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1 I. PROPRIETÁRIOS, CONSTRUTORES E ARTÍFICES: VIVÊNCIAS E RITUAIS CADERNO DE RESUMOS V COLÓQUIO A CASA SENHORIAL: ANATOMIA DOS INTERIORES INTERNACIONAL

CADERNO DE RESUMOS · ... história e análise espacial de ... o presente caderno reúne os resumos das propostas de ... de junho de 2017, no centro de artes da universidade

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I. ProPrIetárIos, construtores e artífIces: VIVêncIas e rItuaIs

CADERNO DE RESUMOS

V coLÓQuIo

A CASA SENHORIAL:ANATOMIA DOSINTERIORES

InternacIonaL

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Comitê científicoJosé Belmont Pessoa (PPGau/uff)nelson Porto (PPGau/ufes)raquel Henriques da silva (IHa/uHL)ana Lúcia Vieira dos santos (eau/uff)Paula torres Peixoto (universidade Lusíada)João Vieira caldas (Ist/uL)carlos alberto d’avila santos (ca/ufPel)aldrin Moura de figueiredo (fau/ufPa)Maria João Pereira coutinho (IHa/unL)Marize Malta (eBa/ufrJ)Gonçalo de Vasconcelos e sousa (citar-eaucP)carlos franco (citar-ea/ucP)

Realizaçãofundação casa de rui Barbosa (fcrB), Museu das Migrações e das comunidades/câmara Municipal de fafe e universidade nova de Lisboa (Portugal)

Apoio Grupo de pesquisa casas senhoriais e seus Interiores: estudos Luso-Brasileiros em arte, Memória e PatrimônioOrganização do Caderno de Resumos: ana Pessoa (fcrB), Madjory almeida Pereira (PIcQfcrB)Design Gráfico (diagramação): Karolyna Koppke (fcBr/Ibmec-rio)Estagiária de Editoração: Iohanna sanches (fcrB)Fotografias: Manuel Meira

V Colóquio Internacional A Casa Senhorial: Anatomia dos Interiores

Comitê organizadorana Pessoa (PPGMa/fcrB)artur coimbra (MII/cm-fafe)Isabel Mendonça (IHa/unL)Helder carita (IHa/unL)

Ministro da Culturasergio sá Leitão

Presidente da FCRBMarta de senna

Diretor do Centro de Pesquisaantonio Herculano Lopes

Chefe do Setor de HistóriaJoëlle rouchou

Fundação Casa de Rui Barbosa

Presidente da RepúblicaMichel temer

colóquio Internacional casa senhorial: anatomia dos Interiores (5.: 2018: fafe, Portugal)caderno de resumos [recurso eletrônico] : a casa senhorial : anatomia dos interiores /

organização ana Pessoa [e] Madjory Pereira – rio de Janeiro: fundação casa de rui Barbosa, 2018.

1 e-book no formato pdf (89 p.).

evento de 6 a 8 de junho de 2018.

IsBn 978-85-7004-378-8

1. casa senhorial. 2. artes decorativas. I. Pessoa, ana, org. II. Pereira, Madjory, org. III. título.

cDD 728.372

Chefe do Setor de EditoraçãoBenjamin albagli neto

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organização

ana PessoaMadjory Pereira

CADERNO DE RESUMOSA CASA SENHORIAL:

ANATOMIA DOS INTERIORES

rIo De JaneIro2018

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Sumário

apresentação........................................................................................................... 6

Seção I: Proprietários, construtores e artífices: vivências e rituais..................................................................................................................... 7

as sete casas de Mateus, Vila realana Motta Veiga, José aguiar ........................................................................................ 8

José florêncio soares: requinte e modernidade, entre o rio de Janeiro e fafeana Pessoa, ana Lucia V. santos................................................................................... 10

a casa senhorial do embaixador Gastão da cunha em são João del-rei: vivências, arquitetura, detalhes construtivos numa habitação nobre do oitocentos mineiroandré Guilherme Dornelles Dangelo, celina Borges Lemos, Vanessa Borges Brasileiro... 12

Ladrilhos hidráulicos: a transmissão do saber-fazer formando identidades profissionais, em Pelotas, Rio Grande do Sulandréa do amaral Dominguez..................................................................................... 14

a representação da casa senhorial ibérica e ibero-americana pelo imaginário hollywoodiano clássico: o exemplo da a marca do Zorro (1940)Luiz flávio La Luna Di cola.......................................................................................... 16

um palácio quase romano no rio de Janeiro do século XIX: o palácio do catete e a invenção de uma tradição clássica nos trópicosMarcus Vinícius Macri rodrigues.................................................................................. 18

De torre de s. sebastião a Museu condes de castro Guimarães, cascais: personagens e vivênciasMaria cristina Gonçalves............................................................................................. 20

o melhor que se acha à venda: a mobília para a sala de cama da rainha d. Maria Pia no palácio da ajudaMaria José Gaivão de tavares........................................................................................ 22

Palácios e vidas instáveis: considerações sobre as moradas de diplomatas portugueses em Paris no início do oitocentos

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Patricia Delayti telles................................................................................................. 24

a casa senhorial em Borba: entre a tradição e a inovação raquel alexandra seixas.............................................................................................. 26

o palácio setecentista de Domingos Mendes Dias, ao chiado. Idealização e construção de uma obra modelar na cidade de Lisboasílvia ferreira............................................................................................................. 28

Seção II: Identificação das estruturas e dos programas distributivos e o estudo de nomenclaturas funcionais e sim-bólicas de cada espaço................................................................................ 30

escritório, sótão, sala de jantar e toalete da casa da chácara da Baronesa, Pelotas, rio Grande do sul, Brasilannelise costa Montone, ester Judite Bendjouya Gutierrez........................................... 31

Reflexões sobre a casa nobre em Belo Horizonte, Minas Gerais, Brasil, entre 1900 e 1930: a arquitetura, os interiores e suas consonâncias com as mudanças dos valores e hábitos da sociedade localcelina Borges Lemos, andré Guilherme Dornelles Dangel............................................ 33

residência senhorial do bairro do flamengo: história e análise espacial de palacete do início do século XX Denise Vianna nunes.................................................................................................. 35

Palácio de d. Xica, requintes de espaço gravados na pedra Domingos tavares...................................................................................................... 37

Da câmara à capela sem sair da residência João Vieira caldas....................................................................................................... 39

ecletismo, técnica e distribuição: o caso do palacete Mendonça, em Lisboa Júlia Zurbach Varela..................................................................................................... 41

a casa da Hera: um modelo singular de casa senhorial no Vale do ParaíbaKatia Maria de souza.................................................................................................. 43

solar Monjardim: da casa colonial a casa museu – Vitória, espírito santoLuciana nemer............................................................................................................ 45

casa do Pinhal, a vida numa fazenda de café Maria alice Milliet....................................................................................................... 47

a fruição da vista: os mirantes das casas burguesas da Vitória - salvador, Bahia

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Maria do carmo Baltar esnaty de almeida.................................................................. 49

Palácio são Joaquim: arquitetura e espacialidade noemia Lucia Barradas fernandes............................................................................... 51

A influência do gosto oitocentista na produção da arquitetura residencial em ouro Preto, Minas GeraisPatrícia thomé Junqueira schettino, fernanda alves de Brito Bueno............................ 52

O reflexo da modernidade no programa distributivo do palacete Passarinho - Belém, Pará Pietra castro Paes Barreto, Marcia cristina ribeiro Gonçalves nunes........................... 54

Seção III: A ornamentação fixa: azulejos, tetos, talhas, pinturas, estuques, têxteis, pavimentos, chaminés/lareiras, janelas, portas, para-ventos e outros bens integrados......... 56

Portas e para-ventos: bens integrados às casas senhoriais de Pelotas carlos alberto ávila santos......................................................................................... 57

os papéis de parede e a paisagem: Johan Moritz rugendas como exemplo carlos Gonçalves terra............................................................................................... 59

Interiores a branco e dourado: o enobrecimento e as alusões aos temas clássicos da mitologia greco-romana no palacete Bolonha - Belém, Parácybelle salvador Miranda, ronaldo n. f. Marques de carvalho, Larissa silva Lea.......... 61

Janelas e portas da residência e administração dos governadores do Grão-Pará: o movimento das imagens elna Maria andersen trindade, Mateus carvalho nunes.............................................. 63

estudo da azulejaria do edifício Paris n’américa - Belém, ParáMarcia cristina ribeiro Gonçalves nunes.................................................................... 65

a pintura decorativa do palácio do raio em Braga Miguel nuno santos Montez Leal............................................................................... 67

as artes pictóricas das casas senhoriais das estâncias: serro formoso, Vista alegre e santa ernestina, do século XIX e início do XX - Lavras do sul, rio Grande do sulMônica de Macedo Praz............................................................................................. 69

o palacete Babilônia e suas superfícies de composição interior noemia Lucia Barradas fernandes, edilene cassia capanema....................................... 71

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Seção IV: O equipamento móvel nas suas funções específicas e suas relações com o espaço; o conjunto e as circulações das peças; a atmosfera do lugar.................................................................... 73

A difusão de instrumentos musicais nos interiores domésticos da fidalguia lisboeta nos finais do Antigo Regime andreia Durães.......................................................................................................... 74

a evolução do candeeiro no século XIX, tipologias e usos antónio francisco arruda de Melo cota fevereiro....................................................... 75

Higiene, saúde e beleza: mobiliário, objetos e interiores decorativos. Modernidades das casas das elites lisboetas nos finais do Antigo Regimecarlos franco.............................................................................................................. 77

redes de dormir e suas múltiplas funções: de equipamento para descanso a meio de transportefrancine soares Bezerra.............................................................................................. 79

Programas decorativos dos interiores domésticos portuenses na segunda metade do oitocentos Gonçalo de Vasconcelos e sousa.................................................................................. 80

a iluminação em ambientes românticos: estudo da coleção de luminária do Palácio nacional da ajuda Maria João Botelho Moniz Burnay................................................................................ 82

Viver com arte: decoração e coleções nos interiores das casas senhoriais de fins do século XIX em Portugal e Brasil Marize Malta............................................................................................................. 84

Emblemas de uma terra desejada: uso e significação de mapas, obras de arte e objetos do Brasil nas casas senhoriais da amsterdã seiscentista rené Lommez Gomes................................................................................................. 86

o mobiliário religioso no interior da casa brasileira, entre funções e significados silveli Maria de toledo russo....................................................................................... 88

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Apresentação

o presente caderno reúne os resumos das propostas de comunicações submetidas e aprovadas pelo comitê cientifico do V Colóquio Internacio-nal a casa senhorial: anatomia dos Interiores, que será realizado na sala Manoel de oliveira/teatro-cinema de 6 a 8 de junho, em fafe, Portugal.

o evento é promovido pela fundação casa de rui Barbosa (fcrB), o Museu das Migrações e das comunidades/câmara Municipal de fafe e a universidade nova de Lisboa (Portugal), com o apoio do grupo de pesqui-sa casas senhoriais e seus Interiores: estudos Luso-Brasileiros em arte, Memória e Patrimônio.

Trata-se de uma reunião científica de pesquisadores, aberta à parti-cipação de estudiosos de todo o mundo, para compartilhar e confrontar resultados de estudos acerca das casas senhoriais, do século XVII ao início do XX, com foco em quatro linhas de investigação, que foram as seções desta edição:

I. Proprietários, construtores e artífices. Vivências e rituais. II. Identificação das estruturas e dos programas distributivos e o estudo de nomenclaturas funcionais e simbólicas de cada espaço. III. A ornamentação fixa: azulejos, tetos, talhas, pinturas, estuques, têxteis, pavimentos, chaminés/lareiras, janelas, portas, para-ventos e outros bens integrados. IV. O equipamento móvel nas suas funções específicas e suas relações com o espaço; o conjunto e as circulações das peças; a atmosfera do lugar.o V colóquio a casa senhorial: anatomia dos Interiores dá sequência

a encontros anuais, iniciados em Lisboa, de 4 a 6 de junho de 2014, sediado pela fundação ricardo espírito santos e a universidade nova de Lisboa, no âmbito do projeto “a casa senhorial em Lisboa e no rio de Janeiro: ana-tomia dos interiores”.

Desde então, o evento vem sendo realizado alternadamente em cida-des portuguesas e brasileiras: no rio de Janeiro, de 11 a 13 de agosto de 2015, na Fundação Casa de Rui Barbosa; no Porto, de 16 a 17 de junho de 2016, na Universidade Católica do Porto; e, em Pelotas, Rio Grande do Sul, de 7 a 9 de junho de 2017, no centro de artes da universidade federal de Pelotas.

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I. Proprietários, construtores e artífices: Vivências e rituais

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I Proprietários, construtores e artífices: vivências e rituais

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I. ProPrIetárIos, construtores e artífIces: VIVêncIas e rItuaIs

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As sete Casas de Mateus, Vila Realana Motta Veiga, José aguiar

a casa de Mateus é um dos edifícios nortenhos mais representativos da arquitetura doméstica barroca. Implantada na proximidade da cidade portuguesa de Vila real, a sua escala revela-se de uma dimensão superior à das casas nobres da região, constituídas no mesmo espaço e no mesmo tempo. a construção que lhe conferirá a sua atual aparência resulta de uma ampliação do século XVIII sobre uma base edificada preexistente de menor escala, e a evolução da sua arquitectura representa não só o crescimento e aumento do seu património material – móvel e imóvel –, bem como o do seu estatuto sociofamiliar. com base no estudo genealógico da família sousa Botelho e no acervo arquivistico da casa de Mateus – que comporta as “gavetas” do-cumentais relativas a cada ramo familiar –, é possível identificar as casas (cabeças de morgados ou prazos) que foram entrando para a família por motivo de casamento e/ou sucessão vincular. Levanta-se então a principal questão desta investigação, a realização do levantamento do patrimônio edificado desta família, identificando e apresentando as suas sete casas (no sentido físico e institucional do termo) cujo patrimônio – em determinado momento – convergiu para uma única representação na “casa mãe” e sua principal cabeça de morgado: a casa de Mateus. o estudo seguirá a ordem cronológica dessa acumulação patrimonial, apresentando as sete casas associadas aos respectivos ramos familiares, cujo patrimônio imóvel construído será apresentado e representado em base cartográfica. Será igualmente analisada a sua evolução arquitetônica, transferência de propriedade (entrada e saída da família), estado atual de conservação e relação territorial em macroescala, procurando detectar as tendências de acumulação fundiária, bem como a importância na gestão territorial e/ou familiar desse vasto patrimônio. Dessa forma, e pela primeira vez, será apresentada a casa de Mateus como edifício representativo de várias casas (construções e vínculos), ex-trapolando a visão limitada e exclusivista que se tem tido de “casa mãe”, dissociada do todo que constituía a sua própria essência: um vasto patri-

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I. ProPrIetárIos, construtores e artífIces: VIVêncIas e rItuaIs

ana Motta Veiga | [email protected]

Licenciada em arquitetura pela faculdade de arquitectura da universidade do Porto (1998), com especialização em reabilitação da arquitectura e núcleos urbanos pela fa-culdade de arquitectura da universidade de Lisboa (2001). Doutoranda na fauL, no ramo de conservação e restauro na variante das casas antigas. foi bolsista da fundação para a ciência e tecnologia.

José aguiar | [email protected]

arquitecto (1986, fauP/fautL), doutorado em conservação do Patrimônio em 1999. foi investigador do LNEC (1986 – 2005); é professor associado da FA-ULisboa, onde foi vice-presidente do seu Conselho Científico, coordenador do Mestrado Integrado em Arquitec-tura e diretor da Área Disciplinar de Arquitectura (2014-a 2017); é responsável científico do Grupo de unidades curriculares de conservação, restauro e reabilitação e coordena-dor dessa especialização no curso de Doutoramento em arquitectura da fa-uLisboa. co-ordenador de Projectos de Investigação em conservação (projectos fct), com algumas centenas de publicações. foi presidente do Icomos-Portugal (2008-2011), sendo a partir daí seu vice-presidente, representa o Icoos no conselho nacional de cultura – secção do Património Arquitectónico e Arqueológico / Governo de Portugal, DGPC; foi vice-diretor do Ja e fundador da revista arquitectos, integrou Comissões Científicas e de Especialistas da Unesco e do Icomos (é membro dos comitês CIVVIH; CIF, ISO20C); foi fundador da sociedade Portuguesa de História da construção, da sPPc e membro da direção da srs-ordem dos arquitectos.

mônio familiar acumulado e convergindo para si, associado a todas as obri-gações e legados pios em vigor até à abolição dos institutos vinculares em 1963. espera-se que o desenvolvimento desta temática permita o vasto co-nhecimento do múltiplo patrimônio edificado que compunha a Casa de Mateus, e o impacto que a sua dispersão teve na gestão da sua conserva-ção.

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I. ProPrIetárIos, construtores e artífIces: VIVêncIas e rItuaIs

José Florêncio Soares: requinte e modernidade, entre o Rio de Janeiro e Fafeana Pessoa, ana Lucia V. santos

a comunicação pretende contribuir com os estudos sobre a circulação dos estilos de vida, ou seja, “conjunto unitário de preferências distintivas que exprimem, na lógica específica de cada um dos subespaços simbólicos, mobília, vestimentas, linguagem ou hexis corporal, a mesma intenção ex-pressiva”, conforme Bourdieu.

esta apresentação integra estudos sobre os modos de morar promo-vidos pelos “brasileiros” torna-viagem, que, após o período de formação e enriquecimento na corte brasileira, retornaram para o pequeno conce-lho de fafe, na segunda metade do século XIX. Para isso, será analisada a trajetória José florêncio soares (1824-1900), uma das personalidades de destaque daquele concelho, e os ambientes em que viveu no rio de Janeiro e em fafe.

José florêncio soares é um dos 1.074 emigrantes que, entre 1836 e 1885, saíram diretamente de fafe para o rio de Janeiro. ele emigrou em 1838, com 13 anos, como caixeiro, tendo como destino a rua do Hospício n°. 20, e permaneceria por 20 anos no Brasil. ele foi um dos membros bem-sucedidos da comunidade de fafe no rio de Janeiro. em 1849, ele já constava do almanak Laemmert, na seção de “armazéns de fazendas por atacado”, situado na rua Direita 119, endereço que manteria até 1858, quan-do anunciou a liquidação do negócio.

