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CENTRO UNIVERSITÁRIO UNA
Instituto de educação continuada, pesquisa extensão Mestrado profissional em gestão social, educação e
desenvolvimento local
FREDERICO FERREIRA DE OLIVEIRA
CIRCUITO TURÍSTICO TRILHA DOS INCONFIDENTES: DESAFIOS À PARTICIPAÇÃO SOCIAL DOS MUNICÍPIOS NO PLANEJAMENTO E
GESTÃO DO TURISMO REGIONAL E LOCAL.
Belo Horizonte
2011
FREDERICO FERREIRA DE OLIVEIRA
CIRCUITO TURÍSTICO TRILHA DOS INCONFIDENTES: DESAFIOS À PARTICIPAÇÃO SOCIAL DOS MUNICÍPIOS NO PLANEJAMENTO E
GESTÃO DO TURISMO REGIONAL E LOCAL.
Dissertação apresentada no Mestrado em Gestão Social, Educação e Desenvolvimento Local do Centro Universitário UNA, como requisito parcial à obtenção do título de Mestre. Área de concentração: Inovações Sociais, Educação e Desenvolvimento Local.
Linha de pesquisa: Processos Político-Sociais: Articulações Institucionais e Desenvolvimento Local.
Orientadora: Prof. Dra. Andréa Márcia Santiago Lohmeyer Fuchs.
Belo Horizonte
2011
DEDICATÓRIA
Dedico este trabalho a meus pais, Josias Francisco de Oliveira e Elsa Ferreira de Oliveira que apesar da distância, do meu silêncio e das minhas ausências sempre são e serão o meu eterno porto seguro.
Dedico também aos meus irmãos Fabrício Ferreira de Oliveira e Ana
Paula Ferreira de Oliveira, que sempre souberam me compreender e me apoiar. E, por fim dedico de maneira especial a todos aqueles cidadãos que
acreditam na participação social como o instrumento e meio para se modificar o cenário das políticas públicas no Brasil e em especial à de turismo.
AGRADECIMENTO
Agradeço inicialmente à Providência Divina e aos dons do Espírito
Santos que se fizeram presentes durante toda a caminhada deste mestrado,
iluminando-me e mostrando o caminho para o alcance de meus objetivos.
Agradeço a Nossa Senhora do Carmo que como modelo de obediência
e de serviço abençoou-me nos momentos de desespero, de ilusão e de desânimo.
Agradeço à minha orientadora Profa. Dra. Andréa Márcia Santiago
Lohmeyer Fuchs que com seu apoio, dedicação, carinho e amizade tornou possível
a realização desta dissertação.
Agradeço a meus pais Josias Francisco de Oliveira e Elsa Ferreira de
Oliveira que com seus exemplos de pais, mestres, educadores ensinaram-me os
verdadeiros valores para uma vida ética e responsável.
Agradeço a meus irmãos Fabrício Ferreira de Oliveira e Ana Paula
Ferreira de Oliveira que com paciência e amor meu auxiliaram no caminho
acadêmico.
Agradeço a Paulo Afonso de Oliveira Júnior, mais que um amigo, um
irmão, que com suas palavras, exemplos e mesmo em seu silêncio se fez presente
nesta jornada.
Agradeço a Rafael Ladeira incansável motivador, amigo e conselheiro
que me fez acreditar que alçar novos vôos é sempre possível.
Agradeço à Mariana Resende que desde o início da idéia da pesquisa
possibilitou que o Circuito Turístico Trilha dos Inconfidentes fosse meu material de
estudo, e que ao longo da dissertação não poupou esforços para me ajudar.
Agradeço a Denilson Silva Reis, que como Presidente do Circuito
Turístico Trilha dos Inconfidentes permitiu e apoiou a minha pesquisa.
Agradeço a todos os municípios que compõem o Circuito Turístico
Trilha dos Inconfidentes, pois foi a partir dos exemplos práticos deles que a
inquietação para esta pesquisa surgiu.
Agradeço à Roberta Cardoso, amiga e companheira, que com seus
olhos meigos e suas palavras sempre me motivaram e me alegraram em dias tão
difíceis ao longo do mestrado.
Agradeço à Andréia Barreto, amiga e companheira também, que com
sua energia e inquietação me mostrou que é sempre possível ir além.
Agradeço a Gleison Macedo e sua esposa Vanete Macedo que
acolheram sempre de braços abertos em sua casa em Belo Horizonte, possibilitando
a concretização desse importante passo para a minha vida acadêmica.
Agradeço aos meus tios Agenor Macedo e Maria Macedo que apesar
de uma rápidas estadas em sua casa, sempre foram hospitaleiros e amáveis
comigo.
Agradeço aos meus novos amigos do CEFET/RJ – UnED Petrópolis
que me receberam de maneira tão calorosa e que com seus exemplos de
professores, pesquisadores têm me auxiliado nestes novos caminhos que estou
trilhando.
Agradeço de modo especial a todos os meus alunos do Instituto de
Ensino Superior Presidente Tancredo de Almeida Neves e do CEFET/RJ – UnED
Petrópolis que souberam compreender o isolamento, as noites de nervosismo e as
cobranças para a compreensão de conceitos e sua aplicação para o
desenvolvimento em turismo.
Agradeço Carla Bronzo Ladeira Carneiro por aceitar a participação na
minha banca de defesa e por acrescentar novos questionamentos e inquietações em
meu caminho acadêmico.
Agradeço à professora Eloisa Santos que desde o primeiro dia de aula
como aluno especial me recepcionou de maneira calorosa e sempre me possibilitou
o livre diálogo e apresentação de minhas inquietações e dúvidas.
“Para os grandes racionalistas, a idéia verdadeira possui uma
característica dupla: embora seja uma produção humana, ela
recebe fiança divina”.
Saint-Sernin (1998, p. 204)
RESUMO
Em Minas Gerais a partir de 1999 o modelo organização da atividade turística desenvolve-se a partir da formação de clusters turísticos. O espaço geográfico do estado foi dividido em regiões de interesse turístico comum, visando garantir aos municípios com vocações equivalentes e complementares o desenvolvimento da atividade turística de maneira conjunta e regionalizada. A organização, o planejamento e a execução da prática turística, nas regiões turísticas do estado de Minas Gerais, a partir da concepção de cluster turístico, recebeu o nome de “circuitos turísticos”. Estes definidos como organismos estabelecidos formalmente que congregam os diferentes municípios já regionalizados para que de maneira conjunta reordenem a atividade turística, e promovam o desenvolvimento e aprimoramento da atividade turística regional e local, a partir de uma gestão participativa. Assim, este trabalho pretende analisar a partir dos eixos de conteúdo, método e gestão, a participação social dos atores envolvidos no planejamento e gestão do turismo regional do Circuito Turístico Trilha dos Inconfidentes, visando compreender se essa participação social tem-se constituído como instrumento de democratização da gestão social no âmbito da política pública regional de turismo no estado de Minas Gerais. Foi realizada uma pesquisa quanti-qualitativa com os participantes do CTTI que possibilitou estabelecer a discussão entre gestão social e participação social, analisando a participação dos membros envolvidos no planejamento, na organização e no funcionamento do CTTI, bem como as consequências de suas ações na gestão turística. Conclui-se que a gestão participativa do Circuito Turístico Trilha dos Inconfidentes se inscreve dentro da esfera de conhecimento da gestão social, ao ser entendida como uma gestão que possibilita a todos os atores sociais as mesmas possibilidades de vocalização de suas demandas, da integração às diferentes estruturas administrativas eletivas, além de possibilitar aos atores sociais participantes novos conhecimentos e informações a respeito do planejamento e da execução de atividades e ações em prol ao desenvolvimento turístico regional. Assim, confirmou-se a hipótese central deste trabalho ao compreender que as práticas institucionais estabelecidas pela Secretaria de Estado do Turismo de Minas Gerais têm favorecido o processo de participação social como mecanismo de democratização para as gestões públicas municipais engajadas no CTTI, resultando no desenvolvimento da gestão social no âmbito das ações das políticas públicas de turismo. Palavras chaves: Circuito Turístico Trilha dos Inconfidentes. Políticas Públicas. Participação social. Turismo.
ABSTRACT
In Minas Gerais from 1999 the organization of touristic activity from the formation of
tourism clusters. The geographical area of the state was divided into areas of
common touristic interest, ensuring that municipalities with similar vocations and
complementary development of tourism in a joint and regionalized manner. The
organization, planning and execution of touristic practice, throughout the tourist
regions in the state of Minas Gerais, from the conception of the tourism cluster, were
named “Circuitos Turísticos” (Touristic Circuits). These formally defined as organisms
that bring together the different municipalities already regionalized in order to reorder
the touristic activity, and promote the development and improvement of regional and
local tourism, from a participative management. Thus, this paper aims to analyze
from the axes of content, method and management, social participation of the actors
involved in the planning and management of regional tourism of Circuito Turístico
Trilha dos Inconfidentes in order to understand if this social participation has been
established as a tool for democratization of social management in the public policy of
regional tourism in the state of Minas Gerais. A quantitative and qualitative research
has been done with participants of the CTTI that allowed a discussion among social
management and social participation, analyzing the role of members involved in the
planning, organization and functioning of CTTI, and the consequences of their
actions in tourism management. It is concluded that the participatory management of
the Circuito Turístico Trilha dos Inconfidentes falls within the sphere of social
management of knowledge, to be understood as a management that enables all
social actors voicing the same opportunities to their demands, integrating the
different elective administrative structures, and providing social actors participants
new knowledge and information about the planning and execution of activities and
actions to promote regional tourism development. Thus, we confirmed the hypothesis
of this paper to learn that the institutional practices established by the Secretaria de
Estado do Turismo de Minas Gerais have favored the process of social participation
as a mechanism for democratizing municipal administrations engaged in CTTI,
resulting in the development of social management within the actions of public
policies on tourism.
Keywords: Circuito Turístico Trilha dos Inconfidentes. Public Policies. Social
Participation.Tourism.
LISTA DE FIGURAS
Figura 01 – A visão do policy cycle linear................................................................ 67
Figura 02 – A visão do policy cycle e intervenção.............................................. 68
Figura 03 – Modelo sistêmico do processo político em Políticas Públicas.......... 74
Figura 04 – Gestão Social................................................................................... 138
Figura 05: Modelo de definição do conceito de turismo...................................... 146
Figura 06 – O processo do planejamento turístico participativo......................... 165
Figura 07 – O policy clycle à luz do planejamento turístico participativo............. 171
Figura 08 – Site do CTTI...................................................................................... 257
Figura 09 – Site do CTTI link Institucional........................................................... 260
Figura 10 – Site do CTTI link Regimento Interno................................................. 260
Figura 11 – Site do CTTI link Estatuto................................................................. 261
Figura 12 – Site do CTTI link Composição das estruturas.................................. 262
Figura 13 – Site do CTTI link Composição das estruturas.................................. 262
Figura 14 – Site do CTTI link Reuniões............................................................... 263
Figura 15 – Site do CTTI link Atas....................................................................... 264
LISTA DE TABELAS
Tabela 01 – Municípios aprovados para o recebimento do ICMS 2010/2011..... 189
Tabela 02 – Valor de Repasse do ICMS Turístico 2010/2011 de Janeiro a Julho....................................................................................................................
191
Tabela 03 – Valor total de Repasse do ICMS Turístico 2010/2011 Circuitos Turísticos.............................................................................................................
193
Tabela 04 – Distância dos municípios que compõem o Circuito Turístico Trilha dos Inconfidentes da sede administrativa............................................................
202
Tabela 05 – Valores repassados de janeiro a julho de 2011 referente ao critério ICMS turístico aos municípios do Circuito Trilha dos Inconfidentes........
212
Tabela 06 – Municípios respondentes ao questionário....................................... 214
LISTA DE GRÁFICOS
Gráfico 01 – Relação dos Circuitos Turísticos e Municípios contemplados com o ICMS Turístico 2010/2011..................................................................................
190
Gráfico 02 – Relação entre Circuitos Turísticos e valores repassados com o ICMS Turístico 2010/2011.....................................................................................
195
Gráfico 03 – Índice de resposta dado ao questionário.......................................... 214
Gráfico 04 – Prazo de envio de ofícios e/ou convites............................................ 215
Gráfico 05 – Disponibilização dos ofícios e/ou convites no site do CTTI.............. 217
Gráfico 06 – Disponibilização de instrumentos para a gestão do CTTI................. 218
Gráfico 07 – Avaliação do CTTI pelos municípios................................................. 219
Gráfico 08 – Auto-avaliação dos representantes municipais................................. 224
Gráfico 09 – Realização de reuniões fora da cidade sede do CTTI......................
228
LISTA DE SIGLAS
CF-88 – Constituição Federal de 1988
CNTur – Conselho Nacional de Turismo
COMTUR’s – Encontro de Conselhos Municipais de Turismo
COSB – Comissão de Simplificação Burocrática
CTTI – Circuito Turístico Trilha dos Inconfidentes
EMBRATUR – Empresa Brasileira de Turismo
FMI – Fundo Monetário Internacional
FUMTUR – Fundo Municipal de Turismo
FUNGETUR – Fundo Geral do Turismo
GESTUR 2010 – Fórum regional em prol do desenvolvimento turístico e formação
de lideranças regionais
MEI – Microempreendedor Individual
MPT – Municípios com potencial turístico
MT – Municípios turísticos
OMT – Organização Mundial do Turismo
ONG – Organização não-governamental
ONU – Organização das Nações Unidas
OPAS – Organização Pan-Americana de Saúde
PLANTUR – Plano Nacional de Turismo
PNMT – Programa Nacional de Municipalização do Turismo
PNT – Política Nacional de Turismo
PPA – Plano Plurianual
RIMTUR – Relatório de Informação Turística
ROTA/ER – Regionalização do turismo para os municípios ao longo do trajeto do
caminho determinado como Estrada Real.
SETUR – Secretaria de Estado do Turismo de Minas Gerais
SUMÁRIO
1. INTRODUÇÃO............................................................................................................. 14
1.1 Problematização do objeto, questão central e hipótese...................................... 18
1.2 Objetivos................................................................................................................... 20
1.2.1 Objetivo Geral......................................................................................................... 20
1.2.2 Objetivos Específicos............................................................................................. 21
1.3 Abordagem metodológica...................................................................................... 21
1.3.1 Base do estudo qualitativo: a hermenêutica-dialética............................................ 23
1.3.2 Modo de investigação: o estudo de caso................................................................ 26
1.3.3 Procedimentos e técnicas de coleta e análise de dados........................................ 27
1.3.3.1 Coleta e análise de fontes secundárias............................................................... 28
1.3.3.2 Coleta e análise de fontes primárias.................................................................... 29
1.4 Estrutura da dissertação.......................................................................................... 30
2 O CENÁRIO DAS POLÍTICAS PÚBLICAS BRASILEIRAS MEDIANTE O
REFERENCIAL DAS REFORMAS DO ESTADO E DA PRÁTICA DA
DESCENTRALIZAÇÃO POLÍTICO-ADMINISTRATIVA DO ESTADO
NACIONAL.......................................................................................................................
33
2.1 Os diversos caminhos de reforma percorridos pelo estado nacional brasileiro
em prol de um estado democrático...............................................................................
34
2.2 Descentralização e participação social como processos de condução de
políticas públicas no Brasil............................................................................................
42
2.3 Políticas e políticas públicas na condução da vida social do Brasil............................ 59
2.3.1 Características e padrões das políticas para o Brasil.............................................. 59
2.3.2 Políticas Públicas e suas aplicações no campo da práxis....................................... 69
3 A PARTICIPAÇÃO SOCIAL E A GESTÃO SOCIAL: NOVOS CAMINHOS
DEMOCRÁTICOS PARA A SOCIEDADE CIVIL BRASILEIRA......................................
98
3.1 Sociedade civil e sua contribuição para a democracia......................................... 98
3.2 Participação social: caminhos para a prática democrática.................................. 105
3.2.1Redemocratização, Constituição Federal de 1988 e participação social.................. 106
3.2.2 Maior voluntariedade da sociedade em participar................................................... 112
3.2.3 Resultados concretos do processo de participação social no Brasil democrático... 120
3.2.4 As gestões públicas e a maior porosidade dos espaços participativos................... 126
3.3 Avanços proporcionados pela redemocratização no cenário da gestão e de
práticas sociais: gestão social........................................................................................... 131
4 PLANEJAMENTO TURÍSTICO COMO INSTRUMENTO DA PRÁTICA
DESCENTRALIZADA DE GESTÃO PÚBLICA...............................................................
144
4.1 O planejamento turístico e suas interfaces com a organização da atividade
turística............................................................................................................................
152
4.1.1 O processo do planejamento turístico participativo................................................. 155
4.2 Políticas públicas de turismo: novos panoramas e perspectivas...................... 166
4.2.1 Políticas públicas e participação social para o desenvolvimento do turismo no
estado de Minas Gerais....................................................................................................
181
5 PARTICIPAÇÃO SOCIAL E TURISMO SOB A PERSPECTIVA DO CIRCUITO
TURÍSTICO TRILHA DOS INCONFIDENTES..................................................................
199
5.1 O desenho institucional do Circuito Turístico Trilha dos Inconfidentes............ 200
5.2 A operacionalização do Circuito Turístico Trilha dos Inconfidentes em prol da
participação social.............................................................................................................
212
6 CONSIDERAÇÕES FINAIS........................................................................................... 237
7 PROPOSTA DE INTERVENÇÃO.................................................................................. 252
7.1 Introdução.................................................................................................................. 252
7.2 Apresentação............................................................................................................. 253
7.3 Objetivo...................................................................................................................... 256
7.4 Conceito..................................................................................................................... 256
7.5 Características........................................................................................................... 256
7.6 Plano de operações e protótipo do site.................................................................. 258
7.7. Detalhamento e protótipo da nova estrutura do site CTTI................................... 259
7.7.1 Links Regimento Interno e Estatuto......................................................................... 259
7.7.2 Link Estruturas......................................................................................................... 261
7.7.3 Link Reuniões........................................................................................................... 262
7.7.4 Link Atas................................................................................................................... 263
REFERÊNCIAS.............................................................................................................. 265
APÊNDICE........................................................................................................................ 278
1 INTRODUÇÃO
As políticas públicas brasileiras, em especial às destinadas ao setor
turístico, podem ser compreendidas como instrumentos para indução do
desenvolvimento da realidade local (CRUZ 2001), isto é, a partir das diferentes
demandas da sociedade, os agentes públicos organizam instrumentos legais que
visem garantir determinado serviço ou grupo de requisitos legais, modificando as
condições de vida de um determinado grupo que sofra a ação da política pública
(COSTA, 2004).
O caráter público vinculado à política traz o significado de “coisa
pública” (res publica) e, portanto, afeta a todos sob a égide de uma lei e o apoio de
uma comunidade de interesses, não sendo, contudo, referência exclusiva do Estado.
Nesse sentido, as políticas públicas comprometem tanto o Estado quanto a
sociedade, que embora sejam reguladas e frequentemente providas pelo Estado,
também englobam preferências, escolhas e decisões privadas. Enquanto lócus de
materialização de direitos, a política pública deve ser localizada no campo político de
disputa entre forças distintas, que irão refletir na sua execução as circunstâncias
históricas, políticas e sociais (PEREIRA, 2008).
Historicamente no Brasil, as principais demandas sociais brasileiras
têm-se concentrado no atendimento às necessidades básicas como a educação,
saúde, moradia e saneamento básico, criando assim um aparato legal bem alargado
para estes atendimentos. Contudo, no campo do turismo percebe-se que pouco se
tem avançado em relação à criação e consolidação de mecanismos legais, de
caráter público, que visem garantir à população maior acesso às atividades de lazer,
bem como incluindo as atividades de turismo, mediante o planejamento e
ordenamento das atrações turísticas de um dado território que possa promover a
democratização dos produtos e serviços turísticos disponibilizados.
O setor turístico em função de sua ordenação e de seu
desenvolvimento possui em seu seio uma gama de diferentes atores públicos,
privados e civis com interesses específicos, o que de certa forma faz com que atuem
de maneira isolada e sem a preocupação formal de que se comprometam com a
geração de alternativas de desenvolvimento social e na melhora da realidade local.
A geração de impactos negativos é então resultado dessa ação
individualista e egoísta de cada um dos atores envolvidos direta e indiretamente com
a atividade turística, promovendo situações como a exclusão social da comunidade
local quando da sua não inserção no mercado de trabalho gerado pelo turismo;
segregação socioespacial e aumento da discriminação das pequenas comunidades
locais; concentração de renda em pequenos grupos de atores da iniciativa privada,
tais como empresários do setor hoteleiro, do setor de alimentos e bebidas
(restaurantes, bares e similares), empreendimentos de entretenimento, casas
noturnas dentre outros exemplos; e, por fim, enfraquecimento de culturas e
comportamentos culturais dos grupos sociais não preparados para o contato com a
cultura externa imposta pela atividade turística.
Os impactos negativos descritos podem ser destacados pelo do
processo de globalização e pasteurização do produto turístico, pois a partir da
massificação da demanda turística, as destinações turísticas iniciam um processo de
cópia de casos de sucesso, repetindo assim o ordenamento geográfico, a
reprodução de construções, estilos arquitetônicos e, porque não dizer, os
comportamentos culturais, buscando sempre agradar o olhar dos turistas,
esquecendo-se dos valores internos da comunidade.
O pensamento da atividade turística, inserido no contexto da política
pública, deveria basear-se na conjugação de esforços entre poderes públicos, setor
privado (empresários do setor turísticos e outros) e comunidade local, visando o
desenvolvimento de produtos e serviços turísticos autênticos, com características
próprias, combatendo diretamente a geração dos impactos negativos que servem
para manchar a imagem turística da localidade, além de fazer que ao longo prazo a
situação social dessa localidade seja comprometida de forma direta pelo turismo.
Um dos paradigmas da atividade turística é conciliar os interesses
econômicos dos empresários e os interesses sócio-culturais por parte das
administrações públicas e da comunidade local frente à capacidade de geração de
emprego e renda, os quais ficam concentrados no setor privado. A partir desse
paradigma a ação ou intervenção do poder público poderá assumir duas
características distintas: permanecer enquanto expectador ativo criando
instrumentos regulatórios que visem a proteção do espaço, o ordenamento da
atividade e a capacitação da comunidade local para a inserção no mercado turístico;
ou poderá se constituir em um expectador passivo, agindo apenas no recolhimento
dos tributos, não criando dificuldades para o crescimento do setor privado, não
levantando os impactos negativos causados no território e na comunidade local.
Ainda dentro desse paradigma a comunidade local também poderá
atuar de maneira passiva ao ser absorvida no mercado turístico, mesmo que por
salários muito baixos, más condições de trabalho, perda do espaço geográfico frente
à valorização imobiliária, marginalização ou perda dos traços culturais ao abraçar a
cultura externa como melhor e mais valorativa. Contudo, a comunidade local
também pode assumir o papel de agente ativo por meio da capacitação de seus
membros para melhor se adequarem ao mercado turístico e aos novos postos de
trabalhos surgidos, criar mecanismos de reivindicação junto ao poder público de
acompanhamento e ordenamento do mercado turístico e seu crescimento no espaço
territorial e, fortalecimento da cultura local como traço importante para a atração e
continuidade da atividade turística e assim, incidir na gestão pública que garanta um
desenvolvimento local pautado nos interesses coletivos e bem estar da comunidade
local e não somente nos interesses privados.
Para tanto, a atividade turística poderá ter no ordenamento e no
planejamento da atividade a construção de modelos de crescimento mais justos e
democráticos, possibilitando também que grupos de municípios com vocações
turísticas similares, possam juntos estabelecer a planificação, diretrizes e ações que
de maneira conjunta construam novos quadros para o desenvolvimento da atividade
turística enquanto promotora de benefícios positivos para o tripé que sustenta o
produto turístico: o poder privado, poder público e comunidades locais, visando a
redução dos impactos negativos (BENI, 1998; RUSCHMANN, 2001; PETROCCHI,
2001; DIAS, 2003).
No Brasil, essa planificação foi iniciada em 1994 com o Plano Nacional
de Municipalização do Turismo; o qual trabalhou em diversos municípios brasileiros
a capacitação dos agentes do tripé turístico para a construção de planejamentos
democráticos a partir da formação dos conselhos municipais de turismo (DIAS,
2003).
Frente ao modelo de gestão proposto pelo Plano Nacional de
Municipalização do Turismo e como resultado da Política Nacional de Turismo, em
Minas Gerais o modelo de organização da atividade turística adotado em 1999 deu-
se a partir da formação de clusters turísticos, isto é, o espaço geográfico do estado
foi dividido em regiões de interesse turístico comum, visando garantir aos municípios
com vocações equivalentes e complementares o desenvolvimento da atividade
turística de maneira conjunta e regionalizada.
A organização, o planejamento e a execução da prática turística nas
regiões turísticas do estado de Minas Gerais, na concepção de cluster turístico1,
recebeu o nome de “circuitos turísticos” a partir do Decreto-lei Estadual no.
43.321/2003, sendo definido como “organismos estabelecidos formalmente que
congregam os diferentes municípios já regionalizados para que de maneira conjunta
reordenem a atividade turística, mediante a ação coletiva e contínua, contribuindo
para a consolidação de uma atividade regional” (MINAS GERAIS, 2003).
Esses circuitos turísticos devem funcionar a partir da dinâmica de
entidades sem fins lucrativos, podendo se estabelecer como associação, agência de
desenvolvimento ou como uma organização não-governamental (ONG), com
estatutos e regimentos próprios contando com a participação de representantes das
administrações públicas municipais, empresários ligados direta e indiretamente com
a atividade turística e cidadãos. Essa participação, segundo a Secretaria de Estado
do Turismo de Minas Gerais (SETUR)2 é prevista nos espaços das Assembléias
Gerais, sendo estas de caráter deliberativo das ações dos circuitos turísticos
mineiros.
O cenário atual que envolve a participação dos interlocutores
municipais nas assembléias do Circuito Turístico Trilha dos Inconfidentes apresenta
alguns aspectos e particularidades importantes a serem consideradas. Os
municípios envolvidos possuem vocações turísticas diferentes, fazendo com que
haja constantemente disputas por ações distintas entre os mesmos. O
desenvolvimento turístico dos municípios envolvidos apresenta patamares
diferentes, ou seja, alguns municípios já possuem o turismo como a principal
atividade econômico-financeira, enquanto em outros municípios a atividade turística
é ainda um novo desafio a ser enfrentado e implementado por parte dos
interlocutores municipais.
O Circuito Turístico Trilha dos Inconfidentes, unidade de análise
empírica desta pesquisa, integra as 52 regiões turísticas do estado de Minas Gerais.
Enquanto materialização dessa prática turística regionalizada se constitui como um
canal de diálogo entre os gestores municipais no que tange ao desenvolvimento e
1 Cluster turístico refere-se na complementação da oferta turística local pelas cidades integrantes,
cada qual com parte do produto turístico: hospedagem, equipamentos de alimentos e bebidas, serviços de entretenimentos e fatores de atratividade ou também conhecidos como atrativos turísticos. A oferta de todos os destinos irá proporcionar ao turista o máximo de aproveitamento da experiência turística em diversas realidades e culturas. 2 Resolução nº 008 de 28 /04/ 2008.
aprimoramento da atividade turística regional e local a partir de uma gestão
participativa.
1.1 Problematização do Objeto, questão central e hipótese
O Decreto-lei estadual nº 43.321/2003 cria os circuitos turísticos
formalizando a existência do Circuito Turístico Trilha dos Inconfidentes (CTTI); ao
fazê-lo define que esse processo de regionalização da atividade turística deva
acontecer de forma conjunta e coletiva, abrindo espaço para a participação
democrática dos diferentes atores envolvidos. Contudo, esse mesmo Decreto-lei
condiciona a possibilidade de captação de recursos por parte dos municípios junto
ao Poder Executivo estadual somente àqueles que integrarem os circuitos turísticos:
“os órgãos da administração pública municipal do Poder Executivo, seja direta ou
indireta, mediante fundações, autarquias ou empresas públicas somente poderão
apresentar projetos para a captação de recursos se estiver participando de um
circuito turístico” (MINAS GERAIS, 2003).
Nesse sentido, questiona-se se essa regionalização do turismo definida
no plano formal-legal em Minas Gerais, a partir do tripé do setor turístico (poder
público, setor privado e comunidade local) não está restrita a uma ação gerencial
estatal, visando apenas a regulamentação legal, em detrimento de processo
participativo que congregue a partir de interesses múltiplos, dos atores envolvidos
essa integração. E mais, nos indagamos também se ao estabelecer de forma
hierarquizada a necessidade por parte dos municípios de se congregarem em
circuitos turísticos e discutirem “em conjunto” o planejamento, o desenvolvimento e a
promoção da atividade turística estariam assegurando efetivamente a participação
social dos diferentes atores, e em especial os municípios, por meio de seus
representantes públicos constituídos.
É certo que tanto nas normativas (resoluções estaduais) quanto nos
documentos e espaços de comunicação institucional do Circuito Turístico Trilha dos
Inconfidentes há uma afirmação sempre presente da necessidade da participação
dos membros representantes, desenhada a partir de uma agenda de divisão de
responsabilidades, cabendo então a estes uma compreensão das funções do Poder
Executivo, do setor privado, como também da própria comunidade em prol da
atividade turística. Contudo, mesmo o Governo do estado de Minas Gerais propondo
a premiação aos municípios participantes por meio de benefícios de políticas
públicas, ainda verifica-se uma instabilidade por parte dos municípios na
participação no CTTI.
Segundo a Resolução da SETUR nº 008/2008, a gestão dos circuitos
turísticos, entre eles o CTTI, deverá ser desenvolvida por meio do plano estratégico
a ser elaborado conjuntamente pelos atores envolvidos, definindo as ações com foco
no desenvolvimento da atividade turística regional; e da participação dos membros
representantes dos poderes públicos municipais, empresariado e cidadãos no que
se refere ao planejamento, acompanhamento e incremento do turismo regionalizado.
Assim, se questiona se esse plano estratégico é resultado do processo
de participação social dos atores envolvidos. E, sobretudo, qual e como tem sido a
participação dos gestores municipais nos mecanismos de gestão do Circuito
Turístico Trilha dos Inconfidentes como, por exemplo, na elaboração do plano
estratégico, na participação das assembléias enquanto espaços de incidência das
definições e decisões do desenho da gestão desse circuito turístico?
A gestão do Circuito Turístico Trilha dos Inconfidentes vem passando
por um processo de mudanças seguindo as orientações legais da Resolução
SETUR nº 008/2008. Entre as ações destacamos a contratação de um gestor para
circuito3 e o descredenciamento nominal dos municípios inadimplentes com a
contribuição mensal do Circuito4. A partir do acompanhamento das reuniões e
assembléias do Circuito Turístico Trilha dos Inconfidentes temos observado que
algumas das participações dos gestores municipais nas reuniões e assembléias está
mais relacionada à criação de vias para o futuro recebimento de verbas públicas
estaduais voltadas para o incremento do setor turístico5 do que propriamente com os
interesses coletivos voltados ao desenvolvimento do turismo local.
3 De acordo com o artigo 2
o, inciso IV, alínea “e” a Resolução n
o 008/2008, os circuitos turísticos
mineiros que visem a certificação junto à Secretaria de Estado do Turismo deverão manter em cada circuito um bacharel em turismo com a finalidade de responder tecnicamente pelos projetos a serem desenvolvidos em prol do turismo regionalizado. 4 O artigo 3
o define a composição dos municípios participantes dos circuitos turísticos e, no parágrafo
3o, define que cada município mineiro deverá a partir da sua região geográfica, pertencer a somente
um circuito turístico. E, no parágrafo 4o demarca que “Os municípios declarados inadimplentes pelo
Circuito Turístico ficarão impedidos de receber quaisquer benefícios e só voltará a ter direito de recebê-los após 30 (dias) da regularização do fato que motivou tal situação, devidamente comprovada pelo Circuito junto a SETUR” (MINAS GERAIS, 2008). 5 No dia 18 de junho de 2010, o Governo do Estado de Minas Gerais promulgou o Decreto-lei n
o
45.403, no qual estabelece o regulamento para o critério “turismo” para a distribuição da parcela da receita do produto da arrecadação do Imposto sobre circulação de mercadorias e serviços (ICMS)
Os questionamentos gestados tanto no exercício da prática profissional
do pesquisador quanto no processo de formação e produção acadêmicas
despertaram a necessidade de compreender o processo de participação social e
interação dos membros representantes junto às assembléias dos circuitos na
proposição de agendas de ações turísticas regionalizadas.
Nesse sentido, a questão central que move esta pesquisa é: a
estrutura institucional do CTTI (organização, planejamento e execução), incluindo as
dinâmicas e práticas adotadas tem favorecido a participação social, dos atores
envolvidos, como instrumento de democratização da gestão social no âmbito da
política pública de turismo?
A partir da questão central da pesquisa estabelece-se a seguinte
hipótese: os instrumentos/mecanismos adotados na gestão do turismo regional do
estado de Minas Gerais, bem como suas práticas institucionais não tem favorecido o
processo de participação social, enquanto um mecanismo de democratização da
gestão pública, e consequentemente, comprometido o desenvolvimento de uma
gestão social no âmbito das ações de política pública de turismo.
1.2 Objetivos
A partir da questão central e hipótese construída é importante a
explicitação dos objetivos a serem alcançados na busca de uma aproximação do
problema de pesquisa. Nesse sentido, faz-se a explicitação clara dos objetivos a
serem alcançados no desenvolvimento da pesquisa e estudo proposto.
1.2.1 Objetivo Geral
Analisar se a dinâmica e práticas institucionais do Circuito Turístico
Trilha dos Inconfidentes, na sua organização, no seu planejamento e na sua gestão,
tem efetivamente favorecido a participação social dos atores envolvidos e se esse
processo tem se constituído como um importante instrumento de democratização da
gestão social na política pública de turismo regional em Minas Gerais.
pertencente aos municípios, gerando assim mais uma nova fonte de recursos a serem acessadas pelos cofres públicos municipais.
1.2.2 Objetivos Específicos
Analisar as estratégias das políticas públicas que promovem o turismo em
Minas Gerais, os documentos do Circuito Turístico Trilha dos Inconfidentes
(doravante CTTI), tentando estabelecer uma discussão entre aplicação,
diálogos, gestão social e participação social;
Compreender como ocorre a formação e o crescimento regional do turismo no
CTTI com o desenvolvimento das gestões públicas;
Analisar o conjunto de ações e princípios políticos, sociais e filosóficos
oferecidos pela adoção da política estadual, no ramo do turismo,
estabelecendo como ocorre o processo de gestão social nas práticas de
políticas públicas;
Analisar a participação dos membros envolvidos na CTTI (planejamento,
organização e funcionamento), bem como as consequências de suas ações
na gestão turística.
1.3 Abordagem metodológica
O conhecimento da realidade, sob o ponto de vista antropológico,
sempre existiu. Diferentes formas de se buscar esse conhecimento da realidade são
empreendidas: a religião, a filosofia, os mitos, a poesia, as artes (entre outras). A
ciência é apenas uma das formas de compreensão e construção da realidade e na
sociedade Ocidental assume a forma hegemônica (MINAYO, 2008).
Nesse sentido Japiassu (1981, p. 62) completa afirmando que:
(...) a ciência não se interessa pelo objeto real em seu estado bruto. O objeto real só se torna objeto científico quando for retirado do seu estado ‘natural, vale dizer, quando for ‘construído’, elaborado, pensado por uma teoria, ou seja, quando for enquadrado por um ponto de vista teórico.
Muito embora a metodologia assuma a tarefa de formalização,
enquanto disciplina instrumental de questionamentos e indagações, que orientam o
pesquisador para conhecer o objeto (JAPIASSU, 1981), ela não tem um fim em si
mesma. Antes ela é um meio para atingir um fim.
Assim, Bourdieu (2004, p. 14) nos alerta para a permanente
necessidade da vigilância epistemológica, no sentido de “não ceder à tentação de
transformar preceitos do método em cozinha científica, ou engenhoca de
laboratórios”.
A prática científica é tanto para Japiassu (1981) quanto para Bourdieu
(2004), e com eles concordo, uma prática humana, histórica e processual. Assim, o
processo de amadurecimento no campo da pratica científica vai sendo construído à
medida que vamos fazendo e refazendo as reflexões, vamos problematizando a
partir das teorias que nos permitem conhecer melhor o objeto de pesquisa
(JAPIASSU, 1981 apud FUCHS, 2009).
Pode-se ainda argumentar que a metodologia é a forma concreta com
que se trilha a busca pelo conhecimento e, refere-se à maneira com que o
conhecimento desejado possa ser adquirido a partir do modo racional e eficiente
(DENCKER, 1998).
Por fim, o campo da prática científica é concebido do ponto de vista
metodológico como a articulação de diferentes instâncias, de diferentes polos que
determinam o espaço no qual a pesquisa se apresenta, apanhada num campo de
forças e determinadas exigências internas (BRUYNE; HERMAN; SCHOUTHEETE,
1991).
Da conjugação dos diversos polos que se mesclam para a produção
metodológica deste projeto, pode-se apresentar que são: polo epistemológico
(campo do conhecimento teórico-metodológico: a abordagem qualitativa da
hermenêutica dialética) – a escolha; pólo teórico (o quadro referencial teórico,
construído a partir das categorias teóricas que irão sustentar o projeto); pólo
morfológico (a estrutura do projeto – teoria e metodologia) e; pólo técnico (o modo
de investigação – Estudo de Caso).
1.3.1 Base do estudo qualitativo: a hermenêutica-dialética
Nas ciências sociais a busca da construção do conhecimento se baseia
na realidade histórica. Ao mesmo tempo em que procura a profundidade no saber, o
pesquisador social estará aperfeiçoando uma metodologia e elaborando uma norma
para a sua validação (DENCKER, 1998).
A profundidade no conhecimento se valerá também da visão holística
no estudo das ciências sociais, pois parte-se do princípio que: “(...) a compreensão
do significado de um comportamento ou evento só é possível em função da
compreensão das inter-relações que emergem de um dado contexto” (ALVES-
MAZZOTTI; GEWANDSZNAJDER, 2003, p. 131).
O conhecimento dos diversos significados da realidade a ser
observada pelo pesquisador das ciências sociais é a principal manifestação da
forma da pesquisa, sendo possível a todas as pessoas empreenderem tal ação.
Contudo, para que a pesquisa empreendida possa ser validada como científica,
carecerá o pesquisador de obter dados mais sólidos do conhecimento, utilizando-se
de métodos e técnicas formais e institucionais impondo cortes metodológicos
específicos, fazendo com que o conhecimento gerado possa ser validado como
ciência (DEMO, 2000).
A cientificidade, frente a esse quadro difuso de pensamentos e
posições a respeito do uso dos métodos e das técnicas da ciência na produção do
conhecimento, estabelece então um caminho alternativo aos pesquisadores sociais,
ao conceber que o objeto de análise da pesquisa social é diferente do das ciências
naturais: “A cientificidade, portanto, tem que ser pensada como uma idéia reguladora
de alta abstração e não como sinônimo de modelos e normas a serem seguidos”
(MINAYO, 2001, p. 12).
O trabalho científico então caminha sobre duas vertentes: numa
estuda, pesquisa, observa, mede, testa e apresenta os resultados, em outra vertente
inventa os métodos, ratifica o caminho do conhecimento, abandona alguns caminhos
já trilhados e segue para outra direção (MINAYO, 2001).
Ora se cabe ao pesquisador a diferenciação da aplicação das técnicas
a partir do objeto a ser estudado, é importante ressaltar que o emprego de
metodologias qualitativas não descaracteriza, não desqualifica os trabalhos de
metodologias quantitativas: “(...) é preciso saber integrar as dimensões que fazem
parte de uma realidade única, tendo sempre em mente, criticamente, o que cada
metodologia tem de forte e de fraco” (DEMO, 2000, p. 37).
A opção pela abordagem qualitativa é feita pelo pesquisador frente ao
objeto de pesquisa, pois caberá à experiência do pesquisador verificar quais são os
melhores instrumentos de pesquisa que poderão extrair do objeto a informação que
responderá a seus questionamentos:
A pesquisa qualitativa responde a questões muito particulares. Ela se preocupa com um nível da realidade que não pode ser quantificado. Ou seja, ela trabalha com o universo de significados, motivos, aspirações, crenças, valores, atitudes, o que corresponde a um espaço mais profundo das relações, dos processos e dos fenômenos (MINAYO, 2001, p. 21-22).
A pesquisa qualitativa assume uma faceta de pesquisa indutiva, na
qual o pesquisador parte de observações livres, mas que possuem o rigor da ciência
e o caráter de cientificidade como guias nessas observações. As dimensões e
categorias próprias do objeto de pesquisa irão emergir numa sequência progressiva
quando do processo de coleta e análise dos dados do objeto (ALVES-MAZZOTTI;
GEWANDSZNAJDER, 2003).
Para que a utilização da metodologia qualitativa resulte em uma análise
de dados confiáveis, é necessário que no decurso da observação livre o pesquisador
aceite os critérios da historicidade, da colaboração, mas que, sobretudo possa ser
revestido da humildade do aprender a aprender e saber que o conhecimento é
aproximado, construído (MINAYO, 2001).
Para o empreendimento desta pesquisa no campo da atividade
turística, a aplicação da metodologia qualitativa fará com o que o pesquisador
estude a realidade e o momento histórico no qual o objeto está inserido, implicando
a formalização dessa discussão apresentada: haverá a aquisição de conhecimento
ao mesmo passo que se desenvolve e se aprimora o método empreendido para a
construção do conhecimento (DENCKER, 1998).
Frente a essa abordagem qualitativa aliamos a proposição da
hermenêutica-dialética, enquanto “um importante caminho do pensamento para
fundamentar a pesquisa qualitativa” (MINAYO, 2008).
A proposição da hermenêutica-dialética é de importância para esta
pesquisa pela sua dinâmica e precisão para a coleta de dados e, por apresentar um
aprofundamento na análise dos dados coletados frente ao referencial teórico
abordado como suporte da pesquisa (OLIVEIRA, 2001).
A proposta de Habermas (1987 apud MINAYO, 2008) passa pela
construção de um movimento interativo entre hermenêutica e dialética, valorizando
as complementaridades e oposições entre as duas: a) ambas trazem no seu núcleo
a idéia fecunda dos condicionamentos históricos da linguagem, das relações e das
práticas; b) ambas partem do pressuposto de que não há observador imparcial; c)
ambas questionam o tecnicismo em favor do processo intersubjetivo de
compreensão e de crítica; d) ambas ultrapassam as tarefas de serem simples
ferramentas para o pensamento e e) ambas estão referidas à práxis estruturada pela
tradição, pela linguagem, pelo poder e pelo trabalho.
Contudo, a hermenêutica6 e a dialética7 não são conceitos que
convergem para o mesmo ponto, mas que quando analisados em conjunto traduzem
o objeto pesquisado a partir da visão das diferentes facetas que o compõem e:
No entanto, enquanto a hermenêutica enfatiza o significado do que é consensual, da mediação, do acordo e da unidade do sentido, a dialética se orienta para a diferença, o contraste, o dissenso, a ruptura do sentido, portanto para a crítica (MINAYO, 2008, p. 168).
A junção de ambos os métodos faz com que um implique no outro,
criando a cumplicidade resultando numa visão realista a respeito do objeto
pesquisado. A compreensão epistemológica do objeto de pesquisa se dará no
caminho do pensamento/conhecimento a partir da interpretação ou reinterpretação
da realidade estudada.
1.3.2 Modo de Investigação: o estudo de caso
Para alcançar os objetivos propostos nessa pesquisa a partir do
problema de pesquisa optamos pelo modo de investigação do Estudo de caso, pois
refere-se a uma estratégia de pesquisa que visa a compreensão do objeto estudado,
que em sua essência trata-se de um fenômeno social complexo, ao envolver
diversos e diferentes atores do Circuito Turístico Trilha dos Inconfidentes:
(...) o estudo de caso permite uma investigação para se preservar as características holísticas e significativas dos acontecimentos da vida real – tais como ciclos de vida individuais, processos organizacionais e
6 A hermenêutica se refere à interpretação do sentido das palavras, assim como a arte de interpretar
leis, códices, textos sagrados, etc. 7 A dialética é definida como a arte de raciocinar a partir de métodos. Refere-se ao que é lógico,
possui uma lógica. A forma de apresentação da dialética é a argumentação engenhosa e dialogada entre aqueles que a praticam ou a estudam. A dialética considera dois planos categoriais de análise: a) como a dialética imagina a realidade (a idéia do conflito social, totalidade, unidade de contrários, teoria e prática e condições objetivas e subjetivas); b) como ela imagina o conhecimento.
administrativos, mudanças ocorridas em regiões urbanas, relações internacionais e a maturação de setores econômicos (YIN, 2005, p. 20).
Contudo, os cientistas sociais preferem utilizar o estudo de caso como
uma parte da pesquisa, ou seja, utiliza-se o estudo de caso como um instrumento da
fase exploratória da investigação, carecendo de outros instrumentos científicos como
a investigação exploratória para alicerçar a discussão e, por conseguinte dar
cientificidade ao estudo empreendido (YIN, 2005).
Tal concepção é refutável ao conceber que o estudo de caso, por se
tratar de uma técnica de pesquisa, exige do pesquisador um profundo e exaustivo
estudo da realidade pesquisada. Desta forma o uso da técnica permite um profundo
conhecimento dos processos e das relações que envolvem o objeto de pesquisa
(DENCKER, 1998).
A profundidade do conhecimento a ser obtido com a aplicação da
técnica de estudo de caso, faz com que se advogue que esta técnica cria suportes
metodológicos para afirmar que a idéia de cientificidade aplicada ao objeto, pois a
cientificidade abarca em si pólos opostos como a unidade e a diversidade:
(...) existe a possibilidade de encontrarmos semelhanças relativamente profundas em todos os empreendimentos que se inspiram na idéia geral de um conhecimento por conceitos, seja de caráter sistemático, seja exploratório e dinâmico. (...) Mas por outro lado, a cientificidade não pode ser reduzida a uma forma determinada de conhecer, ela pré-contem, por assim dizer, diversas maneiras concretas e potenciais de realização (MINAYO, 2001, p. 11).
Se o objeto de pesquisa refere-se à dinâmica e práticas institucionais
como elemento de participação social entre os membros dos diversos municípios
que compõem o Circuito Trilha dos Inconfidentes, a técnica a ser empregada deverá
ser aquela que corrobore na construção de novos postulados teóricos e científicos a
partir da observação destes no CTTI.
1.3.3 Procedimentos e técnicas de coleta e análise de dados
Bourdieu (2004) de forma categórica e precisa chama atenção do
pesquisador para as facilidades de uma aplicação automática de procedimentos já
experimentados e, ensina que “que toda a operação, por mais rotineira e rotinizada
que seja, deve ser repensada, tanto em si mesma quanto em função do caso
particular” (BOURDIEU, 2004, p. 14).
Nesse sentido, em se tratando esta pesquisa também de uma análise
de Políticas públicas setoriais, em específico das políticas públicas de turismo do
Estado de Minas Gerais, a contribuição de Frey soma-se na apresentação do campo
mais instrumental-operacional da pesquisa. Segundo Frey (2000a, p. 214):
(...) o interesse da análise de políticas públicas não se restringe meramente a aumentar o conhecimento sobre planos, programas e projetos desenvolvidos e implementados pelas políticas setoriais. (...) Pretende analisar a inter-relação entre as instituições políticas, o processo político e os conteúdos de política.
Feito a devida sinalização para os cuidados com os instrumentos e a
adequada utilização destes faz-se necessário o detalhamento do modo de operar a
realização da pesquisa.
Definida a unidade de análise empírica, a saber: o Circuito Turístico
Trilha dos Inconfidentes, as razões que contribuíram para sua escolha pode ser
fundamentada nos dizeres de Alves-Mazzotti e Gewandsznajder (2003, p. 162):
[...] a escolha do campo onde serão coletados os dados, bem como dos participantes é proposital, isto é, o pesquisador os escolhe em função das questões de interesse do estudo e também das condições de acesso e permanência no campo e disponibilidade dos sujeitos.
A delimitação geográfica correspondente ao estado de Minas Gerais
deu-se em razão da inserção do pesquisador no campo de pesquisa, o que favorece
um maior aprofundamento na temática. Dentro desta delimitação estão os 20
municípios que fazem parte do CTTI.
Assim, para o conhecimento, análise e compreensão da realidade que
cerca a participação social no Circuito Turístico Trilha dos Inconfidentes, será
necessário dar continuidade à pesquisa bibliográfica para aprofundar as categorias
teóricas de análise que cercam o presente projeto de pesquisa, pois são elas que
permitirão a possibilidade explicativa da realidade estudada (DEMO, 2000).
A coleta de dados compreende várias fontes que à luz do referencial
teórico permitirá a reinterpretação da realidade. Os dados a serem colhidos como
fontes de informação empírica são descritos abaixo, além da bibliográfica, a
documental e experimental.
1.3.3.1 Coleta e análise de fontes secundárias
Compreendeu uma rigorosa e criteriosa pesquisa documental a partir
dos seguintes documentos institucionais do Circuito Turístico Trilha dos
Inconfidentes: o estatuto, o regimento, as atas das reuniões, outros documentos
relativos ao Circuito no que se refere ao planejamento, gestão e condução da
atividade turística regional. E, será analisada a política nacional de turismo e a
política estadual de turismo, permitindo ao pesquisador a visualização do panorama
das diretrizes e orientações estabelecidas pelo poder público federal e estadual em
relação ao turismo.
Como procedimento de análise foi realizada uma leitura criteriosa
selecionando informações a partir dos três grandes eixos de análise: conteúdo,
método e gestão partindo do modelo adotado por Avritzer (2010), que foram
relacionados com as demais fontes primárias de dados discutidas ao longo da
dissertação.
A leitura do Estatuto do CTTI se baseará na 4ª (quarta) versão do
documento, visto que, antes dessa alteração e com base na leitura das atas a forma
de composição dos municípios que integram o CTTI não era definida causando a
entrada e saída de cidades.
A leitura das atas do CTTI se deu a partir da data de 17 de julho de
2007, quando se iniciou o processo de discussão em prol da alteração do Estatuto e
do Regimento Interno, até o mês de julho do ano de 2011. Foram lidas e trabalhadas
um total de nove atas referentes à Assembléia Geral e oito atas das reuniões da
Diretoria Executiva do CTTI.
O levantamento qualitativo, a partir das atas das assembléias, traçou o
perfil dos representantes e dos municípios que integram o CTTI a fim de identificar
como tem sido historicamente a participação dos atores sociais envolvidos no
planejamento e gestão do CTTI.
1.3.3.2 Coleta e análise de fontes primárias
O primeiro momento da pesquisa se deu com a observação livre das
assembléias do CTTI para a compreensão de como se dava o processo envolvendo
a organização, o planejamento e a gestão tanto do Circuito Turístico quanto da
atividade turística regionalizada. Para tanto, foram observadas 02 (duas)
assembléias, a primeira no dia 30 de novembro de 2010, a qual serviu de base para
a identificação dos primeiros questionamentos e da construção das hipóteses de
pesquisa. A segunda reunião observada foi a realizada no dia 12 de abril de 2011, a
qual possibilitou o contato do pesquisador com o corpo gestor do CTTI e a obtenção
de documentos para a análise dos dados secundários.
Para entender a relação entre o desenho institucional do CTTI com a
prática da participação social definiu-se pela aplicação de instrumental avaliativo –
questionário – que foi preenchido pelos integrantes do Circuito Turístico Trilha dos
Inconfidentes (Apêndice 1), visando obter uma fotografia da participação, da ação e
do envolvimento dos representantes nas discussões e na gestão do Circuito
Turístico Trilha dos Inconfidentes.
Para a obtenção desse panorama de observação da gestão do CTTI,
foi enviado aos municípios por e-mail o instrumental de coleta de dados
(questionário) com ênfase quantitativa para que os gestores municipais pudessem
respondê-lo de maneira fácil e cômoda, assinalando a percepção
individual/municipal da gestão turística participativa.
O prazo dado pelo pesquisador aos municípios para que pudessem
responder ao questionário foi de um mês a partir da data do envio, data esta que se
deu no início do mês de junho.
Alguns municípios responderam prontamente ao pesquisador enviando
o questionário respondido antes do final do prazo, somando um total de 11
municípios. Dado a finalização do prazo para a resposta, somente um município
enviou o questionário, e os outros oito municípios não responderam e não
sinalizaram interesse em responder à pesquisa.
A aplicação do método misto (qualitativo e quantitativo) se justifica
também pela necessidade de explicitar em como a teoria pesquisada, enquanto
estrutura de orientação para o estudo empreendido, é de fato observada no campo
da práxis do Circuito Turístico Trilha dos Inconfidentes.
O nível de confiança dos dados foi calculado em 90% a partir do
resultado obtido com o total de respondentes do questionário, representando que a
probabilidade do erro amostral efetivo seja de 90% menor do que o erro amostral
admitido pela pesquisa.
Nessas condições, a amostra e o resultado da pesquisa de fato irão
contribuir para que se possa analisar em como a gestão do CTTI é desenvolvida e
avaliada pelos municípios respondentes ao questionário emitido.
1.4 Estrutura da dissertação
Quanto à estrutura a dissertação está assim organizada: o primeiro
capítulo irá apresentar, inicialmente, a discussão conceitual envolvendo diferentes
autores e visões a respeito da construção histórica das reformas político-
administrativas as quais deram os contornos atuais para o Brasil e seus estados,
mas tendo como unidade de análise o processo da democratização como fio
condutor das análises feitas; os diferentes procedimentos político-administrativos em
consonância com a democratização das ações trouxeram consigo a inserção do
pensamento da descentralização para que o Estado Nacional brasileiro pudesse
reorganizar a administração pública e com isso um conjunto de diferentes posições
são apresentadas a partir da dicotomia existente entre as agendas social-democrata
e a neoliberal procedendo a essa análise em profundidade.
A discussão toda empreendida é margeada pelo pensamento político e
por isso no terceiro momento do primeiro capítulo é delineado a formação do
conceito de política e como esta se estabelece a partir da realidade democrática,
além de empreender a disposição do pensamento das políticas públicas e como
estas se estabelecem enquanto mecanismo de atendimento às demandas sociais
apresentadas após a reforma do Estado Nacional brasileiro e admissão de práticas
descentralizadas em prol da maior democratização das ações públicas promovidas
pelo Estado.
O segundo capítulo possui o seu viés edificado mediante os diferentes
processos que a gestão das políticas públicas feitas pelo Estado consegue alcançar
mediante o estabelecimento da prática da participação social como fruto da
democratização e da descentralização. Para tanto, apresenta-se inicialmente como o
processo participativo é incluído na agenda das reformas democráticas do Estado
Nacional brasileiro, a partir da sociedade civil e de suas diferentes configurações
adotadas ao longo dos anos; num segundo momento discute-se a participação
social como lócus das práticas democráticas e de maior envolvimento entre o Estado
e a sociedade civil promovendo o alargamento das práticas democráticas e cidadãs
fazendo com que se torne possível a criação de espaços participativos que visem ao
controle social das políticas públicas; e por fim, o conceito de gestão social é
apresentado como um novo modelo de gestão que poderá auxiliar tanto o Estado
quanto a sociedade civil para que a participação social possa ser efetivada não
somente nos espaços participativos, mas como um conceito central de novas
práticas gerências em prol da democracia e cidadania.
Já o terceiro capítulo aborda a atividade turística enquanto recorte do
objeto a ser analisado nesta pesquisa partindo da compreensão de como o conceito
de turismo é formado a partir de diferentes elementos e motivações; em um segundo
momento é discutido como o planejamento turístico é empregado como instrumento
formal para que possa administrar a atividade turística em uma dada região visando
a ordenação dos atores sociais e as suas responsabilidades contribuindo para que o
desenvolvimento e o crescimento possam ser elementos que visem contribuir para a
comunidade local, o empresariado e o poder público, e apresenta-se a discussão
pormenorizada a respeito de como o processo do planejamento turístico participativo
pode ser benéfico em prol da sinergia entre esses diferentes atores sociais
envolvidos com o turismo local e/ou regional; num terceiro momento é delineado a
construção do pensamento das políticas públicas para a atividade turística e em
como estas estão promovendo o alargamento da discussão em prol do envolvimento
dos diferentes atores sociais a partir do planejamento e da ordenação da atividade
turística; e por fim, faz-se a análise das políticas públicas do Estado de Minas Gerais
a partir dos seus diferentes instrumentos legais sancionados.
O quarto capítulo apresenta a discussão do objeto de pesquisa em si,
ou seja, o Circuito Turístico Trilha dos Inconfidentes é compreendido a partir das
vertentes da sua estrutura institucional, de como o planejamento das ações se dá a
partir da participação social dos membros associados, e de como a execução e a
gestão do circuito turístico é percebida pelos diferentes atores sociais integrantes a
partir da análise profunda de variáveis que se esmeram em criar um cenário
avaliativo a respeito da gestão e da participação social; além de se discutir como o
planejamento turístico participativo pode ser visualizado com base nas práticas e da
ação dos gestores e dos membros associados em prol do desenvolvimento da
atividade turística regional, além de perceber como o processo de descentralização
está sendo efetivado em detrimento das discussões e da gestão feita pelos próprios
associados a partir de seus conhecimentos e práticas locais.
Com base nos resultados desse estudo proposto no mestrado
pretende-se contribuir com o debate científico e com o entendimento e a busca de
alternativas ao problema de pesquisa levantado; propor alternativas concretas que
contribuam para a consolidação de práticas de gestão coletivizada e participativa do
Circuito Turístico Trilha dos Inconfidentes, promovendo desta forma o turismo
regional como instrumento de integração dos municípios participantes e, fomentando
o desenvolvimento turístico regional e local.
E por fim, o presente estudo visa contribuir na construção e
operacionalização de uma agenda permanente de discussão entre os membros
representantes municipais nas assembléias do Circuito Turístico Trilha dos
Inconfidentes a partir do sentido da participação social como instrumento para a
democratização das ações públicas e fortalecendo as interações sociais entre poder
público, privado e comunidade local.
2 O CENÁRIO DAS POLÍTICAS PÚBLICAS BRASILEIRAS
MEDIANTE O REFERENCIAL DAS REFORMAS DO ESTADO E DA
PRÁTICA DA DESCENTRALIZAÇÃO POLÍTICO-ADMINISTRATIVA
DO ESTADO NACIONAL
A formulação das políticas públicas no atual cenário político-social
brasileiro tem contribuído para que novas medidas legais possam ser colocadas em
favor da sociedade, principalmente em prol de comunidades que historicamente não
possuíam acesso à esfera do poder político, sanando assim necessidades e
demandas por serviços sociais, além de criar diálogo entre os mais diferentes atores
sociais que possam ser envolvidos nessa mudança de cenário.
Mas cabe ressaltar que esse processo da formulação de políticas
públicas veio a ganhar corpo e respaldo a partir das intensas mudanças ocorridas
dentro da esfera estatal, mais precisamente após inúmeras reformas pelas quais o
Estado Nacional brasileiro passou mediante o seu ajuste para se adequar às
condições de tempo e necessidades sociais.
E, mediante tais reformas uma ação que vem ganhando destaque e
permanência no conjuntos das mesmas é o processo constante de descentralização
das instâncias de poder e de serviços públicos para espaços mais próximos da
população, criando assim um elo entre o poder público e sociedade, e políticas
públicas e descentralização.
Para tanto, o presente capítulo se debruça no corpo teórico de autores
para a apresentação em um primeiro momento, de como se estabeleceram as
reformas no processo histórico e político do Brasil, mas tendo o cuidado de abordá-
lo mediante o recorte da democratização e processos políticos; num segundo
momento é apresentado como a descentralização é apresentada a partir das
reformas do Estado Nacional para que uma nova agenda política possa ser
conduzida; e num terceiro momento a discussão da polissemia que o conceito de
política recebe para que se construa um caminho de como a política pública é
pensada e apresentada à sociedade após os dilemas da reforma do Estado e a
inclusão da descentralização no cotidiano político-administrativo do Estado.
2.1 Os diversos caminhos de reforma percorridos pelo estado nacional
brasileiro em prol de um estado democrático
Pensar no Estado é conceber um mister de preocupações, interesses e
vontades coletivas de uma nação vocalizadas ou expressas por um conjunto
determinado de atores sociais, os quais irão ora exercer livremente a vontade da
coletividade, ou seja, a sociedade por compreendê-la e representá-la, ora irão
exercer autoritariamente o poder de controlar e dirigir a coletividade mediante
instrumentos de pressão e controle extremo.
Mas refletir a respeito do Estado é, sobretudo, uma tarefa árdua,
principalmente quando esta reflexão é feita no entendimento da formação e
estabelecimento do Estado Nacional brasileiro. Muitos foram os processos
administrativos e de poder que estiveram presentes, ora criando instrumentos
legítimos em prol da formação da cúpula do poder – os políticos e o corpo de
funcionários que compõem o Estado – ora agindo em favor de interesses
individualistas e formando uma rede de clientelismos e patronagens, deteriorando o
sentido da democracia.
Poder-se-ia pensar que a figura do Estado e o seu controle sobre a
sociedade seria igualado a uma família e o poder que o provedor dessa família tem
sobre os seus, mas o Estado é muito mais do que isso, pois este representa um
conjunto de interesses, proteções e serviços que devem ser disponibilizados a todos
e não somente a um pequeno grupo:
Só pela transgressão da ordem doméstica e familiar é que nasce o Estado e que o simples indivíduo se faz cidadão, contribuinte, eleitor, elegível, recrutável e responsável, ante as leis da Cidade. Há nesse fato um triunfo do geral sobre o particular, do intelectual sobre o material, do abstrato sobre o corpóreo e não uma depuração sucessiva (...) (HOLANDA, 1995, p. 141).
Considerar, o Estado como um conjunto de princípios e valores que
irão reger a vida de uma sociedade, do conjunto de diversas e diferentes famílias é
assegurar que a todas sejam providas suas necessidades coletivas de maneira
igualitária, mas que para que exista é preciso uma ordem, um conjunto de regras e
instrumentos legais que possam dar ordem ao caos que é a vida social e a
convivência das diversas pessoais nas cidades.
Neste tocante, Holanda (1995) destaca que o papel do indivíduo na
vida do Estado, tendo graus diferentes de responsabilidade e de ação, não ficando à
margem ou à espera constante de que o Estado por si só tenha o vislumbre de como
melhor servi-lo e em como apresentar as normas e regulamentos para que possam
ser seguidos por ele.
Pensar nesse conjunto de responsabilidades e de ações que cabe
aos indivíduos é refletir que a formação do Estado é um processo lento, dificultoso e
em muitas vezes contraditório por não refletir a vontade de todos, mas somente de
alguns, mas que em essência é um processo que emana da razão e da ação
humana (BRESSER-PEREIRA, 2010a).
Se assim é pensando e apresentado o Estado é, portanto,
compreensível que em determinados momentos históricos alguns indivíduos roguem
para si o direito da condução do Estado mediante seus interesses e suas vontades.
Para a realidade brasileira, pensar no Estado Nacional é refletir sobre
os seus mais de 200 (duzentos) anos de formação; refletir em como uma simples
colônia extrativista consegue o status de vice-reinado e, por uma reviravolta histórica
passa a ser sede da Monarquia Portuguesa, passando então a ser provido por uma
série de benefícios antes inimagináveis, tais como a instalação de um banco próprio,
ampliação de faculdades e centros de estudos, melhora nos serviços públicos
básicos, além da incorporação dos preceitos de como é o funcionamento das
diferentes estruturas de poder internas do Estado8.
Mas como o viés para a reflexão desta parte da pesquisa é sobre as
reformas administrativas, cabe então mencionar que as primeiras reformas para a
composição do atual Estado brasileiro se deram quando da proclamação da
República, alterando a maneira em como a condução política era conduzida:
abandonava-se a Monarquia Portuguesa e a sua corte e passava-se para o
processo Presidencialista, apoiado nos pilares do voto, no apoio de políticos, e da
manutenção do poder em favor de nova elite brasileira – os cafeicultores paulistas
(COSTA, 2008).
8 Para uma maior e mais abrangente visão a respeito do início da formação do Estado brasileiro
recomenda-se a leitura do artigo “Brasil: 200 anos de Estado; 200 anos de administração pública; 200 anos de reformas”, redigido por Frederico Lustosa da Costa e publicado na Revista de Administração Pública no ano de 2008, no número 42. Neste artigo é desvelado como a administração colonial portuguesa apresenta à realidade brasileira o know-how da burocracia estatal européia, em especial a portuguesa, e em como esses laços entre burocracia e poder político são incorporados para a realidade brasileira, perdurando até os dias atuais, tornando-se assim parte da vida sociocultural e política do Estado Nacional brasileiro.
Essa transformação pode num primeiro momento não representar em
muito uma ampla alteração no modo como o Estado brasileiro foi conduzido por um
longo período de tempo, mas demonstra como a base do pensamento e da
condução política era feita. Alteram apenas as denominações de monarquia para
república, de províncias para estados, de condes, viscondes e barões para
senhores, coronéis e políticos.
Toda essa nova estrutura apresentava uma caracterização
metamorfoseada do que era a Monarquia Brasileira de Dom Pedro II: as províncias
transformadas em estados agora não dependiam mais dos seus figurões (barões,
viscondes) escolhidos pela monarquia para lhe representarem, mas passavam a
depender da vontade e do interesse dos senhores, dos coronéis locais e dos
políticos para fazer valer a suas vontades e interesses nos espaços ditos como
democráticos que são as a assembléia nacional, as assembléias estaduais, as
câmaras de vereadores locais.
Passando então historicamente pela República Velha, a era Vargas, o
surto de crescimento nacional por Juscelino Kubitscheck, o que se pode observar no
quadro do Estado nacional brasileiro é que:
Embora tenha havido avanços isolados durante os governos de Getúlio Vargas, Juscelino Kubitscheck, Jânio Quadros e João Goulart, o que se observa é a manutenção de práticas clientelistas, que negligenciavam a burocracia existente, além da falta de investimento na sua profissionalização. A cada deságio surgido na administração do setor público, decorrente da própria evolução socioeconômica e política do país, a saída utilizada era sempre a criação de novas estruturas alheias à administração direta e o conseqüente adiamento da difícil tarefa de reformulação e profissionalização da burocracia existente (COSTA, 2008, p. 849).
