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8/16/2019 Ciencia Politica - Resumo 2016
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ELEMENTOS QUE CARACTERIZAM O ESTADO: A IMPORTÂNCIA DA TEORIA GERAL DO
ESTADO (Resumo)
Estudar o Estado e suas relações com a sociedade implica, necessariamente, analisar os
mais variados aspectos que envolvem o próprio funcionamento das instituições responsáveis por essa
sociedade. Estado, Governo, Democracia, Legitimidade, Poder são questões que, imbricadas, exigem
uma disciplina para o estudo de suas complexidades: é aí que entra a Ciência Política, forma de saber
cujo objeto se desenvolve no tempo – sendo por isso histórica, no dizer de Bobbio –, sofrendo contínua
transformação, sendo impossível nela aplicar a experimentação, própria dos físicos e biólogos.
Em síntese, repetindo Bobbio, a Ciência Política, compreendido como ciência do homem e
do comportamento humano, tem em comum, com todas as outras ciências humanísticas, dificuldadesespecíficas que derivam de algumas características da maneira de agir do homem, das quais três são
particularmente relevantes:
- O homem é um animal teleológico, que cumpre ações e se serve de coisas úteis para
obter seus objetivos, nem sempre declarados, e muitas vezes, inconscientes, não podendo a Ciência
Política prescindir, desse modo, da presença da psicologia e da psicanálise;
B - O homem é um animal simbólico, que se comunica com seus semelhantes através de
símbolos – dos quais o mais importante é a linguagem. O conhecimento da ação humana exige adecifração e a interpretação destes símbolos, cuja significação é quase sempre incerta, às vezes
desconhecida, e apenas passível de ser reconstruída por conjecturas;
C - O homem é um animal ideológico, que utiliza valores vigentes no sistema cultural no
qual está inserido, a fim de racionalizar seu comportamento, alegando motivações diferentes das reais,
com o fim de justificar-se ou de obter o consenso dos demais;
D – Disso decorre a importância que assume na pesquisa social e política a revelação
daquilo que está escondido, assim como a análise e a crítica das ideologias.A Ciência Política será, assim, essa disciplina que, mediante um processo de
compreensão interdisciplinar, possibilitará interpretar a complexidade que envolve o Estado, o poder, a
política, a democracia e o direito (e suas consequências para a Sociedade). Por isso, é necessário
entender que a Ciência Política guarda uma inexorável relação com os demais ramos da ciência
estudados pelo homem, que, de um modo ou de outro, produzem realidade(s), como o direito, a
economia, a história, a psicologia, a sociologia, a filosofia etc.
A “necessidade” do Estado, por assim dizer, que faça a interdição, a ruptura, entre
civilização e barbárie, o que se traduziu em um rompimento histórico-paradigmático, depois de sístoles
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e diástoles representadas pelas formas liberal e social, com o contraponto das experiências socialistas,
tem o desafio, contemporaneamente, de responder às novas necessidades e enfrentar os novos
dilemas, caracterizadas pelo epíteto que a tradição cunhou do século XX em diante: o Estado
Democrático de Direito, que busca assegurar as conquistas modernas e resgatá-las naquilo que ainda
está incumprido, enfrentando, inclusive, suas próprias dificuldades frente às transformações operadas
por novas formas de vida.
O Estado na Teoria Política Moderna
Várias teorias tentam explicar e justificar a origem do Estado. Com efeito, além da
perspectiva contratualista – mais em voga – poderiam ser mencionadas outras vertentes de explicação
da origem do Estado e do poder político. A visão instrumental do Estado na tradição contratualista
aponta para a instituição estatal como criação artificial dos homens, apresentando-o como um“instrumento” da vontade racional dos indivíduos que o “inventam”, sempre buscando o atingimento de
determinados fins que marcam ou identificam as condicionantes de sua criação.
Neste sentido, a perspectiva aberta pela escola do jusnaturalismo contratualista – nas
suas variantes particulares, como se verá – é crucial para o entendimento da trajetória adotada pelo
Estado Moderno e sua estrutura institucional como Estado Constitucional em seus diversos aspectos
assumidos ao longo dos últimos cinco séculos.
A concepção orgânica contrapõe-se à ideia contratualista, vendo a sociedade como“natural” ao homem. Nesta, por outro lado, a Sociedade/Estado é vista como uma criação artificial da
razão humana através do consenso, acordo tácito ou expresso entre a maioria ou a unanimidade dos
indivíduos... Fim do Estado Natural e o início do Estado Social e Político.
