os cargos vagos poderia ser interpretada

como reposição da vacância?

RESPOSTA: O simples fato de o cargo estar vago, como

afirmado, não significa que sofreu vacância. Deve ter havido exoneração, demissão, promoção, readaptação, aposentadoria, posse em outro cargo inacumulável ou falecimento de seu anterior ocupante. Caso contrário, não há como se falar em reposição. No caso de cargo jamais antes ocupado, não há o que repor.

É o parecer, s.m.j.

Gustavo da Costa Ferreira M. dos Santos

Consultor Técnico

Aprovo o parecer

Marcus Alonso Ribeiro Neves

Consultor Jurídico

Rio de Janeiro, 05 de junho de 2020.

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Parecer IBAM Nº 1266/2020

FM – Finanças Municipais, SM – Servidor Público. LC nº 173/2020. Quinquênio cujo período aquisitivo foi completado antes da entrada em vigor das restrições previstas no art. 8º. Parâmetros para implementação da vantagem. Suspensão da contagem de tempo para fins de concessão de vantagens fundadas exclusivamente no tempo de serviço. Comentários.

CONSULTA:

A Prefeitura Municipal relata que uma servidora completou no dia

28 de maio de 2020 o período aquisitivo de quinquênio (5 anos, 1825 dias), exatamente no mesmo dia de entrada em vigor da Lei Complementar Federal nº 173/2020, que passou a vedar o cômputo do período de 28 de maio de 2020 a 31 de dezembro de 2021 para aquisição desse tipo de direito. Em vista dessa situação específica do teor da LC nº 173/2020, indaga:

1) Nesse caso concreto, a servidora não poderá adquirir o direito

ao quinquênio?

2) A partir de janeiro de 2022, quando se encerra a vedação, os servidores receberão os quinquênios retroativamente à aquisição que se deu nesse período vedado?

A consulta não vem documentada.

RESPOSTA:

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Diante do acelerado avanço da pandemia do novo Coronavírus (Covid-19) e das relevantes repercussões econômicas da calamidade que vivenciamos, foi editada a Lei Complementar nº 173/2020 para fazer frente à premente necessidade de contenção dos gastos púbicos, visando à promoção de um esforço conjunto de todos os entes da federação, em espírito de cooperação, para superação dos efeitos deletérios da propagação da infecção viral sobre a economia. Assim é que a referida LC nº 173/2020 promoveu sensíveis e relevantes alterações na Lei Complementar nº 101/2000 (Lei de Responsabilidade Fiscal — LRF), que dizem respeito a despesas de pessoal realizadas no fim do mandato.

Antes, é bom dizer que não se trata a LC nº 173/2020 apenas de

uma lei que visou a impor restrições na execução orçamentária, na realização de gastos públicos e aumentos a servidores. Ela se trata, como já aponta sua ementa, de um Programa Federativo de Enfrentamento ao Coronavírus, que envolve auxílio financeiro da União aos Estados e Municípios, acompanhado de contrapartidas, conduzido sob o espírito do federalismo fiscal.

A LC nº 173/2020 tem supedâneo, assim, na competência da

União prevista no art. 24, parágrafo único, tendo em vista o equilíbrio do desenvolvimento e do bem-estar em âmbito nacional, e também no art. 169, § 9º, da CRFB, visando à gestão responsável das finanças públicas de aplicabilidade a todas as esferas da federação, bem como a situação de excepcional limitação causada pela crise econômica em curso.

Assim, além das alterações permanentes no art. 21 da LRF, cabe

nesse momento mais atenção ao o art. 8º da própria LC nº 173/2020, que contêm disposições temporárias que se aplicarão até o dia 31 de dezembro de 2021, e que dizem respeito diretamente à presente consulta.

O aludido art. 8º do art. 173/2020 impõe restrições mais severas

que o art. 21 da LRF, a qual trata da vedação à criação de despesas de pessoal dos 180 dias que antecedem o fim do mandato. Assim, pertinente é compreender a amplitude e os parâmetros para aplicação do aludido dispositivo que entrou em vigor em 28 de maio de 2020 e impõe restrições até o dia 31 de dezembro de 2021, para o quê convém transcrevê-lo:

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"Art. 8º Na hipótese de que trata o art. 65 da Lei Complementar nº 101, de 4 de maio de 2000, a União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios afetados pela calamidade pública decorrente da pandemia da Covid-19 ficam proibidos, até 31 de dezembro de 2021, de:

I - conceder, a qualquer título, vantagem, aumento,

reajuste ou adequação de remuneração a membros de Poder ou de órgão, servidores e empregados públicos e militares, exceto quando derivado de sentença judicial transitada em julgado ou de determinação legal anterior à calamidade pública;

(...)

VI - criar ou majorar auxílios, vantagens, bônus, abonos,

verbas de representação ou benefícios de qualquer natureza, inclusive os de cunho indenizatório, em favor de membros de Poder, do Ministério Público ou da Defensoria Pública e de servidores e empregados públicos e militares, ou ainda de seus dependentes, exceto quando derivado de sentença judicial transitada em julgado ou de determinação legal anterior à calamidade;

VII - criar despesa obrigatória de caráter continuado,

ressalvado o disposto nos §§ 1º e 2º;

VIII - adotar medida que implique reajuste de despesa obrigatória acima da variação da inflação medida pelo Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA), observada a preservação do poder aquisitivo referida no inciso IV do caput do art. 7º da Constituição Federal;

IX - contar esse tempo como de período aquisitivo

necessário exclusivamente para a concessão de anuênios, triênios, quinquênios, licenças-prêmio e demais mecanismos equivalentes que aumentem a despesa com pessoal em decorrência da aquisição de determinado tempo de serviço, sem qualquer prejuízo para o tempo de efetivo exercício, aposentadoria, e quaisquer outros fins.

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§ 1º O disposto nos incisos II, IV, VII e VIII do caput deste artigo não se aplica a medidas de combate à calamidade pública referida no caput cuja vigência e efeitos não ultrapassem a sua duração.

§ 2º O disposto no inciso VII do caput não se aplica em

caso de prévia compensação mediante aumento de receita ou redução de despesa, observado que:

I - em se tratando de despesa obrigatória de caráter

continuado, assim compreendida aquela que fixe para o ente a obrigação legal de sua execução por período superior a 2 (dois) exercícios, as medidas de compensação deverão ser permanentes; e

II - não implementada a prévia compensação, a lei ou o

ato será ineficaz enquanto não regularizado o vício, sem prejuízo de eventual ação direta de inconstitucionalidade.

§ 3º A lei de diretrizes orçamentárias e a lei orçamentária

anual poderão conter dispositivos e autorizações que versem sobre as vedações previstas neste artigo, desde que seus efeitos somente sejam implementados após o fim do prazo fixado, sendo vedada qualquer cláusula de retroatividade.

(...)

§ 5º O disposto no inciso VI do caput deste artigo não se

aplica aos profissionais de saúde e de assistência social, desde que relacionado a medidas de combate à calamidade pública referida no caput cuja vigência e efeitos não ultrapassem a sua duração.

§ 6º (VETADO)." (grifo nosso)

Ora, o art. 8º, I, da LC nº 173/2020, ao vedar a concessão, a

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qualquer título, de vantagem, aumento, reajustes ou adequação de remuneração dos servidores, excepciona aquelas que decorram de determinação legal anterior à calamidade pública.

Quando se fala em quinquênio, refere-se a disposições da

legislação funcional que implementam acréscimos remuneratórios fundados no tempo de serviço. Como a servidora completou o período aquisitivo "no dia da entrada em vigor da LC nº 173/2020", infere-se que se tratam justamente de determinações legais anteriores à calamidade pública reconhecida nacionalmente em 20 de março de 2020 pelo Decreto Legislativo nº 6/2020, uma vez que a lei que cria os critérios para implementação do adicional de quinquênio já estava em vigor antes da pandemia.

Convém observar que a redação conferida ao art. 21 da LRF

encampa entendimento de que o ato criador da despesa não é apenas a lei que cria o cargo ou vantagens remuneratórias, mas também o ato de execução orçamentária que provoca o aumento de despesa, isto é, a nomeação ou efetiva implementação do quinquênio nos vencimentos do servidor. Assim, não se tratando o quinquênio de medida destinada especificamente ao combate à calamidade pública, mas fato funcional relacionado à organização dos cargos e carreiras da Câmara, deve sua concretização condicionar-se ao atendimento do disposto nos arts. 16 e 17 da LC nº 101/2001, por não se enquadrar no permissivo do art. 65, § 1º III da LC nº 101/2000, com redação dada pela LC nº 173/2020. Com efeito, os servidores da Câmara não estão envolvidos diretamente em medidas de combate à calamidade púbica, exceção prevista no § 1º do art. 8º da LC nº 173/2020.

Outra limitação importante é que o gasto global com a folha de

pagamento, que se enquadra no conceito de despesa obrigatória, não pode ser majorado acima do IPCA, conforme determina o art. 8º, VIII, da LC nº 173/2020, até o dia 31 de dezembro de 2021. Na prática, o dispositivo acabará por restringir bastante a concessão dos quinquênios, que apenas se viabilização caso a dispêndio nominal com folha de pagamento não varie acima do IPCA, em cumprimento do disposto no art. 8º, VIII, da LC nº 173/2020, devendo no mais das vezes reduzirem-se outras despesas obrigatórias para que se cumpra o dispositivo.

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Mais relevante ainda é o que dispõe o art. 8º, inciso VII e seu § 2º da LC nº 173/2020, segundo os quais a implementação do quinquênio apenas pode ocorrer caso haja prévia compensação mediante aumento da receita ou redução de despesa, bem como atendimento aos requisitos do art. 169, § 1º, da CRFB. A compensação em comento, a propósito, deve ser permanente e prévia à implementação do quinquênio. Com efeito, o art. 8º, § 2º, I e II determina que caso o incremento da despesa de pessoal perdure por mais de dois exercícios — critério objetivo adotado para ser considerada a despesa de caráter continuado—, deve haver medida de compensação nesses moldes.

E assim, o inciso II do § 2º do art. 8º diz que, caso não seja

implementada prévia medida compensatória de caráter permanente, o ato que aumenta despesa de pessoal ficará ineficaz. Portanto, essa é outra condição objetiva para que seja viável implementação do quinquênio no período em que incidem as restrições do art. 8º. Nesse período de excepcional contenção de gastos, enquanto não for atendida a exigência de compensação prevista no art. 8º, § 2º, inciso II, resta ineficaz a disposição legal que prevê o adicional de quinquênio, e esse não poderá ser implementado.

Em relação à segunda pergunta, o caput do art. 8º, IX é bem

claro para dizer que na hipótese de que trata o art. 65 da LRF, isto é, desde o reconhecimento da calamidade pública em nível nacional em 20 de março pelo Decreto Legislativo nº 6/2020, até o término da vigência do art. 8º em 31 de dezembro de 2021, é absolutamente proibido o cômputo de tempo para fins de qualquer incremento remuneratório que decorra exclusivamente de determinado tempo de serviço. Assim, desde o dia 20 de março de 2020 até o dia 31 de dezembro de 2021 estão suspensas as contagens do quinquênio e de quaisquer outras vantagens fundadas exclusivamente no tempo de serviço, sem prejuízo da contagem de tempo de aposentadoria, efetivo exercício ou mesmo promoções ou progressões que comunguem concomitantemente o critério temporal com o de merecimento ou produtividade.

Finalmente, quanto à aplicação ao caso concreto: na consulta,

diz-se que a servidora implementou o direito ao quinquênio no dia da entrada em vigor da LC nº 173/2020, isto é, em 28 de maio de 2020. Para

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que pudesse perceber a vantagem em comento, mesmo que atendidos todos os requisitos do art. 8º acima referidos, todo o período aquisitivo deveria estar compreendido antes do reconhecimento da calamidade pública no dia 20 de março de 2020, pelo Decreto-Legislativo nº 6/2020. Portanto, deverá aguardar o dia 1º de janeiro de 2022 para poder computar o restante do período necessário à aquisição do direito ao quinquênio, salvo caso haja decisão judicial em sentido contrário ou mudança legislativa.