Se o Brasil aprende o modo de funcionamento da burocracia
portuguesa nos idos do tempo colonial, é sabido que esse pensamento perdurasse
por um determinado tempo, mas não que fosse corrompendo a estrutura interna do
Estado, criando dificuldades e obstáculos para que o desenvolvimento e o
crescimento pudessem ser absorvidos de maneira igualitária por toda a sociedade.
Controlar a burocracia e as suas redes de poder é quase uma meta a
ser alcançada para qualquer um dos políticos eleitos pelos brasileiros em prol da
construção da imagem de um novo Estado Nacional, mas pelo que foi demonstrado
por Costa (2008) não foi vencido pelos governantes, mas sim alimentado
gradualmente em favor de clientelismos e patronagens referente à condução
político-administrativa do Estado por cada um dos governantes.
O aumento gradual da burocracia mediante a criação de novas
estruturas internas do Estado como agências, fundações ou empresas estatais, cada
qual com a sua autonomia e distanciamento da esfera do poder central do Estado
pode parecer, num primeiro momento, como um avanço técnico para se operar
ações pontuais em favor da discrepante realidade socioeconômica da população
brasileira.
Mas cada vez que se criava uma nova estrutura administrativa
independente da esfera central do Estado, estava-se ao mesmo tempo alimentando
a burocracia com novos elementos e novos processos administrativos morosos, e
criando redes isoladas e sem comunicação com o núcleo central do poder do
Estado.
Com isso, a autonomia política era exercida livremente pelos partidos
políticos que controlassem essas estruturas administrativas indiretas, fazendo com
que os interesses particularistas e clientelistas recebessem agora não somente a
legitimação do Estado, mas também, em determinados casos, aportes financeiros
para a realização dessas ações individualistas.
Frente a tal realidade caótica no Estado brasileiro, em 1° de abril de
1964 o Brasil passa a ser governado não mais por um conjunto democrático de
políticos, mas por uma base de atores militares, pois exatamente nesta data foi
realizada uma intervenção direta na condução do Estado Nacional pelas Forças
Armadas.
O governo militar durante o longo período de poder frente ao Estado
Nacional implementou uma série de reformas administrativas que alteraram
profundamente a estrutura e o pensamento da condução da vida social, econômica
e política dos brasileiros:
(...) promoveu uma reforma tributária, reorganizou o sistema bancário, reestruturou o ensino universitário e realizou uma ampla reforma administrativa. Em 1965 teve início a reforma tributária que se consolidou com a Constituição de 1967, uniformizando a legislação, simplificando o sistema e reduzindo o número de impostos. Ela trouxe uma brutal concentração de recursos nas mãos da União, esvaziando financeiramente estados e municípios que ficaram dependentes de transferências voluntárias (COSTA, 2008, p. 851).
Desse conjunto de reformas o que mais chama a atenção é o caráter
centralista adotado pelo governo militar, ou seja, com os recursos financeiros
unificados e centralizados na União, os estados e municípios se tornam reféns
político e economicamente dos interesses da União, não cabendo a estes questionar
as transferências de recursos, pois estas se davam de maneira voluntária.
Outro preceito importante adotado pelos governos militares foi o
pensamento de que as ações estatais deveriam sempre se orientar pelos princípios
do planejamento, da coordenação, da descentralização, da delegação de
competências e do controle (COSTA, 2008).
A adoção de tais preceitos inicia na vida pública do Estado a criação e
o estabelecimento cada vez maior do poder dos burocratas e do favorecimento do
conhecimento técnico, distanciando assim as ações do Estado (as políticas) da
população e mesmo dos problemas vivenciados pela sociedade9.
Questionar a União neste momento histórico representava questionar
as Forças Armadas, era questionar a ordem determinada pelo conjunto de militares
que foram incorporados no corpo de burocratas do Estado. E questionar a União
igualmente representava uma insurreição contra o poder dos militares, não sendo
assumida publicamente tal postura, nem por políticos que estavam incorporados no
Estado, nem pela sociedade que era amplamente reprimida.
Frente a tal realidade, árdua a tarefa de pensar em democracia, pois a
prática estatal era impregnada de pensamentos como o centralismo, autoritarismo e
conservadorismo, não permitindo que a ideia de um Estado de fato democrático
fosse cogitada pela sociedade.
No cenário social um conjunto de atores sociais se une engajados na
luta por direitos, mas não voltados unicamente para o acesso aos serviços e bens
públicos, como a saúde, educação, moradia e segurança, mas para que os direitos
devessem ser legitimadores da igualdade dos sujeitos de uma sociedade, como
também corroborar para a diferença desses mesmos sujeitos: mulheres, negros,
homossexuais, trabalhadores, sindicalistas dentre outros movimentos sociais que
estiveram à frente na luta pela cidadania (KAUCHAKJE, 2007).
9 O papel da burocracia, dos burocratas e do conhecimento técnico será tratado mais adiante neste
texto quando for discutido o conceito de políticas públicas e como o conjunto de atores internos do
Estado se estabelece e age.
A principal intenção desse grupo de atores sociais era a criação de
uma redemocratização do Estado no Brasil, agindo da correção dos erros cometidos
pelos governos militares, e possibilitando à sociedade a eleição de seus atores
políticos para que os representassem nas diferentes estruturas de poder do Estado.
Neste tocante, pode-se dizer que a luta convergia em favor da eleição
direta de um Presidente da República, conseguindo o apoio de diferentes correntes
políticas oposicionárias no contexto político, mas que ao vislumbrarem novamente a
possibilidade das eleições e do real controle democrático, a conversão de forças se
fez inevitável (NOGUEIRA, 2005).
Tal campanha num primeiro momento foi vencida pelo plano
parlamentar em vigor, mas que conseguiu num segundo momento a energia
necessária para reunir todos os brasileiros descontentes com a realidade do governo
militar: “A chegada ao poder da Aliança Democrática, em 1985, simbolizou o fim de
uma época e redefiniu as condições concretas do fazer político, dando passagem a
uma nova dialética entre Estado e a sociedade” (NOGUEIRA, 2005, p. 23).
A ditadura e os governos militares chegam ao fim e, com eles a
alvorada dos novos tempos: re-configurar um país que há muitos anos não sabia
mais o que significava o direito de votar, o direito de expressar suas vontades e de ir
ao encontro do Estado e apresentar as suas necessidades.
Com o fim da ditadura e frente a essa nova realidade social, o principal
instrumento em favor da democracia necessitava ser alterado: o texto da
Constituição Brasileira. Se em 1967 os militares impõem o regime democrático
autoritário, para a nova configuração do Brasil, seria necessário que um outro
instrumento fosse escrito em favor da sociedade, contemplando a abertura do
diálogo não somente da sociedade para com o Estado, mas entre todos aqueles que
necessitam da atuação ou intervenção direta do Estado.
Assim, em 1988 é promulgada a nova Constituição do Estado brasileiro
e com ela um conjunto de profundas mudanças para o contexto da administração
pública: a democratização do Estado, a descentralização, a reforma do serviço
público (ABRUCIO, 2007).
Conceber um Estado democrático é dar à população o status de
controle social perante o conjunto de ações, planos, programas e políticas que são
emanados do Estado para a sociedade, favorecendo desta maneira que a sociedade
possa mediante os princípios da legalidade, da publicidade e da transparência ter
amplo acesso às decisões dos atores políticos. Mas ainda assim constitui o
alicerçamento de que o controle do Estado não se dará por somente órgãos
internos, mas operado em conjunto a partir da reformulação das estratégias de ação
do Ministério Público, que passa a ser o órgão governamental que recebe as
intenções de controle da sociedade.
Se o conjunto de reformas recebe o nome de reformas democráticas,
cabe então questionar o autoritarismo e o centralismo das ações empreendidas
pelos governos militares e para tanto, apresentou-se no texto da Constituição
Federal de 1988 (CF-88) o princípio da descentralização, ou seja, a partir da
participação cidadã e de maior proximidade e autonomia das esferas supranacionais
com os problemas, necessidades e demandas da sociedade, credita-se ao Estado
um novo campo para a formulação e implementação de novos instrumentos legais
que corroborem em favor do desenvolvimento social, das melhorias nos serviços
públicos e de uma maior proximidade das esferas de poder para com a sociedade,
que antes era alijada das discussões político-administrativas do Estado.
E, para completar o conjunto de reformas, a CF-88 trouxe em seu texto
um mecanismo para a constante profissionalização da burocracia estatal: o princípio
da seleção meritocrática e universal, baseada nos concursos públicos. Tal medida
se fez necessária para combater o empreguismo clientelista exercido há muitos anos
por políticos interessados em criar redes de poder locais financiadas com o dinheiro
público.
Com a meritocracia nas diferentes instâncias do poder público,
paulatinamente será substituída a rede corrupta e nefasta de burocratas que
exerciam e alimentavam os sistemas políticos de patronagem, criando assim uma
melhor imagem do serviço público em geral e dando capacidade de que o Estado a
cada momento histórico possa se estabelecer com base em pessoas e
conhecimentos próprios.
Mas esse pensamento e a ordenação deste no texto constitucional de
1988 não foram suficientes para resolver o problema da estruturação e ação do
Estado uma vez que, como já exposto, o Estado não é estático em forma, intenção e
movimento, pelo contrário, a cada nova configuração da sociedade, a cada
transformação do cenário macroeconômico global, novos desafios são propostos
para o Estado e a apresentação de soluções e inovações governamentais.
Portanto, a reforma do Estado quando pensada a partir e pela
democratização deve contemplar diferentes estratégias além das apresentadas
acima, mas que possam contemplar um conjunto de medidas em prol do aumento
da eficiência do serviço prestado pelo Estado à sociedade, contemplar e atuar em
prol da redução de estruturas internas e agir diretamente para que exista um
programa de cortes salutares dos gastos públicos, além de contemplar o
pensamento da desestatização de serviços públicos que somente oneram o erário
público e que poderiam ser melhor prestados à sociedade pela iniciativa privada
(COSTA, 2010).
A agenda da reforma democrática do Estado representa por si só um
complexo sistema de ações e efeitos tanto nas estruturas internas do Estado quanto
os serviços prestados à sociedade, pois assim estar-se-ia de fato pensando e agindo
de forma a privilegiar um amplo processo de reforma, não só do Estado, mas
garantindo o caráter efetivo da democratização das ações pensadas em favor da
sociedade como um todo.
Desta maneira, pode-se argumentar que ao fim do período das
reformas democráticas do Estado frente ao regime dos governos militares resultou
em um extenso passivo abrangendo as dimensões política, financeira, administrativa
e social, que necessitarão de grandes esforços contínuos para que sejam vencidas
todas as barreiras e para que novos projetos, ações e políticas possam ser
formulados e implementados em prol da sociedade brasileira.
E o enfretamento das agendas neoliberais com as de posição social-
democratas ajustará toda a discussão do cenário político e eleitoral frente aos
cargos políticos do Estado. Além dessa questão, a globalização e o processo de
regionalização assumirão destaque nos discursos e preocupações do Estado
Nacional, pois:
(...) passará a conviver com uma complexa trama de problemas e pressões difícil de ser decodificada e assimilada. Tornou-se “pós-moderno” sem ter conseguido ser plenamente ‘moderno’. Ganhou uma agenda imensa, desafiadora, enigmática (NOGUEIRA, 2005, p. 25).
As reformas do Estado servem como um grande instrumento para a
compreensão da vida pública do Brasil, e serve como um importante mosaico da
composição e transformação dos espaços de poder, da formação política e em como
a sociedade brasileira assistiu a todas as mudanças ora como agente passivo, ora
como agentes atuantes em prol das mudanças reivindicadas.
Mas as reformas do Estado não devem ser vistas como experiências
de sucesso ou insucesso absoluto (COSTA, 2008), pois se assim fossem o
pensamento das reformas convergiria para uma discussão de agendas políticas e
não de pensamento democrático.
Neste processo intenso das reformas democráticas empreendidas pelo
Estado Nacional brasileiro, a descentralização é que ganha visões críticas e arestas
apresentadas pelas diversas agendas políticas, necessitando de uma investigação
mais profunda, pois a partir da descentralização é que o campo das políticas
públicas no Brasil ganha novos contornos e significados.
2.2 Descentralização e participação social como processos de condução de
políticas públicas no Brasil
Para compreensão dos processos de mudança que ocorrem na
sociedade brasileira de maneira geral é preciso que haja um entendimento a
respeito de um importante conceito: o da descentralização.
A história político-econômica do Estado Nacional sempre foi marcada
por transformações, também denominadas de reformas do Estado Brasileiro, as
quais conduziram a construção de uma nação a partir dos processos colonizadores
portugueses de meados do século XVI, cuja principal característica residia na
centralização do poder decisório na Coroa Portuguesa por meio de seus
mandatários (COSTA, 2008).
Do processo colonial à República, o Estado Brasileiro passou por
reformas administrativas que buscavam sanar as deficiências culturais inscritas
pelos processos centralizados e burocráticos, alcançando em alguns estágios
importantes avanços como no período de 1952 a 196210, quando houve a criação da
10
Costa (2008, p. 848) menciona que este período é caracterizado pela crescente divergência entre a administração direta, a qual era entregue ao clientelismo e submetida aos ditames de normas rígidas e controles versus a administração descentralizada por meio do novo aparato jurídico representado pelas autarquias, empresas, institutos e grupos ad hoc, os quais eram dotados de autonomia gerencial e que podiam realizar contratações sem a realização de concursos, caracterizando a contratação de especialistas. Essa maleabilidade da administração descentralizada faz com que surjam no Estado órgãos públicos com excelência administrativa, fazendo com que o núcleo central da administração permanecesse obsoleto e burocratizado.
Comissão de Simplificação Burocrática (COSB), visando estudos que promovessem
a descentralização dos serviços oferecidos pelo Governo Federal (COSTA, 2008).
Sendo assim, o processo de descentralização precisa ser
contextualizado não somente como uma nova forma de gerir o Estado, mas como
um novo processo de relação entre as bases que sustentam o Estado:
(...) um conjunto de fatores esgarça as bases de sustentação do Estado desenvolvimentista e do pacto federativo que o sustentou. Nas últimas décadas, ocorreu um efetivo processo de desconcentração produtiva, com a emergência de novas elites regionais modernas que, conectadas diretamente com o exterior, questionam o poder de regulação do Estado nacional e de sua expressão política, o governo federal (ARRETCHE, 1996, p. 11).
É preciso que se compreenda que essas novas elites regionais
juntamente com a incapacidade do Estado em responder ativamente às demandas
da população, no que se refere à prestação de serviços e atendimento das
necessidades sociais básicas, criam um propício quadro para que sejam repensadas
as forma de administrar a coisa pública e até mesmo em criar novos mecanismos
que visam o atendimento à população e aos anseios das novas classes regionais
(LOBO, 1990).
Existem ainda outras teses que sustentam que na década de 1970 o
paradigma “centralização e intervencionismo” a partir da tradição social-democrata,
que vinha sendo aplicada nos países ocidentais a partir de meados da década de
1950, possibilitaram a abertura de um novo campo de questionamento: a discussão
do grande aparato burocratizado das administrações públicas, ou seja, questionar e
repensar a forma como o planejamento centralizado da economia, assim como, o
processo de formação do espaço urbano nos países capitalistas estava sendo
operado e formado (SOUZA, 1997).
Esses questionamentos começam a ter força quando ganham espaço
nas agendas dos organismos internacionais como a Organização das Nações
Unidas (ONU), Banco Mundial e a Organização Pan-Americana de Saúde (OPAS)
ao defenderem a descentralização (TOBAR, 1991).
Esses organismos internacionais representam as principais linhas para
obtenção de financiamentos e buscam na adoção da descentralização, por parte de
países que buscam o saneamento fiscal, um avanço no setor social das sociedades
periféricas (COHN, 1994).
A descentralização é também defendida neste momento histórico pelos
setores progressistas das sociedades de países de políticas centralizadoras, em
especial aos países da América Latina, que visavam mediante as práticas
descentralizadas à criação dos novos espaços institucionais de participação, tendo
nestes espaços o poder deliberativo como estratégia política a qual poderia ampliar
as oportunidades de acesso da população às instâncias de poder (COHN, 1994).
No caso brasileiro, o tema descentralização tornou-se pauta das
discussões nos municípios no que tange à inovação na área de tecnologia e
serviços urbanos, mas destaca-se que os novos arranjos institucionais e as novas
práticas de participação são assuntos constantes nessas discussões, pois se
referem a uma “(...) revitalização substantiva da democracia no nível municipal, que
se contrapõe à inércia e impotência dos estados nacionais” (FREY, 2000b, p. 98).
No Brasil, as forças progressistas apóiam a aplicação da
descentralização ao perceber que é necessário que haja transformações sociais e
políticas no cotidiano das políticas, como também, incorporar ao aparato político-
estatal o processo de democratização da administração pública e, o principal
argumento utilizado era a implementação das diretrizes do orçamento participativo
(RIBEIRO; GUEDES, 2000).
As reclamações dos setores progressistas brasileiros possuem
validade frente ao quadro dos males detectados como fatores que impediam o
desenvolvimento maior e mais justo para a população brasileira, a saber:
(...) Em primeiro lugar, a hipertrofia e a ocorrência de conflitos distributivos dentro das próprias burocracias estatais e, associada a estes fatores, a generalizada ineficiência organizacional e técnica das administrações de desenvolvimento. Em segundo lugar, o desrespeito com relação às necessidades da população nos processos de planejamento e de decisão política, assim como um déficit de democracia e de participação política (FREY, 2000a, p. 100).
O cenário econômico brasileiro durante a década de 1980 se mostra
imerso em uma profunda crise: crescimento da taxa de endividamento nacional,
estrangulamento dos investimentos internos e orientação das políticas a partir do
tutelamento de organismos internacionais como o BID (Banco Interamericano de
Desenvolvimento) e o FMI (Fundo Monetário Internacional), além dos desafios em
implementar um plano político que consolide a democracia a partir de reformas
sociais baseadas na universalização dos serviços públicos (SOUZA, 1997).
Além desse complexo e difuso quadro econômico e político, há de se
recordar ainda que na década de 1980 e também na década de 1990 as reformas
administrativas, de amplo debate político, institucional e administrativo, trouxeram
novos enfoques que visavam à atuação dos governos e da própria sociedade para a
condução do Brasil.
A reflexão sobre a reforma político-administrativa do Estado se debruça
na discussão de um novo processo que venha a convergir na união de forças entre
governo e sociedade, ou seja, incluindo outros atores políticos e sociais (esferas
subnacionais, membros do setor privado e da sociedade civil) na participação da
formulação e implementação de um novo plano político (SOUZA; CARVALHO,
1999).
A descentralização é então o tema central que decorre da reflexão
sobre a reforma do Estado, chegando a um consenso de que as propostas de
formas descentralizadas de prestações de serviços públicos poderiam ser
experiências mais democráticas, que de certa maneira serviriam para fortalecer e
mesmo consolidar a democracia, sendo assim desejável que a reforma do Estado
incorporasse essas novas experiências e apresentasse para a população, em geral,
a imagem de um Estado com preocupações e com ações voltadas a propagar a
equidade, justiça social, a redução do favoritismo e clientelismo entre Estado e
sociedade e, um aumento do controle social por parte da sociedade (ARRETECHE,
1996).
Neste âmbito de discussão, a descentralização ganha corpo e
orientações a partir do texto da CF-88 ao desenhar uma nova ordem institucional e
federativa para o Brasil: parte do texto constitucional legitima a democracia a partir
da inserção da participação popular e societal nos espaços político-institucionais e,
incorpora na agenda federativa o compromisso com a descentralização político-
institucional além da descentralização tributária para estados e municípios (SOUZA,
2001).
Desta maneira, a descentralização pode ser compreendida como um
procedimento que visa
(...) reverter rápida e traumaticamente os resultados do longo processo histórico de centralização através da transferência de recursos, atribuições e poder em geral, desde a cúpula do Estado até as bases do mesmo Estado, atingindo a própria sociedade (FELICISSIMO, 1994, p. 47-48).
A aplicação da descentralização no universo brasileiro visando a uma
superação do quadro de políticas centralizadas e distantes das demandas sociais
implica em duas possibilidades: como um processo de modernização arcaica ou
como um processo de modernização orientada para a melhora da qualidade de vida
e democratização política sustentado por Cohn (1994).
A modernização arcaica pode ser vista como um processo de
recentralização do poder na esfera federal e tendo como predominância no discurso
os critérios econômico-financeiros ao discutir e definir “quanto” e “como”
descentralizar sem que essa discussão seja permeada pelo estilo clientelista e
particularista da gestão pública (COHN, 1994).
Já a modernização orientada para a melhora da qualidade de vida e
democratização política refere-se a um processo de transferência de poder da esfera
federal para as esferas estaduais e municipais brasileiras, mas com orientação
específica: a de que os atos públicos sejam imbuídos de autonomia, não somente no
quesito gerencial, mas no que se refere à abertura da permeabilidade da população
local. A autonomia deve incorporar nas esferas estaduais e municipais novos atores
sociais e políticos que poderão contribuir para a melhora das políticas e da
prestação dos serviços públicos prestados. A permeabilidade política tende a
apresentar um caráter mais racional e eficiente na gestão da política e dos gastos
públicos, pois estarão norteados pela efetiva constituição do atendimento às
demandas da população (COHN, 1994).
A descentralização e sua aplicação no cotidiano do poder e das esferas
nacionais refere-se a um amplo e complexo quadro de aplicações conforme pode
ser visualizado pela discussão de Cohn (1994), mas deve-se ressaltar ainda que a
Constituição de 1988 cria em seu texto a autorização para que as esferas estaduais
possam implementar programas nas áreas de saúde, educação, assistência social,
habitação e saneamento, contudo o texto constitucional em momento algum inclui a
obrigatoriedade em implementar tais programas (LEITE, 2009).
Ora dessa forma, é nítido que a descentralização nos primeiros anos
da aplicação do texto constitucional representa uma morosidade na sua
aplicabilidade e na discussão das competências e responsabilidades dos entes
estaduais e municipais frente à esfera federal, mas não invalidando sua
aplicabilidade e seu avanço para o desenvolvimento da democratização e maior
eficiência das políticas.
A descentralização é então um processo que surge como uma nova
opção de gestão do Estado e de como o mesmo lida com as demandas da
população, o orçamento e a forma dos gastos públicos.
Mas é preciso pontuar que existem diferentes posições a respeito do
conceito de descentralização, ou seja, a descentralização assume diferentes papeis
de acordo com os interesses do mercado, do Estado e da aplicação que se dará aos
recursos públicos.
A vertente dos gastos públicos, arrecadação e distribuição dos
recursos financeiros aos estados e municípios é sempre tema recorrente na
discussão da aplicação do conceito de descentralização11 ao aparato estatal,
buscando uma equidade seja na distribuição, seja na aplicação dos recursos
financeiros para as demandas sociais da população, mas os arranjos político-
institucionais em vigor no atual Estado podem vir a não contribuir para a
consolidação dessa nova postura descentralizadora no que tange à divisão e
distribuição de recursos financeiros.
É importante destacar também que o conceito de descentralização
assume vertentes conceituais diferentes em função das diferentes agendas políticas
dominantes no Brasil, a agenda estabelecida pelos Neoliberais e a dos Social-
democratas, com demonstrado no quadro 1.
Essa distinção de significados para o conceito de descentralização
marca as diferenças de pensamentos e agendas políticas institucionalizadas no
Brasil e, o significado incorpora a funcionalidade particularizada a partir das
características dos usuários, ou seja, os diferentes atores sociais utilizam o conceito
de descentralização de maneiras particulares, visando o alcance de seus objetivos e
a busca da satisfação de suas necessidades e demandas sociais.
11
Lobo (1990) aponta que a problemática da distribuição dos recursos financeiros para os estados e
municípios é a principal via temática para justificar a chamada “desordem” do Estado, ou seja, um
Estado centralizador com diferentes instâncias burocráticas e de poder sempre atrelado à União,
fazendo com que se crie uma imagem de solução desses problemas por meio da aplicação do
conceito de descentralização nas diferentes instâncias de poder do Estado (União, estados e
municípios).
Neoliberal Social-Democrata
Desregulamentação Privatização Descentralização/Desconcentração Fragmentação do Social Indivíduo/Mercado
Desconcentração político-administrativa Municipalização Sociedade solidária e organizada Autogestão, co-gestão, participação Novas formas de organização do político Coletivo/Estado
QUADRO 1 - Agenda Neoliberal x Agenda Social-Democrata. Fonte: SOUZA, 1997, p. 4.
Mas é importante salientar que o conceito de descentralização mesmo
a partir das diferentes agendas político-institucionais em vigor no Brasil, assume
elementos comuns, a saber:
a) Sua aplicação sugere pensar no fortalecimento da esfera "local"; b) O problema da descentralização é de caráter político, a implementação eficaz e eficiente do mesmo é de caráter administrativo; c) O processo em si não é possível de se atingir de forma isolada e só é viável dentro do marco de um processo geral de reforma; d) A conceitualização dicotômica centralização vs descentralização não têm poder explicativo sob os dados empíricos (TOBAR, 1991, p. 3).
O poder local, o caráter político, a efetividade, eficiência e reforma são
os principais elementos que norteiam o encaminhamento comum para o conceito de
descentralização a partir das agendas Neoliberal e Social-Democrata quando se
discute e se percebe a realidade brasileira.
Cria-se então um quadro difuso e repleto de meandros político-
institucionais que ora visam a defender o conceito e o processo de descentralização,
ora enxergam e propagam a descentralização como um mal que corrompe a
administração e a relação de isonomia do Estado. Portanto, é necessário que se
compreenda o que significam e o que implicam as diferentes maneiras de se
conceber e aplicar o conceito de descentralização das diferentes agendas político-
institucionais em vigor no Brasil.
A descentralização defendida pelos neoliberais é apoiada pela visão e
objetivos do Fundo Monetário Internacional, o Banco Mundial e o Banco
Interamericano de Desenvolvimento, os quais visam um saneamento da utilização
dos recursos públicos para o aumento e da efetividade dos serviços públicos
prestados (FELICISSIMO, 1994).
A defesa neoliberal da descentralização apóia-se na redução das
funções do Estado no que se refere ao setor social, ou seja, visa garantir a
satisfação elementar das demandas da população e garantir a defesa dos direitos
humanos; ao mesmo passo em que compreende que há a necessidade da
diminuição reguladora do Estado ao permitir que as forças do mercado tenham
autonomia para o desenvolvimento e crescimento (FELICISSIMO, 1994).
Na dimensão econômica, os neoliberais apontam que a
descentralização mediante a redução do papel do Estado em regular, no
enxugamento da estrutura burocrática permitirá que maiores volumes financeiros
possam ser repassados aos estados e municípios a fim de que a eficiência dos
serviços públicos possam ser alcançados (JUNQUEIRA et al, 1997).
Essa visão neoliberal representa que a aplicação da descentralização
deve passar pelo âmbito político ao permitir que o mercado, ou melhor, o setor
privado possa se apropriar das obrigações ditas estatais oferecendo à população
melhores serviços públicos (FELICISSIMO, 1994).
Todo este quadro de ações – desregulamentação, privatização,
desconcentração e fragmentação do social, caracterizam a intenção dos neoliberais
em fazer com que o Estado Nacional se transforme no Estado Mínimo ao deslocar a
força das mudanças para o interesse do mercado fazendo com que o Estado, a
partir dessa nova reorientação, tenha como papel as funções residuais e gerindo
apenas políticas compensatórias (JUNQUEIRA et al, 1997).
Já o modelo proposto pela agenda social-democrata visa estabelecer
um processo democratizante nos eixos administrativos, econômicos e políticos do
aparelhamento estatal, tendo como princípios políticos:
rejeitar o clientelismo, principalmente no setor popular, resistindo ao imperativo da necessidade imediata e à mercantilização da política; promover o efetivo exercício da soberania popular; promover os direitos humanos, privilegiando o direito à vida e à autodeterminação; exercer o controle do Estado, combinando as instituições da democracia representativa com formas mais diretas de participação e gestão; apoiar o estabelecimento da pluralidade dos canais de representação social que superem o reinvindicacionismo (FELICISSIMO, 1994, p. 51).
Já no que se refere aos eixos administrativo e econômico, a
descentralização como modelo democratizante busca apoiar-se na descentralização
territorial do Estado, que significa a multiplicação de cenários de gestão local
favorecendo o atendimento e a inovação nos serviços públicos prestados à
população (FELICISSIMO, 1994).
Ao deslocar o poder de decisão da distribuição de recursos públicos
para mais próximo da população, mediante os novos espaços de participação social,
aponta-se uma redefinição da relação Estado e Sociedade, garantindo agilidade e
eficiência aos serviços públicos prestados ou a virem a ser prestados de acordo com
a necessidade de cada gestão local (JUNQUEIRA et al, 1997).
Enfim, o modelo de descentralização democratizante visa promover a
democracia efetiva a partir dos diferentes níveis e instâncias sociais e estatais
acessíveis e, orientada para a hegemonia da população na administração
democrática e propondo alternativas para superar crises, e descobrindo formas
alternativas para a organização da convivência social (FELICISSIMO, 1994).
Desta forma, a descentralização democratizante constitui-se de um
movimento que parte de baixo para cima, ou seja, parte das demandas da
população local apoiadas e convergidas em espaços de participação que serão
transformadas em políticas públicas e na inovação dos serviços públicos prestados,
ao mesmo passo que essa dinâmica “de baixo para cima” representa uma alteração
profunda nos núcleos de poder já constituídos, seja no campo estatal, seja no
campo da sociedade (RIBEIRO; GUEDES, 2000).
As diferentes agendas políticas para a aplicação da descentralização
conduzem a dificuldades no processo de sua efetivação, ou mesmo apresenta
arenas para debates acalorados entre as posições, de um lado e de outro, mas que
de certa forma representam o núcleo discursivo para que a descentralização não
caia no ostracismo ou mesmo que se torne apenas um elemento inovador no texto
da CF-88.
Se por um lado, as agendas políticas apresentam esse universo de
discussões e visões, estudiosos e pesquisadores apontam outras vertentes
discursivas para a compreensão do que representa a descentralização e o ato de
descentralizar, visões essas que serão apresentadas a seguir.
Uma primeira posição a respeito do conceito de descentralização é a
transferência do poder central do Estado para “(...) outras instâncias de poder,
constituindo um processo para um reordenamento do aparato estatal” (JUNQUEIRA,
1997b, p. 5).
Essa transferência de poder, uma nova delegação do poder de decisão
a esferas administrativas diferentes irá determinar a redistribuição como resposta
direta às antigas formas de poder centralizado, mas é preciso ressaltar que a
transferência de poder, ou seja, a descentralização é, sobretudo neste momento
conceitual, uma decisão político-administrativa, por envolver diferentes atores
sociais: aqueles que irão transferir suas responsabilidades, como aqueles atores
sociais que irão receber as novas atribuições (JUNQUEIRA, 1997a).
É preciso destacar, neste momento, que não se está discutindo a
capacitação dos atores sociais que irão neste momento da descentralização receber
a transferência de poder e nem mesmo discutir a atuação destes atores com o poder
recebido, mas sim o desenho que a descentralização pode assumir.
Com a transferência de poder da esfera central para esferas
secundárias e terciárias, busca-se a redução do aparato estatal e da burocracia
existente, mas também mostra-se como um novo processo a ser vencido pela
própria fisiologia do poder centralizador:
(...)Tal perspectiva exige uma reestruturação profunda do processo decisório e tem como premissa a redistribuição do poder, o que encontra obstáculos na própria trajetória centralista brasileira, onde diferentes regimes autoritários utilizaram largamente as políticas sociais como objeto de troca política e estratégia de cooptação de grupos sociais (SOUZA et al., 2007, p. 68).
Se em períodos históricos anteriores o Estado nacional figurava como
estrutura ineficiente, poderão também os estados e os municípios assumirem esse
novo papel, os de agentes públicos ineficientes no atendimento às demandas, ao
criarem novas estruturas de interesse, clientelismos e partidarismos, carecendo
assim do controle da população frente às ações políticas dos municípios e estados.
Outra crítica a respeito da transferência de poder é quando há o
envolvimento do setor privado: o Estado no interesse de diminuir a sua estrutura
burocrática e de assumir o papel de agente público eficiente faz com que o mercado
passe a ser o centro regulatório das ações (JUNQUEIRA, 1997b).
A partir dessa visão o Estado deveria reduzir-se a funções mínimas12 e,
gerando um sistema de políticas sociais cada vez menores, ou por não dizer excluir
o aparato estatal de toda e qualquer forma de políticas sociais. A prerrogativa para
12
A redução do Estado ao Estado Mínimo é uma visão alicerçada no pensamento dos neoliberais: “para os neoliberais, portanto, descentralização significa redução do papel do Estado para chegar ao Estado Mínimo, deslocando a força motriz da mudança para o mercado, e de redução da organização que permanecerá cumprindo as funções residuais e gerindo as políticas compensatórias” (JUNQUEIRA, 1997b, p. 7).
essa nova postura está no discurso do déficit público e no desestímulo ao trabalho
que o Estado advoga ao manter uma política social (JUNQUEIRA, 1997b).
Tal posicionamento é rebatido ao perceber que a descentralização ao
assumir o papel de instrumento democrático, poder ser vista como:
(...) instrumento adequado para o uso e a redistribuição mais eficiente dos orçamentos públicos, ao mesmo que tempo que os objetivos da descentralização são identificados com a democratização do Estado e com a promoção de maior justiça social, através de políticas sociais mais eficientes (SOUZA et al., 2007, p. 70-71).
A gestão eficiente e eficaz se dará pelo uso correto do onde, para que,
para quem e com que serão utilizados os recursos descentralizados para a
sociedade que os demanda, assim a reforma do Estado: “(...) tem, portanto, o
propósito de democratizar o Estado, mudando a natureza de suas relações com a
sociedade, no sentido de assegurar a vigência da ordem igualitária” (COSTA, 2010,
p. 244).
Assim, ao conceber a descentralização como transferência de poder,
competências e atribuições da esfera federal a esferas estaduais, municipais,
instâncias subnacionais, reconhece-se o lócus necessário para que o controle
democrático efetuado pelos cidadãos possa ser concretizado (SOUZA et al., 2007).
A transferência de poder como significado para a descentralização
também pode assumir a ambiguidade do termo desconcentração, isto porque nos
discursos oficiais e mesmo em textos governamentais os termos descentralização e
desconcentração são utilizados como palavras de mesmo sentido.
Mas o significado de desconcentração é bem diferente da
descentralização, ou seja, desconcentração refere-se a uma mudança na dispersão
físico-territorial de agências governamentais que até então estavam localizadas em
áreas centrais ou estratégicas (LOBO, 1990).
Desconcentração também pode ser compreendida a partir de um
conjunto de ações e procedimentos que visem à racionalização, modernização e
reprodução ampliada do sistema político-administrativo a ser modificado pela
descentralização (TOBAR, 1991).
Essa argumentação faz crer que quando governos querem criar a
imagem de ações e programas de descentralização, nada mais fazendo do que
desconcentrar ações, agências ou prestações de serviços públicos, criando a
imagem de que está implementando uma reforma, mas na verdade está apenas
criando uma ilusão da aplicação da descentralização.
Frente ao processo de desconcentração o Estado nacional opta por dar
continuidade aos processos de descentralização, implicando no fortalecimento
institucional e administrativo dos níveis municipal e estadual, mas priorizando a
centralidade dos recursos financeiros obtidos por meio dos tributos públicos no
núcleo central da administração federal.
Mesmo sendo a desconcentração um dos processos de aplicação da
descentralização, é preciso compreender que a descentralização é um
processo/instrumento de ação governamental, ou seja, a descentralização pode ser
utilizada de maneira isolada, sem que outros aspectos do aparato estatal sejam
modificados, como por exemplo, reformas fiscais, administrativas econômicas ou
mesmo financeiras não criando assim uma supervalorização do conceito e de sua
aplicabilidade como instrumento de salvação, ou de criação para o aumento da
democracia, participação e controle social (LOBO, 1990).
O combate das desigualdades promovidas por processos políticos
centralizados e nem sempre eficazes encontra no conceito de descentralização a
medida correta para a eficiência das ações, pois segundo Junqueira (1997) a
descentralização é compreendida como uma estratégia que visa a reestruturação do
aparato estatal, não tendo como objetivo a redução daquilo que é prestado ao povo,
mas significa agilidade e eficiência ao deslocar para as esferas municipais e
estaduais a competência e o poder de delegar e executar as políticas públicas.
O deslocamento para as esferas municipais e estaduais, com o objetivo
de compreender a descentralização como uma estratégia para a municipalização de
responsabilidades na prestação de serviços públicos envolve a co-responsabilidade
à medida que é feita uma articulação das forças políticas do município, como
também com organizações da sociedade civil para a qualidade, efetividade e
eficiência do serviço a ser prestado (LOBO, 1990).
Já a estadualização como estratégia de descentralização é defendida a
partir de esferas estaduais que sejam fortes e eficientes quanto à prestação dos
serviços já em vigor nas suas esferas, havendo assim uma coerência na designação
do novo serviço a ser prestado pela esfera estadual, fortalecendo o princípio do
gradualismo da descentralização (TOBAR, 1991).
O gradualismo, ou seja, a progressividade da aplicação do conceito de
descentralização na agenda das reformas do Estado se faz necessário, pois:
(...) é importante que as transformações na direção de novos arranjos político-institucionais se dêem progressivamente, a partir de capacidades reconhecidas e aceitas. Não se acredita em descentralização que venha por decreto (LOBO, 1990, p. 9).
A municipalização e a estadualização como forma de descentralização,
e mesmo como estratégia do princípio do gradualismo, deve incorporar na
aplicabilidade a adequação de diferentes realidades definidas no tempo e no
espaço, permitindo a consolidação das transferências de poder, da nova prestação
de serviço ou mesmo da nova em como se portar com a política de descentralização
de forma gradual e continuada, mas, sobretudo que sejam pactuadas como
resultados para mudanças positivas para a população (SCATENA, TANAKA, 2001).
O deslocamento da instância do poder federal para os poderes
municipal e estadual faz com que as demandas da população que antes não eram
atendidas por falta de conhecimento das carências regionais, passam a serem vistas
e atendidas com maior agilidade, mas ao mesmo tempo deve-se observar a
fragilidade do atendimento a essas carências.
Outro princípio destacado por Lobo (1990) em prol da
descentralização, enquanto uma instrumentalização de municipalização e
estadualização, é a flexibilidade: as ações descentralizadas implicam em considerar
as diferenças econômico-financeiras, políticas, técnicas-administrativas e sociais de
cada realidade, seja dos municípios, seja dos estados, fazendo com que cada qual
apresente respostas diferentes às demandas sociais da população.
Assim é preciso conceber que a descentralização a partir da vertente
municipalização e estadualização é um processo contínuo de tempo e de espaço e
que deve ser destacado:
Nega-se, portanto, a idéia da descentralização enquanto projeto de governo com delimitação precisa de espaço e tempo. Em alguns setores e regiões, o processo poderá se dar de forma mais rápida e abrangente; em outros, de forma mais lenta e limitada; em alguns, não se dará de forma alguma, mantendo-se a centralização como mais eficaz. Mais do que um projeto de governo, a descentralização deve ser vista como uma política de Estado (LOBO, 1990, p. 9).
Desta forma, a descentralização não pode ser vista ou compreendida
como uma via de mão única de sentido de cima para baixo a ser implementada por
todos os entes subnacionais como estratégia de superação dos problemas político-
administrativos do Estado. Mas sim como uma estratégia política que possa fazer
com que a União, estados e municípios a partir da descentralização, venham a
prestar os serviços públicos com maior efetividade e eficiência à população, em
geral, visando à diminuição dos contrastes sociais e, melhorando a imagem da coisa
pública como eficiente e não mais como morosa e burocrática.
Para tanto, é preciso que a descentralização possa promover o
aprimoramento das relações a serem estabelecidas a partir dos novos pactos e
acordos entre os entes intergovernamentais; criar condições para a capacitação dos
governos subnacionais para atuarem como agentes de intervenção nas realidades
locais; e ainda promover por parte da população organizada a ação de controle
social das ações empreendidas pelo poder público local (LOBO, 1990).
Há de se ressaltar que cabe à população assumir o papel de controle
das ações públicas a partir dos processos de descentralização das políticas
públicas. Percebe-se que o deslocamento do poder decisório é um movimento que
visa democratizar a gestão através da participação da população local
(JUNQUEIRA, 1997).
O controle social é defendido por Lobo (1990), Tobar (1991) e Arretche
(1996) ao postularem que, mediante a prática de controle exercido pela população
local, as novas políticas e serviços públicos descentralizados poderiam alcançar a
sua efetividade e eficiência, uma vez que estariam em constante vigilância por parte
dos usuários finais.
Vale ressaltar que o controle social é também uma importante
ferramenta exercida pela população para exigir dos governos ações que
estabeleçam novos e melhores serviços públicos, mediante a determinação de
estratégias e ações de descentralização que visem alcançar a transparência no
processo decisório, criando um elo entre a descentralização e a democratização do
Estado e:
Portanto, reformas do Estado nessa direção (descentralização) seriam desejáveis, dado que viabilizariam a concretização de ideais progressistas, tais como eqüidade, justiça social, redução do clientelismo e aumento do controle social sobre o Estado (ARRETCHE, 1996, p. 1).
Desta maneira, o controle social é entendido como prerrogativa para o
pleno exercício da democracia no Brasil, uma vez que, mediante a organização da
sociedade para participar ativamente de ações do poder público, buscando
responsabilizá-lo quando do não cumprimento adequado do atendimento às
necessidades da população (LOBO, 1990).
Mas a partir dessa vertente conceitual da descentralização se torna
nítido que a população passa a integrar o processo das ações do poder público, mas
que necessita se organizar e reivindicar seu espaço de participação.
A participação de diferentes atores sociais, isto é, de entidades
públicas e privadas, deve gerenciar e acompanhar a execução das políticas
públicas, tornando viável a descentralização da gestão pública definida no texto
constitucional de 1988 (ROCHA; SANTOS, 2010).
Contudo, para que este processo possa ocorrer é necessária a
transformação político-administrativa do Estado, permitindo a participação como
processo de encaminhamento para a solução dos problemas sociais, pois cria
facilitadores de acesso para a população às esferas de poder e por consequência
direta o atendimento das demandas sociais geradas (JUNQUEIRA, 1997).
A descentralização mediante o auxílio da participação da população
tende a romper com antigos padrões autoritários do Estado com a construção de
mecanismos político-institucionais de articulação, o estabelecimento de canais de
comunicação, as pressões e o controle social exercido passam a serem aceitos,
constituindo assim elementos de constante avaliação das ações do Estado (LOBO,
1990).
A participação social no processo de implementação e condução da
descentralização serve segundo Nogueira (2005), para vocalizar a democracia, ou
seja, a partir da participação social o poder público passa a compreender melhor as
demandas, as diferenças e as aspirações da população local, mediante um
processamento político que consiga o alcance de uma síntese dessas reivindicações
e comportamentos, pois caso contrário, estaria a população advogando em causa
própria e não contribuindo para o exercício da cidadania e mesmo da democracia.
Toda esta discussão possibilita compreender a descentralização como
uma nova maneira de condução político-administrativa do Estado, aumentando as
possibilidades da efetividade e eficiência no atendimento e na prestação dos
serviços públicos; representa um novo desenho de relacionamento entre entes
intergovernamentais que necessitam estabelecer uma comunicação e troca de
informações que possibilitem a dinamização dos serviços públicos. Um novo
desenho de relacionamento entre a União, os estados e os municípios que ganham
novos papeis e novas obrigações ao dispensarem a atenção e o atendimento direto
à população local, além de serem protagonistas do desenvolvimento das regiões,
das cidades e mesmo de pequenas comunidades. Por fim, a descentralização
representa a inclusão da sociedade como mediadora e avaliadora das estratégias e
ações da descentralização a partir da atuação do controle social e da participação
social.
Mas é preciso salientar que o conceito e a atuação da descentralização
não somente cria um ambiente favorável, deve-se observar que o conceito tem seus
limites e seu lado obscuro, principalmente por se tratar ainda de uma prática em
exercício e relativamente nova na história político-administrativa do Brasil.
Sendo a cultura política do Brasil impactada ainda pelos traços da
cultura centralista e clientelista, a descentralização pode criar o efeito do
neolocalismo, ou também denominado neomunicipalização, tendo ações predatórias
sobre a cidadania social, pois representa a:
(...) disputa entre localidades por investimentos industriais – deslegitimando as prioridades sociais em lugar de benefícios fiscais e isenções tributárias –, nas estratégias de exclusão e apartheid social, em que mendigos são expulsos ou impedidos de entrarem em municípios afluentes, etc (MELO, 1996, p. 15).
Ou seja, com a descentralização e as novas políticas de condução dos
territórios os municípios e os estados podem iniciar disputas por interesses
particulares visando o aumento da arrecadação de impostos, mas ao mesmo tempo
podem contribuir para o aumento da exclusão social e da desorganização
institucional, ou seja, a União pode vir a ter de aumentar o repasse de verbas de
ajuda a programas e projetos sociais a áreas pouco desenvolvidas e diminuir o
repasse a áreas ditas desenvolvidas.
O neolocalismo/neomunicipalismo é revestido também do antigo
autoritarismo, com a redistribuição de poder entre os entes da federação, as forças
regionais retornam ao cenário político visando impor suas vontades e aspirações,
muitas vezes pressionando para que as mudanças político-institucionais e os
benefícios sejam efetivados prioritariamente em regiões específicas de seus
interesses (LOBO, 1990).
Outro problema encontrado ao discutir a implantação da
descentralização reside na diversidade política, econômica e social do Brasil. Essa
diversidade acaba por prejudicar o próprio objetivo da descentralização e de suas
reformas e faz com que a descentralização financeira em favor das esferas
subnacionais esvazie o cofre público, reduzindo as chances de ajuda federal a favor
das esferas estaduais e locais no que tange ao objetivo de minimizar as
desigualdades das diversidades presentes no Brasil (SOUZA; CARVALHO, 1999).
Outro problema a ser considerado na descentralização é o histórico
comportamento cultural da política brasileira: a constante visão de curto prazo. Para
que se estabeleça um processo de descentralização, como afirmado em momento
anterior, é preciso que se estabeleça um continnum no tempo e no espaço das
políticas e da atuação do poder público. Contudo, o que se observa na atuação do
poder público é exatamente a visão imediatista, que quer obter resultados a curtos
prazos e, quando não são obtidos, seja por falta de conhecimento e informações da
realidade, seja por despreparo da estrutura burocrática do Estado ou por ineficiência
e falta de conhecimento dos servidores públicos, abandonam-se as idéias, políticas,
programas e ações em curso para implementar outras (LOBO, 1990).
Ora, todo esse movimento de quebra da continuidade de um processo
de reforma de ações e político-institucional, como no caso da descentralização,
exige que seja repensada as formas e estruturas político-administrativas
empreendidas a partir do conceito de descentralização, uma vez que, os curtos
ciclos políticos têm favorecido em especial às autoridades com interesses
específicos e que nada tem a acrescentar a uma nova história da política pública
brasileira.
Percebe-se que a reforma do Estado mediante a descentralização da
execução das políticas públicas exige uma estreita relação entre participação e
garantias e, por não dizer entre democracia e cidadania, fazendo com que haja de
fato o acesso aos direitos prescritos na CF-8813 (COSTA, 2010).
13
A CF-88 significou um importante passo para a reforma do Estado brasileiro, pois introduziu novos princípios para a organização do Estado, requalificou os direitos que sustentam a cidadania, redefiniu a origem e a aplicação dos recursos econômicos para o bom emprego na sociedade, fixou os limites da intervenção do Estado, reorganizou alguns dos serviços públicos prestados pelo Estado e, inseriu novos instrumentos de política pública, principalmente na área social (COSTA, 2010, p. 251).
2.3 Políticas e políticas públicas na condução da vida social do Brasil
2.3.1 Características e padrões das políticas para o Brasil
A reforma do Estado e, porque não dizer da maneira como são
executadas as ações, programas e projetos é que caracteriza o conceito de política,
pois é por meio da constante reforma do Estado e da agenda permanente de
discussão de normas e dos valores que os cidadãos podem promover a mudança
visando o progresso (BRESSER-PEREIRA, 2010b).
Mas política não representa somente o ato da reforma, consiste na
prática de administrar o Estado, as autarquias, empresas públicas e outros
aparelhos estatais que necessitam da ordem política que vise os objetivos sociais
acordados entre sociedade e membros representantes eleitos (BRESSER-
PEREIRA, 2010a).
Tal pensamento segue embasado nos dizeres de Meirelles (2009, p.
45):
A política, como forma de atuação do homem público, não tem rigidez científica, nem orientação artística. Rege-se – ou deve reger-se – por princípios éticos e comuns e pelas solicitações do bem coletivo. (...) os rumos que conduzam a atividade governamental ao encontro das aspirações médias da comunidade.
O conceito de política também envolve o ato e, porqu não dizer, a arte
de argumentar e fazer compromissos visando obter maioria para assim alcançar o
poder e, se manter no poder, criando bases para o ato de governar. Mas, o termo
política também é conceituado à luz do ato de tomar decisões racionais, as quais
não são embasadas na ética da convicção, mas sim com base na ética da
responsabilidade (BRESSER-PEREIRA, 2010a).
O significado da política assume outras vertentes quando o conceito é
elucidado a partir dos pensamentos de Arendt (2009), a vertente da pluralidade dos
homens e da convivência entre os diferentes. Os homens são em essência frutos da
vontade divina, dotados de almas, de vontades e aspirações mundanas, para tanto
buscam na convivência com os outros homens estabelecerem contatos e nestes
contatos realizarem cada qual a sua vontade, e nesta pluralidade de atos humanos a
política não atinge a profundidade dos atos, pois “(...) a falta de profundidade de
pensamento não revela outra coisa senão a própria ausência de profundidade, na
qual a política está ancorada” (ARENDT, 2009, p. 21).
Ou seja, as relações humanas são dotadas de uma profundidade de
interesses e subterfúgios inerentes ao próprio comportamento humano, mas a
política e a sua superficialidade se torna aparente quando comparada ao complexo
comportamento humano; na política as vontades e as necessidades entre aqueles
que buscam satisfazê-las e entre aqueles que podem satisfazê-las são
estabelecidas na superficialidade das discussões e das vontades, não há o
questionamento e a reflexão profunda do como e do por que satisfazer as vontades
daqueles que a buscam.
Se a política é baseada na pluralidade dos homens e tem na
superficialidade a sua marca aparente, é imperativo que se compreenda que a
política também trata da convivência entre os diferentes, expressa na convivência
humana e na forma de organização social: podendo ser os grupos de convivência, a
família ou em outros aspectos sociais em comum, expressando nestes espaços
suas vontades e necessidades e utilizando a política como artifício de mediação
novamente entre aqueles que buscam a satisfação de suas necessidades e entre
aqueles que podem satisfazê-las.
Essa percepção de Arendt (2009) a respeito da política versa sobre o
campo filosófico e conceitual e, porque não dizer numa discussão do sentido
clássico do que é a política, para tanto, faz-se necessário compreender que o
conceito de política, e mesmo a palavra política, tem sua origem na Grécia Clássica
sendo associada ao conceito de pólis, ou seja, cidade, que indicava o espaço em
que todas as atividades humanas se relacionavam, seja o relacionamento social,
público e/ou cidadão (PEREIRA, 2008).
Assim, a pólis grega ou a política como espaço de relacionamento é
permeado das sutilezas humanas: das vontades, das vaidades, da corrupção, dos
medos, dos anseios, da força, como também é marcada pelos diferentes pontos de
vista entre aqueles que se relacionam e estabelecem a prática política como os
valores, crenças, opiniões e ideologias fazendo com que o campo da política seja
cultivado a partir dos conflitos ou das divergências.
Mas há de se compreender que os conflitos e as divergências não são
em si carregados dos aspectos negativos ou, em outras palavras, não são maus em
essência. Na verdade a força que move a história da humanidade e o próprio
desenvolvimento dos atos políticos é praticado quando há o consenso entre as
partes, entre os homens, que assumem na política a arena dos debates e da
mediação entre seus interesses e aspirações, colaborando para que, mediante a
política, haja a regulação civilizada em substituição a outras práticas arbitrárias do
uso do poder em fazer valer os interesses daqueles que os reivindicam (PEREIRA,
2008).
Contudo, o conceito de política não pode ser visto somente a partir da
sua vertente da benignidade, pois a política é inseparável do político, afirma
Nogueira (2005, p. 63): “a política e o ser político formam um amalgama que possui
como partes da mistura o antagonismo da democracia e do poder”.
Este amalgama é referendado ao se perceber que o conceito de
política e a sua prática são vistos e concebidos a partir de preconceitos humanos. A
sociedade, desde a sua antiguidade, percebe que a política é formada em seu
interior por um complexo sistema de teias feitas pela “(...) velhacaria de interesses
mesquinhos e de ideologia mais mesquinha ainda” (ARENDT, 2009, p. 27). E a
exterioridade da política oscila entre a propaganda vazia e a dinamização das forças
opressoras, a partir da violência contra aqueles que lutam contra a tirania daqueles
que exercem a política (ARENDT, 2009).
A partir desse pensamento, a política não é somente um espaço e um
conjunto de atos voltados para a deliberação consensual racional, mas representa a
arena de lutas e paixões, interesses e vontades daqueles que são representados
(sociedade) e dos representantes (políticos) (NOGUEIRA, 2005).
É mister destacar que as relações políticas apresentam seu caráter
dialético, de um lado o Estado como agente da aplicação dos recursos financeiros e
mesmo políticos voltados para a satisfação das vontades e das necessidades
sociais e, de outro lado a sociedade que reivindica, luta e aspira para que suas
vontades e necessidades sejam atendidas e sanadas pelo Estado, mas cabe à
sociedade o papel de eleger os representantes para a composição do corpo político
estatal (BRESSER-PEREIRA, 2010b).
Dessa luta de interesses pode-se perceber que alguns atos podem ser
desastrosos, pois serão deliberações, atos políticos, programas ou ações que visem
atender aos interesses de alguns, contrariando o status da ética e moral
apresentado por Meirelles (2005) e, mesmo indo contra os interesses do que é
coletivo, do que deve atender a todos, princípios estes presentes no art. 3º da CF-
8814.
A eleição é, em si, um ato da liberdade humana em escolher seus
representantes para que, quando haja a fusão entre homem eleito e corpo estatal
ambos se tornem coisa única, movida pelos interesses da coletividade, agindo em
prol da sociedade e promovendo a política como instrumento da liberdade da
humanidade.
A liberdade, como ação final da política, é a força que promove a
igualdade e a justiça entre os homens que formam a sociedade, e que para eles é
orientada a composição do Estado e sua estrutura.
Mas a liberdade como coisa política não significa a livre constituição
dos seres humanos, não expressa o significado que todos devem e podem agir a
partir de suas vontades, de suas paixões, da sua natureza humana, mas
compreende “(...) negativamente como o não-ser-dominado e não-dominar, e
positivamente como um espaço que só pode ser produzido por muitos, onde cada
qual se move entre iguais” (ARENDT, 2009, p. 48).
A dominação e a não dominação vista como parte negativa é citada
para que não se compreenda a coisa política somente como uma diretriz para a livre
vontade e a livre liberdade dos espaços nos espaços públicos e geográficos, pois se
assim fosse, poderia haver Estados totalitários agindo em prol da coação dos
homens e fazendo com que estes criassem uma mentalidade falseada da realidade
e até mesmo da ação da política e, porque não dizer, do próprio Estado.
Desse pensamento poderiam surgir vários questionamentos como: não
ser dominado e fazer valer meus interesses a todos? É estabelecer a política entre
os iguais? Poderia haver mediação e diálogo entre os homens quando estes não
podem dominar?
Ora, muitas respostas poderiam vir a partir desses questionamentos e,
talvez alguns estariam circunscritos ao pacto da convivência humana, mas outras
respostas poderiam vir do estabelecimento econômico entre os homens. O não ser
dominado ou não dominar o outro poderia estar ligado à liberdade do ser, do se
14
Percebe-se que na redação do artigo 3o da CF-88 há o estabelecimento dos objetivos gerais para o
Brasil e sua composição: Art. 3o. Constituem objetivos fundamentais da República Federativa do
Brasil: I – construir uma sociedade livre, Justa e solidária; II – erradicar o desenvolvimento nacional; III – erradicar a pobreza e a marginalização e reduzir as desigualdades sociais e regionais; IV – promover o bem de todos, sem preconceitos de origem, raça, sexo, cor, idade e quaisquer outras formas de discriminação (BRASIL, 1988).
estabelecer como homem isolado dos outros e neste isolamento poder criar a utopia
da sobrevivência isolada, sozinha. Mas se o homem é por natureza um ser social e,
compreendendo toda a história da sociedade e do estabelecimento econômico entre
as diferentes sociedades, pode o homem construir um espaço social de não
dominação econômica?
Esse questionamento é apenas propositivo para que se pense a
respeito do que é liberdade e, como a liberdade pode assumir diferentes vertentes
conceituais, não cabendo neste estudo uma discussão filosófica e sociológica do
que é liberdade e de como o homem constrói, destrói ou reconstrói a liberdade, mas
é objetivo deste trabalho perceber que a liberdade do homem o faz questionador
daquilo que é a liberdade como espaço da prática política, como ato da construção
de um Estado e, mesmo para que se estabeleça o diálogo entre as diferenças
ideológicas humanas, ideologias essa que compõem o pluralismo que é o Estado e
a composição do que é a política.
E, resgatando a citação positivamente apresentada por Arendt (2009)
de que a liberdade política é a construção de espaços produzidos pelos diversos e
diferentes homens e, que nestes espaços cada qual se move entre seus iguais. Esta
concepção é deveras importante para que se veja que a sociedade e, mesmo o
Estado, é a construção de espaços coletivos da humanidade a partir de suas
diferenças etárias, sexuais, de pensamento, de origem em que cada qual pode se
expressar, se conhecer e se relacionar com o outro, criando sempre novas formas
de relacionamento baseados na liberdade das interações.
Ao mesmo tempo que a partir das diferenças socioculturais da
humanidade, que compõe esse quadro, a liberdade do movimento entre os homens
é vista pela igualdade, pois caso contrário não haveria a liberdade para a construção
da sociedade e das práticas sociais.
Porém, deve-se salientar que essa igualdade de relacionamentos a
partir da liberdade estabelecida pela política não expressa o conceito grego de
Isonomie, ou seja, isonomia, a igualdade de tratamento entre todos aqueles que
compõem a sociedade, pois:
(...) isonomia não significa que todos são iguais perante a lei nem que a lei seja igual para todos, mas sim que todos têm o mesmo direito à atividade política; e essa atividade na polis era de preferência uma atividade de conversa mútua (ARENDT, 2009, p. 49).
Por isso a isonomia é vista como parte do princípio da liberdade, mas
não significa a totalidade da liberdade. Para que uma sociedade (polis) possa ser
constituída a partir dos princípios de liberdade política, é preciso que todos que nela
interajam possam praticar a isonomia e receberem o mesmo tratamento do Estado,
não havendo prevaricação perante uns poucos escolhidos, isso seria a prática ou
princípio de que alguns seriam os “eleitos”, os melhores entre aqueles homens que
compõem a sociedade e, restaria o questionamento: como estes atingiram tal
status?
Essa prevaricação de atos e ações públicas cercearia o princípio da
isonomia e colocaria em cheque o conceito de liberdade como pilar para a política
em uma sociedade que busque em seus atos a constante aplicação da justiça a
todos.
A liberdade e a isonomia enquanto conceitos ligados à política
justificam as implicações que o ato da realização da política têm no cotidiano dos
homens, pois toda ação política tem o caráter de alterar a situação social sobre a
qual incide (COSTA, 2004).
É certo que a política não é um caminho linear, pois em seu centro há o
caráter dialético entre a sociedade civil e o Estado, o qual é preenchido de
discussões, lutas, acertos e erros. Mas para que a política possa ser autônoma
nesse processo de interesses é preciso que haja uma sociedade civil e uma nação
democrática.
Quando a sociedade civil é dotada dos princípios e das ações
democráticas, maiores serão as chances de se ter um Estado também democrático,
possibilitando que a política seja deliberada por e pelos princípios democráticos,
diminuindo as diferenças de educação, de renda e de poder entre os membros.
Para se alcançar esse estágio é importante que o conceito de
autonomia relativa da política seja instituído em um país de princípio democrático. A
autonomia não deve ser lida como alijamento da sociedade civil das instâncias de
poder; não pode ser compreendida como liberdade plena dos oficiais públicos em
impor suas vontades à sociedade; mas significa a liberdade em decidir. A palavra
relativa na expressão atribui o sentido de que a autonomia não é liberdade plena,
ficando condicionada às estruturas sociais (classes e grupos sociais) e econômicas
(regras e procedimentos da economia capitalista) (BRESSER-PEREIRA, 2010b).
A autonomia relativa da política é então compreendida como um
conceito que traz a mediação, o controle, a participação da sociedade civil na
construção das deliberações governamentais que possam servir de instrumentos de
democratização, visando a construção de uma sociedade livre, mais justa e solidária
e, promovendo o desenvolvimento nacional.
Para tanto, é preciso que se compreenda que a política possua uma
metodologia própria para análise denominada de policy analysis, ou seja, análise
das inter-relações entre as instituições políticas, entre o processo político e os
conteúdos das políticas para então de fato se conhecer como uma determinada
sociedade (povo e governo) é regida e como se rege (FREY, 2000a).
Mas para que se compreenda o policy analysis é necessário entender
outros conceitos que norteiam tal viés de abordagem a saber: policy, politics e polity
a partir da discussão empreendida por Frey (2000a).
Toda política tem a sua dimensão institucional para que possa ganhar
corpo burocrático e espaço para ser legislada, assim, no policy analysis esta
dimensão é denominada de policy e abrange os sistemas jurídicos, a estrutura
institucional do sistema político-administrativo de um Estado.
Já no que se refere à dimensão do processual, ou seja, da execução
do ato político, a denominação é dada pelo conceito politics e assume o caráter
conflituoso, pois trabalha com a imposição dos objetivos, aos conteúdos e às
decisões de distribuição de efeito da política formulada.
A politics seria a arena para a formulação da prática política levando
em consideração as demandas da sociedade, mas que por vezes será mediada
pelos interesses do Estado fazendo com que o caráter conflituoso, conforme é
aludido por Frey (2000a), se torne presente em todo o processo de legislação da
política.
Novamente poder-se-ia recuperar a discussão empreendida por Arendt
(2009) quando diz que a política deve ser baseada na liberdade e feita para e pelo
homem, e não para atender aos interesses de grupos menores ou dar continuidade
às práticas clientelistas discutidas por Arretche (1996).
E, por fim, polity se refere propriamente a uma dimensão do conteúdo
do que é feito: como os programas políticos foram construídos, quais problemas
técnicos podem ser observados ao final da redação da política e qual o conteúdo
material dessas decisões políticas realizadas.
A polity em essência é a lei ou o instrumento legal ao fim legislado pelo
corpo do Estado, compreendendo a dialética estabelecida entre o corpo executivo e
o legislativo envolvido no desenvolvimento da polity.
Para a composição da polity deve-se sempre partir do pressuposto de
que a redação final do texto é fruto de inúmeras aspirações e vontades da
sociedade, e que o texto da polity é resultado final de acumulações discursivas a
partir de decisões emanadas das esferas periféricas e fortuitas da sociedade que
compõe a polis (CARADE, 2009).
Este pensamento é deveras importante para que novamente seja
resgatado o papel da sociedade, de seus representantes e mesmo dos políticos em
estarem atentos e abertos a debates e reflexões a respeito daquilo que deve ser
legislado e em como o Estado pode avançar e se desenvolver em prol da
coletividade e não dos interesses escusos de grupos/estruturas essas que
emperram e fazem com o que o Estado e a politics sejam apenas instrumentos de
mando e julgo, mantendo a estrutura clientelista e assistencialista.
Todo este quadro de agentes e ações criados a partir da visão
processual da política, a partir das interfaces entre policy, politics e polity para que
se crie um entendimento do que é o policy analysis, tem a sua dinâmica no policy
cycle ao ser visto como um amálgama dos distintos elementos do campo processual
da política (CARADE, 2009).
Para tanto é preciso que se compreenda que a política possui uma
metodologia própria para a sua criação e articulação com a sociedade civil e com as
instâncias de poder constituídas mediante o corpo burocrático estatal, a qual recebe
o nome de policy cycle. O pensamento exposto permite que se compreenda quem
são os demandantes da política (sociedade, estados, municípios ou outros) e
aqueles que irão formulá-la (corpo legislativo do Estado, estado, municípios e união)
(FREY, 2000a).
O policy cycle tem a sua dinâmica a partir de ciclos deliberativos,
constituindo-se de diferentes estágios, mas cada qual dotado de um processo
dinâmico e que envolve o aprendizado para aqueles que participam e integram os
ciclos: definição de agenda, identificação de alternativas, avaliação das opções,
seleção das opções, implementação e avaliação (SOUZA, 2006).
O processo do policy cycle pode ser visto como um processo linear a
partir da figura 01, na qual pode-se perceber que as demandas da sociedade são
configuradas, organizadas e traduzidas em políticas; num segundo momento tais
políticas são implementadas pelo Estado a partir de suas diretrizes, cabendo ao
Estado e à sociedade realizar o acompanhamento e a avaliação de seus resultados,
podendo a sociedade requerer junto ao corpo político modificações e uma nova
configuração para a política em vigor.
Mas, o processo linear do policy cycle não pode ser visto como um
arranjo perfeito, pois algumas premissas podem ser equivocadas para a composição
da formulação das políticas e mesmo o processo de retroalimentação como proposto
na figura 01.
