cirrose hepatica

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Universidade da Beira Interior Faculdade de Cincias da Sade

Alcoolismo e Cirrose HepticaDissertao para obteno do grau de Mestre pela Universidade da Beira Interior

Lisa Isabel Baptista Gonalves

Orientadora: Dr. Telma Mendes

Mestrado Integrado em Medicina Covilh 2009

ALCOOLISMO E CIRROSE HEPTICA

. Qualquer leitura cuidadosa ou precipitada da literatura leva-nos a uma concluso : estamos com necessidade desesperada de novos pensamentos e novos acessos para este velho problema do homem E. Faber, Toronto, 1975

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AGRADECIMENTOSGostaria de apresentar os meus mais sinceros agradecimentos a todas as pessoas que contriburam para a realizao deste trabalho, nomeadamente: minha orientadora desta tese, Dra. Telma Mendes, por toda a disponibilidade, apoio incansvel, compreenso, orientao, disponibilidade e pacincia demonstrados ao longo da realizao deste trabalho. Faculdade de Cincias da Sade, na pessoa do Professor Doutor Miguel Castelo Branco e Professor Doutor Joo Queirs. Ao Dr. Rui Ramos, Dra. Patrcia Duarte e Dr. Mrio Alexandrino pela ajuda fornecida na pesquisa bibliogrfica e orientao desta tese. Agradeo Dra. Marciomira Silva (Unidade de Alcoologia do Fundo) fornecimento dos dados estatsticos. Agradeo s minhas amigas Ins, Mariana, Joana, Mafalda e Filipa pelo apoio, preocupao, compreenso e amizade demonstradas ao longo deste longo ano. Por fim, agradeo aos meus pais, Teresa e Joo, ao meu irmo Joo Pedro e minha tia Eugnia, por todo o amor, apoio, carinho e compreenso que sempre me dispensaram. Obrigada por tudo! A todos o meu muito Obrigada!FACULDADE CINCIAS DA SADE - UBI - 2009

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RESUMOIntroduo: A despeito do desenvolvimento cientfico e tecnolgico, ocorrido nasltimas dcadas e o facto de todo o conhecimento fisiopatolgico da cirrose heptica ter uma marcada influncia global e emprica, o avano na teraputica tem sido lento, mantendo-se inmeras reas cinzentas. Concomitantemente, s elevadas taxas de mortalidade numa populao demasiado jovem e activa e s taxas de morbilidade que levam a custos econmico-sociais crescentes, faz com seja fundamental no s empenhar todo o esforo na uniformizao do diagnstico e tratamento precoces, mas sobretudo nas situaes causais potencialmente prevenveis.

Material e Mtodos: Foi efectuada uma recolha de dados retrospectivos dos casosclnicos de Doena Heptica Alcolica (nmero de doentes, idade, sexo, destino e diagnstico) do ano de 2008 e um estudo comparativo com os mesmos dados de anos anteriores, 2004 - 2008, fornecidos pela Unidade de Alcoologia do Fundo, e posterior tratamento desses mesmos dados, de forma descritiva. Posteriormente, foi efectuada uma busca activa de revises sistemticas, meta-anlises, estudos controlados e aleatorizados e estudos de Coorte sobre o tema.

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Resultados: De acordo com a anlise descritiva dos dados estatsticos retrospectivosda Unidade de Alcoologia do Fundo, a maioria dos seus doentes no ano de 2008, foi do sexo masculino. O padro etrio prevalente foi entre os [41- 50] anos, seguindo-se a faixa etria dos [51-60] anos. O sexo masculino foi sempre o mais representativo, tendo havido um decrscimo gradual no nmero de bitos ao longo dos 5 anos e no nmero de mulheres que recorreu Unidade. O diagnstico predominante foi o Sndrome de Dependncia Alcolica, seguido da Esteatose Heptica e por fim de Cirrose. No sexo feminino apenas foi diagnosticado o Sndrome de Dependncia Alcolica.

Discusso: De acordo com os conhecimentos actuais vigentes na comunidadecientfica, considero em termos gerais, que no estudo efectuado atravs dos dados estatsticos teoricamente representativos deste concelho, houve concordncia na prevalncia do alcoolismo em idades socialmente activas [41-60] anos e no facto de apenas um pequeno nmero de doentes evoluirem de Esteatose Heptca para Cirrose. Contrriamente, foi discordante, no panorama actual de feminizao do lcool e na prevalncia em idades jovens (adolescncia).

Concluso: Um bom conhecimento da doena, dos factores de risco e dotratamento ir resultar numa melhor preveno e tratamento da doena. Consensos e Guidelines para a preveno, diagnstico, tratamento e complicaes da Cirrose heptica alcolica, sujeitos a actualizaes regulares, devem servir de referncia a estratgias de actuao, a promover em cada unidade hospitalar.FACULDADE CINCIAS DA SADE - UBI - 2009

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Palavras Chave: Cirrose Heptica Alcolica, Cirrose Heptica, Alcoolismo, DoenaHeptica Alcolica, Hepatite alcolica

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ABSTRACTIntroduction: Despite the scientific and technological development, which occurredin recent decades and the fact that all the pathophysiological knowledge of liver cirrhosis has a marked global and empirical influence, the progress in therapy has been slow, maintaining many dark areas. Concomitantly, the high mortality rates in a population too young and active and the rates of morbidity leading to rising economic and social costs, it is essential not only to commit all efforts in standardization of early diagnosis and treatment, but especially in the potentially preventable causal situations.

Material and Methods: A collection of retrospective data was taken from clinicalcases of Alcoholic Liver Disease (number of patients, age, sex, destination and diagnosis) in the year 2008 and a comparative study with the same data from previous years, 2004 - 2008, supplied by the Alcohol Unit of Fundo, and subsequent treatment of these data in a descriptive way. Subsequently, an active search was made of systematic reviews, meta-analysis, and randomized controlled studies and cohort studies on the subject.

Results: Accordingly to the descriptive analysis of statistical data back of the AlcoholUnit of Fundo, the majority of their patients in the year 2008, was male. The pattern was prevalent among ages [41 to 50] years, followed by the age of [51-60] years. The

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male gender was always the most representative, and there was a gradual decrease in the number of deaths over 5 years and the number of women who used the unit. The predominant diagnosis was Alcohol Dependence Syndrome, followed by fatty liver and finally cirrhosis. The females were only diagnosed with Alcohol Dependence Syndrome.

Discussion: According to current knowledge in the scientific community, I considerin general terms, that in the study made through the statistical data theoretically representative of this county, there was agreement on the prevalence of alcoholism in socially active ages [41-60] years and the fact that only a small number of patients evolve from Hepatic Steatosis to Cirrhosis. Contrarily, the data were inconsistent in the current picture of feminization of alcohol and the prevalence in young ages (adolescence).

Conclusion: A good knowledge of the disease, risk factors and treatment will result ina better prevention and treatment of the disease. Consensus and guidelines for the prevention, diagnosis, treatment and complications of Alcoholic Liver Cirrhosis, subject to regular updates, should be references to performance strategies, to promote in each hospital.

Keywords: Alcoholic Liver Cirrhosis, Liver Cirrhosis, Alcoholism, Alcoholic LiverDisease, Alcoholic Hepatitis

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NDICE GERAL

I-Introduo II-Objectivos III-Material e mtodos IV-Fundamentao terica IV 1- Definio IV 2-Epidemiologia IV 2.1- Incidncia IV 2.2- Idade IV 2.3- Sexo IV 2.4- Raa IV 3- Factores de risco IV 3.1- Quantidade e durao de lcool ingerido IV 3.2- Infeco co-existente por Vrus Hepatite B e C IV 3.3.- Factores genticos IV 3.4.- Obesidade IV 3.5.- Desnutrio IV 3.6.- Exposio concomitante a endotoxinas IV 3.7.- Sobrecarga de Ferro IV 4- Mortalidade e Morbilidade IV 5-Fisiopatologia IV 5.1-Acetaldedo IV 5.2.- Alteraes do potencial redox intracelular IV 5.3.- Mecanismos auto-imunes IV 5.4.- Endotoxinas e Citocinas IV 6- Clnica IV 6.1.- Sintomas IV 6.2- Sinais IV 6.2.1- Telangiectasias IV 6.2.2 Eritema Palmar IV 6.2.3- Alteraes ungueais IV 6.2.4- Contractura de Dupuytren IV 6.2.5.- Ginecomastia IV 6.2.6.- Hipogonadismo IV 6.2.7.-Hepatomeglia IV 6.2.8- AsciteFACULDADE CINCIAS DA SADE - UBI - 2009

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IV 6.2.9.- Sopro de Cruveilhier- Baumgarten IV 6.2.10.-Ictercia IV 6.2.11- Asterixis/Flapping IV 6.2.12.- Hipertrofia das glndulas partidas IV 7- Diagnstico IV 7.1- Anamnese IV 7.2.- Exames Complementares de Diagnstico IV 7.2.1- Exames Laboratoriais IV 7.2.1.1- Transaminases IV 7.2.2.2- Fosfatase Alcalina IV 7.2.2.3.- Gama-Glutamil Transpeptidase IV 7.2.2.4.- Bilirrubina srica IV 7.2.2.5.- Albumina srica IV 7.2.2.6.- Imunoglobulinas IV 7.2.2.7.- Nveis Sdio srico IV 7.2.2.8.- Anomalias Hematolgicas IV 7.2.2.- Outros testes de diagnstico IV 7.2.2.1- Carbohydrat Deficient Transferrin (CDT) IV 7.2.2.2- Ethyl Glucoronide (EtG) IV 7.2.2.3- Fibroscan IV 7.2.3- Imagiologia IV 7.2.3.1- Ecografia abdominal IV 7.2.3.2- Tomografia Computorizada IV 7.2.3.3.- Ressonncia Magntica IV 7.2.3.4.- Estudos Nucleares IV 7.2.3.5- Bipsia Heptica IV 8- Diagnstico diferencial IV 8.1- Esteato Hepatite no alcolica (NAFLD) IV 8.2.- Hemocromatose Hereditria IV 8.3.- Hepatotoxicidade por Amiodarona IV 8.4. Sndrome de Budd- Chiari IV 9- Complicaes IV 9.1.- Ictercia IV 9.2.- Ascite IV 9.3- Peritonite Bacteriana Espontnea (PBE) IV 9.4.- Sndrome Hepato- Renal (SHR) IV 9.5.- Hidrotrax Heptico IV 9.6.- Sensibilidade a infeces IV 9.7.- Sndrome Hepato- Pulmonar (SHP) IV 9.8.- Hemorragia por varizes gastro-esofgicas IV 9.9.- Encefalopatia Porto-Sistmica (EPS) IV 9.10- Carcinoma hepatocelular (CHC) IV 9.11- Trombose da veia portaFACULDADE CINCIAS DA SADE - UBI - 2009

