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e-zine de prosa e poesia de Cataguases - MG
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1
Chicos N. 33
Dezembro 2011
e-zine de literatura e idéias
de Cataguases – MG
Capa
De Gabriel Franco sobre foto de Vicente Costa
Editores Emerson Teixeira Cardoso
José Antonio Pereira
Colaboradores desta edição
Álvaro Alves de Faria
Antônio Perin
César Cantoni
Eloah F. Giacomelli
Flausina Márcia da Silva
Francisco Marcelo Cabral
Marcelo Benini
Mariano Shifman
Renata Pallottini
Ronaldo Cagiano
Fale conosco em: [email protected]
Visite-nos em: http://chicoscataletras.blogspot.com/
Dedim de prosa Esta é nossa última edição de 2011. Publicada no último
dia do ano. Portanto desejamos a todos um ótimo 2012.
Nosso maior poeta Chico Cabral nos presenteia com
uma fornada de magnifico poemas. Saboreiem com prazer são
como os finos pães de um divino boulanger.
Stephen Crane surgiu numa conversa de bar e resolvemos
compartilhar com vocês um pouco sua poesia.
Apresentamos dois poemas da paulistana Renata
Pallottini
Marcelo Benini reaparece por aqui com seus belíssimos
passarinhos.
Um poema do último livro de Ronaldo Cagiano vertido
para o espanhol por Mariano Shifman
Apresentamos a vocês mais um poeta argentino, desta
vez é César Cantoni de La Plata.
O baiano de Itaobim, Antônio Perin nos fala de um
catador de latinhas em Havana.
José Antonio Pereira “viaja” no tempo em uma crônica
sobre Cataguases.
Publicamos aqui o fantástico discurso de Saint –John
Perse quando de sua premiação com o Prêmio Nobel.
Flausina Márcia da Silva nos fala de sua recente leitura de
O livro de João de Rosário Fusco
Emerson Teixeira Cardoso faz um breve relato das
atividades do CAC Grupo que sacudiu Cataguases nos anos 60.
O poeta Álvaro Alves de Faria revela sua indignação com
UBE – União Brasileira de Escritores.
2
Sumário
CHICO CABRAL Poema e outros inéditos 03 STEPHEN CRANE Quatro poemas 07 RENATA PALLOTTINI Alguma coisa e outro poema 12 MARCELO BENINI Três estudos para passarinho 14 RONALDO CAGIANO De las cosas y su ritmo 16 CÉSAR CANTONI Dizia minha avó espanhola e outros poemas 18 ANTÔNIO PERIN Os relógios do cubano 20 MARIANO SHIFMAN A entrega 23 JOSÉ ANTONIO PEREIRA A pracinha da fábrica velha 28 SAINT – JOHN PERSE Poesia – Discurso de Estocolmo – 1960 30 FLAUSINA MÁRCIA DA SILVA Deu vontade de resenhar 34 EMERSON TEIXEIRA CARDOSO
Teatro versos teatro, a epopeia do CAC 37 ÁLVARO ALVES DE FARIA UBE, a entidade dos escritores ignora a poesia 39
3
Escrevo para a voz e para o ouvido.
palavras que destecem suas redes
e nós, na trilha elástica dos versos,
do ritmo português do decassílabo
Escrevo para dar carne à palavra
Para que brilhe nos sinos da fala
Abra sua corola de ouro rubro
E atinja seu fulgor de jóia cara
Escrevo para o brilho e a beleza
da fala, em seus concertos e conflitos.
A palavra - centelha impermanente
- escrevo-a para vós e para o olvido
4
Que marcas do teu rosto no meu rosto
Se acentuam com o tempo, construindo
Uma cópia imperfeita de ti?
Saturado de poemas alheios busquei os meus
No côncavo de minhas pegadas:
Tão longe não fui
Nem tão fundo
Mas de qualquer forma toquei o mundo
E me deixei tocar por seu milagre inconcluso
Insisto em bater à porta das palavras
E que o poema
Me encontre
Preparado para o seu mistério
5
Deitada de costas
De seu corpo se desprende
O odor de um cardume de prata
Enquanto a maré lava as dunas
Nas ressacas do outono
Seus braços em arco sob a nuca
Tecem uma grinalda de boninas
E madressilvas em sua boca se abandonam .
Entre suas coxas, um tufo de capim dourado
Ilumina as pétalas de sua rosa profunda.
Espreguiça à música dos pássaros.
Daqui a pouco abrirá os olhos
E o mundo será como uma laranja, perfumado.
6
Para Marcus Vinicius Quiroga
Na sala da Rua Duvivier
o cheiro de jasmins
colhidos em jardim público
e a presença do gato
sucumbem ao odor das bananas e peras
que perecem à espera do poema
num canto da mesa
de Ferreira Gullar.
7
Stephen Crane (1871-1900),
embora figura menor no cenário da
literatura norte-americana, foi contudo
um precursor da revolução literária
americana que rompeu com as
tradições do passado até então
predominantes nos EUA.
Na ficção Maggie, A Girl of the Streets
(1893) é o primeiro romance norte-
americano verdadeiramente
naturalista. Crane, contudo era um
experimentalista, e assim, no seu
segundo romance, The Red Badge of
Courage (1895) e nos seus primeiros
contos produziu os primeiros exemplos
do moderno impressionismo
americano.
Foi William Dean Howells, um dos seus
"pais literários" que o introduziu à
poesia recentemente publicada, e então
considerada excêntrica de Emily
Dickinson.
Crane reagiu com enorme empatia à
poesia de caráter radical de Emily, hoje
universalmente reconhecida como um
dos gêneros poéticos da literatura
americana. Como resultado dêsse
contato, Crane passou a compor poesias
de um impressionismo imagístico, vinte
anos antes do aparecimento do
movimento que se tornaria conhecido
como "imagismo".
Durante sua vida, Crane publicou dois
volumes de poesia, The Black Riders
and Others Lines (1895) e War is Kind
(1899). A tuberculose ceifou o poeta na
Alemanha (...), para onde fôra
esperançoso de recuperar a saúde.
8
I
Um deus irado estava surrando um homem: esbofeteava-o ruidosamente com pancadas trovejantes que reboavam e retumbavam sôbre a terra. O povo todo veio correndo. O homem gritava e lutava e mordia furiosamente os pés do deus. O povo exclamou: "- Ah, que homem maldoso." E - "- Ah, que deus formidável."
9
II
No deserto vi uma criatura, nua, bestial, que agachada ao chão segurava nas mãos o seu coração e dêle comia. Perguntei: " - É gostoso, amigo? " - É amargo, amargo", êle respondeu. " - Mas gosto dêle por ser amargo e por ser meu coração".
10
III
Vi um homem perseguindo o horizonte: em círculos iam disparando um atrás do outro Perturbei-me com isso. Abordei o homem " - É em vão", eu disse. "você nunca poderá..." " - Mentiroso!" êle exclamou. e continuou a correr.
11
IV
Deus jazia morto no céu:
anjos cantavam o hino do fim:
os ventospúrpuros repetiam gemidos,
suas asas gôta a gôta
sangue
derramavam sôbre a terra.
Esta padecente coisa,
tornou-se negra e definhou-se.
Então negra e definhou-se.