Para os autores dessa escola, o estado civil surge como um artifício da razão humana
para dar conta das deficiências inerentes ao estado de natureza, construído como hipótese lógica
negativa ou, para alguns, como um fato histórico na origem do homem civilizado. O contrato clássico
aparece como um instrumento de legitimação do Estado – já existente – e a base sistemática de
construção do sistema jurídico.
Pode-se dizer, então, que:
A - o estado de natureza, como hipótese lógica negativa, reflete como seria o homem e
seu convívio fora do contexto social;
B - o contrato representa o instrumento de emancipação em face do estado de natureza e
de legitimação do poder político; e
C - o estado civil, portanto, surge como uma criação racional, sustentado no consenso dos
indivíduos.
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Para os contratualistas, a figuração do estado de natureza não é uniforme. Uns, como
Thomas Hobbes e Spinoza, veem-no como estado de guerra, ambiente no qual dominam as paixões,
situação de total insegurança e incerteza, domínio do(s) mais forte(s), expressando-o com adágios, tais
como: guerra de todos contra todos; o homem lobo do homem, etc. Outros, como Rousseau, definem-
no como estado histórico de felicidade – o estado primitivo da humanidade –, em que a satisfação seria
plena e comum (mito do bom selvagem, sendo significativa a frase de abertura do Contrato Social: os
homens nascem livres e iguais e, em todos os lugares, encontram-se a ferros), e o estabelecimento da
propriedade privada joga papel fundamental. O estado civil seria um corretivo do próprio
desenvolvimento humano, que teria, assim, uma estrutura triádica (estado de natureza, sociedade civil
como momento negativo e estado civil como república).
Da leitura de Hobbes presume-se que a natureza humana está em permanente conflito,isto é, em guerra generalizada (o homem é o lobo do próprio homem), porém para evitar a guerra,
Hobbes sugere um Estado que controle e reprima as tensões derivantes dessa condição do homem.
Em sua obra central o Leviathan (1968) de Hobbes, originariamente publicado em 1651,
apresenta uma das primeiras tentativas, de sistematizar o comportamento político dos seres humanos,
de acordo com a lógica dedutiva, as leis do movimento e os conceitos do século XVII, que tanto
revolucionaram a investigação científica. Em seu método próprio, o trabalho de Hobbes foi uma ruptura
com o passado em relação a dois pontos: primeiro, ele aplicou uma metodologia científica aocomportamento do indivíduo como o fundamento de sua teoria política, em vez de se preocupar em
tornar a ação do Estado mais eficiente, a exemplo de Maquiavel, e, em segundo lugar, sustentou que
os apetites e as aversões são o que determinam as ações voluntárias do homem (ao contrário do ponto
de vista medieval, segundo o qual os apetites do homem ou as paixões tinham de ser refreados por um
agente externo) e que o único meio para os homens satisfazerem seus apetites e, simultaneamente,
evitarem a mais importante aversão (a morte) era admitir um poder soberano perpétuo, contra o qual
cada um deles seria impotente.
Hobbes poderia ter demonstrado sua tese quanto à renúncia do poder do indivíduo em
favor do soberano mostrando que a luta onipresente por aquele poder levaria ao colapso qualquer
sociedade e a um aumento da probabilidade de morte violenta. De homens razoáveis se poderia
esperar, sem qualquer outra discussão, a compreensão da necessidade de abrir mão de todo o poder
indispensável a um soberano, que pudesse prevenir esse colapso. Em vez de usar esse argumento,
Hobbes introduz a abstração lógica do estado de natureza, uma condição hipotética em que não há
poder comum para controlar os indivíduos, nem lei e nem coação da lei.
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O homem civilizado queria sair dessa condição, mas ao mesmo tempo ele também tinha -
no estado de natureza - os direitos naturais que queria preservar, particularmente "a liberdade que
cada homem possui para usar seu próprio poder como quiser, para a preservação de sua própria
natureza; isto é, de sua própria vida, e, consequentemente, de fazer qualquer coisa conforme seu
próprio juízo e razão e, além disso, de conceber os meios mais apropriados para tanto". (Hobbes,
1968, 189) Por essa razão há uma tensão entre preservar a liberdade vantajosa no estado de natureza
e o medo da violência e da guerra, que logicamente esse estado produz. Isso leva à renúncia do poder
do indivíduo em favor de um soberano.
Os homens devem, em seu próprio interesse, reconhecer total obrigação para com o
soberano. Esse soberano (ou um indivíduo ou um grupo de homens) reduziria todos os súditos à
impotência. Hobbes, porém, se opõe a, essa colocação sob dois aspectos: primeiro, a sujeição émelhor do que a guerra civil (a morte), e, segundo, não seria do interesse do soberano fazer isso a
seus súditos porque a força do soberano provém, do vigor dos súditos.