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IV 9.12.- Hrnias umbilicais IV 10- Tratamento IV 10.1- Abstinncia e Modificao do estilo de vida IV 10.2- Teraputica Nutricional IV 10.3- Teraputica Farmacolgica IV 10.3.1.- Frmacos anti- inflamatricos e anti- citocnicos IV 10.3.1.1.- Glucocorticides IV 10.3.1.2- Pentoxifilina IV 10.3.1.3- Teraputica especfica com factores de necrose antitumoral IV 10.3.2.- Antioxidantes IV 10.3.2.1 - S- adenosilmetionina (SAM) IV 10.3.2.2.- Silimarina IV 10.3.2.3.- Vitamina E IV 10.3.2.4- Glutationa IV 10.3.2.5- Metadoxina IV 10.3.3- Outros antioxidantes IV 10.3.4- Frmacos com benefcio improvvel IV 10.3.4.1- Colchicina IV 10.3.4.2.- Propiltiouracilo (PTU) IV 10.3.4.3- Esterides anabolizantes IV 10.3.4.4- Polyenylphosphatidylcholine (lecitina) IV 10.4- Transplante heptico IV 11- Prognstico IV 11.1- ndices de Prognstico IV 11.1.1- Funo Discriminante de Maddrey (FD) IV 11.1.2- Classificao de Child- Turcotte- Pugh (CTP) IV 11.1.3- Lille Model IV 11.1.4- Pontuao de MELD IV 11.1.5- Pontuao de Glasgow IV 11.1.6- Modelo de Beclere V- Resultados Estatsticos (Unidade de Alcoologia do Fundo) VI- Discusso VII- Concluso VIII- Referncias Bibliogrficas

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NDICE DE FIGURAS

figura 1 - Estadios da leso heptica figura 2 - Progresso na doeaheptica alcolica figura 3 - Fsiolopatologia da doena heptica alcolica figura 4- Manifestaes clnicas sitmicas da cirrose heptica figura 5- Telangiectasias figura 6- Eritema Palmar figura 7- Unhas de Muehrcke figura 8- Unhas de Terry figura 9- Contractura de Dupuytren figura 10- Examinao da ginecomastia figura 11- Hipogonadismo figura 12- Fgado cirrtico figura 13- Ascite figura 14- Ictercia figura 15- Asterixis/ Flapping figura 16- Hipertrofia das glndulas partidas figura 17- Ecografia abdominal figura 18- Tomografia Computorizada abdominal figura 19- Patognese da ascite na cirrose figura 20- Algoritmo do tratamento de doentes com ascite por cirrose figura 21- Patognese do Sndrome Hepato- Renal figura 22- Algoritmo do tratamento por hemorragia por varizes esofgicas

25 33 47 50 52 52 53 53 54 55 56 57 57 58 59 60 73 73 85 88 93 103

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NDICE DE TABELAS

tabela 1- Recomendaes para o diagnstico da doena heptica alcolica tabela 2- Indicaoes para a realizao de bipsia heptica tabela 3- Graus Clnicos da encefalopatia heptica tabela 4- Tratamento da encefalopatia heptica tabela 5- Classificao de Child-Turcotte-Pugh (CTP)

61 76 104 108 138

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ABREVIATURAS

AFP- Alfafetoprotena ALDH- Desidrogenase do acetaldedo CDP CARBOHYDRAT Deficient Transferrin CDT- Carbohydraye Deficient Transferrin CHC- Carcinoma hepatocelular compoturizada CPT- Child Pugh Turcotte DHA- Doena heptica alcolica EPS- Encefalopatia Porto-Sistmica Etg- Ethyl Glucoronide FD- Funo Discriminante FSH- Follicle Stimulating Hormone GABA- cido gama aminobutnico GOT/AST- Aspartato Aminotransferase GPT/ALT- Alanina AminotransferaseFACULDADE CINCIAS DA SADE - UBI - 2009

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HTP- Hipertenso Portal IL- Interleucina LH- Luteinic Hormone MEOS- Sistema de oxigenao enzimtico mitocondrial NAFLD/NASH- Esteato hepatite no alcolica PBE- Peritonite bacteriana espontnea PTU- Propiltiuracilo RM- Ressonncia magntica SAM- S-adenosilmetionina SAM- Sistema de Apoio Mdico SHP- Sndrome Hepato-Pulmonar SHR- Sindrome Hepato- Renal SNG- Sonda Nasogstrica TC- Tomografia ADH- Desidrogenase alcolica TE- Elastography Transient TIPS- Transjugular Intrahepatic Portosystemic Shunt.

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TNF- Factor de Necrose Tumoral TSA- Teste de Sensibilidade a antibiticos UCI- Unidade de Cuidados Intensivos VCM- Volume Corpuscular Mdio VHB- Vrus hepatite B VHC- Vrus hepatite C

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I - INTRODUO

Desde o sculo XVI com Andr Vesalius atribui-se importncia associao lcool/cirrose heptica, existindo uma marcada evidncia nesta associao quer no sentido concordante positivo, maior consumo, maior mortalidade, quer no sentido negativo, perodos de abstinncia ou maior mortalidade por esta doena. (1) Tambm Baillie em 1793 descreve a associao entre o consumo de lcool e a doena heptica, mas o reconhecimento do alcoolismo como doena crnica aparece apenas no sculo XIX, culminando com a publicao de um tratado sobre alcoolismo crnico, pelo sueco Magnus Huss em 1851. (2) A doena heptica alcolica continua um enigma desafiador para cientistas e clnicos. Apesar de mais de 5 dcadas de pesquisa e da elevada frequncia em largas regies do mundo, muitas facetas importantes desta doena continuam por ser resolvidas, nomeadamente: o motivo da cirrose se desenvolver apenas numa pequena fraco de alcolicos que bebem muito, a patognese da doena heptica alcolica grave e quais os tratamentos mais eficientes para pacientes com doena avanada. Concomitantemente, o facto de todo o conhecimento fisiopatolgico desta doena ter uma marcada evidncia global emprica, o avano na teraputica tem sido lento, mantendo-se inmeras reas " cinzentas", nomeadamente a susceptibilidade.

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Individual no desenvolvimento da cirrose, principalmente aumentada no sexo feminino, a influncia dos factores genticos, a regresso ou no da fibrose com o uso de colchicina ou outros frmacos, que vo constituir algumas das bases de controvrsia desta tese. Desde h muito se reconhece a importncia de vrios factores etiolgicos com aco determinante, adjuvante, ou condicionante no desenvolvimento da doena tais como vrus, drogas, toxinas, causas genticas, nutricionais ou ambientais, sendo o lcool certamente o agente etiolgico determinante, indispensvel mas talvez no suficiente. Mais importante que as elevadas taxas de mortalidade numa populao demasiado jovem e activa, so as taxas de morbilidade que levam a custos econmico-sociais crescentes. No presente trabalho para a obteno do ttulo de grau de Mestre, associa-se monografia um estudo estatstico de casos clnicos de doentes com doena heptica alcolica existentes na Unidade de Alcoologia do Fundo procedendo-se a posterior tratamento desses mesmos dados nomedamente nmero de doentes, idade, sexo, destino e diagnstico, do ano de 2008 e um estudo comparativo com os mesmos dados de anos anteriores, 2004- 2008.

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A escolha deste tema, para dissertao para obteno do grau de Mestre pela Universidade da Beira Interior, para alm de todos os aspectos expostos anteriormente, deve-se ao facto de existirem ainda questes no resolvidas que esta doena encerra, assim como pela sua importncia clnica entre ns e pelo facto de existir uma elevada prevalncia de cirrose heptica alcolica nas regies rurais do pas, nomeadamente zonas produtoras vincolas, como o caso da Beira Interior. Tambm fundamental o facto de se tratar de uma patologia multidisciplinar, que envolve vrias especialidades mdicas nomeadamente Medicina Interna,

Gastrenterologia, Psiquiatria, entre outras, que por vezes actuam sem uniformidade de critrios de diagnstico e tratamento.

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II - OBJECTIVOS- Anlise de casos clnicos de doena heptica alcolica existentes na Unidade de Alcoologia do Fundo no ano de 2008 e comparao com anos anteriores (20042008) - Reconhecer a importncia da Cirrose Heptica Alcolica, a sua elevada prevalncia, incidncia e mortalidade. - Reconhecer a histria natural da doena e potenciais complicaes crnicas. - Conhecer os processos fisiopatolgicos que esto na gnese da Cirrose Heptica Alcolica. - Reconhecer a Cirrose Heptica Alcolica como um problema multifactorial - Identificar os principais factores de risco e a sua contribuio. - Identificar os principais sintomas e sinais da Cirrose Heptica Alcolica. - Reconhecer os principais mtodos de diagnstico da Cirrose Heptica Alcolica, suas caractersticas, indicaes, vantagens e desvantagens. - Identificar os principais achados diagnsticos de Cirrose Heptica Alcolica nos diferentes meios complementares.

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- Propr um protocolo seguro, eficaz e econmicamente rentvel para a abordagem diagnstica do doente com suspeita de Cirrose Heptica Alcolica. - Reconhecer as principais modalidades teraputicas. - Reconhecer as principais caractersticas de cada frmaco utilizado no tratamento da Cirrose Heptica Alcolica e suas complicaes em termos farmacocinticos, farmacodinmicos, suas indicaes, contra-indicaes, controvrsias e precaues. - Estabelecer o melhor esquema teraputico de acordo com o quadro clnico do doente. - Identificar as principais perspectivas futuras no mbito da abordagem do doente com Cirrose Heptica Alcolica documentada ou suspeita.

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III MATERIAL E MTODOSInicialmente foi efectuada uma recolha de dados retrospectivos dos casos clnicos de Doena Heptica Alcolica (nmero de doentes, idade, sexo, destino e diagnstico) do ano de 2008 e um estudo comparativo com os mesmos dados de anos anteriores, 2004- 2008, fornecidos pela Unidade de Alcoologia do Fundo, e posteriormente tratamento destes mesmos dados, aps terem sido requeridas as respectivas autorizaes e consentimentos. O diagnstico foi baseado nas listagens do programa Gdh: 303.91 (Abuso ou Dependncia de lcool), 571.2 (Cirrose Heptica, 571.8 (Esteatose Alcolica), pesquisados pelo SAM. Posteriormente foi efectuada uma busca activa da literatura, pesquisando revises sistemticas, meta-anlises, estudos controlados e aleatorizados e estudos de coorte sobre o tema nas bases de dados Pubmed, Cochrane e Up to date. As palavras-chave utilizadas foram: Alcoholic liver cirrhosis, liver cirrhosis, alcoholism, alcoholic liver disease, alcoholic hepatitis. O limite temporal estabelecido para delimitar a busca foi entre 1990-2008. Em algumas circunstncias, aquando da leitura dos artigos inicialmente pesquisados, a pesquisa foi alargada a alguns artigos nele citados por ter sido considerado relevante a sua leitura para a execuo desta dissertao, ainda que implicassem a aquisio de

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dados bibliogrficos publicados em datas fora da margem temporal estabelecida inicialmente. Foi tambm realizada pesquisa exaustiva em tratados e manuais de referncia tais como: Harrison, Medicina interna, 17 edio; Sleisenger & Fordtranss,

Gastrointestinal and Liver Disease, Feldman, 2006; Mrio Quina e Colaboradores, Gastroenterologia Clnica, 2000; Diniz de Freitas, Doenas do Aparelho Digestivo, 2 edio, Coimbra 2002.