Então das cavernas distantes
de pecados mortos
saíram monstros lívidos de desejo.
Lutaram,
brigaram por causa do mundo
- um naco.
Mas da total tristeza, isso foi triste:
Os braços de uma mulher tentando proteger
a cabeça de um homem adormecido
contra as maxilas da última fera.
Traduzidos por Eloah F. Giacomelli
12
Renata Pallottini nasceu na cidade de São Paulo, em 20 de janeiro de 1931. Cursou Direito, Filosofia e Dramaturgia. Escreveu e produziu trabalhos para teatro e televisão, entre os quais Vila Sésamo, Malu Mulher e Joana. Publicou vários livros de poesia, prosa, teatro e ensaios, desde 1957, tendo recebido diversos prêmios por seus trabalhos. Foi professora da Escola de Comunicações e Artes (ECA) e da Escola de Arte Dramática (EAD) da Universidade de São Paulo, além de
ministrar cursos de dramaturgia no Brasil e no exterior. Desde 1988 faz parte do corpo docente da Escuela Internacional de Cine y Television de San Antonio de los Baños, em Cuba. Coordenou e participou daAnthologie de la poésie brésilienne, publicada em Paris, em 1998, e que reuniu quatro séculos de literatura brasileira. No mesmo ano, integrou o júri do Prêmio "Casa de las Américas", em Cuba. Vive em São Paulo e às vezes em Atibaia.
Alguma coisa fica
do caminhar contínuo
e deste sono.
Alguma folha fica
da primavera
no outono.
Algum fruto, algum gesto, alguma voz.
Alguma coisa frutifica.
E fica em nós.
13
Corta-se o vinho, o sal
Corta-se o pão
Corta-se toda preocupação
Deita-se o corpo à noite
No edredon
E se tenta dormir
Como se nada fosse.
No meio de tudo isso a divisão
Na face dos amantes o amargor
Quando se corta o doce
O sexo o amor
Quando se corta a vida
As formas de carinho
Quando se corta a vida.
Não o sal
Não o vinho.
14
Três estudos para passarinho
I
Problema Oblíquo
Tenho um pássaro nas mãos
O que fazer:
Soltá-lo e perdê-lo,
Ou guardá-lo e perdê-lo?
15
II
Ao teu lado reparava
Como o beija flor alegra o mundo
Todos os dias, todas as tardes,
No mesmo galho, à mesma hora,
O beija flor.
Hoje reparo
Todos os dias, todas as tardes,
No mesmo galho, à mesma hora,
O beija flor.
III
Solta um passarinho e voa torto
Mas aprende e acha pouso
Voar é profundeza de passarinho.
16
Sol nas Feridas, livro de
poemas pode ser adquirido em:
www.dobraeditorial.com.br
17
De las cosas y su ritmo
Cuanto de nós, é o que não somos? Ésio Macedo Ribeiro
El sol encendido en mis ojos
hiere la extranjera gestación de los vacíos.
Hay demasiado tiempo en los relojes de la ciudad:
eternidad con sus termitas de acero
atravesando nuestros entrañas
para el triunfo de lo imponderable.
Estamos purgando la existencia
con esas agujas insolentes
condenándonos a un destino de fatigas
o a ningún registro en los obituarios.
Piedra dentro del tiempo,
la muerte, como el molino,
impone el ritmo de las cosas:
pacientemente nos enharina,
granos de nada
en un campo de bacterias.
traducción de Mariano Shifman Del libro O SOL NAS FERIDAS, Dobra Literatura, São Paulo, 2011.
18
Poeta argentino, nasceu em La Plata (1951), autor de “Confluências” (1978), “Linhagem humana” (1984), “Continuidade da noite” (1993), “Triunfo do real” (2001), dentre outros.
"Bem-aventurados os nascidos", dizia minha avó espanhola, que não havia lido Sófocles – que disse mais ou menos o mesmo de um modo perdurável – e que uma vez abandonou sua pátria, envolta na fumaça dos bombardeios, para morrer republicanamente nesta, triste e cansada da vida, com a fé intacta em nada.
19
Se um país tão lírico como a Alemanha pôde gerar um Adolfo Hitler, faço-me uma pergunta: Há
lirismo inocente?
Eliot tinha uma consciência rançosa e suas roupas cheiravam a cânfora, o que não o impediu ser um poeta à altura do seu tempo, deixando claro que a poesia se encontra sempre acima do homem e que ninguém escreve realmente o que quer senão o que ela lhe dita.
20
A Lázaro Macías
Lázaro Macías, 73 anos, é um morador de
rua em Havana. Como toda ilha resistiu por
anos e anos ao bloqueio econômico. Em seu
“neo-empreendedorismo” resistirá à nova
ordem econômica que já vigora em Cuba?
21
Depois de uma sopa no bairro chinês
Lázaro caminha pelas ruas de Havana
dois cães sem dono o acompanham
“Não são meus. Não tenho como mantê-los”.
Pendente no tempo, arrasta um saco
catando latas no lixo de hotéis e bares.
Coloridas latas de cervejas e refrigerantes
um vermelho ausente é a Coca Cola.
Bermuda rasgada, sapatos rasgados,
camiseta rasgada, no pulso esquerdo
dois relógios marcam seus tempos.
Um lembra quem ele é.
É o relógio descascado,
marca desconhecida
precisa o levar latas ao deposito.
22
O outro lembra quem ele foi.
É o relógio de seu pai
Domingo Macías que ganhou a vida
no caminhão pipa entregando água.
Em seu velho código de honra
Lázaro não pede nem aceita esmola
Não vende – passou quatro dias de fome –
o relógio de seu pai.
Aquele que parou às 18h30,
De uma segunda feira
De um dia 9 qualquer.
23
Nasceu em 1969 em Lomas de Zamora, Argentina, formado em
Direito, é autor dos livros de poesia Punto rojo (2009) e
Material de interiores (2010)
Tinha que levar uma encomenda à Rua
Vilardebó, 500; um envelope de papel
madeira com alguma pasta ou livro.
Tratava-se de uma dessas entregas “não
prioritárias” que podiam ser
postergadas para o dia seguinte; preferi
ir no mesmo dia, porém ao entardecer.
Era uma zona escura que eu ainda não
conhecia bem; estava meio perdido.
Para não caminhar demais, perguntei a
um vizinho, um homem entrado em
anos e em quilos, prontamente abrindo
a porta de um saguão.
As pessoas se assustam diante de
estranhos (sobretudo quando baixa o
sol) e apressa o passo ou se esconde;
mas dessa vez não. O homem ouviu a
pergunta, deu meia-volta pouco depois,
com certa dificuldade – talvez sofresse de
um problema no quadril -, e me olhou de
frente enquanto esfregava a barbicha e
encarava as sobrancelhas muito densas.
Havia me visto antes em outro lado?
- São cinco quadras depois dessa;
passe a avenida e é a primeira. Depois,
uma quadra e meia à esquerda.
Desejou-me sorte.
Na área não havia placas com
nomes das ruas, mas o percurso me
pareceu simples; chegar à primeira
avenida, caminhar até à quadra seguinte
e logo dobrar à esquerda. Estranhou-me
24
a crescente quantidade de automóveis
antigos na medida em que me
aproximava do destino. Às vezes dentro
de uma mesma cidade (e ainda de um
mesmo bairro) há diferenças que não se
explicam só pelo poder aquisitivo.