Ressalta-se que para Hobbes, o homem é o indivíduo que almeja a honra. Entre as
causas da violência, uma das principais reside na busca da glória, quando os homens se batem "por
ninharias, como uma palavra, um sorriso, uma diferença de opinião, e qualquer outro sinal de desprezo,
querem seja diretamente dirigido a suas pessoas, quer indiretamente a seus parentes, seus amigos,
sua nação, sua profissão ou seu nome". (Ibidem, cap. XIII, p. 75.) A honra é o valor atribuído a alguémem função das aparências externas.
O homem hobbesiano não é então um homo oeconomicus, porque seu maior interesse
não está em produzir riquezas, nem mesmo em pilhá-las. O mais importante para ele é ter os sinais de
honra, entre os quais se inclui a própria riqueza (mais como meio, do que como fim em si). Quer dizer
que o homem vive basicamente de imaginação. Ele imagina ter um poder, imagina ser respeitado — ou
ofendido — pelos semelhantes, imagina o que o outro vai fazer. Da imaginação — e neste ponto
Hobbes concorda com muitos pensadores do século XVII e XVIII — decorrem perigos, porque o
homem se põe a fantasiar o que é irreal. O estado de natureza é uma condição de guerra, porque cada
um se imagina (com razão ou sem) poderoso, perseguido, traído.
Nessa perspectiva, Hobbes é defensor de um Estado absoluto e observando que o clamor
do povo sempre foi por igualdade e liberdade, nesse sentido, desmonta a retórica dos conceitos de
igualdade e liberdade enquanto um valor vital – pois igualdade e liberdade são as correntes que
motivam constantemente as lutas e guerras entre os povos. Por esse motivo Hobbes diluiu esses
conceitos de grande clamor popular. Para Hobbes o Estado deve administrar o medo nos seus súditos,
pois as pessoas não renunciariam sua liberdade natural se não tivessem nada a temer.
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O soberano governa pelo temor e não pelo terror, o estado de natureza impõe no homem
o terror, assim teme ser morto pelo próprio amigo, pois sua liberdade é inata e incontrolável. O direito
sobre a propriedade é defendida pela burguesia, bem como a autonomia de fazer com ela o que melhor
decidir. Confere assim ao indivíduo o direito de alienar, destruir, vender ou doá-lo conforme sua
vontade impera. Porém no Estado hobbesiano todas as terras e bens estão sob controle do soberano.
Hobbes foi considerado um pensador maldito, para tanto suas ideias valeram-lhe a alcunha de
hobbista, figurando um pejorativo ou ofensa comparado a “maldito” ou ainda “maquiavélico” nas ideias
(Estado monstruoso, homem belicoso, etc.) seja porque subordinou a igreja ao Estado ou porque
limitou o direito de posse sobre a terra que agora dependia do beneplácito do governo. Contudo
Hobbes mostrou-se um pensador tempestuoso, pois se desligava do pensamento aristotélico e da
Escolástica reinantes na época.Há muitos problemas nessa concepção de Estado: por que, por exemplo, deveriam
indivíduos que amam sua liberdade entregar todo seu poder a um soberano, na esperança de que esse
fosse justo e honesto ou, pelo menos, representasse seus principais interesses? A burguesia inglesa
nunca aceitou o modelo de Estado de Hobbes porque ele determinava que o soberano, quer uma única
pessoa ou uma assembleia, deveria ter o poder de nomear seus sucessores. (Hobbes, 1968, 54). Essa
rejeição faz muito sentido se se considerarem os interesses individuais ou de grupo: ninguém que
queira manter o controle sobre um governo poderia ficar satisfeito em conceder ao próprio governopoderes que lhe possibilitariam perpetuar-se.
O conceito de contrato social de Hobbes recorre somente uma vez à estratégia dos
interesses das paixões refreadas ao se referir à finalidade de estabelecer um Estado constituído de tal
forma que os problemas criados pelos homens passionais fossem resolvidos de vez e para todos. Os
homens, em busca da paz, confiariam a um soberano o controle de suas paixões com o interesse de se
refrearem a si próprios; desistiriam de seu poder individual para que nenhum deles pudesse reduzir o
poder de qualquer outra pessoa através da força. No entanto, muitos contemporâneos de Hobbes, e
certamente aqueles que o seguiram, não aceitaram essa solução, acreditando que uma estratégia de
contra-submissão fosse um princípio permanentemente necessário.
