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Caderno C: Entrevista Karin Hills

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Page 1: Caderno C: Entrevista Karin Hills

Fábio TrindadeDA AGÊNCIA ANHANGUERA

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Karin Hils, em 2002, era sóuma entre outras seis mil can-toras em busca de um lugar aosol no programa Popstar, doSBT. Treze anos depois, ela é aprotagonista da megaprodu-ção Mudança de Hábito, musi-cal em cartaz no Teatro Re-nault, em São Paulo, no papelque foi de Whoopi Goldbergno cinema — com o detalhe deter recebido a bênção da pró-pria, em Nova York, semanasatrás. Entre os trabalhos, po-rém, muita coisa aconteceuem sua carreira. Karin foi umadas cinco integrantes do extin-to — e fenômeno — grupo Rou-ge entre 2002 e 2005, tendo gra-vado quatro álbuns. Com o fimda parceria pop, ela passou ase dedicar à carreira solo e, pos-teriormente, ao teatro, tendoestreado em musicais em 2009,no aclamado Hairspray, de Mi-guel Falabella. Foi o início deuma bem-sucedida parceriacom o ator/autor. Karin foi es-calada por Miguel em outrosdois musicais, Alô, Dolly! e Xa-nadu, além da novela AqueleBeijo (2011) e do seriado Pé naCova (2013-2014). Karin aindafez parte do elenco de Hair, noteatro, em 2010, e foi uma dasprotagonistas da série Sexo e asNegas, no ano passado.

Caderno C — Quando solta-ram a informação que o próxi-mo musical do Teatro Re-nault seria Mudança de Hábi-to, eu sempre falei que se a De-loris Van Cartier não fosse fei-ta por você, eu não iria nemassistir...

Karin Hils — Menino, todomundo me fala isso. E não vounegar para você que eu tam-bém me via no papel. Eu rece-bi muito esse feedback, de vá-rios amigos, de pessoas domeio artístico. Todos falavam:se esse musical vier mesmo pa-ra o Brasil, você tem que fazera Deloris, eu te vejo como ela.E eu vou te falar uma coisa, eunão sou uma das pessoas maisseguras e confiantes do mun-do. Acho que isso até faz parteum pouco da personalidade deum artista, não sentir tanta se-gurança, achar que tem o con-trole de tudo na mão. O friozi-nho na barriga ajuda, faz parte,impulsiona. Mesmo assim,uma das poucas certezas queeu já tive na minha vida é queeu ia fazer Mudança de Hábitoe que eu ia fazer bem.

Como foi o processo de se-leção? Você chegou a fazer au-dições?

Eu fiz duas apresentaçõespara os gringos que estavamaqui. Eu recebi uma ligação daprodutora em janeiro do anopassado me sondando para sa-ber se eu tinha algum trabalhoem vista, que eles estavam tra-zendo o musical e pensaram

em mim. Eles queriam me son-dar mesmo. Eu falei que estavatranquila, que ia estrear umasérie, no caso Sexo e as Negas(Globo), mas que depois não ti-nha nada. No meio do proces-so de audições, enquanto eu fa-zia a série, eu vim para São Pau-lo duas vezes para os gringosme conhecerem. Os produto-res falaram que eles queriammuito que eu fizesse, masquem decide mesmo, quem re-solve, são os caras de fora. En-tão eu vim, fiz os dois testes, erolou.

Por que você acha que to-do mundo te viu nesse papel?

É difícil te dizer. Eu achoque a minha energia sempre vi-brou no tom da personagem. Éuma coisa de personalidademesmo.

Aliás, você conheceu aWhoopi Goldberg pessoalmen-te e disse que ela te deu a bên-ção. Como foi esse encontro?

Não me pergunte o que elafalou, porque não lembro direi-to. Estava muito nervosa, malconseguia falar, e chorei semparar. Foi tudo muito corrido,minha ida para lá foi de 48 ho-ras, com equipes gravando,agenda apertada e tudo mais.Mesmo assim, ela pediu dezminutos comigo sem câmerasnem nada, e foi incrível. Ela se-gurava minha mão e dizia:“You’ll be fine”. Você vai ficarbem. Ela me disse isso algumasvezes. Isso me deu muita segu-rança para seguir. Foi incrível.

Muito se falou sobre aWhoopi fazer a exigência deque a protagonista, indiferen-te de onde o musical for mon-tado, seja sempre negra, por-que, segundo ela, os negrosnão têm espaço no mundodos musicais. Só que as pes-soas focam tanto nisso, comose você tivesse no papel ape-nas por ser negra, e não peloseu talento. Como você vê is-so?

Que pergunta difícil, meni-no. Pessoalmente, que bomque há essa exigência, sincera-mente. Mas, convenhamos, co-mo já aconteceu em algumasmontagens, não tem como exi-

gir isso em lugares como China(risos). Eu vi no Youtube umtrecho da China e é muito en-graçado, porque a moça, coita-da, tá com uma meia marromnos braços e o resto tudo pinta-do. Na Alemanha também eraassim. Tirando isso, eu acredi-to que o teatro musical sejamuito mais democrático eabrangente para qualquer artis-ta negro, diferentemente da te-levisão, que ainda está muitomais ligada à estética e outrascoisas. Eu torço para que ve-nham mais espetáculos comoesse porque eles dão espaço pa-ra vários outros talentos, nãosó negros, mas para pessoasque estão se preparando parao teatro, para a nova geraçãoque quer fazer teatro musicalno Brasil. Insistimos em dizerque nós, brasileiros, não temospreconceito. Mas existe umacota muito maior para mim no

teatro do que na TV, porque oque está em jogo lá, certamen-te, não é só o talento.