Indiossincrasias, pensei.
Segui a indicação, nada
complicada. Constatei que a altura foi a
correta. Tinha que estar em frente ao
domicílio procurado: dos lados do
biombo se via uma placa de bronze de
consultório ou estúdio.
- Ah, sim, as pastas para o doutor.
Passe.
Atendeu-me uma mulher de uns
trinta e cinco anos, alta, corpulenta.
Não havia muita luz, de modo que não
pude ver-lhe em detalhes a cara; feia
não era, ainda que a boca grande
tornava-a um pouco tosca.
Adentrei o saguão, que estava às
escuras. Disse que a lâmpada do
corredor havia queimando um pouco
antes. Pediu-me que passasse à sala de
espera do estúdio para poder ler os
dados do envelope e acusar o
recebimento.
Era uma sala ampla, de tetos
altos, com um revestimento de cores
desbotadas e uma proteção com mapas
mundi e frases em latim. Sentia-me
bastante exausto logo depois de uma
jornada cansativa; duzentas e
cinqüenta, trezentas quadras a pé. Não
havia razão para que recusasse seu
convite para sentar. A mulher tinha que
ir até o segundo escritório buscar o
doutor. Antes de retirar-se me serviu
suco de uma jarra apoiada sobre uma
mesinha de café coberta por revistas em
branco e preto. O sabor da bebida,
demasiado doce, viscoso, é o último que
de que me lembro até depois de me
despertar.
Encontro-me estendido sobre uma
cama gigantesca, de pelo menos três
lugares. No momento estou só, com o
tronco nu; também me retiraram o cinto.
Não posso recordar como cheguei até ao
cômodo; não sei o que me deram para
tomar. Mas apesar de estar bastante
apreensivo, não sinto a angústia
imaginável em uma situação assim, à
mercê de qualquer coisa.
Na casa, tingida por uma difusa luz
avermelhada de um pedestal, não há
relógios, e o meu não funciona. A janela
dá para outra casa interna, de modo que
não tenho meios de saber a hora, se é de
noite ou se amanheceu. Penso em gritar,
mas meu temor, estranhamento, não é
proporcional ao esforço que precisaria
fazer. O que mais me preocupa é meu
estado de relaxamento, uma indolência
que percorre todo meu corpo e que não
me deixa em boas condições no caso de
ter que defender-me ou tentar escapar.
Passa um longo tempo, que segundo
meus cálculos é de pelo menos meia
25
hora. Só então junto forças para
levantar-me da cama e tratar de abrir a
porta: o faço sem dificuldade. Na parte
contígua vejo três mulheres
semidespidas, de calcinhas e com
despojados sutiãs. A maior – que é
ruiva-, de grandes seios e uma pinta
sobre o ângulo dos lábios, não chega
aos vinte e cinco anos. As outras duas
asseguram ter vinte, ainda que pareçam
menores: uma loura do tipo alemã,
cabelo curto e nariz demasiado
arrebitado que lhe dá ares de bebê, e
uma delicada morena de traços
indianos, cabelos muito escuros,
azeviche, longuíssimo e sedoso. As três
nasceram para ser desejadas.
- Se continuares comportando-te
tão bem como até agora, terá mais
sobremesa -, disse a maior.
- Enganas-te, querida, teremos
que nos comportar muito bem. Ele
pagou todas as despesas na última
noite, agora nós temos que... -
acrescenta a morena.
- Terás que comportar-se bem
com as três, papi, interrompe a loira.
Por acaso eu não te atraio tanto como
as outras?... Hoje vou ser a primeira.
Não posso recordar nada do que
me atribuem. Não estou louco, não
estou sonhando, as mulheres são reais e
eu gosto muito, mas os desejos naturais
de minha primeira reação
transformam-se imediatamente em
cansaço, de modo que não posso explicar
muito bem, algo assim como uma ilusão
que murcha. Apenas tenho forças para
continuar parado escutando-as falar de
mim. Quero sentar-me ou voltar a
dormir: sequer me interessa perguntá-
las todo o que supostamente passou na
noite anterior. Ou saber o que pode
acontecer esta noite. Vou me sentindo
cada vez mais leve, desprendido de meu
corpo, como se não houvesse gravidade.
Tenho que dormir. Durmo.
Acordo em outro quarto. Ao
contrário do primeiro, neste a luz do sol
estala contra cada objeto da cômoda, das
mesas de luz, sobre um mural a la
mexicana que cobre grande parte de uma
das paredes. Esta cama é convencional,
de dois lugares. Não bem me sento e em
volta emerge do banheiro da suíte uma
mulher de uns trinta anos, figura
estilizada, vestida com saia cinza,
apertada, mas de corte formal, e uma
espécie de camisola branca, muito
engomada, com colarinho bordado. O
ruído dos tacos, desmedidos, parece-me
desagradável. No cabelo, entre louro e
cinza, carrega uma rede.
Eu sou e não sou eu. Sim, porque não
me abandonou a consciência de todo o
meu passado até o momento da entrega:
não perdi a memória de minha vida
anterior, primeiro passo até a loucura.
26
E não, não sou eu de todo, porque
aquele, a ideia de mim que sobrevive na
lembrança, estaria desesperado por
conhecer o que vem acontecendo desde
que cruzou a porta de entrada. Estou
nervoso, é inegável. Mas como só estar
antes de um exame ou frente a uma
entrevista de trabalho.
- Vou às compras – deixa escapar
ao passar a altiva dama -: chegaram
umas novidades nas lojas do centro. Ah,
gostaria de usar hoje o pérramus¹ e o
chapéu que lhe presenteei em seu
aniversário.
- Que aniversário, que pérramus,
que chapéu, podes responder-me?
Criou um mal-estar que não sinto
e ela franze a testa com uma raiva que
nem percebe. O jogo de dupla ficção
anula-se por si mesmo. Ela sai sem
responder-me e eu me retiro para
dormir.
A casa, embora situada em pleno
bairro de classe média, tem ou aparenta
ter uma superfície descomunal. Na
ponta de uma lustrosa mesa de
escritório, ovalada, de comprimento
não inferior a dez metros, analiso os
traços de vinte homens de terno. Uns
têm perfil de ave, outros de tubarão,
com o queixo contraído, alguns de
felinos: todos se assemelham a animais
predadores. Muito me surpreende eu
estar ali, mas não que eles estejam. O
mais jovem de todos se refere a mim
como meu pai. Não sei o que pensar nem
o que sentir; mas se o visse na calçada em
frente, preferiria destruí-lo: para bater-
lhe ou por ser insuportável.
O tempo não é o que cremos o que
fazemos com ele, senão o que ele faz de
nós. De e não com, porque o tempo é
sujeito ativo: não necessita colaboração,
consulta, nem compromisso de suas
criaturas. Volto ao primeiro quarto, o
escuro, o que me levou outra vez até ele
mesmo, como a serpente que morde a
própria cauda. Posso observar-me em
um espelho pela primeira vez desde que
cheguei à casa. Não sei se envelheci,
porque a imagem interna que tenho de
mim corresponde à imagem que o
espelho me devolve. Cansaço não me
falta, mas não o de costume, físico, senão
um profundo esgotamento mental.