A legalidade do esquema do policy cycle linear é fundamentada na
excessiva atenção dada à formulação da política em detrimento de outras
dimensões como o estabelecimento de uma agenda política e do confronto entre as
especificações da política e de suas alternativas para a implementação (SILVA;
MELO, 2000).
FIGURA 01 – A visão do policy cycle linear. Fonte: SILVA; MELO, 2000, p. 6.
Como afirmado anteriormente, a politics representa uma arena, um
espaço de debates, de confrontos entre diferentes atores sociais em prol da
definição de políticas que atendam aos interesses sociais, mas que sofrerão a
intervenção do Estado ou, possivelmente até o seu veto. Desta forma, é preciso que
na figura 01 seja inserido um estágio anterior à formulação de políticas, podendo
assumir então uma configuração imaginária, a partir da figura 02.
FIGURA 02 – A visão do policy cycle e intervenção. Fonte: SILVA; MELO, 2000. Adaptado por OLIVEIRA, 2011.
Neste processo, compreende-se que antes da formulação das políticas,
a sociedade e o Estado realizem debates, provocações, estabelecimento de
agendas inserindo o tema da reivindicação ou da demanda social na pauta política,
para que então os temas da política abordados pela sociedade possam por parte do
Estado “(...) ser avaliada preliminarmente a partir de seus custos e benefícios das
várias opções disponíveis de ação, assim como uma avaliação das chances do tema
ou projeto de se impor na arena política” (FREY, 2000b, p. 227).
Há outra vertente de análise para a composição da arena política,
aquela na qual o ponto de partida para a demanda social é barganhado entre
aqueles que demandam, ou seja, atores sociais corrompidos pelo corpo político do
Estado; e outra vertente de análise considera que a sociedade e seus atores sociais,
que reivindicam a proposição de uma agenda política em prol de determinada
necessidade, agem pela persuasão para com o corpo político do Estado,
encontrando de maneira mais fácil o consenso na arena política (SOUZA, 2006).
Outra crítica ao modelo de policy cycle linear recai na implementação
de políticas que pode representar, numa primeira análise, a visão ingênua e irreal do
funcionamento do aparato estatal, uma utopia de que toda formulação política será
implementada em perfeição e harmonia com as demandas levantadas e
apresentadas nas agendas políticas (SILVA; MELO, 2000).
A estrutura burocrática do Estado e seus aparelhos nem sempre
poderão absorver com imediatismo as reivindicações da sociedade transformadas
em políticas, uma vez que, para a sua implementação dependerá de orçamentos
disponíveis, pessoas, locais e outras variáveis concernentes a cada caso, como
também dependerá da situação econômico-social de cada estado ou município. Se a
política for do estilo top-down (de cima para baixo), as políticas são formuladas na
esfera federal e sua implementação dependerá das esferas estaduais e municipais,
as quais nem sempre estão preparadas para a aplicação em imediato das
mesmas(SILVA; MELO, 2000).
Outra crítica ainda se inscreve na dinâmica do policy cycle quando este
é concebido a partir da linearidade, pois em determinadas situações a gênese desse
processo de ciclos pode ser facilmente burlada quando houver interesses e outras
prevaricações inerentes às estruturas de poder envolvidas com a política a ser
formulada (CARADE, 2009).
Mas deve-se ressaltar que quando a dinâmica do policy cycle cumpre
todas as etapas e envolve o Estado e a sociedade como atores sociais co-
responsáveis na retroalimentação e monitoramento da política formulada e
implementada, pode-se compreender que haverá a existência de maiores chances
para que a política seja implementada de maneira eficaz e que seu
acompanhamento seja feito de maneira eficiente pelos atores sociais.
2.3.2 Políticas Públicas e suas aplicações no campo da práxis
A compreensão da política enquanto um instrumento de mediação
entre o Estado e a sociedade para que determinados serviços públicos possam ser
prestados, inscreve-se no campo das obrigações do Estado Democrático para com a
população e deve-se notar que estas obrigações se dão em função do interesse e
da direção assumida pela governabilidade do Estado, mas se os interesses são
expressos ou são requeridos pela sociedade como se dará a redação de políticas?
O Estado, com seu corpo de funcionários e com a sua burocracia, nem
sempre pode compreender as diversas facetas dos problemas que afligem a
sociedade de maneira geral, carecendo assim de espaços próprios para que
demandas sociais possam ser conhecidas e, por ventura, transformadas em corpo
legal (política) específico. Para tanto, convenciona-se determinar tal ação como
política pública.
Mas acreditar que a partir das demandas societais o Estado legisle
novos ordenamentos jurídicos seria deveras imaturo e infantil acreditar que este é o
caminho, ou mesmo acreditar que o caminho é dado de maneira simplória. Por isso,
é preciso lançar novas luzes para que se conheça o desdobrar das políticas públicas
e como as mesmas nascem e se orientam.
Inicialmente, a compreensão da origem e da ontologia de uma área de
conhecimento é essencial para que se possa conhecer a sua práxis, conduzindo
aquele que se aventura nesse conhecimento pelos diversos caminhos deste novo
conhecimento (SOUZA, 2006; TREVISAN, BELLEN, 2008).
Desta forma, estudar o conceito de política pública deve ser visto como
um processo por meio do qual se obterá maior conhecimento a respeito de
características generalistas dos sistemas políticos e das relações que são
estabelecidas entre política e política pública, de um lado, ou entre governo e
sociedade de outro lado (SARAIVA, 2006).
Para melhor compreensão do conceito de política pública recorrer-se-á
ao histórico de sua aplicação e de sua iniciação no campo das práticas públicas e
societais, que é marcado por romper e/ou pular as etapas determinadas pela
tradição européia, no que se refere aos estudos e pesquisas nessa área.
Isto é, a política pública, enquanto disciplina acadêmica, nasce nos
Estados Unidos da América, recebendo a atenção dos pesquisadores, mas sem que
houvesse relações com as bases teóricas sobre a atuação do Estado, e sim
admitindo uma ênfase nos estudos sobre a ação dos governos (SOUZA, 2006).
Tal situação é perturbadora para o campo dos estudos, principalmente
quando confrontado pelo rigor acadêmico estabelecido pelos centros de estudos
europeus que se debruçam na compreensão das políticas públicas como “(...)
teorias explicativas sobre o papel do Estado e de uma das mais importantes
instituições do Estado – o governo –, produtor por excelência, de políticas públicas”
(SOUZA, 2006, p. 22).
As diferenças estruturais dos métodos de análises entre os Estados
Unidos da América e os países europeus, de maneira geral, se dão em função da
própria condução e orientação do Estado onde, de um lado encontramos nos
Estados Unidos da América um Estado que tem seu papel fundamentado na
regulação do mercado mediante políticas que atendam ao corpo societal sem ferir os
princípios democráticos já estabelecidos, no extremo oposto encontra-se nos países
europeus grande tradição do papel e da ação do Estado na condução e na
regulação da vida social, além de prover serviços públicos orientados para a
sociedade em geral.
Assim, as relações estabelecidas pelas políticas públicas nos Estados
Unidos da América compreende como os governos locais tendem a solucionar
pontualmente as demandas originadas por segmentos sociais de uma localidade e
não atendendo ao princípio da universalidade da política, quando assume seu viés
de pública.
Na Europa seria impensável conceber políticas públicas que não
atendam às demandas da sociedade de maneira geral, pois assim poderiam criar
antigos vícios ou mesmo alimentar a nefasta estrutura clientelista, assumindo assim
contra-caminhos à democracia.
Além desses fatores sócio-culturais inerentes a cada uma das duas
situações ponderadas, é preciso que se compreenda que a política pública surge
como um novo processo político capaz de lidar com os cenários das incertezas que
decorrem das rápidas mudanças de contexto sendo motivados pelas transformações
políticas, econômicos e/ou estruturais dos diversos e diferentes países de cunho
democrático (SARAIVA, 2006).
Mas é preciso que se compreenda que quando a ação do Estado,
mediante uma política pública, é estruturada a partir de uma agenda propositiva,
esta servirá para orientar os gestores públicos na produção, condução e
implementação de políticas mais eficazes, atendendo sempre ao princípio da
democracia e, concebida como um arranjo institucional engendrado pela sociedade
e Estado, concomitantemente (CARADE, 2009).
A política pública enquanto disciplina e campo do conhecimento
conduz os pesquisadores para a análise sobre a identificação da situação problema
que conduzirá o encontro da sociedade com o Estado, solicitando deste uma
solução para a situação vivenciada, ou seja, a legislação de uma política pública
(SOUZA, 2003).
Retornando ao debate de quando se inicia a aplicação e a
instrumentalização das políticas públicas, deve-se reportar à década de 1970, mais
precisamente quando do estabelecimento da Guerra Fria e da valorização da
tecnocracia, nos Estados Unidos da América, como configuração das políticas em
criarem novas soluções para os problemas socioeconômicos enfrentadas (SOUZA,
2006).
A política pública enquanto um instrumento para a apresentação de
uma solução para os problemas de origem social ou emanados da sociedade, não
pode ser compreendida apenas à luz das análises técnicas e frias do corpo
burocratizado do Estado, deve sim, ser um ajustamento entre as partes – Estado e
sociedade – que mediante uma interação de forças possam chegar a um
denominador comum, que será a redação propriamente dita da política pública
(RONCARATTI, 2008).
A mediação entre Estado e sociedade é apontada como o principal
caminho que diferencia uma política estatal de uma política pública, pois o que está
em jogo é um enfrentamento das diferentes relações de poder. Segundo Rua (2011,
p. 1) “ as políticas públicas (policies), por sua vez, são outputs, resultantes da
atividade política (politics): compreendem o conjunto das decisões e ações relativas
à alocação imperativa de valores”.
A alocação imperativa de valores conforme é destacado por Rua
(2011), se configura em um árduo trabalho dialógico entre a sociedade, a qual
requer com determinada urgência a resolução de seus problemas enfrentados, e o
Estado que, por sua vez, pode se esquivar ou justificar que o problema apontado
pela sociedade será resolvido, mas não naquele momento, pois algumas variáveis
podem não ser favoráveis para a solução requerida, tais como: orçamento,
disponibilidade financeira e redação final do ordenamento jurídico (a política pública
em si).
Desta forma, o conceito de política pública é revestido de intensos
fluxos de decisões públicas, orientando-se na manutenção do equilíbrio social ou da
introdução de desequilíbrios voltados a modificar essa realidade. Essas decisões
são condicionadas pelo próprio fluxo, como também pelas reações e modificações
que a própria política pública é capaz de causar no tecido social, além dos valores,
idéias e visões dos que adotam ou influenciam na decisão (SARAIVA, 2006).
Outro ponto de destaque no conceito de política pública é seu caráter
estratégico ao ser vista como uma bússola que aponta para diversos fins, mas fins
estes que de alguma forma são demandados por diferentes grupos que participam
do processo decisório de uma política pública (SARAIVA, 2006).
As decisões políticas correspondem a uma livre escolha por parte do
Estado dentre um grupo de opções e/ou alternativas, conforme as preferências dos
atores envolvidos neste processo de escolha, pautando-se no ajustamento entre os
fins pretendidos e os meios disponíveis (RUA, 2011).
Essa visão é carregada de lateralidade, ou seja, a decisão política pode
ser feita sem que haja o consentimento da sociedade, ou mesmo que a decisão a
ser tomada pelo Estado não atenda em momento algum qualquer necessidade ou
demanda da sociedade.
Por isso o conceito e a sua aplicação – políticas públicas – inscrevem-
se em duas áreas: a da política – que é uma ação de intermediação entre estruturas
de poder, mas que é definida a partir de um determinado grupo de atores (Estado,
governos) e, a pública – que é o caráter da coletividade, do que é público, tendo a
sua origem nas demandas sociais.
Mas deve-se ressaltar que o conceito de política pública, além de ser
fruto de constantes fluxos decisórios e de diferentes estruturas de poder, tem como
finalidade algo muito simples que é a consolidação dos princípios democráticos para
a sociedade, maior justiça social, a manutenção do poder (SARAIVA, 2006).
Por isso, as políticas públicas tendem a ter uma maior repercussão na
economia e na sociedade, pois partem de uma visão holística do tema (demanda
social) a ser convertida em diferentes ações governamentais tais como planos,
programas, projetos, bases de dados, ou sistema de informação e pesquisa
(SOUZA, 2006).
Essas novas ações representam novos gastos públicos e com isso
necessita-se de tempo para a sua implementação, como também de recursos
públicos para colocá-las em prática, carecendo assim de tempo e de disponibilidade
do Estado para articular a efetivação da política pública.
Mas retornando à discussão dos processos políticos e dos outputs da
política pública, recorre-se à figura 03 para melhor ilustração e explanação do
processo sistêmico para a adoção de uma política pública.
Em uma primeira análise, a figura 03 lembra em muito o processo
desenhado na figura 02, quando se concebia a explicação do policy cycle e as
intervenções durante este processo, mas nesta figura 03 dentro do sistema político
originam-se também as demandas, as quais são denominadas de withinputs, outra
variável que na figura 02 não aparecia, pois se tratava apenas do desenho da
política e não de políticas públicas.
FIGURA 03 – Modelo sistêmico do processo político em Políticas Públicas. Fonte: RONCARATTI, 2008, p. 6. Adaptado por OLIVEIRA, 2011.
As definições do modelo sistêmico carregam os pensamentos de Rua
(1998), Rua (2011) e de Easton (1970), os quais apresentam um diálogo frutífero
para a compreensão do que são os inputs, withinputs, e os outputs, conforme
demonstrados na figura 03.
Os inputs são definidos a partir de dois grandes grupos: exigências ou
demandas e os apoios ou sustentáculos, pois para que uma política pública possa
ser concebida é necessário que haja uma demanda reclamante por esta e que
também existam apoios ou sustentáculos que possibilitem que essa demanda possa
ser recebida pelo sistema político (RONCARATTI, 2008).
As exigências ou demandas quando expressas na forma sistêmica de
inputs são vistas como reivindicações por bens e serviços públicos, tais como saúde,
educação, estradas, transportes, segurança pública, melhores normas de higiene e
controle sanitário para os produtos alimentícios, dentre outros conjuntos de
demandas sociais. Podem ser expressos também como demandas da intenção de
participação no sistema político em vigor como o reconhecimento do direito, o
acesso a cargos públicos por parte de estrangeiros dentre outras tantas demandas
oriundas da sociedade (RUA, 2011).
O apoio, também chamado de sustentáculos, não está diretamente
vinculado às demandas da sociedade, mas é instrumento, ferramenta ou mesmo
ação que dá apoio ao sistema político em vigor, podendo ser visto como a
obediência e o cumprimento de leis e regulamentos, como também comportamentos
favoráveis ao sistema político (RUA, 2011; RONCARATTI, 2008).
No centro da figura 03 encontra-se o sistema político, que será o meio
pelo qual os inputs da sociedade são ouvidos, considerados para que possam ser
apresentados às discussões e futuras decisões. O sistema político é formado pelo
corpo de políticos eleitos pelo sufrágio eleitoral democrático e possui seus
desdobramentos, conforme já apresentado anteriormente, nos poderes executivos e
legislativos, cada qual com atribuições e responsabilidades.
Desta maneira, o sistema político tende a realizar os outputs do modelo
sistêmico respondendo à sociedade e às suas necessidades com políticas públicas
específicas, tendo no campo das decisões e das disputas internas de poder uma
resposta às exigências ali apresentadas, mas ao mesmo tempo tende a recorrer aos
inputs de apoio como uma estratégia de sustentação do próprio sistema político em
vigor (RONCARATTI, 2008).
Tal utilização dos inputs de apoio para a sustentação do sistema
político é uma maneira de criar uma regulação por retroação, ou seja, à medida que
são criadas novas políticas públicas que atendam ao input de demanda, o sistema
político cria um processo de retroação, maximizando o apoio disponível e
respondendo com dinamicidade o seu envolvimento necessário e preciso para com
a sociedade:
Assim, de maneira bastante simplificada, podemos considerar que grande parte da atividade política dos governos se destina à tentativa de satisfazer as demandas que lhes são dirigidas pelos atores sociais ou aquelas formuladas pelos próprios agentes do sistema político, ao mesmo tempo que articulam os apoios necessários (RUA, 2011, p. 3).
Mas, as políticas públicas como outputs do processo político, ou seja,
saídas ou produtos finais do processo político, de acordo com Rua (2011), devem
ser vistos com cautela e com o devido reconhecimento do que de fato são políticas
públicas e do que são decisões políticas, pois em determinadas situações o sistema
político poderá utilizar-se dos inputs de demanda não organizados e não
reivindicados por atores sociais fortes para convertê-lo em uma ação política
unilateral.
Outra consideração deve ainda ser feita com relação aos inputs do
modelo sistêmico do processo político para a formulação de políticas públicas:
percebe-se que existem diferentes graus de demandas por parte da sociedade e que
cada grau pode representar ou não uma abertura do sistema político em atendê-la.
Assim, de acordo com Rua (2011), são três diferentes graus de demandas: as
demandas novas, as demandas recorrentes e as demandas reprimidas.
As demandas novas podem ser consideradas como aquelas que
nascem a partir do surgimento de novos atores políticos no contexto social ou
mesmo de novos problemas enfrentados pela sociedade. A cada momento histórico
a sociedade passa a perceber e a enfrentar novos dilemas e problemas, seja no que
tange aos serviços públicos, seja na necessidade de acesso a novos produtos e,
portanto, a cada novo obstáculo a ser enfrentado diferentes atores sociais que
carecem por serviços públicos reivindicam uma solução para tais problemas.
Já os novos atores políticos não são necessariamente aqueles atores
que não existiam no contexto dos inputs em um dado momento, mas sim atores
políticos que passam a se organizar frente a uma situação não mais suportada e
visam pressionar o sistema político para que novos outputs possam ser
regulamentados.
O segundo grau de demanda são aquelas denominadas de
recorrentes, pois são expressas por problemas recorrentes na vida da sociedade e
que o sistema político, de certa maneira, tende a incluir em sua agenda de
discussão, mas que não apresenta uma resposta concreta mediante um output.
O sistema político pode ser visto como sistema carregado de
demandas recorrentes, pois por dificuldade em estabelecer uma agenda concreta e
até mesmo em coordenar as ações que visem o input de apoio interno para que as
ações em fase de planejamento se convertam em output, acabam por gerar na
sociedade e nos atores sociais e políticos constantes debates a respeito da
morosidade, da burocracia e da falta de atenção para com a sociedade:
Quando se acumulam as demandas e o sistema não consegue encaminhar soluções aceitáveis, ocorre o que se denomina “sobrecarga de demandas”: uma crise que ameaça a estabilidade do sistema. Dependendo da sua
gravidade e da sua duração, pode levar até mesmo à ruptura institucional. Mesmo que isto não ocorra, o sistema passa a lidar com crises de governabilidade (...) (RUA, 2011, p. 3).
E por fim, apresentam-se as demandas reprimidas, que podem ser
conceituadas como “estados de coisas” ou mesmo por “não-decisões”.
Diferentemente da demanda recorrente, na qual as necessidades fazem parte da
agenda do sistema político, as demandas reprimidas são situações recorrentes no
cotidiano das pessoas, mas que não conseguem espaço ou canal de introdução por
meio dos atores sociais e políticos nas agendas do sistema governamental.
A não entrada na agenda governamental é que faz com que a
demanda reprimida seja denominada de “estado de coisa”, mas quando a situação-
problema é vista e compreendida pelo sistema político e converte-se não em um
input do modelo sistêmico do processo político de políticas públicas, mas em um
problema político, o próprio sistema não poderá mais não enxergar ou mesmo não
compreender a necessidade urgente para o atendimento da necessidade expressa
pela sociedade.
E, quando o “estado de coisa” se converte em um item da agenda
governamental é porque conseguiu apresentar pelo menos uma das características
abaixo destacadas por Rua (2011).
O estado de coisa é fonte geradora de mobilização da ação política,
seja essa ação coletiva de grandes grupos ou mesmo de grupos pequenos, mas
grupos estes dotados de fortes recursos de poder por meio de atores individuais
estrategicamente situados dentro do sistema político.
Quando há uma situação de crise extrema como uma catástrofe,
calamidade ou outro evento de forte impacto na sociedade, logo o sistema político
cria condições para que se supere o estado de coisa vivenciada pela sociedade ou
por um grupo da sociedade.
E, por fim, o estado de coisa pode ser encarado como uma situação de
oportunidade por parte do sistema político, criando assim um tratamento
diferenciado para o então problema da sociedade.
Estas três situações características são necessárias para que se
compreenda novamente que a política pública não é fruto da resolução de uma
questão pontual ou vivenciada por um determinado grupo de pessoas, pois desta
maneira estaria se configurando no sistema político de políticas clientelistas e
direcionadas a grupos específicos e agindo em favor do favorecimento e não do
coletivo e do público.
Para tanto, é necessário compreender quem são os atores que
movimentam as diferentes esferas (política e societal) em prol da criação de políticas
públicas que versem a respeito de soluções dos problemas enfrentados.
A literatura de políticas públicas denomina esses agentes promotores
de mudanças como atores políticos: “(...) são os envolvidos na política, ou melhor,
nos conflitos em torno da alocação de bens e recursos públicos” (RONCARATTI,
2008, p. 7).
Essa visão demonstra de maneira clara que não é somente o corpo de
atores que trabalha e atua diretamente com o Estado. Representa dizer que existem
outros atores que formam o corpo estatal, aqueles que têm acesso à apresentação,
discussão e implementação de políticas que irão afetar toda sociedade. Mas
representa a indicação de que o campo da política pública é permeado pelos atores
sociais, os quais serão beneficiados direta ou indiretamente com a implementação
de determinada política pública, pois, como apresentado nesta discussão, a política
pública é um ato que implica na melhora de condições socioeconômicas ou de
regulamentação para a sociedade em geral.
Pode-se então dizer que outros segmentos da sociedade,
diferentemente do governo, são envolvidos na discussão das políticas públicas como
grupos de interesse e movimentos sociais, cada qual com um maior ou menor grau
de influência sobre a política pública a ser demandada, como também terá diferentes
graus de inputs de apoio junto aos atores políticos que formam o governo (SOUZA,
2006).
Mas tal pensamento de Souza (2006) não implica na percepção única
de que o governo e seus atores políticos fiquem à mercê dos interesses da
sociedade organizada ou, que o Estado e seu corpo de funcionários e políticos são
agentes excluídos num primeiro momento da atenção e da preocupação com as
demandas da sociedade. O que se percebe é que o campo das políticas públicas é
exatamente um campo difuso e tenso entre as constantes disputas de poder (Estado
versus sociedade), como também é um campo que apresenta configurações que
são tecidas a partir da demanda ou de um problema enfrentado pela sociedade, o
qual tende a se dissolver a partir da implementação da política pública reivindicada.
Dessa forma Rua (1998) e Rua (2011) apresentam uma distinção das
diferentes características de cada grupo de atores que compõem o difuso quadro
dos inptus de demanda das políticas públicas.
Para que o Estado e suas obrigações possam funcionar de maneira
correta e democrática, é preciso que este seja constituído de pessoas que possam
representar o interesse da população nos espaços de discussões políticos e na
composição de corpos administrativos específicos. Tais pessoas são denominadas
de atores políticos, ou seja, atores cuja posição e ocupação junto ao Estado resulta
de mandatos eletivos (RUA, 1998; RUA, 2011).
Num segundo momento, ainda na discussão da esfera política e
estatal, existem determinados cargos, funções e obrigações que não são
desempenhados pelos atores políticos, pois estes poderiam transformar as ações do
Estado em um conjunto de atos políticos, voltados para as manifestações
clientelistas e individualistas, contrariando ao princípio da isonomia do Estado e da
própria política. Para tanto, o Estado é composto de burocratas, que são os atores
que atuam no cenário político, mas que ocupam cargos que demandam
conhecimentos específicos sobre determinados assuntos nos quais o Estado atua
diretamente (habitação, saúde, impostos, transportes públicos, educação dentre
outros) (RUA, 2011) e, tem o seu ingresso no setor público não a partir do mandato
eletivo, mas sim do concurso público, corroborando para a isonomia do tratamento
do Estado para a composição do seu corpo burocrático.
Mas deve-se atentar que entre os burocratas e os atores políticos
existe sempre um clima tenso e de disputas, pois os interesses dos burocratas
referem-se ao cumprimento de princípios da administração pública e das leis,
normas e portarias expedidas pelo próprio Estado, o que no conjunto pode
representar um legítimo enfrentamento para que práticas clientelistas e
individualistas de políticos sejam combatidas e evitadas (RUA, 2011).
Saindo da esfera política do Estado e compreendendo os diferentes
atores sociais, é possível dizer que, num primeiro momento, os trabalhadores,
mediante grupos de movimentos sociais, são representativos e importantes atores
no processo das políticas públicas, pois como vem sendo discutido a política tendo o
seu caráter de pública deve atender aos interesses da sociedade e, é por meio dos
atores sociais oriundos de movimento sociais que as demandas reprimidas e as
recorrentes são incorporadas na agenda estatal devido à pressão de sindicatos,
movimentos sociais diversos, organizações não governamentais (ONGs) e pelos
diversos movimentos religiosos (RUA, 2011).
Num segundo momento, os atores sociais ainda são compostos pelos
atores privados, em específico pelos empresários, os quais são mais dotados de
poder no que se refere aos inputs de apoio junto ao governo, pois são eles que, em
essência, provém o Estado de recursos financeiros por meio do constante e rigoroso
sistema de impostos e arrecadação. Dessa forma, possuem um maior grau de
influência no campo da formulação das políticas públicas e, podem se manifestar na
área da política pública como atores individuais ou como atores coletivos (RUA,
2011).
Mas como o campo das políticas públicas é um campo de complexos
interesses e de ações específicas para a sociedade, outro importante conjunto de
atores deve ser mencionado neste momento: os agentes internacionais. Agentes
financeiros como o Fundo Monetário Internacional (FMI), o Banco Mundial e outras
instituições que provém de recursos externos a política do Estado, acabam por
também pressionarem o Estado e seu corpo de funcionários a legislar políticas
públicas que cumpram com protocolos internacionais ou mesmo que atendam às
demandas e pressões político-econômicas externas (RUA, 2011).
Numa primeira análise e entendimento poderia ser citado que esses
agentes externos possuem pouco poder de intervenção na política interna e até
mesmo na legislação de políticas públicas, mas quando se compreende que os
Estados e as políticas estão interligadas com o processo de globalização,
compreende-se, que em determinadas situações, não há países e políticas isoladas,
mas sim países e democracias que juntas buscam o mesmo objetivo: se tornarem
países mais justos e com economias equilibradas.
E, por fim, mas não menos importante podem ser citados como atores
no processo de políticas públicas a mídia e seus diversos e diferentes meios de
comunicação com a sociedade. A mídia tem um importante papel para com as
políticas públicas na medida em que dissemina para toda a população como as
ações empreendidas pelo poder público, as políticas e as políticas públicas estão
sendo pensadas e implementadas, com o objetivo de contribuir para que haja um
constante acompanhamento da sociedade no que diz respeito à aplicação dos
recursos financeiros públicos e em como as demandas sociais (reprimidas ou
recorrentes) podem ser incorporadas nas agendas políticas ao serem retratadas nos
veículos de comunicação (RONCARATTI, 2008).
Essa discussão dos atores sociais e políticos que compõem o quadro
de formulação e implementação das políticas públicas serve como bússola para que
seja possível identificar em quais pontos pode ocorrer uma sobrecarga de interesses
ou mesmo para identificar quais são os principais atores em conflito a partir de
políticas públicas em discussão.
Mas no ínterim dessa discussão a respeito da proposição de políticas
públicas e atores sociais envolvidos no processo, é preciso que seja feita uma
consideração pontual a respeito dos withinputs do processo, mais precisamente, é
preciso considerar que a máquina estatal burocrática pode assumir mais do que
simplesmente o papel de apoio ao processo de formulação de políticas públicas,
mas que em determinada situações pode representar o início do processo em prol
das mesmas.
É preciso que se reflita bem a respeito de como os withinputs podem
iniciar um processo de formulação de política pública, visto que a própria acepção do
termo público traz consigo as características que a necessidade, vontade e desejo
emanam de uma sociedade e não de um Estado para a sociedade.
Se assim for concebido o processo de formulação de políticas públicas
a partir dos withinputs seria então contraditório nomear as políticas que nascem da
vontade do Estado e denominá-las de políticas públicas.
Essa reflexão de como o Estado e seus winthinputs são fomentadores
para a formulação e implementação de políticas públicas inicia-se com o
conhecimento do papel da burocracia perante a própria vida política estatal, e em
como a burocracia pode arrogar o papel de ator principal desse processo.
Para iniciar tal processo é preciso que se saiba o que vem a ser a
burocracia, para tanto, a mesma pode ser definida como um conjunto de pessoas
que são organizadas de maneira hierárquica, as quais realizam um conjunto de
trabalhos de elevada natureza rotineira dentro das diversas estruturas de trabalho
(RONCARATTI, 2008).
Pode parecer que esse corpo de pessoas trabalha de forma alienada
ao cotidiano externo ao ambiente em que trabalham, além de terem uma
compreensão extremamente restrita aos assuntos e conhecimento somente ligados
ao desempenho de suas tarefas, pensamento este que é muitas vezes ligado ao que
é a burocracia.
Mas, quando se desvela o lado preconceituoso a respeito da
burocracia pode se perceber que existe todo um trabalho e conhecimento que é
inerente ao pleno funcionamento da estrutura do Estado e, porque não dizer do
sistema político em si. A:
(...) amplitude e (...) natureza do poder burocrático exige que se esclareça que este nunca é exercido com base apenas nos recursos que lhe são próprios – o controle do conhecimento técnico. O poder dos burocratas depende do respaldo ou da delegação de algum ator político estratégico que sustentará sua posição como policymarker (IPEA, 2010, p. 307).
Isto quer dizer que a burocracia não é apenas um corpo amorfo de
pessoas, mas sim um conjunto de conhecimentos e procedimentos que sustenta a
estrutura do Estado, assim como o seu poder perante a estrutura do Estado em si
não é assumida lateralmente, mas sim compartilhada com os atores políticos,
fazendo com que a burocracia seja um instrumento de apoio às decisões políticas.
Mas ainda assim, outra distinção se faz importante para melhor
localização da burocracia no complexo sistema estatal-político, qual seja a
compreensão de que existem duas cúpulas de poder envolvidas: o núcleo decisional
e o núcleo operacional (SUBIRATS, 2006).
As características do núcleo operacional são claras, pois representam
a máquina burocrática atuando de maneira cega ou em algumas situações,
indiferente, mediante processos formalizados para alcançar o cumprimento dos
objetivos fixados por uma linha de obrigações ou no âmbito de uma decisão política
(SUBIRATS, 2006).
Já o núcleo decisional é representado pelos burocratas com maior
acesso aos espaços políticos ou que mantêm relações diretas com os atores
políticos colaborando para que informações privilegiadas a respeito das estruturas
do Estado e para a formulação de políticas possam ser alcançadas de maneira mais
fácil e rápida, valorizando o trabalho da burocracia.
Desta maneira, a burocracia quando vista a partir dessas duas
vertentes (núcleo decisional e núcleo operacional) é compreendia em estruturas que
mantêm o processo da continuidade do funcionamento do Estado e, em como
determinadas ações são empreendidas pelo próprio Estado, definindo-se que a
formulação de estratégias se torne claramente diferenciada da sua aplicação
(SUBIRATS, 2006).
A aplicação é empreendida pelo corpo burocrático do Estado, com
suas tarefas rotineiras, já a formulação das estratégias é feita pelos burocratas: os
quais são pessoas que ocupam cargos de alto escalão ou de direção de órgãos da
administração pública do Estado, sejam cargos na administração direta ou indireta
do Executivo, mas tendo estes um alto grau de conhecimento técnico a respeito dos
temas aos que estão sob a sua tutela de ação (IPEA, 2010).
O alto grau de conhecimento dos burocratas faz com que eles sejam
vistos como atores de destaque no conjunto de outros atores políticos, pois os
mesmos conseguem operar decisões de maneira mais efetiva e eficiente, além de
conseguirem operar a realidade à qual está subordinada a sua ação.
Essas ações são operadas pelos burocratas quando estes dispõem de
uma completa gama de informações do que acontece dentro e fora da sua área de
competência administrativa; e que a situação ou o entorno no qual se operam as
suas ações é suficientemente estável para que não seja necessária a reformulação
das decisões no processo de implementação (SUBIRATS, 2006).
Isto quer dizer que quando um burocrata detém alto grau de
conhecimento técnico e ainda assim da realidade a que ele opera e que está
propenso a agir mediante uma ação, uma política ou mesmo uma política pública, o
grau de assertividade será muito maior comparada a de outros atores
essencialmente políticos, pois como já discutido, o ator político é impregnado de
ações e de intenções individuais ou clientelistas.
Mas, é preciso ainda compreender que o campo da burocracia é
também uma arena de disputa constante entre os burocratas e os atores políticos,
pois o que está em jogo é o processo de autonomia para se construir políticas
públicas que possam sanar as deficiências e/ou necessidades da sociedade,
levando consigo o caráter personalístico das ações políticas.
A representação de tal situação é vislumbrada quando os partidos
políticos, mediante a ação de seus atores políticos, não conseguem consolidar a sua
posição e função governativa em prol da elaboração e defesa de projetos ou
políticas públicas de próprias de seu governo. Cabe aos burocratas e à burocracia o
papel de descisores ou de implementadores dessas ações:
por sua vez, o exercício da função governativa pela burocracia alija os partidos políticos deste processo relegando-os cada vez mais para a função de representantes de clientelas ou grupos particularistas na sociedade e reforçando suas práticas meramente reprodutoras de posição de poder – reeleição e conquista de recursos necessários para tal (IPEA, 2010, p. 321).
Quando visto sob este prisma, a burocracia e o corpo de burocratas
podem parecer como atores que buscam defender o Estado e suas atribuições
democráticas, contudo, é necessário considerar que a eleição de políticos e a
escolha democrática dos partidos políticos constituem instrumentos indissolúveis
dos preceitos democráticos.
Além de tal concepção, a burocracia e seus agentes são muito pouco
capazes de se adaptarem às mudanças, e muito pouco capazes ainda de adaptar-se
aos novos compromissos assumidos pelo Estado democráticos nos últimos anos e,
menos capazes ainda de resistir à dinâmica da fragmentação dos interesses e da
contínua mutilação tecnológica das últimas décadas (SUBIRATS, 2006).
Se a burocracia é vista como um conjunto de procedimentos
formalizados é fácil perceber que uma abrupta mudança no rumo da metodologia, ou
mesmo no foco da atenção dos programas e planos de governo fará com que estes
facilmente percam o foco e o direcionamento de suas atividades.
Além da inoperância é preciso reforçar que o contínuo avanço
tecnológico faz com que a própria burocracia esteja sob constante ameaça, em
virtude da simplificação de procedimentos e da constante busca da eficiência
administrativa15.
Mas como a discussão aqui empreendia é compreender em como a
burocracia se inscreve no processo das políticas públicas e não no entendimento de
como a burocracia e o corpo de burocratas se comporta no corpo estatal, é preciso
que se busque conhecer quais são os recursos mais importantes que a própria
burocracia possui e que explicam a sua importância no processo de formulação e
implementação de políticas públicas.
15
"Assim, princípio da eficiência é o que impõe à administração pública direta e indireta e a seus agentes a persecução do bem comum, por meio do exercício de suas competências de forma imparcial, neutra, transparente, participativa, eficaz, sem burocracia e sempre em busca da qualidade, rimando pela adoção dos critérios legais e morais necessários para melhor utilização possível dos recursos públicos, de maneira a evitarem-se desperdícios e garantir-se maior rentabilidade social" (MORAES, 1999, p. 30).
Em primeiro lugar, o controle sobre a informação e a sua capacidade
profissional faz com que a burocracia se estabeleça, como já afirmado anteriormente
como um núcleo a parte dos núcleos políticos do Estado (SUBIRATS, 2006).
O controle sobre a informação processada do Estado, assim como o
entendimento das informações emanadas de outras instâncias governamentais,
além do grande grau de conhecimento dos programas políticos faz com que a
burocracia já tenha por si só uma diferenciação de conhecimento e porque não dizer
de poder frente aos atores políticos que iniciam as suas atividades junto ao corpo
executivo do Estado.
E, atrelado ao controle da informação, a capacidade profissional e as
habilidades dos burocratas fazem com que a formulação de políticas públicas,
quando orientadas pelo Estado, tenham uma alta propensão a serem aceitas e
implementadas com eficácia.
Outro recurso de destaque empregado pela burocracia é a rede de
contatos informais e formais a partir dos mais diferentes serviços da administração
pública, mantendo a estrutura burocrática sempre informada e a par dos últimos
acontecimentos e gerando um conhecimento não-formalizado a respeito dos pontos
positivos e negativos de programas e planos governamentais, aumentando ainda
mais o grau de influência e de poder não-tácito nas arenas de disputas em prol da
formulação de políticas públicas (SUBIRATS, 2006).
E, por fim, a permanência de burocratas e mesmo da burocracia nos
desenhos de políticas públicas, programas e planos governamentais garantem a
estes recursos mais eficazes para que a estrutura política do Estado se utilize de
seus conhecimentos e de suas ações em prol da necessária efetivação para as
ações ora empreendidas ou a serem empreendias (SUBIRATS, 2006).
Esta discussão dos recursos utilizados pela burocracia para a sua
manutenção e retroalimentação neste processo como importante ator withinput das
políticas públicas é trespassada pela pergunta: pode haver relação entre
competência e política?
Tal questionamento é feito por Bobbio (2004) ao compreender que
existe ainda outro aspecto a ser considerado entre a burocracia e os burocratas, a
tecnocracia:
(...) Os princípios fundamentais dessa ideologia são, além da predominância da eficiência e da competência, a concepção da política como reino da incompetência, da corrupção e do particularismo; o tema do desinteresse das massas a respeito da res pública com a conseqüente profissionalização do decision-making, a tese do declínio das ideologias políticas e a substituição de uma espécie de kome tecnológica (BOBBIO, 2004, p. 1235).
A inserção da burocracia, ou porque não dizer, a intromissão no
modelo sistêmico de políticas públicas é amparado pelo pensamento acima exposto
de Bobbio (2004) ao considerar que a sociedade possui desinteresse em se
envolver nas discussões do espaço público, acreditando que mediante o voto e a
eleição de políticos sua participação para a construção de novas e melhores
políticas púbicas já esteja cumprindo.
Tal posicionamento da sociedade, frente ao pensamento de Bobbio
(2004), contraria boa parte da discussão aqui empreendida, pois se não houver em
nenhum momento a intervenção da sociedade, acredita-se que o Estado pode vir
novamente a assumir uma postura centralizadora, creditando somente ao corpo
burocrático as decisões e implementações das políticas públicas, afastando por
completo a visão a respeito da inserção da sociedade como processo de início da
formação de agendas em prol de políticas públicas e, cabe ainda mencionar que tal
afastamento da sociedade poderia colocar em xeque a defesa e manutenção do
Estado democrático.
Por outro lado, o pensamento de Bobbio (2004) ainda apresenta outro
elemento importante a ser considerado no ínterim da discussão de políticas públicas
que é o caráter dos políticos e suas intenções para com o uso da máquina
administrativa do Estado, ou seja, em muitas situações poderá o político em favor de
seus interesses induzir outros agentes políticos com menor grau de conhecimento,
seja da realidade da sociedade ou dos interesses do próprio Estado, que
determinadas políticas públicas sejam votadas e aprovadas em favor próprio,
contribuindo para que as ações corruptas sejam vistas pelos burocratas como algo a
ser vencido a partir de suas ações.
Esta talvez possa ser uma das mais importantes ações do corpo de
burocratas e mesmo da burocracia: o constante combate à ação corrupta de
determinados agentes e atores políticos que se elegem pelo voto da sociedade, mas
que agem em favor e benefício próprio ou em favor de grupos selecionados. Essa
batalha dos burocratas é mediante a aplicação cansativa da burocracia, vencendo
os atores políticos menos preparados e com menor grau de conhecimento de como
a máquina estadista funciona e em como a rede de interesses interna faz com que
manobras corruptas possam facilmente ser desmontadas quando percebidas pelos
burocratas.
A presente discussão, a partir da visão de Bobbio (2004), ganha outros
ares quando comparada ao pensamento do IPEA (2010) ao considerar que a
burocracia tem se consolidado na história democrática do Brasil como ator de
fundamental importância durante o processo decisório de políticas públicas, pois
mesmo com a divergência de pensamentos entre burocratas e atores políticos, os
princípios democráticos e a vontade de fazer instrumentos legislativos mais próximos
da sociedade são garantidos pela intenção e ação dos burocratas.
De certa maneira então, é do próprio interesse do Estado que exista
um corpo de burocratas e uma estrutura burocrática que possa dar conta do avanço
e do desenvolvimento da sociedade, a partir da configuração de políticas públicas,
com caráter mais técnico e com um maior respaldo dos núcleos decisórios do
próprio Estado, seja do poder Legislativo ou do poder Executivo.
Assim, se compreende que em determinados momentos históricos da
vida pública do Estado Nacional brasileiro surgiram iniciativas e ações que
consolidaram a prática dos burocratas e legitimaram seu extremo conhecimento
técnico, sendo denominada de insulamento burocrático.
Compreender o insulamento burocrático é compreender, ao mesmo
tempo, como o Estado é carente de informações técnicas e como é necessário uma
distância da visão dos técnicos, da visão extremista de determinados atores
políticos, os quais muitas vezes precisam do Estado para que suas intenções e
vontades possam ser feitas a qualquer custo, ainda que contrariando os
instrumentos legais em vigor.
Mas o modo de operação do insulamento burocrático é que se revela
um pouco contraditório quando comparado ao modus operanti das políticas públicas
e mesmo aos preceitos democráticos, pois:
(...) Supõe uma espécie de isolamento do núcleo técnico do Estado contra a interferência do público. Desse modo, a alta burocracia estatal da sociedade permanecia isolada, conhecida como tecnocracia, implementando políticas e tomando decisões sem a participação do povo ou sociedade e de seus representantes (RONCARATTI, 2008, p. 12).
Se a concepção das políticas públicas é como defendido neste texto e
com base em um corpo de autores e pensadores do próprio conceito, a prática do
insulamento induz a um afastamento da sociedade em relação ao Estado e, porque
não dizer, um afastamento tendencioso do próprio Estado para com a sociedade,
criando um aparato de instrumentos normativos, políticas públicas, planos e
programas que visam ao atendimento daquilo que somente o próprio Estado
entende que a sociedade necessita.
Além disso, sem a participação da sociedade estar-se-ia invalidando o
conceito de políticas públicas e ao mesmo tempo desconstruindo a necessidade do
modelo sistêmico de políticas públicas, já que a intervenção do Estado se daria de
maneira unilateral, não cabendo em nenhum momento incluir a sociedade nessas
discussões.
Tal posicionamento do insulamento burocrático é visto pelo dilema
estabelecido por Bobbio (2004) e que ganha novos contornos na visão de IPEA
(2010) ao compreender que a partir do insulamento burocrático menores serão as
chances de que práticas clientelistas desenvolvidas por atores políticos mal
intencionados sejam mantidas pelo Estado.
Mas cabe destacar que, ao mesmo tempo em que se compreende que
a simples prática da manutenção do insulamento burocrático reduziria as práticas
clientelistas, poderia ser gerada pelo Estado uma posição enfatizada para que a
ordem democrática e os impactos negativos do insulamento burocrático sejam
maximizados e tenham suas experiências ampliadas (IPEA, 2010).
Para conceber que o insulamento burocrático nem sempre é a melhor
alternativa para que o processo de políticas públicas seja neutralizado dos
interesses dos atores políticos mal intencionados, deve-se recorrer à história política
do Brasil e rever como o regime militar adotou, mediante o insulamento burocrático,
uma nova maneira de conduzir a democracia:
(...) buscou-se isolar a Administração Pública da influência da sociedade, de modo que as decisões eram tomadas sem que houvesse qualquer participação e as políticas públicas eram executadas sem mecanismos de controle social (RONCARATTI, 2008, p. 12).
Se não há controle social sobre as políticas públicas, como acreditar
que o insulamento burocrático não pode gerar novos estratagemas de clientelismos
e favoritivismos? E como não questionar o insulamento burocrático como um
instrumento da não-democracia?
Esses questionamentos referem-se como a sociedade, o Estado, o
corpo de burocratas e mesmo os atores políticos devem criar novos parâmetros de
relacionamento em prol da uniformização das agendas de políticas públicas, para
que sejam cada vez menores as chances de que o insulamento burocrático seja
instrumentalizado novamente pelo Estado Nacional democrático.
E combater o pensamento de que basta a competência para decidir os
fins de uma política pública (BOBBIO, 2004), por meio da participação da sociedade
nas arenas públicas com o Estado é que se pode construir novos postulados que
servirão para que os atores políticos sejam capazes de formular novas políticas
públicas que tendam a ser efetivas e eficientes em sua essência e prática.
Assim, a burocracia pode ser vista como um processo ambíguo: ora
fornecendo informações e apoio aos gestores das políticas públicas; ora agindo
contra a aplicabilidade das políticas públicas por se sentir lesada, ou seja,
discriminada por não centralizar em si e no conjunto de seus conhecimentos e
técnicas as diretrizes das políticas públicas.
A participação da sociedade no conjunto de ações empreendidas pelo
Estado faz com que a política assuma seu viés social, mas nem todas as políticas
realizadas podem levar a alcunha de política pública, pois trata-se de uma vertente
conceitual do termo política.
Quando intitula-se uma política como política pública deve-se
considerar que o elemento balizador e diferenciador é a palavra pública, pois leva
consigo um conjunto de resoluções e ações que são empreendidos pelo Estado,
mas que estarão sob o controle da sociedade (PEREIRA, 2008).
Assim, existem diferentes tipos de políticas públicas que são
classificadas segundo os pesquisadores do tema como: políticas distributivas,
redistributivas e regulatórias.
As políticas distributivas podem ser compreendidas como aquelas que
tendem à alocação de recursos financeiros em áreas ou setores demandados pela
sociedade. Caracterizam-se também pela facilidade com a qual os recursos
financeiros a serem aplicados são dispensados de forma atomizada a unidades
isoladas (RONCARATTI, 2008).
Essa ação atomizada gera um entendimento de que as políticas
distributivas são por vezes individualistas privilegiando determinados grupos sociais
ou regiões, não atendendo ao princípio da universalidade (SOUZA, 2006).
Para tanto, é preciso compreender determinados pensamentos e
vertentes a respeito da aplicabilidade de políticas distributivas e seus impactos em
um ambiente social democrático.
Para tanto, Neder (1988) apresenta que para o Estado construir
políticas distributivas é necessário que haja um engajamento em desempenhar com
eficácia o recolhimento de tributos da sociedade, para que então possa construir
políticas distributivas sem causar novos prejuízos aos cofres públicos.
Mas essa construção política é vista como uma ação de dependência,
ou seja, para que as políticas distributivas possam ser implementadas é necessário
um empenho das agências oficiais do Estado no contínuo recolhimento de tributos.
Caso haja uma diminuição dos recolhimentos de tributos automaticamente as
políticas distributivas serão afetadas e a sociedade que depende desses recursos
públicos distribuídos não será beneficiada.
Assim, para que haja eficácia desse tipo de política pública é preciso
uma contínua articulação entre o recolhimento de tributos e sua aplicação direta nas
políticas públicas distributivas, mas deve-se destacar que durante esse processo a
legitimidade política:
(...) reside na possibilidade de tornar menos gritantes as contradições (...)visando às assimetrias inerentes a um exercício de igualdade dos sujeitos sociais. Dessa forma - e enfocando especificamente as políticas públicas alocadoras e produtivas de caráter distributivo -, a igualdade não é uma qualidade referenciada pela inexistência de assimetrias, mas balizada pela existência da impossibilidade de superar inteiramente as assimetrias. Daí não se segue que a impossibilidade seja, em si, justificativa/justificadora da e para a distribuição iníqua da riqueza. Na verdade, a centralidade da legitimidade política reside no equacionamento (em conjunturas e lugares específicos) das formas e conteúdos não da distribuição da riqueza per se, mas dos procedimentos segundo os quais os sujeitos sociais em disputa podem fixar, acompanhar e fazer cumprir regras disciplinando seus conflitos que envolvam a apropriação privada da acumulação econômica na sociedade e a distribuição social da riqueza gerada por essa acumulação (NEDER, 1988, p. 22).
Esta visão de inquietação e de controle social deve ser constante a
respeito de um processo que é por si só contraditório ao caráter discutido e
apresentado ao longo deste texto que é a universalidade das políticas públicas, mas
que se compreende que em determinados casos é impossível garantir a todos o
pleno acesso a uma política pública. As diferenças socioeconômicas de uma
população é que irão fazer com que os inputs de demandas e as decisões políticas
versem a respeito da aplicabilidade de uma política pública distributiva.
A legitimidade política durante o processo da legislação de uma política
pública distributiva é que garantirá o contínuo do caráter democrático, sem que seja
criado ou imposto a patronagem e o clientelismo como formas dominantes desta
política em questão (RONCARATTI, 2008).
Já as políticas redistributivas caracterizam-se por atender a um número
maior de pessoas e sua aplicação pelo Estado representa perdas financeiras
concretas de curto prazo a certos grupos sociais e ganhos futuros incertos para
outros (SOUZA, 2006).
O seu caráter, diferentemente das políticas distributivas, é a
universalização da redistribuição, gerando impactos em categorias diferentes da
sociedade: ricos e pobres, grandes e pequenos (RONCARATTI, 2008).
A contradição existente no centro das políticas públicas redistributivas
reside no fato de que, em determinadas situações, a sua aplicabilidade e constância
podem gerar uma desigualdade de renda a longo prazo coibindo a iniciativa e o
espírito empresarial. Tal fato se explica porque as políticas redistributivas estão
amparadas nas transferências de recursos financeiros a parcelas da população
menos favorecidas, obrigando o Estado a criar mecanismos de recolhimento de
tributos cada vez mais vorazes e eficientes para dar suporte à parcela da população
em estado de carência, no que diz respeito às políticas públicas redistributivas.
Se há um constante aumento do valor e da forma dos recolhimentos,
poder-se-á vislumbrar que, num futuro, os atores sociais que compõem a iniciativa
privada iniciarão movimentos reclamatórios junto ao Estado exigindo a diminuição da
carga tributária à custa de diminuição de sua ação ou até mesmo da saída do país
de determinadas empresas e, com isso empregos e impostos (CYSNE, 2009).
Essa visão é permeada pela postura neoliberal e social democrata nas
agendas políticas, assim como a descentralização, as políticas públicas também são
vistas com pontos de vistas diferenciados e diferenciadores sobre a sua prática e
eficácia.
A agenda neoliberal corrobora o pensamento da não universalidade
dos benefícios oriundos da aplicabilidade de determina política social de cunho
redistributivo, uma vez que concebe as desigualdades sociais como resultantes dos
processos decisórios individuais, cabendo à política social um papel de ajuste de
seus efeitos, ou seja, uma ação regulatória mas não compensatória (TEIXEIRA,
2002).
Já a visão social-democrata concebe que os benefícios sociais
oriundos de políticas públicas redistributivas devem ser concebidos como
instrumentos de proteção aos mais fracos economicamente, pois em detrimento dos
desajustes da supremacia do capital os membros da sociedade não possuirão
condições de acessarem determinados serviços e garantias sociais se não por meio
de políticas públicas que garantam uma relativa distribuição de renda e possibilitem
que direitos sociais possam ser universalizados (TEIXEIRA, 2002).
O campo da política pública redistributiva se constitui como uma
polarização de conflitos e interesses, pois o caráter desta política é o deslocamento
consciente de recursos financeiros a camadas sociais menos favorecidas da
sociedade (RONCARATTI, 2008).
As diferentes posturas indicam que o campo da formulação de políticas
públicas, em especial as de caráter redistributivo, é permeado pela disputa de poder
de diferentes agendas e também perpassa pela intenção e pelo apoio de atores
sociais em especial, fazendo com que a política pública garanta ou não a sua
aplicabilidade.
Não se quer com essas visões demonstrar que as políticas públicas de
caráter redistributivas carregam um objetivo ruim ou que possuem um caráter
pejorativo para o Estado, mas apresentar que existe um lado a ser discutido e muito
bem analisado antes da sua implementação.
E, por fim as políticas públicas regulatórias são expressas por meio de
ordens, proibições, decretos e portarias que têm como efeito, como o próprio
conceito expressa, a regulação de determinada atividade ou serviço, seja ele público
ou privado (FREY, 1999; RONCARATTI, 2008).
Os impactos dessa política pública afeta em menor proporção o campo
de discussão das políticas públicas distributivas e redistributivas, pois a sua atenção
é dada aos custos e benefícios que podem ser gerados para o Estado para melhor
regulação da vida social pública e privada (FREY, 1999).
Se os impactos da política regulatória são vistos como custos e
benefícios, percebe-se que a discussão dessa área política é na vertente econômica
e nas linhas setoriais subseqüentes, e não diretamente na área social ou de
garantias sociais.
Mas assim como nas políticas distributivas e redistributivas, a política
pública regulatória possui também sua arena de conflito tão importante quanto às
outras ou talvez de maior proporção e conta com uma multiplicidade de atores
sociais envolvidos e afetados por tal política.
Essa multiplicidade de atores sociais age de acordo com seus
interesses e organiza-se em torno das relações econômico-financeiras que querem
que sejam regulamentadas ou que está sendo afetada pela aplicabilidade efetiva de
uma política pública de regulação (RONCARATTI, 2008).
A multiplicidade de atores sociais faz ainda com que os inputs de apoio
sejam vistos de diferentes ângulos: ora apoiando as ações do Estado, ora
pressionando para que determinação ação seja posta em prática, configurando um
quadro difuso e complexo para que alianças e acordos políticos possam ser feitos ao
longo prazo.
A configuração específica das políticas regulatórias irá depender dos
processos de conflito, consenso e coalizão que a multiplicidade de atores sociais
assuma em detrimento de determinada agenda política em discussão (FREY, 1999).
Assim, a política pública pode ser compreendida como uma ação
pública executada pelo Estado, mas ação esta que deve nascer da necessidade e
da vontade da sociedade que, organizada, reivindica a sua ação e implementação
normalmente em um dado território ou para um grupo de cidadãos.
Mas cabe ressaltar que na política pública sempre deverá haver a
intervenção da sociedade, seja demandando, dando suporte, apoio ou através do
controle democrático exercido frente à intervenção do Estado (PEREIRA, 2008).
Cabe ainda apresentar que uma política para assumir o papel de
política pública deve objetivar a concretização de direitos sociais inscritos no
conjunto dos direitos assegurados pelo texto da CF-88, os quais foram conquistados
pela sociedade e somente poderão ser aplicados por meio de políticas públicas, que
por vezes assumem o papel de programas, projetos ou serviços segundo
denominações atribuídas pelo Estado (PEREIRA, 2008), cabendo então uma
compreensão a respeito das políticas públicas na visão político-administrativa do
Brasil.
Inicialmente deve-se justificar que a análise de políticas públicas no
Brasil é um campo incipiente, padecendo de fragmentação organizacional e temática
apesar do crescimento das políticas públicas já implementadas (FARIA, 2003).
Visto essa dificuldade, deve-se recorrer a uma importante característica
do processo político brasileiro:
Até o início dos anos 1980, as políticas públicas promovidas pelo Estado brasileiro se caracterizavam, em primeiro lugar, pela centralização decisória e financeira na esfera federal. (...) As políticas públicas eram marcadas, em segundo lugar, pela fragmentação institucional (RONCARATTI, 2008, p. 22).
A centralidade das políticas públicas na esfera federal faz com que se
questione até que ponto essas políticas poderiam de fato ser denominadas de
políticas públicas uma vez que, como profundamente discutido, o caráter de público
é dado pela participação da sociedade na apresentação de suas demandas e na
convergência de agendas em prol da discussão.
Se as decisões são aglutinadas na esfera federal e se possuem um
caráter centralizador, como considerá-las então políticas públicas e, como
considerar também que existe um conceito de autonomia dos atores sociais na
reivindicação dessas demandas?
Esses questionamentos nos fazem perceber que o tema política
pública só consegue ganhar o devido espaço e a correta conceituação quando o
Estado brasileiro passa pelas profundas reformas democráticas trazendo para a
Constituição Federal um conjunto de garantias sociais que antes não eram
imaginadas e que não anteriormente não teriam espaço na agenda governamental
para a sua discussão.
Outro pensamento a respeito da centralidade do processo decisório
das políticas públicas refere-se à necessidade de articulação dos estados e
municípios com a esfera federal em prol da formulação de políticas públicas, mas
estas teriam muito mais o caráter de favoritismos e práticas clientelistas do que
propriamente de políticas públicas:
(...) a centralização financeira instituída pela reforma fiscal de meados dos anos 60 concentrou os principais tributos nas mãos do governo federal e, ainda que tenha ampliado o volume da receita disponível dos municípios, uma vez realizadas as transferências, estas estavam sujeitas a estritos controles do governo federal (ARRETCHE, 1999, p. 113).
Num segundo momento é percebido que a fragmentação institucional
criada pela própria burocracia do Estado fez com que as políticas públicas não
tivessem um papel de universalização, mas sim de práticas distributivas, fazendo
com que a sua ação se desse de maneira restrita e dependente dos recursos
financeiros da esfera federal.
Já a partir dos anos de 1980 o debate a respeito das políticas públicas
e, por conseguinte, o papel do Estrado no Brasil assume novas arenas e atores
sociais e faz com que haja uma grande mobilização nacional voltada para a
democratização dos processos de decisão, da equidade dos resultados das políticas
públicas e de maiores garantias sociais (RONCARATTI, 2008).
Para tanto, a descentralização e a maior participação da sociedade na
formulação e implementação das políticas públicas fez com que houvesse um
profundo questionamento do papel do Estado brasileiro centralizador versus uma
maior autonomia política dos estados e municípios em prol da introdução da
eficiência nas políticas públicas.
No Brasil pós 1988 e com a redação da nova Carta Magna, a
autoridade política de cada nível de governo se faz soberana e independente das
demais. E, diferentemente de outros países, os municípios brasileiros após 1988
foram declarados entes federativos autônomos implicando na autoridade soberana
de prefeitos em sua circunscrição (ARRETCHE, 1999).
Mas tal processo deve ser visto com cautela, pois a autonomia dada a
estados e municípios faz com que se reconfigure a distribuição de recursos de
maneira igualitária entre todos e, faz com que as políticas públicas que antes eram
efetivadas pela esfera federal passem a ser possíveis nas esferas estaduais e
municipais.
As novas agendas políticas passam agora a lidar com as demandas
sociais (novas, recorrentes e reprimidas) que antes não possuíam espaço na arena
de discussão centralizada e com isso uma nova gama de atores sociais surge no
ínterim dessa gênese reivindicando espaços e ações de estados e municípios
(ARRETCHE, 1999).
Essa profusão de atores sociais, demandas e novas responsabilidades
faz com que haja um novo relacionamento e novas formas de articulação do Estado
para com a sociedade civil e com o setor privado:
A descentralização, por sua vez, não significa apenas transferir atribuições de forma a garantir eficiência, mas é vista, sobretudo, como redistribuição de poder, favorecendo a democratização das relações entre Estado e sociedade, bem como do acesso aos serviços (RONCARATTI, 2008, p. 23).
Mas este novo processo de redistribuição de poder é conferido pelos
estados e municípios a partir dos repasses financeiros de recursos para que sejam
colocadas em práticas as novas políticas públicas, pois os agentes públicos (estados
e municípios) somente efetivarão tais políticas com recursos próprios quando
puderem perceber que os benefícios gerados a partir das novas políticas públicas
serão maiores que os recursos financeiros aplicados para a sua efetivação
(ARRETCHE, 1999).
Essa postura de proteção aos cofres públicos estaduais e municipais
evidencia o peso e importância que a descentralização das políticas públicas é ainda
uma nova realidade para as gestões públicas municipais, cabendo a estas a opção
de executá-las.
A participação, vista como elemento integrante da política pública, que
vise à descentralização, se faz valorizada ao colocar em evidência a dimensão local,
isto é, os movimentos sociais, as organizações populares, os conselhos e outros
instrumentos de participação da sociedade cujo objetivo é estabelecer formas
dinâmicas de controle social para as políticas públicas a serem oferecidas à
população.
Para tanto, o próximo capítulo irá tratar como a participação social
integra-se com a nova realidade do Estado brasileiro, seja no tocante à
apresentação de suas demandas, seja como ator social e político na formulação e
implementação de políticas públicas. E, será discutido também como a gestão social
pode contribuir para que novos estágios democráticos possam ser consolidados no
Estado favorecendo a práticas políticas mais justas e efetivas à sociedade.
3 A PARTICIPAÇÃO SOCIAL E A GESTÃO SOCIAL: NOVOS CAMINHOS
DEMOCRÁTICOS PARA A SOCIEDADE CIVIL BRASILEIRA
Os processos participativos vêem contribuindo para que a gestão de
políticas públicas, e mesmo a gestão administrativa do Estado, sejam incorporadas
por novos e inovadores processos a partir de um novo contexto sócio-político
brasileiro, fazendo com que o controle social seja exercido pela sociedade.
Esses novos passos para o aumento da democracia só foram possíveis
mediante a intensa reforma social que ocorreu no seio da sociedade, isto é, a partir
da sua mobilização e articulação os atores sociais e membros da sociedade
perceberam que unidos poderiam reivindicar novas posturas dos agentes políticos
em prol de profundas transformações para a melhora das realidades locais.
Assim, os processos participativos criados pela sociedade civil –
movimentos sociais, organizações, associações comunitárias, é que o presente
capítulo se organiza com o objetivo de compreender como a sociedade civil vem
possibilitando que a democracia seja efetivada; além de pesquisar e demonstrar
como a participação social se incorporou na agenda governamental do Estado
brasileiro, criando novos espaços e dotando a sociedade civil de responsabilidade,
no que tange ao controle social das políticas públicas; e, por fim, como caminho de
desenvolvimento e aprimoramento dos estágios participativos e novos
conhecimentos gerados pela participação social nos diversos espaços da sociedade
civil, apresenta-se o conceito de gestão social e como o mesmo está colaborando
para que novos processos de gestão possam ser incorporados pelo Estado
brasileiro.
3.1 Sociedade civil e sua contribuição para a democracia
A partir das reformas do Estado, percebe-se que não somente a
estrutura política da sociedade se faz preocupada com a manutenção da
democracia, mas a própria sociedade percebe que é necessário que haja uma
organização e mobilização em prol da discussão de como o Estado deve se
reorganizar.
E sociedade inicia um processo de reflexão de como pode contribuir
para que este novo Estado possa estar apto a apresentar novas soluções aos
problemas vivenciados.
Cabe então uma reflexão a respeito de quem são esses atores sociais
que entram em cena durante o processo de reforma do Estado. Que interesses
esses atores possuem para que a democratização seja cada vez mais efetiva e
eficiente no que tange aos serviços públicos, e como esses atores percebem os
espaços políticos e partidários que compõem a esfera do Estado?
São esses os questionamentos que servirão de guia para a
compreensão de como a sociedade civil tem contribuído no alargamento da
democratização do Estado para toda a sociedade.
Inicialmente, é preciso que se estabeleça uma diferenciação entre
sociedade civil e Estado, pois num primeiro momento pode transparecer que toda a
sociedade está envolvida diretamente em contribuir com as reformas do Estado.
Além disso, têm-se o mercado – espaço no qual as relações de
trabalho e renda são organizadas e possuem uma dinâmica própria – e em como a
sociedade também é influenciada e influencia o comportamento deste:
(...) A sociedade civil é a parte da sociedade que está fora do aparelho do Estado. Ou, situada entre a sociedade e o Estado, é o aspecto político da sociedade: a forma pela qual a sociedade se estrutura politicamente para influenciar a ação do Estado. (...) Entre a sociedade, de um lado, e o Estado e o mercado, de outro, temos a sociedade civil. (...) Já a sociedade civil, como entidade intermediária, embora também possa ser subsidiariamente pensada em termos de instituição, está aqui sendo vista como o agente ou ator social concreto ou real (BRESSER-PEREIRA, 1998, p. 6).
A sociedade civil pensada como entidade intermediária poderia ser
vista como um elemento amorfo e sem poder de intervenção diretamente na
condução e no pensamento do Estado, ou seja, se o Estado é formado por atores
políticos eleitos pela sociedade, como esta mesma sociedade é questionadora da
atuação daqueles que ela elegeu? Mas a questão não é tão simples quanto possa
parecer, pois o voto é apenas um dos instrumentos da expressão democrática e a
continuidade na observação e cobrança de ações efetivas do Estado para a
superação dos problemas sociais é uma obrigação da sociedade como um todo,
tendo como norte o status da democracia.
Por um lado pode-se perceber que não é toda a sociedade que busca
a intervenção e o questionamento do papel desempenhado pelos atores políticos
junto à esfera do Estado, mas sim um conjunto de pessoas que, organizadas,
buscam expressar a vontade e o anseio de toda uma sociedade frente ao Estado.
De outro lado este mesmo agrupamento de pessoas pode também
interferir diretamente no mercado, mas de uma maneira diferenciada, pois as
relações econômico-sociais do mercado não são formadas por laços democráticos,
mas sim de interesses financeiros, sendo necessária outra forma de organização e
de intervenção desses atores sociais neste espaço.
Retornando à discussão entre Estado e sociedade, o novo papel que o
Estado assume frente às constantes mudanças após as reformas representa dizer
que maior é seu estágio democrático, ou seja, a partir das reformas e da intervenção
da sociedade, novas formas de comportamento e de ações são conduzidas pelo
Estado, mas isto não representa em si a única fonte de decisões democratizantes,
pois:
(...) os legislativos eleitos já não monopolizam ou hierarquizam a elaboração das leis; os tribunais ou parlamentos nacionais já não são as instâncias supremas na hierarquia jurídica; o vínculo entre a soberania territorial e a político-jurídica dissolveu-se, e a própria soberania desagregou-se, fragmentou-se e tornou-se complexa (COHEN, 2003, p. 421).
