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E mais: >> Maria Celina D’Araújo: As Forças Armadas no Brasil e na América Latina >> Antoine Artous: O mundo do trabalho e o marxismo Leonildo Silveira Campos A Reforma 500 anos depois de Calvino. Yves Krumenacker Calvino. Um revolucionário ou um conservador? 316 Ano IX 23.11.2009 ISSN 1981-8469 Ricardo Rieth Uma teologia a caminho Calvino 1509-1564. Teólogo, reformador e humanista flash.indd 1 23/11/2009 17:03:38

Calvino; Teólogo reformador e humanista

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  • E mais:

    >> Maria Celina DArajo: As Foras Armadas no Brasil e

    na Amrica Latina

    >> Antoine Artous: O mundo do trabalho

    e o marxismo

    Leonildo Silveira Campos A Reforma 500 anos depois de Calvino.

    Yves Krumenacker Calvino. Um revolucionrio ou um conservador?

    316Ano IX

    23.11.2009ISSN 1981-8469

    Ricardo RiethUma teologia a caminho

    Calvino 1509-1564.

    Telogo,

    reformador e humanista

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  • IHU On-Line a revista semanal do Instituto Humanitas Unisinos IHU Universidade do Vale do Rio dos Sinos - Unisinos. ISSN 1981-8769. Diretor da Revista IHU On-Line: Incio Neutzling ([email protected]). Editora executiva: Graziela Wolfart MTB 13159 ([email protected]). Redao: Mrcia Junges MTB 9447 ([email protected]) e Patricia Fachin MTB 13062 ([email protected]). Reviso: Vanessa Alves ([email protected]). Colaborao: Csar Sanson, Andr Langer e Darli Sampaio, do Centro de Pesquisa e Apoio aos Traba-lhadores CEPAT, de Curitiba-PR. Projeto grfico: Bistr de Design Ltda e Patricia Fachin. Atualizao diria do stio: Incio Neutzling, Greyce Vargas ([email protected]) e Juliana Spitaliere. IHU On-Line pode ser acessada s segundas-feiras, no stio www.unisinos.br/ihu. Sua verso impressa circula s teras-feiras, a partir das 8h, na Unisinos. Apoio: Comunidade dos Jesutas - Residncia Concei-o. Instituto Humanitas Unisinos - Diretor: Prof. Dr. Incio Neutzling. Gerente Administrativo: Jacinto Schneider ([email protected]). Endereo: Av. Unisinos, 950 So Leopoldo, RS. CEP 93022-000 E-mail: [email protected]. Fone: 51 3591.1122 ramal 4128. E-mail do IHU: [email protected] - ramal 4121.

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    Calvino - 1509-1564

    Celebram-se, neste ano, os 500 anos de nascimento do reforma-dor francs Joo Calvino (1509-1564).

    O Instituto Humanitas Unisinos IHU, dedicou um amplo espao nas Notcias do Dia, publicadas e atualizadas diariamente na sua pgina eletrnica, a este importante evento. Esta edio da IHU On-Line quer aprofundar a anlise e o debate sobre o legado deste grande telogo, reformador e humanista.

    Contribuem nesta edio o filsofo e o telogo presbiteriano Leonildo Silveira Campos, da Umesp; Bernard Cottret, bigrafo francs de Calvino, da Universidade de Versailles Saint-Quentin; Carlos Eduardo Oliveira, professor da Universidade Federal de So Carlos UFSCar, um dos tradutores de A instituio da religio cris-t, obra em dois volumes de Joo Calvino, para o portugus; Yves Krumenacker, da Universidade Lyon 3, historiador, autor do livro Calvin. Au-del des legendes (Paris, Bayard, 2009); Volker Leppin, decano da Faculdade de Teologia da Universidade de Jena; Hermis-

    ten da Costa, pastor e professor do Seminrio Presbiteriano Reverendo Jos Manoel da Conceio; Ricardo Rieth, professor da Universidade Luterana do Brasil Ulbra, e da Escola Superior de Teo-logia EST; e Risto Saarinen, pastor da Igreja Evanglica Luterana e professor da Universidade de Helsinki.

    Completam esta edio as entrevistas com Maria Celina DArajo, cientista poltica e professo-ra da PUC-Rio e com Ana Lusa Janeira, professora da Universidade de Lisboa.

    Agradecemos ao professor Henrique Amorim, pesquisador do Departamento de Sociologia da Uni-camp, a entrevista que fez com Antoine Artous, autor de Marx et le travail (Editions Syllepse, avril 2003) e membro do comit de redao da revista ContreTemps, e que publicamos nesta edio.

    A todos e a todas, uma tima leitura e uma excelente semana!

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  • SO LEOPOLDO, 23 DE NOVEMBRO DE 2009 | EDIO 316 3

    Leia nesta edio

    PGINA 02 | Editorial

    A. Tema de capa

    Entrevistas

    PGINA 07 | Bernard Cottret: A purificao calvinista do cristianismo

    PGINA 09 | Ricardo Rieth: Uma teologia a caminho

    PGINA 12 | Leonildo Silveira Campos: A Reforma 500 anos depois de Calvino

    PGINA 19 | Carlos Eduardo de Oliveira: Para Calvino, a eleio divina independe at mesmo da f

    PGINA 24 | Yves Krumenacker: Calvino. Um revolucionrio ou um conservador?

    PGINA 26 | Volker Leppin: A teologia poltica de Calvino

    PGINA 27 | Hermisten Maia Pereira da Costa: A f reformada e os compromissos existenciais inevitveis

    PGINA 31 | Risto Saarinen: A Reforma, sem dvida, foi um movimento com forte tonalidade hermenutica

    B. Destaques da semana

    Brasil em Foco

    PGINA 33 | Maria Celina Soares DArajo: O papel das Foras Armadas no Brasil e na Amrica Latina

    Entrevista da Semana

    PGINA 36 | Antoine Artous: O mundo do trabalho e o marxismo

    Teologia Pblica

    PGINA 41 | Ana Lusa Janeira: A energia mxima ser sempre o amor

    Coluna Cepos

    PGINA 44 | Rodrigo Jacobus: A cultura do excesso e alguns mitos da interatividade

    Destaques On-Line

    PGINA 46 | Destaques On-Line

    C. IHU em Revista

    Eventos

    IHU Reprter

    PGINA 50| Gelson Fiorentin

    IHU On-Line a revista semanal do Instituto Humanitas Unisinos IHU Universidade do Vale do Rio dos Sinos - Unisinos. ISSN 1981-8769. Diretor da Revista IHU On-Line: Incio Neutzling ([email protected]). Editora executiva: Graziela Wolfart MTB 13159 ([email protected]). Redao: Mrcia Junges MTB 9447 ([email protected]) e Patricia Fachin MTB 13062 ([email protected]). Reviso: Vanessa Alves ([email protected]). Colaborao: Csar Sanson, Andr Langer e Darli Sampaio, do Centro de Pesquisa e Apoio aos Traba-lhadores CEPAT, de Curitiba-PR. Projeto grfico: Bistr de Design Ltda e Patricia Fachin. Atualizao diria do stio: Incio Neutzling, Greyce Vargas ([email protected]) e Juliana Spitaliere. IHU On-Line pode ser acessada s segundas-feiras, no stio www.unisinos.br/ihu. Sua verso impressa circula s teras-feiras, a partir das 8h, na Unisinos. Apoio: Comunidade dos Jesutas - Residncia Concei-o. Instituto Humanitas Unisinos - Diretor: Prof. Dr. Incio Neutzling. Gerente Administrativo: Jacinto Schneider ([email protected]). Endereo: Av. Unisinos, 950 So Leopoldo, RS. CEP 93022-000 E-mail: [email protected]. Fone: 51 3591.1122 ramal 4128. E-mail do IHU: [email protected] - ramal 4121.

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    Calvino - 1509-1564

    Celebram-se, neste ano, os 500 anos de nascimento do reforma-dor francs Joo Calvino (1509-1564).

    O Instituto Humanitas Unisinos IHU, dedicou um amplo espao nas Notcias do Dia, publicadas e atualizadas diariamente na sua pgina eletrnica, a este importante evento. Esta edio da IHU On-Line quer aprofundar a anlise e o debate sobre o legado deste grande telogo, reformador e humanista.

    Contribuem nesta edio o filsofo e o telogo presbiteriano Leonildo Silveira Campos, da Umesp; Bernard Cottret, bigrafo francs de Calvino, da Universidade de Versailles Saint-Quentin; Carlos Eduardo Oliveira, professor da Universidade Federal de So Carlos UFSCar, um dos tradutores de A instituio da religio cris-t, obra em dois volumes de Joo Calvino, para o portugus; Yves Krumenacker, da Universidade Lyon 3, historiador, autor do livro Calvin. Au-del des legendes (Paris, Bayard, 2009); Volker Leppin, decano da Faculdade de Teologia da Universidade de Jena; Hermis-

    ten da Costa, pastor e professor do Seminrio Presbiteriano Reverendo Jos Manoel da Conceio; Ricardo Rieth, professor da Universidade Luterana do Brasil Ulbra, e da Escola Superior de Teo-logia EST; e Risto Saarinen, pastor da Igreja Evanglica Luterana e professor da Universidade de Helsinki.

    Completam esta edio as entrevistas com Maria Celina DArajo, cientista poltica e professo-ra da PUC-Rio e com Ana Lusa Janeira, professora da Universidade de Lisboa.

    Agradecemos ao professor Henrique Amorim, pesquisador do Departamento de Sociologia da Uni-camp, a entrevista que fez com Antoine Artous, autor de Marx et le travail (Editions Syllepse, avril 2003) e membro do comit de redao da revista ContreTemps, e que publicamos nesta edio.

    A todos e a todas, uma tima leitura e uma excelente semana!

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  • 4 SO LEOPOLDO, 23 DE NOVEMBRO DE 2009 | EDIO 316

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  • SO LEOPOLDO, 23 DE NOVEMBRO DE 2009 | EDIO 316 5

    Livro digital do Simpsio Narrar Deus lanado

    Livro digital do X Simpsio Internacional IHU: Narrar Deus numa Sociedade Ps-Metafsica. Possibilidades e impos-sibilidades com os textos das oficinas, minicursos e comu-nicaes do evento est disponvel no stio do IHU.

    Acesse www.ihu.unisinos.br e faa o download do livro digital do Simpsio Narrar Deus.

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  • 6 SO LEOPOLDO, 23 DE NOVEMBRO DE 2009 | EDIO 316

    Joo CalvinoNascimento 10/07/1509, em Noyon, FranaFalecimento 27/05/1564, em Genebra, Sua

    O Senhor teve pie-dade de mim, sua pobre cria-tura; (...) Ele me estendeu a

    Sua misericrdia para anunciar a ver-dade do Evangelho. Com estas pa-lavras, autodefiniu-se o reformador humanista Joo Calvino, fundador da Igreja protestante na Frana.

    De origem humilde, Calvino era filho de um tabelio, secretrio do bispo de Noyon. Ingressou no Colgio dos Cape-to e depois foi admitido entre os filhos do Senhor de Monmor, compartilhando com eles sua educao.

    Em agosto de 1523, iniciou seus es-tudos na Universidade de Paris, onde aprendeu latim, filosofia e dialtica,

    chegando a distinguir-se como humanista. Encaminhado para a teologia por seu pai, Calvino foi enviado para uma capela da Catedral de Noyon, depois para a parquia de Marteville.

    Com a mudana dos planos paternos, Calvino direcionou-se para o direito. Entre 1528 e 1533, frequentou as uni-versidades de Orleans e de Bourges. Em 1532, publicou sua primeira obra, Dois livros sobre a Clemncia ao Impe-rador Nero, em que comentou o pen-samento de Sneca sobre a clemncia. Aos poucos, foi-se aproximando das questes morais e religiosas e do pen-samento de Lutero, o reformador da Igreja catlica na Alemanha.