Necessito que alguém me abra a porta,
agora fechada. Prestes a voltar e deitar
por causa do tédio ou resignação, entra a
corpulenta mulher do início. Está ou se
considera mais velha, porque agora me
trata de senhor: julgo aos outros como a
mesma forma com que me julgam. Mas
prefiro não averiguar nada. Aproveito a
porta aberta e saio.
Ontem, em outro extremo da
cidade, e já sem esperança de vê-lo
novamente, encontrei-me com meu
cicerone. Aparentemente, não havia
mudado nada, mas senti isso como uma
falácia. Pelo menos, variou a percepção
27
que eu tinha dele. Se soubesse de onde
me enviou aquele entardecer, era o
contrário do que então me pareceu: um
simples homem de subúrbio. Mas se ele
não soube, ninguém sabe nada, nem ele
nem eu. E não foi isso que pensei dele
nem de mim quando perguntei-lhe pelo
nome de uma rua.
- Como estamos indo?
Não me agradam os plurais
descarados em que me incluem sem
autorização.
- Diga-me a verdade.
- Não o entendo.
Avancei um par de passos.
Necessitava vê-lo mais de perto,
descobrir uma chave ou uma armadilha.
Quiçá, imaginou que eu ia golpeá-lo.
Suas sobrancelhas estavam despen-
teadas.
- Está bem, vou lhe dizer. Equivoquei-
me.
- Não o acuso de nada. Onde eu estava?
Chegamos ainda mais perto. Seu
rosto era um velho retrato de família.
- Me consultaste na rua Viladerbó e nem
me lembrei da mudança do nome. Te
mandei a Ballivián, que assim se
chamava quando eu tinha a mesma
idade sua. Tomaste-me como distraído e
te mandei ao passado. Te vi tão
igualzinho a mim que a confusão foi
mais forte que eu. Se te fiz sofrer,
desculpe-me, te peço por Deus.
Fiquei pálido – me conheço -, mas
não reparou em minha falta de cor ou
não se interessou. Seguiu explicando já
mais calmo, quase dono da situação.
- Foste ao passado que justamente um
pouco antes me havia vindo à mente. Se
me analisasse um pouco havias dado
conta, menino: te mandei ao passado
pelo qual não passei. Não ao que me
recordo, senão a outro, ao que
vislumbrei, mas não vivi. Como foram as
coisas?
Ainda confuso, como se flutuasse
entre as distorções de um sonho (o seu,
o meu?) tratei de pensar uma resposta
razoável. Notei-lhe um olhar um pouco
vidrado. Dizer-lhe bem poderia torná-lo
amargo; dizer-lhe mal também, se é que
por alguma razão me considerava.
Afinal, qual era a verdade? Estava
tentando perguntar-lhe se isso que
atravessei pode ter sido meu futuro. No
me animei.
- Veja, é como tudo: questão de gosto,
questão de costume.
O velho esboçou algo parecido a
um sorriso e me deu aquele envelope,
que não havia encontrado destinatário.
Não quis averiguar o que ele tinha.
Tampouco quis abri-lo. Ainda que não
fizesse falta: estava vazio. Ainda tremia,
apressei o passo até a estação sem olhar
atrás.
(¹) Espécie de sobretudo ou abrigo de inverno, muito
usado em meados do século passado na Argentina
28
Dia destes, saindo de
um supermercado, cruzei aquela praça
em frente à fábrica velha, resolvi parar
e sentar em um de seus bancos. Ou
seria assentar? Como ouço muito por
aqui. Pintores pintavam de marrom a
parte do prédio onde até recentemente
funcionou o Bar da Loura. Raramente
estive, como agora, sentado em um
destes bancos, mas sempre passei por
sua calçada, vindo ou indo para a Vila
ou Bairro Haidée, locais onde morei
muitos dos anos de minha vida. Ela é
uma praça única, forma um pequeno
retângulo fechado pelos três lados, já
que um dos lados menores é a rua que
liga a estação ferroviária a vila.
Na maioria das vezes em que parei nestas
imediações, foi com meu pai no Bar
Pinguim, que antes de desaparecer foi
cenário de gravações baseadas na obra
do Ruffato, o bar ficava no térreo do
Hotel Pires. Parávamos ali para um
guaraná após cortar o cabelo na
Barbearia do Seu Euclides, que ficava no
mesmo prédio, junto à entrada do hotel.
Era dali que observava o movimento na
pracinha, principalmente quando as
tecelãs saíam da fábrica. Isto quando não
me distraía com o Horizonte, pescador
do rio Pomba com algum dourado
brilhando em sua fieira de peixes.
Lembrei-me que lá na minha infância
funcionou um cinema naquele prédio,
acho que pertencia ao pessoal do Hotel
Pires, nunca vi filme ali, mas uma placa
era sempre colocada na mesma calçada
por onde eu, não só eu, mas também
meus amigos e a maioria da população
passavam um monte de vezes por dia no
nosso ir e vir. O cinema acabou e várias
atividades foram sucedendo, de uma
29
fábrica de colchões a outros tantos
negócios até que fracionaram o prédio.
Muitos anos depois, morando noutra
cidade, lá aportei no Bar do Quim. Em
uma noite de sábado quente, ainda
vivíamos a ditadura militar, eu, meus
amigos Zé Tarcísio Lima, estudando em
Viçosa e o Fernando Cesário, que
acabara de retornar à cidade, varamos
uma madrugada num bom papo nestes
mesmos bancos; enquanto o Quim,
naquela bonifaciana paciência dele, vez
ou outra nos trazia uma cerveja. Quim
herdara do pai, o Seu Bonifácio, o jeito
calmo e sereno de lidar com todos.
Muitos anos depois, tomando umas
cervejas comigo e o Toquinho, o
Emerson aqui do Chicos, lá no Depósito
de Pão Nossa Senhora do Rosário, nos
contou algumas peripécias do seu
tempo por aqui. Uma delas aconteceu
em um domingo pela manhã, quando,
para atender uns sobrinhos que faziam
um churrasco, foi ao bar por volta de
onze horas buscar umas cervejas, ao
abrir as portas deu de cara com o
Antônio Jaime. Nosso poeta, tranqui-
lamente sentado em uma das mesas,
tomava uma gelada cerveja. Quim
fechara o bar com o Antônio Jaime no
banheiro.
O Toquinho relembrou de um caso
ocorrido com o Fabinho Leite. Este,
uma ave noturna chegava ao bar
sempre de madrugada com sua risada
alta e na mesma altura soltava: Quim me
dá uma coca! Até o dia em que Quim o
chamou a um canto e disse: Fabim! Por
favor, ao entrar aqui peça coca cola.
Neste horário, sempre entra algum
viciado. E a polícia tá de olho no bar. Eu
não quero problemas. Ao que o Fabinho
prontamente retrucou: O Quim deixa de
viadagem! Que diferença faz. Coca e
cola não é tudo o que os caras querem
cheirar?
Tempos depois surgiu ali uma igreja, que
usava uma placa igual a do cinema,
vendendo o seu negócio. Nela, lia-se
entre outras pérolas, duas curiosíssimas
“Não percam todas as sextas feiras show
de milagres.” e mais em baixo: “Diaria-
mente sessão de descarrego de encostos”.