É bem verdade que a LC nº 173/2020 entrou em vigor no dia 28

de maio de 2020. Porém, o caput do art. 8º faz referência expressa à hipótese do art. 65 da LRF, isto é, o início do estado de calamidade pública reconhecido por meio do Decreto Legislativo nº 6/2020, publicado no Diário Oficial do dia 20 de março de 2020. Além disso, a redação dos incisos I e VI, in fine, do art. 8º ("determinação legal anterior à calamidade") demonstram que o termo inicial das restrições é o início da calamidade, e não a vigência da LC nº 173/2020. Assim, não há segurança jurídica para que se repute viável o cômputo do tempo entre o dia 20 de março de 2020 e 28 de maio de 2020 para fins de implementação de vantagens fundadas exclusivamente no tempo de serviço.

Em vista de tudo que foi exposto, conclui-se respondendo

objetivamente aos questionamentos formulados:

1) Nesse caso concreto, a servidora não poderá adquirir o direito ao quinquênio?

RESPOSTA: O quinquênio não poderá ser concedido à servidora

mediante cômputo do tempo de serviço a partir do reconhecimento da calamidade pública, isto é, desde o dia 20 de março de 2020, data da publicação no Diário Oficial da União do Decreto Legislativo nº 6/2020, uma vez que o termo inicial da restrição prevista no art. 8º, IX da LC nº 173/2020 está atrelada à hipótese do art. 65 da LRF. Assim, a aplicabilidade do dispositivo legal que concede o quinquênio restará ineficaz até o dia 31 de dezembro de 2021(art. 8º, § 2º, II da LC nº 173/2020), quando o prazo voltará a ser contado.

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2) A partir de janeiro de 2022, quando se encerra a vedação, os servidores receberão os quinquênios retroativamente à aquisição que se deu nesse período vedado?

RESPOSTA: Não, porque o art. 8º, IX da LC nº 173/2020

determina que desde a decretação da calamidade pública em 20 de março de 2020, hipótese do art. 65 da LRF e termo inicial das restrições, até o dia 31 de dezembro de 2021, é absolutamente proibido o cômputo de tempo para fins de qualquer incremento remuneratório que decorra exclusivamente de determinado tempo de serviço. Desse modo, não haverá cômputo retroativo, a contagem do tempo necessário a aquisição do quinquênio foi suspensa em 20/03/2020, voltando a correr somente em 01/01/2022, razão pela qual a servidora em questão somente fará jus ao quinquênio em meados de março de 2022.

É o parecer, s.m.j.

Gustavo da Costa Ferreira M. dos Santos

Consultor Técnico

Aprovo o parecer

Marcus Alonso Ribeiro Neves Consultor Jurídico

Rio de Janeiro, 05 de junho de 2020.

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Parecer IBAM Nº 1267/2020

SM – Servidor Público. Contratação temporária por excepcional interesse público (art. 37, IX, da Constituição Federal). LC nº 173/2020. Considerações.

CONSULTA:

Relata o consulente que o Tribunal de Contas do Estado correspectivo emitiu parecer no sentido da ilegalidade da suspensão dos contratos temporários por excepcional interesse público em virtude da pandemia da COVID-19, bem como pela impossibilidade de redução da carga horária e consequentemente da remuneração.

Ainda conforme os relatos do consulente, com a crise que se

instaurou na municipalidade, a demissão dos contratados seria um caminho possível.

Em assim sendo, indaga o consulente se, caso os contratados

temporários tenham seus contratos extintos unilateralmente pela Administração Municipal, com o retorno das aulas, à luz da LC nº 173/2020 estariam vedadas novas contratações.

A consulta não veio documentada.

RESPOSTA:

Inicialmente, cumpre deixar consignado que a regra na Administração Pública é o ingresso no serviço público de candidatos aprovados em regular concurso público de prova ou provas e títulos, nos termos do art. 37, inciso II, da Constituição Federal. As principais exceções à indigitada regra da obrigatoriedade do concurso público encontram-se no mesmo art. 37, a saber: os cargos comissionados (inciso V) e a contratação

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temporária de excepcional interesse público (inciso IX).

Desse modo, compete ao Poder Executivo a iniciativa de lei municipal, consoante os ditames do art. 61, § 1º, inciso II, alínea "a" da Lei Maior, definindo o regime necessariamente jurídico-administrativo em que se dará a contratação por excepcional interesse público, bem como os casos em que será admitida. O contrato, por sua vez, deverá ser obrigatoriamente a termo e delimitado no tempo.

Ressaltamos, por oportuno, que, ante o princípio da legalidade,

expresso no art. 37, caput, da Constituição Federal, e por ser o art. 37, inciso IX, norma constitucional de eficácia limitada, somente será factível a contratação temporária com a existência de lei municipal definidora do regime jurídico aplicável. Impende salientar que as situações de permissividade previstas na lei devem limitar-se às hipóteses de necessidade excepcional e temporária, de modo a não ensejar situação fraudadora da obrigatoriedade de certame isonômico e impessoal para o exercício de funções públicas permanentes.

Feitas estas considerações, em que pese não nos tenham sido

repassadas maiores informações, temos que muito provavelmente o Tribunal de Contas correspectivo reputou ilegal a suspensão dos contratos temporários, bem como a redução da jornada por ausência de previsão neste sentido da lei local que regulamenta o tema e no contrato celebrado e pela vedação constitucional de redução dos vencimentos.

Muito embora não nos tenha sido dado conhecer o inteiro teor da

lei local que disciplina o regime jurídico da contratação temporária por excepcional interesse público, temos que a rescisão unilateral dos contratos pela Administração Pública será possível se houver tal previsão na lei e estritamente nos limites nela estabelecidos com o pagamento de todas as verbas devidas.

Mais especificamente com relação à possibilidade de realizar

novas contratações temporárias por ocasião do retorno das aulas são cabíveis as considerações que passamos a aduzir.

Como sabido, a rápida expansão da pandemia do Novo

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Coronavírus (COVID-19) impôs sérias restrições ao nosso modo de vida, sendo certo que as recomendações de distanciamento social e de quarentena geram uma redução substancial da circulação de pessoas, que levam, por sua vez, a impactos sensíveis nas mais diversas áreas da sociedade e, por conseguinte, a necessidade de organização da Administração Pública para atendimento das demandas e manutenção do bem comum.

Diante do acelerado avanço da doença no Brasil e dos múltiplos

desdobramentos no campo da saúde e da economia, ao longo deste ano de 2020, os poderes Executivo, Legislativo e Judiciário têm adotado, proposto ou sugerido medidas, providências ou ordens, de conteúdos diversos, para instrumentalizar o Poder Público e a sociedade em geral com os meios que se reputam oportunos e necessários para enfrentamento da crise.

Neste contexto, em 28 de maio de 2020, entrou em vigor a LC nº

173/2020 que encarta o Programa Federativo de Enfrentamento ao Coronavírus, que estabelece medidas de socorro financeiro da União para os demais entes federativos mediante algumas contrapartidas negociadas pelo Executivo com o Senado Federal. A referida lei complementar também trouxe sensíveis modificações na LRF (LC nº 101/2000).

Dentre suas disposições transitórias, a LC nº 173/2020, mais

precisamente em seu art. 8º, IV, veda, até 31/12/2020, admitir ou contratar pessoal, a qualquer título com algumas ressalvas. Vejamos:

"Art. 8º Na hipótese de que trata o art. 65 da Lei

Complementar nº 101, de 4 de maio de 2000, a União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios afetados pela calamidade pública decorrente da pandemia da Covid-19 ficam proibidos, até 31 de dezembro de 2021, de:

(...)

IV - admitir ou contratar pessoal, a qualquer título,

ressalvadas as reposições de cargos de chefia, de direção e de assessoramento que não acarretem aumento de despesa, as

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reposições decorrentes de vacâncias de cargos efetivos ou vitalícios, as contratações temporárias de que trata o inciso IX do caput do art. 37 da Constituição Federal, as contratações de temporários para prestação de serviço militar e as contratações de alunos de órgãos de formação de militares;" (Grifos nossos).

Desta sorte, note-se que não há, na LC nº 173/2020 vedação

para realização de contratação temporária.

Neste ponto, vale consignar que antes mesmo da entrada em vigor da LC nº 173/2020, a União editou a MP nº 922/2020, a qual altera a Lei Federal nº 8745/1993 (lei que disciplina a contratação temporária por excecional interesse público no âmbito da União) para possibilitar, entre outros, a dispensa da realização do processo seletivo para atendimento das demandas provenientes de calamidade pública e emergências em saúde pública.

Por conseguinte, eventual óbice à contratação temporária por

ocasião do retorno das aulas na Rede Municipal de Ensino não está na LC nº 173/2020, mas poderá decorrer das normas financeiras e orçamentárias, mormente daquelas que versam sobre limites e aumento de despesa com pessoal (como se dá em situações de normalidade na Administração Pública).

Isto posto, concluímos objetivamente a presente consulta na

forma das razões exaradas.

É o parecer, s.m.j.

Priscila Oquioni Souto Assessora Jurídica

Aprovo o parecer

Marcus Alonso Ribeiro Neves

Consultor Jurídico

Rio de Janeiro, 08 de junho de 2020.

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Parecer IBAM Nº 1274/2020

SM – Servidor Público. Segurança e medicina do trabalho. Retorno de servidores que foram infectados por Covid-19. Redução dos riscos inerentes ao trabalho. Competência do Município. Critérios técnicos. Considerações.

CONSULTA:

A Câmara Municipal consulta este Instituto quanto à possibilidade de se exigir atestado médico de aptidão de saúde para regresso ao trabalho daqueles que foram contaminados por Covid-19.

A consulta não vem documentada.

RESPOSTA:

As normas relativas aos servidores municipais reputam-se assunto de exclusiva competência legislativa do Município (art. 39, caput, da CRFB), por força da autonomia político-administrativa que lhe foi outorgada pela Constituição de 1988, nos termos dos seus arts. 1º, 18, 29 e 30. Cabe ao Município, mediante lei de iniciativa do Executivo (art. 61, § 1º, II, "c", da CRFB), a organização do regime funcional de seus servidores, incluindo-se, aí, os direitos, deveres e demais regras aplicáveis aos servidores públicos. Para tanto, impõe-se observar os comandos constitucionais dirigidos ao servidor público, em especial nos arts. 37 a 41.

Especificamente quanto à medicina e segurança do trabalho, é

de se observar que o art. 39, § 3° expressamente estende aos servidores públicos o direito assegurado aos trabalhadores em geral à redução dos

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riscos inerentes às suas atividades (art. 7°, XXII, da CRFB). A respeito do tema, é pertinente o magistério do Procurador do Trabalho João Carlos Teixeira:

"Ora, a saúde, o trabalho e a segurança são direitos

sociais insertos no art. 6° da Lei Maior. O inciso XXII do art. 7° estatui que é direito dos trabalhadores urbanos e rurais a redução dos riscos inerentes ao trabalho, por meio de normas de saúde, higiene e segurança. Segundo a classificação de José Afonso da Silva, tal dispositivo constitucional se enquadraria dentre as normas de eficácia limitada e aplicabilidade indireta, na medida em que depende de uma norma integradora.

Tais normas, quando do advento da Constituição, já

existiam e estão inseridas nos arts. 154 e s. da Consolidação das Leis do Trabalho, com redação dada pela Lei 6.514/77. Há ainda regulamentando essas normas legais as Portarias n° 3.214/78 e 3.067/88, emitidas com fulcro no art. 155, I, da CLT, que aprovaram as Normas Regulamentadoras das ações e serviços em matéria de saúde, higiene e segurança no trabalho urbano e rural - são as NRs e NRRs.

