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ESCRITÓRIO SPBR: um estudo comparativo entre casas contemporâneas Este trabalho tem como tema a arquitetura residencial unifamiliar e, como objeto de estudo, as casas produzidas pelo SPBR, escritório paulista fundado em 2003 pelo arquiteto Ângelo Bucci. O arquiteto possui graduação (1987), mestrado (1998) e doutorado (2005) pela USP e é professor da mesma universidade desde 2001. Entre os anos de 1996 e 2002, Bucci foi sócio do escritório MMBB. De modo recorrente no universo residencial do SPBR, observa-se o emprego de elementos que remetem à linguagem da arquitetura moderna produzida em São Paulo. Nas suas casas, assim como observado no brutalismo paulista 1 , são empregados volumes puros, com empenas longitudinais cegas contrapostas à grandes aberturas transversais. Também nelas há uma exaltação da estrutura como elemento inerente à expressão formal do edifício e a exploração do uso do concreto aparente. O emprego deste vocabulário é observado tanto nas casas com composições compactas, como naquelas com composições aditivas. Além da linguagem empregada, a análise atenta das casas produzidas pelo escritório permite traçar considerações sobre seus arranjos tipológicos e o modo como estes são operacionalizados e transformados ao longo do tempo. Analisar as casas do escritório SPBR à luz dos seus arranjos tipológicos é o objetivo deste trabalho. O seu estudo se justifica por ampliar a crítica sobre a produção da arquitetura contemporânea brasileira, subsidiando, direta e indiretamente, novas práticas profissionais e acadêmicas. Metodologicamente, o estudo se baseia no conceito de tipo, centrando atenção no modo como ele foi operacionalizado a partir da arquitetura moderna. Segundo Rafael Moneo (1999), a partir do modernismo, o arquiteto começa a trabalhar associando um tipo ao seu projeto e, na sequência, intervém sobre esse tipo, seja respeitando-o, destruindo-o ou transformando-o, através de deformações e/ou sobreposições de tipos diferentes ou de fragmentos de tipos. Neste sentido, os arranjos das alas ou setores podem ser entendidos como fragmentos de tipos, que, já testados previamente, são replicados em novos projetos, cuja “montagem” busca uma melhor adaptação ao novo contexto. (MARTI ARÍS, 1993). Assim, o resultado final é uma estrutura tipológica flexível, que permite a coordenação de diversas soluções projetuais. Decorrente destes procedimentos, numa linha cronológica de projetos de um mesmo arquiteto ou escritório, é possível identificar o que Martí Aris (1993) e Rafael Moneo (1999) definem como “séries tipológicas”. A série tipológica é a relação que o tipo, como estrutura formal comum, estabelece num conjunto de obras. Na série tipológica, é possível identificar o “tipo mãe” que orienta a continuidade de uma série, bem como analisar como um modelo é capaz de interferir na construção de outro. O entendimento de tipo e de séries tipológicas orienta este estudo que busca desenvolver uma análise comparativa das casas produzidas pelo SPBR. Para tanto, o estudo se apoia no redesenho e numa abordagem gráfico-textual das mesmas. 1 Neste contexto, cabe observar que o “brutalismo paulista” faz parte da tendência brutalista que ocorreu em diversas partes do mundo no período pós 2ª Guerra Mundial até a década de 1970. No Brasil, essa tendência aparece por volta da década de 1950 no Rio de Janeiro e São Paulo, ganhando mais destaque nesse último, através da produção de arquitetos como Vilanova Artigas e Paulo Mendes da Rocha. (ZEIN, n.d.; SANVITTO, 1997) Casas Ribeirão Preto, Aldeia da Serra e Santana do Parnaíba Escritório SPBR Autoras: Mariana Samurio e Ana Elísia da Costa

Casas Ribeirão Preto, Aldeia da Serra e Santana do Parnaíba · Santana do Parnaíba ... (2006); Casa de Fim de Semana em São Paulo (2011); Jardim Europa (2016) ... como observa

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ESCRITÓRIO SPBR: um estudo comparativo entre casas contemporâneas

Este trabalho tem como tema a arquitetura residencial unifamiliar e, como objeto de estudo, as casas produzidas

pelo SPBR, escritório paulista fundado em 2003 pelo arquiteto Ângelo Bucci. O arquiteto possui graduação (1987),

mestrado (1998) e doutorado (2005) pela USP e é professor da mesma universidade desde 2001. Entre os anos

de 1996 e 2002, Bucci foi sócio do escritório MMBB.