Diante de epidemias que assolavam Portugal, ele foi incitado por seu pai a recolher fundos para a construção do Hospital da Misericórdia no concelho natal. como resultado de sua iniciativa, foram recolhidos cin-co contos de réis, o que deu ensejo à constituição, em 8 de abril de 1858, de uma comissão de subscritores fundadores, presidida pelo comendador antônio Gonçalves Guimarães, que viabilizaria a construção do hospital.

em 1858, como preparativo do retorno, Jose florêncio autorizou leilão de seus pertences, mobiliário e objetos que decoravam a casa no largo do Boticário, além de cavalos e escravos. De volta à Fafe com mulher e filho, José florêncio desenvolveria uma carreira política e empresarial de suces-

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I. ProPrIetárIos, construtores e artífIces: VIVêncIas e rItuaIs

ana Pessoa | [email protected]

Arquiteta e doutora em Comunicação e Cultura (ECO-UFRJ). Iniciou-se profissionalmente na Cinemateca do MAM, em 1976; em seguida, atuou em diversas instituições governa-mentais do Ministério da cultura. a partir de 1996, é pesquisadora da casa de rui Barbosa, onde dirigiu o centro de Memória e Informação, no período de 2003 a 2015. tem trabalhos, artigos e livros publicados e lidera grupos de pesquisa.

ana Lucia V. santos | [email protected]

arquiteta, doutora em História pelo PPGHIs da universidade federal fluminense (uff). Professora da escola de arquitetura e urbanismo da uff. coordenadora do Laboratório de estudos do Patrimônio (uff). Pesquisadora bolsista da fundação casa de rui Barbosa (2010-2015), integra o projeto “a casa senhorial: anatomia dos interiores”.

so, tendo implantado, em 1873, a primeira fábrica têxtil da região. Já em 1861, ele deu início à construção de sua majestosa casa. ainda

que a construção tenha envolvido várias disputas com a câmara, dois anos depois, a casa estava pronta para abrigar o baile comemorativo da inaugu-ração da primeira etapa das obras do hospital, o que mereceu elogioso co-mentário no comércio do Porto: “a casa do sr. florêncio é das mais lindas de fafe e o salão de baile é magníco”.

cercada por jardim romântico, a casa de dois andares tem planta re-tangular, telhado de quatro águas, com claraboia e mansarda central, re-vestida de zinco. o imóvel abrigou sucessivas gerações da família, até ser vendido em 2003, tendo sido seus interiores fotografados na ocasião. a análise relativa à estada no rio de Janeiro compreenderá a contextualiza-ção dos bens relacionados no leilão de 1858 ao modo de vida dos negocian-tes da corte em meados do século XIX. Quanto à fafe, serão analisadas as fotografias de 2003 e plantas da casa, e memórias sobre a ocupação do imóvel pela família, situadas em meio à presença dos “brasileiros” no con-celho de fafe.

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I. ProPrIetárIos, construtores e artífIces: VIVêncIas e rItuaIs

A casa senhorial do embaixador Gastão da Cunha em São João del-Rei: vivências, arquitetura, detalhes construtivos numa habitação nobre do Oitocentos mineiroandré Guilherme Dornelles Dangelo, celina Borges Lemos, Vanessa Borges Brasileiro

este estudo aborda a importância do sobrado em que viveram três gerações da ilustre família do então embaixador Gastão da cunha, atual-mente pertencente aos descendentes de uma sobrinha desse tão lembrado proprietário. este é oriundo de família portuguesa da cidade de Braga, her-dando a tradição de relevante participação na política. seu avô, Domingos José da cunha, por exemplo, formado em medicina envolveu-se com po-lítica e, em virtude dessas ações políticas, exilou-se em Londres, onde se empregou como médico em uma embarcação que navegaria rumo à amé-rica do sul. Já em solo brasileiro, permaneceu temporariamente no rio de Janeiro e em 1830 fixou residência em São João del-Rei. Nessa próspera cidade com ares de modernidade imperial, o médico casou-se com filha de tradicional família da cidade. O casal teve seis filhos. O pai do dr. Gastão foi o segundo filho do casal e recebeu nome de Balbino Cândido da Cunha. Ao seguir a profissão do pai, ele se tornaria figura ilustre do Brasil do Se-gundo reinado. Diplomado em medicina em 1854, logo casou-se, e dessa união teve cinco filhos. Além de sua atuação como médico exerceu cargos políticos como vereador e deputado-geral da assembleia Provincial.

após seu falecimento, em 1905, no seu inventário aparece como in-ventariante o embaixador Gastão da cunha e, entre outros dados históricos sobre a distinta família sanjoanense, é citado o sobrado com seus requinta-dos móveis situado à antiga rua são francisco. o futuro diplomata nasceu em são João del-rei em 1863 e diplomou-se em direito na faculdade de Direito da universidade de são Paulo em 1884. Iniciou sua carreira como magistrado na condição de promotor e juiz de direito e casou-se em 1892 no rio de Janeiro com a sra. elisa de castro, descendente dos barões de Itaípe. Do casamento, nascem as três filhas, e a partir desse período diver-sifica seu trabalho ao exercer cargos como procurador geral do estado de Minas Gerais e professor da faculdade de Direito de Minas Gerais. a partir

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I. ProPrIetárIos, construtores e artífIces: VIVêncIas e rItuaIs

andré Guilherme Dornelles Dangelo | [email protected]

Professor associado da escola de arquitetura da universidade federal de Minas Gerais (ufMG). Departamento de análise crítica e Histórica da arquitetura e do urbanismo. Programa de Pós-Graduação arquitetura e do urbanismo.

celina Borges Lemos | [email protected]

arquiteta, com doutorado em ciências sociais pela unicamp (2003). concluiu o pós-dou-torado na fau-usP, em 2008. É professora associada da universidade federal de Minas Gerais, vinculada ao Departamento de análise crítica e Histórica da arquitetura e do ur-banismo e ao Programa de Pós-Graduação em arquitetura e urbanismo. É parecerista ad hoc, autora de diversas publicações.

Vanessa Borges Brasileiro | [email protected]

Arquiteta, doutora em História pela Faculdade de Filosofia e Ciências Humanas da UFMG (2008). foi presidente do Iepha/MG no ano de 2003 e é membro do Icomos. atualmente é professor adjunto IV da ufMG. tem experiência na área de arquitetura e urbanismo, com ênfase em História da arquitetura e urbanismo e técnicas retrospectivas. É autora de diversas publicações.

de 1889, inicia sua carreira política, elegendo-se deputado federal pelo 3º Distrito a qual pertencia a comarca de são João del-rei. com participações relevantes em várias incitavas vinculadas ao direito internacional, em 1905 renuncia ao seu mandato de deputado federal e à carreira política partidá-ria, para se dedicar às questões diplomáticas que vão glorificar e unificar sua vocação jurídica e política. Em 1907, entra oficialmente para a carrei-ra diplomática depois de realizar algumas missões especiais, ainda como deputado, no Itamaraty. Em 1915, faz a sua última visita oficial a São João del-rei, em que foi recebido com festa por autoridades e populares como prova do carinho e reconhecimento que tinha por ele e pelo seu trabalho o povo são-joanense.

o sobrado senhorial onde nasceu e residiu dr. Gastão da cunha repre-senta uma referência em são João del-rei, e encontra-se quase sem nenhu-ma descaracterização. tombado pelo Iphan em 1938, o bem registra a alta relevância e a importância histórica e cultural desse imóvel para o patri-mônio brasileiro. como um documento arquitetônico do mais alto valor, o sobrado é testemunho da vida de personagens históricos que colabora-ram fundamentalmente para a consolidação da ideia de nação nas últimas décadas do século XIX. além disso, a arquitetura da casa representa uma articulação entre os princípios e técnicas construtivas do século XVIII em Minas Gerais e as modernizações advindas de Portugal muito presentes no casario são-joanense do Brasil imperial.

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I. ProPrIetárIos, construtores e artífIces: VIVêncIas e rItuaIs

Ladrilhos hidráulicos: a transmissão do saber-fazer formando identidades profissionais, em Pelotas, Rio Grande do Sulandréa do amaral Dominguez

os ladrilhos hidráulicos são ornatos que cobrem os pisos de vários ambientes das casas senhoriais pelotenses edificadas na virada do século XIX para o XX. no princípio, foram importados da europa. Mas, com a chegada dos imigrantes europeus, a técnica de produção aportou em Pe-lotas. em 1914, foi fundada a primeira fábrica na cidade, que alimentava a comunidade com variados padrões de alta qualidade técnica e estética das peças quadrangulares de cimento e areia. a prática diária da produção dos ladrilhos hidráulicos é um ritual que permanece inalterado em suas etapas técnicas, com poucas inovações, sendo a mais marcante, a substituição de objetos de apoio que utilizavam materiais que caíram em desuso e foram trocados por elementos similares.

a manutenção do rito se dá na práxis, na transmissão via oral do sa-ber-fazer, do mestre aos discípulos. exige a concentração e muita sensibi-lidade do artesão/aprendiz, que durante o aprendizado passa a dominar o procedimento de confecção das peças hidráulicas. o empirismo do traba-lho artesanal estimula o surgimento da identidade profissional nos artífi-ces. Há uma hierarquia no ambiente de trabalho, onde os novatos buscam adquirir a sensibilidade dos mais experientes, através da observação e da manipulação dos instrumentos e materiais empregados. os saberes trans-mitidos oralmente são alimentados pela memória de cada instrutor. em uma entrevista feita com um desses mestres de ofício na pioneira “fábrica de Mosaicos”, inaugurada em 1914 e ainda em funcionamento, obtivemos relatos da formação dos principiantes, que transformam a artesania em arte e os objetos de cimento e areia prensados em obras únicas, verdadeiros tapetes ornamentais integrados à arquitetura, com mais de um século de manufatura inalterada.

Neste artigo, buscamos evidenciar a identidade profissional dos arte-sãos, utilizando as reflexões de Joël Candau e Maurice Halbwachs desen-volvidas nas publicações: Memória e Identidade e Los Marcos sociales de

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I. ProPrIetárIos, construtores e artífIces: VIVêncIas e rItuaIs

andréa do amaral Dominguez | [email protected]

Mestre pelo PPG Memória Social e Patrimônio Cultural da UFPel-RS (2016); especialização em Design para estamparia pela ufsM-rs (2008). Graduação em Desenho Industrial (Ha-bilitação: Programação Visual) pela ufsM-rs (1999). tem experiência na área de Desenho Industrial, com ênfase em Programação Visual e Design de estamparia.

la Memoria. além de enfatizarmos a transmissão do saber-fazer incorpo-rada à produção das peças, para restauro das casas senhoriais tombadas da cidade, trazemos uma amostra destes artefatos encontrados nos casarões e produzidas na cidade ainda hoje.

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A representação da casa senhorial ibérica e ibero-americana pelo imaginário hollywoodiano clássico: o exemplo da A marca do Zorro (1940)Luiz flávio La Luna Di cola

Na filmografia de Hollywood da “Era de Ouro” (1920-1960), as casas senhoriais ibéricas e ibero-americanas foram cenários privilegiados para a afirmação de vários gêneros e subgêneros populares que atravessaram décadas como exemplos acabados do ilusionismo e do escapismo da Meca do cinema: o “capa e espada”, o costume picture, o drama histórico e as fantasias românticas e exóticas. Dentre os exemplares dessas cenas cine-matográficas destaca-se o clássico do “capa e espada” a marca do Zorro, tremendo sucesso em sua época que afirmou o astro da Fox Tyrone Power como o grande espadachim das matinês, ao lado de errol flynn, seu ar-quirrival na Warner Bros. em filmes como o Gavião do Mar, também de 1940. esse mesmo ano de lançamento de ambas as produções não é mera coincidência. Ele reflete não só a batalha mercadológica dos grandes es-túdios pela sua fatia de mercado num dos gêneros mais lucrativos da épo-ca, mas também o esforço de engajamento da indústria cinematográfica americana na guerra ideológica contra as potências do eixo e seus aliados, como a espanha de francisco franco, antes mesmo do ataque japonês a Pearl Harbor (07/12/1941). É nesse momento que personagens e enredos da história política, administrativa e bélica do Velho e do novo Mundo ibéricos, usados para representar metaforicamente a ameaça nazifascista às democracias liberais, foram inseridos sub-repticiamente no corpo des-ses artefatos de entretenimento popular. Por exemplo, em o Gavião do Mar, felipe II (1527-1598) de espanha é ostensivamente uma representa-ção do próprio adolf Hitler, enquanto em a marca do Zorro, o persona-gem do capitão Esteban Pasquale personifica não só a corrupção e o ter-ror de uma administração militarizada e autocrática na antiga califórnia espanhola, como os da própria europa sob a sombra das ditaduras. e na mise-en-scène dessas fantasias cinematográficas, a casa senhorial ibérica como sede e habitação de um poder imperialista, opressor e explorador

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I. ProPrIetárIos, construtores e artífIces: VIVêncIas e rItuaIs

Luiz flávio La Luna Di cola | [email protected]

Bacharel em comunicação pela faculdade de comunicação da fundação armando álvares Penteado (Faap-SP); mestre em Comunicação e Cultura do Curso de Pós-Graduação da escola de comunicação da universidade federal do rio de Janeiro (ufrJ). Publicitário, jornalista e pesquisador; ex-coordenador dos cursos de Publicidade e de Cinema da Uni-versidade estácio de sá.

assumirá um papel central, pois serão nesses espaços cenográficos que boa parte das tramas e peripécias se desenrolará. Nesse contexto, a recriação cenográfica das casas senhoriais ibéricas no interior dos estúdios de Hollywood assumirá partidos arquitetônico-decorativos e funções dramatúrgico-cinemáticas específicos que resulta-rão num imaginário que até hoje condiciona o olhar contemporâneo sobre esse tipo de edificação. Será esse cruzamento entre o referencial histórico da casa senhorial ibérica, as pressões de uma guerra ideológica e os impe-rativos do espetáculo hollywoodiano o objeto do nosso estudo.

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Um palácio quase romano no Rio de Janeiro do século XIX: o palácio do Catete e a invenção de uma tradição clássica nos trópicosMarcus Vinícius Macri rodrigues

o palácio do catete, antigo palácio nova friburgo e atual sede do Mu-seu da república, foi construído entre 1858 e 1867. originalmente foi a residência de antônio clemente Pinto, o barão de nova friburgo, antes de se tornar a sede do Poder executivo federal no período de 1897 a 1960. o edifício foi idealizado para servir como uma residência digna da posição do barão, que, apesar da origem humilde de imigrante português, conse-guiu criar fortuna com comércio de café e escravos no interior fluminen-se, chegando a ser considerado o homem mais rico do Império brasileiro. Projetado pelo arquiteto prussiano Gustav Waehneldt, o palácio chamou a atenção pela imponência e pelo requinte de detalhes em sua construção, sendo apreciado por brasileiros e estrangeiros que visitaram o país como uma das mais belas construções da cidade do rio de Janeiro.

esta comunicação visa analisar a motivação para a construção do em-blemático edifício, chamado de “quase romano” por cronistas do Brasil do século XIX, e como essa construção se incluía no processo de criação de uma identidade nacional empreendido pelo Império brasileiro. Para isso, usaremos os conceitos de invenção das tradições, de eric Hobsbawm, e de processo civilizador, de norbert elias.

o neoclassicismo, principal modelo artístico no Brasil no século XIX, foi um dos veículos da realeza brasileira para transmitir o programa civi-lizador da monarquia por meio das artes e da arquitetura. a decoração do palácio do Catete, repleta de representações greco-romanas, reflete este período do século XIX onde se buscava inventar uma tradição clássica nos trópicos, que tinha por objetivo a inculcação dos valores de civilidade e ordem europeias no Brasil, insinuando uma continuidade entre os valo-res do Velho Mundo e da monarquia recém-instituída, incorporando, in-clusive, elementos “brasileiros” de forma associada aos padrões da cultura clássica.

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I. ProPrIetárIos, construtores e artífIces: VIVêncIas e rItuaIs

Marcus Vinícius Macri rodrigues | [email protected]

Mestre e doutorando pelo Programa de Pós-Graduação em História comparada da ufrJ. Historiador do Museu da república - Ibram, realizando pesquisas com enfoque no palácio do catete e seu entorno, destacando-se o livro um palácio quase romano: o Palácio do ca-tete e a invenção de uma tradição clássica nos trópicos.

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De Torre de S. Sebastião a Museu Condes de Castro Guimarães, Cascais: personagens e vivênciasMaria cristina Gonçalves

entre as principais famílias da colônia de veraneio que se mudava de sintra para cascais quando os reis d. carlos e d. amélia desciam do Paço da Pena para a cidadela, encontrava-se a família o’neill e o casal castro Guimarães, como referenciam periodicamente as colunas do “High-life” do Diário Ilustrado nas décadas de 1890 e 1900.

Deve-se a Jorge Torlades O’Neill (1848-1925), um aristocrata e fi-nanceiro de ascendência irlandesa, a construção da “torre de s. sebastião”, na enseada de santa Marta, à saída da vila de cascais, entre 1897 e 1900, para residência de vilegiatura da sua família. resultante de esboços pers-péticos do cenógrafo italiano Luigi Manini, do projeto do francisco Vilaça e de planos de pormenor arquitetônico ou soluções específicas de caráter decorativo para o exterior e interior solicitados a albrecht Haupt, o edifício surpreende pelo acentuado ecletismo, estudado em pormenor por Denise Pereira.

Manuel Inácio de castro Guimarães (1858-1927), o segundo pro-prietário da torre de s. sebastião, era sócio e amigo de Jorge o’neill. In-fluente na sociedade e na corte do final da Monarquia, como advogado e banqueiro na direção do Banco Lisboa e açores, foi agraciado com o título de “conde de castro Guimarães” por d. Manuel II, em 1909, notabilizan-do-se ainda como bibliófilo, organista amador, compositor e desportista. na posse do edifício, introduziu algumas alterações, para o adaptar aos seus principais gostos: uma sala de música e uma biblioteca. após a morte da mulher, e sem descendência, o conde legou em testamento (1924) à vila de Cascais a casa e todo o seu recheio artístico e bibliográfico, para aí se constituir um museu municipal e biblioteca pública, em ligação com os jardins e o parque contíguo “para recreio do público”. com tal iniciativa, concretizava um importante testemunho de filantropia e mecenato, valo-rizando de forma indelével o patrimônio e a cultura da região.

o museu foi inaugurado em 12 de julho de 1931, apresentando cole-ções marcadas pelo gosto eclético dos antigos proprietários e testemunho

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I. ProPrIetárIos, construtores e artífIces: VIVêncIas e rItuaIs

Maria cristina Gonçalves | [email protected]

Licenciatura em História e pós-graduação em Patrimônio e Museologia. Iniciou o percurso profissional no Palácio Nacional da Pena. Em 1993, ingressou na Direção Regional da Cul-tura dos açores, tendo participado na coordenação da rede regional de museus. atualmen-te, desenvolve funções de estudo das coleções no Museu condes de castro Guimarães.

de diferentes períodos artísticos. ao longo do tempo, o núcleo original foi sendo completado e enriquecido pela ação das sucessivas direções, através de novas aquisições e da incorporação de outras doações de menor dimen-são. a apresentação museológica articula-se com os espaços arquitetôni-cos, evocando as ambiências de uma casa aristocrática de inícios do século XX, com salas de vivência social e outras de cariz mais privado. as grandes aberturas envidraçadas para o exterior tiram partido da proximidade da frente marítima, de acordo com o gosto em voga a partir do final do século XIX, que escolheu cascais como estância balnear de eleição.

nesta comunicação, serão abordadas as sucessivas funções dos espaços e as vivências dos habitantes da torre de s. sebastião. a família o’neill e os condes de castro Guimarães, entre 1897 e 1927, bem como o primeiro percurso expositivo do museu.