Há tempos a igreja que convivia de
“parede e meia” com o Bar da Loura
migrou e em seu lugar surgiu uma
sinuca, os cânticos foram substituídos
pela conversa dos jogadores e o ruído do
entrechoque das bolas de bilhar. O bar
fechou. Parece-me que convivia melhor
com a igreja.
O vento que sopra anunciando uma
chuva de verão trás o forte cheiro da
tinta. Acabam por me trazerem de volta
aos meus dias atuais e seus afazeres. Vou
mais volto. Gostei de sentar ali.
Entristece-me, ver a cidade lentamente
desmanchando e apagando seu passado e
perceber que tudo vai virando escombros
na memória de seus moradores.
30
Poesia Discurso de Estocolmo
(1960)
"Aceitei para a poesia a homenagem
que aqui lhe é prestada, e que me
apresso a lhe restituir.
Poucas vezes a poesia ocupa um lugar
de honra. É que parece vai
aumentando a dissociação entre a obra
poética e a atividade de uma sociedade
sujeita às servidões materiais.
Distância aceita pelo poeta, mas não
procurada por ele, e que seria a mesma
para o sábio, não fossem as aplicações
práticas da ciência.
Mas, do sábio, como do poeta, é o
pensamento desinteressado que aqui se
pretende honrar. Que, ao menos, aqui
já não sejam considerados como irmãos
inimigos. Porquanto é a mesma a
interrogação que eles fazem sobre um
mesmo abismo, e só os modos de
investigação é que diferem.
Quando se mede o drama da ciência
moderna, que até no absoluto
matemático descobre os seus limites
racionais; quando se vê, na física, duas
grandes doutrinas-mestras formularem
uma um princípio geral de relatividade e
outra um princípio quântico de
incerteza e de indeterminismo que
limitaria para sempre a própria
exatidão das medidas físicas; quando se
ouviu o maior inovador científico deste
31
século, iniciador da cosmologia
moderna e responsável pela mais vasta
síntese intelectual em termos de
equações, invocar a intuição em
socorro da razão e proclamar que "a
imaginação é o verdadeiro terreno de
germinação científica", chegando
mesmo até a reclamar para o sábio o
benefício de uma verdadeira "visão
artística" -, não se está no direito de
considerar o instrumento poético tão
legítimo como o instrumento lógico?
Na realidade, toda criação do espírito é
principalmente "poética" no sentido
próprio do termo; e, na equivalência
das formas sensíveis e espirituais, uma
mesma função se exerce, inicialmente,
para o empreendimento do sábio e
para o do poeta. Entre o pensamento
discursivo e a elipse poética, quem vai
mais longe e de mais longe? E, dessa
noite original em que tateiam dois
cegos de nascença, um aparelhado com
a ferramenta científica e o outro
assistido pelas únicas fulgurações da
intuição, quem é que mais cedo e mais
cheio de breve fosforescência se
exalça? Não importa a resposta. O
mistério é comum. E a grande aventura
do espírito poético não cede em coisa
alguma às aberturas dramáticas da
ciência moderna. Podem alguns
astrônomos ter-se perturbado ao
extremo com uma teoria do universo
em expansão; não há menos expansão
no infinito moral do homem - esse
universo. Por mais que a ciência recue
as suas fronteiras, e em todo o arco
estendido dessas fronteiras, ainda se
ouvirá correr a matilha caçadora do
poeta. Porque, se a poesia não é, como se
disse, o "real absoluto", é certamente a
mais próxima cobiça e a mais próxima
apreensão desse real, nesse limite
extremo de cumplicidade em que, no
poema, o real parece informar-se a si
mesmo.
Pelo pensamento analógico e simbólico,
pela iluminação remota da imagem
mediadora e de associações estranhas,
enfim, pela graça de uma linguagem em
que se transmite o próprio movimento
do Ser, o poeta investe-se de uma super-
realidade que não pode ser a da ciência.
Haverá no homem dialética mais
empolgante e que mais o comprometa?
Quando os próprios filósofos desertam o
limiar da metafísica, ao poeta sucede
reintroduzir aí o metafísico; e então a
poesia, e não a filosofia, é que se revela a
verdadeira "filha da interrogação",
consoante a expressão do filósofo antigo
a quem ela foi mais suspeita.
Porém, mais do que modo de
conhecimento, a poesia é primeiramente
modo de vida - e de vida integral. O
poeta existia no homem das cavernas,
existirá no homem das idades atômicas,
32
porque é parte irredutível do homem.
Da exigência poética, exigência
espiritual, nasceram as próprias
religiões, e pela graça poética a
centelha do divino vive para sempre no
sílex humano. Quando as mitologias se
esboroam, é na poesia que acha refúgio
o divino; talvez mesmo o seu "relais". E
até na ordem social e no imediato
humano, quando as Portadoras de pão
do antigo cortejo cedem o passo às
Portadoras de archotes, é ainda na
imaginação poética que se acende a
alta paixão dos povos em busca da
claridade.
Ufania do homem em marcha por sob a
sua carga de eternidade! Ufania do
homem em marcha debaixo do seu
fardo de humanidade, quando para ele
se abre um humanismo novo, de
universalidade real e de integralidade
psíquica... Fiel ao seu ofício, que
consiste no aprofundamento do
mistério do homem, a poesia moderna
arrosta uma empresa cujo
prosseguimento interessa a plena
integração do homem. Não há nada de
pítico em tal poesia. nada, tampouco,
de puramente estético. Ela não é arte
de embalsamador ou de decorador.
Não cria pérolas cultivadas, nem
trafica simulacros ou emblemas, e não
poderia contentar-se com nenhuma
festa musical. A si alia, em seus
caminhos, a beleza, aliança suprema,
porém não faz dela seu fim nem seu
pábulo único. Recusando-se a dissociar
da vida a arte, e do amor o
conhecimento, ela é ação, é paixão, é
poder e novação sempre, que desloca os
limites. O amor é seu lar, a insubmissão
sua lei, e seu lugar está em toda parte,
na antecipação. Ela jamais se quer
ausência ou recusa.
Nada espera, no entanto, das vantagens
do século. Presa ao seu próprio destino e
livre de toda ideologia, ela se conhece
igual à própria vida, que por si mesma
nada tem a justificar. E é com um mesmo
amplexo, como com uma só grande
estrofe viva, que ela abraça, no presente,
todo o passado e todo o futuro, o
humano, como o sobre-humano, e todo o
espaço planetário com o espaço
universal. A obscuridade que lhe
exprobam não se prende à sua natureza
própria, que é esclarecer, e sim à
própria noite que ela explora e que a ela
cabe explorar: a da própria alma e do
mistério em que o ser-humano imerge. A
sua expressão sempre vedou a si mesma
o obscuro, e essa expressão não é menos
exigente do que a da ciência.