    Em 1533, sua distncia em relao ao catolicismo tornou-se pblica, com a redao de um discurso con-tendo matria religiosa considerada hertica. Dois anos depois, concluiu sua obra mais famosa, a Instituio da Religio Crist, que lhe rendeu grande prestgio.

    Trs anos mais tarde, convidado a en-sinar teologia, Calvino passou a viver em Genebra, unindo-se ao reformador Guillaume Farel. Uma tentativa mal-sucedida de implantar os costumes re-formados acabou causando celeuma e levando Calvino ao exlio, em 1538.

    Mudou-se para Estrasburgo, onde, em agosto de 1540, casou-se com a vi-va Idelette de Bure, com quem viveria por nove anos. Com a morte da esposa, Calvino seguiu cuidando dos filhos dela. Em 1541, retornou a Genebra, onde criou um modelo institucional para a Igreja reformada. Publicou as suas Or-denanas Eclesisticas naquele ano. A partir de ento, ocupou-se do aprimo-ramento e da difuso da nova doutri-na, expandindo-a para outros centros europeus.

    Em seus ltimos anos, estava com a sade debilitada. Joo Calvino morreu no dia 27 de maio de 1564, aps um acesso de hemoptise.

    Fonte: http://educacao.uol.com.br/biografias/ult1789u191.jhtm

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  • SO LEOPOLDO, 23 DE NOVEMBRO DE 2009 | EDIO 316 7

    A purificao calvinista do cristianismo Para Bernard Cottret, Lutero e Calvino tm teologias prximas por sua afirmao da justificao pela f ou sua recusa do sacrifcio da missa. H diferenas, contu-do. No existe atualidade em si de Calvino, mas constante exigncia de renovao interior

    Por Mrcia Junges | Traduo Benno dischinger

    O calvinismo no pode se reduzir apenas predestinao, diz o bigrafo francs de Calvino, Bernard Cottret. Em entrevista especial IHU On-Line, por e-mail, ele explica tambm em que medida essa religio pode ser considerada uma reao ao protestantismo e ao ca-tolicismo. A purificao calvinista do cristianismo consiste em extirpar impiedosamente a idolatria, incluindo a liturgia. Praticamente no h arte sacra calvinista quando h

    evidentemente uma arte sacra luterana, anglicana, para no falar da arte sacra catlica, e do estilo jesuta. Em sua opinio, um bom calvinista no deveria dizer-se calvinista, j que em sua ori-gem, o calvinismo uma inveno de luteranos da segunda ou terceira gerao, hostis teologia de Calvino, em particular sobre as questes eucarsticas.

    Cottret professor da Universidade de Versailles Saint-Quentin e membro do Instituto Univer-sitrio da Frana. autor de, entre outros, Calvin. Biographie (2. Ed. Paris: Payot, 1999). Confira a entrevista.

    IHU On-Line - Em que medida Calvi-no teria sido para a lngua francesa o que Lutero1 foi para a lngua alem uma figura quase paternal?Bernard Cottret - Calvino e Lutero ocu-pam situaes inversas: Lutero perce-bido pelos alemes de todas as confis-ses como o fundador de seu idioma. Sua traduo da Bblia uma grande data na histria da lngua alem e o estabele-cimento do Hoch Deutsch [alemo cls-sico]. Calvino, por sua vez, no traduziu a Bblia, deixando este cuidado a seu pri-mo Olivtan2 e fazendo o prefcio des-

    1 Martinho Lutero (1483-1546): telogo ale-mo, considerado o pai espiritual da Reforma Protestante. Foi o autor de uma das primeiras tradues da Bblia para o alemo, sua tradu-o suplantou as anteriores. Alm da quali-dade da traduo, foi amplamente divulgada em decorrncia da sua difuso por meio da imprensa, desenvolvida por Gutemberg em 1453. Sobre Lutero, confira a edio 280 da IHU On-Line, de 03-11-2008, intitulada Re-formador da Teologia, da igreja e criador da lngua alem. O material est disponvel para download em http://www.ihuonline.unisinos.br/uploads/edicoes/1225737560.4112pdf.pdf. (Nota da IHU On-Line)2 Pierre Robert Olivtan (1506-1538): primei-

    sa obra. Porm e, sobretudo, o protes-tantismo sempre foi minoria na Frana, enquanto percebido como majoritrio no espao germnico, ou, mais em geral, em toda a Europa.

    IHU On-Line - Por que Calvino um filsofo pr-cartesiano? Poderia comentar essa afirmao?Bernard Cottret - Meus prprios tra-balhos, aps meu artigo publicado nos Annales ESC at minha recente edio do Tratado das relquias (Trait des re-liquess. Paris: ditions de Paris, 2008) passando por minha biografia do refor-mador (reeditada na Frana em 2009) tiveram por objetivo dar a Calvino seu merecido lugar na tradio intelec-tual francesa. Por sua reflexo sobre a lngua, por sua semitica exigente, Calvino iniciou os trabalhos de um Saussure,3 por exemplo, distinguindo

    ro tradutor da Bblia para o francs. (Nota da IHU On-Line)3 Ferdinand de Saussure (1857-1913): linguis-ta suo, cujas elaboraes tericas propricia-ram o desenvolvimento da lingustica enquan-to cincia e desencadearam o surgimento do

    bem o significante do significado. Toda sua doutrina eucarstica pretende ver, nas espcies, simples significantes, re-cusando que lhe seja votado um culto julgado idoltrico. o que implica o recurso s figuras da retrica e, em particular, a definio do sacramento como metonmia, e no como me-tfora. A recusa da transubstanciao tomista , sob este ttulo, ligada a uma concepo gramatical. Tive oca-sio de falar h uns trinta anos sobre essas coisas com Michel de Certeau,4

    estruturalismo. Alm disso, o pensamento de Saussure estimulou muitos dos questionamen-tos que comparecem na lingustica do sculo XX. (Nota da IHU On-Line)4 Michel de Certeau (1925-1986): intelectual jesuta francs. Foi ordenado na Companhia de Jesus em 1956. Em 1954 tornou-se um dos fundadores da revista Christus, na qual este-ve envolvido durante boa parte de sua vida. Lecionou em vrias universidades, entre as quais Genebra, San Diego e Paris. Escreveu diversas obras, dentre as quais La Fable mys-tique: XVIme et XVIIme sicle (Paris: Galli-mard, 1982); Histoire et psychanalyse entre science et fiction (Paris: Gallimard, 1987); La prise de parole. Et autres crits politiques (Paris: Seuil, 1994). Em portugus, citamos A escrita da histria (Rio de Janeiro: Forense

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  • SO LEOPOLDO, 23 DE NOVEMBRO DE 2009 | EDIO 316

    que me encorajara a prosseguir. Ora, isso me levou a tomar distncia

    em relao ao maravilhoso livro de Michel Foucault5 sobre As palavras e as coisas uma arqueologia das cincias humanas (3 ed. So Paulo: Martins Fontes, 1985), que atribui a Descartes6 uma dissociao

    Universitria, 1982) e A inveno do cotidiano (3 ed. Petrpolis: Vozes, 1998). Sobre Certe-au, confira as entrevistas Michel de Certeau ou a erotizao da histria, concedida por Elisabeth Roudinesco, e As heterologias de Michel de Certeau, concedida por Dain Bor-ges, ambas edio 186 da IHU On-Line, de 26-06-2006, disponveis para download em http://www.ihuonline.unisinos.br/uploads/edicoes/11534440.7pdf.pdf. As mesmas entrevistas podem ser conferidas na edio 14 dos Cadernos IHU em Formao, intitulado Jesutas. Sua identidade e sua contribuio para o mundo moderno, disponvel para do-wnload em http://www.ihu.unisinos.br/uplo-ads/publicacoes/edicoes/1184009586.45pdf.pdf. (Nota da IHU On-Line)5 Michel Foucault (1926-1984): filsofo fran-cs. Suas obras, desde a Histria da Loucu-ra at a Histria da sexualidade (a qual no pde completar devido a sua morte) situam-se dentro de uma filosofia do conhecimento. Suas teorias sobre o saber, o poder e o sujeito romperam com as concepes modernas des-tes termos, motivo pelo qual considerado por certos autores, contrariando a sua pr-pria opinio de si mesmo, um ps-moderno. Seus primeiros trabalhos (Histria da Loucu-ra, O Nascimento da Clnica, As Palavras e as Coisas, A Arqueologia do Saber) seguem uma linha estruturalista, o que no impede que seja considerado geralmente como um ps-es-truturalista devido a obras posteriores como Vigiar e Punir e A Histria da Sexualidade. Foucault trata principalmente do tema do po-der, rompendo com as concepes clssicas deste termo. Para ele, o poder no pode ser localizado em uma instituio ou no Estado, o que tornaria impossvel a tomada de poder proposta pelos marxistas. O poder no con-siderado como algo que o indivduo cede a um soberano (concepo contratual jurdico-pol-tica), mas sim como uma relao de foras. Ao ser relao, o poder est em todas as partes, uma pessoa est atravessada por relaes de poder, no pode ser considerada independen-te delas. Para Foucault, o poder no somente reprime, mas tambm produz efeitos de ver-dade e saber, constituindo verdades, prti-cas e subjetividades. Em duas edies a IHU On-Line dedicou matria de capa a Foucault: edio 119, de 18-10-2004, disponvel para download em http://www.ihuonline.unisinos.br/uploads/edicoes/1158265374.73pdf.pdf e a edio 203, de 06-11-2006, disponvel em http://www.ihuonline.unisinos.br/uploads/edicoes/1162842466.39pdf.pdf. Alm disso, o IHU organizou, durante o ano de 2004, o even-to Ciclo de Estudos sobre Michel Foucault, que tambm foi tema da edio nmero 13 dos Ca-dernos IHU em Formao, disponvel para do-wnload em http://www.ihu.unisinos.br/uplo-ads/publicacoes/edicoes/1184009500.55pdf.pdf sob o ttulo Michel Foucault. Sua contri-buio para a educao, a poltica e a tica. (Nota da IHU On-Line)6 Ren Descartes (1596-1650): filsofo, fsico e matemtico francs. Notabilizou-se sobretu-

    entre a realidade e as aparncias enga-nadoras que, a meu ver, encontra-se em Calvino. Eis como eu o situaria agora no nominalismo medieval.

    IHU On-Line - O que faz a diferena do empreendimento de Calvino e de Lutero de purificar o cristianis-mo?Bernard Cottret - Lutero, em sua con-cepo do sacramento, permanece ligado substncia. Nele, fala-se de consubstanciao a propsito da San-ta Ceia, e o po e o vinho coexistem com o corpo e o sangue do Salvador. Para Calvino, isso no tem sentido; ele muda radicalmente de perspectiva por sua teoria do signo. A purificao calvinista do cristianismo consiste em extirpar impiedosamente a idolatria, incluindo a liturgia. Praticamente no h arte sacra calvinista quando h evidentemente uma arte sacra lutera-na, anglicana, para no dizer da arte sacra catlica, e do estilo jesuta.

