1
Carlos Drummond de Andrade (Itabira , 31 de outubro de 1902 Rio de Janeiro , 17 de agosto de 1987 ) foi um poeta , contista e cronista brasileiro , considerado por muitos o mais influente poeta brasileiro do século XX . 1 Para Sempre Por que Deus permite que as mães vão-se embora? Mãe não tem limite, é tempo sem hora, luz que não apaga quando sopra o vento e chuva desaba, veludo escondido na pele enrugada, água pura, ar puro, puro pensamento. Morrer acontece com o que é breve e passa sem deixar vestígio. Mãe, na sua graça, é eternidade. Por que Deus se lembra — mistério profundo — de tirá-la um dia? Fosse eu Rei do Mundo, baixava uma lei: Mãe não morre nunca, mãe ficará sempre junto de seu filho e ele, velho embora, será pequenino feito grão de milho. Carlos Drummond de Andrade, in 'Lição de Coisas' Duração O tempo era bom? Não era O tempo é, para sempre. A hera da antiga era roreja incansavelmente. Aconteceu há mil anos? Continua acontecendo. Nos mais desbotados panos, estou me lendo e relendo. Tudo morto, na distância que vai de alguém a si mesmo? Vive tudo, mas sem ânsia de estar amando e estar preso. Pois tudo enfim se liberta de ferros forjados no ar. A alma sorri, já bem perto, da raiz mesma do ser. Carlos Drummond de Andrade, in 'As Impurezas do Branco'

Carlos Drummond de Andrade.docx

Embed Size (px)

DESCRIPTION

Poemas

Citation preview

Carlos Drummond de Andrade(Itabira,31 de outubrode1902Rio de Janeiro,17 de agostode1987) foi umpoeta,contistaecronistabrasileiro, considerado por muitos o mais influente poeta brasileiro dosculo XX.1

Para SemprePor que Deus permiteque as mes vo-se embora?Me no tem limite, tempo sem hora,luz que no apagaquando sopra o ventoe chuva desaba,veludo escondidona pele enrugada,gua pura, ar puro,puro pensamento.Morrer acontececom o que breve e passasem deixar vestgio.Me, na sua graa, eternidade.Por que Deus se lembra mistrio profundo de tir-la um dia?Fosse eu Rei do Mundo,baixava uma lei:Me no morre nunca,me ficar semprejunto de seu filhoe ele, velho embora,ser pequeninofeito gro de milho.

Carlos Drummond de Andrade, in 'Lio de Coisas'

DuraoO tempo era bom? No eraO tempo , para sempre.A hera da antiga eraroreja incansavelmente.

Aconteceu h mil anos?Continua acontecendo.Nos mais desbotados panos,estou me lendo e relendo.

Tudo morto, na distnciaque vai de algum a si mesmo?Vive tudo, mas sem nsiade estar amando e estar preso.

Pois tudo enfim se libertade ferros forjados no ar.A alma sorri, j bem perto,da raiz mesma do ser.

Carlos Drummond de Andrade, in 'As Impurezas do Branco'