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CAPACITAÇÃO PARA INOVAÇÃO DE UM SETOR INDUSTRIAL - CASO DE VÁLVULAS INDUSTRIAIS Ricardo Nóbrega (Cgcre)- Rio de Janeiro/RJ, 3 e 4 de dezembro de 2010 Palavras-chave: válvulas industriais, acreditação, avaliação da conformidade 1 INTRODUÇÃO Este trabalho retrata esforços dirigidos a um segmento industrial brasileiro (válvulas industriais) composto por dezenas de fábricas onde, via de regra, o projeto do produto começava pelo fim. Tendo um produto fabricado por concorrente, fazia-se medições e as reproduzia em papel, chamando-a de “projeto” que ainda servia para completar a família de válvulas guardando proporção aritmética das dimensões. A capacitação para inovação retratada neste caso de estudo é na evolução deste segmento industrial para um patamar onde fabricantes efetivamente desenvolvem sua tecnologia de projeto, de produção e de acompanhamento do produto em serviço, no que se chama “Projeto do Processo”. Neste cenário, normas técnicas e mecanismo de avaliação da conformidade voluntário, de terceira parte, são componentes imprescindíveis. 2 PROGRAMA DE HOMOLOGAÇÃO DE VÁLVULAS Ainda hoje, o mercado brasileiro oferece válvulas industriais sem uma base concreta na confiabilidade de dados técnicos. Registros de ocorrências de problemas causados pelo mau desempenho provocando lucro cessante, danos ambientais, acidentes com vítimas e prejuízos materiais (Fig. 1), motivaram iniciativas por parte de um grande cliente - Petrobras - em favor da qualidade e especificação das válvulas. Num primeiro momento (2004), a Petrobras tomou uma série de atitudes próprias montando um esquema de inspeção (PEV) e de avaliação de fornecedores (PGQMSA) e depois, em 2007, buscou parceria com o Inmetro (Cgcre e Dqual) e com a ABNT. O principal elemento inovador da proposta originada pela Petrobras é o “Projeto do Processo”. A abordagem dada a produtos foi por muito tempo centrada em características físicas do produto. Com a formação do mercado comum europeu, foi dada ênfase no desempenho do produto. No “Projeto do Processo” as atenções são dirigidas ao fabricante, exigindo capacitação tecnológica e autonomia e, por conseguinte, poder para inovação. O projeto de uma válvula (Fig. 2) para ser desenvolvido chega a requerer um mês de trabalho de uma equipe de projetistas e, para ser avaliado, três dias de auditoria de Organismo de Avaliação da Conformidade acreditado (OAC), sem contar os ensaios. Inicialmente foi elaborada norma Petrobras (N-2827) a qual serviu de base para a norma brasileira ABNT NBR 15827:2007. A NBR-15827 identifica características de projeto, estabelece condições de ensaios (ensaios de ciclagem) e requer identificação da assinatura da válvula (Fig. 3) (Camelo, 2009). Tendo a NBR-15827 como referência, o mercado pode passar a oferecer válvulas com características e dados de desempenho com níveis de confiabilidade estabelecidos. A confiança nas informações prestadas pelos fabricantes é fundamental para o sucesso do Programa. Os fabricantes são regularmente acompanhados e auditados por OAC seguindo procedimentos estabelecidos em Regulamento de Avaliação da Conformidade (RAC) da Dqual. O Programa alcança fabricantes brasileiros e estrangeiros e tem potencial para conquistar novos mercados. No mundo não há programa de avaliação da conformidade de desempenho de válvulas nos moldes da NBR-15827. Na Europa (Diretiva 97/23/CE, - equipamentos sob pressão) há um interessante esquema de avaliação da conformidade para todos os elementos que compõem dutos (tubulação, elementos de fixação e válvulas), contemplando modelos de avaliação da conformidade com variações em função da classe de risco (pressão x vazão). Outros aspectos, como segurança ao fogo (fire safety) são avaliados por outros esquemas (API 589 Second Edition Fire Test). Figura 1 - Problemas no desempenho de válvulas Figura 2 Projeto de uma válvula Figura 3 - Fases da Homologação de Válvulas

CAPACITAÇÃO PARA INOVAÇÃO DE UM SETOR …repositorios.inmetro.gov.br/bitstream/10926/603/6/ID23 Nobrega.pdf · qual serviu de base para a norma brasileira ABNT NBR 15827:2007

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CAPACITAÇÃO PARA INOVAÇÃO DE UM SETOR INDUSTRIAL - CASO DE VÁLVULAS INDUSTRIAIS

Ricardo Nóbrega (Cgcre)- Rio de Janeiro/RJ, 3 e 4 de dezembro de 2010

Palavras-chave: válvulas industriais, acreditação, avaliação da conformidade

1 INTRODUÇÃO

Este trabalho retrata esforços dirigidos a um segmento industrial brasileiro (válvulas industriais) composto por dezenas de fábricas onde, via de regra, o projeto do produto começava pelo fim. Tendo um produto fabricado por concorrente, fazia-se medições e as reproduzia em papel, chamando-a de “projeto” que ainda servia para completar a família de válvulas guardando proporção aritmética das dimensões.