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O melhor que se acha à venda: a mobília para a sala de cama da rainha d. Maria Pia no palácio da AjudaMaria José Gaivão de tavares

Partindo de documentação escrita e da análise dos objetos identifi-cados, pretende-se narrar a história da decoração do quarto da rainha do Palácio nacional da ajuda. a correspondência entre o conde da Ponte, ve-dor da casa real e o visconde de Paiva, ministro plenipotenciário em Paris, existente no arquivo nacional da torre do tombo, revela-nos as intensões, o gosto, as escolhas e, por fim, as aquisições por parte da Casa Real por-tuguesa. essa documentação indicia também as restrições orçamentais, a urgência e os imprevistos, que acabam por influenciar o resultado final da decoração desse quarto, ainda hoje intacta.

Mandado construir sob a regência do príncipe real d. João em 1796, o Real Paço da Ajuda só veio a ser residência oficial da família real portu-guesa no reinado de d. Luís I (1861-1889). Por essa altura, e durante toda a década de 1860, foram executadas importantes campanhas de decoração e modernização dos interiores do palácio, de forma a dotar a residência real das tendências estéticas, aliadas ao conforto e à higiene, exigidos pelas elites europeias da segunda metade do século XIX.

em 1862, pouco antes do casamento do rei com a princesa de sabóia, d. Maria Pia (1847-1911), iniciam-se os trabalhos de decoração dos aposen-tos da futura rainha. a aquisição do mobiliário, incluindo o leito nupcial de sua Majestade, foi comissionada ao visconde de Paiva, então minis-tro plenipotenciário de Portugal em Paris, três meses antes da chegada da augusta senhora. De fato, Paris continuava a ser o centro de produção das artes decorativas, em particular de mobiliário, onde as casas reais europeias e as elites se abasteciam. Possuir um objeto marcado “à Paris” era uma forma de distinção. ebanistas de vários pontos de frança, assim como marceneiros estrangeiros, radicavam-se em Paris, onde abriam as suas casas comerciais e ali apresentavam propostas de qualidade diversa, variadíssimos estilos e preços díspares para agradar a um leque abrangente de clientela. Qualidade, riqueza e bom gosto foram os fundamentos apre-sentados pelo vedor da casa real, quiçá instruído pelo rei d. Luís, ao requi-

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Maria José Gaivão de tavares | [email protected]

Licenciada em História, com pós-graduação em Museologia (unL) e pós-graduação em Pe-ritagem de Mobiliário (esad) é conservadora da coleção de mobiliário do Palácio nacional da ajuda. atualmente integra a direção do comité Internacional para as artes Decorativas e Design (Icdad/Icom). apresentou conferências e publicou artigos sobre a coleção de mo-biliário da ajuda, em Portugal e no estrangeiro, e colaborou em catálogos de exposições.

sitar os serviços do ministro em Paris para a aquisição do mobiliário, e de alguns objetos decorativos, para os aposentos de sua Majestade. Perante a enunciação de tais qualidades, o visconde de Paiva entendeu escolher a Maison racault et cie, umas das mais conceituadas casas comerciais pari-sienses, estabelecida pelos ebanistas alemães irmãos Krieger desde 1826, e fornecedora de casas reais europeias.

a seleção dos objetos e, mais tarde, a sua aquisição, não se concreti-zaram, porém, sem alguns embaraços causados pela estreiteza de tempo, o constrangimento orçamental e a estagnação momentânea da indústria parisiense, devido à exposição universal de Londres no ano transato. con-dicionantes que, em boa verdade, tiveram uma influência definitiva naqui-lo que se veio a adquirir.

o mobiliário, e certos objetos decorativos, chegam a Lisboa menos de um mês antes da rainha d. Maria Pia. Por consideração ao rei, seu marido, ou por apreço à decoração, essa foi a única sala que se manteve pratica-mente intacta durante a vivência da rainha no palácio da ajuda.

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Palácios e vidas instáveis: considerações sobre as moradas de diplomatas portugueses em Paris no início do Oitocentos Patricia Delayti telles

as imagens da vida diplomática que povoam o imaginário luso-bra-sileiro ainda tendem a localizar os diplomatas trajando punhos de renda, entre pratarias e tapetes, em vagos interiores rococó. espelham talvez o es-forço de d. rodrigo annes de sá almeida e Meneses (1676-1733), 3º marquês de fontes, embaixador de d. João V, para impressionar o papa clemente IX – a desfilar pelas ruas de Roma, em 1716, em coches suntuosos, atirando aos transeuntes moedas de ouro. ou ainda as festas promovidas em Viena d’áustria por d. Pedro José Joaquim Vito de Menezes (c.1775-1823), 6º mar-quês de Marialva, para viabilizar o noivado entre uma princesa Habsburgo, d. Leopoldina e o herdeiro da coroa portuguesa, o futuro d. Pedro IV.

tão faustosas foram essas ocasiões, tanto destaque ganharam na im-prensa, que podem ter marcado por séculos a ideia de uma vida diplomáti-ca de luxo e riqueza – obliterando o fato que, desde que a diplomacia come-çou a profissionalizar-se em Portugal, graças em grande parte à criação das secretarias de estado em meados do século XVIII, a maioria dos membros desse grupo era composta por meros funcionários de pequena fidalguia – cujos inventários revelam hábitos e moradias relativamente modestos.

o inventário de francisco José Maria de Brito (1760-1825), realizado após a sua morte, em Paris, permite-nos vislumbrar como vivia, nos seus últimos anos, este amigo do conde da Barca – nomeado no ano anterior embaixador extraordinário da corte portuguesa para substituir o marquês de Marialva, precocemente falecido. Por ele, veremos que o chevalier Brito, bibliófilo, mecenas da missão francesa ao Brasil, não era apenas um “ho-mem sem rosto” do qual nunca foi encontrado sequer um retrato – mas igualmente um homem quase sem bens.

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Patricia Delayti telles | [email protected]

Bolsista de pós-doutoramento (sfrH/BPD/115974/2016), doutora em História da arte (ue, 2015), mestre em arts administration (columbia university, 1996) e economista (Puc-rio, 1988). Bolseira Gulbenkian (2015/2016), venceu os prêmios fernão Mendes Pinto (2016) e Dahesh Museum Prize (2011). especializada em pintura do período de 1777 a 1834, sobretu-do retratos, miniaturas e mercado de arte.

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A casa senhorial em Borba: entre a tradição e a inovação raquel alexandra seixas

a nossa proposta de comunicação não se centra somente na análise de

uma casa senhorial em específico, mas antes num conjunto de casas edifi-cadas na segunda metade do século XVIII na cidade alentejana de Borba.

essa cidade transtagana, de fundação medieval, sofreu alterações sig-nificativas no seu tecido urbano nos finais da centúria de Setecentos. Al-terações motivadas quer pela prosperidade econômica de alguns dos seus moradores, quer pela proliferação do movimento iluminista no seio das elites locais.

Após o término dos maus anos agrícolas e dos conflitos militares com espanha (Guerra fantástica, 1762), assistiu-se, por todo o país, a um im-portante crescimento econômico e, por conseguinte, demográfico. Este crescimento foi despoletado pelo alargamento da superfície cultivada e pela recomposição do padrão de cultivo, orientado para as necessidades do mercado. neste quadro, a vinha foi a cultura que mais se difundiu, re-gistrando-se, nos finais de Setecentos, uma duplicação na produção com-parativamente ao início da centúria, sendo o Douro apenas responsável por 13% desse crescimento.

É nesse contexto que Borba assiste a um importante florescimento econômico, alavancado na produção vinícola – principal motor de fixação de novas famílias. conjuntura que legou à casa senhorial um papel pre-ponderante, enquanto manifestação visível da afirmação social e do pode-rio econômico das elites locais.

com efeito, a convergência de um conjunto de fatores favoráveis per-mitiu o cimentar de uma pequena elite intelectual, com expressão tanto nas estruturas de poder (vereadores municipais) como nas estruturas eco-nômicas (proprietários agrícolas). Elite influenciada pela corrente, então emergente, do Iluminismo, cujos preceitos teóricos enformaram o novo projeto urbanístico, ordenado e racional, da cidade de Borba. Projeto mar-cado pela abertura de novos arruamentos, assinalados com a construção de diversas casas senhoriais, que se assumem como verdadeiros edifícios-

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raquel alexandra seixas | [email protected]

Doutoranda em História da Arte na FCSH-NOVA desde 2016 com bolsa financiada pela fct (sfrH/1089873/2015), com licenciatura (2009) e mestrado (2014) em História da arte. Integra o grupo de investigação Medieval and early Modern art studies do IHa-fcsH/noVa. coordena o projeto de conservação, reabilitação e Musealização do santuário de nossa senhora de aires, em Viana do alentejo, com candidatura aprovada pelo Programa operacional regional do alentejo 2020. tem participado em congressos e publicado arti-gos dedicados à história da arquitetura do alentejo.

orientadores. Deixamos a interrogação: estas transformações urbanas fo-ram ou não acompanhadas pela renovação do discurso arquitetônico? Qual o papel da elite intelectual, ou seja, dos proprietários, neste processo?

esse plano urbanístico e a construção das novas casas senhoriais obe-decem a critérios rigorosos, inseridos no espírito pombalino da reconstru-ção da Baixa de Lisboa (1755), da modernização da cidade do Porto (1757-1804) e da nova Vila real de santo antônio (1774-1776). saliente-se, a este propósito, a intervenção de reinaldo Manuel dos santos (1731-1791), uma das figuras de proa da arquitetura pombalina, na empreitada do novo Re-colhimento de nossa senhora das Dores (1778), na cidade de Borba. Qual o legado na arquitetura civil borbense?

Pretendemos analisar as características da casa senhorial de Borba e contextualizá-las à luz da arquitetura alentejana e portuguesa, tanto ao nível das tipologias e da sociologia do espaço, como do discurso artísti-co, nomeadamente da decoração arquitetônica. Para o efeito, o diálogo e questionamento entre centro e periferia, cultura humanista e cultura de pedreiro, tradição e renovação, constituirá uma das linhas centrais da nos-sa apresentação, que atentará no papel estruturante da engenharia militar e da tradição seiscentista na arquitetura do alentejo, um dos principais palcos militares do país, e na sua relação com a gramática barroca, pom-balina e até neoclássica. análise complementada pela tratadística e pelo método comparativo com outros edifícios, seja civis ou religiosos.

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O palácio setecentista de Domingos Mendes Dias, ao Chiado. Idealização e construção de uma obra modelar na cidade de Lisboasílvia ferreira

Domingos Mendes Dias, natural da região do Minho, chegou a Lisboa ainda adolescente, onde se fixou, trabalhando como ajudante de merceei-ro. a sua vontade inabalável e a dedicação ao mester conduziram-no, em poucos anos, ao estatuto de homem de negócios rico, com armazéns em Lisboa e comércio com as praças do Brasil, índia e europa, locais privile-giados onde desenvolvia os seus negócios de importação e exportação de mercadorias a grosso.

no entanto, para o rapaz que veio sozinho de terras longínquas e que triunfou na grande cidade, faltava cumprir-se um dos desígnios que, na-turalmente, o guiou desde o instante em que chegou à capital: a edificação de uma morada condigna com o seu estatuto de homem abastado e res-peitado.

Domingos Mendes Dias não pretendia a construção de uma habita-ção de carácter banal, desejava um palácio. Para concretizar a sua intenção, põe em marcha uma série de ações concertadas: coloca-se em posição de receber a ordem de cavaleiro da ordem de cristo, que lhe será atribuída por d. José e confirmada pela mesma Ordem em 1763, depois de várias in-quirições na sua terra natal e em Lisboa. anos mais tarde, inicia diligências para a sua nobilitação, processo que desencadeia em 1773. a inquirição apura que: “os ditos seus pais e avos só servirão a cargos honrosos da cama-ra e da republica e se tratarão sempre a ley da nobreza com cavallos e cria-dos sem exercitarem officio algum mecânico mais o justificante e eles são legítimos Descendentes dos Mendes Dias que forão pellos senhores reys deste Reyno honrados...se deue julgar justificada a sua Nobreza e linha-gem e pertemcem-lhe as mesmas armas de que se lhe deue passar Brazão”. as condições estavam criadas.

Possuidor de uma fortuna considerável, cavaleiro da ordem de cris-to, dalgo com direito a uso de brasão, Domingos Mendes Dias inicia o pro-cesso de aquisição de terras e de construção da sua casa nobre em local pri-

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sílvia ferreira | [email protected]

Doutora em História na especialidade de arte, Patrimônio e restauro pela faculdade de Letras de Lisboa. Desenvolve atualmente projeto de pós-doutoramento, apoiado pela fun-dação para a ciência e a tecnologia dedicado ao tema: “Presença, memória e diáspora: des-tinos da arte da talha em Portugal entre o liberalismo e a atualidade”. no âmbito dos seus estudos sobre arte e história religiosa da Lisboa barroca, tem participado em congressos, colóquios e outros encontros de caráter científico, promovidos no país e no estrangeiro, sendo autora de diversas publicações.

vilegiado da cidade, tendo como vizinho, o antigo palácio dos Marqueses de fronteira na rua da Horta seca que, apesar afetado pelo terremoto de 1755, não deixava de ser um edifício de caráter nobre.

As relações privilegiadas que mantinha com figuras gradas do reino terão sido determinantes para a gênese, construção e decoração do seu pa-lácio. segundo cirilo Volkmar Machado, o responsável pela planta e cons-trução desse edifício foi o arquiteto régio Manuel caetano de sousa. apre-sentando no seu projeto original um piso térreo e um andar de aparato, o palácio foi dotado nos seus interiores com os melhores materiais e peças decorativas que se podiam encomendar à época. À sumptuosa área civil correspondia uma outra não menos faustosa: a capela de talha dourada, datada de finais do século XVIII.

É nossa intenção, neste estudo, analisar a forma como, em finais de Setecentos, Domingos Mendes Dias colocou em marcha um propósito fir-me, que resultaria na construção de um edifício que, apesar de apresentar uma das mais fascinantes histórias é, talvez, dos mais desconhecidos da cidade de Lisboa.

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II. IDentIfIcaÇÃo Das estruturas e Dos ProGraMas DIstrIButIVos e o estuDo De noMencLaturas funcIonaIs e sIMBÓLIcas De caDa esPaÇo

II Identificação das estruturas e dos programas distributivos e o estudo de nomenclaturas funcionais e simbólicas de cada espaço

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II. IDentIfIcaÇÃo Das estruturas e Dos ProGraMas DIstrIButIVos e o estuDo De noMencLaturas funcIonaIs e sIMBÓLIcas De caDa esPaÇo

Escritório, sótão, sala de jantar e toalete da casa da chácara da Baronesa, Pelotas, Rio Grande do Sul, Brasilannelise costa Montone, ester Judite Bendjouya Gutierrez

os espaços residenciais se transformaram ao longo dos séculos e, da mesma forma, sua denominação. essas mudanças podem ser observadas, por exemplo, devido às adaptações de uso, pela criação de novos compar-timentos nas habitações e de uma cultura para outra. o presente texto propõe uma discussão em torno da nomenclatura utilizada para alguns cômodos do circuito expositivo do Museu Municipal Parque da Baronesa, antiga chácara do século XIX, no sul do Brasil.

o local foi residência da família de annibal antunes Maciel Júnior (1838-1887) e amélia fortunata de Brito Hartley [antunes Maciel] (1848-1919), casados no rio de Janeiro, em agosto de 1864. ele era bacharel em ci-ências físicas e matemáticas e pecuarista, natural de rio Grande. em 1884, recebeu o título de “Barão de três serros” do imperador dom Pedro II, por ter emancipado 58 de seus escravos. amélia era carioca, de ascendência inglesa por via paterna e descendente de portugueses pelo lado materno.

a história remete a 1871, data em que annibal recebeu a propriedade, como parte na herança de sua mãe, transformando-a no parque annibal, com casa de moradia, jardins, gruta, pomares, potreiros e cocheiras. Mais tarde, o local ficou conhecido como chácara da Baronesa e, em 1978, os netos dos barões, todos residentes no rio de Janeiro, lotearam a proprie-dade e passaram ao município a tutela de uma fração da área, onde estava localizada a vivenda, com indicação de que fosse convertida em museu. após uma obra de restauração, empreendida pelo poder público munici-pal, foram mantidos muitos dos espaços preexistentes, com a tipologia de residência.

a casa senhorial dos barões de três serros foi estudada por meio de inventários post mortem, livros de despesa da família, entrevistas, ima-gens e cartas trocadas entre a baronesa e sua filha mais velha, que possuía o mesmo nome da mãe, amélia. analisou-se a planta atual, referente ao uso como museu, à luz de informações encontradas nesses documentos,

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com atenção às mudanças promovidas pelas diferentes gerações na antiga habitação e à denominação utilizada para seus cômodos.

Tendo como base, principalmente, autores como Hélder Carita (2014; 2016), Marize Malta (2011), Ana Lúcia Vieira dos Santos (2005; 2016) e Wi-told rybczynski (2002), em diálogo com a documentação investigada, pre-tende-se criticar, definir e justificar o uso de designações como escritório, sótão, sala de jantar e toalete, no Museu da Baronesa. ao mesmo tempo, é possível traçar uma comparação entre a utilização destes termos antes e depois da transição da chácara da Baronesa, de espaço privado para espaço público.

annelise costa Montone | [email protected]

Doutoranda em Memória social e Patrimônio cultural/IcH/ufPel, linha de pesquisa pa-trimônio e cidade – orientação: profa. dra. ester Judite Bendjouya Gutierrez. Mestre em Memória social e Patrimônio cultural/IcH/ufPel, linha de pesquisa gestão de acervos e patrimônio. especialista em Preservação do Patrimônio arquitetônico e urbano (faurb/ufPel). Graduada em arquitetura e urbanismo (ufPel) e em administração de empresas e administração Pública (ufrGs). administradora/Prefeitura de Pelotas, diretora do Museu Municipal Parque da Baronesa/secretaria de cultura.

ester Judite Bendjouya Gutierrez | [email protected]

Graduada em Arquitetura e Urbanismo (UFRGS); especialista em Educação (UFPel) e em Gestão do Patrimônio (UFPE/Unesco); mestre e doutora em História (PUCRS). Professora de mestrado em arquitetura e urbanismo e de mestrado e doutorado em Memória social e Patrimônio cultural, da ufPel.

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Reflexões sobre a casa nobre em Belo Horizonte, Minas Gerais, Brasil, entre 1900 e 1930: a arquitetura, os interiores e suas consonâncias com as mudanças dos valores e hábitos da sociedade localcelina Borges Lemos, andré Guilherme Dornelles Dangel

os primeiros projetos das casas nobres situadas em grande parte na área central da capital, representam um marco de modernidade e inova-ção da arquitetura mineira, que surgiu com o plano urbanístico da nova capital. Este estudo aborda algumas reflexões sobre a arquitetura e suas caracterizações projetuais e técnicas construtivas compreendidas entre a fundação da cidade em 1897 e a década de 1930. os arquitetos responsáveis por essas construções integravam em grande parte a equipe da comissão construtora da nova capital. ao longo das décadas de 1920 e 1930, outro grupo de arquitetos, advindos do rio de Janeiro e da europa, adquiriram notoriedade na paisagem cultural local. suas contribuições, coadunadas com o desenvolvimento socioeconômico, propiciam transformações arqui-tetônicas relevantes na concepção das casas nobres, pautadas por inovação dos detalhes dos projetos, das técnicas construtivas e dos acabamentos. a adoção conceitual de uma racionalidade arquitetônica protomoderna aliada aos materiais sofisticados propiciam e simultaneamente integram a dinamização dessa produção na capital.