Portanto, o direito fundamental e social à redução dos

riscos inerentes ao trabalho, por meio de normas de saúde, higiene e segurança, previsto no inciso XXII do art. 7° da Magna Carta, já está devidamente integrado e regulamentado nas normas supracitadas, e, assim, em plena condição de aplicabilidade imediata.

A plena aplicabilidade dessas normas aos trabalhadores

regidos pela relação jurídica de emprego estabelecida na CLT é questão pacífica na doutrina." (Disponível em 22/03/2012 em https:// www.pgt.mpt.gov.br/publicacoes/pub48.html . Grifo nosso)

Como se depreende do afirmado pelo Procurador, as normas

regulamentadoras expedidas pelo extinto Ministério do Trabalho e Emprego

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têm como fundamento legal os arts. 154 e ss. da CLT, que, em razão da competência exclusiva do Município para dispor sobre o regime jurídico de seus servidores públicos, a eles não se aplicam de imediato aos estatutários.

Em razão disso, existe no Brasil um grande problema em relação

à observância de regras de segurança no âmbito da Administração Pública, uma vez que os servidores estatutários não estão sujeitos à fiscalização dos auditores-fiscais do trabalho, hoje integrados à estrutura do Ministério da Economia, quanto à aplicabilidade nas normas regulamentadoras e normas de segurança do trabalho.

Portando, quanto aos servidores estatutários, cabe ao Município

a organização do sistema de proteção à saúde do trabalhador. É comum e desejável que seja criado um Serviço Especializado em Engenharia de Segurança e Medicina do Trabalho (SESMT) em âmbito municipal, porém cada entidade pública tem autonomia para estabelecer suas regras e os seus parâmetros. Isso não significa que o disposto no art. 39, § 3º c/c art. 7º, XXII da CRFB seja letra morta, mas que se trata de norma constitucional de eficácia limitada que, em relação aos servidores públicos estatutários, terá sua efetividade condicionada à edição de normas específicas pelos órgãos e entidades a que esses servidores sejam vinculados.

É de se noticiar que, na prática, a medicina e saúde do

trabalhador no âmbito da Administração Pública tem dito respeito menos à prevenção de acidentes e doenças decorrentes do trabalho que à emissão de laudos em perícias, ou seja, quando o problema já está consolidado. A respeito do tema, pertinente os seguintes excertos de estudo publicado na Revista do Serviço Público:

“Comecemos relembrando que as políticas públicas

direcionadas à saúde do trabalhador elegeram como foco principal os trabalhadores vinculados às organizações privadas, deixando uma importante lacuna na atenção em saúde para os servidores públicos." (RAMMINGER, T; NARDI, H. C. Saúde do trabalhador:

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um (não) olhar sobre o servidor público. Revista do Serviço Público, Brasília, v. 58, n. 2, p. 213-26, abr.-jun. 2007, disponível em https://revista.enap.gov.br/index.php/RSP/article/view/171/176 - grifo nosso)

Os autores do artigo, Tatiane Hamminger e Henrique Nardi, em

estudo de caso concreto dos servidores públicos de um determinado estado, observaram o seguinte:

"Tivemos a oportunidade de conhecer a realidade de

apenas um estado brasileiro, mas consideramos que seja representativa do que acontece em grande parte do país. (...) Ao servidor público do referido estado, resta justificar suas ausências ou afastamentos do trabalho ao Departamento de Perícia Médica e Saúde do Trabalhador, que, apesar de ter integrado recentemente a 'saúde do trabalhador' ao seu nome, segue com a atividade principal de "perícia", ou seja, "com a principal função de ver se os funcionários estão aptos para o trabalho quando ingressam no serviço público, e também de homologar atestados médicos e os exames de insalubridade'" (idem - grifo nosso)

Arrematam os pesquisadores:

"Sendo assim, percebemos a extrema vulnerabilidade das

ações voltadas à atenção da saúde do servidor público que, definitivamente, não integram uma política pública, mas ficam à mercê dos diferentes governos, sendo que os enunciados da saúde do trabalhador parecem ter uma frágil penetração em uma área ainda hegemônica da Medicina do Trabalho” (idem - grifo nosso)

No caso da consulta, indaga-se quanto à necessidade de se

exigir atestados dos servidores públicos afastados em razão da contaminação pelo Covid-19 quando de seu regresso. Ora, a resposta a essa pergunta não pertence ao Direito, mas à medicina do trabalho. Caberá aos órgãos responsáveis pela saúde do servidor do Município definirem

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os critérios e os parâmetros para o retorno desses servidores por meio de normas de saúde, higiene, segurança. Essas normas poderão levar em consideração o tempo de afastamento, os sintomas, exames, atestados e laudos médicos. Poderá a própria perícia do Município responsabilizar-se por fazer a anamnese desses servidores no seu retorno; caso não existam médicos peritos suficientes para atendimento dessa demanda ou organização desse fluxo de serviço, poderão ser contratados serviços especializados em medicina e saúde do trabalho com observância da Lei nº 8.666/1993 e da Lei nº 13.979/2020.

Em vista de tudo que foi exposto, conclui-se que cabe ao

Município estabelecer normas de saúde, higiene e segurança dos servidores estatutários, visando à redução dos riscos inerentes ao trabalho, conforme determina o art. 39, § 3º c/ art. 7º, XXII. Os critérios e parâmetros para o retorno dos servidores que hajam sido contaminados por Covid-19 é assunto que pertence à medicina do trabalho e que deve ser objeto de regulamentação pela administração local. Portanto, a exigência de atestado poderá ser realizada caso devidamente justificada por parâmetros técnicos.

É o parecer, s.m.j.

Gustavo da Costa Ferreira M. dos Santos

Consultor Técnico

Aprovo o parecer

Marcus Alonso Ribeiro Neves

Consultor Jurídico

Rio de Janeiro, 08 de junho de 2020.

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Parecer IBAM Nº 1275/2020

SM – Servidor Público. LC nº 173/2020. Aumentos salariais. Progressões. Promoções. Considerações.

CONSULTA:

Tendo em vista o inciso IX do art. 8º da LC nº 173/2020, indaga o consulente acerca da possibilidade de concessão neste período de aumentos salarias, progressões e promoções a servidores efetivos que já constam nos planos de cargos e carreiras do Município.

A consulta vem acompanhada da LC nº 173/2020 e de

documentos pertinentes à discussão do respectivo projeto de lei.

RESPOSTA:

Inicialmente, como sabido, a rápida expansão da pandemia do

Novo Coronavírus (COVID-19) impôs sérias restrições ao nosso modo de vida, sendo certo que as recomendações de distanciamento social e de quarentena geram uma redução substancial da circulação de pessoas, que levam, por sua vez, a impactos sensíveis nas mais diversas áreas da sociedade e, por conseguinte, a necessidade de organização da Administração Pública para atendimento das demandas e manutenção do bem comum.

Diante do acelerado avanço da doença no Brasil e dos múltiplos

desdobramentos no campo da saúde e da economia, ao longo deste ano de 2020, os poderes Executivo, Legislativo e Judiciário têm adotado, proposto ou sugerido medidas, providências ou ordens, de conteúdos diversos, para instrumentalizar o Poder Público e a sociedade em geral

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com os meios que se reputam oportunos e necessários para enfrentamento da crise.

Neste contexto, em 28 de maio de 2020, entrou em vigor a LC nº

173/2020 que encarta o Programa Federativo de Enfrentamento ao Coronavírus, que estabelece medidas de socorro financeiro da União para os demais entes federativos mediante algumas contrapartidas negociadas pelo Executivo com o Senado Federal. A referida lei complementar também trouxe sensíveis modificações na LRF (LC nº 101/2000).

Dentre suas disposições transitórias, a LC nº 173/2020, mais

precisamente em seu art. 8º, I, veda até 31 de dezembro de 2021 a concessão de qualquer vantagem, aumento, reajuste ou adequação aos servidores, excepcionando em sua parte final aquelas decorrentes de decisões judiciais que assim venham a determinar, bem como aquelas provenientes de determinação legal anterior à calamidade pública. Já o inciso IX deste mesmo dispositivo veda a utilização do lapso temporal mencionado no caput para fins de cômputo de período aquisitivo de determinadas vantagens. Vejamos:

"Art. 8º Na hipótese de que trata o art. 65 da Lei

Complementar nº 101, de 4 de maio de 2000, a União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios afetados pela calamidade pública decorrente da pandemia da Covid-19 ficam proibidos, até 31 de dezembro de 2021, de:

I - conceder, a qualquer título, vantagem, aumento,

reajuste ou adequação de remuneração a membros de Poder ou de órgão, servidores e empregados públicos e militares, exceto quando derivado de sentença judicial transitada em julgado ou de determinação legal anterior à calamidade pública;

(...)

VI - criar ou majorar auxílios, vantagens, bônus, abonos,

verbas de representação ou benefícios de qualquer natureza,

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inclusive os de cunho indenizatório, em favor de membros de Poder, do Ministério Público ou da Defensoria Pública e de servidores e empregados públicos e militares, ou ainda de seus dependentes, exceto quando derivado de sentença judicial transitada em julgado ou de determinação legal anterior à calamidade;

IX - contar esse tempo como de período aquisitivo

necessário exclusivamente para a concessão de anuênios, triênios, quinquênios, licenças-prêmio e demais mecanismos equivalentes que aumentem a despesa com pessoal em decorrência da aquisição de determinado tempo de serviço, sem qualquer prejuízo para o tempo de efetivo exercício, aposentadoria, e quaisquer outros fins." (Grifos nossos).

Analisando primeiramente o teor do inciso I do art. 8º acima

transcrito, temos que com relação as vantagens decorrentes de decisões judiciais, o trecho é autoexplicativo e não enseja maiores dúvidas. Por outro lado, no que tange àquelas provenientes de determinação legal anterior à calamidade pública, vale registrar que aqueles direitos, vantagens que o servidor já fazia jus por ocasião do reconhecimento da situação de calamidade pública em âmbito nacional pelo Decreto Legislativo nº 06/2020 (em 20/03/2020) devem ser pagos/concedidos.

De outra feita, à luz do inciso IX do art. 8º, o período de 20 de

março de 2020 até dezembro de 2021 encontra-se suspenso para fins de concessão de vantagens que dependam exclusivamente do decurso do tempo, a exemplo dos anuênios ou licenças prêmio. Isto quer significar que este lapso temporal somente poderá ser computado para concessão de tais vantagens após janeiro de 2022.

Da simples leitura dos dispositivos colacionados, qualquer

aumento de remuneração, vencimento base ou vantagens lato senso, somente pode ser admitido caso a lei correspectiva tenha entrado em vigor antes de 20/03/2020 (data da publicação do Decreto Lei nº 06/2020). Neste ponto, vale explicitar que as progressões (lato senso) não se enquadram

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nos conceitos vantagem, aumento, reajuste ou adequação de remuneração e, mesmo que se enquadrassem, de certo, decorrem de plano de cargos e carreiras anterior a 20/03/2020.

No que tange ao inciso IX do art. 8º da LC nº 173/2020, como

aventado acima, a vedação de contagem do tempo se aplica para concessão de vantagens que decorram exclusivamente do decurso do tempo, tal como aponta a primeira parte do dispositivo. As progressões, em atendimento ao postulado constitucional da eficiência, não decorrem exclusivamente do mero decurso do tempo, devendo este fator ser conjugado com outros, a exemplo da avaliação de desempenho, titulação, entre outros.

Assim, se a progressão funcional lato senso (progressões e

promoções), além do decurso do tempo, exigir avaliação de desempenho, dentre outros critérios, não há óbices à sua concessão no período estabelecido no caput do art. 8º da LC nº 173/2020.

Isto posto, concluímos objetivamente a presente consulta na

forma das razões exaradas.

É o parecer, s.m.j.