De modo recorrente no universo residencial do SPBR, observa-se o emprego de elementos que remetem à

linguagem da arquitetura moderna produzida em São Paulo. Nas suas casas, assim como observado no brutalismo

paulista1, são empregados volumes puros, com empenas longitudinais cegas contrapostas à grandes aberturas

transversais. Também nelas há uma exaltação da estrutura como elemento inerente à expressão formal do

edifício e a exploração do uso do concreto aparente. O emprego deste vocabulário é observado tanto nas casas

com composições compactas, como naquelas com composições aditivas.

Além da linguagem empregada, a análise atenta das casas produzidas pelo escritório permite traçar

considerações sobre seus arranjos tipológicos e o modo como estes são operacionalizados e transformados ao

longo do tempo. Analisar as casas do escritório SPBR à luz dos seus arranjos tipológicos é o objetivo deste

trabalho. O seu estudo se justifica por ampliar a crítica sobre a produção da arquitetura contemporânea

brasileira, subsidiando, direta e indiretamente, novas práticas profissionais e acadêmicas.

Metodologicamente, o estudo se baseia no conceito de tipo, centrando atenção no modo como ele foi

operacionalizado a partir da arquitetura moderna. Segundo Rafael Moneo (1999), a partir do modernismo, o

arquiteto começa a trabalhar associando um tipo ao seu projeto e, na sequência, intervém sobre esse tipo, seja

respeitando-o, destruindo-o ou transformando-o, através de deformações e/ou sobreposições de tipos

diferentes ou de fragmentos de tipos. Neste sentido, os arranjos das alas ou setores podem ser entendidos como

fragmentos de tipos, que, já testados previamente, são replicados em novos projetos, cuja “montagem” busca

uma melhor adaptação ao novo contexto. (MARTI ARÍS, 1993). Assim, o resultado final é uma estrutura tipológica

flexível, que permite a coordenação de diversas soluções projetuais.

Decorrente destes procedimentos, numa linha cronológica de projetos de um mesmo arquiteto ou escritório, é

possível identificar o que Martí Aris (1993) e Rafael Moneo (1999) definem como “séries tipológicas”. A série

tipológica é a relação que o tipo, como estrutura formal comum, estabelece num conjunto de obras. Na série

tipológica, é possível identificar o “tipo mãe” que orienta a continuidade de uma série, bem como analisar como

um modelo é capaz de interferir na construção de outro.

O entendimento de tipo e de séries tipológicas orienta este estudo que busca desenvolver uma análise

comparativa das casas produzidas pelo SPBR. Para tanto, o estudo se apoia no redesenho e numa abordagem

gráfico-textual das mesmas.

1 Neste contexto, cabe observar que o “brutalismo paulista” faz parte da tendência brutalista que ocorreu em diversas partes do mundo no período

pós 2ª Guerra Mundial até a década de 1970. No Brasil, essa tendência aparece por volta da década de 1950 no Rio de Janeiro e São Paulo,

ganhando mais destaque nesse último, através da produção de arquitetos como Vilanova Artigas e Paulo Mendes da Rocha. (ZEIN, n.d.;

SANVITTO, 1997)

Casas Ribeirão Preto, Aldeia da Serra e

Santana do Parnaíba

Escritório SPBR

Autoras: Mariana Samurio e Ana Elísia da Costa

1. Das Casas

No site do escritório (<http://www.spbr.arq.br>), observa-se que, de 2000 a 2016, foram produzidos dezoito

projetos residenciais. Destes, dois foram produzidos antes de 2003, data de fundação do escritório, quando Bucci

ainda fazia parte do escritório MMBB. Neste universo, é possível verificar que as casas possuem semelhanças

linguísticas entre si, mas não necessariamente semelhanças tipológicas (Figura 1), o que permite a configuração

de pequenos grupos tipológicos.