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IV FUNDAMENTAO TERICAIV 1 - DEFINIO A Cirrose Heptica uma alterao difusa do fgado, histolgicamente bem definida, em que a arquitectura normal substituda por ndulos regenerativos, separados por faixas de tecido fibroso (Anthony, 1977), que determina a diminuio das funes de sntese e excreo hepticas, hipertenso portal (HTP) com anastomoses portosistmicas e risco de carcinoma hepato-celular. (4) Pode ser consequncia de vrios factores etiolgicos, nomeadamente lcool, infeces vricas, doenas metablicas, processos auto-imunes ou patologia da via biliar. (4) A presena de ambos, ndulos e fibrose, essencial para o diagnstico histolgico de cirrose, permitIndo diferenci-la das leses como a hiperplasia nodular regenerativa, caracterizada pela presena de ndulos sem desenvolvimento de fibrose de grau aprecivel ou de doenas em que h intensa fibrose, sem formao e ndulos como a fibrose heptica congnita. (4) Normalmente precedem-na surtos repetidos e relativamente assintomticos de hepatite alcolica, com necrose hialina e infiltrao de polimorfonucleares, com aumento progressivo da deposio de colagnio. Em ltima anlise, d-se uma distoro completa da arquitectura heptica, com esclerose perivenular e diminuioFACULDADE CINCIAS DA SADE - UBI - 2009

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do nmero de veias hepticas. Um padro micronodular d lugar a um macronodular e a hepatomeglia inicial d lugar a um fgado pequeno e atrfico com consistncia firme. (4) Didcticamente usual a diviso de DHA nos trs grupos histolgicos clssicos: Esteatose, Hepatite alcolica e Cirrose. (5) No entanto, normalmente coexistem dois ou mais destes grupos, traduzindo o espectro de resposta heptica agresso pelo lcool. Esta diviso til para encararmos a DHA como um contnuo evolutivo, com um espectro de gravidade menor na esteatose, e acima de tudo o conceito de reversibilidade que total na esteatose pura e controverso na cirrose heptica instalada. (5)

Figura n 1 Estados de leso Heptica

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IV 2 - EPIDEMIOLOGIAIV 2.1 - INCIDNCIA O lcool foi cronolgicamente o primeiro factor a ser associado ao desenvolvimento da doena e a sua responsabilidade na causalidade da cirrose heptica, a mais exaustivamente estudada.Como tal, nos E.U.A estima-se que h pelo menos 10 milhes de alcolicos, representando cerca de 6 a 7% da populao adulta. (6), (7) Neste pas, E.U.A., a hepatopatia crnica a 10 causa mais comum de morte em adultos, sendo a cirrose alcolica responsvel por cerca de 40% das mortes por cirrose. (8) A ingesto de bebidas alcolicas um hbito enraizado na nossa cultura, sendo o lcool a droga de abuso mais frequente em Portugal (9). Em 2002, cada portugus ingeriu em mdia 9,8 litros de lcool puro. (10) Podemos, contudo, verificar que a tendncia tem sido para a reduo do consumo, pois esta era em mdia de 11,3 litros em 1997 (11) e de 10,8 litros em 2000. (12) Numa anlise retrospectiva efectuada num servio de Medicina Interna Durante 12 anos, verificou-se que, em 7,8% dos internamentos, os diagnsticos principais e/ou secundrios so relacionados com o lcool. (13)

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Apesar da relao entre a ingesto de lcool e a doena heptica ser conhecida h mais de 200 anos, o facto que apenas 10 a 15% dos alcolicos desenvolvem cirrose heptica. (14) A relao entre consumos elevados (160 gramas/dia) e prolongados (8 anos) de lcool e cirrose heptica foi j bem documentada (15), mas a verdade que existem dados que mostram um aumento do risco relativo de cirrose heptica desde valores to baixos como 10 gramas/dia nas mulheres e 20 gramas/dia nos homens. (16) Dados disponveis de 2001 referem um risco aumentado de cirrose heptica a partir de 30 gramas de lcool/dia ou um consumo total durante a vida de 100 Kg de lcool. (17) O padro de ingesto alcolica relevante, a ingesto diria e continuada parece ser mais deletria do que consumo intermitente. (14) O consumo maior nos pases produtores, como o caso de Portugal. (9) O consumo em Portugal problemtico mas com novas nuances: incio do consumo em idades muito precoces (mdia em Portugal por volta dos 13 anos, com risco prximo de dependncia futura de 50%), feminizao do alcoolismo (no Reino Unido nos ltimos 30 anos a mortalidade por cirrose alcolica na mulher jovem aumentou 1000%. (18) Estima-se que a percentagem de raparigas que bebem bebidas destiladas idntica a dos rapazes. (18)

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IV 2.2 - IDADE A maior prevalncia de consumos agudos de lcool nos E.U.A. observado em adultos jovens com idades entre 18 e 25. (19) (20). O alcoolismo tambm comum nos idosos, (21) mas as pessoas com idade mdia (30 a 64 anos) esto em maior risco de desenvolver doena heptica alcolica (22). Entre os indivduos com 45 a 65 anos de idade, a cirrose a terceira causa mais comum de morte, aps as cardiopatias e as neoplasias, nos EUA (22). Os idosos esto particularmente em risco aumentado de interaces frmaco-lcool, em parte relacionada com o nmero de medicamentos que muitas vezes tomam (19). O consumo de lcool entre os jovens um problema particular, uma vez que a experimentao com lcool comea muitas vezes no meio escolar. As pessoas que comeam a beber na infncia, tm quatro vezes mais probabilidades de desenvolver alcoolismo do que aqueles que comeam aos 21 anos. (23)

IV 2.3 - SEXO As mulheres so mais susceptveis a leso heptica alcolica quando comparadas aos homens. (24) (25) (27) Elas desenvolvem uma hepatopatia em fase avanada com ingesto alcolica substancialmente menor (26) (6) aproximadamente 40gr.

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Os indivduos do sexo masculino que desenvolvem quadros avanados de leso heptica, exibem um padro de consumo alcolico caracterizado tipicamente pela ingesto diria de 80g ou mais de etanol, durante 10 ou mais anos. (6) As mulheres so mais susceptveis de negar que tm um problema e minimizam os problemas associados ao alcoolismo, o que as leva concomitantemente a elevadas taxas de transtornos alimentares, pnico, stress ps-traumtico e sndrome depressivo. (28) (29) As diferenas que dependem do sexo resultam de efeitos pouco compreendidos do estrognio e do metabolismo do lcool (26) Segundo Day CP, a mulher desenvolve formas mais severas e mais precoces de DHA, relativamente ao homem com consumos dirios menores, devido, em parte, ao seu menor volume de distribuio do lcool, mas tambm potencialmente a um aumento da permeabilidade do intestino para endotoxinas. (30) Na realidade ainda controversa a razo desta maior susceptibilidade do sexo feminino: diferenas na composio do organismo? (31) (32) Menor peso corporal? (31), (32) Maior propenso para mecanismos de auto-imunidade na mulher? Diferenas no sexo relativamente ao metabolismo do lcool? (30) Influncia dos factores hormonais pouco conhecidos, relacionados com a menopausa e o ciclo menstrual? Menor produo de desidrogenase alcolica na mucosa gstrica da mulher? (25), (33) Sauders JB et al e Loft S et al, concluram atravs do seu estudo, que as diferenas no tamanho corporal e na sua composio, so em parte responsveis pela maior

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susceptibilidade do sexo feminino a desenvolver doena heptica alcolica. (31), (32) De acordo com Moreno A et al, Baraona E et al Freeza et al, a maior susceptibilidade do sexo feminino deve-se principalmente reduzida actividade da ADH gstrica, o que leva a uma diminuio do metabolismo gstrico do etanol. (25) (33) (35) Podem ser tambm factores genticos os responsveis pela maior susceptibilidade das mulheres aos efeitos agressivos do alcol no fgado. (34) Segundo Gavaler et al, o motivo porque isso ocorre incerto, mas pode em parte estar relacionado a maiores nveis circulantes de etanol por quilograma de peso corporal, aps a ingesto. (24) Segundo Thuluvath et al, outros factores, como a infeco por Helicobacter Pylori e gastrite, tambm podem reduzir a actividade da ADH gstrica, mas como promovem o desenvolvimento da doena heptica alcolica no conhecido. (74) De acordo com Baraona et al, Sptizer JA et al Thurman RG e tal, outros factores de risco para o desenvolvimento da doena heptica em mulheres parecem incluir ainda o aumento da endotoxmia que leva a activao das clulas de Kupffer, peroxidao lipdica, activao do factor de transcrio critica NF- kappaB, e nveis de RNAm quimocina (monocyte chemotactic protein-1). (25), (36), (37)

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IV 2.4 - RAA Os homens hispnicos demonstram uma taxa de morte ajustada idade muita mais alta nos EUA devido a cirrose alcolica que os brancos no hispnicos e negros. (26) Segundo Enomoto e al, os asiticos podem ser protegidos da doena heptica alcolica, devido sua relativa deficincia da isoenzima ALDH2 que resulta na acumulao de acetaldedo o que cria uma reaco de rubor em 75% dos asiticos que leva a averso de ingesto alcolica. (38) Esta reaco semelhante a resposta ingesto de lcool em doentes que tomam disulfiram (Antabuse). De acordo com Thomasson et al, a taxa de alcoolismo entre os indivduos Chineses com este gentipo muito inferior comparado com outros indivduos Chineses; no entanto, uma significativa reduo no risco gentico de alcoolismo nessas subpopulaes no pode ser excluda (39).

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IV 3 FACTORES DE RISCO conhecida desde h sculos a associao entre o consumo excessivo de lcool e o desenvolvimento de doena heptica alcolica. (6) Factores genticos, sociais e psicolgicos provvel que desempenhem um papel potencial e cumulativo. (6) Tambm ainda desconhecido o motivo porque s 10- 15% dos alcolicos crnicos desenvolvem quadros de cirrose heptica, e porque no se evidencia leso heptica clinicamente aparente em cerca de 1/3 dos alcolicos. (6), (14), (30) A explicao obscura, mas envolve a interaco de factores facilitadores e co mrbidos tipo sexo, hereditariedade, imunidade e factores sociais (6), (26) Uma impressionante variabilidade individual foi observada na quantidade de etanol necessria para induzir doena heptica alcolica entre aqueles que consomem muito lcool. Segundo Wilfred de et al e Zakhari et al, embora essa varivel de risco no esteja completamente explicada, vrios factores de risco tm sido identificados, incluindo a quantidade e durao de lcool ingerido, a coexistncia de hepatites virais e os factores genticos (40), (41)

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90 A 100% Fgado Normal Esteatose Heptica

10 a 35%

8 a 20%

? 40% Hepatite Alcolica Cirrose

Figura n 2 Progresso na doena Heptica Alcolica - Fonte: McCullough, AJ, et al, Am J Gastroenterol 1998; 93:2023.