    IHU On-Line - Quais so os pontos de proximidade e de ruptura que o se-nhor destacaria entre estes dois re-formadores?Bernard Cottret - Lutero e Calvino tm, ao mesmo tempo, teologias pr-ximas por sua afirmao da justifica-o pela f ou sua recusa do sacrifcio

    do pelo seu trabalho revolucionrio da Filoso-fia, tendo tambm sido famoso por ser o in-ventor do sistema de coordenadas cartesiano, que influenciou o desenvolvimento do clculo moderno. Descartes, por vezes chamado o fun-dador da filosofia e matemtica modernas, ins-pirou os seus contemporneos e geraes de filsofos. Na opinio de alguns comentadores, ele iniciou a formao daquilo a que hoje se chama de racionalismo continental (suposta-mente em oposio escola que predomina-va nas ilhas britnicas, o empirismo), posio filosfica dos sculos XVII e XVIII na Europa. (Nota da IHU On-Line)

    da missa, mas tambm dessemelhan-as. , pois, falso reduzir, como se faz com frequncia, o calvinismo somente predestinao.

    IHU On-Line - Quais so as influn-cias do Calvino jurista no Calvi-no telogo? A austeridade de seu pensamento seria explicada por esta diferena?Bernard Cottret - Calvino jurista onde Lutero e os outros receberam uma formao clssica de telogos catlicos. Isso induz diversas caracte-rsticas notveis que eu destaquei em minha biografia: 1) Calvino permanece profundamente laico;2) Ele jamais recebeu consagrao pastoral, enquanto Lutero e os outros so antigos padres;3) De maneira igualmente essencial, ele recusa dissociar a Lei e a Graa, a Torah7 e o Evangelho. De onde provm, sem dvida, o filo-semitismo notvel de diversos reformadores, no qual Lutero se mostra funcionalmente antijudaico.

    IHU On-Line - Em que medida o calvi-nismo uma reao ao protestantis-mo e ao catolicismo?Bernard Cottret - O calvinismo uma construo dogmtica que eu distin-guiria da f viva de Calvino. Muitos protestantes calvinistas preferem di-zerem-se reformados para no incor-rer na censura de idolatria. Um bom calvinista no deveria dizer-se calvi-nista, e, em sua origem, o calvinismo uma inveno de luteranos da segun-da ou terceira gerao, hostis teolo-gia de Calvino, em particular sobre as questes eucarsticas. Calvino em todo o caso no queria ser calvinista, como, de resto, Marx8 no queria ser marxis-

    7 Tor: nome dado aos cinco primeiros livros do Tanakh e que constituem o texto central do judasmo. Contm os relatos sobre a cria-o do mundo, da origem da humanidade, do pacto de Deus com Abrao e seus filhos, e a libertao dos filhos de Israel do Egito e sua peregrinao de quarenta anos at a terra pro-metida. Inclui tambm os mandamentos e leis que teriam sido dadas a Moiss para que en-tregasse e ensinasse ao povo de Israel. (Nota da IHU On-Line)8 Karl Heinrich Marx (1818-1883): filsofo, cientista social, economista, historiador e re-volucionrio alemo, um dos pensadores que exerceram maior influncia sobre o pensamen-to social e sobre os destinos da humanidade no sculo XX. Marx foi estudado no Ciclo de

    No existe

    atualidade em si de

    Calvino, de Marx ou de

    Jesus, mas continua a

    permanente exigncia de

    uma renovao interior

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    ta... Eu, alis, trabalho atualmente sobre Marx, e constato que sua teoria do fetichismo de inspirao to am-plamente bblica quanto hegeliana.

    IHU On-Line - O calvinismo foi uma segunda fase do protestantismo?Bernard Cottret - Embora ele tenha aparecido historicamente aps Lutero, Calvino promoveu uma teologia pro-fundamente original, e difcil falar de uma segunda fase ou de um apro-fundamento. fundamentalmente ou-tra tradio cultural, ligada ao huma-nismo francs pista que eu explorei em minha biografia.

    IHU On-Line - Qual a atualidade de Calvino 500 anos aps seu nas-cimento?Bernard Cottret - H dez anos escre-vi um pequeno livro sobre o Renasci-mento, chamado La Renaissance 1492-1598. Civilisation Et Barbarie (Paris: ditions de Paris, 2000 - O Renascimen-to 1492-1598. Civilizao e barbrie). Ali eu falava de Calvino, de Lutero, mas tambm de Incio de Loyola9 e de alguns outros. Para mim, existe uma atualidade da histria, da histria en-quanto tal, da histria em geral. Mas, a tarefa do historiador parece-me ser a de sempre descartar o anacronismo, e eu desconfio de expresses como a atualidade de Calvino. No fundo, e para retomar Calvino sobre este pon-to, sua atualidade se d no aspecto do olhar ou da f. No existe atualidade em si de Calvino, de Marx ou de Jesus, mas continua a permanente exigncia de uma renovao interior. Ou, para empregar outra palavra, de uma refor-ma sempre ativa. Ecclesia reformata semper reformanda.

    Estudos Repensando os Clssicos da Economia. A edio nmero 41 dos Cadernos IHU Ideias, de autoria de Leda Maria Paulani tem como ttulo A (anti)filosofia de Karl Marx, dispon-vel em http://www.unisinos.br/ihu/uploads/publicacoes/edicoes/1158330314.12pdf.pdf. Tambm sobre o autor, confira a edio nme-ro 278 da IHU On-Line, de 20-10-2008, intitu-lada A financeirizao do mundo e sua crise. Uma leitura a partir de Marx, disponvel para download em http://www.unisinos.br/ihuon-line/uploads/edicoes/1224527244.6963pdf.pdf. (Nota da IHU On-Line)9 Santo Incio de Loyola (1491-1556): funda-dor da Companhia de Jesus, conhecida como os Jesutas, cuja misso o servio da f, a promoo da justia, o dilogo inter-religioso e cultural. (Nota da IHU On-Line)

    De acordo com Ricardo Rieth, Calvino compreendia sua contri-buio intelectual como uma teologia a caminho. Identifica-va-se com Santo Agostinho e destacou-se pela capacidade de sistematizar a tradio eclesistica oriental e ocidental

    Por Mrcia Junges

    A originalidade no propriamente um trao de Calvino, mas muito antes a sua capacidade sistemtica, unificando num todo orgni-co a tradio eclesistica oriental e ocidental, o ensino do huma-nismo cristo renascentista e as propostas da primeira gerao de reformadores protestantes. A afirmao do telogo e socilo-

    go Ricardo Willy Rieth na entrevista que concedeu, com exclusividade, por e-mail, IHU On-Line. Calvino compreendia sua contribuio intelectual como uma teologia a caminho. Identificou-se com Santo Agostinho, que certa vez descreveu a si mesmo como algum que escreve a partir da pro-gresso dos pensamentos e progride no escrever. A teologia de Calvino tem um carter fortemente determinado pela prpria experincia, completa Rieth. Ponderando os aspectos de proximidade e divergncia entre Calvino e Lutero, menciona que ambos so referncias fundamentais para a teologia e tambm para o protestantismo.

    Rieth telogo e socilogo. Cursou a graduao em Teologia no Semin-rio Concrdia da Igreja Evanglica Luterana do Brasil, e em Cincias Sociais pela Universidade do Vale do Rio dos Sinos - Unisinos. doutor em teologia pela Universidade de Leipzig, na Alemanha, onde tambm obteve o ttulo de ps-doutor. Sua tese intitulou-se Habsucht bei Martin Luther: konomisches und theologisches Denken, Tradition und soziale Wirklichkeit im Zeitalter der Reformation (Weimar: Hermann Bhlaus Nachfolger, 1996). Atualmente, professor da Universidade Luterana do Brasil Ulbra, e da Escola Superior de Teologia EST. autor do livro Martim Lutero: discpulo, testemunha, refor-mador (So Leopoldo: Editora Sinodal, 2007). Confira a entrevista.

    Uma teologia a caminho

    IHU On-Line - Qual a atualidade de Calvino 500 anos aps seu nas-cimento?Ricardo Rieth - Joo Calvino conti-nua sendo uma referncia para os fiis que so membros de igrejas sur-gidas a partir do movimento por ele conduzido. Nesse caso, seus escritos servem de orientao para posicio-namentos doutrinrios, reflexes teolgicas e formulaes de juzos ticos acerca de temas desafiadores suscitados pela realidade atual nos diversos contextos em que esto e agem essas igrejas e pessoas. Por ou-tro lado, Calvino foi um intelectual

    e homem de ao de grande desta-que em um perodo fundamental da histria ocidental, quando marcos importantes do que hoje configura nosso contexto de vida foram esta-belecidos. Evocar sua memria e re-fletir sobre as grandes questes de nossos dias, tomando por referncia aspectos de sua herana literria e prtica, pode ser muito significativo, mesmo para pessoas sem interesse especfico quanto f crist ou mes-mo religio de um modo geral.

    IHU On-Line - Como pode ser defini-do o calvinismo?

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    Ricardo Rieth - Calvino conheci-do como fundador do protestantis-mo reformado. Reformado, em sen-tido estrito, diferencia-se de outras correntes intraprotestantes e designa o movimento originado na Sua a par-tir de Zuinglio, Bullinger1 e Calvino, entre outros. O prprio reformador genebrino rejeitou que o movimento, a partir dele referenciado, assumisse a denominao calvinismo, prin-cipalmente quando este foi acolhido em territrios germnicos, algo que se deu com muita intensidade a partir da segunda metade do sculo XVI. por isso que igrejas identificadas com sua obra e pensamento adotam o adjeti-vo reformadas, e no calvinistas, quando se apresentam. Essa autode-signao lembra que uma igreja que tem por referncia a Reforma protes-tante do sculo XVI necessita de reno-vao permanente, pautada pelo ouvir da Palavra de Deus, exatamente como diz o moto: Ecclesia reformata sem-per reformanda.

    IHU On-Line - Quais so as mudanas que o calvinismo prope no protes-tantismo?Ricardo Rieth - Calvino no se carac-teriza propriamente pela originalida-de, mas muito mais pela capacidade de sistematizar em um todo orgnico a tradio eclesistica oriental e oci-dental, o ensino do humanismo cris-to renascentista e as propostas da primeira gerao de reformadores protestantes. Tinha profundo conhe-cimento da Antiguidade e da filosofia clssica. Usava as publicaes de Eras-mo de Rotterdam2 para seu trabalho exegtico. Suas obras trazem incon-tveis citaes de Padres da Igreja, principalmente de Santo Agostinho, em especial quando aborda a doutrina sobre a graa, a livre vontade, a elei-o e os sacramentos. De grande signi-

    1 Heinrich Bullinger (1504-1575): reformador prostestante suo, o sucessor de Ulrico Zun-glio como chefe da igreja e pastor em Zurique. Por ser uma figura muito menos controversa do que Joo Calvino ou Martinho Lutero, a sua importncia tem sido desde muito subestima-da. Uma pesquisa recente mostrou, porm, que ele foi um dos mais influentes telogos da Reforma Protestante no sculo XVI. (Nota da IHU On-Line)2 Erasmo de Rotterdam (1466-1536): telgo e humanista neerlands. Seu principal livro foi Elogio da loucura. (Nota da IHU On-Line)

    ficado para seu ensino sobre os sacra-mentos foi So Cirilo de Alexandria.3 Como exegeta, valorizava especial-mente So Joo Crisstomo,4 de quem queria editar pregaes em francs. A fonte mais decisiva, no entanto, era a Bblia, a partir da qual repetidamente criticava os Padres, quando conclua que sua opinio dela destoava.