Neste contexto, essas casas já edificadas pelo setor privado, e não mais por iniciativa do poder público, tornaram-se referenciais e influenciaram a arquitetura edificada em outras regiões menos nobres da capital. Outro aspecto relevante vincula-se às relações estabelecidas entre os seus interio-res, as arquiteturas e as mudanças de valores e hábitos no modo de morar dessa camada da sociedade. neste aspecto observa-se um impacto simbó-lico criado pela arquitetura do morar de luxo no contexto belo-horizontino e suas manifestações culturais e estéticas na sociedade. nesta perspectiva, são relevantes as dimensões da imagem arquitetural, o significado crítico dos projetos arquitetônicos, as práticas construtivas, que se transmutam em modos de morar e enunciam um novo sentido de conforto e intimidade no espaço doméstico sofisticado.

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celina Borges Lemos | [email protected]

arquiteta, com doutorado em ciências sociais pela unicamp (2003). concluiu o pós-dou-torado na fau-usP, em 2008. É professora associada da universidade federal de Minas Gerais, vinculada ao Departamento de análise crítica e Histórica da arquitetura e do ur-banismo e ao Programa de Pós-Graduação em arquitetura e urbanismo. É parecerista ad hoc, autora de diversas publicações.

andré Guilherme Dornelles Dangel | [email protected]

Professor associado da escola de arquitetura da universidade federal de Minas Gerais (ufMG). Departamento de análise crítica e Histórica da arquitetura e do urbanismo. Programa de Pós-Graduação arquitetura e urbanismo.

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Residência senhorial do bairro do Flamengo: história e análise espacial de palacete do início do século XX Denise Vianna nunes

este artigo apresenta os espaços interiores de um palacete carioca construído entre o final do século XIX e o início do século XX no bairro do flamengo, no rio de Janeiro. trata-se da residência do fazendeiro, advoga-do e promotor público Galeno Martins de almeida (1870-1948) demolido em 1973. a moradia aqui estudada localizava-se na travessa Januária nº. 16 e 18, bastante próxima à avenida de Ligação, atual avenida oswaldo cruz, que passou a ser chamada de rua Princesa Januária por iniciativa desse morador em homenagem a uma das filhas do imperador Pedro I com d. Leopoldina. tal fato somado à análise preliminar de seu acervo, dos de-poimentos de seus familiares e dos relatos obtidos em jornais da época nos permitem esboçar o perfil desse herdeiro da elite cafeeira paulista.

Galeno nasceu em Valença (rJ), mas passou a infância e a juventude em são Paulo. como muitos membros da elite de seu tempo, viajava com frequência para a europa e cultivava hábitos franceses. figura bem relacio-nada nos meios sociais e políticos paulista (foi colega de turma no curso de Direito do presidente Washington Luís) e carioca (promovia saraus todo segundo sábado do mês em seu palacete), foi um meticuloso colecionador de arte, livros, pratarias, louças e cristais; deixou descrita a origem da pes-quisa e compra de cada peça de sua coleção. segundo o jornal o Globo de 01/02/1948, foi cultor das belas-artes, transformou sua casa num museu de objetos de mais apurado gosto e teve o mérito de reunir na sua biblioteca a maior parte das obras existentes sobre o nosso país, possuindo assim va-liosíssima brasiliana.

a residência em dois pavimentos estava implantada no alinhamen-to da via com testada de 30m; sua fachada principal apresentava uma fe-nestração regular com poucos ornamentos e acabamento austero, quase uma fortaleza. o telhado se encontrava escondido por platibanda. farto material iconográfico do acervo da família comprova a compartimentação dos espaços internos em sala de bilhar, de música, de estar e jantar, entre

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outros. além disso, revelam os elementos integrados e os móveis. Diversas publicações em jornais, após o falecimento de seu proprietário, também descrevem os muitos ambientes e o requinte de seu interior e das recep-ções que ali ocorriam.

as fontes primárias de informação para o desenvolvimento deste tra-balho são o inventário do proprietário, a escritura da casa e material ico-nográfico do acervo da família. Diversas fontes secundárias serão consulta-das. entre os autores: carlos Lemos, William Bittar e francisco Veríssimo, Jeffrey Needell e Patricia Schettino. Pretende-se identificar a organização e a articulação dos espaços internos deste palacete de modo a tornar pos-sível o seu desenho e sua análise comparativa com os interiores de outros palacetes de seu período. acredita-se assim poder contribuir com o conhe-cimento da história urbana do rio de Janeiro.

o presente artigo se insere em pesquisa sobre transformações nos modos de morar do século XX – da casa ao edifício, que a autora pretende dar início no primeiro semestre de 2018 na escola de arquitetura e urba-nismo da universidade federal fluminense.

Denise Vianna nunes | [email protected]

Professora da escola de arquitetura e urbanismo da universidade federal fluminense e do curso de arquitetura e urbanismo do IBMec. foi coordenadora da Pós-Graduação em Design de Interiores da unisuam no período 2015-2017. Possui graduação, mestrado e dou-torado pela fau-ufrJ.

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Palácio de d. Xica, requintes de espaço gravados na pedra Domingos tavares

chegada a Braga, a noiva, jovem e rica herdeira paulista, transportou para o casamento no Minho rural e aristocrático, uma miragem renovadora da casa nobre europeia. francisca de sousa trouxe do Brasil para Portugal a irreverência e liberdade em tudo contrárias ao espírito dos velhos solares das terras do noroeste português. e fez sentir ao arquiteto suíço radicado no país, já apaixonado pela descoberta de um outro caminho para a arqui-tetura, o seu sonho de princesa em palácio romântico.

É na compreensão do requinte dos espaços interiores que melhor se pode entender a dimensão áurea da vivência procurada. Deve referir-se à qualidade das sequências e relações funcionais subjacentes à ideia do pro-jeto, ou de como elas identificam os valores de um padrão de vida atenta às questões do conforto e algum nível de independência da vida íntima, da qualidade das relações de trabalho com os servidores e da valorização si-multânea dos elementos que contribuem para a eficácia da representação social da família.

o arquiteto esmerou-se na apresentação de uma “habitação nobre da província”. num gesto de ecletismo com algum sabor alemão, na linha do aclamado palácio da Pena em sintra, inventou uma torre medieval ameada para marcar o sítio da senhora, com varanda privada sobre a entrada, su-blinhada por elegante jardim de inverno. conjugou a art nouveau em ferro e vidro com os ritmos renascentistas dos corpos redondos abrigando salas e varandas de fumo. e conferiu ao moderno elevador elétrico o papel de articulador vertical da casa, num toque de modernidade irreverente.

o andar principal apresenta três setores bem escalonados, a saber: área de recepção com disponibilidade de acesso a um jardim de inverno; salas de jantar e fumo em ligação com a grande varanda sobre o parque e o outro lado do jardim de inverno; salas de estar e jogos como convém à vida social da família em noites de recolhido convívio. e no andar dos quartos disponibiliza as instalações privadas do casal no primeiro terço, uma área central de alojamentos complementares e um terceiro setor de privacidade

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cuidada para hóspedes merecedores de atenção especial.Das experiências esboçadas restaram cinco anos de paixão criati-

va, transportados para as pedras e árvores de um palácio impossível em tempos de grande guerra, de crises e revoluções. em 1920 a emoção dos sentimentos pessoais cruzou-se com impossibilidades mal esclarecidas, deixando a obra inacabada, sem uso e sem destino. Por essa época e por outras paragens, o eclectismo romântico já ia dando lugar a outras realida-des mais prosaicas. na casa inventada para francisca, foram as pedras que morreram de pé. uma morte prematura, no ventre da imaginação dos que a conceberam.

Domingos tavares | [email protected]

arquiteto, professor faculdade de arquitectura da universidade do Porto, investigador do centro de estudos de arquitectura. Publicou francisco farinhas, realismo moderno (Daf-ne, 2007), casas de Brasileiro – erudito e popular na arquitectura dos torna-viagem (Dafne/ceau-faup, 2015) e transformações na arquitectura Portuense, o caso de antónio da silva (Dafne/ceau-faup, 2017).

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Da câmara à capela sem sair da residência João Vieira caldas

no Portugal do antigo regime não era concebível uma família nobre que não usufruísse de um lugar privilegiado no espaço religioso, fosse para orar, para assistir à missa ou para tumular os seus mortos. nesse contexto, era normal construírem-se capelas anexas a catedrais, igrejas paroquiais ou conventuais, ou as famílias assumirem o padroado de uma capela la-teral integrante do templo. a posse de uma capela particular integrada na residência própria, porém, era na Idade Média privilégio dos membros da família real.

no século XVI começam a ser construídas capelas junto às casas no-bres, mas nem sempre diretamente ligadas à zona residencial. É só no fi-nal do século XVII, e, sobretudo, no século XVIII, que a capela se torna parte integrante da habitação, principalmente em ambiente rural e até em muitos centros urbanos. na capital, e esporadicamente fora dela, essa co-modidade era frequentemente substituída pela ligação dos palácios das principais famílias aos conventos contíguos, dos quais, geralmente, eram patronas, onde possuíam uma tribuna para assistir às cerimônias religio-sas, o que não evitava a existência de um oratório no interior da casa — mas não necessariamente sob a forma de compartimento exclusivamente com essa função — destinado às preces em ambiente privado e mais isolado.

a posse de capela numa habitação particular foi durante muito tempo uma prerrogativa da classe nobre. em consequência, o inverso também é verdadeiro, isto é, tal como a pedra de armas, a capela associada a uma habitação era um signo de nobreza. sendo certo, portanto, que a evidên-cia da capela correspondia a uma manifestação de classe, particularmente importante para a nobreza recente ou em ascensão social, para a nobreza de província e para a pequena nobreza em geral, também é verdade que, sobretudo em contexto rural, as capelas particulares prestavam um impor-tante serviço à população. estando frequentemente integradas em casas que eram cabeça de grandes propriedades, por vezes distantes dos princi-pais núcleos urbanos, não só proporcionavam aos serviçais domésticos e aos trabalhadores agrícolas um acesso fácil aos serviços religiosos, como também às populações rurais das aldeias e campos vizinhos que viviam

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afastadas das sedes das respectivas paróquias. esta situação conduzia a família proprietária a posicionar-se no espaço da capela, nomeadamente durante os serviços religiosos públicos ou semipúblicos, de modo a afirmar claramente o seu estatuto e a sua diferença.

a presente comunicação pretende, assim, evidenciar os meios de acesso interno às capelas senhoriais a partir das principais câmaras ou an-tecâmaras utilizadas pelo senhores da casa, assim como a posição mais ou menos sobranceira que estes escolhiam para se apresentarem nesse espaço perante os seus servidores e os camponeses das redondezas, desde que co-meçaram a aparecer as “ermidas” ligadas às residências até que a procura de conforto e intimidade, em crescimento na segunda metade do século XVIII, levou a que as segundas tenham absorvido completamente as pri-meiras, fazendo crescer em número e em qualidade espacial e decorativa os espaços interiores concebidos expressa e exclusivamente enquanto ora-tórios.

João Vieira caldas | [email protected]

Licenciado em arquitetura, mestre em História de arte e doutor em arquitetura. É atu-almente professor auxiliar no Instituto superior técnico da universidade de Lisboa, onde leciona disciplinas de teoria e de História de arquitetura no curso de Mestrado Integra-do em arquitetura, e a cadeira de Métodos de Investigação em arquitetura no curso de Doutoramento em arquitetura. tem investigado, publicado e orientado dissertações de mestrado e de doutoramento no âmbito da História da arquitetura das épocas moderna e contemporânea, preferencialmente no domínio da História da Habitação (erudita e verná-cula, urbana e rural).

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Ecletismo, técnica e distribuição: o caso do palacete Mendonça, em Lisboa Júlia Zurbach Varela

na arquitetura eclética tardo-oitocentista, que se estenderá pelas pri-meiras décadas do século XX, convergem aspectos técnicos, construtivos, programáticos e decorativos que conferem ao exercício do projeto um grau de complexidade crescente. a composição, enquanto instrumento que permite organizar aspectos parciais e vários num todo uno e coerente, as-sume papel central nesta prática, em que o arquiteto procede, em paralelo, a um trabalho de análise e de síntese, atento ao desenho da parte e do todo, à conciliação da técnica e da história, num olhar simultâneo para o pas-sado e para o futuro. no campo da arquitetura doméstica, ganham ainda especial relevo os novos códigos programáticos associados ao exercício da distribuição que, a par do projeto decorativo, são os campos onde de forma mais evidente se pode sentir (ou pressentir) uma partilha de decisões entre arquiteto e cliente/habitante.

Propõe-se uma reflexão acerca destes temas a partir do palacete Men-donça, obra de Miguel Ventura terra, construída durante a primeira déca-da do século XX para o roceiro Henrique Mendonça, em Lisboa, no alto do Parque eduardo VII. exemplar paradigmático do que seria uma arqui-tetura doméstica de vanguarda na época, nele se refletem a excelência do arquiteto e o estatuto do cliente, numa obra que, pelo seu estado de con-servação é hoje um exemplar particularmente interessante e rico para o estudo da arquitetura doméstica do ecletismo em Portugal.

Dando seguimento à investigação que tem vindo a ser realizada sobre este edifício, onde se defende que a concepção do palacete Mendonça tem associada de forma muito evidente ideais de cosmopolitismo e progresso, perfilhados em igual medida pelo arquiteto e pelo cliente, procura-se agora dar mais um passo na concretização desta tese, aprofundando e detalhan-do aspectos onde de modo mais imediato e evidente se podem encontrar as marcas deste “espírito do tempo”: as tecnologias associadas à construção e ao espaço doméstico.

Assim, partindo de uma identificação e caracterização dos aspectos

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Júlia Zurbach Varela | [email protected]

Doutoranda em História da arte na universidade de Évora e membro do centro de História da arte e Investigação artística dessa instituição. Investiga sobre História da arquitetura e da cidade dos séculos XIX-XX. Bolsista da fundação para a ciência e tecnologia (referência sfrH/BD/122544/2016).

técnicos (infraestruturas, equipamentos e construção), procura-se por um lado, questionar o modo como estes determinam e são determinados pelo exercício amplo da composição; e, em simultâneo, dar conta do papel assumido por estes novos espaços da técnica, associados à higiene e ao conforto, no exercício global e codificado da distribuição, hierarquização e simbólica do conjunto dos espaços que constituem a casa.

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A Casa da Hera: um modelo singular de casa senhorial no Vale do ParaíbaKatia Maria de souza

esta comunicação é resultado da investigação desenvolvida pelo gru-po de pesquisa “Design, cultura e memória”, que investiga e analisa a arqui-tetura e os objetos existentes no acervo de instituições públicas e privadas no estado do Rio de Janeiro que configurem e/ou constituam exemplares significativos para a história da arquitetura e do design no que compreende a relação entre o usuário, objeto, espaço e sociedade. entende-se que esses objetos, de fatura artesanal e/ou industrial, configuram e representam um modo de viver típico de uma época.

o projeto inicial tomou como base o Museu casa da Hera, em Vas-souras, município do estado do rio de Janeiro, que foi moradia da família teixeira Leite e possui diversos objetos, como mobiliário, decoração e uma importante coleção de indumentária, que ajudam a contar a história do apogeu das plantações de café no Vale do Paraíba do sul, durante o século XIX.

a pesquisa tem como objetivo principal descrever as informações técnicas, históricas e tipológicas da arquitetura do Museu casa da Hera através de três etapas: pesquisa histórica, comparação com outros mo-delos arquitetônicos e análise tipológica. estas etapas visam salientar as semelhanças e diferenças encontradas na distribuição dos espaços e nas técnicas construtivas utilizadas, verificando seus partidos arquitetônicos, procurando estabelecer um paralelo entre os modelos existentes na região e em outras áreas do Brasil, no período que compreende o final do século XVIII até a segunda metade do século XIX.

este texto, então, apresenta os primeiros levantamentos realizados pelo grupo. observamos que o partido adotado na casa da Hera se apro-xima muito das soluções empregadas nas casas de fazenda no rio de Ja-neiro, são Paulo e Minas Gerais. a separação das áreas íntimas, sociais e comerciais obedecem ao padrão adotado nas fazendas e se repete na casa da Hera.

no entanto, essa é uma casa “urbana”, ou seja, construída próxima ao

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núcleo central da cidade de Vassouras, mas que conserva a dimensão de casa isolada e circundada por vegetação, mantendo uma atmosfera cam-pestre. o que a aproxima das casas senhoriais ou de cidade é justamente o seu interior, ricamente decorado nos setores sociais e comerciais, e por outro lado extremamente sóbrio nas áreas íntimas, talvez herança ou in-fluência das fazendas.

Sendo assim, num primeiro momento, a pesquisa pretende verificar como se configurou a disposição dos espaços da residência, considerando, conforme apontam os estudos históricos, os acréscimos realizados nos pri-meiros anos de posse da casa pelo patriarca Joaquim teixeira Leite até a sua disposição atual. a investigação busca confrontar tais acréscimos por meio de levantamento de materiais e técnicas construtivas e a sua importância na constituição de uma espacialidade que a coloca como representante de uma casa senhorial nos moldes adotados na segunda metade do século XIX.

esse modelo de arquitetura residencial empregada na casa da Hera era muito comum no Brasil dos finais do século XVIII, especialmente na região do Vale do Paraíba, e se expandiu durante o período da cultura do café. assim, o estudo comparativo das técnicas construtivas e modelos distributivos das casas de fazenda e das casas urbanas da região ajudam a compreender esse exemplar tão singular no cenário das casas senhoriais da zona cafeeira do estado do rio de Janeiro. É justamente o contraste entre arquitetura colonial típica das fazendas e um interior decorado com luxo e elegância que esta comunicação pretende registrar, catalogar e atualizar.

Katia Maria de souza | [email protected]

arquiteta, mestre em História da arte (1998) e doutor em artes Visuais (2008) pela eBa/ufrJ. Professora adjunta, coordenadora do curso de arquitetura, desde 2016, da universi-dade Veiga de almeida, atuando principalmente nas áreas de História da arte e História e teoria da arquitetura.