IV 3.1 QUANTIDADE E DURAO DE LCOOL INGERIDO

A ingesto de lcool claramente o principal determinante da doena heptica alcolica. (6) Existe uma correlao significativa entre o consumo per capita e a prevalncia da cirrose heptica. (6) Praticamente todos os estudos epidemiolgicos tm definido uma dose limiar de lcool necessria. Os dados mais amplamente citados para o desenvolvimento de cirrose referem a exigncia de consumo de 80g de etanol por dia durante 10 a 20 anos, o que corresponde aproximadamente a 1 litro de vinho, 8 cervejas de tamanho padro ou meio litro de licor forte por dia (15). O risco baseado na quantidade de etanol absoluto, assim os alcolicos que preferem um tipo de bebida alcolica (como vinho) no esto protegidos. Por outro lado,FACULDADE CINCIAS DA SADE - UBI - 2009

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aqueles que bebem vinho preferencialmente podem consumir uma menor quantidade de lcool absoluto e, assim, serem menos susceptveis a desenvolver cirrose heptica(15)

Estes dados tambm sugerem que, em pacientes que consomem at 230g de etanol por dia, durante pelo menos 20 anos, pelo menos 80% tero moderada ou severa esteatose heptica e 50% tero cirrose ou leses pr-cirrose (15). Por outro lado, metade dos pacientes ingerindo uma notvel quantidade de lcool no ir desenvolver doena heptica grave. Assim outros factores vo acelerar ou reduzir o risco em consumidores de grandes quantidades de lcool. (15) Dados epidemiolgicos evidenciaram uma marcada diminuio da prevalncia da DHA nos perodos de racionamento (guerra) , de proibio no consumo de alcol e de aumento do seu custo (6). O limiar para desenvolver hepatopatia alcolica nos homens representado por uma ingesto de > 60 a 80g/dia de lcool durante 10 anos, enquanto as mulheres correm maior risco de vir a desenvolver graus semelhantes de leso heptica ao consumirem 20 a 40 g/dia.(26) A ingesto de 160g/dia est associada a um risco 25 vezes maior de vir a desenvolver cirrose alcolica. (26) Apenas 15% dos alcolicos desenvolvem hepatopatia alcolica. (6) (14) (30).

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IV 3.2 INFECO COEXISTENTE DE INFECO POR VRUS HEPATITE B E C Existe uma forte associao entre a doena heptica alcolica e a hepatite por vrus C . Ao contrrio da infeco por vrus B, a infeco por VHC parece estar envolvida no desenvolvimento de DHA avanada. (42) A prevalncia de VHC em doentes com DHA de 25-65% pelo mtodo ELISA , de 1479% pelos ensaios imunoblot, e de 10-40% utilizando a deteco do ARN-VHC. (42) Comparando os doentes com DHA sem infeco por VHC, com os doentes DHA infectados, verifica-se que esta associao surge em idades mais jovens, os doentes apresentam quadros histolgicos mais severos, desenvolvem a doena em fase mais precoce, apresentam uma sobrevida mais reduzida e esta associao o factor de maior risco de desenvolvimento de hepatocarcinoma. (26), (42) A infeco crnica pela hepatite C (HCV) uma importante co-morbidade na progresso da hepatopatia alcolica para a cirrose nos alcolicos crnicos e excessivos. Mesmo uma ingesto moderada de lcool de 25-50g/dia eleva o risco de cirrose e carcinoma hepatocelular nos indivduos HCV- infectados (26). Uma ingesto de lcool > 50g/dia pelos pacientes infectados com HCV reduz a eficcia da teraputica antiretroviral baseada no interfero. (26) A prevalncia de inaparente ou no suspeita infeco pelo VHB activa na doena heptica alcoolica, muito inferior a VHC.

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Zignego et al, realizaram um estudo com 110 alcolicos activos, no qual encontraram VHB-DNA em s 3 doentes (3%) contra quase 30% de prevalncia do VHC-RNA (43). No entanto, quase 30% tinham evidncia de infeco passada pelo VHB. Por conseguinte, parece provvel que a maior importncia do VHC na doena heptica alcolica a sua elevada taxa de cronicidade. Contudo, a ingesto crnica de etanol pode alterar a resposta imune celular infeco pelo VHB e predispe pacientes infectados a infeco persistente. (44) Semelhante ao caso da infeco pelo VHC, pode haver mais do que efeito aditivo da infeco pelo VHB e ingesto de lcool sobre o risco de carcinoma hepatocelular(45),(46)

De acordo com o estudo caso-controle de Ikeda et al, o risco relativo de HBsAg positivo em pacientes com carcinoma hepatocelular foi de 11,4 %, em comparao com controles, enquanto que o risco relativo de HBsAg concomitante a ingesto de lcool foi 64,7 %. (46)

IV 3.3 FACTORES GENTICOS Vrios factores genticos que podem aumentar o risco de doena heptica alcolica foram identificados. Estes incluem o sexo feminino, polimorfismos no metabolismo do lcool baseados na etnia, fentipo antignio de histocompatibilidade e

susceptibilidade herdada ao alcoolismo. (47), (48)FACULDADE CINCIAS DA SADE - UBI - 2009

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Polimorfismos genticos nos sistemas metabolizadores do lcool como CYP2E1 e ADHs tm sido postulados como tendo um papel no desenvolvimento da doena heptica alcolica. (25) (33) (42) (49) De acordo com o estudo de Cichoz- Lach H et al, o gentipo CYP2E1 e os alelos c1 e c2 ocorreram mais frequentemente em doentes com cirrose alcolica do que no grupo controlo, o que concluram que podem constituir um factor de risco da cirrose heptica alcolica. (49) Nenhum destes polimorfismos, contudo, explicam adequadamente as respostas patolgicas diversas observadas entre doentes com doena heptica alcolica De acordo com Marcos M et al, o alelo 330 T da IL2, est associado a um maior risco de desenvolver cirrose heptica alcolica e esse facto pode favorecer a produo da doena heptica alcolica. (50) A maioria dos estudos neste campo tm sido focados nos principais sistemas enzimticos hepticos envolvidos no metabolismo do lcool: desidrogenase alcolica (ADH), desidrogenase do acetaldedo (ALDH) e citocromo P450. (42) Alguns estudos suportam o incremento na frequncia do gene ADH 321 que codifica a isoenzima gama-1ADH em doentes com cirrose alcolica, anomalia que, combinada com alteraes do alelo ALDH 2-2, induziria a diminuio da capacidade de metabolizao do acetaldedo (33). Outros trabalhos oriundos do Japo, evidenciam uma maior incidncia da ADH 2-1, e maior frequncia de ALDH 2-1 em doentes alcolicos, em comparao com um grupo de controlo.FACULDADE CINCIAS DA SADE - UBI - 2009

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De acordo com Morgan et al e Doffoel et al, certos fentipos HLA parecem aumentar o risco de doena heptica alcolica (51) (52). No entanto, esta informao rara ou pouco til na clnica. De acordo com Pastor IJ et al, o alelo 238 TNFA-A, est associado a um risco maior de desenvolver cirrose heptica alcolica. Este polimorfismo pode ser considerado como um dos factores genticos que conferem predisposio a sofrer de cirrose heptica alcolica na populao de Castela e Len (48). Segundo Grove et al, um polimorfismo no promotor do factor de necrose tumoral alfa (TNF-) na posio 238 foi encontrado como sendo mais comum em pacientes com esteatohepatite alcolica do que nos controlos (53).De acordo com Wilhelmsen et al, esta associao necessita de nova reviso para excluir potenciais falsas associaes que podem surgir num estudo caso- controle (54). De acordo com o estudo de Nahon et al, a sobrecarga de ferro no fgado e a mutao C282Y do gene HFE esto associadas a maior risco de desenvolvimento de carcinoma hepatocelular em pacientes com cirrose heptica alcolica (55).

IV 3.4 - OBESIDADEA idade, obesidade e a Diabetes Mellitus, esto associadas ao desenvolvimento de fibrose em doentes com esteatose heptica no alcolica (NASH), um transtorno que tem semelhanas histolgicas com a doena heptica alcolica. Para avaliar se estesFACULDADE CINCIAS DA SADE - UBI - 2009

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factores tambm contribuem para a doena heptica alcolica, foi realizado um estudo por Raynard et al, envolvendo 268 pacientes alcolicos que foram negativos para marcadores da hepatite viral e submetidos a uma biopsia heptica (56). A associao entre fibrose e possveis predictores foi explorada numa anlise multivariada, que incluiu 7 variveis (idade, sexo, ndice de massa corporal, a quantidade de lcool ingerido, a durao de lcool ingerido, o nvel de glicemia e colorao de Perls para os depsitos de ferro (56). Predictores independentes de fibrose incluram o ndice de massa corporal , nveis sricos de glicose, e colorao de Perls. Estes dados apoiam a ideia que a doena heptica alcolica partilha uma patognese semelhante NASH e podem ter implicaes no tratamento da doena heptica alcolica. Num outro estudo realizado por Ruhl et al, observou-se que a elevao das aminotransferases associadas ingesto de lcool foram mais evidentes nos doentes com excesso de peso ou obesidade (57). Segundo Anania et al e You et al, m equilbrio alterado nas adipocinas, com nveis reduzidos de molculas protectoras incluindo a adiponectina, e nveis aumentados de leptina, aumentam a esteatose e a inflamao em doenas hepticas graves, incluindo a doena heptica alcolica (58),(59). Naveau et al, numa anlise de regresso logstica de 1604 alcolicos identificou um indicie de massa corporal superior a 25 Kg/m2 por pelo menos 10 anos como um factor de risco independente de esteatose, hepatite alcolica e cirrose (60). EstaFACULDADE CINCIAS DA SADE - UBI - 2009

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concluso particularmente intrigante, pois um estudo experimental de Yang et al, demonstrou que ratos geneticamente obesos tm maior risco de leso heptica endotxica (61). Desde que foi sugerido que endotoxinas derivadas da flora intestinal podem contribuir para o aumento da inflamao na doena heptica alcolica, esta ultima informao pode fornecer um mecanismo potencial para o risco associado obesidade. Dois estudos tm relevado particular interesse a respeito ao fgado esteattico associado a obesidade e doena heptica alcolica. Primeiro, de acordo com Pritchard et al, elementos do sistema do complemento podem contribuir para a esteatose heptica (62). Segundo, de acordo Jeong et al o sistema caninide pode ser um contributo essencial, uma vez que os ratos deficientes nesta via no desenvolvem esteatose heptica em resposta alimentao por etanol (63). Esta via requer interaces parcrinas entre clulas hepticas estreladas e hepatcitos.

IV 3.5 - DESNUTRIO A leso decorrente do lcool no depende da desnutrio, porm a obesidade e esteatose heptica devida aos efeitos dos hidratos de carbono sobre o controle transcripcional da sntese e transporte de lipidos podem ser factores proeminentes(64).

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A deficincia de vitamina A tambm tem sido implicada na patofisiologia da doena heptica alcolica (64), parecendo alterar a morfologia heptica (65). De acordo com Tatiana Pereira et al, nveis baixos de retinol hepticos tm sido encontrados em todos os estgios de doena heptica alcolica (65). A deficincia de vitamina A na doena heptica alcolica pode resultar da diminuio da sua ingesto ou absoro, na reduo da sntese de cido retinico ou na diminuio da sua degradao (65). Nos alcolicos crnicos, o estado nutricional da vitamina A deve ser monitorado, para evitar a sua deficincia e os seus sintomas clnicos, embora a suplementao deva ser feita com cuidado, pois doses comumentemente usadas podem ser txicas para aqueles que consomem etanol (65). Estudos anteriores sugeriram que a doena heptica alcolica foi devida, principalmente, a desnutrio, no entanto de acordo com Feinmam et al, agora evidente a partir de observaes tanto de origem animal como humana, que a doena ocorre frequentemente em alcolicos bem nutridos (66). No entanto, a desnutrio pode piorar a gravidade da doena. Esta observao fornece a justificao para a vigorosa suplementao nutricional como uma terapia para a doena heptica alcolica (64)

IV 3.6 EXPOSIO CONCOMITANTE E HEPATOTOXINAS Em geral, quaisquer dois agentes hepatotxicos vo agir sinrgicamente conferindoFACULDADE CINCIAS DA SADE - UBI - 2009

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maior risco para o desenvolvimento da doena heptica do que apenas um isoladamente. Exemplos proeminentes em alcolicos incluem a vitamina A e o acetominofeno. Segundo Lee et al, com a administrao de acetominofeno, o grande risco que a ingesto crnica de etanol pode predispr a uma hepatotoxicidade mesmo em doses teraputicas de acetominofeno (67), (68).