    Calvino partia da premissa como Lutero de que nos primeiros cinco s-culos da Igreja teria inicialmente ha-vido um consenso doutrinrio. Poste-riormente, teria iniciado um processo de decadncia. Calvino tambm tinha profundo conhecimento da escolstica medieval,5 como mostram citaes li-terais do Livro das Sentenas de Pedro Lombardo6 e do Cdigo do Direito Ca-

    3 So Cirilo de Alexandria (c. 375- 444): pa-triarca de Alexandria quando a cidade estava no topo de sua influncia e poder dentro do Imprio Romano. Cirilo escreveu extensiva-mente e foi o protagonista liderante nas con-trovrsias cristolgicas do final do sculo IV e do sculo V. Foi uma figura central no Primeiro Conclio de feso, em 431, que levou depo-sio de Nestrio da posio de Patriarca de Constantinopla. listado entre os Pais e os Doutores da Igreja. (Nota da IHU On-Line)4 So Joo Crisstomo (347 - 407 d. C.): telo-go e escritor cristo, Patriarca de Constantino-pla no fim do sculo IV e incio do sculo V. Por sua retrica inflamada, ficou conhecido como Crisstomo (que em grego significa boca de ouro. considerado santo pelas Igrejas Or-todoxa e Catlica. um dos quatro grandes Padres da Igreja Oriental, e doutor da Igreja Catlica. (Nota da IHU On-Line)5 Escolstica: linha dentro da filosofia medie-val, de acentos notadamente cristos, surgida da necessidade de responder s exigncias da f, ensinada pela Igreja, considerada ento como a guardi dos valores espirituais e mo-rais de toda a Cristandade, por assim dizer, responsvel pela unidade de toda a Europa, que comungava da mesma f. Esta linha vai do comeo do sculo IX at ao fim do sculo XVI, ou seja, at ao fim da Idade Mdia. Este pensamento cristo deve o seu nome s artes ensinadas na altura pelos escolsticos nas es-colas medievais. Estas artes podiam ser divi-didas em Trivium (gramtica, retrica e dia-lctica) e Quadrivium (aritmtica, geometria, astronomia e msica). A escolstica resulta essencialmente do aprofundar da dialtica. (Nota da IHU On-Line)6 Pedro Lombardo (1100-1164): filsofo esco-lstico do sculo XII, professor na escola de

    nnico. Criticava em vrios autores da escolstica a falta de uma nfase cris-tocntrica, seu carter especulativo e filosfico, suas mltiplas distines no ensino acerca da f, a doutrina da gra-a e a compreenso sacramental. No h dvida alguma quanto ao decisivo significado de Lutero para a teologia de Calvino. Nos pontos centrais de sua confisso pelo ensino reformatrio, Calvino se mostrou um aluno de Lute-ro: na doutrina da justificao (somen-te Cristo, somente a f, somente a graa, somente a Escritura) e na com-preenso acerca da Igreja. Em relao a Ulrico Zuinglio, apesar do inegvel parentesco, Calvino tinha certas res-tries. Por Martin Bucer,7 reformador em Basilia, Calvino foi influenciado, acima de tudo, por interpretaes dos evangelhos, alm do ensino sobre a Igreja, ministrio, liturgia e disciplina eclesistica.

    IHU On-Line - Quais so as principais proposies defendidas por Calvino?Ricardo Rieth - Calvino compreendia sua contribuio intelectual como uma teologia a caminho. Identificou-se com Santo Agostinho, que, certa vez, descreveu a si mesmo como algum que escreve a partir da progresso dos pensamentos e progride no escrever. A teologia de Calvino tem um carter fortemente determinado pela prpria experincia. Sua obra magna, Institu-tas ou Tratado da Religio Crist, saiu em primeira edio em 1536, mas foi sistematicamente revisada e ampliada por ele nos anos subsequentes, o que deixa evidente esta perspectiva. Nela, temos uma sntese do pensamento de Calvino. Sua estrutura compreende 80 captulos, distribudos em quatro livros, e alterou-se completamente at 1559, ano da ltima edio por ele preparada. O primeiro livro traz a descrio das fontes do conhecimento de Deus, aborda a revelao, o conhe-cimento natural e bblico acerca de Deus, o dogma da Trindade e o ensino sobre a providncia divina. O segundo livro centra o interesse na cristologia: encarnao, ensino sobre as duas na-

    Notre Dame em Paris. (Nota da IHU On-Line)7 Martin Bucer (1491-1551): reformador pro-testante que influenciou Lutero, Calvino e as doutrinas e prticas anglicanas. Era membro da ordem dominicana. (Nota da IHU On-Line)

    Lutero e Calvino so

    referncias fundamentais

    para a teologia e o

    protestantismo

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    turezas de Cristo, seu trplice minist-rio de Cristo como profeta, sacerdote e rei, e a unidade entre antiga e nova aliana. O terceiro tematiza a obra do Esprito Santo e a vida crist com suas facetas, que so o levar a cruz, a au-tonegao, a meditao sobre a vida futura, a liberdade crist e a orao. Aqui tambm aborda a justificao por graa e f em perspectiva forense e desenvolve suas compreenses sobre predestinao e ressurreio. O quar-to livro, por sua vez, o mais detalha-do. Nele, Calvino trata da obra exter-na do Esprito, o ensino sobre Igreja, ministrios, disciplina na vida crist e sacramentos. A passagem em que discute os meios pelos quais a pessoa permanece em comunho com Cristo concluda com um pargrafo sobre a autoridade, qual dada a tarefa de promover o culto exterior e prote-ger a doutrina correta e a posio da Igreja, que proporciona a comunho entre as pessoas. No prefcio de Ins-titutas, Calvino revela a inteno de preparar estudantes de teologia para a leitura da palavra de Deus. Afirma querer ser, em primeira linha, telogo da Escritura. O que ensinou do plpito e da ctedra em suas aulas de exegese bblica estaria sistematizado na obra para auxiliar telogos e professores de religio. A exegese bblica deveria acontecer exclusivamente para o bem das pessoas na Igreja, ou seja, o tex-to deveria ser interpretado em funo da prxis eclesial. As maiores virtudes de quem interpreta a Bblia seriam a clareza e a brevidade. Como autnti-co representante do humanismo bbli-co francs, trabalhava com extremo cuidado do ponto de vista histrico e filolgico.

    IHU On-Line - Quais seriam os princi-pais pontos de convergncia e diver-gncia entre Calvino e Lutero? Ricardo Rieth - Lutero e Calvino so referncias fundamentais para a te-ologia e o protestantismo. natural, portanto, que se busque comparar seus legados intelectuais, buscando neles elementos que justifiquem a aproximao ou o afastamento entre denominaes surgidas por iniciati-va de seus herdeiros. Inmeras abor-

    dagens desenvolvidas em distintas escolas de pesquisa sobre a teologia da Reforma ousaram empreender es-tudos comparativos, dando nfase ao lado da divergncia. Assim, trabalhos comparando modelos de constituio eclesistica, concepes a respeito da Santa Ceia e noes acerca dos dois reinos e do senhorio de Cristo merece-ram lugar destacado. Com frequncia, deixou-se de lado o grande nmero de aspectos convergentes entre Cal-vino e Lutero, dando a entender que discrepncias e divergncias seriam o decisivo e primordial. Isso muitas ve-zes contribuiu para que se promovesse

    uma abordagem carente de equilbrio e bom senso. Mais ou menos um ano antes da morte de Lutero, Calvino lhe escreveu uma carta. Pediu-lhe para escrever em poucas palavras qual sua opinio sobre os nicodemitas na Frana, bem como sua opinio acerca do escrito em que ele, Calvino, rejei-tava sua prtica de, mesmo assumin-do uma conscincia evanglica, seguir participando de cerimnias conforme o rito romano. Melanchthon,8 portador

    8 Philipp Melanchthon (1497-1560): reforma-dor alemo. Colaborador de Lutero, redigiu a Confisso de Augsburgo (1530) e converteu-se no principal lder do luteranismo aps a morte do prprio Lutero. (Nota da IHU On-Line)

    da carta de Calvino, no se atreveu a entreg-la a Lutero. Calvino escreveu: Ao mui excelente pastor da Igreja crist, Dr. M. Lutero, meu mui vene-rado pai. Concluiu com as palavras: Ah, pudesse eu escapar at vossa presena, mesmo que fosse para usu-fruir somente algumas horas de teu convvio. Pois desejaria muito conver-sar contigo no s sobre essa questo, mas falar pessoalmente sobre todos os outros assuntos. O que, porm, no possvel na Terra, logo ser possvel, eu espero, no reino de Deus. Viva bem, tu, homem mais que famoso, tu, o mais excelente servo de Cristo, para mim um pai constantemente conside-rado. Que o Senhor continue a condu-zir-te com seu Esprito at o fim, para o bem comum de sua Igreja. Teu Joo Calvino. Pena que por tanto tempo as atitudes de luteranos e calvinistas, uns em relao aos outros, pautaram-se pelo completo descompasso em re-lao a este esprito.

    IHU On-Line - Que possibilidades de dilogo inter-religioso se abrem a partir do calvinismo hoje?Ricardo Rieth - No campo das doutrinas e ideias teolgicas, Calvino se esforou ao mximo pela unidade de pensamento e na pregao. Os religiosos de Genebra e cercanias tinham a obrigao, junta-mente com outros membros da comu-nidade, de participar toda sexta-feira, a partir das 7 horas da manh, de uma reunio de estudos. Pela ordem, cada participante tinha que interpretar um texto bblico, sendo avaliado por todo o grupo. No caso de Calvino, no se tratava de disciplinar obsessivamente a teologia e o pensamento. Considerando sua pos-tura de um modo geral, possvel verifi-car uma tenso dialtica entre o esforo por uma unidade fechada na doutrina e a abertura ecumnica. Esse segundo as-pecto se manifestou nos dilogos religio-sos, dos quais Calvino participou, e na relao com outros reformadores, como, por exemplo, Filipe Melanchthon. H in-meros impulsos advindos do pensamento e da prtica de Calvino que encorajaram e seguem encorajando pessoas crists e pessoas religiosas em geral ao dilogo e a prticas ecumnicas e inter-religiosas.

    Seria mais apropriado,

    portanto, falar em uma

    teocracia do conselho

    municipal de Genebra do

    que em uma teocracia de

    Calvino. Para entender

    o pensamento poltico-

    religioso de Calvino,

    preciso ter por

    referncia o contexto

    poltico em que ele

    viveu

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    IHU On-Line - Calvino queria instau-rar uma teocracia? Por qu?Ricardo Rieth - Em geral, a atuao de Calvino em Genebra caracterizada pelo termo teocracia. No entanto, os conflitos com o conselho municipal, especialmente na questo da prtica da disciplina na Igreja, demonstram o quanto as autoridades municipais conseguiram impor seu poder sobre a Igreja e o quanto Calvino, como mem-bro do clero local, acabou submetido a isso. Seria mais apropriado, portanto, falar em uma teocracia do conselho municipal de Genebra do que em uma teocracia de Calvino. Para entender o pensamento poltico-religioso de Cal-vino, preciso ter por referncia o contexto poltico em que ele viveu. O que observamos em Genebra em rela-o s determinaes rigorosas quanto disciplina na Igreja e na moral crist, ou ento, com relao unio entre Igreja e Estado, no era incomum ou excepcional na Europa do sculo XVI. Representava, isso sim, uma tendncia crescente no incio da era moderna. O que talvez possa ser considerado inco-mum era a personalidade de Calvino, que defendia incondicionalmente as determinaes do alto do plpito e perante o conselho municipal. Desen-volveu, assim, uma teologia que pri-mava pela santificao da comunidade de f. Uma rpida anlise da pesquisa especializada deixa evidente a dificul-dade de rotular o conjunto de ideias poltico-religiosas desse reformador. Alm de teocracia, fala-se em governo realizado a partir da Bblia (bibliocra-cia), por inspirao do Esprito Santo (pneumatocracia) e pelo clero (cle-rocracia). Em sntese, teocracia tem o sentido de governo realizado pelo clero, e isso foi algo terminantemente rejeitado por Calvino.