A capacitação para inovação retratada neste caso de estudo é na evolução deste segmento industrial para um patamar onde fabricantes efetivamente desenvolvem sua tecnologia de projeto, de produção e de acompanhamento do produto em serviço, no que se chama “Projeto do Processo”. Neste cenário, normas técnicas e mecanismo de avaliação da conformidade voluntário, de terceira parte, são componentes imprescindíveis.

2 PROGRAMA DE HOMOLOGAÇÃO DE VÁLVULAS

Ainda hoje, o mercado brasileiro oferece válvulas industriais sem uma base concreta na confiabilidade de dados técnicos. Registros de ocorrências de problemas causados pelo mau desempenho provocando lucro cessante, danos ambientais, acidentes com vítimas e prejuízos materiais (Fig. 1), motivaram iniciativas por parte de um grande cliente - Petrobras - em favor da qualidade e especificação das válvulas.

Num primeiro momento (2004), a Petrobras tomou uma série de atitudes próprias montando um esquema de inspeção (PEV) e de avaliação de

fornecedores (PGQMSA) e depois, em 2007, buscou parceria com o Inmetro (Cgcre e Dqual) e com a ABNT.

O principal elemento inovador da proposta originada pela Petrobras é o “Projeto do Processo”. A abordagem dada a produtos foi por muito tempo centrada em características físicas do produto. Com a formação do mercado comum europeu, foi dada ênfase no

desempenho do produto. No “Projeto do Processo” as atenções são

dirigidas ao fabricante, exigindo capacitação tecnológica e autonomia e, por conseguinte, poder para inovação. O projeto de uma válvula (Fig. 2) para ser desenvolvido chega a requerer um mês de trabalho de uma equipe de projetistas e, para ser avaliado, três dias de auditoria de Organismo de

Avaliação da Conformidade acreditado (OAC), sem contar os ensaios.

Inicialmente foi elaborada norma Petrobras (N-2827) a qual serviu de base para a norma brasileira ABNT NBR 15827:2007. A NBR-15827 identifica características de projeto, estabelece condições de ensaios (ensaios de ciclagem) e requer identificação da assinatura da válvula (Fig. 3) (Camelo, 2009).

Tendo a NBR-15827 como referência, o mercado pode passar a oferecer válvulas com características e dados de desempenho com níveis de confiabilidade estabelecidos.

A confiança nas informações prestadas pelos fabricantes é fundamental para o sucesso do Programa. Os fabricantes são regularmente acompanhados e auditados por OAC seguindo procedimentos estabelecidos em Regulamento de Avaliação da Conformidade (RAC) da Dqual.

O Programa alcança fabricantes brasileiros e estrangeiros e tem potencial para conquistar novos mercados. No mundo não há programa de avaliação da conformidade de desempenho de válvulas nos moldes da NBR-15827. Na Europa (Diretiva 97/23/CE, - equipamentos sob pressão) há um interessante esquema de avaliação da conformidade para todos os elementos que compõem dutos (tubulação, elementos de fixação e válvulas), contemplando modelos de avaliação da conformidade com variações em função da classe de risco (pressão x vazão). Outros aspectos, como segurança ao fogo (fire safety) são avaliados por outros esquemas (API 589 Second Edition Fire Test).

Figura 1 - Problemas no desempenhode válvulas

Figura 2 Projeto de uma válvula

Figura 3 - Fases da Homologação de Válvulas

3 Comentários

3.1 Cenário: complexidade crescente em prazos menores

O tempo decorrido entre a descoberta de um poço de petróleo e o início de sua exploração é cada vez menor, apesar do crescente grau de dificuldade e complexidade das condições para exploração. É um cenário que requer inovações constantes.

Com o pré-sal, há significante oportunidade de negócio para o Inmetro fortalecer sua parceria com a Petrobras em termos de avaliação da conformidade de bens e serviços.