Daí surge a necessidade de uma sociedade civil organizada e não
alienada ao aparato político formal do Estado e de seus diversos aparelhamentos,
cabendo assim que as esperanças a respeito de um novo modelo democrático de
Estado e de sociedade surjam a partir de uma sociedade civil capaz de gerar a
solidariedade, de tornar públicas as questões a serem discutidas e repensadas junto
ao campo de ação do Estado, efetivando a democracia (COHEN, 2003).
A não alienação da sociedade civil frente ao Estado é fruto de uma
relação histórica construída a partir dos diferentes processos de diferenciação social
existentes com o próprio Estado, como também de um resultado de processos
internos de transformações nos quais os atores sociais individuais que integram a
sociedade civil estabelecem entre si vínculos de agregação e participação,
construindo alicerces para que a democracia seja efetivada a partir de suas ações e
reivindicações.
Dessa maneira, os movimentos sociais, as associações laicas e
religiosas, fundações, institutos e organizações não-governamentais representam a
construção dos atores sociais que compõem a base da sociedade civil (NEDER,
1998).
Cabe mencionar neste momento que a noção organizacional dada aos
movimentos sociais é de extrema importância para que se compreenda como a
sociedade civil é formada e em como a mesma estabelece as suas ações:
Movimentos sociais são formas de ação coletiva com algum grau de organização. Representam o conflito ou a contradição entre setores da população pela conquista e/ou administração de recursos e bens econômicos, culturais e políticos; também promovem modificações e transformações das relações instituídas de uma sociedade, havendo os que almejam a manutenção das instituições sociais (KAUCHAKJE, 2007, p. 81).
Os movimentos sociais, ao longo da história da sociedade,
representam a vocalização das aspirações, contradições e das manifestações
contrárias à opressão à não democratização do Estado, fazendo com que toda a
sociedade repense os seus caminhos e estabeleça novos espaços de diálogos, de
aprendizagem e de convivência desses atores sociais que se sentem insatisfeitos ou
não aparados pelas relações institucionalizadas do Estado.
É a partir da organização e do aprendizado dos movimentos sociais
que os grupos citados por Neder (1998) surgem no cenário da sociedade, buscando
desta maneira ocupar espaços que antes eram dominados por representantes de
interesses econômicos, grupos políticos e burocratas já estabelecidos no Estado
(GOHN, 2007).
Estes novos atores sociais buscam, com a participação política,
estabelecer novos pactos políticos que redirecionem o modelo político empreendido
pelo Estado, ou seja, com a mobilização, articulação e organização os novos atores
sociais são capazes de criarem novos espaços junto à sociedade e, desta maneira,
criar uma agenda de discussão paralela ao Estado que busque a discussão contínua
dos interesses democráticos para a gestão da coisa pública (GOHN, 2007).
Assim, discute-se a representação da sociedade civil em prol de novas
políticas públicas, ao conceber que a sociedade civil organizada é dotada de maior
conhecimento a respeito de suas necessidades, como também é capaz de oferecer
soluções que visem a contribuir para a superação de problemas já estabelecidos na
agenda política, mas para os quais ainda não foi proposta uma solução.
O Estado está incorporando a sociedade civil organizada a partir dos
novos espaços democráticos como conselhos, audiências públicas, redes jurídicas
(sejam elas locais, ou aquelas que se articulam a outras de caráter regional,
nacional ou por ventura e necessidade internacional), além dos fóruns temáticos ou
de participação popular (GOHN, 2007).
Discute-se que a forma de representação e atuação da sociedade civil
e dos espaços de participação junto à organização e atuação do Estado pode ser
vistos de duas maneiras:
(...) Em um caso, estamos falando de uma representação quase coletiva e, no outro, de uma forma coletiva e não-institucionalizada de ação que gera a representação. Este último não possui as características da igualdade matemática da soberania, tão cara à idéia de representação eleitoral, e não possui o elemento monopolista territorial na medida em que partilha a capacidade de decisão com outras instituições presentes no território. O importante em relação a essa forma de representação é que ela tem sua origem em uma escolha entre atores da sociedade civil, decidida frequentemente no interior de associações civis. (...) A diferença entre a representação por afinidade eleitoral é que a primeira se legitima em uma identidade ou solidariedade parcial exercida anteriormente (AVRITZER, 2007, p. 457-458).
Todos estes novos espaços democráticos visam lidar com soluções na
área de políticas públicas e sociais por representantes da sociedade civil engajados
com a problemática em discussão. Mas podem também coexistir grupos de pessoas
não organizadas, mas que possuem uma íntima ligação com a temática em
discussão, a proposição de novos espaços participativos.
A composição destes espaços participativos é feita pelos atores sociais
que compõe a sociedade civil. Pode-se assim dizer que a sociedade civil nada mais
é do que um instrumento socializador de indivíduos que buscam uma inserção na
esfera política.
Mas tal concepção é refutável ao entender que o laço que une os
diferentes atores sociais em grupos, associações ou movimento sociais é o laço de
solidariedade a ser estabelecido, pois é a solidariedade que movimenta a união das
pessoas e não o interesse por afinidade eleitoral ou política.
Essa concepção refuta a posição de que a sociedade civil poderia ser o
núcleo exclusivo de novos atores políticos ou mesmo de novos partidos políticos,
pois se assim fosse pensada, a sociedade civil seria reduzida a um caráter
extremamente político, invalidando o histórico de lutas, reivindicações e conquistas
dos movimentos sociais.
Portanto é preciso que a sociedade civil deva ser concebida a partir da
conceituação gramsciniana como um palco para o pluralismo de organismos
concebidos como “privados”, ou seja, associações e organizações, sindicatos,
partidos, atividades culturais, meios de comunicação e outros organismos que
buscam se inserir na dinâmica da vida social, criando assim uma esfera na qual as
classes organizadas defendem seus interesses e disputam a hegemonia social
(DURIGUETTO, 2007).
Tal pensamento é ainda confirmado ao conceber a dimensão cultural
dado ao conceito de sociedade civil gramsciniano, no qual as associações,
organizações e as redes que são estabelecidas entre os membros associados se
forjam mediante alianças, identidades coletivas e valores éticos em prol do
estabelecimento de um campo de luta e arena para a contestação social, ou para
afirmar a contra-hegemonia de atores sociais subalternos (COHEN, 2003).
Toda essa arena de lutas e de contestação social faz com que surja
uma dinâmica e uma inovação para a tematização dos problemas sociais
vivenciados pelos membros da sociedade em geral; e como resultado da tensão
existente entre a sociedade civil gramsciniana, o Estado e o mercado, novos valores
e novas identidades coletivas são formadas, além da criação da autonomia cívica
institucionalizada por parte da sociedade civil (COHEN, 2003).
Uma visão menos atrelada à luta e ao embate sócio-político é
apresentada na conceituação dada à sociedade civil na visão de Habermas “(...) os
atores não visam à conquista do poder do Estado ou à organização da produção; em
vez disso, tentam influenciar pela participação em associações e movimentos
democráticos e por meio da mídia pública” (COHEN, 2003, p. 426).
A base para o pensamento de Habermas está na compreensão de que
a sociedade civil está localizada na esfera pública autônoma, os atores sociais não
estão vinculados ou presos na dicotomia entre Estado e mercado, mas sim na
vinculação e propagação de convicções que sejam temas de relevância para o
conjunto da sociedade, contribuindo assim para a interpretação de valores e
produção de bons fundamentos (DURIGUETTO, 2007).
A ação da sociedade civil do ponto de vista habermasiano é suposta
mediante a sua influência nas instituições e organizações da sociedade política e
econômica, determinando que sejam estabelecidos “sensores” no interior do Estado
e do mercado para que tais ações possam de fato serem colocadas em prática. O
conceito de “sensor” refere-se aos espaços públicos institucionalizados no interior do
Estado e do mercado sensíveis à influência dos atores sociais que compõem os
diversos grupos da sociedade civil, podendo ser exemplificado pelos cidadãos no
primeiro caso e por consumidores no segundo caso (COHEN, 2003).
Até este ponto a discussão tem apresentado a sociedade civil como um
conjunto de pessoas dotadas de boas intenções e que a todo o momento
reverenciam a democracia como elemento balizador de suas ações, contudo, é
preciso avançar na conceituação e compreender que existe outro lado da sociedade
civil: o egoísmo:
(...) Destacada do Estado e concebida como campo oposto e não integrado a ele, a sociedade civil converte-se em terra de ninguém, como toda e qualquer sociedade “desestatalizada”, isto é, não estruturada por um pólo que contrabalance as desigualdades e que faça com que valores gerais (justamente os da cidadania política) prevaleçam sobre interesses particulares-egoísticos (NOGUEIRA, 2005, p. 111).
Tal ponto de vista é particularmente importante para a reflexão da ação
dos atores sociais que estão organizados sob o conceito de sociedade civil. Se por
um lado as suas ações tendem a criar uma sociedade mais democrática, por outro
lado, podem buscar a afirmação ou fazer com que se prevaleça seus interesses e
suas aspirações, não contribuindo de fato para o que seria a construção de uma
sociedade mais democrática e cidadã.
Pode-se então argumentar que a sociedade civil é conceituada como
esfera pública não-estatal da cidadania, a qual possui sua base material nos
discursos e consensos a respeito do autêntico interesse público, não prevalecendo
os interesses egoísticos ou hegemônicos, mas criando um processo discursivo e
consensual entre os atores envolvidos, seja o Estado, o mercado e a própria
sociedade civil em prol do reconhecimento, garantia e consolidação dos direitos
sociais, políticos e culturais de uma sociedade democrática (DURIGUETTO, 2007).
Ressalta-se que a organização da sociedade civil frente ao Estado
representa um fenômeno histórico resultante dos processos de diferenciação social,
no qual o processo interno de transformação dos indivíduos em atores sociais
mobilizados em prol da participação de organizações que apresentem tais agendas,
contribuindo para que a sociedade civil seja formada no âmago da democracia
(BRESSER-PEREIRA, 1998).
Dessa forma, os atores sociais que compõem a sociedade civil criam
estratégias e vínculos para que possam ser inseridos nas agendas dos Estados,
motivando a participação no debate público em prol da dissensão e da crítica
pertinente ao processo de construção da opinião coletiva e para a formação da
vontade dos cidadãos, influenciando o processo legislatório e as políticas públicas
(COHEN, 2003).
A sociedade civil, com a sua maneira própria de organização e
funcionamento, permite que a sua autonomia frente às estruturas burocráticas do
Estado sejam mais eficientes, contudo é preciso que se compreenda que os atores
que se organizam e engajam em movimentos sociais possam ser dotados de
criatividade e do senso de questionamento em relação à política em funcionamento.
E, é necessário que esta sociedade civil queira não somente
permanecer como instrumento e canal de reivindicação e de contestação apenas
perante o Estado, mas que queria contribuir, participar da construção de uma nova
sociedade e de um novo modelo de Estado para a sociedade num todo.
Dessa forma, a sociedade civil é o lócus para que a participação social
possa ser preenchida com outros significados contribuindo para a democratização
do Estado e proposição de novo instrumental político-administrativo, fazendo com
que os espaços políticos e partidários possam se tornar mais porosos para com o
ideal cidadão e participativo, sendo esta a discussão a ser empreendida no próximo
tópico.
3.2 Participação social: caminhos para a prática democrática
A participação vista como elemento integrante da política pública que
vise a descentralização se faz valorizada ao colocar em evidência a dimensão local:
os movimentos sociais, as organizações populares, os conselhos e outros
instrumentos de participação da sociedade cujo objetivo é estabelecer formas
dinâmicas de controle social para as políticas públicas a serem oferecidas à
população (ROCHA; SILVA, 2010).
O fortalecimento da sociedade civil na discussão e na própria condução
das políticas públicas faz com que nasça um novo projeto de condução política do
Estado, pois as ações a partir da participação sofrerão um maior controle e haverá
uma desmonopolização no que tange à formulação e à implementação das ações
públicas, desmitificando a idéia de público como sinônimo de estatal (PAULA, 2005).
3.2.1 Redemocratização, Constituição Federal de 1988 e participação social
Os atos propositores de mudança envolvem diversos e diferentes
atores sociais em torno de temas que suscitam a insatisfação ou a necessidade de
que modificações possam ser colocadas à disposição daqueles que reivindicam a
mudança.
A partir da mobilização da sociedade civil em torno de agrupamentos
de atores mobilizados a partir de determinadas causas ou objetivos, o Estado e o
mercado se tornam alvos para que críticas possam ser feitas, mas, acredita-se que
com o diálogo estabelecido entre as partes, novas ações e posturas possam ser
tomadas em prol da superação dos problemas.
No tocante ao Brasil, é preciso que se compreenda que o histórico da
relação entre o Estado e a sociedade civil se torna tênue a partir da década de 1970
e intensifica-se na década de 1980, quando a insatisfação da sociedade para com a
postura intransigente, centralista e burocrática do Estado coloca de lado as
aspirações democráticas da sociedade como um todo.
Mas para que se compreenda de fato esse cenário do surgimento de
novos atores e da reforma do Estado, é preciso destacar o fenômeno que une a
sociedade civil e que ao mesmo tempo torna-se o principal argumento para a
renovação do Estado: a inserção da participação social na agenda oficial.
A reforma do Estado não é apenas uma aspiração dos atores políticos
de esquerda, mas também dos que se posicionam à direita, exigindo que o Estado
burocrático e centralizador possa ser repensado em conjunto com a sociedade e que
novas ações e pensamentos possam ser postos em prática (NEVES, 2007).
Contudo, o Estado centralizador e burocrático alimentava a utopia de
que os processos participativos, ou mesmo a inclusão da sociedade civil na
discussão dos rumos administrativos e políticos da estrutura oficial do Estado
tenderiam a agir como um freio, ou seja, os instrumentos democráticos participativos
como a consulta popular, a negociação e formação de fóruns democráticos
poderiam ser entendidos como empecilhos para o crescimento econômico, pois ao
inserir na agenda do Estado novos e diferentes atores sociais haveria uma
morosidade paulatina e constante para a tomada de decisão, aumentando a demora
no atendimento das necessidades e na implementação dos serviços públicos
(NOGUEIRA, 2005).
De certa forma a posição de distanciamento do Estado para com a
sociedade civil é muito bem alicerçada quando se retoma a discussão dos estágios
burocráticos e da tecnocracia, ou seja, para este corpo burocrático é impensável o
Estado discutir com pessoas sem capacitação a respeito de temas, assuntos ou
políticas e políticas públicas, pois estes assuntos estariam centrados na esfera
estatal.
Esse posicionamento demonstra a pré-disposição contrária à
participação social dos burocratas e mesmo dos políticos centralistas, pois caso o
adotassem procedimentos participativos, poderiam estes atores políticos
corromperem as estruturas de poder do próprio Estado.
Muitas foram as discussões, manifestações e reivindicações da
sociedade civil para que os pensamentos e posições estadistas criadas pela cultura
burocrática do Estado centralizador pudessem ser derrubadas em prol da
redemocratização do Estado:
Esse tema percorre a história do país num contexto de luta pela democracia, conflitos sociais e conquistas, ganhando maior legitimidade, fundamentalmente em âmbito local, com a emergência dos “novos movimentos sociais” que, a partir dos anos 1970 e 1980, se organizaram como espaços de reivindicação e, mais tarde, como ação propositiva, recusando relações subordinadas, de tutela ou de cooptação por parte do Estado, dos partidos ou de outras instituições. Esses novos sujeitos constroem uma vigorosa cultura participativa e autônoma, multiplicando-se por todo o país, influenciando a constituição de uma vasta teia de ações coletivas e de organizações populares e contribuindo para o aprofundamento da democracia (PINTO, 2004, p. 59).
As constantes lutas que se formaram no âmago da sociedade
questionavam não somente a postura centralizadora e ditatorial do Estado brasileiro,
mas reivindicavam melhores condições de acesso às decisões político-
administrativas, e uma postura democrática de um Estado voltado para o
atendimento da sociedade e não das vontades e intenções do corpo de burocratas
estatizados.
Cabe ainda mencionar que se o Estado, nas décadas de 1970 e 1980
não permitia a formalização dos espaços de participação local, é a própria sociedade
civil que os cria a partir dos movimentos sociais16 com o intuito claro de fomentar
espaços de protesto e contestação social. Mas o que é importante destacar nesse
momento histórico do Brasil é a forma como a própria sociedade oprimida pelo
Estado ditatorial se organiza e inicia um processo de intenso questionamento dos
rumos democráticos do país.
Nesse sentido, dá-se destaque à tensão existente no cerne da
sociedade: a fragmentação sociopolítica, a busca da cidadania política e social para
todos os membros da sociedade, e o combate à exclusão social imposta pelas
políticas nacionais centralizadoras e clientelistas (FELICISSIMO, 1994).
A combinação de todos esses fatores motiva as lutas constantes da
sociedade contra a posição do Estado, não cabendo mais a postura passiva frente
às ações, mandos e políticas que não se tornam efetivas e eficientes.
Além da formação e conscientização crítica por parte da sociedade
frente às situações de desigualdade, discriminação a que é colocada, faz com que
haja uma vontade coletiva a partir de objetivos comuns: o combate da situação de
isolamento das ações do Estado e das políticas em vigor (PINTO, 2004).
A sociedade, mediante a sua intenção de participar e contribuir para a
construção de um Estado e mesmo de uma sociedade melhor suscita o direito de
participar da vida político-administrativa do Estado.
Para tanto, é preciso que haja cidadãos pré-dispostos a serem sujeitos
de cidadania ativa, ou seja, cidadãos que como portadores de seus direitos e
deveres, irão criar direitos para a abertura de espaços de participação política no
cenário nacional (LACERDA; SANTIAGO, 2007).
Os sujeitos sociais ativos devem definir as demandas sociais que
consideram como pertencentes ao conjunto de seus direitos para então ir lutar pelo
reconhecimento e aceitação dos mesmos: “Nesse sentido, é uma estratégia dos
não-cidadãos, dos excluídos, uma cidadania ‘desde baixo’”. (DAGNINO, 2004, p.
104)
O reconhecimento das demandas sociais por parte das classes
oprimidas e a sua ação de ir lutar para o atendimento das mesmas, é que promove a
construção da nova cidadania enquanto um processo para a consolidação do sujeito
16
O assunto movimentos sociais será tratado posteriormente neste estudo, pois a sua importância para a redemocratização do Estado, como também para a criação da postura de participação social é de suma importância, carecendo assim um aprofundamento específico.
social ativo e participativo nos espaços públicos e políticos. Tal pensamento é
reforçado ao compreender que o conceito de participação social exige ser inclusivo e
amplo, não se limitando apenas aos caminhos institucionais já traçados.
Para a gestão do Estado democrático de fato o desafio é romper com o
ranço de antigas políticas segmentadas e de pouca eficácia para os problemas que
pretendiam resolver, e empreender a participação ampla e não seletiva de sujeitos
sociais que possam de fato serem instrumentos da construção conjunta da nova
política pública (LACERDA; SANTIAGO, 2007).
A participação social inserida no contexto político-social deve ser
compreendida como a efetiva democratização do poder, pois define a agenda e os
investimentos públicos de maneira partilhada, coletiva, fazendo com que haja a
garantia de que os interesses e as demandas da sociedade sejam atendidos
(PINTO, 2004).
Para este estudo é importante salientar que a participação social,
enquanto instrumento para a viabilização e deliberação das políticas públicas,
deverá ser exercida de maneira conjunta com o Estado, não criando
distanciamentos ou separatismos partidários; a ação da participação da sociedade
nas políticas públicas deve assumir o status de controle social.
Contudo, a sociedade civil não é um conjunto de sujeitos homogêneos
e com as mesmas necessidades, mas refere-se a um quadro amplo e difuso:
diversos e diferentes atores sociais se relacionam, mas não buscam ser absorvidos
por determinadas estruturas partidárias ou estatais (COSTA, 2002).
A sociedade civil frente a toda essa articulação e mobilização, frente ao
o corpo de políticos do Estado consegue uma importante vitória para a
redemocratização do Estado Nacional brasileiro: a promulgação da CF-88:
A Constituição Federal de 1988 foi o marco legal que possibilitou a articulação entre dois elementos básicos que constituíram o processo de redemocratização do Estado brasileiro: a descentralização político-administrativa e o incentivo às práticas locais de participação. Este último, impulsionado por meio da construção de espaços democráticos pautados no fortalecimento da participação dos sujeitos contribui para qualificar a democracia e a cidadania (PINTO, 2004, p. 64).
A participação não pode ser compreendida como fruto da imposição de
uma política ou de uma ação unilateral do Estado, ou seja, visando simplesmente
incluir a sociedade civil nas discussões, projetos e ações políticas apenas como
cumprimento da agenda ascendida pela CF-88, gerando desta maneira o não
comprometimento da sociedade civil.
Mas a participação deve ser vista como um novo instrumento de gestão
para as políticas públicas, um instrumento de liberdade voltado para a construção de
uma nação cidadã, possibilitando o comprometimento daqueles que participam na
construção de uma realidade mais justa, democrática e cidadã (MIELKE, 2010).
A partir da década de 1990, a cidadania passa a ser incorporada na
agenda oficial e tende para a proximidade com o conceito de participação social,
visto que, o cidadão ao se comportar de maneira cívica, imbuído de
responsabilidade social para com os outros e para com toda a sociedade, não
buscará exercer somente seus direitos, mas compreenderá quais são seus deveres
para a construção de uma sociedade mais cidadã e, ao mesmo tempo buscar o
aprimoramento da participação social como um pilar da democracia (GOHN, 2007).
A participação social e a cidadania expressam a conquista dos
movimentos sociais no período de redemocratização do Estado e mesmo da
sociedade, ao fazer que suas necessidades, suas demandas específicas, o respeito
às identidades locais, as diferenças fossem reconhecidas pelas políticas do Estado
brasileiro (GOHN, 2007). .
Ainda sim, a introdução da participação social na agenda do Estado
pós redemocratização fez com que os atores sociais e mesmo a sociedade como um
todo fossem reconhecidos como cidadãos pertencentes às comunidades com
características únicas e peculiaridades que necessitam ser compreendidas pelo
Estado brasileiro, fazendo com que o discurso oficial se amplie no atendimento
dessas novas demandas sociais (GOHN, 2007).
Outro ponto que carece destaque é que a partir da CF-88, a sociedade
civil empreendeu uma luta contra a ditadura militar em prol da ressurreição da
democracia e do nascimento da democracia participativa para a vida político-
administrativa do Estado brasileiro.
Com a promulgação da CF-88, importantes elementos inovadores
foram incluídos na gestão do Estado como as iniciativas populares, a participação
das comunidades em prol da formulação dos planos diretores das cidades, além de
outros inúmeros exemplos de participação social inseridos (NOGUEIRA, 2005).
Mas, a participação social como pressuposto básico da CF-88 é
reafirmada quando se percebe a introdução de um novo mecanismo administrativo
para o Estado-Nação: a descentralização participativa. A gestão administrativa do
Estado brasileiro, que antes era conduzida pelos burocratas, tecnocratas e outros
atores políticos encravados no âmago da burocracia passa a receber informações e
apoio da sociedade civil a partir dos fóruns participativos, fazendo com que as
políticas públicas de seguridade social como saúde, educação e assistência social
fossem co-geridas pelo Estado e sociedade civil, tendo como lócus a participação
das comunidades para a contribuição de melhores serviços públicos17 (NOGUEIRA,
2005).
Outro ponto de destaque na discussão de participação social e CF-88,
se refere a uma resignificação das decisões políticas, ou seja:
(...) faz sentido supor que instituições de âmbito local, dotadas de efetivo poder, possam representar um incentivo à participação política, dado que podem possibilitar formas mais efetivas de controle sobre a agenda e sobre as ações de governo. No entanto, não é suficiente que se reforme apenas a escala ou âmbito da esfera responsável pela decisão a ser tomada. É necessário que se construam instituições cuja natureza e cujas formas específicas de funcionamento sejam compatíveis com os princípios democráticos que norteiam os resultados que se espera produzir (ARRETCHE, 1996, p. 48).
Assim, não basta ter no texto da CF-88 as condições favoráveis à
inclusão da participação social no cotidiano da gestão político-administrativa do
Estado, mas sim construir espaços democráticos e cidadãos para que a sociedade
civil e seus atores sociais possam de fato contribuir para a construção de novas e
melhores políticas públicas sociais e setoriais.
3.2.2 Maior voluntariedade da sociedade em participar
A participação social, conforme está sendo discutida neste estudo,
refere-se à condição de ação do ator social em querer modificar sua realidade,
17
Para melhor ilustração desse importante avanço social destaca-se o texto da Carta Magna de 1988: Art. 194. A seguridade social compreende um conjunto integrado de ações de iniciativa dos Poderes Públicos e da sociedade, destinadas a assegurar os direitos relativos à saúde, à previdência e à assistência social. VII - caráter democrático e descentralizado da administração, mediante gestão quadripartite, com participação dos trabalhadores, dos empregadores, dos aposentados e do Governo nos órgãos colegiados (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 20, de 1998).
conquistar um espaço mais justo e solidário junto à sociedade e ter acesso melhor
aos serviços públicos prestados pelo Estado.
Mas de certa maneira a participação social dos atores da sociedade
civil representa a idéia de autoformação, isto é, os atores da sociedade que se
sentem motivados a participar estão se constituindo enquanto cidadãos
democráticos, os quais buscam repensar suas origens, as suas identidades e seus
destinos (GUIMARÃES, 2009).
A autoformação pressupõe que o ator social não busca num
determinado momento histórico a sua inserção no conjunto de transformações da
sua realidade, mas sim se refere em pensar em um processo de mobilização do
povo brasileiro para o alcance de suas demandas e de suas aspirações
(GUIMARÃES, 2009).
Quando refletida desta maneira, a participação social da sociedade
brasileira, ao longo das décadas de 1970 e 1980, representa todo o contexto de
lutas e disputas contra o autoritarismo do Estado no contexto da ditadura até a
conquista da participação social, no final da década de 1980, e toda essa
mobilização tem seu marco a partir dos movimentos sociais:
Os movimentos sociais emergem das contradições fundamentais da sociedade em seus aspectos econômicos, políticos e culturais. Emergem também de demandas conjunturais decorrentes de carências econômico-culturais. Entretanto, contradições e carências não bastam para explicar o surgimento e manifestação dos movimentos, é necessário levar em conta elementos como: práticas organizativas e participativas de grupos sociais específicos com potencialidade para compor o campo movimentalista; suas interpretações e representações sociais sobre a experiência social e sobre as forças sociais que dizem representar e contra as quais se antagonizam. Além disso, é fato preponderante a posição de agentes externos (como apoios ou ambiente cultural ou politicamente repressivo) (KAUCHAKJE, 2007, p. 81).
Pode-se pensar que os movimentos sociais tendem a possuir um
caráter de reivindicação e de luta constante contra todas as posturas contrárias
àquelas reivindicadas. Contudo, a reflexão deve possuir o seguinte olhar: os
movimentos sociais são inicialmente espaços de diálogo e apresentação de
insatisfações da sociedade, que se organizam a partir de um determinado tema,
objetivo ou realidade que os une (GOHN, 2003).
O espaço dos movimentos sociais representa, para aqueles que
participam, a construção do sentimento de pertencimento social: os sujeitos de uma
realidade local que se sentiam excluídos e não conseguiam se congregar em grupos
sociais de pouca relevância encontram junto aos movimentos sociais o espaço
concreto para expressar por meio do discurso, do diálogo e da prática as suas
carências e dificuldades vivenciadas, e que em conjunto com outros indivíduos
podem construir a possibilidade do alcance da superação desses problemas,
sentindo-se dessa forma incluídos em um grupo ativo (GOHN, 2003).
Por isso, tem-se que os movimentos sociais urbanos no Brasil durante
a década de 1980 tinham um caráter reivindicativo no que se refere ao controle
social sobre o Estado para que houvesse melhorias das condições sociais (saúde,
educação, assistência social). Já a partir da década de 1990, com a promulgação da
Constituição Federal de 1988, há um deslocamento no eixo das reivindicações,
deixando de ser um confronto contra o Estado para se tornar uma participação
negociada (NEVES, 2007).
O interesse dessa participação negociada por parte dos movimentos
sociais refere-se a duas questões: a primeira é a busca por novos direitos para a
construção de uma cidadania ativa, e a segunda questão se refere ao
estabelecimento de uma agenda participativa das classes populares na gestão das
cidades, construindo uma cultura democrática-participativa (NEVES, 2007).
Para uma melhor compreensão a respeito da cidadania ativa, deve-se
entender o caráter pedagógico dos movimentos sociais, que propicia aos sujeitos
sociais o aprendizado para a participação cidadã; refere-se ainda à constituição de
sujeitos dotados de criatividade para o enfrentamento da realidade social na qual
estão inseridos (KAUCHAKE, 2007).
A presente discussão remete à percepção de que cidadania deve ser
compreendia à luz da ação política deliberativa: o sujeito social deve empreender a
sua participação em instâncias diferentes da sociedade para garantir o seu papel
como cidadão detentor de direitos, mas que luta em prol dos mesmos, não se
tornando um sujeito social passivo das políticas públicas (TENÓRIO, 1998).
Os sujeitos sociais quando alijados do processo econômico e social, do
direito à propriedade, encontram na participação de movimentos sociais o
conhecimento e o saber antes negado de maneira formal e, que este processo de
aprendizagem o faz sujeito de sua vida e protagonista de mudanças sociais
(MARTINTS, 2009).
A cidadania requer por parte da sociedade a constituição de sujeitos
sociais ativos, ou seja, aqueles que possuem a definição clara das suas
necessidades e aspirações e empreendendo movimentos e lutas em prol do
reconhecimento destas. De certa forma, refere-se à cidadania como um processo de
baixo para cima onde os não-cidadãos, os excluídos é que deverão traçar
estratégias em conjunto para a conquista de suas necessidades (DAGNINO, 2004).
Neste tocante, remete-se ao que prevalece no campo das práticas
políticas a tese da imaturidade e da desqualificação das camadas populares para a
participação social e para a cidadania, percepção esta que é superada quando o
indivíduo é dotado de consciência, liberdade e responsabilidade, e estabelece-se a
capacidade de agir frente à sua realidade social, a vontade de participar, de lutar em
prol da sua cidadania (ARROYO, 1991).
A participação social vem como resposta a estes anseios sociais: os
novos sujeitos sociais que emergiram com os movimentos sociais serão os
condutores de novos pactos políticos que possam redirecionar o modelo político
vigente e, por não dizer em novas diretrizes para que a cidadania possa ser
compreendida como o acesso pleno aos direitos constitucionalizados (GOHN, 2007).
A participação social e a conquista da cidadania deliberativa para um
Brasil democrático são fatores que fortalecem o caminhar dos movimentos sociais e,
por não dizer para os dias atuais, também para as organizações não
governamentais e suas ações.
O conceito de cidadania participativa possui como lastro a amplitude da
cidadania, não se restringindo apenas ao direito do voto, mas sim no que se refere
ao direito à vida do homem como um todo, ou seja, a cultura cidadã, fundada em
valores éticos universais e impessoais (GOHN, 2004).
E, mediante a concepção democrática radical, a participação cidadã
tem por objetivo o fortalecimento da sociedade civil no que tange à construção de
novos caminhos para uma nova realidade social, realidade esta que corrobore para
que a desigualdade e as exclusões de qualquer natureza possam ser combatidas
mediante o entendimento da igualdade e da diversidade cultural que cada homem
possui em sua comunidade ou seu local (GOHN, 2004).
Destaca-se então que a participação cidadã é concebida além da
fronteira do relacionamento homem-sociedade-Estado, mas trata-se de um projeto
emancipatório e civilizador alicerçando a construção de uma sociedade democrática
e sem injustiças sociais (GOHN, 2004).
Quando se percebe que os movimentos sociais e seu caráter dialógico
servem enquanto campo para o desenvolvimento de novos atores sociais ao redor
de temas que tendem para a exclusão social, ao não atendimento de necessidades
sociais, percebe-se em essência que a condição cidadã desses atores está sendo
furtada por um Estado que tende a não compreender a situação social a qual esses
atores estão imersos, mas, é necessário que se perceba que o Estado antes da
década de 1970 possuía um forte caráter, como tem sido destacado ao longo deste
estudo, centralizador apoiado em decisões burocráticas.
Mas quando este ator social percebe a sua autonomia, a sua
capacidade transformadora em sua comunidade, organizando-se em agrupamentos
ou movimentos sociais, pode então lutar para a conquista de um espaço
reivindicativo junto ao Estado e fazendo com que os direitos ligados à condição
cidadã sejam efetivados, além de construir uma identidade para a participação
cidadã nos espaços democráticos junto com o Estado e a sociedade em geral.
O segundo questionamento apresentado por Neves (2007) no que
tange à participação negociada pelos movimentos sociais é a inserção dos atores
sociais nos espaços públicos para a discussão da gestão das cidades, no sentido de
como repensar a comunidade, as necessidades sociais, e em como o Estado em
conjunto com a sociedade civil podem descobrir novas e inovadoras estratégias para
o alcance dos problemas vivenciados pelos atores sociais em suas comunidades.
A resposta para este questionamento surge ao se fazer uma leitura
mais minuciosa a respeito da tendência atual da participação social entendida como
“(...) expressão de práticas sociais democráticas interessadas em superar os
gargalos da burocracia pública e em alcançar soluções positivas para os diferentes
problemas comunitários” (NOGUEIRA, 2005, p. 121).
Não se pode compreender em pleno século XXI que a participação
social ainda seja entendida e vista como simplesmente o veículo de pressão popular
contra o Estado, pois se assim fosse estar-se-ia estagnando o conceito às práticas
das décadas de 1970 e 1980 e desconsiderando todos os avanços políticos e
participativos que foram conseguidos a partir da CF-88.
Além de que, a sociedade civil igualmente poderia ser concebida como
um conceito inerte frente a todas as modificações sociais, político e econômicas que
a cada período histórico se inscrevem na vida cotidiana dos diferentes atores
sociais, sejam de uma comunidade, cidade ou país.
Para tanto, a resposta do questionamento de Neves (2007) pode
receber outro tratamento além do que o apresentado por Nogueira (2005), que é o
conceito de governabilidade participativa, o qual é entendido a partir do
relacionamento mais efetivo que é estabelecido entre o Estado e os cidadãos,
relação esta baseada na cidadania ativa dos membros da sociedade civil que
buscam participar e contribuir nesse novo desenho de gestão pública, como pela
democracia integral intrínseca aos meandros da administração pública do Estado
(WANDERLEY; RAICHELIS, 2009).
Desta maneira, está se discutindo a gestão participativa entre
sociedade civil e Estado, ambos abertos à dinâmica social, mas cabendo ao Estado
neste momento uma posição imersa em procedimentos e ações democráticas e com
maior grau de competência no que tange ao aparelhamento em auxiliar as
comunidades a construírem procedimentos próprios para que se autogovernem,
corroborando para um fortalecimento da sociedade civil e seus movimentos sociais
inerentes a cada realidade (NOGUEIRA, 2005).
A organização e a mobilização social em prol da construção de uma
sociedade civil mais forte aliada à participação cidadã serve enquanto instrumento
para que o conceito de comunidade seja atribuído ao conjunto de atores sociais
ativos, ou seja, aqueles que buscam se inserir nas discussões locais em prol da
melhora dos programas sociais, serviços públicos e prol do atendimento das
necessidades sociais que possam traçar um caminho de baixo para cima:
A participação passa a ser concebida como uma intervenção social periódica e planejada, ao longo de todo circuito de formulação e implementação de uma política pública. Para que venha a ocorrer a Participação Cidadã, os sujeitos de uma localidade/comunidade precisam estar organizados/mobilizados de uma forma que ideários múltiplos fragmentados possam ser articulados (GOHN, 2004, p. 19).
O resultado dessa ação conjunta entre Estado e sociedade civil por
meio da participação nas políticas públicas amplia sua representação enquanto
sujeito que demanda, fiscaliza e controla as ações do Estado onde, mediante a
participação nas políticas públicas, a sociedade civil busca em conjunto com o
Estado a melhora da qualidade de vida. (AVRITZER, 2009).
Contudo, é preciso que se destaque que os diferentes caminhos
tomados pelos movimentos sociais no Brasil democrático pós-Constituição de 1988
sinalizou que a democracia não é um status puro e acabado, exige-se dos cidadãos
o contínuo status de altera e acompanhamento da ação do Estado e, ao mesmo
tempo exige por parte da sociedade a formação de novos movimentos sociais.
A partir dessa ideia, é possível dizer que a partir da década de 1990,
novas e diferentes formas de movimentos sociais se iniciam no Brasil, deixando para
trás o caráter de luta em prol da democracia, da abertura do Estado para com a
sociedade civil. E, frente às medidas e políticas neoliberais incorporadas ao
procedimento político-administrativo do Estado, os novos movimentos sociais
tendem para uma organização em prol de temas como as reformas estatais, ações
de cunho cidadão contra a fome, o desemprego, a reivindicação por melhores
condições para aposentados e pensionistas do sistema previdenciário, atos em prol
da paz, contra a violência urbana (GOHN, 2004).
E, ainda podem ser citados os movimentos sociais que emanam de
outras demandas da sociedade, não mais aquelas ligadas às necessidades sociais,
mas sim ligadas à melhora da vida urbana e cultural das comunidades: os
movimentos de gênero (feminismo e de homossexuais), os étnicos (negros e povos
indígenas), de faixa etária (crianças e adolescentes), ambientalistas, os ligados à
deficiência e mobilidade e, por fim aos movimentos sociais ligados à diversidade
cultural (KAUCHAKJE, 2007).
Esses novos movimentos sociais emergem a partir de um cenário
construído a duras penas pelos antigos movimentos sociais e pela disputa legítima
de espaço dialógico com o Estado, além de criar na sociedade civil uma disposição
dos cidadãos para exercer o direito de participar, de fazer parte das discussões de
interesse social e a criação de uma conscientização crítica a partir do contínuo
questionamento e da negação das situações que envolvem a discriminação e a
desigualdade social, resultando na intervenção coletiva social em prol de objetivos
comuns, pois: “A consciência crítica e analítica da realidade facilita a compreensão
da importância da força social quando é articulada em torno de objetivos pré-
definidos” (PINTO, 2004, p. 61).
Outra posição deve ser considerada ao se pensar em como os novos
movimentos sociais se posicionam junto ao Estado democrático e participativo já
que nem toda participação social representa por imediato uma intervenção política,
mas isto não representa o pensamento de que a participação social não seja
orientada por algum tipo de relação de poder. Aqueles atores sociais que se inserem
no campo da participação social almejam afirmar-se perante outros, sobrepujar
alguém, buscar a resolução de algum problema utilizando-se de recursos sejam eles
políticos, técnicos, financeiros ou intelectuais próprios ou disponíveis em espaços
comunitários (NOGUEIRA, 2005).
O contato da população em espaços decisórios antes reservados
somente às autoridades representa um entrave na divisão do poder, representando
em como a participação social sofre dificuldades para sua realização nesses
espaços de poder. Para tanto, os atores sociais que buscam se inserir mediante a
participação social nos espaços antes restritos necessitam de novos padrões de
relacionamento para com o poder governamental, fazendo com que todos
compreendam seus papeis, seus significados e, que o poder antes reservado a
poucos seja compartilhado, construindo junto (ROCHA; SANTOS, 2010).
Essa colocação é importante para que se ponderem as formas de
participação social, políticas públicas e papel do Estado frente à nova sociedade
pós-Constituinte de 1988. Creditar somente à livre iniciativa da sociedade em
participar da vida política é algo que necessita de um processo educacional.
Assim, a realidade socioeconômica, política e cultural da população, para quem o poder é transferido, determina diferentes posições sociais e distâncias desse poder. Por isso, a descentralização não garante automaticamente a participação, podendo, em algumas circunstâncias, reiterar as diferenças (JUNQUEIRA, 1997, p. 35).
A descentralização e a nova configuração do Estado a partir das
medidas da reforma democrática de 1988 podem ser vistas, como se está
debatendo, enquanto um grande avanço para a inserção da sociedade civil nos
diferentes níveis de governança do Estado, participando não somente para a
melhora das comunidades, mas criando novos parâmetros para que a cidadania
possa ser exercida de fato e de direito por todos. Mas ao mesmo tempo a simples
indicação da participação no texto da CF-88 não representa que todos os atores
sociais da sociedade civil terão condições para dialogarem, compreenderem e
tomarem as decisões corretas, seja na implementação de políticas públicas, seja na
distribuição de recursos financeiros para a melhora de serviços públicos.
Os movimentos sociais, a partir da reflexão conceitual, demonstram
que os espaços nos quais os atores sociais se congregam e organizam funcionam
num primeiro momento enquanto um local de aprendizagem: como dialogar, como
ouvir o outro, como estabelecer o convívio com o outro, para que então possam
conseguir se inserir da discussão e na vivência dos espaços tecnocráticos e/ou
burocráticos do Estado, garantidos pela CF-88.
O que é interessante de constatar é que os movimentos sociais têm o
caráter pedagógico fazendo com que os atores sociais a partir de suas realidades,
conhecimentos e vivências em como podem transformar a sua realidade a partir da
constituição de sujeitos criativos e imbuídos do espírito da participação cidadã
(KAUCHAKJE, 2007).
Pode-se notar então que a discussão e a aprendizagem gerada pelos
movimentos sociais representa o empoderamento aos atores sociais, ou seja,
segundo uma agenda emancipatória os movimentos sociais servem enquanto uma
janela para que os atores sociais participativos e cidadãos possam visualizar melhor
a realidade social na qual estão inseridos, realizando diagnósticos e propondo
propostas de melhora e de superação das dificuldades (GOHN, 2004). E, o
empoderamento ainda pode ser visto como:
Construir cidadãos éticos, ativos, participantes, com responsabilidade diante do outro e preocupados com o universal e não com particularismos é retornar as utopias e priorizar a mobilização e a participação da comunidade educativa na construção de novas agendas (GOHN, 2007, p. 53).
Nesse sentido o empoderamento dos atores locais e a aprendizagem
conseguida com a prática nos movimentos sociais, faz com que os antigos espaços
de poder do Estado sejam questionados não por atores sem a necessária condição
para intervirem de maneira positiva na realidade local, ao contrário disso, os atores
locais quando dotados do empoderamento se tornam agentes de mudança não
somente para a realidade local, como também para a própria estrutura burocrática
do Estado que necessita aprender ainda com a comunidade em como criar novas e
melhores políticas públicas locais.
É nesse sentido que a realidade político-administrativa do Estado
brasileiro vem sendo modificada e modernizada, vencendo antigos obstáculos para
a inserção da participação dos atores da sociedade civil mobilizada e articulada,
fazendo com que novos espaços e agendas possam ser definidos em prol do
desenvolvimento comunitário/local, e que novos desenhos como os fóruns,
conselhos e orçamentos participativos possam ser capazes de serem desenhados e
colocados em prática, aumentando o controle social por parte da sociedade para
com o Estado e fazendo com que a cidadania, a democracia e mesmo a participação
social sejam os novos pilares do Brasil pós-Constituição de 1988.
3.2.3 Resultados concretos do processo de participação social no Brasil democrático
A participação como novo elemento no campo da gestão pública
corresponde além de uma mudança teórico-ideológica, mas também às exigências
da globalização capitalista ao Estado e ao mesmo tempo pela sociedade:
A gestão pública também está pressionada pela sociedade, não só naquilo que tem prolongamento do passado – não só pelos problemas relacionados à pobreza, às injustiças, às carências –, mas também naquilo que contém demandas provenientes das novas estruturas sociais que se estão constituindo nos últimos anos, fruto do aprofundamento do processo de democratização, das mudanças culturais, da reestruturação produtiva, das novas políticas econômicas e financeiras, da diferenciação funcional e social (NOGUEIRA, 2005, p. 124).
Essas reivindicações da sociedade passam pela demanda de políticas
públicas eficientes, pela demanda em participar e contribuir no novo desenho da
pública, todo esse contexto é denominado como governabilidade participativa.
O princípio democrático, neste novo desenho de gestão pública, é
ressaltado por Bresser-Pereira (2005) ao dizer que o princípio da autonomia dos
gestores públicos vincula-se às responsabilidades sociais, à demonstração de
resultados e da excelência dos serviços prestados à sociedade.
Considerando o conjunto conceitual apresentado da participação social
e dos movimentos sociais e pensando a sua implicação para a gestão de novas
políticas públicas e para o alicerçamento do princípio democrático, destaca-se que
os conselhos de política e os orçamentos participativos representam o conjunto de
instituições participativas concretas para o processo da inovação da participação
social no contexto do Brasil democrático (AVRITZER, 2009).
Os conselhos como espaços democráticos e aparelhamento inovador
para o contexto político-administrativo do Estado para com a sociedade civil podem
ser entendidos como possibilidade da reordenação das políticas públicas brasileiras
a serem implementados em prol do direcionamento de novas formas de governança
democráticas:
De fato, os conselhos gestores foram a grande novidade nas políticas públicas ao longo dos anos. Com caráter interinstitucional, eles têm o papel de instrumento mediador na relação sociedade/Estado e estão inscritos na Constituição Federal de 1988, e em outras leis de país, na qualidade de instrumentos de expressão, representação e participação da população (GOHN, 2007, p. 83).
Frente a este pensamento, pode-se citar que foram criados e
instalados diversos conselhos nos diferentes municípios brasileiros ao longo dos
anos a partir de 1988, tais como conselhos setoriais nas áreas de: saúde, educação,
cultura, assistência social, meio ambiente. Como conselhos de segmento podem ser
citados os do idoso, da mulher e da criança e adolescente; e como conselhos
temáticos podem ser exemplificados os da moradia e o de direitos humanos (PINTO,
2004).
Os conselhos gestores, não representam somente o caráter
participativo para a gestão das políticas públicas, mas representam o espaço
democrático e conquistado pela sociedade para propor inovações no campo da
gestão político-administrativa do Estado.
Isto significa afirmar que os conselhos são em essência instituições
híbridas, ou seja, contam com a participação de atores do executivo e de atores da
sociedade civil relacionados com o setor temático com o qual o conselho atua. O
formato institucional dado aos conselhos é definido por instrumentos legais próprios
de cada municipalidade brasileira, seguindo as diretrizes estabelecidas pela CF-88,
adotando como critério norteador a paridade representativa, ou seja, nos:
(...) conselhos de saúde, os usuários ocuparam metade da representação; no caso da assistência social e dos conselhos da criança e do adolescente, entidades da sociedade civil ocupam metade das vagas no conselho (AVRITZER, 2009, p. 34).
Nesta perspectiva cabe à sociedade civil e ao poder público local
discutirem fervorosamente quem serão os representantes, tanto da sociedade civil
dentre o conjunto de representações temáticas envolvidas com o conselho gestor a
ser definido, quando por parte do próprio poder público local.
Esta consideração é deveras importante para que os membros dos
conselhos gestores a serem formados não estejam apenas representados por
pessoas indicadas pelo poder público, contribuindo para que o papel do conselho se
restrinja à plena aceitação das diretrizes e das ações a serem legitimadas pelo
poder público local, como também necessita que os membros indicados pelo poder
público possam contribuir com dados e informações necessárias e relevantes para
que os atores da sociedade civil organizada, representados nas cadeiras do
conselho, possam inferir em argumentações propositivas para a superação real dos
problemas enfrentados pelos usuários dos serviços públicos (PINTO, 2004).
Nesse bojo argumentativo, deve-se destacar que os conselhos
gestores podem assumir duas posições bem diferenciadas quanto à sua atuação: a
serem órgãos consultivos ou deliberativos.
É importante diferenciar o papel do conselho consultivo e do conselho deliberativo em termos políticos e administrativos, quanto à sua relação com a diretoria da instituição. O conselho consultivo é um espaço de maior representação da sociedade, sem qualquer poder hierárquico sobre a diretoria. É uma instância de escuta da sociedade, ou seja, seu caráter político se dá pela participação, e não tem qualquer responsabilidade administrativa. Ao conselho deliberativo, usualmente, compete deliberar sobre a política geral de administração da entidade, seus planos de benefícios, orçamento anual, e suas alterações e planos de aplicação do patrimônio. Também é comum o colegiado validar decisões de diretoria (PIRES, 2011, p. 64).
O entendimento dessas duas posições que os conselhos gestores
tomam frente à dinâmica da participação social inserida na relação
sociedade/Estado marca o papel de como os atores sociais podem contribuir para o
alargamento do cânone democrático brasileiro, mas que é preciso que o poder
público compreenda qual de fato é o papel a ser desempenhado pelo conselho
gestor a ser estabelecido.
Pode-se notar uma preferência do poder público, o qual possui
dificuldade na compreensão do papel da participação social na gestão de políticas
públicas, em atribuir aos conselhos gestores apenas o status de consultivo,
referendado o conhecimento, a participação dos atores sociais e a sinergia com os
representantes do poder público nomeados. Contudo, como é destacado por Pires
(2011), não há qualquer responsabilidade na condução da vida político-
administrativa do poder público, ou seja, no que tange à condução das políticas
públicas setoriais e em como as mesmas podem ser redimensionadas para o
atendimento das comunidades fica a cargo da voluntariedade política do poder
público em acatar ou não os pareceres do conselho consultivo.
No outro lado dessa moeda participativa, que são os conselhos,
encontram-se os de caráter deliberativo, os quais de fato podem e devem intervir
diretamente na condução político-administrativa do Estado no que tange à
modificação, implementação e/ou inovação nos serviços públicos prestados. Além
de serem órgãos fiscalizadores e de controle da ação do Estado, pois serão estes
conselhos que irão aprovar a prestação de contas de determinados gastos públicos.
Tal posicionamento é referendado ao se fazer a leitura do pensamento
de Gohn (2007, p. 88-89) no que se refere à constituição, responsabilidade e
funcionamento dos conselhos gestores:
(...) A lei vinculou-os ao poder Executivo do município, como órgãos auxiliares da gestão publica. É preciso, portanto, que se reafirme em todas as instâncias seu caráter essencialmente deliberativo, por a opinião apenas não basta. Nos municípios sem tradição organizativo-associativa, os conselhos têm sido apenas uma realidade jurídico-formal, e muitas vezes um instrumento a mais nas mãos dos prefeitos e das elites, falando em nome da comunidade, como seus representantes oficiais, não atendendo minimamente aos objetivos de se tornarem mecanismos de controle e fiscalização dos negócios públicos.
A postura dos conselhos e seu poder de ação dependem
essencialmente da vontade política dos atores políticos do poder público local, mas
ao mesmo tempo deve sofrer pressão dos atores locais para que a condição de
consultivo se torne deliberativo, para que de fato o conselho possa ser um órgão de
controle social.
O que é interessante constatar da relação estabelecida entre os
conselhos gestores deliberativos e o poder público local é a formação da gestão
compartilhada, não cabendo ao poder executivo transferir para a sociedade civil
organizada – conselhos gestores – o poder político de responsabilidade das ações a
serem realizadas, implementadas ou modificadas, pois se o assim fizesse estaria
contrariando ao dispositivo legal constitucional que atribui a responsabilidade pública
e fiscal aos gestores públicos, cabendo à sociedade civil organizada e aos
conselhos o papel de agentes públicos fiscalizadores (GOHN, 2007).
A democracia e a participação social devem ser vistas como elementos
principais para que a gestão pública promova a construção de novas políticas
públicas as quais se vinculam com a descentralização, promovendo uma
aproximação das instâncias de poder à dimensão local.
Para tal realização pode-se citar outro resultado concreto do processo
de participação social no Brasil democrático: o orçamento participativo e sua
contribuição para o aumento do controle social sobre o poder público local.
O orçamento é o instrumento básico do contrato político que subjaz a
essas relações, bem como das interações entre os diferentes organismos estatais
encarregados de executar tal contrato. Contudo, em uma sociedade comandada por
uma forte tradição autoritária e patrimonialista, como é o caso do Brasil, o orçamento
público tem sido menos a expressão do contrato político do que a expressão da sua
ausência.
O orçamento participativo é uma forma de administração pública que
rompe com a tradição política centralizadora recorrendo à participação direta da
população em diferentes fases da preparação e da implementação orçamentária,
com uma preocupação especial pela definição de prioridades para a distribuição dos
recursos de investimento (SANTOS, 2002).
E, o orçamento participativo pode ser também concebido em prol da
manifestação emergente de um espaço público institucionalizado, no qual os
cidadãos e o poder público convergem em autonomia mútua, configurando-se como
um modelo de co-gestão entre o poder político e a sociedade civil, construindo um
instrumento político-administrativo para a realidade local que sirva para que
mudanças estruturais possam ser feitas a partir das demandas e necessidades
locais (PINTO, 2004).
Esse modelo de co-gestão mediante a prática do orçamento
participativo faz com que haja mudança da postura dos líderes comunitários e do
poder público: num primeiro momento pode-se citar que essa postura se referencia
na busca da superação da política centralizada e paternalista nas quais muitos
municípios brasileiros ainda estão incluídos; e num segundo momento a criação de
uma nova dinâmica de relacionamento entre os atores sociais e os atores políticos
para a participação institucionalizada seja incluída na agenda de discussões,
propiciando dessa maneira o alargamento da democracia e concretização da
participação da sociedade local em prol da resolução dos problemas.
Mas o modelo de co-gestão pode representar no nível comunitário
duas facetas diferentes para as lideranças comunitárias: o despertar de um espírito
comunitário e imbuído da vontade em participar, lutar e mobilizar outros atores
sociais em prol das mudanças necessárias e requeridas pela comunidade; como
também pode suscitar nas lideranças comunitária o perigo do clientelismo e
carreirismo (SANTOS, 2002).
Os líderes comunitários quando de fato representam a sua comunidade
nas assembléias, reuniões e outros encontros referentes ao orçamento participativo
de uma dada municipalidade devem sempre buscar a resolução do problema
comunitário e da apresentação de soluções inovadoras, mas que sejam de âmbito
comunitário. Isto significa dizer que o líder é o representante máximo dos anseios da
comunidade local, não defendendo necessidades e vontades próprias, mas sim a
vontade coletiva de um conjunto de pessoas.
Mas em contra-partida, a íntima relação com o poder pode corromper a
liderança comunitária, fazendo com que os interesses que antes eram comunitários
passem a ser voluntariados de acordo com as aspirações político-administrativas do
poder público ao perceber que a liderança comunitária passa a ser inserida num
conjunto de privilégios e cargos públicos, ou mesmo que esta liderança comunitária
se torne defensora de determinada posição político-partidária, colocando em
segundo plano a representatividade e passando a ser mais uma peça dentro do
complexo jogo do poder público.
A diferenciação dessas posições das lideranças comunitárias deve ser
levada em consideração para que o objetivo do orçamento participativo não seja
modificado ou corrompido, pois se assim o for estar-se-ia deturpando o conceito de
participação social, controle social e maior porosidade do poder público para com as
iniciativas locais em prol de melhoras constantes nas políticas públicas.
Para que seja compreendido o processo de implantação do orçamento
participativo, é preciso que se deixe claro que, como todo processo político-
administrativo, a vontade sempre parte do poder público, nesse caso do prefeito da
municipalidade em incorporar na sua administração a participação social e a co-
gestão com a comunidade. A partir desse ato operam-se diferentes ações, mas que
podem ser resumidas18 na formação de diferentes assembléias regionais e
temáticas que são operadas a partir da livre participação da comunidade, ou seja,
todos os cidadãos que desejam e querem participar das assembléias se tornam
automaticamente representantes e membros de igual poder de deliberação
(AVRITZER, 2009).
Tanto os conselhos gestores quanto o orçamento participativo
representam como a participação social tem avançado de maneira concreta no
cotidiano da gestão pública, e ao mesmo tempo representa resultados concretos de
como a participação social tem modificado de maneira positiva a democracia
brasileira, superando os problemas, as desigualdades sociais e propiciando a
aproximação da população para com as estruturas de poder e de prática política.
É importante destacar que toda essa aproximação faz com que seja
questionado constantemente como o poder público eleito faz a utilização dos
recursos públicos em determinados locais, faz também com que a população local
se mobilize e crie diferentes movimentos locais de participação que possam servir
como instrumentos de informação e condução para as políticas públicas e serviços
públicos disponibilizados nas comunidades por parte do poder público que tende a
essa porosidade da participação social em sua administração, sendo então
necessário conceber uma gestão pública que incorpore além dos conselhos
gestores e do orçamento participativo a participação social em suas administrações.
3.2.4 As gestões públicas e a maior porosidade dos espaços participativos
A relação entre sociedade civil e Estado, no que se refere à criação de
diferentes mecanismos de incentivo à participação social, tende não somente à
democratização do Estado, mas essencialmente a politização da sociedade civil,
pois com uma sociedade consciente de seu papel de agente de transformação e
com a vontade em participar e contribuir para que novos serviços públicos possam
18
Para maior aprofundamento na discussão do orçamento participativo indicasse a leitura pormenor dos artigos de Boaventura de Souza Santos intitulado de “Orçamento participativo em Porto Alegre: para uma democracia redistributiva”, e o artigo de Leonardo Avritzer “Modelos de deliberação democrática: uma análise do orçamento participativo no Brasil” ambos os artigos encontram-se disponíveis na obra “Democratizar a democracia: os caminhos da democracia participativa” de 2002.
ser prestados é que torna a democracia e a cidadania conceitos vivos, ou seja,
conceitos que não estão presentes somente nos documentos oficiais e no texto da
CF-88, mas sim presentes na vida das comunidades.
Ao mesmo tempo é preciso considerar que para que haja o aumento da
porosidade dos espaços participativos nas gestões públicas brasileiras é preciso que
se vençam os antigos ranços políticos como a centralização, a burocracia e a falta
de transparência dos atos e orçamentos públicos para que então a participação
social possa ser implementada nas suas diferentes maneiras (NEVES, 2007).
Além dos conselhos gestores e do orçamento participativo outros
formatos de participação social devem ser apontados, tais como audiências públicas
envolvendo a discussão de diversos temas de caráter normativo para a
implementação de políticas públicas (municipal, estadual e/ou federal); preparação e
elaboração do Plano Plurianual (PPA), e por fim a criação de novos conselhos
gestores que envolvem a tematização de assuntos em áreas sociais sem a tradição
de mobilização e participação social (AVRITZER, 2009).
Pode-se notar que existe uma preferência por parte do poder público
executivo local na formação de conselhos gestores, pois estes tendem a dinamizar a
formulação e a implementação das políticas públicas mediante uma aproximação
direta do poder público com a sociedade civil e a comunidade local. E ao mesmo
tempo serve como um canal de democratização e aproximação do poder para com
as camadas desprovidas de interesse no que se refere à discussão político-
administrativa do Estado; e essa voluntariedade do poder público executivo traça
novos caminhos para a gestão do Estado e por que não dizer da gestão pública.
Tal proposição de gestão pública ganha a conceituação de governança
local quando assume escala microrregional: a governança representa a sinergia
inclusiva que visa potencializar a ação e os ganhos coletivos e, significa ao mesmo
tempo uma apropriação particular das energias e dos recursos coletivamente
produzidos e mobilizados (ROVER, 2008).
Desta forma, percebe-se que a conceituação de gestão pública
somada ao conceito de governança enfatiza o entrelace da democracia e da
inserção da sociedade através da participação social visando à construção de um
novo patamar para a ação das políticas e das políticas públicas.
Ao mesmo tempo pode-se compreender que o que está sendo
realizado mediante a inserção da participação social na gestão pública é a criação
da gestão compartilhada, ou seja:
A gestão compartilhada em suas diferentes formas de conselhos, colegiados etc., precisa desenvolver uma cultura participativa nova, que altere as mentalidades, os valores, a forma de conceber a gestão pública em nome dos direitos da maioria e não de grupos lobbistas. Isso implica a criação de coletivos que desenvolvam saberes não apenas normativos (legislações, formatos de aplicação de verbas etc.) embora esses itens também sejam importantes, dado o papel dos fundos públicos no campo de disputa política em torno das verbas públicas. Mas é preciso desenvolver também saberes que orientem as práticas sociais, que construam novos valores, aqui entendidos como a participação de coletivos de pessoas diferentes com metas iguais (GOHN, 2007, p. 51-52).
A porosidade da gestão pública somada à gestão compartilhada faz
com que as necessidades, vocações e anseios locais possam ser inseridos na
administração político-administrativa local pelo poder executivo, não se tornando
instrumento de poder e de barganha para antigos políticos centralistas e de ações
escusas. Mas, representa compreender que a comunidade local com seus saberes e
fazeres é capaz de contribuir de maneira positiva para com a mudança de
paradigmas da gestão pública local.
Ainda a respeito do pensamento de Gohn (2007) é possível conceber
outro instrumental democrático-participativo: os coletivos, que representam espaços
de conhecimento e formação para a comunidade que antes não era envolvida
diretamente na condução da vida político-administrativa de sua comunidade e que
agora passa a receber essa incumbência.
Ora, se a participação social, como demonstrado anteriormente, para
alguns setores sociais já está deveras avançado é necessário então que a gestão
pública local tenha atenção para outras áreas temáticas e outros saberes, fazendo
com que se crie uma administração participativa interdisciplinar, na qual os
diferentes saberes das comunidades mediados por atores sociais com maior
experiência em participação social e política possam conduzi-los em um processo
educativo constante, reforçando cada vez mais a importância em participar e
contribuir para o desenho de novas formas democráticas de poder.
Contudo, é preciso que não seja construída uma utopia participativa na
gestão pública na qual a participação sempre contribui para a maior democratização
das ações públicas, esse pensamento se refere aos questionamentos:
(...)verificar se a gestão participativa, ao “socializar” e compartilhar determinadas decisões – ao co-reponsabilizar os governados –, não estaria ajudando a que se embaralhe e se complique o próprio processo decisório, com a ampliação do risco potencial de indefinições ou de vazios decisionais (NOGUEIRA, 2005, p. 119).
A co-reponsabilidade nas decisões político-administrativos da gestão
pública deve sim ser mediada entre Estado e sociedade civil, desde que a própria
sociedade civil esteja preparada para compreender o que se está sendo votado, no
que se está participando para que então se sinta comprometida, pois caso contrário,
poderá se sentir apenas como um fantoche na mão da gestão pública e agindo
apenas como legitimadora das ações já estabelecidas pelo poder público local. Essa
simples legitimação pode fazer com que haja a desmotivação da sociedade civil em
continuar a participar, ou mesmo em participar do projeto pseudo-participativo da
gestão pública.
E, como apresentado por Nogueira (2005), essa pseudo-participação
pode resultar em vazios decisionais ou indefinições para a implementação de
políticas públicas que necessitam da aprovação da sociedade civil. Este entrave
administrativo pode motivar a morosidade da gestão pública local na efetivação de
soluções para os problemas vivenciados pela comunidade local em função da
desmobilização e a falta de organização da comunidade.
A despolitização da comunidade local mediante uma ação coercitiva da
gestão pública local reduz a participação social à condição de simples recurso
gerencial (NOGUEIRA, 2005), servindo apenas para que as decisões técnico-
gerenciais sejam referendadas, não servindo para o alargamento do cânone
democrático-participativo.
Esses questionamentos e pensamentos que versam a respeito do lado
reverso da participação social devem ser muito bem pensados para que as gestões
públicas com pouco comprometimento com a participação social, a democracia, a
cidadania não utilizem do discurso democrático apenas para a construção de uma
propaganda participativa, conselhos e fóruns gestores legitimadores de ações
unilaterais por parte do Estado.
O cenário da participação social frente à gestão pública deve ser
referenciado com mais duas posições, a saber: a competência governamental em
admitir a participação social como instrumento colaborativo e auxiliar da gestão e o
compromisso político em incorporar na agenda política os compromissos
participativos (PINTO, 2004).
O reverso da participação social como demonstrado acima enfatiza a
precariedade das gestões públicas municipais na incorporação da participação
social como instrumentos legitimadores da ação político-administrativa que tende
para a maior democratização e transparência de seus atos, mas que para o alcance
desse processo é preciso que tenha um corpo político, burocratas e tecnocratas
preparados e com conhecimentos para implementarem e aglutinarem a participação
social junto às esferas de poder e de decisão dessas gestões, contribuindo assim
para que a participação social seja efetivada e contribua com novos projetos e ações
de co-gestão para a comunidade local.
E, por fim, deve-se dar destaque ao compromisso político dos gestores
públicos em incorporarem de fato e de direito a participação social no processo de
co-gestão e co-responsabilidade em prol da mudança da realidade local. O
compromisso político em muitos casos precisará de agentes políticos com coragem
e motivação para romper com antigos laços históricos de clientelismos, centralismos
e estruturas burocráticas ineficientes traçando através da participação social uma
nova perspectiva de futuro para as comunidades locais e mesmo para toda a
sociedade local.
Todo esse processo – participação social e contribuição para o
aumento de espaços dialógicos – faz com que a gestão pública cresça
continuamente em paralelo com os avanços tecnológicos, sócio-culturais e
educacionais da sociedade local, rompendo com os ranços políticos centralistas e
clientelistas, auxiliando a incorporação de novos atores sociais no cenário da gestão
pública e fazendo com que os cidadãos possam efetivar sua cidadania ao contribuir
para um planejamento e para uma gestão pública democrática de fato.
3.3 Avanços proporcionados pela redemocratização no cenário da gestão e de
práticas sociais: gestão social
O tema gestão pública e participação social recebe novos elementos
para a sua compreensão quando se percebe que nele está envolvido também a
dimensão das políticas públicas e de práticas sociais, carecendo assim de nova
redefinição, ou melhor, de um alargamento para a sua compreensão, possibilitando
ao universo de pesquisas e proposições a conceituação de gestão social para esse
entrelace de realidades: Estado, participação da sociedade nas práticas
governamentais e organizações sociais.
Ademais, a denominação de gestão social para esse conjunto de ações
e atores sociais busca expressar a noção de controle social inerente a todo este
processo de gestão conjunta, visto que, com a participação de um número
diferenciado de atores participantes na e para a gestão governamental há um maior
diálogo entre diferentes saberes e conhecimentos, fazendo com que a
interdisciplinaridade existente amplie a visão dos gestores para com os problemas
locais a serem enfrentados e resolvidos.