Priscila Oquioni Souto

Assessora Jurídica

Aprovo o parecer

Marcus Alonso Ribeiro Neves

Consultor Jurídico

Rio de Janeiro, 08 de junho de 2020.

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Parecer IBAM Nº 1281/2020

SM – Servidor Público. LC nº 173/2020. Adicional por tempo de serviço. Revisão geral anual. Considerações.

CONSULTA:

Tendo em vista a entrada em vigor da LC nº 173/2020, mormente das vedações contidas em seu art. 8º, indaga o consulente:

"- Em relação ao tempo de serviço para aquisição de

quinquênios e licença-prêmio: - o período terá a contagem interrompida em 27 de maio de 2020 e voltará a contar a partir de 01 de janeiro de 2022?

- A revisão geral anual, para correção da inflação,

prevista na CF, a qual em nosso município temos a data-base fixada em fevereiro e o percentual acumulado no índice IPCA (LC 234/2013 alterada pela LC 276/2017) fica permitida?"

A consulta não veio documentada.

RESPOSTA:

Inicialmente, como sabido, a rápida expansão da pandemia do

Novo Coronavírus (COVID-19) impôs sérias restrições ao nosso modo de vida, sendo certo que as recomendações de distanciamento social e de quarentena geram uma redução substancial da circulação de pessoas, que levam, por sua vez, a impactos sensíveis nas mais diversas áreas da sociedade e, por conseguinte, a necessidade de organização da Administração Pública para atendimento das demandas e manutenção do bem comum.

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Diante do acelerado avanço da doença no Brasil e dos múltiplos desdobramentos no campo da saúde e da economia, ao longo deste ano de 2020, os poderes Executivo, Legislativo e Judiciário têm adotado, proposto ou sugerido medidas, providências ou ordens, de conteúdos diversos, para instrumentalizar o Poder Público e a sociedade em geral com os meios que se reputam oportunos e necessários para enfrentamento da crise.

Neste contexto, em 28 de maio de 2020, entrou em vigor a LC nº

173/2020 que encarta o Programa Federativo de Enfrentamento ao Coronavírus, que estabelece medidas de socorro financeiro da União para os demais entes federativos mediante algumas contrapartidas negociadas pelo Executivo com o Senado Federal. A referida lei complementar também trouxe sensíveis modificações na LRF (LC nº 101/2000).

Dentre suas disposições transitórias, a LC nº 173/2020, mais

precisamente em seu art. 8º, I, veda até 31 de dezembro de 2021 a concessão de qualquer vantagem, aumento, reajuste ou adequação aos servidores, excepcionando em sua parte final aquelas decorrentes de decisões judiciais que assim venham a determinar, bem como aquelas provenientes de determinação legal anterior à calamidade pública. Já o inciso IX deste mesmo dispositivo veda a utilização do lapso temporal mencionado no caput para fins de cômputo de período aquisitivo de determinadas vantagens. Vejamos:

"Art. 8º Na hipótese de que trata o art. 65 da Lei

Complementar nº 101, de 4 de maio de 2000, a União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios afetados pela calamidade pública decorrente da pandemia da Covid-19 ficam proibidos, até 31 de dezembro de 2021, de:

I - conceder, a qualquer título, vantagem, aumento,

reajuste ou adequação de remuneração a membros de Poder ou de órgão, servidores e empregados públicos e militares, exceto quando derivado de sentença judicial transitada em julgado ou de determinação legal anterior à calamidade pública;

(...)

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IX - contar esse tempo como de período aquisitivo necessário exclusivamente para a concessão de anuênios, triênios, quinquênios, licenças-prêmio e demais mecanismos equivalentes que aumentem a despesa com pessoal em decorrência da aquisição de determinado tempo de serviço, sem qualquer prejuízo para o tempo de efetivo exercício, aposentadoria, e quaisquer outros fins." (Grifos nossos).

Analisando primeiramente o teor do inciso I do art. 8º acima

transcrito, temos que com relação as vantagens decorrentes de decisões judiciais, o trecho é autoexplicativo e não enseja maiores dúvidas. Por outro lado, no que tange àquelas provenientes de determinação legal anterior à calamidade pública, vale registrar que aqueles direitos, vantagens que o servidor já fazia jus por ocasião do reconhecimento da situação de calamidade pública em âmbito nacional pelo Decreto Legislativo nº 06/2020 (em 20/03/2020) devem ser pagos/concedidos.

Assim, à luz do inciso I do art. 8º acima transcrito a partir de

20/03/2020 não se revela factível a edição da lei de concessão da revisão geral anual, ainda que a data base tenha sido em fevereiro.

Aliás, neste ponto, vale registrar que, recentemente, o STF, no

julgamento do RE nº 565.089, firmou a tese de que o não encaminhamento do projeto de lei de revisão geral anual dos vencimentos dos servidores públicos previsto no inciso X do art. 37 da Constituição não gera direito à indenização, devendo o Poder Executivo, no entanto, se pronunciar de forma fundamentada sobre as razões pelas quais não propôs a revisão.

De outra feita, à luz do inciso IX do art. 8º, o período de 20 de

março de 2020 até dezembro de 2021 encontra-se suspenso para fins de concessão de vantagens que dependam exclusivamente do decurso do tempo, a exemplo dos anuênios ou licenças prêmio. Isto quer significar que este lapso temporal somente poderá ser computado para concessão de tais vantagens após janeiro de 2022.

Por conseguinte, com relação à concessão de anuênios, triênios

e demais adicionais por tempo de serviço, em que pese não nos tenha sido

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dado conhecer o teor do Estatuto dos servidores local (norma constitucionalmente adequada a tratar do tema), via de regra, para a implementação deste direito exige-se o mero decurso do tempo. Em assim sendo, com a publicação da LC 173/2020 resta obstada sua concessão, sendo certo que este lapso temporal (da edição do Decreto Legislativo nº 06/2020 até 31 de dezembro de 2021) não poderá ser utilizado para concessão de adicional por tempo de serviço após 31 de dezembro de 2021. De toda sorte, caso a vantagem tenha sido concedida entre a data da edição do Decreto Legislativo nº 06/2020 e a publicação da LC 173/2020 estaríamos diante de ato jurídico perfeito que não pode ser prejudicado por lei posterior (art. 5º, XXXVI da CF).

Destacamos, por oportuno, que o art. 8º, IX, da LC nº 173/2020 não interrompe o prazo aquisitivo das vantagens, de forma a zerar o seu cômputo, mas tão somente o suspende, não havendo a contagem até 31 de dezembro de 2021. A partir de janeiro de 2022, o lapso temporal para aquisição de adicional por tempo de serviço volta a contar de onde parou. Por exemplo, se em 20/03/2020 (data da publicação do Decreto Legislativo 06/2020) determinado servidor contava com três meses para aquisição de anuênio, em janeiro de 2022, ele retomará a contagem do lapso temporal a partir desses três meses.

Isto posto, concluímos objetivamente a presente consulta na

forma das razões exaradas.

É o parecer, s.m.j.

Priscila Oquioni Souto Assessora Jurídica

Aprovo o parecer

Marcus Alonso Ribeiro Neves

Consultor Jurídico

Rio de Janeiro, 08 de junho de 2020.

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Parecer IBAM Nº 1283/2020

SM – Servidor Público. Projeto de lei que visa reduzir a jornada laboral dos servidores municipais da área da saúde de 40 horas semanais para 30 horas semanais sem redução da remuneração. Ano de eleições municipais. LC nº 173/2020. Considerações.

CONSULTA:

Indaga o consulente acerca da viabilidade jurídica de projeto de lei que visa reduzir a jornada laboral dos servidores municipais da área da saúde de 40 horas semanais para 30 horas semanais sem redução da remuneração, tendo em vista as eleições municipais do corrente ano.

Para tanto o consulente esclarece que o referido projeto de lei foi

protocolizado em 04/06/2020.

A consulta não veio documentada.

RESPOSTA:

Inicialmente, temos que a rápida expansão da pandemia do Novo

Coronavírus (COVID-19) impôs sérias restrições ao nosso modo de vida, sendo certo que as recomendações de distanciamento social e de quarentena geram uma redução substancial da circulação de pessoas, que levam, por sua vez, a impactos sensíveis na capacidade financeira dos cidadãos, bem como nos serviços prestados à população.

Dentro deste contexto, muitos municípios têm questionado

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acerca da possibilidade de redução dos vencimentos de servidores, o que não seria possível à luz do postulado constitucional da irredutibilidade dos vencimentos (art. 37, XV, da Constituição Federal):

"Art. 37:(...)

XV - o subsídio e os vencimentos dos ocupantes de

cargos e empregos públicos são irredutíveis, ressalvado o disposto nos incisos XI e XIV deste artigo e nos arts. 39, § 4º, 150, II, 153, III, e 153, § 2º, I;"

Ainda acerca da irredutibilidade dos vencimentos, a possibilidade

de redução de remuneração de servidores efetivos ou comissionados por excesso de despesas de pessoal prevista no art. 23, §§ 1º e 2º da LC nº 101/2000 está com aplicabilidade suspensa por conta de decisão cautelar na ADI 2238/DF do STF (mencionada pelo consulente em sua consulta):

"EMENTA: CONSTITUCIONAL. MEDIDA CAUTELAR EM

AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE. LEI COMPLEMENTAR Nº 101, DE 04 DE MAIO DE 2000 (LEI DE RESPONSABILIDADE FISCAL). MEDIDA PROVISÓRIA Nº 1.980-22/2000. Lei Complementar nº 101/2000. Não- conhecimento.

(...)

XXV - Art. 23, §§ 1º e 2º: a competência cometida à lei

complementar pelo § 3º do art. 169 da Constituição Federal está limitada às providências nele indicadas, o que não foi observado, ocorrendo, inclusive, ofensa ao princípio da irredutibilidade de vencimentos. Medida cautelar deferida para suspender, no § 1º do art. 23, a expressão "quanto pela redução dos valores a eles atribuídos", e, integralmente, a eficácia do § 2º do referido artigo. "

Não obstante, não é isso que se indaga na presente

oportunidade. Aqui, a municipalidade pretende a redução da jornada

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laboral dos servidores municipais da área da saúde, contudo, sem a redução dos respectivos vencimentos.

Neste diapasão, em razão da autonomia que lhe fora outorgada

pela Constituição Federal (art. 18 c/c art. 30, I), pode o Município dispor sobre o regime jurídico de seus servidores, o qual caracteriza conjunto de regras que regem a relação entre a Administração e seu pessoal. Vale registrar, por oportuno, que é entendimento assente no âmbito dos Tribunais Superiores à inexistência de direito adquirido à manutenção do regime aplicável no momento da nomeação, motivo pelo qual pode ele vir a ser alterado a qualquer tempo, desde que por intermédio de lei.

Assim, compete ao Poder Executivo definir em lei a carga horária

dos cargos que compõem a sua estrutura administrativa. Releva frisar que o sistema constitucional vigente permite a fixação da jornada laboral em até 44 horas semanais e 8 horas diárias, conforme art. 7º, XIII, tratando-se de direito extensivo ao servidor público, por força da combinação com o art. 39, § 3º, da Lei Maior.

Vale alertar, outrossim, que a alteração da carga horária, assim

como sua fixação, deve se dar em conformidade com as peculiaridades das atividades inerentes ao cargo, não poderá importar em irredutibilidade de vencimentos (o que já relatado pelo consulente que não acontecerá) e precisa sempre atender ao interesse público. A majoração ou minoração da carga horária, dentro deste contexto, deve se referir ao cargo conglobando todos os servidores nele providos, sob pena de violação aos postulados da impessoalidade e da moralidade.

De igual forma, a redução da carga horária não pode ensejar

prejuízos ao interesse público, tais como: prejudicar a eficiência dos serviços prestados, exigir gastos com o pagamento de horas extraordinárias ou contratações temporárias.

Dito isto, alertamos que neste momento de situação de

calamidade pública e enfrentamento de uma pandemia, com arrimo nos postulados da eficiência e da moralidade, não vislumbramos como a

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redução da carga horária possa não ensejar prejuízo ao interesse público!

