3
Clemente Romano e a “Sola Fide” Introdução É sabido que a doutrina da Sola Fide (ou "só pela Fé") é uma das colunas da Reforma Protestante do século XVI, junto com Só a Graça, Só a Escritura, Só Cristo e Só glória a Deus. Esta doutrina ensina que não existe mérito algum que faça o homem pecador "merecedor" da salvação da sua alma, mas que a mesma é consequência da infinita misericórdia de Deus, recebida por Graça (presente) por meio da Fé no sacrifício vicário e expiatório de Jesus Cristo na cruz do Calvário. Já o apóstolo Paulo declara que somos salvos por Graça por meio da Fé... "não por obras para que ninguém se glorie" (para que ninguém diga que o mereceu), ensinando por conseguinte que a Justificação diante de Deus Pai do homem pecador se realiza SÓ PELA FÉ ("Sola Fide") "Porque por graça sois salvos  por meio da fé; e isto não vem de vós, pois é dom de Deus; não por obras  , para que ninguém se glorie. Porque somos feitura sua, criados em Cristo Jesus para boas obras [1]  , as quais Deus preparou de antemão  para que andássemos nelas..." (Efésios 2:8-10) Ora bem, esta doutrina (Só a Fé -"Sola Fide") atenta de maneira directa contra a pr ópria base dos ar gumentos esgri midos pel a Igrej a Católica Romana pa ra sustentar o seu poder temporal: o pretenso estabelecimento sobre ela de "todos os meios de salvação" [2]. Porque se a Salvação for realmente "Só por Fé", a sua hierarquia fica sem argumentos para apregoar a necessidade de subordinar-se a ela [3]. É por isso que a Igreja Católica rejeita totalmente esta doutrina, ao ponto de declarar anátema (maldito – excomungado) quem ouse professá-la. Concílio de Trento Já no Concílio de Trento [4] a Igreja Católica Romana deixa bem claro o que é que pensa sobre o tema controverso de "SÓ A FÉ": «Se alguém disser, que o pecador se justifica só com a fé , entendendo que não se requer alguma outra coisa que coopere para conseguir a graça  [5] da  justificação; e que de nenhum modo é necessário que se prepare e disponha com o movimento da sua vontade; seja excomungad o (Cânon IX) Clemente Romano Apresentada a base do qu e aqui se exe, veja mos a seguir um escr ito de Clemente Romano, que fora dirigido sob a forma de carta aos habitantes de Corinto no ano 96 dC. Esta carta contém 2 particularidades que motivam a sua exposição neste artigo: 1. Que no seu texto distingue-se claramente a Doutrina de SÓ A FÉ ("Sola Fide"). 2. Que quem escreveu dita carta (Clemente) foi considerado pela Igreja Católica Apostólica Romana como o seu quarto Sumo Pontífice (90-99), depois de Pedro (33-64), Lino (64-76) e Anacleto (76-90) [6].

Clemente Romano e a "Sola Fide"

Embed Size (px)

Citation preview

8/9/2019 Clemente Romano e a "Sola Fide"

http://slidepdf.com/reader/full/clemente-romano-e-a-sola-fide 1/3

Clemente Romano e a “Sola Fide”

Introdução

É sabido que a doutrina da Sola Fide (ou "só pela Fé") é uma das colunas daReforma Protestante do século XVI, junto com Só a Graça, Só a Escritura, Só Cristoe Só glória a Deus.

Esta doutrina ensina que não existe mérito algum que faça o homem pecador"merecedor" da salvação da sua alma, mas que a mesma é consequência da infinitamisericórdia de Deus, recebida por Graça (presente) por meio da Fé no sacrifíciovicário e expiatório de Jesus Cristo na cruz do Calvário. Já o apóstolo Paulo declaraque somos salvos por Graça por meio da Fé... "não por obras para que ninguém seglorie" (para que ninguém diga que o mereceu), ensinando por conseguinte que aJustificação diante de Deus Pai do homem pecador se realiza SÓ PELA FÉ ("SolaFide")