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Solar Monjardim: da casa colonial a casa museu – Vitória, Espírito SantoLuciana nemer

na cidade de Vitória, o edifício que hoje abriga o Museu solar Monjar-dim, teve sua origem como sede da fazenda Jucutuquara, cujo proprietário foi o capitão francisco Pinto. a residência começou a ser construída no final do século XVIII e teve sua obra concluída em 1805. Em 1816, a proprie-dade passou a pertencer à família Monjardim por ocasião do casamento de Ana de Paula, filha do capitão, com o coronel José Monjardim. Devido ao fato de saint-Hilaire, naturalista francês, ter se hospedado na proprie-dade no início do século XIX, informações foram registradas. o viajante descreve uma encosta onde abaixo da casa do proprietário encontram-se o engenho e as choupanas dos negros, lembra ainda a influência dos méto-dos jesuítas no plantio.

até a década de 1940, o solar continuou sendo utilizado como resi-dência da família quando foi tombado pelo sphan. a residência possui arquitetura típica do período colonial, com características da casa rural mineira e da bandeirante. sua fachada principal é voltada para a baía, o que caracterizava o controle das terras e propiciava maior ventilação. o solar é atualmente um museu casa, ambientado como uma moradia rural do século XIX, com a distribuição dos cômodos definida a partir dos usos e das noções de convívio social e de privacidade daquele período. no primei-ro pavimento, o porão utilizado como depósito nos tempos antigos abriga hoje a administração do museu, a cargo do Ibram.

o museu, no segundo pavimento, é composto de varanda coberta que circunda dois lados da casa garantindo a ventilação e a iluminação atra-vés de dez vãos de portas protegidos por guarda-corpos vazados. ela serve como circulação e permite o acesso à sala de visitas, à sala de jantar e à ca-pela. a sacristia e a capela foram cômodos criados na residência em 1842. a sala de visitas formava o núcleo da habitação, com a melhor mobília e a mais bonita ornamentação, o ambiente se abre para os quartos de casal e de solteiro e o escritório. este último era usado para estudo ou para escri-turação dos negócios. ambos os quartos, solteiro e casal, possuem janelas,

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Luciana nemer | [email protected]

arquiteta, pela fau–ufrJ (1991), mestre em engenharia civil-uff (1995), doutor em en-genharia de Produção-coPPe–ufrJ (2002) e com pós-doutorado no PPGau-ufes (2016). Professora da uff tar-PPGau. especialista na área de expressão e Maquetes, é líder do GPARF. Pesquisadora do GPTA-UFES. Autora de inúmeros artigos científicos, trabalha há 22 anos na área acadêmica.

o primeiro para os fundos da residência e o segundo para a varanda. a sala de jantar era um espaço de ostentação, ricamente ornada com seus pre-ciosos mobiliários. com entrada pela sala de jantar, o quarto de hóspedes era reservado a amigos e correligionários. com seu piso em tijoleira cerâ-mica, indicando uso de serviço, a ampla cozinha era o principal espaço de convivência doméstica da residência. a camarinha localiza-se no terceiro nível e foi construída em meados do século XIX, em função do aumento da família. nesse espaço, acessado por escada interna, encontram-se um vestíbulo e um amplo quarto.

o presente trabalho analisa o histórico do imóvel, das alterações na distribuição dos cômodos, e realiza uma detalhada observação das facha-das materializada através de aquarelas produzidas pela autora. o solar é considerado um dos melhores exemplares da arquitetura rural do litoral sudeste do Brasil, o que enfatiza a relevância desta pesquisa.

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II. IDentIfIcaÇÃo Das estruturas e Dos ProGraMas DIstrIButIVos e o estuDo De noMencLaturas funcIonaIs e sIMBÓLIcas De caDa esPaÇo

Casa do Pinhal, a vida numa fazenda de café Maria alice Milliet

Moradia representativa da ocupação do interior paulista, a casa do Pinhal guarda traços do que foi a vida numa fazenda de café no século XIX. a construção em pau a pique, iniciada por volta de 1831, conserva o aspecto austero da arquitetura rural brasileira. residência familiar e sede de uma empresa cafeeira, a casa – um bloco prismático formado por paredes bran-cas e coberto por telhas de barro – ocupa posição central no complexo que abrange os extensos terreiros margeados pelas senzalas e, no lado oposto, os jardins seguidos de um vasto pomar de uso recreativo.

em quase duzentos anos, o espaço doméstico pouco mudou. Da casa, o proprietário comandava as atividades produtivas da fazenda, ali tratava de negócios, recebia políticos e acolhia os viajantes, sem que a intimida-de doméstica fosse devassada. a manutenção dessa segregação revela a permanência de formas arcaicas de convivência, o que só veio a mudar no início do século XX.

com o passar do tempo, a rusticidade da vida na casa do Pinhal foi sendo amenizada. No final do século, alguns requintes foram introduzi-dos, tais como móveis encomendados no rio de Janeiro, louças, cristais e talheres importados da frança. até um piano alemão chegou à fazenda para alegria das moças da família. essas melhorias permitiram que o décor da moradia se aproximasse dos padrões vigentes nos palacetes urbanos. recentemente, graças ao restauro da arquitetura e aos objetos e mobiliário remanescentes, foi possível reconstituir cada ambiente e assim identificar os usos e costumes da época.

os jardins, desde sempre, estiveram ligados à vida doméstica. can-teiros geométricos ao gosto francês, um lago com repuxo, bancos e cara-manchões definem as áreas de estar e lazer. Anexo vem o pomar onde tudo é mais amplo, menos disciplinado. essa área, cultivada com árvores fru-tíferas, refrescada por canais e tanques d’água e cercada por altos muros, servia à convivência dos familiares nas horas quentes do dia.

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Maria alice Milliet | [email protected]

Historiadora da arte, crítica, curadora. Doutora pela faculdade de arquitetura e urbanis-mo da universidade de são Paulo. foi diretora da Pinacoteca do estado de são Paulo, do MaM-sP e da fundação nemirovsky. autora de numerosos livros e ensaios. curadora da casa do Pinhal em são carlos (sP).

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A fruição da vista: os mirantes das casas burguesas da Vitória - Salvador, Bahia Maria do carmo Baltar esnaty de almeida

a transformação da arquitetura residencial durante a Primeira re-pública, em Salvador, foi influenciada por fatores de ordem distinta. Do discurso higienista, atrelado a uma nova ordem imobiliária, do avanço das técnicas construtivas à designação de novos papéis para os membros do núcleo familiar, a casa refletirá os ideais burgueses na maneira de morar, assumindo uma função didática na construção do cidadão moderno. tais modificações, que alteraram substancialmente o agenciamento da habita-ção, com a reorganização de suas funções e a introdução de novos elemen-tos no programa arquitetônico, decorrem também da construção de novas sensibilidades e práticas sociais.

a educação do olhar e a fruição dos valores estéticos da natureza con-tribuíram para a construção de equipamentos urbanos que favorecessem o deleite contemplativo e as maneiras de sociabilidade. em salvador, este processo foi fomentado pela grande colônia de estrangeiros que se instala no distrito da Vitória a partir da Independência, em 1822.

na habitação burguesa, essa forma de viver estará expressa em ele-mentos que estabelecem uma nova relação com o exterior. Para além das exigências de salubridade, que favoreceram a utilização de grandes jane-las, balcões e bay-windows, tratava-se de construir vistas agradáveis, es-paços para satisfazer o hedonismo, aliando-os à saúde da casa e dos seus habitantes. a paisagem urbana adquire um status valorizado, uma com-plementação estética do projeto da habitação, idealizada para o usufruto do morador.

nesse contexto, destaca-se a construção de mirantes nas casas da elite soteropolitana, no distrito da Vitória. os principais exemplares encontra-dos na pesquisa encontram-se no campo Grande, corredor da Vitória e Graça, áreas de cumeada com grande recobrimento vegetal e privilegiada vista sobre a baía de todos os santos. também nas habitações da classe média nos novos loteamentos da Barra são identificados pequenos miran-tes dos quais se podia apreciar o mar.

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situados em corpos estreitos e geralmente recuados do plano da fa-chada principal, destacam-se da cobertura desses edifícios, em arranjos compositivos distintos. Volumetricamente, estabelecem um contraponto vertical com a horizontalidade do conjunto construído. Seu aspecto figu-rativo, na maioria das vezes, assume as características do pitoresco, utili-zando pérgolas, elementos que remetem aos chalets ou pequenas torres. o acesso estava sempre relacionado à escadaria que, nos projetos mais ela-borados, a exemplo da Villa catharino, contava com um elevador, uma ex-travagância do proprietário. através dos mirantes, a casa se apropriava da cidade e dos seus horizontes. os depoimentos de antigos usuários indicam o uso desses espaços pela família e por visitantes mais ilustres, convidados a apreciar a paisagem da vizinhança de um ponto privilegiado da casa.

São poucas as fotografias do período que revelam esses elementos ar-quitetônicos, seu uso ou as vistas a partir deles. É possível percebê-los, entretanto, como espaços contemplativos e de recreação, de um lazer mais intimista da família ou um lugar de exibição da posição social do morador. Da mesma forma, perceber o enquadramento da paisagem do entorno das casas, o recorte estético que seleciona elementos como edifícios, vegetação ou o mar. estudar estes elementos da habitação burguesa é aprofundar a compreensão de um processo de modernização, complexo e contraditório em muitos aspectos.

Maria do carmo Baltar esnaty de almeida | [email protected]

Arquiteta, Doutora em Arquitetura e Urbanismo pela Ufba. Professora do Departamento Acadêmico de Construção Civil do Ifba - campus salvador.

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Palácio São Joaquim: arquitetura e espacialidade noemia Lucia Barradas fernandes

o palácio são Joaquim, localizado à rua da Glória, entre o centro e a Zona sul da cidade do rio de Janeiro, é um importante patrimônio da ci-dade, uma edificação residencial singular no contexto da arquitetura civil de inícios do século XX. o palácio foi construído entre 1912 e 1918, para ser residência do primeiro cardeal arcebispo do rio de Janeiro Dom Joaquim arcoverde cavalcanti, além de abrigar a sede do governo da arquidiocese do rio de Janeiro (em substituição à antiga residência no morro da con-ceição). o palácio são Joaquim é atualmente residência de sua eminência o cardeal dom orani João tempesta. Projetada pelo arquiteto Morales de Los Rios (1858-1928), em 1912, é uma das quatro únicas edificações rema-nescentes da numerosa “produção” desse arquiteto.

o edifício majestoso compõe a paisagem do largo da Glória, com sua fachada de gosto eclético, forte influência de elementos clássicos, com a justaposição de elementos arquitetônicos; seus interiores refletem ainda hoje a importância do decorativismo e da distribuição espacial e funcional dos cômodos para o uso efetivo da edificação de acordo com os padrões da época.

o presente trabalho pretende analisar a hierarquização do progra-ma distributivo dessa edificação, através das relações de espacialidade – dimensões, localização, ornamentação e nomenclaturas dos cômodos, procurando compreender as características específicas desse palácio que é uma habitação de cunho diferenciado em função de ser a habitação/resi-dência de religiosos até os dias atuais.

noemia Lucia Barradas fernandes | [email protected]

arquiteta urbanista (I.M. Bennett, 1994), mestre em ciências da arquitetura (Proarq/ufrJ, 2006), atualmente doutoranda (PPGau/uff). especialista em conservação e risco a Acervos em Edificações Protegidas (Iccrom, 2013) e em Conservação de Elementos Pétre-os (Project eu-charisma, 2012), e na investigação de materiais e elementos integrados à ar-quitetura. Desde 1995, desenvolve projetos, obras, acompanhamento técnico, fiscalização e consultorias em patrimônio histórico e cultural.

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A influência do gosto oitocentista na produção da arquitetura residencial em Ouro Preto, Minas GeraisPatrícia thomé Junqueira schettino, fernanda alves de Brito Bueno

este artigo faz parte de uma pesquisa em andamento que tem por objetivo identificar e catalogar as arquiteturas de gosto oitocentista que se encontram dentro do núcleo histórico tombado de ouro Preto, com o intuito de promover o (re)conhecimento e a valorização dessa produção arquitetônica. Visa produzir um corpo documental, composto por levan-tamento bibliográfico, iconográfico, produção de mapas temáticos, fichas cadastrais, catálogos de elementos construtivos, textos analíticos e críticos sobre a arquitetura produzida ou modificada durante o século XIX e início do século XX.

ao longo do século XIX, a cidade de ouro Preto, conhecida por seu conjunto arquitetônico e urbanístico do período colonial, passou por um processo de “modernização” das construções e, no final do século, parte da paisagem urbana foi remodelada ao gosto “eclético” na tentativa de se manter como capital do estado de Minas Gerais. esses exemplares se en-contram, muitas vezes, descaracterizados graças ao discurso de valoriza-ção da arquitetura colonial defendida pelos modernos, a partir de 1930.

o presente artigo pretende apresentar alguns exemplares catalogados durante a pesquisa de campo que podem ser considerados casas senho-riais, dentro do contexto ouropretano. a proposta visa analisar algumas arquiteturas residenciais da cidade histórica tendo como referência os pa-lacetes edificados na cidade do Rio de Janeiro entre o final do século XIX e início do XX, levantados durante a pesquisa documental realizada para elaboração da tese a mulher e a casa: estudo sobre a relação entre as trans-formações da arquitetura residencial e a evolução do papel feminino na sociedade carioca no final do século XIX e início do século. É preciso deixar claro que as arquiteturas produzidas na cidade histórica, ainda que tentem imitar o gosto eclético adotado pela escola de Belas artes, não apresentam as mesmas características dos exemplares das grandes cidades, como o rio de Janeiro. acredita-se que o ecletismo que se instaurou em ouro Preto possui peculiaridades e não possa ser tratado como um estilo que rompe

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por completo com a arquitetura tradicional, e menos ainda com seu traça-do urbano. trata-se de uma “modernização”, em sua maioria de “fachada”, onde se manteve a implantação e partido das construções, com raras exce-ções. alguns autores compreendem essa produção arquitetônica do século XIX nas cidades do interior com características diferentes da arquitetura produzida nas grandes cidades, denominando a primeira como ecletismo popular, vernacular ou de fachada.

o objetivo deste artigo é, a partir do entendimento de que a produção eclética do interior tem suas peculiaridades, analisar alguns exemplares da arquitetura residencial ouropretana do século XIX tendo como referência os palacetes cariocas desse período. As edificações residenciais seleciona-das terão suas plantas analisadas, assim como os elementos decorativos de fachada, visando compreender como a apropriação dessa linguagem e do repertório estético oitocentista se deu em ouro Preto. além disso, serão elaborados quadros sínteses com o intuito de apresentar, de forma resumida, os elementos decorativos de fachada, assim como os cômodos mais encontrados nas edificações levantadas e cadastradas pela pesquisa, estabelecendo, através de análises de plantas baixas e de fachadas, compa-rativos entre a arquitetura eclética produzida na capital e em ouro Preto.

Patrícia thomé Junqueira schettino | [email protected]

arquiteta e urbanista formada pela universidade federal de Juiz de fora, mestre em urba-nismo pelo Programa de Pós-Graduação em urbanismo da fau/ufrJ e doutora em arqui-tetura e urbanismo pelo PPGau/ea/ufMG. atualmente é professora efetiva do Dearq da escola de Minas, ufop.

fernanda alves de Brito Bueno | [email protected]

arquiteta e urbanista pelo centro universitário Metodista Izabela Hendrix. especialista em revitalização urbana e arquitetônica pela ea/ufMG. Possui MBa em Gestão empre-sarial pela fGV e é mestre em ciências da engenharia civil, pelo PPGec/DecIV/escola de Minas da ufop, doutoranda do PPGau/ea/ufMG. atualmente é professora efetiva do Dearq da escola de Minas, ufop.

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O reflexo da modernidade no programa distributivo do palacete Passarinho - Belém, Pará Pietra castro Paes Barreto, Marcia cristina ribeiro Gonçalves nunes

A influência europeia na nova forma de morar é perceptível na so-ciedade burguesa de Belém durante as primeiras décadas do século XX. Momento marcado pela transição entre o auge e a decadência da explo-ração do látex no decorrer do período que ficou denominado como Belle Époque, onde Belém foi considerada a Paris n’américa devido aos novos ideais de modernidade que pairavam na região. a sociedade estava sempre em busca de símbolos da reeuropeização, esta já havia começado no país com a chegada da corte portuguesa ao rio de Janeiro e o crescimento da arquitetura Neoclássica, contudo, no estado do Pará intensifica-se com o constante fluxo entre Belém e a Europa a partir de 1897 durante a inten-dência de antônio Lemos e o despontamento da arquitetura eclética na cidade.

Neste sentido, justifica-se a escolha do Palacete Aurélia Passarinho, localizado na atual av. Magalhães Barata, no bairro de são Brás, como ob-jeto de estudo, na investigação sobre as referências estéticas do ecletismo e suas relações com o modo de habitar vigente no período em questão, por meio do estudo tipológico e iconográfico analisando o complexo programa distributivo do Palacete e a relação deste com o papel que a família Passa-rinho empregava na cidade.

o sonho burguês de viver aos moldes burgueses europeus de moder-nidade é responsável pelo surgimento dos espaços de transformação entre o interior e o exterior, atuando como fronteira entre o público e o privado. É neste momento que os jardins ornamentais ganham destaque da edifica-ção tornando- se elementos de importância dentro do contexto de habitar e valorizando ainda mais a edificação e são repletos de elementos decora-tivos: no caso do Palacete Passarinho encontramos fontes, caramanchão e estátuas. todavia, é no interior e por meio das artes decorativas que o de-sejo de consumir a modernidade vai se instalar. cada ambiente é projetado objetivando atender as necessidades de seus proprietários e a utilização de elementos decorativos específicos para cada ambiente irá acentuar a espe-

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Pietra castro Paes Barreto | [email protected]

Graduanda do curso de arquitetura e urbanismo. Integrante da pesquisa “a casa senhorial: anatomia de interiores - Belém”.

Marcia cristina ribeiro Gonçalves nunes | [email protected]

Doutorado em História pela UFPA; Mestrado em Desenvolvimento e Meio Ambiente Ur-bano e Graduação em arquitetura e urbanismo pela unaMa. Professor adjunto da uni-versidade da amazônia – unaMa no curso de arquitetura e urbanismo. coordenadora do grupo de pesquisa casas senhoriais Belém em parceria com a fundação casa de rui Barbosa e a universidade nova de Lisboa.

cificidade do programa de necessidades. A setorização bastante definida e pontuada pela ausência de circulação linear é um dos principais traços da tipologia palaciana eclética. o casal aurélia e Benedito Passarinho eram filhos de imigrantes portugueses e optaram por formar as suas filhas no colégio feminino de Bouffémont nos arredores de Paris, por essas circuns-tâncias, é possível perceber a relação que a família estabelece com a europa e a influência desta no modo de habitar e nas escolhas projetuais adotadas pelo casal no Palacete, visto que em uma de suas viagens ao velho conti-nente, encomendaram um projeto para a construção do Palacete com as características dos Palácios urbanos e francesas e que será adaptado em Belém pelo arquiteto José sidrim. assim, o Palacete é composto por várias salas no setor social; vários quartos com funções diferenciadas e o setor de serviço e outros ambientes que serão analisados no seguinte artigo.