Figura 1: Linha do tempo com as residências do escritório SPBR entre os anos 2000 e 2016.

Fonte: SPBR <http://www.spbr.arq.br/portfolio-gallery/residencial/>.

Entre os grupos tipológicos identificáveis2, chama atenção dois grupos de casas construídas entre 2000 e 2014,

sendo estes aqui denominados: “horizontalizados”, com volumes compactos ou sugerindo uma compacidade,

pilotis, empenas laterais cegas e planta bipartida; e “verticalizados”, ocupando terrenos íngremes e configurando

composições aditivas, cujos volumes não se apoiam diretamente sobre o terreno. (Figura 2)

Figura 2: Linha do tempo com dois esquemas tipológicos empregados pelo escritório SPBR.

Fonte: COSTA, Gabriela, 2014; SAMURIO, Mariana, 2016; SPBR <http://www.spbr.arq.br/portfolio-gallery/residencial/>.

Interferência entre modelos

Nesta linha cronológica, é possível perceber que dentro de um mesmo grupo, um modelo interfere na construção

de outro, mesmo que de modo não linear. Nos partidos horizontalizados, este argumento pode ser exemplificado

pelas casas Ribeirão Preto (2000) e Orlândia (2007), em que a cozinha ocupa a ala longitudinal que conecta as

duas alas transversais ao lote, onde estão os setores íntimo e social. Semelhanças no arranjo espacial também

podem ser apontadas entre as casas Aldeia da Serra (2001) e Cotia (2008), em que as escadas centralizadas,

juntamente com as cozinhas, definem os eixos que separam os setores íntimo e social. (Figuras 3 e 4).

Figura 3: Casas com partidos horizontalizados - (a) Casa em Ribeirão Preto; (b) Casa em Orlândia. SPBR.

Fonte: (a) COSTA, Gabriela (2014); (b) SPBR <http://www.spbr.arq.br/portfolio-gallery/residencial/>.

2 Uma análise prévia das casas do SPBR, excluindo a casa no Jardim América, permite agrupá-las em partidos horizontais e verticais. Nestes grupos, configuram-se subgrupos definidos a partir do emprego de arranjos aditivos ou compactos e de volumes puros ou decompostos.

PARTIDOS HORIZONTAIS: (1) Compactos, com volumes puros: Ribeirão Preto (2000), Aldeia da Serra (2001), Orlândia (2007), Cotia (2008); Orlândia (2011); Campinas (2011) (2) Corpo unificador que envolve volumes decompostos: Phoenix (2005); Hampton (2007) PARTIDOS VERTICAIS: (3) Compactos, com volumes puros: Portland (2008); (4) Aditivos, com volumes puros: Santa Tereza (2004); Itaipava (2012); Ubatuba II (2012); Santana do Paraíba (2014); (5) Aditivos, com volumes decompostos: Carapicuíba (2003); Ubatuba (2006); Casa de Fim de Semana em São Paulo (2011); Jardim Europa (2016)

Figura 4: Casas com partidos horizontalizados - (a) Casa em Aldeia da Serra; (b) Casa em Cotia. SPBR.

Fonte: (a) COSTA, Gabriela (2014); (b) SPBR <http://www.spbr.arq.br/portfolio-gallery/residencial/>.

Entre os partidos verticalizados, as casas Ubatuba II e Itaipava, ambas de 2012, explicitam semelhanças em sua

geometria e no modo como os volumes se articulam com o terreno, diferenciando-se significativamente na

compacidade dos volumes e no arranjo da rede circulatória. (Figura 5)

Figura 5: Casas com partidos verticalizados - (a) Casa em Ubatuba II; (b) Casa em Itaipava, do escritório SPBR.