John Locke é um individualismo liberal, defensor nato da liberdade e da tolerância, é, pois,
considerado o pai do empirismo, desenvolveu a teoria da tábula rasa em contraposição à doutrina das
ideias inatas e do direito divino de governar explícitos no Primeiro e Segundo Tratados. Para John
Locke, tido como “pai do liberalismo”, o estágio pré-social e político dos homens, ou seja, sua vida em
natureza se apresentava como uma sociedade de “paz relativa”, pois nele haveria certo domínio
racional das paixões e dos interesses.
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Nos quadros do estado de natureza, a razão permitiria a percepção de limites à ação
humana, conformando um quadro de garantias naturais ou, melhor dizendo, um quadro de direitos
naturais que deveriam ser seguidos pelos homens; aqui o homem já se encontra dotado de razão e
desfrutando da propriedade (vida, liberdade e bens); não há, todavia, na eventualidade do conflito,
quem lhe possa pôr termo para que não degenere em guerra e, ainda, tenha força coercitiva suficiente
para impor o cumprimento da decisão.
Para Locke, como para Hobbes, a condição política original do homem é um singular
"estado de natureza" não-primitivo – o estado de perfeita liberdade individual no qual o homem tem a
prerrogativa de todos os direitos e privilégios da lei de igualdade de natureza em relação aos outros –
onde o homem poderia não apenas assegurar e preservar sua propriedade mas ser, ao mesmo tempo,
juiz e executor da lei natural. Porém, esse estado de natureza pode degenerar em um estado deguerra: um homem pode tentar submeter outro homem a seu poder absoluto.
Homens vivendo juntos de acordo com a razão, sem um superior comum na Terra comautoridade para julgar entre eles, nisso consiste propriamente o estado de natureza. Mas aforça, ou um desígnio declarado de força contra a pessoa de outrem, quando não háqualquer superior comum na Terra a quem apelar por auxílio, constitui, o estado de guerra; éa falta desse recurso que dá ao homem o direito de guerra mesmo contra um agressor,embora esteja em sociedade e seja igualmente súdito. (Locke, 1955, 14).
E para se defenderem contra o estado de guerra, Locke argumenta (ainda concordando
com Hobbes) que os homens se juntam na sociedade política, com um corpo de leis que regem as
relações de poder entre eles. Nessa sociedade política os homens entregam os direitos de
autopreservação da propriedade à comunidade (O Estado):
No entanto, porque nenhuma sociedade política pode subsistir sem ter em si o poder de
preservar a propriedade e, para tanto, de punir as ofensas de todos os membros dessa sociedade,
somente haverá sociedade política quando cada um dos membros renunciar ao próprio poder natural,
passando-o às mãos da comunidade, em todos os casos que não o impeçam de apelar à proteção da
lei estabelecida por ela.
Portanto, sempre que qualquer número de homens se reúne em uma sociedade de tal
forma que cada um abandone seu poder executivo da lei natural, passando-o ao público, aí, e somente
aí, haverá uma sociedade política ou civil. (Locke, 1955, 61-63)
Mais do que isso, Locke diverge completamente de Hobbes quanto à natureza do
soberano: na sua definição de sociedade política a monarquia absoluta é incompatível com o governo
civil. O monarca não tem autoridade para apelar senão a si mesmo, e, portanto, está no estado de
natureza, não na sociedade civil. Locke exclui a monarquia absoluta de qualquer forma aceitável de
governo. Os homens, uma vez, podem ter consentido em dar o poder a um único "homem bom eexcelente... a uma espécie de autoridade natural”, mas, em seguida, ao descobrirem que seu sucessor
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não podia manter suas propriedades seguras da mesma maneira, insistiram para que o poder fosse
colocado em "corpos coletivos de homens". (Locke, 1955, 67-68) .
Dessa forma, a sociedade política de Locke não define, na verdade, a forma de Estado,
mas, antes, somente seu princípio fundamental dos direitos individuais. E ele é absolutamente
específico sobre em quem residem esses direitos. O que é importante para Locke é que os indivíduos
entregam seu poder político "natural" a outrem - a um poder legislativo, a um grupo de homens ou a um
único homem, que elaborará e fará cumprir as leis que mantenham a propriedade de cada indivíduo e a
sua segurança pessoal.
Assim, para superar os inconvenientes do estado de natureza, os homens se reúnem e
estabelecem entre si um pacto que funciona como instrumento de passagem do momento “negativo” de
natureza para o estágio político (social); serve, ainda, como fundamento de legitimação do “Estado de
Sociedade”. Contudo, há diferenças marcantes entre os autores no que diz com o conteúdo destes
pactos. Fiquemos, em um primeiro momento, com dois deles: Hobbes e Locke.