    Leia Mais...Ricardo Willy Rieth j concedeu outra en-

    trevista IHU On-Line. Ela est disponvel na pgina eletrnica do IHU (www.ihu.unisinos.br)

    * Entre a cidadania teolgica e a esquizofrenia acadmica. Notcias do Dia 24-04-2008, dispon-vel para download em http://www.ihu.unisinos.br/index.php?option=com_noticias&Itemid=18&task=detalhe&id=13419

    Leonildo Silveira Campos matiza a percepo da Reforma e aponta a teoria da complexidade como importante para com-preender seu estudo nas diferentes tradies que teve. Calvi-nismo e neopentecostalismo possuem vrias incompatibilida-des, assinala

    Por Mrcia Junges

    De acordo com o ponto de vista do filsofo e telogo Leonildo Silveira Campos, a Reforma no pode ser vista somente como uma guerra entre catlicos e protestantes. Os vrios movimentos reformadores tambm tiveram o irmo reformado como inimigo. Alm disso, continua, preciso aplicar a teoria da complexidade ao estudo das

    reformas, o que nos auxilia a compreender e localizar cada uma das tradies reformadas (luterana, zwingliana, calvinista, anglicana ou radical-anabatista) de tenses, conflitos e diferentes propostas de reforma. Analisando possveis pontos de proximidade entre o calvinismo e o neopentecostalismo, em espec-fico a Igreja Universal do Reino de Deus (IURD), Campos conclui que a questo da prosperidade no justifica uma aproximao do calvinismo com a IURD. Esta uma Igreja que conseguiu assimilar elementos da religiosidade popular catlica, indgena e africana, mesclando com elementos da ps-modernidade e de sua vertente religiosa a Nova Era. As declaraes fazem parte da en-trevista a seguir, concedida, por e-mail, IHU On-Line.

    Graduado em Filosofia pela Faculdade de Filosofia, Cincias e Letras de Mogi das Cruzes, cursou Teologia pela Igreja Presbiteriana Independente do Brasil. Seu mestrado e doutorado foram realizados na Universidade Metodista de So Paulo - Umesp, com a tese Teatro, templo e mercado: uma anlise da organizao, rituais, marketing e eficcia comunicativa de um empreendi-mento neopentecostal - a Igreja Universal do Reino de Deus (Petrpolis: Vo-zes, 1997). Atualmente, professor da Umesp e da Faculdade de Teologia da Igreja Presbiteriana Independente do Brasil. Confira a entrevista.

    A Reforma 500 anos depois de Calvino

    IHU On-Line - Que diferenas h en-tre a reforma luterana e calvinista?Leonildo Silveira Campos - Prefiro no buscar inicialmente as diferenas entre o sistema luterano e o calvinis-ta no nvel da teologia ou da filosofia. Tomo como ponto de partida a viso das cincias sociais, que privilegiam o contexto histrico e social em que surgiu a Reforma (ou as reformas protestantes) no sculo XVI. Essa perspectiva nos permite perceber o

    cenrio em que se deram as reformas como um objeto plural, multifaceta-do e complexo. Essa viso levou Car-ter Lindberg (As reformas na Europa. So Leopoldo, Sinodal: 2001) a insis-tir que no estamos diante de uma, mas de vrias reformas religiosas na Europa recm sada da Idade Mdia.

    A viso multifacetada do movimento reformado fica ainda mais desafiadora para o analista quando ele nota o surgi-mento, em diversas regies da Europa,

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    de verses locais do que algum porta-dor de paradigmas simplistas pense ser um s movimento de reforma. Portanto, a teoria da complexidade, se aplicada ao estudo das reformas, nos ajuda na com-preenso e localizao em cada uma das tradies reformadas (zwingliana,1 calvi-nista, anglicana2 ou radical-anabatista3) de tenses, conflitos e diferentes pro-postas de reforma.

    H tambm a questo da anlise dos movimentos reformados na linha do tempo. Em que datas as reformas comearam? Na tarefa de responder a essa questo, paira sempre o risco do que Marc Bloch4 (Apologia da histria ou ofcio do historiador. Rio de Ja-neiro: Jorge Zahar Editor, 2001, p.56) chamou de dolo das origens. Quan-do por ele influenciados, pensamos poder demarcar o tempo, a data exata em que tais coisas tiveram o seu incio. Isto quer dizer ser quase impossvel afirmar que os movimentos de reforma protestante comearam com Lutero, Zwinglio ou Calvino, e nem que este ou aquele movimento terminou com a morte do lder que mais visibilidade lhe deu. Alm dos lderes h os suces-sores. Todos eles contriburam, acen-tuaram tendncias e ajudaram a dar rumos a um empreendimento muito mais coletivo e nada pessoal.

    1 Zwinglianismo: movimento criado pelo pas-tor reformador Huldrych Zwingli, pretendeu fazer a Igreja retornar simplicidade original. Caracteriza-se por um humanismo, um radica-lismo e tambm um racionalismo estranhos ao luteranismo. (Nota da IHU On-Line)2 Anglicanismo: tambm denominado como Igreja da Inglaterra, uma igreja crist esta-belecida oficialmente na Inglaterra e o tronco principal da Comunho Anglicana Mundial. Fora da Inglaterra, a Igreja Anglicana denomina-da Igreja Episcopal, pricipalmente nos Estados Unidos e na Austrlia. (Nota da IHU On-Line)3 Anabatismo: cristos da chamada ala radi-cal da Reforma Protestante. So assim cha-mados porque os convertidos eram batizados em idade adulta, desconsiderando o at ento batismo obrigatrio da igreja romana. Assim, re-batizavam todos os que j tivessem sido batizados em criana, crendo que o verdadei-ro batismo s tem valor quando as pessoas se convertem conscientemente a Cristo. (Nota da IHU On-Line)4 Marc Lopold Benjamim Bloch (1886-1944): historiador francs notrio por ser um dos fundadores da Escola dos Annales e morto pe-los nazis durante a Segunda Guerra Mundial. Considerado um dos maiores medievalistas de todos os tempos. Os seus trabalhos e pesquisas abriram novos horizontes nos estudos sobre o feudalismo. (Nota da IHU On-Line)

    Cristalizao x dinamismo e continuidade

    Nessa mesma linha de indagao, po-demos perguntar pela tenso que sempre surge entre a tendncia das instituies pela cristalizao e dos movimentos pelo dinamismo e continuidade. O que acon-tece quando um movimento reformador se torna uma instituio reformada? Al-guns reformados procuraram manter o dinamismo colocando como meta a ex-presso ecclesia reformata semper re-formanda. Por sua vez, Paul Tillich5 (A era protestante. So Paulo: Cincias da Religio, 1992) captou bem as tenses e crises da era protestante ao falar no conflito entre princpio protestante e instituio protestante. Para ele, o acirramento da modernidade levou o protestantismo a se tornar uma institui-o esvaziada do princpio proftico, pois, a energia desencadeada no se fi-xou nas instituies reformadas, muito

    5 Paul Tillich (1886-1965): telogo alemo, que viveu quase toda a sua vida nos EUA. Foi um dos maiores telogos protestantes do scu-lo XX e autor de uma importante obra. Entre os livros traduzidos em portugus, pode ser consultado Coragem de Ser (6 ed. Editora Paz e Terra, 2001) e Amor, Poder e Justia (Edi-tora Crist Novo Sculo, 2004). (Nota da IHU On-Line)

    pelo contrrio, elas emigraram para os movimentos revolucionrios laicos.

    Por fora do ofcio, estou habituado, nos ltimos 30 anos, a olhar os fenme-nos religiosos a partir de uma perspectiva das cincias sociais aplicadas ao estudo da religio. Nesse esforo, tenho privile-giado dois autores, entre outros, Pierre Bourdieu6 e Karl Mannheim.7 De Pierre Bourdieu (Economia das trocas simbli-cas. So Paulo: Perspectiva, 1982, p. 92) tenho usado a teoria do campo religioso. Para Bourdieu, o campo um espao so-cial marcado por conflitos e lutas entre agentes e instituies. Entre os diversos agentes em luta esto sacerdotes e pro-fetas. Os primeiros tentam reproduzir e dar continuidade instituio tal como ela se encontra. J os profetas esto comprometidos com as mudanas. Nos tempos da reforma protestante, quem eram profetas e sacerdotes? Por que sa-cerdotes surgem mais tarde e se tornam hegemnicos em movimentos marcados pelo dinamismo da tradio proftica?

    Para Bourdieu, um profeta na sua luta contra os sacerdotes se baseia na fora do grupo que mobiliza por meio

    6 Pierre Bourdieu (1930 - 2002) socilogo francs. De origem campesina, filsofo de for-mao, chegou a docente na cole de Socio-logie du Collge de France, instituio que o consagrou como um dos maiores intelectuais de seu tempo. Desenvolveu, ao longo de sua vida, mais de trezentos trabalhos abordando a questo da dominao, e , sem dvida, um dos autores mais lidos, em todo mundo, nos campos da Antropologia e Sociologia, cuja contribuio alcana as mais variadas reas do conhecimento humano, discutindo em sua obra temas como educao, cultura, literatura, arte, mdia, lingstica e poltica. Seu primei-ro livro, Sociologia da Arglia (1958), discute a organizao social da sociedade cabila, e em particular, como o sistema colonial interferiu na sociedade cabila, em suas estruturas e des-culturao. Dirigiu, por muitos anos, a revista Actes de la recherche en sciences sociales e presidiu o CISIA (Comit Internacional de Apoio aos Intelectuais Argelinos), sempre se posicio-nado clara e lucidamente contra o liberalismo e a globalizao. (Nota da IHU On-Line)7 Karl Mannheim (1893-1947): socilogo ju-deu nascido na Hungria. Iniciou seus estudos de filosofia e sociologia em Budapeste parti-cipando de um grupo de estudos coordenado por Georg Lukcs. Estudou tambm em Berlim, onde ouviu as prelees de Georg Simmel, e Paris. Em Heidelberg, onde Mannheim foi alu-no do socilogo Alfred Weber, irmo de Max Weber, tornou-se privatdozent a partir de 1926. Foi professor extraordinrio de sociolo-gia em Frankfurt a partir de 1930. Em 1933, com a ascenso do nazismo Mannheim deixou a Alemanha para tornar-se professor da London School of Economics, na Inglaterra. (Nota da IHU On-Line)

    Para ele, o acirramento

    da modernidade levou

    o protestantismo a se

    tornar uma instituio

    esvaziada do princpio

    proftico, pois, a

    energia desencadeada

    no se fixou nas

    instituies reformadas,

    muito pelo contrrio,

    elas emigraram para os

    movimentos

    revolucionrios laicos

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    de sua aptido para simbolizar em uma conduta exemplar ou em um discurso os interesses propriamente religiosos de leigos que ocupam uma determina-da posio na estrutura social. Apli-cando-se o seu pensamento Reforma protestante, Lutero, Calvino ou Zwin-glio, e seus seguidores, somente deram continuidade ao projeto de reforma porque as aspiraes que j existiam antes dele(s), ainda que de um modo explcito, semiconsciente ou incons-ciente, estavam sintonizadas com um momento social adequado.

    Nesse sentido, um profeta ou re-formador um indivduo isolado, sem passado, destitudo de qualquer cauo a no ser ele mesmo, agindo sobre a realidade com uma fora organizadora e mobilizadora. dessa forma que um movimento proftico d origem a uma nova forma de composio no cenrio religioso ou poltico. Tambm por tais motivos que cada um desses reforma-dores, ao questionar a organizao reli-giosa a qual pertence, dela recebe des-prezo e oposio. Isto porque, segundo Bourdieu (p.93), a empresa burocrtica de salvao incondicionalmente hostil ao carisma pessoal, isto , proftico, mstico ou exttico. No caso dos refor-madores, o carisma pessoal pode ser vis-to como um fator capaz de perturbar a ordem eclesistica, mas a sua continui-dade dependeu essencialmente do apoio recebido dos leigos.