Sua primeira protagonistana TV também foi em um se-riado feito exclusivamente pa-ra negras, o que chegou a ge-rar até uma enorme discussãosobre racismo. Se não fossepor musicais ou programasquase que segmentados, vocêacredita que seria difícil semanter na indústria do entre-tenimento?

No teatro não, mas na televi-são sim. Eu percebi que aindahá uma parada muito conden-sada com relação à entrada donegro na TV, a conquistar bonspapéis. Eu comecei a fazer TVhá pouco tempo, claro, mesmoassim, apesar de ainda ser mui-to difícil, eu também sinto quetem rolado uma mudança. Esinto isso porque, se tem algoque pode superar qualquer pre-conceito, é o talento. Superaqualquer coisa, é inevitável e émaravilhoso quando isso acon-tece. Óbvio que no teatro, noteatro musical e na música hámais democracia justamenteporque o talento ainda é o queconta mais.

Você engrenou uma parce-ria muito produtiva com o Mi-guel Falabella, tanto nos pal-cos, quando na TV. Como sur-giu isso?

Ele sem dúvida é um dosgrandes responsáveis por eu es-tar aqui agora. Lá atrás, quan-do acabou o Rouge e eu fui fa-zer teste para meu primeiromusical, foi ele quem viu essedom em mim, antes mesmode eu enxergar essa possibilida-de. Eu até brinquei, disse “Mi-guel, você está maluco”, e ele“você vai fazer sim, você é atriztambém”. Desde então, graçasa Deus, ele tem me dado diver-sas oportunidades para eu de-senvolver essa arte e a oportu-nidade de trabalhar com gran-des estrelas da televisão brasi-leira, tanto no teatro quanto naTV. Eu fiquei um ano traba-lhando com Marília Pêra emAlô, Dolly!, contracenandocom ela, vendo ela da coxia, tra-balhei ainda com ela no Pé naCova, em Aquele Beijo. E ela é

só um exemplo, porque tem Ar-lete Salles, Claudia Jimenez, en-fim, eu não poderia ter tido ba-se melhor. Todo mundo queacompanha minha carreira sa-be que eu devo tudo e sou mui-to grata ao Miguel Falabellapor ter visto em mim coisasque nem mesmo eu tinha vis-to.

Falando em Marília Pêra,quando a entrevistei para estamesma coluna, ela me disseque se não fosse o Miguel, elaestaria afastada das telas por-que não há mais papéis para aidade dela. O seu caso é outro,mesmo assim, hoje, sem o Mi-guel, como você vê seu futurona TV?

Eu não vejo muito. Está se-gregado não só para negro, pa-ra mulher negra, veja bem, Ma-rília Pêra também diz isso esente isso. Eu sei o quanto é di-

fícil, sei exatamente o que elaestá falando, e o Miguel é as-sim, faz questão de trabalharcom amigos. Mais do que isso,ele é uma pessoa aberta, quedá espaço para novos talentos.Em todo mundo que passa pe-lo teatro ele está de olho. Estápara nascer alguém como ele,é o que eu sempre digo.

O Rouge, de alguma forma,ainda faz parte da sua vida, se-ja por reconhecimento de fãs,pelas músicas, ou mesmo asmeninas que fizeram parte dogrupo com você?

O Rouge está muito presen-te. E é incrível pensar isso. Dife-rentemente de 13 anos atrás,quando o Rouge nasceu, eunão tinha muito acesso a infor-mação, internet, essas coisas.Até tinha, mas era de formamais tímida, as coisas não che-gavam até a gente tão rápido. Equando foi exibida a reporta-gem feita comigo e com aWhoopi Goldberg no Fantásti-co, foi impressionante a reper-cussão de pessoas que cresce-ram comigo, que torcem pormim desde a época do Rouge.Os fãs se mobilizaram nas re-des, falaram que estavam co-movidos, que ficaram impres-sionados, que estão do meu la-do para sempre. Muita gente,uma coisa surreal. O Rouge foium marco na minha vida, nãotem como eu desassociar a mi-nha história, a minha vida, aminha trajetória profissionaldo Rouge. E eu nem quero.Sem contar o fato que o grupome trouxe grandes amigas,grandes parceiras de trabalhoque vibram comigo. A Patrícia(Lissah) veio ver um ensaio, an-tes da estreia, e estava até cha-ta já (risos). Eu cantei mal e elaveio falar que eu cantei bem.Não cantei bem não, amiga. Es-tava ruim e ela falava “amiga,tava bom”. Tava nada (risos). Éum amor muito real entre nóstodas, uma vibração maravilho-sa. E a Patrícia mal sabe que foiela quem me influenciou nestepróprio teatro se apresentandoem Miss Saigon (2007). Foi alique eu a vi pela primeira vezem um musical e falei, nossa,como isso é legal, acho que dápara eu fazer também (risos).

“Insistimos emdizer que nós,brasileiros, nãotemos preconceito.Mas existeuma cota muitomaior para mimno teatro do quena TV, porque oque está em jogolá, certamente,não é só otalento.”

Eu acho que aminha energiasempre vibrou notom dapersonagem. Éuma coisa depersonalidademesmo.”

Todo mundoque acompanhaminha carreirasabe que eudevo tudo,e sou muitograta, aoMiguel Falabellapor ter vistoem mimcoisas que nemmesmo eu tinhavisto.”

Talhada para o papel

PROTAGONISTA do musical Mudança de Hábito, em cartaz em São Paulo, a atriz e cantora KARIN HILS recebeu o aval daprópria Whoopi Goldberg, que estrelou a versão original da história no cinema, para viver a personagem. Integrante do extinto grupoRouge, a artista também esteve no elenco da SÉRIE Sexo e as Negas (Globo), de Miguel Falabella, que a dirigiu em outros musicais

César Rodrigues/AAN

CampinasQUINTA-FEIRA 12 / 03 / 2015

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