Feitas estas considerações, tendo em vista que, não obstante a

situação de calamidade pública ensejada pela pandemia da COVID-19, até a presente data o TSE mantém o Calendário Eleitoral (Res. nº 23.606/2019), mister observarmos o teor do art. 73, incisos V e VIII, da Lei nº 9.504/1997:

"Art. 73. São proibidas aos agentes públicos, servidores

ou não, as seguintes condutas tendentes a afetar a igualdade de oportunidades entre candidatos nos pleitos eleitorais:

(...)

V - nomear, contratar ou de qualquer forma admitir,

demitir sem justa causa, suprimir ou readaptar vantagens ou por outros meios dificultar ou impedir o exercício funcional e, ainda, ex

officio, remover, transferir ou exonerar servidor público, na circunscrição do pleito, nos três meses que o antecedem e até a posse dos eleitos, sob pena de nulidade de pleno direito, ressalvados:

(...)

VIII - fazer, na circunscrição do pleito, revisão geral da

remuneração dos servidores públicos que exceda a recomposição da perda de seu poder aquisitivo ao longo do ano da eleição, a partir do início do prazo estabelecido no art. 7º desta Lei e até a posse dos eleitos. " (Grifos nossos).

À luz do dispositivo colacionado, tendo em vista que na redução

da jornada laboral não há um aumento nominal nem aumento de despesa com pessoal, não vislumbramos óbices de natureza eleitoral.

No mesmo toar, o art. 8º, I, da LC nº 173/2020 (instituiu o

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Programa Federativo de Enfrentamento ao Coronavírus SARS-CoV-2/ COVID-19) que veda até 31 de dezembro de 2021 a concessão de qualquer vantagem, aumento, reajuste ou adequação aos servidores, excepcionando em sua parte final aquelas decorrentes de decisões judiciais que assim venham a determinar, bem como aquelas provenientes de determinação legal anterior à calamidade pública.

Não havendo efetivamente aumento de despesa com pessoal na

medida, de igual forma, não vislumbramos óbices na redução da jornada no que tange ao art. 8º da LC nº 173/2020.

Assentas as premissas acima, muito embora não existam óbices

na seara eleitoral e menos no que tange ao art. 8º da LC nº 173/2020, reiteramos que neste momento de situação de calamidade pública e enfrentamento de uma pandemia, com arrimo nos postulados da eficiência e da moralidade, não vislumbramos como a redução da carga horária possa não ensejar prejuízo ao interesse público e em necessidade de, em breve, aumentar a despesa com pessoal com contratações temporárias para suprir a demanda.

Isto posto, concluímos objetivamente a presente consulta na

forma das razões exaradas.

É o parecer, s.m.j.

Priscila Oquioni Souto

Assessora Jurídica

Aprovo o parecer

Marcus Alonso Ribeiro Neves

Consultor Jurídico

Rio de Janeiro, 09 de junho de 2020.

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Parecer IBAM Nº 1289/2020

FM – Finanças Municipais, SM – Servidor Público. LC nº 173/2020. Termo inicial das restrições do art. 8º. Questionamentos diversos.

CONSULTA:

A Câmara Municipal consulta este Instituto a respeito da aplicação da Lei Complementar nº 173/2020. Aduz o consulente que, em vista das proibições constantes do art. 8º e seus respectivos incisos e parágrafos, faz-se necessária análise e pronunciamento deste Instituto quanto a diversas dúvidas.

Informa o consulente que o quadro de servidores da Câmara

Municipal é composto de 6 (seis) servidores efetivos, cuja carga horária é de 8 (oito) horas, para os auxiliares de serviço, e 6 (seis) horas para os cargos de menor complexidade, 4 (quatro) horas para os cargos de complexidade maior.

A legislação municipal possibilita que os servidores ocupantes de

cargos efetivos recebam horas-extras, adicional de nível universitário, gratificação por produtividade, auxilio alimentação, o vencimento mensal, adicional de 1/3 de férias, podendo estas serem convertidas em até 50% e pagas em pecúnia, licença prêmio (paga em dinheiro a cada 5 anos de efetivo trabalho, podendo optar pelo descanso de 3 meses); bônus assiduidade, abono permanência e anuênio ao servidor que venha fazer jus.

Em vista do exposto:

1) A data de início da contagem da suspensão do tempo

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previsto no inciso IX do Artigo 8º da Lei Complementar n.º 173 de 27 de maio é a data da decretação do estado de calamidade pública no município ou é a data da vigência da lei?

2) Nos termos do inciso IX do artigo 8º da Lei

Complementar n.º 173 de 27 de maio de 2020, é também suspensa a contagem de tempo para a concessão de férias anuais?

3) Nos termos do inciso IX do Artigo 8º da Lei

Complementar n.º 173 de 27 de maio de 2020, suspende a contagem de tempo para a concessão do abono permanência?

4) Nos termos do inciso I do artigo 8º da lei

Complementar de 27 de maio de 2020 é possível o pagamento de horas extras (serviços extraordinários) nos termos do Art. 119 da Lei Municipal 424/69?

5) Nos termos do inciso I, do artigo 8º da Lei

Complementar é possível o pagamento de gratificação por produtividade, nos termos do art. 5º da Lei 1.494 de 23/10/90?

6) Nos termos do inciso I, do artigo 8º da Lei

Complementar nº 173 é possível manter o pagamento do auxílio alimentação previsto na Lei Municipal nº 2.278 de 17/04/2004?

7) Nos termos do inciso I, do Artigo 8º da lei

Complementar n.º 173 de 27 de maio de 2020, é permitido conceder o pagamento de adicional de nível universitário, nos termos do art. 38 da Lei 1.346/89 requerido após a vigência da LC 173?

8) É possível converter cinquenta por cento das férias

regulamentares em pecúnia, após a vigência da Lei Complementar n.º 173 de 27 de maio de 2020?

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9) É possível realizar o pagamento, após a vigência da Lei Complementar 173 do bônus assiduidade previsto na Lei 2.522/07?

10) Solicita que sejam feitos outros comentários e

observações que sejam pertinentes.

A consulta vem documentada.

RESPOSTA:

Diante do acelerado avanço da pandemia do Novo Coronavírus

(Covid-19) e das relevantes repercussões econômicas da calamidade que vivenciamos, foi editada a Lei Complementar nº 173/2020 para fazer frente à premente necessidade de contenção dos gastos púbicos, visando à promoção de um esforço conjunto de todos os entes da federação, em espírito de cooperação, para superação dos efeitos deletérios da propagação da infecção viral sobre a economia. Assim é que a referida LC nº 173/2020 promoveu sensíveis e relevantes alterações na Lei Complementar nº 101/2000 (Lei de Responsabilidade Fiscal — LRF), que dizem respeito a despesas de pessoal realizadas no fim do mandato.

Antes, é bom dizer que não se trata a LC nº 173/2020 apenas de

uma lei que visou a impor restrições na execução orçamentária, na realização de gastos públicos e aumentos a servidores. Ela se trata, como já aponta sua ementa, de um Programa Federativo de Enfrentamento ao Coronavírus, que envolve auxílio financeiro da União aos Estados e Municípios acompanhados de contrapartidas, conduzido sob o espírito do federalismo fiscal.

A LC nº 173/2020 tem supedâneo, assim, na competência da

União prevista no art. 24, parágrafo único, tendo em vista o equilíbrio do desenvolvimento e do bem-estar em âmbito nacional, e também no art. 169, § 9º, da CRFB, visando à gestão responsável das finanças públicas de aplicabilidade a todas as esferas da federação, bem como a situação de excepcional limitação causada pela crise econômica em curso.

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Assim, além das alterações permanentes no art. 21 da LRF, cabe nesse momento muita atenção ao o art. 8º da própria LC nº 173/2020, que contêm disposições temporárias que se aplicarão até o dia 31 de dezembro de 2021 e que dizem respeito diretamente à presente consulta.

Pertinente, antes, porém, trazer à colação o disposto no art. 21 da

LRF, já com redação conferida pelo art. 7º da LC nº 173/2020:

“Art. 21. É nulo de pleno direito:

I - o ato que provoque aumento da despesa com

pessoal e não atenda:

a) às exigências dos arts. 16 e 17 desta Lei

Complementar e o disposto no inciso XIII do caput do art. 37 e no § 1º do art. 169 da Constituição Federal;

b) ao limite legal de comprometimento aplicado às

despesas com pessoal inativo;

II - o ato de que resulte aumento da despesa com

pessoal nos 180 (cento e oitenta) dias anteriores ao final do mandato do titular de Poder ou órgão referido no art. 20;

(...) § 1º As restrições de que tratam os incisos II, III e

IV:

I - devem ser aplicadas inclusive durante o período de recondução ou reeleição para o cargo de titular do Poder ou órgão autônomo; e

II - aplicam-se somente aos titulares ocupantes de

cargo eletivo dos Poderes referidos no art. 20.

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§ 2º Para fins do disposto neste artigo, serão considerados atos de nomeação ou de provimento de cargo público aqueles referidos no § 1º do art. 169 da Constituição Federal ou aqueles que, de qualquer modo, acarretem a criação ou o aumento de despesa obrigatória.” (grifo nosso)

Antes da alteração promovida pelo art. 7º da LC nº 173/2020 à

LC nº 101/2000, havia balizado entendimento, encampado pelo IBAM e pelo Tribunal de Contas da União (cf. Acórdão TCU nº 1106/2008, publicado em 06/11/2008) de que o ato de que resultava o aumento da despesa de pessoal consistia na lei ou norma criadora da despesa, e não propriamente no ato administrativo ou de gestão que executa a despesa. Assim, a implementação de despesa que decorria automática e diretamente da lei, quando devidamente atendidas as exigências do art. 169, § 1º da CRFB, bem como observados os princípios da razoabilidade, da proporcionalidade e da continuidade administrativa, se encontrava imune à vedação do art. 21, parágrafo único, em sua redação original.

No entanto, as novíssimas alterações no art. 21 da LRF acenam

no sentido de que o legislador encampou entendimento, já adotado em alguns tribunais de contas estaduais, no sentido de que o ato que provoca aumento de despesa de pessoal abrange tanto a lei que cria a obrigação de despesa, como também o ato administrativo concreto que materializa a obrigação de despesa, isto é, a execução orçamentária. Assim, quando da efetiva implementação de acréscimos pecuniários que acarretem aumento de despesa com pessoal, deverão ser observadas as restrições aplicáveis em fim de mandato.

Assim, a partir de 5 de julho de 2020 (180 dias finais do

mandato), passa a haver restrições à implementação de direitos que acarretam aumento de gastos. A LRF e a LC nº 173/2020, evidentemente, não retroagem para tornar totalmente ineficazes os planos de carreiras já existentes e em plena vigência, mas impõem restrições e parâmetros financeiros para que possam ser aplicados com responsabilidade fiscal,

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que analisaremos caso a caso mais abaixo.

Para atender ao comando de que não se aumentem despesas

com pessoal nos últimos 180 dias de mandato, a interpretação mais segura é que se mantenham os percentuais com despesa de pessoal em comparação com a receita corrente líquida, para que não sejam majorados no período de 180 dias que antecedem o mandato. A respeito desse último ponto, convém trazer a orientação do Tribunal de Contas do Estado de Santa Catarina em "Cartilha de Final de Mandato":

"Durante os últimos 180 dias do mandato dos prefeitos e

presidentes de Câmaras, ou seja, a partir de 5 de julho, os gastos com pessoal dos Poderes Legislativo e Executivo não poderão ser aumentados, sendo considerados nulos de pleno direito os atos que resultarem em acréscimo, conforme dispõe a Lei Complementar no 101/00, em seu art. 21, parágrafo único.

É importante destacar que a verificação é feita pelo

percentual resultante do cálculo da despesa com pessoal dos últimos 12 meses em relação à Receita Corrente Líquida do mesmo período.