IV 3.7 SOBRECARGA DE FERRO Irving et al e Hultcrantz et al, demonstraram que a sobrecarga de ferro potencializa o desenvolvimento de doena heptica alcolica (69), (70). Este efeito pode estar relacionado com a capacidade que o ferro tem de agir como um electro doador, o que acelera a produo de intermedirios reactivos de oxignio instveis, levando a um aumento da leso da membrana. Segundo Hultcrantz et al, o aumento da formao de radicais livres tambm pode acelerar a formao de neutrfilos quimioatractivos, que aumentam ainda mais a resposta inflamatria (70). Assim, a suplementao de rotina de muitos alimentos como cereais ao pequeno-almoo com ferro pode inadvertidamente aumentar a prevalncia da leso heptica em pacientes que consomem grandes quantidades de lcool ou que tm hemocromatose gentica.

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IV 4 MORTALIDADE E MORBILIDADEO consumo excessivo de lcool a terceira principal causa evitvel de morte nos Estados Unidos e foi considerada responsvel por cerca de 76.000 mortes e 2,3 milhes de anos de vida produtiva perdidos em 2001 (71). A doena heptica alcolica nos E.U.A. um grande problema de sade. Constitui a 10 causa de morte em adultos, sendo responsvel por 8% de todas as mortes nos E.U.A. Associada a cirrose, a mortalidade aproxima-se de 60% aps 4 anos (26). Esta doena responsvel por mais de 30% dos casos de carcinoma hepatocelular (26), (71). A sobrevida mdia inferior a 2 anos em doentes com indcios de descompensao, em comparao com 10 anos, em pessoas com cirrose heptica compensada (72). Pacientes que para alm de cirrose tm hepatite alcolica, estima-se uma sobrevida aos 5 anos de 30%, em comparao com 50% naqueles com cirrose inactiva. (72).A

cirrose heptica de etiologia alcolica uma das principais causas de morte em

homens entre 25-64 anos de idade, nos grandes centros urbanos dos Estados Unidos, Canad e Mxico. Em Portugal, em 2001, morreram 1964 pessoas devido a Doena Crnica do Fgado e Cirrose, mais do que 1863 vtimas de Acidentes de Trnsito com Veculos a Motor(73).

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IV 5 - FISIOPATOLOGIAO lcool inteiramente absorvido no tubo digestivo, 30% no estmago, 65% no duodeno e apenas 5% no clon. A ingesto em jejum condiciona uma absoro completa em 15 a 20 minutos, enquanto, se ingerido com alimentos, pode demorar at 3h. (75) Uma vez absorvido, o lcool tem que ser obrigatoriamente metabolizado. Esta metabolizao tem lugar no fgado, em sistemas enzimticos saturveis e induzveis, envolvendo reaces de oxidao. O indivduo normal tem a capacidade de metabolizar entre 160 a 180 gramas/dia de lcool. Em termos gerais, o lcool convertido em acetaldedo pela enzima lcool-desidrogenase, e em menor percentagem (10-15%) por um sistema citocromo P450- sistema microssmico de oxidao do etanol (MEOS). O acetaldedo, composto muito txico e reactivo, transformado em acetato pela acetaldedo desidrogenase. (76) Alguns mecanismos que condicionam a agresso heptica por parte do lcool, so :

IV 5.1 - ACETALDEDO um composto altamente reactivo e txico. Quer na mitocndria, quer no citoplasma, pode causar desnaturao das protenas, peroxidao lpidica e alteraes da exocitose por ligao tubulina. Reduz o nvel de glutatio e aumenta o efeito txico de radicais livres, especialmente de radicais 1-hidroxietilo. Interfere com a cadeia deFACULDADE CINCIAS DA SADE - UBI - 2009

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transporte de electres, causando alteraes estruturais na mitocndria, e inibe os mecanismos de reparao do ADN. Estimula ainda a sntese de procolagnio I e fibronectina. (77), (78)

IV 5.2 ALTERAES NO POTENCIAL REDOX INTRACELULAR A oxidao de lcool a acetaldedo envolve a reduo de NAD a NADH. A metabolizao de grandes quantidades de lcool altera a relao NADH/NAD, inibindo a metabolizao de cidos gordos, a sntese de protenas e aumentando a peroxidao lipdica e formao de radicais livres. (79)

IV 5.3 MECANISMOS AUTO-IMUNES Existem evidncias de agresso heptica por auto-imunidade na DHA. Identificaram-se anticorpos anti-citocromo P450-2E1, (sistema enzimtico

microssomal correspondente ao MEOS), em resposta a uma modificao das protenas deste sistema enzimtico por reaco com os radicais livres 1hidroxietilo, resultantes do metabolismo do acetaldedo. No contexto de um polimorfismo gentico envolvido na proliferao dos linfcitos T (CTLA-4), a apresentao do antignio self modificado vai resultar na produo de autoanticorpos que podem desencadear uma resposta auto-imune contra o tecido heptico. (80)

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IV 5.4 ENDOTOXINAS E CITOCINAS As endotoxinas bacterianas parecem desempenhar um papel em vrias doenas hepticas, nomeadamente na DHA. O etanol e o seu metabolito acetaldedo parecem causar disfuno das tight junctions do epitlio das vilosidades intestinais, permitindo a passagem de macromolculas como lipopolissacardeos de bactrias gram negativas que colonizam o intestino. Estas atingem o fgado pela circulao portal e activam uma srie de mecanismos imunes. As clulas de Kupffer so estimuladas por ligao directa ao CD14 e desencadeada uma resposta imune local com produo de factor de necrose tumoral (TNF-), interleucina 1, protoglandinas E2 e D, leucotrienos, com recrutamento de polimorfonucleares, aumento de expresso de molculas de adeso, com aumento do stress oxidativo e consumo de O2, aumento da expresso de HLA, estimulao de fibroblastos e clulas de Ito e aumento da deposio de colagneo. (81), (82), (83) Apesar destes mecanismos estarem relativamente bem esclarecidos, o facto de apenas uma relativamente pequena percentagem de alcolicos desenvolver doena heptica parece cada vez mais relacionado com factores de susceptibilidade individual, como o sexo e factores genticos.

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Figura n 3 - Fisiopatologia da Doena Heptica Alcolica - Fonte: ciencia-atual.blogspot.com

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CLNICAIV 6.1 - SINTOMAS Os doentes com hepatopatia alcolica podem apresentar-se com sintomas inespecficos, constitucionais, tais como: dor imprecisa no quadrante superior direito, febre, nuseas e vmitos, anorexia, astenia, perda de peso, sintomas sugestivos de desnutrio e mal estar geral (84). Apresentam ainda fragilidade capilar, edema de membros inferiores, diarria, prurido, aumento do permetro abdominal, e confuso ou perturbao do sono (possivelmente indicando encefalopatia) (84).

IV 6.2 - SINAIS Os achados fsicos em pacientes com doena heptica alcolica podem variar de normal a evidncias de cirrose heptica ou descompensao. Assim, o exame fsico por si s no suficientemente sensvel para a deteco da doena heptica alcolica, embora os resultados positivos possam ser sugestivos. O incio sbito de qualquer uma dessas complicaes pode ser o primeiro evento que leva o paciente a procurar assistncia mdica. Outros pacientes podem ser identificados numa avaliao de exames laboratoriais de rotina que se revelam anormais (84).

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Pacientes com doena heptica alcolica apresentam muitas vezes disfunes coexistentes em outros rgos. Como resultado, a histria clnica e os exames fsicos devem incluir a avaliao para cardiomiopatia, atrofia muscular, neuropatias e disfuno pancretica (103). Ao exame objectivo, o fgado e o bao podem estar aumentados de volume, com a borda do fgado resistente e nodular. A presena de um bordo fino, duro e cortante, sugere a presena de fibrose, importante particularmente quando existe cirrose. Nestas situaes o bordo como a superfcie so nodulares. Outras alteraes frequentes (estigmas de DHC) incluem: ictercia das esclerticas, eritema palmar, telangiectasias, hipertrofia das glndulas partidas e glndulas lacrimais,

baqueteamento digital, unhas brancas ou Muerckes e quebradias, atrofia muscular ou surgimento de edema e ascite, vasos colaterais periumbilicais provocados pela permeabilizao da veia umbilical por hipertenso portal (caput medusa) (84), (85), (86). Os homens podem evidenciar distribuio pilosa do tipo feminino e ginecomastia assim como atrofia testicular, que pode ser consequncia de anormalidades hormonais ou de um efeito txico directo do alcol sobre os testculos (84). Nas mulheres com cirrose alcolica em fase avanada, ocorrem habitualmente irregularidades menstruais e algumas delas podem ter amenorreia (84). Com frequncia, essas mudanas so reversveis aps o abandono do lcool.

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Neurolgicas Encefalopatia Heptica Neuropatia perifrica Asterixis

Pele e mucosas Ictercia Telangiectasias Eritema palmar Prpura Petquias Caput medusa Hematolgicas Anemia Trombocitopenia Leucopenia Alteraes da coagulao Esplenomeglia Metabolismo Hipokalimia Hiponatremia hipoalbuminemia Cardiovascular Anasarca Adema perifrico Ascite

Gastrointestinal Anorexia Dispepsia Nusea, vmitos Alteraes hbitos intestinais Dor abdominal moderada Fetor hepaticus Varizes esofgicas e gstricas Hematemeses Varizes hemorroidais Gastrite congestiva Reprodutivas Amenorreia Atrofia testicular Ginecomastia Impotncia

Figura n 4 - Manisfestaes faculty.plattsburgh.edu//Chyrrosis.jpg

clnicas

sistmicas

da

cirrose

heptica

fonte:

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Especificando alguns deles:

IV 6.2.1 - TELANGIECTASIAS Telangiectasias so leses vasculares cutneas que consistem numa arterola central rodeada por muitos pequenos vasos. So mais frequentemente encontradas na regio superior do tronco, face e membros superiores, ocorrendo exclusivamente no territrio da veia cava superior (o que permite o diagnstico diferencial do Sndrome de Rendu Osler) (86). Embora sua patognese no esteja entendida completamente, acredita-se que elas so resultado de alteraes no metabolismo da hormona sexual (estrognios). Um estudo de Pivorino et al, sugeriu que a presena de telangiectasias em homens foi associada a um aumento da razo estradiol / testosterona livre (87). Telangiectasias adquiridas no so especficas para cirrose, uma vez que tambm podem ser observadas durante a gravidez e em pacientes com desnutrio grave (86). Tambm podem ser observadas em pessoas saudveis, que normalmente tm menos de trs pequenas leses. Segundo Zamanan et al, como regra geral, o nmero e o tamanho das telangiectasias correlacionam-se com a gravidade da doena heptica e os doentes podem estar em risco aumentado de hemorragia por varizes esofgicas. (88)

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Figura n 5 Talengiectasias - Fonte: www.merk.com

IV 6.2.2 ERITEMA PALMAR Consiste na hipermia das eminncias tenar e hipotenar e da polpa dos dedos, contrastando com palidez na regio central da palma da mo. Pode ser constitucional ou acompanhar outras patologias, como atrtrite reumatide ou tirotoxicose. (86)

Figura n 6 - Eritema palmar - Fonte: members.xoom.it

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IV 6.2.3 ALTERAES UNGUEAIS As unhas de Muehrcke so faixas horizontais brancas emparelhadas separadas por cores normais. A patognese exacta desconhecida, mas acredita-se que seja causada por hipoalbuminemia. No so especficos para cirrose, uma vez que tambm podem ser observadas noutras condies associadas com uma baixa de albumina srica, como a sndrome nefrtica (89).