"Porque por graça sois salvos por meio da fé; e isto não vem de vós, pois é domde Deus; não por obras , para que ninguém se glorie. Porque somos feitura sua,criados em Cristo Jesus para boas obras [1] , as quais Deus preparou de antemão

 para que andássemos nelas..." (Efésios 2:8-10)

Ora bem, esta doutrina (Só a Fé -"Sola Fide") atenta de maneira directa contra aprópria base dos argumentos esgrimidos pela Igreja Católica Romana parasustentar o seu poder temporal: o pretenso estabelecimento sobre ela de "todosos meios de salvação" [2]. Porque se a Salvação for realmente "Só por Fé", asua hierarquia fica sem argumentos para apregoar a necessidade de subordinar-sea ela [3]. É por isso que a Igreja Católica rejeita totalmente esta doutrina, aoponto de declarar anátema (maldito – excomungado) quem ouse professá-la.

Concílio de Trento

Já no Concílio de Trento [4] a Igreja Católica Romana deixa bem claro o que é quepensa sobre o tema controverso de "SÓ A FÉ":

«Se alguém disser, que o pecador se justifica só com a fé, entendendo quenão se requer alguma outra coisa que coopere para conseguir a graça [5] da justificação; e que de nenhum modo é necessário que se prepare e disponha

com o movimento da sua vontade; seja excomungado.» (Cânon IX)

Clemente Romano

Apresentada a base do que aqui se expõe, vejamos a seguir um escrito deClemente Romano, que fora dirigido sob a forma de carta aos habitantes deCorinto no ano 96 dC. Esta carta contém 2 particularidades que motivam a suaexposição neste artigo:

1. Que no seu texto distingue-se claramente a Doutrina de SÓ A FÉ ("Sola Fide").

2. Que quem escreveu dita carta (Clemente) foi considerado pela Igreja CatólicaApostólica Romana como o seu quarto Sumo Pontífice (90-99), depois de Pedro(33-64), Lino (64-76) e Anacleto (76-90) [6].

8/9/2019 Clemente Romano e a "Sola Fide"

http://slidepdf.com/reader/full/clemente-romano-e-a-sola-fide 2/3

O que torna particular o tema é que alguém considerado Padre da Igreja e,além disso, Sumo Pontífice ou Papa, tenha pregado uma doutrinaanatematizada no concílio de Trento (Janeiro de 1547).

Epístola aos Coríntios(Clemente Romano)

Como assinalámos, esta epístola foi escrita no ano 96 dC. e dirigida à igreja deCorinto por causa de algumas questões disciplinares que se haviam suscitado e quenecessitavam de ser observadas.

A seguir, reproduzimos o ponto XXXII da carta, que dá motivo a este artigo:

"Se alguém os considera um por um com sinceridade, compreenderá a

magnificência dos dons que Ele nos concede. Porque de Jacob são todos os

  sacerdotes e levitas que ministram no altar de Deus; dele é o Senhor Jesusquanto à carne; dele são reis e governantes e soberanos da linha de Judá; sim, eo resto das tribos são tidas em uma honra não pequena, sendo assim que Deus

 prometeu dizendo: A tua semente será como as estrelas do céu. Todos eles foram, pois, glorificados e engrandecidos, não por causa deles mesmos ou das suas obras, ou dos seus actos de justiça que fizeram, mas por meio da suavontade.  E assim nós , tendo sido chamados pela sua vontade em Cristo Jesus,

não nos justificamos a nós mesmos, ou por meio da nossa própria sabedoria

ou entendimento ou piedade ou obras que tenhamos feito em santidade de

coração, mas por meio da fé  , pela qual o Deus Todo-poderoso justifica todos os

homens que foram desde o princípio; ao qual seja a glória para sempre. Amén." (Carta aos Coríntios XXXII)

Conclusão

Podemos ver que Clemente (suposto 4º Papa) não cria na Doutrina da Justificaçãocomo é ensinada pela Igreja Católica Romana; antes cria que o homem é

 justificado (só) pela Fé e não por obras feitas em santidade de coração.