Observa-se que, no período de vedação, poderá a

Administração Pública municipal aumentar as despesas com pessoal não descumprindo a norma legal da LRF, caso as receitas arrecadadas que compõem o cálculo da Receita Corrente Líquida acompanhem proporcionalmente o acréscimo, ou que haja a redução das despesas com pessoal já existentes." (cf. http:// http://www.tce.sc.gov.br/sites/default/files/final%20de%20mandato_TCE_2012_site_0.pdf , pag. 9, acesso em 03/06/2020, grifo nosso)

Em igual sentido, o Tribunal de Contas do Estado de São Paulo,

no estudo intitulado "O Tribunal e a Gestão Financeira dos Prefeitos", a orientação quanto à aplicação da vedação ao aumento de despesas de pessoal nos últimos 180 dias do mandato foi a seguinte:

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"Entre 5 de julho e 31 de dezembro do último ano de gestão, não pode o Prefeito editar ato que aumente a despesa de pessoal. Nesse rumo, a Lei n.º 10.028, de 2000, responsabiliza o gestor que comete o desvio (art. 359-G do Código Penal), contexto que justifica o parecer desfavorável desta Casa de Contas.

Dessa vedação escapam aumentos derivados de atos

editados antes de 5 de julho; eis alguns exemplos:

• A concessão de vantagens pessoais advindas dos estatutos de

servidores (anuênios, quinquênios, sexta-parte); • O abono concedido aos profissionais da educação básica para

que se atenda à Emenda Constitucional nº 53, 2007 (60% do FUNDEB para aquele profissional);

• A revisão geral anual (art. 37, X da CF), derivada de lei local anterior a 5 de julho;

• Contratação de pessoal para o atendimento de convênios antes assinados;

• Cumprimento de decisões judiciais.

Ao demais, há de se enfatizar que, sob a LRF, a despesa

de pessoal é sempre um número percentual, obtido do confronto de 12 meses desse gasto com 12 meses de receita corrente líquida. Então, incrementar tal dispêndio é o mesmo que elevar sua taxa face à verificada no mês que precede os 180 dias da norma: o de junho.

De toda sorte e por medida de cautela, recomenda-se que,

nos últimos 180 dias, um inevitável aumento do gasto laboral seja compensado, de pronto, com cortes em outras rubricas de pessoal (ex.: contratação temporária de motoristas de ambulância compensada, de imediato, pelo corte, parcial ou total, de horas extras e de certas gratificações funcionais)" (cf. https:// https://www.tce.sp.gov.br/sites/default/files/publicacoes/manual-gestao-financeira-prefeitura-municipal_0.pdf, pag. 34-35, acesso em 03/06/2020 - grifo nosso)

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Assim, consideramos que, após as modificações promovidas pelo art. 7º da LC nº 173/2020 ao art. 21 da LRF, a melhor interpretação e a que oferece maior segurança jurídica para se evitar incorrer em nulidades e glosas pelos órgãos de controle nesse período de fim de mandato é evitar que haja crescimento do percentual de despesas de pessoal em face da receita corrente líquida. A respeito do tema, são valiosos os comentários de Flávio C. de Toledo Jr e Sérgio Ciqueira Rossi, em estudo realizado em 2002, quando ainda era muito recente a edição da LRF:

"Reside no conceito de "aumento de despesa de pessoal"

uma das polêmicas na inteligência do transcrito dispositivo. Defendem alguns tratar-se do aumento puramente nominal, em valores monetários, números absolutos, pois.

(...)

Ousamos nós, contudo, outra linha interpretativa, no

sentido da relativização das cifras nominais, em fração da receita corrente líquida, vale dizer, o cotejo é percentual, baseado na taxa do mês que antecede o início do alcance da aludida regra. Dentro do período restringido e conforme as exceções admitidas na Lei Eleitoral (art. 73, V, "a" a "d"), tornam-se possíveis aumentos nominais no gasto de pessoal, desde que isso não implique percentual maior que o registrado no período-base da regra, o mês anterior aos 180 dias do final da gestão. (...)

Para efeitos da Lei Complementar nº 101, de 2000, a

despesa de pessoal é, sempre, uma proporção da receita corrente líquida. Assim o é no instrumento de verificação dos limites fiscais, o Relatório de Gestão Fiscal (art. 55, I, "a"). Também é dessa forma quando se freia tal dispêndio porque ultrapassado o limite prudencial (art. 22, § único) ou à época em que se detecta necessidade de cortes vez ultrapassado o subteto máximo de cada Poder (art. 22).

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Em suma, a apuração desse gasto relaciona sempre duas variáveis fazendárias: a despesa de pessoal de cada Poder e a receita corrente líquida de todo ente federado; se é assim sempre, a barreira em debate não poderia ser observada de maneira diversa." (R. TCU. Brasília, v. 33, n. 93, jul/set 2002. "Aumento da despesa com pessoal nos 180 dias que ultimam os mandatos - uma análise sistemática do parágrafo único, artigo 21 da Lei de Responsabilidade Fiscal". Disponível em https:// revista.tcu.gov.br/ojs/index.php/RTCU/article/view/852)

De qualquer modo, como bem apontado pelo consulente, o mais

importante é observar que estão em vigor desde o dia 28 de maio de 2020, as excepcionais restrições previstas no art. 8º da LC nº 173/2020, mais severas que as do art. 21 da LRF. Assim, a verdade é que no presente momento, até o dia 31 de dezembro de 2021, cabe atentar para essas disposições excepcionais, que acabam, por serem mais restritivas, se impondo sobre aquelas acima expostas, as quais transcrevemos:

"Art. 8º Na hipótese de que trata o art. 65 da Lei

Complementar nº 101, de 4 de maio de 2000, a União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios afetados pela calamidade pública decorrente da pandemia da Covid-19 ficam proibidos, até 31 de dezembro de 2021, de:

I - conceder, a qualquer título, vantagem, aumento,

reajuste ou adequação de remuneração a membros de Poder ou de órgão, servidores e empregados públicos e militares, exceto quando derivado de sentença judicial transitada em julgado ou de determinação legal anterior à calamidade pública;

(...)

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VI - criar ou majorar auxílios, vantagens, bônus, abonos, verbas de representação ou benefícios de qualquer natureza, inclusive os de cunho indenizatório, em favor de membros de Poder, do Ministério Público ou da Defensoria Pública e de servidores e empregados públicos e militares, ou ainda de seus dependentes, exceto quando derivado de sentença judicial transitada em julgado ou de determinação legal anterior à calamidade;

VII - criar despesa obrigatória de caráter

continuado, ressalvado o disposto nos §§ 1º e 2º;

VIII - adotar medida que implique reajuste de

despesa obrigatória acima da variação da inflação medida pelo Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA), observada a preservação do poder aquisitivo referida no inciso IV do caput do art. 7º da Constituição Federal;

IX - contar esse tempo como de período aquisitivo

necessário exclusivamente para a concessão de anuênios, triênios, quinquênios, licenças-prêmio e demais mecanismos equivalentes que aumentem a despesa com pessoal em decorrência da aquisição de determinado tempo de serviço, sem qualquer prejuízo para o tempo de efetivo exercício, aposentadoria, e quaisquer outros fins.

§ 1º O disposto nos incisos II, IV, VII e VIII do caput

deste artigo não se aplica a medidas de combate à calamidade pública referida no caput cuja vigência e efeitos não ultrapassem a sua duração.

§ 2º O disposto no inciso VII do caput não se aplica

em caso de prévia compensação mediante aumento de receita ou redução de despesa, observado que:

I - em se tratando de despesa obrigatória de caráter

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continuado, assim compreendida aquela que fixe para o ente a obrigação legal de sua execução por período superior a 2 (dois) exercícios, as medidas de compensação deverão ser permanentes; e

II - não implementada a prévia compensação, a lei

ou o ato será ineficaz enquanto não regularizado o vício, sem prejuízo de eventual ação direta de inconstitucionalidade.

§ 3º A lei de diretrizes orçamentárias e a lei

orçamentária anual poderão conter dispositivos e autorizações que versem sobre as vedações previstas neste artigo, desde que seus efeitos somente sejam implementados após o fim do prazo fixado, sendo vedada qualquer cláusula de retroatividade.

(...)

§ 5º O disposto no inciso VI do caput deste artigo

não se aplica aos profissionais de saúde e de assistência social, desde que relacionado a medidas de combate à calamidade pública referida no caput cuja vigência e efeitos não ultrapassem a sua duração.

§ 6º (VETADO)." (grifo nosso)

Observa-se, portanto, que o art. 8º do art. 173/2020 impõe ainda

mais restrições que o art. 21 da LRF acima colacionado. Assim, pertinente é compreender a amplitude e os parâmetros para aplicação do aludido dispositivo de vigência temporária, que deve ser observado, desde o dia 28 de maio de 2020 até o dia 31 de dezembro de 2021.

Ora, o art. 8º, I, da LC nº 173/2020, ao vedar a concessão, a

qualquer título, de vantagem, aumento, reajustes ou adequação de remuneração dos servidores, excepciona aquelas que decorram de determinação legal anterior à calamidade pública. Portanto, a legislação já

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existente pode ser aplicada.

Importa notar, também, que o próprio art. 8º, no inciso III, veda a

alteração da estrutura de carreira que implique aumento de despesa. A contrário sensu, a estrutura de carreiras já prevista em lei anterior à calamidade continua em vigor e tem aplicabilidade, estando albergada pela exceção expressa prevista no dispositivo.

Cabe salientar, ainda, que não se tratando de acréscimos

pecuniários destinados especificamente ao combate à calamidade pública, mas fatos funcionais relacionados à organização dos cargos e carreiras da Câmara, deve sua concretização condicionar-se ao atendimento do disposto nos arts. 16 e 17 da LC nº 101/2001, por não se enquadrar no permissivo do art. 65, § 1º III da LC nº 101/2000, com redação dada pela LC nº 173/2020. Com efeito, os servidores da Câmara não estão envolvidos diretamente em medidas de combate à calamidade púbica, exceção prevista no § 1º do art. 8º da LC nº 173/2020.

Outra limitação importante é que o aumento da despesa com a

folha de pagamento, que se enquadra no conceito de despesa obrigatória, não pode fazer com que o valor global das despesas obrigatórias variem positivamente em percentual maior que o do IPCA, conforme determina o art. 8º, VIII, da LC nº 173/2020, até o dia 31 de dezembro de 2021. Na prática, o dispositivo acabará por restringir a realização de despesas de pessoal, que apenas se viabilizará caso o dispêndio nominal com despesas obrigatórias da Câmara não varie acima do IPCA, em cumprimento do disposto no art. 8º, VIII, da LC nº 173/2020.

Convém observar, também, que, como já dito anteriormente, a

redação conferida ao art. 21 da LRF encampa entendimento de que o ato criador da despesa não é apenas a lei que cria o cargo ou os mecanismos de promoção, mas também o ato de execução orçamentária que provoca o aumento de despesa, isto é, a efetiva realização do gasto público. Portanto, o aumento remuneratório decorrente da concessão de qualquer acréscimo pecuniário que perdure por mais de dois exercícios deve observar o art. 8º, inciso VII e seu § 2º da LC nº 173/2020, isto é, apenas

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pode ocorrer caso haja prévia e permanente compensação mediante aumento da receita ou redução de despesa, bem como atendimento aos requisitos do art. 169, § 1º, da CRFB.

Aliás, quando tratávamos do art. 21, II, III e IV da LRF, já com

redação conferida pelo art. 7º da LC nº 173/2020, foi dito que para atender ao comando de que não se aumentem despesas com pessoal nos últimos 180 dias de mandato, a interpretação mais segura é que se mantenham os percentuais com despesa de pessoal em face da receita corrente líquida, para que não sejam majorados no período de 180 dias que antecedem o mandato.

Aqui, é importante apontar a diferença para o que dispõe o art.