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III . a ornaMentaÇÃo fIXa: aZuLeJos, tetos, taLHas, PInturas, estuQues, têXteIs, PaVIMentos, CHAMINÉS/LAREIRAS, JANELAS, PORTAS, PÁRA-VENTOS E OUTROS BENS INTEGRADOS

III A ornamentação fixa: azulejos, tetos, talhas, pinturas, estuques, têxteis, pavimentos, chaminés/lareiras, janelas, portas, para-ventos e outros bens integrados

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III . a ornaMentaÇÃo fIXa: aZuLeJos, tetos, taLHas, PInturas, estuQues, têXteIs, PaVIMentos, CHAMINÉS/LAREIRAS, JANELAS, PORTAS, PÁRA-VENTOS E OUTROS BENS INTEGRADOS

Portas e para-ventos: bens integrados às casas senhoriais de Pelotas carlos alberto ávila santos

a comunicação proposta enfoca as portas e os para-ventos que dão acesso aos ambientes interiores dos casarões senhoriais edificados em Pe-lotas – no rio Grande do sul – vinculados à estética arquitetônica histori-cista do final do século XIX e início do XX. Esses artefatos são elementos funcionais e ornamentais integrados às caixas murais que, de maneira sun-tuosa, antecedem e prenunciam os requintes das decorações desenvolvi-das nas salas internas das construções da época.

as portas de entrada das residências analisadas alcançaram grandes dimensões, sobretudo na altura para o preenchimento dos vãos, determi-nada pelos altos porões empregados para a ventilação dos assoalhos dos pavimentos térreos, em uma localidade onde os invernos são frios e úmi-dos. Grande parte foi talhada em madeiras nobres, com duas folhas estru-turadas em superfícies reentrantes ou salientes – almofadadas. algumas receberam adornos escultóricos. Muitas foram enriquecidas com artefatos utilitários/decorativos fundidos em diferentes ligas metálicas: maçanetas, aldrabas e espelhos/caixas de correspondências.

os para-ventos são anteparos de madeira colocados atrás das portas principais das edificações, com o objetivo de impedir a passagem do vento. eram muito utilizados nas igrejas barrocas, para evitar que as velas que tremulavam nos altares dos templos fossem apagadas pelas correntes de ar. foram revivalizados nos palacetes ecléticos, com o intuito de minimi-zar o frio e a umidade dos aposentos que davam sequência aos vestíbulos. erguidos por meio de estruturas de madeira preenchidas por vidros colo-ridos ou trabalhados com ácido – contrastando superfícies transparentes e opacas –, enfeitados com frisos, guirlandas e monogramas.

na investigação realizada, denominamos de para-vento: uma segun-da porta que sucede a abertura principal das habitações de famílias não tão privilegiadas economicamente. Perfilados ao longo das ruas, os frontispí-cios desses prédios conjugam espaços cheios e vazados, dentre os quais se destaca a porta de entrada ao edifício, encimada por frontão e ladeada por

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III . a ornaMentaÇÃo fIXa: aZuLeJos, tetos, taLHas, PInturas, estuQues, têXteIs, PaVIMentos, CHAMINÉS/LAREIRAS, JANELAS, PORTAS, PÁRA-VENTOS E OUTROS BENS INTEGRADOS

carlos alberto ávila santos | [email protected]

Licenciado em artes, centro de artes/ufPel. especialista em arte e educação, ca/ufPel. especialista em cultura e arte Barroca, Instituto de artes e cultura/ufop. Mestre em His-tória, teoria e crítica da arte, Instituto de artes/ufrGs. Doutor em arquitetura e urbanis-mo – Área de Conservação e Restauro, Faculdade de Arquitetura e Urbanismo/Ufba.

pilastras com capitéis de gosto clássico. ela dá passagem para um vestíbulo com degraus – normalmente revestidos com placas de mármore – que le-vam a um patamar onde se encontra a segunda porta/para-vento de acesso à morada, com peculiaridades semelhantes às supracitadas.

Durante a comunicação prevista, apresentaremos exemplares desses bens integrados ao ecletismo historicista que caracterizou a arquitetura edificada em Pelotas, no período compreendido entre os anos de 1870 e 1931. Por um lado, são registros materiais agregados às vivendas senhoriais e revelam uma maneira idealizada do “bem habitar” – entre as datas cita-das – que privilegiou a decoração, externa e internamente. Por outro, são índices que ostentam o status econômico, social e as ideologias dos pro-prietários dos antigos casarões residenciais, que atualmente ascenderam à condição de patrimônio cultural da cidade.

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III . a ornaMentaÇÃo fIXa: aZuLeJos, tetos, taLHas, PInturas, estuQues, têXteIs, PaVIMentos, CHAMINÉS/LAREIRAS, JANELAS, PORTAS, PÁRA-VENTOS E OUTROS BENS INTEGRADOS

Os papéis de parede e a paisagem: Johan Moritz Rugendas como exemplo carlos Gonçalves terra

o papel de parede foi inventado na china, em 200 a.c. onde eram utilizados como um elemento decorativo e confeccionados de maneira ar-tesanal. Inicialmente aplicados de forma rudimentar, com processos di-ferenciados foram se tornando gradativamente um suporte de decoração importante. foi trazido ao ocidente pelos comerciantes árabes que haviam aprendido com os chineses como produzi-los. Inicialmente os temas eram da cultura chinesa, e depois os padrões da cultura ocidental começaram a ser incorporados e industrializados. na frança, Inglaterra, estados uni-dos, Itália e rússia, foram usados intensamente, com seu uso surgindo em diferentes séculos. Determinados ambientes tinham suas paredes revesti-das com papel, principalmente com cenas de paisagens, a fim de propor-cionar a sensação de ampliação do espaço. Para este trabalho, escolhemos os papéis de parede que utilizavam a paisagem como tema principal e que revestiram algumas casas e palácios. no Brasil, a importação se iniciou de forma lenta no início do século XX, tomando impulso na segunda metade desse século, trazido pelos imigrantes europeus.

Muitas residências usaram o papel de parede como decoração, algu-mas ainda mantêm resquícios dessas aplicações e em outras, por reformas sucessivas, se perderam. Poucas pesquisas brasileiras se dedicaram a estu-dar o papel de parede mostrando o uso, a técnica gráfica e a sua aplicação. alguns desses papéis foram confeccionados inspirados na obra de Johan Moritz rugendas – um artista alemão que desembarcou no rio de Janeiro em 1822, como desenhista da expedição científica do barão Georg Heinrich Von Langsdorff.

Como registro dessa viagem foi publicada uma coleção de litografias denominadas Viagem pitoresca através do Brasil, que ajudou a propagar a imagem do país no exterior com pranchas de paisagens, usos e costumes dos índios e dos negros. essas impressões e imagens serviram de base para alguns dos papéis de parede que foram manufaturados e adquiridos por diversos países. selecionamos dois exemplos que foram confeccionados

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III . a ornaMentaÇÃo fIXa: aZuLeJos, tetos, taLHas, PInturas, estuQues, têXteIs, PaVIMentos, CHAMINÉS/LAREIRAS, JANELAS, PORTAS, PÁRA-VENTOS E OUTROS BENS INTEGRADOS

carlos Gonçalves terra | [email protected]

Graduado em ciências econômicas pela ucPel (1986), mestre em artes Visuais/PPGaV/eBa/ufrJ (1993) e doutor em artes Visuais/PPGaV/eBa/ufrJ (2004). Professor associado da eBa/ufrJ, atuando como seu diretor. É avaliador institucional e de cursos superiores do Inep/Mec. tem experiência na área de artes, com ênfase em Paisagismo. Membro do cBHa, da aBca, da aica e do Icomos-Brasil. organizador da revista Leituras Paisagísticas: teoria e práxis (Issn 1809-0540).

inspirados na obra de rugendas – o palácio Itamaraty e uma casa no bairro da Glória, ambos na cidade do rio de Janeiro, rJ. tais papéis foram impor-tados no início do século XX, trazidos da manufatura Zuber, na frança, e apresentam como tema vistas panorâmicas de paisagens e ainda se man-têm intactos em seus locais de origem.

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III . a ornaMentaÇÃo fIXa: aZuLeJos, tetos, taLHas, PInturas, estuQues, têXteIs, PaVIMentos, CHAMINÉS/LAREIRAS, JANELAS, PORTAS, PÁRA-VENTOS E OUTROS BENS INTEGRADOS

Interiores a branco e dourado: o enobrecimento e as alusões aos temas clássicos da mitologia greco-romana no palacete Bolonha - Belém, Parácybelle salvador Miranda, ronaldo n. f. Marques de carvalho, Larissa silva Lea

a comunicação em tela trata-se de um estudo sobre as artes decora-tivas aplicadas ao palacete Bolonha, com destaque para os temas mito-lógicos aplicados em estuque. o palacete Bolonha (1905-1910) destaca-se como exemplar representativo para o estudo da “Belém dos ecletismos”, tanto por ser a residência idealizada e construída pelo engenheiro francis-co Bolonha, notório por sua participação na construção de diversos equi-pamentos urbanos da cidade durante os finais do século XIX e início do século XX, bem como por sua atuação na administração de tais empreen-dimentos.

O palacete começou a ser construído por volta de 1905 e fica loca-lizado na estrada de são Jerônimo, atual avenida Governador José Mal-cher, próximo à praça da república, bem ao centro da cidade. Bolonha nasceu em Belém no ano de 1872, estudou engenharia no rio de Janeiro de 1890 a 1894, morou um período na frança, depois Holanda e Inglaterra, onde se especializou em hidráulica. casou-se com a pianista carioca alice tem-Brick e voltou a morar em Belém, onde estabeleceu um escritório de engenharia, construiu uma fábrica de gelo, além de uma construtora e lo-cadora de quiosques. Vale ressaltar que francisco Bolonha foi responsável por obras significativas na capital paraense, como o palacete Bibi Costa e o prédio da folha do norte, entre outros.

no século XIX, os ambientes passaram a seguir repertórios ornamen-tais, por meio de catálogos que funcionavam como material de consulta para arquitetos e outros profissionais ligados às artes decorativas. Também, por meio de periódicos como a Illustração Portugueza, era possível aos paraenses a visualização dos interiores dos palácios e palacetes europeus, utilizando-se similares repertórios em seus ambientes particulares ou pú-blicos. o palacete, referido na mítica associada ao auge da Belle Époque paraense como uma “promessa de amor” feita pelo marido apaixonado

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III . a ornaMentaÇÃo fIXa: aZuLeJos, tetos, taLHas, PInturas, estuQues, têXteIs, PaVIMentos, CHAMINÉS/LAREIRAS, JANELAS, PORTAS, PÁRA-VENTOS E OUTROS BENS INTEGRADOS

à esposa, integra em seu programa ornamental elementos do repertório erudito do romantismo de inspiração clássica, associado à profusão de ele-mentos florais e fitomorfos que conferem um caráter íntimo e românti-co ao edifício. em seus cômodos internos, profusamente decorados com revestimentos importados, de alta qualidade, destacando-se os azulejos e mármores, define-se uma atmosfera de intimidade primordialmente a partir de um conjunto ornamental estucado. Por meio da análise dos te-mas simbólicos pertencentes ao classicismo da mitologia greco-romana, adotados nos ambientes sala de música, sala de jantar, Quarto de vestir da senhora e Biblioteca, pode-se construir uma narrativa que nos conduza ao entendimento das aptidões e inclinações de seu idealizador, integrado na dinâmica do fin de siècle belemense.

ademais, este artigo soma-se ao estudo do emprego da técnica da es-tucagem em Belém, a qual mostrou-se relevante para a configuração de interiores requintados, a qual permite inserir elementos simbólicos re-presentativos institucionais, como nos interiores do hospital Beneficente Portuguesa do Pará, ou nos salões nobres do palácio da Intendência (hoje palácio antonio Lemos).

cybelle salvador Miranda | [email protected]

arquiteta e urbanista e doutora em antropologia pela universidade federal do Pará, com pós-doutoramento em História da arte pela universidade de Lisboa. coordena o Labora-tório de Memória e Patrimônio cultural (Lamemo), da universidade federal do Pará e é docente da faculdade de arquitetura e urbanismo e do Programa de Pós-Graduação em arquitetura e urbanismo (PPGau).

ronaldo n. f. Marques de carvalho | [email protected]

arquiteto e urbanista pela universidade federal do Pará e doutor em engenharia de recur-sos naturais da amazônia pela mesma universidade, com pós-doutoramento em História da arte pela universidade de Lisboa. Docente da faculdade de arquitetura e urbanismo (fau) e investigador do Laboratório de Memória e Patrimônio cultural (Lamemo), da uni-versidade federal do Pará, integra os grupos de pesquisa saúde e cidade: arquitetura, ur-banismo e Patrimônio cultural e rede amazônia Luso-Brasileira de Pesquisa.

Larissa silva Lea | [email protected]

Discente do curso de arquitetura e urbanismo da universidade federal do Pará, é bolsista de iniciação científica junto ao Lamemo/FAU/Ufpa, participando da pesquisa Belém dos ecletismos: arquitetura na cultura da Metrópole amazônica.

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Janelas e portas da residência e administração dos governadores do Grão-Pará: o movimento das imagens elna Maria andersen trindade, Mateus carvalho nunes

Investiga-se neste trabalho, a partir de uma perspectiva trans-histó-rica, como o arquiteto bolonhês antônio José Landi (1713-1791), manejou modelos de matrizes italianas de diferentes temporalidades e tradições nos seus desenhos para os três projetos para a residência e administração dos governadores do Grão-Pará, entre 1759 e 1767, aproximando a leitura dos testemunhos imagéticos e uma história social da arquitetura. as fontes principais desta pesquisa são a coletânea de 22 desenhos executados por Landi para três projetos elaborados para a edificação, também conhecida como Palácio dos Governadores, em comparação com desenhos e gravuras do arquiteto executados em todas as suas fases, desde estudos realizados na Academia Clementina até seus exercícios profissionais na Itália, Portu-gal e Brasil.

através da produção de seus desenhos, constata-se que Landi se pre-ocupou em constituir um repertório erudito, fundamentado no estudo dos mestres clássicos, tratadistas e arquitetos canônicos. nesse processo de formação de repertório, o arquiteto bolonhês desenhou fachadas, portas e janelas de diversos prédios de grande importância para o estudo arquite-tônico, analisando e relacionando-se com diversos valores da arquitetura, concebendo as imagens como instrumento de compreensão e domínio do pensamento.

Busca-se aqui analisar o vigor, a potência e a eficácia do movimento das imagens produzidas por Landi como campo da memória, a partir de um processo não linear, acolhendo as descontinuidades e os anacronismos do movimento das imagens. nessa operação de armazenamento, manu-tenção, transmissão e transformação entre o visto, o lido, o estudado e o executado está a base teórica, metodológica e operacional que se procura seguir na abordagem do presente estudo, em diálogo com obras que, em grande medida, estabelecem interlocução com o método proposto por aby Warburg (1866-1929) na interpretação e leitura das imagens. com isto,

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elna Maria andersen trindade | [email protected]

Professora da fau-ufpa e doutora em História social da amazônia no curso de História pela ufpa. Mestre em artes Visuais da eBa/ufrJ. Membro fundadora do fórum Landi, no qual coordenou o curso de pós-graduação em Interpretação, conservação e revitalização do Patrimônio artístico de antônio José Landi (2006- 2008). atualmente participa das atividades do fórum Landi – ufpa. Integrante da pesquisa a casa senhorial: anatomia de Interiores – Belém.

Mateus carvalho nunes | [email protected]

Discente do curso de graduação da faculdade de arquitetura e urbanismo da universidade Federal do Pará (FAU-Ufpa). Bolsista de iniciação científica do Conselho Nacional de De-senvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq) no Laboratório Cidades na Amazônia (LaBcaM-fau-ufpa) e membro do fórum Landi – ufpa.

procura-se compreender a dimensão simbólica contida nessas operações de armazenagem, transmissão, transformação e manutenção de modelos obtidos no repertório do arquiteto, através das imagens executadas (do re-desenho,) por Landi, das janelas e portas de autoria de arquitetos canôni-cos, como Bibiena, Borromini, rafael e Michelangelo, e metamorfoseadas nos projetos para a residência e administração dos governadores. tal ope-ração imagética perpetua-se no conceito de “engrama”, também proposto por Warburg, que compreende a forma da memória social e coletiva, ou seja, como o traço de Landi permanece vivo na memória coletiva e imagé-tica de Belém do Pará.

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Estudo da azulejaria do edifício Paris n’América - Belém, ParáMarcia cristina ribeiro Gonçalves nunes

a utilização de azulejo na arquitetura brasileira iniciou-se como re-vestimento de barras decorativas e posteriormente em fachadas inteiras. este processo foi uma herança trazida de Portugal no início da colonização no Brasil, onde a utilização desse tipo de revestimento demonstra a influ-ência lusitana nos nossos costumes e na nossa arquitetura. o gosto pelo azulejo acaba determinando uma característica na arquitetura imperial, tornando-se um elemento essencial não só no exterior como no interior das casas e igrejas. o princípio do século XX, com seus hábitos franceses, vai introduzir não apenas a sofisticação nos banheiros, mas nos próprios produtos de higiene. nesse período, nas residências das famílias mais abastadas, em muitos casos apareciam recursos de conforto como nas ha-bitações europeias e seu tratamento formal era rebuscado, em voga nesse período, atendendo com rigor os padrões acadêmicos europeus. na sala de almoço, cozinhas e banheiros começavam a ser aplicados o revestimento de azulejos, em geral com barras decorativas.

a maioria dos azulejos antigos de Belém data do século XIX e início do século XX. Eles estão em fachadas de edificações que se encontram no centro da cidade e no seu entorno. foi no período econômico mais próspe-ro da região, denominado de Belle Époque, final do século XIX, que ocor-reu um aumento da importação de azulejos vindos da europa e houve uma maior diversidade dos exemplares existentes hoje na cidade. a loja Paris n’américa, localizada no centro de Belém, e que outrora foi casa de moda francesa, era também residência do comerciante português francisco Pe-reira da silva castro. esse comerciante, inspirado nas Galerias Lafayettes, manda construir seu palacete de dupla função: loja de tecidos e armari-nhos nos dois primeiros andares e residência nos terceiro e quarto andares. o projeto desse palacete foi importado de Paris, obra iniciada em 1906 e inaugurada em 1909, em que apenas as madeiras foram da amazônia – os pisos e esquadrias eram em ipê e pau amarelo. os demais materiais e equipamentos foram importados: revestimento externo em cantaria por-

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tuguesa (lioz), os lustres, espelhos e vidrarias, são todos de origem fran-cesa. ferragens, louças inglesas e azulejos de diversas origens. será sobre a azulejaria nos ambientes internos da residência de francisco de castro que iremos analisar essa arte decorativa. as toilettes são verdadeiras obras artísticas de ferragens rebuscadas, louças finíssimas, espelhos de cristal importados, grandes bancadas em pedras nobres, requintado acabamento em ladrilhos hidráulicos nos pisos e azulejos, também importados, ora até a metade das paredes, ora em paredes inteiras. a cozinha e sala de almoço também eram espaços adornados com esses azulejos até metade das pare-des e ladrilhos hidráulicos nos pisos.

o ecletismo será o símbolo da modernidade, a representação arquite-tônica das mudanças de comportamento trazidas pela riqueza do ciclo da borracha, em que a construção se beneficiava de novas técnicas e materiais, adotando novas maneiras de implantação e organizando-se de maneira di-ferenciada no interior dos novos ambientes do edifício Paris n’américa.

Marcia cristina ribeiro Gonçalves nunes | [email protected]

Doutorado em História pela Ufpa; mestrado em Desenvolvimento e Meio Ambiente Urba-no e Graduação em arquitetura e urbanismo pela unama. Professor adjunto da universi-dade da amazônia (unama) no curso de arquitetura e urbanismo. coordenadora do grupo de pesquisa casas senhoriais Belém em parceria com a fundação casa de rui Barbosa e a universidade nova de Lisboa.