Assim, por sua adesão total ao que é, o
poeta mantém para nós ligação com a
permanência e com a unidade do Ser. E
sua lição é de otimismo. Uma mesma lei
de harmonia rege para ele o inteiro
33
mundo das coisas. Nada pode acontecer
que, por natureza, exceda a medida do
homem. Os piores cataclismos da
história não passam de ritmos sazonais
numa mais vasto ciclo de
encadeamentos e de renovações. E as
Fúrias que atravessam o cenário, tocha
erguida, iluminam apenas um instante
do longuíssimo tema em curso. As
civilizações maturescentes não morrem
de modo algum com os estertores de um
outono; mudam apenas. Só a inércia é
ameaçadora. Poeta é aquele que rompe
para nós a acostumança.
E assim é que, mau grado seu, o poeta
se acha também ligado ao
acontecimento histórico. E, do drama
de seu tempo, nada lhe é estranho. Que
a todos diga ele claramente o gosto de
viver esse tempo forte! Porquanto
grande e nova é a hora em que se nasce
de novo! E a quem, então, haveríamos
de ceder a honra de nosso tempo?...
"Não temas, diz a História, levantando
um dia a sua máscara de violência; e,
com a mão levantada, faz aquele gesto
conciliatório da Divindade asiática no
mais forte da sua dança destruidora,
"não temas nem duvides - porque a
dúvida é estéril e o temor é servil. Antes,
escuta essa batida ritmada que minha
mão erguida imprime, inovadora, na
grande frase humana, em criação
permanente. Não é verdade que a vida
possa renegar-se a si mesma. Não há
nada vivo que do nada proceda, nem
que pelo nada se apaixone. Porém,
tampouco, nada conserva forma ou
medida sob o incessante afluxo do Ser.
A tragédia não está na própria
metamorfose. O verdadeiro drama do
século está na distância, que se deixa
crescer, entre o homem temporal e o
homem intemporal. Será que o homem
aclarado sobre uma vertente vai
obscurecer-se sobre a outra? E o seu
amadurecimento forçado, numa
comunidade sem comunhão, não
passará de falsa maturidade?... "
Ao poeta indiviso cabe atestar entre nós
a dupla vocação do homem. E é isto
alçar perante o espírito um espelho
mais sensível às suas potencialidades
espirituais. É evocar no próprio século
uma condição humana mais digna do
homem original. É, enfim, associar
mais ousadamente a alma coletiva à
circulação da energia espiritual no
mundo... Face à energia nuclear, a
lâmpada de argila do poeta bastará a
seu propósito? Basta, se de argila se
lembrar o homem.
E é suficiente, para o poeta, ser a má
consciência do seu tempo.
In: PERSE, Saint-John. "Poemas". Tradução de
Bruno Palma. Rio de Janeiro : Grifo, 1971
34
Deu vontade de resenhar
O Livro de João, romance de
autoria do Rosário Fusco, um dos
principais criadores da Revista Verde,
anunciadora do modernismo de Minas
Gerais, começa com as “reminiscências”
do narrador que, “num dia de outubro”,
é acusado de ser amante de Carmélia,
pelo marido desta.
A narrativa é intrigante, logo de início,
pois João, o narrador, fora confundido
com algum outro, suposto amante,
merecedor da morte. Para se safar
do confronto, João estabelece um
diálogo absurdo com seu quase
assassino. Chega ao cúmulo de dizer que
a mancha no lençol de sua cama
resultara de um encontro com seu
assistente de trabalho, cuja beleza
desconcertante...
A origem da mancha afinal é mais
prosaica, conforme explicações posteri-
ores. A presença do marido invasor, no
quarto de João, se explicará também.
Rosário responde às prováveis
interrogações do leitor, no fio mesmo da
narrativa.
João trabalha num laboratório de
análises clínicas, localizado em região de
meretrício do Rio de Janeiro e próximo
da sua residência. Sobre a época, posso
dizer que leio uma edição de 1944, a
única parece.
Ele fala da pensão onde mora, uma
edificação de estilo datado, e manifesta
seu “apego às coisas que sugiram
imagens do passado.” Compara a uma
futura decadência, quando seu aposento
“envergonharia um chiqueiro.”
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João inventa um joão para desviar a
cólera de Moreira, o marido de
Carmélia, mas não se livra da invenção,
enreda-se com ela. Os solilóquios de
João e seu outro irrigam a narrativa com
a seiva cultural daquele contexto bra-
sileiro. Foi uma escolha interessante do
autor, trabalhar com dois joões, em vez
de um Quixote e um Pança, por exemplo.
As personagens aparecem na trama
como tipos, caracterizados pelo modo de
agir socialmente e de pensar sobre as
coisas da vida. Poucos têm nome pró-
prio, Moreira e Carmélia, que geram as
reminiscências, são nomeados. Os
outros são o Major, devoto enamorado
da Dona da Pensão, de quem o amor da
vida toda, aparece doente, “só para
morrer” e um casal formado pelo
Fotógrafo e a Loura. São personagens
sem tradição, pertencem ao cotidiano e
ao anonimato. João não, suas reflexões
evocam sua mãe e uma história de vida.
O texto de João chega a ser filosófico –
humano, para ele, é “um adjetivo mise-
rável, qualificador de grandezas e misé-
rias.” Tece considerações várias sobre a
situação criada com o suicídio da Loura,
que estava grávida do Fotógrafo,
foragido, após matar um suspeito de
caso amoroso dela. Considera o agir da
polícia, a importância dos nomes e, mais
enfático conclui que “A morte não altera
coisa alguma no cotidiano dos vivos e
mortos.” “A morte de Cristo foi
espetacular, rebelou os elementos: daí o
seu prestígio. Antes dele a morte era im-
portante, depois dele, perdeu a impor-
tância. A ressurreição da carne, prome-
tida e conceituada, desmoralizou o mis-
tério do fim”. Este é um dos parágrafos
mais ousados do livro. João acredita
na alma. “Mas na alma ligada à carne,
alma que deita comigo, levanta comigo,
escova os dentes...” Declara participação
do mistério, mas duvida da igualdade
dos homens diante das leis dos homens
e de Deus. “Somos e não somos. Depen-
de do boletim meteorológico, das
oscilações da bolsa e das notas (colunas)
sociais.” João se enreda nos aconteci-
mentos das vidas dessas personagens,
ao ponto de se mudar para a residência
de Moreira e Carmélia, por insistência
deste último. Em alguns momentos das
relações de João com elas, determinados
aspectos de sua conduta atraem a
simpatia do leitor, sem truques. É o caso
de sua compaixão pela Loura e dos seus
escrúpulos quanto aos expedientes
pouco lícitos de que se vale o Fotógrafo.
João observa o casal Moreira e Carmélia
de dentro do pacto conjugal deles e diz a
si mesmo, “Tu és o catalisador João”.
Isso não autoriza o leitor a deduzir que
João fez uma escolha, porque o tema
destino é recorrente em suas reflexões,
fala de uma linhagem de decisões
anteriores às nossas.
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“... (Moreira) afirmara-me, certa vez,
que, no amor, o que se ama é a inquieta-
ção...” Nesse capítulo XXII, entram em
cena os sentimentos, inaugurados com o
ciúme. São mais de 60 páginas carrega-
das de minúcias e ousadias sobre o en-
volvimento de João num possível triân-
gulo amoroso e sua inépcia para posicio-
nar-se. Ao final do vigésimo nono
capítulo, o leitor se depara com um João
que acode Carmélia, quando da chegada
de Moreira, logo após a saída de um
homem, recebido por ela no quarto do
casal. Era terça-feira, dia de João e
Moreira, incentivados por Carmélia,
irem se “distrair”. João se furtara dessa
vez, andava arredio.