    Lendo os sinais dos tempos

    Mas, um reformador incomoda quando pretende indicar um cami-nho original em direo a Deus dife-rente do que tem sido proposto pela instituio religiosa. Mas, por que uns tem sucesso onde outros fracassaram? Ora, Lutero e Calvino tiveram suces-so nessa empreitada justamente onde outros anteriormente nada consegui-ram. O segredo do sucesso foi porque eles conseguiram conciliar a demanda popular nas regies em que atuaram com uma proposta de reformulao da viso religiosa de mundo por parte dos leigos. Para Bourdieu (p.94), esta capacidade de ler os sinais dos tem-pos que tornam um determinado in-divduo (...) socialmente predisposto a sentir e a exprimir, com uma fora

    e uma coerncia particulares, disposi-es ticas ou polticas, j presentes, de modo implcito, em todos os mem-bros da classe ou do grupo de seus des-tinatrios.

    Consequentemente, Lutero e Calvi-no, e at certo ponto Zwinglio, diferen-tes de Joo Huss,8 Wycliff9 ou Savonaro-la10, conseguiram um rpido e duradouro sucesso em seus respectivos projetos de reforma da Igreja crist. Isto porque o sucesso de cada um deles se alimentou de condies peculiares, e, com isso, produziram formas diferenciadas de pro-testantismos. Lutero atuou na Alema-nha; era fiel aos prncipes que o apoia-ram politicamente; refletia concepes teolgicas mais adaptadas a um mundo marcadamente campons. Enquanto isso, Calvino mantinha suas ligaes com o mundo capitalista que estava se iniciando; tinha como cenrio a cidade-estado Genebra, com um governo repre-sentativo, no qual ele era a eminncia parda e que se tornaria um sistema poltico ideal para a democracia ociden-tal. Calvino se preocupou com questes econmicas, sugerindo normas sobre a riqueza, posses, comrcio, organizao poltica da cidade, baseado em uma preocupao humanista com as pessoas destitudas de recursos econmicos. Ao contrrio de Lutero, e dos telogos ca-tlicos medievais, Calvino via o lucro de uma forma positiva.

    A proposta de reforma de Calvino foi considerada por Andr Biler,11 um dos maiores especialistas na Frana a

    8 Jan Hus (1369-1415): pensador e reformador religioso. Iniciou um movimento religioso ba-seado nas ideias de John Wycliffe. Os seu se-guidores ficaram conhecidos como os Hussitas. A igreja catlica no perdoou tais rebelies e ele foi excomungado em 1410. Condenado pelo Conclio de Constana, foi queimado vivo. (Nota da IHU On-Line)9 John Wycliffe (1320-1384); telogo e refor-mador religioso ingls, considerado precursor das reformas religiosas que sacudiram a Euro-pa nos sculos XV e XVI. Trabalhou na primeira traduo da Bblia para o idioma ingls, que ficou conhecida como a Bblia de Wycliffe. (Nota da IHU On-Line)10 Girolamo Savonarola (1452-1498): tambm conhecido como Jernimo Savonarola ou Hie-ronymous Savonarola, foi um padre dominica-no e, por curto perodo, governou Florena. Reformador dominicano, era um intelectual muito talentoso e devotado a seus estudos, em especial filosofia e medicina. (Nota da IHU On-Line)11 Andr Biler (1914-2006): telogo suo, professor nas Universidades de Genebra e Lau-sanne. (Nota da IHU On-Line).

    enfocar o humanismo social de Calvino, (O pensamento econmico de Calvino. So Paulo: Casa Editora Presbiteriana, 1990) como uma reforma integral da sociedade. Para ele, o calvinismo te-ria se tornado uma fora permanente de transformao poltica e social ao propor novas estruturas para a socie-dade, as quais deveriam inibir e elimi-nar as foras destrutivas da Igreja e da Sociedade, entre elas o naciona-lismo religioso, a mstica revolucion-ria, o militarismo e a teocracia.

    Para Biler, a vida econmica e as reformas sociais propostas por Calvino desafiavam a atuao da Igreja em uma reforma integral da sociedade no senti-do poltico, social, econmico e espiri-tual. Essa atuao implicava no estabe-lecimento de regras para a produo da riqueza, no atendimento dos pobres, na distribuio equitativa dos bens entre ricos e pobres. Insistia tambm Calvino que a propriedade deveria ser defendida do furto, cabendo ao Estado uma funo reguladora da economia, da ordem ju-rdica, do comrcio, da propriedade e da escravido. Por isso mesmo, a ativi-dade dos banqueiros, dos mercadores, dos que emprestavam dinheiro a juros, e as relaes entre devedores e credo-res recebiam uma ateno especial nas ordenanas e na reflexo teolgica de Calvino.

    Talvez algumas das diferenas en-tre a proposta reformadora de Lutero e a de Calvino tenham sido bem cap-tadas por R. H. Tawney12 (A religio e o surgimento do capitalismo. So Paulo: Perspectiva, 1971, p.109): o Calvinismo foi uma fora ativa e ra-dical. Era um credo que buscava no somente purificar o indivduo, mas ainda reconstruir a Igreja e o Estado, e renovar a sociedade, permeando to-dos os setores da vida, tanto pblicos como privados, com a influncia da re-ligio. Lutero teria sido mais mstico, submisso aos poderes polticos, ligado s questes microeconmicas do mun-do rural e da pequena cidade. Enquan-to Calvino e seus seguidores, segundo Tawney (p.110) abordaram a realidade como homens de negcios, enraiza-dos numa realidade urbana. Da o sur-gimento de teologias diferentes, pois,

    12 Richard Henry Tawney (1880-1962): histo-riador ingls. (Nota da IHU On-Line)

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    refletiam relaes e molduras scio-econmicas diferenciadas.

    IHU On-Line - Que comemoraes mar-caram o quinto centenrio de Calvino e qual foi o significado dessa redesco-berta de Calvino por parte deles? Leonildo Silveira Campos - Neste ano de 2009, presbiterianos e reformados do mundo todo, sob a liderana da Aliana Reformada Mundial, com sede em Genebra, comemoraram o quinto centenrio do nascimento de Joo Cal-vino (1509-1564). Os reformados, 75 milhes no mundo, relembraram que Calvino, para fugir das perseguies movidas na Frana aos huguenotes,13 se estabeleceu em Genebra (1536), onde iniciou uma reforma religiosa e social que iria atingir outras partes da Europa, especialmente a Inglater-ra, Esccia, os Pases Baixos, a Fran-a e, mais tarde, os Estados Unidos. No ano anterior, em Basilia, Calvino com apenas 26 anos de idade, escre-veu o mais completo texto de teologia protestante do sculo XVI, A institui-o da religio crist, mais conhecida como Institutas. Ao longo de sua vida, no muito longa, Calvino conseguiu plasmar Genebra de uma forma tal que fez com ela se tornasse a cidade cosmopolita, internacional e de maio-ria catlica que nos dias de hoje. Ainda hoje a Catedral de So Pedro o lugar em que as autoridades da cidade tomam posse de seus respectivos man-datos polticos.

    No Brasil, as igrejas presbiteria-nas realizaram celebraes em vrias datas e lugares. Em Genebra, houve uma grande concentrao, para onde lderes de centenas de igrejas presbi-terianas e reformadas se dirigiram. A reforma de Genebra, que iniciou antes de Calvino e foi reforada com a sua chegada cidade em 1536, no deve ser vista como um fato independente ou isolado de outras reformas e movi-mentos que estavam acontecendo na Europa. Desde 1517, na Alemanha com Lutero, e na Sua com Zwinglio, a par-tir de 1525, havia um pipocar de refor-mas, estimuladas por uma mudana de mentalidade e de cultura, sintetizadas

    13 Huguenote: denominao dada aos pro-testantes franceses (quase sempre calvinis-tas) pelos seus inimigos nos sculos XVI e XVII. (Nota da IHU On-Line)

    nas palavras Renascimento e Hu-manismo.

    A cristandade, especialmente a que se originou na reforma protes-tante, deve ser vista como um campo de batalha. Este um outro conceito que temos tomado de Pierre Bourdieu, para quem o espao religioso marca-do por lutas. Nele, os agentes sempre se encontram divididos e em situao de conflito. Os reformados nunca esti-veram fora dessa regra. Eles lutavam contra o catolicismo, mas tambm contra as diversas verses de protes-tantismos que foram surgindo nas d-cadas e sculos posteriores a Lutero. As guerras religiosas custaram a vida de Zwinglio, que morreu em um campo de batalha, e de milhares de catlicos e protestantes no decorrer do sculo da Reforma e da Contra Reforma Cat-lica. Mas a Reforma no pode ser vista somente como uma guerra entre cat-licos e protestantes. Os vrios movi-mentos reformadores tambm tiveram o irmo reformado como inimigo. A revolta dos camponeses (1525) deixou isso bem claro e foi esmagada com o apoio de Lutero, amigo dos prncipes. Calvino, por sua vez, agiu com mo de ferro contra os hereges, entre eles Miguel Serveto.14 Rubem Alves (Protes-

    14 Miguel Serveto (1511-1553): telogo, mdi-co e filsofo aragons, humanista, interessan-do-se por assuntos como astronomia, meteoro-logia, geografia, jurisprudncia, matemtica, anatomia, estudos bblicos e medicina. Servet foi o primeiro a descrever a circulao pul-monar. Participou da Reforma Protestante e, posteriormente, desenvolveu uma cristologia no-trinitariana. Condenado por catlicos e protestantes, ele foi preso em Genebra e quei-mado na fogueira como um herege por ordem do Conselho de Genebra, presidido por Joo

    tantismo e represso. So Paulo: ti-ca, 1979) usou Ernst Troeltsch15 para apontar para a continuidade de certa tradio inquisitorial que nasceu entre calvinistas e se aninhou no interior de brasileiros que ele classificou como defensores do protestantismo da reta doutrina. Essa tentao inquisitorial levou Alves a duvidar que Calvino te-nha deixado um legado inteiramente democrtico e liberal. Nos meios pro-testantes brasileiros, explodiu uma inquisio sem fogueiras, especial-mente nos anos da Ditadura Militar (1964-1985).

    IHU On-Line - Como se deu o dilogo entre os prprios protestantes e at onde ele foi possvel?Leonildo Silveira Campos - O protes-tantismo nasceu do rompimento do dilogo com o catolicismo romano. Seria natural, portanto, pensarmos que a tendncia seria surgir entre os reformados o sentimento de serem eles membros de um s corpo e por-tadores de uma s doutrina. Porm, nada mais distante da realidade. O movimento reformado optou por um modelo oposto ao de centrifugao. Em suas respectivas trajetrias de ex-panso quanto mais distante do centro irradiador, mais mudanas e transfor-maes. Somente no final do sculo XIX e primeira metade do sculo XX que certas parcelas do protestantismo optariam pelo dilogo interno e com a Igreja Catlica.