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A pintura decorativa do palácio do Raio em Braga Miguel nuno santos Montez Leal

situado no centro da multissecular cidade de Braga, muito próximo da sé catedral, o palácio do raio, assim denominado desde meados do século XIX, foi construído entre 1752 e 1755 a partir do desenho rigoroso do arquiteto andré soares (Braga, 1720-1769) e constitui, ainda hoje em dia, um testemunho de uma das obras mais importantes da arquitetura civil barroca. o palácio deve-se a uma encomenda inicial de João Duar-te faria, um rico comerciante de Braga. em 1853, seria vendido por José Maria Duarte Peixoto a Miguel José raio (Braga, 1814-1875), visconde de são Lázaro (título concedido pelo rei d. Luís I por decreto de 3-12-1870), grande negociante que fizera fortuna no Brasil, comendador da Ordem de Cristo e de Nossa Senhora da Conceição de Vila Viçosa. O palácio ficou desde então a ser conhecido como Palácio do raio ou casa do Mexicano. no período do visconde de são Lázaro, mais concretamente na década de 70 do século XIX, decorre uma campanha decorativa que vem enriquecer o conjunto palaciano.

a pista que nos conduz a esta leitura e interpretação deve-se a João Manuel esteves Pereira (1873-1944), escritor e historiador que no seu Por-tugal, Dicionário Histórico, Corográfico, Heráldico, Bibliográfico, Numis-mático e Artístico Ilustrado refere a autoria das pinturas decorativas desse edifício. Podemos assim indubitavelmente identificar o autor dessas pin-turas como sendo Pereira Cão (Setúbal, 1841; Lisboa, 1921), e não como algumas vezes vem citado em relação a esse palácio, “atribuídas a Pereira cão”. Passamos a citar a passagem em que essa autoria vem claramente enunciada: “em seguida áquelle triumpho artistico, cinatti, que durante mais de 18 anos acompanhara com o sincero entusiasmo da sua grande alma d ‘artista, os progressos sempre crescentes do discípulo querido, in-dicou o ao Visconde de s. Lázaro, de Braga, para ir ali decorar o seu sump-tuoso Palácio. Por este tempo a pintura decorativa não estava vulgarizada no Norte do país; ao contrário nas residências opulentas abundavam os estuques. Porém, as decorações do Palácio de s. Lázaro despertaram nos proprietários mais ilustrados e nos capitalistas de bom gosto d’aquella re-gião o desejo de ornamentar e enriquecer as salas das suas casas com pin-

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turas artísticas” (p. 635).na comunicação, iremos apresentar essa encomenda, estudar a sua

pintura decorativa e os exemplos de pintura de paisagem, de pintura herál-dica, de ornatos e trompe l’oeil da autoria do pintor Pereira cão presentes nesse edifício, assim como avaliar o impacto que esta teve na época na cidade de Braga. Discípulo de cinatti e rambois, formado na academia nacional de Belas artes, é autor de uma obra muito vasta no âmbito da pintura decorativa (a fresco e têmpera), enquanto decorador, cenógrafo e pintor de azulejos. através deste pequeno ensaio poderemos entender a sociologia da época, revisitar a segunda metade do século XIX em Portu-gal, tempo pródigo em pintura decorativa, e resgatar a obra de um autor que merece não cair no esquecimento. conhecer o palácio de são Lázaro é viajar no tempo e estudar algumas das páginas esquecidas da história local e da arte em Portugal.

Miguel nuno santos Montez Leal | [email protected]

Investigador integrado do IHa da fcsH da universidade nova de Lisboa. Doutor e mestre em História da arte contemporânea (unL) e licenciado em História (unL). tem parti-cipado em colóquios de História e História de Arte e publicado em eventos científicos. Pertence ao Instituto Português de Heráldica.

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As artes pictóricas das casas senhoriais das estâncias: Serro Formoso, Vista Alegre e Santa Ernestina, do século XIX e início do XX - Lavras do Sul, Rio Grande do SulMônica de Macedo Praz

este trabalho dará continuidade ao tema que foi apresentado no IV colóquio, sob o título “a estância do serro formoso. Lavras do sul, rs”, que tratou desse exemplar da arquitetura rural eclética rio-grandense. a propriedade foi fundada por volta do ano de 1830, pelo coronel francisco Pereira de Macedo, tendo a casa senhorial construída, provavelmente, em 1854. nela hospedou-se o imperador d. Pedro II, quando esteve no sul do Brasil por ocasião da Guerra do Paraguai. na oportunidade, o monarca foi recepcionado ao som do Hino nacional executado por uma banda de escravos, e rebatizou a propriedade que se chamava fazenda são francisco das chagas com o nome de estância do serro formoso. Mais tarde, em 1885, foi concedido ao, então barão, francisco Pereira de Macedo o título de “Visconde do serro formoso”, devido à sua contribuição para com o Bra-sil na Guerra do Paraguai. o trabalho apresentou a casa senhorial do serro formoso destacando suas pinturas murais feitas com o uso de estêncil, pinturas de forro feitas à mão e escaiolas.

Para o V colóquio serão acrescentadas as artes pictóricas de mais duas propriedades rurais: a estância Vista alegre, fundada em 1888, pelo coro-nel Antônio Leal de Macedo, um dos filhos do visconde, que lutou pelo Brasil na Guerra do Paraguai; e a Estância Santa Ernestina, fundada em 1910 por João cândido Leal de Macedo, neto do visconde do serro formo-so. todas se encontram na região da campanha, próxima a Pelotas e Mon-tevidéu, capital uruguaia. essa localização, provavelmente, foi responsável pelos três exemplares destacarem-se na arquitetura rural rio-grandense, apresentando, de forma expressiva, preocupação com as artes integra-das, enquanto que a maioria das estâncias do rio Grande do sul recebeu um tratamento mais rústico, ainda que tendo por fundadores, senhores de posses e cabedais. através das três gerações, com casas construídas em momentos distintos da história, têm-se exemplares de pinturas murais e

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escaiolas preservados, com características semelhantes entre si, mas que diferem das pinturas encontradas em centros urbanos como Pelotas, es-pecialmente no que se refere aos acabamentos. essas variações remetem a diferentes interpretações de seus artífices. O que leva a crer que os imi-grantes italianos que adornaram o casario pelotense tiveram formação dis-tinta dos que executaram as pinturas na região da campanha, sobretudo no serro formoso, onde provavelmente, também os escravos exerceram tal ofício. as pinturas murais evidenciam o uso de estêncil, efeitos trompe l’oeil, desenhos em estilo art nouveau. na estância Vista alegre está pre-servada a pintura feita com tecido retorcido embebido em tinta, imitando revestimento forrado. O uso da técnica não era comum entre as edificações rurais. os três exemplares, através de suas artes pictóricas, revelam dados importantes da arquitetura rural rio-grandense a partir do século XIX.

Mônica de Macedo Praz | [email protected]

Brasileira, natural de Pelotas, rs. Possui graduação em arquitetura e urbanismo, pela uni-versidade federal de Pelotas. cursa, em regime especial, mestrado em Memória social e Patrimônio cultural. Participou do IV colóquio Internacional casa senhorial com a comu-nicação “a estância do serro formoso – Lavras do sul. rs”.

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O palacete Babilônia e suas superfícies de composição interior noemia Lucia Barradas fernandes, edilene cassia capanema

no presente trabalho, propomo-nos olhar com especial atenção as qualidades artísticas e arquitetônicas, especialmente os tetos e paredes do palacete Babilônia. A edificação é um exemplar de arquitetura neoclássica, e segue o padrão de edificações residenciais de seu período, tendo em sua composição elementos típicos da linguagem arquitetônica da época – pro-porção, simetria –, escadas externas de acesso ao pavimento nobre e porão alto, dois pavimentos superiores. em suas fachadas, encontramos elemen-tos da linguagem clássica, como frontões, cimalhas, platibandas, e em suas áreas internas uma espacialidade bem definida em termos distributivos, bem como, um “decorativismo interno” bastante peculiar, com forros estu-cados, pinturas parietais lisas e com relevos, fingidos, trompe-l’oeil, cenas com alegorias e de caça.

o palacete Babilônia localiza-se no bairro da tijuca, na rua são fran-cisco Xavier, e faz parte do conjunto de edificações que compõe o Colégio Militar do Rio de Janeiro. A edificação foi construída na década de 1860, para ser casa de campo de um rico comerciante, dr. silva Pinto. com o falecimento do dr. silva Pinto, a chácara Pedra da Babilônia foi adquirida através de leilão (1867) pelo comendador Jeronimo José de Mesquita (fu-turo barão de Mesquita), que permaneceu como proprietário até 1887. no ano de 1889, a chácara foi vendida para a fazenda nacional, e nesse mesmo ano o colégio Militar passou a funcionar nesse local.

Infelizmente, a edificação possui uma serie de descaracterizações, bem como processos de deterioração que não estão estanques. os tetos e as paredes sofreram ao longo do tempo diferentes processos que fizeram perder um pouco de sua autenticidade, bem como contribuíram para um processo de degradação das superfícies originais. alguns ambientes pre-servam características originais, o que nos permite uma leitura acertada do que fora a composição piso, parede e teto originais.

Nesse contexto, pretendemos identificar características e entender a ambientação dos cômodos que o compõem, para um melhor conhecimen-

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noemia Lucia Barradas fernandes | [email protected]

arquiteta urbanista (I.M. Bennett, 1994), mestre em ciências da arquitetura (Proarq/ufrJ, 2006), atualmente doutoranda (PPGau/uff). especialista em conservação e risco a Acervos em Edificações Protegidas (Iccrom, 2013) e em Conservação de Elementos Pétre-os (Project eu-charisma, 2012), e na investigação de materiais e elementos integrados à ar-quitetura. Desde 1995, desenvolve projetos, obras, acompanhamento técnico, fiscalização e consultorias em patrimônio histórico e cultural.

edilene cassia capanema | [email protected]

Bacharel em escultura em 2006 pela universidade federal do rio de Janeiro (ufrJ), escola de Belas artes, com MBa em Gerenciamento de projetos fundação Getúlio Vargas (fGV). Possui vasto currículo nas obras mais relevantes de restauração de patrimônio artístico e arquitetônico na cidade do rio de Janeiro, tendo como destaque: as obras do theatro Mu-nicipal do rio de Janeiro, mosteiro são Bento, centro cultural do tse, teatro riachuelo (antigo cine Palácio), pintura das torres da grande sala da cidade das artes orientadas pelo arquiteto christian Portzamparc, projeto de restauração do mobiliário de época do palácio Gustavo capanema (Iphan).

to da conjuntura cultural, da estética da época, e dessa forma nosso estudo contribuir para sistematizar dados que permitam a “recomposição da or-namentação” interna dessa casa senhorial.

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IV. O EQUIPAMENTO MÓVEL NAS SUAS FUNÇÕES ESPECÍFICAS E SUAS RELAÇÕES COM O ESPAÇO; O CONJUNTO E AS CIRCULAÇÕES DAS PEÇAS; A ATMOSFERA DO LUGAR

IV O equipamento móvel nas suas funções específicas e suas relações com o espaço; o conjunto e as circulações das peças; a atmosfera do lugar

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IV. O EQUIPAMENTO MÓVEL NAS SUAS FUNÇÕES ESPECÍFICAS E SUAS RELAÇÕES COM O ESPAÇO; O CONJUNTO E AS CIRCULAÇÕES DAS PEÇAS; A ATMOSFERA DO LUGAR

A difusão de instrumentos musicais nos interiores domésticos da fidalguia lisboeta nos finais do Antigo Regime andreia Durães

o presente estudo versa sobre instrumentos musicais, uma categoria de objetos cuja função, características materiais e plásticas nos remetem para o consumo de objetos artísticos. É que além de os instrumentos musi-cais serem por inerência um suporte através do qual a música é executada, eles são um produto da arte da manufatura, produzidos por artífices es-pecializados que, além das particularidades sonoras, se preocupam com a estrutura que protege a mecânica, muitas vezes decorada e transformada sob os domínios da pintura e escultura, tornando-os objetos decorativos e, como tal, apreciados pelo seu valor ornamental. a própria práxis de os artífices marcarem a sua obra através de inscrições com o seu nome, data, local de construção e número, acentua, em certo sentido, o caráter artísti-co e único dos instrumentos musicais.

Partindo de uma amostra de 375 inventários orfanológicos realizados em Lisboa entre 1755 e 1836 que cobrem um amplo espectro social, con-cluímos que os agregados proprietários de instrumentos musicais se des-tacavam pela riqueza e, muitas vezes, pelo fato de a sua ocupação ter um caráter diferenciado, associado na tratadística à difusa noção de nobreza civil, sendo notório que os fidalgos e altos dignitários assumem a dianteira no consumo desse tipo de bens.

Que instrumentos foram encontrados nos interiores domésticos dos fidalgos e altos dignitários? Quais os que parecem gozar de maior popula-ridade? Quais as suas características físicas? são as principais questões a que pretendemos dar resposta ao longo do presente trabalho.

andreia Durães | [email protected]

Licenciatura em História na universidade do Minho. atualmente a concluir doutoramento em História da Idade Moderna na universidade do Minho com o projeto “casas de cidade: processo de privatização e consumos de luxo nas camadas intermédias urbanas (Lisboa na segunda metade do século XVIII e início do século XIX)”.

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IV. O EQUIPAMENTO MÓVEL NAS SUAS FUNÇÕES ESPECÍFICAS E SUAS RELAÇÕES COM O ESPAÇO; O CONJUNTO E AS CIRCULAÇÕES DAS PEÇAS; A ATMOSFERA DO LUGAR

A evolução do candeeiro no século XIX, tipologias e usos antónio francisco arruda de Melo cota fevereiro

No final do século XVIII, realizaram-se várias experiências em tor-no da iluminação a óleo vegetal na europa. essas experiências resultaram no aperfeiçoamento de queimadores, de reservatórios e de chaminés. a luminosidade alcançada é superior à das velas e de outras fontes de ilumi-nação então disponíveis. o sucesso dessas experiências levou ao desenvol-vimento de vários tipos de candeeiros. todos são para óleo vegetal, foram fabricados com o recurso a vários materiais e têm sistemas sofisticados para a condução do óleo. todavia, a grande maioria era acessível às classes sociais mais favorecidas. no ano de 1836, é desenvolvido o candeeiro do tipo modérateur, ou moderador como é designado em Portugal, pelo enge-nheiro francês charles-Louis-félix franchot. essa foi a resposta para que o candeeiro se tornasse acessível a outras classes sociais, particularmente a ascendente classe média com poder de compra. nesse período, são desen-volvidos candeeiros para um determinado uso. nomeadamente para ler, para secretária, para peças de mobiliário, para parede, para candelabros e para teto. De acordo com essas funções específicas, cada exemplar tem uma decoração, a qual tem uma escala e motivos para ser vista de deter-minado ponto. também os quebra-luzes em vidro foram aperfeiçoados. a forma e as decorações têm como finalidade controlar a luz. Desse modo, a luminosidade é realçada ou quebrada consoante o efeito pretendido em determinado espaço. a decoração dos espaços era assim realçada confor-me o efeito decorativo, a escala e as estilizações de cada candeeiro.

todavia, a iluminação a óleo vegetal tem os seus inconvenientes. a viscosidade dos óleos torna-se difícil na alimentação à chama. o uso não frequente dos candeeiros leva ao bloqueio dos mecanismos e a sua repa-ração era feita por pessoas especializadas. nos meados do século XIX, são desenvolvidas as primeiras experiências em torno da iluminação a petró-leo nos estados unidos da américa e na europa. a viscosidade é considera-velmente melhor que a do óleo vegetal e é de fácil manutenção. esse foi um passo decisivo para a democratização da iluminação em todos os lares. as tipologias anteriores mantiveram-se, mas com diferenças. o reservatório

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IV. O EQUIPAMENTO MÓVEL NAS SUAS FUNÇÕES ESPECÍFICAS E SUAS RELAÇÕES COM O ESPAÇO; O CONJUNTO E AS CIRCULAÇÕES DAS PEÇAS; A ATMOSFERA DO LUGAR

antónio francisco arruda de Melo cota fevereiro | [email protected]

natural de Lisboa e mestre em arquitetura pela universidade Lusíada, onde defendeu a tese álvaro augusto Machado, José antónio Jorge Pinto e o movimento arte nova em Por-tugal. Tem vindo a dedicar-se ao estudo da arquitetura, ao levantamento de biografias de várias individualidades, à decoração de interiores, à azulejaria e aos candeeiros do século XIX e início do XX. nesses estudos, tem vindo a levantar documentação inédita, a qual tem sido divulgada em colóquios e publicada em vários artigos. atualmente encontra-se a co-ordenar a restruturação e redistribuição dos candeeiros nos interiores do Palácio nacional da Pena em sintra.

é próximo ao queimador, devido à viscosidade, e novos tipos de candeeiros foram desenvolvidos aproveitando essa vantagem. são candeeiros usados nos pianos, incorporados em colunas e de pequena dimensão. No final do século XIX, aparecem no mercado quebra-luzes em tecidos. estes eram feitos com seda, com rendas e com outras fibras. O tom velado e colorido realça o ambiente, tornando-o acolhedor e vistoso.

o desenvolvimento da iluminação no século XIX foi determinante no desenho arquitetônico dos espaços interiores. Pela primeira vez, houve fontes de iluminação estáveis e de luminosidade superior.

Dessa forma, a vivência, os hábitos e a decoração interior alteraram-se.

esses ambientes estão preservados nos antigos paços reais portugue-ses, que detêm uma das mais significativas coleções de candeeiros. Neste estudo, partiremos das diferentes tipologias e os espaços para onde foram inicialmente previstos. além das residências reais, focaremos outras ha-bitações e exemplares em coleções particulares, de forma a compreender-mos a evolução do candeeiro durante o século XIX.

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Higiene, saúde e beleza: mobiliário, objetos e interiores decorativos. Modernidades das casas das elites lisboetas nos finais do Antigo Regimecarlos franco

nos interiores das casas das elites lisboetas, ao longo da segunda me-tade do século XVIII e primeiro quartel do século XIX, ocorreram alterações significativas. Uma sociabilidade crescente, rupturas políticas geradoras de novos grupos e de outras identidades sociais, as ideias protagonizadas pelos estrangeiros que se instalaram na capital do reino, o aumento signi-ficativo de eventos sociais, entre outras, geraram novas sociabilidades, ou-tros confortos, e divulgaram práticas de higiene e de saúde que não eram comuns. assistimos, nesse contexto, à emergência de outros valores que exi-girão mudanças na organização do espaço residencial e tornarão impres-cindível a procura de bens móveis capazes de responder às emergentes ne-cessidades de um grupo que tem expectativas acerca dos novos ideais de higiene, saúde e beleza. nesta comunicação, partindo do estudo do mobiliário e de outros objetos que terão existido nas casas das elites lisboetas na segunda meta-de de setecentos e primeiro quartel do século XIX, propomo-nos elencar algumas transformações arquitetônicas ocorridas naquelas residências, a par da aquisição de bens móveis que serviram para responder aos novos desafios que se auguram. Pretendemos que esta análise de patrimônios de diferentes matrizes se cruze com o novo ciclo de sociabilidade, as novas práticas médicas e preocupações higienistas, outros sinais de beleza e a importância crescen-te do papel da mulher, que caracterizaram esse período.