Fonte: SPBR <http://www.spbr.arq.br/portfolio-gallery/residencial/>.

Contudo, é possível observar também que os modelos de grupos distintos interferem entre si, hibridizando

esquemas tipológicos. Este argumento será ilustrado através da análise comparativa de três casas - Ribeirão

Preto (RB - 2000), Aldeia da Serra (AS - 2001) e Santana do Parnaíba (SP - 2014), possuindo as duas primeiras

arranjos horizontalizados e a última, verticalizado.

2. Confrontação entre modelos

Implantação e arranjo formal

A configuração dos terrenos, especialmente a largura dos mesmos, condiciona nos três casos arranjos de plantas

mais retangulares (RP e SP) ou quadráticas (AS). Nos casos das plantas retangulares, o arranjo impõe a

disposição de um pátio central, que separam as alas entre si e promove uma biorientação dos ambientes – para

o pátio e para os recuos. Em contraposição, as plantas quadráticas exploram a compacidade do volume e a

abertura dos ambientes somente para o recuo frontal ou posterior3. Em razão do terreno em desnível, natural

(AS e SP) ou artificializado (RP), todas casas estão apoiadas por pilotis ou suspensas (SP), estratégia esta que

serve tanto para liberação do solo e formar a garagem/área de lazer/serviço, quanto para acomodar melhor a

casa no terreno. Cabe notar ainda que na RP e AS o pilotis é parcialmente recoberto por taludes e canteiros,

promovendo a leitura de um volume que “flutua” sobre o terreno e favorecendo a conexão de todos os pavimentos

com o mesmo. (Figura 6)

Figura 6: Implantação e cortes - (a) Ribeirão Preto. 2000; (b) Aldeia da Serra. 2001; (c) Santana do Parnaíba. 2014. SPBR

Fonte: (a e b) COSTA, Gabriela, 2014; (c) SAMURIO, Mariana, 2016.

Formalmente, percebe-se nas três casas uma tentativa de conferir uma compacidade volumétrica. Na RP, o

arranjo em “U” – com duas alas paralelas e uma ala conectora - sugere por sua “gestalt” um prisma puro, como

observado na AS. Na SP, o jogo de volumes com pequenos desníveis sugere um partido aditivo, contudo, as duas

circulações periféricas – rampa de um lado e escadas do outro - e o revestimento com brises induzem

visualmente a perceber uma unidade volumétrica. (Figura 7)

Entre as casas, pode-se sustentar a hipótese de que tenha havido uma hibridização dos partidos horizontalizados

e verticalizados. O arranjo da RP (alas paralelas conectadas por alas-circulação) e AS (compacto) fundem-se na

SP (alas paralelas conectadas por alas-circulação, com compacidade sugerida) que perde em parte a clareza de

sua composição aditiva, característica dos partidos verticalizados. (Figura 7)

3 Como exceções dentro dos grupos tipológicos indicados anteriormente, deve-se mencionar: a Casa Cotia (2008), cuja planta de proporções retangulares não incorpora pátios; e a Casa Itaipava (2012), cujo arranjo aditivo, com dois volumes escalonados, configura uma espécie de pátio entre eles.

Figura 7: Esquema volumétrico - (a) Ribeirão Preto. 2000; (b) Aldeia da Serra. 2001; (c) Santana do Parnaíba. 2014. SPBR

Fonte: SAMURIO, Mariana, 2016.

Além disso, observa-se que todas casas utilizam empenas cegas laterais ou com poucas aberturas, contrapostas

a grandes aberturas transversais orientadas para frente e fundo e/ou para os pátios. (Figura 8). Esta

característica é recorrentemente empregada em lotes urbanos de meio de quadra (COSTA; COTRIN, 2015) e é

repertório comum entre as casas do brutalismo paulista, como observa Carlos Alberto Hübner (2003, p. 93)

A casa, como volume único, com a intenção de valorizar o espaço interno (...), conduziu à configuração de planos

fechados em dois sentidos do prédio; nos outros dois lados eram abertos para pátios ou para paisagem

circundante. Esses planos fechados eram frontais nas casas térreas e laterais nas casas em blocos elevados.