Figura n 7 - Unhas de Muehrcke - Fonte: Baran R, e tal, Differential Diagnosis and Treatment, 1991

As unhas de Terry tambm podem ser observadas em pacientes com cirrose. Os dois teros proximais da unha aparecem de cor brancas contrastando com o tero distal vermelho. Este achado tambm se pensa ser secundrio a hipoalbuminmia (90).

Figura n 8 - Unhas de Terry - Fonte: Baran R, e tal, Differential Diagnosis and Treatment, 1991

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IV 6.2.4 CONTRACTURA DE DUPUYTREN Contratura de Dupuytren resulta do espessamento e encurtamento da fscia palmar, o que provoca deformidades na flexo dos dedos. Patologicamente, caracterizada por proliferao fibroblstica e deposio de colgeno desordenada com espessamento fascial. A patognese desconhecida, mas pode estar relacionado com a formao de radicais livres produzidos pelo metabolismo oxidativo da hipoxantina. (91)

Figura n 9 Dupuytrens - Fonte: Sheon, RP, Moskowitz, RW, Goldberg, VM. Soft Tissue Rheumatic Pain: Recognition, Management, Prevention, 3rd ed, Williams &Wilkins, Baltimore 1996.

IV 6.2.5 - GINECOMASTIA A Ginecomastia definida como uma proliferao histologicamente benigna do tecido glandular da mama masculina e clinicamente pela presena de uma massa firme estendida concentricamente a partir do mamilo (s).

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At dois teros dos pacientes com cirrose tm ginecomastia. Segudo Van Thiel, et al possivelmente causada pelo aumento da produo de androstenediona das glndulas supra-renais, reforada metabolizao da androstenediona a estrona, e aumento da converso de estrona em estradiol. (86) Os homens tambm podem desenvolver outras caractersticas reflectindo feminizao como a perda de plos axilares e trax ou inverso do padro normal dos plos pubianos (86).

Figura n 10 Examinao da Ginecomastia - Fonte: Braunstein, GD, Hosp Pract 1993; 28:37.

IV 6.2.6 - HIPOGONADISMO

O Hipogonadismo manifestado por impotncia, infertilidade, perda do impulso sexual e atrofia testicular. uma caracterstica predominantemente observada em doentes com cirrose alcolica e hemocromatose. Mais do que um mecanismo parece estar envolvido. Segundo Van Thiel et al, em alguns casos, a leso gonadal primria

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parece ser mais proeminente, como sugerido pelo aumento das concentraes sricas FSH e LH, enquanto que noutros a supresso da funo hipfise ou hipotlamo parece ter um papel primordial, tal como sugerido pelas concentraes sricas de LH que no esto elevadas. Os efeitos txicos do lcool ou de ferro pode tambm contribuir para o seu desenvolvimento (92).

Figura n 11 - Hipogonadismo - Fonte: www.uftm.edu.br

IV 6.2.7 - HEPATOMEGALIA

Um fgado cirrtico pode estar aumentado, tamanho normal, ou pequeno. Embora a presena de um fgado palpvel possa indicar doena heptica, um figado no-palpvel no pode exclui-la. Quando palpvel, o figado cirrtico tem uma consistncia firme e nodular.(86)

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Figura n 12 - Fgado cirrtico - Fonte: www.alcoologia.net

IV 6.2.8 - ASCITE Ascite o acmulo de lquido na cavidade peritoneal. A preciso dos achados fsicos varivel dependendo em parte da quantidade de fluido presente, da tcnica utilizada para examinar o paciente, bem como do cenrio clnico (por exemplo, a deteco pode ser mais difcil em pacientes que so obesos). (86)

Figura n 13 - Ascite - Fonte: www.hepcentro.com.br FACULDADE CINCIAS DA SADE - UBI - 2009

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IV 6.2.9 SOPRO DE CRUVEILHIER-BRAUMGARTEN

O sopro de Cruveilhier-Baumgarten um sopro venoso que pode ser auscultado em pacientes com hipertenso portal. o resultado de conecces bilaterais entre o sistema porta e a veia umbilical remanescente. melhor auscultado quando o estetoscpio colocado sobre o epigstro. O sopro agravado por manobras que aumentem a presso intrabdominal, como a manobra de Valsalva e diminudo atravs da aplicao de presso na pele acima do umbigo (93).

IV 6.2.10 - ICTERCIA A ictercia uma colorao amarela da pele e mucosas, que resulta de um aumento da bilirrubina srica. geralmente no detectvel at a bilirrubina ser maior do que 2 a 3 mg / dL. A hiperbilirrubinemia pode tambm causar o aparecimento de urina escura ou cor de vinho do Porto. (Fezes aclicas ou em massa de vidraceiro).(94)

Figura n 14 Ictercia - Fonte: www.hepcentro.com.br FACULDADE CINCIAS DA SADE - UBI - 2009

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IV 6.2.11 ASTERIXIS/FLAPPING um tremor bilateral mas assincrnico com braos estendidos e dorsiflexo das mos, observado em pacientes com encefalopatia heptica, que descreve o espectro de anormalidades neuropsiquitricas potencialmente reversiveis observadas em

pacientes com disfuno heptica. Os Asterixis tambm podem ser observado em pacientes com insuficincia cardaca grave e urmia. (94)

Figura n 15 - Asterixis/Flapping - Fonte: escuela.med.puc.cl

IV 6.2.12 HIPERTROFIA DAS GLNDULAS PARTIDAS A hipertrofia da Glndula partida (provavelmente secundria ao alcoolismo, no cirrose propriamente dita) geralmente secundria infiltrao de gordura, fibrose e edema, em vez de uma glndula hiperfuncionante.(94)

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Figura n 16 - Hipertrofia das glndulas partidas - Fonte: www.scielo.br

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IV 7 - DIAGNSTICOH recomendaes para o diagnstico da doena heptica alcolica que foram estabelecidas numa directriz do Colgio Americano de Gastroenterologia e aprovadas pela Associao Americana de Gastroenterologia e pela Associao Americana para o estudo das doenas do fgado. Critrios formais de diagnstico para doenas relacionadas ao consumo de lcool tambm foram avanados por outras organizaes.Todos os pacientes devem ser rastreados para a doena heptica alcolica. Uma histria minuciosa do uso de lcool deve ser obtida. O CAGE um bom mtodo de triagem para o lcool abuso ou dependncia. Um exame fsico detalhado deve ser feito, em busca de sinais de doena heptica crnica e estadiamento da sua gravidade Um perfil bioqumico heptico (incluindo albumina, bilirrubina e transaminases [AST / ALT]. Um hemograma completo e tempo protrombina ou INR deve ser obtido para apoiar uma suspeita clnica de doena heptica alcolica e avaliar a sua gravidade. No entanto, ambas as anormalidades laboratoriais e achados fsicos podem ser mnimos ou ausentes, mesmo em pacientes com a doena heptica alcolica. Ao avaliar um paciente de doena heptica alcolica, o mdico deve-se lembrar que o limiar txico dose diria de 80 g de lcool no absoluta. Elevaes de ALT srica podem-se desenvolver em doses muito mais baixas, especialmente em mulheres e doentes com hepatite. Pode ser necessrio realizar uma bipsia heptica em pacientes com suspeita de doena heptica alcolica quando o diagnstico incerto devido a caractersticas atpicas ou possvel doena concomitante.Tabela n 1 - Recomendaes para o diagnstico da doena heptica alcolica. - Fonte: Am J Gastroenterol 1998; 93:2022

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IV 7.1 - ANAMNESE A histria deve incluir questes sobre os factores de risco para doena heptica crnica, incluindo uma histria de hepatite, o consumo de lcool, Diabetes Mellitus, uso de drogas ilcitas (por injeco ou por inalao), transfuses, histria familiar de doena heptica, viagens, bem como a presena de doenas auto-imunes (incluindo doena inflamatria intestinal, artrite reumatide e doena da tiride) (94).

IV 7.2 EXAMES COMPLEMENTARES DE DIAGNSTICO IV 7.2.1 EXAMES LABORATORIAIS

Os exames laboratoriais podem estar completamente normais nos pacientes com cirrose inicial compensada. Como alternativa, na hepatopatia avanada existem habitualmente muitas anormalidades. (84)

IV 7.2.1.1 - TRANSAMINASES A aspartato aminotransferase (AST), a alanino aminotransferase (ALT) e a gamaglutamil transferase (GGT), so frequentemente anormais na doena heptica alcolica, apesar da persistncia de nveis anormais de aminotransferases no soro no indica necessariamente que o doente continua a ingerir lcool (95). O padro mais comum nos testes de anormalidades bioqumicas do fgado uma desproporcionada elevao dos nveis sricos de AST (SGOT), comparativamente com a ALT (SGPT). EstaFACULDADE CINCIAS DA SADE - UBI - 2009

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razo geralmente superior a 2, um valor que raramente observado em outras formas de doena heptica. Num estudo mais antigo, mas ainda relevante, de Cohen et al, por exemplo, a mdia da razo AST/ALT foi 2,85 em doentes com doena heptica alcolica versus 1,74 naqueles com cirrose ps necrtica (96) Outro estudo de Williams et al, encontrou uma razo mdia de 2,6 em pacientes com doena heptica alcolica versus 0,9 naqueles com esteatose heptica no alcolica. Um terceiro estudo de Williams et al, registou uma razo inferior a 1,0 em pacientes com hepatite viral crnica (97). O valor absoluto dos nveis sricos de AST e ALT geralmente inferior a 500 UI /L (e, normalmente inferior a 300 UI/L). Concentraes mais elevadas devem levantar a suspeita de leso heptica concomitante devido a hepatite viral ou isqumica ou utilizao de acetominofeno, mesmo em doses teraputicas (103). De acordo com Uchida et al, a variante incomum, degenerao alcolica espumosa, que se caracteriza por ictercia e hiperlipidmia, pode elevar a AST to alta como 730 UI/L com a AST>ALT (98). De acordo com Diehl et al, a relativamente menor elevao da ALT tem sido atribuda a deficincia de 6-fosfato-piridoxal em alcolicos, que um co- factor para a actividade enzimtica da ALT (99). Segundo esta hiptese, a alterao na razo reflecte a falta de capacidade de aumentar a ALT, em vez de uma elevao da AST desproporcionada. No entanto, associada uma hepatite isqumica ou hepatotoxicidade por acetominofeno pode causar uma marcada e desproporcionada elevao da AST e ALT com ASTFACULDADE CINCIAS DA SADE - UBI - 2009

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restante> ALT; esta observao sugere que outros factores alm da 6- fosfato-piridoxal tambm so importantes. No entanto, as provas hepticas convencionais podem apresentar-se normais. Se a relao AST/ALT reverte com a abstinncia, mais provvel que exista um quadro de esteatose heptica. Se a relao AST/ ALT inferior a 2, devem-se suspeitar de outras etiologias na hepatite do alcolico (85).