Por que as coisas não podem ser ditas
simplesmente, entre as pessoas? O
narrador pergunta. No entanto, o Livro
de João é narrativa construída a partir
do não dito e se sustenta nisso. Rosário
Fusco talvez dissesse, é e não é, depende
do leitor e do João da Bíblia.
Os sentimentos desse enredo desenre-
dam-se. “Moreira, para justificar as
concubinas que tomava, atribuía aman-
tes à mulher. E, eu, por desejar possuí-
la, queria disputá-la, não com o marido,
mas com os outros que me tivessem
antecipado na posse de mesma
natureza.” João desatina e
intervém nos acontecimentos de forma
inesperada. Uma outra personagem, o
ginecologista da Carmélia, se vê em
situação parecida com a do João, na
confusão do início do livro. Agora,
porém, há uma descrição das verdades e
das mentiras, síntese do novo papel
desempenhado pelo João, não mais
aquele envolto com exames de urina da
Carmélia, solicitados por Moreira. Não
freqüenta mais seu calabouço,
profundezas da sua alma.
O autor nos adverte: “Nos livros, as
descrições dos sentimentos pertencem,
noventa por cento, ao poder, à força da
sensibilidade de quem lê. A imaginação
monta e desmonta cenas que as palavras
ajudam a construir, para que as
assistamos numa sucessão de imagens,
que se propõe, vivas, ao nosso espírito.
Por instantes, a alucinação da coisa
descrita se apossa de nós, e nos domina,
despótica e voluntariosa. Mas a verdade
é que só podemos rever o já visto, sentir
o já sentido. Narrai a mais delicada
história de amor a quem nunca amou e
rir-se-á de vós.”
Estamos já no capítulo XXXII e nada vou
dizer sobre os dois últimos, vinte
páginas, porque me intriga ainda, como
no início, o final.
O texto de Rosário Fusco é denso e
telegráfico ao mesmo tempo, sua
temática lembra Dostoiévsky e o livro
não tem prazo de validade, ao contrário
das edições. O exemplar que li está
caindo aos pedaços, literalmente. Uma
pena!
37
Teatro versus teatro, a
epopeia do CAC
Os Beatles começavam a acontecer
no Hit parade. Pelé jogava no Santos, o
tropicalismo ainda engatinhava e o
cinema novo era a grande promessa de
nossa cinematografia.
Foi nesse contexto artístico e
histórico que surgiu por estas bandas e
barrancas do Rio Pomba o Centro de
Arte de Cataguases. Falar dele, dando
ao mesmo tempo minha íntima, posto
que modesta contribuição para
relembrar da sua existência a partir do
Cine Clube Sergei Einstein, é a
incumbência que me foi delegada.
O CAC foi um grupo de arte surgido
na esteira dos muitos movimentos
culturais de Cataguases da década de
sessenta. Os caquistas se propunham
dentre outras coisas a manter aqui um
centro de arte; com certeza achavam que
os que já existiam não eram o bastante.
O ano, 1964; o grupo, uns seis gatos
pingados capitaneados por um jovem
(mas aquela altura nem tão jovem
assim) Paulo Bastos Martins. Em
tempo hábil cuidaram de arranjar tudo:
estatutos, ata, alvarás e os cambaus.
A cidade não tinha até então tantos
espaços culturais o que fazia com que
suas atividades acontecessem sempre
em locais diferentes. O auditório do
colégio, a sala da maçonaria, os
subterrâneos do prédio do cinema, onde
havia ainda algumas mesas
remanescentes da época em que teria
sido um salão de bilhar.
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Ali aconteciam os eventos: Teatro do
Absurdo: encenação de “O Mestre” de
Ionesco; exposição de quadros de Isaac
Monteiro, judeu holandês, naturalizado
brasileiro e a Mostra Fantástica de
Clério Benevenuto, artista local
emergente que se dizia descendente
direto do próprio Benevenuto Cellini,
exatamente nesta ordem em que estão
relacionados.
Mas o campo de atuação dos moços
caquistas até que era bem mais
abrangente. Incursionaram pela
música concreta – atenção pessoal, eu
disse música – literatura, pintura,
escultura e acreditem ou não, até
radiodramaturgia. Em matéria de
cinema arriscaram-se a voos mais altos
chegando a produzir um filme de longa
metragem, O Anunciador, até
recentemente, única fita rodada aqui
depois do ciclo da Phebo de Humberto
Mauro. Aliás, a quem foi dedicado.
O CAC foi um Sesaugatac no dizer de
um de seus integrantes e mais ativos
participantes (não por acaso o ator
principal no filme que acabei de citar)
Carlos Moura, e teria dado aí a palavra
final em relação ao movimento, mas
efemérides são efemérides, então vamos
lá: Sesaugatec, nada mais é que a
inversão do nome da cidade de
Cataguases, truque que demorei a
decifrar.
Acho que o Centro de Arte de
Cataguases se realizou melhor mesmo
foi no tablado. Produziram peças que se
não foram excelentes no que concerne
as suas montagens, já que desprovidas
de respaldo técnico, primavam pela
originalidade dos temas, pelos seus
processos de improvisação, experi-
mentação e inventividade.
A própria noção de dramaturgia
implica a existência de um texto que é
onde enquanto gênero literário este se
realiza. Os caquistas resolveram
romper com este critério inventando o
teatro sem o texto, sem nenhuma
bolação.
As peças tinham títulos bombásticos:
Humanidade Acorrentada; Invenções
Opus I; Introdução ao suicídio; as
apresentações eram feitas às sextas
feiras no palco do Cine Teatro
Cataguases (antigo nome do Cine
Edgard) quando não havia programado
nenhum filme de cowboy e a plateia era
composta essencialmente de
convidados.
39
UBE, a entidade dos escritores
ignora a Poesia
Para quem não sabe, UBE quer
dizer União Brasileira de Escritores. Já
foi uma entidade séria. Já foi uma
entidade representativa. Hoje não é
mais. Nem sei, ao certo, o tempo em que
fui associado da UBE-SP. Mas são mais
de quatro décadas, seguramente.
Participei de muitas campanhas de
eleição na UBE. Nunca aceitei qualquer
cargo de direção na entidade.
Trabalhava por uma chapa por
convicção literária e também
ideológica.Sou apenas um poeta. Um
poeta que se dedicou a vida inteira à
Poesia. Também sou um jornalista que
se dedicou a vida inteira ao jornalismo
cultural, à crítica e à promoção de livros.
Por exemplo, no suplemento “Jornal de
Domingo” que criei e editei por 13 anos
no extinto Diário de S. Paulo, dos
Diários Associados, havia lugar para
todos, democraticamente, até para
desafetos declarados. Por esse trabalho
em favor do livro e da literatura foram-
me concedidos dois Prêmios Jabutis de
Imprensa, da Câmara Brasileira do
Livro, e três Prêmios Especiais da
Associação Paulista de Críticos de Arte.