3.2 Confiança e Avaliação da Conformidade

Os mecanismos tradicionais da Avaliação da Conformidade focam exclusivamente o atendimento a requisitos. No Programa de Homologação de Válvulas, essa condição é necessária, mas não suficiente. Igualmente importante é a integridade e intenção, inclusive, no PGQMSA, o histórico dos fornecedores é elemento de pontuação. Para conquistar confiança, além da conformidade aos requisitos, há de se considerar alcance de resultados, alinhamento de propostas e compromisso pelos resultados comuns. Essa premissa é válida para todos que participam do Programa de Homologação de Válvulas, inclusive Inmetro e OAC.

3.3 Mão de Obra Qualificada

Apesar do mercado brasileiro contar com profissionais capazes de projetar válvulas, falta mão de obra qualificada aos fabricantes e aos OAC para atender a demanda requerida pelo Programa de Homologação de Válvulas NBR-15827. Foram promovidos pelo Programa de Mobilização da Indústria Nacional de Petróleo e Gás Natural - Prominp, dois cursos de 360 h de especialização para engenheiros, em 2009, pela USP. Em 2010, estão em andamento outros dois cursos: USP e PUC/RJ. Existe vínculo direto entre inovação e mão de obra qualificada. Os fabricantes mais acostumados em copiar do que em desenvolver, tiveram de reestruturar sua engenharia e incluir um perfil de profissional projetista, inclusive com a absorção de softwares para cálculo de elementos finitos e de escoamento de fluídos.

3.4 Propensão para Confiança

Uma das propostas do Programa de Homologação de Válvulas NBR-15827 é fortalecer o compromisso e a responsabilidade do fabricante pelo produto e informações técnicas (Fig. 5). Quando o cliente (2ª parte) interfere na produção, exercendo poderes de aprovação, o fabricante tende a se isentar de responsbilidade. Existe um ponto ideal, onde a avaliação de 3ª parte atua estimulando a responsabilidade e compromisso por parte do fabricante. Sem mecanismos de AC (s/ AC), a propensão para confiança é baixa.

3.5 Gestão do Programa

A gestão do Programa é desempenhada pela Câmara Setorial de Válvulas Industriais da Abimaq (Abimaq/CSVI). O propósito é o de fortalecer o compromisso dos fabricantes com o Programa. É importante ressaltar o alinhamento da visão finalística do Programa entre os participantes. No momento, as atenções se voltam para implantar o Programa visando o cliente Petrobras. Num instante posterior, a proposta pode ser para outros segmentos de mercado. Outro aspecto relevante é o reconhecimento de que cada elemento integrante do Programa tem interesse próprio e um papel bem definido a ser desempenhado. Por exemplo, o Inmetro pode ter interesse em: a) apoiar o parque industrial brasileiro para ingressar no mercado global fazendo uso da marca de conformidade e, em decorrência, prioridade seria dada para compatibilizar a norma brasileira com normas consagradas no mercado global e promover a participação efetiva do Brasil na CT da ISO; b) estender o trabalho de AC para dutos (tubulação e elementos de fixação); c) conquistar espaço junto a Petrobras para atuar na AC de equipamentos para águas profundas; e d) desenvolver trabalhos de AC para outros produtos e serviços sujeitos a AC.

4 CONCLUSÃO

O Programa de Homologação de Válvulas NBR-15827 atua num ambiente que requer permanente inovação e tem impacto em dezenas de fabricantes no Brasil e no exterior, promove mudança no perfil e estimula a capacitação para domínio tecnológico e integração de fabricantes brasileiros na globalização. Com os desafios advindos das descobertas do pré-sal, este é um momento de oportunidade de negócio para o Inmetro estabelecer um política e fortalecer sua parceria com a Petrobras. O Programa exige dos elementos que atuam direta e indiretamente na AC (Cgcre, Dqual e OAC), postura diferente da tradicional, fundamentada em condições estáveis e com ênfase no controle e na previsibilidade de funções específicas. Além do atendimento aos requisitos, a confiança e a capacitação dos fabricantes são relevantes. O apoio da Abimaq, abrigando a gestão do Programa, é favorável ao comprometimento do segmento fabril.

5 REFERÊNCIA BIBLIOGRÁFICA

Camelo, Evandro e Goldstein, Ilan. Monitoramento de Desempenho de Fornecedores de Válvulas Industriais. Curso de Projeto de Válvulas Industriais. Prominp/USP, 2009.

Figura 4 - Tempo entre decoberta e exploração petróleo

s/ AC 2ª Parte 3ª Parte

Figura 5 - Propensão para confiança