    No se podia, portanto, imaginar que as teologias pudessem ajudar no dilogo dos protestantes entre si. Os dogmticos e inquisidores, tal como aponta Rubem Alves, no conseguem imaginar uma situao em que o dilo-go seja uma forma de aprendizagem. Os que se sentem donos da verdade no se interessam por qualquer tipo de dilogo. O objetivo de qualquer encontro fundamentado na polmica levar o adversrio ao cho, e no a

    Calvino. (Nota da IHU On-Line)15 Ernst Troeltsch (1865-1923): telogo ale-mo protestante, escritor de tratados de filo-sofia da religio e filosofia da histria, alm de influente figura no pensamento do seu pas de-pois de 1914. Seu trabalho era uma sntese de um nmero de ideias desenhadas por Albrecht Ritschl, concepes de Max Weber sobre socio-logia e dos neokantianos da Escola de Baden. (Nota da IHU On-Line)

    Ser um abenoado

    filho de Deus ser um

    consumidor de todos os

    bens materiais que

    foram, segundo a IURD,

    colocados disposio

    dos autnticos filhos de

    Deus

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    aprender algo com ele. Por exemplo, Lutero, Zwinglio e seus seguidores debateram longamente a respeito da Eucaristia ou da Santa Ceia. A discus-so era se Cristo estava presente na celebrao ou se tudo aquilo no pas-sava de um smbolo conforme queria Zwinglio. Lutero acusava Zwinglio de defender uma heresia j condenada no passado a posio nestoriana a respeito da natureza humana e divina de Jesus. Somavam-se a isso diferen-as entre os reformadores quanto presena da arte, especialmente da msica no culto reformado.

    J calvinistas e luteranos se opuse-ram aos anabatistas em relao ao ba-tismo infantil, admitindo como vlido somente o batismo por imerso. Por sua vez, Zwinglio considerava os ana-batistas adversrios do governo suo institudo por causa da recusa deles em fazer juramento, de pagar impos-tos e em participar do servio militar, elementos bsicos da cidadania. Alis, as opinies de calvinistas e luteranos se dividiam quanto s formas de se re-lacionar com a sociedade politicamen-te organizada. Harro Hpfl (Sobre a autoridade secular. So Paulo: Martins Fontes, 2005) reuniu e comentou dois dos textos mais famosos de Calvino e de Lutero: Sobre o governo civil, do primeiro, e Sobre a autoridade se-cular do segundo. O grande desafio para os reformadores protestantes era conciliar o que era entendido como a vontade de Deus exposta nas Escri-turas com os desafios da ordenao poltica da sociedade europeia.

    IHU On-Line - Que metodologia pode-se usar para o estudo das reformas protestantes do sculo XVI?Leonildo Silveira Campos - A historio-grafia atual tem desconfiado do em-prego do mtodo biogrfico no estudo da histria e da teologia da reforma. No contexto desse marco terico, no se deve valorizar muito cada um dos reformadores. Essa tendncia meto-dolgica evoluiu para uma historiogra-fia totalmente avessa ao estudo dos grandes heris. Porm, para mim, esse um recurso que ao ser usado com cuidado pode oferecer ganhos para os historiadores interessados em

    examinar trajetrias e histrias de vida de alguns personagens escolhidos como os mais representativos de um determinado movimento. claro que essa tarefa corre o risco de no atin-gir o seu objetivo. Especialmente se o pesquisador se entregar a uma histo-riografia que valorize apenas os he-ris, esquecendo-se das foras hist-ricas ou sociais que plasmaram essas biografias e lideranas. Ora, so tais foras que os levaram a uma sintonia com as aspiraes, desejos e necessi-dades de um conjunto de indivduos situados em uma determinada poca e lugar. Parece-me ser esse um dos ris-cos que correm muitos dos filhos de Calvino neste ano de comemorao do quinto centenrio de seu nascimen-to. Nas publicaes empenhadas nessa comemorao vrias releituras foram feitas de Calvino. H uma expresso muito conhecida dos historiadores, no me lembro se de Croce ou de Marc Bloch: o homem muito mais filho de seu tempo do que de seus pais. Como chegar ao tempo da reforma protes-tante do sculo XVI atravs de um estudo de um de seus filhos? Que es-tudo pode ser feito das contribuies dos filhos (de Calvino, por exemplo) obra e pensamento de seus pais? No teria Max Weber16 relacionado muito mais a tica protestante dos calvi-nistas do sculo XVII com o esprito do capitalismo do que o pensamento do prprio Calvino?

    O mtodo biogrfico aplicado a Joo Calvino tem muita utilidade na reconstruo de uma determinada sociedade ou grupo social a partir do testemunho dele e de seus seguidores.

    16 Max Weber (1864-1920): socilogo alemo, considerado um dos fundadores da Sociologia. tica protestante e o esprito do capitalismo (Rio de Janeiro: Companhia das Letras, 2004) uma das suas mais conhecidas e importantes obras. Cem anos depois, a IHU On-Line dedi-cou-lhe a sua 101 edio, de 17-05-2004, inti-tulada Max Weber. A tica protestante e o esp-rito do capitalismo 100 anos depois, disponvel para download em http://www.unisinos.br/ihuonline/uploads/edicoes/1158261116pdf.pdf. De Max Weber o IHU publicou o Cader-nos IHU em Formao n 3, 2005, chamado Max Weber o esprito do capitalismo. Em 10-11-2005, o professor Antnio Flvio Pierucci ministrou a conferncia de encerramento do I Ciclo de Estudos Repensando os Clssicos da Economia, promovido pelo IHU, intitulada Re-laes e implicaes da tica protestante para o capitalismo. (Nota da IHU On-Line)

    No caso do calvinismo, os sonhos, an-seios, desejos e sofrimento das pesso-as de sua poca podem ser acessados por meio da anlise de seus textos. Nos livros de Calvino, h sistematiza-o teolgica, ordenanas civis e ecle-sisticas, comentrios bblicos e litur-gias. Mas, antes de serem escritos de Calvino, tais documentos devem ser vistos como fragmentos da vida coti-diana de perseguidos poltico-religio-sos da Frana, que se refugiaram em Genebra. Eles podem nos revelar mais do que o simples exame das formula-es doutrinrias da prpria Confisso de F de Westminster (preparada por uma assembleia entre 1643-46) para subsidiar a unificao entre o protes-tantismo escocs e o ingls.

    Calvino pode ser visto como a pon-ta de um iceberg capaz de demarcar as fronteiras do pensamento teolgico em um momento histrico de turbilho re-ligioso. Consequentemente, quando da origem e expanso de seus respectivos movimentos, um biografado age como se fosse uma boia viva que flutua em um mar agitado. Calvino, no entanto, pode ser visto assim nesse contexto em que um lder adotado por milhares de pes-soas em processo coletivo de recomposi-o de crenas e prticas quase sempre opostas s principais receitas monopo-lizadas pelas igrejas e movimentos de onde saram, foram expulsos ou para elas nunca mais voltariam. Assim ocor-reu com o surgimento de denominaes crists na Inglaterra e nas colnias ingle-sas da Amrica do Norte, no sculo XVII. Em suma, Calvino, Lutero, John Knox17 e outros so mais do que lderes historica-mente datveis, so personalidades cor-porativas, isto , pessoas que encarna-ram determinados anseios e demandas culturais e histricas.

    IHU On-Line - Que outras contribui-es as cincias sociais podem ofe-recer para o estudo da teologia de Calvino e para o seu dilogo com a modernidade?Leonildo Silveira Campos - Alm da contribuio de Bourdieu, tenho, semelhana de meu mestre e orienta-

    17 John Knox (1514-1572): religioso reforma-dor escocs que liderou uma reforma religiosa na Esccia segundo a linha calvinista. (Nota da IHU On-Line)

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    dor Antonio Gouva Mendona (1922-2007), me reportado aos escritos de Karl Mannheim (Ideologia e utopia. Porto Alegre: Editora Globo, 1954) a respeito das conexes entre o pensa-mento e o contexto social onde ele produzido. Dele deduzo que no con-seguimos compreender bem determi-nados modos de pensamento, inclusive o teolgico, enquanto permanecerem obscuras as suas origens sociais. Para Mannheim o pensamento humano nas-ce e opera, no num vcuo social, mas num meio social definido (p.74). Por-tanto, o pensamento no est divor-ciado do contexto social. Muito pelo contrrio, ele deve ser compreendido dentro da moldura concreta de uma situao histrico-social (p.3). Logo, mudanas e transformaes na base social em que o pensamento se aninha acarretam um esgaramento da lgica ou das relaes coerentes entre pen-samento e sociedade.

    Ora, todo perodo de crise social, econmica e cultural momento de desgaste para sistemas religiosos, as-sim como oportunidade para o surgi-mento de profetas, reformadores ou lderes messinicos. Eles so pessoas que conseguem transcender o momen-to histrico, e buscam apoio nas massas que podero segui-los nesse processo de contestao da ordem estabeleci-da. Assim ocorreu com os reformado-res ao tentarem superar a situao de crise, produzindo experincias, aes e modos de pensamento que somente se tornaram um sucesso em certos lu-gares e pocas (p. 126).

    curioso, todavia, pensar na fora de sistemas teolgicos e religiosos em outros lugares distantes de onde surgi-ram. Sobre isso h necessidade de maio-res consideraes. Porm, basta-nos lembrar que a propagao missionria de um sistema religioso e de pensamen-to se d por meio de um processo de hi-bridizao cultural que nunca pode ser descartado. Em outras palavras, nunca recebemos e inserimos em um novo con-texto certas ideias e formas de religiosi-dade sem o aparecimento de fenmenos como sincretismo ou do hibridismo. Sen-do assim, um o calvinismo de Genebra, outro de John Knox na Esccia, outro que resultou da fixao dos peregrinos

    na Amrica do Norte e de l trazidos por missionrios norte-americanos ao Brasil no sculo XIX.

    Crise do protestantismo histrico

    As ideias, sistemas de pensamento e formas de se entender as relaes entre Deus e a sociedade humana no so impunemente transferidas de um contexto cultural para outro sem mo-dificaes. No h esse elemento imu-tvel que os fundamentalistas chamam de uma f que uma vez foi dada aos santos como num depsito incorrup-tvel. Esse tesouro puro uma mera abstrao intelectual que no condiz com a realidade scio-cultural vivida pelo ser humano.

    Finalmente, as cincias sociais podem

    nos ajudar na compreenso da chamada crise do protestantismo histrico, tam-bm encarada por lentes diferenciadas em funo do cenrio religioso em que tal crise percebida. Na Europa, Jean-Paul Willaime (La prcarit protestante Sociologie du protestantisme contem-porain. Geneve: Labor & Fides, 1992) tem analisado essa crise luz do fen-meno da secularizao, da falta de uma vitalidade que provoque o renascimento e a superao de uma ntida tendncia para a decadncia e esvaziamento. O fundamentalismo e o ecumenismo apa-recem como plos opostos de tentativas de revitalizao. J na Amrica, o pro-

    testantismo que experimenta um longo processo de aclimatao tende, em es-pecial na Amrica Latina, para a pen-tecostalizao e assimilao de valores da cultura religiosa catlica, indgena e africana.

    O culto racional calvinista, a nfase na doutrina da predestinao, o sistema representativo de governo, tem se tor-nado muito mais uma realidade virtual no presbiterianismo brasileiro e latino-americano. O culto presbiteriano recebe uma enorme presso da improvisao e do espontneo jeito pentecostal de cultuar a divindade. H uma absoro do racional pelo ldico e, em especial, pelo louvorzo (uma forma de cnti-cos liderados por jovens devidamente equipados de tecnologias novas em que a congregao toda participa durante 30 ou 40 minutos, com palmas e gingar de corpos, a som de guitarras e baterias). O governo representativo, menina dos olhos de Calvino, distancia-se do desejo da congregao, cujos membros afirmam que no pensam como os presbteros membros do Conselho administrativo lo-cal. Pastores calvinistas imitam bispos pentecostais e catlicos, no exerccio do poder eclesistico, assimilando poderes prprios de uma liderana episcopal ou carismtica.