O Estado é caracterizado como o Leviatã na obra de Hobbes, que o designa como “deus
mortal”, porque a ele – por debaixo do Deus imortal – devemos a paz e a defesa de nossa vida. Esta
dupla denominação resulta fortemente significativa: o Estado absolutista que Hobbes edificou é, em
realidade, metade monstro e metade deus mortal, como se pode ver na obra o Leviatã.
Por outro lado, em Locke, altera-se substancialmente o conteúdo do contrato, admitindo,inclusive, seu caráter histórico, muito embora permaneça como um princípio de legitimação do poder.
Aqui, a existência-permanência dos direitos naturais circunscreve os limites da convenção. O “pacto de
consentimento” que se estabelece serve para preservar e consolidar os direitos já existentes no estado
de natureza.
O convênio é firmado no intuito de resguardar a emersão e generalização do conflito.
Através dele, os indivíduos dão seu consentimento unânime para a entrada no estado civil e,
posteriormente, para a formação do governo quando, então, se assume o princípio da maioria.
A consequência destas atitudes díspares se mostrará na configuração do estado civil
proposta por cada um dos autores citados. Poderemos ter a construção de um poder ilimitado, posto
que sem nenhum referencial no estado de natureza, ou seja, um poder novo, sem vínculos ao estilo
hobbesiano, tido como ilustrador do estado absoluto, uma vez que o “príncipe” tudo pode, ou tudo deve
fazer, pecando unicamente por fraqueza. Aqui, não há parâmetros naturais para a ação estatal, uma
vez que pelo contrato o homem se despoja de tudo, exceto da vida, transferindo o asseguramento dos
interesses à sociedade política, especificamente ao soberano. O Estado e o Direito se constroem pela
demarcação de limites pelo soberano que, por não ser partícipe na convenção instituidora e, recebendo
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por todo desvinculado o poder dos indivíduos, tem aberto o caminho para o arraigamento de sua
soberania.
Sua contribuição para a política foi extremamente importante porque apresenta um
pensamento político desvinculado do pensamento religioso. O jusnaturalismo de Locke se funda na
trilogia estado natural/contrato social/estado civil. Concebeu o estado de natureza como sendo de
relativa paz, concórdia e harmonia designando assim, a vida, a liberdade e os bens como direitos
naturais do homem. Além do direito sobre os bens, Locke defende que a propriedade inexiste no
estado de natureza passando a ser instituída pelo homem através do seu trabalho – origem da
propriedade privada. Percebe-se que tanto Hobbes quanto Locke defende a ideia de um contrato
social. Para Locke o contrato surgiu da necessidade da passagem do estado de natureza para o
estado civil objetivando a segurança e preservação da propriedade por meio da lei, árbitro e da força deum corpo político unitário. O contrato é fundado no consentimento do grupo que por sua vez inaugura
um Estado com governo (monarquia, oligarquia ou democracia) e poderes próprios ( legislativo
executivo e federativo). Para Locke os direitos naturais deve ser o cerne do estado civil. O pensamento
lockeano foi marcante para muitos movimentos como a Revolução Gloriosa, a monarquia parlamentar
inglesa, a Revolução norte-americana, os iluministas franceses e a Grande Revolução, espalhando-se
por todo o Ocidente.
J-J Rousseau propôs a soberania como fonte legítima de poder emanado do povo. Evitoufalar dos processos que levaram o homem a escravidão reconhecendo que não há como verificar os
fatos reais que lograram para tanto. Nem mesmo os vestígios deixados pelo homem são incapazes de
dar conta de todo o processo. No Contrato Social Rousseau estabelece as condições de um pacto
legítimo depois de o homem ter perdido sua liberdade natural.
A existência de um contrato social que originou um Estado com poderes de regulamentar
os diferentes aspectos da vida social. A sociedade então se organizaria em torno de uma autoridade
com poderes legítimos que, por meio do contrato entre os indivíduos legitimariam esse poder baseados
na vontade geral. O modelo proposto por Rousseau estabelece a liberdade por meio da obediência de
cada indivíduo que constitui parte do todo, isto é, uma submissão à vontade geral em detrimento da
vontade de um indivíduo ou grupo de indivíduos.
Rousseau não considera o homem como “o lobo do homem”; na verdade, o homem se
transforma no lobo do homem no decorrer da história. É fácil perceber, assim, que o estado de
natureza rousseauniano é antitético ao de Hobbes: “Tudo é bom quando sai das mãos do Autor das
coisas”, porém “tudo se degenera nas mãos do homem”, sentencia. Consequentemente, no seu
Contrato Social, Rousseau diz que o homem nasceu livre, e, paradoxalmente, encontra-se aprisionado.