Contudo, para que seja estabelecida essa base dialógica entre Estado,
sociedade civil, movimentos sociais e organizações do terceiro setor19 envolvidas e
comprometidas com a gestão democrática e participativa mediante o conceito de
gestão social, é preciso que se compreenda que a gestão social é amparada por
uma problemática muito maior do que a simples articulação, mobilização e
participação desses atores sociais: representa uma nova postura contra a
construção de uma sociedade capitalista desigual e marginalizadora.
A base ideológica na qual a sociedade atual está estabelecida baseia-
se no tripé capitalismo, lucro e distanciamento com as preocupações individuais,
19
Por se tratar de um conceito que não é elemento central na discussão empreendida, cabe uma
nota sobre o terceiro setor. Longe de haver consenso em torno do conceito, a discussão sobre o
terceiro setor revela entendimentos e concepções ideopolíticas divergentes. Para alguns autores,
entre eles Ficher (2005). Este se organiza na realidade brasileira tendo como fator de organização os
avanços democráticos gerados durante e pós a redemocratização do Estado brasileiro. Como
exemplos de organizações e instituições que compõem o terceiro setor podem ser citadas as
organizações filantrópicas, fundações, institutos empresariais, associações de defesa de direitos,
dentre outras diversas formas organizativas pelas quais a sociedade civil manifesta-se como pólo
dinâmico de atuação social frente às questões que não são geridas pelo Estado e pelo mercado.
Contudo, para Montaño (2007, p. 181) o termo terceiro setor é "carente de rigor teórico - não é
preciso na caracterização do espaço que ocupa e antes confunde do que esclarece, e desarticulador
do social, pressupondo a existência de um primeiro setor - dividindo a realidade social em três
esferas autônomas: o Estado, o mercado e a 'sociedade civil'".
causando mais malefícios para o desenvolvimento social do que benefícios quando
se percebe que:
(...) O capitalismo como sistema é realmente um bom organizador microeconômico da produção, mas é um péssimo distribuidor, um empregador cada vez mais precário e um destruidor ambiental que leva, ao concentrar poderosas tecnologias em formas cada vez mais predatórias de exploração dos recursos naturais, a um impasse planetário (DOWBOR, 1999, p. 31).
O capitalismo assim visto faz com que novas fortunas sejam geradas
num curto prazo, não importando em como as cifras financeiras são geradas e os
impactos produzidos serão absorvidos pelas comunidades, o que importa é
satisfazer a grande massa de consumidores.
E, nesse ínterim está o lucro e os interesses individualistas dos
empresários, e por não dizer também, de alguns governos em se colocarem em
posição passiva para com os problemas e impactos negativos gerados na sociedade
a partir da degradação ambiental, da explosão demográfica descontrolada em áreas
produtivas, e do descontrole financeiro da população na aquisição de produtos e
serviços além dos seus níveis de renda.
Não se pode compreender e aceitar que tal posicionamento – a
conjunção de todos os impactos negativos causados à sociedade e ao ambiente
local - seja saudável e louvável para um governo local pelo simples aumento de
arrecadação de impostos e tributos, há de se questionar e se problematizar a gestão
do local e do social por um maior número de atores sociais frente aos governos.
Esse posicionamento é destacado como a gestão contra o social, pois
se configura como estratégia tecnológica e instrumental por partes dos empresários
em forçarem os governos locais a aceitarem os impactos negativos como
beneficiários para o aumento da empregabilidade local, do maior afluxo de capital
para a economia local, mas ao mesmo tempo está se construindo bases para que as
organizações do campo social e os direitos de cidadania da sociedade local sejam
destituídos ou mesmo obliterados por essa conjunção de fatores (MAIA, 2005).
Mas tal obliteração não é mais tão eficiente quando se retorna à
discussão dos movimentos sociais e suas conquistas em um país democrático como
o Brasil, isto é, no contraponto da gestão contra o social encontram-se movimentos
sociais e seus atores que buscam confrontar o Estado e o mercado (empresários)
para com os problemas vivenciados nas esferas locais: miséria, emprego, renda e
desenvolvimento social.
Essa dialética promovida entre a sociedade civil e os movimentos
sociais perante o Estado faz com que novos conhecimentos e práticas sejam criadas
e que indicadores sociais sejam construídos para que possa de fato monitorar como
a ação capitalista está promovendo avanços sociais ou possibilitando o aumento do
abismo social, mas além disso os indicadores sociais criados pelos movimentos
sociais e diferentes organizações do terceiro setor que compõe a sociedade civil
fazem com que seja possível a transformação da sociedade fundada em valores
como a democracia, justiça, igualdade, equidade e cidadania universal (MAIA,
2005).
Tal posicionamento se baseia não somente na busca da maior inserção
da sociedade na gestão participativa e democrática local, mas sim criar mediante a
participação e o processo dialógico com o Estado o desenvolvimento societário
cidadão, tendo o social como centro, garantindo à população local o direito de
exercer a sua cidadania mediante a participação decisória nos rumos da vida em
sociedade (MAIA, 2004).
Ao se compreender a interação entre sociedade civil e Estado no
tocante às novas formas de gestão pública, está ao mesmo tempo se referindo em
como promover novos espaços para que sejam repensados o desenvolvimento
social e a participação dos atores sociais nesse processo.
Para que a temática gestão social seja alicerçada devidamente e
amparada pelos conceitos discutidos ao longo deste estudo, tomar-se-á como novo
parâmetro o entendimento de que desenvolvimento social refere-se a um processo
integrador que visa à expansão das liberdades subjetivas interligadas de uma
sociedade (SEN, 2000).
Ao refletir em como a liberdade pode alicerçar o desenvolvimento
social e garantir novos processos gestionários para o setor governamental público, é
preciso que se amplie o que vem a ser liberdade:
As liberdades não são apenas os fins primordiais do desenvolvimento, mas também os meios principais. Além de reconhecer, fundamentalmente, a importância avaliatória da liberdade, precisamos entender a notável relação empírica que vincula, uma às outras, liberdades diferentes. Liberdade política (na forma de liberdade de expressão e eleições livres) ajudam a
promover a segurança econômica. Oportunidades sociais (na forma de serviços de educação e saúde) facilitam a participação econômica. Facilidades econômicas (na forma de oportunidades de participação no comércio e na produção) podem ajudar a gerar a abundância individual, além de recursos públicos para os serviços sociais. Liberdades de diferentes tipos podem fortalecer umas às outras (SEN, 2000, p. 25-26).
Com base nesse importante pensamento, justifica-se que o
desenvolvimento social não é contraditório ao capitalismo e ao lucro, o que se busca
é uma maior inserção da sociedade local no processo de ganhos e distribuições
geradas a partir do capitalismo.
Ao mesmo tempo é importante salientar que para o Estado prover as
necessidades sociais de uma sociedade é preciso que exista um aporte financeiro
que garanta a continuidade das políticas públicas e dos serviços prestados, e com
isso a melhor distribuição dos recursos financeiros por toda a sociedade faz com que
haja uma possibilidade maior de desenvolvimento tanto para o governo e suas
diferentes esferas, quanto para a sociedade.
Ainda sim, depreende-se do conceito de liberdade vislumbrado por Sen
(2000) que quanto maior for o desenvolvimento aliado às liberdades, maiores serão
as chances da sociedade local se inserir em processos participativos democráticos,
buscando sempre garantir que políticos e gestores públicos sejam eleitos mediante o
cumprimento de uma agenda que garanta o desenvolvimento social e o aumento
das liberdades sociais.
Pode transparecer num primeiro momento que a visão de Sen (2000) é
utópica ou mesmo de proporções universais inconcebíveis para a sociedade atual,
mas quando se reflete a respeito dos ganhos sociais gerados pelas diferentes lutas
dos movimentos sociais, percebe-se que o Brasil e a reforma democrática foram
estabelecidos nesse caminhar proposto por Sen (2000), mas a continuidade é que
dependerá da vontade da sociedade em avançar na construção conjunta desse
processo de desenvolvimento social.
Mediante tal contextualização a respeito de como a sociedade civil
busca a sua inserção na discussão da governabilidade local, pode-se então iniciar a
construção do entendimento e discussão dos avanços gerados por diferentes
pensadores a respeito do conceito de gestão social.
Inicialmente a gestão social é pensada como um envolvimento na
participação equilibrada de diferentes segmentos sociais resultando na abertura de
um espaço de arquitetura e decisão social, com o apoio de centros acadêmicos e
pensadores, motivando assim a maior articulação entre os participantes nesse
processo gestionário (DOWBOR, 1999).
A articulação entre os diferentes atores sociais em prol do diálogo e da
construção de um processo participativo democrático faz com que sejam
referendadas as posições de que a participação da sociedade civil e seus diferentes
atores sociais possam contribuir para com os gestores públicos no tocante ao maior
e melhor conhecimento das informações e experiências locais, favorecendo a
efetividade das políticas públicas.
Tal contribuição da sociedade civil e dos atores sociais faz com que se
configure que a gestão social e as políticas públicas não podem ser dotadas do
ímpeto do tecnocratismo, pois se assim fossem estariam repetindo antigos modelos
de gestão publica e colocando por terra todos os avanços sociais conquistados ao
longo da reforma democrática do Estado.
Mas para pensar e refletir sobre o conceito de gestão social é preciso
que se busque conhecer melhor as duas palavras que conjuntamente expressam a
visão inicial de Dowbor (1999): a gestão e o social, para que então possa ser
expandido e demonstrado em como o conceito vem se desenvolvendo e sendo
repensado por outros pesquisadores.
A gestão pode ser compreendida a partir de sua etimologia, vindo do
latim gestionare indicando a declinação de gesto, podendo ser compreendida quase
que exclusivamente a partir da sua perspectiva instrumental: valores, propósitos,
referenciais teóricos e metodológicos, além das práticas efetivadas pelos agentes
(MAIA, 2004).
Desta maneira, a gestão pode ser concebida como um processo que
tem a sua construção na sociedade, fundado e revelado na indissociabilidade das
seguintes dimensões: ético-política, teórica-metodológica e técnico-operativa (MAIA,
2004).
Se a gestão é um processo feito e pensado a partir do conjunto de
práticas sociais, o conceito então possui um entrelace com o apelo e a participação
da sociedade, no que tange a diferentes ações e posições que depreende uma
característica cidadã para a sua efetivação (MAIA, 2005).
Se a gestão é então vista como um processo social e que visa à
cidadania, pode-se considerar a gestão como instrumento e prática para a condução
do Estado pós-reforma democrática, ou seja, a gestão representa um novo modelo
de como gerir os serviços públicos no que se refere ao aumento da proposta
democrática e cidadã reivindicada pelos movimentos e organizações sociais ao
longo da história da construção democrática do Brasil (MAIA, 2005).
Mas, quando a gestão é concebida friamente a partir dos
conhecimentos gerados pelas ciências administrativas, o conceito recebe o
entendimento como um processo que
(...) visa ao uso racional dos recursos para a realização econômica. O que significa dizer que o conjunto de “ativos” deverá ser mobilizado, ajustado, a normas, procedimentos e medidas, que viabilizem a otimização do capital investido (CARRION; CALOU, 2008, p. 15).
Quando concebida friamente a partir dessa ótica, a gestão assumiu
para a condução do Estado, um forte caráter neoliberal, sustentando a posição das
privatizações, da focalização e da descentralização das políticas sociais, fazendo
com que o Estado assuma uma posição de mediador entre os interesses do
mercado e as necessidades da sociedade, o que de certa forma representa para a
história democrática brasileira uma incrível perda das conquistas sociais geradas ao
longo da reforma democrática e da promulgação da CF-88 (MAIA, 2005).
Entretanto, refletir e conceituar a gestão social representa muito mais
do que a simples intervenção da gestão para e na condução do Estado e das
políticas públicas, significa gerir as demandas e as necessidades do social mediante
a vontade e a ação da sociedade por meio de formas diversificadas de gestão e/ou
mecanismos de auto-organização, tendo como princípio o associativismo (FRANÇA
FILHO, 2008).
Quando a gestão social é compreendida a partir de tal posicionamento,
refere-se a uma abertura da conceituação de gestão e mesmo a relação da
sociedade com o Estado, uma vez que, não cabe à sociedade mediante os atributos
participativos esperar que o ambiente político-administrativo brasileiro crie espaços e
agendas que viabilizem o ideal democrático-participativo, mas cabe à sociedade o
papel de agente transformador de sua realidade local e com isso, a gestão pode
auxiliar uma transformação de objetivos e condução dos movimentos sociais,
fazendo com que a preocupação e o interesse se voltem na conquista do poder de
motivar a sociedade local e propor modificações e conquistas de autonomia para os
moradores deste espaço mediante os diferentes organismos associativos.
A conquista da autonomia como forma de gestão social está
intimamente ligada à gestão organizacional, utilizando-se dos conhecimentos e
técnicas instrumentais da administração para gerir as demandas e as práticas
sociais de uma determinada lógica local (FRANÇA FILHO, 2008).
Pode parece que a conceituação de gestão social se inscreve como
uma prática de gestão que tende a unir duas posições bem distintas: os
conhecimentos e saberes da administração com os saberes e conhecimentos locais
e sociais, entretanto não se pode convencionar tal pensamento, pois os
instrumentos e saberes formais da administração não são acessíveis pelos membros
da comunidade local.
Cada comunidade local, cada associação ou movimento social tende a
construir seus próprios modelos de gestão, e deve-se referendar que os
conhecimentos formais estão num primeiro momento de análise longe do acesso
desses moradores de comunidade, ou seja, a universidade, os centros acadêmicos
e outros espaços formais de conhecimentos e saberes não são acessíveis a todos
os membros da comunidade local devido às falhas e à carência financeira dessas
comunidades.
Mas restaria o questionamento: como então essas comunidades,
associações e movimentos sociais podem conduzir um processo de gestão social
sem os conhecimentos e saberes formais? E, como pode esse processo ser
denominado de gestão e ainda sim ter uma interferência na condução do Estado e
das políticas públicas?
Essa é a lógica contrária da gestão social: gerar conhecimentos e
práticas a partir da própria relação da sociedade local com os seus problemas e
frente a esse desafio construir instrumentos próprios para a gestão, além disso,
persiste a lógica contrária com relação ao econômico e o social:
(...) onde o primeiro deixa de ser uma prioridade, e acrescenta-se ainda a importância do aspecto político, a gestão social revela uma vocação forte de redefinição da relação entre economia e política, numa perspectiva de reconciliação entre o econômico e o social. De fim em si mesmo, o aspecto econômico se transforma num meio para a consecução de outros objetivos (sociais, políticos, culturais, ecológicos...) (FRANÇA FILHO, 2008, p. 34).
A lógica contrária da gestão social com relação ao aspecto econômico
é que faz com que os saberes e conhecimentos locais sejam valorizados, evitando
com isso que a racionalidade e os instrumentos administrativos da gestão impliquem
na imposição de práticas e atividades que sejam contrárias àquelas de anseio das
comunidades locais.
Frente a esse pensamento, pode-se apresentar que a conceituação de
gestão social refere a um desdobramento de inúmeras realidades e práticas, as
quais podem ser visualizadas no esquema abaixo reproduzido:
FIGURA 04 – Gestão Social. Fonte: FRANÇA FILHO, 2008, p. 35.
Com base na figura 04, pode-se compreender que a gestão social
frente aos desafios enfrentados busca intervir em diferentes áreas da vida social
buscando a satisfação das demandas e necessidades da comunidade local, mas
tendo um envolvimento direto com as políticas públicas estatais e uma articulação
com organizações populares, universidades, entidades não governamentais
(SINGER, 1999).
Outro posicionamento para a conceituação de gestão social se baseia
na relação entre a sociedade local e governo mediante a viabilização de políticas
públicas, projetos e programas governamentais assegurando uma melhora efetiva
na realidade local das comunidades (CARVALHO, 1999).
Ambos os posicionamentos devem ser discutidos à luz da história e do
momento em que foram pensados: o Brasil estava saindo de um período ditatorial no
qual as políticas públicas e as ações governamentais refletiam, como já discutido
nesse estudo, uma postura centralista e tecnocrática, não permitindo às
comunidades locais apresentarem as suas demandas e necessidades. Dessa forma
a conceituação exposta por Singer (1999) e Carvalho (1999) demonstra de maneira
bem clara a vontade da sociedade civil organizada e mesmo dos atores sociais das
comunidades locais em se inserir nesse campo de discussão e de ação do Estado,
propondo posturas inovadoras para a gestão das políticas públicas e mesmo para o
social.
A discussão da conceituação e das práticas de gestão social avança no
tempo e têm-se outro posicionamento que apresenta que a gestão social é um
processo de mediação social que deve articular múltiplos níveis de poder: do poder
individual ao poder social. Mas sempre se orientando na negociação do que deve
ser feito, do porque e para quem as ações da gestão social se revertem, cabendo
compreender que o processo dessa gestão não é individualizado ou estatizado, mas
é um processo coletivo que pode ser realizado com diferentes graus de simetria de
participação e envolvimento, trazendo consigo nessa simetria/assimetria os difusos
conflitos de interesses dos diversos atores sociais envolvidos e suas diferentes
escalas de poder. (FISCHER, 2002).
Percebe-se que a discussão avança e o envolvimento da sociedade
civil e dos atores sociais no tocante à participação e inserção de suas demandas na
agenda política já se fazem presentes, contudo o interesse agora da conceituação é
em como fazer com que ambos os atores participantes desse processo – de um lado
a sociedade civil e os atores sociais locais e de outro lado o Estado com seu
aparelhamento técnico-administrativo e seus interesses financeiros e políticos –
possam chegar a um consenso, ou melhor, a uma mediação vantajosa para ambos
os lados.
Como no processo do policy cycle, a gestão social é mais do que uma
vontade unilateral dos agentes envolvidos, mas é a formação de um campo de
discussão e diálogo entre os atores sociais e governamentais envolvidos, ambos
tendendo para as suas vontades e posições, mas ambos buscando uma maneira
conciliatória para fazer com que a realidade local possa de fato ser alterada.
Esse envolvimento dos atores sociais e políticos fornecem subsídios
para que a conceituação de gestão social possa florescer com um novo conceito a
ser aplicado nas gestões públicas, as quais visam a melhora da condição de vida da
população e a implementação de políticas públicas e sociais:
(...) gestão social (...) constitui em um campo interdisciplinar e intersetorial de conhecimentos e práticas que dão suporte aos processos decisórios estratégicos e de implementação de ações públicas destinadas à realização do bem estar social (CKAGNAZAROFF, 2004, p. 13).
A gestão social vista a partir do conceito acima exposto visa ao
conhecimento e o gerenciamento da complexidade social para a apresentação de
soluções para os conflitos existentes e, por isso denota-se uma gestão voltada para
o local, centrada na ação das políticas públicas. Mas há de se ressaltar que o
conflito é ainda existente e inscreve-se nessa arena dialética entre Estado e
sociedade civil, fazendo que os elementos conflituosos (necessidades e demandas
da sociedade versus interesses políticos) venham a ser gerenciados pela gestão
social a ser executada pelo Estado com o apoio da sociedade civil.
Avançando nessa postura de relacionamento entre Estado e sociedade
civil local, a conceituação de gestão social recebe um tratamento, ou melhor, é
pensada como um gerenciamento público, tendo um viés participativo como modelo
de condução para os processos decisórios entre os diferentes atores sociais e
políticos envolvidos, significando assim uma administração pública societal (PAULA,
2005).
Mas cabe neste momento uma reflexão a cerca da condução do
desenvolvimento do conceito de gestão social a partir dos pensamentos expostos
por Paula (2005): se a discussão e a vontade motivacional da gestão social
representam a intervenção positiva dos saberes e conhecimentos locais para o
ambiente político-administrativo do Estado, como pode-se conceituar a gestão social
como um modelo de administração pública? Ou ainda, se os preceitos democráticos
participativos estão inscritos na CF-88, por que creditar à conceituação de gestão
social esse viés de administração pública societal?
Ambos os questionamentos demonstram em como a fragilidade
conceitual faz com que haja uma aproximação, ou melhor, uma redução conceitual
da gestão social como mais um mecanismo unilateral do Estado, colocando em
descrédito as práticas sociais e mesmo em como a gestão social se faz inscrita nas
realidades locais.
Não é producente creditar todas as inovações sociais somente ao
Estado e colocar em segundo plano os avanços sociais desenvolvidos pela
sociedade civil local mediante os espaços participativos/associativos, pois se assim
for pensado, o conceito de gestão social não representa avanço algum para a
sociedade, mas sim uma nova ferramenta de gestão do Estado.
Ora, é fácil perceber que esse posicionamento deve ser considerado
com cautela, e creditado a mais uma forma de aprimorar as práticas administrativas
do Estado, mas sempre percebendo que é a sociedade local o espaço para que
essa prática (gestão social) aconteça e se desenvolva.
Essa argumentação recebe o apoio conceitual de que os modelos de
inovação para as práticas governamentais, ou seja, a administração pública não
deve ser confundida com o tipo de regime político:
Se os autores querem chamar esse tipo de gestão pública de “gestão social”, não tenho objeções. Haveria assim uma “administração pública gerencial social”. E assim seria possível distingui-la não apenas da administração pública burocrática, mas também de versão mais liberais e autoritárias de administração gerencial. O que não podem, porém, é comparar modelo de administração pública com o tipo de regime político. Como também não podem colocar todas as versões de administração pública gerencial numa mesma categoria e associá-las às estratégias neoliberais (BRESSER-PEREIRA, 2005, p. 51).
Tal posicionamento pode parecer num primeiro momento como
autoritário e sem espaço para a discussão, mas o que de fato Bresser-Pereira
(2005) faz é se posicionar com a intenção clara de demonstrar que a administração
pública não pode ser constantemente redefinida, ou melhor, reconceituada ao bel
prazer dos pesquisadores sem o devido conhecimento do que é o Estado e todo o
seu aparto burocrático necessário.
Mas se está nesse momento fazendo um juízo de valor entre a
administração pública e a burocracia existente como algo ruim para a sociedade e a
gestão social como algo inovador e que é capaz de resolver os problemas das
práticas político-administrativas do Estado.
A gestão social é um conceito que deve ser lido como um modelo de
gestão, ou seja, pode ser ou não incorporado pelas gestões políticas estatais,
contribuindo para o aumento das práticas participativas e democráticas no Estado,
incorporando novos atores sociais para a discussão e avaliação das políticas
públicas de interferência local, mas em momento algum será capaz de se tornar o
elemento maior que a administração pública e a burocracia existente.
Com base nessa argumentação a gestão social tem sido reconceituada
a partir da reflexão das formas de organizações sociais; da relação existente entre
as dimensões político, econômica e social que vêem a compor a realidade total da
sociedade; e ao mesmo tempo criar novos espaços de participação no qual os
diferentes atores estatais, empresariais e comunitários possam dialogar a respeito
dos problemas e necessidades vivenciados por estes. Desta maneira a gestão social
demonstra o caminhar para uma sociedade horizontalizada e participativa, na qual a
formação de redes se configura como um novo desenho organizacional (DOWBOR,
2006).
Com isso, pode-se compreender que a gestão social:
(...) não está atrelado às especificidades de políticas públicas direcionadas a questões de carência social ou de gestão de organizações do denominado terceiro setor, mas, também a identificá-lo como uma possibilidade de gestão democrática, onde o imperativo categórico não é apenas o eleitor e/ou contribuinte, mas sim o cidadão deliberativo; não só a economia de mercado, mas também a economia social (...) não é o monologo, mas, ao contrário, o diálogo (TENÓRIO, 2008, p. 54-55).
A gestão social é então um processo dialógico entre os diferentes
atores sociais num espaço de participação, cidadania e democracia tendo como elo
os problemas sociais, econômicos, culturais e ambientais e buscando a construção
de novos e inovadores processos de gestão apoiados em diferentes conhecimentos,
fazendo que haja a construção de novos processos descentralizados mediante o
planejamento das ações e como estas terão seus desdobramentos na prática.
A compreensão de como a sociedade civil se forma, organiza e
mobiliza diferentes atores sociais em prol do objetivo democrático, representa para a
história da democracia brasileira uma verdadeira revolução, tanto de pensamento
quanto de postura e atitude, além de demonstrar em como os movimentos sociais
conquistaram novos espaços na sociedade.
Esse levante democrático fez com que as bases políticas do Estado
brasileiro repensassem a forma de receber, compreender e construir em conjunto
com a sociedade brasileira a partir de novos instrumentos políticos, priorizando a
participação social e os diferentes atores sociais como interventores das políticas
públicas e das práticas de programas e projetos governamentais.
Além disso, sinalizou que novos modelos de gestão social estão sendo
pensados e criados a partir das realidades locais, contribuindo desta maneira para
que a participação social não seja vinculada somente aos espaços de controle social
e de legitimação de ações do Estado, mas servindo como base para que estes
inovadores processos de gestão possam ser articulados com o Estado para uma
melhor e mais eficaz intervenção nas sociedades locais, contribuindo assim para o
desenvolvimento social, o aumento dos direitos voltados à cidadania e possibilitando
que a democracia seja exercida de fato por todos no contexto da sociedade
brasileira.
O capítulo seguinte buscará analisar como o campo da atividade
turística está sendo alterado a partir dos pensamentos e das contribuições da
participação social mediante a implementação de novas políticas públicas setoriais
sob viés dessa análise.
4 PLANEJAMENTO TURÍSTICO COMO INSTRUMENTO DA PRÁTICA
DESCENTRALIZADA DE GESTÃO PÚBLICA
O turismo se encontra em um cenário que o indica como uma das
atividades econômicas de maior crescimento, com forte tendência a intensificar
progressivamente sua representatividade no mercado global.
É uma atividade econômica que mobiliza diversos setores produtivos
de bens e serviços, requerendo o trabalho de inúmeras categorias técnicas e
profissionais, promovendo a geração de emprego e renda.
Desta forma, o turismo representa um fator de estímulo para a iniciativa
privada que busca implantar novos empreendimentos, constituindo uma nova
dinâmica econômica para a localidade.
Contudo, o turismo não pode ser visto apenas como um fator de
desenvolvimento econômico para a localidade. Necessita, antes disso, ser
compreendido enquanto um instrumento para o desenvolvimento sociocultural da
localidade na qual a atividade se desenvolve ou tem potencial para se desenvolver.
Pois caso contrário, os efeitos negativos advindos com a atividade turística serão
potencializados: acentuação da estagnação do turismo, afetando outras atividades
econômicas além do turismo; aumento do fator de aculturação da comunidade local;
geração de conflitos de interesse entre os indivíduos e o grupo social, quando se
parte da análise divergente entre as realidades etnosocioeconômicas, dentre outros
fatores (MOLINA, 2005).
Para que os efeitos positivos sejam maximizados em uma destinação
turística é preciso que se compreenda que o fenômeno turístico deve partir da
percepção de um sistema de agentes interligados, os quais se relacionam direta e
indiretamente com atividades e serviços:
(...) turismo é o conjunto de serviços que tem por objetivo o planejamento, a promoção e a execução de viagens, e os serviços de recepção, hospedagem e atendimento aos indivíduos e aos grupos, fora de suas residências habituais (ANDRADE, 2001, p. 38).
A atividade turística deve ser compreendida sob a ótica da estruturação
de uma destinação turística (nação, estado ou município), a qual necessita de
padrões de desenvolvimento e planejamento para o crescimento ou, mesmo, o
fortalecimento do turismo como fator de relevância para a natureza econômica.
Para que se perceba melhor a complexidade da atividade turística e
suas facetas com relação à comunidade local, ao empresariado e ao Estado, Molina
(2005) apresenta um esquema no qual busca discutir o processo básico de
conceituação em turismo, incluindo características pouco compreendidas ou
estudadas por outros pesquisadores no âmbito conceitual do turismo (figura 5).
Parte-se do princípio de que, para que ocorra o turismo, deverão existir
alguns princípios básicos ou um conjunto de conceitos que conduzam o praticante
dessa atividade a uma destinação em especial, tendo, dessa maneira, a percepção
do que busca encontrar no local, tendo como origem a motivação.
Mas, para que possa haver a motivação para conhecer e deslocar-se
do seu local de habitação para uma destinação turística, deverá existir um consenso
entre três das partes do esquema apresentado por Molina (2005), conforme figura 5
apresentada na página seguinte. São elas: tempo obrigatório, ócio e tempo livre.
Esses conceitos, na literatura básica sobre o tema, buscam demonstrar aos
pesquisadores a concepção do turismo a partir somente da institucionalização
destes tempos, ou melhor, da separação formal desses períodos para que, então, o
ser humano possa estabelecer qual ou quais motivações irão conduzi-lo ao espaço
turístico.
Waichman (1997) retrata a percepção atribuída ao tempo livre nas
práticas ligadas à recreação, mas, para este estudo, fez-se um recorte conceitual a
partir do tempo livre, pois livre será o tempo entendido como aquele no qual o
homem poderá expressar as suas necessidades e demandas próprias.
Essa afirmação refere-se à liberdade de escolha do homem e o que ele
realiza dentro desse período temporal de ociosidade, não devendo ser condicionado
a atividades ou ações praticadas dentro de padrões sociais obrigatórios. O homem
deverá ser livre nas suas escolhas relativas ao tempo livre, incluindo passeio,
caminhadas, leitura ou estudos, dentre outras inúmeras atividades a serem
realizadas e que poderiam ser enumeradas, mas, a escolha, a eleição, se dará
somente com plena liberdade de escolha, caracterizando assim a percepção
demonstrada pela figura de Molina (2005).
FIGURA 05 – Modelo de definição do conceito de turismo. Fonte: MOLINA, 2005, p. 15.
O tempo obrigatório, o tempo do trabalho e o das ações sociais
obrigatórias não são de livre escolha do homem, mas estão ligados a interesses
sociais e econômicos de acordo com a perspectiva de Paiva (1995), Waichman
(1997), Trigo (1998), Dumazedier (2001), Dias (2003). Essas percepções são
advindas da Revolução Industrial, segundo a qual a compreensão do tempo livre
passa a ser o da implantação da jornada de trabalho, deixando o homem livre para
realizar atividades à sua escolha e que o conduzam a estados não alienantes.
No período anterior à Revolução Industrial, somente caberiam dois
tempos: o tempo desocupado e de ociosidade, pois, não havendo a
institucionalização das fábricas e do salário, o homem produzia apenas para o seu
consumo ou para ir ao encontro dos insumos básicos para a manutenção da vida
(DUMAZEDIER, 2001).
Assim, não se pode conceber o conceito de turismo em períodos
anteriores à Revolução Industrial, pois o homem não fazia diferenciação do tempo
livre – ócio, para com o tempo trabalhado – instituído. O ato de o homem encaixar-
se dentro de padrões societais de consumo e produção o fez desenvolver atividades
que o retirassem dos estados alienantes pungentes nas intermináveis jornadas de
trabalho a serem cumpridas.
Percebe-se, então, que o tempo livre e o ócio são características
inexoráveis do conceito de turismo e, dentro desse pressuposto, Montejano (1996)
descreve uma sequência de funções psicossociais atribuídas ao ócio, as quais
encontram-se em acordo com a classificação proposta por Dumazedier (2001).
São funções psicossociais: função do descanso, função de diversão e
de desenvolvimento. Esta última pode ser interpretada como dúbia ou mesmo como
parte do tempo obrigatório – estudo – mas, os autores a analisam como integrante
do processo de escolha livre do homem, no qual serão eleitas atividades ligadas ao
desenvolvimento intelectual, artístico e físico. Isso demonstra claramente a
preocupação do homem em conhecer locais ligados aos fatores culturais e históricos
e em desenvolver atividades físicas em locais de extrema beleza natural
(DUMAZEDIER, 2001).
Um segundo momento de extrema importância, destacado dentro do
esquema apresentado por Molina (2005) e corroborado por Rodrigues (2001), inclui
os valores, necessidades e expectativas sociais, os quais são justificados ao
analisar a complexidade da conceituação turística.
Esses valores, necessidades e expectativas sociais são apresentados,
ou melhor, são percebidos pelos turistas somente após a ruptura espacial do local
de trabalho/vida do trabalhador, ou com o êxodo do campo para as metrópoles. O
homem parte em busca de outras possibilidades sociais e sensoriais a serem
vivenciadas e, dentro dessa procura, emerge o turismo, como prática social distinta
das tradicionais socialmente reconhecidas ou, mesmo, marginalizadas (NICOLAS,
2001).
Esta visão demonstra a busca do homem por valores distintos
daqueles com os quais está em contato cotidianamente, indo ao encontro de outros
ou mesmo na compreensão daqueles sobre os quais não tem um julgamento
preciso, mas que o conduzem ao entendimento deste. Assim, justifica-se o processo
proposto por Dumazeider (2001) ao afirmar que o homem busca o seu
desenvolvimento intelectual a partir de ações fora do seu espaço cotidiano.
Mas, ao se lançar na busca do conhecimento de outros valores e de
outras culturas, o homem estará se lançando num universo social distinto do seu,
indo ao encontro de culturas e locais que o façam refletir a respeito do seu espaço.
Desta maneira, pode-se compreender que o praticante do turismo se
desloca a partir de um conjunto de motivações intrínsecas baseadas no desejo de
vivenciar o espaço turístico e o conhecimento a ele associado, estabelecendo um
novo cotidiano, distinto do seu local de habitação, mas, relacionado à estrutura
social local (GEIGER, 2001).
Mas tal pensamento deve ser analisado com cautela, uma vez que se
vive em uma sociedade pautada no consumo e orientada para as viagens
(KRIPPENDORF, 2003).
A reflexão iniciada por Krippendorf (2003) corrobora para uma leitura
do conceito de turismo, não a partir do lado individual da escolha da destinação e
dos valores e necessidades a serem satisfeitas, mas sim a partir das expectativas
sociais envolvidas. A sociedade sempre desenvolveu uma segregação social em
relação às escolhas de destinações, principalmente ao realizar a leitura dos
conceitos iniciais propostos pelos autores Dumazeider (2001) e Geiger (2001).
Há destinações elitizadas em que a prática do turismo se dava e ainda
se dá somente para poucos privilegiados economicamente, e destinações populares
em que a prática do turismo se faz dentro da estrutura tempo trabalhado–tempo
livre, marcada pelos períodos de férias escolares e regulamentadas.
Esta análise cria justificativas para que as expectativas sociais dos
praticantes da atividade turística estejam alinhadas com os valores e necessidades
dos praticantes com relação às destinações turísticas consumidas.
Há uma coerção social para o que fazer e onde visitar, questionando o
conceito de liberdade da escolha inerente ao homem. Isso porque se há a liberdade
como conceito norteador do tempo livre, haveria de se ter também plena liberdade
na eleição das destinações pelos praticantes da atividade turística (KRIPPENDORF,
2003).
Contudo, deve-se realizar uma conjugação conceitual temporal,
buscando apresentar o turismo como fruto da Revolução Industrial e, assim, produto
de uma sociedade do consumo e para o consumo, com padrões de comportamento
orientados por grupos sociais mais abastados economicamente, interferindo no
próximo processo destacado por Molina (2005): as manifestações.
Para que haja o deslocamento será necessária a existência de fatores
que motivem o turista para esta ação. Beni (1998) analisa esses fatores como um
conjunto de recursos naturais e culturais presentes na localidade de destino,
também nomeada de núcleo receptor.
Essa análise, segundo o mesmo autor, se dará ainda por meio da
identificação e do estabelecimento das condicionantes da viagem e, por
conseguinte, dos componentes comportamentais que envolvem o turista, como: a
origem da viagem, os meios de transporte utilizados, a natureza da viagem, o tempo
de permanência no local, os equipamentos receptivos solicitados, as motivações e
as necessidades do turista, o grau de participação nas atividades turístico-recreativa,
no núcleo receptor e, por fim, a estratificação a que pertence o consumidor.
Tais observações são concernentes à figura 5 apresentada por Molina
(2005) ao se referir às atividades e ao conjunto de fatores que tendem a motivar ou
a despertar o interesse do turista em relação ao núcleo receptor, dando início ao
processo de conceituação do turismo.
As atrações caracterizam-se como a razão individual para a eleição de
um núcleo receptor, oferecendo ao turista razões para realizar a escolha com base
na motivação individual ou nas manifestações que espera encontrar no núcleo
durante a visita (COOPER et al., 2001).
Contudo, Molina (2005), ao apresentar tal conjunto de fatores
(manifestações ideológicas, políticas, econômicas, sociais, psicológicas e físico-
ambientais), busca apresentar dentro do conceito de turismo as influências que o
núcleo receptor exerce nos turistas, como apresentado por Beni (1998) e Cooper et
al. (2001), despertando o interesse para características que tendem a assumir um
perfil único, invariável de destino para destino.
A primeira influência é realizar a leitura do núcleo receptor como um
amálgama, isto é, um conjunto intrínseco, inseparável, no qual cada elemento
exerce influência sobre o outro e todos influenciando diretamente o turista e suas
motivações. A primeira influência, conforme destacado por Beni (1998), recebe o
nome de atrações ou recursos naturais e culturais. Mas, segundo Cooper et al.
(2001), ainda podem ser observadas amenidades (hospedagem, venda de comida e
bebida, entretenimento, comércio varejista e outros serviços), acesso (transporte
local, terminais de transporte) e serviços auxiliares, sob a forma de empresas e
organizações locais.
Todo esse conjunto tem suas particularidades, mas deve apresentar
um nível de qualidade a ser oferecido ao turista, para que, então, ocorra o despertar
da motivação e do interesse para com o núcleo receptor. Cooper et al. (2001)
inferem na dificuldade de controle, e mesmo de coordenação, de cada um desses
componentes, exigindo um desmembramento teórico, o qual será abordado mais
adiante.
Todo núcleo receptor é formado por experiências culturais a serem
vivenciadas pelo turista, dando à visita uma diferenciação do espaço de origem da
demanda (turista). Não existem, nesse ponto, referências quantificadas. Cooper et
al. (2001) afirmam que essas experiências devem ser encontradas pelo próprio
núcleo, não devendo ser tomadas como experiências padrões, pois, caso fossem,
invalidaria a motivação do turista para ir ao encontro de novas realidades, novas
experiências.
Outro conceito apresentado por Cooper et al. (2001) é a
inseparabilidade do amálgama e da experiência pelos núcleos receptores. Não há
como o estudioso do conceito de turismo desconstruir ou realizar a separação
desses, pois o consumo do amálgama se dá somente dentro do núcleo receptor e as
experiências culturais vão se construindo e sendo percebidas pelos turistas no ato
do consumo, durante todo o período de estada, caracterizando o conceito
apresentado por Molina (2005).
A inseparabilidade conduz à observação de que o turista não é o único
sujeito dentro do núcleo receptor; a população local é agente de todo o desmembrar
dessas particularidades unificadoras dos núcleos receptores. Se o turista busca
vivenciar uma experiência turística, tenderá a buscá-la fora do seu local de origem e
entrando em contato com outra realidade social existente. Cooper et al. (2001)
discutem que, para a ação do turismo, a localidade receptora deverá ser um
organismo social vivo, dotado de um cotidiano que faça sentido para os moradores
locais e, nele, o turista se encaixa temporariamente, vivenciando as manifestações
ideológicas, políticas, econômicas, sociais, psicológicas e físico-ambientais
apresentadas por Molina (2005).
O turista realiza, no seu deslocamento, a busca por novos elementos
da paisagem, espaços construídos e o movimento da vida, atribuindo a esses um
caráter de estranheza ao confrontar com a sua realidade local. Mas, a diferenciação,
a estranheza, é percebida como fator de motivação, ou melhor, como fatores de
atração para o turismo e os núcleos receptores (WAINBERG, 2000).
Assim, deve-se realçar um dos conceitos formulados pela Organização
Mundial do Turismo (OMT), que define o turismo como sendo “a soma de relações e
de serviços resultantes de um câmbio de residência temporário e voluntário
motivado por razões alheias a negócios ou profissionais”, como destacado por
Barreto (1995, p.12). Essas relações são também compreendidas sob a ótica do
planejamento e das implicações econômicas envolvidas, haja vista o destaque para
a motivação dos turistas e visitantes em realizarem o deslocamento para
destinações turísticas. Essa motivação, segundo a conceituação apresentada, deve
ser alheia a negócios ou a profissões, submergindo a atividade turística nos campos
do lazer e do ócio.
Arendit (2000, p. 21) apresenta a definição mais atualizada emitida pela
OMT:
Fenômeno que ocorre quando um ou mais indivíduos se transladam a um ou mais locais diferentes de sua residência habitual por um período maior que 24 horas e menor que 180 dias, sem participar de mercados de trabalho nos locais visitados.
A não participação no mercado de trabalho por turistas e visitantes é
marcada pela atualização da conceituação. Percebe-se, então, que o turismo é uma
atividade que deve ser desenvolvida para o aproveitamento do tempo livre do ser
humano, sob as mais diferentes maneiras de ser organizado.
Também são encontradas em Barreto (1995, p. 14), outras
considerações de grande importância sobre a atividade turística:
(...) elemento essencial para definir o turismo é todo o arcabouço toda a preparação envolvida. Para que uma pessoa possa viajar existe toda uma equipe que faz o planejamento do receptor que presta serviços no local; que providencia as vias de acesso, saneamento básico, alojamento, alimentação e recreação.
Os fatores motivacionais irão agir diretamente para o favorecimento de
planejamentos turísticos em localidades, a fim de suprir os desejos dos turistas e
visitantes: novas atividades, equipamentos de hospedagem, qualificação do setor de
alimentos e bebidas e uma série de outras ações que se façam necessárias para
amparar o turismo no local de sua ocorrência.
4.1 O planejamento turístico e suas interfaces com a organização da atividade
turística
O planejamento deve ser decifrado como um conjunto de ações que
visem projetar, dar ordem a partir de objetivos propostos focados numa realidade
futura (ANSARAH, 2001).
O planejamento conduzido por meio dos objetivos definidos poderá
provocar mudanças estruturais na localidade, visando o aceleramento econômico
dos agentes envolvidos, priorizando a visão conceitual econômica, pois discute a
introdução e a abertura para que o poder privado faça investimentos na localidade
turística, promovendo a geração de renda, de novos postos de emprego e, a
melhora de vida da comunidade local, desde que todo esse desenvolvimento
econômico seja ordenado por um processo planejado (RUSCHAMANN, 2001).
Outra definição importante para este estudo diz respeito ao
planejamento enquanto um processo em constante atuação, utilizando-se de
informação obtida dentro do núcleo receptor e tendo constantes processos
decisórios para as etapas a serem implementadas ou consideradas (PETROCCHI,
2001).
Esse processo de planejar a atividade turística pode ser discutido sob
uma visão sistêmica20, assim como apresentado por Beni (1998), em que cada etapa
é pré-determinada a partir de uma série de objetivos listados para o processo de
planejamento.
Esses autores (BENI, 1998; PETROCCHI, 2001; ANSARAH, 2001)
partem do princípio de que o planejamento envolve ações que visam o
desenvolvimento contínuo da atividade turística, tendo como foco uma visão de
futuro. Esse desenvolvimento continuado deverá ser fixado por meio de ações
determinadas a serem executadas, demonstrando a necessidade de se fixar
20
O sistema de turismo conceituado por Beni (1998) permite a visualização da atividade turística em sua totalidade, compreendendo três macros conjuntos: o das relações ambientais, o da organização estrutural e o das ações operacionais. Cada um destes com desmembramentos e especificidades que são inerentes à atividade turística e sua correlação com o território na qual o turismo se desenvolve.
objetivos e metas consistentes e revisados no decurso do planejamento e de sua
implementação.
Nesse sentido, é importante utilizar um arcabouço científico-
metodológico para o alcance de objetivos e metas a serem perseguidos dentro do
planejamento, no qual a utilização de métodos científicos conduzirão o planejamento
desta atividade a uma maior probabilidade de acertos. Molina e Rodríguez (2001, p.
71) destacam, em relação a esse pensamento, que:
(...) num contexto científico, para chegar a conhecer, mudar e avaliar a
realidade, é necessário organizar e conduzir previamente um processo de
observação, registro e dedução de fenômenos e fatos que sirvam para
identificar e estabelecer hipóteses que, por sua vez, sejam comprovadas
ou rechaçadas pela observação e experimentação. Se estas hipóteses
resistem à comprovação, servirão de base para elaboração de leis, das
quais surgirão, numa ordem dedutiva, teorias e modelos.
O planejamento, a partir da compreensão de Molina e Rodríguez
(2001), assume um caráter de cientificidade apoiado em teorias e conceitos que irão
conduzir o processo de forma cautelosa, buscando minimizar os possíveis erros e
mensurando os impactos de possíveis alterações no ambiente.
Ainda, Beni (1998), Ruschmann (2001), Petrocchi (2001) e Dias (2003)
afirmam que o planejamento turístico não é uma ferramenta ou um conceito de
abrangência somente para uma única localidade, mas há todo um contexto sócio-
geográfico partindo do pressuposto de que as localidades vizinhas se inter-
relacionam e, da mesma maneira, sofrem influências ambivalentes que
compreendem os fatores culturais, econômicos e sociais.
Muito embora o planejamento turístico assuma uma estrutura diferente
em cada área e região a ser aplicado, esse segue um padrão em linhas gerais
partindo da dimensão política, na qual durante todo o processo a ser realizado
deverá ser conduzido, orientado ou coordenado pelo poder público (MOLINA;
RODRIGUEZ, 2001).
O planejamento turístico traduzido em ações empreendidas pelo poder
público se dará por meio da manutenção e ampliação da infra-estrutura básica,
melhoria nas políticas públicas e sociais dentre outras, assegurando que o
desenvolvimento do núcleo turístico receptor seja efetivado pelo Estado (COOPER
et al., 2001).
A orientação do planejamento pelo poder público visa não somente
ordenar a atividade turística, mas garantir que aspectos como o social e o cultural
não sejam marginalizados pela vontade e interesse da iniciativa privada, assumindo
desta maneira o seu viés enquanto uma política pública setorial.
Percebe-se que o planejamento é parte da condução da vida social e
da manutenção do amálgama turístico, ou seja, a infra-estrutura básica de uma
localidade, as atrações turísticas e os serviços turísticos prestados pelos
empresários, compõem esse difuso e complexo amálgama do núcleo receptor
(COOPER et al., 2001).
Desta forma, a execução do planejamento se dará por meio de
programas de ação direcionados às tipologias desde que assumam o caráter
estratégico, tático ou operacional21, pois, a correta compreensão conduzirá o
planejador no discernimento da melhor orientação a ser seguida frente à diversidade
de caminhos e opções. A execução poderá se dar em tempos distintos, isto é, cada
planejamento a ser executado poderá ter um período diferente, assumindo o caráter
de longo, médio ou curto prazo, em conformidade com as necessidades do local ao
qual se aplica (PETROCCHI, 2001).
O termo planejamento, como um instrumento de política do Poder
público, assume uma leitura na dimensão social segundo a qual as ações a serem
realizadas irão impactar diretamente a população local e o seu cotidiano para que se
alcance a diversidade das experiências culturais e a atração de investimentos
econômicos no núcleo receptor. Contudo, segundo Molina e Rodriguez (2001), todo
o processo de planejamento deverá ter como objetivo a manutenção ou o aumento
da qualidade de vida dos envolvidos nas áreas a serem transformadas, pois, caso
contrário, o processo de aculturação da comunidade poderá ocultar ou até
exterminar as experiências culturais a serem perseguidas pelos turistas, retirando o
interesse e a motivação dos turistas em o conhecerem.
Se o processo de planejamento turístico é algo que envolve diversos
atores, situações e empreendimentos é necessário que seja um processo construído
em conjunto, com a participação de todos os envolvidos para que o desenvolvimento
21
De acordo com Petrocchi, (2001, p. 68), os termos estão respectivamente relacionados ao tipo de organização, estabelecendo diagnóstico, objetivos e estratégias, e aos escalões intermediários, subordinados à alta administração, caracterizados por planos setoriais (programas voltados para áreas específicas) e são tarefas executadas dentro de uma empresa.
tanto, econômico quanto o social sejam alcançados por todos de maneira igualitária
e justa.
Esse processo construído em conjunto suscita a prerrogativa da
participação das lideranças locais como sujeitos do processo de planejamento,
implementação, gestão e monitoramento da atividade turística (RODRIGUEZ, 1999).
Assim, a atividade turística e, por conseguinte seu planejamento, deve
ser vista como uma nova possibilidade de geração de trabalho e renda, mas que
promova a interação e a cooperação entre os atores locais, produzindo um valor
agregado intangível (MIELKE, 2010).
Souza (1999) corrobora com os questionamentos apresentados por
Junqueira (1997), Rocha e Santos (2010) e Mielke (2010) no que diz respeito à
heterogeneidade da sociedade e assimetria de poder nos distintos espaços, sejam
públicos ou privados, estatais ou não estatais, colocando em questão a real e livre
participação da população na gestão do turismo local. A resposta deste
questionamento reside nos pensamentos de Mielke (2010, p. 21): “(...) alinhar
pensamentos para que todos tenham o mesmo foco é um processo árduo, exigindo
muita experiência e profissionalismo por parte dos envolvidos”.
O planejamento do turismo, na perspectiva da gestão democrática
participativa, deve ter como princípio a participação e cooperação da comunidade
local e do empresariado para que em conjunto com os entes estatais, possam
construir e conduzir a política pública de turismo.
4.1.1 O processo do planejamento turístico participativo
Pensando de uma forma restrita, o planejamento turístico é instrumento
para a ordenação do produto e da atividade turística local, mediante a visualização
de um sistema de dados e informações gerados a partir de uma visão técnica. Mas
será que somente a visão técnica conseguirá garantir que, de fato, o planejamento
turístico seja efetivado?
Mediante este questionamento é que surge a discussão e a proposição
de novas metodologias que sejam empregadas em prol da ordenação e do
planejamento da atividade turística, isto é, com base nos conhecimentos e práticas
técnicas é possível agregar outros conhecimentos e práticas de diferentes atores
sociais envolvidos, criando outra forma de se pensar e agir o planejamento turístico
mediante a participação social.
Quando se percebe a participação social de diferentes atores sociais
da localidade na qual se pretende organizar ou planejar a atividade turística, espera-
se que o efeito multiplicador na economia local gerado pelo turismo possa vir a
beneficiar um conjunto maior de pessoas e empreendimentos, agregando um maior
número de interessados em discutir e pensar a atividade turística local (DIAS 2003).
A participação social quando empregada no planejamento da atividade
turística não se refere somente ao envolvimento dos atores sociais na condução da
atividade em sua localidade, mas busca empreender uma nova metodologia que
resulte não somente em interpretações e análises técnicas oriundas dos processos
metódicos e tecnicistas do planejamento turístico, mas sim criando amparos para
que a participação social na gestão do turismo possa ser discutida.
Admitindo-se a gestão participativa de um conjunto de diferentes atores
sociais locais no planejamento turístico, espera-se estruturar o desenvolvimento da
comunidade receptora da atividade turística fundamentada num processo de
organização pela e para a comunidade, na qual cada ator social que se envolve
assume o papel de sujeito no direcionamento de ações que tenham o cunho de
estratégias sustentáveis para a destinação turística (CONCEIÇÃO; NUÑEZ, 2007).
Desta maneira, pensar em planejamento participativo para o turismo é
gerar um processo de desenvolvimento que tenha como compromisso ser pensado
de maneira endógena, a partir das realidades do cotidiano, dos anseios e
necessidades da comunidade local, assim como também do envolvimento do setor
produtivo turístico (equipamentos de hospedagem, alimentação, bares,
transportadoras turísticas dentre outros).
Para tanto é preciso que se considere o que venha a ser entendido
como comunidade, para que não se convencione a concepções errôneas ou mesmo
marginalizadoras desse conceito:
(...) comunidade é uma organização de seres interdependentes, mas que se articulam e interagem em relacionamentos existencialmente primários (quando as pessoas mantêm vínculo direto, espontâneo e informal, avaliando e controlando o ambiente comum de sua existência) e secundários (decorrem normas e decisões coletivas, nos quais há um controle externo à pessoalidade de cada indivíduo) (OLIVEIRA, 2008, p. 24).
Para tanto, a comunidade não é somente formada pelos indivíduos,
excluindo o setor privado que movimenta de fato a atividade turística, como também
a comunidade não pode ser vista como um elemento que venha a excluir o setor
público, pelo contrário, é exatamente a reunião de todos esses atores sociais.
De certa maneira, é compreensível que os laços e vínculos primários e
secundários sejam dados a partir da interferência que cada um dos atores sociais
venha a ter com outros pares da própria comunidade e, como ressalta Oliveira
(2008), persiste uma relação de interdependência entre todos aqueles que estão
localizados no perímetro da comunidade.
A partir da perspectiva da interdependência dos diferentes atores
sociais que compõem o espaço da comunidade local, a participação no processo do
planejamento turístico vem recebendo importantes contribuições favoráveis para o
aumento de estratégias que contemplem essa inter-relação entre os diferentes
atores sociais, pois os benefícios e os impactos advindos com a atividade turística
irão refletir diretamente na comunidade receptora.
Pensando desta maneira, o planejamento turístico, quando envolve a
dimensão da participação social, estimulará a consciência dos atores sociais para
uma verdadeira mudança, ou seja, a partir da discussão e participação de um maior
número de atores sociais interessados no desenvolvimento da comunidade local, as
propostas para o planejamento turístico sairão das esferas teóricas e segmentadas e
passarão a ser de responsabilidade de todos os que se envolvem. Além disso,
mediante a participação social no planejamento turístico, almeja-se que as ações
determinadas de médio e longo prazo sejam efetivadas, não caindo no ostracismo
do poder público, o qual, em grande parte, é o executor unilateral do planejamento
turístico (LOCH; WALKOWSKI, 2009).
O planejamento turístico participativo gera uma gestão integrada dos
recursos e ações a serem empreendidos na comunidade local, fazendo com que o
cidadão busque se envolver com o processo em si não objetivando somente o
desenvolvimento econômico da localidade, mas buscando na participação social
uma contribuição para que o turismo possa utilizar os recursos naturais e culturais
da comunidade sem depreciá-los (OLIVEIRA, 2008).
Essa faceta do planejamento turístico participativo é que deve ser
ressaltada quando se percebe que o turismo é uma atividade com grande poder em
prol do desenvolvimento da comunidade receptora: gera novos postos de trabalho,
aumenta o fluxo circular da economia local, atrai novos investimentos, potencializa a
ação dos governos locais em prol das necessidades e dos problemas pontuais de
infra-estrutura básica.
A percepção do planejamento turístico participativo não é criar uma
utopia participativa que irá mediante novos canais de comunicação e interação
resolver todos os problemas da comunidade, mas se torna um forte instrumento para
que o desenvolvimento e a sustentabilidade possam ser inseridos nas agendas
propositivas do turismo local:
Percebe-se então que um dos pontos que viabilizam o processo de desenvolvimento regional se traduz na aplicação de um planejamento, considerando a capacidade de harmonizar as formas de articulação local com uma proposta sustentável que produza raízes na vocação regional e crie uma identidade da população local em relação a idéia de sustentabilidade (CONCEIÇÃO; NUÑEZ, 2007, p. 5).
Harmonizar não significa excluir por total os problemas e necessidades
sinalizados pelos diferentes atores sociais que compõem a comunidade turística
receptora, pelo contrário, significa cria um sistema participativo no qual as
necessidades serão sinalizadas e mediante uma discussão e um processo de
estabelecimento de metas e obrigações cada um dos atores envolvidos tomará para
si a responsabilidade na resolução do problema sinalizado.
Toda essa discussão fica amarrada a uma compreensão das
necessidades democráticas das comunidades locais latino-americanas que almejam
que o desenvolvimento e o crescimento econômico sejam compartilhados com todos
os membros das comunidades:
Uma das necessidades mais prementes das sociedades da região latino-americana consiste em projetar mecanismos para elevar quantitativa e qualitativamente o grau de participação de seus membros e suas instituições em tudo que se refere à identificação de prioridades, estratégias de execução das soluções e avaliação dos resultados obtidos. Fica difícil ascender a um desenvolvimento socioeconômico mais elevado sem estas condições e suas implicações (MOLINA, 2001, p. 123).
A participação social no planejamento turístico não representa uma
discussão dogmática, para além do que pode de fato ser feito em prol da
comunidade turística receptora, mas deve ser compreendida como um novo
mecanismo para a gestão da atividade turística local, promovendo assim a inter-
relação dos diferentes atores sociais, além de promover o desenvolvimento e a
sustentabilidade para todos os atores envolvidos direta e indiretamente na dinâmica
turística.
Assim, a gestão participativa no planejamento turístico deve
reconhecer as complexidades que envolvem a atividade turística em uma
comunidade receptora, para que então possa processar de maneira prioritária para
todo o conjunto de atores envolvidos com se dará o processo de mudanças que
visem o alavancar do desenvolvimento (OLIVEIRA, 2008).
Tendo como elo o compromisso social a ser pactuado entre os
diferentes atores sociais envolvidos na dinâmica do planejamento turístico
participativo, criar-se-á a garantia de que as questões urgentes que venham a
ameaçar a estabilidade da comunidade receptora sejam então resolvidas ou que
venham a ser pauta das discussões desses atores (MOLINA, 2001).
Além da complexidade local existem outras justificativas para que o
processo participativo seja implementado no âmbito da atividade turística, uma vez
que o processo do planejamento turístico tende a um forte caráter centralizador a
partir das abordagens sistêmicas como apresentadas no tópico anterior.
O planejamento turístico centralizado, ou seja, aquele que apresenta o
governo como núcleo da ação e transformação da comunidade turística receptora,
não consegue resolver todos os dilemas e problemas apresentados pela
complexidade de fatores próprios da atividade turística, uma vez que, no processo
de planejamento turístico centralizado fatores como coesão política, participação dos
membros da comunidade, descontinuidade governamental e comprometimento
político não são levados em consideração na etapa de formulação, escrita e
finalização do documento final do planejamento turístico centralizado (ENDRES,
2002).
Os fatores como coesão política e descontinuidade governamental
foram temas já levantados neste estudo quando da discussão das políticas públicas
e sua formulação, e percebe-se que são temas que perpassam outras esferas de
decisão governamental.
A coesão política vista a partir da realidade local pode durante um
período governamental auxiliar e trazer para a comunidade um conjunto de ações,
empreendimentos, serviços públicos que visem contribuir de maneira positiva para o
desenvolvimento do turismo como também a própria comunidade local. Mas se não
houver coesão política na administração pública local, tanto a comunidade
(cidadãos) quanto o empresariado do setor turístico serão olvidados quando da
formulação dos planos políticos do governo local, não se tornando elementos de
discussão e preocupação.
Ainda assim, é preciso que se compreenda que a coesão política e a
descontinuidade governamental afeta diretamente a maneira como o planejamento
turístico é conduzido nas comunidades. No início de uma nova gestão político-
administrativa os planos e ações do antigo governo são colocados de lado e inicia-
se um novo processo de se repensar todas as ações a serem empreendidas
localmente, abandonando com isso as ações e programas já em fase de execução e
apresentação dos primeiros resultados.
Com isso, o desenvolvimento, não só do turismo como da própria
comunidade, sofre ações intervalares: o ciclo de desenvolvimento é interrompido até
que novos projetos sejam construídos e colocados em prática. Obras, serviços
públicos, facilidades de acesso às esferas do poder local são repensados e a
comunidade local e o empresariado se tornam vítimas da morosidade e da
burocracia a ser instalada novamente na gestão político-administrativa.
Não se quer com isso justificar que planejamentos turísticos antigos
não sejam modificados ou que se permaneça continuamente com antigos vícios da
administração pública. Contudo, mediante a participação social dos atores locais, o
planejamento turístico que já venha colhendo bons frutos deve ser continuado e
repensado, mas jamais destruído ou colocado de lado.
A concentração de poder dos governos em poucos atores políticos cria
a base que justifique que novos procedimentos sejam incorporados à realidade local
em prol da melhor dos serviços públicos, incluindo nestes em especial a discussão
do turismo.
Desta maneira para que o planejamento turístico participativo possa ser
implementado na realidade local, este deverá mediante a focalização no
desenvolvimento local ter um conjunto de ações descentralizadas, pois:
(...) planejar significa ser e agir de forma responsável, orientando ações que
contemplem o bem-estar coletivo. Seguindo este raciocínio, entende-se que toda e qualquer atividade deva ser realizada com ética e sem falsas promessas e meras palavras que assegurem expectativas ilusórias apenas para beneficiar instituições. No viés do novo paradigma de desenvolvimento inclusivo, significa ter como meta a melhoria da qualidade de vida e do índice de desenvolvimento humano, descentralizando ações e incorporando preceitos que envolvam a gestão participativa e integrada de todos os envolvidos no processo de planejamento do turismo (OLIVEIRA, 2008, p. 27).
Não é a partir de um sistema político-administrativo que vise atender
somente ao empresariado que deve construir um processo de planejamento
turístico, uma vez que, como já demonstrado anteriormente, o turismo não é uma
atividade que envolve um número ou mesmo somente alguns atores sociais da
comunidade turística receptora, mas que depende de todo um complexo sistema de
inter-relações entre todos da comunidade.
E, não se pode convencionar que o planejamento turístico é um
instrumento que vise a dar respostas imediatas a problemas e às situações
apresentadas por um grupo, pois, se assim fosse, não se trataria de um instrumento
que venha a promover o desenvolvimento e sim somente o crescimento econômico
e social do grupo a ser atendido.
O turismo e, por conseguinte, o planejamento turístico deve ser
pensado a partir da dinâmica da participação social mediante a vontade política de
envolver o maior número possível de atores sociais que de fato possam promover
uma discussão sadia e proveitosa em prol do desenvolvimento do turismo e da
própria comunidade (MOLINA, 2001).
Mas é preciso que se compreenda que o processo do planejamento
turístico participativo, assim como o processo das políticas públicas, representa
vencer as barreiras impostas à vontade política em compartilhar o poder decisório
sobre o que venha a ser feito na comunidade local, demonstrando de maneira clara
como a vontade política pode ser interessada na manutenção dos privilégios
temporais estabelecidos e nas estruturas de poder já arraigadas à administração
política do poder público local (MOLINA 2001).
É preciso que se ressalte que o planejamento participativo é um
instrumento que nasce da vontade coletiva dos atores sociais interessados no
desenvolvimento, tanto da atividade turística quanto da comunidade turística
receptora, não sendo possível subjugar o planejamento turístico somente como ação
técnica, a qual faz com que os envolvidos sejam treinados e disponham de amplo
conhecimento técnico.
Ao justificar o planejamento turístico como um conjunto de técnicas
aprimoradas que tendem a impedir que a comunidade receptora local participe das
decisões a serem empreendidas em prol do turismo, trata-se do reforço do discurso
do poder público em criar barreiras e impedimentos para que outros atores sociais
venham a contribuir de fato para uma melhor compreensão e apresentação de idéias
e sugestões que visem à melhora do produto turístico local (DIAS, 2001).
Ainda pode-se comentar que, frente ao exposto por Bobbio (2004) e
IPEA (2010), ao conceber que o sistema político administrativo do Estado é
composto por um forte vínculo na burocracia e no tecnocratismo para a defesa da
concentração do poder sob alegação de que as classes populares possuem pouco
conhecimento técnico que de fato possa auxiliar à condução de construção de novos
cenários, é preciso que estes desafios sejam vencidos e que o planejamento
turístico participativo possa ser implementado na realidade local.
A situação do distanciamento do planejamento turístico da comunidade
local é referendada na concepção da atividade turística quando compreendida a
partir da perspectiva econômica, ou seja, o turismo acontece a partir dos
equipamentos de hospedagem, alimentação, bares, estabelecimentos de lazer e
entretenimento que são de origem privada, não carecendo da população para a sua
realização. Mas por outro lado, é importante pensar e refletir que é a sociedade local
que será afetada, tanto positivamente como negativamente com a movimentação
turística gerada, necessitando para tanto do envolvimento em prol do planejamento
turístico participativo:
No caso do turismo, o planejamento participativo apresenta-se como uma excelente alternativa para fazer oposição aos excessivos desequilíbrios gerados nos pólos turísticos, especialmente se se leva em conta que neles prolifera a marginalização em suas dimensões ideológicas, cultural, política e econômica (MOLINA, 2001, p. 126).
Dessa maneira, o planejamento da atividade turística deve ser
repensado mediante o envolvimento dos atores sociais locais com seus diferentes
conhecimentos e saberes para que a realidade local, mediante suas peculiaridades
e atrações turísticas, possa servir como bússola para o turismo participativo.
Mediante a fundamentação do planejamento turístico participativo, a
partir da participação ativa da população local, haverá a estimulação da consciência
em prol de mudanças verdadeiras na realidade turística (LOCH; WALKOWSKI,
2009), não sendo citadas ou convencionadas somente aquelas que se referem à
iniciativa privada (empresários do setor turístico), e que se atrelem à infra-estrutura
local, que estejam vinculadas unicamente à atividade turística (estradas,
saneamento e abastecimento de água, fornecimento de energia elétrica dentre
outros exemplos), olvidando as carências e necessidades da comunidade local.
Mas é preciso que as propostas a serem atribuídas e legitimadas no
planejamento turístico participativo saiam das esferas teóricas e sejam postas em
prática mediante a priorização de ações de médio e longo prazo a partir do
levantamento dos recursos a serem utilizados, tanto pelo poder público quanto pela
iniciativa privada, como também pela comunidade local (LOCH; WALKOWSKI,
2009).
A aprendizagem da priorização das atividades e mesmo a utilização
racional dos recursos frente às necessidades de todos os atores sociais legitimados
no planejamento turístico participativo faz com que seja constantemente criado um
sistema de conhecimentos e práticas a respeito do planejamento turístico frente às
necessidades e insatisfações de todos os atores sociais envolvidos (MOLINA, 2001),
favorecendo uma continuidade dos planos e programas resultantes do planejamento
turístico participativo.