Figura 8: Esquema das empenas laterais cegas contrastantes com as superfícies transversais envidraçadas - (a) Ribeirão Preto.

2000; (b) Aldeia da Serra. 2001; (c) Santana do Parnaíba. 2014. SPBR

Fonte: SAMURIO, Mariana, 2016.

Apesar das empenas das casas RP e AS serem em concreto aparente, nem todas elas atuam no sistema

estrutural. Nos três casos, os volumes são sustentados por quatro pilares internalizados nos mesmos,

configurando grandes balanços. Na AS, a estrutura se viabiliza com a adoção de uma laje nervurada, contrapondo-

se à RP e à SP em que os pilares apoiam vigas que, por sua vez, sustentam as lajes. Na RP, o vigamento é invertido,

aparecendo na cobertura do volume. Essa viga, conforme afirma o escritório, “estrutura a laje de cobertura e

atiranta a laje de piso, sem vigas”, sem comprometer assim a sua integridade volumétrica. Na SP, uma viga-parede

migra para o interior do volume, deixando o sistema circulatório exterior a ele e arrematado pelos brises que

conferem uma maior leveza formal. Assim, na SP, há um desmantelamento da rigidez dos volumes compactos,

rigidez essa que orientou o projeto de todas as casas anteriores que são aqui analisadas4. (Figura 9).

4 Cabe observar que este desmantelamento volumétrico dos partidos compactos verticais começa a ser investigado na casa Carapicuíba (2003) e depois se expressa de forma contundente na Casa Ubatuba (2005) e Casa de Fim de Semana em São Paulo (2014)

Figura 9: Esquema estrutural - (a) Ribeirão Preto. 2000; (b) Aldeia da Serra. 2001; (c) Santana do Parnaíba. 2014. SPBR

Fonte: SAMURIO, Mariana, 2016.

Arranjo funcional e espacialidade

Como já observado, as três casas possuem um elemento central organizador, seja ele um pátio (RP e SP), seja

ele um núcleo hidráulico e de circulação (AS) (Figura 10). Esse elemento central divide as edificações em duas

alas, uma íntima e outra social, sendo estas conectadas por alas laterais que funcionam apenas como circulação

(AS e SP) ou como um binário circulação - serviço (RP). (Figura 11)

Figura 10: Esquema das alas e do elemento central organizador - (a) Ribeirão Preto. 2000; (b) Aldeia da Serra. 2001; (c) Santana do

Parnaíba. 2014. SPBR.

Fonte: SAMURIO, Mariana, 2016.

Figura 11: Esquema do zoneamento - (a) Ribeirão Preto. 2000; (b) Aldeia da Serra. 2001; (c) Santana do Parnaíba. 2014. SPBR

Fonte: SAMURIO, Mariana, 2016.

Como em todas as casas com partido horizontalizado, a escada e o acesso das casas RP e AS ocupam uma posição

central no volume, o que permite configurar halls agigantados que dão autonomia de uso aos distintos setores.

Na SP, contudo, a lógica de um sistema binário e longitudinal de circulação condiciona que o estar assuma o papel

de espaço de passagem, o que já é experimentado em outra casa com partido verticalizado – Itaipava (2012). A

lógica que rege as duas primeiras casas, portanto, é mais funcional e a última, mais espacial, visto que os

percursos se afirmam como uma grande promenade contemplativa da paisagem. (Figura 12)

Figura 12: Espacialidade nos halls e estares - (a) Ribeirão Preto. 2000; (b) Aldeia da Serra. 2001; (c) Santana do Parnaíba. 2014. SPBR

Fonte: SAMURIO, Mariana, 2016.