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Rousseau pretende, assim, devolver a liberdade ao homem, e o modelo que propõe se sustenta na
consciência humana e deve estar aberto à comunidade.
A vontade de que fala Rousseau não advém da submissão a um terceiro, através de um
pacto: ela se origina de uma união entre iguais. O homem rousseauniano só deve obedecer à
consciência pública representada pelo estado, fora do qual não há mais do que consciências privadas
ou individuais, que devem ser rechaçadas porque prejudiciais.
Para Rousseau a concepção de sociedade civil é uma descrição do modo como os
homens são atualmente encontrados em sociedade não como uma construção ideal ou hipotética, mas
como uma realidade. Por isso ele postulou exatamente a dicotomia antagônica entre natureza e
sociedade civil: Rousseau viu o homem na natureza como sem moralidade, mas ao mesmo tempo sem
maldade; o homem é corrompido não pela natureza, mas pela posse da propriedade e pela formaçãoda própria sociedade civil. É a sociedade civil que é corrupta e a natureza é um ideal pré-humano.
O primeiro homem que, após cercar um pedaço de terra, se lembrou de dizer: isto é meu, eencontrou pessoas simples o bastante para acreditarem nele, foi o verdadeiro fundador dasociedade civil. Quantos crimes, quantas guerras, quantos assassinatos, quantas desgraçase horrores teria poupado para a espécie humana aquele que, arrancando as estacas ouatulhando o fosso, tivesse gritado aos seus semelhantes: guardai-vos de ouvir esseimpostor; estais perdidos se vos esqueceis de que os frutos da terra pertencem igualmente atodos nós, e de que a própria terra é de ninguém! (Rousseau, 1967, 211-212)
Rousseau, contudo, vê a formação da sociedade civil como o produto da voracidade do
homem: "a partir do momento em que pareceu vantajoso para um homem possuir provisões suficientespara dois, a igualdade desapareceu; a propriedade foi introduzida; o trabalho tomou-se necessário; e
as vastas florestas tomaram-se campos risonhos que tinham que ser regados com o suor humano e
onde a escravidão e a miséria eram logo vistas, germinando e crescendo com as colheitas".
(Rousseau, 1967, 211-212).
Rousseau, portanto, viu o Estado da sua época como criação do rico para assegurar sua
posição como classe dominante, um Estado apresentado como benéfico a todos, mas destinado a
preservar a desigualdade. Ele sustentou que era impossível separar a desigualdade social dadesigualdade política, mas ao mesmo tempo acreditou que os homens queriam ser livres e iguais – que
foi sua ignorância que os levou a aceitar a sociedade civil na qual viviam. Rousseau pôde, então,
conceber um Estado que garantiria a liberdade e a igualdade.
A contrario sensu, uma vez que o modelo contratualista via positivamente o Estado, surge
a tradição socialista – de base marxista, fundamentalmente – que se apoia em uma versão negativa do
Estado desde uma perspectiva que considera a hegemonia e a submissão no contexto de uma
sociedade de classes.
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No livro A origem da família, da propriedade privada e do Estado, Engels diz que a síntese
da sociedade civilizada é o Estado, que, em todas as épocas conhecidas, tem sido o Estado da classe
preponderante e essencialmente, em todos os casos, a máquina de opressão da classe explorada.
Marx e Engels reconhecem ao Estado, pois, somente um fim: a opressão de uma classe por outra.
O pensamento marxista é uma das mais vigorosas reações às doutrinas clássicas da
teleologia estatal. Leva, pois, à negação do Estado, isto é, a sua extinção. Na mecânica social
marxista, a rotação das classes, que se dará até o inteiro desaparecimento desta, condiciona a
natureza e os fins do Estado. O Estado é, assim, superestrutura do modo de produção capitalista, que
representa a infraestrutura, onde esta determina aquela.
O marxismo, na visão de Bobbio, teria deixado uma lacuna ao não ter desenvolvido uma
ciência política, tampouco uma teoria da democracia. O que seria evidentemente problemático postoque, para ele, ao renunciar construir tais teorias as sociedades pós-revolucionárias se encontravam
enredadas no denso cipoal de ter que conviver com um “estado socialista” que cada vez mais se
burocratizava e enrijecia antes que fenecer, contrariando a prospecção de Marx, Engels e Lênin. Para
Bobbio, essa lacuna no marxismo traria uma consequência ainda mais grave. A ausência de uma teoria
do estado seria a razão – se não a única, uma das mais importantes – dos “gravíssimos defeitos” das
Bobbio e a teoria marxista do Estado sociedades pós-revolucionárias. O estado socialista, não na
teoria ou nas idealizações teóricas, mas na realidade histórica dos últimos cinquenta anos, tornou-seum estado-partido, um estado no qual o partido transformou-se no suporte do poder estatal, o órgão
que tem não somente as funções tradicionais de reunir as reivindicações e inseri-las no sistema, mas
também de dar respostas, ou seja, tomar as decisões válidas para a toda comunidade (BOBBIO, 1987,
p. 30).