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IV. O EQUIPAMENTO MÓVEL NAS SUAS FUNÇÕES ESPECÍFICAS E SUAS RELAÇÕES COM O ESPAÇO; O CONJUNTO E AS CIRCULAÇÕES DAS PEÇAS; A ATMOSFERA DO LUGAR

carlos franco | [email protected]

Licenciado em História pela faculdade de Letras da universidade de Lisboa, mestre em artes Decorativas e doutorado em estudos do Patrimônio pela escola de artes da uni-versidade católica Portuguesa. É investigador do citar – ea. tem participado em cursos, conferências e ações de formação relacionadas com o estudo dos interiores decorativos e as vivências domésticas nos séculos XVIII e XIX. escreveu diversos artigos e livros acerca dessa temática.

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Redes de dormir e suas múltiplas funções: de equipamento para descanso a meio de transportefrancine soares Bezerra

A rede de dormir figurou como um importante equipamento móvel dos primeiros séculos da américa portuguesa, período em que as dinâmi-cas domésticas ainda transitavam entre a mobilidade e a fixação. Assim como os ambientes internos das casas coloniais, que comumente acumula-vam mais de uma atividade, as redes de algodão também assumiam múlti-plas funções, acomodando os corpos nos mais variados usos, ora leito para descanso e acolhimento de enfermos, ora meio de transporte de membros da elite e de cortejos fúnebres.

nessa perspectiva, a presente comunicação tratará de um recorte de nossa pesquisa de mestrado que, dentro do escopo da cultura material, e tendo como aporte os estudos realizados por Luis da câmara cascudo e sérgio Buarque de Holanda, tem em vista compreender como tal leito de algodão colaborou na construção de alguns costumes relacionados ao descanso, repouso e transporte na colônia. Importa ressaltar que, à épo-ca, tais costumes apresentavam-se bastante diversos dos modos europeus, tendo as redes substituído os leitos de madeira nos interiores ou no pouso em viagem, também servindo como uma espécie de liteira de algodão no trânsito pelas ruas das cidades, fato comumente percebido no recorte que compreende a capitania de são Vicente (1534 – 1709), posteriormente ca-pitania de são Paulo (1720 – 1821), e seus caminhos comerciais para o inte-rior do continente, do século XVII até meados do século XIX, período em que podemos observar, inclusive, tanto as modificações estéticas e formais quanto as ressignificações sofridas pelo objeto.

francine soares Bezerra | [email protected]

Mestranda no Programa de Pós-Graduação em História da arte da universidade federal de são Paulo (unifesp). Possui pós-graduação lato sensu em Metodologia do ensino de artes pelo centro universitário de Maringá (2015) e graduação em superior de tecnologia em Design de Interiores pela universidade do oeste Paulista (2011).

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Programas decorativos dos interiores domésticos portuenses na segunda metade do Oitocentos Gonçalo de Vasconcelos e sousa

ao longo da segunda metade de oitocentos, diversas personagens portuenses investiram no enriquecimento dos interiores domésticos das casas onde viviam, seja através da aquisição de diversos materiais para a ornamentação dos espaços, seja mediante a importação de objetos móveis para decorarem as suas residências.

a matriz francesa revelava-se um referencial, em contraposição com a influência inglesa, visível nas casas de alguns britânicos da “Cidade Invic-ta”. agentes estrangeiros aproveitavam a presença de grossos cabedais na urbe para a promoção desses elementos decorativos e objetos, tendo sido diversas as famílias e indivíduos que se deixaram seduzir pela atração dos luxos provenientes da “cidade das Luzes”.

um negócio de objetos decorativos cada vez mais desenvolvido pode ser identificado através da análise dos estabelecimentos comerciais da ci-dade do Porto, que deixaram rastos em diversos arquivos particulares, ain-da na posse das famílias ou, então, entretanto dispersos. existem faturas de peças adquiridas em lojas de louças e vidros, em ourivesarias, de diver-sas soluções decorativas mandadas executar em casas de estofos, repos-teiros ou de decoração de interiores, que já existiam na época, e que ilus-tram os seus documentos gráficos com desenhos de encomendas passíveis de realizar. Louças, relógios, instrumentos musicais, prataria ou móveis, conjuntamente com a relevância dos têxteis, que continuava efetiva nes-se período, compunham os principais róis das aquisições de bens móveis, materializando os gostos mais ou menos apurados das elites mais antigas ou de mais fresca data da cidade.

nesta comunicação, serão analisados alguns casos portuenses que en-volvem pesquisas realizadas em diversos núcleos documentais, que nos permitirão não somente demonstrar a relevância de determinados tipos de informações extraídas de arquivos particulares, como a necessária com-plementaridade com elementos procedentes de acervos públicos. notícias manuscritas associam-se a outras impressas, designadamente dos alma-

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Gonçalo de Vasconcelos e sousa | [email protected]

Professor catedrático da Escola das Artes da Universidade Católica Portuguesa; investiga-dor permanente do citar (ea-ucP).

naques ou de jornais coevos, para além das fontes iconográficas, com vista a fornecer uma perspectiva do que seriam os interiores de determinadas residências no Porto oitocentista.

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A iluminação em ambientes românticos: estudo da coleção de luminária do Palácio Nacional da Ajuda Maria João Botelho Moniz Burnay

Pouco depois da unificação da Itália em 1861, a princesa Maria Pia da Sabóia (1847-1911), filha do rei Victor Emmanuel II da Itália (1820-1878) e adelaide da áustria (1822-1855) casou-se com o rei Luís I de Portugal (1838 -1889) e mudou-se para sua nova residência, em 1862 – o Palácio nacional da ajuda – propriedade da família real até 1910, ano da proclamação da república.

com a chegada do novo casal, o palácio ganhou outro esplendor. Jo-aquim Possidónio da silva (1806-1896), discípulo dos arquitetos franceses Percier e fontaine, foi o arquiteto responsável pelas remodelações reali-zadas. seguindo padrões burgueses modernos, em que o conforto e a hi-giene eram vitais e tendo em conta as regras de protocolo diário da corte portuguesa oitocentista, projetou uma nova distribuição das salas e criou divisões como o jardim de inverno, as salas de saxe e chinesa, casas de ba-nhos com água canalizada fria e quente e também nova iluminação. a par da renovação dos interiores, alguns bailes e outras cerimônias ocorreram e a ajuda tornou-se centro da corte portuguesa.

após a proclamação da república em 1910 e o seu encerramento, rea-briu ao público em 1968 como museu, reunindo importantes coleções de artes decorativas datadas entre os séculos XV e XX. o universo de 66.000 peças inclui a ourivesaria e joalharia, os têxteis, mobiliário, cerâmica, pin-tura, escultura, fotografia, o vidro e, finalmente, a luminária.

talvez devido às suas origens, a rainha Maria Pia tinha uma predi-leção pelas artes decorativas onde se incluíam os vidros e as luminárias. ao longo de sua estada em Portugal (1862-1910), adquiriu uma quantida-de considerável de peças de caráter decorativo e utilitário, como apliques, lustres, espelhos, serviços de mesa e muitos outros conjuntos e objetos. Viajou treze vezes para diferentes destinos europeus: Paris, nice, aix-Les-Bains, Londres, Viena, Munique, roma, Veneza, turim e Karlsbad eram alguns de seus destinos de eleição e onde visitou as lojas mais distintas, e os revendedores e fabricantes proeminentes.

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a luminária da ajuda, que contempla lustres em cristal, metal e por-celana, apliques, e candeeiros com seus acessórios, pode ser parcialmente observada em todo o palácio. Inclui peças produzidas em fabricantes como F&C Osler (Grã-Bretanha), as firmas Baccarat, Henry Beau, Motheau e Gagneau (frança), a manufatura La Granja (espanha), de fábricas de Mu-rano (Itália), Marinha Grande (Portugal) e também de manufaturas da Bo-êmia. a coleção tem cerca de 436 peças que revelam as tendências da épo-ca: inclui 103 lustres, 78 apliques, 199 candeeiros de mesa e 56 lanternas. o arrolamento judicial do Palácio nacional da ajuda, realizado após a parti-da da Família Real para o exílio em 1910, permitiu-nos identificar algumas peças e a sua localização original. essa fonte documental é basilar para o estudo de todas as coleções. outras foram reconhecidas através das faturas ou ordens de compra encontradas no arquivo da casa real portuguesa.

as agendas, cadernos e notas pessoais da rainha e suas camareiras, os catálogos (indicando que a casa real portuguesa também encomendou à distância), complementam as pesquisas.

o álbum de aguarelas do pintor da casa real, enrique casanova ofe-recido pela rainha a d. Luís por ocasião do seu aniversário, em 31 de outu-bro de 1889, apresenta 19 salas dos palácios da ajuda, cascais e sintra. exe-cutado entre 1889 e 1891/92, nele podemos encontrar algumas peças ainda hoje expostas. Também fotografias dos interiores permitem-nos observar as alterações e a evolução desde o tempo da iluminação com velas de cera até à época do gás e eletricidade.

É uma pesquisa em desenvolvimento, com recurso a arquivos e aos fabricantes ainda existentes, em Portugal e no estrangeiro.

Maria João Botelho Moniz Burnay | [email protected]

Licenciada em ciências Históricas pela universidade Lusíada de Lisboa, realizou mestrado em arte, Patrimônio e teoria do restauro, no IHa da faculdade de Letras, universidade de Lisboa. Desde 2011, é conservadora da coleção de vidros, tem publicado vários artigos e par-ticipado em conferências em Portugal e no estrangeiro. É também conservadora da coleção de equipamento e utensílios. É ainda membro do Icom/Glass e da Light and Glass society.

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Viver com arte: decoração e coleções nos interiores das casas senhoriais de fins do século XIX em Portugal e Brasil Marize Malta

além da decoração de interiores, que mereceu grandes investimen-tos nas casas e palacetes nas últimas décadas do século XIX, no intuito de evocar personalidades, foram desenvolvidas muitas coleções artísticas, fenômeno de grande repercussão entre nobres e burgueses, que envolveu quantidade, acúmulo e diferentes graus de qualidade, sendo abrigadas de formas particulares nos ambientes domiciliares. como foram acolhidas e dispostas essas coleções? como se articulavam com os móveis e os objetos decorativos? o que diziam dos seus proprietários? os ambientes domésticos oitocentistas foram tomados como lugares abarrotados de objetos, cujas densidades e variedades de itens dificultavam separar os bons objetos dos maus objetos, discernir a boa arte da má arte ou daquilo que nem como arte poderia ser identificado. Nessa confusão, as coleções se incluem ao meio do abarrotamento de imagens matéricas, cores e texturas domésticas. É no espaço cotidiano de convivência que objetos e pessoas estão em intensa proximidade, onde objetos de diferentes naturezas se confrontam e é possível diversa experiência visual, com os objetos perto dos olhos e do corpo, sugerindo outros modos de “ver” e de dizer das coisas do mundo e das diferentes civilizações que o povoaram e modelaram. auxiliados por manuais oitocentistas de decoração, que orientavam a conformação das coleções em casa, documentos, relatos e crônicas de época, aliados, especialmente, a um conjunto de fotografias de interiores (palácio foz, fronteira, Pena, são cristóvão, etc.), procuraremos observar como se articularam as coleções de arte portas adentro, percebendo como se fizeram mostrar, o que mostravam e insinuavam de como se vivia com arte.

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Marize Malta | [email protected]

Doutora em História e mestre em História da arte, é professora associada da eBa/ufrJ, atuando na graduação e pós-graduação, em História e teoria da arte, artes Decorativas, ambientes históricos, coleções e modos de exibição. É pesquisadora PQ-2 do cnPq, líder dos grupos de pesquisa entresséculos e Modos e integrante do grupo casas senhoriais em Portugal, Brasil e Goa.

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Emblemas de uma terra desejada: uso e significação de mapas, obras de arte e objetos do Brasil nas casas senhoriais da Amsterdã seiscentista rené Lommez Gomes

a cidade de amsterdam cresceu vertiginosamente, no século XVII. o investimento de seus mercadores no comércio ultramarino, o florescimen-to das casas de impressão e da produção cartográfica, aliados ao acentuado desenvolvimento do comércio local de arte, fizeram da cidade um impor-tante centro econômico e cultural do norte da europa.

o crescimento da cidade esteve intimamente associado à ascensão de uma burguesia letrada que se distinguia socialmente por meio de seu engajamento ostensivo no debate das questões políticas e comerciais da república batava, do cultivo das artes e da manutenção de luxuosas re-sidências, cuja decoração testemunhava a prosperidade e simbolizava os interesses de seus proprietários.

À época, um dos temas que dividiu opiniões entre os cidadãos de amsterdã foi a possibilidade de a república batava conquistar e manter regiões do Brasil anteriormente colonizadas pelos portugueses. em ams-terdã, o tema assumiu tal importância que produziu reflexos no cotidiano de parte da elite senhorial que, ao longo do século, consumiu e colecionou mapas do Brasil, livros com descrições de suas terras e corantos com notí-cias de batalhas e do corso realizados nos seus litorais.

ao menos 12 grandes senhores da cidade decoraram suas residências com pinturas e cartas marítimas que representavam a natureza, os povos e a geografia do Brasil. Alguns deles colecionaram e exibiram, nos principais cômodos de suas casas, exemplares de objetos produzidos por indígenas brasileiros, como arcos, flechas e maracás. Outros 15 senhores acumula-ram objetos semelhantes a estes, mas que foram genericamente descritos como coisas das “índias ocidentais”.

o emprego de objetos associados ao Brasil nas casas senhoriais de amsterdã foi registrado em documentos de tipologias variadas, como registros notariais (inventários post mortem, de insolvência e falência),

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rené Lommez Gomes | [email protected]

Professor de História da arte e História das coleções do curso de Museologia da ufMG. coordena o rariorum – núcleo de Pesquisa em História das coleções e dos Museus. É pesquisador do projeto “african Ivories in the atlantic World”, desenvolvido pela ufMG e pela universidade de Lisboa.

cartas e relatos de visitas a espaços domésticos. a amplitude dos dados re-gistrados nesses documentos, em especial em um conjunto de inventários conservados no stadsarchief amsterdam, permite ao investigador recons-tituir a distribuição dos objetos brasileiros nas casas burguesas da cidade; analisar os usos e funções que lhes eram dados em cada espaço doméstico; bem como avaliar valores simbólicos e monetários a eles atribuídos.

a presente comunicação de pesquisa tem por objetivo analisar como se deu a incorporação, a distribuição espacial e a construção dos usos, valores e significados de objetos originários ou representativos do Brasil, nas casas senhoriais da amsterdã seiscentista. Buscar-se-á, ainda, revelar como a disposição e a exposição desses objetos nos diferentes espaços das residências burguesas constituíam emblemas das relações de seus pro-prietários com o mundo ultramarino, construindo narrativas biográficas, representando posicionamentos políticos e sinalizando uma grande gama de interesses. Para tanto, a comunicação se centrará no estudo dos objetos que se encontravam em quatro residências da cidade, cujos proprietários se associavam de diferentes formas ao Brasil: as habitações de dois dire-tores da companhia das índias ocidentais, Mathijs van ceulen e Jacques van Hoorn, e as casas de dois imigrantes luso-brasileiros, Luís Mariano e Isaac serrano.

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O mobiliário religioso no interior da casa brasileira, entre funções e significados silveli Maria de toledo russo

Neste encontro científico, pretendo destacar um importante enfoque metodológico relacionado às minhas atividades de pesquisa, em anda-mento no âmbito de museus e coleções particulares paulistas, que se di-recionam, sobretudo, ao estudo do patrimônio móvel de cunho religioso, tendo em vista o entendimento das manifestações artísticas e variedades tipológicas relacionadas ao conjunto de discursos e práticas próprios da sociedade que o produziu, ao longo da história brasileira, colonial e im-perial. neste ponto, interessa lembrar que no início do século XX, com a abertura de órgãos oficiais determinados ao estudo e programas de preser-vação dos bens culturais no Brasil, deu-se prosseguimento ao processo de constituição do saber histórico, que desde a centúria anterior já chamava a atenção para o passado como um objeto do conhecimento que marca as sociedades.

Dentre os diversos escritos sobre o mobiliário brasileiro, surgiram cronologias, designações estilísticas, nomenclaturas e tipologias, em perspectiva comparativa com as influências do mobiliário de Portugal e de suas diversas matrizes culturais de influências externas: orientais, mé-dio-orientais e europeias. ao analisar o conjunto de móveis cuja função principal é atuar como polo agregador de vivências religiosas no recesso do lar, observa-se que eles contemplam dois universos funcionais: em um domínio, tem-se o gênero dos objetos devocionais, destinado ao retiro, ao recolhimento e à oração; em outro domínio, tem-se a produção em que eles aparecem especialmente dispostos para a orientação das celebrações oficiais da Igreja Católica, tais como o ofício da missa, do batismo, do ma-trimônio e da extrema-unção.

no âmbito das casas senhoriais, ou palacetes, é possível observar uma singular tipologia de mobiliário religioso, cujas peças foram adquiridas pe-los próprios detentores do privilégio de possuí-las; exempli gratia, o mobi-liário religioso que se encontra salvaguardado em um imóvel localizado na cidade de são Paulo – construído no ano de 1935 – cujo projeto arquitetôni-

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silveli Maria de toledo russo | [email protected]

Graduada em artes pela unesp. Graduada em arquitetura e urbanismo e especialização em espaço e Design pela faculdade de Belas artes de são Paulo. Doutora e com pesqui-sa pós-doutoral pela fau-usP. Docente em instituições de ensino superior. Pesquisadora residente na Biblioteca Brasiliana Guita e José Mindlin da universidade de são Paulo e investigadora no Instituto de História da arte da faculdade de Letras da universidade de Lisboa.

co, de influência eclética francesa, é atribuído ao arquiteto francês Jacques Emile Paul Pilon (1905-1962), de significativa atuação na arquitetura pau-lista, entre as décadas de 1930 e 1960. fato este que, entre outros, suscita à análise alguns desafios, visto o interesse por parte dos proprietários em não só preservar o seu conjunto arquitetônico e equipamento móvel, mas também ampliar a divulgação do repertório de referências patrimoniais que se vinculam à história familiar, local e regional.

em continuidade a esse discurso, ocorre citar que a investigação da natureza das relações individuais e familiares desenvolvidas no interior das habitações, e a veneração e o culto que se dispensam, é imprescindível tanto para a análise dos usos precedentes do mobiliário religioso, e seus componentes, como também para o estudo do contexto histórico de ori-gem dos mesmos, com suas constantes e variações. Julga-se por bem rei-terar que tais percepções estão em constante diálogo com o conhecimento dos atributos físicos e com as funções utilitárias de repertório, inclusive no tocante à presença de aspectos arquitetônicos e plásticos recorrentes, conferindo inteligibilidade às peças, do mesmo modo que compreensão e sistematização das motivações inerentes à experiência religiosa domésti-ca, devocional e litúrgica nesse contexto.

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