O planejamento turístico participativo não representa somente uma
nova ferramenta para incorporar as vontades, necessidade e insatisfações dos
diferentes atores sociais em prol da melhora e continuidade do desenvolvimento da
atividade turística, mas baseia-se no princípio do desenvolvimento regional, ou seja:
O modelo participativo de planejamento do desenvolvimento regional baseia-se na ampliação da base de decisões autônomas por parte dos atores locais, gerando a capacidade de harmonizar as sinergias locais com um plano de desenvolvimento que produza raízes e identidades regionais e com a consciência coletiva de pertencer ao território comum, onde o conceito de espaço seja entendido como um meio constante de transformação (CONCEIÇÃO; NUÑEZ, 2007, p. 3).
Perceber que o território da comunidade receptora local é um meio de
constantes transformações cria a justificativa de que o planejamento turístico deve
compreender as várias dinâmicas sociais que criam e recriam o espaço, além de
abranger o desenvolvimento dos atores sociais e de suas aspirações para com o
espaço e para com a atividade turística.
Todo o posicionamento feito nesta pesquisa faz com que se justifique a
necessidade da implantação do planejamento turístico participativo como redesenho
para que a cidadania seja efetivada por todos os atores sociais da comunidade
turística receptora.
Essa argumentação se baseia no princípio de que a participação social
dos atores locais em prol de processos de planejamento participativo se inscreve
como uma medida para efetivar o direito do indivíduo decidir qual caminho será
trilhado para a construção de seu destino (DIAS, 2001).
Ao entender que o planejamento turístico participativo se inscreve na
esfera da cidadania, está se construindo para os atores sociais locais a efetivação
dos princípios democráticos, ao conceber que todo o espaço deve ser pensando de
maneira conjunta, sem que haja atores sociais com poder maior de resolução das
situações ou com poder maior de interferência na realidade local.
Esse pensamento referenda a posição de Dagnino (2004) do combate
ao mito da falta de preparado da comunidade e dos agentes locais em prol do
processo de planejamento participativo, pois a cidadania deve ser uma ação que
emana das bases da sociedade até os níveis mais altos, fazendo com que os
princípios democráticos sejam efetivados de maneira igualitária.
No contraponto dessa argumentação – o centralismo das decisões e o
tecnocratismo que envolve o planejamento – o planejamento turístico participativo
pode ser vislumbrado a partir da figura 06.
A figura 06 apresenta as três esferas que são discutidas nesta
pesquisa a partir da aplicação da metodologia do planejamento turístico participativo:
o poder público como sendo o núcleo gestor do planejamento e das ações a serem
empreendidas, uma vez que cabe ao mesmo os principais investimentos, em obras
e serviços de infra-estrutura e melhoria na comunidade local receptora da atividade
turística. O setor privado, composto pelos empresários que movimentam direta e
indiretamente a cadeia produtiva do setor turístico mediante a geração de emprego e
renda, além de oferecer os serviços básicos procurados pelos turistas e visitantes
em uma comunidade local receptora.
E, por fim percebe-se a esfera da comunidade local e seus atores
sociais que são afetados direta e indiretamente pelo turismo, compondo também o
corpo de empregos e funcionários dos estabelecimentos turísticos privados, além de
servirem como complemento para o amálgama turístico, podendo ser a cultura local
mais um fator motivacional para a atividade turística.
A área de interseção marcada na figura 06 representa os diferentes
interesses das esferas acima citadas que buscam, mediante uma nova dinâmica, a
resolução dos problemas e/ou a contribuição para o que turismo possa se
desenvolver e crescer trazendo benefícios para todos.
FIGURA 06 – O processo do planejamento turístico participativo. Fonte: adaptado de LOCH; WALKOWSKI, 2009, p. 53.
Mas, essa área de interseção é demonstrada a partir de uma figura
geométrica composta de várias arestas. Tal desenho vem corroborar o pensamento
de que nem sempre a participação social, a articulação e a verbalização das
necessidades laterais de cada esfera serão tomadas como prioritárias, carecendo
sempre de um processo dialógico e mediado para que haja um consenso a favor da
maioria dos atores envolvidos no processo de planejamento turístico participativo.
Trata-se então de um sistema de correlação de forças que busca
sustentar o modelo do planejamento e do enfoque participativo para o turismo entre
os diversos atores sociais que se inserem neste sistema, tendo como objetivo ideal
um futuro melhor para a comunidade receptora turística (DIAS, 2001).
Mas deve-se frisar que, sendo o setor público o núcleo gestor, este
deve ser preocupado em atender às expectativas da comunidade local, além de ser
bem preparado e eficiente no que tange ao desenvolvimento da comunidade em prol
do turismo beneficiando o setor privado e primando para o seu crescimento contínuo
(DIAS, 2001).
O processo do planejamento turístico participativo deve prever como
demonstrado na figura 06, além das constantes trocas de informações e
conhecimentos entre os diferentes atores sociais envolvidos, mecanismos
constantes de retroalimentação (MOLINA, 2001), pois o planejamento turístico não é
um instrumento estático que não possa ser alterado mediante contingências na
realidade local, mas pelo contrário, é um sistema que deve se adaptar às novas
necessidades e prioridades dos atores sociais envolvidos, tanto do poder público,
quando da comunidade e dos empresários.
Com a retroalimentação haverá sempre uma sinergia maior entre os
envolvidos e fortalecendo os vínculos e o interesse em participar constantemente
das decisões descentralizadas do planejamento turístico da localidade, além de
favorecer maior preocupação local para o tema turismo e desenvolvimento não
sendo somente uma ansiedade por parte do poder público e privado, mas sim da
comunidade como de todos.
Para tanto, percebe-se que frente ao exposto o planejamento turístico
participativo pode ser compreendido como uma nova metodologia frente ao
planejamento turístico tradicional, mas que nos últimos anos vêm ganhando força a
partir das novas políticas públicas de turismo que são editadas tanto pelo Governo
Federal brasileiro quanto pelo Governo Estadual de Minas Gerais, assunto este
tratado a seguir.
4.2 Políticas públicas de turismo: novos panoramas e perspectivas
De acordo com Beni (1998), a política de turismo deve ser entendida
como um conjunto de fatores que irão condicionar e dar diretrizes básicas para o
alcance dos objetivos gerais expressados para o incremento e desenvolvimento da
atividade turística em um determinado país. Ainda assim, pode ser compreendido
como as prioridades da ação do Estado em facilitar o planejamento e as atividades
relacionadas direta e indiretamente com o turismo.
Apresentada desta maneira, a política de turismo deve nortear-se por
três grandes áreas que condicionam o pensamento e a organização da política, a
saber: o cultural, o social e o econômico (BENI, 1998).
Num primeiro momento, a política de turismo terá como preocupação o
legado cultural de uma comunidade receptora, região turística ou mesmo de um
país, pois a preservação da cultura representa a preservação futura dos fluxos
turísticos, uma vez que, a movimentação turística existe em função de algo que
desperta o interesse de turistas e visitantes. Sendo a cultura essa fonte
motivacional, deverão os governos locais, regionais ou nacionais criarem um
conjunto de normas que visem à proteção e salva-guarda dessa atratividade.
O legado cultural não se constrói isolado da dimensão social de uma
comunidade receptora turística, mas sim como um sistema vivo no qual a cultura é
criada e recriada pela vivência social da comunidade. A dimensão social faz com
que o turismo crie novas estruturas de pensamento em prol da superação dos
problemas e das necessidades que a comunidade receptora vivencia em seu
cotidiano, mediante a geração de emprego e maior disponibilidade de renda na
economia local.
Assim, quando a política de turismo é implementada de maneira efetiva
para lidar com as dimensões culturais e sociais de uma comunidade receptora,
estar-se-á criando um novo status para que a democracia e a cidadania possam ser
asseguradas como direitos conquistados pela a população local.
E, por fim, a dimensão econômica se encontra vinculada à política de
turismo ao estimular e dinamizar novos empreendimentos turísticos na comunidade
turística receptora, favorecendo o comércio local, o setor de prestação de serviços e
outras atividades comerciais que, direta ou indiretamente, se inter-relacionam com a
atividade turística.
Não mais importante que estimular a atividade turística
local/regional/nacional, a política de turismo, quando efetivada de maneira positiva,
trará ao longo prazo um aumento no volume de transações financeiras, fazendo com
que o produto nacional e a entrada de divisas sejam beneficiados a partir dessa
importante dinâmica econômica que é o turismo.
Entendendo a política de turismo ainda como um conjunto de
intenções, diretrizes e estratégias e/ou ações deliberadas, no âmbito do poder
público, em virtude do objetivo geral de alcançar e/ou dar continuidade ao pleno
desenvolvimento da atividade turística num dado território (CRUZ, 2001), cria-se
uma normatização específica e necessária para que a comunidade receptora local,
regional e/ou nacional não venha a sofrer com o desenvolvimento desenfreado e
sem planejamento.
Mas se o pensamento exposto expressa de maneira positiva a
implantação da política de turismo, pode-se considerar que o seu caminho é mesmo
trilhado por outras políticas públicas setoriais?
A resposta deste questionamento encontra-se na falta de articulação e
de importância que o setor turístico recebeu historicamente do Governo Federal,
diferentemente de outras políticas públicas como saúde, educação e assistência
social (MAIA, 2004), fazendo com que o setor turístico se auto-organizasse a partir
de suas realidades e das redes de poder local (governos municipais/regionais e
empresários) articulando e possibilitando a cada um o favorecimento naquilo que de
fato tinham o interesse: a geração econômica.
A auto-regulação da atividade cria sem a devida normatização a
exclusão contínua e marginalizadora da comunidade local, fazendo com que os
impactos negativos do turismo sejam visualizados: especulação imobiliária,
concentração de renda em um pequeno grupo de atores locais (empresários), falta
de investimentos e má distribuição dos recursos públicos em infra-estrutura local,
marginalização da comunidade local, dentre outras ações negativas advindas com o
turismo.
Para que se crie a proteção e se promova o desenvolvimento das três
dimensões apontadas por Beni (1998) em prol do turismo é necessário que se
reconheça o papel que a CF-88 veio desempenhar frente à problemática da auto-
regulação e dos problemas ocasionados com o turismo:
Para que se cumpram a orientação constitucional de buscar o desenvolvimento social e econômico do país através da atividade turística, foram dados aos Administradores Públicos dos três níveis político-administrativos da Federação (à União, aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios) dois caminhos: (1) promovê-lo e (2) incentivá-lo. Não se trata de alternativas, mas de vias distintas que deverão ser igualmente percorridas. Administradores públicos e legisladores não só devem incentivar o turismo, como também estimulá-lo (MAMEDE, 2004, p. 24).
Colocado desta forma, a atividade turística deve priorizar o
desenvolvimento e crescimento da comunidade turística receptora, mas a partir de
um planejamento que vise a um desenvolvimento sustentável, tanto ambiental
quanto social e cultural, além de criar, a partir da realidade local turística, meios para
que a promoção do destino ocorra.
É mister destacar que ao se referir à promoção, Mamede (2004) não
está se referindo a práticas de publicidade e propaganda (cartazes, folders,
outdoors, mídia em televisão e internet), mas sim, a um conjunto de ações
promovidas de maneira conjunta entre o poder público local, a iniciativa privada e a
comunidade local visando a superação dos problemas que possam vir a ser danosos
para a atividade turística.
Para tanto, enfatiza-se a necessidade do planejamento turístico de
maneira participativa entre os diversos atores sociais, fazendo com que novos laços
sejam feitos entre estes, assim como unir a discussão em prol do desenvolvimento
da comunidade receptora, fortalecendo não somente a infra-estrutura local e a
comunidade, mas sim criando uma comunidade turística mais atrativa e preparada
para recepcionar a atividade turística, tanto no presente quanto no futuro.
Outro ponto destacado por Mamede (2004) é a idéia de incentivar o
turismo na comunidade local: muitas comunidades possuem fatores de atratividade
turística significativos (locais para visitação, áreas naturais, construções histórica,
gastronomia típica, cultura popular dentre outros exemplos) para que se estabeleça
uma movimentação turística, contudo, sem que haja um despertar e um
planejamento desses fatores atrativos a atividade turística continuará sendo apenas
um desejo e uma vontade unilateral de algum ator local.
Incentivar o turismo é então uma prerrogativa do poder público, o qual
deve compreender que a comunidade local pode, mediante o desenvolvimento do
turismo, criar novas possibilidades para o seu crescimento a partir da geração de
novos postos de trabalho, valorização da cultural local, atração de investimentos
externos, e com isso maior possibilidade de investimentos na infra-estrutura local de
serviços públicos.
Como exemplo de incentivos ao turismo, é possível citar os
empréstimos ao setor privado para futuros investimentos nas regiões turísticas em
desenvolvimento ou já desenvolvidas, incentivos fiscais para a fixação de novos
empreendimentos turísticos, diminuição de cargas tributárias específicas ao setor
turístico (DIAS, 2001).
Por outro lado, existirão incentivos praticados pelo Estado que irão
atuar diretamente sobre a comunidade receptora contribuindo para que haja a
expansão da atividade22, maior acesso da comunidade local a espaços de lazer e
entretenimento, além de promoção e estimulo ao turismo social por meio de
associações e organizações sociais mediante a doação de terrenos ou cessão de
espaços públicos para que possam ser transformados em locais de lazer (DIAS,
2001).
O estímulo promovido pelo Estado sobre a comunidade receptora
perpassa pela qualidade, ou seja, ao se compreender que a atividade turística é uma
forte cadeia de serviços a serem prestados diretamente a turistas e visitantes, a
atividade necessitará de um número de pessoas que possam prestar estes serviços
com qualidade. Para tanto, é dever do Estado promover ações que possibilitem que
a comunidade local possa estar apta a essa prestação.
Desta forma, o Estado deve, mediante as suas particularidades,
promover nas comunidades receptoras a oferta de cursos técnicos de qualificação
(guias de turismo, gerenciamento de empreendimentos turísticos etc.), ensino
acadêmico nas modalidades bacharelado e tecnólogo visando à formação de
profissionais aptos a compreenderem a dinâmica e o mercado turístico, estimulando
desta maneira o turismo, a partir de uma visão profissionalizada (MAMEDE, 2004).
Os incentivos educacionais e de formação profissional oferecidos pelo
Estado fazem com que a comunidade turística receptora possa criar, ao longo do
tempo, novos empreendimentos próprios, não carecendo somente dos empresários
externos para a movimentação e o crescimento do setor, possibilitando assim a
autonomia dos atores locais e o seu desenvolvimento como cidadãos de fato.
Assim, assevera-se que o turismo cria uma nova dinâmica para o
interesse e a preocupação do Estado ao considerar que:
O Estado se está preocupado com o desenvolvimento do setor, não pode desprezar tais particularidades, da mesma forma que não pode permitir que os interesses, nem sempre legítimos, de um ou alguns prejudiquem toda uma coletividade (MAMEDE, 2004, p. 25).
Tal pensamento é corroborado por Dias (2001) ao perceber que o
22
A fim de criar mecanismos de atuação direta, o Estado promulgou a Lei Complementar nº 128/2008
que cria a modalidade do Microempreendedor Individual (MEI), legalizando um conjunto de
trabalhadores que viviam à margem do mercado formal de trabalho como vendedores ambulantes,
artesãos dentre outros profissionais que estão inseridos na economia da atividade turística.
Estado é o representante máximo do interesse geral, do interesse de todos, devendo
assim, sob a sua responsabilidade, orientar os caminhos do desenvolvimento
turístico pautado no interesse da coletividade.
Essa discussão é referendada pelos apontamentos já discutidos por
Arretche (1996) e Arendit (2009) ao refletir que a política e, por conseguinte, as
ações do Estado devem sempre proporcionar ao homem a liberdade de suas
escolhas frente à sua realidade; como também referendar que o Estado é o corpo
legal de normas que visa ao combate de práticas clientelistas atendendo sempre ao
que é de todos e para todos.
Sendo assim, pensar em políticas de turismo é se debruçar no policy
cycle e em como a dinâmica dos ciclos deliberativos se justifica mediante o processo
do planejamento turístico participativo, fazendo com que exista uma integração entre
os diferentes atores sociais em prol do estabelecimento de uma agenda de
discussões e assuntos que venham a propor a identificação de problemas e
necessidades inerentes à atividade turística e aos seus desdobramentos em cada
uma das esferas participativas.
Para tanto, reconfigura-se o policy cycle à luz do planejamento turístico
participativo como instrumento interventor para as políticas públicas de turismo,
como demonstrado na figura 07.
A figura 07 apresenta, de forma sintética, a explanação do policy cycle
levando-se em consideração os pensamentos de Frey (2000a), Silva e Melo (2000),
Dias (2001), Molina (2001), Souza (2006), Carade (2009) e Loch e Walkowski
(2009).
No centro da figura 07 encontram-se as esferas representativas das
demandas de uma localidade/região: o Poder Público, o setor privado e a
comunidade e os atores locais, cada qual tendo interesses e objetivos ora
convergentes ora divergentes uns dos outros, mas tendo como elo o interesse pela
atividade e pelo desenvolvimento do turismo.
FIGURA 07 – O policy clycle à luz do planejamento turístico participativo. Fonte: Elaboração própria,
2011.
Na interseção ampliada pela forma geométrica com as arestas
representa o espaço no qual os atores sociais das três esferas se encontram para
debaterem e discutirem em conjunto os caminhos da atividade turística, como
também para pensarem a formulação de políticas públicas para o turismo.
Há que se destacar que a figura 07 declara a intenção democrática na
formulação de políticas públicas de turismo, não se focando nos centralismos
autoritários de alguns governos, tampouco favorecendo a visão tecnocrática do
planejamento turístico; práticas que precisam ser combatidas com o alargamento do
empoderamento dos atores sociais a respeito da cidadania e da vontade e
necessidade em contribuir para o desenho de uma nova sociedade e para o turismo
desenvolvido e sustentável.
A formulação da política pública de turismo, após as contribuições de
todos os atores sociais, é apresentada aos legisladores para que possam fazer sua
aprovação e publicação tornando-a então legal e aplicável. Deve-se atentar para o
fato de que no Brasil a formulação e a implementação são prerrogativas do Poder
Público, reconhecidas pela CF-88.
A implementação, como demonstrada na figura 07, recebe a
delimitação de um grande círculo que envolve as três esferas, tendo a intenção de
mostrar que os efeitos advindos da política pública de turismo serão sentidos por
todos os atores sociais de uma comunidade turística receptora, que a política não é
um instrumento unilateral ou protecionista para um determinado grupo de atores
sociais, mas um instrumento democrático que visa a colaborar para o
desenvolvimento e o crescimento de toda a comunidade.
Assim sendo, as setas internas nas esferas demonstram que todo o
processo de implementação das políticas públicas de turismo deverá sofrer o
processo constante de monitoramento por parte de cada uma das esferas, para que
as ações e objetivos da política sejam efetivados em sua totalidade, evitando com
isso o protecionismo ou a implementação de ações que visem somente um
determinado grupo social.
Por fim, como demonstrado na figura 07, a política pública de turismo
não pode ser compreendida como um instrumento democrático estático, ou seja,
após a sua implementação é necessário que as três esferas estejam a todo o
momento discutindo os planos e programas definidos pela política a fim de perceber
se já não alcançaram seus objetivos e necessitam de novas ações para superar
novos desafios e atender às novas necessidades de cada uma das esferas da
comunidade.
Todo este processo representa um continuum democrático a ser
coordenado pelo Poder Público, pois é este o grande agente capaz de conduzir o
processo de política pública do turismo, ao mesmo tempo em que se compreende
que a política pública de turismo respeita os anseios e necessidades dos atores
sociais de um determinado tempo, precisando sempre ser renovado e incorporando
novos atores no espaço para o planejamento turístico participativo, contribuindo
assim como novas idéias e sugestões em prol do turismo e do desenvolvimento
comunitário.
O processo de implementação de uma política pública de turismo para
a realidade brasileira passou por um longo caminho até ser efetivado levando em
consideração alguns aspectos demonstrados na figura 06. Teve o seu início no ano
de 1938 até o ano de 1966, tendo como resultado um conjunto de diplomas legais
que regulamentavam a atividade turística, além de organizar e fiscalizar os serviços
turísticos internos e externos no Brasil (DIAS, 2001).
Durante o período de 1966 a 1991, foram criados outros instrumentos
legais, em especial o Fundo Geral do Turismo (FUNGETUR), que visava ao
financiamento de projetos especiais vinculados ao desenvolvimento do turismo em
diversas áreas de interesse turístico no Brasil (MAMEDE, 2004).
Já nas décadas de 1970 e 1980, o Governo Federal desperta para
atuação mais vigorosa, no que tange à proteção de áreas de interesse turístico e
bens de valor cultural e natural, mediante planos, programas e ações vinculadas
entre o Conselho Nacional de Turismo (CNTur)23 e a Empresa Brasileira de Turismo
(EMBRATUR)24, fazendo com que a atividade turística passasse a ocupar a agenda
de vários ministérios federais (DIAS, 2001).
O que se percebe ainda nesse período de 1966 a 1991 é uma
centralidade das ações em prol do desenvolvimento turístico: caberia ao Governo
Federal organizar, planejar e coordenar as atividades de turismo em todo o Brasil,
mas tendo o foco nos serviços turísticos de maior movimentação, ou seja, as
transportadoras turísticas (empresas de aviação, transporte rodoviário e ferroviário),
equipamentos de hospedagem (hotéis, pousadas, pensões e outros similares),
equipamentos de alimentos e bebidas (restaurantes, bares, lanchonetes e afins).
Ao mesmo tempo em que se percebe que será o Governo Federal a
determinar quais serão as atrações turísticas a serem preservadas e quais destas
deverão receber incentivos para a sua preservação, demonstrando em como a
comunidade receptora local com seus atores sociais, sua cultura, seus
conhecimentos são colocados em um segundo patamar, ou seja, aquilo que de fato
motiva a existência do turismo não é vislumbrado pelo Governo Federal do período
analisado como algo que carecia de proteção e desenvolvimento.
Mas, a partir da promulgação da CF-88, inicia-se um novo processo de
se pensar e repensar a realidade turística e, no ano de 1992, é promulgado Decreto-
lei nº 448, de 14 de fevereiro de 1992, o qual dispõe a respeito da Política Nacional
de Turismo.
O Art. 2º da Política Nacional de Turismo (PNT) apresenta duas
importantes diretrizes frente ao que se está discutindo nesta pesquisa. Primeiro o
turismo passa a ser pensando como instrumento que visa à promoção da
valorização e preservação dos patrimônios naturais e culturais do Brasil; e em um
23
O Conselho Nacional de Turismo (CNTur) foi criado no ano de 1967, mediante o Decreto-lei 60.224/67, art. 6º e recebendo como atribuição a característica de formular diretrizes a serem obedecidas pela política nacional de turismo (CRUZ, 2001). 24
A EMBRATUR é instituída também no ano de 1967 pelo mesmo Decreto-lei nº 60.224/67, Art. 20, recebendo o objetivo de estudar e propor ao CNTur atos normativos que fossem necessários à promoção da política nacional de turismo (CRUZ, 2001).
segundo momento destaca o beneficiário maior da política e do desenvolvimento do
turismo é o próprio homem.
Estas diretrizes avançam na discussão e na compreensão de que a
atividade turística é em essência uma ação promovida pelo e para o homem,
devendo este ser envolvido diretamente no objetivo do desenvolvimento turístico, e
tendo o mesmo foco de atenção que se dá para os patrimônios naturais e culturais
do Brasil.
A PNT de 1992 apresenta seu conjunto de objetivos:
Art. 3º - A Política Nacional de turismo tem por objetivo: I- democratizar o acesso ao Turismo Nacional, pela incorporação de diferentes segmentos populacionais, de forma a contribuir para a elevação do bem estar das classes de menor poder aquisitivo; II- reduzir as disparidades sociais e econômicas de ordem regional, através do crescimento da oferta de emprego e melhor distribuição de renda; III - aumentar os fluxos turísticos, a taxa de permanência e o gasto médio de turistas estrangeiros no País, mediante maior divulgação do produto brasileiro em mercados com potencial remissivo em nível internacional; IV - difundir novos pontos turísticos, com vistas a diversificar os fluxos entre as Unidades de Federação e beneficiar especialmente as regiões de menor nível de desenvolvimento; V - ampliar e diversificar os equipamentos e serviços turísticos, adequando-os às características socioeconômicas regionais e municipais; VI - estimular o aproveitamento turístico dos recursos naturais e culturais que integram o patrimônio turístico, com vistas à sua valorização e conservação; VII - estimular a criação e implantação de equipamentos destinados a atividades de expressão cultural, serviços de animação turística e outras atrações com capacidade de retenção e prolongamento da permanência dos turistas (BRASIL, 1992).
O conjunto dos objetivos demonstra como o Governo Federal Brasileiro
passa a perceber que o turismo pode se consolidar como uma importante atividade
econômica, além de garantir que a população seja incluída nos processos
democráticos de decisão a fim de criar a diminuição das disparidades sociais e
econômicas regionais.
A atenção para com o produto turístico interno se envereda pelo
desenvolvimento de regiões com menor poder de atração turística já consolidada,
isto é, o Governo Federal compreendendo que a potencialidade turística é
encontrada em diversas áreas dispersas ao longo de todo o território brasileiro, mas
que nem em todas essas áreas o turismo já se encontra estabelecido mediante
investimentos privados e públicos que garantam o acesso e a estadia dos turistas e
visitantes.
Para tanto, ao colocar nos incisos IV e V do Art. 3º, percebe-se que não
somente as regiões turísticas tradicionais irão continuar a receber recursos e
investimentos do Governo Federal, mas a partir de tal colocação passam a ser
incluídos nas agendas em prol do desenvolvimento turístico outras regiões e áreas,
mas levando-se em consideração suas características e peculiaridades.
A partir da aplicabilidade do Decreto-lei nº 448, de 14 de fevereiro de
1992, é possível perceber que se inicia um processo de alteração na condução das
políticas públicas de turismo, passando do estágio de centralização para a
descentralização das ações mediante a implantação do Plano Nacional de Turismo
(PLANTUR), no ano de 1992.
O PLANTUR era em essência um grande plano detalhado de ações a
serem empreendidas pelo poder público a fim de efetivar a Política Nacional de
Turismo a partir de sete programas específicos: Programa Pólos Turísticos,
Programa Turismo Interno, Programa Mercosul, Programa Ecoturismo, Programa
Marketing Institucional, Programa Qualidade e Produtividade do Setor Turístico,
Programa de Formação dos Recursos Humanos para o Turismo. Cada um desses
programas receberam o tratamento de subprogramas com o intuito de facilitar a sua
aplicabilidade nas realidades locais (DIAS, 2001).
Cabe neste momento uma reflexão a respeito de como a teoria do
policy cycle referenda algumas posições futuras frente à implantação e articulação
das políticas públicas com as realidades: o PLANTUR se tornou apenas uma
ferramenta de propaganda do Governo Federal, em 1992, devido ao fato de ter a
sua implementação antes da finalização da Política Nacional de Turismo (DIAS,
2001).
Os dois documentos são de fato imprescindíveis para o
desenvolvimento e para o incremento da atividade turística em diversas áreas ao
longo do território brasileiro. Contudo, o que não se poderia conceber é como o
Governo Federal não soube como conduzir processos tão diferentes no mesmo
período temporal, ocasionando a ineficiência de ambos os instrumentos.
O Governo Federal, percebendo as falhas advindas da falta de
norteamento e condução do processo político-administrativo, tanto da Política
Nacional de Turismo como do PLANTUR, resolve, a partir de 1994, deflagrar um
novo processo de construção de novas diretrizes nacionais para a Política Nacional
de Turismo mediante o Programa Nacional de Municipalização do Turismo (PNMT)
(DIAS, 2001).
O PNMT tinha como princípios a participação social da sociedade local,
dos empresários e do poder público mediante a constituição do Conselho Municipal
de Turismo, criando a dinâmica participativa como elemento de condução do
processo de planejamento turístico, como também enfatizava a necessidade da
municipalização do turismo, isto é, deveria ser o município a discutir e a encontrar as
formas e necessidades específicas para se propor em como o turismo será
trabalhado pela comunidade turística receptora.
Nesta percepção os governos locais passam a ser elementos que
devem agregar, convidar e motivar a comunidade local e seus atores locais, além de
empresários do setor, a participarem de maneira efetiva nas discussões e
proposições do Conselho Municipal de Turismo.
Além do princípio da participação social, o PNMT cria outro instrumento
que visa o empoderamento dos participantes dos conselhos municipais de turismo: o
Fundo Municipal de Turismo (FUMTUR): um fundo financeiro a ser gerido pelos
membros dos conselhos municipais de turismo, recebendo aportes financeiros
advindos de verbas públicas, doações ou geração de recursos próprios, a partir de
outros instrumentos legais municipais a serem instituídos.
Com a aplicação do FUMTUR o que se esperava era que os conselhos
municipais de turismo pudessem ter maior autonomia das estruturas burocráticas
político-administrativas dos municípios, não carecendo das aprovações e dos
interesses políticos para a implantação de programas e ações de cunho municipal
que poderiam contribuir para o desenvolvimento e crescimento da atividade turística.
O PNMT funcionava a partir da seguinte metodologia: os municípios
eram identificados pela EMBRATUR como locais prioritários para o desenvolvimento
do turismo a partir de pesquisas anuais do Relatório de Informação Turística
(RIMTUR); num segundo momento os municípios eram classificados em municípios
turísticos (MT), os que já possuíam fluxo turístico consolidado, além de
apresentarem infra-estrutura turística propícia ao turismo, e em municípios com
potencial turístico (MPT), que seriam os municípios que possuem recursos naturais,
históricos e/ou culturais que poderiam vir a se desenvolver mediante a atividade
turística, fomentando o crescimento socioeconômico do município (DIAS, 2001).
As ações da EMBRATUR eram divididas em dois momentos: para os
municípios turísticos a idéia se concentrava em articular os atores sociais que
deveriam compor o conselho municipal de turismo, treinar esses atores para o
entendimento de como deve ser pensada e empregada a atividade turística de
maneira sustentável na comunidade, além de apresentar a metodologia do
FUMTUR. Ao fim desse processo, havia uma certificação a ser dada pela
EMBRATUR aos municípios turísticos que cumprissem as obrigações estabelecidas
no PNMT, passando assim, oficialmente, a integrarem a rede de municípios do
PNMT.
Já para os municípios com potencial turístico, a EMBRATUR
estabeleceu um estágio inicial diferente: o corpo técnico da EMBRATUR realizava
nestes municípios oficinas de sensibilização para a identificação dos atores sociais
que poderiam dinamizar o desenvolvimento turístico naquela comunidade; depois da
sensibilização era feita a capacitação desses atores sociais para que então
pudessem compreender a dinâmica do conselho municipal de turismo e, ao fim
conseguirem criar o FUMTUR.
O PNMT passa receber ao longo dos seus oito anos de duração, 1994
a 2002, o status de programa mais duradouro e bem sucedido no setor turístico,
uma vez que conseguiu atingir os seguintes números: foram realizadas ao todo
1.107 oficinas em todo o Brasil, capacitando um total de 28.000 agentes municipais,
e tendo o envolvimento direto de 1,5 milhão de voluntários ao longo do período das
realizações das oficinas. E, no ano de 2002, dos 1.529 municípios que foram
listados como municípios com potencial turístico (MPT), 1.450 ainda apresentavam
engajamento junto ao PNMT (EMBRATUR, 2002).
Este programa é um exemplo de que a partir da participação social, do
empoderamento dos atores sociais e da abertura de espaços dinâmicos de
participação e diálogo. Serve para fazer crer que o desenvolvimento do turismo não
pode ser convencionado somente às estruturas tecnocráticas, mas sim que emana
da comunidade local e das bases comunitárias os saberes, o conhecimento e as
idéias para que de fato o turismo possa crescer e se desenvolver de maneira
sustentável e propícia a todos.
Para que a política pública de turismo possa gerar benefícios às
comunidades que baseiam suas atividades no turismo é preciso levar em
consideração as diferenças existentes em toda a área geográfica brasileira: áreas
turistas com diferentes fatores de atratividade, isto é, a cultura, as atrações
históricas, os atrativos naturais. A partir de tal quadro, o Ministério do Turismo
formulou para o período de 2003-2007 a Política Nacional de Turismo com as
diretrizes e metas para que o turismo possa atuar como indutor do desenvolvimento
sócio-econômico do país (MINISTÉRIO DO TURISMO, 2007).
Com vistas à articulação da Política Nacional de Turismo, foi lançado
em junho de 2007, o Programa de Regionalização do Turismo, que em seu cerne
apresenta os seguintes ideais:
(...) induz à cooperação e complementaridade das atividades econômicas relacionadas ao turismo, na respectiva região e, busca superar as estratégias de competição entre localidades, de modo a convalidar a construção de laços de solidariedade e de associativismo (MINISTÉRIO DO TURISMO, 2007, p. 24).
O Programa de Regionalização do Turismo de acordo com o Ministério
do Turismo (2007), incentiva e apóia a formação de redes locais de colaboração
para que a competição entre as localidades turísticas possa ser minimizada. Além
disso, estimula o fortalecimento de laços ampliando a produtividade e distribuindo o
fluxo turístico, buscando promover a redução de custos da cadeia produtiva
envolvida e a facilitação no acesso às inovações tecnológicas e a novos mercados
e, por fim, a troca de experiências e de informações entre os membros integrantes
da rede.
A gestão municipal é priorizada pelo Programa de Regionalização do
Turismo, uma vez que compreende que a esfera municipal deve ser o agente de
nucleação das decisões, pois ao perceber que o desenvolvimento do turismo carece
de um conjunto de instrumentos legais, investimentos financeiros e articulação com
outras esferas do poder público, é esta que deverá criar tais instrumentos
possibilitando que o planejamento turístico possa ser efetivado a partir das diretrizes
do Programa. Necessita-se assim de um aparato político-administrativo que seja
responsável pela efetivação dessas ações (BRASIL, 2010a).
Tal medida pode transparecer, num primeiro momento, como uma
análise pseudo-justificativa para a centralização das decisões e ações no poder
público municipal. Contudo, o Programa de Regionalização do Turismo prevê que
seja implementado o Plano Municipal de Desenvolvimento Sustentável do Turismo:
instrumento democrático a ser confeccionado pelo conjunto dos diferentes atores
sociais que de fato estão integrados e engajados no desenvolvimento do turismo.
A ênfase não é colocar o município como centro da efetivação, mas
passa a colocá-lo como figura principal e que deverá sofrer, a todo o momento, o
monitoramento e avaliação por parte dos atores sociais que compõem a estrutura
participativa do turismo no município, vistoriando e avaliando se as ações propostas
no plano municipal estão evoluindo e auxiliando o desenvolvimento do turismo
municipal.
O monitoramento e a avaliação constante por parte dos atores sociais,
tanto das ações do poder público local, quanto do Plano Municipal de
Desenvolvimento Sustentável, faz com que seja gerado o conhecimento da gestão
de impactos (BRASIL, 2010): perceber como o turismo vem afetando, tanto
positivamente quanto negativamente, a comunidade e intervir para que os efeitos
positivos possam ser dinamizados para um maior número de pessoas, tanto como
agir prontamente quando identificadas as causas dos impactos negativos.
O conjunto dessas ações de monitoramento e avaliação cria a
sustentabilidade do processo do plano municipal de desenvolvimento, uma vez que,
o plano deve ser um instrumento que seja capaz de articular a realidade local com
os objetivos futuros a serem alcançados, mas deve ser também capaz de ser
modificável mediante cada novo estágio de desenvolvimento e crescimento, tanto da
comunidade local quanto da atividade turística.
Assim, o Programa de Regionalização do Turismo cria as bases
municipais para que, ao se discutir e pensar o turismo de forma regional estar-se-á
discutindo o desenvolvimento com a participação de atores sociais com alto grau de
empoderamento, conhecimento de suas potencialidades e atratividades turísticas,
podendo garantir que a discussão regional seja feita para proporcionar uma maior
distribuição dos recursos financeiros gerados pela movimentação turística, assim
como fazer com que os benefícios promovidos pelo turismo sejam efetivados para
todos os municípios e munícipes.
Outro ponto que merece destaque no Programa de Regionalização do
Turismo é a característica de descentralizar a gestão do turismo a partir do
estabelecimento de governanças regionais, isto porque, mediante os efeitos
positivos advindo com o PNMT, com o desenvolvimento dos municípios turísticos e
dos municípios com potencial turístico em municípios turístico, o Governo Federal
compreendeu que a ênfase do processo de desenvolvimento deve ser botton-up
(debaixo para cima), partindo dos atores sociais da comunidade local, do
empresariado e do poder público local o estabelecimento de agendas próprias em
favor do turismo e do seu desenvolvimento.
Assim, a descentralização e as ações em prol do desenvolvimento
regional se dão mediante o estabelecimento de uma governança regional que
agrupará todos os municípios que irão compor a região turística a ser integrante do
Programa de Regionalização do Turismo, mas compreendo que por governança
regional entende-se:
Instância de Governança Regional é uma organização social com participação do poder público e dos atores privados da atividade turística, com o papel de fazer a gestão do turismo, com visão de sustentabilidade e também coordenar o Programa de Regionalização na região (BRASIL, 2010b, p. 87).
O processo de estabelecimento da instância de governança regional
deverá sempre primar pela transparência dos processos político-administrativos
(BRASIL, 2010b), fazendo com que todos os atores sociais, cada qual representante
de uma realidade diferente, possam encontrar neste espaço o local para a troca de
informação, formação de conhecimento e motivação para a continuação do processo
de regionalização do turismo.
Como vem sendo apregoado pelo processo do planejamento turístico
participativo, o Programa de Regionalização do Turismo deve ser embasado num
constante processo de representatividade dos setores envolvidos com a atividade
turística, de maneira a garantir que todo o envolvimento se dará de maneira
participativa e compartilhada entre os atores sociais (BRASIL, 2010b).
Se a participação social em áreas como a saúde, educação e
assistência social ainda sofre desafios e problemas para estabelecer instâncias
participativas, democráticas, transparentes, é compreensível que críticas sejam
possíveis às políticas públicas de turismo e aos programas que estão sendo
executados, mas deve-se pensar que se trata de um processo a ser construído pela
sociedade civil, poder público e empresariado em prol não somente do
desenvolvimento do turismo, mas em fazer com que a sociedade, de maneira geral,
possa ser dotada de novos valores ou mesmo recuperar certos valores perdidos ao
longo do tempo.
Descentralizar as políticas públicas de turismo é um desafio novo para
o Brasil democrático e para os diferentes interesses que movem a atividade turística
nas comunidades e nos municípios turísticos, mas que a partir dessas novas
experiências e resultados favorece à continuação dos programas e planos, além de
servir como uma postura de empoderamento para a sociedade como um todo,
movendo-a sempre à frente e tendo como guia a democracia e a cidadania como
luzes nesse trajeto.
4.2.1 Políticas públicas e participação social para o desenvolvimento do turismo no
estado de Minas Gerais
O Estado de Minas Gerais vem desenvolvendo ações que possibilitam
que as políticas públicas voltadas para o incremento e desenvolvimento do setor
turístico possam de fato contemplar a participação social nos processos decisórios.
Uma destas ações foi a criação da Secretaria de Estado de Turismo de Minas
Gerais (SETUR), por meio da Lei Estadual no 13.341, de 28 de outubro de 1999
(MINAS GERAIS, 1999).
Nesta Lei Estadual, o Governo de Minas Gerais estabelece que a
Política Estadual de Turismo deve ser implementada por meio de um sistema de
descentralização da participação. Define que a participação de órgãos públicos,
entidades afins com o Governo Estadual de Minas Gerais, dos representantes dos
poderes públicos municipais e da iniciativa privada deverão, em conjunto planejar e
organizar o desenvolvimento da atividade turística no estado (BOLSON; ÁLVARES,
2005).
A descentralização em Minas Gerais recebe outro incentivo por parte
do Governo Estadual com a criação dos Circuitos Turísticos Mineiros, visto que, por
possuir uma enorme área geográfica, o ordenamento, programas e o planejamento
de ações não poderiam unicamente partir da SETUR, mas sim das instâncias locais
de poder a partir de suas realidades.
Para uma melhor compreensão dos Circuitos Turísticos, o site do
Circuito Turístico Trilha dos Inconfidentes apresenta a seguinte definição:
Circuito Turístico é o fruto da implementação de um planejamento integral, que envolve um conjunto de municípios de uma mesma região, com afinidades culturais, sociais e econômicas que se unem para organizar e desenvolver a atividade turística regional de forma sustentável, através da integração contínua dos municípios consolidando uma atividade regional (CIRCUITO TURÍSTICO TRILHA DOS INCONFIDENTES, 2010a, s/p.).
Contudo, a simples organização ou instituição de um Circuito Turístico
em uma dada região geográfica de Minas Gerais pode vir a não representar de fato
a execução da política pública mineira em prol do desenvolvimento da atividade
turística. No ano de 2003, o Governo de Minas Gerais estabelece o processo de
reconhecimento dos Circuitos Turísticos.
O reconhecimento dos Circuitos Turísticos é dado pelo Decreto-lei no
43.321, de 08 de maio de 2003, em cujo texto fica determinado o caráter obrigatório
da participação em circuitos turísticos de municípios mineiros que por ventura
tenham interesse em angariar recursos financeiros voltados para o planejamento e
promoção do turismo (MINAS GERAIS, 2003).
Tal medida se fez necessária para dar sustentabilidade aos circuitos
turísticos que se viam esvaziados da participação de representantes do poder
público municipal e, tornavam-se simplesmente instituições inativas. Isto é, não
existiam ações concretas para a proposta de regionalização e desenvolvimento da
atividade turística e, para permitir o monitoramento, por parte da SETUR, da gestão
dos circuitos.
O processo de reconhecimento dos circuitos turísticos ganha, no ano
de 2008, por meio da Resolução da SETUR no 008 (MINAS GERAIS, 2008), outras
normas e critérios, profissionalizando o setor turístico e, por conseguinte, a forma
como o turismo em Minas Gerais é planejado. Neste sentido, Bolson e Álvares
(2005) destacam que, com a regionalização do turismo a partir dos circuitos
turísticos e, em momento posterior, por meio dos processos de certificação dos
circuitos turísticos, a SETUR criou condições para uma nova atuação nos municípios
mineiros, fomentando assim o planejamento do turismo a partir das realidades locais
e com os atores locais.
Emerge assim, uma compreensão do novo papel do Estado, não mais
como centralizador do poder e das decisões, mas como um elo de uma corrente que
é constituída pelo setor privado, pelos membros das comunidades, das
organizações civis e de outros integrantes que buscam assumir suas
responsabilidades, mas que compartilham o poder, possibilitando desta maneira,
segundo o Circuito Turístico Trilha dos Inconfidentes (2010a, s/p.), o envolvimento e
o desenvolver de uma postura proativa dos integrantes na resolução dos problemas,
a partir de uma ótica da corresponsabilidade.
Os Circuitos Turísticos em Minas Gerais representam de acordo com
Gohn (2007), espaços públicos novos para a operacionalização das políticas
públicas de maneira participativa, integrando-se à discussão do desenvolvimento
local empreendida anteriormente.
Costa (2002) diz que para a consolidação e a construção de uma nova
sociedade, deve haver espaços públicos porosos, isto é, que permitam que a
sociedade civil e o Estado possam dialogar a respeito dos problemas que permeiam
o cotidiano das pessoas. Este espaço deve ser uma arena para a propagação de
conhecimentos e saberes que alimentam tanto a sociedade civil quanto o Estado,
criando uma sinergia benéfica para ambos.
Mas para que os Circuitos Turísticos possam ser vistos como espaços
públicos de diálogo, é preciso observar que a cultura democrática, isto é, que a
busca pelos direitos, passa pela formação de um novo sujeito social que é, na visão
de Dagnino (2004), aquele que compreende a sua participação como um processo
voltado para a mudança, para a luta da ampliação dos espaços da política e,
servindo assim como um instrumento para a construção de uma nação democrática
de fato.
É, este novo sujeito social que irá participar das discussões e reuniões
dos Circuitos Turísticos buscando reforçar a conquista de seus direitos e deveres a
partir de uma posição cidadã, imbuída da essência do conceito de cidadania, que se
baseia segundo Carvalho (2008) no amálgama dos direitos civis, dos direitos
políticos e dos direitos sociais formando um conjunto de direitos que buscarão
assegurar aos cidadãos o amparo legal de suas necessidades, desejos e
aspirações.
O conceito de cidadania é reforçado por Boneti (2007) frente à
participação dos atores sociais nos Circuitos Turísticos mineiros, o qual deve ser
pautado pela consciência do local, pelo conviver e viver na e para a coletividade,
pelo pertencer a grupos e organizações sociais e, pela percepção do direito ao
acesso igualitário aos bens e serviços sociais produzidos socialmente.
A qualidade cívica da participação dos atores sociais nos Circuitos
Turísticos é revestida, também, de um caráter pedagógico, conforme afirma
Kauchakje (2007, p. 90): “(...) caráter pedagógico inserido no processo de
aprendizado da participação cidadã, mas, sobretudo, seu caráter pedagógico
propicia a constituição de sujeitos criativos na própria constituição da realidade
social”.
Dowbor (2006) diz que o sujeito social pode realizar a transformação
econômica e social a partir da sua realidade, necessitando para isso que a idéia de
educação voltada para o desenvolvimento local capacitaria pessoas, tornando-as
aptas para participar de forma mais ativa dos espaços públicos que permitam a
transformação, o desenvolvimento. Entende-se que os Circuitos Turísticos em Minas
Gerais se configuram em um desses espaços.
Paiva (2002) reforça o entendimento de que os sujeitos sociais alijados
do processo econômico e social encontram nos processo de participação, entre eles
nos movimentos sociais, o conhecimento e o saber antes negado de maneira formal
e, que este processo de aprendizagem o faz sujeito de sua vida e protagonista de
mudanças sociais.
Esta mudança de comportamento social permite o que Kauchakje
(2007) e Gohn (2007) definem como empoderamento, ou seja, os atores sociais
através de sua participação ativa em espaços públicos de discussões conquistam o
atendimento de suas necessidades, o respeito por suas identidades e diferenças
culturais e, resgatam a auto-estima e fortalecem o sentimento de pertencimento a
uma dada comunidade local.
O processo de desenvolvimento turístico local no estado de Minas
Gerais, através da gestão social dos Circuitos Turísticos, é consolidado a partir das
novas legislações que se esmeram em evidenciar o envolvimento e a participação
da base comunitária nos processos decisórios da condução da atividade turística
nos municípios mineiros, reforçando o pensamento exposto por Mielke (2010, p. 24):
Está claro que, quando a comunidade já se apresenta organizada politicamente, havendo um avançado estágio de cooperação e empoderamento, processo de inserção e estruturação estratégico do turismo torna-se mais fácil. Porém, o que normalmente ocorre é justamente o contrário. Tendo ainda o agravante de a atividade turística não ser o negócio principal da comunidade.
Compreender os Circuitos Turísticos em Minas Gerais como espaços
de diálogo que promovam a cidadania e a educação é conceber uma visão
aprofundada a respeito dos processos de desenvolvimento das políticas públicas
estaduais voltadas para a descentralização de suas ações e, apresentando às
comunidades a possibilidade da construção, em conjunto, do desenvolvimento local.
Mas é necessário sinalizar que todo este processo é construído a longo
prazo e com esforços tanto da comunidade local, que recebe e ampara este
processo, quanto do Estado, que possui uma visão descontínua das políticas
públicas, que são interrompidas a cada quatro anos, de acordo com o ciclo
democrático das eleições.
Para que ocorra o planejamento turístico participativo nos espaços dos
circuitos turísticos, são necessários recursos financeiros para que os programas e
ações concebidos pelos circuitos turísticos e, por conseguinte, pelos municípios
mineiros, possam de fato estimular a geração de emprego e renda aos munícipes e
oferecer aos turistas e visitantes atrativos e infra-estrutura de qualidade.
É com este intuito que o Governo de Minas Gerais cria novos
mecanismos de distribuição de recursos aos municípios. Através da Lei Estadual n.o
18.030 de 12 de janeiro de 2009 (MINAS GERAIS, 2009), possibilitam novas
destinações a parcelas da receita do produto da arrecadação do imposto sobre
operações relativas à circulação de mercadorias e sobre prestações de serviços de
transporte interestadual, intermunicipal e de comunicação (ICMS), incluindo o setor
de turismo.
No artigo 9o, da Lei Estadual no 18.030/2009 (MINAS GERAIS, 2009),
ficam estabelecidos os critérios de valores decorrentes da aplicação dos percentuais
destinados à atividade turística:
§ 1º - Para se habilitar à participação no critério "turismo", o Município deverá: I - participar do Programa de Regionalização do Turismo da SETUR; II - elaborar uma política municipal de turismo; III - constituir e manter em regular funcionamento o Conselho Municipal de Turismo e o Fundo Municipal de Turismo (MINAS GERAIS, 2009).
No decurso das políticas públicas mineiras, os incisos I, II e III da Lei
Estadual no 18.030/2009 (MINAS GERAIS, 2009), servem como elementos
fomentadores para que a descentralização e a participação popular se firmem como
elementos agregadores de novas posturas e condutas para o planejamento turístico,
por parte dos municípios integrantes dos circuitos turísticos.
O simples fato de participar de circuito turístico certificado segundo a
Resolução da SETUR no 008/2008 (MINAS GERAIS, 2008), não significa possuir um
processo de planejamento e de ações concretas que visem a estimular o setor de
turismo. Mas, para aqueles municípios realmente engajados com o processo de
desenvolvimento regional e dos circuitos turísticos, o governo estadual de Minas cria
um estímulo financeiro compensador.
As exigências apresentadas pela Lei Estadual no 18.030/2009 (MINAS
GERAIS, 2009) são aludidas por Bolson e Álvares (2005), quando estes analisaram
a estrutura para o planejamento turísticos nos municípios mineiros participantes de
circuitos turísticos pertencentes à área geográfica da Estrada Real.
Bolson e Álvares (2005) apresentam que 52,2% dos municípios não
possuíam o conselho municipal de turismo instituído, refletindo uma idéia de que a
simples participação no circuito turístico iria sanar as deficiências municipais no
tocante ao processo de planejamento turístico e, pode-se ainda dizer que por falta
de conhecimento dos gestores municipais a respeito da importância do que
representam os conselhos municipais de turismo, os mesmos não eram constituídos.
Se o processo de regionalização faz com que haja uma estrutura e
espaços democráticos de participação e inclusão social, os conselhos municipais de
turismo são os instrumentos para que as decisões e os programas planejados no
circuito turístico possam ser verbalizados através das realidades locais, mediante
ações específicas.
A Lei Estadual no 18.030/2009 não informava aos gestores municipais
quando seria criada a sua regulamentação específica, criando uma expectativa nos
municípios que já atendiam aos incisos I, II e III, do § 1o, do Art. 9o (MINAS GERAIS,
2009), e permitindo aos demais municípios participantes de circuitos turísticos
certificados o encaminhando de ações para o cumprimento das necessidades legais.
A resposta para a regulamentação foi promulgada em 18 de junho de
2010, por meio do Decreto-lei de no 45.403 da SETUR (MINAS GERAIS, 2010), o
qual regulamenta o critério “turismo” da Lei no 18.030/2009 (MINAS GERAIS, 2009),
e que em seu artigo 3o apresenta a seguinte redação:
Art. 3º São requisitos mínimos para habilitação do Município: I - participar do Programa de Regionalização do Turismo da SETUR; II - possuir uma política municipal de turismo; III - possuir e manter em regular funcionamento o Conselho Municipal de Turismo e o Fundo Municipal de Turismo (MINAS GERAIS, 2010).
O Governo de Minas Gerais, por meio de seus colaboradores da
SETUR, apresentou discretas alterações na redação dos incisos II e III do § 1o, do
Art. 9o da Lei Estadual no 18.030/2009 (MINAS GERAIS, 2009), o que na redação
anterior era uma proposição, agora se torna uma obrigação, tanto a política
municipal de turismo quando o conselho municipal de turismo e o fundo municipal de
turismo.
Essa discreta alteração na redação dos verbos faz com que muitos
municípios mineiros participantes de circuitos turísticos certificados não consigam
protocolar até a data de 15 de julho de 2010, conforme data limite estabelecida no §
5o, do Art. 9o da Lei Estadual no 18.030/2009 (MINAS GERAIS, 2009) e referendado
no Art. 8o do Decreto-lei no 45.403 da SETUR (MINAS GERAIS, 2010), os
documentos necessários para a habilitação e aprovação da destinação da parcela
do ICMS destinado ao incremento da atividade turística municipal.
Contudo, a legislação turística não veda ou proíbe novos pedidos de
participação ao ICMS Turístico. Apenas veda a participação dos municípios ao
volume financeiro para o ano de 2011, mas nada impedindo a sua participação para
o ano de 2012, e assim por diante.
Para tanto, apresenta-se a tabela 01 com o resultado obtido pelos
municípios participantes dos circuitos turísticos mineiros que conseguiram ser
inscritos para a obtenção dos recursos financeiros a serem gerados no ano de 2011
a partir do ICMS Turístico.
Esses dados permitem que sejam observados que, para o primeiro ano
de vigência da Lei Estadual n.o 18.030/2009 (MINAS GERAIS, 2009) e do Decreto-
lei no 45.403 da SETUR (MINAS GERAIS, 2010), um conjunto de municípios passa a
receber benefícios financeiros direto do Governo do Estado de Minas Gerais,
corroborando o fortalecimento dos cumprimentos legais em vigor, além de
demonstrar que a participação social está sendo efetivada nas instâncias de
governança municipais a partir da análise turística.
Mas ao mesmo tempo, quando analisada a tabela 01 com o número
total de circuitos turísticos inscritos no perímetro do Estado de Minas Gerais,
percebe-se que a partir do gráfico 01, somente 17 circuitos turísticos conseguiram
atender aos requisitos estabelecidos pelos documentos legais para o recebimento
dos benefícios financeiros oriundos do repasse do ICMS. Do total dos municípios
percebe-se que somente 44 estão engajados com o desenvolvimento turístico a
partir dos princípios da descentralização, regionalização, municipalização e
planejamento turístico participativo.
TABELA 01 – Municípios aprovados para o recebimento do ICMS 2010/2011.
Fonte: SETUR, 2011, s/p.
A leitura do gráfico 01 demonstra de maneira clara a necessidade de
avançar em muito para que a gestões regionais dos circuitos turísticos possam se
efetivar e conseguir que os princípios da municipalização e da participação social
N° Município Circuito Turístico
1 Alfredo Vasconcelos Trilha dos Inconfidentes 2 Angelândia Pedras Preciosas 3 Antonio Carlos Trilha dos Inconfidentes 4 Araporã Águas Do Cerrado 5 Argirita Serras E Cachoeiras 6 Bueno Brandão Serras Verdes Do Sul De Minas 7 Cachoeira de Minas Serras Verdes Do Sul De Minas 8 Cachoeira Dourada Águas Do Cerrado 9 Camanducaia Serras Verdes Do Sul De Minas 10 Cambuí Serras Verdes Do Sul De Minas 11 Capelinha Pedras Preciosas 12 Capitólio Nascentes Das Gerais 13 Caratinga Rota do Muriqui 14 Carmo de Minas Das Águas 15 Catas Altas da Noruega Villas e Fazendas 16 Caxambu Das Águas 17 Chapada do Norte Lago De Irapé 18 Conceição da Barra de Minas Trilha dos Inconfidentes 19 Coronel Xavier Chaves Trilha dos Inconfidentes 20 Cristália Lago De Irapé 21 Datas Diamantes 22 Dores de Campos Trilha dos Inconfidentes 23 Felício dos Santos Diamantes 24 Gonçalves Serras Verdes Do Sul De Minas 25 Grão Mogol Lago de Irapé 26 Ipanema Rota do Muriqui 27 Ipuiúna Caminhos Gerais 28 Jequeri Montanhas E Fé 29 Lagoa Dourada Trilha dos Inconfidentes 30 Passa Quatro Terras Altas Da Mantiqueira 31 Piedade de Caratinga Rota do Muriqui 32 Poços de Caldas Caminhos Gerais 33 Pouso Alegre Serras Verdes Do Sul De Minas 34 Sabará Ouro 35 Sacramento Da Canastra 36 Santa Rita de Minas Rota do Muriqui 37 São Tiago Trilha dos Inconfidentes 38 Sapucaí Mirim Serras Verdes Do Sul De Minas 39 Simonésia Pico da Bandeira 40 Tocos do Moji Serras Verdes Do Sul De Minas 41 Turmalina Lago De Irapé 42 Uberlândia Triangulo Mineiro 43 Varginha Vale Verde e Quedas D'Água 44 Virgolândia Trilhas do Rio Doce
sejam efetivados em maior proporção, pois se o Estado de Minas Gerais é dividido
em 46 circuitos turísticos e somente 17 circuitos foram contemplados, ou seja,
somente 37% do total dos circuitos irão receber os benefícios gerados.
GRÁFICO 01 – Relação dos Circuitos Turísticos e Municípios contemplados com o ICMS Turístico 2010/2011. Fonte: Elaboração própria, 2011.
Para um primeiro ano de vigência de legislação do ICMS Turístico,
pode-se dizer que o índice alcançado é satisfatório, mas quando se compreende que
os circuitos turísticos mineiros, a formação de instâncias regionais de governança e
a descentralização, municipalização e participação social são conceitos que estão
sendo trabalhados desde o ano 1999, quando se deu início todo esse processo de
formação de circuitos.
Percebe-se que o Governo do Estado de Minas Gerais mediante a
Secretaria de Estado do Turismo, os gestores e presidentes de cada circuito turístico
assim como os governos municipais, comunidade e empresários necessitam alinhar
suas praticas e receberem maior atenção para a mobilização em prol do
planejamento turístico participativo, aumentando para os próximos anos o índice dos
circuitos turísticos mineiros atendidos pelo ICMS Turístico.
Ora, se o Estado de Minas Gerais possui um total de 853 municípios, e
se somente 44 conseguiram obter a aprovação para o recebimento do ICMS
Turístico, pode-se concluir que somente 5,2% dos municípios estão sendo
agraciados com os benefícios financeiros, sinalizando que há um longo caminho em
prol da democratização do turismo nos municípios e que para os próximos anos o
volume financeiro dividido deverá sofrer uma redivisão, caso haja o aumento de
municípios que cumpram as determinações dos dispositivos legais em vigor no
Estado de Minas Gerais no tocante ao ICMS Turístico.
Mas é preciso que se compreenda que a distribuição dos recursos
financeiros do Governo do Estado de Minas Gerais para os municípios que
atenderam aos requisitos legislados com relação ao ICMS Turístico faz com que se
repense o desenvolvimento turístico local e mesmo o aumento dos investimentos
dos governos municipais para com a atividade turística, uma vez que, se antes não
havia qualquer instrumento legal que apoiasse financeiramente o turismo, a partir do
ano de 2011 o desenvolvimento turístico passa a ser apoiado e financiado com
recursos públicos.
Ao mesmo tempo se compreende que os municípios mineiros que
atenderam à legislação do ICMS Turístico conseguirão legitimar um conjunto maior
de ações municipais e locais em prol do turismo, visto que, os conselhos municipais
detêm o instrumento de fomento ao turismo local, que é o Fundo Municipal de
Turismo.
Para melhor visualização dos recursos financeiros redistribuídos pelo
Governo do Estado de Minas Gerais aos municípios contemplados com o requisito
do ICMS Turístico, apresenta-se a tabela 02, na qual há a demonstração financeira
total distribuída de janeiro a julho do ano de 2011, contemplando a indicação de
cada município e o circuito turístico no qual está inserido.
TABELA 02 – Valor de Repasse do ICMS Turístico 2010/2011 de Janeiro a Julho.
MUNICÍPIO CIRCUITO TURÍSTICO VALOR
Alfredo Vasconcelos Trilha dos Inconfidentes R$ 84.326,96 Angelandia Pedras Preciosas R$ 91.164,49
Antônio Carlos Trilha dos Inconfidentes R$ 99.629,69
Arapora Águas Do Cerrado R$ 12.046,71
Argirita Serras E Cachoeiras R$ 24.079,77
Bueno Brandão Serras Verdes Do Sul De Minas R$ 108.420,37
Cachoeira de Minas Serras Verdes Do Sul De Minas R$ 96.373,69
Cachoeira Dourada Águas Do Cerrado R$ 11.069,92
Camanducaia Serras Verdes Do Sul De Minas R$ 78.140,60
Cambui Serras Verdes Do Sul De Minas R$ 91.164,32
MUNICÍPIO CIRCUITO TURÍSTICO VALOR
CIRCUITO TURÍSTICO CIRCUITO TURÍSTICO VALOR
VALOR CIRCUITO TURÍSTICO VALOR
Capelinha Pedras Preciosas R$ 108.421,07
Capitolio Nascentes Das Gerais R$ 39.070,48
Caratinga Rota do Muriqui R$ 104.187,08
Carmo de Minas Das Águas R$ 96.373,94
Catas Altas da Noruega Villas e Fazendas R$ 36.140,18
Caxambu Das Águas R$ 91.163,69
Chapada do Norte Lago De Irapé R$ 96.379,12
Conceição da Barra Minas Trilha dos Inconfidentes R$ 52.092,98
Coronel Xavier Chaves Trilha dos Inconfidentes R$ 39.070,44
Cristalia Lago De Irapé R$ 52.110,60
Datas Diamantes R$ 60.237,53
Dores de Campos Trilha dos Inconfidentes R$ 108.420,45
Felicio dos Santos Diamantes R$ 78.140,97
Gonçalves Serras Verdes Do Sul De Minas R$ 52.112,71
Grão Mogol Lago de Irapé R$ 65.117,40
Ipanema Rota do Muriqui R$ 104.187,03
Ipuiuna Caminhos Gerais R$ 88.559,61
Jequeri Montanhas e Fé R$ 78.141,05
Lagoa Dourada Trilha dos Inconfidentes R$ 88.559,69
Passa Quatro Terras Altas Da Mantiqueira R$ 104.187,33
Piedade de Caratinga Rota do Muriqui R$ 84.326,08
Poços de Caldas Caminhos Gerais R$ 26.046,95
Pouso Alegre Serras Verdes Do Sul De Minas R$ 78.140,74
Sabara Ouro R$ 117.211,03
Sacramento Da Canastra R$ 39.070,38
São Tiago Trilha dos Inconfidentes R$ 117.211,45
Sapucai-mirim Rota do Muriqui R$ 65.116,70
Simonesia Serras Verdes Do Sul De Minas R$ 117.211,59
Santa Rita de Minas Pico da Bandeira R$ 48.186,88
Tocos do Mogi Serras Verdes Do Sul De Minas R$ 36.142,48
Turmalina Lago De Irapé R$ 91.165,23
Uberlandia Triangulo Mineiro R$ 78.140,72
Varginha Vale Verde e Quedas D'Água R$ 65.117,27
Virgolandia Trilhas do Rio Doce R$ 72.279,21
VALOR TOTAL REPASSADO AOS MUNICÍPIOS R$ 3.274.456,58
Fonte: Fundação João Pinheiro, 2011, s/p.
Para um primeiro ano é importante que se ressalve que os valores
distribuídos irão contribuir sobremaneira para que o turismo possa ser repensando e
que novos serviços públicos e ações municipais se convertam em prol da
profissionalização, do planejamento participativo do turismo, assim como se torne
uma atividade sustentável e que inclua o maior número possível de atores locais que
se preocupam com desenvolvimento da comunidade municipal como um todo.
A próxima tabela apresentada, a de número 03, demonstra o volume
financeiro distribuído para cada circuito turístico mineiro:
TABELA 03 – Valor total de Repasse do ICMS Turístico 2010/2011 Circuitos Turísticos.
CIRCUITO TURÍSTICO VALOR REPASSE
Águas do Cerrado R$ 23.116,63
Caminhos Gerais R$ 114.606,56
Da Canastra R$ 39.070,38
Das Águas R$ 187.537,63
Diamantes R$ 138.378,50
Lago de Irapé R$ 304.772,35
Montanhas e Fé R$ 78.141,05
Nascentes das Gerais R$ 39.070,48
Ouro R$ 117.211,03
Pedras Preciosas R$ 199.585,56
Pico da Bandeira R$ 48.186,88
Rota do Muriqui R$ 409.911,64
Serras E Cachoeiras R$ 24.079,77
Serras Verdes do Sul de Minas R$ 657.706,50
Terras Altas da Mantiqueira R$ 104.187,33
Triangulo Mineiro R$ 78.140,72
Trilha dos Inconfidentes R$ 537.216,91
Trilhas do Rio Doce R$ 72.279,21
Vale Verde e Quedas D'Água R$ 65.117,27
Villas e Fazendas R$ 36.140,18
TOTAL DO REPASSE R$ 3.274.456,58
Fonte: Fundação João Pinheiro, 2011, s/p.
Se o pensamento do Governo Federal é fomentar a regionalização do
turismo, o Governo do Estado de Minas Gerais fez com que, mediante a distribuição
de recursos financeiros aos municípios fosse gerado um incremento em prol do
crescimento e do desenvolvimento da atividade turística.
Contudo, é preciso que se coloque uma importante prerrogativa dos
governos municipais ao receberem os recursos provindos da distribuição do ICMS,
isto é, o recurso financeiro é depositado diretamente na conta de repasses estaduais
nos municípios, não havendo qualquer conta exclusiva em prol dos repasses
realizados.
Tal colocação faz com que se responsabilizem os gestores municipais
(prefeitos e secretários de planejamento, orçamento e finanças) para que os novos
recursos obtidos não sejam incluídos como nova fonte de recursos financeiros a
compor o volume total do orçamento público municipal, pois se assim for
compreendido, os gestores municipais não são obrigados a repassarem às
estruturas político-administrativas dos municípios que lidam com o turismo
(secretarias, fundações e empresas municipais de turismo) os novos recursos
obtidos.
Pode parecer que os recursos obtidos, mediante o cumprimento da
legislação do ICMS Turístico, servirão como um novo instrumento de
desenvolvimento da atividade turística, mas o legislador, em momento algum,
indicou no corpo da lei que deverá o município aplicar os recursos obtidos somente
com a atividade turística. Cabe aos membros do conselho municipal de turismo fazer
o papel de agentes fiscalizadores e promotores da mudança de pensamento dos
gestores municipais.