Uma vez que Marx não desenvolveu uma única e coerente teoria da política e ou do
Estado, as concepções marxistas do Estado devem ser deduzidas das críticas de Marx a Hegel, do
desenvolvimento da teoria de Marx sobre a sociedade (incluindo sua teoria da economia política) e de
suas análises de conjunturas históricas específicas, tais como: a revolução de 1848, na França, e a
ditadura de Luís Napoleão, ou a Comuna de Paris de 1871. Além disso, temos a obra mais recente de
Engels ([1884] 1968) e O Estado e a Revolução, de Lenin ([1917] 1965). A variedade de interpretações
possíveis, baseada nessas fontes diferentes, levou a um debate considerável, indo de uma posição
que defende a visão leninista àquelas que vêem uma teoria do Estado claramente refletida na análise
política e econômica de Marx, ou tomam o Estado autônomo do Dezoito Brumário (de Luís Napoleão)
como a base para a análise da situação atual. Apesar dessas diferenças, porém, todos os teóricos
marxistas, de um modo ou de outro, baseiam suas "teorias" do Estado em alguns dos "fundamentos"
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marxistas e são esses fundamentos analíticos que formam o quadro do debate. Quais são eles e por
que estão sujeitos a tantas interpretações diferentes?
Em primeiro lugar, Marx considerava as condições materiais de uma sociedade como a
base de sua estrutura social e da consciência humana. A forma do Estado, portanto, emerge das
relações de produção, não do desenvolvimento geral da mente humana ou do conjunto das vontades
humanas. Na concepção de Marx, é impossível separar a interação humana em uma parte da
sociedade da interação em outra: a consciência humana que guia e até mesmo determina essas
relações individuais é o produto das condições materiais - o modo pelo qual as coisas são produzidas,
distribuídas e consumidas.
A segunda versão do Estado Moderno: o modelo liberal e o triunfo da burguesia
Durante o período no qual duraram os Estados Absolutistas, a burguesia havia sidorelegada a um segundo plano. Ela detinha o poder econômico, mas não o político, sendo este privilégio
dos aristocratas. Devido a isso, na França, ela se uniu ao povo e, posteriormente, a alguns membros
do clero e da nobreza, para derrubar o Rei e poder participar das decisões políticas. Isso culminou, em
1789, na Revolução Francesa, de ideais iluministas, que marcou o início da Idade Contemporânea. O
contratualismo foi essencial para os revoltosos, pois eles visavam a criação de uma Constituição
(contrato social) para a França. Da luta contra o absolutismo surgiu o liberalismo, uma ideologia de
princípios individualistas, que preconizava garantias contra os poderes arbitrários, direitos humanos,liberdade, mobilidade social e, principalmente, a limitação da área de ingerência do Estado, entre
outras ideias.
O liberalismo pode ser dividido em três núcleos: moral, político e econômico. O núcleo
moral afirma os direitos básicos do ser humano, como vida, liberdade e dignidade. O núcleo político
contém os direitos políticos dos indivíduos, que são a representação, o consentimento individual, a
soberania popular e o constitucionalismo. O núcleo econômico traz os pilares capitalistas: economia de
mercado livre, a competição e a propriedade privada. Como o liberalismo prega a não-interferência do
Estado, a não ser em algumas poucas atividades, ele também é entendido como uma ideologia
antiestado.
No fim do século XIX, o ideário liberal concebeu um novo projeto, que foi chamado de
justiça social. Essa justiça consistia em uma ajuda do Estado àqueles indivíduos de baixa
autoconfiança e de fraca iniciativa, abatidos pelo mercado. A partir daí surgiu o Welfare State (Estado
de bem-estar social).
Em Locke que vemos a constituição inaugural do perfil do liberalismo político sustentando
a necessidade da limitação do poder e das funções do Estado. Com a Revolução Francesa, a
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burguesia inaugura seu poder político como classe: “acabava ela de suprimir a contradição com o
passado”. E uma nova contradição se estabelece, a saber: a contradição burguesia-operariado, aquela
que na sequência do conflito ideológico lhe haveria de ser fatal à conservação intacta dos privilégios
econômicos adquiridos”, prenúncio, em certa medida, dos embates futuros que conduziriam à ruptura
“desta” ordem e/ou às transformações intestinas rumo ao modelo de Estado Social que emergirá
tempos depois.