«Porque por graça sois salvos por meio da fé... não por obras[7]... E se é por graça, já não é por obras; de outra maneira agraça já não é graça. E se é por obras, já não é graça; de outramaneira a obra já não é obra. [8]»

 _______________________________________________________

[1] Note-se quão clara é a declaração do apóstolo Paulo. Primeiro esclarece quesomos salvos "por graça por meio da fé... NÃO por obras". E depois, esclarecendo opapel das nossas boas obras, diz que foram preparadas de antemão por Deus paraque "andássemos nelas". Ou seja, somos salvos PARA (andar em) Boas Obras,NÃO que somos salvos POR andar nelas. As Boas Obras no cristão não são o meio

para conseguir ou merecer a salvação MAS são o obrar consequente por tê-la

8/9/2019 Clemente Romano e a "Sola Fide"

http://slidepdf.com/reader/full/clemente-romano-e-a-sola-fide 3/3

recebido. Pelo que, a Fé não pode ser "salvífica" (permita-se-me o termo) se não é"obradora do bem" (como refere o apóstolo Tiago na sua epístola).

[2] (Sublinhados acrescentados) «"A única Igreja de Cristo..., é aquela que nossoSalvador depois de sua Ressurreição, entregou a Pedro para que fosse seu pastor econfiou a ele e aos demais Apóstolos para propagá-la e regê-la... Esta Igreja,

constituída e organizada neste mundo como uma sociedade, subsiste na ( "subsistitin") Igreja Católica governada pelo sucessor de Pedro e pelos Bispos em comunhãocom ele" (LG 8). O Decreto sobre o Ecumenismo, do Concílio Vaticano II, explicita:"Pois somente por meio da Igreja católica de Cristo, 'a qual é meio geral desalvação', pode ser atingida toda a plenitude dos meios de salvação.Cremos que o Senhor confiou todos os bens da Nova Aliança somente ao ColégioApostólico, do qual Pedro é o chefe, a fim de constituir na terra um só Corpo deCristo, ao qual é necessário que se incorporem plenamente todos os que, de quealguma forma, já pertencem ao Povo de Deus" (UR 3).» Catecismo Nº 816

«...É na Igreja que está depositada "a plenitude total dos meios de salvação"(UR 3).» Catecismo Nº 824

«.. A Igreja é católica: anuncia a totalidade da fé; traz em si e administra aplenitude dos meios de salvação..» Catecismo Nº 868

«.."Estão incorporados plenamente à sociedade, que é a Igreja, os que, tendo oEspírito de Cristo, aceitam a totalidade de sua organização e todos os meios desalvação nela instituídos e estão unidos, dentro da sua estrutura visível, aCristo, que a rege por meio do Sumo Pontífice e dos Bispos, pelos vínculos daprofissão de fé, dos sacramentos, do regime eclesiástico e da comunhão.»Catecismo Nº 837

[3] «O Magistério da Igreja exerce plenamente a autoridade que recebeu de Cristoquando define dogmas, isto é, quando propõe, de uma forma que obriga o povo

cristão a uma adesão irrevogável de fé, verdades contidas na Revelação divinaou também quando propõe de maneira definitiva verdades que têm com elas umvínculo necessário.» Catecismo Nº 88.

«.. não podem salvar-se aqueles que sabendo que Deus fundou, por meio deJesus Cristo, a Igreja católica como necessária para a salvação, no entanto, nãoquiserem entrar ou perseverar nela (LG 14).» Catecismo Nº 846.

[4] «DECRETO SOBRE A JUSTIFICAÇÃO», SESSÃO VI, celebrada a 13 de Janeirode 1547.

[5] Existe uma incongruência na expressão: "...que coopere para conseguir agraça". Porque se a palavra "graça" significa PRESENTE, pois, um presente nem se

consegue nem se merece, um presente SE RECEBE, sem que haja nada quepossamos fazer para cooperar na sua obtenção.

[6] Estas datas de pontificados romanos devem ser consideradas apenas como"orientadoras", já que curiosamente (e surpreendentemente também, por tratar-sede parte da tão apregoada Sucessão Apostólica que concede autoridade a todos osPapas, até ao dia de hoje) não existe uma versão única.

[7] Efésios 2:8

[8] Romanos 11:6