IV 7.2.2.2 FOSFATASE ALCALINA A fosfatase alcalina est normalmente elevada, mas menos de duas a trs vezes o limite superior normal. Nveis mais altos podem ser observados em pacientes com colangite esclerosante primria e cirrose biliar primria (94).

IV 7.2.2.3 GAMA-GLUTAMINAL TRANSPEPTIDASE A Gama-glutamil transpeptidase (GGT) correlaciona-se razoavelmente bem com os nveis de fosfatase alcalina na doena heptica. Os nveis de GGT so normalmente muito mais elevados na doena heptica crnica de etiologia alcolica do que noutras causas. Segundo Goldberg, este pode ser o resultado da estimulao da produo de GGT nos microssomas hepticos, pelo lcool, ou eliminao de GGT pelos hepatcitos(100).

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IV 7.2.2.4 BILIRRUBINA SRICA Os nveis de bilirrubina podem ser normais na cirrose compensada. No entanto, esses nveis aumentam quando a cirrose progride (94).

IV 7.2.2.5 ALBUMINA SRICA A albumina sintetizada exclusivamente no fgado. A diminuio dos nveis de albumina assim como a sua produo heptica, intensiva-se com o agravamento da cirrose. Assim, os nveis sricos de albumina podem ser utilizados para o estadiamento cirrose. A hipoalbuminmia no especfica para a doena heptica, uma vez que pode ser observada em muitas outras condies mdicas, tais como insuficincia cardaca congestiva, a sndrome nefrtica, ou desnutrio (94).

IV 7.2.2.6 - IMUNOBLOBINAS As imunoglobulinas tendem a elevar-se em pacientes com cirrose. Isto pode ser secundrio sada de antgenos bacterianos do sangue venoso portal para longe do tecido linfide heptico, que induz produo imunoglobulinas (94). A hipergamaglobulinmia comum nos estgios avanados da DHA, com elevao na IgG e na IgA (85).

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IV 7.2.2.8 NVEIS SRICOS DE SDIO A hiponatremia comum em pacientes cirrticos com ascite, e est relacionada a uma incapacidade de excretar gua livre. Isso resulta principalmente da secreo de elevados nveis de hormona anti-diurtica (84), (101). A hiponatremia torna-se muitas vezes grave quando a cirrose avana para fase final da doena heptica.

IV 7.2.2.8 ANOMALIAS HEMATOLGICAS Os doentes com cirrose geralmente tm uma variedade de anormalidades hematolgicas, incluindo distrbios de coagulao e diversos graus de citopenia.

Anemia - A anemia geralmente de origem multifatorial. Pode ser consequncia dadeficincia em ferro por hemorragia gastrintestinal aguda e crnica, por deficincia de folato, por efeito directo da toxicidade devido ao lcool, por hiperesplenismo, devido a supresso da medula ssea (como na hepatite associada anemia aplstica), por doena crnica (inflamao), e por hemlise (85), (94). De acordo com Veyrac et al, uma forma mpar de anemia hemoltica (com hemcias espiculadas e ancatcitos) denominada Sndrome de Zieve, pode preceder episdios de hepatite alcolica aguda num fgado normal, fibrtico ou cirrtico. Caracteriza-se por

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ictercia, hiperlipidemia e normalmente desenvolve-se em jovens e alcolicos crnicos com fgado gordo aumentado (84) (102).

Segundo Jenny Sauk et al, a macrocitose indica doena de longa durao e pode reflectir um mau estado nutricional, deficincia de cobalamina e folato, e toxicidade do lcool e/ou aumento da deposio lipdica na membrana celular vermelha (103)

Trombocitopenia Pode ser consequncia directa do etanol como reflexo dahipertenso portal com hiperesplenismo, que tambm pode induzir leucopenia. (84) A esplenomeglia pode resultar em sequestro temporrio de at 90 por cento da massa de plaquetas circulantes. No entanto, isto raramente resulta em contagem de plaquetas inferior a 50.000 / mL, e, excepto complicada por coagulopatia coexistente, raramente um problema clnico. A diminuio nos nveis de trombopoietina pode tambm contribuir para a trombocitopenia (94). A trombocitopenia primria pode resultar de hipoplasia da medula ssea, que pode ser devida ao uso de alcol e geralmente breve (103).

Leucopenia e neutropenia - Leucopenia e neutropenia so devido aohiperesplenismo com marginao (94). Em 50% dos doentes podemos encontrar leucocitose, com valores de 12 000 a 14 000/mm3 , e raramente quadros leucemides (85). uma anormalidade frequente eFACULDADE CINCIAS DA SADE - UBI - 2009

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importante na hepatite alcolica. Depois que outras causas sejam excludas, a magnitude da elevao das clulas brancas sanguneas correlaciona-se estreitamente com a gravidade da leso heptica. A infiltrao neutrofilica habitualmente observada na biopsia heptica e estas clulas podem desempenhar um papel patognico importante na leso heptica (103).

Defeitos da coagulao - A maioria das protenas envolvidas no processo decoagulao produzida no fgado. Assim, o agravamento da coagulopatia correlacionase com a gravidade da disfuno heptica. Para alm da deficincia de protenas coagulantes, os doentes podem desenvolver diferentes graus de DIC, fibrinlise, deficincia de vitamina K, disfibrinogenemia, e trombocitopenia, que podem contribuir para a hemorragia (94).

Tempo de Protrombina - O fgado est envolvido na sntese de muitas protenasda coagulao necessrios para o normal. Assim, o tempo de protrombina reflete o grau de disfuno heptica sinttica. O tempo de protrombina aumenta medida que a capacidade da cirrose heptica sintetizar fatores de coagulao diminui. A hipoprotombinmia, se presente, resultante de doena heptica grave ou de deficincia de vitamina K (85).

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IV 7.2.2 OUTROS TESTES DE DIAGNSTICO

A capacidade do fgado para o transporte de anies orgnicos e metabolizar drogas levou ao desenvolvimento de uma variedade de testes para avaliar a sua funo. Nada utilizado rotineiramente na prtica clnica (94).

IV 7.2.2.1 MEDIO DA CARBOHYDRATE DEFICIENT TRANSFERRIN (CDT) Tem sido proposta para o diagnstico da doena heptica alcolica. De acordo com Yersin et al e Anton et al, a sensibililidade e especificidade para ingesto significativa de lcool esto na faixa 60 a 70% e 80 a 90%, respectivamente (95), (104). Elevaes da CDT podem ocorrer na sepsis, anorexia nervosa e doenas das vias areas. Menores valores de sensibilidade tambm tm sido relatados com sobrecarga de ferro. Segundo Schmitt et al, a utilidade do teste da CDT depende do quadro clnico e outros exames bioqumicos (105).

IV 7.2.2.2 ETHYL GLUCURONIDE (ETG) Um metabolito directo do etanol, formado pela conjugao do etanol com o cido glucocurnico, pode ser detectado em vrios fluidos corporais, tecidos, cabelos e at 80h aps eliminao completa do lcool do organismo. Como resultado, a EtG estFACULDADE CINCIAS DA SADE - UBI - 2009

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emergindo como um potencial marcador estvel do consumo alcolico. De acordo com a investigao de Zimmer et al, um teste ELISA EtG produziu uma taxa de sensibilidade e especificidade de 92% e 91%, respectivamente (106). Este teste no muito utilizadona prtica clnica, mas poderia ser til em circunstncias especiais (por exemplo, em pacientes que negam o consumo de etanol como parte de avaliao para o transplante do fgado, ou nos casos legais) (103). Dunn et al, propuseram um modelo preditivo, que pode distinguir esteatohepatite alcolica de no alcolica (107). O modelo incorpora o volume corpuscular mdio (VCM) e a razo ALT/AST, o indce de massa corporal e o sexo. Estudos adicionais de validao so necessrios, para entender melhor as caractersticas do teste.

IV 7.2.2.3 FIBROSCAN:

Durante anos, bipsia heptica tem sido o padro-ouro para quantificar a fibrose heptica. Actualmente, alternativas no invasivas esto disponveis para quantificar a fibrose. Elastography Transiente (TE) ou Fibroscan ((R)) quantificam a rigidez do fgado, que proporcional ao grau de fibrose heptica. Segundo Carrin JA, a TE confivel para o diagnstico de cirrose heptica e fibrose significativa, mas os seus valores podem variar de acordo com as caractersticas do paciente e da etiologia da doena. A TE pode evitar a bipsia heptica em 90% dos

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pacientes com cirrose e em at 70% das pessoas com fibrose significativa quando combinado com outros mtodos no-invasivos. (108)

IV 7.2.3 - IMAGIOLOGIA Embora os achados radiolgicos possam ocasionalmente sugerir a presena de cirrose, no so suficientemente sensveis ou especficos para utilizao como uma modalidade primria de diagnstico (94). A maior utilidade da radiologia na avaliao do paciente cirrtico est na sua capacidade para detectar as complicaes da cirrose heptica, tais como ascite, carcinoma hepatocelular e, heptica ou trombose da veia porta. Em casos raros, achados radiolgicos sugerem a etiologia da cirrose (94). A hipertrofia do caudado descoberto na TC, por exemplo, sugere sndrome de BuddChiari. A diminuio da intesidade do sinal na RM, pode indicar sobrecarga de ferro a partir de hemocromatose hereditria (109).

IV 7.2.3.1 ECOGRAFIA ABDOMINAL Entre as tcnicas de imagem destaca-se, pela acessibilidade e baixo custo, a ecografia abdominal. A sua maior limitao reside na grande dependncia da qualidade e experincia do executante e nas dificuldades que podem surgir na avaliao do fgado quando existe ascite. (110)

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A ecografia abdominal o exame inicial de eleio, sendo rotineiramente utilizada durante a avaliao do paciente cirrtico. no invasiva, bem tolerada, amplamente disponvel, e fornece informaes valiosas. (94) Na cirrose avanada, o fgado pode aparecer pequeno e nodular. De acordo com Di Lellio et al, o aumento da nodularidade da superfcie e da ecogenicidade traduz-se por reas irregulares compatveis com o diagnstico de cirrose, mas tambm pode ser observado na esteatose heptica. (111). Revela normalmente atrofia do lobo direito e hipertrofia dos lobos caudado e esquerdo. Alguns pesquisadores, como Giorgio et al, tm tentado utilizar a razo entre a largura do lobo caudado para a largura do lobo direito como um critrio ecogrfico para o diagnstico de cirrose. No entanto, a sensibilidade pobre (94). A ecografia, pode ser utilizada como um teste de rastreio de carcinoma hepatocelular e hipertenso portal. O achado de ndulos na ecografia garante uma avaliao mais aprofundada desde ndulos benignos e malignos que podem ter aparncia semelhante ecogrficamente (94). Segundo Zwiebel et al, os achados de hipertenso portal incluem um aumento do dimetro da veia porta e presena de veias colaterais (112). Pode tambm ser til para detectar esplenomegalia, ascite, e trombose da veia porta. (94) A ecografia tambm til para eliminar a hiptese de obstruo biliar e associada ao Doppler possibilita o estudo da permeabilidade das veias porta e hepticas e adireco do fluxo portal (85).