Nesse tempo, anos 70, 80, a UBE ainda
era a UBE, que participava inclusive das
questões políticas, com posições
coerentes e firmes em defesa de
escritores que enfrentavam problemas
com a ditadura. Eu, por exemplo, fui
preso cinco vezes pelo Dops, como
subversivo.
40
A última prisão tento esquecer até hoje,
mas sei que não esquecerei nunca.
Voltando ao assunto: nunca aceitei
cargo de direção na UBE, quando ela
era, de fato, uma entidade represen-
tativa dos escritores. Hoje não é mais.
Sempre pertenci a uma corrente comba-
tiva no jornalismo. Mesmo nas questões
culturais. E na literatura também. Um
poeta e jornalista por mais de quatro
décadas associado à UBE, sem nenhuma
mancha que pudesse desabonar a mim
ou a entidade. Pois agora a UBE realizou
um Congresso de Escritores na cidade de
Ribeirão Preto. A bem da verdade, fui
cogitado, numa conversa de um ou dois
minutos, durante um lançamento de
livro, para realizar no evento uma
Oficina de Poesia, coisa que está na
moda. Declinei e sugeri que a UBE
promovesse, no Congresso, uma leitura
de poemas, com a participação de
muitos poetas. Afinal, ao meu ver, isso
caberia facilmente numa programação
tão extensa. Insisti na leitura de poesia
com vários nomes, por acreditar que os
poetas enriqueceriam o evento. Insisti
várias vezes. Não obtive resposta
nenhuma. O poeta Luis Avelima enviou-
me uma mensagem generosa pedindo
que eu me inscrevesse no evento. Mas o
fez, acredito, em nome pessoal. Senti
que a idéia de uma leitura de poesia com
a participação de vários poetas estava
fora de cogitação. O Congresso de
Escritores foi realizado deixando
subtendido na sua programação que
Poesia é artigo de segunda ou terceira
categoria. E para falar sobre poesia
brasileira, a UBE convidou o poeta
português, Luis Serguilha, que se
encontrava no Brasil na ocasião. Nada
contra o poeta. Mas a UBE deu a
entender que não temos gente capaz de
falar sobre poesia brasileira. Temos sim:
escritores e ensaístas de peso, sérios,
honestos e que, aliás, participaram do
Congresso, mas discutindo outros
assuntos. Estavam no evento escritores,
ensaístas e poetas que conhecem a fundo
a Poesia do Brasil. Mas não: preferiu-se
um poeta de fora para falar sobre a
poesia brasileira. Eu, particularmente,
vejo nisso uma afronta. Diante desse
descaso em relação à Poesia, pedi meu
desligamento da UBE, uma entidade
muito distante daquela que conheci.
Hoje, uma entidade que diz ser de
escritores e que, de maneira inexpli-
cável, relega a um segundo plano a
Poesia de um país que é considerada
uma das mais ricas do mundo. Escrevi
uma carta ao senhor presidente da UBE
pedindo meu desligamento. Ele não
respondeu pessoalmente, por falta de
educação ou por descaso. A resposta foi
lacônica, assinada pela Secretaria
Administrativa.
41
A seguir, agradeci o meu desligamento
com outra carta. Apresento toda essa
documentação aqui. No final, isso tudo
revela a cara deste país em que vivemos.
A UBE, hoje, é uma entidade que
ninguém sabe ao certo o que significa ou
representa. Lamentavelmente.
*****
A seguir, a troca mensagens entre
o ex-associado poeta Álvaro Alves de
Faria e a UBE de São Paulo:
*****
1.
Caro Joaquim Maria Botelho
Presidente da UBE-SP
Não sei ao certo há quanto tempo sou associado da
União Brasileira dos Escritores em São Paulo,
mas, pelos meus cálculos, há mais de 40 anos.
A realização do recente Congresso de
Escritores em Ribeirão Preto constituiu, para
mim, uma profunda decepção.
Acreditei que, a esta altura da vida e por tanto
tempo sendo um associado, poderia sugerir algo
que, ao meu ver, enriqueceria o evento.
Por várias vezes pedi que fosse realizada
uma sessão de leitura de poemas, com vários
poetas convidados. Nada individual.
O que mais choca é saber que um poeta
estrangeiro - contra o qual nada tenho, por ser
inclusive meu amigo - foi convidado para falar
sobre poesia brasileira.
Para mim, particularmente, isso soa como
um verdadeiro insulto, porque temos aqui - e nem
é preciso dizer - gente capacitada que poderia falar
sobre a produção de poesia neste país.
Senti, então, que a Poesia, nesse
Congresso, foi tratada como um artigo de
"segunda categoria", talvez uma "arte menor", tal o
descaso que a UBE dedicou a esse gênero literário.
Tal o descaso que a UBE dedicou aos
poetas de São Paulo, particularmente, e de outros
Estados do país.
Para mim, isso é inaceitável.
Sendo assim, não me sinto representado
em nada na UBE e peço meu desligamento de seu
quadro associativo.
Peço por gentileza que esta solicitação seja
atendida, porque é em caráter irrevogável.
Agradeço sua atenção
Atenciosamente,
Álvaro Alves de Faria
42
2.
Caro Álvaro,
o presidente chegou a convidá-lo pessoalmente no
lançamento do livro Gente Pobre para que você
desse uma oficina sobre poesia.
A programação do Congresso contou com uma
oficina de poesia e uma palestra do Serguilha
sobre a poesia.
Também foi realizado um sarau poético aberto a
todos os presentes.
O nosso presidente discorda dessa afirmação.
Mas o seu pedido de desligamento está acatado.
Secretaria Administrativa da UBE
3.
Senhores da UBE-SP:
Eu agradeço, sinceramente, e lamento muito
encerrar minha ligação com a UBE, de mais de
quatro décadas, desta maneira.
De fato, o presidente falou-me sobre uma Oficina
de Poesia numa conversa de um ou dois minutos,
durante o lançamento de um livro, local
totalmente inadequado para tratar de um assunto
assim. Como resposta sugeri que fizéssemos uma
leitura de poemas, com muitos poetas, o que, ao
meu ver, enriqueceria o evento.
Achei que, a esta altura da minha vida e
sendo sócio da UBE há tanto tempo, poderia fazer
essa sugestão numa programação que teve de tudo.
Infelizmente, a sugestão sequer foi
discutida, mesmo com minha insistência.
Mas, o mais vergonhoso, ao meu ver, é
chamar um poeta estrangeiro, Luis Serguilha, de
Portugal, para falar sobre poesia brasileira, com
tantos especialistas em poesia que temos na
própria UBE, muitos dos quais estiveram em
Ribeirão Preto. Nomes de peso na literatura do
Brasil.
Tenho publicado muitos livros em
Portugal, mas se algum dia eu fosse convidado
para falar sobre poesia portuguesa naquele país,
por uma questão ética, eu recusaria.
Agradeço meu afastamento e tenho mais
um lamento a somar: Eu me dirigi ao Senhor
Presidente da entidade e acredito que até por um
gesto de elegância e de educação, o mínimo, a
resposta a este assunto deveria ter sido escrita por
ele e não por uma "secretaria" impessoal.
Mas, no resumo de tudo, isso revela bem
no que se transformou a UBE-SP, a entidade que
diz representar os escritores brasileiros.
Agradecido
Ávaro Alves de Faria