8º, §2º, I e II, que é mais restritivo e se aplica até 31 de dezembro de 2021. Enquanto a aferição do percentual da receita corrente líquida para fins de observância da restrição ao aumento de despesa de pessoal nos últimos 180 dias de mandato (art. 21, da LRF) é verificada no decorrer daquele período, o art. 8º, § 2º, I e II vai além, ao dizer que caso o incremento da despesa de pessoal perdure por mais de dois exercícios — critério objetivo adotado para ser considerada a despesa de caráter continuado—, deve haver medida de compensação prévia e permanente consistente em redução de despesa ou incremento da receita. O inciso II do § 2º do art. 8º diz que, caso não seja implementada prévia medida compensatória de caráter permanente, o ato que aumenta despesa de pessoal ficará ineficaz.

Portanto, essa é outra condição objetiva para que seja viável

implementação de acréscimos pecuniários permanentes, ainda que previstos em legislação já existente, no período que começou em 28 de maio de 2020 e vai até 31 de dezembro de 2021. Nesse período de excepcional contenção de gastos, enquanto não for atendida a exigência de compensação prévia e permanente prevista no art. 8º, § 2º, inciso II, resta ineficaz a disposição legal que prevê a implementação de acréscimos pecuniários permanentes.

Em vista de tudo que foi exposto, passamos a responder os

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questionamentos formulados em suas especificidades:

1) A data de início da contagem da suspensão do tempo previsto

no inciso IX do Artigo 8º da Lei Complementar n.º 173 de 27 de maio é a data da decretação do estado de calamidade pública no município ou é a data da vigência da lei?

RESPOSTA: Este Instituto sustenta que a interpretação correta e

mais segura é de que o termo inicial do prazo da suspensão da contagem do tempo não é nem a vigência da lei, tampouco a decretação do estado de calamidade pública no Município. O termo inicial da suspensão da contagem do tempo previsto no inciso IX do art. 8º da LC nº 173/2020 é, na verdade, o dia 20 de março, data da publicação do Decreto Legislativo nº 6/2020 pelo Congresso Nacional, reconhecendo o estado de calamidade pública em âmbito nacional.

Explicamos: como já afirmado, a LC nº 173/2020 não se trata

apenas de diploma normativo que visou a impor restrições na execução orçamentária, na realização de gastos públicos e aumentos a servidores. Ela se trata, como já aponta sua ementa, de um Programa Federativo de Enfrentamento ao Coronavírus, que envolve auxílio financeiro da União aos Estados e Municípios acompanhados de contrapartidas. A LC nº 173/2020 tem supedâneo, assim, na competência da União prevista no art. 24, parágrafo único e no art. 169, § 9º, da CRFB, visando à gestão responsável das finanças públicas de aplicabilidade a todas as esferas da federação, bem como a situação de excepcional limitação causada pela crise econômica em curso.

O art. 8º da Lei Complementar nº 173/2020, diversamente da

modificação permanente na LRF realizada pelo art. 7º do mesmo diploma legal, é dirigido especificamente à situação de calamidade pública decorrente da atual pandemia da Covid-19, e ao fazer referência à hipótese de que trata o art. 65 da LRF, atrai para o seu campo de incidência todos os demais entes federativos afetados, independentemente destes terem decretado ou não estado de calamidade pública. Com efeito, é de se considerar que no mesmo dia 20/03/2020 em

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que foi editado o Decreto Legislativo nº 06/2020, pela Portaria nº 454 do Ministério da Saúde, foi declarado, em todo o território nacional, o estado de transmissão comunitária do novo Coronavírus (Covid-19).

As restrições do art. 8º estão, assim, atreladas à percepção do

auxílio financeiro advindo do Programa Federativo de Enfretamento ao Coronavírus SARS-CoV-2 (Covid-19) instituído pela Lei Complementar nº 173/2020 de modo que para incidência das restrições estabelecidas no artigo 8º do aludido diploma legal não há necessidade de decretação do estado de calamidade pela municipalidade.

As restrições, portanto, se aplicam de imediato em todo território

nacional, e não há como haver diferenciação de acordo com a data do reconhecimento da calamidade pública em cada Município. Isso porque se a finalidade das proibições encartadas no artigo 8º é estabelecer uma contrapartida dos demais entes federativos em face dos recursos financeiros que receberão da União, não faz sentido algum que este ou aquele Estado ou Município receba o socorro financeiro da União e esteja fora do âmbito de aplicação das proibições do art. 8º.

Por outro lado, não há segurança jurídica em sustentar que as

restrições se aplicam apenas a partir da vigência da lei, isto é, do dia 28 de maio de 2020, haja vista ter sido o caput do art. 8º, IX da LC nº 173/2020 bem claro para dizer que na hipótese de que trata o art. 65 da LRF, isto é, desde o reconhecimento da calamidade pública em nível nacional em 20 de março pelo Decreto Legislativo nº 6/2020, até o término da vigência do art. 8º em 31 de dezembro de 2021, é absolutamente proibido o cômputo de tempo para fins de qualquer incremento remuneratório que decorra exclusivamente de determinado tempo de serviço. Assim, desde o dia 20 de março de 2020 até o dia 31 de dezembro de 2021 estão suspensas as contagens de quaisquer outras vantagens fundadas exclusivamente no tempo de serviço, sem prejuízo da contagem de tempo de aposentadoria, efetivo exercício ou mesmo promoções ou progressões que comunguem concomitantemente o critério temporal com o de merecimento ou produtividade.

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2) Nos termos do inciso IX do artigo 8º da Lei Complementar n.º 173 de 27 de maio de 2020, é também suspensa a contagem de tempo para a concessão de férias anuais?

RESPOSTA: Não, porque o dispositivo tem como alvo a

"concessão de anuênios, triênios, quinquênios, licenças-prêmio e demais

mecanismos equivalentes que aumentem a despesa com pessoal em

decorrência da aquisição de determinado tempo de serviço". As férias se tratam de direito conferido pela Constituição a trabalhador (art. 7º, XVII), direito estendido expressamente aos servidores públicos pelo art. 39, § 3º da CRFB.

É de se averbar que a finalidade do direito a férias é o de conferir

ao servidor um período de repouso para recuperar-se do desgaste físico e mental sofrido após um ano de trabalho, como de lhe propiciar momentos de lazer e descanso. Além disso, embora com as férias devam ser pagos um acréscimo pontual de 1/3 sobre a remuneração normal (art. 7º, XVII, da CRFB), não há qualquer acréscimo permanente aos vencimentos dos servidores. Assim, não há qualquer identidade entre o direito às férias e adicionais fundados exclusivamente no tempo de serviço tais como anuênios, triênios, quinquênios ou licenças-prêmio.

A propósito, por amor ao debate, cabe observar que mesmo que

houvesse previsão de suspensão de contagem do tempo para concessão de férias na LC nº 173/2020, essa previsão seria inconstitucional, uma vez que não pode uma lei complementar suspender direito assegurado pela Constituição, que é norma de superior hierarquia. E o legislador, sabiamente, não previu e nem fez referência às férias.

3) Nos termos do inciso IX do Artigo 8º da Lei Complementar n.º

173 de 27 de maio de 2020, suspende a contagem de tempo para a concessão do abono permanência?

RESPOSTA: O art. 40, § 19 da CRFB/88 na nova redação dada

pela EC nº. 103/2019 dispõe sobre a concessão do abono de permanência nas regras permanentes e estabelece que por meio de lei, os Estados, o

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Distrito Federal e os Municípios podem restringir o alcance da norma, estabelecendo critérios para seu pagamento.

A norma de concessão de abono de permanência da última

reforma previdenciária tem eficácia contida, já que o legislador de cada ente federativo pode restringir-lhe o alcance, estabelecendo critérios que possam importar em redução de seu valor ou até mesmo em sua supressão, conforme o seguinte teor do § 19 do art. 40 da CRFB/88, na redação dada pela EC nº. 103/2019:

"Art. 40. [...]

§ 19. Observados critérios a serem estabelecidos em lei

do respectivo ente federativo, o servidor titular de cargo efetivo que tenha completado as exigências para a aposentadoria voluntária e que opte por permanecer em atividade poderá fazer jus a um abono de permanência equivalente, no máximo, ao valor da sua contribuição previdenciária, até completar a idade para aposentadoria compulsória."

Como é sabido, as normas constitucionais e infraconstitucionais

relacionadas ao regime próprio de previdência social dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, anteriores à data de entrada em vigor da Emenda Constitucional nº. 103/2019, e, em especial a regra de concessão de abono de permanência, continuam a ser aplicada aos Estados, Distrito Federal e Municípios para fins de cálculo dos proventos enquanto não promovidas alterações na legislação interna.

Registre-se que como o art. 35 da EC nº. 103/2019, revogou os

arts. 2º e 6º da EC nº. 41/2003 e o art. 3º da EC nº. 47/2005, a própria reforma de 2019 determinou um período de vacância para a vigência dessa revogação em face dos Estados, Distrito Federal e Municípios (art. 36, II), durante o qual não haverá aplicabilidade constitucional para os Estados, o Distrito Federal e os Municípios, já que ela dependerá de referendo para o início de sua vigência, mediante a publicação de lei de iniciativa privativa do respectivo Poder Executivo destes entes da

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Federação. Ou seja, enquanto não houver esse referendo mediante lei dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, aqueles artigos das reformas das Emendas nº. 41/2003, e nº. 47/2005 continuam em vigor e ainda podem embasar a concessão de abono de permanência no âmbito dos RPPS subnacionais.

Daí se conclui que a concessão de abono de permanência com

base nas regras de transição das reformas previdenciárias anteriores das Emendas nº. 41/2003 (arts. 2º e 6º), e nº. 47/2005 (art. 3º), pode vir a ser extinta para os RPPS dos Estados, Distrito Federal e Municípios mediante lei do respectivo ente que referende integralmente a sua revogação pelo art. 35, incisos III e IV, da EC nº. 103/2019. No entanto, tal abono poderá ser mantido pro tempore, na reforma previdenciária dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, nos moldes da redação do § 3º do art. 3º da EC nº. 103/2019, até que entre em vigor a lei do respectivo ente que regulamente o disposto no § 19 do art. 40 da CRFB/88.

O art. 3º, § 3º da EC nº. 103/2019 estabeleceu o seguinte sobre o

abono de permanência:

§ 3º. Até que entre em vigor lei federal de que trata o § 19

do art. 40 da Constituição Federal, o servidor de que trata o caput que tenha cumprido os requisitos para aposentadoria voluntária com base no disposto na alínea "a" do inciso III do § 1º do art. 40 da Constituição Federal, na redação vigente até a data de entrada em vigor desta Emenda Constitucional, no art. 2º, no § 1º do art. 3º ou no art. 6º da Emenda Constitucional nº 41, de 19 de dezembro de 2003, ou no art. 3º da Emenda Constitucional nº 47, de 5 de julho de 2005, que optar por permanecer em atividade fará jus a um abono de permanência equivalente ao valor da sua contribuição previdenciária, até completar a idade para aposentadoria compulsória.

Assim sendo, caso o Município não extinga por meio de lei o

abono de permanência nos termos da lei local que referende a Emenda Constitucional nº. 103/2019 o abono de permanência é devido no valor

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equivalente ao da contribuição previdenciária do servidor estadual, distrital ou municipal, enquanto não for editada lei do respectivo ente subnacional que regulamente os critérios que possam importar em redução de seu valor, ou até mesmo em sua supressão, conforme a norma de eficácia contida do § 19 do art. 40 da Constituição, na redação dada pela EC nº. 103/2019.

Pois bem. Não foi dada a conhecer a legislação local que trata do

abono de permanência. Entretanto, consideramos que a finalidade do abono não guarda identidade com a finalidade dos acréscimos pecuniários fundados exclusivamente no tempo de serviço, tais como os citados no inciso IV do art. 8º da LC nº 173/2020. Assim, caso exista previsão na legislação de sua concessão anterior a 20 de março de 2020, consideramos que se enquadrará na exceção prevista no art. 8º, inciso I, in fine ("exceto quando derivado (...) de determinação anterior à calamidade").