Esta lógica circulatória também condiciona o arranjo das alas íntimas. A solução adotada na RP - corredores de

carga dupla, com quartos de um lado e banheiros de outro, configurando um núcleo hidráulico – é replicada na

AS, constituindo-se assim num “fragmento tipológico”. Na SP, ao contrário, os núcleos de banheiros se

internalizam na planta do setor íntimo, dispostos entre o corredor e os quartos, permitindo que a circulação

assuma uma posição periférica e diretamente ligada ao pátio central ou recuo frontal, tal como ocorre nas demais

casas com partidos verticalizados. Nos corredores íntimos das duas primeiras casas, a experiência espacial é

mais enclausurada, negando inclusive a interação visual com o pátio (RP). O circular nestas casas é, portanto,

um procedimento de natureza mais funcional, em que se é submetido a uma compressão espacial. Na PA, uma

nova promenade espacial se desenha também no percurso do setor íntimo. (Figura 13)

Figura 13: Espacialidade nos corredores íntimos - (a) Ribeirão Preto. 2000; (b) Aldeia da Serra. 2001; (c) Santana do Parnaíba. 2014.

SPBR

Fonte: SAMURIO, Mariana, 2016.

Nas duas primeiras casas, a contemplação do exterior, seja ele o pátio e/ou os recuos, é privilégio dos ambientes

de permanência prolongada. Na SP ou nas casas com arranjos verticalizados, também as circulações interagem

com o exterior, construindo assim um conjunto em que todos os percursos promovem múltiplos pontos focais e

diferentes graus de dilatação espacial.

Esse desejo de exploração extrema das visuais pode ainda justificar porque todas as casas com partidos

verticalizados possuem suas cozinhas integradas ao estar, configurando uma grande planta livre, ao passo que

todas as casas com partidos horizontalizados possuem cozinhas. enclausuradas.

Conclusão

Cronologicamente, a casa PA pode se revelar como um projeto-chave em que há a hibridização dos partidos

horizontalizados e verticalizados. Nelas, estão presentes características dos partidos horizontalizados, como a

disposição de alas paralelas, separadas por um pátio central e ligadas por circulações periféricas; e o desejo de

compactação volumétrica. Por outro lado, ela preserva ainda a lógica circulatória e o arranjo das alas íntima e

social observados nas casas com partidos verticalizados (Figura 14). Hibridiza-se, assim, o todo compositivo das

casas com partidos horizontalizados, mas preserva-se o arranjo das partes e a exploração de uma espacialidade

mais exteriorizada das casas com partidos verticalizados.

Figura 14: Quadro-resumo das características observadas nas tipologias horizontalizadas e nas verticalizadas.

Fonte: SAMURIO, Mariana, 2016.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

COSTA, Ana Elísia da; COTRIM CUNHA, Marcio. O pátio no Brasil. Da casa moderna à contemporânea. Arquitextos, São Paulo,

ano 16, n. 181.07, Vitruvius, jun. 2015. Disponível em: <http://www.vitruvius.com.br/revistas/read/arquitextos/16.181/5560>.

Acesso em: 22 Mai. 2016.

HÜBNER, Carlos Alberto. O Pátio na Arquitetura Brutalista Paulista em São Paulo nos Anos 50, 60 e 70. Dissertação

(Mestrado em Arquitetura) – Faculdade de Arquitetura, Universidade Federal do Rio Grande do Sul, Porto Alegre,

2003.

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MONEO, Rafael. La solitudine degli edifici e altri scriti. Questioni intorno all’architettura. Torino: Umberto Allemandi

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SANVITTO, Maria Luiza. Brutalismo Paulista: Uma Análise Compositiva de Residências Paulistanas Entre 1957 e

1972. Dissertação (Mestrado em Arquitetura) – Faculdade de Arquitetura, Universidade Federal do Rio Grande do

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SPBR. Disponível em: <http://www.spbr.arq.br>. Acesso em: 22 Mai. 2016.

ZEIN, Ruth Verde. A Arquitetura da Escola Paulista: 1953-1973. Tese (Doutorado em Arquitetura) – Faculdade de

Arquitetura, Universidade Federal do Rio Grande do Sul, Porto Alegre, 2005.