O que se pode divisar deste esboço é que o liberalismo significou uma limitação da
autoridade, bem como uma divisão da autoridade, sendo que o governo popular se formula a partir do
sufrágio e da representação restritos a cidadãos prósperos, embora esta situação tenha se
transformado já em fins do séc. XIX, quando a representação e o sufrágio se universalizam (primeiro
com o voto masculino independente de renda). Com isto há a consolidação das conquistas liberais, taiscomo: liberdades, direitos humanos, ordem legal, governo representativo, legitimação da mobilidade
social etc.
No Século XIX, o liberalismo tornou-se a doutrina da monarquia limitada e de um governo
popular igualmente limitado, já que o sufrágio e a representação eram restritos a cidadãos prósperos.
Hoje em dia, o que a palavra liberal geralmente significa na Europa continental e na América Latina é
algo de muito diverso do que significa nos EUA. Desde o New Deal de Roosevelt, o liberalismo
americano adquiriu, nas palavras de Richard Hofstadter, “um tom social-democrático”. A passagem da fórmula liberal do Estado Mínimo para o Estado Social, em sentido amplo,
importou na transformação do perfil do modelo adotado pelo liberalismo clássico, no qual, como visto
acima, à autoridade pública incumbia apenas, e tão só, a manutenção da paz e da segurança, limitada
que estava pelos impedimentos próprios às liberdades negativas da época.
A partir de meados do século XIX, percebe-se uma mudança de rumos e de conteúdos no
Estado Liberal, quando este passa a assumir tarefas positivas, prestações públicas, a serem
asseguradas ao cidadão como direitos peculiares à cidadania, agindo, assim, como ator privilegiado do
jogo socioeconômico.
No século XIX, os liberais e os movimentos e partidos liberais mudaram a estrutura
econômica, social e política da Europa alterando drasticamente a comunidade internacional. Pôs-se fim
à escravidão, às incapacidades religiosas; inaugurou-se a liberdade de imprensa, de discurso e
associação, a educação foi ampliada; o sufrágio foi se estendendo até a sua universalização – muito
embora esta tenha se concretizado já no século XX –; Constituições escritas foram elaboradas; o
governo representativo consolidou-se como modelo de organização política; garantiu-se o livre
comércio e eliminaram-se as taxações até então impostas, etc.
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No referente específico ao sufrágio, o seu alargamento provoca uma consequência
imediata com a formação de partidos políticos (de massa), provocando uma maior participação eleitoral
– no sentido quantitativo –, bem como reformulando o conteúdo das demandas políticas – na
perspectiva, agora, qualitativa. Há uma suscetibilidade tanto de governos quanto de partidos às
reivindicações sociais que se expressam a partir da ampliação da participação político-eleitoral, que
passa a incluir os não possuidores de patrimônio ou renda, os proletários/operários, na sequência as
mulheres e aqueles com uma idade limite, a qual vem sendo reduzida historicamente.
Em resumo, como exposto, pode-se dizer que, ao longo do século XIX, os liberais e os
movimentos e partidos liberais mudaram a estrutura econômica, social e política da Europa, e
modificaram drasticamente a comunidade internacional, quando, então, terminaram a escravidão e as
incapacidades religiosas, garantiu-se a tolerância, a liberdade de imprensa, de manifestação e deassociação; a educação foi estendida; o direito de voto ampliou-se – universalizou-se – até as
mulheres; elaborações constitucionais limitando e responsabilizando os governos foram escritas.
Conclui-se que o Estado Moderno como algo novo insere-se perfeitamente em uma
descontinuidade histórica, isso porque um dos maiores argumentos a confirmar tal tese é de que se
apresenta inexorável o processo de concentração do poder de comando sobre um determinado
território bastante vasto, que acontece através da monopolização de alguns serviços essenciais para a
manutenção das ordens interna e externa, tais como a produção do direito através da lei, que, àdiferença do direito consuetudinário, é uma emanação da vontade do soberano, e do aparato coativo
necessário à aplicação do direito contra os renitentes, bem como através do reordenamento da
imposição e do recolhimento fiscal, necessário para o efetivo exercício dos poderes aumentados.
REFERÊNCIA
STRECK, Lenio Luiz; MORAIS,José Luiz Bolzan de. Ciência política e teoria geral do estado. 8. ed.
ver. atual. ed. Porto Alegre: Livraria do Advogado Editora, 2014