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Figura n 17 Ecografia Abdominal - Fonte: www.hepcentro.com.br

IV 7.2.3.2 TOMOGRAFIA COMPUTORIZADA (TC)

A tomografia computorizada no utilizada rotineiramente no diagnstico e avaliao de cirrose. (94) Fornece informao similar ecografia, mas custa da exposio a radiao e contraste. Os resultados da TC podem sugerir a presena de cirrose, mas no so diagnsticos. (94)

Figura n 18 - Tomografia compututorizada abdominal - Fonte: www.hepcentro.com.br

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IV 7.2.3.3 RESSONNCIA MAGNTICA (RM) O papel da ressonncia magntica (RM) no diagnstico de cirrose claro. Apesar de muito entusiasmo sobre o potencial de ressonncia magntica na avaliao do paciente cirrtico, hoje seu uso limitado pelo custo, intolerabilidade do paciente, bem como a capacidade de obter informaes fornecidas pela RM por outros meios(94)

Ito et al, constataram que a RM pode diagnosticar com preciso a cirrose e classific-la segundo a gravidade (113). Ito et al concluira, no seu estudo, que a ressonncia magntica, tem uma sensibilidade e especificidade na distino entre cirrose classe A segundo a classificao de Child-Pugh das outras classes de classificao, de 93 e 82 por cento, respectivamente (114). A ressonncia magntica pode tambm revelar sobrecarga de ferro e fornecer uma estimativa da concentrao de ferro heptico, segundo Bonkovsky et al. (115) De acordo com Finn et al, a angioressonncia mais sensvel que a ecografia no diagnstico de complicaes da cirrose, tal como a trombose da veia porta (116). A venografia heptica utiliza-se na vigncia da sndrome de Budd- Chiari e no estudo da presso venosa supra-heptica (85). A fibrose avanada pode ser determinada usando elastrografia transitria (94). Na ressonncia magntica, de acordo com Ocazaki et al, caractersticas clnicas que so sugestivas de cirrose alcolica versus cirrose por hepatite viral incluem um maior

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indce de volume do lobo caudado, menor tamanho dos ndulos de regenerao do fgado, e mais frequente a visualizao da incisura heptica posterior direita. (117)

IV 7.2.3.4 ESTUDOS NUCLEARES Testes com Radionuclido podem ser teis em sugerir o diagnstico de cirrose heptica, segundo Mc Laren et al (118). O enxofre coloidal 99mT normalmente absorvido por clulas do sistema reticuloendotelial. Nos pacientes com cirrose, pode haver heterogeneidade na captao do enxofre coloidal 99mT no fgado e aumento da absoro pelo bao e medula ssea. A exacta sensibilidade e especificidade destes achados para diagnosticar a cirrose desconhecida. Dada a ampla utilizao das outras modalidades de imagens discutidas anteriormente, este teste pouco realizado na prtica clnica. (94)

Uma ferramenta experimental para o diagnstico da doena heptica alcolica o hepatic phosphorus 31 magnetic resonance spectroscopy, que pode calcular o metabolismo heptico energtico e o metabolismo da membrana fosfolipidica. Menon et al concluram com o seu estudo que pacientes com cirrose alcolica tm razes fosfodiesterase /ATP mais baixos do que pacientes com cirrose por outras causas (119).

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IV 7.2.3.5 BIPSIA HEPTICA difcil prever a presena de cirrose com base em caractersticas clnicas e laboratoriais. A documentao da cirrose pode ter implicaes prognsticas e teraputicas. Alm disso, alguns achados histolgicos, tais como fibrose perivenular, mitocondria gigante, bem como a presena de gordura macro e microvesicular, podem estar associados a um pior prognstico em pacientes com esteatose mas que ainda no desenvolveram cirrose (120). A deciso de realizar uma biopsia, deve ponderar a confiana do diagnstico clnico, e o papel de que os achados na bipsia so importantes na orientao das decises teraputicas. Como regra geral uma biopsia pode ser indicada em: (103)

Qualquer paciente com elevaes das aminotransferases no soro que persistem por mais de 6 meses, mesmo quando o paciente est assintomtico Pacientes que tm evidncia de insuficincia heptica (por exemplo, tempo de protrombina anormal, hipoalbuminmia), para alm de nveis elevados de aminotransferases. Se uma coagulopatia est presente, a biopsia transjugular geralmente mais segura do que a biopsia percutnea. Pacientes nos quais o diagnstico de hepatite alcolica incerto baseado em achados clnicos e laboratoriais. Pacientes que podem ter mais que um tipo de doena heptica (como lcool e hepatite C), em que a biopsia heptica pode ajudar a determinar a contribuio relativa desses factores. Pacientes nos quais desejada uma compreenso mais detalhada do prognstico.Tabela n 2 - Indicaes da bipsia para heptica - FONTE: Jenny Sauk, MD et al, Clinical manifestations and diagnosis of alcoholic liver disease, 2009 FACULDADE CINCIAS DA SADE - UBI - 2009

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o nico mtodo de avaliar as leses histolgicas presentes. Tem sobretudo interesse, na prtica clnica, como indicador de prognstico, na medida em que faculta informao sobre a reversibilidade ou irreversibilidade do quadro lesional, como a esteatose, ou se j existem leses cuja progresso no possvel evitar, como a fibrose perivenular, a hepatite alcolica ou a cirrose heptica, mesmo que os doentes faam uma absteno absoluta e definitiva do lcool (121). Apesar de algumas limitaes, quer quanto a execuo, pela presena de ascite, anemia, ou alteraes da coagulao, um exame complementar de grande valor, designadamente em doentes em abstinncia e em que subsistem alteraes laboratoriais ou ecogrficas (121). Leses, como a esteatose, a hepatite alcolica ou o carcinoma, podem ser focais e no estar presentes no fragmento obtido. Por outro lado, h limitaes inerentes ao tamanho do fragmento quando se aplicam critrios estritos para afirmar a presena de pseudolbulos (121). Enquanto para o diagnstico das leses focais o recurso biopsia dirigida pode constiituir a soluo, o diagnstico da cirrose pode no ser possvel. Uma outra possibilidade de biopsia heptica a demonstrao de leses no provocadas pelo lcool e devidas a outras causas que so responsveis, em alguns estudos, por at 20% da doena heptica observada em consumidores excessivos. (121) Atendendo a que nenhuma das alteraes hsitolgicas permite afirmar a etiologia, na prtica clnica a bipsia heptica pode ter pouca importncia no diagnstico e os achados no influenciam a deciso teraputica fundamental que consiste na abstinncia alcolica. A informao obtida tem sobretudo significado prognstico

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(121). Para isso, reservamos a bipsia heptica para os doentes em que conseguimos

uma absteno duradoura e em que persistem alteraes laboratoriais ou na ecografia (121). Pretendemos assim, obter dados mais precisos quanto ao prognstico individual e excluir a eventual presena de outras etiologias (121). O padro de ouro para o diagnstico de cirrose heptica um exame de exposio do fgado na autpsia ou aps transplante de fgado durante o qual a arquitetura de todo o fgado pode ser apreciada. A sensibilidade de uma bipsia heptica por cirrose est na faixa de 80 a 100 por cento, dependendo do mtodo utilizado, bem como o tamanho eo nmero de espcimes obtidos (122), (123). No entanto, a bipsia heptica no necessria se os dados clnicos, laboratoriais, radiolgicos sugerirem fortemente a presena de cirrose. Um exemplo seria um paciente com ascite e coagulopatia grave(94).

Alm de demonstrar que a cirrose est presente, uma bipsia heptica, por vezes pode sugerir a causa. Isto especialmente verdade para causas metablicas da cirrose, como a hemocromatose hereditria, NASH, a doena de Wilson, e deficincia de alfa-1 antitripsina (94).

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IV 8 DIAGNSTICO DIFERENCIAL

Apesar do diagnstico clnico da doena heptica alcolica ser normalmente muito simples, a semelhana dos achados clnicos e histolgicos com outras doenas, s vezes causa confuso no diagnstico. Alm disso, ocasionalmente, determinar a razo de um doente estvel com DHC bem compensada, ter repentina e inexplicavelmente uma deteorizao do seu estado, pode ser difcil. As condies que tm achados clnicos e histolgicos em comum com a doena heptica alcolica so: a doena do fgado gordo no alcolica (NAFLD), hemocromatose hereditria, hepatotoxicidade por amiodarona e o Sndrome de BuddChiari.

IV 8.1 ESTEATO HEPATITE NO ALCOLICA (NAFDL) A condio que mais desafiadora para diferenciar da doena heptica alcolica NAFDL. As duas condies so histolgicamente indistinguveis. Como consequncia, a diferenciao entre doena heptica alcolica e NAFDL deve ser feita por razes clnicas. A evidncia mais forte no suporte do diagnstico de NAFDL em vez de doena heptica alcolica a histria de ingesto de lcool diria inferior a 20g. Quando a ingesto de lcool pelo paciente questionvel, diferenciar as duas condies pode ser difcil, se no impossvel. De acordo com Marchesini al e falck- Ytter et al,

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doentes com NAFDL so mais susceptveis que os pacientes com doena heptica alcolica, a serem mulheres assintomticas que tm resistncia a insulina perifrica, obesidade, hipertenso e dislipidmias.(124), (125) Tambm so mais susceptveis a terem resultados normais nos testes bioqumicos do fgado e razo AST/ALT no soro inferior a 1, comparada com uma razo AST/ALT no soro superior a 2 na maioria dos doentes com doena heptica alcolica. Doentes com NAFDL e cirrose, contudo, frequentemente tm uma razo AST/ALT no soro superior a 1. O nvel de CDT no soro pode ser til para distinguir bebedores pesados de doentes abstinentes com NAFDL, contudo, a eficcia do teste para detectar moderadas mas nveis clinicamente significativos de ingesto de lcool menos clara. (125) (126)

IV 8.2 HEMOCROMATOSE HEREDITRIA

Na ocasio, pode ser difcil distinguir doentes com doena heptica alcolica e sobrecarga de ferro secundria, de pacientes com doena heptica causada por hemocromatose hereditria, particularmente os com cirrose descompensada. De acordo com Cotler SG et al, doentes com doena do fgado em estgio terminal por cirrose alcolica podem ter ferro e ferritina elevados no soro e aumentados os nveis de ferro hepticos sugestivos de Hemocromatose Hereditria (127). De facto, mais de 20% dos doentes com cirrose alcolica em estgio final tem siderose heptica clinicamente importante, segundo Deugnier et al. (128)

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Para complicar ainda mais, segundo Fletcher LM et al, 15-40% dos doentes com hemocromatose hereditria consomem mais de 80g de lcool p