A democratização das informações municipais dos recursos
financeiros, o aumento e a incorporação da participação social no processo político-
administrativo dos municípios está proporcionando a quebra da rotina de ações
centralistas e pseudo-democráticas que alguns gestores municipais podem vir a ter.
Ao mesmo tempo, é papel dos conselhos municipais, fiscalizarem e acompanharem
a aplicação dos recursos públicos mediante as demandas da sociedade, como
também colaborar para que a aplicação dos recursos públicos seja efetivada
seguindo as diretrizes e objetivos das políticas públicas municipais, não somente as
vinculadas ao turismo.
Já o gráfico 02 demonstra como os recursos financeiros repassados
aos municípios contemplados com a legislação do ICMS Turístico estão distribuídos
pelos circuitos turísticos.
Deve-se observar que os circuitos turísticos com as cidades turísticas
mais conhecidas e divulgadas pelo estado de Minas Gerais, como o Circuito dos
Diamantes tendo a cidade de Diamantina a sua principal destinação turística, e o
Circuito Turístico do Ouro, tendo Ouro Preto e Mariana como atrações que
representam a imagem turística do Estado, são agraciados com poucos recursos
financeiros quando comparados com o Circuito Turístico Serras Verdes do Sul de
Minas e Trilha dos Inconfidentes.
GRÁFICO 02 – Relação entre Circuitos Turísticos e valores repassados com o ICMS Turístico 2010/2011. Fonte: Fundação João Pinheiro, 2011, s/p.
Essa percepção denota a uma importante observação: o requisito
ICMS Turístico não tem por objetivo a promoção e o desenvolvimento dos
municípios já consolidados como instrumento de avaliação, mas são a participação
social, o envolvimento comunitário e o interesse no desenvolvimento do turismo
regional os indicadores para que de fato os valores financeiros possam ser
distribuídos.
Ao mesmo tempo, a distribuição do ICMS Turístico seguindo os
preceitos estabelecidos na legislação, faz com que os gestores municipais dos
municípios turísticos já consagrados repensem suas posturas, deixando de pensar e
planejar o turismo somente a partir da esfera do poder público, mas que percebam
que, mediante a participação social e os conselhos municipais de turismo, o
planejamento turístico pode vir a trazer novos resultados e novas ações que venham
a renovar e reposicionar a destinação turística no mercado turístico emissivo.
Mas deve-se ressaltar que a política pública de turismo de Minas
Gerais, mesmo sendo considerada como um importante avanço para o incremento
da atividade turística no estado, possui algumas arestas que necessitam de maior
discussão e observação.
Uma primeira aresta que necessita ser discutida tanto pelo Governo do
Estado de Minas Gerais como com os gestores dos circuitos turísticos do estado, é
que a política pública representa um instrumento de fomento do turismo, premiando
aos municípios que atendem aos requisitos dispostos a respeito da participação
social, mediante a prática constante dos conselhos municipais de turismo e dos
fundos municipais de turismo, contudo, consideram que todos os municípios de
Minas Gerais possuem o turismo como principal atividade econômica.
Essa primeira observação faz com que os municípios que não
possuem nenhuma vinculação direta com o turismo acabem por fomentar atividades
e grupos de atores sociais apenas para o cumprimento da legislação e a obtenção
dos benefícios financeiros gerados a partir da redistribuição do ICMS arrecadado
pelo Estado de Minas Gerais. Cabendo algumas indagações: o turismo e a
participação social para estes municípios não estariam sendo forjados apenas para
o recebimento do recurso financeiro? Poderão estes municípios conseguir efetivar
políticas públicas municipais na área do turismo, mesmo não possuindo o setor
produtivo local organizado e existente?
Os questionamentos acima conduzem a reflexão para a segunda
aresta encontrada na política pública de turismo de Minas Gerais: nem todos os
municípios mineiros possuem vocação turística e muito menos potencial turístico.
Isto significa que o turismo depende, como argumentado anteriormente, do
complexo amálgama apresentado por Cooper et al (2001), que desta forma
diferencia a movimentação turística entre os diferentes municípios.
A legislação da política pública de turismo mineiro se torna um
instrumento cego frente a esta realidade, ou seja, para o Governo do Estado de
Minas Gerais todos os municípios possuem vocações turísticas que podem ser
convertidas em produtos turísticos. Mas se fosse assim, algo tão simplório, o estado
de Minas Gerais, estaria entre os que mais recebem turistas e visitantes25. Mas não
é essa a realidade existente, o que denota que o Governo de Minas Gerais
25
Para melhor visualização dos dados do turismo brasileiro, indica-se a leitura da cartilha “Dados do turismo brasileiro”, disponibilizada pelo Ministério do Turismo no site institucional a partir do seguinte link de acesso: <http://www.turismo.gov.br/export/sites/default/turismo/o_ministerio/publicacoes/downloads_publicacoes/Cartilha-Dados_Turismo-15x21-web.pdf>.
necessita ainda se preocupar com os principais destinos receptores de turismo,
gerando maior profissionalização e investimentos, assim como assegurar mediante
diplomas legais, que o planejamento da atividade turística continue seguindo o
caminho da participação social, dos circuitos turísticos e da municipalização.
Outra aresta que acompanha a problematização e os questionamentos
gestados refere-se a um amparo e colaboração somente para a profissionalização
dos municípios que possuem a vocação turística já em desenvolvimento,
construindo um abismo entre aqueles que já possuem o turismo inscrito como
atividade socioeconômica pertencente ao leque de atividades correlatas ao
município, contra aqueles que ainda não conseguiram a sensibilização e a atração
de investimentos para o que turismo possa se tornar uma nova estratégia de
desenvolvimento local para o município.
Essa medida pode causar a marginalização de municípios mineiros que
jamais terão a possibilidade de acessarem os recursos provindos da redistribuição
do ICMS Turístico a partir da legislação em vigor, motivando o descrédito naquilo
que de fato deve representar uma política pública setorial, ou seja, a política pública
deve emanar da necessidade da coletividade e atender ao maior número possível de
realidades.
Para tanto, essas argumentações e as arestas apresentadas
demonstram que a política pública de turismo de Minas Gerais necessita de maiores
discussões e opiniões para aprimorar sua efetivação para o maior número possível
de municípios mineiros, mas sem que se perca o viés da participação social, da
municipalização em prol do planejamento turístico participativo.
Assim, o processo de desenvolvimento turístico no estado de Minas
Gerais, através da participação social dos circuitos turísticos, é consolidado a partir
das novas legislações que se esmeram em evidenciar o envolvimento e a
participação da base comunitária nos processos decisórios da condução da
atividade turística nos municípios mineiros.
O próximo capítulo desta pesquisa abordará como a participação
social, o monitoramento das políticas públicas de turismo do Estado de Minas Gerais
e o entrosamento dos diferentes atores sociais na instância regional de
desenvolvimento do turismo, ou seja: como o Circuito Turístico Trilha dos
Inconfidentes tem se apropriado desse conhecimento gerado a partir das diferentes
políticas públicas federais e estaduais para a condução do desenvolvimento
socioeconômico a partir do vetor turismo regional e participação social.
5 PARTICIPAÇÃO SOCIAL E TURISMO SOB A PERSPECTIVA DO
CIRCUITO TURÍSTICO TRILHA DOS INCONFIDENTES
A gestão social, pensada como instrumento para a condução da
atividade turística e impulsionada pelo processo da participação social, surge como
uma importante temática que pode contribuir para um aprofundamento na
compreensão da dinâmica multifacetada que representa a realidade turística nas
esferas governamentais municipal, estadual/distrital, federal e/ou internacional.
Os diversos atores sociais que movimentam o turismo necessitam ser
vistos como elementos principais da atividade turística e, não somente as
organizações que eles em si representam como por exemplo, hotéis, restaurantes,
empresas de transportes turísticos dentre outras, para que então se visualize
nominalmente aqueles que são beneficiados, aqueles que são marginalizados e
mesmo aqueles atores que não sofram nenhuma dessas ações, mas que se
interessam e buscam contribuir para o aprimoramento do turismo.
O Circuito Turístico Trilha dos Inconfidentes, entendido como resultado
de ações da política pública do turismo no estado de Minas Gerais, desenvolve-se a
partir de um processo de regionalização voltado para o planejamento da atividade
turística a partir das realidades socioeconômicas e culturais de municípios afins. A
leitura dos circuitos turísticos no estado de Minas Gerais perpassa ainda pela
dinâmica da descentralização das instâncias de poder, isto é, com a criação dos
circuitos turísticos aproximam-se dos munícipes a competência do andamento das
decisões no tocante ao turismo e, facilita a compreensão dos atores sociais
representantes do poder público local, iniciativa privada e membros da comunidade
local para a condução em conjunto da atividade turística.
Para tanto, é objetivo deste capítulo compreender como as estratégias
das políticas públicas que vem promovendo o turismo em Minas Gerais, além dos
documentos oficiais do CTTI, visam estabelecer o diálogo entre participação social,
desenvolvimento turístico e controle social.
5.1 O desenho institucional do circuito turístico trilha dos inconfidentes
O desenho institucional do Circuito Turístico Trilha dos Inconfidentes é
compreendido a partir da participação social e da gestão participativa podem ser
vislumbradas mediante a leitura e apreciação do Estatuto da Associação do Circuito
Turístico Trilha dos Inconfidentes, assim como do Regimento Interno e do caderno
de atas das assembléias deliberativas, os instrumentos criam o conjunto de
regulamentos internos visando a organização, administração e funcionamento do
Circuito Turístico Trilha dos Inconfidentes (CTTI).
O primeiro dado a ser extraído dos documentos é que o CTTI foi
fundado no ano de 2000, no município de Santa Cruz de Minas constituindo-se
enquanto uma entidade civil de direito privado, sem fins lucrativos, gozando de
autonomia financeira e administrativa.
A data de fundação pode ser lida enquanto parâmetro para legitimar as
ações empreendidas pelo Governo do Estado de Minas Gerais a partir da publicação
da Lei Estadual n.o 13.341, de 28 de outubro de 1999 (MINAS GERAIS, 1999), a
qual estabelece que os governos municipais devam se articular de forma
regionalizada para que o turismo possa ser planejado a partir do pensamento do
planejamento turístico participativo.
A constituição da personalidade jurídica do CTTI pode transparecer,
num primeiro momento, algo que é justificável perante os parâmetros de
participação social, mas é preciso que se tenha o cuidado com as devidas
colocações, tendo em vista que a Resolução da SETUR no 008/2008 (MINAS
GERAIS, 2008), no que se refere ao Art. 2º, inciso II, alínea “a”, na qual se apregoa
que, para os circuitos turísticos receberam a chancela de “Certificado de
Reconhecimento dos Circuitos Turísticos de Minas Gerais”, a primeira exigência
estatutária é que a entidade deverá ser definida como sem fins lucrativos, tendo os
objetivos e as finalidades direcionados para o desenvolvimento do turismo
sustentável de forma regional.
Assim concebida a colocação da SETUR, o que se percebe é que a
política pública e os seus contornos designados pelo corpo burocrático do Estado
moldam as estruturas e funcionamento dos circuitos turísticos em Minas Gerais,
prevalecendo uma postura de que cabe ao Estado o papel regulamentador e
formalizador de como os espaços de participação social para discutirem o turismo
serão pensados e organizados.
De certa maneira, a postura da SETUR em ditar que os circuitos
turísticos devam ser configurados enquanto entidades sem fins lucrativos e voltados
para a discussão do turismo regionalizado faz com que se crie um correto
direcionamento das discussões e do envolvimento dos atores sociais em um único
tema. Mas pode o Estado compreender e ditar que regras são melhor aplicadas às
diversas realidades dos circuitos turísticos do estado de Minas Gerais?
As resoluções expedidas pela SETUR apresentam-se como
instrumentos que vão se ajustando às realidades dos circuitos turísticos e de suas
práticas, enquanto lócus da participação social para o planejamento turístico
regionalizado. Mas é preciso que essas resoluções tragam consigo instrumentos e
ferramentas aplicáveis às diversas realidades e não apenas novos obstáculos para
que os atores sociais reunidos nos circuitos turísticos tenham surpresas em prol do
atendimento das legislações publicadas.
Retornando à leitura e reflexão dos documentos internos do CTTI a
partir do ano de 2007 ao ano de 2011, a sede do circuito turístico se encontra na
cidade de São João del Rei, no Estado de Minas Gerais. Percebe-se que a sede do
circuito turístico na cidade descrita representa a localização central perante o
conjunto das cidades participantes, dado este que pode ser percebido mediante a
apresentação da tabela 04.
A distância média dos municípios pertencentes ao CTTI da cidade sede
administrativa, São João del-Rei, representa aproximadamente 47 km (quarenta e
sete quilômetros), não sendo empecilho ou fator que possa vir a dificultar a
locomoção para a participação de reuniões, assembléias, cursos ou outras ações
que o CTTI venha a desenvolver que carece da participação dos municípios
integrantes.
Esse importante dado precisa ser compreendido melhor enquanto um
facilitador para a maior integração ao perceber como a dinâmica estabelecida no
Decreto-lei nº 43.321, de 08 de maio de 2003 (MINAS GERAIS, 2003), faz com que
os municípios se vejam obrigados a integrar e participar efetivamente de algum
circuito turístico.
TABELA 04 – Distância dos municípios que compõem o Circuito Turístico
Trilha dos Inconfidentes da sede administrativa.
Município Distância da sede em Km
Alfredo Vasconcelos 68,2 Antônio Carlos 72,5 Barbacena 61,1 Barroso 34,9 Carrancas 74 Conceição da Barra de Minas 30,2 Coronel Xavier Chaves 18,1 Dores de Campos 35,1 Entre Rios de Minas 68 Ibituruna 68,7 Lagoa Dourada 36,2 Madre de Deus de Minas 58,7 Nazareno 50,4 Piedade do Rio Grande 74,4 Prados 27,8 Resende Costa 46,7 Santa Cruz de Minas 6,4 São João del-Rei São Tiago 46,6 Tiradentes 15,7
Fonte: Elaboração própria, 2011.
Os municípios participantes mediante a locomoção de seus
representes passam a gastar um valor financeiro menor, pois a distância a ser
percorrida para participar das ações é menor, não necessitando de gastos extras
com hospedagem e alimentação.
Visto como o CTTI se organiza, a análise parte para o entendimento de
como de dá a composição do CTTI e de seus associados.
O CTTI enquanto uma associação sem fins lucrativos apresenta como
base no seu Estatuto que a integração de novos atores sociais se dê com base no
objetivo de desenvolver o turismo de forma participativa e regionalizada, agregando
representantes do poder público, da iniciativa privada e sociedade civil.
O CTTI permite também que autarquias, fundações, organizações não
governamentais e organizações da sociedade civil de interesse público, além de
sindicatos, associações e outros instituições representantes de classe, possam
integrar o conjunto de atores sociais em favor da participação e das discussões da
atividade turística participativa e regionalizada.
Pensando assim, o CTTI é administrado por um conjunto de órgãos
internos, a saber: a Assembléia Geral, Diretoria Executiva, Conselho Fiscal e equipe
operacional, carecendo de recursos financeiros advindos dos associados para a
manutenção das atividades.
O processo decisório do CTTI é visto a partir dos diferentes órgãos
internos e deliberado somente pela Assembléia Geral e pela Diretoria Executiva,
cada qual com atribuições diferentes, mas tendo como finalidades e objetivos o
turismo regionalizado e a política pública nacional e a estadual de turismo.
A Assembléia Geral é o principal espaço para que os diferentes atores
sociais integrantes ao CTTI possam se articular e deliberar sobre projetos, ações
e/ou modificações necessárias no instrumento do plano integrado em prol do
desenvolvimento sustentável da região geográfica de abrangência do circuito.
Os atores sociais que compõem o CTTI devem se reunir
ordinariamente, uma vez ao ano ,conforme convocação a ser expedida pela Diretoria
Executiva e tem como atribuições: a eleição da Diretoria Executiva e do Conselho
Fiscal, aprovar as contas e alterar o estatuto interno, além de destituir os
colaboradores contratados que venham a compor a equipe operacional, de acordo
com as justificativas expedidas pela Diretoria Executiva.
É importante que se ressalve algumas considerações a respeito da
caracterização dos representantes dos municípios junto à Assembléia Geral: para
que o município possa se integrar ao CTTI é preciso que seja estabelecido um
convênio, o qual irá disciplinar o objetivo do instrumento jurídico, ou seja, visando à
execução de programas de trabalho, projeto/atividade ou evento de interesse
recíproco, em regime de mútua cooperação; mediante a transferência de recursos
públicos; além de apresentar mediante a identificação clara de quem será o
representante da concedente26 para o convenente27, ou seja, o CTTI.
É pela a identificação da concedente que se gera o ator social
representativo do município junto ao corpo dos demais atores que irão deliberar a
respeito das decisões e que, segundo o Estatuto do CTTI, somente este terá direito
ao voto, não podendo repassar esta obrigação/responsabilidade mediante
26
Órgão da administração pública federal direta, autárquica ou fundacional, empresa pública ou sociedade de economia mista, responsável pela transferência dos recursos financeiros ou pela descentralização dos créditos orçamentários destinados à execução do objeto do convênio (BRASIL, 1997). 27
Órgão da administração pública direta, autárquica ou fundacional, empresa pública ou sociedade de economia mista, de qualquer esfera de governo, ou organização particular com a qual a administração federal pactua a execução de programa, projeto/atividade ou evento mediante a celebração de convênio (BRASIL, 1997).
procuração a outro representante legal para que compareça às reuniões da
Assembléia Geral.
Tal mecanismo protecionista que o CTTI, mediante seu instrumento
legal – Estatuto, deseja exemplificar que se o município ao conceber o convênio
apresentar como representante máximo o prefeito municipal, este deverá arcar com
as responsabilidades de suas tarefas e funções administrativas do município além
de se preocupar também com as decisões e deliberações do CTTI.
A vedação do voto por procuração faz perceber que os integrantes da
Assembléia Geral tiveram o esmero em fazer com que os prefeitos municipais
passem a outorgar aos secretários municipais ligados à pasta de turismo a
incumbência e a responsabilidade em participar ativamente no processo participativo
do CTTI.
Assim, a representação e as agendas a serem deliberadas pelas
reuniões da Assembléia Geral terão a continuidade da representação, além da
assiduidade representativa, não criando rupturas nos processos de discussões.
Contudo, o Estatuto faz uma importante distinção entre a intenção de
participação e o direito à participação nas assembléias deliberativas do CTTI: todos
os atores sociais que se tornem associados ao circuito turístico deverão ter seus
nomes aprovados pela Diretoria Executiva e deverão contribuir mensalmente com
uma quantia financeira a ser determinada pela Assembléia Geral. Ou seja, o direito
ao voto fica condicionado ao pagamento das mensalidades, carecendo assim de
uma breve discussão do que é direito de participar e do que é dever de participar na
discussão do turismo regionalizado e participativo.
Ao instituir a contribuição financeira como instrumento segregador e
meritocrático, poderá ficar a assembléia deliberativa do CTTI esvaziada de atores
sociais, assim como das necessidades e demandas sociais que precisam ser
discutidas em prol do desenvolvimento turístico, promovendo assim apenas a
discussão e a deliberação de ações em prol dos atores sociais que possuem a
capacidade financeira do pagamento mensal da contribuição.
Mas é preciso que se perceba que existe outra vertente dessa
segregação do direito ao voto dos atores sociais que compõem o CTTI: ao
apresentar a necessidade da contribuição mensal, estabelece-se que para o
funcionamento do circuito turístico é preciso que haja uma determinada entrada
financeira fixa, podendo assim fazer com que o corpo técnico e que as despesas
administrativas possam ser devidamente pagas, auxiliando o desenvolvimento das
ações do CTTI.
Cabe ressaltar que o processo deliberativo da Assembléia Geral se
dará durante as reuniões. Mediante o seguinte sistema: a Assembléia Geral se
reunirá em primeira convocação com a presença de um terço dos sócios
convocados e que estejam em dia com o pagamento das mensalidades, ou em
segunda convocação, que se dará no período de 30 minutos após a primeira
convocação com qualquer número de sócios, podendo assim deliberar a respeito da
pauta da reunião convocada.
Mas para que a deliberação venha a envolver a destituição de algum
dos colaboradores da equipe técnica, alteração estatutária ou a respeito da extinção
do CTTI, o Estatuto apresenta que a Assembléia Geral necessitará de contar
obrigatoriamente com dois terços dos sócios convocados e que apresentem a
regularidade fiscal para com o CTTI.
As distinções a respeito do número de participantes para as diferentes
categorias de deliberações estabelecidas no Estatuto do CTTI fazem com que haja
uma maior agilidade para as decisões a serem tomadas pelos membros presentes
nas reuniões da Assembléia Geral, ao mesmo tempo em que representa uma
valorização para os membros que se deslocaram de seus municípios para a reunião.
Em outra análise o quórum mínimo de participantes na Assembléia
Geral sempre se dará, pois dada a primeira convocação e o número de membros
presentes não atinja o estabelecido no Estatuto, caberá ao presidente do CTTI
postergar a abertura da Assembléia para 30 minutos após a primeira convocação,
ou seja, as decisões deliberadas poderão referendar apenas os interesses daqueles
atores sociais que sempre se fazem presentes nas reuniões.
Para que não ocorra a prevaricação de interesses e de decisões,
caberá aos membros o espírito de cooperação regional a ser formado mediante o
estabelecimento da governança local (ROVER, 2008) que atue em favor da
formação de sinergia entre os diferentes atores que participam da Assembléia Geral,
gerando assim ganhos coletivos a todos.
O processo deliberativo da Assembléia Geral deve então se configurar
como co-gestão e co-responsabilidade entre os diferentes atores sociais envolvidos
para que haja a mudança da realidade regional turística, gerando maiores benefícios
a todos.
A outra instância deliberativa do CTTI, é a Diretoria Executiva que será
composta por membros participantes da Assembléia Geral e que serão eleitos
também pela mesma Assembléia Geral para que possam cumprir um mandato de 02
(dois) anos, podendo haver a reeleição para mais um mandato, conforme fica
estabelecido no Estatuto do CTTI.
As reuniões da Diretoria Executiva acontecerão ordinariamente uma
vez a cada mês, ou uma vez a cada dois meses, de acordo com o critério a ser
deliberado pelos componentes dessa diretoria.
As deliberações da Diretoria Executiva se darão seguindo o mesmo
princípio da Assembléia Geral, ou seja, com a presença de no mínimo dois terços
dos membros convocados em primeira chamada ou pela simples maioria dos
presentes a partir da segunda chamada, 30 (trinta) minutos após a primeira
convocação.
O campo de ação da Diretoria Executiva é bem diferente do da
Assembléia Geral, visto que, cabe a esta diretoria determinar o âmbito de atuação
do CTTI mediante a composição de documentos como estudos, planos e propostas
para que se efetive o processo de regionalização e do desenvolvimento turístico,
além das ações administrativas e financeiras do cotidiano do circuito turístico.
O conhecimento das diferentes realidades turísticas dos municípios
participantes do CTTI, assim como o espírito de participação e de integração,
deverão ser os elementos motivadores para os membros que comporão a Diretoria
Executiva, além de sempre buscar, mediante as agendas a serem deliberadas, a
simetria e a assimetria dos diferentes conflitos de interesses dos atores sociais
envolvidos no processo de regionalização do turismo, o que de certa forma faz-se
perceptível em como a gestão social é aplicável no bojo das ações administrativas
da diretoria executiva.
A gestão social como um processo que visa ao combate das posições
tecnocráticas e de ações clientelistas é sustentada por um conjunto de atores sociais
que se unem em para a motivação em comum.
No CTTI cada um desses atores sociais traz consigo conhecimentos e
práticas diferenciadas, fazendo com que na arena de debates essas diferenças de
informação sirvam como alicerce em prol de processos decisórios mais justos e
solidários, fazendo com que a gestão não seja baseada no interesse individualista,
mas no interesse coletivo e que se destine à realização do bem-estar comum de
todos os participantes.
Essa postura de ação dos atores sociais eleitos para atuarem na
Diretoria Executiva do CTTI não deve ser vista como uma gestão utópica e perfeita,
visto que, as ações a serem deliberadas envolvem um conjunto de atos que visam à
satisfação da demanda coletiva dos municípios integrantes do CTTI, cada qual com
seus interesses e necessidades em específico, mas que, ao integrarem a arena
participativa do CTTI deverão compreender seu papel de agentes de
desenvolvimento local e regional e não assumirem os interesses individualistas
como pauta de ação.
Desta maneira, a gestão exercida pela Diretoria Executiva do CTTI se
encaixa na conceituação explanada por Paula (2005) a ser compreendida como uma
gestão social mediante o gerenciamento público, tendo nas características
participativas o modelo para a condução dos processos deliberativos, auxiliando
assim o desenvolvimento regionalizado do turismo.
Outra análise pode ser elucidada ao se compreender que a Diretoria
Executiva do CTTI é formada por membros representantes da Assembléia Geral, ou
seja, caso o prefeito municipal assuma para si esta responsabilidade e se for eleito
como membro da Diretoria Executiva, passará a ter maior envolvimento com a
administração do CTTI, além de ter de disponibilizar mais tempo para
deslocamentos constantes para a cidade sede do circuito turístico, em função de
compromissos oficiais junto ao CTTI – reuniões e assembléias, dentre outros.
O Conselho Fiscal é mais um dos organismos internos do CTTI, mas
que não possui a característica deliberativa, uma vez que, tem por objetivo o
monitoramento e a avaliação da situação financeira do circuito turístico. Sua
composição é dada da mesma forma que da Diretoria Executiva: dentre os atores
sociais participantes da Assembléia Geral, seis membros podem ser eleitos para
assumirem esta responsabilidade e desempenharem o mandato também de dois
anos.
E, por fim apresenta-se na leitura do Estatuto, a Equipe Operacional do
CTTI, a qual deverá ser constituída por um gestor, um turismólogo, um secretário e
por um escritório de contabilidade que fará a escrituração dos dados contábeis.
No Estatuto consta que o número de colaboradores da Equipe
Operacional poderá ser aumentado tendo-se em vista a necessidade de maiores
ações e a disponibilidade financeira do CTTI.
O Regimento Interno apresenta maiores detalhes a respeito das
obrigações e de como as ações deverão ser desempenhadas pelo gestor e pelo
turismólogo do CTTI. Para o gestor, as atribuições e responsabilidades são
configuradas mediante o conjunto de ações e atividades administrativas e
operacionais que visem a sustentar a Diretoria Executiva.
Já para o turismólogo, o Regimento Interno apresenta que as
atribuições e responsabilidades serão desempenhadas por um rol de atividades
técnicas e específicas da área do turismo, tais como: desenvolver estratégias de
propostas e ações que colaborem para a difusão e conhecimento do produto
turístico regional, tanto no mercado turístico local, nos municípios que compõem a
região geográfica do CTTI, como no mercado turístico externo, ou seja, em outros
municípios, estados e países, visando a atração de um maior número de turistas e
visitantes para as cidades do circuito turístico.
Cabe ao turismólogo a incumbência de elaborar projetos, convênios,
contratos e termos de referências que auxiliem o desenvolvimento dos projetos e
ações do CTTI para que o conjunto dos municípios envolvidos no circuito turístico
possa vir a desfrutar dos mesmos níveis de promoção e desenvolvimento da
atividade turística regionalizada.
A execução das políticas públicas não se configura como um quadro
isolado das atividades desenvolvidas pelas entidades sociais criadas para serem
instrumentos de efetivação das demandas do Estado, isto é, ao perceber que o CTTI
é formado como instrumento de articulação entre Estado, municípios e sociedade
civil organizada, há de fato a execução plena da política pública em vigor.
Mas, ao se fazer a leitura do Regimento Interno e da compreensão da
obrigatoriedade da presença de um turismólogo, é preciso que se questione se o
profissional contratado é apenas um avanço da percepção dos atores do CTTI em
se ter um agente capacitado e que possa de fato auxiliar no processo de
desenvolvimento turístico regionalizado, ou se trata somente de mais um
cumprimento das obrigações legais impostas pelo Estado?
O questionamento apresenta-se bem real ao se fazer a leitura
pormenorizada da Resolução da SETUR no 008/2008 (MINAS GERAIS, 2008), na
qual no inciso IV, alínea “e” diz que o circuito turístico que almejar ser certificado
pela SETUR deverá fazer constar em seu quadro pelo menos um bacharel em
turismo para que exerça ações e se torne responsável técnico pelos projetos a
serem desenvolvidos pelo circuito turístico.
É justificável que a presença de um profissional formado em turismo
exercerá melhor as atividades em prol do turismo regionalizado, além de poder
conduzir o processo de ações e projetos em consonância com as diretrizes legais
determinadas pelo Governo Federal e Estadual. Mas o que dizer do caráter
pedagógico da arena participativa dos circuitos turísticos? E como fica o
empoderamento dos atores sociais e a gestão social a ser desenvolvida pelos
membros do circuito turístico?
Questionar a presença do turismólogo é fruto de um processo no qual é
preciso refletir se o Estado tem sim a necessidade de que a articulação e a
efetivação da política estadual de turismo venha a se consolidar em diferentes
regiões geográficas de Minas Gerais mediante os circuitos turísticos por meio de um
profissional qualificado.
Esse questionamento apresenta-se verbalizado na ata do CTTI da data
de 17 de julho de 2007, na qual os membros da Assembléia Geral apresentam que o
circuito turístico deverá contar com um novo gestor e que este tenha um perfil de
administrador, tendo no bacharel uma posição secundária.
Tal posicionamento da Assembléia é o que de fato aparece na redação
do Regimento Interno, no qual o gestor tem maiores responsabilidades e atuará
como um interlocutor direto nas diferentes realidades municipais e que será
juntamente com o presidente do CTTI o interlocutor com os gestores de cada
município, representantes da iniciativa privada, da sociedade civil, como também
nos espaços e reuniões com representantes do Governo do Estado de Minas
Gerais.
A leitura das atas, no curso do ano de 2008, para o entendimento dos
desdobramentos do papel do gestor e do bacharel em turismo apresenta que de fato
o gestor assume cada vez mais o papel de interlocutor direto com os municípios e
com os demais atores sociais que compõe o CTTI, cabendo à turismóloga o
desempenho de atividades de caráter técnico.
Em especial, é necessário que se destaque que com a separação das
atividades entre gestor e turismóloga houve uma agilidade na sensibilização de que
os municípios que compõem a região geográfica do CTTI voltassem a se interessar
pelas discussões e a participar das Assembléias, assim como do estabelecimento de
convênios de cooperação técnica, fazendo com que o volume financeiro pudesse ser
recuperado e que outras ações fossem desenvolvidas.
Ao mesmo passo, a turismóloga em contato direto com a SETUR
conseguiu compreender desde o início como se daria o processo para a obtenção
de recursos financeiros advindos com o repasse mensal do ICMS turístico: na
reunião da data de 04 de julho de 2008, a turismóloga informa aos presentes como a
SETUR está elaborando a proposta de lei que regulamentará a distribuição dos
recursos de ICMS mediante a criação do critério turismo junto à Lei Estadual
denominada de Lei Hobin Hood28, conforme Decreto-lei nº 32.771, de julho de 1991
(FUNDAÇÃO JOÃO PINHEIRO, 2011).
A informação repassada aos membros da Assembléia Geral do CTTI
faz com que se crie o pensamento de preparação em todos os municípios que
compõem o circuito turístico visando o recebimento dos recursos financeiros a serem
advindo com o critério de redistribuição do ICMS no estado de Minas Gerais.
Essa situação ilustra o pensamento apresentado por Silva e Melo
(2008) quando discutem que as políticas públicas são formuladas nas esferas
superiores, mas que a sua execução dependerá das estruturas municipais, ou no
caso aqui discutido, dos circuitos turísticos estarem preparados para a aplicação em
imediato.
Desta maneira, é preciso que se reflita que a posição da SETUR na
Resolução da SETUR no 008/2008 (MINAS GERAIS, 2008) sustentará a capacidade
de conhecimento e de articulação entre os municípios que integram um determinado
circuito turístico para que consigam receber os benefícios oriundos da redistribuição
do ICMS a partir do critério turismo.
Além disso, é importante que se ressalte que o conhecimento e o poder
técnico, ou convencionado de tecnocratismo, quando se observa a atuação da
turismóloga em fazer a comunicação da nova prática administrativa a ser adotada
28
Em 2009, após longos debates pelo Estado, promovidos pela Assembléia Legislativa do Estado de Minas Gerais, foi aprovada e publicada em 12 de janeiro de 2009 a Lei nº 18.030, originária do projeto de Lei n° 23/2003. Esta irá promover mudanças significativas na distribuição da cota-parte do ICMS pertencentes aos municípios do Estado, tendo em vista a inclusão de seis critérios (turismo, esportes, municípios sede de estabelecimentos penitenciários, recursos hidrícos, ICMS solidário e mínimo per capita) e um subcritério do ICMS Ecológico (mata seca). A nova Lei entrou em vigor em janeiro de 2010, mas a distribuição realizada com base nos novos critérios somente iniciará a partir de 2011 (FUNDAÇÃO JOÃO PINHEIRO, 2011).
pelo Governo de Minas Gerais, além de se colocar à disposição dos municípios
integrantes do CTTI para o acompanhamento em favor do cumprimento das
exigências estabelecidas pela SETUR, podem trazer para a realidade participativa o
empoderamento e o saber técnico disseminando para os participantes das arenas
deliberativas novos aprendizados, fazendo assim com que a vivência e
conhecimento apreendido auxiliem na transformação da realidade local e de fato
referendando a posição ideológica de Kauchakje (2007).
O papel da turismóloga frente ao desenho da política pública de Minas
Gerais e, em especial, quando da aprovação do critério turismo junto ao ICMS
turístico fez, com que o CTTI ganhasse um novo contorno para a gestão, levando a
crer que o modelo adotado se configura como o de gestão compartilhada de acordo
com o apregoado por Gohn (2007), no qual a ênfase se dá no comprometimento dos
atores sociais que compõem a arena deliberativa.
A gestão do CTTI termina o ano de 2008 com base na leitura das atas,
com a seguinte alteração significativa: na Equipe Operacional o gestor do circuito
turístico pede o seu desligamento formal devido a problemas de saúde, cabendo à
Diretoria Executiva a difícil decisão a ser tomada para que o destino do circuito
turístico não venha a ser alterado frente ao processo do ICMS turístico, já em fase
de encaminhamento.
Na data de 28 de janeiro de 2009, a Diretoria Executiva apresenta à
Assembléia Geral uma importante modificação no quadro do funcionamento do
circuito: a turismóloga passa a acumular o cargo de gestora do CTTI.
Pode transparecer que são competências diferentes as do gestor
comparadas ao cargo de turismólogo como descreve o Estatuto e o Regimento
Interno do CTTI. Contudo, mediante o contato da turismóloga com o corpo técnico
da SETUR e com os diferentes atores sociais que compõem a Assembléia Geral, o
andamento das ações e de futuros planejamentos do circuito turístico será de
responsabilidade da nova gestora/turismóloga, criando justaposição de obrigações e
competências.
O resultado do comportamento proativo da turismóloga e do
envolvimento direto dos municípios em assumir as responsabilidades locais para o
recebimento do benefício do ICMS turístico podem ser visualizados na tabela 05. A
redistribuição financeira entre os municípios do Estado de Minas Gerais representou
um importante incremento para as economias locais demonstrando que a atividade
turística pode ser vista como um novo elemento que dependerá da participação
social para a continuação do repasse financeiro.
TABELA 05 – Valores repassados de janeiro a julho de 2011 referente ao critério ICMS turístico aos municípios do Circuito Trilha dos Inconfidentes.
MUNICÍPIO CIRCUITO TURÍSTICO VALOR
Alfredo Vasconcelos Trilha dos Inconfidentes R$ 84.326,96 Antônio Carlos Trilha dos Inconfidentes R$ 99.629,69
Conceição da Barra Minas Trilha dos Inconfidentes R$ 52.092,98
Coronel Xavier Chaves Trilha dos Inconfidentes R$ 39.070,44
Dores de Campos Trilha dos Inconfidentes R$ 108.420,45
Lagoa Dourada Trilha dos Inconfidentes R$ 88.559,69
São Tiago Trilha dos Inconfidentes R$ 117.211,45
VALOR TOTAL REPASSADO AOS MUNICÍPIOS R$ 589.311,66
Fonte: Elaboração própria, 2011.
A ênfase do ICMS turístico não se configura apenas como vertente em
benefício dos circuitos turísticos, mas concebe maior importância à organização da
participação social municipal em favor do Conselho Municipal de Turismo e da
organização e aplicabilidade da política pública municipal de turismo, prevalecendo à
visão de que os conselhos participativos são instrumentos da vontade tanto dos
atores políticos em estabelecer tal mecanismo participativo, quanto dos atores
sociais em participar e opinarem com sugestões que possam fazer com que o
conselho possa assumir o caráter deliberativo em prol do turismo municipal.
5.2 A operacionalização do circuito turístico trilha dos inconfidentes em prol
da participação social
A gestão interna do CTTI demonstra-se incorporada aos elementos da
gestão participativa por meio da Assembléia Geral com o caráter deliberativo,
permitindo que todos os membros associados tenham o direito a deliberarem as
ações, programas, projetos dentre outros atos inerentes à gestão do circuito
turístico.
Por outro lado, percebe-se que a ênfase do processo de gestão do
CTTI se baseia na intensa participação e integração das gestões municipais,
mediante a indicação de representantes do poder público provindo de secretarias
municipais articuladas ou não com o turismo e/ou os prefeitos municipais.
A ênfase desse processo se dá mediante a construção histórica dos
circuitos turísticos enquanto parte da política pública do Estado de Minas Gerais, isto
é, como processo político, a SETUR, desde 1999 estabelece que a gestão do
turismo se dê mediante o processo de descentralização cuja ênfase será a
conjugação de esforços entre os municípios com características turísticas
complementares.
A partir de modificações e de melhores processos para a gestão dos
circuitos turísticos, a SETUR estabelece o processo de certificação para os
municípios que passem a integrar e participar efetivamente dos circuitos turísticos,
buscando com isso assegurar a continuidade da política pública, assim como
fortalecer o processo para os circuitos que já se encontram articulados e
propositores de processos em prol da atividade turística regionalizada.
Com a implantação do critério ICMS turístico, a SETUR demonstra
como o processo de gestão dos circuitos turísticos irá garantir aos municípios novos
canais para a obtenção de recursos financeiros que auxiliem o desenvolvimento
local do turismo e que venha a fortalecer a ação dos conselhos municipais de
turismo e dos fundos municipais de turismo.
Esta análise conduz à necessidade de se conhecer, mediante os dados
apresentados anteriormente, como os gestores municipais percebem a gestão do
CTTI e como avaliam a ação do circuito turístico, para que se possa alargar a visão
de como é o processo de gestão participativa do turismo em Minas Gerais, tendo
como unidade de análise o CTTI.
Apresenta-se na tabela 06 os municípios que responderam o
questionário no prazo determinado, os municípios que responderam ao fim do prazo
e os municípios que não responderam ao questionário.
É considerável destacar que a data de envio dos questionários e o
prazo dado para as respostas aos municípios garantiria a tranqüilidade para o envio
dentro do prazo determinado, o que leva a inferir que possa ter havido a falta de
interesse dos municípios em responder à pesquisa.
TABELA 06 – Municípios respondentes ao questionário.
Respostas dadas no prazo
Antônio Carlos Barroso Carrancas Conceição da Barra de Minas Coronel Xavier Chaves Dores de Campos Entre Rios de Minas Lagoa Dourada Prados Resende Costa São João del Rei Respostas dadas ao fim do prazo Barbacena Não responderam Alfredo Vasconcelos Ibituruna Madre de Deus de Minas Nazareno Piedade do Rio Grande Ritápolis Santa Cruz de Minas São Tiago Tiradentes
Fonte: Elaboração própria, 2011.
Para melhor visualização do resultado do índice de resposta dada ao
questionário enviado, observa-se o gráfico 03.
A porcentagem de respondentes ao questionário até o fim do prazo
estipulado pela pesquisa demonstra que 57% dos municípios se sensibilizaram com
a pesquisa e demonstram interesse em contribuir com as informações, e que 47%
dos municípios não demonstraram interesse em responder ao questionário.
GRÁFICO 03 – Índice de resposta dado ao questionário. Fonte: Elaboração própria, 2011.
A este respeito é preciso que se considere que a atividade turística nos
municípios componentes do CTTI nem sempre possui estruturas administrativas
próprias designadas para a gestão do turismo municipal, cabendo esta
responsabilidade a secretários que acumulam outras funções administrativas. É
possível inferir que alguns municípios ainda não se sensibilizaram a respeito da
importância em participar e contribuir para o processo de gestão do circuito turístico
analisado, tendo em vista que a gestora do CTTI enviou a cada município avisos e
solicitações para que o questionário fosse respondido, servindo não somente como
parte das informações desta pesquisa, como também parte do processo de
avaliação do próprio circuito turístico.
O que de fato resulta da análise da tabela 06 e do gráfico 03 é que o
processo de gestão regionalizada e participativa em favor do turismo passa por
caminhos de aprendizagem e incorporação da importância do que de fato é a
participação social e a gestão social entre os municípios visando ao
desenvolvimento turístico comum.
Na primeira pergunta, o intuito era de observar se o CTTI envia os
ofícios e/ou convites para as reuniões e assembléias com antecedência aos
gestores municipais, e o resultado obtido está demonstrado no gráfico 04:
GRÁFICO 04 – Prazo de envio de ofícios e/ou convites. Fonte: Elaboração própria, 2011.
A percepção que se tem dos dados apresentados no gráfico 04 é de
que os gestores municipais possam se preparar e assegurar que consigam participar
das reuniões mediante a resposta de 73% dos respondentes. Contudo 27% dos
municípios que responderam informaram que o CTTI envia os ofícios e/ou convites
com alguns dias de antecedência, cabendo então a esses gestores municipais a
urgência em se prepararem e reorganizarem suas agendas de trabalho para
conseguirem ir às reuniões e assembléias promovidas pelo CTTI.
A observação final do gráfico possibilita afirmar que, no geral, há sim a
preocupação da gestão do CTTI em que haja o máximo possível de participação dos
municípios, tendo em vista que nenhum dos respondentes assinalou que o envio dos
ofícios e/ou convites se dá no dia que antecederá as reuniões, assim como não
houve nenhuma resposta que não há o envio dos comunicados.
Para o processo de participação social e para a gestão regional do
turismo é importante que as assembléias e reuniões possam sempre contar com o
máximo possível de membros associados, tendo em vista que o processo e as
ações a serem deliberadas serão efetivados pelos municípios e não somente pelo e
para o circuito turístico.
Como o processo de comunicação entre a gestão do CTTI e os
membros municipais associados é algo que precisa ser melhor compreendido, o
questionário levantou a problemática se o circuito turístico disponibiliza no site do
próprio circuito os ofícios e/ou convites enviados, resultando no gráfico 05.
O resultado é animador ao perceber que 92% dos respondentes
recebem os ofícios e/ou convites e os conferem no site do CTTI, dando a percepção
de que de fato há o acompanhamento das ações por parte da gestão do circuito,
como também a constante visita no site do circuito turístico.
Mas 8% dos respondentes afirmaram que o CTTI não disponibiliza as
informações enviadas por fax e/ou email no site do Circuito Turístico, o que leva a
algumas considerações: o site pode conter um desenho (design) que não seja
amigável a alguns usuários, ou seja, a maneira como as informações são
disponibilizadas no site não consegue estabelecer comunicação direta e intuitiva aos
municípios associados ao CTTI; outra observação se faz na utilização do site por
parte dos gestores municipais: será que os gestores estão de fato acessando o site
e conhecendo as informações disponibilizadas ou estão apenas informando que o
circuito turístico não disponibiliza as informações por falta de conhecimento e
interesse para com o site?
GRÁFICO 05 – Disponibilização dos ofícios e/ou convites no site do CTTI. Fonte: Elaboração
própria, 2011.
Esse questionamento pode ser muito bem referendado e respondido
quando se observa que se 92% dos municípios afirmam acessar as informações
(ofícios e/ou convites) no site do circuito turístico é porque de fato estas estão
presentes no ambiente virtual do CTTI, não sendo possível afirmar que não há
disponibilização.
A condução do questionário faz a indagação se os municípios
associados possuem acesso aos documentos formais do CTTI – estatuto,
regimento, atas e outros instrumentos – que visem auxiliar o processo de gestão do
turismo regional; as respostas dadas seguem demonstradas no gráfico 06.
Novamente, o índice de respostas demonstra que o CTTI de fato pensa
a gestão do circuito turístico enquanto um processo que deve ter como parâmetro a
transparência das informações que visem ao maior envolvimento dos municípios
associados, pois 92% dos respondentes afirmaram que os instrumentos formais
para a gestão são disponibilizados para os municípios.
GRÁFICO 06 – Disponibilização de instrumentos para a gestão do CTTI. Fonte: Elaboração própria,
2011.
Essa informação representa importante avanço para que se pense no
processo descrito na figura 07 ao se pensar em como deve ser a construção do
policy clycle à luz do planejamento turístico participativo: o contato dos municípios
participantes com tais instrumentos facilita a compreensão de como é o processo de
construção das políticas públicas, de como se dá o estabelecimento das demandas
e necessidades, além de auxiliar aos municípios com maior grau de dificuldade para
o entendimento do que venha a ser o processo de gestão do turismo tanto municipal
quanto regional.
Os outros oito por cento dos municípios que responderam não
visualizarem a disponibilização das informações podem assim se posicionar, tendo
em vista que, estes documentos não estão em suas mãos, mas sim com a gestão do
CTTI, carecendo assim de uma ação efetiva do CTTI em disponibilizar tais
documentos por meio digital, seja no site ou por email, para que esses municípios
possam ter o máximo possível de informações e conhecimento a respeito da gestão
regionalizada do turismo.
Frente a esta problemática levantada, a próxima pergunta representa
um quadro avaliativo dos municípios mediante as ações desenvolvidas pelo CTTI,
de acordo com o demonstrado no gráfico 07.
GRÁFICO 07 – Avaliação do CTTI pelos municípios. Fonte: Elaboração própria, 2011.
A primeira variável analisada para a compreensão da avaliação
baseava-se em como os municípios percebem a interlocução e o diálogo entre eles
promovido mediante as ações do CTTI, e o resultado observado apresentou índices
otimistas: sete dos 12 respondentes classificaram que as ações empreendidas pelo
CTTI são muito boas, dois respondentes classificaram como ótima, perfazendo um
total de nove respondentes que avaliam de maneira acima da satisfatória, e três
respondentes classificaram as ações como boas.
As respostas dadas à primeira variável consolidam o pensamento de
que o processo de descentralização da gestão do turismo mediado pelos próprios
municípios, por meio do circuito turístico consegue formar o espaço dialógico e
participativo proposto Frey (2000a) e Silva e Melo (2000) – arena política – no qual o
interesse é de que todos os membros participantes possam interagir e conseguir
fazer com que suas demandas sejam ouvidas e discutidas.
Além disso, a arena política ou o espaço dialógico consegue motivar os
participantes e fazer com que a presença deles nas assembléias sejam asseguradas
por meio da qualidade dos debates e da importância das deliberações a serem
tomadas por todos.
A próxima variável questionada refere-se em como os participantes das
assembléias avaliam a ação do CTTI em prol da participação nesse espaço
dialógico e o resultado se torna equilibrado de acordo com os dados obtidos, mas
que todos os respondentes classificam como positiva e efetiva o estímulo dado pelo
circuito a favor da participação nas assembléias.
A terceira variável observada se baseia em como os municípios
avaliam o controle social exercido por eles a respeito das ações deliberadas pelo
CTTI em prol do turismo regional; o resultado obtido foi bem distribuído nas
categorias de avaliação, o que denota que alguns municípios percebem que o
processo de gestão do circuito turístico pode conter traços definidos como ações
top-down como discutido por Silva e Melo (2000).
Esse processo pode afetar a qualidade da participação dos municípios
que integram a Assembléia Geral ao fazer com que os temas, ações e projetos
discutidos sejam somente aqueles de interesse da Diretoria Executiva, não sendo o
resultado de um processo amplamente discutido e colocado em votação por todos.
Mas cabe aos municípios integrantes da Assembléia Geral fazerem-se
atuantes mediante o que Gohn (2004) denomina de cidadania participativa, na qual
cada membro da sociedade deve atuar em espaços participativos e que busquem
apresentar seus problemas, suas demandas e necessidades, para que por meio do
diálogo e do embate possa haver a resposta aos problemas apresentados.
E essa deverá ser a posição dos municípios que assinalaram a
avaliação como boa e regular: buscar se inserir nas discussões e apresentarem
seus pontos de vistas e solicitações para que haja uma avaliação melhor no tocante
ao controle dos participantes em prol do turismo regional.
Considerando o conjunto das variáveis apresentadas até o momento, a
próxima variável visa perceber como o planejamento do turismo é formalizado pelo
CTTI e os índices de respostas conduzem novamente à observação positiva: todos
assinalaram positivamente que o circuito turístico por meio de suas ações, visa
facilitar o planejamento turístico.
O planejamento turístico consiste em um grande conjunto de
instrumentos técnicos que necessita de amplo conhecimento para a sua
aplicabilidade e recolhimento de resultados positivos. Ao se estabelecer o processo
do planejamento turístico participativo como enfatizado por Molina (2001), no
entanto, os municípios com menor grau de conhecimento técnico conseguem utilizar
tais ferramentas por meio do envolvimento de outros atores sociais que dominam o
conhecimento técnico e que auxiliam a todos na sua compreensão e aplicabilidade.
Mas como houve cinco respondentes que assinalaram como boa a
ação do CTTI em prol do planejamento turístico, é aconselhável que haja reuniões e
treinamentos em específico que vise auxiliar a todos os municípios para que
compreendam melhor como desenvolverem o planejamento turístico em suas
cidades e desta maneira contribuir para a melhora do turismo regional.
Neste tocante é importante destacar que a Resolução da SETUR nº
008/2008, item IV, alínea “b”, no que se refere à gestão dos circuitos turísticos,
esclarece que o grupo de atores envolvidos deverá, por meio de processo próprio,
desenvolver conjunto de ações que visem ao desenvolvimento sustentável da
atividade turística regional por meio da execução do Plano Estratégico.
Apreciando o conjunto de documentos oficiais do CTTI observa-se que
no ano de 2010 os atores sociais do circuito turístico se reúnem para formular a
versão do documento Planejamento Estratégico para o quadriênio 2011/2014
(CIRCUITO TURÍSTICO TRILHA DOS INCONFIDENTES, 2010c).
Como resultado da mobilização e articulação dos diversos atores
sociais que integram o CTTI, o texto do Planejamento Estratégico do circuito turístico
foi elaborado de maneira participativa e tendo como princípios norteadores as
diretrizes dos planos municipais de turismo apresentados por cada um dos
representantes municipais (CIRCUITO TURÍSTICO TRILHA DOS INCONFIDENTES,
2010c), possibilitando, desta maneira, o diálogo entre os objetivos e metas da
instância de governança regional que é o próprio CTTI com todos os municípios que
o integram.
Além das diretrizes municipais, o Planejamento Estratégico do CTTI
2011/2014 está integrado com a perspectiva de incrementar a atividade turística nos
municípios que compõem o circuito, por meio da estimulação do espírito de
cooperação para que a utilização dos recursos turísticos regionais possa se dar a
partir do viés sustentável; além de apresentar como objetivo o estabelecimento e
promoção de serviços de capacitação e treinamento dos recursos humanos nos
diversos municípios para que possam atuar de maneira qualificada nas suas
realidades locais (CIRCUITO TURÍSTICO TRILHA DOS INCONFIDENTES, 2010b).
O planejamento turístico participativo é então visto como uma realidade
para os gestores municipais, mediante os diferentes mecanismos adotados pela
gestão do CTTI seja na elaboração do plano estratégico, na participação das
assembléias enquanto espaços de incidência das definições e decisões do desenho
da gestão desse circuito turístico
O resultado do planejamento turístico, tanto local quanto regional, é
enfatizado pela política pública do Estado de Minas Gerais ao criar o critério ICMS
turístico, assim a próxima variável questiona como os municípios avaliam a
promoção do aumento de acesso aos recursos públicos financeiros por parte do
CTTI e o resultado apresentado denota a observação mediana de avaliação tendo
em vista que 06 (seis) respondentes assinalaram que consideram como boa a
atuação do CTTI em prol de novos recursos financeiros aos municípios.
Contudo, é preciso que se perceba que os recursos financeiros
advindos do Estado de Minas Gerais para os municípios devem ser angariados
mediante esforços próprios destes, ou seja, os municípios deverão conseguir o
cumprimento dos requisitos determinados nas resoluções expedidas pela SETUR,
não havendo como o CTTI intervir diretamente nesse processo. Além disso, o CTTI
se estabelece enquanto um organismo de caráter participativo e que visa ao
desenvolvimento turístico regional, atuando em prol de todos os municípios que
compõem a Assembléia Geral e não mediando ou priorizando algum município em
específico.
De certa maneira, o resultado emitido pelos municípios pode também
se configurar como a satisfação mediana frente ao resultado do ICMS turístico, isto
é, nem todos os municípios que protocolaram a documentação na SETUR visando à
obtenção dos recursos obtiveram a chancela, desmotivando e promovendo uma
visão tendenciosa para com o CTTI nas respostas do questionário.
Como assinalado, o CTTI deverá promover reuniões e treinamentos
voltados para o planejamento turístico. Essa condução passa a ser visualizada na
última variável avaliada na pergunta 04, a qual buscou levantar como os municípios
participantes avaliam o processo de formação e capacitação promovido pelo CTTI.
O índice maior informado pelos municípios avaliou como boa o
processo de formação representando seis respondentes, três respondentes avaliam
como ótimo, dois como muito boa e um avaliou como regular os esforços
empreendidos pelo CTTI.
A aprendizagem é um processo que necessita da sua continuidade
temporal, envolvendo diferentes estratégias que visem ao conhecimento, à
motivação e ao empoderamento daqueles que estão vivenciando como destacado
por Molina (2001) e referendando o pensamento de Kauchakje (2007) e Gohn (2007)
ao propor que os atores sociais é que de fato são os promotores da mudança e da
superação dos problemas locais e regionais.
O CTTI ao criar um processo contínuo e permanente em prol da
formação das lideranças municipais, visando o processo do desenvolvimento do
pensamento e da ação turística regionalizada e participativa, criará a base para que
aumente gradativamente a percepção positiva a respeito do processo de formação e
capacitação destas lideranças municipais.
Ao confrontar a realidade apresentada pela variável discutida com os
dados do Circuito Turístico Trilha dos Inconfidentes (2010c), percebe-se que ao
longo do ano de 2010, foram efetivadas seis diferentes ações em prol do
desenvolvimento turístico regional, por meio de cursos, encontros e palestras: Curso
Gestão de Projetos Culturais, Encontro de Conselhos Municipais de Turismo
(COMTUR’s), Fórum regional em prol do desenvolvimento turístico e formação de
lideranças regionais (GESTUR 2010), palestra com representantes da ROTA/ER29
em prol do desenvolvimento de produtos e serviços regionais vocacionados para o
turismo eqüestre30, capacitação do grupo gestor na cidade de Tiradentes e palestra
turismo e meio ambiente visando a sensibilização dos gestores municipais em prol
do turismo natural e sustentável.
Assim, permanece a visão de que cabe ao CTTI divulgar mais os
eventos que promovem a capacitação dos gestores municipais, mas, ao mesmo
tempo, também deverá o CTTI criar controle rigoroso a respeito das capacitações e
dos cursos promovidos, fazendo com que os municípios se integrem cada vez mais
ao conteúdo discutido e principalmente aproveitem os exemplos e conhecimentos
passados nesses espaços para diversificarem a oferta dos produtos e serviços
locais, contribuindo assim para a diferenciação do turismo regional.
A discussão do questionário encaminha-se para outro grande conjunto
de variáveis que visa identificar como os representantes municipais se avaliam
29
Projeto da Estrada Real – ER de regionalização do turismo para os municípios ao longo do trajeto do caminho determinado como Estrada Real, denominado como Projeto ROTA. 30
O Turismo Eqüestre que tem nos eqüídeos o principal atrativo ou, pelo menos, uma das principais motivações, já é reconhecido em diferentes países como um importante segmento dentro das atividades de turismo e lazer, contando com grande e crescente número de adeptos (IDESTUR, 2011).
perante a participação nas ações, reuniões e na Assembléia Geral do CTTI, o
gráfico 08.
GRÁFICO 08 – Auto-avaliação dos representantes municipais. Fonte: Elaboração própria, 2011.
A primeira variável da quinta questão do questionário busca
compreender como os representantes municipais participam das reuniões e
assembléias: motivados e interessados?
O resultado demonstrou a visão dos representantes ao avaliarem como
boa, no total foram sete respondentes, dois se avaliaram como ótima e três como
muito boa o grau de participação nas reuniões, o que denota que o empoderamento
e a motivação se fazem presentes nos representantes municipais.
Quanto maior é a percepção positiva a respeito da auto-avaliação dos
representantes municipais nos espaços de participação e deliberação do CTTI,
maior é a possibilidade destes se perceberem como sujeitos criativos e que
possuem o espírito da participação cidadã como destaca Kauchakje (2007) nos seus
apontamentos.
A constituição de sujeitos criativos e com o interesse na participação
cidadã faz com que os espaços deliberativos do CTTI se convertam em espaços
promotores de mudança para a gestão do turismo local e regional e que o
conhecimento gerado por meio das discussões possa ser promotor de mudanças
também para o representante municipal.
A variável seguinte procurou pesquisar como os representantes
municipais se avaliam durante as reuniões e assembléias: tendem a se comunicar
mediante conversas e trocas de informações, idéias com os outros municípios
integrantes do CTTI?
O resultado demonstrado no gráfico 08, considerando que nove
respondentes assinalaram que possuem uma articulação com outros representantes
municipais mostrou que o processo de gestão do CTTI é discutido pelos presentes
nas Assembléias Gerais, buscando, mediante o diálogo com os outros
representantes municipais, se envolverem com a dinâmica do planejamento turístico
participativo e regionalizado.
Mas, é preciso que se atente para os três representantes municipais
que marcaram como resposta a opção regular: a gestão do circuito turístico não
deve ser algo pensando por poucos e sem estabelecer um diálogo promissor entre
todos aqueles que se encontram nas assembléias.
Se o processo de descentralização do turismo foi pensado como um
mecanismo para aproximar a realidade turística dos seus reais atores sociais e para
que a discussão seja feita na esfera local e/ou regional, é preciso que haja uma
constante motivação para que os participantes de espaços gestores participativos
estabeleçam laços de comunicação, além de trocas de informações e
conhecimentos.
O know-how de uma determinada destinação turística poderá
representar idéias e práticas inovadoras que devem ser compartilhadas nos espaços
de gestão da atividade turística que tenha como princípio a participação social, a
descentralização e a regionalização, motivando uma melhora constante para a
atratividade turística regional.
Desta maneira, cabe à gestão do CTTI perceber que deverá haver
momentos específicos que estimulem os municípios a se comunicarem uns com os
outros, mediante dinâmicas ou outras ações que tendam à familiarização dos temas
discutidos como, por exemplo, o planejamento turístico regional, ações e projetos a
serem deliberados, novo posicionamento frente às diretrizes estabelecidas pelo
Governo Federal e pelo Governo Estadual, que possam impactar diretamente a
condução da atividade turística nos municípios.
A próxima variável investigada refere-se à preocupação e ao interesse
dos representantes municipais para com as ações desempenhas pelos gestores do
CTTI, tendo em vista que é da Assembléia Geral do CTTI que emana as diretrizes,
os planos de ação e outros documentos necessários à gestão, organização e
planejamento em prol da atividade turística regionalizada.
Os representantes municipais assinalaram, em sua maioria, que
possuem interesse pelas ações dos gestores como ótima, representando desta
maneira, o contato direto para com as informações e com os processos de gestão
em desenvolvimento.
É mister salientar que esse posicionamento é favorável e importante
para a gestão regionalizada do turismo, pois colabora para reforçar a sinergia entre
os gestores e os representantes municipais, fazendo com que as temáticas a serem
discutidas e deliberadas sejam de interesse geral, além de significar a proximidade
dos gestores com os representantes municipais durante o processo de gestão do
CTTI.
Esse envolvimento e sinergia entre os representantes municipais
reforça o pensamento a respeito das práticas descentralizadas de gestão do turismo,
principalmente quando revisitado o pensamento de Frey (2000a), ao compreender
que é mediante novos arranjos institucionais e novas práticas de participação social
que a temática democracia, empoderamento e transparência vão se alicerçando
nesses novos espaços participativos, nesse estudo o CTTI.
A descentralização e o maior interesse dos atores sociais em participar
dos espaços em prol da gestão participativa circunscrevem-se no pensamento de
Arretche (1996) ao pensar que essas novas experiências participativas apresentam
à população a imagem de um novo Estado preocupado com a equidade, justiça e,
ao fim colaborando para que o controle social possa ser exercido de fato pela
sociedade.
Assim, o interesse dos representantes municipais se faz não somente
pelas ações a serem deliberadas, mas como ato de compreensão de que o CTTI é
um espaço de diálogo e confronto construído por todos os representantes e
instrumento de controle social da atuação dos gestores do circuito turístico.
Se há o envolvimento, a motivação e o interesse pelas ações dos
gestores do CTTI, a última variável da auto-avaliação dos representantes municipais
para com o CTTI converge para a seguinte pergunta: os representantes municipais
seguem as orientações e diretrizes estabelecidas pelo circuito turístico em prol da
região?
As respostas dadas apresentam que há um alto índice de avaliação
positiva – 10 respondentes – avaliam que seguem as orientações e diretrizes
traçadas pelo CTTI em prol da região, dando uma ótima avaliação para o processo
de participação social e envolvimento dos representantes municipais.
O processo de gestão do CTTI vem se consolidando desde 2000
quando oficialmente é estabelecido o circuito turístico e a composição dos
municípios participantes e que, ao longo destes anos vários foram os procedimentos
adotados em prol do turismo regional, sempre perseguindo as diretrizes federal e
estadual para nortear o bojo de diretrizes regionais.
O índice obtido com as respostas dos representantes municipais
converge para que seja referendada a importância da constituição e fortalecimento
da instância de governança regional, como é destacado pelo Programa Nacional de
Regionalização do Turismo (BRASIL, 2010b), tendo neste recorte a sustentabilidade
das ações e do pensamento.
A gestão que se pretende estabelecer é que a organização do turismo
regional possa ser um processo de longo prazo, justificando que os representantes
municipais ao assinalarem em sua totalidade a avaliação positiva de que seguem as
orientações do CTTI, o processo de gestão do circuito turístico tende a ser
sustentável a longo prazo, possibilitando que novos projetos e planos sejam
traçados possibilitando que o desenvolvimento e o crescimento econômico para a
região seja obtido mediante o caminhar e a reflexão de que o turismo é uma
atividade que exige o constante envolvimento de todos.
Fecha-se o bloco de avaliação da gestão do CTTI e dos representantes
municipais perante o CTTI com uma análise positiva de que a descentralização da
atividade turística proposta pelo Estado de Minas Gerais está sendo absorvida pelos
municípios e se consolidando, ao longo do tempo, como um processo regionalizado
e participativo.
A próxima pergunta formulada questiona os representantes municipais
se estes participam de reuniões fora da cidade sede do CTTI. Os dados resultantes
do questionamento são apresentados no gráfico a seguir:
GRÁFICO 09 – Realização de reuniões fora da cidade sede do CTTI. Fonte: Elaboração própria,
2011.
O interesse desta pergunta voltou-se para descobrir se há a
preocupação do CTTI em fazer as reuniões programadas em municípios diferentes a
cada período, favorecendo àqueles representantes municipais que estão mais
afastados geograficamente participarem no maior número possível de encontros.
O índice obtido com as respostas foi de 50% para sim e para não, o
que de início representou uma margem de dúvida para verificar se de fato as
reuniões acontecem ou não em municípios outros que não o da sede do CTTI.
Para tanto, a verificação das respostas dadas se deu com o apoio da
leitura das atas das assembléias promovidas pelo CTTI, a partir de 17 de julho de
2007, e que somente em 26 de novembro de 2009 acontece a primeira sessão
extraordinária fora da cidade sede do CTTI, tendo o município de Alfredo
Vasconcelos essa prerrogativa.
O motivo da reunião fora da cidade sede do CTTI tem uma importante
justificativa: Alfredo Vasconcelos a partir de 26 de novembro de 2009 passa a
integrar oficialmente o CTTI, tendo a reunião o objetivo de aproximar os
representantes municipais dos outros municípios ao novo membro integrante, como
também de aproximar os representantes do poder público municipal de Alfredo
Vasconcelos dos gestores do CTTI.
Desta maneira, pode-se inferir que o índice de respostas se deu a partir
da lembrança desta única reunião em quatro anos de análise de documentos oficiais
do CTTI, ou seja, os representantes municipais que estão atuantes e acompanhando
o processo de gestão do CTTI assinalaram a variável sim e, os novos
representantes municipais assinalaram a variável não como opção no questionário
enviado.
Não menos importante, mas cabível neste momento, é de se
referendar a posição estratégica do município de São João del Rei como sede do
CTTI, pois como demonstrado na tabela 04 deste estudo, a distância dos municípios
componentes do CTTI até o município sede representa uma equidade entre todos,
não havendo a necessidade de que as reuniões sejam feitas em municípios diversos
ao da sede.
Diferente das perguntas anteriores, a próxima pergunta foi construída
para que os respondentes pudessem ter a liberdade de expressar suas idéias, não
havendo variáveis quantitativas apresentadas, o que fez com que a análise se desse
a partir da perspectiva qualitativa, mediante a organização das informações em
blocos de respostas
Assim, o questionamento feito apresentava a seguinte questão: quais
seriam as deficiências e desvantagens de se discutir regionalmente o turismo a partir
das reuniões e assembléias do Circuito Turístico Trilha dos Inconfidentes?