    Tenho trabalhado com o pressuposto que as cincias sociais nos ajudam a en-tender as precariedades do protestantis-mo brasileiro, em especial, o de tradio calvinista. Se o critrio for crescimento, sucesso no mercado, o presbiterianismo, portador de uma herana calvinista que participava em 34% do grupo de evanglicos em 1930, passou para 7,2% em 1964. Os pentecostais, que eram 9,5% do total de evanglicos em 1930, tornaram-se 77,9% no Censo Demogrfi-co do ano 2000. A sndrome do decrsci-mo est minando o que foi chamado, em certa poca, como a forma de ser pres-biteriano no Brasil e Amrica Latina. Acredito que, nesse cenrio, o presbite-rianismo que ir crescer em nosso pas no ser o herdeiro de Calvino. Haver um salto de qualidade e restaro apenas pequenos grupos calvinistas conservado-res e radicais de um lado e pseudos-cal-vinistas pentecostalizados de outro.

    IHU On-Line - Quais seriam os pos-

    A teologia de Calvino

    est muito longe disso.

    O homem corrupto, a

    maldade tomou conta

    dele desde que nasceu.

    Da a necessidade de

    buscar a graa e a f para

    corrigir essa tendncia

    crnica para o mal

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    sveis pontos comuns entre o calvi-nismo e o neopentecostalismo, em especial da Igreja Universal do Reino de Deus?Leonildo Silveira Campos - A Igreja Uni-versal do Reino de Deus (IURD),18 que te-nho estudado e acompanhado h quase trs dcadas, somente no que se rela-ciona teologia da prosperidade pode parecer ter alguma relao com o calvi-nismo. Max Weber (A tica protestante e o esprito do capitalismo, Edio de Antonio Flvio Pierucci,19 So Paulo. Companhia Das Letras: 2004) chamou a ateno para o esprito de disciplina tra-zido pelo calvinismo, que gerou pessoas interessadas em multiplicar o seu capital por meio de um trabalho no mundo se-cular, semelhante ao trabalho do monge em um convento. A riqueza acumulada passou a ser um sinal da eficincia da vocao e de que a predestinao esta-va evidenciada. Essa tese despertou um enorme debate nestes ltimos 105 anos da publicao da primeira verso daque-le ensaio de Weber.

    No vem ao caso agora explorar em profundidade a tese weberiana. Mas

    18 Igreja Universal do Reino de Deus (IURD): igreja crist protestante, de tendcia pente-costal, fundada no Brasil. Sobre o tema, confira a edio 36 do Cadernos IHU Ideias, intitulada Igreja Universal do Reino de Deus no contexto do emergente mercado religioso brasileiro: uma anlise antropolgica, disponvel para do-wnload em http://www.ihu.unisinos.br/uplo-ads/publicacoes/edicoes/1158330917.43pdf.pdf. Confira, ainda, a entrevista Neopenten-costais e religies afro-brasileiras. Uma guer-ra instituda?, com Vagner Gonalves da Silva, publicada em 14-04-2009, nas Notcias do Dia do IHU, disponvel para download em http://www.ihu.unisinos.br/index.php?option=com_noticias&Itemid=18&task=detalhe&id=21274. Leia, tambm, a entrevista com Toni Andr Scharlau Vieira, A compra da Guaba e do Cor-reio do Povo pela IURD, publicada em 16-03-2007, disponvel em http://www.ihu.unisinos.br/index.php?option=com_noticias&Itemid=18&task=detalhe&id=5696. (Nota da(Nota da IHU On-Line)19 Antnio Flvio de Oliveira Pierucci: soci-logo brasileiro. professor titular do Depar-tamento de Sociologia da Universidade de So Paulo (USP). Concedeu a entrevista intitulada Em defesa da pluralidade e da multicausalida-de, sobre Max Weber, ao IHU On-Line n. 101, de 17-04-2004, disponvel para download em http://www.ihuonline.unisinos.br/uploads/edicoes/1158261116pdf.pdf. Dele, tambm publicamos o artigo O retrovisor polons na IHU On-Line n. 136, de 11-04- 2005. Em 2005 proferiu a conferncia de encerramento do I Ciclo de Estudos Repensando os Clssicos da Economia, intitulada Relaes e implicaes da tica protestante para o capitalismo. (Nota da IHU On-Line)

    curioso que, apesar de defendida ardo-rosamente por poucos, combatida por muitos, o pblico de um modo geral se esqueceu de Sombart20 ou das questes levantadas por R.H. Twney, e a tese de Max Weber continua sendo discutida.

    A IURD, diferente do calvinismo, pre-ga o livre arbtrio, condena a predestina-o como uma heresia criada por Santo Agostinho e no atrai fiis com o esprito de disciplina prprio dos puritanos ingle-ses de origem calvinista. O carro-chefe da pregao iurdiana uma filosofia tambm presente em outros movimentos religiosos no-cristos, como, por exem-plo, em religies orientais do tipo da Seicho-no-ie, ou nos que pregam a fora da mente sobre a organizao da vida fi-nanceira das pessoas. Lair Ribeiro21 seria um bom exemplo laico de praticante e pregador da filosofia da prosperidade.

    Na IURD, a busca da prosperidade para garantir que algum filho de um Deus rico e que no admite ter filhos pobres. O dinheiro (segundo Macedo,22 o sangue da Igreja) a ser conquis-tado, mesmo custa da fidelidade a um Deus presumivelmente rico, a chave para a entrada numa sociedade afluente onde somente o TER bens o que vale. Estar fora da sociedade de consumo, dirigida pelas leis do merca-do, estar fora de uma relao com Deus. Portanto, a converso envolve o redirecionamento da vida financei-ra. Porm, insistimos, o dinheiro no para ficar parado ou para ser reinves-tido no sistema que ir produzir mais dinheiro para o fiel. Ser um abenoa-do filho de Deus ser um consumidor de todos os bens materiais que foram, segundo a IURD, colocados disposi-o dos autnticos filhos de Deus. Da a pregao da autoestima, da crena em suas potencialidades, do despertar

    20 Werner Sombart (1863-1941): socilogo e economista alemo, que influenciou nas ideias de Weber. (Nota da IHU On-Line)21 Lair Ribeiro: escritor, conferencista e pa-lestrante motivacional brasileiro que durante muitos anos atuou como mdico cardiologista. Tem diversos livros, artigos, vdeos e audios na rea da Programao Neurolingustica (PNL). (Nota da IHU On-Line)22 Edir Macedo Bezerra (1945): empresrio e religioso brasileiro, fundador da Igreja Uni-versal do Reino de Deus (IURD), e proprietrio da Rede Record de Televiso. Promotora e de-fensora da Teologia da Prosperidade, a IURD cresceu e tornou-se a quarta maior corrente religiosa do pas, segundo o Censo de 2000. (Nota da IHU On-Line)

    da f que est dentro do prprio indi-vduo, o que faz dele um portador de um fragmento de Deus.

    A teologia de Calvino est muito lon-ge disso. O homem corrupto, a malda-de tomou conta dele desde que nasceu. Da a necessidade de buscar a graa e a f para corrigir essa tendncia crnica para o mal. Para Calvino, de um Deus totalmente soberano que provm o cha-mado ou a vocao para um indivduo se integrar no time dos salvos. A salvao vem da aceitao do chamado irresist-vel. No depende, portanto, de algo que j esteja dentro do ser humano espe-ra de um despertamento. No h nada mais hertico para Macedo do que esse monstruoso ensinamento.

    No que se relaciona administrao da Igreja, a IURD praticante do sistema episcopal de governo. Tudo est atrelado a uma centralizao e uma verticaliza-o do exerccio do poder eclesistico. Em entrevista a ns, em 1994, o ento porta-voz da teologia da IURD, o faleci-do pastor J.Cabral, nos afirmou que Edir Macedo mais obedecido na sua Igreja do que o Papa na Igreja Catlica. Os bis-pos exercem um papel subalterno em relao a Macedo e os pastores queles. Aos fiis reunidos (uma massa apenas) no se permite nenhuma organizao ou escolha de seus representantes em algum tipo de governo. Da eclesiologia calvinista nada h que se assemelhe eclesiologia da IURD.

    No calvinismo, h uma possibilida-de de se mudarem as coisas no interior de uma Igreja presbiteriana qualquer. Isso atravs dos meios competentes, isto , por meio da Assembleia e do Conselho local, dos Conclios regionais (presbitrios) ou dos Snodos ou As-sembleia Geral (de carter nacional, s vezes, chamado pomposamente de Supremo Conclio). Qual a possibili-dade que algum ou algum grupo tem de propor mudanas na IURD?

    A minha concluso que a ques-to da prosperidade no justifica uma aproximao do calvinismo com a IURD. Esta uma Igreja que conseguiu assimilar elementos da religiosidade popular catlica, indgena e africana, mesclando com elementos da ps-mo-dernidade e de sua vertente religiosa a Nova Era.

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  • SO LEOPOLDO, 23 DE NOVEMBRO DE 2009 | EDIO 316 19

    Para Calvino, a eleio divina independe at mesmo da f

    Traduzida para o portugus em dois tomos, A instituio da religio crist possua estilo prprio, diferente daquele marcante nas obras de Teologia da Idade Mdia, acentua Carlos Eduardo de Oliveira

    Por Mrcia Junges

    A Instituio da religio crist uma obra apologtica composta por um estilo pr-prio, profundamente diverso daquele que marcou as principais obras teolgicas da Idade Mdia. Como pano de fundo de seu trabalho, Calvino apoia-se, sobre-tudo, na sucesso de citaes de vrias passagens das Escrituras retoricamente apoiadas, principalmente, pela explanao de textos patrsticos. A afirmao

    do filsofo Carlos Eduardo Oliveira, na entrevista que concedeu, por e-mail, IHU On-Line. Um dos tradutores de A instituio da religio crist (So Paulo: Editora UNESP, 2008, Tomo I, Livros I e II), junto dos pesquisadores Jos Carlos Estvo, Ilunga Kabebgele, Elaine Cristine Sartorelli e Omayr Jos de Moraes Jnior, ele diz que, quanto ao contedo dessa obra, o adversrio facilmente iden-tificado: os abusos da Igreja de sua poca, apontados por Calvino como uma decorrncia do mau uso e compreenso da tradio crist nos quais amplamente teria incorrido a escolstica. O pesquisa-dor fala, ainda, sobre a fora conferida teologia de Calvino atravs da obra de Max Weber, A tica protestante e o esprito do capitalismo. Muito mal resumidamente, poderamos dizer que Weber defende que os calvinistas acabaram em algum momento por identificar o sucesso econmico como um sinal da eleio divina, e que isto teria, de algum modo, contribudo na histria da evoluo do ca-pitalismo. As proximidades e diferenas entre Calvino e Ockham so outro tema dessa entrevista.

    Graduado em Filosofia pelas Faculdades Associadas do Ipiranga, mestre e doutor em Filosofia pela Universidade de So Paulo (USP) com a tese A Realidade e seus Signos: as proposies sobre o futuro contingente e a predestinao divina na lgica de Guilherme de Ockham. professor da Universidade Federal de So Carlos (UFSCar) no Centro de Educao e Cincias Humanas. Confira a entrevista.

    IHU On-Line - Quais foram os princi-pais desafios em traduzir A institui-o da religio crist, de Calvino?Carlos Eduardo Oliveira - Quando nos foi proposta, a traduo da Instituio da Religio Crist de Joo Calvino no foi nada menos que uma boa provoca-o. Atendendo a uma solicitao que, embora curiosamente tenha partido de fora da Universidade, dizia respeito a um texto de reconhecida importncia na academia, a editora da Unesp apre-sentou o pedido de que fosse feita a traduo desta obra de Calvino tendo em vista algo que contemplasse tanto as exigncias prprias de um trabalho

    1 Confira, tambm, o recm lanado A ins-tituio da religio crist (