De qualquer modo, não basta ter completado o tempo necessário

para aposentadoria nos termos das normas constitucionais em referência. O abono de permanência é despesa de pessoal e obrigatória de caráter continuado, devendo ser atendidos, além dos critérios já apontados, na vigência do art. 8º da LC nº 173/2020, os seguintes requisitos: i) que exista prévia dotação na Lei Orçamentária Anual, e autorização específica na Lei de Diretrizes Orçamentárias (art. 169, § 1º, da CRFB) e compatibilidade com o Plano Plurianual, bem como sejam atendidos os requisitos dos arts. 16 e 17 da LRF; ii) que os percentuais com despesa de pessoal em face da receita corrente líquida não aumentem no decorrer dos 180 dias que antecedem o fim do mandato; iii) que haja prévia compensação permanente mediante aumento da receita ou diminuição da despesa de caráter continuado, considerada esta aquela que perdure por mais de 2 exercícios, sob pena de restar ineficaz a concessão do abono de permanência até a implementação da compensação; iv) que o dispêndio nominal global com despesas obrigatórias da Câmara não varie positivamente acima da variação do IPCA.

4) Nos termos do inciso I do artigo 8º da lei Complementar de 27

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de maio de 2020 é possível o pagamento de horas extras (serviços extraordinários) nos termos do Art. 119 da Lei Municipal 424/69?

RESPOSTA: As horas extras se enquadram na exceção prevista

no art. 8º, inciso I, in fine ("exceto quando derivado (...) de determinação anterior à calamidade").

Cabe salientar que é competência do próprio Município definir a

carga horária e a jornada de trabalho de seu pessoal para melhor atender ao horário de funcionamento de suas repartições. Releva frisar que o art. 39, § 3º da CRFB estende aos servidores públicos alguns direitos constitucionais próprios dos trabalhadores da iniciativa privada relacionados à duração do trabalho, notadamente os previstos no art. 7º, IX, XIII, XV e XVI da CRFB.

Nesse passo, observa-se que o sistema constitucional vigente

fixa os seguintes parâmetros básicos para a carga horária e jornada de trabalho a serem seguidos pela Municipalidade: a duração do trabalho deve ser de no máximo quarenta e quatro horas semanais e oito horas diárias, possibilitada a compensação; a remuneração do trabalho noturno deve ser fixada em patamar superior à do diurno; deve ser concedido repouso semanal ao menos uma vez por semana, preferencialmente e não obrigatoriamente aos domingos; e, as horas que ultrapassarem a carga normal de trabalho devem ser pagas em adicional de no mínimo 50%. Não poderia a LC nº 173/2020, por ser norma de inferior hierarquia, proibir totalmente o pagamento de serviço extraordinário.

Entretanto, as horas extras são um importante componente das

despesas com pessoal, e o fato de não ser vedada sua concessão não significa que o gestor esteja imune às restrições previstas na LRF. Vedação absoluta não há, porém o pagamento de gratificação ou adiciona por serviço extraordinário deve ser realizado com observância das regras de boa governança e responsabilidade fiscal.

5) Nos termos do inciso I, do artigo 8º da Lei Complementar é

possível o pagamento de gratificação por produtividade, nos termos do art.

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5º da Lei 1.494 de 23/10/90?

RESPOSTA: A gratificação de produtividade prevista no art. 5º

da lei em referência é determinação anterior à calamidade pública, de modo que não é totalmente vedada sua concessão. Entretanto, do mesmo modo que o abono de permanência, além das limitações do art. 21 da LRF e dos demais apontamentos feitos ao longo do parecer quanto aos limites com despesas de pessoal no decurso da execução orçamentária, devem ser atendidos pelo menos os seguintes requisitos cumulativos até o dia 31 de dezembro de 2021: i) que exista prévia dotação na Lei Orçamentária Anual, e autorização específica na Lei de Diretrizes Orçamentárias (art. 169, § 1º, da CRFB) e compatibilidade com o Plano Plurianual, bem como sejam atendidos os requisitos dos arts. 16 e 17 da LRF; ii) que os percentuais com despesa de pessoal em face da receita corrente líquida não aumentem no decorrer dos 180 dias que antecedem o fim do mandato; iii) que haja prévia compensação permanente mediante aumento da receita ou diminuição da despesa de caráter continuado, considerada esta aquela que perdure por mais de 2 exercícios, sob pena de restar ineficaz o dispositivo legal que trata do adicional de produtividade até a implementação da compensação; iv) que o dispêndio nominal global com despesas obrigatórias da Câmara não varie positivamente acima da variação do IPCA.

6) Nos termos do inciso I, do artigo 8º da Lei Complementar nº

173 é possível manter o pagamento do auxílio alimentação previsto na Lei Municipal nº 2.278 de 17/04/2004?

RESPOSTA: Sim. Porém é importante observar que se trata de

despesa obrigatória que pode ser reduzida.

7) Nos termos do inciso I, do Artigo 8º da lei Complementar n.º

173 de 27 de maio de 2020, é permitido conceder o pagamento de adicional de nível universitário, nos termos do art. 38 da Lei 1.346/89 requerido após a vigência da LC 173?

RESPOSTA: O adicional de nível universitário previsto no art. 38

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da lei em referência é determinação anterior à calamidade pública, de modo que não é totalmente vedada sua concessão, enquadrando-se na exceção prevista no art. 8º, I, in fine. Entretanto, do mesmo modo que a gratificação de produtividade, além das limitações do art. 21 da LRF e dos demais apontamentos feitos ao longo do parecer quanto aos limites com despesas de pessoal no decurso da execução orçamentária, devem ser atendidos pelo menos os seguintes requisitos cumulativos até o dia 31 de dezembro de 2021: i) que exista prévia dotação na Lei Orçamentária Anual, e autorização específica na Lei de Diretrizes Orçamentárias (art. 169, § 1º, da CRFB) e compatibilidade com o Plano Plurianual, bem como sejam atendidos os requisitos dos arts. 16 e 17 da LRF; ii) que os percentuais com despesa de pessoal em face da receita corrente líquida não aumentem no decorrer dos 180 dias que antecedem o fim do mandato; iii) que haja prévia compensação permanente mediante aumento da receita ou diminuição da despesa de caráter continuado, considerada esta aquela que perdure por mais de 2 exercícios, sob pena de restar ineficaz o dispositivo legal que trata do adicional de nível universitário até a implementação da compensação; iv) que o dispêndio nominal global com despesas obrigatórias da Prefeitura não varie positivamente acima da variação do IPCA. Por fim, cabe observar que o dispositivo em questão se aplica aos servidores da Prefeitura.

8) É possível converter cinquenta por cento das férias

regulamentares em pecúnia, após a vigência da Lei Complementar n.º 173 de 27 de maio de 2020?

RESPOSTA: As férias se tratam de direito conferido pela

Constituição a trabalhador (art. 7º, XVII), direito estendido expressamente aos servidores públicos pelo art. 39, § 3º da CRFB.

É de se averbar que a finalidade do direito a férias é o de conferir

ao servidor um período de repouso para recuperar-se do desgaste físico e mental sofrido após um ano de trabalho, como de lhe propiciar momentos de lazer. Nesse sentido, pertinente o magistério da Prof. Sheila Schotz:

"Como é notório, o direito a férias tem o objetivo de

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proporcionar ao trabalhador um tempo mais prolongado e necessário de repouso que aqueles previstos pelos descansos diários (entre e/ou intrajornadas de trabalho) e semanais estabelecidos em lei; todas essas pausas visam ao ajuste do tempo de trabalho a padrões adequados de esforço/repouso, preservando, desta forma, a saúde do trabalhador e evitando, por conseguinte, eventuais enfermidades e acidentes de trabalho. O direito a férias e o seu efetivo desfrute, ademais de permitir o repouso e a recuperação dos desgastes físicos e psicológicos produzidos pelas atividades laborais, buscam, entre suas finalidades, disponibilizar um maior convívio do trabalhador com sua família e com a comunidade na qual está inserido." (SHOTZ, Sheila. "O direito de férias anuais remuneradas segundo o Tribunal de Justiça das Comunidades Europeias: análise de uma sentença judicial: enfoque comparado" Revista do Tribunal Superior do Trabalho, v. 72, n. 2, p. 127-136, maio/ago. 2006. Justiça do trabalho, v. 23, n. 270, p. 86-94, jun. 2006.

A conversão de metade das férias em pecúnia faz descumprir

sua finalidade constitucional, de modo que entendemos que nem antes, nem depois da LC nº 173/2020 possa haver tal providência.

9) É possível realizar o pagamento, após a vigência da Lei

Complementar 173 do bônus assiduidade previsto na Lei 2.522/07?

RESPOSTA: Toda vantagem remuneratória deve ser fundada no

interesse público, e tem como requisito de validade a observância dos princípios da eficiência e da moralidade (art. 37, caput, da CRFB), que não são meras recomendações ou conselhos, mas regras cogentes que informam e condicionam a atividade dos gestores públicos. Na lição de Hely Lopes Meirelles, "as prerrogativas, garantias e demais vantagens do

servidor só se legitimam quando reclamadas pelo serviço público e não

anulem seus requisitos de eficiência, moralidade e aperfeiçoamento. Na

concessão desses benefícios por via constitucional existe uma presunção

de imprescindibilidade, diante da qual devem curvar-se as entidades

estatais" (MEIRELLES, Hely Lopes. Direito Administrativo Brasileiro. São

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Paulo: Malheiros, 2006, p. 601).

Este Instituto compreende, assim, que são proibidas vantagens

funcionais ou prêmios que tenham por fundamento tão-somente a assiduidade, que bonifica o servidor pelo cumprimento de um dever ínsito ao exercício de qualquer cargo. Com efeito, decorre do princípio da eficiência e da moralidade (art. 37, caput, da CRFB) o dever de qualquer servidor de comparecer ao serviço para cumprir a jornada de trabalho que é conferida a seu cargo. Em nosso entender, o prêmio de assiduidade configura benefício anômalo e ilegal, nos termos da lição de Hely Lopes Meirelles:

"Além dessas vantagens, que encontram justificativa em

fatos ou situações de interesse administrativo, por relacionadas direta ou indiretamente com a prestação do serviço ou com a situação do servidor, as Administrações têm concedido vantagens anômalas, que refogem completamente dos princípios jurídicos e da orientação técnica que devem nortear a retribuição do servidor. Essas vantagens anômalas não se enquadram quer como adicionais, quer como gratificações, pois não têm a natureza administrativa de nenhum desses acréscimos estipendiários, apresentando-se como liberalidades ilegítimas que o legislador faz à custa do erário, com o só propósito de cortejar o servidor público." (MEIRELLES, Hely Lopes. Direito Administrativo Brasileiro. São Paulo: Malheiros, 2005, p. 484).

Portanto, a vantagem em comento, a nosso ver, não pode ser

concedida nem antes nem depois da LC nº 173/2020.

10) Solicita que sejam feitos outros comentários e observações

que sejam pertinentes.

RESPOSTA: Cabe noticiar que até o momento, existem duas

Ações Diretas de Inconstitucionalidade ajuizadas no Supremo Tribunal Federal em face da LC nº 173/2020 (ADI 6.450 e ADI 6.447), ambas com pedidos de medida cautelar. Assim, dadas as significativas repercussões

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dos dispositivos mencionados ao longo do parecer na gestão das despesas com pessoal, recomenda-se o acompanhamento diuturno do andamento das referidas ações.

É o parecer, s.m.j.

Gustavo da Costa Ferreira M. dos Santos

Consultor Técnico

Aprovo o parecer

Marcus Alonso Ribeiro Neves

Consultor Jurídico

Rio de Janeiro, 09 de junho de 2020.