Como cada município do CTTI possui uma realidade turística diferente,
persiste a dificuldade em se alinhar temas e discussões que motivem a todos os
municípios em uma única reunião, carecendo um papel atuante dos gestores para
compreenderem essa diversidade e se alinharem a partir de ações e projetos que
una a todos.
Tal pensamento percorre nas atitudes dos representantes municipais
durante as reuniões e assembléias, pois surge no conjunto das respostas que
alguns municípios parecem mais preocupados com suas realidades locais do que
com a região. O fato é que o turismo é uma atividade que possui um complexo
sistema de relações, isto é, por ser a atividade turística considerada a partir do
comportamento das pessoas que se sentem motivadas a visitar determinada
localidade, ao mesmo passo em que representa o envolvimento dos empresários
locais que precisam criar uma rede de serviços de hospitalidade que possa oferecer
aos turistas e visitantes da localidade a satisfação das diferentes necessidades e
motivações que os levou até lá.
E quando se está discutindo regionalmente o turismo, como no caso
ora analisado, é compreensível que os municípios que já se encontram com a
atividade turística consolidada venham a agir de maneira individualista e/ou egoísta
dentro das reuniões e assembléias, pois precisam que os gestores do CTTI tenham
respostas e propostas para a manutenção e diferenciação da atividade turística
regional, não se preocupando somente com a estruturação de cada município que
ainda não se encontra alinhado à perspectiva do turismo consolidado.
Como a atividade turística em cada município é um elemento
diferenciador entre os municípios integrantes do CTTI, faz com que haja, durante as
reuniões a perda de foco e objetivo, como salientado pelos respondentes. Tal
situação necessita de uma intervenção dos gestores para criar constantemente a
motivação e ao mesmo tempo fazer com que todos os presentes na reunião
compreendam que é na coletividade que acontece a aprendizagem e o despertar de
novos conhecimentos e práticas, fazendo com que a diferença da realidade turística
e a diversidade de interesses possam auxiliar a todos em futuras reuniões e temas a
serem discutidos.
Ainda tratando da diversidade e das diferenças da realidade turística os
respondentes sinalizam que a deficiência e a desvantagem em se discutir
regionalmente o turismo se inscreve na esfera da infra-estrutura turística local, ou
seja, alguns municípios, por já possuírem a atividade turística como realidade
implantada, já possuem alguns empreendimentos que visem ao atendimento de
turistas e visitantes, enquanto outros municípios ainda estão buscando se preparar
para receber a movimentação turística.
Destaca-se que a deficiência apontada é de fato algo que pode
desmotivar a participação e a integração de determinados municípios às discussões,
pois para estes o interesse é em como manter ou aumentar o fluxo turístico, a
divulgação da atratividade turística, além de despertar nos empresários locais maior
interesse em investir no turismo, exigindo assim uma postura diferenciada perante
os gestores do CTTI. Postura esta que deve se dar mediante ações e planos que
visem ao atendimento dessas necessidades, mas ao mesmo tempo sem que se
coloque em posição diferenciada os municípios já com o turismo implementado dos
que estão buscando a implementação.
O desafio é constante para os gestores do CTTI de discutir
regionalmente o turismo e fazer com que as vocações locais possam se
complementar, além de fazer com que os municípios que já possuem a atividade
turística aceitem dialogar com outros municípios, promovendo assim constante troca
de conhecimento e informação.
Outra resposta dada pelos representantes municipais foi a de que
existe a dificuldade de se ter a presença de prefeitos ou de representantes com
poder de decisão nas reuniões, para que estas tenham de fato o efeito deliberativo e
não somente um encontro para repasse de informações e troca de conhecimento.
A deliberação em uma estrutura gestora como o CTTI é de
fundamental importância para que os representantes presentes se sintam de fato
responsabilizados e tenham autoridade para decidirem a respeito do rumo da
atividade turística enquanto um instrumento para o desenvolvimento regional.
Essa deficiência – a falta de representantes nas reuniões com poder de
deliberação – é fruto de um processo que ainda está sendo absorvido pelas
estruturas do poder público municipal: enquanto os prefeitos e secretários de turismo
acreditarem serem os sujeitos indispensáveis para a deliberação nas reuniões,
muitas votações terão de ser adiadas esperando ter o número suficiente para que
seja decidido a proposição, projeto e/ou ação discutida na reunião.
O que se percebe é que ainda persiste o centralismo do poder de
deliberação e que alguns prefeitos e/ou secretários não o querem repassar para os
indicados a lhes representarem nas reuniões e assembléias do CTTI, o que dificulta
e torna moroso o processo de deliberação no circuito turístico.
Este é o grande desafio para os gestores do CTTI: conseguir explicar
para os prefeitos e secretários de turismo que ao se indicarem como membros
representantes de seus municípios passarão a ter obrigações próprias, não cabendo
a delegação destas responsabilidades a outros representantes ou mesmo
repassando por meio de procuração a responsabilidade de deliberar e/ou votar nas
assembléias do CTTI, situação esta vedada pelo estatuto do circuito.
Cabe então aos representantes municipais, e aqui se está discutindo o
papel dos prefeitos e secretários de turismo que buscam se inscrever no CTTI, não
visualizarem o circuito turístico enquanto mais uma participação honorífica, mas sim
como uma participação social ativa e necessária para que o desenvolvimento
turístico da região possa ser analisado e discutido mediante as demandas a serem
surgidas nas reuniões e assembléias, ou por outros mecanismos internos e externos
do CTTI.
Mesmo sendo a pergunta uma interrogação a respeito das deficiências
e desvantagens, surgiu como resposta uma interessante proposta para que os
problemas levantados e discutidos possam ser melhor apreciados pelos membros
representantes: existir oportunidades de encontros entre os participantes do Circuito,
proporcionando troca de experiências.
A agenda oficial de reuniões e assembléias do CTTI se motiva a partir
das necessidades estatutárias e extraestatutárias, buscando a discussão de
problemas ou apresentando agendas que precisam do envolvimento e discussão
dos representantes para a sua deliberação.
Mas, ao mesmo tempo, surge pelos representantes a necessidade de
que exista no calendário de reuniões o planejamento de alguns encontros que
possam ser realizados com o objetivo de que os municípios participantes do CTTI
troquem informações, conhecimentos e até mesmo propor modificações aos
processos internos do CTTI em andamento.
O trabalho feito em conjunto pelos membros representantes municipais
precisa ser dinâmico e que venha a absorver novas demandas, pois se as
deficiências identificadas se focam no individualismo, na discussão de problemas,
devem estes membros encontrar soluções que visem ao atendimento de todos os
municípios, ou seja, essas novas reuniões seriam exatamente para fazer com que
os municípios que ainda não possuem o turismo como atividade socioeconômica
implantada possam aprender com os municípios turísticos o que é preciso fazer para
se construir uma base sólida, justa e participativa para que a atividade turística
venha a ser incorporada ao rol de outras atividades municipais.
A dinâmica da participação social faz com que os atores sociais que de
fato se engajam no processo de gestão do turismo regionalizado a partir da
descentralização das políticas públicas no Estado de Minas Gerais, em especial no
CTTI, busquem maior envolvimento para com a realidade a ser gerida e que não
cabe somente aos gestores a atuação e ação, mas que é de responsabilidade de
todos a contínua discussão e ação em prol do turismo regional.
Por fim, o questionário apresenta um espaço para que os
representantes municipais possam dar sugestões aos gestores do Circuito Turístico
Trilha dos Inconfidentes a fim de melhorar a gestão e a participação dos municípios
nas reuniões e assembléias.
A primeira sugestão dada seria a divulgação do conteúdo das reuniões
por meio eletrônico a ser definido pelo CTTI para que os representantes municipais,
membros da sociedade civil e demais atores sociais ausentes possam acompanhar
o rumo das discussões e das deliberações adotadas.
A participação social e a motivação constante dos membros
representantes se dão mediante o envolvimento com a discussão empreendida, e se
houver a divulgação eletrônica dos conteúdos discutidos essa inovação
proporcionará aos membros do CTTI maior empoderamento das discussões e
deliberações, proporcionando o alargamento dos princípios democráticos e de
transparência dos atos do circuito turístico.
Contudo, é preciso salientar que o simples acompanhamento das
reuniões e assembléias por meio das atas e documentos eletronicamente
disponíveis não faz com que a participação social seja efetivada. É preciso que
todos os representantes estejam presentes em todas as reuniões e assembléias,
principalmente porque o poder de deliberação é individual e, desta forma, é
necessária a participação ativa nas reuniões e assembléias.
A definição de calendário das reuniões é a segunda proposta
apresentada pelos representantes, pois com esta definição tornaria fácil o
planejamento em prol das participações presenciais. Destaca-se que o CTTI, como
apresentado no gráfico 04, sempre envia com antecedência os convites e/ou ofícios,
mas mesmo assim, como se está discutindo a formação de uma agenda regional,
alguns municípios poderão ter outros compromissos locais já agendados e com a
definição do calendário antecipado de reuniões, facilitaria a organização dos
compromissos e o maior envolvimento e participação dos representantes com poder
de deliberação nas reuniões.
Ao mesmo tempo em que se estabelece uma agenda, é proposto que
as reuniões sejam realizadas em municípios diversos ao da sede do CTTI, criando a
oportunidades de outros representantes conhecerem o trabalho do circuito, como os
próprios prefeitos de cada localidade.
Essa proposta, como já discutida anteriormente, é cabível de
realização e principalmente frente à necessidade e vontade dos representantes
municipais, pois assim, as realidades turísticas tanto discutidas nas reuniões
poderiam ser visualizadas e conhecidas por todos, facilitando desta maneira a
compreensão em futuros encontros que visem à discussão de melhorias e
implementação de ações em prol dos municípios que ainda não possuem a atividade
turística estruturada.
Tanto quanto seria também uma boa oportunidade para os membros
do CTTI conhecerem, na prática, como alguns municípios estão trabalhando o
turismo, o envolvimento da comunidade local e de empresários, dinamizando as
relações entre os municípios e mesmo destes para com os gestores do circuito.
Como a discussão da gestão participativa do CTTI está baseada na
participação social e no envolvimento dos atores sociais, surge como sugestão que
os gestores deveriam permitir aos representes o melhor aproveitamento do item da
pauta das reuniões designado de “palavra aberta”, espaço para que os
representantes municipais possam apresentar suas dúvidas, sugestões e perguntas
diversas tanto aos gestores do circuito turístico, como para outros membros
representantes presentes nas reuniões e assembléias.
Essa sugestão é na verdade um item que precisa ser refletido pelos
gestores do CTTI, pois é mediante o constante diálogo, conversa e questionamento
que o processo de gestão pode ir se aprimorando e auxiliando para que todos os
participantes compreendam seu papel nesse grupo, se motivem e ajudem os outros
municípios a se desenvolverem.
A prática da participação social é um eterno aprendizado a ser
compreendido por todos os atores sociais participantes das arenas participativas.
Não é objetivo ou essência do conselho gestor ser apenas um espaço para a
apresentação das agendas já pré-definidas ou discutidas, mas sim o espaço para o
constante embate sadio entre os representantes, pois assim é que se percebe que
não há interesses individualistas ou clientelistas sendo discutidos ou deliberados.
O grupo gestor do CTTI deverá propor um novo espaço para que os
membros participantes possam verbalizar suas necessidades, demandas ou
dúvidas, ou então criar encontros específicos para a discussão e aprimoramento de
determinado tema, seja mediante oficinas ou encontros temáticos para que o tema a
ser discutido nas reuniões oficiais e/ou assembléias seja deliberado com plena
consciência por todos participantes presentes, após os encontros específicos
traçados a partir das demandas dos atores sociais do CTTI.
Outra sugestão é dada levando em consideração o maior grau de
descentralização da política de turismo do Estado de Minas Gerais: poderiam os
gestores de o CTTI realizar reuniões com representantes do COMTUR e com o setor
privado de todas as cidades que fazem parte do circuito, pelo menos duas vezes ao
ano, com o objetivo de troca de informações, priorizações, e discussões de casos de
sucessos.
Essa proposta é apresentada oportunamente tendo em vista os efeitos
advindos da implementação do critério turismo na redistribuição do ICMS no estado
de Minas Gerais, a partir da necessidade da comprovação do funcionamento do
COMTUR, mas que nem todos os municípios possuem pessoal capacitado para o
entendimento em como conduzir o conselho municipal em prol do turismo municipal
e não como um instrumento manipulativo da estrutura político-administrativa dos
municípios.
A reunião dos membros representantes municipais no COMTUR com
os gestores do CTTI ajudaria a todos a terem visão de como outros conselhos estão
atuando, resolvendo problemas burocráticos e técnicos e até mesmo como estão
desenvolvendo suas políticas municipais de turismo.
Não é possível acreditar que a partir da legislação aprovada pelo
Estado de Minas Gerais que automaticamente os municípios passariam a
compreender e atuar de maneira eficiente o rol de problemas relacionados com a
atividade turística a nível local, carecendo assim do monitoramento do CTTI para
que os representantes municipais possam ser sensibilizados a respeito do seu papel
e da sua importância nos conselhos municipais de turismo, além de apresentar
sugestões a respeito de como o trabalho em prol do turismo é realizado pelo CTTI
para todos os municípios integrantes.
O contato entre o CTTI e os conselhos municipais de turismo não seria
eficiente somente para os municípios, mas também colaboraria para que os gestores
do circuito turístico pudessem, segundo outra sugestão dada, buscar novos projetos
e oportunidades para o fortalecimento do turismo municipal e regional.
Com o conhecimento das diversas realidades in loco é possível aos
gestores do CTTI perceberem de fato o que são as necessidades prioritárias a
serem deliberadas pelo circuito em prol do estabelecimento de ações e programas
que visem à dinamização do planejamento turístico regional.
Pode-se concluir que o planejamento e o desenvolvimento das
atividades turísticas empreendidas pelos diferentes atores sociais no espaço
dialógico e participativo que é o CTTI, vem gerando uma ação concreta para que
estabeleça a agenda em prol do turismo regional.
As proposições, objetivos e ações propostos pelo conjunto de
instrumentos legais expedidos pelo estado de Minas Gerais e pela SETUR estão
sendo incorporados pelo CTTI, tornando instrumentos que auxiliam no processo da
regionalização do turismo, assim como a Política Nacional de Turismo e o Programa
de Regionalização do turismo expedidos pelo Governo Federal.
O estado de Minas Gerais desde o ano de 1999 formatou a
organização do turismo de maneira descentralizada e, ao fim da análise de todo o
material pesquisado, percebe-se que mesmo as diferentes realidades
socioeconômicas e turísticas poderiam sinalizar entraves para a formação da
agenda de regionalização do turismo. Contudo, o CTTI, ao perceber que a partir da
regionalização e da descentralização o turismo poderia ser melhor planejado e
executado, vem possibilitando que o conjunto de municípios, a partir de seus atores
sociais, contribuam para este desenvolvimento ao mesmo passo que a união de
todos os atores sociais reunidos no circuito turístico, inscreve-se como elo de
fortalecimento e motivação em prol do turismo regional.
6 CONSIDERAÇÕES FINAIS
A reflexão a respeito do Estado empreendida nesta pesquisa além de
buscar à elucidação de conceitos e proposições a respeito de quais são as
obrigações e as tarefas deste importante instrumento regulador da vida em
sociedade, buscou sobretudo relacionar como os problemas da sociedade brasileira
foram sendo incorporados, ou não, pelas diferentes correntes de pensamento e
ações que perpassaram a história da formação do Estado Brasileiro.
O conjunto das reformas político-administrativas possibilita hoje aos
estudiosos do tema compreender que, em cada momento histórico, diferentes
pensamentos e ações conduziram tanto a burocracia estatal quanto o corpo de
políticos e burocratas, como também que o contrário pode ser percebido, uma vez
que os burocratas e os políticos são partes inerentes ao Estado e é a partir da ação
destes atores, sob a tutela da burocracia, que as necessidades da sociedade são ou
não ouvidas, atendidas e sanadas.
Mas, para que o Estado possa de fato ser entendido como um conjunto
de princípios e valores em prol da vida em sociedade é preciso que seja ressaltado o
caráter da democracia como elemento nuclear desta instituição social. Nesse
sentido, a ação dos diferentes atores estatais – políticos, burocratas e servidores
públicos – deveria ser pautada não nos interesses marginais, político-partidários ou
clientelistas, mas sim no que se refere ao bem coletivo, ou seja, aquele que é
convertido em prol do maior número possível de cidadãos.
Se pensado por este prisma, o Estado deve não somente atender à
coletividade, quanto permitir que a coletividade tenha acesso a ele, significando
dizer que, quanto maior o entendimento a respeito da democracia e da transparência
dos atos públicos, maior deverá ser o acesso dos cidadãos ao Estado, colaborando
com informações, apresentando suas necessidades e carências, controlando e
monitorando as ações e os gastos públicos, visando à melhoria constante da vida
social e do desenvolvimento nacional.
O controle social enquanto elemento das práticas de gestão do Estado
faz com que se projete um cenário de maior organização que vise ao atendimento
das demandas sociais, além de sinalizar a incorporação dos princípios
democráticos, combatendo as práticas centralizadas e clientelistas.
É, portanto imperativo pensar que o conjunto das reformas do Estado
brasileiro atrelado ao princípio da descentralização fez com que a efetivação do
controle social fosse possível, assim como fez com que as decisões político-
administrativas a respeito do emprego dos recursos públicos se tornassem mais
próximas da sociedade que de fato necessidade destes e que pode apresentar
soluções para este atendimento.
A descentralização democratizante permite ao Estado inovar na sua
gestão político-administrativa, deixando de ser espaço por excelência dos
conhecimentos técnico-administrativos (burocracia), espaço restrito aos servidores
públicos, burocratas e políticos para incorporar a sociedade como novo elemento
nessa gênese.
A junção de diferentes conhecimentos e saberes faz com que a
proposição dada pela CF-88 da descentralização reafirme o caráter inovador do
controle social da população local perante as ações do Estado descentralizado,
podendo, assim, além do acompanhamento dos atos públicos, monitorar a gestão do
corpo político-administrativo como um todo.
Na discussão apresentada na dissertação ficou destacado que
mediante a inovação da descentralização aliada ao controle social, a gestão político-
administrativa do Estado passa a carecer de novos processos e dinâmicas para dar
conta da complexidade das demandas sociais crescentes e aparentes frente a este
novo cenário.
As decisões políticas surgem como instrumentos para legitimarem a
ações democráticas do Estado, tornando reais e dirigidas aos grupos sociais que
necessitam de serviços públicos específicos, tal como visa regular as diferentes
funções e necessidades sociais; mas estas decisões, mesmo que democráticas,
precisam também incorporar o controle social e a sociedade para que de fato
possam ser de maior abrangência e de melhor eficiência.
Por isso, compreende-se que existe, como foi discutido nos capítulos, a
diferença entre política e política pública, ambas estão inscritas na arena estatal,
mas a política pode apenas apresentar e vocalizar as intenções e objetivos do
Estado e nem sempre convergindo para o atendimento das necessidades sociais.
As políticas públicas, por sua vez, apresentam a vocalização das
demandas sociais discutidas e acolhidas pelo Estado mediante instrumentos
regulatórios que de fato visem ao atendimento das necessidades e demandas
sociais, ou seja, tendem a apresentar o caráter da coletividade, daquilo que de fato é
público e não direcionado a determinados grupos ou interesses político-partidários.
A política pública não é apenas um instrumento para o atendimento das
necessidades sociais, mas sim o instrumento para que a democracia, a
descentralização e o controle social sejam empregados como elementos
estratégicos para a nova gestão estatal, não podendo esta ser indiferente para com
os avanços sociais, técnicos e políticos do atual período histórico do Brasil.
Cada política pública homologada pelo Estado pode fazer com que os
gastos públicos sejam convertidos em diferentes ações governamentais podendo
surgir, a partir dela, uma série de desdobramentos como planos, programas,
projetos ou pesquisas que visem à correta implementação das ações dirigidas à
sociedade, ou seja, este é um cenário projetado frente ao que de fato representam
as políticas públicas, contudo as práticas locais podem corromper este pensamento.
Política pública, democracia e controle social fazem parte de um
complexo sistema vascular que se emaranha dentro do Estado permitindo que uma
nova oxigenação seja possível às arcaicas burocracias e gestões dando lugar à
inovação e à participação da sociedade como novos elementos gestionários.
Incorporar a sociedade no bojo das ações e deliberações do Estado é
sim, como discutido, um processo inovador, mas para tanto, é preciso que se reflita
que a sociedade não é um conjunto unânime de cidadãos e que nem todos estes
estão dispostos efetivamente a se integrarem nas discussões e deliberações do
Estado, portanto a referência à sociedade é vista a partir do conceito do que é
sociedade civil.
A sociedade civil a integrar estes novos espaços democráticos e
deliberativos do Estado é entendida como esfera pública não-estatal da cidadania, a
qual possui nos diálogos e consensos o respeito ao autêntico interesse para o que é
público, não agindo mediante interesses egoístas ou hegemônicos.
A sociedade civil, mediante seus diferentes atores sociais, é capaz de
criar estratégias e vínculos que permitem a sua aproximação e permeabilidade na
estrutura gestionária do Estado, fazendo com que a democracia, descentralização e
controle social possam aos poucos ser absorvidos pelas estruturas arcaicas e
melindrosas do Estado que precisa se modernizar, mas que ainda não sabe como e
que ao mesmo tempo precisa se alinhar aos novos pensamentos democráticos dos
tempos atuais.
Ora, mas não cabe somente ao Estado a compreensão das novas
ordens democráticas e gestionárias, cabe, por conseguinte, que a sociedade civil
esteja preparada, capacitada e interessada em participar e contribuir para com o
avanço das políticas públicas e de outras ações estatais, pois caso contrário estaria
apenas reafirmando a debilidade que o Estado lhe confere: um corpo amorfo de
atores sociais que pressionam o Estado para o atendimento das demandas sociais,
mas que em momento algum se manifesta como interesse em contribuir de fato.
A sociedade civil organizada e participativa faz com que o Estado se
inove e ao mesmo tempo faz com que novos espaços participativos sejam criados, a
fim de dinamizar a gestão pública, enfatizando a necessidade da participação social
como elemento inovador.
A participação social, expressa como sistema de relação entre
sociedade civil e Estado, fez com que se perceba que existam duas esferas que
estão em constante embate, mas que em determinados momentos, interesses e
necessidades se intersecionam permitindo o contado direto da sociedade com os
diferentes espaços e aparatos estatais e vice-versa, possibilitando a discussão
aproximada a respeito das necessidades e demandas sociais, como também da
apresentação de sugestões e contra-argumentação das possíveis ações que visem
ao coletivo.
Mas para que essa aproximação entre as diferentes esferas fosse
possível, a participação social foi um processo de construção social mediante os
passos dados durante o processo de redemocratização do Brasil, processo este que
exigiu forte organização da sociedade em diversos movimentos sociais que
possibilitaram a vocalização da insatisfação com a gestão centralizadora e de como
as políticas eram expressas mediante o corpo político e técnico do Estado.
A redemocratização abre possibilidades para que a participação social
permita maior abertura a novos pensamentos e atores no bojo dos espaços
decisórios do Estado, ao mesmo tempo em que se discute a descentralização das
ações para os estados e municípios.
O novo conjunto de atores sociais – sociedade civil organizada,
movimentos sociais e outros – incorporados aos espaços deliberativos precisam
agora agir em favor da legitimação das demandas e necessidades sociais e ao
mesmo tempo aprender como é o funcionamento político-administrativo do Estado,
pois o simples fato de participar não significa a efetivação da participação social
como um processo de superação da centralização estatal.
Para tanto, a participação social faz com que os atores sociais passem
a usufruir e construir uma nova dinâmica denominada cidadania ativa, que é a
constituição de cidadãos dotados do espírito criativo para o enfrentamento da
realidade social à qual estão inseridos a partir dos espaços deliberativos do Estado.
A cidadania ativa e participação social permitem que os problemas,
demandas sociais e reivindicações das comunidades locais sejam tratados como
agendas das reuniões nos espaços deliberativos e não como assuntos secundários,
pois ao participar destes novos espaços os atores sociais estão ali representando
todo o conjunto de cidadãos que clamam por soluções e melhores serviços públicos.
Para o Estado, a participação social representa também um novo
elemento para a sua gestão, pois as decisões antes apresentavam o caráter
unilateral, isto é, o Estado era onipotente em suas ações ao deliberar a respeito da
quantidade, da qualidade e da distribuição dos recursos financeiros, dos serviços
públicos e da atenção para com as comunidades locais e depois da
redemocratização, da descentralização, do controle social, das novas políticas
públicas e da participação social, essa lógica é subvertida e novos parâmetros para
a gestão precisam ser descobertos e construídos em conjunto pela sociedade civil e
Estado.
A participação social gera não somente estes novos laços de
aproximação do Estado para com a sociedade civil organizada, mas gera em ambas
as esferas um novo conceito de responsabilização: as ações, deliberações e
políticas públicas agora são empreendidas não somente pelo Estado e sim em
conjunto com a sociedade civil, podendo esta ser cobrada e pressionada pela
sociedade em geral.
Por isso, participação social é tida como um processo que emancipa os
cidadãos, tornando-os mais responsáveis pelos seus atos nos espaços estatais de
participação e deliberação; serve como instrumento pedagógico ao desenvolver
novas habilidades e conhecimentos nos atores sociais que se integram a estes
espaços; e aumenta a capacidade da sociedade como um todo em controlar e
monitorar as ações e atos públicos do Estado.
A aprendizagem e a responsabilização dos atos públicos na
participação social faz com que um novo processo gestionário se apresente a partir
da discussão empreendida: a gestão social.
A gestão social é vista como a superação dos processos de gestão que
enfatizam a unilateralidade dos atos públicos estatais, ao ter na discussão e no
diálogo exercido entre os atores sociais e públicos envolvidos o trajeto para que as
ações e políticas públicas possam ser efetivadas.
O processo discursivo e dialógico a ser exercido pelos diferentes atores
sociais faz com que a realidade local seja vista não como um problema a ser
enfrentado pelo Estado, mas como lócus para que novos e melhores serviços e atos
públicos possam ser empreendidos, gerando assim novos conhecimentos e padrões
para a administração pública.
Desta maneira, a gestão social é vista como um processo inovador que
tem na cidadania ativa a sua base de sustentação e na participação social o
elemento motriz para a sua efetivação, e não cabe construir limites de atuação ou
emprego deste conceito, pois como é um processo da sociedade e para a
sociedade, o Estado é citado apenas como exemplo de seu uso, cabendo este
modelo de gestão ser adotado por diferentes instituições, sejam do terceiro setor
como de outros setores econômicos.
Assim, o processo dialógico e participativo é que faz a gênese da
gestão social nos diferentes espaços e setores nos quais possivelmente pode ser
utilizado, sinalizando o estado rudimentar que os processos de gestão
centralizadores ou com pouca porosidade para a participação apresentam no atual
cenário social.
A atividade turística é considerada a partir das análises empreendidas
anteriormente como elemento integrante do complexo amálgama apresentado
anteriormente, mas que representa parcela significativa quando analisado a partir de
seus efeitos produzidos em uma dada destinação.
A gestão do Estado perpassa pela gestão do turismo, assim como os
elementos de descentralização e democracia são também elementos que estão
auxiliando a maior permeabilidade de conceitos, estudos e visões a respeito de
como a atividade turística pode ser instrumento para a promoção do aumento da
qualidade de vida, da responsabilização dos diferentes atores locais para com a
preservação dos recursos turísticos (atrativos) que representam a história, a cultura,
os valores e os conhecimentos da sociedade local.
O pensamento a respeito do conceito de turismo, como demonstrado,
não é algo que visa a simplificar a realidade ou apresentar limites possíveis para a
compreensão do que seja ou não o turismo, mas emana um conjunto de elementos
que auxiliam os pesquisadores a observarem em profundidade quais são os
diferentes laços sociais que permitem que o turismo seja percebido como uma
atividade social, econômica e cultural.
Essas diferentes perspectivas demonstram que a atividade existe não a
partir somente do território, ou seja, dada uma destinação com atrativos que
exerçam fascínio e interesse em outras pessoas, sendo então possível ter a
atividade turística sendo realizada naquele espaço, mas a observação vai além da
destinação e se envolve com aquele que pratica o turismo, ou seja, o ser humano e
suas diferentes motivações e expectativas, aliadas à necessidade de abstração da
realidade e do tempo de trabalho.
Essa visão holística faz com que os diferentes elementos que
compõem o conceito de turismo sejam analisados de maneira distinta, mas
entendendo que cada um destes possuem ligação, ou melhor, conseqüências tanto
no indivíduo quanto na coletividade – sociedade – ao desejarem e demandarem por
produtos e serviços turísticos.
Ao se mencionar estas conseqüências estão sendo mencionados os
impactos que o turismo gera nas destinações a serem visitadas ou consumidas
pelos turistas e visitantes. Em um primeiro momento, pode-se afirmar que o turismo
é promotor de desenvolvimento e crescimento tanto da economia local, quanto dos
padrões e da qualidade de vida das comunidades locais, resgate da memória e
valorização da cultura local, além de maior interesse da população por locais, fatos e
personagens que possam servir de novos elementos a serem divulgadores e
motivadores para a atividade turística.
Mas em um segundo momento, pode-se afirmar que o turismo é
promotor de transformações negativas, ou seja, o consumo turístico e a lógica
capitalista fazem com que o interesse dos empresários seja maior do que os
interesses sócio-culturais da população, interferindo nas relações econômicas,
alterando a forma como o Estado lida com o espaço geográfico, e por fim pode gerar
a marginalização da comunidade local ao não ser inserida nos espaços destinados à
atividade turística (empregos, serviços, comércio, etc.).
Para a regulação, ou melhor, para o ajustamento dos impactos
positivos e negativos em uma dada comunidade ou destinação turística,
desenvolveram-se os estudos e pesquisas a respeito do planejamento turístico e em
como este pode representar um conjunto de conhecimentos e técnicas a ser
empregado pelo Estado quanto pela iniciativa privada objetivando a manutenção, o
desenvolvimento e o crescimento dos espaços turísticos.
O planejamento turístico e seu escopo conceitual esmeram-se na
necessidade do ordenamento das ações corretas para a efetivação da atividade
turística com mínimos impactos negativos, tendo na relação Estado – Empresários –
Comunidade local o tripé de sua sustentação.
Cada um destes elementos do tripé conceitual deve ter suas
responsabilidades e envolvimento com o turismo, não podendo a atividade turística
ser planejada e conduzida sob a tutela da iniciativa privada, mesmo sabendo que é a
própria iniciativa privada quem será a maior beneficiária, observando que os grandes
equipamentos hoteleiros, restaurantes, bares, locais de entretenimento e eventos
são de interesse da iniciativa privada não podendo estes ser coisas estatais.
A comunidade local é concebida pelo planejamento turístico a partir de
tripé com menor poder de intervenção, pois em grande parte das destinações
turísticas a iniciativa privada se estabelece com a intenção de promover o
desenvolvimento e o crescimento local e sempre é bem-vista pela comunidade local
no primeiro momento, contudo, o desenvolvimento do turismo faz com que a
iniciativa privada vá aos poucos marginalizando a comunidade local devido a alguns
fatores como: falta de conhecimento e capacitação para serem empregados nos
serviços formais gerados, inexperiência para com a gestão de negócios e
empreendimentos, carência econômico-financeira fazendo-a vender propriedades a
baixos valores para a iniciativa privada dentre uma série de outros exemplos a
serem dados.
Para tanto, o objeto de estudo e apreciação do planejador em turismo é
compreender as diferentes forças exercidas por cada um destes membros do tripé
conceitual, mas tendo a observação do importante papel que o Estado tem neste
sistema: o de legislar, monitorar e controlar a atividade turística. Ao se referir à
atribuição de legislar, retorna-se a discussão empreendida a respeito de políticas
públicas. No tocante ao turismo, é importante que os processos da política pública
de turismo possam convergir para a arena dialógica entre os membros do tripé do
planejamento turístico favorecendo ao princípio democrático e descentralizado.
Já o sistema de monitoramento e controle são ações exercidas pelo
Estado que carece de pareces e instrumentos técnicos próprios do planejamento
para que a atividade turística possa, ao longo de seu desenvolvimento ser vetor de
geração de emprego e renda, além de ser vetor de desenvolvimento local para a
destinação turística.
Percebe-se que o planejamento turístico tende a apresentar um caráter
dialógico e participativo no seu bojo de ações, mas prevalece o status de
instrumento técnico e de difícil apropriação para a comunidade local, do conjunto de
conhecimentos e saberes a serem aplicados no enfrentamento da marginalização,
da exclusão e dos interesses de classe.
Para tanto, a literatura pesquisada demonstra que há avanço na
orientação do planejamento turístico para a inserção da comunidade local e da
facilitação da compreensão do instrumental técnico empregado, avanço este que
recebe a denominação de planejamento turístico participativo.
A intenção dos pesquisadores analisados não é de criar uma utopia
participativa, mas sim de inserir a comunidade local em espaços próprios para que
possa apresentar suas demandas, necessidades e contribuições em prol do
desenvolvimento turístico local.
O conceito de planejamento turístico participativo, ao ser analisado,
demonstrou um refino das teorias anteriormente pesquisadas, ou seja, o pensar em
ações e estratégias que visem à participação social, que tendam a colaborar no
aumento da porosidade de estratégias descentralizadas e democráticas no tocante
ao Estado, e na aproximação do Estado e comunidade local com a iniciativa privada
responsabilizando cada um destes pelos efeitos positivos e negativos gerados na
comunidade local.
Do conceito de planejamento turístico participativo depreende o
pensamento a respeito das políticas públicas para o setor turístico, não mais como
elemento centralizado e de responsabilidade unilateral do Estado, mas sim como
instrumento legitimador dos anseios e necessidades do próprio Estado, da iniciativa
privada e da comunidade local.
A instrumentalização do policy clycle conduziu a pesquisa no
empreendimento de figurar, de maneira sintética, como deve ser pensado e
empregado o ato de se desenvolver novas e melhores políticas públicas para o setor
turístico brasileiro, dada as suas características e peculiaridades conforme descritas
ao longo da dissertação.
O Estado tem seu local privilegiado no processo das políticas públicas
de turismo, mas ao mesmo tempo tem também toda a atenção e controle da
comunidade local e do setor privado para que de fato possam ser implementados
projetos, planos, programas e outras ações para a sua efetivação.
Ao analisar a política pública de turismo do Estado de Minas Gerais
percebe-se que o processo iniciou-se tendo como parâmetro os tradicionais
caminhos políticos públicos, ou seja, a centralização e os preceitos tecnocráticos,
pois foi uma política planejada pelos membros da Secretaria de Estado do Turismo
de Minas Gerais.
Mas ao remontar sua trajetória, seus efeitos e resultados apontam que
a regionalização do turismo em Minas Gerais fez com que os diversos municípios se
responsabilizassem a respeito da necessidade de organização, planejamento e
desenvolvimento de ações que colaborassem para que os circuitos turísticos se
efetivassem como pólos receptores de turistas e visitantes.
Os municípios mineiros ao criarem as instâncias de governanças
regionais com a inserção dos gestores municipais (prefeituras), dos distintos
membros da iniciativa privada e membros da comunidade local, permitiram que a
descentralização do planejamento turístico se aproximasse das realidades locais e
fosse discutida pelas partes interessadas e não como um conjunto de medidas a
serem cumpridas a partir das decisões emanadas pela Secretaria de Estado do
Turismo de Minas Gerais.
Nestas instâncias regionais a participação social é o viés que interliga,
motiva e delega responsabilidades e atribuições aos diferentes membros que
integram estes espaços deliberativos, fazendo com que a coletividade haja em prol
dos interesses de todos e não privilegiando os municípios mais desenvolvidos ou
tendo um tratamento diferenciado para com os municípios com menor
potencialidade turística.
As relações socioeconômicas de cada um dos municípios que
compõem estas instâncias regionais é que são os elementos motivadores para a
agregação e discussões: o interesse da política pública do estado de Minas Gerais é
fazer com que a descentralização permita aos diferentes atores sociais locais
discutirem o planejamento e a ordenação do turismo regional a partir de suas
realidades, problemas e oportunidades.
Os resultados concretos da política pública de turismo de Minas Gerais
passam a ser expressos não somente pelo aumento da demanda turística nas
destinações locais, mas sim a partir da redistribuição dos recursos do ICMS
mediante o critério turismo.
Tal observação se faz justificada, uma vez que, para o recebimento dos
recursos financeiros do ICMS Turístico, cada circuito turístico, além de cada
município deverá comprovar que a participação social é elemento integrante do
pensamento e da realidade técnica-gerencial a partir dos indicadores: existência de
conselho municipal de turismo, aprovação de política pública de turismo municipal,
relatório das atividades e ações desenvolvidas pelo conselho municipal de turismo.
Inicialmente questionou-se se o processo dos circuitos turísticos em
Minas Gerais não seria apenas uma simples interação sem envolvimento, sem
motivação, ou seja, o contrário do que é de fato participação social e o resultado
homologado pela Secretaria de Estado do Turismo de Minas Gerais para a
redistribuição dos recursos do ICMS Turístico provou que os municípios estão, sim,
engajados na política pública de turismo do estado.
Um fato que chama a atenção na análise dos resultados da
homologação da redistribuição dos recursos para o ano de 2011 foi a ausência dos
municípios turísticos consolidados como Ouro Preto, Mariana, Diamantina e
Tiradentes por não conseguirem comprovar a efetivação da participação social em
seus municípios.
Este resultado reforça o posicionamento a respeito da distância
existente entre as gestões públicas municipais, os empresários e a comunidade
local. Cada um destes elementos trabalham o turismo de maneira isolada e sem a
preocupação com os impactos advindos com o mau gerenciamento da atividade;
além de demonstrar que a participação social, a descentralização e a
democratização ainda são assuntos a serem discutidos e inseridos nas agendas
desses municípios.
Por outro lado os resultados apresentam que a participação social e a
descentralização não são assuntos dominados somente pelos grandes municípios,
pelo contrário os resultados homologados, apresentados na tabela 02 referente ao
ICMS Turístico, demonstraram que os municípios menores é que estão efetivando
de maneira concreta a participação social como elemento condutor para o
desenvolvimento da atividade turística local e permitindo que os diferentes atores
locais possam ser envolvidos nas discussões e ações para o turismo.
Os espaços participativos, como os conselhos municipais de turismo,
tendem a apresentar uma nova dinâmica para a condução da atividade turística e
por isso nem sempre são bem recebidos pelos representantes públicos, pois ao
envolver novos atores sociais nas discussões, poderá o Estado ser responsabilizado
e cobrado para que ações efetivas sejam realizadas e não somente permanecendo
no ostracismo e nos discursos da dificuldade em agir e da falta de recursos
financeiros para atuar.
Essas inquietações formaram os diversos elos de pensamento e
análise do Circuito Turístico Trilha dos Inconfidentes, a partir dos documentos
formais internos – regimento e estatuto, atas de reuniões das assembléias,
instrumentos de avaliação e acompanhamento das atividades do circuito e, ao fim
pode-se perceber que as relações socioeconômicas de cada município podem
representar problemas de assimetria num espaço participativo como o circuito
turístico. No entanto, a regionalização do turismo a partir dos espaços dialógicos e
participativos, segundo a análise feita, faz com que se credite aspectos positivos no
que se refere ao conjunto de planos, ações e resultados alcançados a partir da
participação social e da regionalização do turismo.
A regionalização do turismo ao ser proposta inicialmente pelo estado
de Minas Gerais e mais tarde como parte da Política Nacional de Turismo, mediante
o Programa de Regionalização, segundo a análise empreendida a partir do CTTI, fez
com que fosse derrubado o pensamento de que o tripé do setor turístico (poder
público, setor privado e comunidade local) não seria capaz de se organizar em um
espaço dialógico e participativo, a partir das temáticas envolvendo turismo e
desenvolvimento regional.
Não se pode ignorar que a ação do Governo de Minas Gerais ao
propor a regionalização, seria a de criar espaços em prol do simples cumprimento da
ação gerencial estatal, no que se refere apenas à regulamentação legal: os
municípios iriam se agrupar em circuitos turísticos, mas o turismo, mediante o
planejamento e a sua execução não se dariam de maneira plena, ou seja, os
circuitos turísticos seriam apenas espaços formalizados para que a SETUR pudesse
perceber que a legislação estaria sendo cumprida.
Os resultados demonstrados pelo CTTI permitem afirmar que o
processo participativo foi sim estabelecido pelos municípios participantes e
integrantes do circuito turístico e, que a partir dos múltiplos, diferentes e
incongruentes interesses está sendo estabelecido o processo da participação social,
de legitimação das demandas de cada um dos membros representantes, havendo
com isso o processo democrático e transparente para o planejamento turístico
participativo.
Pode-se perceber com a análise dos resultados que os municípios do
CTTI que foram contemplados com os recursos dos ICMS Turístico foram aqueles
que se engajaram no processo de tornar realidade a prática da participação social
para as discussões turísticas em seus municípios, contrariando os pensamentos de
que somente os grande municípios ou aqueles com a atividade turística
estabelecida, como São João del-Rei e Tiradentes, seriam contemplados.
As agendas formadas pelo CTTI não se consolidam na esfera do
simples atendimento das demandas determinadas pelo Governo de Minas, avançam
além disso, se constituem a partir da vocalização dos atores sociais a partir de suas
demandas e das realidades locais para que então seja de fato consolidado o
processo de desenvolvimento e crescimento da atividade turística regionalizada.
A gestão participativa do CTTI gerou, no ano de 2010, diferentes ações
como citadas neste estudo que possibilitaram ao conjunto dos municípios
participantes a articulação, permitindo que novas proposições e novas ações
possam ser planejadas e executadas nos próximos anos.
O elemento central que move as ações e programas do CTTI é a
participação social ativa dos membros, isto é, as assembléias e reuniões do CTTI
demonstraram a partir da pesquisa realizada, que a interação e participação dos
membros participantes se inscrevem como ação democratizante e construída a partir
da coletividade destes atores sociais participantes.
Os municípios que integram o CTTI tendem a ter maior possibilidade
de que suas políticas públicas municipais possam ser executadas por meio do
conhecimento e das constantes trocas de informação na arena participativa do
circuito turístico, além de poderem conhecer como os municípios que já possuem o
turismo como atividade socioeconômica implementada e desenvolvida poderão
inovar em suas realidades locais.
Pode-se então compreender que a estrutura organizacional, seja esta
entendida a partir das vertentes: organização, planejamento e execução, incluindo
as dinâmicas e práticas adotadas pelo CTTI como elementos que favorecem e
fortalecem a participação social dos diferentes atores sociais envolvidos, sendo ao
mesmo tempo entendido este espaço e sua organização como instrumentos que se
articulam em prol da democratização da viabilização das políticas públicas de
turismo do estado de Minas Gerais.
Ainda sim, pode-se argumentar que a gestão participativa do CTTI se
inscreve dentro da esfera de conhecimento da gestão social, ao ser entendida como
uma gestão que possibilita a todos os atores sociais as mesmas possibilidades de
vocalização de suas demandas, da integração às diferentes estruturas
administrativas eletivas, além de possibilitar aos atores sociais participantes novos
conhecimentos e informações e, por não dizer, da colaboração em prol da cidadania
ativa dos diferentes espaços públicos.
Como recorte para o entendimento dessas considerações traçadas a
partir do CTTI, infere-se afirmar que os gestores municipais integrantes do CTTI
passam, mediante a participação das reuniões e assembléias, a possuir a
capacitação em prol da gestão participativa: a participação social é um processo
construído pelo e para os atores sociais que integram os espaços dialógicos,
participativos e deliberativos, como o CTTI.
No que tange ao processo de aprendizagem por parte dos gestores
municipais para com a participação social, é mister enfatizar que é a esfera
municipal a responsável pelo processo, a nível local, de fazer com que os diferentes
atores sociais se envolvam para discutir, planejar e executar ações em prol do
turismo municipal.
Ainda sim, pode-se comentar que a gestão descentralizada do turismo,
a partir dos circuitos turísticos, favorece o exercício conjunto do planejamento
turístico estratégico a partir da vertente da regionalização: o CTTI apresenta,
conforme dados da pesquisa, que os interesses e vocações turísticas, mesmo sendo
desiguais e em diferentes patamares de desenvolvimento, podem convergir para o
processo de planejamento turístico participativo e estratégico, pois a lógica adotada
é regional e não direcionada para alguns municípios.
Os documentos analisados, além do resultado concreto dos
questionários, fazem com que se construa uma realidade favorável de que a gestão
descentralizada do turismo em Minas Gerais, a partir do estudo de caso
empreendido – CTTI – se consolide no cenário nacional como modelo de gestão
turística, mas que esse modelo evidencia a partir dos elementos analisados pela
pesquisa realizada que avanços estão sendo possibilitados no campo da
participação social, mas ainda muito há que se avançar em prol da descentralização
e das políticas públicas de turismo, em se tratando de gestão turística brasileira.
O planejamento e a gestão do turismo regional e local quando
analisados a partir do CTTI representam desafios para a concretização da
participação social nos municípios integrantes deste circuito turístico, pois a
descentralização, a concepção de novas políticas públicas e planejamento
participativo representam temas novos, quando vistos sob a ótica do turismo.
Este percurso desenvolvido com a pesquisa empírica aliada ao
referencial teórico levou à negação da hipótese inicial que considerava os
instrumentos/mecanismos adotados na gestão do turismo regional do estado, bem
como suas práticas institucionais, não favorecendo o processo de participação
social, enquanto um mecanismo de democratização da gestão pública e
consequentemente, comprometido com o desenvolvimento de uma gestão social no
âmbito das ações de política pública de turismo, a partir dos dados levantados e
discutidos ao longo de todo o estudo.
Por fim apresenta-se como contribuição para o processo contínuo da
regionalização, descentralização e aumento da democracia e cidadania ativa para os
atores sociais do CTTI o projeto de intervenção na realidade pesquisada.
Como demonstrado pelo resultado da pesquisa a partir dos
questionários, o processo de comunicação efetivado pelos gestores do CTTI carece
de alguns ajustes para que os atores sociais participantes possam ter maior acesso
às informações, sejam elas de ordem estatutária, dos resultados concretos obtidos
pelo circuito turístico, ou seja, para o acompanhamento das discussões e
deliberações empreendidas pelos atores sociais.
Para tanto, o projeto de intervenção vem apresentar um novo modelo
para o design do atual site virtual do CTTI: a intenção é de que a democratização
das informações possibilite o aumento das discussões, melhora dos processos
deliberativos e empoderamento dos atores sociais que integram este circuito
turístico.
7 PROPOSTA DE INTERVENÇÃO
Inovações tecnológicas no design do site do Circuito Turístico Trilha dos
Inconfidentes em prol do Empoderamento e Participação Social
7.1 Introdução
O turismo regional é um instrumento capaz de dinamizar as relações
entre os municípios que buscam se inserir em novos espaços dialógicos buscando,
por meio da participação social e da troca de conhecimento, experiências e
informações para a superação de problemas e/ou situações que impeçam o
desenvolvimento e o crescimento dessa atividade socioeconômica.
Além disso, compreende-se que a partir das posições legais
estabelecidas pelo Governo de Minas Gerais, a partir de 1999, e com o suporte da
Política Nacional de Turismo e do Programa de Regionalização do Turismo, os
municípios de Minas Gerais estão consolidando as instâncias regionais de
governança como realidade prática e factível, com o intuito de contribuir para o
planejamento turístico participativo.
Em especial, ao observar a realidade da participação social e de como
os membros participativos interagem a partir da realidade do Circuito Turístico Trilha
dos Inconfidentes – CTTI, é preciso que novas dinâmicas participativas possam ser
incorporadas ao cotidiano deste circuito.
O CTTI, atualmente, já possui avanços significativos com relação ao
planejamento turístico participativo e na proposição e execução de programas e
ações que se revertam para a melhora do turismo regional, além de conseguir a
articulação entre os diferentes atores sociais que hoje compõem a estrutura
institucional do circuito.
Mas para que o processo de participação social possa sempre ser
motivador e instigador, percebe-se que é preciso investir na inovação e no
acompanhamento dos avanços tecnológicos, em especial àqueles ligados à
comunicação: o site do CTTI, hoje, conta com uma estrutura que aparentemente
responde às demandas dos usuários, mas sendo possível perceber que é possível
criar novas relações entre usuários, CTTI e informação.
Este projeto de intervenção apresentará como os meios de
comunicação estão sendo impactados a partir da modernização da internet e em
como essa ação pode significar avanços em prol da melhora da participação social,
da transparência dos atos e deliberações dos atores sociais que contribuem
ativamente com o processo de regionalização do turismo.
7.2 Apresentação
Os meios de comunicação foram revolucionados após o surgimento da
internet e da expansão do World Wide Web, o que resultou em novos e inovadores
elementos que visam à democratização do acesso à informação, ou seja, a partir da
internet as possibilidades de acesso a banco de dados, textos, listas de discussões,
entre outras, que antes eram de difícil acesso ao grande público, se tornaram
abertas e públicas, disponibilizadas nas diferentes páginas com endereço na web.
As informações, que antes não eram acessíveis ao cidadão comum –
ora por exigir o investimento de recursos financeiros necessários para o acesso à
tecnologia (o preço de computadores e hardwares para o acesso à internet), ora
pelas poucas fontes de informações não serem abertas a todas as pessoas que as
buscavam – passam a estar mais disponibilizadas contrapondo inclusive às práticas
de organizações que mantinham sob seu controle informações não socializadas ao
público. A internet, nesse sentido, e a web surgem com caráter revolucionário na
facilitação dessas informações (MONTEIRO, 2001).
Contudo, nos dias atuais o que se verifica é exatamente o contrário: as
organizações estão buscando cada vez mais disponibilizar informações e conteúdos
que auxiliem os cidadãos a compreenderem melhor seus serviços, produtos e outras
ações que venham a ter em determinada comunidade ou país, criando uma imagem
positiva e aberta perante os consumidores e cidadãos.
Entretanto, a utilização dos recursos interativos da internet deve ser
visto com ressalvas, principalmente quando analisado a partir do viés internet –
democracia – política. Os argumentos empregados enfatizam que, a partir da rede
mundial de computadores, as distâncias e as relações entre as pessoas são
atenuadas, causando a impressão de que todos vivem muito próximos uns dos
outros.
Mas essa relação de proximidade entre as pessoas, quando vistas a
partir do interesse que envolve a temática democracia e política, tendem a
estabelecer não uma relação verticalizada, mas sim horizontalizada: os internautas
relacionam-se com outros usuários e não de maneira mais profunda com a
organização (EISENBERG, 2003).
Ao se pensar em organizações, Eisenberg (2003) está citando o
Estado e suas diversas formas de instâncias organizacionais: secretarias,
autarquias, fundações, seções, departamento dentre outros órgãos vinculados de
maneira direta e indireta à execução das ações estatais.
A crítica proposta por Eisenberg (2003) na diferenciação entre
horizontalidade e verticalidade do relacionamento dos usuários dos espaços virtuais
do Estado refere-se à superficialidade das relações a serem estabelecidas: os
usuários dos sites públicos ao perceberem determinado problema, insatisfação para
com os serviços prestados ou apresentando suas críticas e sugestões para com o
site nos espaços próprios o fazem sem que se sintam na obrigação de dialogarem
com o Estado.
A interação social entre o Estado e os usuários do espaço virtual não
se dá pela verticalidade: caso o Estado resolva responder, apresentar seu
posicionamento ao usuário do site, este, por sua vez, não estará interessado nas
respostas ou nos argumentos, pois sua relação não é que seja estabelecido um
diálogo propositivo em prol de melhoras, e sim apenas um canal de direção única
entre usuário – site.
A horizontalidade assim percebida faz com que os usuários destes
espaços virtuais tornem os fóruns ou outros links que permitam o aprimoramento dos
serviços públicos prestados pelo Estado não possam avançar por meio do diálogo e
de um processo comunicativo.
A verticalidade apresentada por Eisenberg (2003) se daria na medida
em que ao receber determinada reclamação, sugestão ou mesmo comentário o
Estado pudesse por meio do mesmo canal de comunicação – o site, estabelecer um
processo dialógico compreendendo em profundidade a informação postada no
espaço virtual e apresentando argumentos, soluções e outras informações ao
usuário, e este por sua vez respondendo ao Estado se o conjunto de dados providos
no processo dialógico sana as suas inquietações.
Esta discussão é vista por Cardoso (2004) de outro ponto de vista.
Segundo o autor, a internet e a rede mundial, quando analisadas a partir das
experiências dos governos, tende a apresentar serviços públicos mais adequados
aos cidadãos, tendo em vista que a transparência e o controle social da sociedade
para com o governo é aumentada a partir de novos meios de comunicação, pois:
uma dramática alteração nas formas pelas quais os cidadãos interagem com seus representantes e governantes, seja em termos de transmitir seus desejos, aspirações e necessidades, seja em termos de opinar sobre iniciativas, projetos ou políticas governamentais ou, ainda, em termos de acompanhar e controlar a ação daqueles que os representam e governam (CARDOSO, 2004, p. 33-34).
Assim, Cardoso (2004) apresenta que é necessário que se estabeleça
um processo verticalizado de comunicação entre usuário e organização a partir do
espaço virtual – internet, pois com a modernização dos meios de comunicação o
Estado e, por sua vez, o próprio político não podem se manter distanciados da
população, carecem de instrumentos próprios e inovadores para que o
acompanhamento e controle social sejam cada vez mais efetivados.
A utilização da internet como meio de comunicação é necessária nos
dias atuais quando se trata do viés democracia – instituições públicas – política,
visando não somente o repasse de informações, mas sim o estabelecimento de
novos parâmetros de relacionamento com os cidadãos das comunidades locais.
É, então, a partir deste pequeno recorte conceitual, que
fundamentamos nossa proposta de intervenção: apresentar ao Circuito Turístico
Trilha dos Inconfidentes a criação de um portal virtual de comunicação, uma home-
page na internet, como uma ferramenta de “pedagogia de gestão democrática e
participativa”. Essa proposta objetiva tornar este recurso mais uma ferramenta da
participação e representação municipal junto às assembléias e reuniões do CTTI, no
qual as informações ligadas aos aspectos turísticos promocionais estariam
acessíveis em um ambiente seguro, e os seus representantes poderiam ter acesso
às atas e documentos oficiais do CTTI, facilitando o acesso às informações das
reuniões e tomadas de decisões.
7.3 Objetivo
Propor ao Circuito Turístico Trilha dos Inconfidentes a utilização de
novas ferramentas de comunicação, via internet, para que haja o incremento da
participação social dos membros associados às decisões e deliberações realizadas.
7.4 Conceito
A proposta a ser apresentada espelha-se na iniciativa de que vários
governos vêm tendo para o alargamento das possibilidades de participação e
controle social dos cidadãos nos serviços públicos prestados, aplicação de recursos
financeiros, além de promover a interatividade entre cidadãos e governo de maneira
mais transparente e menos burocratizada.
O conceito norteador da proposta a ser apresentada ao CTTI é o da
“Casa dos Conselhos”. A partir de um mesmo ambiente virtual da Web, os diferentes
portais de conselhos municipais instituídos e em funcionamento nas cidades, tais
como Mossoró (RN), Ouro Preto (MG), Petrópolis (RJ), São Carlos (SP), Vitória
(ES), dentre outros municípios brasileiros, disponibilizam informações a respeito dos
para o alargamento dos preceitos democrático-participativo para as políticas
públicas.
O conceito adotado é de que o emprego do meio de comunicação, a
internet, possa permitir que, por meio da Web, encontros entre cidadãos e os
membros associados ao CTTI possam debater as proposições deliberadas nas
reuniões e assembléias do circuito promovendo a expansão dos argumentos e maior
visão crítica a respeito das deliberações.
7.5 Características
Atualmente o CTTI disponibiliza, na rede mundial de computadores, um
sítio com importantes informações para os usuários, em geral, tendo a figura 8 como
página principal:
FIGURA 08 – Sítio do Circuito Turístico Trilha dos Inconfidentes. Fonte: CTTI, 2011, s/p.
Os principais links de acesso estão relacionados às atividades
desempenhadas pelo CTTI em relação ao turismo regional, facilitando o acesso às
informações pelos usuários, em geral, do site; além de contar com espaço específico
para contato de quem acessa o endereço virtual do circuito turístico para com os
gestores.
Contudo, não existe nenhuma forma específica de comunicação
referente à gestão do CTTI para os membros associados. Aqueles que por ventura
não possam comparecer às reuniões e assembléias, somente terão acesso ao
conteúdo das atas e deliberações na próxima reunião, ou se a secretaria executiva
do CTTI disponibilizasse as atas por e-mail digitalizadas (o que não vem
acontecendo e mesmo assim torna-se uma atividade dispendiosa de tempo). Essa
ausência ou hiato nas informações por meio do espaço virtual – site – dificulta o
acompanhamento das discussões, a processualidade da gestão do CTTI, ou mesmo
das definições que poderão afetar a todos os municípios envolvidos.
A criação dessa ferramenta, com vista à socialização dos conteúdos
que envolvem a gestão do circuito turístico, contribuirá para que membros
associados e mesmo a sociedade civil possam também acompanhar e opinar a
respeito dos trabalhos e ações desempenhadas pelo CTTI em prol do turismo
regionalizado.
De uma maneira geral, compreende-se que a adoção de uma nova
estrutura do site com conteúdo específico, ou seja, a partir da inserção de novos
links direcionados para a divulgação das atas das reuniões e dos documentos
técnicos do CTTI, significará uma tecnologia de divulgação de conteúdo técnico,
possibilitando uma maior interação dos atores participantes do circuito com os
processos de tomadas de decisão para a gestão turística dos municípios
componentes e, também como instrumento de monitoramento e controle social por
parte da comunidade, em geral, face às decisões tomadas para o desenvolvimento
da atividade turística regional.
Além destes fatores, destaca-se que, por se tratar de um circuito
turístico que abrange 21 municípios, as distâncias, mesmo que curtas, representam
custos para o deslocamento dos representantes em todas as assembléias e
reuniões. Estes custos estariam minimizados no estudo do conteúdo das reuniões
anteriores disponibilizados a partir dos novos links propostos, além de poderem
estudar com antecedência os projetos e ações a serem propostas em futuros
encontros.
A nova estrutura do site a ser apresentada seria constituída da
inserção de novos links, visando ao conteúdo técnico do CTTI, contemplando a
disponibilização do Regimento Interno, Estatuto, Estruturas do CTTI, além de
apresentar um link dedicado às Reuniões e às Atas das reuniões anteriores. No
próximo subtópico deste projeto de intervenção serão pormenorizadas as
informações pertinentes a cada um destes links descriminados.
Portanto, a criação deste instrumento de comunicação virtual facilitará
a participação dos atores sociais envolvidos na gestão do CTTI, além da divulgação
do conhecimento e uma maior mobilização desses atores sociais.
7.6 Plano de operações e protótipo do site
Para que os novos links possam vir a ser funcionais para os usuários
do site do CTTI, será preciso que os gestores atuais desempenhem a administração
funcional deste espaço, alimentando-o constantemente com informações que sejam
de relevância, tanto para os usuários em geral, quanto para os membros
associados.
O processo de alimentação de informações para os novos links se
iniciará com a digitalização do Estatuto e do Regimento Interno; da preparação dos
documentos que se referem à estrutura do CTTI, organogramas, levantamento dos
currículos dos atores sociais que atualmente ocupam cargos eletivos e outras
informações adicionais; além de digitalizar as atas das reuniões que aconteceram
antes da inserção do novo link.
A partir da inserção dos novos links, caberá ao gestor do CTTI e da
equipe de gestão operacional, ao fim de cada reunião, disponibilizar em, no máximo
24 (horas), a ata da reunião e/ou assembléia em link específico para que os usuários
do site possam ler e tomarem conhecimento a respeito do que foi deliberado.
Apresenta-se abaixo a estrutura pensada para os novos links, a serem
contemplados a partir do link “Institucional” já existente na atual estrutura do site do
CTTI.
7.7 Detalhamento e protótipos da nova estruturação do site CTTI
7.7.1 Links Regimento Interno e Estatuto
Serão disponibilizados pelo gestor do CTTI e da equipe de gestão
operacional cópias em arquivos digitais em extensão que não permitam a sua
edição, facilitando aos novos membros a historicidade e/ou o conhecimento de como
o CTTI vem construindo sua trajetória em prol do turismo regional.
A cada alteração no Regimento Interno e/ou no Estatuto, estas deverão
ser digitalizadas e postadas novamente no site, mas tendo o cuidado de preservar
as versões anteriores, para que se construa, virtualmente, um traçado histórico a
respeito da gestão do CTTI.
Este link poderá ser compreendido com exemplo bem sucedido dos
conceitos de descentralização e da formalização da instância regional de
governança, conceitos estes propostos pelo Ministério do Turismo, a partir de suas
políticas e planos (Figuras 09, 10 e 11).
FIGURA 09 – Site do CTTI link Institucional. Fonte: Elaboração própria, 2011.
FIGURA 10 – Site do CTTI link Regimento Interno. Fonte: Elaboração própria, 2011.
FIGURA 11 – Site do CTTI link Estatuto. Fonte: Elaboração própria, 2011.
7.7.2 Link Estruturas
Neste link serão apresentados os organogramas funcionais da
Assembléia Geral e da Diretoria Executiva, além de apresentar um mini-currículo dos
atores sociais que ocupam cargos eletivos nesses espaços, fazendo com que os
usuários conheçam a trajetória profissional e política de cada um destes atores
sociais, além de apresentar emails de contatos institucionais para que os usuários
possam se aproximar o máximo possível destes atores, estabelecendo novos
vínculos (Figuras 12 e 13).
FIGURA 12 – Site do CTTI link Composição das estruturas. Fonte: Elaboração própria, 2011.
FIGURA 13 – Site do CTTI link Composição das estruturas. Fonte: Elaboração própria, 2011.
7.7.3 Link Reuniões
Caberá a este link apresentar, para debate virtual, os temas que irão
compor a pauta das próximas reuniões, seja da Diretoria Executiva, seja da
Assembléia Geral. O intuito desse espaço virtual é ampliar o diálogo entre os
membros associados e a sociedade civil que não estão participando diretamente das
reuniões, mas que se interessam pela temática discutida.
As discussões serão postadas como mini-textos e cada usuário poderá
postar sua posição, contribuindo para fomentar o diálogo, a proposição de novas
idéias, apresentação de dúvidas e sugestões que possam ir além dos espaços como
reuniões e assembléias do CTTI.
A gestão deste espaço será coordenada pelo Gestor, em conjunto com
a equipe de gestão operacional, a qual caberá monitorar, mediar, responder e retirar
deste espaço as mensagens que julgar impróprias para o diálogo neste link.
Ainda no link Reuniões apresentará aos usuários a agenda de reuniões
a serem realizadas, tanto pela Diretoria Executiva quanto a Assembléia Geral,
facilitando assim aos membros associados a disponibilização de agenda para a
participação nestas (Figura 14).
FIGURA 14 – Site do CTTI link Reuniões. Fonte: Elaboração própria, 2011.
7.7.4 Link Atas
Os usuários do site terão acesso, por meio de arquivo digital em
extensão, que não permitirá a sua edição, às atas das reuniões e assembléias já
efetivadas, possibilitando o acompanhamento das discussões realizadas, tanto na
Diretoria Executiva quanto na Assembléia Geral.
Caberá ao Gestor do CTTI, em deliberação com a Diretoria Executiva,
decidir a partir de qual data serão disponibilizados os documentos a comporem este
importe link para o controle social e transparência dos atos, deliberações e
encaminhamentos do CTTI (Figura 15).
FIGURA 15 – Site do CTTI link Atas. Fonte: Elaboração própria, 2011.
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APÊNDICE
Apêndice 1 – Questionário
1. Há o envio de ofícios e/ou convites para as reuniões com antecedência por parte da gestão do Circuito Turístico Trilha dos Inconfidentes? ( ) Sempre envia com antecedência ( ) Envia com alguns dias de antecedência ( ) Envia no dia anterior ( ) Não envia 2. Os ofícios e/ou convite são disponibilizados eletronicamente no site do Circuito Turístico? ( ) Sim ( ) Não 3. O Circuito Turístico procura proceder a redação e disponibilização de documentos como estatuto, regimento, atas e outros instrumentos para a gestão do turismo regional? ( ) Sim ( ) Não 4. Como você avalia a ação do Circuito Turístico Trilha dos Inconfidentes:
Ótima
Muito Boa
Boa Regular Ruim
Aumenta o diálogo entre os municípios participantes
Estimula a participação nas assembléias
Permite maior controle dos participantes nas ações em prol do turismo regional
Facilita o planejamento do turismo
Promove (promoveu) o aumento de acesso a recursos financeiros públicos
Promove a formação e capacitação dos participantes das reuniões em prol do desenvolvimento da ação turística
Comentários adicionais opcional:
5. Como você avalia a sua participação no Circuito Turístico Trilha dos Inconfidentes:
Ótima
Muito Boa
Boa Regular Ruim
Participa com interesse das reuniões e assembléias
Conversa e troca informações, idéias e sugestões com outros municípios que participam das reuniões
Se interessa pelas ações dos gestores do Circuito Turístico
Segue as orientações e diretrizes estabelecidas pelo Circuito Turístico em prol da região
Comentários adicionais: 6. As reuniões são realizadas em cidades distintas da sede do Circuito Turístico? ( ) Sim ( ) Não 7. O Circuito Turístico promove a sensibilização da comunidade receptora da reunião, através de seus atores principais, com antecedência? ( ) Sim ( ) Não 8. Quais seriam as deficiências e desvantagens de se discutir regionalmente o turismo a partir das reuniões e assembléias do Circuito Turístico Trilha dos Inconfidentes? 9. Que sugestões poderiam ser dadas aos gestores do Circuito Turístico Trilha dos Inconfidentes a fim de melhorar a gestão e a participação dos municípios nas reuniões e assembléias?